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ARTRITE REUMATÓIDE

CASTOR JORDÃO COBRA *

H E R N A N I D'AURIA **

A artrite reumatóide é doença sis- fecciosa, metabólica, endócrina, cir-


têmica, de caráter eminentemente culatória periférica, nervosa, psico-
crônico, de duração e intensidade gênica, de hipersensibilidade. A ten-
muito variáveis e de localização pre- dência atual é aceitar não apenas
dominantemente articular; evolui, u m fator etiológico, m a s u m a cons-
quase na totalidade dos casos, para telação de fatores dos quais uns agi-
a fase final de fibrose. Os casos de riam mais, outros menos, de acordo
regressão completa, com restitutio com as tendências particulares de
ad integrum, são raríssimos e muito cada caso.
discutidos. Até hoje não se conhe-
ce a causa direta da doença; admi- PATOLOGIA
te-se, entretanto, a existência de ele-
A artrite reumatóide é descrita co-
mentos desencadeantes, agravantes
m o doença sistêmica que lesa a subs-
e atenuantes, e que há tendência fa-
tância interfibrilar do tecido conec-
miliar transmitida por fatores here-
tivo. Esta substância é de tipo co-
ditários (gens). A evolução do pro-
loidal, transparente e existe nos es-
cesso se faz por ciclos de duração
paços que separam as células e fi-
e intensidade variáveis. N ã o é raro
bras de origem mesenquimal. Este
haver remissão espontânea tempo-
conceito explica a distribuição uni-
rária.
versal das lesões reumatóides, u m a
É moléstia conhecida sob várias vez que os tecidos mesenquimais são
denominações: poliartrite crônica universalmente distribuídos pelo or-
evolutiva, artrite deformante, artri- ganismo.
te reumática, artrite atrófica, artri-
te proliferativa, poliartrite simétrica Lesões articulares — Variam mui-
progressiva, reumatismo prolifera- to segundo o estádio e gravidade da
tivo. doença. Entretanto, desde a fase ini-
É muito mais freqüente em climas cial há proliferação de células sino-
temperados do que e m climas tropi- viais, com espessamento da membra-
cais. Inicia-se com maior freqüência na sinovial. A cartilagem perde o
entre os 20 e 50 anos, com o acme brilho habitual e pode exibir ulcera-
nas proximidades dos 40 anos. E m ções superficiais. À medida que a
relação ao sexo, a artrite reumatói- doença progride, a cartilagem arti-
de genuína acomete de preferência cular se apresenta branco-acinzenta-
a mulher, aproximadamente na ra-
zão de 3:1. Todas as raças parecem
ter a m e s m a suscetibilidade à doença. Trabalho da Secção de Reumatologia
da Cadeira de Terapêutica Clínica da
A etiologia é muito discutida, sen- *ac. Med. da Univ. de São Paulo (Prof.
do considerada como de natureza in- Cantidio de Moura Campos).
Chefe.
** Médico auxiliar.
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da, mais frouxa e pode mostrar ul- são específicas, pelo que não é pos-
cerações maiores. Nos espaços me- sível, muitas vezes, fazer diagnósti-
dulares subcondrais desenvolve-se te- co seguro partindo apenas do aspec-
cido conectivo proliferativo; do mes- to microscópico.
m o modo, da proliferação de vilosi-
dades sinoviais, freqüentemente ini- Lesões extra-articulares — Os nó-
ciada ao nível do ângulo condro-si- dulos subcutâneos da artrite reuma-
novial, resulta a formação do cha- tóide constituem as únicas lesões pa-
mado pannus sinovial, que tende a tológicas características da doença.
invadir a cavidade articular e a pro- Estes nódulos são semelhantes aos
mover a destruição da cartilagem da febre reumática, diferindo apenas
hialina (a esse processo prolif erati- no maior tamanho e duração mais
vo se filia a denominação artrite longa na artrite reumatóide. N o nó-
proliferativa, já atribuída à artrite dulo reumático existem, como carac-
reumatóide). A cartilagem é com- terísticas mais notáveis, a exsudação
primida entre o pannus articular e de plasma e a infiltração de células
o tecido proliferativo dos espaços sangüíneas; no nódulo reumatóide
subcondrais, do que resulta a sua predominam a proliferação e a de-
destruição, constituindo-se verdadei- generação, sendo discretos os fenô-
ra "ponte fibrosa" entre as duas epí- menos exsudativos. As alterações
fises, pela aderência dos pannus si- vasculares variam desde o infiltra-
noviais entre si e destes com os ele- do perivascular de células inflama-
mentos epifisários; constitui-se as- tórias (linfócitos e plasmócitos), até
sim, e m última análise, a ancilose a inflamação e a degeneração difu-
fibrosa que, e m conseqüência da ação sas de toda a parede do vaso. En-
de osteoblastos, pode evoluir para a contram-se tromboses mais comu-
ancilose óssea. mente nos nódulos reumatóides. Ul-
timamente tem-se admitido que a le-
O pannus articular e o infiltrado
são primária desses nódulos é u m
inflamatório periarticular determi-
processo inflamatório, instalado na
n a m o aumento de volume das arti-
parede de u m vaso sangüíneo, que
culações acometidas. As prolifera-
evolui para necrose.
ções subcondrais são u m dos fato-
res responsáveis pela osteoporose, As infiltrações nos músculos es-
queléticos são representadas por lin-
assim como pela formação de cistos
fócitos, como e m outras doenças, e
epifisários. A atrofia e destruição
não podem ser consideradas patolò-
da cartilagem, .causando a aproxi-
gicamente específicas. Infiltrados
mação das extremidades ósseas, são
idênticos têm sido descritos nas bai-
traduzidas radiològicamente pelo pin-
nhas dos nervos periféricos na artri-
çamento articular.
te reumatóide.
Microscòpicamente, na fase ativa
As lesões reumatóides são relati-
da doença, o tecido sinovial mostra
vamente raras nas serosas ou nas
proliferação das células de revesti-
vísceras. Sinais de valvulite cardía-
mento, vascularização aumentada e
ca aparecem com a m e s m a freqüên-
graus variáveis de infiltração celu-
cia e m pacientes reumatóides e na
lar, que pode ou não ser perivascu-
população e m geral. A autópsia de
lar. A maioria das células infiltra-
pacientes reumatóides revela lesões
tivas é representada por linfócitos.
cardíacas, comparáveis às da febre
As alterações histopatológicas não
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reumática, e m percentagens variá- gianas proximais dos dedos; por mo-


