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Índice

Adaptações maternas à gravidez.........................................................................página 2


Semiologia obstétrica e assistência pré-natal.......................................................página 9
Anatomia pélvica e estática fetal........................................................................página 17
Mecanismo do parto...........................................................................................página 29
Assistência ao parto vaginal e ao parto operatório.............................................página 34
Lactação............................................................................................................página 50
Avaliação da vitalidade fetal...............................................................................página 59
Puerpério...........................................................................................................página 66
Hemorragias da primeira metade da gestação...................................................página 80
Gravidez gemelar...............................................................................................página 93
Hemorragias da segunda metade da gestação................................................página 103
Parto pré-termo................................................................................................página 114
HIV na gestação...............................................................................................página 119
Síndromes hipertensivas gestacionais.............................................................página 126
Doença hemolítica perinatal.............................................................................página 131
Diabetes gestacional........................................................................................página 133

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 1


Adaptações maternas à
gravidez
As modificações advindas da nidação ovular e de sua evolução são fruto da
adequada adaptação do binômio materno-fetal após a aceitação de elementos paternos
pelo organismo materno. Elas são locais, sistêmicas, anatômicas, fisiológicas e
bioquímicas.

Útero e estruturas adjacentes

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Modificações locais

Vulva e vagina
▪ Tumefação/hipertrofia dos músculos lisos: produção de hormônio pelo corpo
lúteo
▪ Consistência amolecida (afrouxamento
do tecido conjuntivo)
▪ Tonalidade arroxeada (aumento da
vascularização)
o Vulva e parede vaginal: sinal de
Jacquemier ou Chawdick (após a
8ª semana)
o Colo: sinal de Kluge (após a 8ª
semana)
▪ Espessamento da mucosa vaginal
▪ Pulsação em fundo de saco lateral: sinal de Osiander – no toque vaginal
bidigital/bimanual, estruturas ao redor do colo que por ação hormonal e
vasodilatação, há pulsação desde o início da gravidez (não é via de regra)

Colo do útero
▪ Sinal de Kluge
▪ Consistência amolecida: sinal de Goodell
▪ Eversão do epitélio colunar: ectrópio > hiperplasia e hipertrofia de glândulas
cervicais > a ectocérvice fica friável e sangrante ao menor traumatismo. O
epitélio colunar avança da endocérvice para a ectocérvice que era epitélio
escamoso. Algumas mulheres descobrem a gravidez por relação sexual que
sangra.

Útero
▪ Diminuição da consistência (especialmente do istmo; região acima do colo): sinal
de Hegar / consistência de pudim
▪ Aumento assimétrico (maior no local da nidação): sinal de Piskacek /
abaulamento
▪ Mudança da forma piriforme para globosa (preenchimento nos fundos de saco
laterais): sinal de Nobile-Budin

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▪ Percepção do feto ao mobilizar o útero com o dedo examinador, a partir de 16
semanas: sinal de Puzzos (rechaço fetal)

Mamas
▪ Aumento do volume a partir de 5-6 semanas (hiperplasia dos elementos
glandulares) podendo ficar túrgidas e dolorosas
▪ Surgimento de delicadas veias abaixo da pele: rede de Haller
▪ Aumento da pigmentação dos mamilos e aréolas: sinal de Hunter
▪ Hipertrofia das glândulas sebáceas periareolares: tubérculos de Montgomery

Rede de Haller Sinal de Hunter

Tubérculos de Montgomery

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Modificações sistêmicas

As modificações sistêmicas são resultado do efeito mecânico provocado pelo


útero em crescimento e do efeito hormonal, em especial da progesterona, sobre o
organismo materno.

Postura e marcha
▪ Deslocamento anterior do centro
gravitacional do corpo (peso adicional
do útero, do feto, dos anexos e das
mamas)
▪ Alteração postural de forma
compensatória
o Lordose lombar acentuada: a
paciente joga o corpo para trás
o Marcha anserina
(deambulação dos gansos):
ampliação da base de
sustentação, andar oscilante,
passos curtos e lentos
▪ Flexão mantida do pescoço: dor cervical

Pele
▪ Hiperpigmentação: linha alba do abdome (linha nigra), cicatriz umbilical, face e
pescoço (cloasma gravídico ou melasma gravidarum)
▪ Aumento da vascularização da pele: eritema palmar, eritema plantar,
telangiectasias
▪ Estrias: alteração do colágeno e hiperdistensão da pele

Metabolismo dos carboidratos


▪ Hipoglicemia de jejum: parasitismo verdadeiro
▪ Hiperinsulinemia: hiperplasia e hipertrofia de células beta pancreáticas
▪ Hormônio lactogênio placentário (HPL) na segunda metade: aumento da
resistência periférica a insulina > diminuição do consumo celular de glicose >
hiperglicemia pós-prandial

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▪ A gestação é um estado potencialmente diabetogênico

Metabolismo dos lipídeos


Para preservar a glicose para o feto e para o próprio SNC materno, os
lipídeos sofrem alterações.
▪ Níveis elevados de glucagon, adrenalina, GH e HPL favorecem a lipólise
▪ Aumento da lipólise > aumento da concentração de ácidos graxos plasmáticos
> principal fonte de energia materna > tendência a cetose

Metabolismo das proteínas


▪ Aumento da síntese proteica para desenvolvimento fetal e das estruturas
maternas
▪ Aumento da utilização dos aminoácidos > diminuição da concentração
plasmática
▪ Aumento das proteínas totais (valor absoluto), porém, pela hemodiluição, estão
em concentração plasmática diminuída

Metabolismo hidroeletrolítico
▪ Aumento da volemia materna: mais ou menos 7,5L de água
▪ Aumento da quantidade de sódio e água mediada pelo SRAA:
hiperaldosteronismo secundário da gravidez
“Faz-se necessário o ajuste contínuo do volume sanguíneo materno ao aumento do leito
vascular para garantir que uma corrente sanguínea adequada e abundante alcance o
ventrículo esquerdo a todo momento.” (Gauer e Henry, 1976)

Alterações hematológicas
▪ Necessidade de ferro e ácido fólico: incremento da demanda
▪ Aumento do volume das hemácias (33%) com diminuição da concentração
sanguínea
▪ Aumento do volume plasmático em 45%
▪ Aumento da hemodiluição > diminuição da concentração final de hematócrito e
hemoglobina (costumam ser normais no primeiro trimestre e depois decaem)
▪ Leucocitose sem desvio (ppm a conta dos neutrófilos) – até 18.000 é
considerado normal
▪ Aumento de VHS
▪ Diminuição da resposta imune: propensão a infecções
▪ Aumento de fibrinogênio e outros fatores coagulantes: estado crônico de CIVD,
onde a síntese excede o consumo – explicado para evitar hemorragia no parto

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Alterações circulatórias
▪ ↑ FC repouso – 10 a 15 bpm
▪ ↑ Rendimento cardíaco em 30 a 40% (↑ volume
sistólico)
▪ Eleva-se o diafragma – desvio lateral esquerdo
do coração
▪ ↑ AE, VE e massa cardíaca
Durante toda a gestação, também é
▪ ↓ PA (2° trimestre) ↓ PAD > ↓ PAS – a considerado normal o aparecimento
progesterona faz vasodilatação, explicando essa de um sopro sistólico em foco
redução aórtico (assim como no neonato).
▪ Síndrome de hipotensão supina: em decúbito Isso se deve ao aumento da volemia
causado pela vasodilatação (ação da
dorsal e decúbito lateral direito, por compressão progesterona), promovendo um
da VCI pelo útero → ↓ rendimento cardíaco → maior fluxo de sangue do átrio para o
Lipotímia ventrículo, exercendo força na valva.
▪ ↑ Pressão Venosa: Edema e varizes de MMII /
hemorroidas

Alterações do aparelho respiratório


▪ Aumento da ventilação: respiração mais profunda sem alterar o número de
incursões por minuto – dispneia fisiológica
▪ Aumento do volume corrente de 500 a 700mL/min
▪ Redução do volume residual pulmonar
▪ Hiperventilação: aumento da pO2 e diminuição da pCO2 = alcalose respiratória
compensada = aumento do pH sanguíneo

Alterações do aparelho urinário


▪ Elevação fluxo plasmático renal e da taxa filtração glomerular (30- 50%)
▪ Diminuição da concentração plasmática de ureia e creatinina
▪ Glicosúria (filtração de glicose ↑ 50%) e aminoacidúria

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▪ Hipotonia e hipomotilidade da pelve renal, ureteres e bexiga: ação de
prostaciclinas e progesterona
▪ Maior dilatação da pelve renal à direita: dextro-desvio uterino
▪ Predisposição à ITU: retardo do fluxo urinário e diminuição da imunidade
▪ Polaciúria (1° e 3° trimestre)
▪ Incontinência urinária: alteração posição vesical e afrouxamento dos tecidos
assoalho pélvico

Nas grávidas ou mulheres com


suspeita de gravidez, recomenda-
se solicitar EAS, urinocultura e
sensibilidade aos antibióticos, pois
as infecções urinárias são muito
recorrentes e perigosas.

Alterações do aparelho gastrintestinal


▪ Náuseas e vômitos no primeiro trimestre: devido a aumento de estrogênios?
▪ Gengivas hiperemiadas e friáveis
▪ Aumento do apetite, da sede e da salivação
▪ Diminuição do peristaltismo
o Esvaziamento gástrico lento > eructação
o Constipação
▪ Hipotonia e hipoatividade da vesícula biliar: propensão a litíase
▪ Pirose: aumento da pressão intra-abdominal e relaxamento do esfíncter
esofagiano

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Semiologia obstétrica e
assistência pré-natal
Definição

É o conjunto de medidas preventivas e curativas, com o fim de proporcionar


condições de bem-estar físico, mental e social durante a gestação e assegurar o
nascimento de uma criança saudável, com risco mínimo para a mãe. Tem como
objetivos:
➔ Estratificação do risco gestacional.
➔ Avaliação contínua do bem-estar materno e fetal.
➔ Identificação de problemas e intervenção para prevenir e minimizar morbidades.
➔ Educação da paciente, aprimorando o cuidado e a qualidade de vida de mãe,
filho e familiares.

Diagnóstico de gravidez

Diagnóstico hormonal
▪ Produção de gonadotrofina coriônica humana (HCG)
▪ Dosagem de fração beta no sangue: beta-HCG – existem reações cruzadas com
essa fração
o Teste positivo: valores acima
de 25mUI/mL
o Teste quantitativo: dá noção da
idade gestacional
o Pode ser dosado na urina:
teste imunológico da
gravidez (TIG)

Diagnóstico ultrassonográfico
▪ Saco gestacional: a partir de 5 semanas
▪ Vesícula vitelina: a partir de 5/6 semanas
▪ Ecos embrionários (imagem do bebê): a partir de 6 semanas
▪ Embrião com atividade cardíaca presente: a partir de 7 semanas
(obrigatório)

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Saco gestacional
Vesícula vitelina Diferenciação do embrião

Redução da vesícula

Atrofia da vesícula
BCF

Excesso de beta-HCG: pode indicar gravidez múltipla. Ex.: 4ª semana com beta-HCG
de 15.000
Beta-HCG acima de 15.000 é obrigatório já ter imagem ultrassonográfica do feto.

Primeira consulta de pré-natal

1. História clínica
a) Identificação: nome completo, idade, data de nascimento, raça, grau de
instrução, profissão/ocupação, estado civil/união.
b) Antecedentes familiares: hipertensão arterial, DM, doenças congênitas,
gemelaridade, partos prematuros, doenças infecto-contagiosas (TB,
doença de Chagas, toxoplasmose), parceiro sexual portador de DSTs.
c) Antecedentes pessoais: HAS, cardiopatias, anemias, doenças
pulmonares e renais crônicas, distúrbios nutricionais (desnutrição,
sobrepeso, obesidade), doenças neurológicas e doenças psiquiátricas,
doenças da tireoide e outras endocrinopatias, alergias, hanseníase, TB
ou outras doenças infecciosas, AIDS, infecção urinária de repetição,
hemotransfusões, perdas gestacionais anteriores (abortos, neomortos,
natimortos, prematuros), cirurgias, história vacinal.
d) Antecedentes ginecológicos: menarca, tipo de ciclo menstrual (precisão
do primeiro dia da última menstruação – DUM), métodos
anticoncepcionais prévios, infertilidade e esterilidade, mamas (alterações
e tratamentos), última colpocitologia oncótica.
e) Antecedentes obstétricos: número de gestações, número de partos e
tipo, número de abortos (especificar se espontâneo ou provocado),
intervalo entre as gestações (ideal: 2 anos – se paciente está grávida no
intervalo menor que isso e o parto anterior foi cesárea, a chance de uma
segunda cesárea é maior), aloimunização Rh, peso dos RN, natimortos
e neomortos, intercorrências ou complicações em gravidezes ou

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puerpérios anteriores (especificar), aleitamentos anteriores (duração,
complicações e motivo de desmame).
f) Gestação atual: data do primeiro dia da última menstruação (DUM), data
prevista do parto (DPP), peso prévio e altura, sinais e sintomas na
gestação em curso, medicamentos usados na gestação e antes dela,
hábitos, aceitação ou não da gravidez pela mulher, pelo parceiro e pela
família (principalmente na adolescência).

Se houver diferença de até 5 dias da conta até a primeira USG, é confiável. Se não,
pegar a segunda USG para decidir qual conta vai valer. A primeira USG é a mais fiel
da idade gestacional. Quanto mais avanço na gravidez, menor é a certeza do cálculo.

Exemplos de cálculo da idade gestacional


➔ Por DUM conhecida: 05/05/18 | 26/11/17

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➔ Por ultrassonografia: biometria de 14 semanas e 1 dia em 04/03/17

Cálculo da data provável do parto


Objetivo: estimar o período provável do parto, que normalmente em torno de 40
semanas completas. Pode-se usar o gestograma, utilizar aplicativos de celulares ou
a regra de Naegele: somar 7 ao dia da DUM, diminuir 3 ao mês da DUM ou somar 9 ao
mês quando a DUM ocorreu em janeiro, fevereiro ou março.

