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Cap.
anemia nas desordens sistêmicas
MEDGRUPO - Ciclo 1: MEDCURSO Capítulo 3 - Anemia nas Desordens Sistêmicas 26
A
nemia é um achado muito frequente em Outros sinônimos empregados para ADC in-
doenças não hematológicas, tais como cluem: “anemia inflamatória”, “anemia hipo-
neoplasias malignas, infecções sistêmi- ferrêmica com siderose reticuloendotelial” e
cas, colagenoses, doenças granulomatosas, doen- “anemia citocina-mediada”. Embora esta últi-
ça inflamatória intestinal, insuficiência renal ma designação seja a mais correta, não costuma
crônica, hepatopatia crônica e endocrinopatias ser utilizada na prática clínica.
(hipotireoidismo, insuficiência suprarrenal).
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A IL-6 tem um papel essencial neste bloqueio, 1-2 meses do quadro, estabilizando-se a partir
já que, após o aparecimento de uma doença in- daí. O hematócrito se mantém acima de 25% em
flamatória crônica, os macrófagos começam a 80% dos casos, e o quadro anêmico costuma
liberar esta citocina, que estimula o fígado a acompanhar a atividade da doença. Por exemplo:
produzir hepcidina (que se comporta como um um dos critérios de atividade da artrite reuma-
reagente de fase aguda). Esta última, por sua vez, toide e do lúpus é a anemia. Quando os sinais e
determina uma redução na absorção intestinal sintomas da colagenose melhoram – fase da
de ferro ao inibir a síntese de ferroportina (o remissão – a anemia também melhora, e o he-
“canal de ferro” responsável pela entrada deste matócrito pode voltar ao normal.
elemento nos enterócitos). Ocorre também um
“aprisionamento” do ferro no interior dos ma- Na maioria dos casos, a ADC não cursa com
crófagos e demais locais de depósito, compro- hematócrito abaixo de 25%. Se isso ocorrer,
metendo o abastecimento da produção eritroci- somos obrigados a investigar fatores contri-
tária – um fenômeno chamado de eritropoiese buintes para a anemia (ex.: ferropenia)!!!
restrita em ferro... Tais efeitos da hepcidina
justificam a HIPOFERREMIA encontrada na
anemia de doença crônica! Conforme veremos, L ABORATÓRIO
na ADC o ferro sérico está baixo, a ferritina sé-
rica vai de normal a alta e a saturação da trans- Embora possa ser normocítica-hipocrômica,
ferrina fica reduzida... Observe a Figura 1. ou mesmo microcítica-hipocrômica, a ADC é,
em sua forma mais característica de apresen-
A IL-1 estimula a síntese, pelos polimorfonu- tação, normocítica-normocrômica. Quando
cleares, de lactoferrina, uma proteína seme- existe microcitose, esta é discreta e quase nun-
lhante à transferrina, que compete pelo ferro. ca o VCM fica < 72 fL. Sem dúvida a hipocro-
A lactoferrina é mais ávida por ferro do que a mia é mais comum e mais acentuada do que a
transferrina, e não libera o ferro para a medula microcitose, diferenciando esta anemia da
de forma adequada. O interferon-gama também ferropriva, na qual a microcitose é mais proe-
tem papel importante na anemia de doença minente e se instala antes da hipocromia.
crônica, ao promover apoptose e fazer down-
-regulation dos receptores de eritropoetina nas O índice de produção reticulocitária encontra-
células precursoras da medula óssea. Além -se normal. Os exames do metabolismo do
disso, também parece antagonizar outros fato- ferro encontram-se da seguinte forma: (1) fer-
res pró-hematopoiéticos. ro sérico baixo (< 50 mg/dl) e ferritina sérica
normal ou alta (situando-se entre 50-500 ng/ml)
– essa combinação caracteriza a doença; (2)
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS TIBC normal ou baixo (< 300 mg/dl); e (3)
saturação de transferrina levemente baixa (10-
Como na maioria das vezes a ADC não é 20%). A Protoporfirina Livre Eritrocitária
grave, o quadro clínico é marcado basica- (FEP) encontra-se elevada, mas em menor grau
mente pelos sinais e sintomas da doença de quando comparada à anemia ferropriva. A TRP
base. Eventualmente, pacientes assintomáti- (Proteína Receptora de Transferrina), ao con-
cos com anemia leve acabam descobrindo, trário da ferropriva está baixa...
no processo de investigação diagnóstica, uma
doença oculta... Um paciente que apresenta Reparem: o TIBC está normal ou até baixo
perda ponderal significativa, e cujos exames porque, na anemia de doença crônica, há
revelam anemia + aumento do VHS, deve ser uma redução da transferrina sérica (lembrar
extensivamente investigado para uma doen- que o TIBC não é influenciado pela quantidade
ça sistêmica! de ferro no sangue ou mesmo pela porcentagem
de sítios livres da transferrina – ele é útil porque
A “anemia de doença crônica” em geral se ins- traduz, em última análise, a concentração séri-
tala progressivamente ao longo dos primeiros ca de transferrina).