veis, segundo os diversos autores, tivos desconhecidos são poupadas as
entre 15 e 5 0 % . interfalangianas distais, ao contrá-
rio do que sucede na osteartrite.
MANIFESTAÇÕES CLINICAS Nos casos graves de artrite reuma-
O início da artrite reumatóide é tóide são atingidas praticamente to-
das as articulações.
freqüentemente insidioso; as mani-
festações iniciais são de cansaço, A artrite reumatóide típica apre-
mal-estar geral, astenia, distúrbios senta aspecto característico, com in-
vasomotores, parestesias, hipertonia flamação, dor e limitação de movi-
muscular e perda de peso. Alguns mentos. E m virtude do espessamen-
autores admitem a existência de pe- to dos tecidos periarticulares e da
ríodo prodrômico que seria represen- atrofia dos músculos adjacentes, a
tado pelos mesmos fenômenos asso- articulação assume aspecto fusi-
ciados ou isolados, m a s e m grau m e - forme.
nos intenso, u m a vez que eles con-
Os músculos que atuam sobre de-
tinuam presentes e e m geral mais
terminada articulação se dividem em
acentuados nos demais períodos evo-
dois grupos que agem como antago-
lutivos da doença, que são o inicial,
nistas, havendo e m geral predomi-
já referido, o de estado e o final.
nância de u m deles. Quando a arti-
As manifestações articulares que culação se torna inflamada e dolo-
acompanham as fases mais precoces rosa, advém reflexamente hipertonia
são insidiosas na maioria dos casos, muscular, com limitação de movi-
outras vezes pouco mais evidentes e, mentos. Sendo os flexores os mús-
e m proporção menor de casos, niti- culos predominantes, ocorre contra-
damente evidentes. Nos casos de iní- tura e m flexão, motivo pelo qual se
cio insidioso, o processo inflamatório
afirma que a artrite reumatóide é
articular atinge u m a ou mais arti-
"doença de flexão" Quando a in-
culações, estendendo-se e m seguida
flamação periarticular se abranda,
lentamente a outras. O início agudo
as contraturas assumem maior im-
se caracteriza por poliartrite, febre
portância porque condicionam fre-
alta e leucocitose, ao contrário dos
qüentemente as seqüelas do surto
casos de início brando, e m que a fe-
superado. A s articulações mais aco-
bre e a leucocitose são muito menos
metidas são as das mãos, punhos,
acentuadas. A artrite reumatóide de
cotovelos, joelhos e dedos dos pés;
início agudo, nas fases mais preco-
o acometimento das têmporo-man-
ces, pode simular a febre reumática;
dibulares é praticamente patogno-
o diagnóstico diferencial dessas duas
mônico da artrite reumatóide. Nos
doenças é importantíssimo, pois des-
casos avançados, como já referimos,
te dependerá a orientação terapêu-
pode ocorrer ancilose fibrosa e ós-
tica exata que, embora tenha alguns
pontos e m comum, é bastante diver- sea, acompanhada de subluxação ou
sa principalmente no que diz respei- de desvio do eixo da articulação
to ao repouso, como veremos mais atingida. Atrofia e fraqueza mus-
adiante. culares são freqüente e insistente-
mente referidas pelos pacientes reu-
Nos casos típicos de artrite reu-
matóides. N a opinião de muitos ob-
matóide o acometimento articular é
servadores, a atrofia muscular é par-
distribuído simètricamente e, de pre-
te integrante da doença e por isso
ferência, nas articulações interfalan-
não deve ser atribuída apenas ao de-
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suso e à desnutrição que decorrem lembrar-se a possibilidade de tais le-


