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AULA 5

NEUROCIÊNCIA DAS EMOÇÕES

Profª Adiele M. S. Corso


CONVERSA INICIAL

Durante muito tempo a presença de psicopatologia infantil tem sido


negada pelas pessoas em geral e até por alguns estudiosos.
Algumas crenças disfuncionais entendem a infância como um período
repleto de descobertas, e a motivação gerada por estas não daria espaço para
as doenças de ordem emocional. O fato de estar motivado para descobrir algo
ou ter energia de sobra para explorar o mundo não é sinônimo de que
internamente as coisas estejam bem com a criança ou adolescente. Uma criança
com um nível elevado de stress, por exemplo, pode diminuir sua motivação pelo
novo. No terreno das neurociências, esse bloqueio emocional gerado pelo stress
infantil pode ser capaz de inibir sinapses ou mesmo de os neurônios sofrerem
uma poda neuronal.
Como já visto em aulas anteriores, uma condição emocional negativa em
crianças pode gerar dificuldades de aprendizagem.
Outra crença bastante comum é a de que a infância é uma fase da vida
com menos responsabilidades e, assim, com menos patologias de ordem
emocional. É importante compreender que a psicopatologia não é condição
exclusiva de pessoas com acúmulo de responsabilidades, mas se deve a uma
série de fatores envolvendo predisposição genética, meio ambiente, família e
características de personalidade.
Para quem trabalha com crianças e adolescentes, é fundamental ter
conhecimento acerca das psicopatologias que podem ocorrer nesse período, no
intuito de entender melhor o mundo da criança, para assim poder desenvolver
estratégias de ensino mais eficazes e também de perceber o momento de
conversar com os pais, no sentido de orientá-los a buscar tratamento
especializado, com psicólogo, psiquiatra infantil e/ou neuropediatra. A escola,
nos casos em que os pais não conseguem perceber sozinhos o momento de
buscar ajuda, pode encaminhá-los a esses serviços de auxílio à criança.
Tendo esse conhecimento maior acerca das psicopatologias da infância e
adolescência, a escola cumpre ainda melhor com o seu papel no auxílio ao
desenvolvimento pleno deste ser em formação, tendo mais ferramentas de
observação do comportamento do aluno, realizando condutas mais assertivas e
orientações mais eficazes.

02
CONTEXTUALIZANDO

O estudo das neurociências aplicada ao desenvolvimento emocional


infantil, no intuito de compreender as relações entre o cérebro e o
desenvolvimento emocional na infância, constitui um vasto campo de pesquisa
clínica e teórica. Qual é a importância de se estudar o cérebro infantil e o
desenvolvimento emocional da criança?
O refinamento da avaliação neuropsicológica e o avanço das técnicas de
neuroimagem permitiram um grande avanço no conhecimento da relação entre o
cérebro e as funções mentais.
Dentro dos exames de neuroimagens atuais, visando à possibilidade de
obtenção de imagens funcionais do cérebro, há:

 Tomografia computadorizada;
 Ressonância magnética;
 Ressonância magnética funcional (para a qual é realizada estimulação
cerebral em tempo real para avaliar quais áreas estão sendo ativadas);
 Tomografia por emissão de pósitrons (PET);
 Tomografia por emissão de fóton único (SPECT);
 Outros.

Dentre os transtornos psiquiátricos na infância, o mais conhecido é o


TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), seguido do TOD
(transtorno desafiador opositor) e o transtorno de conduta.
Os transtornos depressivos e de ansiedade também podem começar na
infância, ao contrário do que muitos acreditam.
No entanto, os transtornos psicóticos, como o transtorno delirante e a
esquizofrenia, são bastante raros na infância, e o início da manifestação de seus
sintomas se dá no final da adolescência e início da vida adulta.
O fator genético tem sido bastante utilizado em muitos estudos dos
transtornos mentais ou psiquiátricos. Em contrapartida, ainda não se sabe quais
genes estão envolvidos na transmissão destes traços.
É importante salientar que esses transtornos apresentam componentes
genéticos, neuropsicológicos, comportamentais e ambientais, no entanto, por
uma questão de ordem didática e fiel ao tema da disciplina, a ênfase será dada
nos aspectos neuropsicológicos e neurobiológicos.