Exemplo:

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2. Exame físico
a) Exame físico geral: calcular IMC, medir PA – paciente sentada após 5
min de repouso, nunca em posição supina ou ortostática –, inspeção das
mucosas, palpação da tireoide e pescoço, ausculta cardiopulmonar,
inspeção dos membros inferiores (edema, varizes).
b) Exame específico/gineco-obstétrico:
i. Exame das mamas: inspeção e palpação, orientações sobre
preparo para amamentação (sol, manobras para retração)
ii. Exame do abdome: ectoscopia (hiperpigmentação da linha alba,
presença de estrias, presença de hérnias), medida da altura
uterina, (entre 16 e 30 semanas, a medida é igual a idade
gestacional) avaliar a estática fetal com manobras de Leopold-
Zweifel, ausculta dos BCF com sonar, a partir de 12 semanas.

1ª manobra: delimitação do fundo do útero – situação se o bebê


está longitudinal ou transversal.
2ª manobra: determinação do dorso fetal – posição.
3ª manobra: apresentação cefálica ou pélvica – tentar captar a
cabeça do bebê
4ª manobra: grau de insinuação da apresentação – saber se o
bebê está encaixado ou não.

iii. Exame toco-ginecológico: inspeção dos genitais externos,


exame especular (inspeção das paredes vaginais, do conteúdo
vaginal, do colo uterino e coleta de material para exame
colpocitológico), toque vaginal.

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3. Conduta
a) Calcular idade gestacional
b) Calcular DPP
c) Prestar informações às indagações da mulher e da família
d) Solicitar exames laboratoriais de primeira rotina e USG
e) Providenciar vacinação, quando indicado
f) Prescrever medicações de rotina (suplementos ou necessárias para
tratamento)
i. Suplementos: sulfato ferroso (40mg/dia) e ácido fólico (5mg/dia
até 14 semanas)
ii. Antieméticos: hiperêmese gravídica
iii. Analgésicos: cefaleia, lombalgia
iv. Anti-espasmódicos: cólicas, APP, pródromos do TP
v. Uterolíticos: APP ou ameaça de abortamento
vi. Antibióticos: infecções
vii. Corticoides: APP (maturação pulmonar)
viii. Anti-hipertensivos: HAS, DHEG (pré-eclâmpsia)
ix. Antiácidos: pirose, gastrite

4. Exames complementares:
Exames de primeira rotina de pré-natal

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Acompanhamento de pré-natal
Exame de segunda rotina de pré-natal – tabela 1 – (entre 24 e 28 semanas) | Exames
de terceira rotina de pré-natal – tabela 2 – (35-36 semanas)

Exames de ultrassonografia durante o pré-natal


▪ Primeiro trimestre
o Transvaginal: avaliar saúde fetal e confirmar a idade gestacional
o Entre 11 e 13 semanas e 6 dias: morfológica do primeiro trimestre –
transluscência nucal (até 2,5mm = normal), osso nasal (precisa ser
visualizado), ducto venoso (onda específica), regurgitação tricúspide
(onda específica), comprimento do colo (25mm ou mais = normal); para
pesquisa de malformação e parto prematuro.
▪ Segundo trimestre
o Acima de 16 semanas: obstétrica – evolução fetal e sexo fetal
o Entre 20 e 26 semanas: morfológica – malformações
o Entre 24 e 28 semanas: dopplerfluxometria – ver oxigenação intraútero,
risco de pré-eclâmpsia e crescimento intrauterino restrito (CIUR)
▪ Terceiro trimestre
o Obstétrica: evolução fetal, peso fetal, quantidade de líquido amniótico.

Vacinação

1. Permitidas
a. Antitetânica
i. 3 doses há menos de 10 anos: 1 dose de reforço da DTPa
ii. 3 doses há mais de 10 anos: fazer 3 doses (30/30 dias ou 60/60
dias)
iii. Vacinação prévia incompleta: completar esquema
b. Influenza (H1N1): dose única (anualmente)

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c. Hepatite B (se anti HBs e HBsAg negativos): fazer 3 doses – 1ª dose / 2ª
dose (30 dias após a 1ª dose) / 3ª dose (180 dias após a primeira dose)
d. Raiva, febre amarela: permitidas em caso de alto risco de contaminação
2. Contraindicadas: sarampo, caxumba, rubéola, BCG, varicela

Consultas subsequentes

Por via de regra, as consultas são:


▪ Mensais, até 32 semanas
▪ Quinzenais, de 32 a 36 semanas
▪ Semanais, de 36 semanas até o parto

Incluem revisão da ficha pré-natal, anamnese e verificação do calendário de vacinação.


▪ Controles maternos:
o Confirmar idade gestacional (IG)
o Avaliar queixas ou intercorrências
o Peso
o Medida da pressão arterial
o Altura uterina e palpação obstétrica
o Edemas
o Resultados de exames laboratoriais

▪ Controles fetais:
o Batimentos cardíacos fetais
o Movimentação
o Resultados de ultrassonografias

O cartão pré-natal é direito de toda paciente, deve ser preenchido corretamente e


fornecido a paciente na primeira consulta e deve estar sempre junto com a paciente e
preenchido em cada consulta subsequente.

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Anatomia pélvica e estática
fetal
Anatomia pélvica

Denomina-se bacia ou pelve o canal ósseo formado pelos dois ilíacos – o sacro
e o coccígeo – com as respectivas articulações: sínfise púbica, sacro-ilíacas e sacro-
coccígeas.

A bacia se
divide em
grande bacia
(sem
expressão
obstétrica) e
pequena bacia
ou escavação,
que é
considerada o
trajeto duro do
parto. A grande
bacia se separa
da pequena pelo anel do estreito superior. A pequena bacia se acha limitada acima
pelo estreito superior (do promontório até a borda superior da sínfise púbica) e
abaixo pelo estreito inferior (da ponta do cóccige até a borda inferior da sínfise
púbica), contendo também o estreito médio (no nível das espinhas ciáticas).

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Dimensões ou diâmetros da escavação

Os estreitos da bacia são planos de maior dificuldade à passagem fetal. Ou seja,


existem três níveis da bacia que, por serem mais estreitos, podem atrapalhar o parto
vaginal. As dimensões da bacia e de seus estreitos são importantes na acomodação do
feto durante o parto.

1. Estreito superior:
➔ Diâmetros anteroposteriores
o Conjugata vera
anatômica: do
promontório à borda
superior do pube, que
mede 11 cm
o
o Conjugata vera
obstétrica: do
promontório à face
posterior do pube, que
mede 10,5 cm. É o
mais importante na
obstetrícia, porque
representa o espaço
real do trajeto da
cabeça fetal.
o Conjugata diagonalis:
linha que une o
promontório e a borda
inferior do osso púbico,
que mede 12 cm. Na avaliação pelo toque vaginal, esta é a
medida empregada para estimativa do diâmetro da conjugata
vera obstétrica. Em geral, o diâmetro da conjugata vera obstétrica
é 1,5cm menor que a conjugata diagonalis.
➔ Diâmetro transverso máximo, que vai de uma linha inominada a do
outro lado (junção do 1/3 posterior com 2/3 anteriores do diâmetro
anteroposterior) e mede 13 a 13,5 cm.
➔ Diâmetros oblíquos: começam nas
eminencias ileopectíneas e terminam
na articulação sacroilíaca. Medem
cerca de 12,5cm. O primeiro oblíquo
é discretamente maior que o
segundo oblíquo, o que pode
justificar a maior ocorrência de
insinuações fetais neste diâmetro.

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2. Estreito médio
➔ Diâmetro anteroposterior: em nível das espinhas ciáticas, mede 12 cm.
➔ Diâmetro transverso ou biespinha ciática: é o menor diâmetro da
pelve e mede 10,5cm.

As espinhas ciáticas são


importantes pontos de
referência, e representam o
plano “zero” de De Lee.
Delas, emergem os nervos
pudendos, que são comumente
anestesiados no parto vaginal.

3. Estreito inferior
➔ Diâmetro anteroposterior: é a conjugata exitus, que vai do cóccige à
borda inferior do pube, medindo 9,5cm. Após a retropulsão do cóccige
(pelo movimento da cabeça fetal durante o desprendimento), ele é
substituído pelo diâmetro subsacro subpúbico, medindo 11cm.
➔ Diâmetro transverso ou bi-isquiático ou intertuberoso: vai de um
ísquio ao outro contra-lateral, que mede 11 cm.

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Tipos fundamentais de bacia

Mais comum Mais raro

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➔ Ginecoide: corresponde a 50% das pelves femininas.
o Estreito superior arredondado
o Diâmetro transverso máximo afastado do
promontório e pube
o Chanfradura ciática ampla
o Espinhas ciáticas não proemminentes
o Sacro largo e côncavo
o Diâmetro bi-isquiático grande
o Diâmetro anteroposterior e estreito superior grandes
➔ Antropóide: corresponde a 25% das pelves femininas.
o Mais próxima da bacia dos macacos
o Estreito superior elíptico
o Diâmetro transverso máximo diminuído próximo do
pube
o Chanfradura ciática mais ampla, pouco profunda
o Espinhas ciáticas não proeminentes
o Sacro estreito e longo
o Diâmetro bi-isquiático menor
➔ Androide: corresponde a 20% das pelves femininas.
o Mais próxima das bacias masculinas
o Estreito superior levemente triangular
o Diâmetro tranverso máximo perto do sacro
o Chanfradura ciática estreita
o Sacro estreito e longo
➔ Platipeloide: corresponde a 5% das pelves femininas.
o Bacia achatada
o Estreito superior ovalado
o Diâmetro transverso aumentado
o Chanfradura ciática ampla
o Espinhas ciáticas proeminentes
o Sacro longo e curto
o Diâmetro bi-isquiático aumentado

Planos da bacia

São linhas imaginárias, paralelas, traçadas na entrada, em várias alturas e na


saída da escavação. Servem para avaliação da altura da apresentação na cavidade
pélvica. Os mais conhecidos são os Planos Paralelos de Hodge e os Planos
Paralelos de De Lee.

➔ Planos de De Lee: o diâmetro biespinha isquiática ou terceiro plano de Hodge


é o plano de referência “0”. A partir deste plano, a apresentação é estimada
em centímetros positivos caso a apresentação fetal o tenha ultrapassado, e
em centímetros negativos caso a apresentação não o tenha alcançado.
Atualmente, é o plano mais empregado no acompanhamento do trabalho de
parto.
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➔ Planos de Hodge: não possui grande aceitação.
o Primeiro plano: é delimitado pela borda superior do pube e promontório.
Corresponde ao estreito superior da bacia.
o Segundo plano: vai da borda inferior do pube ao meio da segunda
vértebra sacra.
o Terceiro plano: delimita-se nas espinhas ciáticas e corresponde ao
estreito médio.
o Quarto plano: é traçado pela ponta do coccige.

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Estática fetal

A Estática Fetal diz respeito as relações do feto com a bacia e com o útero.

a) Atitude fetal: relação das diversas partes fetais entre si. Graças a flexibilidade
da coluna, o feto se aloja na cavidade uterina em flexão generalizada, que dá
a ele a forma ovóide, o ovóide fetal, que apresenta dois polos, o cefálico e o
pélvico.

b) Situação: relação entre o maior eixo fetal e o maior eixo uterino


➔ Coincidentes os dois eixos: situação longitudinal em 99,5% das vezes
➔ Perpendiculares os eixos: situação transversa em 0,5% das vezes
➔ Cruzados os eixos: situação oblíqua ou inclinada: fase de transição

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c) Posição: relação do dorso fetal com o abdome
materno.
➔ Posição esquerda ou 1ª posição: dorso
fetal voltado para o lado esquerdo da mãe
➔ Posição direita ou 2ª posição: dorso fetal
se orienta para o lado direito da mãe.
O crânio fetal é constituído de dois ossos frontais,
dois parietais, dois temporais, um occiptal, um
esfenóide e um etmóide. Os ossos da abóbada se
acham separados pelas suturas e fontanelas (tecidos membranosos), permitindo
a redução de volume durante o parto. Já os ossos da base compõem um bloco
indeformável.

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Na cabeça, podemos traçar diversos diâmetros e circunferências para
entendermos o mecanismo do parto. São eles:
Diâmetro (cm) Circunferência (cm)
Occiptofrontal 12 34
Occiptomentoniano 13,5 36
Subocciptobregmático 9,5 32
Subocciptofrontal 11 33
Submentobregmático 9,5 32
Biparietal 9,5 -
Bitemporal 8 -

d) Apresentação: o polo fetal que se encontra no estreito superior da pelve


materna. Na situação transversa a apresentação sempre será córmica (de
ombro). Na situação longitudinal, duas apresentações podem ocorrer:
cefálica (cabeça fetal) ou pélvica (nádega fetal).

e) Variedade de apresentação: diferentes formas que a apresentação pode


ocorrer.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 25


➔ A apresentação cefálica pode ser fletida, com o mento próximo à face
anterior do tórax, que é a mais comum; ou pode ser defletida, quando o
mento se afasta do tórax em graus variados:
▪ defletida de 1º grau ou bregmática,
▪ defletida de 2º grau ou de fronte,
▪ defletida de 3º grau ou de face, que é a deflexão máxima.

➔ A apresentação pélvica pode ocorrer de duas maneiras:


▪ Completa ou pelvipodálica: se as coxas e pernas estão fletidas
▪ Incompleta ou pélvica simples: chamada de modo de nádegas,
quando as pernas ficam estendidas sobre a face anterior do
tronco.

Durante a gravidez, a apresentação encontra-se afastada do estreito superior.