da contratura persistente. sões estarem relacionadas com sur-
A pele das extremidades freqüen- tos pregressos ou concomitantes de
temente se torna lisa, brilhante e febre reumática, pelo menos e m al-
atrófica, podendo haver rubor das guns casos.
eminências tênar e hipotênar. As Irites e uveítes muitas vezes re-
mãos usualmente são frias e úmidas. beldes aos vários tratamentos dispo-
E m cerca de 15 a 2 0 % dos pacien- níveis, podem preceder ou acompa-
tes reumatóides surgem nódulos sub- nhar a artrite reumatóide e levar
cutãneos, freqüentemente localiza- até à cegueira completa.
dos na face posterior do antebraço,
sobre o cúbito, u m pouco abaixo da Formas clínicas da artrite reuma-
apófise olecraniana; podem existir tóide — D e acordo com certas ca-
t a m b é m sobre outras proeminências racterísticas especiais, individuali-
ósseas; o tamanho desses nódulos é zam-se e m Reumatologia tipos dis-
variável, atingindo até o volume de tintos de artrite reumatóide, que
guardam entre si relações estreitas
u m a azeitona; não são dolorosos, a
e que devem ser considerados como
não ser quando expostos a pressão
simples variantes de u m a só doença,
indevida ou quando ulcerados e pos-
até que se conheça minuciosamente
teriormente infectados; na maioria
a patogênese de cada u m a delas: 1)
dos casos estão localizados e m áreas
Artrite reumatóide genuína, ou do
sujeitas a traumatismos freqüentes.
adulto, cujas características princi-
Estes nódulos persistem de meses a
pais já foram discriminadas. Apa-
anos, ao contrário dos da febre reu-
rece no adulto, iniciando-se de pre-
mática, que duram de semanas a
ferência entre os 20 e 50 anos de
meses.
idade, atingindo predominantemente
E m geral existe febre pouco in- pacientes do sexo feminino e exis-
tensa nas fases iniciais de atividade tindo tendências nitidamente anci-
da doença; e m alguns poucos casos losantes e m relação às articulações
os níveis térmicos mostram-se altos periféricas. 2) Síndrome de Still, ou
por algumas semanas. Além de fe- artrite reumatóide juvenil. É a ar-
bre encontra-se discreta taquicardia trite reumatóide da criança, carac-
e deficiência da circulação periférica. terizando-se por poliartrite evoluti-
A nutrição geral se vê seriamente va, raramente ancilosante, freqüen-
comprometida; nos casos mais gra- temente acompanhada de subluxa-
ves pode sobrevir caquexia. O pa- çÕes e de desvios do eixo articular,
ciente apresenta aspecto nitidamen- assim como de hepatosplenomegalia
te doentio, fisionomia abatida, pali- e de poliadenopatia. São freqüentes
dez e traços marcantes de sofrimen- nesta forma, distúrbios do cresci-
to intenso; sob este prisma difere mento ósseo, traduzidos na vida adul-
muito dos portadores de outras afec- ta por braquidactilia e braquigna-
ções reumáticas, tais como ostear- tia. 3) Síndrome de Felty, e m que
trite, artrite úrica, lumbago, que e m estão presentes todas as caracterís-
regra m a n t ê m aspecto sadio. ticas da artrite reumatóide genuína,
E m b o r a seja referida na literatu- além de hepatosplenomegalia. 4) Ar-
ra a existência de sinais de pericar- trite psoriática, forma especialmen-
te rebelde de artrite reumatóide, as-
dite, de miocardite e de lesões val-
sociada a lesões cutâneas de psoría-
vulares na artrite reumatóide, deve
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e plaquetas não apresentam desvios


se. Corresponde a 3 % dos casos de
apreciáveis dos padrões normais.
artrite reumatóide. E m alguns ca-
sos coincidem lesões articulares in- Nos casos típicos, geralmente a
terfalangianas distais com lesões un- hemossedimentação se apresenta ace-
gueais psoriásicas. 5) Espondilite lerada e a reação de Weltmann, des-
ancilosante, também chamada espon- viada para a esquerda; entretanto,
dilite ancilopoiética, espondilite reu- não é raro encontrar-se a reação de
matóide, espondilite rizomélica, do- Weltmann desviada para a direita
ença de Marie-Strümpell, doença de m e s m o nas fases ativas da artrite
Mendel-Bechterew, é considerada por reumatóide genuína. A reação do
muitos autores como forma especial Octab e a dosagem das mucoproteí-
da artrite reumatóide, com localiza- nas carecem de pesquisas mais am-
ção vertebral, encontrada com maior plas, para que possam ser utilizadas
freqüência e m pacientes do sexo na prática.
masculino, na razão de 9:1. Cerca A aglutinação de estreptococos he-
de 2 0 % dos pacientes portadores de m,olíticos do grupo A por soros de
espondilite ancilosante apresentam pacientes reumatóides se verifica na
lesões das articulações periféricas, grande maioria dos casos; porém,
que e m nada diferem das lesões da sendo prova de difícil realização,
artrite reumatóide genuína. prefere-se, por ser de execução mais
simples, a prova de aglutinação de
DADOS LABORATORIAIS hcmácias de carneiro sensibilizadas,
que apresenta grande especificidade.
A anemia normocítica e hipocrô- E m estudo por nós realizado, e m
mica que acompanha a artrite reu- 1955, com relação a esta última pro-
matóide responde muito pouco ao va, obtivemos cerca de 8 5 % de po-
tratamento pelo ferro; n e m por isso sitividade nos 44 casos de artrite
se justifica a exclusão desse medi- reumatóide genuína e negatividade
camento do programa terapêutico do nos 5 casos de espondilite ancilo-
artrítico reumatóide. Os leucócitos sante :

Freqüência de títulos
N? de
Especificação Inferior Igual Superior amostras
a 16 a 16 a 16 estudadas

Febre reumática 8
8 5 1 14
14
Coréia de Sydenhann 5 4 0 9
Artrite reumatóide genuína ativa 7 6 31 44
Artrite reumatóide genuína inativa 1 — — 1
Espondilite ancilopoiética 5 — • — 5
Osteartrite 4 1 3 8
Lúpus eritematoso disseminado . . 1 1 2
Afecção não reumática 6 1 3 10
Indivíduos sadios 136 16 — 152

Totais 173 33 39 245

Os valores considerados positivos são os iguais e os superiores a 16.


