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Transtornos

Psiquiátricos da
Infância
1. Transtorno de Déficit de Atenção
/Hiperatividade (TDAH) 4
O que é o TDAH? 4
Qual é o Tratamento para o TDAH? 6
Um Diagnóstico 7
Crianças Desatentas, Hiperativas e Impulsivas 9
Podemos Prevenir o TDAH? 10

2. Transtornos Internalizantes 13
Transtornos Emocionais ou Internalizantes 13
Ansiedade 14
Ansiedade: Definição, Sintomatologia
e Epidemiologia 14
Transtornos de Ansiedade na Infância 17
Transtorno de Ansiedade de Separação 22
Diagnóstico 23
Causas e Origem 24
Tratamento 24
Conclusão 24

3. Transtornos Disruptivos ou Externalizantes 26


Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) 27
Transtorno Opositivo Desafiador (TOD) Ou (TDO) 30
Transtorno de Conduta (TC) 35

4. Fobia Simples ou Fobia Social 40

5. Depressão Infantil 50
Quadro Clinico 50

6. Referências Bibliográficas 55

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03
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

1. Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade


(TDAH)

Fonte: NeuroSaber1

T DAH é um distúrbio que afeta


de 3% a 5% das crianças em
idade escolar e sua prevalência é
rentes à impulsividade. Ele é feito
quando seis (ou mais) dos sintomas
enumerados persistiram por no mí-
maior entre os meninos. Dificulda- nimo seis meses, com evidente pre-
des para manter o foco nas ativida- juízo funcional.
des propostas e agitação motora ca- Esses sintomas devem se ma-
racterizam esse distúrbio. nifestar em pelo menos dois contex-
tos, no caso de crianças, os am-
O que é o TDAH? bientes doméstico e o escolar. Pode
predominar a desatenção ou a hipe-
O TDAH é um diagnóstico psi- ratividade, ou os quadros podem ser
quiátrico, baseado em respostas a mistos. Alguns dos sintomas já es-
itens que constam de um questioná- tariam presentes antes dos sete anos
rio do DSM, que descreve nove com- de idade e não se apresentariam ex-
portamentos ligados à falta de aten- clusivamente associados a outros
ção, seis à hiperatividade e três refe- transtornos mentais.

1 Retirado em https://neurosaber.com.br/

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

É quase impossível que ao nos Qual o risco de crianças com


depararmos com o questionário não “excesso normal de atividade” serem
nos identifiquemos como possíveis diagnosticadas e tratadas como por-
portadores do transtorno. No ma- tadoras de TDAH? Esse seria o ver-
nual há também vários itens acerca dadeiro risco a que as crianças estão
de prevalência, diagnóstico diferen- expostas? Há intolerância a frustra-
cial, evolução e outros. Algumas ção, baixa autoestima, racionaliza-
questões que se destacaram: ções para se lidar com os fracassos e
O transtorno é mais frequente as crianças podem ser alvo de rejei-
no sexo masculino. O fato de o trans- ção. “Pode haver histórico de abuso
torno ser mais comum em meninos ou negligência, múltiplos lares ado-
poderia sugerir algum tipo de heran- tivo. Isso sinaliza a importância dos
ça ligada ao sexo? Ou haveria fatores vínculos afetivos significativos para
psicológicos, culturais, sociais liga- o desenvolvimento infantil e tam-
dos ao masculino? A prevalência é bém, que os fatores emocionais de-
de 3-7% entre crianças em idade es- vem ser considerados no surgimento
colar e aumentou do DSM-III para o dos sintomas e na abordagem dos
IV devido a mudanças de critérios. mesmos.
Certamente a partir do DSM-V a Quanto ao rendimento intelec-
prevalência do TDAH aumentará tual, “em média o nível intelectual
ainda mais, o que será retomado avaliado por testes de QI é vários
adiante. pontos inferior em crianças com es-
Quanto à desatenção, o ma- se transtorno quando comparadas
nual refere que as pessoas “dão a im- com seus pares.”. Afirma também
pressão de estarem com a mente em que os sintomas de desatenção são
outro local” Chama a atenção para a mais comuns em crianças com baixo
importância de diferenciar a hipera- QI colocadas em contextos escolares
tividade do “excesso normal de ati- em desacordo com sua capacidade
vidade”. A impulsividade levaria a intelectual, mas também podem
criança a ter falas e comportamentos ocorrer em crianças muito inteligen-
inoportunos, fazer palhaçadas, e co- tes em ambientes escolares pouco
locar-se em situações de risco, po- estimulantes.
dendo sofrer acidentes. A aferição de inteligência por
Será que o fato de que as meio QI é algo questionável, princi-
crianças dispõem de uma mente e palmente quando considerado como
não apenas de um cérebro, realmen- dado isolado - e as falhas de inter-
te é levado em conta? pretação podem levar a resultados

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

desastrosos. A importância de se le- nos resta nada além de admitir que


var em conta a relação entre inteli- as relações, os contextos escolar e
gência, desatenção e contexto esco- familiar devem ser considerados?
lar é evidente. Mas será que real- No que diz respeito à evolução,
mente é atribuída à influência da es- os sintomas se atenuam à medida
cola o devido valor? que a criança amadurece. Embora
Os sinais do transtorno podem haja controvérsia a respeito disso
ser mínimos ou estar ausentes quan- evidentemente, à medida que a
do o indivíduo se encontra sob um mente se estruture e se fortaleça a
controle rígido, se encontra num condição de continência emocional é
ambiente novo, está envolvido em ampliada.
atividades especialmente interes-
santes, em uma situação a dois… Qual é o Tratamento para o
Aqui se destaca a importância do TDAH?
vínculo afetivo ajudando a focar a
Para a psiquiatria o TDAH é
atenção e os fatores afetivos que des-
uma afecção neurocomportamental,
pertam interesse contribuindo para
embora alguns tratados de psiquia-
isso.
tria infantil considerem a importân-
Não há exames clínicos labo-
cia de aspectos psicossociais intera-
ratoriais nem sinais ao exame físico
gindo com os genéticos.
que possam contribuir para que o
Após o diagnóstico, que como
diagnóstico seja estabelecido. Com
vimos é baseado na clínica, a criança
respeito a fatores genéticos as maio-
é encaminhada para tratamento.
res frequências de TDAH em paren-
Embora a proposta seja de uma
tes de primeiro grau de crianças com
abordagem múltipla, englobando
o transtorno atestaram (atesta-
intervenções psicossociais, nos âm-
riam?) a forte presença de fatores
bitos familiar e escolar e psicotera-
genéticos, mas as influências da es-
pia (geralmente a terapia cognitivo-
cola, da família e dos pares são con-
comportamental – TCC é a indicada
sideradas importantes na determi-
pelos psiquiatras), o tratamento far-
nação do grau de comprometimen-
macológico é priorizado, e o metilfe-
to. Ou seja, infelizmente o desenvol-
nidato é indicado como primeira
vimento científico ainda não deu
linha (antidepressivos seriam a se-
conta de provar que essas dificulda-
gunda), mas as anfetaminas tam-
des são fruto dos nossos genes e não
bém vêm sendo utilizadas.

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Um Diagnóstico falhas na continência emocional. O


sistema em que vivemos hoje pode
Ainda acerca do diagnóstico e ser mais um fator contribuindo para
etiologia: estudos recentes de neu- o aumento da ocorrência dos sinto-
roimagem e neurobiologia molecu- mas de desatenção e hiperatividade
lar demonstraram modificações no nas crianças.
volume cerebral e em estruturas do Não se trata de denegrir a ati-
SNC de crianças com TDAH e altera- vidade desempenhada pelo psiquia-
ções funcionais em alguns neuro- tra, mas sim de adotarmos uma pos-
transmissores, em especial os de do- tura crítica e reflexiva diante do pa-
pamina e noradrenalina. Tais alte- norama que temos à nossa frente.
rações dão força não apenas à etio- Outros programas que podem ser
logia genética, mas também à in- acessados pela WEB apresentam
fluência do ambiente; há trabalhos pontos de vista opostos, bem como,
mostrando como as experiências ini- a literatura disponível a respeito re-
ciais, as trocas afetivas “esculpem” o flete o mesmo padrão: o da diver-
sistema nervoso. gência. Isso contribui para gerar dú-
O metilfenidato é um estimu- vida e insegurança e expõe o fato de
lante do SNC e age aumentando o que as evidências científicas não são
nível de dopamina e noradrenalina tão conclusivas. Assim sendo, a ex-
nas fendas sinápticas. No Brasil os periência profissional de cada um e
medicamentos autorizados são a questões ideológicas irão nortear a
Ritalina e o Concerta, porém o Vy- visão a ser privilegiada.
vance, um composto à base de de- Assinala também que o pro-
xanfetamina já está disponível. Esse blema não residiria apenas nos cri-
mercado movimenta US$ 30 mi- térios adotados pelo DSM, mas no
lhões por ano só no Brasil! uso que pode ser feito deles, tanto
Estaríamos com o uso do por médicos “educados” pela indús-
metilfenidato tratando uma doença, tria farmacêutica, mas também pela
ou sintomas? população em geral, já que a indús-
Quais seriam as vantagens de tria farmacêutica pode postar infor-
seu uso? mações publicitárias na internet.
Quais os prejuízos? Nota-se também muitos pais
Evidentemente na história da se referindo aos próprios filhos co-
humanidade sempre existiram fato- mo “o meu Asperger”, “o meu DDA”
res ambientais que interagindo com etc. - é a nos forçando os pais a apa-
os constitucionais resultam em garem a subjetividade de seus filhos.

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Frances alerta que o DSM-V, solucionados no campo médico. O


em vias de elaboração, pode aumen- diagnóstico de TDAH é baseado em
tar a idade de ocorrência de 7 para 12 sintomas. Será que realmente pode-
anos e também diminuir de 6 para 3 mos equiparar sintomas a doenças?
o número de itens de ocorrência de Esse processo quando se dá, a pa-
sintomas da tabela para o TDAH, o tologização, fortalece a medicaliza-
que contribuiria ainda mais para o ção e dá margem a riscos, por exem-
aumento do número de diagnós- plo, de que questões escolares se
ticos. Uma das decorrências seria a transformem em um distúrbio na
ampliação do uso excessivo do meti- mente ou no corpo dos alunos, ou
lfenidato. Marcia Angell (2011), que que situações de vida que envolvem
foi editora da New England Journal perdas, sofrimento, sejam transfor-
of Medicine, publicou uma interes- madas em doenças. Essas autoras
sante matéria sobre a “Epidemia de analisam a fundo o problema e ques-
doença mental”. Destaca que há tra- tionam a existência do diagnóstico
balhos mostrando que as pesquisas de TDAH; este não passaria de um
que comparam o efeito da utilização construto que ganharia forças por
de medicações versus placebo, mui- interesses escusos, antiéticos, liga-
tas vezes não demonstram diferen- dos a mercado de trabalho, às pode-
ças significativas nos sintomas de rosas indústrias farmacêuticas, se-
melhora, que por vezes ocorreriam guros de saúde e outros.
ligados aos efeitos colaterais (tanto Okay (2012), também faz um
que há estudos feitos com «placebos alerta sobre os efeitos nocivos da
ativos»). Por sua vez, a associação, medicalização afetando as crianças,
ou a utilização de psicoterapias, ou especificamente no que tange ao
outros tratamentos voltados para as diagnóstico de TDAH. Chama a
influências ambientais poderiam, no atenção para o risco da medicaliza-
longo prazo, até resultarem mais ba- ção “silenciar” o que o sintoma da
ratos do que o tratamento medica- criança estaria expressando e para a
mentoso. desconsideração para com todo o
Moysés e Collares (2011) cha- processo de escolarização. Hoje a
mam a atenção para a medicaliza- “terceirização” é um fato. Na medici-
ção, a ampliação e extensão do po- na, se o desenvolvimento de especia-
der médico em que questões de ou- lidades contribuiu para o progresso
tra natureza, geralmente sociais, são científico, a perda da dimensão hu-
transformadas em problemas origi- mana e sua descontextualização é
nados e que, portanto, devem ser um golpe irreparável: as pessoas que