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TEMA 1 – TRANSTORNO DESAFIADOR OPOSITOR

O transtorno desafiador opositor encontra-se dentro dos transtornos de


conduta. De acordo com o CID-10, ele se manifesta em crianças jovens e
caracteriza-se por um comportamento provocador, perturbador e desobediente.
Não é acompanhado por comportamentos que envolvam delitos ou condutas
agressivas ou dissociais graves. Conforme o Manual diagnóstico e estatístico de
transtornos mentais (DSM-V), está dentro dos transtornos disruptivos, do
controle de impulsos e da conduta. Dentro da classificação internacional para
doenças mentais (CID-10), apresenta CID F91.3.
O início de sua manifestação ocorre antes dos 8 anos de idade e, se não
tratado, poderá piorar muito na adolescência.
A prevalência é entre 2 a 16% das crianças em idade escolar e mostra-se
mais comum nos meninos que nas meninas.
Entre os 2 a 3 anos de idade, por falta de maturação das funções
cerebrais e também comportamentais, é comum a criança apresentar
comportamento agressivo, por ainda não conseguir modular suas emoções e
não desenvolver estratégias efetivas de controle. Assim, o controle nessa fase é
externo, por meio das figuras parentais e da escola. No caso do transtorno
desafiador opositor, após essa fase os sintomas ainda persistem e tendem a
piorar, apresentando características como uma teimosia exagerada,
desobediência e extrema hostilidade, negativismo, resistência em cumprir regras
e combinados, além de incomodar as demais pessoas deliberadamente.

Saiba mais
O transtorno de conduta (TC) define-se por violações mais sérias como
roubo, agressividade e crueldade com as demais pessoas e animais.

Cerca de 50% das crianças diagnosticadas com TDAH (transtorno de


déficit de atenção e hiperatividade) apresentam TOD (transtorno desafiador
opositor), enquanto comorbidade (patologia secundária associada a uma
patologia principal) do TDAH (Sadock; Sadock; Ruiz, 2016).
Conforme Parra e Muñoz (2012), existem diferenças entre o
comportamento delinquente e o comportamento agressivo, descritos no quadro a
seguir.

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Quadro 1 – Diferença entre comportamento delinquente e agressivo

Comportamento delinquente Comportamento agressivo


 Não parece sentir-se culpado depois de  Discute muito
se comportar mal  É metido, arrogante
 Junta-se a crianças/jovens que se  É agressivo, cruel ou mau com os outros
metem em problemas  Destrói suas próprias coisas
 Diz mentiras ou engana  Destrói as coisas de seus familiares e/ou
 Foge de casa amigos
 Rouba fora de casa  Desobedece em casa
 Diz grosserias, usa imagens obscenas  Exige muita atenção
 Prefere estar com crianças/jovens mais  Fica enciumado facilmente
velhos  Desobedece na escola
 Falta à escola sem motivos  Briga muito
 Pensa muito em temas sexuais  Gosta de chamar atenção ou de ser
 Toma álcool ou consome drogas engraçado
 Comete atos de vandalismo  Obstinado, mal-humorado, irritado
 Súbitas mudanças de humor ou de
sentimentos
 Fala muito
 Debocha muito dos outros
 Faz birra ou tem mau gênio
 Ameaça os outros
 Mais barulhento que o comum
Fonte: Parra; Muñoz (2012).