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Pelo quadro acima, podemos veri- neralizando gradualmente e toman-


ficar que a especificidade e sensibi- do aspecto de "saca-bocados" ob-
lidade da prova são relativamente servado com freqüência na artrite
satisfatórias para justificarem seu reumatóide e na gota. Nos casos
emprego habitual. avançados pode haver fusão dos seg-
Quando comparados os títulos de mentos articulares, por ancilose fi-
antistreptolisinas O em casos de ar- brosa ou óssea. Freqüentemente se
trite reumatóide e na população ge- instalam subluxações, com ou sem
ral, não se notam diferenças dignas destruição das extremidades ósseas.
de nota. Coincidentemente com estas altera-
ções pode ocorrer certo grau de hi-
Os níveis sangüíneos de ácido úri-
pertrofia óssea, labiamento e forma-
co estão, habitualmente, dentro dos ção de osteófitos, fatos esses pró-
limites normais. prios da artropatia degenerativa e
O liqüido sinovial apresenta nú- que surgem secundariamente à ar-
mero aumentado de leucócitos e de trite reumatóide. E m raras eventua-
polimorfonuclares; costuma ser tur- lidades, pode haver completa perda
vo e mais coagulável do que o nor- das extremidades ósseas, que leva à
mal. chamada deformidade em "franja de
tapete" (carpet tack).
RADIOLOGIA

O quadro radiológico varia muito DIAGNÓSTICO


de acordo com as diferentes fases
da artrite reumatóide; por conve- Os critérios para diagnóstico da
niência, as fases iniciais e finais são artrite reumatóide já estão bem es-
tabelecidos, sendo possível distinguir
descritas separadamente.
quase sempre, nos casos típicos, esta
Precocemente pode não haver afecção de outras formas de artrite.
anormalidades radiológicas, mas gra- O diagnóstico diferencial com a
dualmente vão aparecendo altera- osteartrite é muito importante, em
ções características, como: aumento
virtude da grande diferença no prog-
do espaço articular conseqüente ao nóstico e no tratamento e porque es-
aparecimento de derrame intra-arti- tas duas afecções correspondem, nu-
cular; velamento radiológico da ar-mericamente, a cerca de dois terços
ticulação, devido à inflamação dos
das artrites crônicas. O paciente
tecidos moles peri-articulares; des-
reumatóide apresenta aspecto niti-
mineralização difusa do esqueleto,
damente doentio; o osteartrítico não
u m pouco mais acentuada nas epí- tem outras queixas, nem sintomas
fises das articulações comprometidas
gerais, além dos referentes às arti-
(a maior desmineralização epifisária
culações. Com referência à locali-
decorre do desuso, do processo ge-
zação articular, a osteartrite predo-
ral de osteoporose e da presença na
mina nas interfalangianas distais e
epífise de tecido conectivo prolife-
nas articulações de sustentação, co-
rativo); pinçamento do espaço arti-
m o os joelhos, as coxofemorais, os
cular, pela destruição da cartilagem
tornozelos.
hialina. Ainda precocemente pode
aparecer destruição cortical das ca- A febre reumática é de início mais
beças metatarsianas. agudo, na maioria dos casos; quan-
to ao comprometimento articular é
E m fases mais avançadas, essas
em geral assimétrico, iniciando-se
áreas de destruição óssea vão-se ge-
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e m grandes articulações, com cará- liarticulares. O início é rápido, a ar-


ter fugaz e sem deixar seqüelas. Os ticulação se torna quente, inchada,
comemorativos cárdio-circulatórios dolorosa e apresenta derrame arti-
são evidentes nesta afecção e mais cular intenso. A cultura ou esfre-
raros na artrite reumatóide; o ele- gaço freqüentemente revela o agente
trocardiograma e a radiologia car- etiológico; o hemograma é caracte-
díaca apresentam sinais caracterís- rístico de processo supurativo. A
ticos na febre reumática e e m geral freqüência destas artrites está dimi-
são inexpressivos na artrite reuma- nuindo progressivamente e m virtude
tóide. Seqüelas valvulares cardíacas da ação eficiente dos antibióticos e
mais ou menos intensas são quase das sulfonamidas.
que regra na febre reumática; ad- A artrite metastática ou focai se
mite-se que a gravidade das seqüe- manifesta com início insidioso como
las e m parte decorre da extensão a artrite reumatóide genuína; falta,
das lesões e da orientação terapêu- entretanto, o caráter simétrico do
tica. A velocidade de hemossedimen- comprometimento articular e quase
tação é habitualmente maior na fe- sempre é possível suspeitar de foco
bre reumática, na qual atinge, com séptico, que tenha desencadeado ou
grande freqüência, níveis superiores que esteja mantendo a atividade do
a 80 m m na primeira hora. processo de artrite. A artrite me-
A gota é freqüentemente monoar- tastática parece traduzir resposta
ticular, podendo ser migratório e po- exagerada de u m organismo de cons-
liarticular; seu início é bastante tituição reumática a determinado
abrupto; depois de algumas horas foco infeccioso; com freqüência re-
de iniciada a dor, a articulação atin- lativa pode acusar-se a lues, a tu-
gida apresenta-se vermelha, quente, berculose, as infecções a cocos, a
inchada e intensamente dolorosa à brucelose, assim como outras infec-
pressão. N ã o costuma haver, na go- ções bacterianas.
ta, artropatia de caráter simétrico. A artrite traumática é muito se-
E m cerca de 5 0 % dos casos de gota, melhante à artrite reumatóide quan-
há comprometimento da articulação to aos fenômenos inflamatórios da
metatarso-falangiana do hallux. A articulação comprometida, m a s a
evolução da artrite úrica se faz por
anamnese refere o trauma local.
surtos de duração relativamente cur-
E m certos casos não há u m trauma
ta. N a gota os níveis de ácido úrico definido, mas, se fizermos investi-
habitualmente estão acima dos nor-
gação rigorosa, chegaremos à con-
mais, que são aproximadamente de
clusão de que as articulações afe-
6,0 mg/100 ml para homens e de 5,5
tadas já vinham sofrendo micro-
mg/100 ml para mulheres. N a ar-
traumas longa e continuamente.
trite úrica encontram-se muito fre-
qüentemente tofos de biurato de só- A artropatia do lúpus eritematoso
dio, localizados de preferência nos simula muito as manifestações arti-
bordos do pavilhão da orelha e no pé. culares da artrite reumatóide, prin-
cipalmente nas fases iniciais; entre-
As artrites supurativas são m o n o
tanto, a acometimento sistêmico
ou panciarticulares e, na quase tota-
múltiplo (coração, rim, pulmão,
lidade dos casos, têm caráter intensa
pleura, pericárdio, peritônio, pele)
e rapidamente destrutivo e m relação
e a presença de células L.E. refor-
à cartilagem. E m nossa experiência
çam o diagnóstico de lúpus erite-
nunca vimos artrites supurativas po-
matoso disseminado.
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PROGNÓSTICO deve ser realizado somente quando