Perto do parto teremos graus evolutivos de altura em relação com a bacia:
1) Alta e móvel: não tem contato
2) Ajustada: ocupa a área do estreito superior
3) Fixa: pelo palpar, não mobilizamos a apresentação
4) Insinuada: a maior circunferência da apresentação transpôs o estreito superior.
Passagem do diâmetro biparietal nas cefálicas e do bitrocanteriano nas pélvicas.
Durante o trabalho de parto, a altura da apresentação é expressada pelos planos de
De Lee ou de Hodge

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A travessia dessa região da bacia pela cabeça se faz com redução de volume e
com movimento de inclinação lateral, denominado assinclitismo. Podemos ter:
1) Sinclitismo: sem lateralização da cabeça, sutura sagital equidistante do pube e
sacro
2) Assinclitismo anterior (Obliquidade de Nägele): sutura sagital próxima do sacro
e osso parietal anterior se insinua primeiro
3) Assinclitismo posterior (Obliquidade de Litzmann): sutura sagital próxima do
pube e osso parietal posterior se insinua primeiro

f) Variedade de posição: relação dos pontos de referência da apresentação e os


pontos de referência da pelve materna (basicamente o sacro e o pube).
Os pontos de referência maternos são:
• O pube;
• As iminências ileopectíneas (próximas ao pube);
• As extremidades do diâmetro transverso;

• A sinostose sacroilíaca (próximas ao sacro); e
• O sacro.
Os pontos de referência fetais são:
• Fontanela lambdóide ou lambda:
apresentação cefálica fletida;
• Fontanela bregmática ou bregma:
defletida de 1º grau (bregmática);
• Glabela ou raiz do nariz: defletida
de 2º grau (de fronte);
• Mento: defletida de 3º grau (de
face);
• Crista sacrococcígea:
apresentação pélvica; e
• Acrômio (ombro): apresentação
córmica.
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Com a
nomenclatura obstétrica
designam-se, de maneira
exata, a situação, a
apresentação, a posição e a
variedade de posição,
tendo-se perfeito
conhecimento da estática
fetal.
Usamos duas a três
letras:
– a primeira indica a
apresentação,
– a segunda define o lado materno no qual está o ponto de referência fetal, e
– a terceira corresponde ao ponto de referência da bacia.

Na apresentação cefálica fletida teremos:


o OP: occipto-púbica
o OEA: occipto-esquerda-anterior
o OET: occipto-esquerda-transversa
o OEP: occipto-esquerda-posterior
o OS: occipto-sacra
o ODP: occipto-direita-posterior
o ODT: occipto-direita-transversa
o ODA: occipto-direita-anterior

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Nas apresentações cefálicas defletidas, substituímos a letra “O” de occipto por
“B” de bregma, “N” de naso ou “M” de mento. Na apresentação pélvica, substituímos
a letra “O” pela letra “S” de sacro. Nas apresentações córmicas, usamos a letra “A” de
acrômio.

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Mecanismo do parto
Do ponto de vista do mecanismo do
parto, o feto é o móvel ou objeto, que
percorre o trajeto (bacia), impulsionado
por um motor (contração uterina). O
móvel mantém ou readquire seu formato
de ovóide fetal (em flexão) no momento
do parto e que a seu turno se compõe de
dois segmentos: o polo cefálico (ou
pélvico) e o polo córmico.
O trajeto ou canal de parto se
estende do útero à fenda vulvar e é
constituído por uma cintura óssea
designada pequena bacia ou escavação
(trajeto duro) que sustenta formações
de tecidos moles (trajeto mole) que
compreendem o segmento inferior do
útero, o canal cervical (colo uterino), o
canal vaginal e a região vulvoperineal.
Durante seu transcurso no canal de parto, impulsionado pela contratilidade
uterina e pelos músculos abdominais, o feto executa movimentos passivos que
procuram adaptar os diâmetros fetais aos diâmetros da bacia.
Aqui veremos o parto fisiológico: apresentação cefálica fletida em bacia
ginecóide. Outras situações são vistas comparativamente ao fisiológico. Os tempos do
mecanismo de parto são basicamente três: insinuação, descida e desprendimento.

Insinuação
A insinuação ou encaixamento é a passagem da maior circunferência da
apresentação através do anel do estreito superior da escavação. Nessa condição,
pelo geral, o ponto mais baixo da apresentação está à altura das espinhas ciáticas
(plano 0 de De Lee ou 3 de Hodge).
No início, com a
cabeça fetal ainda acima do
estreito superior, ela está
em flexão moderada e
com a sutura sagital
orientada no sentido do
diâmetro oblíquo esquerdo
ou do transverso e com a
pequena fontanela
(lambdóide) voltada para
a esquerda: OEA. Nesse

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 30


momento, a cabeça apresenta ao ES o diâmetro occiptofrontal (12cm), que é maior
que o subocciptobregmático (9,5cm). Para apresentar esse último diâmetro ao ES, a
cabeça sofre um primeiro movimento de flexão.

Descida
A cabeça migra até a proximidade do assoalho pélvico, exagerando a flexão. A
circunferência máxima da cabeça se encontra agora no estreito médio. O movimento da
cabeça é turbinal: penetração rotativa de “Fernando Magalhães”. Dois movimentos
importantes acontecem:
1. Rotação interna da cabeça: quando a cabeça sofre uma rotação que levará a
sutura sagital a se orientar no sentido ântero-posterior da saída do canal.
2. Insinuação das espáduas: simultaneamente com a rotação da cabeça, ocorre a
penetração das espáduas (ombros) através do estreito superior. Os ombros se
aconchegam e, a partir daí, se orientam no sentido de um dos diâmetros oblíquos
ou no transverso do estreito superior.

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Durante a descida, faz-se uma avaliação da altura da apresentação pelos planos
de Hodge e/ou planos de De Lee para avaliar a progressão dessa descida.
Plano 1: passa pela borda superior do
púbis e pelo promontório.
Plano 2: passa pela borda inferior do
púbis e pela 2ª vértebra sacra.
Plano 3: passa ao nível das espinhas
ciáticas.
Plano 4: parte da ponta do cóccige.

Desprendimento
Terminada a rotação interna, a nuca fetal vai se posicionar sob a arcada
púbica, ficando a sutura sagital em sentido ântero-posterior. Dada a curvatura inferior
do canal de parto, o desprendimento se processa por deflexão da cabeça com seu
basculamento em direção para cima.
Com esse movimento de báscula,
estando a nuca apoiada sob a arcada
púbica, liberta-se o diâmetro
subocciptobregmático, seguindo-se o
subocciptofrontal, subocciptonasal e
assim por diante até o desprendimento
completo da cabeça.
A partir do desprendimento completo
da cabeça acontecem novos e
sincronizados movimentos:

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 32


1. Rotação externa da cabeça: rotação de 1/4 a 1/8 de circunferência, voltando o
occiptal para o lado onde se encontrava na bacia movimento de restituição.
2. Rotação interna das espáduas: simultaneamente ao movimento anterior, as
espáduas, que estavam com o diâmetro biacromial em sentido oblíquo direito ou
transverso, vão rodar para o sentido ântero-posterior, apoiando-se o ombro
anterior sob o pube e o ombro posterior vai impelir o cóccige materno para trás.
3. Deprendimento das espáduas: o ombro anterior transpõe a arcada púbica e
aflora à vulva. O tronco sofre um leve deslocamento no sentido lateral e,
finalmente se desprende o ombro posterior.

O restante do corpo fetal não oferece resistência para o nascimento.

Em todas as outras variedades de posição (OET, OEP, OS,ODP, ODT, ODA) e


também nas variedades de apresentação (cefálicas defletidas de 1º, 2º e 3º graus e nas
pélvicas), o mecanismo de parto segue os mesmos tempos e sincronia de
movimentos, mudando-se os pontos de referência fetais e maternos.
Algumas dessas variações chegam ao êxito do nascimento, enquanto outras se
caracterizam em impedimento do parto ou distócias. Já no caso de uma apresentação
córmica, torna-se inviável o nascimento por via vaginal.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 33


Assistência ao parto vaginal e
ao parto operatório
Diagnóstico de trabalho de parto
Se caracteriza o trabalho de parto como uma síndrome, e o conjunto dos
elementos é que confirma esse diagnóstico. Didaticamente, devemos considerar:
➔ Contrações dolorosas, rítmicas (de 2 a 3 em cada 10 minutos), que se iniciam
no fundo uterino e se estendem por todo o corpo uterino em direção
descendente, durando cerca de 50 a 60 segundos.
➔ Colo apagado e dilatado 2cm (nas primíparas); colo apagado ou semiapagado e
dilatado 3cm (nas multíparas).
➔ Formação da bolsa das águas: protusão da bolsa amniótica no canal cervical.
➔ Perda do tampão mucoso, denunciando apagamento e dilatação do colo.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 34


Dilatação
Inicia-se essa fase com as contrações uterinas dolorosas e ritmadas, que
modificam o colo, e termina quando a ampliação do colo está completa: 10 cm. A
dor do parto é referida 70% no hipogástrio, 20% na região lombo-sacra e 10% em ambos
os lugares.
O colo se dilata e se apaga (afina/diminui a espessura do colo) graças ao efeito
de tração das fibras longitudinais do corpo uterino que se encurtam durante a contração
e ao efeito compressivo da bolsa das águas e da apresentação fetal sobre ele. Nas
primíparas, o colo se apaga (se afina) e depois se dilata. Nas multíparas, ele começa a
se dilatar e depois se apaga.
A assistência ao primeiro período deve ser capaz de:
1. Retardar a internação hospitalar: internar quando for a fase ativa (3 ou mais
contrações em 10min e dilatação de pelo menos 5cm)
2. Oferecer testes de avaliação fetal: para prevenção de desfechos
desfavoráveis.

Cardiotocografia

3. Dieta: na década de 1940, considerava-se


que não deveria haver ingesta durante o Antigamente, havia o costume de
trabalho de parto. Atualmente, pode-se injetar solução hipertônica no reto, por
liberar quantidades modestas de líquidos enema, para a gestante evacuar. No
claros (água, sucos sem polpa, chá, etc.) e entanto, percebeu-se que o fato de o reto
alimentos leves para gestantes de baixo estar cheio ou vazio no momento do
parto não faz diferença na incidência de
risco. Para os casos de alto risco de
infecção, porque o parto já é considerado
broncoaspiração, por exemplo (obesidade, um ambiente contaminado com sangue,
diabetes, via aérea difícil), é recomendável urina ou fezes (e há plena possibilidade de
alguma restrição. separação por campo cirúrgico).
4. Posição e deambulação: a posição supina Atualmente, o enema só é utilizado em
leva à compressão dos vasos abdominais. casos de fecaloma ou retenção de fezes
Posições verticalizadas e deambulação que seja muito prejudicial para o trabalho
de parto. De mesmo modo outra prática
reduzem o tempo do primeiro período e da
abandonada atualmente é a tricotomia,
necessidade de analgesia peridural. que não apresenta diferença quanto a
5. Imersão em água a 37°: essa medida morbidade febril materna e infecção de
causa menor necessidade de analgesia ferida perineal. Os pelos atrapalham
peridural (redução de 18%). somente no fechamento dos pontos na
6. Suporte contínuo: suporte emocional e cesárea.
medidas de conforto físico por profissionais
de saúde ou leigos (doula, amiga, parente).
SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 35
Acompanhante durante o trabalho de parto é uma recomendação da OMS e do
Ministério da Saúde, sendo um direito garantido por lei.

7. Amniotomia: capaz de reduzir a


duração do Trabalho de Parto entre 60
e 120 minutos e a necessidade de
infusão de ocitocina. Se o trabalho de
parto está demorando muito, é possível
que a amniotomia ajude. A
amniotomia precoce é
contraindicada. A técnica correta
envolve dois dedos do obstetra, com o
amniótomo entre eles. Durante o
procedimento, é importante que o dedo
permaneça, a fim de que, se o examinador sente o cordão umbilical em seu
dedo, a necessidade da cesárea é percebida e a indicação é imediata. Essa
medida é tomada para impedir o prolapso de cordão, que, quando ocorre,
rompe o suporte nutritivo e de oxigênio do feto.

8. Analgesia peridural: é indicada para diminuir o desconforto da parturiente por


reduzir a sensação da dor e também para acelerar a dilatação cervical por
relaxamento das fibras musculares do colo uterino. Se introduz um cateter no
espaço peridural e aplica-se xilocaína em dose capaz de aumentar o limiar de
dor da paciente sem reduzir a atividade motora do músculo uterino. Deve ser
realizada quando houver de 5 a 6cm de dilatação, já que com dilatação cervical
menor pode ocorrer hipotonia uterina e, consequentemente, parada da
progressão do parto.

9. Manejo ativo: com seu uso, há tendência na redução da taxa de cesarianas.


Consiste em:
o Diagnóstico preciso do trabalho de parto
o Suporte contínuo por enfermeira
o Amniotomia, se necessário
o Ocitocina intravenosa ou misoprostol (prostaglandina E1) intravaginal:
▪ Ocitocina: aumenta a intensidade e a frequência das contrações.
É usada em infusão venosa contínua. Usualmente, dilui-se uma
ampola (5 unidades) de ocitocina em 500mL de soro glicosilado a
5%, e inicia-se na dose de 2 a 4 mUI/min, dobrando-se a dose a
cada meia hora até o máximo de 32mUI/min, com bomba
infusora. A monitoração pelo partograma é fundamental,
mantendo-se a dose de ocitocina adequada a proporcionar a
contração uterina dentro dos limites fisiológicos (não a mais do
que cinco contrações em 10 min).
▪ Misoprostol endovaginal: é um éster sintético da prostaglandina
E1, que permite o progressivo apagamento e a dilatação cervical
concomitante ao aumento da atividade uterina. A aplicação no
fundo de saco vaginal tem sido a via mais escolhida, mas pode,
também, ser administrado VO, sublingual ou retal. A dose usual é

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 36


de 25 a 50 mcg de 6h/6h, inciando-se, preferencialmente, durante
o dia.
o Monitoração do progresso do parto com partograma: representação
gráfica da dilatação do colo e da descida da apresentação no trabalho de
parto. É obrigatório em todas as maternidades desde 1994. Na abscissa,
coloca-se o tempo em horas e na ordenada, à esquerda, coloca-se a
dilatação cervical e à direita a descida da apresentação. Uma linha
de alerta é traçada a partir da dilatação de 1 cm e é atingida quando a
velocidade de dilatação é <1cm/hora. Outra linha, a de ação, é traçada
4h depois da linha de alerta. Esse é o momento de decidir: indicar a via
alta (cesariana) ou não?

