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TEMAS

ESPECIAIS PARA DEFENSORIA


ESTADUAL

EXECUÇÃO PENAL

Perspectivas críticas da lei das execuções penais e a


visão da Defensoria Pública

A execução penal é a relação jurídica que se estabelece entre o Estado, detentor


exclusivo do direito de punir, e a pessoa que foi declarada culpada em sentença penal
condenatória.

Última etapa da persecução penal, a execução da pena não pode se afastar dos
princípios constitucionais e legais que regem o poder punitivo estatal.

Princípios esses que – sob a ótica do Estado Democrático de Direito, fundado pela
ordem constitucional de 1988 – colocam o ser humano no centro do ordenamento
jurídico, pois a promoção da dignidade da pessoa humana é o objetivo da República.

Promover a dignidade da pessoa humana nada mais é do que possibilitar que a pessoa
desenvolva os atributos de sua personalidade em toda sua potencialidade.

O cumprimento desse mandamento constitucional cabe precipuamente ao Estado,


mediante a concretização dos direitos fundamentais, embora nas relações particulares
a eficácia horizontal desses direitos também se impõe.

Durante a execução da pena, o condenado não perde a sua qualidade de ser humano,
ou seja, de sujeito de direitos, titular de direitos e de obrigações. A restrição dos
direitos do sentenciado se limita unicamente àquilo que for necessário para o

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cumprimento da pena.

Assim, os princípios da execução da pena são aqueles que asseguram ao sentenciado a


preservação de sua dignidade enquanto ser humano e que devem ser observados,
notadamente, pelo Estado, titular da pretensão executória-punitiva.

O primeiro princípio da execução penal a ser destacado é o da humanização das penas,


corolário do princípio da dignidade da pessoa humana. O valor da pessoa humana do
condenado deve prevalecer em face da pretensão punitiva do Estado.

O princípio da humanização das penas não pode ser reduzido à previsão


constitucional que veda as penas cruéis (art. 5º, XLII, CF/1988), mas deve ser
observado na concreta execução da sanção penal.

A violação desse princípio não se limita aos notórios casos de superlotação de presídios,
de falta a direitos básicos do sentenciado, como saúde, mas também a fatos graves,
como o alojamento de presos em containers, fato que já ocorrera no Pará e no Espírito
Santo, o que já ensejou denúncias contra o Brasil em Cortes Internacionais de Direitos
Humanos. Não obstante tais denúncias, a prática voltou a ser sugerida recentemente,
como medida preventiva à pandemia causada por coronavírus.

Outro princípio que se coloca na execução da pena é o da legalidade, inerente a um


Estado Democrático de Direito, porquanto limita o poder estatal.

Pelo princípio da legalidade, na execução da pena, o Estado não pode limitar direitos do
sentenciado, senão apenas aqueles atingidos pela sentença penal condenatória ou pela
lei.

Desse modo, as normas internas dos presídios, de natureza administrativa, não podem
inovar a ordem jurídica, notadamente, no que tange à previsão de faltas e respectivas
sanções, sob pena de violação à ordem jurídica.

A legalidade na execução da pena deve coibir o excesso ou desvio da execução, pois os


agentes estatais ficam vinculados à sentença penal condenatória transitada em julgado,
título executivo a que estão adstritos.

Ainda como princípio da execução penal tem-se o princípio da personalização, pelo


qual o cumprimento da sanção penal deve-se dar de forma individualizada, de acordo
com a personalidade do sentenciado.

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Dessa maneira, não se admite, no ordenamento jurídico brasileiro, a execução de pena
que se dê de forma coletiva, tal como, corriqueiramente, ocorre em sanções coletivas,
como, por exemplo, ocorre no fato de se encontrar um objeto ilícito dentro da cela e,
como não se encontra quem infringiu a disciplina, aplicam-se sanções a todos os presos
daquela cela.

Como o princípio da personalização se concentra na personalidade do sentenciado, a


legislação brasileira prevê o denominado exame criminológico, o qual, contudo, não
pode ser usado como forma de estigmatizar a pessoa do condenado, mas, se admite,
como maneira de promover a sua volta ao convívio social após o cumprimento da pena.

Como corolário do princípio da personalização, há os princípios da


proporcionalidade e da isonomia, os quais impedem condutas discriminatórias na
execução da pena, não devendo os presos serem tratados de forma diferente em razão
de sua origem, sexo, raça, cor e, até mesmo, pela gravidade do crime que tenha
praticado, que já fora objeto de apreciação, abstratamente, pelo legislador ao cominar a
pena, e, concretamente, pelo juiz ao aplicar a pena.

Também o princípio do devido processo legal se aplica à execução penal, a realçar


que a execução penal exige a interferência do Judiciário. A atuação administrativa deve
ser mínima, prevalecendo a intervenção do juiz.

Por fim, há de se destacar o princípio da não marginalização. Não há como negar


que o cárcere gera danos incontornáveis ao sentenciado, os quais, contudo, devem ser
mitigados.

Com isso e dado o contorno constitucional de que o Estado deve promover o princípio
da dignidade da pessoa humana, como já salientado, a execução da pena não deve ter
como prisma afastar o sentenciado do meio social, mas promover a sua reintegração à
sociedade.

Esses são alguns dos princípios que devem reger a execução da pena no ordenamento
jurídico brasileiro.

A atuação institucional da Defensoria Pública (DP) deve ser pautada nesses princípios,
de acordo com as suas funções constitucional e legalmente estabelecidas.

Para além de uma percepção filosófica, teórica-jurídica, constitucional e processual


penal, os princípios, na execução da pena, devem ser analisados sob a seguinte

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perspectiva:

Os princípios (...) possuem dois sentidos complementares:


primeiramente, ser um ponto de inflexão do processo de sistematização,
revisão, reflexão e proposição de caminhos, tendo como base o histórico
acumulado, os avanços e entraves presentes no campo (...). Princípio,
dessa forma, não é um começo; é uma parada, uma panorâmica que se
estabelece sobre o campo. Complementando, compreende-se um
princípio como um fundamento, o qual, sendo assim, carrega consigo um
conjunto de representações de ordem epistemológica, empírica e
relacional. Assentados em conceitos, teorias e dinâmicas do campo de
intervenção, os princípios aqui apresentados condensam processos de
alta complexidade, cuja síntese tem por objetivo permitir os
desdobramentos daquelas representações em orientações práticas sobre
alguns caminhos a seguir (MELO, 2016).

Assim, a atuação da DP há de se pautar nos princípios da execução da pena, não de


uma maneira meramente abstrata, mas de forma a produzir efeitos concretos na
operação e na gestão do sistema carcerário do Brasil.

Produzir efeitos concretos no caótico sistema penitenciário brasileiro implica atuação


institucional da DP, no sentido de diminuir a incidência do poder punitivo do Estado,
diminuir o tempo de encarceramento, se este se mostrar inevitável, garantir ao preso
acesso aos direitos fundamentais de que é titular e evitar o agravamento da condições
de encarceramento.

Obra coletiva do Curso Ênfase produzida a partir da análise estatística de incidência


dos temas em provas de concursos públicos.
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