houver indicação indiscutível para o
Em vista da natureza da doença ato cirúrgico.
e de sua evolução caprichosa, o prog-
O repouso deve ser prescrito de
nóstico é de difícil determinação. H á
acordo com as peculiaridades de ca-
raros casos que, e m certa fase evo- da caso; deve ser proporcionado ao
lutiva, entram e m remissão m e s m o corpo todo e a cada articulação
sem tratamento e o paciente volta comprometida. N ã o é necessário re-
às atividades habituais sem grandes pouso absoluto, pois a atividade ar-
limitações da capacidade funcional; ticular deve aumentar progressiva-
e m outras eventualidades, u m a for- mente à medida que diminui a ati-
m a benigna pode tornar-se brusca vidade inflamatória. M e s m o duran-
e rapidamente grave, ou vice-versa. te as fases agudas devem ser reali-
E m síntese, é muito difícil e fre- zados exercícios suaves para evitar,
qüentemente quase impossível pre- tanto quanto possível, a atrofia mus-
dizer a evolução dos fatos e m cada cular por desuso.
caso particular. Para garantir repouso articular
completo pode recorrer-se a talas,
TRATAMENTO a goteiras ou a outros meios de
imobilização; o repouso articular não
Na falta do conhecimento exato deve durar o dia todo, sendo muito
da etiologia, não se conseguiu ain- útil a sua alternância com sessões
da chegar ao tratamento específico; de mobilização ativa ou passiva, de
é possível, entretanto, beneficiar o caráter progressivo.
paciente, especialmente quanto à
gravidade das seqüelas articulares, Tratamento medicamentoso —
mas t a m b é m quanto às manifesta- Todas as drogas antipiréticas ou
ções gerais. analgésicas, já estudadas no trata-
N a avaliação dos resultados tera- mento da febre reumática, podem
pêuticos, não devemos deixar de con- e devem ser empregadas na artrite
siderar que a doença está sujeita a reumatóide, embora o seu efeito se-
remissões espontâneas, pelo que po- ja apenas sintomático, segundo a
de ser atribuída erroneamente essa maioria dos autores. A fim de evi-
melhora à última terapêutica usada. tar repetições, não estudaremos aqui
os salicílicos, os cincofênicos e os
para-aminofenólicos; dos pirazolôni-
Tratamento geral — Diante de
cos focalizaremos especialmente a
pacientes emagrecidos e desnutridos,
fenilbutazona, u m a vez que o pira-
devemos procurar manter boa nutri-
ção através de estímulo do apetite, mido já foi estudado.
de dietas b e m balanceadas e de A descoberta da fenilbutazona foi
complementos vitamínicos. ocasional; surgiu quando se busca-
va u m solubilizante do piramido pa-
Merecem t a m b é m especial atenção
ra que este pudesse ser empregado
o funcionamento intestinal regular,
por via parenteral. É usada na prá-
os cuidados dentários e os possíveis
tica médica desde 1949. A absorção
focos de infecção. A remoção de
da fenilbutazona se faz e m cerca de
focos, entretanto, não altera direta-
2 horas quando administrada por via
mente a evolução da artrite reuma-
oral e e m cerca de 8 horas quando
tóide; por isso, o afastamento de
por via intramuscular. As concen-
dentes, amígdalas, apêndice, vesícula,
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trações sangüíneas se estabilizam aparecem prurido e lesões cutâneas