O que o autor acima chama de comportamentos delinquentes seriam


aqueles dentro do transtorno de conduta e os comportamentos agressivos que
podem fazer parte do transtorno desafiador opositor. A principal mudança seria a
severidade dos sintomas que ocorrem no transtorno de conduta, bem como os
comportamentos de impulsividade do transtorno desafiador opositor.
No que tange aos aspectos biológicos, seriam aqueles relacionados a
uma possível herança genética, ou seja, a criança herda dos pais
comportamentos impulsivos, baixo limiar à frustração, irritabilidade e disfunções
em neurotransmissores serotoninérgicos e dopaminérgicos.
Em relação aos hormônios e à neurotransmissão, crianças com TOD
apresentam níveis mais baixos de frequências cardíacas, de índices medianos
de cortisol (hormônio relacionado ao estresse) e de hipoativação do sistema
nervoso autônomo, o que tem sido demonstrado em pacientes com TOD.
Estudos demonstraram que o receptor serotoninérgico pós-sináptico de crianças
com TOD poderia ser hipersensível.

Serotonina: neurotransmissor excitatório do sistema nervoso central.

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Estudos sugerem que no TOD exista algum tipo de disfunção na
amígdala, uma das estruturas que faz parte do sistema límbico, em dois
processos complementares. O primeiro deles seria a informação sensorial
presente que faz referência a uma experiência passada, reatualizando as
experiências passadas. Um exemplo seria quando uma criança pequena grita e
bate nos colegas e, em seguida, sua raiva diminui, no entanto quando ela revive
a mesma experiência, essa se transforma em intensa cólera e, por não saber
como controlar (função da amígdala), a criança exibe novamente o
comportamento agressivo. O segundo seriam os registros que o cérebro tem das
consequências das experiências anteriores e, dessa forma, são capazes de
modelar as motivações das ações que estarão por vir em experiências futuras.

TEMA 2 – DEPRESSAO NA INFÂNCIA

Durante muito tempo negou-se a possibilidade de crianças e


adolescentes sofrerem de quadros depressivos. Ao contrário, esse período era
interpretado romanticamente como um estágio de grandes descobertas, alegrias
e encantamentos.
Estudos epidemiológicos apontam para fatos como a depressão e até
mesmo ideações e tentativas de suicídio, que são mais comuns do que se pode
imaginar.
O mito gerado pelo desejo adulto de que as preocupações infantis são
sempre passageiras e amenas, ou que crianças não apresentam sentimento de
culpa intensos por carecerem de responsabilidades importantes é uma grande
armadilha.
Ao contrário, o transtorno depressivo maior é uma das patologias mais
estudadas em várias ciências. Conforme o Manual diagnóstico e estatístico de
transtornos mentais (DSM-V), encontra-se dentro dos transtornos depressivos,
representado pelo CID F32.

Estatisticamente falando, cerca de 0,3 a 5,9% da população geral de


crianças e adolescentes apresentam esta patologia. Assim também se
observou um número de 6,4% de distimia (a chamada depressão leve).
Na adolescência aparece como um sério problema de saúde pública,
com prevalência, na população norte-americana, de 3 a 5% e taxas
para todo o período (até os 18 anos) na faixa de 20% (Birmaher et al.,
1996; Lewinsohn; Clarke; Rohde, 1994).

Em relação ao gênero, existe uma taxa mais elevada em meninas, entre


12 e 15 anos, e essa se mantém quando adultas.