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

sofrem são fragmentadas, encaradas representações, do corporal ao psí-


como partes de seu corpo. Em psi- quico. Seus sintomas resultam de fa-
quiatria com o uso de questionários lhas nesse desenvolvimento primi-
e escalas o mesmo se dá. Nas escolas tivo. Ao entrarem em ansiedade,
muitas questões que caberiam aos desorganizam-se internamente, pois
pais e familiares, são a elas delega- o desenvolvimento simbólico preju-
das. Verifica-se cada vez mais como dicado resulta que fiquem aprisio-
são drenadas para as instituições de nadas no mundo sensorial. A ex-
saúde problemas escolares ou fami- pressividade corporal predominará
liares. sobre a capacidade de funcionamen-
O que observo é que esse diag- to psíquico – registros de linguagem
nóstico não traz benefícios à criança, corporais.
pois se encerra em si mesmo, dá a Suas percepções ocorrendo de
falsa impressão de que estamos en- forma anárquica, não permitem que
tendendo o que se passa com ela, foquem a atenção, ou, quando con-
tranquilizam pais e professores, seguem, isso se dá por um elo de
mantém a criança parcialmente interesse com a questão, ou pela pre-
atendida (por vezes desatendida), sença de alguém com um bom vín-
muitas vezes estigmatizada. É um culo afetivo com a criança, que pode
diagnóstico que privilegia os sinto- ajudá-la a concentrar-se, deter-se e
mas e não a função deles. A criança aprofundar-se nas suas atividades,
que corre pela sala de aula: estaria nos seus relacionamentos, e ampliá-
ela fugindo de uma atividade aver- los, sem dispersão. A distração seria
siva? Estaria precisando da atenção estimulada pelo tropismo aos obje-
dos colegas ou do professor? Estaria tos sensoriais.
buscando uma estimulação sen- A hiperatividade, expressa co-
sorial? mo agitação psicomotora e verbor-
ragia pode ser entendida como ma-
Crianças Desatentas, Hiperati- nifestação do escoamento de con-
vas e Impulsivas teúdo internos, por falhas de con-
tenção, representando esforços na
A partir de toda a exposição tentativa de recuperar algum tipo de
anterior, podemos pensar que essas contorno.
crianças apresentam prejuízos na É fácil imaginar que essas
construção da sua subjetividade, pe- crianças vivendo nesse imediatismo,
la dificuldade de evolução das sensa- nessa concretude, tenham falhas na
ções às emoções, das percepções às aprendizagem. Além disso, o prejuí-

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

zo dos processos interjetivos dificul- mobilizariam fortes defesas narcísi-


ta que assimilem e armazenem in- cas e a criança se voltaria para si
ternamente suas vivências e os re- mesma, ficando entregas às próprias
gistros internos das boas experiên- forças, insuficientes para darem
cias com o objeto serão frágeis. conta dos desafios propostos pela
O predomínio nas experiên- vida e pelo crescimento.
cias iniciais de afetos negativos in- Destacar a importância do de-
terfere na estruturação do SNC, fe- senvolvimento emocional não exclui
chando-se, dessa maneira, o círculo a consideração pelos fatores exter-
aprisiona. O vínculo com a mãe é nos à criança, principalmente no
fundamental: qualquer situação que que se refere a que ela receba um
interfira negativamente no estabele- olhar muito atento, não apenas por
cimento de um bom vínculo entre a parte dos pais nos cuidados dispen-
criança e o objeto primário pode sados a ela, mas também dos educa-
prejudicar de formas e graus varia- dores nos cuidados com o ambiente
dos o desenvolvimento psíquico, se- e sua vida escolar, e das autoridades
jam eles fatores constitucionais ou governamentais com sua saúde de
ambientais. modo geral.
Podemos então agregar aos
genéticos, os gestacionais, os congê- Podemos Prevenir o TDAH?
nitos, as instabilidade sociais, difi-
culdades emocionais dos pais, pre- A prevalência do Transtorno
juízo da PMP, problemas nas rela- do Déficit de Atenção e Hiperati-
ções familiares, separação precoce vidade (TDAH) tem sido objeto de
mãe-bebê, perdas significativas, estudo de diversas investigações
doenças diversas etc. científicas nas últimas décadas, tais
A decorrência da atuação de estudos têm proporcionado dados
fatores prejudiciais poderá abranger sobre a frequência, severidade e
desde sintomas simples e passagei- curso do transtorno em relação ao
ros, até quadros severos, por exem- gênero, idade, área geográfica, fa-
plo, de autismo. Não há nenhum ti- tores psicossociais, etc.
po de “especificidade”. O TDAH caracteriza-se pela
No caso dos sintomas de falta tríade sintomatológica de desaten-
de atenção e hiperatividade, pode- ção, hiperatividade e impulsividade,
ríamos pensar que haveria forças que se manifestam de maneira des-
muito intensas atuantes, que ao não proporcional tendo em vista a idade
conseguirem encontrar continência, e o nível de desenvolvimento do in-

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

divíduo O transtorno é considerado quência do TDAH na população, e


pela Associação Americana de Psi- na identificação dos fatores de risco
quiatria como um problema de saú- e consequências na saúde pública.
de pública cujas implicações consis- Tais estudos auxiliam na melhoria
tem em atividades motoras excessi- da qualidade de vida do indivíduo
vas, na dificuldade em sustentar a por identificar medidas preventivas
atenção e, no controle dos impulsos. e possíveis formas de controle.
Estas características podem com- Apesar das contribuições dos
prometer o comportamento funcio- estudos de prevalência, é possível
nal do indivíduo no âmbito familiar, identificar algumas limitações, visto
social, laboral e, acadêmico. que, na qualidade de descritivos po-
As crianças, adolescentes e pulacionais, estão condicionados
adultos com o transtorno estão su- aos critérios metodológicos, à sele-
jeitos a apresentar problemas na es- ção da amostra representativa da
fera social, interpessoal e intrapes- população-alvo, à localização geo-
soal, tais como: baixa autoestima, gráfica, à precisão diagnóstica, aos
conflitos familiares, problemas de fatores sociodemográficos, e à fonte
relacionamento entre iguais e con- de informações utilizadas como for-
jugais, maior probabilidade de en- ma de rastreamento.
volvimento em acidentes automobi-
lísticos, práticas sexuais de risco,
uso de substâncias ilícitas, compor-
tamentos antissociais, entre outros.
Mesmo com os avanços dos
estudos genéticos e das técnicas de
neuroimagem, ainda não há um
consenso definitivo sobre a etiologia
do transtorno. A literatura científica
sinaliza que é uma síndrome hetero-
génea de origem multifatorial, inte-
grando fatores genéticos, neuro-
biológicos, ambientais e múltiplos
genes associados.
Diante da gravidade do trans-
torno, convém destacar que os estu-
dos de prevalência são impres-
cindíveis no monitoramento da fre-

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

2. Transtornos Internalizantes

Fonte: Revista Saúde2

O transtorno emocionais ou in-


ternalizante, com altos níveis
de afetividade negativa, incluem,
monstra preocupações persistentes,
irreais e exageradas com os pais ou
consigo mesma, pesadelos, resistên-
transtorno obsessivo-compulsivo e cia para ir à escola, dormir sozinha
transtornos relacionados, como o ou fora de casa, raiva, choros, quei-
trauma e o fator de estresse relacio- xas de dores de barriga ou de cabeça,
nado a distúrbios e transtornos dis- enjoos etc.
sociativos, incluem também trans- Fobias simples ou fobias so-
tornos depressivos e transtornos de ciais: ambas são mais frequentes na-
ansiedade. tes da puberdade. Fobias simples
são caracterizadas por medos inten-
Transtornos Emocionais ou sos, resistência, antecipação ansiosa
Internalizantes ou angústia dirigida a um objeto ou
situação, limitando a vida social da
Transtorno de ansiedade de criança. Geralmente, envolvem ani-
separação: normal nos primeiros mais, escuro, tempestades, altura ou
anos de vida, a ansiedade de separa- procedimentos médicos. Já as fobias
ção é mais comum antes da puber- sociais (ou transtorno de ansiedade
dade, entre 7 e 9 anos. A criança de- social) se caracterizam pela evitação

2 Retirado em https://rsaude.com.br/

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

marcante de contato com pessoas cos e fisiológicos, que faz parte do


não familiares, mesmo as da mesma desenvolvimento do ser humano,
idade, e grande angústia em situa- podendo tornar-se patológica quan-
ções sociais. do acontece de forma exagerada e
Transtorno de ansiedade ge- sem uma situação real ameaçadora
neralizada: mais comum na adoles- que a desencadeie.
cência, envolve preocupações cons- No ser humano, as causas
tantes sobre comportamentos pas- mais comuns da ansiedade não são
sados, atuais ou eventos futuros, de natureza biológica, mas sim psi-
competência e desempenho. Isso le- cológicas, surgindo em função de
va a sensações permanentes de ten- comunicações simbólicas verbais ou
são, insegurança, necessidade de não, interpretadas à luz de concei-
reafirmação frequente e queixas de tos, crenças e valores formulados
dores de cabeça e estômago, náu- por uma comunidade sociocultural.
seas, tensão muscular ou dificulda- Os transtornos de ansiedade
des para dormir. próprios da infância e mais comuns
Quadros depressivos mais fre- são: transtornos de ansiedade fóbi-
quentes na adolescência, podendo ca, transtorno de ansiedade social e
também aparecer na infância. Na transtornos de ansiedade de sepa-
infância, pode-se observar recusa ou ração.
relutância em ir para a escola, irrita-
bilidade e sintomas físicos variados, Ansiedade: Definição, Sinto-
como dor abdominal e de cabeça, matologia e Epidemiologia
náuseas e vômitos. Na adolescência,
perturbação do sono e do apetite, A ansiedade é definida como
culpa e falta de esperanças são os um estado de humor desconfortável,
sintomas mais comuns. Nesses qua- uma apreensão negativa em relação
dros, há o risco de suicídio, mais gra- ao futuro, uma inquietação interna
ve em adolescentes, principalmente desagradável. A ansiedade inclui
quando outros problemas estão manifestações somáticas e fisiológi-
associados, como o abuso de álcool e cas (dispneia, taquicardia, vaso-
drogas. constrição ou dilatação, tensão mus-
cular, parestesias, tremores, sudore-
Ansiedade se, tontura, etc.) e manifestações
psíquicas (inquietação interna,
A Ansiedade é um estado emo- apreensão, desconforto mental etc.)
cional com componentes psicológi-

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Do ponto de vista psíquico, a ma resposta generalizada, ampla,


principal manifestação de ansiedade que mobiliza todo o nosso organis-
é descrita como uma sensação ines- mo pelos mais variados estímulos.
pecífica, vaga, da existência de al- Sintomas ansiosos, e não os
gum tipo de ameaça ao bem estar. A transtornos propriamente, são fre-
inquietante sensação de que “algo quentes em outros transtornos psi-
está para acontecer” tanto pode es- quiátricos. Estes sintomas caracteri-
tar ligada a situações a serem en- zam-se por uma ansiedade que se
frentadas no dia-a-dia, como à vés- explica pelos sintomas do transtor-
pera de uma prova, um novo empre- no primário (exemplos: a ansiedade
go, uma mudança de casa, uma via- do início do surto esquizofrênico; o
gem, quanto pode ocorrer sem ne- medo da separação dos pais numa
nhuma causa objetiva aparente. criança com depressão maior) e não
A ansiedade e o medo passam constitui um conjunto de sintomas
a ser reconhecidos como patológicos que determina um transtorno ansio-
quando são exagerados, despropor- so típico. Mas podem ocorrer casos
cionais em relação ao estímulo, ou em que vários transtornos estão pre-
qualitativamente diversos do que se sentes ao mesmo tempo e não se
observa como norma naquela faixa consegue identificar o que é primá-
etária e interferem com a qualidade rio e o que não é, ou seja, sintomas
de vida, o conforto emocional ou o primários não são derivados de ou-
desempenho diário do indivíduo. tras condições psiquiátricas (de-
Tais reações exageradas ao estímulo pressões, psicoses, transtornos do
ansiogênico se desenvolvem, mais desenvolvimento, transtorno hiper-
comumente, em indivíduos com cinético, etc.), sendo mais correto
uma predisposição neurobiológica referir que esse paciente apresenta
herdada. A maneira prática de se di- mais de um diagnóstico coexistente
ferenciar ansiedade normal de an- (comorbidades).
siedade patológica é basicamente Nos últimos 20 anos, o diag-
avaliar se a reação ansiosa é de curta nóstico, classificação e tratamento
duração, autolimitada e relacionada dos quadros ansiosos têm sido pro-
ao estímulo do momento ou não. fundamente revisados, principal-
O transtorno é acompanhado mente depois da publicação do
de uma série de sensações físicas, Manual Diagnóstico e Estatístico, na
tais como: palidez, palpitações, falta sua terceira versão em 1980. Desde
de ar, boca seca, tremores, sudorese então novos conhecimentos sobre
nas mãos e pés, manifestando-se nu- aspectos biológicos e neuropsicoló-