rapidamente n u m platô, cujo nível que impõem a suspensão do medi-
não se consegue aumentar conside- camento. A anemia progressiva que
ravelmente por meio de doses adi- se pode verificar é devida, e m parte,
cionais. A observação tem mostra- à hidremia e pode assumir graus
do que, no adulto, a dose diária de acentuados como refere Boots. De
fenilbutazona capaz de proporcionar 1954 a 1955, tivemos ocasião de ob-
a concentração máxima oscila e m servar, no Ambulatório, 16 pacien-
torno de 400 e 600 mg. Além desse tes que foram tratados com u m a sé-
limite, o aumento da dose diária ex- rie de 15 injeções de Irgapirin, apli-
põe mais o paciente a fenômenos tó- cadas por via intramuscular e m dias
xicos e não proporciona aumento alternados e não encontramos indí-
apreciável do efeito terapêutico. A cios clínicos ou laboratoriais de de-
excreção diária é de 15 a 2 5 % da pressão hemopoiética. H á , entretan-
dose administrada; assim sendo, a to, na literatura, referência a casos
fenilbutazona só desaparece comple- de leucopenia, trombocitopenia e
tamente da circulação cerca de 10 m e s m o agranulocitose, pelo empre-
dias após a suspensão de seu uso. go da fenilbutazona; esses casos res-
A desintegração no organismo é rá- ponderiam b e m a transfusões de
pida e m cães, coelhos e ratos e len- sangue ou a períodos curtos de ad-
ta no homem, sendo pouco conheci- ministração de A C T H . M e s m o nos
da a sua natureza íntima. Parece casos e m que exerce ação analgé-
que o fígado exerce papel predomi- sica intensa, parece ter efeito anti-
nante por ser o local onde se pro- reumático muito pouco nítido, e m
cessa a conjugação do radical fenil virtude de não diminuir apreciàvel-
e a transformação da pirazolona e m mente o grau de inflamação. A fe-
ácido glutâmico, que depois se trans- nilbutazona está sendo exaustiva-
forma e m glutamina. A fenilbutazo- mente estudada e m muitos centros
na diminui temporariamente a diu- de pesquisa e dentro de alguns anos
rese, provavelmente por reabsorção será b e m conhecido o seu real valor.
tubular aumentada; ao m e s m o tem- Até o presente momento sabe-se não
po produz retenção dos íons sódio ser "droga maravilhosa" embora se-
e cloro, não se alterando a excreção ja arma terapêutica utilíssima.
do potássio. Desses fatos decorre a
As conclusões a que se pode che-
retenção hídrica, notada pelo aumen-
gar até o presente momento, e m re-
to de peso logo a partir dos primei-
lação à fenilbutazona, são as seguin-
ros dias de tratamento. Suspensa a
tes: 1) tem efeito analgésico bem
droga, há tendência para o reequi-
evidente; 2) tem praticamente a
líbrio hídrico. A retenção de sódio
m e s m a eficiência quando usada só
é mais evidente e m pacientes acima
ou e m associação com o piramido;
dos 60 anos, e m casos de insuficiên-
3) tem efeitos tóxicos e m certa pro-
cia renal e e m casos de descompen-
porção de casos que, a nosso ver,
sação cardíaca limítrofe.
não é muito grande e pode ser di-
Com certa freqüência se verifica minuída ainda mais quando usada
o aparecimento de náuseas e des- com os devidos cuidados; 4) é tão
conforto abdominal, m e s m o usando eficiente que se justifica o seu em-
drágeas entéricas; a via intramus- prego na artrite reumatóide antes de
cular retarda, e m parte, o apareci-
se recorrer aos glicocorticóides ou ao
mento desses sintomas. Às vezes ACTH.
Artrite reumatóide 99

Os produtos comerciais disponí- alguns tuberculosos tratados com ouro


e também e m algumas semelhanças clí-
veis entre nós são: Butazona (am-
nicas entre a artrite reumatóide e a tu-
polas para via intramuscular de 500 berculose. N a última década têm sido
mg, drágeas de 200 m g , supositórios- realizadas inúmeras investigações na
de 250 m g ) ; Butazolidina (ampolas Europa e na América e todas chegam
à conclusão favorável ao uso dos sais
para via intramuscular de 600 m g , de ouço na artrite reumatóide, embora
drágeas de 200 m g , supositórios de com algumas restrições.
250 m g ) ; Irgapirin (ampolas para
via intramuscular com fenilbutazo- Depois desses estudos, pôde-se ti-
na 750 m g e piramido 750 m g , drá- rar muitas conclusões que permitem
geas com fenilbutazona 125 m g e o uso mais sensato dos compostos
piramido 125 m g , supositórios com de ouro na artrite reumatóide. Os
fenilbutazona 250 m g e piramido 250 vários sais que entram na composi-
mg). ção dos produtos comerciais são or-
gânicos ou inorgânicos, hidrossolú-
Os glicocorticóides e a corticotro-
veis ou insolúveis. Cada u m deles
pina constituirão objeto de estudo
tem riqueza própria e m ouro metá-
especial e por isso não serão 'expla-
lico e ação terapêutica proporcio-
nados aqui.
nal. Para. que se possa fazer estudo
Apesar do advento dos hormônios comparativo do valor terapêutico dos
mencionados que, segundo se de- diferentes sais empregados, deve-se
preendia das primeiras observações conhecer seu teor e m ouro metáli-
publicadas e m 1949, iriam dominar co; o tiossulfato de ouro e sódio,
por completo o campo da terapêu- por exemplo, tem 3 7 % de ouro me-
tica medicamentosa das doenças reu- tálico, enquanto a aurotioglicose tem
máticas, os sais de ouro ainda têm 50%.
o seu lugar garantido no arsenal te- Fizeram-se dosagens de ouro no
rapêutico da artrite reumatóide por- plasma, na urina e nas fezes, por
que, e m muitos casos, a crisoterapia longos períodos, durante e depois
proporciona resultados dignos de es- de injeções semanais dos diferentes
tudo apurado. compostos de ouro. N ã o se sabe,
ainda, e m que estado químico o ouro
Em 1890, Koch relatou que o cianu- é eliminado nas fezes e na urina; no
reto áurico é capaz de inibir o cresci- sangue, encontra-se no' plasma sob
mento do bacilo da tuberculose in vitro.
a forma de complexo químico ouro-
Subseqüentemente, foram preparados e
estudados sais orgânicos e inorgânicos, proteína, existindo e m traços insig-
com capacidade para inibir o cresci- nificantes nas células sangüíneas.
mento de bactérias. E m 1924, Mollgard Injetado na forma de solução aquo-
relatou seus estudos experimentais e ex- sa é excretado predominantemente
periências clínicas com o uso da criso-
terapia na tuberculose. Este fato esti- na urina. O ouro se acumula no or-
mulou estudos clínicos com preparados ganismo, pois, m e s m o vários meses
à base de ouro no tratamento de certas depois de suspenso o tratamento ain-
afecções de pele que se pensava esta- da aparece no sangue e é excretado
rem relacionadas com a tuberculose
(psoríase, eczema e lúpus eritematoso). na urina. O organismo retém cerca
O primeiro estudo sobre a ação do ouro de 7 5 % da dose injetada semanal-
na artrite reumatóide foi realizado por mente.
Lande, e m 14 pacientes, e m 1927. E m
1929, Forestier achou razoável o empre- Desde que a excreção e ouro não
go da crisoterapia na artrite reumatói- aumenta significativamente depois
de baseado no fenômeno observado por que são empregadas doses consecu-
Koch e m 1890, nas melhoras obtidas por
Revista de Medicina
100