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É considerado raro uma “depressão pura”, e são vários os trabalhos
buscando identificar psicopatologias associadas. O diagnóstico mais comum é o
de ansiedade, oposicionismo, hiperatividade, agressividade e os relacionados a
substâncias psicoativas (álcool e outras drogas).
A depressão encontra-se dentro dos transtornos do humor, sendo na
infância caracterizada por estado de humor irritável ou disfórico, prejuízo no
desempenho escolar, ansiedade de separação, hiperatividade, comportamento
antissocial, alteração no sono e apetite, choro fácil, afirmações negativas sobre
si própria, autoagressividade, queixas somáticas, socialização diminuída, perda
da energia habitual, sendo estes seus principais sintomas.
A etiologia (causa) é multifatorial, e todas as diretrizes de tratamento
apontam para a necessidade de cuidados precoces nos casos de depressão.
Caso contrário, ela persistirá na fase adulta, podendo levar ao desenvolvimento
de outras patologias associadas e aumento de possibilidades de tentativas de
suicídio.
Estudos apontam para a associação de abordagem psicofarmacológica e
psicoterapia. A tendência atual é aplicar programas de amplo espectro que
incluam componentes comportamentais (atividades agradáveis, habilidades
sociais, relaxamento), cognitivos (reestruturação cognitiva, reatribuição, solução
de problemas) e de autocontrole.
Torna-se fundamental uma sólida formação em desenvolvimento humano,
a fim de discriminar os processos normais dos patológicos, conforme a etapa do
desenvolvimento.
É importante que não seja esquecido o dado de pesquisas experimentais,
as quais apontam que a depressão bem diagnosticada e com total remissão na
infância diminui os riscos de episódios mais severos na vida adulta.
Conforme visão das neurociências das emoções, a depressão infantil é
vista como um mau funcionamento cerebral, ao contrário de uma visão de má
vontade psíquica ou até mesmo de uma distorção das crenças a respeito das
coisas boas que a vida tem a oferecer. O local onde deve ocorrer a ação
terapêutica é no sistema límbico, sendo o principal sistema do cérebro que cuida
das emoções.
O efeito esperado em uma abordagem baseada nas neurociências seria o
aumento de neurotransmissores na fenda sináptica a nível funcional, assim
como a alteração da sensibilidade e número de neurorreceptores. Assim, o local

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de ação da depressão seria nos sistemas serotoninérgico, dopaminérgico e
noradrenérgico do sistema límbico.
No tratamento da depressão, o efeito esperado seria em relação à função,
sensibilidade e ao aumento de neurotransmissores, sendo os principais a
serotonina, dopamina e noradrenalina.

TEMA 3 – TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO

Muitos pais percebem certas características disfuncionais no


desenvolvimento de seus filhos, como desobediência, dificuldade em obedecer a
regras, seja em casa, na escola e na comunidade, impulsividade, agressividade
e baixa tolerância à frustração. Caso sejam passageiros e/ou em contextos
isolados, provavelmente estarão dentro da normalidade.
Todavia, se tais sintomas estiverem em conjunto e forem persistentes,
prejudicando a vida diária da criança, no relacionamento familiar e escolar, é
hora de procurar ajuda terapêutica especializada.
O TDAH (como é chamado o transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade) caracteriza-se por sintomas marcantes de desatenção,
hiperatividade e impulsividade, além de um quadro clínico bastante heterogêneo.
De acordo com o DSM-V, encontra-se dentro dos transtornos do
neurodesenvolvimento e existem três subtipos: apresentação combinada (com
sintomas de hiperatividade e desatenção, representado pelo CID F90.2),
apresentação predominantemente desatenta (CID F90.0) e apresentação
predominantemente hiperativa/impulsiva (CID F90.1).
Caso não seja tratado persistirá na vida adulta, resultando em prejuízos
na qualidade de vida do indivíduo e de toda a sua família.
Alguns estudos sugerem que crianças com TDAH, se não tratadas,
apresentam maior índice de repetência, suspensões e expulsões de escolas,
além de um rendimento inferior se comparado a outras crianças. Assim como
adultos com TDAH cometem mais infrações e acidentes de trânsito, têm vida
sexual precoce, maior número de parceiros e menor proteção durante a
atividade sexual, maior risco de gravidez não planejada e também de doenças
sexualmente transmissíveis. Também se observa maior taxa de demissões,
absenteísmo, redução da eficiência no trabalho e maior número de acidentes.
Sadock. Sadock e Ruiz (2016).

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Quanto mais precoce o diagnóstico e tratamento, maior o controle dos
sintomas e qualidade de vida oferecidos.
Acomete cerca de 5,29% das crianças em todo o mundo (Polanczyk;
Schmitz; Rohde, 2007) e é mais comum em meninos que nas meninas.
O objetivo de todas as modalidades de atendimento, aliado ao tratamento
medicamentoso, é melhorar na qualidade de vida e resolução de problemas,
oportunizando o desenvolvimento de crianças saudáveis e felizes, em diferentes
contextos.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (1993), o TDAH pode se
associar a outras morbidades (patologias associadas), como o transtorno
desafiador opositor, transtorno de conduta e distúrbios de aprendizado, além de
problemas emocionais em etapas subsequentes na vida.
Outro dado relevante é o alto componente genético encontrado dentro do
TDAH, envolvendo uma taxa de hereditariedade de 0,75 a 0,91. Estudos
genéticos apontam para os genes que são envolvidos na transmissão
dopaminérgica e, de acordo com Gill (1997) os circuitos dopaminérgicos fronto-
estriatal estão envolvidos na fisiopatologia do transtorno.
Pliszka (2008) mostra que:

É mais provável que o TDAH tenha natureza poligenética. Os


medicamentos estimulantes, como o metilfenidato (Ritalina, Metadate,
Concerta) ou a anfetamina (Adderall, Dexedrina), têm efeitos
pronunciados sobre os sistemas da catecolamina, norepinefrina (NE) e
dopamina(DA).

Analisando a fundo a base neuropsicológica da atenção, vários autores


da área dedicaram seus estudos para ela.
Luria (1981) revela que “a atenção tem caráter direcional e seletivo, o que
nos permite manter vigilância em relação ao que acontece ao nosso redor,
responder aos estímulos relevantes e inibir aqueles que não correspondem aos
nossos interesses, intenções ou tarefas imediatas”.
Lent (2008) mostra que “podemos prestar atenção em um processo
mental, como um cálculo matemático, uma lembrança ou outro pensamento
qualquer”.
A atenção pode ser classificada em diferentes categorias. Luria (1981)
diferencia as formas mais elementares das mais elaboradas. A primeira (também
chamada de involuntária) estaria presente nos primeiros anos de vida na criança
e é de origem biológica, atraída fortemente por estímulos externos. A segunda
(também chamada de voluntária) é construída socialmente, sendo um ato social
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desenvolvido pelas crianças já em idade escolar, requerendo certo grau de
maturação do sistema nervoso e relacionando-se à capacidade de responder a
instruções faladas, mesmo diante de estímulos distrativos.
Lent (2008) fala também em atenção sensorial, visual, espacial e
intelectual. A atenção sensorial é quando o processamento seletivo da
informação apresenta estreita relação com os sentidos. Na atenção visual, a
partir de uma visão, um objeto pode ser colocado no centro da análise.

A atenção espacial, tipo de atenção dentro da atenção visual,


determina quais regiões da cena são mais relevantes, "em que" e
“onde” deve-se focalizar a atenção visual. Na atenção intelectual, a
direção e a seletividade da atenção são empregadas no
processamento de pensamentos. (Lent, 2008)

Além do conceito e classificação, pesquisadores da área desenvolveram


estudos sobre a biologia do mecanismo da atenção.
Luria (1981) teorizou sobre as bases biológicas atencionais, estabelecendo que
seriam a formação reticular, a parte superior do tronco encefálico, o sistema límbico e a
região frontal. Conforme Luria (1981)

as estruturas da parte superior do tronco encefálico e a formação


reticular seriam as responsáveis pela manutenção do tono cortical de
vigília e manifestação da reação de alerta geral, enquanto o sistema
límbico (ele também chama de córtex límbico) e a região frontal
estariam relacionados ao reconhecimento seletivo de um determinado
estímulo, inibindo respostas a estímulos irrelevantes.

Com o advento dos exames de imagens, como a ressonância magnética


funcional, percebe-se com maior precisão as áreas cerebrais envolvidas no
TDAH, como os lobos frontais, os núcleos caudados e o cerebelo. No lobo
frontal, percebe-se pela dificuldade importante com a impulsividade e o
julgamento social. Em indivíduos normais, o lobo frontal direito é levemente
maior que o esquerdo e, em crianças com TDAH, os lobos frontais direitos são
ligeiramente menores. O lobo frontal direito está envolvido na função
comportamental de “retirada”, sendo mais ativo quando estímulos aversivos
estavam presentes, no entanto as pessoas com TDAH apresentam tendência de
se precipitarem e ignorarem possíveis consequências negativas. Os núcleos
caudados participam na iniciação do comportamento motor. Conforme Pliszka
(2008), diversos autores sugerem que crianças com TDAH tinham os núcleos
caudados direito e esquerdo menores. O cerebelo, relacionado ao equilíbrio
motor, também seria menor em crianças com TDAH.