Boa evolução do trabalho de parto

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 37


Má evolução do trabalho de parto, atingindo a linha de ação

Por convenção, marca-se a dilatação cervical com um ponto ou figura


geométrica e a apresentação e respectivo desenho da variedade de posição numa
circunferência na mesma coluna de acordo com altura da apresentação. Insere-se a
linha de alerta a partir do canto inferior direito da 1ª verificação e a linha de ação, a
partir de 04 quadrados à direita, ligando as diagonais dos quadrados, com inclinação
ascendente para a direita. A marcação no partograma começa a partir de 3 cm de
dilatação.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 38


O registro no partograma acontece concomitantemente a toques subsequentes
a cada uma ou duas horas (anotação no gráfico), a fim de avaliar dilatação, altura da
apresentação, variedade de posição e condições da bolsa das águas. Há, ainda, um
sistemático registro das contrações, do BCF, da cor do líquido, da administração de
líquidos e drogas e início da analgesia.
As linhas de alerta e de ação são meios de diagnóstico precoce de parto
disfuncional, por exemplo, fase prolongada de dilatação e descida demonstra “falta
de motor”, isto é, teria de haver mais contrações. Parada secundária da dilatação e
da descida demonstram desproporção céfalo-pélvica (DCP).

O “motor” normal corresponde a 1


contração uterina a cada 3 a 5 min.
Mais ou menos do que essa média são
caracterizadas como distócia de motor.
Se houver hipossistolia, a ocitocina
costuma resolver. No caso de
taquissistolia, os uterolíticos (como
antagonistas do receptor de ocitocina)
Distócia de motor não são utilizados; recomenda-se
tentar alterar a posição da mulher para
decúbito lateral esquerdo, hidratação e
administração de glicose. Se essas
medidas não resolverem o quadro e o
bebê estiver em sofrimento fetal, a
interrupção da gravidez é mandatória.

10. Monitoração fetal: cardiotocografia (CTG) x ausculta fetal intermitente.


Objetiva prevenir a hipóxia fetal, mas a CTG restringe a paciente ao leito. Por
isso, é recomendada a ausculta intermitente para gestantes de baixo risco.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 39


Quanto às de alto-risco (hipertensão, aloimunização, oligodramnia etc.), a CTG
contínua é recomendada, pois os riscos podem gerar hipóxia a cada contração;
redução da frequência cardíaca.

Visualização de hipóxia
fetal a cada contração
materna.

Desaceleração dos BCF


prolongada, à medida
que há contrações.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 40


No acompanhamento da dilatação, vale mais a pena a
ausculta fetal intermitente ou fazer cardiotocografia? Para
baixo risco, AFI, e para alto risco, cardiotocografia. Para realizar a
CTG, um sensor é posicionado no alto do útero que capta
contrações uterinas e o outro sensor no coração do bebê. Ele
marca, em gráfico, na parte de cima a atividade cardíaca do bebê
e, embaixo, as contrações uterinas.

Expulsão
Ao se iniciar essa fase, fica a parturiente, pelo geral, agitada, experimentando, a
maioria delas, desejo de defecar (tenesmo retal). As metrossístoles ficam mais
frequentes e intensas, somando-se a elas as contrações voluntárias da prensa
abdominal (puxos). A dilatação já atingiu seu ápice, 10 cm, e a apresentação se
encontra bem penetrada no estreito inferior. É nesse momento que devemos conduzir
a parturiente à mesa de parto.

1. Posição materna na mesa de parto


a. Posição de Laborie-Bué ou Laborie-Duncan: facilita a avaliação do
profissional de saúde e a prática de intervenções, bem como modifica a
amplitude da bacia.
b. Posições verticalizadas (sentada, de cócoras etc.): efeito da gravidade,
menor compressão da aorta e da cava, maior eficiência da contratilidade
uterina, alinhamento do feto com a pelve, etc.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 41


2. Manobra de Rietger: é a proteção do períneo, por meio da preensão dele por
parte do médico, utilizando uma de suas mãos com a ajuda de uma compressa.
A outra mão deve ser utilizada para sustentar o occipto do bebê.

3. Manobra de Kristeller: é a expressão


do fundo uterino durante as contrações
utilizando as mãos ou o cotovelo para
empurrar o feto em direção ao canal do
parto. Os riscos incluem a rotura
uterina, lesões perineais graves, toco-
traumatismo fetal e maior hemorragia
materno-fetal. É obsoleta é
contraindicada pelo Ministério da
Saúde.

4. Episiotomia: é a incisão no períneo, no momento do parto, com o objetivo de


facilitar o desprendimento. Era realizada de maneira compulsória; atualmente,
observou-se que sua restrição tem como vantagens menos trauma perineal
posterior, maior probabilidade de manter o períneo intacto e retorno mais
precoce a vida sexual. É indicada quando há necessidade de parto operatório
(fórcipe) ou suspeita de sofrimento fetal. A técnica correta consiste em preceder
o bloqueio troncular do nervo pudendo interno, na extremidade da espinha
ciática, com lidocaína, xilocaína ou procaína – a infiltração do anestésico é feita
com movimentos de avanço e recuo, em forma de leque. A melhor opção é a
incisão médio-lateral-direita, com a incisão partindo da fúrcula vaginal em um
ângulo entre 45º e 60º. Pode-se usar, também, a incisão mediana (perineotomia)
ou médio-lateral-esquerda.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 42


Planos envolvidos
▪ Pele
▪ Tecido celular subcutâneo
▪ Mucosa vaginal
▪ Músculos bulbo cavernoso, transverso superficial do
períneo e fibras anteriores do elevador do ânus

Para a episiorrafia, a técnica preferencial parece ser a


sutura contínua em todas as camadas (menor percepção de
dor). O fio sintético absorvível (categut simples, categut
cromado ou vicryl) é o indicado.

Quando necessária e não realizada, a falta da episiotomia pode levar a mulher


a desenvolver incontinência urinária posteriormente.

5. Assistência ao desprendimento dos ombros: após a expulsão do polo


cefálico, explora-se a região cervical em busca de circulares de cordão, para
serem desfeitas ou seccionadas. Ultimada a rotação externa da cabeça, o
obstetra apreende a apresentação com ambas as mãos na região abaixo das
orelhas, traciona para baixo para liberar o ombro anterior e em seguida para
cima, ajudando a saída do ombro posterior.

6. Clampeamento, corte e coleta de sangue do cordão


umbilical: após a expulsão total do feto, o acolhemos e
entregamos à mãe ou ao pediatra. Após um tempo de
espera de no máximo 3min, clampeamos o cordão
umbilical a mais ou menos 10cm de sua inserção
abdominal, com duas pinças distando mais ou menos 1cm
uma da outra, e realizamos o corte dele com tesoura ou lâmina de bisturi. Depois
do corte, colhemos o sangue do cordão em uma seringa, para futura
determinação da tipagem sanguínea fetal.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 43


Dequitação ou secundamento
A dequitação ou secundamento, também chamado de delivramento ou
decedura se inicia após o nascimento do feto e clampeamento do cordão umbilical. Se
caracteriza por três tempos: descolamento da placenta e das membranas amnióticas
da parede uterina, descida e expulsão das mesmas para fora das vias genitais. Esse
processo deve ocorrer em até 30min – após esse tempo, o manejo ativo se inicia.
➔ Descolamento: com a retração do útero após o parto, reduz-se muito a sua
superfície interna, pregueando-se a zona de inserção da placenta e
causando seu descolamento. No ponto que se inicia esse descolamento,
forma-se um hematoma que se expande entre as paredes e os cotilédones
placentários, ajudando essa clivagem.
➔ Descida: as contrações uterinas, que não cessam, e a ação da gravidade levam
a placenta do corpo uterino ao segmento inferior, colo e vagina.
➔ Expulsão: no canal vaginal a placenta provoca nova sensação de puxo, que é
responsável pela expulsão da mesma para o exterior.

Existem dois mecanismos de desprendimento placentário:


▪ Baudeloque-Schultze: a placenta se desprende pela face fetal.
▪ Baudeloque-Duncan: a placenta se desprende pela face materna.

Face materna

Face fetal

Face fetal

Face materna

O descolamento precoce da placenta é uma emergência obstétrica,


porque ocasiona a perda de trocas nutritivas e gasosa entre a mãe e
o feto. A DPP é uma causa de hemorragia comum na segunda
metade da gravidez, com altos índices de mortalidade perinatal e
materna. Pode ser causada por traumas internos, externos e por
outros fatores não traumáticos, como HAS, multiparidade, idade
materna avançada, cesárea prévia, DM, tabagismo, etilismo, entre outros. No caso de
DPP, a medida a ser tomada é a parturição imediata por qualquer via,
preferencialmente vaginal, mas a cesárea deve ser praticada se não for viável.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 44


1. Manejo ativo do secundamento (em ordem de preferência)
o Clampeamento do cordão (no máximo até 3min após expulsão)
o Massagem uterina
o Manobra de Harvey: pinçamento da parede do ventre (como se
segurasse uma laranja), pedindo para a paciente tossir ou contrair a
parede abdominal
o Manobra de Fabre ou “do pescador”: tração controlada do cordão
o Manobra de Jacob-Dublin: torcer suavemente a placenta no sentido
axial para as membranas se disporem em fuso
o Administração rotineira de uterotônicos: após o desprendimento da
placenta, como ocitocina (preferencialmente) ou ergometrina ou
misoprostol (com o objetivo de evitar sangramentos)

2. Revisão do canal de parto: deve ser sistemática e feita após o secundamento


placentário. Pequenas rasgaduras na mucosa vaginal não requerem cuidados,
pois cicatrizam rapidamente. Lacerações no bordo do colo uterino devem ser
suturadas para evitar sangramentos profusos e complicações futuras, como
incompetência istmo-cervical. Se foi efetuada a episiotomia, esta deve ser
corrigida pela episiorrafia. É importante, também, conferir a placeta, a fim de
verificar se não falta nenhum pedaço. Se tiver, a retirada do canal de parto deve
ser mecânica.

Primeira hora após o parto


É neste período que se continua a retração uterina e fenômenos para a
contenção de hemorragias, envolvidos no globo de segurança de Pinard.
1. Miotamponagem: a retração uterina com contração miometral determina
laqueadura viva dos vasos uterinos endometriais (primeira linha de defesa).
2. Trombotamponagem: formação de hematoma intrauterino que recobre a ferida
aberta no sítio placentário.
3. Indiferença miouterina: o útero torna-se “apático”, com fases de contração e
de relaxamento.
4. Contração uterina fixa: normalmente, decorrida uma hora após o parto, o útero
adquire maior tônus e assim se mantém.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 45


Parto operatório
É chamado parto operatório aquele realizado com auxílio do fórcipe ou o
realizado por via abdominal, que é a cesariana. O parto à fórcipe está cada vez mais
em desuso, em razão da alargada segurança da operação cesariana.

Parto à fórcipe

O fórcipe é o instrumento destinado a apreender a cabeça ou a nádega do feto


e extraí-la através do canal pelvigenital. Ele é composto por dois ramos, que se dividem
em colher, articulação e cabo. Existem diversos tipos, sendo o mais utilizado o de
Simpson. Mais raramente, são usados o de Kielland, o de Barton e o de Piper.
Segundo a altura da apresentação na escavação, o fórcipe pode ser alto, médio,
médio-baixo e baixo. O único usado hoje em dia é o baixo ou o chamado fórcipe de
alívio, que serve para ajudar o parto em apresentação cefálica fletida (Simpson) ou é
manobra imprescindível para o parto pélvico com cabeça derradeira (Piper).

Kielland
Simpson

Barton

Piper

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Atualmente, apenas o fórcipe de alívio é utilizado:
➔ O escalpe fetal encontra-se visível sem a necessidade de afastar os grandes
lábios
➔ A cabeça atingiu o assoalho pélvico (plano +4 a +5 de DeLee)
➔ A sutura sagital está no diâmetro ântero-posterior ou nos diâmetros oblíquos
anterior/posterior
➔ A rotação não deve exceder 45º
➔ É imprescindível saber a variedade de posição para a correta aplicação

Condições de praticabilidade: boa proporcionalidade cefalopélvica, dilatação


completa do colo, períneo de boa elasticidade e membranas rotas.

Indicações
▪ Fetal: sofrimento fetal presumido
▪ Materna
o Condições médicas em que se deseja evitar os puxos, como cardiopatias
classe III ou IV, crise hipertensiva, doença cerebrovascular, miastenia
gravis, lesão medular, etc.
o Exaustão da parturiente
▪ Parada de progressão (com a apresentação aflorando à vulva; final de TP)
o Nulíparas: parada de progressão do segundo período por 3 horas com o
uso de analgesia espinhal ou por 2 horas sem analgesia
o Multíparas: parada de progressão do segundo período por 2 horas com
uso de analgesia espinhal ou por 1 hora sem analgesia

Parto cesáreo

A cesariana ou cesárea é o ato cirúrgico que consiste em incisar o abdome e a


parede uterina para liberar o concepto. Em 1985, a OMS instituiu o percentual de 15%
de cesáreas como limite preconizado a qualquer país. Hoje, no Brasil, o SUS só paga
as cesarianas realizadas em até 30% do número total de partos, como tentativa de
alcançar a recomendação da OMS.

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Indicações absolutas
▪ Placenta prévia total
▪ Desproporção céfalo-pélvica (DCP) absoluta
▪ Herpes genital ativo
▪ Apresentação córmica defletida de terceiro grau
▪ Condiloma com obstrução de trabalho de parto

Indicações relativas
▪ Cesárea prévia há menos de 2 anos: risco de rotura uterina
▪ Discinesias: parada de progressão por falha na contratilidade uterina
▪ Placenta prévia total: indicação absoluta
▪ Descolamento prematuro da placenta (DPP)
▪ Apresentação córmica
▪ Apresentação pélvica em primípara
▪ Sofrimento fetal agudo: visto na cardiotocografia
▪ Diabetes gestacional: feto geralmente macrossômico
▪ Prolapso e procedência de cordão ou de membros
▪ Gestação gemelar

Técnica
A anestesia utilizada é a raquimedular, a peridural ou a geral. Deve-se passar
uma sonda vesical de demora (Foley) e colocar a paciente em Trendelemburg (elevação
das pernas em 35º a 45º).