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

gicos da ansiedade trouxeram uma realizados como os distúrbios


nova perspectiva para este tipo de psiquiátricos mais tratáveis. Mais
problema. Os avanços mais signifi- assustador ainda são os dados de
cativos foram em relação ao tra- que não só a pessoa sofre com o dis-
tamento. túrbio ansioso, seja ele qual for, tem
Cada vez mais, os atendimen- prejuízos, mas também a sociedade
tos realizados dentro da abordagem paga um preço altíssimo.
cognitivo-comportamental ganham Um terço dos gastos do go-
força e novos medicamentos são verno norte-americano em saúde
indicados para tratar estes casos. mental na década de 80 foi destina-
Segundo dados do maior estudo epi- do aos distúrbios de ansiedade e
demiológico já realizado nos EUA, suas consequências, sendo a princi-
pelo Epidemiologic Catchment Area pal delas a queda na produtividade
Study (ECA) realizado na década de do indivíduo. Para complicar ainda
80, 23% da população estudada mais a situação, um outro estudo do
apresentava um distúrbio ansioso. INSM deste mesmo período revelou
Já de acordo com dados do Instituto que com o passar do tempo e sem o
Nacional de Saúde Mental américa- tratamento adequado, cerca de 70%
no (INSM), aproximadamente 15% das pessoas portadoras de algum
da população do país vai apresentar transtorno ansioso têm pelo menos
em algum momento de sua vida um um outro problema de ordem psi-
transtorno de ansiedade. Estas pes- quiátrica, podendo este ser inclusive
quisas evidenciam que a ansiedade dependência ou abuso de substância
patológica, na década de 80, era o Em pesquisas mais recentes estes
problema de saúde mental mais im- dados se mantêm. Os transtornos
portante do país. ansiosos continuam sendo os mais
Estes dados são alarmantes prevalentes na população norte-
não somente pelo fato de ser um nú- americana e um dos problemas mais
mero bastante significativo da popu- importantes do mundo, podendo
lação sendo acometido por este mal, chegar a atingir um quarto da popu-
mas principalmente porque menos lação mundial.
de um quarto das pessoas que so- Os transtornos de ansiedade
friam algum transtorno ansioso pro- mais comuns são: Transtorno de
curavam tratamento adequado. Ansiedade Generalizada, Transtor-
Já nesta época, uma dificul- no de Ansiedade de Separação, Fo-
dade dentro do espectro da ansieda- bias Especificas, Transtorno de
de era evidenciada pelos estudos Ansiedade Social, Transtorno de Pâ-

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

nico e Agorafobia, Transtorno de A distribuição entre os sexos é,


Estresse Pós Traumático e Transtor- de modo geral, equivalente, exceto
no Obsessivo-Compulsivo. Esses para as fobias específicas, o trans-
quadros psiquiátricos são igualmen- torno de estresse pós-traumático e o
te encontrados tanto em crianças transtorno de pânico apresentam
quanto em adultos, com uma preva- predominância no sexo feminino.
lência de 12,5% ao longo da vida e Em crianças, o desenvolvi-
7,6% no ano. mento emocional influi sobre as
causas e a maneira como se manifes-
Transtornos de Ansiedade na tam os medos e as preocupações, se-
Infância jam normais ou patológicas. Dife-
rentemente dos adultos, crianças
Os transtornos ansiosos en- podem não reconhecer seus medos
contram-se entre as doenças psi- como exagerados ou irracionais, es-
quiátricas mais comuns em crianças pecialmente as menores.
e adolescentes, perdendo para os Tanto a ansiedade quanto o
transtornos de déficit de aten- medo são considerados patológicos
ção/hiperatividade (TDAH) e de quando exagerados, desproporcio-
conduta. Até 10% das crianças e ado- nais em relação ao estímulo ou qua-
lescentes sofrem de algum transtor- litativamente diverso do que se ob-
no ansioso (excluindo-se o transtor- serva como normal naquela faixa
no obsessivo - compulsivo (TOC), etária, e também quando interferem
que afeta até 2 % das crianças e na qualidade de vida, conforto emo-
adolescentes). cional ou desempenho diário da
Os transtornos ansiosos mais criança.
frequentes são o transtorno de Na avaliação e no planejamen-
ansiedade de separação, com preva- to terapêutico desses transtornos, é
lência em torno de 4%, o transtorno fundamental obter uma história de-
de ansiedade excessiva (TAG) de talhada sobre o início dos sintomas,
2,7% a 4,6%; fobias específicas de possíveis fatores desencadeantes
2,4% a 3,3%. A prevalência de fobia (ex.: crise conjugal, perda por morte
social fica em torno de 1% e do trans- ou separação, doença na família e
torno de pânico, 0,6%. Mais de 50 % nascimento de irmãos) e o desenvol-
das crianças ansiosas experimenta- vimento da criança. Sugere-se, tam-
rão um episódio depressivo como bém, valorizar o temperamento da
parte de sua síndrome ansiosa. criança (ex.: presença de comporta-
mento inibido), o tipo de apego o

17
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

qual possui com seus pais (ex.: se- mente conformistas, perfeccionistas
guro ou não) e o estilo de cuidados e inseguras, apresentando uma ten-
paternos destes (ex.: presença de dência a refazer tarefas em razão de
superproteção), além dos fatores excessiva insatisfação com um
implicados na etiologia dessas pato- desempenho menos que perfeito.
logias. Também deve ser avaliada a Elas demonstram excessivo
presença de comorbidades. zelo na busca por aprovação e exi-
O Transtorno de Ansiedade gem constantes garantias sobre seu
Generalizada tem como caracterís- desempenho e outras preocupações.
tica essencial uma ansiedade ou ex- O transtorno de ansiedade de
cessiva preocupação (expectativa separação é caracterizado por ansie-
apreensiva), ocorrendo na maioria dade excessiva em relação ao afas-
dos dias por um período de pelo tamento dos pais ou seus substi-
menos 6 meses, acerca de diversos tutos, não adequada ao nível de
eventos ou atividades. A ansiedade e desenvolvimento, que persiste por,
a preocupação são acompanhadas no mínimo, quatro semanas, cau-
de pelo menos três sintomas adicio- sando sofrimento intenso e prejuí-
nais, de uma lista que inclui inquie- zos significativos em diferentes
tação, fadiga, dificuldade em con- áreas da vida da criança ou adoles-
centrar-se, irritabilidade, tensão cente.
muscular e perturbação do sono. Em As crianças ou adolescentes,
crianças apenas um sintoma adicio- quando estão sozinhas, temem que
nal é exigido. algo possa acontecer a si mesmo ou
Em crianças e adolescentes aos seus cuidadores, tais como aci-
com Transtorno de Ansiedade Gene- dentes, sequestro, assaltos ou doen-
ralizada, a ansiedade e a preocupa- ças que os afastem definitivamente
ção frequentemente envolvem a destes. Em casa, para dormir neces-
qualidade de seu desempenho na sitam de companhia e resistem ao
escola ou em eventos esportivos, sono, que vivenciam como separa-
mesmo quando seu desempenho ção ou perda de controle. Com fre-
não está sendo avaliado por outros. quência referem pesadelos que ver-
Pode haver preocupação excessiva sam sobre seus temores de separa-
com a pontualidade. Eles também ção. Recusa escolar secundária tam-
podem preocupar-se com eventos bém é comum nesses pa- cientes. A
catastróficos tais como terremotos criança deseja frequentar a escola,
ou guerra nuclear. As crianças com demonstra boa adaptação prévia,
transtornos podem ser excessiva- mas apresenta intenso sofrimento

18
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

quando necessita afastar-se de casa. associação com o indivíduo. A


Quando a criança percebe que seus resposta ao evento deve envolver
pais vão se ausentar ou o afasta- intenso medo, impotência ou hor-
mento realmente ocorre, manifes- ror. O quadro sintomático completo
tações somáticas de ansiedade, tais deve estar presente por mais de 1
como dor abdominal, dor de cabeça, mês e a perturbação deve causar so-
náusea e vômitos são comuns. frimento ou prejuízo clinicamente
Crianças maiores podem ma- significativo no funcionamento so-
nifestar sintomas cardiovasculares cial, ocupacional ou em outras
como palpitações, tontura e sensa- aéreas importantes da vida do indi-
ção de desmaio. Esses sintomas pre- víduo.
judicam a autonomia da criança, Em crianças mais jovens, os
restringem a sua vida de relação e sonhos aflitivos com o evento po-
seus interesses, ocasionando um dem, em algumas semanas, mudar
grande estresse pessoal e familiar. para pesadelos generalizados com
Sentem-se humilhadas e medrosas, monstros, com o salvamento de
resultando em baixa autoestima e outros ou com ameaças a si mesmas
podendo evoluir para um transtorno ou a outros. As crianças pequenas
do humor. em geral não têm o sentimento de
A particularidade essencial do estarem revivendo o passado; em
Transtorno de Estresse Pós-Trau- vez disso, reviver o trauma pode
mático é o desenvolvimento de sin- ocorrer por meio de jogos repetiti-
tomas característicos após a expo- vos. Em vista da dificuldade de uma
sição a um estressor traumático criança em relatar diminuição no in-
extremo, envolvendo a experiência teresse por atividades significativas
pessoal direta de um evento tão e limitação do afeto, esses sintomas
ameaçador que envolve morte, sério devem ser atentamente avaliados
ferimento ou outra ameaça à própria mediante relatos feitos pelos pais,
integridade física; ter testemunhado professores e outros observadores.
um evento que envolve morte, feri- As características essenciais
mentos ou ameaça à integridade do Transtorno Obsessivo-Compulsi-
física de outra pessoa; ou o conhe- vo são obsessões ou compulsões re-
cimento sobre morte violenta ou correntes sufi cientemente graves a
inesperada, ferimento sério ou ponto de consumirem tempo ou
ameaça de morte ou ferimento expe- causarem sofrimento acentuado ou
rimentado por um membro da fa- prejuízo significativo.
mília ou outra pessoa em estreita

19
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Os quadros em crianças geral- família, podendo a inibição das inte-


mente são similares aos da idade rações chegar ao ponto do mutismo.
adulta, porém elas não solicitam Crianças pequenas podem mostrar-
ajuda, e os sintomas podem não ser se excessivamente tímidas em con-
ego-distônicos. Com maior frequên- textos sociais estranhos, retraindo-
cia, o problema é identificado pelos se do contato, recusando-se a parti-
pais, os quais levam a criança a tra- cipar em brincadeiras de grupo, per-
tamento. Declínios graduais no ren- manecendo tipicamente na periferia
dimento escolar, secundários ao das atividades sociais e tentando
prejuízo da capacidade de concen- permanecer próximas a adultos co-
tração, têm sido relatados. Assim nhecidos. Para este diagnostico em
como os adultos, as crianças tendem crianças, deve haver evidências de
mais a envolver-se em rituais em que são capazes de relacionar-se so-
casa do que na frente de seus pares, cialmente com pessoas da família, e
de professores ou estranho. a ansiedade social deve ocorrer em
No Transtorno de Ansiedade contextos envolvendo seus pares,
Social, um medo acentuado e persis- não apenas em interações com adul-
tente de situações sociais ou de de- tos.
sempenho na qual o indivíduo pode- Fobia Específica é qualquer
ria sentir vergonha é a particulari- medo acentuado e persistente de ob-
dade deste transtorno. A exposição à jetos ou situações claramente dis-
situação social ou de desempenho cerníveis e circunscritos. A exposi-
provoca, quase que invariavelmente, ção ao estimulo fóbico provoca uma
uma resposta imediata de ansieda- resposta imediata de ansiedade.
de, podendo assumir a forma de um Em crianças, a ansiedade pode
Ataque de Pânico. ser expressa por choro, ataques de
Embora adolescentes e adul- raiva, imobilidade ou comporta-
tos com este transtorno reconheçam mento aderente. As crianças com
que seu medo é excessivo ou irracio- frequência não reconhecem que os
nal, isto pode não ocorrer com crian- temores são excessivos ou irracio-
ças; sendo mais comum a situação nais e raramente relatam sofrimento
social ou de desempenho evitada ou por terem fobias. O medo de animais
suportada com pavor. e outros objetos do ambiente natural
Quanto à criança, pode haver são particularmente comuns e em
choro, ataques de raiva, imobilida- geral é transitório na infância. Um
de, comportamento aderente ou diagnóstico de Fobia Específica não
permanência junto a uma pessoa da é indicado, a menos que os temores

20
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

acarretem prejuízo clinicamente se ou calafrios; palpitações ou ritmo


significativo. cardíaco acelerado; aperto, dor ou
Agorafobia é uma ansiedade desconforto no peito; náuseas ou
acerca de estar em locais ou situa- mal-estar abdominal; parestesias
ções das quais escapar poderia ser (sensações de dormência ou formi-
difícil ou nas quais o auxílio pode gamento); sensação de fraqueza, de
não estar disponível na eventual- falta de ar ou asfixia, de sufocamen-
dade de ter um Ataque de Pânico ou to; ondas de frio ou de calor; tremer
sintomas tipo pânico, evitando ou sacudir-se; desrealização (senti-
assim uma variedade de lugares co- mentos de irrealidade); despersona-
mo ônibus, estar sozinho em casa, lização (sentir-se destacado de si
lugares com multidão e outros. mesmo); medo de perder o controle,
A ansiedade ou esquiva agora- de morrer ou de ficar louco.
fóbica não pode ser mais bem expli- Também se pode fechar o
cada por outro transtorno mental, diagnóstico na ocorrência de um
como Fobia Social (por ex., a esquiva único episódio se, além dos quatro
se limita a situações sociais pelo critérios mínimos mencionados aci-
medo do embaraço), Fobia Específi- ma, o episódio for seguido de uma
ca (por ex., a esquiva se limita a uma antecipação ansiosa e incapacitante
única situação, como elevadores), em relação a futuros ataques. Outros
Transtorno Obsessivo-Compulsivo critérios que devem estar presentes:
(por ex., esquiva à sujeira, em al- preocupação quanto às consequên-
guém com uma obsessão de conta- cias ou implicações do ataque, pre-
minação), Transtorno de Estresse sença de significativas alterações
Pós-Traumático (por ex., esquiva de comportamentais relacionadas aos
estímulos associados com um es- ataques e a persistente expectativa
tressor severo) ou Transtorno de de passar novamente pela experiên-
Ansiedade de Separação (por ex., cia.
esquiva a afastar-se do lar ou de Quando trata-se do transtorno
parentes). de pânico com agorafobia, acrescen-
Segundo os critérios do DSM- ta-se a evitar lugares e situações
IV, para concluir o diagnóstico do públicas em que o paciente acredita
transtorno do pânico deve haver a haver dificuldades para obter ajuda,
ocorrência de ataques de pânico caso ocorram sintomas de pânico.
recorrentes e inesperados, em que Em outras palavras, os critérios
estejam presentes, no mínimo, qua- diagnósticos para transtorno do
tro dos seguintes sintomas: sudore- pânico sem agorafobia são idênticos