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TEMA 4 – STRESS INFANTIL

Estudiosos destacam que experiências de stress severo ocorridos na


infância podem produzir resultados psicofisiológicos duradouros, podendo
persistir na vida adulta.
Conforme Lipp e Romano (1987),

o stress infantil assemelha-se ao do adulto em vários aspectos,


podendo gerar sérias consequências, no caso de ser excessivo. A
reação da criança frente a eventos excitantes, irritantes, felizes,
amedrontadores, ou seja, que exijam adaptação por parte dela, inclui
mudanças psicológicas, físicas e químicas no seu organismo.

A criança, quando exposta a um evento estressor, acaba entrando em


estado de alerta, ativando uma estrutura do sistema límbico denominada
hipotálamo, o qual ativa também o sistema nervoso simpático e a glândula
pituitária. Ao mesmo tempo, as glândulas suprarrenais liberam o
neurotransmissor adrenalina, tendo por objetivo reagir, fugindo do evento
estressor ou lutando contra ele. O stress gerado pode ser capaz de provocar
sintomas de mudança no padrão de sono e alimentar. O estresse é capaz de
prejudicar o desenvolvimento neurológico e funcionamento cerebral.
No cérebro, ocorre um aumento do cortisol (hormônio relacionado ao
stress), provocando atraso no desenvolvimento motor, cognitivo e social da
criança. O cortisol torna o hormônio mais vulnerável e como consequência
diminui as sinapses.
As principais reações ao stress na criança podem ser:

 Reações físicas: diarreia, dores abdominais, dor de cabeça, tique


nervoso, hiperatividade, náuseas, enurese noturna, bruxismo (ranger dos
dentes), tensão muscular, gagueira, dificuldade para respirar e perda ou
aumento do apetite.
 Reações psicológicas: choro excessivo, ansiedade, terror noturno,
dificuldades interpessoais, pesadelos, agressividade, insegurança,
angústia, depressão, hipersensibilidade, crises de birra, medo excessivo e
introversão súbita.

De forma categórica, o stress pode ser dividido em 4 fases:

1. Fase de alerta ou alarme: o indivíduo se depara com o estressor e se


prepara para a ação; é onde o córtex cerebral busca achar saídas e

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restabelecer a homeostase (equilíbrio interno). Caso o evento estressor
não seja eliminado, ele passa para a fase seguinte.
2. Fase de defesa ou resistência: o estressor continua e ocorre uma
hiperatividade córtico-supra-renal e como consequência maior gasto de
energia, as quais seriam necessárias para outras funções vitais. O
organismo não se recupera e permanece em estado de alerta, caso essa
condição persista levará à exaustão.
3. Fase quase-exaustão: a tensão excede o limite de controle e a resistência
física e emocional começam a se romper; em alguns momentos ainda
consegue manter o controle. O cortisol é produzido em maior quantidade,
destruindo as defesas imunológicas, dando início a doenças físicas e
psicológicas.
4. Fase de exaustão: é a reação mais negativa do stress, quando ocorre
maior desequilíbrio, ocorrendo um agravamento do desgaste do
organismo e dos sintomas, podendo ocorrer doenças graves e até fatais.

Com base no estudo das fases acima, torna-se fundamental entender


melhor o funcionamento e evolução do stress, para assim procurar auxílio
terapêutico especializado, como o de um psicólogo, psiquiatra e/ou neurologista
infantil no sentido de tratamento.