Tipos de incisão

▪ Mediana: longitudinal, em desuso.


▪ Pfannenstiel: transversal, arciforme,
com a convexidade para cima, um a dois
dedos acima do bordo superior do pube,
lateralmente equidistante da linha média
(linha nigra).
▪ Joel-Cohen: transversal e retilínea,
feita pouco acima da Pfannenstiel.

Camadas incisadas
1. Pele: transversal (Pfannenstiel)
2. Tecido celular subcutâneo (TCSC): mesmo sentido da pele
3. Aponeurose: mesmo sentido do TCSC
4. Músculo reto-abdominal: longitudinal (afastando os músculos)

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5. Peritônio parietal: mesmo sentido do músculo
6. Peritônio visceral: transversal como Pfannenstiel
7. Parede uterina: mesmo sentido do peritônio visceral

A cirurgia
Nas cirurgias pélvicas, o cirurgião se coloca à esquerda do paciente. No entanto,
na cesariana, convencionou-se que o obstetra se coloca à direita. A pinça Kelly deve
ser utilizada, junto com os dedos, para divulsionar a ferida operatória, e a mão deve ser
usada para alavancar a apresentação.
O auxiliar cirúrgico deve comprimir o fundo uterino para ajudar a saída
fetal. Após isso, ocorre a retirada do feto, o clampeamento do cordão e a retirada da
placenta. Por fim, revisão da cavidade uterina, fechamento de todos os planos incisados
e curativo oclusivo.

Estratégias para reduzir o índice de cesáreas


➔ Direcionadas aos obstetras
o Parto vaginal após cesariana
o Indução do parto com 41 semanas
o Versão cefálica externa na apresentação pélvica
o Amniotomia e ocitocina para acelerar o parto
o Uso do partograma e ausculta fetal intermitente
➔ Direcionadas às mulheres: se resumem apenas ao suporte contínuo no parto
e ao incentivo durante o pré-natal ao parto vaginal

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Lactação
Introdução
A amamentação constitui uma das questões mais importantes para a saúde
humana, principalmente nos primeiros anos de vida, pois atende às necessidades
nutricionais e metabólicas, além de conferir proteção imunológica ao lactente. O
ministério da saúde e a OMS recomendam o aleitamento materno exclusivo nos
primeiros 6 meses de vida (não precisa complementar nem com água), com
introdução alimentação a partir dos 6 meses e mantendo até os dois anos de vida.

Vantagens
➔ Para a criança
o Alimento completo do lactente até os 6 meses
o Menor incidência de doenças diarreicas e, caso adquira, são de menor
gravidade
o Sofre menos risco de infecções do TRI, de otite média, de meningite
bacteriana, entre outras
o Maior vínculo afetivo
o Diminui probabilidade de maus tratos
➔ Para a mãe
o Favorece a involução uterina, a perda de peso e diminui a hemorragia
pós-parto
o Diminui risco de câncer de mama, ovário e endométrio
o É mais barato, prático e limpo
o Método contraceptivo

Anatomia da mama
A mama é formada pelo
tecido glandular (alveolar),
sistema de ductos e canais,
tecido conjuntivo, adiposo,
vasos sanguíneos e linfáticos. A
glândula mamária é composta por
15 a 20 unidades lactíferas que são
formadas pelos alvéolos (células
secretoras circundadas por células
mioepiteliais/ejetoras), canalículos,
ductos lactíferos e seio lactífero,
localizado logo abaixo da aréola.

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Controle hormonal
Durante a gravidez, o hormônio lactogênio placentário (HPL), com produção
maior por volta da 20ª semana, é responsável pela hipertrofia dos lóbulos e células
secretoras (alveolares), pela maturação das células secretoras, aumento da
vascularização e pelo depósito de gordura intersticial. Todas essas ações promovem o
crescimento mamário. A produção de leite não é executada durante a gravidez porque
é inibida pelo fator inibidor da prolactina (dopamina), pelo estrogênio e pela
progesterona.
Após o parto, entram em cena a prolactina e a ocitocina, que respondem
intensamente ao reflexo de sucção mamilar. A prolactina é produzida na hipófise
anterior e estimula as células alveolares a produzir o leite. Já a ocitocina é produzida
na hipófise posterior e promove contração das células mioepiteliais, gerando a
impulsão do leite em direção ao mamilo (descida do leite).

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Fisiologia
Três processos fisiológicos estão envolvidos na lactação:

1. Lactogênese I: ocorre durante a gravidez, é o preparo para a lactação, mediada


pelos hormônios placentários. Neste processo, estão envolvidas as etapas:
a) Crescimento e diferenciação fisiológica do epitélio lóbulo-alveolar
(passagem para o estado secretor)
b) Hiperplasia e hipertrofia da mama
c) Aumento do tecido adiposo
d) Aumento da vascularização
e) Baixos níveis de caseína e beta-lactoglobulina nas células alveolares
2. Lactogênese II: ocorre no pós-parto, é a secreção e a ejeção láctea. Há
diminuição de progesterona e aumento da prolactina.
a) Síntese de alfa-lactoalbumina ocasiona a síntese de lactose, e, por
efeito osmótico, há expansão do volume da secreção láctea.
b) A prolactina se liga a receptores das células secretoras alveolares
estimulando síntese e secreção de componentes do leite.
c) Diante do aumento da ocitocina por sucção do bebê, há contração das
células mioepiteliais e ejeção do leite.

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3. Lactogênese III ou galactopoiese: manutenção da lactação

Esvaziamento Acúmulo de leite nas mamas


frequente das mamas

Aumenta o FIL (feedback


Maior eficiência de inhibitor of lactation),
secreção láctea ocasionando menor
eficiência na secreção láctea

O principal fator de lactogênese ruim é, portanto, o feedback inibidor da


lactação. A curto prazo, o acúmulo de leite tem um efeito supressor na lactação,
reversível, pois reduz a ligação da prolactina aos receptores das células alveolares,
diminui a síntese de proteína, a lactose e a secreção láctea. A longo prazo, há involução
da glândula mamária e ocasiona a interrupção da lactação.

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Tipos de leite
1. Colostro: é secretado nos primeiros 3 a 5 dias após o parto. Tem valor
energético de 67-70kcal/100mL, semelhante ao leite maduro. Sua composição
apresenta maior conteúdo de eletrólitos, proteínas, vitaminas lipossolúveis
(vitamina A, que dá a coloração amarelada), minerais e imunoglobulinas (IgA,
lactoferrina). Por outro lado, possui menos gordura, lactose e vitaminas
hidrossolúveis. Facilita a eliminação de mecônio, permite a proliferação de
Lactobacillus bifidus (flora saprófita e que impede a proliferação de micro-
organismos patogênicos) na luz intestinal e estimula o sistema imune.
2. Leite de transição: produzido a partir do 6º dia até a segunda pós-parto. É
intermediário entre o colostro e o leite maduro, mesclando a composição de
ambos.
3. Leite maduro: produzido a partir da segunda quinzena pós-parto. Tem maior
teor lipídico e de lactose, menos quantidade de proteínas. O leite anterior
é ralo e doce (solução), ocorrendo predomínio de proteína do soro e lactose. No
meio da mamada, é maior a quantidade de caseína (suspensão). O leite
posterior tem grande concentração de gordura, necessária, para saciar o
lactente (emulsão).

Além dessas modificações, o leite materno maduro também muda de


composição sob demanda das necessidades do bebê, como quando ele
fica doente. O mecanismo de alteração da composição do leite não é bem
estabelecido, mas entende-se que o processo começa por sinapses – a
preocupação da mãe – e também considera-se que a saliva do bebê encostando nos
receptores mamários dê sinais dessa necessidade.

Composição bioquímica do leite materno


A concentração proteica do leite humano é menor que o do leite de vaca. A
relação caseína/proteínas do soro no leite de vaca é cerca de 80/20, ocorrendo a
formação de um coalho mais duro, dificultando a digestão e aumentando o tempo de
esvaziamento gástrico.
A proteína do soro com maior concentração no leite humano é a
alfalactoalbumina humana, que tem potencial alergênico praticamente no nulo,
enquanto no leite de vaca é beta-lactoalbumina. Além disso, o leite materno tem maior
digestibilidade, pois tem lipase.

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O leite humano tem, ainda, ácidos graxos de cadeia longa, que têm ação
primordial no desenvolvimento neuropsicomotor e na formação da retina. A lactose
é o principal carboidrato do leite materno, que, por hidrólise, fornece glicose e galactose,
sendo esta importante para a formação dos
cerebrosídeos (componente lipídico da
membrana dos neurônios).
A menor concentração de sódio no
leite materno impede a sobrecarga renal e
diminui o risco de desidratação hipertônica
frente a qualquer tipo de agravo. O ferro
está em baixa concentração em ambos os
leites, porém, a disponibilidade do ferro no
leite humano alcança 50%, enquanto no
leite de vaca, apenas 10% é absorvido.

Contraindicações da amamentação
➔ Maternas
o Doenças graves: endocardite, ICC, eclâmpsia
o Doenças bacterianas: TB, gonorreia, doença por estreptococos do grupo
A
o Doenças virais: varicela (enquanto estiver com vesículas), HIV
o Drogas: antineoplásicas, imunossupressores, substâncias radioativas
(iodoterapia), lítio, drogas ilícitas
➔ Da criança: erros inatos do metabolismo
o Galactosemia
o Fenilcetonúria

Patologias da lactação

Hipogalactia
É a baixa produção do leite, que é dividida em
▪ Primária: surge desde o início da amamentação e depende diretamente da
glândula mamária
o Hipoplasia mamária: natural ou pós-cirúrgica (mamoplastia)
o Nutrição deficiente da mãe
o Doenças consumptivas
o Fatores emocionais, como depressão pós-parto
▪ Secundária: mostra-se no decorrer da amamentação e é
consequência do esvaziamento incompleto da mama
o Erro de técnica: pega errada
o Malformação do aparelho bucal do RN: lápio
leporino, fenda palatina
o Alterações de conformação dos mamilos: plano ou
invertido
o Presença de lesões mamilares: rachaduras e fissuras

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O diagnóstico é feito pelo relato da nutriz ou pela observação do lactente que
apresenta estagnação ou regressão da curva de peso. O tratamento da hipogalactia
primária pode ser realizado com metoclopramida/domperidona/bromoprida por 3 a
5 dias, que têm como efeito colateral a galactorreia; e da secundária, deve-se corrigir
a pega, usar próteses de palato até que se possa realizar a cirurgia corretiva, e tratar as
fissuras com o próprio leite ou pomadas cicatrizantes sobre o mamilo afetado.

Ingurgitamento mamário
Caracteriza-se pelo aumento do volume das mamas, que se apresentam
túrgidas, distendidas e dolorosas a ponto de impedir a amamentação. O que aparece
no segundo ou no terceiro dia de pós-parto,
quando surge o leite de transição, é consequente
à congestão venosa e ao edema da mama e é
considerado fisiológico. O patológico, por sua
vez, é de aparecimento tardio e o distúrbio de
base de sua fisiopatologia é a retenção de leite
nas mamas por acotovelamento dos canais
galactóforos e consequente falta de
esvaziamento da mama. É muito comum em
mulheres com mamas volumas e pendulares.

➔ Diagnóstico
o Hipogalactia secundária
o Distensão tecidual excessiva, causando grande desconforto
o Febre e mal-estar
o Mama aumentada de tamanho, dolorosa, com áreas difusas
avermelhadas, edemaciadas e brilhantes
o Mamilos ficam achatados, dificutando a pega do bebê
➔ Tratamento
o Boa sustentação das mamas com sutiã apropriado para alívio da dor e
manutenção dos ductos em posição anatômica
o Ordenhar manualmente um pouco de leite antes da mamada para facilitar
a pega
o Amamentar com frequência, em livre demanda
o Usar analgésicos sistêmicos ou antiinflamatórios (ibuprofeno ou
paracetamol)
o Usar compressas frias após as mamadas para diminuir o edema, a
vascularização, e a dor

Mastite
A mastite puerperal ou da lactação é um processo infeccioso agudo das
glândulas mamárias que acomete mulheres em fase de lactação, de difícil tratamento.

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Ela se explica pela maior atividade da glândula mamária e pela amamentação, que
proomove intensa manipulação dos seios, em especial os mamilos e aréola.
O mamilo pode ser porta de entrada fácil através dos canais galactóforos
(mastite parenquimatosa) e quando tem solução de continudade, como as fissuras ou
rachaduras, denominada mastite intersticial.
A incidência é alta, até 33% e é causada geralmente por S. aureus, mas pode
também ser causada por S. epidermidis, estreptococos, Enterobacter, Klebisiella sp e
E. coli.

➔ Fatores predisponentes
o Anomalias do mamilo: invertido, plano, grande
o Condições de higiene local
o Pega ruim para fazer a sucção
o Ingurgitamento mamário
➔ Quadro clínico
o Dor espontânea ou, principalmente, no
momento da amamentação
o Febre
o Calafrios
o Mal estar
o Ingurgitamento mamário
o Hiperemia
o Calor local
o Ponto de flutuação da pele quando se formou
abscesso

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➔ Tratamento
o Boa sustentação das mamas com
sutiã apropriado
o Ordenhar manualmente um pouco de
leite antes da mamada para facilitar a
pega
o Usar analgésicos sistêmicos e
antiinflamatórios (ibuprofeno ou
paracetamol)
o Compressas frias até de 2h/2h
o Antibiótico: iniciar o uso após 24h sem redução dos sintomas com as
medidas de suporte descritas. Duração de tratamento de 10 dias, em
esquema:
▪ Cefalexina 500mg VO 6h/6h
▪ Amoxicilina com clavulanato 500mg + 2000mg VO de 8/8h
▪ Pacientes alérgicas a penicilina: clindamicina 300mg VO 8/8h
o Drenagem cirúrgica de abscessos
o Em alguns casos, supressão da lactação com bromoergocriptina 0,5mg
2 comprimidos VO em dose única

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Avaliação da vitalidade fetal
Contagem dos movimentos fetais
Os fetos saudáveis mexem de 4 a 100 vezes por hora. As primigestas sentem
os movimentos geralmente a partir de 18 a 20 semanas, enquanto as pacientes que já
engravidaram costumam sentir antes, com 16 semanas.
A grande vantagem da análise dos movimentos é o custo baixo e o fato de ser
realizado pela própria gestante em todos os momentos.
Existem dois tipos de contagem:
▪ Sadovsky: contagem dos MF 3x/dia depois das refeições. O valor de referência
é que o feto se movimente 4x ou mais. Caso esse número não seja alcançado,
o médico deve recomendar que a gestante repita a contagem na próxima hora.
Se ainda não mexer, o obstetra precisa avaliar.
▪ Cardiff: orienta-se a gestante para que seja realizada a contagem de dez MF
durante um período de 12h.