tivas, o grau de retenção durante minuir ou inibir a atividade da doen-


o tratamento pode ser avaliado. De- ça e suprimir as alterações inflama-
pois de suspenso o tratamento, o tórias. E m estudos realizados sepa-
ouro é encontrado no sangue e ex- radamente por vários autores, nos
cretado por longos períodos de tem- Estados Unidos da América do Nor-
po, cuja duração é função da dose te, n u m total de 6.467 casos, desde
semanal administrada. D e modo ge- 1935 até 1949, verificou-se que a
ral, quanto maior fôr a dose sema- grande maioria dos pacientes obte-
nal, maior será o tempo de excre- ve melhoras com a crisoterapia; cer-
ção. Dessa forma, é interessante ca de 3 0 % dos casos apresentaram
usar doses úteis, as menores possí- manifestações tóxicas, se b e m que
veis, para que seja abreviado o tem- apenas 4,5% foram de gravidade que
po de retenção e conseqüentemente exigisse a interrupção do tratamen-
os perigos de crisotoxicose, embora to. E m cerca de 2 5 % de todos os
assim se possa diminuir e m parte a casos houve remissão durante espa-
eficiência terapêutica. As suspen- ços de tempo variáveis. É necessá-
sões oleosas são absorvidas mais len- rio salientar que os critérios de ava-
tamente e produzem concentrações liação de resultados e os métodos
variáveis e discretamente menores empregados por esses autores não
de ouro plasmático do que as obti- foram uniformes.
das com soluções aquosas de sais de O ouro é útil quando usado em
ouro; os efeitos menos consistentes pacientes com sinovite ativa, pois
decorrem do retardo na absorção. sua ação se faz no sentido de dimi-
Ainda se desconhece o mecanismo nuir a atividade inflamatória. As-
de ação do ouro no processo reuma- sim sendo, não se emprega o ouro
tóide. Entretanto, não parece pro- com o intuito de modificar o estado
vável que o seu efeito na artrite reu- de articulações deformadas ou anci-
matóide se relacione com as suas losadas. Quando o paciente já se
propriedades bacteriostática e bac- encontra nesta fase da doença, o ou-
tericida, u m a vez que ainda não foi ro pode ser empregado com a fina-
demonstrado que a artrite reumatói- lidade de inibir a atividade inflama-
de seja doença infecciosa. O encon- tória e, conseqüentemente, prevenir
tro de partículas de ouro coloidal comprometimento de articulações
fagocitadas por células do sistema ainda não lesadas. Diante de inati-
retículo-endotelial suscitou a teoria vidade inflamatória b e m comprova-
de que o ouro exerce ação estimu- da, não se deve empregar sais de
lante sobre o referido sistema. Ad- ouro. A maior indicação da criso-
mitem outros autores que os efeitos terapia reside nas fases ativas ini-
anti-reumáticos do ouro decorrem ciais da artrite reumatóide perifé-
de suas propriedades diuréticas, de rica, sem deformidades n e m ancilo-
seus efeitos tóxicos, ou de sua ação ses articulares.
estimulante sobre o córtex supra-
renal. Entretanto, nenhuma destas O paciente que se vai submeter
teorias está substancialmente pro- à crisoterapia deve ser informado
vada. da longa duração do tratamento, da
regularidade a ser mantida e da ne-
A observação tem mostrado que cessidade de exames laboratoriais pe-
os únicos benefícios que os sais de
riódicos. Nunca se deve lançar m ã o
ouro podem proporcionar no trata-
da crisoterapia pela simples presun-
mento da artrite reumatóide são di-
ção da artrite reumatóide.
Artrite reumatóide 101