21
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

aos critérios para transtorno do pâ- companhia dos pais, o que causa
nico com agorafobia, com exceção queda de desempenho escolar e difi-
das referências a medos e evitar culdade de interação com colegas.
agorafóbicas. Não raro, a mãe desiste de trabalhar
Como fatores do ambiente ou ter outras atividades para dar
físico e social da criança podem estar segurança ao filho.
presentes tanto no desenvolvimento A ansiedade de separação é um
quanto na manutenção dos transtor- sentimento natural, da criança,
nos, aspectos como níveis de ameaça ocorrendo nos momentos de separa-
ou de segurança, cuidados exagera- ção entre o indivíduo e alguma pes-
dos ou negligência por parte dos soa de grande importância pessoal
pais, sistema punitivo nas escolas e ou afetiva em sua vida. Dito de outra
na comunidade, entre outros, devem forma, é o desconforto significativo
ser levados em conta. que surge ao afastar-se(separa-se)
de uma grande figura de vinculação
Transtorno de Ansiedade de (alguém próximo, de quem muito se
Separação gosta ou a quem se ama ou com
quem se tem forte relação).
Transtorno de ansiedade de
separação (TAS) ou Transtorno liga- De modo geral, as principais
do à angústia de separação é um figuras de vinculação da criança são
transtorno de ansiedade caracteriza- os pais, sejam eles biológicos, sejam
do por intenso medo e estresse adotivos, sendo especialmente co-
quando o indivíduo é separado de mum haver ansiedade de separação
sua casa e das pessoas a quem o entre a criança e sua mãe. Não obs-
indivíduo tem uma forte ligação tante, sintomas de ansiedade de se-
emocional (por exemplo, dos pais, paração podem ocorrer com relação
um cuidador ou irmãos). a avós, babas, tios, irmãos ou mesmo
A ansiedade de separação é um professoras e funcionários de uma
medo exagerado e intenso de perder instituição na qual a criança porven-
um dos pais (normalmente a mãe). tura esteja abrigada.
Este medo causa sofrimento signifi- A ansiedade de separação faz
cativo e prejuízos importantes nas parte do desenvolvimento normal de
áreas social, escolar e familiar. toda criança, e todos sabemos que
Crianças e adolescentes com este pode ser difícil aprender a se separar
transtorno tornam-se extremamen- de pessoas importantes em determi-
te ansiosas quando não estão em nadas ocasiões. Esse aprendizado

22
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

talvez continue por toda vida, mas  Intenso e persistente receio de


certamente é mais intenso na infân- perder de alguma forma ou fi-
cia, começando quando ainda somos gura de vinculação, ou ainda,
bebes. O fato de apresentarmos ou receio de que sofra algum mal
(acidente, adoecimento, entre
experimentarmos sinais de ansieda-
outros).
de de separação, no entanto, não é  Recusa ou relutância em sair
sufi ciente para caracterizar um de casa para ir a escola ou ou-
transtorno psiquiátrico. tro lugar devido ao medo da
separação
Diagnóstico  Medo excessivo ou relutância
quanto a ficar sozinho ou lon-
O transtorno de ansiedade de ge da figura (s) de vinculação.
separação é um diagnóstico médico  Preocupação intensa e persis-
tente de que algo cause a sepa-
estabelecido pelo psiquiatra ou ou- ração da figura de vinculação,
tro profissional da saúde mental como perder-se ou sequestra-
quando os sinais e sintomas de an- do, por exemplo.
siedade de separação são fortes a  Recusa de dormir fora de casa
ponto de causarem problemas rele- ou longe da(s) de vinculação
vantes e/ou intenso sofrimento para  Pesadelos repetitivos envol-
a vida da pessoa. vendo o tema da separação
Segundo epidemiológicos, cer-  Dores de cabeça, de estomago,
vômitos ou outros sintomas
ca de 1 em cada 25 crianças costuma
físicos durante (ou em anteci-
sofrer desse transtorno- ou seja pação aos) momentos de sepa-
aproximadamente 4%- o que o torna ração da(s) figura(s) de vin-
um quadro frequente nessa popula- culação
ção. Além disso, o diagnóstico é mais
comum em crianças de que em ado- O transtorno de ansiedade de
lescentes e acomete meninas com separação é uma das maiores causas
frequência um pouco maior do que de recusa para ir à escola e deve ser
meninos. considerado como possível explica-
Os principais sinais e sintomas ção para os casos de crianças ou ado-
do transtorno de ansiedade de sepa- lescentes com faltas excessivas.
ração são: Também é importante desta-
 Intenso desconforto nos mo- car que, em geral, esses sintomas
mentos de separação de uma não são considerados de modo isola-
figura de vinculação ou sair de do pelo bom profissional da saúde
casa ou, ainda ao antecipar
tais momentos

23
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

mental, que deverá sempre interpre- te feito em duas modalidades:


tá-lo dentro de um contexto. psicológico e medicamentoso.
De modo geral, o acompanha-
Causas e Origem mento psicológico é mais importan-
te do que a farmacoterapia no trata-
Estudos familiares demostram mento do transtorno de ansiedade
que os transtornos de ansiedade são de separação. Além da psicoterapia
mais comuns em filhos de pais com individual, as abordagens familiares
transtornos de ansiedade ou depres- podem ser muito úteis nesses casos.
sivos. Mais especificamente, pais Entre as diferentes linhas, há mais
com depressão e / ou transtornos de evidencias cientificas da eficácia
pânico costumam ter filhos com cognitivo-comportamental, o que
transtornos de ansiedade de separa- não significa que outras linhas sejam
ção com frequência do que pais sem menos eficazes ou não possam ser
esses diagnósticos. utilizadas.
Além disso, superdotação, o
excesso de controle por parte dos Conclusão
pais e modos excessivamente ansio-
sos de criar os filhos são traços co- A ansiedade de separação e o
mumente associados ao transtorno transtorno de ansiedade de separa-
de ansiedade de separação. ção são fenômenos diferentes: en-
É interessante observar que a quanto a primeira é observável em
natureza do vínculo entre a mãe e o diversos momentos ao longo do de-
filho pode ter um papel maior na senvolvimento normal, o transtorno
origem desse transtorno (e de outros de mesmo nome provoca prejuízos e
transtornos de ansiedade) do que o sofrimentos importantes para o
temperamento da criança ou o nível indivíduo e pessoas próximas.
de ansiedade da mãe.

Tratamento

O prognóstico em geral é bom,


mas depende da gravidade de cada
caso e da capacitação dos profissio-
nais que acompanham o paciente.
Como em todos os transtornos de
ansiedade, o tratamento é geralmen-

24
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

3. Transtornos Disruptivos ou Externalizantes

Fonte: Hospital Santa Monica3

T anstornos Disruptivos (TD)


são comportamentos antisso-
ciais que envolvem problemas na
de audácia, agressão física, conflito e
oposição a figuras de autoridade,
normas e leis. Os transtornos dis-
regulação emocional e/ou compor- ruptivos são os transtornos psiquiá-
tamental, manifestando-se com a tricos mais frequentes na infância e
violação de direitos alheios e/ou têm grande impacto na adolescência
conflitos com normas ou figuras de e na vida adulta. Porém, há uma sé-
autoridade. rie de empecilhos para seu diagnós-
O Transtorno de Oposição tico:
Desafiante (TOD) surge, geralmen-  Dificuldade com o diagnóstico
te, na pré-escola e refere-se a com- diferencial, principalmente
portamentos e emoções, enquanto o em relação a ansiedade, de-
Transtorno de Conduta (TC) surge pressão e déficit de atenção/
hiperatividade;
na adolescência e possui sintomas

3 Retirado em https://hospitalsantamonica.com.br/

26
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

 Dificuldade em apontar quan- transtorno obsessivo-compulsivo


do o comportamento faz parte (TOC). Até o momento, a maioria
do ciclo normal do desenvol- das intervenções que provaram ser
vimento infantil; eficazes para o tratamento de TOC é
 Escassez de instrumentos e
semelhante àquelas desenvolvidas
técnicas padronizadas para
esse tipo de atendimento. Por- para outros transtornos de ansie-
tanto, este artigo teórico tem dade. No entanto, estudos que in-
por objetivo refletir sobre os vestigaram a neurobiologia do TOC
aspectos considerados neces- chegaram a conclusões que nem
sários e importantes para o sempre são compatíveis com aque-
atendimento psicoterápico las anteriormente associadas aos
nos transtornos disruptivos,
demais transtornos de ansiedade.
sem pretensão de esgotar a
discussão. Para tanto, inicial- É provável que a ansiedade
mente serão apresentadas a seja uma dimensão relevante do
definição e a caracterização de TOC, com impacto em outras carac-
transtorno da conduta e trans- terísticas desse transtorno. Conse-
torno desafiador de oposição. quentemente, estudos futuros po-
dem se beneficiar da investigação
Transtorno Obsessivo-Com- dos fenômenos de medo e ansiedade
pulsivo (TOC) e de suas relações com os tipos de
obsessões e compulsões, idade de
O transtorno obsessivo-com-
início do TOC, comorbidades e pa-
pulsivo, conhecido popularmente
drões de resposta ao tratamento. Os
pela sigla TOC, é um distúrbio psi-
Transtornos Disruptivos (TD) com-
quiátrico de ansiedade descrito na
postos do Transtorno Opositor De-
quinta edição do Manual de Diag-
safiador (TOD) e o Transtorno de
nóstico e Estatística de Transtornos
Conduta (TC) são distúrbios psi-
Mentais, o DSM-V (no termo em
quiátricos que apresentam como
inglês) e na décima edição da CID
característica principal um modelo
(Classificação Internacional de
repetitivo e persistente de conduta
Doenças).
antissocial, agressiva ou desafia-
A principal característica do
dora.
TOC é a presença de crises recorren-
O Transtorno Obsessivo-Com-
tes de pensamentos obsessivos, in-
pulsivo (TOC) não é uma doença
trusivos e em alguns casos compor-
única ou uniforme, mas uma síndro-
tamentos compulsivos e repetitivos.
me que abrange um amplo espectro
A ansiedade é um componente
de sintomas que representam múlti-
importante da psicopatologia do

27
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

plos domínios psicopatológicos. entre os dois sistemas classificató-


Mesmo com o avanço das técnicas rios são pequenas.
terapêuticas, parte dos pacientes Segundo o DSM-IV-TR, o TOC
não responde aos tratamentos con- é caracterizado pela presença de
vencionais. obsessões e/ou compulsões, graves
Diversas pesquisas realizadas o sufi ciente a ponto de consumirem
nos últimos anos indicam o TOC tempo (mais do que uma hora por
como uma doença neuropsiquiátri- dia), ou causarem acentuado sofri-
ca. Uma série de circuitos paralelos mento ou prejuízo significativo na
envolvendo regiões corticais e sub- rotina normal do indivíduo, em seus
corticais estariam hiperativos, e es- relacionamentos ou em suas ativi-
sas alterações seriam responsáveis dades acadêmicas, profissionais ou
pela modulação dos comportamen- sociais. Pelo menos em algum ponto
tos repetitivos no TOC. durante o curso do transtorno, o su-
Estudos clínicos têm demons- jeito deve reconhecer as obsessões
trado uma distribuição bimodal ou compulsões como excessivas ou
para a idade de início do TOC, com irracionais.
um pico nas idades de 12-14 e outro A maioria das crianças tam-
nas idades de 20,22, apontando para bém percebe a inadequação de seus
menos de 15% os casos com o início sintomas, porém aceita -se que este
após os 35 anos. Início mais precoce critério não seja satisfeito na infân-
do TOC associa-se ao sexo mas- cia. Além desses critérios, a CID- 10
culino. exige que os sintomas estejam pre-
O início dos sintomas pode ser sentes por, pelo menos, duas sema-
agudo ou insidioso. O TOC pode se nas para que seja feito o diagnóstico.
apresentar com um curso episódico Obsessões são definidas como
ou intermitente, com intervalos li- pensamentos, medos, preocupa-
vres de sintomas; mas, na maioria ções, dúvidas, ou imagens recorren-
das vezes, tem curso crônico, com tes e persistentes que são vivencia-
períodos de melhora e piora, apre- dos como intrusivos (não estão sob o
sentando maior gravidade quando controle do indivíduo) e/ou inapro-
não tratado. priados por seu conteúdo ou intensi-
A remissão completa e dura- dade. Alguns exemplos de obsessões
doura tende a ser rara. Os critérios frequentes são: medo de se contami-
diagnósticos adotados no Brasil são nar ao cumprimentar uma pessoa;
baseados principalmente na CID-10 imagens mentais de se ferir ou ferir
e no DSM-IV-TR. As diferenças