Fig. 1
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Quadro de Conceitos I
Qual é a principal causa de anemia microcítica-hipocrômica? Anemia Ferropriva
Qual é a principal causa de anemia normocítica-normocrômica? Anemia Ferropriva
Qual é a segunda principal causa de anemia microcítica-hipocrômica? Anemia de Doença Crônica*
Qual é a segunda principal causa de anemia normocítica-normocrômica? Anemia de Doença Crônica
Qual é a principal causa de anemia em pacientes hospitalizados? Anemia de Doença Crônica
*Se microcitose < 72 fL, a segunda causa é talassemia.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E
LABORATORIAIS
Ferro IV 1.000 mg, divididos em Iniciar se St transf ≤ 20% ou ferritina ≤ 200 ng/ml.
Esquema de
dez aplicações em sessões Objetivo: atingir St transf entre 30-50% e ferritina entre
reposição
consecutivas de HD. 200-500 ng/ml.
Objetivo: manter St transf entre 30-50% e ferritina entre
Esquema de
Ferro IV 25-100 mg 1x/semana. 200-500 ng/ml.
manutenção
Interromper se St transf > 50% ou ferritina > 500 ng/ml.
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Como, na maioria das vezes, a anemia é leve ou Cerca de 10-25% dos pacientes com hiperti-
moderada, o quadro clínico é marcado pelos reoidismo apresenta anemia. A anemia é dis-
sinais e sintomas da hepatopatia crônica. Os creta, e seu mecanismo é desconhecido. Um
achados laboratoriais característicos são de uma componente de hemodiluição parece contribuir.
anemia normocítica ou macrocítica, com índi-
ce de produção reticulocitária elevado, em torno Classicamente, é do tipo normocítica-normo-
de 8,5% (variação entre 2,5-24%). A macroci- crômica ou microcítica. A microcitose não
tose ocorre em 30-50% dos casos, geralmente responde à reposição de ferro. Com o tratamen-
não excedendo o limite de 110 fL O esfregaço to da doença, a anemia é corrigida.
do sangue periférico pode mostrar uma série de
alterações sugestivas: (1) macrócitos finos – Outras Endocrinopatias
hemácias com diâmetro aumentado, porém,
volume corpuscular normal – este achado é Uma anemia leve pode aparecer no hipoadre-
comum, ocorrendo em cerca de 60% dos casos; nalismo (ex.: doença de Addison), hipogona-
(2) hemácias em alvo (Figura 3) – idênticas dismo masculino, hipopituitarismo e hiperpa-
àquelas encontradas nas hemoglobinopatias e ratireoidismo. Geralmente, trata-se de uma
na esplenectomia – o mecanismo é o aumento forma normocítica-normocrômica que reverte
da superfície da hemácia, em razão do acúmulo após a correção hormonal.
de lipídeos na membrana, em relação ao volume
corpuscular; e (3) acantócitos – 5% dos pacien- No caso do hipogonadismo masculino, a falta
tes. Pancitopenia ou bicitopenia (leve a mode- de androgênio reduz a produção renal de eri-
rada) pode ocorrer, em virtude do hiperesplenis- tropoietina, trazendo o hematócrito para os
mo frequentemente coexistente. níveis normais do sexo feminino.
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Tab. 3: Causas de anemia por ocupação medular –
V - ANEMIA POR OCUPAÇÃO MEDULAR “mieloftísica”.
(Anemia Mieloftísica) 1 - Neoplasias Malignas Hematológicas
Leucemias agudas ou crônicas
O termo mieloftise (tise = tuberculose) foi criado Linfomas
Mieloma múltiplo
numa época em que a tuberculose não apresen-
Metaplasia mieloide agnogênica
tava tratamento, evoluindo, com frequência, para Policitemia vera
a forma disseminada ou miliar. A infecção atingia Trombocitemia essencial
uma série de órgãos, entre eles fígado, baço, me-
2 - Neoplasias Malignas Não Hematológicas
ninges, linfonodos, rins, coração e medula óssea.
A medula apresentava múltiplos focos de granu- Carcinomas Metastáticos – principais:
- Mama
loma caseoso e áreas de fibrose, e o paciente - Pulmão
desenvolvia pancitopenia progressiva associada - Próstata
ao aparecimento de células jovens na periferia - Estômago
(eritroblastos e granulócitos imaturos), o que se 3 - Infecções Granulomatosas Disseminadas
denomina leucoeritroblastose (Figura 4).
Tuberculose miliar
Micoses profundas
4 - Doenças Inflamatórias Não Infecciosas
Sarcoidose
Lúpus Eritematoso Sistêmico (Mielofibrose)
5 - Miscelânea
Osteopetrose
Doença de Gaucher