Em pacientes de alto risco, o obstetra deve realizar a contagem após 26-32


semanas. Em pacientes de baixo risco, observar se amãe percebe diminuição da
movimentação conforme as consultas pré-natais é suficiente no primeiro momento.

A contagem dos movimentos fetais não pode determinar a conduta de parto. Se


resultado anormal: realizar outro teste mais específico. Se resultado normal:
não há necessidade de outros testes.

Cardiotocografia basal
A CTG é realizada com um
aparelho específico para medir os
batimentos fetais. Esse exame não deve
ser realizado rotineiramente nem para
todas as gestantes, apenas aquelas que
relatam movimentos diminuindo e em
pacientes com fatores de risco para
prognóstico fetal adverso.
Apesar de ser um método de
análise válido, se houver disponibilidade
no hospital, é preferível realizar o
doppler.
Convencionou-se que uma CTG normal garante ao feto a segurança de seus
batimentos fetais normais por uma semana. Essa convenção é, no entanto, relativa,
porque o comportamento correto da frequência cardíaca fetal depende de dois fatores
básicos:
SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 59
➔ Da integridade do SNC: centros cerebrais cardioacelerador (simpático) e
cardioinibidor (parassimpático), situados no diencéfalo.
➔ Da integridade da inervação autônoma do coração

Traçado normal da CTG


Em padrões normais, a linha de base deve estar no intervalo 110-160bpm
cardíacos fetais, com uma variabilidade de 6 até 25 bpm em duas ou mais
acelerações, demonstrada em “A”. A linha “D” é a pressão uterina, isto é, mostra se a
gestante está tendo contrações.

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Traçados anormais

Este exame demonstra a linha de base em padrão comprimido,


revelando ausência de oscilação. Neste caso, pode-se utilizar como
conduta a administração de glicose hipertônica ou pedir para a
paciente comer, pois a hipoglicemia materna pode alterar o padrão.
Além disso, vale a pena investigar se a paciente faz uso de algum
ansiolítico.

A cada contração uterina, há uma bradicardia fetal transitória. Esse


fenômeno é denominado Dip I, consequência da compressão do polo
cefálico fetal, provocando reflexo vagal. É uma alteração fisiológica e,
logo após a contração, observa-se o aumento da frequência cardíaca
fetal. No caso da Dip II, a desaceleração não coincide com a contração
uterina e é sinal de hipóxia fetal. Um Dip II esporádico é aceitável; de
caráter repetitivo, pode ser um sinal de enrolamento de cordão.

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Padrão sinusoidal, com ou sem contrações uterinas, demonstra
hipóxia fetal.

Classificação dos achados na CTG


➔ Categoria I: é preditivo de equilíbrio ácido-base normal do feto no momento
da observação. Nenhuma intervenção é necessária. Deve incluir todos os
seguintes parâmetros
o Linha de base entre 110 a 160 bpm
o Variabilidade normal
o Desacelerações tardias ou variáveis ausentes
o Desacelerações precoces presentes ou ausentes
o Acelerações transitórias presentes ou ausentes

➔ Categoria II: não pode ser incluída na I ou III. Embora os traçados não sejam
preditivos de alterações ácido-base, requerem avaliação contínua e
complementar (doppler). Nesta categoria inclui-se qualquer uma das seguintes
alterações
o Variabilidade mínima
o Variabilidade ausente não acompanhada de desacelerações recorrentes
o Variabilidade aumentada
o Ausência de acelerações transitórias depois de estímulo
o Desacelerações variáveis acompanhadas de variabilidade mínima ou
normal
o Desacelerações prolongadas (>2min e <10min de duração)
o Desacelerações tardias recorrentes com variabilidade normal

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➔ Categoria III: está associada a equilíbrio ácido-base anormal no momento
da observação e requer intervenção rápida. Deve incluir todos os seguintes
parâmetros
o Ausência de variabilidade + qualquer uma das outras
▪ Desacelerações tardias ou variáveis recorrentes
▪ Bradicardia
▪ Padrão sinusoidal

Perfil biofísico fetal


É prova de vitalidade fetal que se baseia fundamentalmente em parâmetros
ultrassonográficos, associados a cardiotocografia.

Dopplervelocimetria fetal
Quanto menor a velocidade do fluxo durante a diástolle, maior a resistência
periférica do território vascular examinado e vice-versa. Os principais índices usados
são:
▪ Índice de pulsatilidade (IP): Sístole (S) – Diástole (D)/Velocidade Média (VM)
▪ Índice de resistência (IR): S-D/S
▪ Relação S/D ou relação A/B: S/D

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Vasos estudados
➔ Artérias umbilicais: a artéria umbilical leva o sangue a ser oxigenado para a
placenta. Após a oxigenação, ele retorna pela veia umbilical. O fluxo dessa
artéria determina a função placentária e um índice alterado indica
comprometimento grave na perfusão fetoplacentária.

Ponto mais alto: sístole. Ponto mais baixo: diástole

➔ Artéria cerebral média: apresenta normalmente índice de resistência elevado


na vida fetal. Na presença de hipoxemia fetal, ocorre um aumento do aporte
sanguíneo para o cérebro, para o miocárdio e a para as suprarrenais. Esse
fenômeno adaptativo é chamado de centralização. No caso de diástole zero,
deve-se avaliar o ducto venoso; e no caso de diástole reversa, deve-se
interromper a gravidez.

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➔ Sistema venoso: a avaliação do ducto venoso dá a informação da função
cardíaca fetal. Em casos de hipóxia fetal, teremos onda A patológica, que
prediz acidemia grave. Pulsações na veia umbilical traduzem
descompensação fetal crítica.

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Puerpério
Introdução
Puerpério, sobreparto ou pós-parto é o período cronologicamente variável, no
qual ocorrem as manifestações involutivas da genitália materna e por conseguinte o
término da atividade endócrina. Por via de regra, completa-se a involução puerperal no
prazo de 6 a 8 semanas, mas este período se divide em puerpério imediato (1 a 10
dias de pós-parto), puerpério tardio (10 a 45 dias) e puerpério remoto (além do 45º
dia). O puerpério é fisiológico, mas, se houver complicações, ele se torna patológico.

Puerpério imediato
Com o objetivo de retornar ao estado pré-gravídico, as estruturas maternas
sofrem modificações estruturais e hormonais. Os fenômenos involutivos das estruturas
hipertrofiadas ou hiperplasiadas da gravidez são definidos pelo termo crise genital.

Útero
O fundo uterino regride e situa-se pouco acima da
cicatriz umbilical, cerca de 12 cm do pube, firmemente
contraído. As contrações rítmicas prosseguem, indolores,
mas causando, às vezes, cólicas mais intensas. Reflexo útero-mamário: as cólicas
mencionadas são mais frequentes
Os orifícios vasculares de onde se situava a nas mulheres que amamentam. A
secreção de ocitocina nessas
placenta sofrem trombose. Além disso, há retração e mulheres sinaliza que os miócitos
contração do miométrio (globo de segurança de Pinard). uterinos precisam contrair, o que
Esses dois processos geram uma hemostasia fisiológica. causa cólicas, e acelera a involução
uterina.
O ritmo de involução é acelerado entre o 3º e o 10º
dia e depois fica mais lento. Até o 10º dia, o útero ainda é abdominal, e depois retorna
à pelve.

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Colo
No pós-parto imediato, o
colo fica hiperemiado e
edemaciado, com bordas
distensíveis, pregueadas e
irregulares. O orifício externo fica
com aspecto em fenda
transversal – comum no parto por
via vaginal.
Com 12h de puerpério, o
colo já tem readquirido seu
formato, tendendo a se fechar
com as contrações do pós-
parto, em “focinho de toupeira”,
mas o OE fica aberto e distensível aos dedos examinadores. Com 3 dias, já é possível
distinguir OE, canal cervical e OI. Por volta de 9 a 10 dias, só o OE dá passagem ao
dedo do examinador; o OI está fechado. O colo da mulher que já deu à luz não retorna
à conformação das nulíparas.

Para que o útero fique em fenda,


uma dilatação grande deve
ocorrer. Pacientes que fazem
parto cesáreo marcado
permanecem com o colo
puntiforme.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 67


Vulva e vagina
Também ficam edemaciadas e com grande relaxamento das paredes, mas com
48h essas alterações já desaparecem. Nas primíparas, ocorre laceração do hímen que,
após cicatrizado, constituirá as carúnculas mirtiformes.
A queda nos níveis de estrogênio promove atrofia da mucosa vaginal,
estabelecendo-se a crise vaginal, com predominância das camadas profundas do
epitélio. O início da recuperação se dá a partir do 25º dia.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 68


Lóquios
São secreções – transudatos, exsudatos, elementos celulares e sangue –
liberadas pelo canal vaginal, decorrentes da involução uterina e da regeneração da
ferida placentária. O tipo de secreção varia de acordo com o tempo de puerpério:
➔ Até 4 dias: lóquios sanguíneos com fluxo vermelho escuro
➔ Entre 4 e 10 dias: lóquios serossanguíneos com coloração acastanhada e odor
peculiar
➔ Após 10 dias: lóquios serosos com coloração rósea ou de palha
Em algumas situações, pela anteversão uterina acentuada, pode haver retenção
dos lóquios (loquimetria) na primeira semana, predispondo a infecções.

Puerpério tardio
É o período de transição que começa com o 10º dia
após o parto, no qual fica mais evidente a recuperação
genital, influenciada pela lactação, e vai até o 45º dia.
O período de resguardo por 42
O útero continua a regredir, mas lentamente, até 6 dias é recomendado, sem relação
semanas pós-parto. A cavidade uterina refaz seu epitélio sexual, porque o risco de infecções
é maior devido a todas as
inteiramente, processo que fica finalizado por volta do 25º alterações do puerpério.
dia.
O epitélio vaginal mantém um padrão atrófico, no qual predominam as camadas
profundas, até o 25º dia. A partir de então, na mulher que amamenta, mantém-se esse
padrão, enquanto naquela que não amamenta, há aceleração do processo evolutivo.

Puerpério remoto
Começa a partir do 45º dia após o parto e é um período de duração imprecisa,
dependendo, também, da lactação.
A vagina torna-se normoestrogênica, mas diversas mulheres referem
ressecamento vaginal, com dispareunia. A menstruação retorna, podendo ser

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precedida da ovulação (80% das puérperas ovulam antes da primeira menstruação –
por isso, não se deve esperar a menstruação para iniciar anticoncepção neste período).
As lactantes podem ficar amenorreicas por 8 a 10 meses, enquanto as não
lactantes voltam a menstruar em 2 meses.
São queixas comuns das mulheres neste período:
▪ Queda de cabelo
▪ Redução da libido
▪ Ressecamento vaginal
▪ Ressecamento da pele
▪ Astenia

Involução dos sistemas extragenitais


Acontece em diversas fases do puerpério, gradativamente.

Sistema endócrino
▪ HCG e HPL: eram produzidos pela placenta, logo, a queda é brusca e rápida
▪ Estrogênio e progesterona: têm queda acentuada, pois, durante a gravidez, seus
níveis são aumentados graças à atividade placentária. Retornam aos níveis
normais gradativamente, dependendo da lactação.

Sistema cardiovascular
▪ Débito cardíaco: aumentado em 10% na primeira hora do pós-parto e se mantém
assim por cerca de 1 semana
▪ Pressão venosa dos MMII: está elevada na gravidez e normaliza-se
imediatamente
▪ Varizes e hemorroidas: atenuam-se
▪ Edemas: desaparecem gradativamente

Sistema hematológico
▪ Série vermelha: inalterada
▪ Série branca: apresenta leucocitose até 25.000 glóbulos, reduzindo à metade
em 48h e normalizada após 5 dias
▪ VHS: acelerada na gravidez e volta a aumentar no pós-parto, regularizando entre
5 e 7 semanas
▪ Hematócrito: volta a níveis não-gravídicos em 6 semanas
▪ Coagulabilidade: risco aumentado de trombose por aumento na tendência à
coagulação

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Sistema urinário
▪ Capacidade da bexiga: como ela dilata, bem como os ureteres, durante a
gravidez, no pós-parto, ela ainda se encontra dilatada, o que permite o aumento
da capacidade da bexiga
▪ Cistocele: prolapso da parede vaginal anterior entre os grandes lábios, que
acontece por relaxamento do diafragma urogenital
▪ Diurese: do 2º ao 6º dia, estabelece-se abundante diurese, que elimina a água
acumulada.

Sistema digestivo
▪ Anatomia: as vísceras abdominais retornam, vagarosamente, às suas posições
após o esvaziamento do útero
▪ Motilidade: até 4 dias após o parto, há hipomotilidade intestinal

Sistema cutâneo
▪ Estrias: na região do abdome e das mamas, as estrias perdem a cor vermelho-
arroxeada e ficam algumas semanas branco-nacaradas
▪ Hiperpigmentação: o cloasma e a linha nigra regridem

Peso
Nos primeiros 10 dias, há perda acentuada de peso, por causa da saída do
feto, da maior diurese, da secreção láctea e da eliminação loquial. Depois deste tempo,

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a amamentação é um potente redutor de peso no puerpério, porque a gordura do leite
passa da mãe para o bebê.