28
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

uma pessoa querida ao segurar um a um objeto ou situação temida nas


garfo ou uma faca. fobias específicas e na fobia social;
As obsessões não são simples preocupação excessiva com um de-
preocupações excessivas com pro- feito físico mínimo ou imaginado,
blemas do cotidiano, e causam mar- associada a rituais de checagem
cas da ansiedade ou sofrimento, o repetitiva no espelho ou de esquiva
que leva o sujeito a tentar afastá-las, de outras pessoas no transtorno dis-
suprimi-las ou neutralizá-las com mórfico corporal; pensamentos re-
algum outro pensamento ou com- correntes de que tem uma doença
portamento (compulsões). grave na hipocondria; ou comporta-
Compulsões são comporta- mento repetitivo de arrancar cabelos
mentos repetitivos (por exemplo, la- ou pelos do corpo na tricotilomania.
var as mãos, conferir se a porta está Outro diagnóstico diferencial
trancada, organizar os objetos numa importante é com o transtorno de
determinada ordem) ou atos men- personalidade obsessivo-compulsi-
tais (trocar um pensamento “mau” vo (TPOC) ou transtorno anancás-
por um pensamento “bom”, rezar ou tico da personalidade. O TPOC é um
contar silenciosamente) que a pes- transtorno do Eixo II e que está as-
soa se sente compelida a realizar em sociado com meticulosidade, persis-
resposta às obsessões, ou de acordo tência, rigidez, isolamento pessoal,
com regras que devem ser seguidas exagerada dedicação ao trabalho e
rigidamente. Apesar de as compul- produtividade, exigência e preocu-
sões serem frequentemente realiza- pação com regras, formalidades, de-
das para prevenir algum evento te- talhes e ordem. São traços de perso-
mido ou diminuir o desconforto cau- nalidade estáveis, precoces e egos-
sado pelas obsessões, nem sempre sintônicos, ou seja, valorizados pela
têm conexão real com o que eles própria pessoa. Este seria um dife-
tentam neutralizar ou prevenir. rencial importante em relação ao
O diagnóstico de TOC não de- TOC, que é habitualmente egodistô-
ve ser realizado quando o conteúdo nico (sintomas considerados indese-
das obsessões e compulsões está ex- jáveis e mesmo ridículos pelo pa-
clusivamente restrito a outro trans- ciente). Apenas uma minoria de
torno psiquiátrico, como por exem- pacientes com TOC apresenta tais
plo, preocupações exageradas e características de personalidade,
rituais relacionados aos alimentos e por vezes confundidas com sintomas
à dieta nos transtornos alimentares; obsessivo-compulsivos que são este-
preocupação e esquiva relacionadas reotipados, sob a forma de rituais

29
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

(mágicos), eventualmente secretos, transtornos cognitivos e retardo


envolvendo conteúdos e cognições mental, entre outros, os dois trans-
específicos. tornos possam ser variantes evolu-
tivas um do outro, sendo o transtor-
Transtorno Opositivo Desafia- no de conduta a progressão natural
dor (TOD) Ou (TDO) do transtorno desafiador opositivo
com a maturação da criança.
O Transtorno Opositivo Desafi A criança portadora do proble-
ador (TOD) consiste em um trans- ma tende a efetuar uma forma de
torno psicológico caracterizado, agressão emocional, na qual tenta
principalmente, por comportamen- agredir seus familiares, agindo de
tos apresentados pela criança no forma opositiva do que se espera
sentido de agir contrariamente aqui- dela. Na maioria das vezes, este tipo
lo que se pede ou se espera dela. Di- de transtorno causa mais sofrimento
ferentes comportamentos caracteri- àquelas que a cercam do que à crian-
zam o problema. “O Transtorno de- ça, pois esta acha que está certa em
safiador opositivo consiste de um suas atitudes agressivas e não pode
padrão persistente de comporta- evitá-las, pois não são atitudes in-
mentos negativistas, hostis e desafi tencionais. O conjunto de atitudes
adores na ausência de sérias viola- de agressão que podem aparecer em
ções de normas sociais ou direitos casos de TOD é vastíssimo e pode
alheios”. O transtorno pode ser ca- variar de acordo com as característi-
racterizado, em linhas gerais, pelos cas de cada família. O comporta-
seguintes sintomas: mento pode se manifestar não ape-
Os sintomas mais frequentes nas sob a forma de atitude ativa no
observados em crianças com TDO sentido de agredir, mas, também,
são: discutem com adultos; desafi através de comportamentos como o
am ou recusam-se ativamente a obe- silêncio, a omissão, a apatia, o meu-
decer a solicitações e regras dos decimento, o não fazer nada e assim
adultos; perturbam as pessoas Deli- por diante.
beradamente e, frequentemente res- A maior evidência que os com-
ponsabilizam os outros por seu erro portamentos opositores são agressi-
ou mau comportamento. Contudo, vos, na medida em que causam o
este tipo de comportamento pode mal- estar emocional no outro, é a
estar presente em outros tipos de ausência dele, na ausência deles se
transtornos tais como, transtorno de quer agredir. Contudo, ainda, há r-
déficit de atenção/hiperatividade, elativa escassez de trabalhos sobre o

30
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Transtorno Desafiador Opositor, de reações emocionais extremas, irrita-


forma geral e a literatura sugere que bilidade crônica, impulsividade e
fatores diversos podem contribuir falta de atenção, tendam a desen-
para o aparecimento do problema. volver comportamentos de oposi-
Em especial, é possível afirmar que ção.
ainda há poucos estudos direciona- Afirma-se que essas respostas
dos a investigar os fatores determi- estão relacionadas com o tempera-
nantes que contribuem para o apa- mento infantil, o que pode estar liga-
recimento do problema. do a uma base genética ou constitu-
Compreender as causas do cional. Essas crianças que apresen-
TOD nas crianças é uma iniciativa tam temperamento difícil não se
complicada, já que não existe, apa- acalmam facilmente, não se adap-
rentemente, uma teoria uniforme da tam bem às mudanças ambientais e
etiologia. Do mesmo modo, como são “resmungonas”. Por outro lado,
ocorre com a maior parte dos trans- segundo o autor, os principais pa-
tornos clínicos, o TOD tem a influên- drões de comportamento dos pais,
cia de múltiplos fatores que se en- observados em famílias de crianças
contram inter-relacionados, no sen- que têm um TOD são: a imaturida-
tido de que podem funcionar como de, a falta de experiência com rela-
variáveis que atuam como causa e ção à educação dos filhos, a hostili-
variáveis que atuam como efeito. dade e a labilidade emocional. As-
Salientando que existem vá- sim, a presença de conflitos conju-
rias evidências de que o TOD é mol- gais, de depressão materna e de psi-
dado e mantido pela natureza das copatologia parental, em geral, sina-
trocas mútuas entre a criança e os liza também um risco para o TOD. O
adultos significativos de seu conví- mesmo autor ressalta que, em certo
vio, começando com os pais e esten- sentido, esses e outros fatores rela-
dendo-se a outras figuras como au- cionados podem determinar uma
toridades. Quando se aborda o tema tendência nos pais a se comporta-
das causas, é apropriado levar em rem e responderem a seus filhos de
conta as características da criança e forma que aumente a probabilidade
dos pais, assim como as variáveis de encontrarem desobediência, opo-
(do contexto) situacionais, que po- sição e desafio.
dem controlar a qualidade das inte- Acrescenta que “a identifica-
rações criança/adulto. Com base em ção das de comportamento é impor-
revisão da literatura, afirma ser pro- tante, de forma a compreender os
vável que crianças que apresentam processos de adaptação do indivíduo

31
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

no curso da vida e nas sociedades mento exteriorizado: biológicos, so-


contemporâneas; e dessa maneira, ciais, cognitivos, acadêmicos, educa-
ter a possibilidade de realizar um cionais e familiares. Para estes auto-
planejamento de programas de pre- res, os fatores acadêmicos e educa-
venção e intervenção, destinados a cionais são, também, tão importan-
crianças e jovens com problemas de tes quanto os fatores cognitivo-
comportamento. sociais na determinação e evolução
O desenvolvimento de condu- dos comportamentos exteriorizados.
tas agressivas ao longo da infância e A literatura revela consistência, nes-
adolescência está sendo alvo de se sentido: Para identificar as causas
vários estudos que almejam respon- de diversos transtornos psicológi-
der, essencialmente, questões refe- cos, devemos analisar a interação de
rentes à origem e à manutenção da todas as dimensões relevantes: as
agressividade durante a trajetória da contribuições genéticas, o papel do
vida. É preciso analisar, ao longo do sistema nervoso, os processos cogni-
processo de maturação, se essas tivos e comportamentais, as influen-
crianças apresentam comportamen- cias emocionais e interpessoais e os
tos agressivos. Assim, se essas con- fatores de desenvolvimento.
dutas se apresentarem de formas O transtorno desafiador de
severas e frequentes, então, isto po- oposição (TOD) é considerado uma
derá indicar sinais de psicopatolo- condição de difícil tratamento.
gia. São vários os fatores e situações Crianças com transtorno desafi ador
que podem originar crenças e esta- de oposição (TOD) têm mais disfun-
dos emocionais, que predispõem às ção familiar do que controles psi-
atitudes agressivas. Os mesmos au- quiátricos e usam mais abordagens
tores, com base em revisão da lite- negativas diante do conflito. Crian-
ratura, consideram várias fontes de ças com TOD têm taxas de transtor-
estresse: perda de um dos pais, bri- nos internalizastes altas, são mais
gas entre eles, o nascimento de um rejeitadas por colegas e têm maiores
irmão, solidão ou abandono da índices de recusa escolar.
criança, ser o último a conseguir Transtornos disruptivos em
algo, ser ridicularizado em classe, crianças são associados também
mudança de casa ou escola, ir ao com mau prognóstico na vida adul-
dentista ou ao hospital, ou, ainda, ta, expresso por um alto risco de de-
possuir alguma diferença marcante. pressão, tentativas de suicídio, abu-
Existem múltiplos determi- so de substâncias e complicações le-
nantes de problemas de comporta- gais. Não há tratamento fármaco-

32
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

lógico bem-estabelecido para TOD intercâmbios interpessoais


ou TC. Foram realizados ensaios po- que são ‘reforçados negative-
sitivos com uso de antipsicóticos tí- mente’. A pesquisa de Patter-
son e seus colaboradores, por
picos e atípicos, lítio, anticonvulsi-
exemplo, demonstra que
vantes e clonidina para agressão ou quando as crianças atuam de
mesmo sintomas de TOD. maneira desafi adora, negativa
O efeito dos estimulantes para e agressiva para com seus pais,
TOD não está tão claramente estabe- tal comportamento frequente-
lecido como seu efeito sobre os sin- mente produz consequências
tomas cardinais de transtorno do favoráveis, como o fim das de-
mandas, a retirada da atenção
déficit de atenção e hiperatividade
não desejável ou a obtenção de
(TDAH), embora muitos estudos in- algo agradável. Como resulta-
diquem que, além de serem eficazes do, esses comportamentos são
para sintomas de TDAH, estas dro- fortalecidos e ocorrerão com
gas ajam sobre sintomas de TOD e maior probabilidade no futu-
sobre a características da criança e ro. Do mesmo modo, quando
dos pais indicam a importância de os pais são severos, punitivos
ou negativos em suas intera-
compreender os intercâmbios recí-
ções com a criança, às vezes
procos nas interações crianças/pais são reforçados, porque esse
no desenvolvimento e manutenção comportamento produz obe-
do TOD”. diência ou elimina uma fonte
Além disso, o autor divide os de irritação (por exemplo, a
fatores de interação pai – criança em criança ‘cede. Com efeito, tan-
to a criança quanto os pais
dois níveis:
aprendem a realizar compor-
 As habilidades parentais defi tamentos negativos e coerciti-
cientes, como não prestar vos quando enfrentam aconte-
atenção a sinais significativos cimentos desagradáveis ou
da criança (por exemplo, aversivos.
quando está claro o mal-
estar), não colocar limites ao
Revela-se, portanto, que os
comportamento impróprio e
não vigiar de forma constante diversos problemas comportamen-
o nível de atividade podem tais que costumam aparecer associa-
funcionar também como acon- dos ao TOD, podem ser influencia-
tecimentos antecedentes que dos por variáveis de natureza diver-
provoquem e mantenham o sa. Estudar os fatores que contri-
desafio. buem para a origem e evolução dos
 As crianças com um TOD e
transtornos de comportamento é
seus pais realizam inúmeros