N a artrite reumatóide juvenil e tivas. C o m o a dermatite, estas le-


na artrite reumatóide psoriática, a sões podem tornar-se crônicas e mui-
crisoterapia tem as mesmas indica- to desagradáveis. D e modo geral,
ções e limitações relacionadas à ar- melhoram lentamente depois da sus-
trite reumatóide. N a espondilite an- pensão da crisoterapia.
cilosante os efeitos do ouro são de-
As lesões de outros segmentos do
sanimadores e parece haver maior
aparelho digestivo são muito raras.
freqüência de sintomas tóxicos; por T ê m sido descritos alguns casos de
isso, nesta eventualidade, deve dar- nefrite tóxica com albuminúria, he-
-se preferência a outras formas de matúria e hipertensão. São raras as
tratamento (roentgenterapia, glico- discrasias sangüíneas, mas quando
corticóides, corticotrofina, fenilbuta- ocorrem são graves e quase sempre
zona). fatais.
O maior problema e m relação à E m geral, depois das primeiras
crisoterapia é o da toxicidade poten- injeções observa-se aumento de in-
cial do ouro. Vários órgãos e siste- tensidade das dores articulares, que
mas são atingidos, no h o m e m ; as diminuem depois de algumas inje-
manifestações cutâneas são as mais ções.
comuns. N a maioria dos casos, a A percentagem de incidência de
primeira manifestação cutânea é o intoxicação é muito variável segun-
prurido, que pode ser discreto ou in- do os vários autores; entretanto, e m
tenso, localizado ou generalizado. 6.467 casos observados e m parcelas,
E m geral, o prurido se faz sentir por vários autores, desde 1935 até
nos locais que futuramente serão se- 1948, a média de casos tóxicos foi
de de lesões cutâneas, as quais va- de 37,1%. Neste número incluem-se
riam desde o simples eritema até os casos cujas manifestações eram
a dermatite esfoliativa, que é a mais tão discretas que não exigiram a
grave. D e m o d o geral, manifestações suspensão do tratamento. Observan-
tóxicas só aparecem depois de de- do várias publicações recentes, a in-
corridas algumas semanas de trata- cidência de intoxicação grave ocor-
mento. Qualquer erupção cutânea reu e m 4,5%.
que surja durante a crisoterapia, A mortalidade se reduziu de 3 %
principalmente se fôr erupção pru- e m 1935 para 0,4%, atualmente; isso
riginosa, deve ser b e m interpretada se conseguiu através do emprego de
antes que se continue o tratamento menores doses individuais de sais de
que, quando suspenso, só deve ser ouro, do aperfeiçoamento de alguns
reiniciado depois de desaparecidos compostos áuricos, do melhor conhe-
todos os sintomas tóxicos e m e s m o cimento do metabolismo do ouro e
assim e m caráter prudentemente da resposta clínica ao ouro e do me-
progressivo. lhor tratamento da intoxicação.
Muitas vezes, junto com a derma- C o m o objetivo de reduzir a per-
tite, aparece estomatite; esta pode centagem de fenômenos tóxicos, de-
surgir, entretanto, sem a erupção ve-se tomar as seguintes precauções:
cutânea e pode ser precedida de a) injeção aplicada semanalmente
gosto metálico. A s lesões inflama- pelo próprio médico, que interrogará
tórias mucosas podem ulcerar-se e, o paciente quanto a prurido, gosto
portanto, transformar-se e m glossi- metálico, náuseas, vômitos, diarréia,
te, estomatite ou gengivite ulcera- erupção cutânea; b) exames do se-
102 Revista de Medicina

dimento urinário e pesquisas de pro- lado, pode proceder-se a u m a pausa


teínas na urina, cada 7 dias ou, no de 2 a 3 meses, para garantir a eli-
máximo, cada 14 dias, principalmen- minação da droga acumulada e ins-
te nas fases iniciais do tratamento; tituir nova série igual à primeira.
c) hemograma completo cada 14 A escolha entre o método contínuo
dias; o ideal será fazer hemograma e o intermitente fica na dependên-
antes de cada injeção. cia das circunstâncias peculiares a
Nos casos e m que tenha sido ne- cada caso. É de se notar, entretan-
cessária a suspensão do tratamento, to, que o uso de pequenas doses quin-
este só deve ser reiniciado depois zenais e até mensais costuma pro-
de desaparecidos completamente os porcionar resultados práticos satis-
fenômenos tóxicos e somente sob vi- fatórios.
gilância absoluta; ao mínimo sinal
de intoxicação, o ouro deverá ser Tratamento ortopédico — Em ne-
novamente suspenso; diante de in- n h u m a doença do grupo reumático
toxicações graves a suspensão deve se faz tão necessária a prevenção
ser definitiva. de deformidades, que muitas vezes
resultam de negligência e e m geral
Existem vários esquemas de tra-
são melhoradas e m e s m o evitadas
tamento e todos eles aproximada-
pelo uso de goteiras. Se a ancilose
mente se eqüivalem. E m nosso meio
representa o resultado final mais in-
há dois produtos comerciais dispo-
desejável nas articulações compro-
níveis: u m é o Solganal B oleoso
metidas, é preferível que se processe
(Schering), que é sal hidrossolúvel
e m posição funcional, diferente para
(aurotioglicose), e m cuja molécula
cada articulação. Quando já existi-
há 5 0 % de ouro metálico e é apre-
rem anciloses e m posições viciosas,
sentado e m suspensão oleosa para
injeções intramusculares; o outro é há indicação para cirurgia ortopé-
a Crisalbine (Rhodia), também sal dica, que só deverá ser realizada em
fase inativa da doença.
hidrossolúvel (tiossulfato de ouro e
sódio) com 3 7 % de ouro metálico
Fisioterapia — É coadjuvante de
e apresentado e m cristais para se-
grande valor no tratamento da ar-
rem dissolvidos e m soro fisiológico
trite reumatóide e se destina prin-
imediatamente antes da injeção, que
cipalmente a aliviar a dor, propor-
pode ser intramuscular ou intrave-
nosa. cionar limites amplos de movimen-
tação articular e manter a força
Nos pacientes de ambulatório te-
muscular. O calor é o agente fisio-
mos empregado, com maior freqüên-
terápico mais freqüentemente usa-
cia, Crisalbine por via intramuscu-
do. A terapêutica ocupacional tem
lar. São vários os esquemas de tra-
grande valor no sentido de desper-
tamento que se podem seguir. Por
tar o interesse do paciente e m exer-
exemplo, injeções semanais de 20 a
citar as articulações e músculos em
50 mg, excepcionalmente até 100
geral e especialmente comprometi-
mg, repetidas até a dose total de
dos.
750 m g a 1 g. Completada esta sé-
rie, pode prosseguir-se por muito
Roentgenterapia — Utiliza-se de
tempo com injeções semanais, quin-
preferência nos casos de espondilite
zenais ou mensais de 20, 50 ou, ex-
reumatóide e de artrite reumatóide
cepcionalmente, 100 mg; por outro
periférica m o n o ou pauciarticular.
Artrite reumatóide 103

Reabilitação — Consiste e m orien- special reference to disorders of the


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