Alterações psíquicas
Pela quantidade de mudanças, é normal que a paciente tenha uma instabilidade
emocional, denominada blues puerperal. Isso acomete >50% das pacientes nas
primeiras duas semanas.
Isso se torna preocupante quando a mãe passa a rejeitar o neném de alguma
maneira, se recusa a vê-lo ou a cuidar dele. A partir deste ponto, considera-se avaliação
de depressão pós-parto.

Assistência pós-natal

1. Medidas higiênicas e dietéticas


▪ A vulva e o períneo devem ser limpos com água, após micção e
defecação
▪ Uso regular de absorventes para os lóquios
▪ Mamilos devem ser limpos com água filtrada antes e após as mamadas.
O uso de conchas de amamentação é útil para evitar a proliferação de
germes. O uso de sutiã firme também é recomendado.
▪ Alimentação sem grandes restrições, com incentivo ao consumo maior
de líquidos
▪ Na cesárea: lavar e secar 3x ao dia e depois álcool 70º. Se houver
episiorrafia, lavar a seca e evitar passar papel higiênico, porque pode
agarrar e predispor a infecções. É desnecessária a prescrição rotineira
de antissépticos e pomadas cicatrizantes.
2. Deambulação: deve ser precoce para evitar tromboembolismo e ajudar nas
eliminações fisiológicas
3. Exames pós-parto: a visita média deve ser feita em até 48h, com avaliação de
▪ Temperatura e pulso: hipertermia pode indicar processo infeccioso
▪ Palpação do útero e da bexiga: para avaliar sub-involução uterina
(infecção, retenção de membranas) e retenção urinária (lesões em
esfíncter uretral)
▪ Lóquios: observar volume o odor
▪ Períneo: verificar a cicatrização da episiorrafia e hemorroidas
▪ Mamas: avaliar mamilos (fissuras) e consistência (infecções)
▪ Membros inferiores: reconhecer precocemente tromboses
4. Consulta de revisão: deve ser realizada com 20 a 30 dias após parto normal e
7 a 12 dias após cesariana.

Puerpério patológico
As modificações descritas acima são parte do puerpério fisiológico, isto é, são
naturais e fazem parte do progresso de involução das características gravídicas.
Quando não seguem este padrão, patologias aparecem, desde o delivramento

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placentário até os dias que se seguem após o parto. As patologias podem ser
hemorrágicas ou infecciosas.

Hemorragia puerperal
➔ Incidência: 5 a 8% de todos os partos. É uma importante causa de mortalidade
materna e pode ter como consequência choque hipovolêmico, necessidades
transfusionais, e síndrome de Sheehan (amenorreia secundária a hipóxia
hipofisária)
➔ Classificação
o Hemorragia puerperal precoce: acontece nas primeiras 24h, e pode ser
causada por atonia uterina, lacerações no canal de parto, retenção
placentária, rotura uterina, inversão uterina e transtornos da coagulação
o Hemorragia puerperal tardia: entre as 24h e 6 semanas de pós-parto,
tendo como causas sub-involução do sítio placentário uterino e retenção
de restos placentários.
➔ Fatores de risco
o Sobredistensão uterina: gravidez gemelar, polidramnia, macrossomia
fetal
o Multiparidade
o Trabalho de parto prolongado
o Infecção ovular
o Placenta prévia
o Parto prematuro

Retenção placentária
A placenta é considerada retida quando o secundamento não se completou
decorridos 30min da expulsão fetal. Diante dessa observação, pode-se concluir que
houve:
▪ Descolamento retardado: quando ocorre
por hipotonia uterina ou por anormalidade
anatômica das aderências placentárias
(acretismo placentário);
▪ Encarceramento: quando as contrações
espasmódicas do orifício cervical (anel de
Bandl) aprisionam a placenta; ou
▪ Retenção de fragmentos: quando ocorre
retenção de membranas ou de
cotilédones. Por isso, é bom examinar a
placenta ainda na mesa de parto, para Pedaço de placenta faltando
checar se está completa.
Para tratar a retenção placentária,
administra-se infusão venosa de líquidos e
eletrólitos ou de sangue total, para conter a
hemorragia, primeiramente. Após isso, existem
três maneiras de desfazer a retenção:

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a) Manobra de Credé: segura-se o útero entre o polegar e os outros dedos, fazendo
uma expressão no sentido ântero-posterior
b) Extração manual (curagem): com a paciente anestesiada, põe-se a mão
esquerda sobre o ventre e a direita é introduzida no útero para achar um plano
de clivagem e proceder a separação completa da placenta
c) Curetagem cuidadosa ou histerectomia: se não houve sucesso na curagem

Inversão uterina aguda


É a invaginação do fundo uterino, em forma de dedo de luva, que pode alcançar
a vagina (parcial) ou surgir fora da vulva (total). As causas podem ser hipotonia,
adelgaçamento das paredes uterinas, esvaziamento súbito do útero e manobras para
extrair a placenta, como pressão violeta sobre o fundo e tração do cordão umbilical.
No geral, a paciente relata dor aguda, hemorragia profusa e evolui para choque.
O tratamento consiste em correção manual (manobra de Taxe) e medicação para tratar
o choque. Se a manobra falhar, deve-se fazer a correção cirúrgica (operação de
Huntington) após a compensação do choque).

Manobra de Taxe Cirurgia de Huntington

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Hemorragias do pós-secundamento
Acontecem após a saída de placenta completa. Podem ter como causas as
lacerações do canal de parto e a hipotonia uterina. As lesões traumáticas estão
subordinadas à operatória transpelvina: fórcipe, versão por manobras internas ou
extração de feto pélvico.
A hemorragia é vultuosa, sangue vermelho vivo com fluxo contínuo e o
útero está contraído. A laceração pode ser no colo, na vagina ou se estender
parcialmente ao corpo uterino. A hipotonia uterina tem como causas a sobredistensão
ou esgotamento das fibras musculares e pode ser de gravidade imensa.
O tratamento se baseia em:
▪ Identificação e sutura das
lacerações,
▪ Massagem suave e permanente
do fundo uterino
▪ Ocitocina venosa, alcalóides do
ergot intramuscular ou
misoprostol intravaginal,
▪ Reposição volêmica (Ringer
lactato e/ou sangue total),
▪ Compressão permanente do
fundo com enfaixamento abdominal ou saco de areia
▪ Compressão da aorta abdominal: com o punho cerrado, empurrando pra frente
o útero
▪ Compressão bimanual do útero (método de Hamilton).

Recomendação para profilaxia de hemorragia pós-parto: administrar ocitocina


10 unidades (2 ampolas) intramuscular

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Traje antichoque

Balão intrauterino

Infecção puerperal
Também é denominada infecção febril puerperal, é a infecção que se origina no
aparelho genital após o parto recente, com febre maior que 38ºC ocorrida entre o
segundo e o décimo dia de pós-parto. Cerca de 8% de todos os partos tem essa
complicação.
Fatores de risco:
▪ Parto cesáreo
▪ Amniorrexe prematura prolongada
▪ Parto prolongado
▪ Toques ginecológicos frequentes
▪ Baixa higiene

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Infecção da ferida operatória
Tem como agentes etiológicos o S. aureus e B. fragilis. O quadro clínico
apresenta febre entre o quarto e o quinto dia de pós-parto, edema, eritema, dor, e
deiscência da sutura com eliminação de pus.
Tratamento:
▪ Drenagem cirúrgica da ferida em centro cirúrgico, sob anestesia, dependendo
da extensão da infecção
▪ Analgésicos e antitérmicos
o Diclofenaco sódico: 50mg VO ou retal 8/8h
o Paracetamol: 500 a 750mg VO de 6/6h
o Dipirona 500mg VO de 6/6h
▪ Antibioticoterapia oral ou venosa, dependendo da gravidade do quadro
o Cefazolina 1g IV de 8/8 h (1ªescolha em pacientes internados).
o Cefalexina 500 mg VO de 6/6 horas (2ª escolha).
o Oxacilina 1 a 2 g IV de 4/4 horas (casos mais graves).
o Tempo recomendado de tratamento: 7 a 10 dias.

Endometrite e miometrite
É a mais frequente infecção puerperal,
surge na área de implantação da placenta e se
origina da ascensão de patógenos do trato
genital inferior. Os agentes envolvidos nessas
infecções são mais comumente Staphyloccocus
aureus, Streptoccocus pyogenes, Clostridium
perfringens, Escherichia coli, Chlamydia
tracomatis, Bacteroides fragilis.
Quadro clínico:
▪ Febre de 38,5º a 39ºC entre o 4º e 5º dia
de pós-parto
▪ Calafrios
▪ Dor hipogástrica
▪ Queda do estado geral, com inapetência
▪ Lóquios purulentos, com odor fétido
▪ Útero amolecido e doloroso à mobilização

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Tratamento:
▪ Internação para esquema antibiótico venoso: se possível, orientada pelo
antibiograma. Como conduta geral, sugere-se:
o Clindamicina 900 mg IV 8/8h +
o Gentamicina 1,7 mg /kg peso IV (máx. 240 mg) 1x ao dia
OU
o Ampicilina 1,5 g a 2 g IV de 6/6h +
o Gentamicina 3-5mg / kg (máx 240mg) uma vez ao dia IV ou IM +
o Metronidazol 500 mg IV 8/8h
OU
o Amoxicilina 500mg + ácido clavulânico 100mg IV 8/8h
o Antibioticoterapia pode ser suspensa após 3 dias sem sintomas. Em
casos mais graves, manter até 21 dias.
▪ Analgésicos e antitérmicos
o Paracetamol / dipirona 500mg VO de 6/6h
▪ AINEs
o Diclofenaco sódico 50mg VO de 8/8h
o Ibuprofeno 400mg VO de 8/8h
▪ A intervenção na cavidade endometrial (curetagem): só é indicada na suspeita
de restos ovulares com sangramento persistente, e será feita após 1 a 2 dias de
antibioticoterapia.

Infecção do aparelho urinário


É muito frequente, principalmente após cesarianas, pelo uso rotineiro de sonda
vesical de demora (Foley). E. coli é o agente infeccioso mais comum (75%).
Quadro clínico
▪ Disúria
▪ Polaciúria
▪ Estrangúria
▪ Retenção urinária pós-parto sem analgesia
▪ Febre
▪ Lombalgia

Tratamento
▪ Antibiótico específico após resultado de urocultura para cistite não complicada
▪ Internação e antibiótico parenteral em caso de pielonefrite: ampicilina,
cefalosporinas ou aminoglicosídeos
▪ Analgésicos e antitérmicos

Peritonite
Causada por S. aureus, S. pyogenes, C. perfringes, E. coli, Chlamydia
trachomatis, B. fragilis, Peptococcus spp.

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Quadro clínico
▪ Febre alta >40ºC
▪ Taquicardia
▪ Distensão abdominal
▪ Íleo paralítico
▪ Sinal de Blumber positivo
▪ Dor intensa ao toque vaginal
▪ Fundo de saco de Douglas pode estar abaulado por coleção purulenta
Tratamento
▪ Igual ao da endometrite + hidratação venosa com reposição de eletrólitos
▪ Drenagem de abscesso do fundo de saco (colpotomia)
▪ Laparatomia com HTA e pesquisa de outros focos abdominais, se peritonite
generalizada resistente à terapêutica clínica
▪ Admitir a hipótese de tromboflebite pélvica se febre mantida

Tromboflebite pélvica
Quadro clínico
▪ Febre puerperal persistente, a despeito da Coágulo
antibioticoterapia
▪ Dor abdominal mal localizada
Agente
Tratamento infeccioso

▪ Igual ao da endometrite + anticoagulantes


o Heparina 1000 UI/h EV ou
o Enoxaparina 20 a 40mg/dia SC
o Associar varfarina
o Manter o tratamento por 10 a 14 dias
o Nos casos de embolia: manter anticoagulação por 3 a 6 meses

Choque séptico
Quadro grave, habitualmente causado por E. coli.
Quadro clínico
▪ Febre constante
▪ Calafrios
▪ Taquicardia
▪ Estado geral comprometido
▪ Hipotensão arterial
▪ Útero pode ser indolor à palpação e os lóquios discretos
Tratamento
▪ UTI: igual ao da endometrite
▪ Investigação e drenagem de abscesso
▪ Laparotomia com HTA e pesquisa de outros focos abdominais (em resistência)

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hemorragias da primeira
metade da gestação
Abortamento

A OMS define o abortamento como a interrupção da gestação antes do


período perinatal (idade gestacional inferior a 20-22 semanas) e/ou <500g de peso
do feto. Apesar de ser comum tratar a palavra aborto como sinônimo, o aborto é o que
foi eliminado, e abortamento é o processo. É classificado, ainda, como precoce, quando
ocorre antes de 13 semanas, ou como tardio, quando está entre 13 e 20-22 semanas.
50% dos abortamentos são subclínicos (ocorre antes da próxima falha
menstrual), e cerca de 15% corresponde ao abortamento clínico (após a gravidez
confirmada), que ocorre no primeiro trimestre ou bem no
início do segundo. A maior parte dos abortamentos clínicos
acontecem por anomalias cromossômicas, especialmente
a síndrome de Turner.
Doenças endócrinas, como
Mulheres maiores de 35 anos têm risco maior de hipotireoidismo, DM
insulinodependente, SOP,
sofrer o processo, assim como usuárias de drogas lícitas e
infecções e distúrbios
ilícitas e portadoras de alterações uterinas. 80% das imunológicos (síndrome do
gestações são interrompidas até a 12ª semana, e o anticorpo antifosfolipídeo)
abortamento espontâneo diminui para menos de 10% também são causas de
abortamentos clínicos.
após os batimentos cardiofetais serem identificados na
ultrassonografia.