33
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

importante, de forma a compre- ou, ainda, possuir alguma diferença


ender os processos de adaptação do marcante.
indivíduo no curso da vida e nas Existem múltiplos determi-
sociedades contemporâneas; e dessa nantes de problemas de comporta-
maneira, ter a possibilidade de reali- mento exteriorizado: biológicos, so-
zar um planejamento de programas ciais, cognitivos, acadêmicos, educa-
de prevenção e intervenção, destina- cionais e familiares. Para estes auto-
dos a crianças e jovens com proble- res, os fatores acadêmicos e educa-
mas de comportamento. cionais são, também, tão impor-
O desenvolvimento de condu- tantes quanto os fatores cognitivo-
tas agressivas ao longo da infância e sociais na determinação e evolução
adolescência está sendo alvo de vá- dos comportamentos exteriorizados.
rios estudos que almejam respon- A literatura revela consistência, nes-
der, essencialmente, questões refe- se sentido: Para identificar as causas
rentes à origem e à manutenção da de diversos transtornos psicológi-
agressividade durante a trajetória da cos, devemos analisar a interação de
vida. todas as dimensões relevantes: as
É preciso analisar, ao longo do contribuições genéticas, o papel do
processo de maturação, se essas sistema nervoso, os processos cogni-
crianças apresentam comportamen- tivos e comportamentais, as influen-
tos agressivos. Assim, se essas con- cias emocionais e interpessoais e os
dutas se apresentarem de formas se- fatores de desenvolvimento.
veras e frequentes, então, isto pode- O transtorno desafiador de
rá indicar sinais de psicopatologia. oposição (TOD) é considerado uma
São vários os fatores e situa- condição de difícil tratamento.
ções que podem originar crenças e Crianças com transtorno desafi ador
estados emocionais, que predis- de oposição (TOD) têm mais disfun-
põem às atitudes agressivas. Os ção familiar do que controles psi-
mesmos autores, com base em re- quiátricos e usam mais abordagens
visão da literatura, consideram vá- negativas diante do conflito. Crian-
rias fontes de estresse: perda de um ças com TOD têm taxas de transtor-
dos pais, brigas entre eles, o nas- nos internalizastes altas, são mais
cimento de um irmão, solidão ou rejeitadas por colegas e têm maiores
abandono da criança, ser o último a índices de recusa escolar.
conseguir algo, ser ridicularizado Transtornos disruptivos em
em classe, mudança de casa ou es- crianças são associados também
cola, ir ao dentista ou ao hospital, com mau prognóstico na vida

34
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

adulta, expresso por um alto risco de raiva e ódio; pela via somática, como
depressão, tentativas de suicídio, a apresentação de taquicardia, rosto
abuso de substâncias e complicações ruborizado, além das demais rea-
legais. Não há tratamento fármaco- ções autonômicas; pela via cogniti-
lógico bem-estabelecido para TOD va, através de crenças de conquistas
ou TC. Foram realizados ensaios po- sem que importem os meios, planos
sitivos com uso de antipsicóticos de ação que envolve a manipulação
típicos e atípicos, lítio, anticonvulsi- do meio; e finalmente, a via verbal,
vantes e clonidina para agressão ou da qual o indivíduo vai utilizar-se do
mesmo sintomas de TOD. sentido das palavras para expressar
O efeito dos estimulantes para controle em relação aos outros.
TOD não está tão claramente estabe- Esta abordagem da agressão
lecido como seu efeito sobre os sin- refere-se à agressão instrumental,
tomas cardinais de transtorno do ou seja, aquela que apresenta uma
déficit de atenção e hiperatividade função dentro do ambiente em que
(TDAH), embora muitos estudos in- está sendo utilizada. Isso significa
diquem que, além de serem eficazes que o indivíduo tenta obter o contro-
para sintomas de TDAH, estas dro- le de seu meio através de comporta-
gas ajam sobre sintomas de TOD e mentos agressivos, tais como gritar,
sobre a agressividade. ameaçar, quebrar ou xingar. A partir
desta definição, pode-se observar
Transtorno de Conduta (TC) que, ao longo do processo de matu-
ração, crianças e adolescentes exi-
O desenvolvimento de condu- bem comportamentos agressivos.
tas agressivas ao longo da infância e Entretanto, se essas condutas se
adolescência tem sido alvo de inú- mostram severas e frequentes, elas
meros estudos que pretendem res- podem indicar sinais de psicopatolo-
ponder, basicamente, questões refe- gia.
rentes à origem e à manutenção da Crianças e adolescentes com
agressividade durante o percurso da características agressivas intensas e
vida. O comportamento agressivo é frequentes parecem apresentar pe-
próprio da espécie humana e apre- culiaridades em dois processos fun-
senta múltiplas configurações. Ele damentais. O primeiro deles diz res-
pode ser expresso pela via motora, peito à percepção que esses indiví-
através de movimentos de ataque ou duos possuem de seu ambiente:
fuga; pela via emocional, com a quando comparados a indivíduos
experimentação de sentimentos de não agressivos, eles tendem a atri-

35
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

buir mais intenções hostis aos de- supõe-se que o agressor não reco-
mais, além de se mostrarem mais nhece os sentimentos alheios ou
hipervigilantes e hiper-responsivos pouco se sensibiliza por eles. Além
a esse tipo de estímulo. disso, o desenvolvimento de condu-
Jovens e crianças agressivos tas empáticas e comportamentos
não só superestimam a hostilidade pró-sociais na infância e adolescên-
alheia, mas parecem também subes- cia aparecem como fatores de pre-
timar sua própria agressividade, venção às condutas antissociais.
mostrando que possuem pouca acui- Outro fator que pode ser acres-
dade da percepção de seus próprios centado às investigações sobre as
comportamentos. Esse pode ser um causas da agressividade nos perío-
dos motivos que explicaria o fato de dos da infância e adolescência é a
muitos deles tenderem a apontar os presença de transtornos neuropsi-
pares como causadores dos conflitos quiátricos. Em muitos deles, como
interpessoais. no caso do Transtorno de Déficit de
Além das distorções na inter- Atenção/Hiperatividade, a origem
pretação dos eventos, o processo de das condutas agressivas pode sofrer
solução de problemas parece acon- influência do fator neurobiológico,
tecer de forma diferente em indiví- podendo também ser propiciadas e
duos agressivos. De forma geral, es- mantidas pelo ambiente. Nesse caso,
ses jovens geram uma quantidade o diagnóstico torna-se fundamental
menor de soluções quando compa- para o entendimento e a intervenção
rados àqueles não agressivos. Ou- tanto psicológica quanto psiquiá-
tras evidências têm mostrado, ain- trica.
da, que crianças e adolescentes Dessa maneira, a conduta
agressivos geram menos soluções agressiva parece se manifestar por
verbais e mais respostas não verbais uma série de razões que podem coe-
se comparados aos indivíduos não xistir ou, até mesmo, serem comple-
agressivos. mentares. Algumas vezes, esse pro-
Os dados da literatura acres- cesso se torna complexo e exige que
centam também que déficits em compreendamos a participação de
habilidades empáticas relacionam- múltiplos fatores na formação da
se intimamente às manifestações de agressividade. Tal entendimento
agressividade. Na verdade, a própria pode auxiliar tanto na investigação
definição da conduta agressiva as- quanto no consequente tratamento
lienta que a empatia é deficitá ria: ao de crianças e adolescentes. O objeti-
invocar um dano a outro indivíduo, vo então é promover informações

36
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

relevantes a respeito dos principais Mas o que caracteriza um comporta-


fatores de origem e/ou manutenção mento antissocial? O que parece
dos comportamentos agressivos na descrever a patologia do comporta-
infância e adolescência com a finali- mento antissocial é a existência de
dade de facilitar o diagnóstico e as um padrão consistente dessas con-
intervenções psicológicas e psiquiá- dutas e o grau de prejuízo que elas
tricas. causam aos demais e à sociedade em
Ao longo dos anos, as condutas geral.
antissociais receberam uma série de Os principais transtornos
nomes, incluindo os de delinquên- envolvidos com a expressão de com-
cia, comportamentos exteriorizados portamentos antissociais ou desafia-
e problemas de comportamento. dores são o Transtorno Opositivo
Atualmente, a definição de compor- Desafiador (TOD) e o Transtorno de
tamento antissocial compreende Conduta (TC). O TOD caracteriza-se
qualquer conduta que reflita a viola- especialmente pela presença de con-
ção das regras sociais ou atos contra dutas de oposição, desobediência e
os outros, incluindo comportamen- desafio. Os comportamentos oposi-
tos como roubo, mentiras, vandalis- tivos e desobedientes podem ser
mo e fugas. A expressão agressiva é “passivos”, uma vez que a criança
justamente aquela que invade o di- pode não responder ao pedido, mas
reito alheio, não respeitando os limi- pode apenas permanecer inativa. Os
tes de convivência em sociedade. comportamentos desafiadores, ao
Deste modo, pode-se sugerir que contrário, incluem verbalizações ne-
uma criança que apresenta compor- gativas, hostilidade e resistência
tamentos agressivos, tenderá, com física que podem ocorrer junto com
maior probabilidade, a evoluir para a desobediência.
práticas antissociais. O diagnóstico de TOD tem
É importante ressaltar que sido um preceptor importante para a
crianças e adolescentes podem apre- evolução do problema ao Transtor-
sentar comportamentos agressivos, no de Conduta, sugerindo que haja
desafiadores e antissociais ao longo um contínuo entre estas duas pa-
do desenvolvimento considerado tologias. As condutas das crianças
normal, especialmente em idades com TOD são menos severas do que
pré-escolares e na adolescência. Eles aquelas apresentadas no TC. Além
poderão brigar com os irmãos ou disso, elas não incluem agressão a
com os pares, fazer birras, ou que- pessoas ou animais, destruição de
brar brinquedos e objetos em geral. propriedades ou um padrão de furto

37
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

ou defraudação. O Transtorno Opo- chance do Transtorno evoluir para a


sitivo Desafiador em geral se ma- idade adulta. Finalmente, o papel da
nifesta antes dos oito anos de idade família e de suas características su-
e tem pouca probabilidade de se ini- gere que quanto mais a família
ciar depois do início da adolescên- apresenta condutas antissociais ou
cia. Os sinais opositivos frequente- agressivas pior é o prognóstico da
mente emergem no contexto domés- criança na vida adulta.
tico, mas é comum estender-se a
outras situações.
Em geral, os aspectos do TOD
estão presentes no TC, e não se faz o
diagnóstico de TOD se são satisfei-
tos os critérios para TC. Isso signifi-
ca dizer que o Transtorno de Condu-
ta é um quadro mais amplo e mais
complexo que o TOD.
O curso do TC é estimado se-
gundo uma série de fatores. Crian-
ças que iniciaram precocemente
(antes dos seis anos) os sinais de
comportamento desafiador (prova-
velmente aquelas que receberam o
diagnóstico de TOD durante a
infância) tenderam, em maior pro-
babilidade, a expressarem compor-
tamentos antissociais na vida adul-
ta. Além disso, a amplitude do com-
portamento desviado é relevante:
crianças que apresentam esse tipo
de conduta em casa e na escola
tendem a correr maior risco.
Um terceiro fator diz respeito
às características de frequência, in-
tensidade e diversidade dos compor-
tamentos antissociais. Quanto
maior o número, a gravidade e a
complexidade dos atos, maior é a

38
39
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

4. Fobia Simples ou Fobia Social

Fonte: Perfil4

A fobia social (também conheci-


da como transtorno de ansie-
dade social) é um dos transtornos
em 63 pacientes com diagnóstico de
fobia social, através da Entrevista
Clínica Estruturada para o DSM-IV
mentais mais prevalentes na popu- (versão clínica). Trinta e cinco por
lação geral. A depressão maior é fre- cento dos pacientes apresentaram
quentemente uma complicação na história de pelo menos um episódio
fobia social (generalizada e circuns- depressivo maior. Nesta amostra os
crita). Os autores deste estudo exa- pacientes com fobia social generali-
minaram retrospectivamente o cur- zada e paciente com fobia social cir-
so longitudinal da depressão maior cunscrita apresentaram porcenta-

4 Retirado em https://www.perfil.com/

40
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

gens semelhantes de depressão de oportunidades para seu portador.