TEMA 5 – TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

Conforme o DSM-V, está inserido nos transtornos do


neurodesenvolvimento, sendo que o CID é F84.0.
Dentro das neurociências, o autismo poderia ser entendido como uma
dificuldade na aquisição e ativação dos neurônios espelho, ligados à imitação,
compreensão da intenção do outro, sendo um comportamento social ligado à
empatia e a habilidades sociais.
Pessoas com lesões no giro supramarginal possuem importante
dificuldade na compreensão de metáforas e na interpretação das ações dos
outros. Assim também pode se observar esses mesmos sintomas em pessoas
dentro do espectro autista, em que pesquisas futuras sobre a gênese do autismo
poderiam explicar se ocorre uma disfunção no giro supramarginal (estrutura
dentro do lobo parietal).
Pelo estudo dos neurônios espelho, cultura e biologia passam a estar
interligadas, e não separadas, como eram até então. Os neurônios espelho

012
absorvem diretamente a cultura e uma geração vai ensinando para as demais
por meio da observação, da imitação e do convívio social.
Essa atividade ocorre no córtex pré-motor (ligado ao movimento) e no
lobo parietal inferior e lobo da ínsula (ligados à percepção, capacidade de
compreender o sentimento do outro, entender a intenção e uso da linguagem).
Alguns cientistas consideram que a descoberta dos neurônios espelho
seja uma das mais importantes para as neurociências, acreditando que possam
ser fundamentais no comportamento de imitação e aquisição da linguagem.
Exames de neuroimagens mostram que indivíduos autistas possuem
volume cerebral maior (macrocefalia). Os lobos temporal, parietal e occipital são
maiores, podendo explicar a hipersensibilidade auditiva, sensorial e visual
comuns no autismo.
Outro ponto é que os lobos frontais são poucos ativados no autismo,
mostrando importante déficit nas funções executivas (ligadas ao planejamento,
controle, flexibilidade cognitiva, entre outras).
Retornando à questão da macrocefalia no autismo, o que se percebe é
um aumento da massa branca no córtex cerebral e não na massa cinzenta. Ou
seja, o cérebro é aumentado no autismo não pelo aumento do número de
neurônios, mas sim de uma parte deles, que não é a parte que realiza as
sinapses (ligações entre os neurônios).

Saiba mais
É importante lembrar que na massa branca encontram-se os axônios
revestidos de mielina, que contêm fibras nervosas mielinizadas. Na massa
cinzenta, corpos celulares (que contêm o núcleo da célula) e dendritos de
neurônios.

FINALIZANDO

A importância de se estudar o desenvolvimento do cérebro infantil e o


desenvolvimento emocional da criança é fundamental para quem trabalha com
educação. Entender o que está dentro do desenvolvimento normal é tão
importante quanto estudar o aparecimento das psicopatologias infantis.
A partir do momento em que existe um maior estudo e embasamento
teórico acerca da psicopatologia infantil, o olhar para a criança torna-se mais
intenso e profundo.

013
Quando o educador consegue compreender que determinadas
características não se devem apenas à falta de limites na criança, por exemplo,
ele abre um leque imenso de exploração e tentativa de entendimento do mundo
interno de seu aluno.
Ele sai do senso comum, quando é capaz de imaginar que determinadas
características emocionais, de comportamento ou de relacionamento
interpessoais podem sugerir algo maior.
A ideia não é de o professor ou outro profissional do âmbito educacional
assumir o papel de diagnóstico e tratamento, mas sim de ter maiores subsídios e
perceber o momento mais apropriado de encaminhar a um tratamento adequado
e, assim, também de facilitar o trabalho do profissional que receberá essa
criança ou adolescente em suas clínicas ou consultórios, dialogando com eles
no sentido de troca de saberes.
Como o educador é o profissional que passa o maior tempo com essa
criança, suas percepções, olhares e observações são de suma importância.
Saber o que observar na criança, como observar e quando encaminhar é
a proposta de estudo desta aula.
Dessa forma, o processo de ensino e aprendizagem sai ainda mais do
âmbito puramente acadêmico, realizando cada vez mais uma imersão em torno
do conhecimento acadêmico adquirido e unindo ao entendimento das emoções e
do impacto delas na vida do aluno.
O resultado provavelmente será a elaboração de propostas mais efetivas,
de maior alcance e abrangência na vida do aluno, tendo o educador como
mediador nesse processo em conjunto com todas as pessoas envolvidas na vida
da criança.

014
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