maior (37% e 30%, respectivamen- Diversos tratamentos cognitivos
te). Os pacientes com maior incapa- comportamentais e farmacológicos
citação em seu funcionamento pes- demonstraram sua eficácia e estão
soal devido a fobia social apresen- atualmente disponíveis para os pa-
taram mais transtornos depressivos. cientes com fobia social.
As implicações clínicas destes acha- Embora diversos estudos te-
dos são discutidas dentro do contex- nham demonstrado a eficácia dos
to atual do desenvolvimento de sin- tratamentos psicológicos na fobia
tomas depressivos em pacientes social, cada vez menos pacientes
com transtornos de ansiedade. Tam- vêm recebendo esta modalidade de
bém, as implicações para o trata- tratamento. Até onde se sabe aqui no
mento psicológico (intervenções Brasil existem apenas dois estudos
cognitivo-comportamentais) e far- relacionados à terapia de grupo no
macológico são brevemente discuti- tratamento da fobia social generali-
das em pacientes com fobia social e zada.
depressão maior concomitante. Um estudo descreve a terapia
O transtorno de ansiedade so- psicodinâmica de grupo no trata-
cial, popularmente chamado de fo- mento da fobia social generalizada e
bia social ou sociofobia, é um trans- o outro estudo descreve a compara-
torno de ansiedade descrito no ção entre técnicas (treinamento de
DSM-IV, caracterizado por manifes- habilidades sociais versus treina-
tações de alarme, tensão nervosa, mento de habilidades sociais acres-
medo e desconforto desencadeado cido da reestruturação cognitiva) no
pela exposição à avaliação social - o tratamento deste transtorno. A fobia
que ocorre quando o portador pre- social é classificada como um distúr-
cisa interagir com outras pessoas, bio de ansiedade que reflete medo de
realizar desempenhos sob observa- interação e desempenho social.
ção ou participar de atividades so- A timidez, um termo bastante
ciais. utilizado pela população em geral, é
Tudo isso ocorre até o ponto utilizada para situações bastante di-
de interferir na maneira de viver de versas. Serão estes dois conceitos se-
quem a sofre. Confundida com a ti- melhantes e sobreponíveis ou serão
midez, a fobia social é muito mais do duas entidades distintas com carac-
que isso. É um transtorno mental terísticas específicas? Relativamen-
severo que traz sofrimento e perdas te à fobia social é realizada uma re-

41
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

visão dos diferentes critérios de que a consideram prevalente e trata-


diagnóstico, fatores etiológicos am- vel. A TM pode ser considerada uma
bientais e biológicos e dados epide- forma moderada de FS, podendo ser
miológicos com diferenças na inci- a própria FS uma forma severa de
dência e prevalência consoante a TM. A pessoa sente-se desconfortá-
idade, género e o país de origem, vel na presença de desconhecidos,
com as naturais particularidades de- evitando o contato com estes, pen-
pendendo da cultura em que se inse- sando estar sujeita a constante es-
rem os estudos realizados. Conside- crutínio e demonstrando descon-
rando as características clínicas, são fiança, o que leva a um elevado ní-
descritos os sintomas somáticos, vel de stress, a uma limitação subs-
manifestações cognitivas e altera- tancial na vida quotidiana e, por
ções de comportamento característi- isso, a uma redução da qualidade de
cas mas que por vezes se confundem vida.
com a existência de comorbilidade. A FS pode ser considerada o
Diferentes opções de tratamento são medo de situações e interações so-
aqui referidas e há uma reflexão so- ciais. É o medo de ser julgado nega-
bre o impacto da fobia social na so- tivamente pelos outros que leva a
ciedade e, particularmente, na eco- sentimentos de inadequação, emba-
nomia. raço, humilhação e depressão. A
A Timidez (TM) é uma carac- ansiedade causada pela interação
terística bastante comum na popu- social é causada devido a um estimu-
lação e é um termo utilizado para lo considerado ameaçador e as ma-
uma grande diversidade de situa- nifestações clínicas podem englobar
ções. É uma situação comum em de- sintomas somáticos, aspectos cogni-
terminadas fases do ciclo da vida, tivos e alterações no comportamen-
mais propriamente na adolescência. to e desempenho social.
No entanto, na maioria dos casos, O conceito de FS é relativa-
esta vivência é de grau ligeiro e não mente recente e o seu reconheci-
interfere com o funcionamento so- mento como entidade clínica inde-
cial da pessoa e não conduz ao evitar pendente data de meados da década
essas situações. Embora não seja de 60 embora apenas nos anos 80
uma patologia com nomenclatura tenha entrado na nomenclatura
recente, a Fobia Social (FS) tem vin- psiquiátrica, estimando-se que seja
do a receber cada vez maior atenção um distúrbio de ansiedade muito
por parte dos profissionais de saúde comum.

42
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Ao longo dos últimos anos um conceito psicológico bem defini-


tem-se assistido a um aumento de do e a procura de um conceito de
interesse por este distúrbio que é, timidez mais rigoroso leva a que se
por vezes, sub-diagnosticado. Desde considere uma característica de per-
1980 que o conceito está presente no sonalidade ou temperamento. No
Diagnostic and Statistical Manual of entanto, as definições habitualmen-
Mental Disorders, Third Edition (DS te utilizadas para a TM são carac-
M-III), com critérios de diagnóstico terísticas habituais também dos fó-
que incluem o medo excessivo de bicos sociais.
observação ou avaliação em situa- A TM é parte integrante de um
ções de desempenho ou execução espectro, numa linha contínua em
social específicas, excluindo a pre- que num extremo estão os indiví-
sença de distúrbio de personalidade duos sem qualquer stress perante si-
evitada, limitando assim o diagnós- tuações sociais e no outro estão os
tico a situações específicas de de- indivíduos com FS, que é vista como
sempenho. Este critério de exclusão extrema timidez. Os indivíduos com
foi posteriormente retirado, sendo FS têm mais sintomas e são mais
depois reconhecida a existência de afetados pelo seu desconforto pe-
indivíduos que têm dificuldades rante os eventos sociais que os tími-
acentuadas em várias situações, ten- dos e isso é consistente com a noção
do sido introduzido no DSM-III-R o de que a TM é uma condição sub-
subtipo de fobia social generalizada, clínica e um traço de personalidade
que continua presente no DSM-IV. normal, não patológico. Outra visão
Assim, existem dois subtipos é a de que estas duas condições são
reconhecidos, o generalizado e o sobreponíveis, com a TM a repre-
específico, com o primeiro a ser sentar um conceito mais alargado,
diagnosticado se os medos incluírem sendo estas duas condições diferen-
a maioria das situações. tes em vários aspectos mais do que
Timidez ou Fobia Social? variando entre si apenas em grau e
Desde que a FS foi reconhecida intensidade. Ou seja, embora ambas
como um distúrbio psiquiátrico no estejam relacionadas, a maior parte
DSM-III que médicos e investigado- das pessoas consideradas tímidas
res têm teorizado acerca da relação não têm critérios para FS e muitos
entre FS e TM. A FS é bem definida consideram a TM com um traço de
no DSM-IV enquanto a TM continua personalidade que não deve ser con-
a ser um termo menos bem definido, fundido com fobia social.
ainda hoje. A TM não corresponde a

43
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Pode-se considerar também duos sem TM nem qualquer distúr-


que em relação à TM não há uma bio psiquiátrico (n=27). A existência
interferência severa no desempenho de TM foi avaliada por uma escala de
social, pois conseguem focar a aten- timidez, a presença de FS pela exis-
ção na tarefa social ao invés dos fó- tência de critérios para o subtipo
bicos sociais que tendem a focar a generalizado no DSM-IV e outros
atenção em si mesmos, monitori- distúrbios pelo método de entrevista
zando os seus sinais somáticos de CIDI-Auto, versão 2.1 Foram avalia-
ansiedade e o seu desempenho, que dos sintomas somáticos, cognitivos
sofre interferência severa. Num es- e tarefas de desempenho social.
tudo de baseado numa amostra de Foi concluído que o primeiro
2202 pessoas, chegou se à conclusão grupo evidenciava mais sintomas
que a percentagem de fóbicos era que o segundo e este mais que o ter-
maior num grupo de indivíduos ceiro grupo (maior número de me-
classificados como muito tímidos dos sociais - 100% vs 65,4% vs 25,
comparada com a do grupo dos tími- 9%, evitamento - 96% vs 50,0% vs
dos moderados, apoiando a hipótese 7,4% e sintomas somáticos - 100% vs
da existência de um espectro, um 65,4% vs 22,2%).
contínuo. Apesar disso, nesse pri- Para além disso, os fóbicos
meiro grupo apenas metade dos ele- sociais apresentavam maior percep-
mentos tinha FS generalizada, uma ção dos sintomas somáticos e maior
quantidade menor que a inicial- limitação nas atividades quotidianas
mente esperada. Este estudo mostra do que os indivíduos considerados
que maiores graus ou níveis de TM apenas tímidos, assim como apre-
estão associados a maior prevalência sentavam menor competência no
de FS mas que as duas condições não desempenho social. Os resultados
são a mesma, estando a TM mais deste estudo, em que houve uma va-
intimamente associada ao subtipo riação mais quantitativa que quali-
generalizado da FS. tativa das manifestações (a título de
Noutro estudo realizado, uma exemplo, o tipo de medos avaliados
amostra de 78 indivíduos foi dividi- era tão comum como o medo de falar
da em 3 grupos: um com indivíduos em entrevistas, aulas, em público ou
tímidos com diagnóstico de FS (n= a presença em festas), foram consis-
25), um com pessoas tímidas sem FS tente com a hipótese de um espectro,
ou outros distúrbios psiquiátricos em que a FS é um extremo de uma
(n=26) e outro composto por indiví- linha onde também se encontra a

44
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

TM. No entanto, os resultados en- tato visual e inibição do compor-


contrados entre os tímidos, em que tamento social normalmente espe-
alguns revelaram múltiplos medos rado.
sociais enquanto outros não indica- Distingue dois subtipos, a TM
ram nenhum demonstra alguma he- medrosa de desenvolvimento preco-
terogeneidade dentro da população ce que é uma TM de início precoce,
de tímidos. Não se deve, no entanto, no primeiro ano de vida, associada a
ver a TM como uma situação predisposição genética, e uma TM
anormal ou uma condição prépa- por consciência de si mesmo, de
tológica. início mais tardio, relacionada com
A TM tem até vantagens: as o desenvolvimento de cognições
pessoas discretas e introspectivas acerca de si mesmo e com as práticas
conseguem preservar melhor a sua de socialização.
intimidade, disfrutam dos prazeres Critérios de Diagnóstico do
da solidão, geralmente não intimi- DSM-IV-TR para a fobia social/dis-
dam ou incomodam outros,evitam túrbio de ansiedade social:
conflitos, observam, atuam cautelo-  Medo intenso e persistente de
samente e são bons ouvintes. Este uma ou mais situações sociais
autor identificou três subgrupos de ou de desempenho nas quais o
tímidos: os que não receiam a in- indivíduo está exposto a pes-
soas desconhecidas ou ao pos-
teração social, apenas têm preferên-
sível escrutínio de outros. O
cia por estarem sozinhos; os que têm sujeito receita comportar-se
baixa autoconfiança, competências (ou mostrar sintomas de an-
sociais fracas e que se sentem emba- siedade) de modo humilhante
raçados na presença dos outros; os ou embaraçoso. Nota:
que se mostram preocupados com a  Nas crianças, deve existir evi-
possibilidade de se comportarem de dência da capacidade, apro-
priada à idade, de relaciona-
forma inadequada em situações so-
mento social com pessoas fa-
ciais, auto avaliando o seu compor- miliares e a ansiedade deve
tamento social e apresentando baixa ocorrer em contextos com os
frequência de encontros sociais defi- pares, não apenas em intera-
ne TM como uma reação originada ções com os adultos.
pela presença de estranhos ou co-  A exposição às situações so-
nhecidos pouco familiares e é ca- ciais receadas provoca quase
sempre ansiedade, a qual pode
racterizada por tensão, preocupa-
tomar a forma ou predispor
ção, sentimentos de embaraço e des- situacionalmente a um ataque
conforto, assim como desvio do con- de pânico. Nota: Nas crianças,

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

a ansiedade pode ser expressa  Se uma condição física ou ou-


através de choro, birras ou fi- tro distúrbio mental estiverem
carem mobilizadas ou encolhi- presentes, o medo do critério
das, sem situações sociais com A não está relacionado com
pessoas não familiares. eles; por exemplo, não é medo
 O indivíduo reconhece que o relacionado com gaguejar (ga-
medo é excessivo ou irracio- guez), de tremer (doença de
nal. Nota: Nas crianças, este Parkinson) ou de exibir um
aspecto pode estar ausente. comportamento alimentar
 As situações sociais ou de de- anormal (anorexia ou bulimia
sempenho receadas são evita- nervosa).
das ou enfrentadas com inten-
sa ansiedade ou desconforto. Situações ainda em estudo.
 O evitamento, a ansiedade an- Diagnóstico de fobia social segundo
tecipatória ou o desconforto a ICD-10 As fobias sociais aparecem
nas situações sociais ou de de-
frequentemente na adolescência e
sempenho, interferem signifi-
cativamente com a rotina nor- centram-se no medo do escrutínio
mal do indivíduo, com o seu por outras pessoas, em grupos com-
funcionamento ocupacional parativamente pequenos (por oposi-
(ou académico), com as ativi- ção a multidões), levando ao evita-
dades ou relações sociais, ou mento de situações sociais. Ao con-
existe um mal-estar intenso trário de outras fobias, as fobias so-
devido à fobia.
ciais são igualmente comuns em ho-
 Em sujeitos com menos de 18
anos de idade, a duração é de mens e mulheres. Estas podem ser
pelo menos 6 meses. específicas (comer em público, falar
 O medo ou evitamento não é em público, ou encontros com o sexo
devido a efeitos fisiológicos oposto) ou difusas, envolvendo qua-
duma substância (por exem- se todas as situações sociais fora do
plo, abuso de droga, um medi- círculo familiar. O medo de vomitar
camento) ou a uma condição em público pode ser importante. O
física geral e não é mais bem
contato em nível do olhar pode ser
explicada por nenhum outro
distúrbio mental (por exem- bastante estressante em algumas
plo, distúrbio de pânico com culturas. Fobias sociais estão nor-
ou sem agorafobia, ansiedade malmente associadas a fraca autoes-
de separação, distúrbio dis- tima e medo de crítica. As queixas
mórfico corporal, um distúr- poderão ser de corar, tremor das
bio desenvolvimental pervasi- mãos, náuseas, ou urgência de uri-
vo ou distúrbio de personali-
dade esquizóide).

46
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

nar ou defecar, levando por vezes a condicionamento clássico. Para,


pessoa a convencer-se que algum além disso, essa relação familiar po-
destes sintomas secundários de de ser vista na perspectiva de con-
ansiedade, é o problema principal; tato com adultos com distúrbios
estes sintomas podem evoluir para ansiosos, de acordo com a teoria de
ataques de pânico. aprendizagem social de um estudo
Os evitamentos das situações prospectivo de 2 anos com adoles-
de ansiedade são frequentemente centes dos 14 aos 17 anos (n = 1047)
fortes, e em casos extremos podem permitiu concluir que proteção
resultar num completo isolamento exagerada, falta de afeto ou rejeição
social. Família Uma questão impor- dos progenitores são razões apon-
tante é a de saber qual o papel do tadas como fatores de risco para FS
meio familiar, nomeadamente dos assim como distúrbios mentais dos
pais, no aparecimento de ansiedade pais (ansiosos, depressivos ou abuso
social nos filhos. Está descrito que a de álcool ou drogas).
educação dada e a interação pais-fi- Em outro estudo mais recente
lhos são importantes com um am- partiu de uma amostra de 3021
biente disfuncional familiar a ter indivíduos com follow-up de 10
relação com o aumento de probabili- anos, sendo analisados nessa altura
dade de ter doença. Sabe-se que os 1395 indivíduos. Ao fim desse tempo
pais com distúrbios ansiosos apre- a incidência cumulativa tinha sido
sentam maiores níveis de stress e de 8,7%, com maior predominância
maior preocupação acerca dos filhos de mulheres (10%) em relação aos
e das suas atividades, exercendo um homens (7,4%), sendo 25% dos
efeito negativo e inibindo o compor- casos do subtipo generalizado (dos
tamento destes e a sua socialização. 23 casos verificados, apenas 3 não
Isso leva a predisposição para com- tinham pais com FS, outros distúr-
portamentos ansiosos no futuro. A bios ansiosos, depressão ou alcoolis-
aprendizagem por observação e imi- mo). Os filhos de pais com FS eram
tação dos modelos, que neste caso mais afetados do que a descendência
são os pais, também pode ser impor- de indivíduos sem distúrbios men-
tante. tais (incidência de 13,2% contra
Experiências sociais traumáti- 4,2%). Os filhos de indivíduos afeta-
cas que despertem medo ou ansie- dos por distúrbios ansiosos, depres-
dade elevada podem conduzir ao de- são ou abuso de álcool apresenta-
senvolvimento de fobia através do vam incidência de 10,5-11,7%.

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

Neste estudo também se veri- familiares poderá indicar alvos po-


ficou a relação da rejeição, falta de tenciais para implementação de pro-
afeto ou proteção exagerada no gramas de prevenção para a FS, in-
aumento de incidência de FS, ava- tervindo mais precocemente, alte-
liado com base no Questionaire of rando assim quer a incidência, quer
Recalled Parental Rearing Beha- o curso ou sequelas desta patologia
viour (FEE). Com recurso a outro nos vários membros da família.
questionário, o McMaster Family
Assessment Device (FAD) verificou-
se que os progenitores com FS,
avaliada pelos filhos, estavam na
base de um pior funcionamento
familiar.

Fonte: https://leiturinha.com.br/

Sabe-se que o aparecimento


da doença pode também estar rela-
cionada com a falta de relaciona-
mento com um adulto na infância,
não ser filho varão, conflitos matri-
moniais na família, pais com histó-
ria de distúrbios psiquiátricos, mu-
dança de habitação mais de 3 vezes
na infância, assim com abuso físico
ou psicológico, insucesso escolar ou
necessidade de ensino especial antes
dos 9 anos. Os próprios fatores de
risco dos pais podem estar associa-
dos a um maior risco nos filhos. A
identificação dos fatores de risco

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

5. Depressão Infantil

Fonte: Psicólogo e Terapia5

A depressão infantil é caracteri-


zada pela presença dos seguin-
tes sinais e sintomas, os quais po-
compreendidos como entidades fe-
nomenológicas iguais, fato derivado
de pesquisas que definiram que os
dem se apresentar de forma masca- mesmos critérios diagnósticos são
rada: baixo desempenho escolar, confiavelmente aplicados nestas três
pouca capacidade para se divertir faixas etárias. Segundo o Manual
(anedonia), sonolência ou insônia, Diagnóstico e Estatístico de Trans-
mudança no padrão alimentar, fadi- tornos Mentais (DSM-IV), os sinto-
ga excessiva, queixas físicas, irritabi- mas básicos de um episódio depres-
lidade, sentimentos. sivo maior, são os mesmos em adul-
tos, adolescentes e crianças, embora
Quadro Clinico existam dados sugerindo que a pre-
Na atualidade, os transtornos dominância de sintomas caracterís-
depressivos em crianças e adoles- ticos pode mudar com a idade, ci-
centes e aqueles em adultos são tando sintomas muito comuns em
crianças (queixas somáticas, irrita-

5 Retirado em https://www.psicologoeterapia.com.br/

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

bilidade e retraimento social) e sin- maturação das diferentes fases do


tomas menos comuns em crianças desenvolvimento nos sintomas e
(retardo psicomotor, hipersonia e comportamentos depressivos, exis-
delírios). Sintomas do Episódio De- tindo uma caracterização sintoma-
pressivo Maior - DSM - IV: tológica predominante por faixa etá-
 Humor deprimido ou irritável; ria. Em crianças pré-escolares (ida-
 Interesse ou prazer acentua- de até seis a sete anos), a manifesta-
damente diminuídos; ção clínica mais comum é represen-
 Perda ou ganho significativo tada pelos sintomas físicos, tais co-
de peso, ou diminuição ou au- mo dores (principalmente de cabeça
mento de apetite;
e abdominais), fadiga e tontura.
 Insônia ou hipersonia;
Goodyer cita que aproximada-
 Agitação ou retardo psico-
motor; mente 70% dos casos de depressão
 Fadiga ou perda de energia; maior em crianças apresentam quei-
 Sentimento de inutilidade ou xas físicas. As queixas de sintomas
culpa excessiva ou inade- físicos são seguidas por ansiedade
quada; (especialmente ansiedade de sepa-
 Capacidade diminuída de pen- ração), fobias, agitação psicomotora
sar ou concentrar-se, ou inde- ou hiperatividade, irritabilidade,
cisão;
diminuição do apetite com falha em
 Pensamentos de morte recor-
alcançar o peso adequado, e altera-
rentes, ideação suicida, tenta-
tiva ou plano suicida. ções do sono. Alguns autores ainda
citam, com menor frequência, a
Já a Classificação Internacio- ocorrência de enurese e encoprese,
nal das Doenças (CID-10) lida com fisionomia triste, comunicação defi-
os transtornos depressivos de forma ciente, choro frequente, movimen-
idêntica em todos os grupos etários, tos repetitivos e auto e agressividade
com apenas a seguinte citação espe- na forma de comportamento agres-
cífica apresentações atípicas são sivo e destrutivo. O prazer de brincar
particularmente comuns no episó- ou ir para a pré-escola diminui ou
dio depressivo na adolescência, mas desaparece e as aquisições de habili-
não fornece maiores esclarecimen- dades sociais próprias da idade não
tos.A maioria dos autores na área ocorrem naturalmente. Sintomas de
dos transtornos depressivos na in- Depressão em Crianças Pré-esco-
fância e adolescência cita que os sin- lares:
tomas variam com a idade, desta-  Dores (de cabeça e abdomi-
cando a importância do processo de nais);

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

 Prazer de brincar e ir à pré- to, declínio ou desempenho escolar


escola diminuído; fraco, podendo chegar à recusa esco-
 Dificuldade nas aquisições de lar, ansiedade de separação, fobias e
habilidades sociais da idade; desejo de morrer. Também podem
 Ansiedade; relatar concentração fraca, queixas
 Fobias; somáticas, perda de peso, insônia e
 Agitação ou hiperatividade;
sintomas psicóticos humor-con-
 Irritabilidade;
gruente (alucinações auditivas de-
 Diminuição do apetite;
 Alterações de sono. preciativas e, menos frequentemen-
te, delírios de culpa e pecado).
Embora a maioria dos autores O declínio no desempenho po-
afirma que neste período não ocor- de dever-se à fraca concentração ou
rem ideação ou tentativas de suicí- interesse, próprios do quadro de-
dio, Shaffi e Shaffi destacam que o pressivo. É comum a criança não ter
comportamento autodestrutivo na amigos, dizer queos colegas não gos-
forma de bater a cabeça severa e re- tam dela ou apresentar um apego
petidamente, morder-se, engolir ob- exclusivo e excessivo a animais. Ina-
jetos perigosos e a propensão a aci- bilidade em se divertir (anedonia),
dentes pode ser um equivalente sui- pobre relacionamento com seus pa-
cida em crianças que não verbalizam res e baixa autoestima, se descrê-
emoções. Entretanto, a ideação sui- vendo como estúpidas, bobas ou im-
cida nesta faixa etária é considerada populares também podem estar pre-
de ocorrência rara, podendo ocorrer sentes. Sintomas de Depressão em
em casos especiais. Crianças Escolares:
Quanto às famílias, estudos  Tristeza, irritabilidade e/ou
norte-americanos realizados com tédio;
crianças pré-escolares com depres-  Falta de habilidade em se di-
vertir;
são encontraram frequentemente
 Aparência triste;
pais também com depressão e envol-  Choro fácil;
vidos em graves problemas sociais.  Fadiga;
Em crianças escolares (idade entre  Isolamento com fraco relacio-
seis a sete anos até doze anos), o hu- namento com seus pares;
mor depressivo já pode ser verbali-  Baixa auto-estima;
zado e é frequentemente relatado  Declínio ou desempranho es-
como tristeza, irritabilidade ou té- colar fraco;
dio. Apresentam aparência triste,  Ansiedade de separação;
choro fácil, apatia, fadiga, isolamen-  Fobias;

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TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

 Desejo ou fantasias de morte. mento e a prevenção da cronificação


do problema. Nesse sentido, é indis-
É importante destacar que os cutível a relevância de se empreen-
professores são frequentemente os der esforços que possam investigar
primeiros a perceber as modifica- sistematicamente a depressão infan-
ções decorrentes da depressão nes- til, principalmente em razão da ine-
sas crianças. Em pesquisa sobre o ficácia dos diagnósticos e ao fato de
rendimento escolar em crianças de que poucos pacientes recebem trata-
nove a doze anos com sintomas de- mento adequado, tornando-se, as-
pressivos, de uma escola particular sim, um grande desafio para a saúde
na cidade do Recife PE, Bandim et pública. É possível constatar a gran-
al. obtiveram como resultado um de concentração de estudos que bus-
prejuízo significativo no desempe- cam investigar a identificação da
nho escolar em todas as matérias, sintomatologia da depressão e sua
principalmente em Português e prevalência, mas ainda são raros os
Ciências, quando comparados com estudos que se voltam às interven-
crianças sem sintomas depressivos. ções, sobretudo, àquelas psicanalíti-
Tanto em crianças pré-escolares co- camente orientadas. Verificam-se as
mo nas escolares a depressão pode lacunas existentes também no que
tornar-se clara através da observa- tange à eficácia dos tratamentos pa-
ção dos temas das fantasias, desejos, ra a depressão em crianças e adoles-
sonhos, brincadeiras e jogos, com os centes, já que uma grande preocupa-
conteúdos predominantes de fracas- ção é a necessidade de compreender
so, frustração, destruição, ferimen- melhor as etapas do desenvolvimen-
tos, perdas ou abandonos, culpa, to, para que se possa adequar me-
excesso de autocríticas e morte. lhores recursos de avaliação e trata-
Ainda que haja concordância mento na infância. Também seria
entre os autores acerca da importân- importante compreender mais pro-
cia e gravidade da depressão na in- fundamente os contextos familiares,
fância, que pode predizer ou estar suas dificuldades e possibilidades.
associada a outras patologias, ainda Constata-se, ainda, uma carência
assim não existe um consenso sobre importante de estudos dedicados à
a definição ou conceptualização da discussão e ao desenvolvimento de
depressão nessa faixa etária. A falta estratégias de prevenção, bem como
de tais definições coloca em dúvida, no sentido da elaboração de dire-
muitas vezes, seu diagnóstico, o que, trizes políticas para o enfrentamen-
consequentemente, dificulta o trata- to desse problema.

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54
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS DA INFÂNCIA

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