Fatores de risco

▪ Idade materna avançada


▪ Uso de álcool
▪ Uso de gás anestésico
▪ Uso excessivo de cafeína
▪ Tabagismo materno e paterno
▪ Uso de cocaína
▪ Nova gestação nos primeiros 3 meses do parto anterior
▪ Uso de DIU
▪ Medicações: misoprostol, retinoides, metotrexate, AINEs (menos paracetamol)
▪ Múltiplos abortamentos provocados previamente
▪ Radiação em altas doses
▪ Peso materno fora da faixa da normalidade
▪ Doença celíaca

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Apresentações clínicas

1. Ameaça de abortamento: gravidez complicada por sangramento em IG <22


semanas. A probabilidade de evolução para abortamento espontâneo é de 50%.
➔ Quadro clínico: sangramento discreto, dor discreta ou ausente, exame
especular sem alterações, colo fechado, USG sem alterações, febre
ausente, vitalidade ovular preservada e tamanho uterino compatível com
a IG.
➔ Tratamento: acompanhamento ambulatorial, repouso relativo,
abstinência sexual, USG seriada em intervalos dependentes da evolução
do caso, apoio psicológico.
o Progesterona: uso controverso. Está indicado atualmente
apenas no caso de abortamento habitual (quando ocorrem
abortamentos frequentes, 3 ou mais episódios consecutivos) por
insuficiência do corpo lúteo. Apesar de esse diagnóstico ser
difícil e raro, o tratamento acaba sendo “empírico” quando
ocorrem abortos consecutivos.
o Antiespasmódicos: hioscina, escopolamina. Ajudam no alívio
das cólicas.

2. Abortamento inevitável: o colo está dilatado, mas o produto da concepção não


foi eliminado. Considera-se uma progressão da ameaça de abortamento.
➔ Quadro clínico: sangramento presente e abundante, dor sempre
presente, exame especular releva hemorragia pelo orifício externo, colo
entreaberto, USG revela ovo deformado / hematoma retro-ovular / ovo
muito baixo, febre ausente, volume uterino pode ser incompatível com a
IG.

Hematoma retro-ovular

Ovo deformado

➔ Tratamento: na maior parte dos casos, a


resolução é espontânea em até 72h. A
paciente deve ser internada e submetida à
hidratação venosa, e acompanhada por Diferentemente da ameaça de
abortamento, no qual o uso de
sinais vitais. Nos casos que não se resolvem imunoglobulina anti-Rh é
espontaneamente, o médico deve instituir o questionável, o acontecimento de
esvaziamento uterino. Se houver sinais de um abortamento inevitável
pressupõe o uso para prevenção
abortamento provocado (manipulação da
da aloimunização em pacientes
cavidade uterina), a antibioticoterapia Rh-.
profilática deve ser administrada.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 81


o Na gestação de primeiro trimestre: misoprostol, aspiração
manual intrauterina (AMIU) ou dilatação do colo e curetagem
uterina. AMIU é realizada ambulatorialmente, com menos riscos.
o Na gestação de segundo trimestre: misoprostol, ocitocina em
soro glicosilado 0,5% 40mUI/min, AMIU ou curetagem após a
expulsão do feto, inibição da lactação com cabergolina 1mg VO
dose única.

3. Abortamento incompleto: alguma parte do produto da concepção foi


eliminada, mas não sua totalidade.
➔ Quadro clínico: sangramento presente e abundante, dor sempre
presente, exame especular revela saída de material pelo colo, colo
entreaberto, USG revela restos ovulares intrauterinos, febre ausente,
útero menor do que a IG.

Ecos endometriais amorfos e mal-


definidos, compatível com restos
ovulares na cavidade uterina.

➔ Tratamento: esvaziamento uterino e medidas de acompanhamento na


internação, assim como no abortamento inevitável.
o Na gestação de primeiro trimestre: misoprostol, aspiração
manual intrauterina (AMIU) ou dilatação do colo e curetagem
uterina. AMIU é realizada ambulatorialmente, com menos riscos.
o Na gestação de segundo trimestre: misoprostol, ocitocina em
soro glicosilado 0,5% 40mUI/min, AMIU ou curetagem após a
expulsão do feto, inibição da lactação com cabergolina 1mg VO
dose única.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 82


Tratamento com misoprostol
1ª opção: 4 comprimidos de
Até 12 semanas de 6 dias 200mcg via vaginal 12/12h – 3
doses
2ª opção: 2 comprimidos de
200mcg via vaginal 8/8h – 3 doses
1 comprimido de 200mcg via
13 a 16 semanas e 6 dias
vaginal 6/6h – 4 doses
1 comprimido de 100mcg via
17 a 26 semanas
vaginal 6/6h – 4 doses
Contraindicações: cesárea anterior, cirurgia uterina prévia, paciente asmática, uso
concomitante com ocitocina. Atenção: não usar ocitocina dentro de 6h após a última
dose de misoprostol.

4. Aborto retido: gravidez na qual já há a morte fetal sem a expulsão. Pode


acontecer por retenção do ovo morto (presença do embrião sem vida no saco
gestacional íntegro), ou ovo anembrionado/ovo cego (ausência de embrião no
saco gestacional íntegro).
➔ Quadro clínico: sangramento ausente, dor
ausente, exame especular sem alterações, colo
fechado, USG demonstra BCF ou embrião
ausente (realizar 2 exames intercalados de 15
dias), febre ausente.
➔ Tratamento: a conduta expectante pode ser
uma opção nessas pacientes (mas costuma ter
mais complicações, e esse tipo de abortamento

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 83


pode complicar com CIVD). Ao optar pelo esvaziamento uterino, medidas
gerais de internação devem ser seguidas.
o Em gestações <12 semanas: misoprostol, AMIU ou dilatação do
colo e curetagem uterina.
o Em gestações a partir de 12 semanas: misoprostol, perfusão
venosa de ocitocina, AMIU ou curetagem após a expulsão do feto
e inibição da lactação por cabergolina.

A conduta expectante consiste em aguardar a resolução espontânea do


abortamento, mas carrega alguns riscos, não sendo recomendada pela
maioria dos autores e só pode ser sugerida em gestações de 6 a 8 semanas
com estabilidade hemodinâmica. Caso não haja expulsão completa após 72h,
o esvaziamento uterino deve ser indicado. É importante lembrar que a prática
clínica nem sempre segue as condutas à risca e cada caso deve ser avaliado
pelo obstetra individualmente.

5. Abortamento infectado: abortamento (geralmente incompleto) complicado com


infecção intrauterina, mais frequente quando há manipulação da cavidade
uterina em tentativas de provocar o abortamento. Começa com uma
endometrite que pode progredir para peritonite, choque séptico, insuficiência
renal, coagulopatia, SDRA e morte.
➔ Quadro clínico: geralmente, é causado por diversos germes que
colonizam o trato genital inferior, sendo os mais comuns cocos
anaeróbios, E. coli, C. perfingrens e bacteroides. Sangramento variável,
dor presente com sinais de peritonite, exame especular revela secreção
purulenta, colo entreaberto, USG mostra restos ovulares intrauterinos,
febre presente.
➔ Tratamento: medidas gerais de internação e esvaziamento uterino, e
antibioticoterapia.
o Sem peritonite: cefazolina 2g EV de 8/8h e metronidazol 500mg
EV de 8/8h.
o Com peritonite: clindamicina 900mg IV 8/8h e gentamicina 3-
5mg/kg IV (dose máxima de 240mg) uma vez ao dia.
o Na gestação de primeiro trimestre: AMIU ou dilatação do colo
e curetagem uterina 1 hora após o início da terapêutica com
ocitócito e antibiótico.
o Na gestação de segundo trimestre: esvaziamento só deve ser
feito após a expulsão do feto; misoprostol, perfusão venosa de
ocitocina SG5% 40mUI/min, esvaziamento da cavidade uterina
uma hora após o início da terapêutica com ocitócito e antibiótico,
inibição da lactação com cabergolina.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 84


6. Abortamento completo: todo o material da
concepção foi eliminado sem necessidade de
intervenção médica ou cirúrgica.
➔ Quadro clínico: sangramento discreto ou
ausente, dor ausente, exame especular sem
alterações, colo fechado, USG mostra útero
vazio e ocasionalmente observa-se imagens
compatíveis com coágulos, febre ausente.
➔ Tratamento: apoio psicológico e
administração de imunoglobulina anti-Rh nas
gestantes Rh-.

Incompetência istmocervical

É a falência do sistema oclusivo da


matriz, de tal modo que o colo uterino não se
mantém cerrado, tornando-se incapaz de reter o
produto da concepção até o final da gravidez, o
que geralmente provoca a expulsão fetal após 16
semanas de gestação. Desse modo, a
incompetência istmocervial é causa de
abortamento tardio de repetição e de partos
prematuros habituais.
A principal causa é o trauma cervical,
seja ele por conização (biópsia do colo do útero),
laceração cervical no parto, ou dilatação cervical
exagerada em curetagens.

Diagnóstico

O diagnóstico é baseado no quadro e na história clínica, seguido dos exames


mencionados acima.
▪ Rotura espontânea das membranas e
dilatação cervical sem dor
▪ Concepto nasce vivo e morfologicamente
normal
▪ Perdas gestacionais ocorrem tipicamente
no segundo ou no início do terceiro trimestre, com
cada interrupção ocorrendo mais cedo que a
anterior. Usualmente, há história de 2 ou mais
perdas gestacionais (abortamento habitual)

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Parto em avalanche: termo utilizado para descrever o que, muitas vezes,
acontece nos casos de incompetência. Os eventos ocorrem um atrás do
outro, decorrentes da incapacidade do colo se manter fechado. Desse modo,
após identificar a dilatação cervical, o próximo passo pode ser tanto amniorrexe
quanto a sucessão dos eventos com um parto empelicado.

Tratamento

Podemos considerar três categorias de pacientes:


1. História clássica de insuficiência cervical com 2 ou mais perdas de segundo ou
início do terceiro trimestre, sem sangramento ou sinais claros de parto
precedendo a interrupção, candidatas à circlagem eletiva.
2. Pacientes com dilatação cervical >2cm ou prolapso das membranas, mas sem
contrações dolorosas e regulares, possíveis candidatas à circlagem de
emergência.
3. USG transvaginal (colo <25mm de 16-24 semanas) + 1 perda fetal, candidata à
circlagem terapêutica ou indicada.

A circlagem do colo uterino pela técnica de MacDonald é um procedimento


cirúrgico que corresponde à sutura em bolsa do colo uterino, próximo à junção
cervicouterina com fio não absorvível. Os pontos são profundos e não alcançam o canal
cervical para facilitar a remoção ao final da gravidez.
A cirurgia pode ser eletiva, podendo ser realizada entre 12 e 14 semanas de
gravidez após a USG transvaginal mostrar o feto vivo e sem anomalias, terapêutica
quando realizada entre 16 e 23 semanas e de emergência que pode acontecer entre
14 e 24 semanas.
➔ Circlagem eletiva: no pré-operatório e após a intervenção, faz-se tratamento ou
profilaxia de infecções locais com clindamicina vaginal. A tocólise deve ocorrer
2h antes do procedimento e deve ser mantida por 12h. Após a cirurgia,
recomenda-se repouso relativo por 30 dias, com proibição do coito. Como
complicações, há o aumento da atividade ou irritabilidade uterina, rotura das
membranas, corioamnionite, deslocamento da sutura, e cicatrização cervical
levando a distócia cervical.
➔ Circlagem de emergência: dilatação cervical avançada <4cm e herniação das
membranas no início da gravidez, entre 14 e 24 semanas.

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Hemorragias ativas, amniorrexe, corioamnionite e anomalias fetais incompatíveis
com a vida contraindicam a cirurgia. A circlagem deve ser removida com 36 semanas
de idade gestacional. No caso de rotura prematura das membranas na paciente circlada,
a sutura deve ser retirada imediatamente – mas, entre 24 e 32 semanas de gestação,
deve-se esperar 48h para o corticoide amadurecer o pulmão fetal.

Gestação ectópica

Denomina-se gestação ectópica qualquer gestação que não tem o blastocisto


implantado na superfície endometrial. Isso ocorre mais comumente nas trompas, nos
ovários, no peritônio, no cérvice e no ligamento largo.

Fatores de risco

▪ Idade > 35 anos


▪ Infertilidade
▪ Doenças sexualmente transmissíveis, especialmente clamídia
▪ Antecedente de laqueadura ou reconstrução tubária
▪ Paciente usuária de DIU: ocorre quando há falha do método, já que ele não
inibe a ovulação e, sim, torna os ambientes da cavidade pélvica inóspitos ao
embrião. Nesse sentido, quando o método falha, há mais chances do
desenvolvimento de uma gestação fora da cavidade uterina, quando comparado
a mulheres que não usam anticoncepção.
▪ Endometriose
▪ Cirurgias abdominais prévias

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Gestação tubária

A maior parte das gestações ectópicas corresponde à implantação do embrião


nas tubas uterinas, mais especificamente no istmo e na ampola das tubas. Nas
primeiras semanas, pode ser que a ectopia não seja diagnosticada. Evoluindo, dor
abdominal, amenorreia ou sangramento vaginal de intensidade variável podem
surgir e, se avançar, pode ocorrer rotura tubária. Assim, a gestação tubária tem suas
apresentações clínicas dividas em forma subaguda e forma aguda.

Forma subaguda
Essa gravidez geralmente ocorre na porção ampular. Nesse caso, o quadro
clínico é inespecífico, de evolução insidiosa. O saco gestacional crescente distende a
trompa e provoca dor abdominal e a separação parcial do trofoblasto e da placenta,
também devido à distensão da trompa, provoca perda sanguínea para a cavidade
abdominal. Assim, estabelece-se uma irritação peritoneal localizada, que pode estar
ausente.

Forma aguda
É mais comum em gravidezes que ocorrem
no istmo, no qual são mais frequentes as roturas.
Geralmente, a rotura é espontânea, mas traumas
associados ao coito ou ao exame bimanual podem
ser causas também.
O quadro clínico da forma aguda é
exuberante, com irritação abdominal e sinais bem
específicos:
➔ Sinal de Laffont: dor escapular
➔ Sinal de Cullen: equimose periumbilical
➔ Sinal de Proust: abaulamento em fundo de
saco
➔ Grito de Douglas: dor excessiva ao toque
vaginal no fundo de saco de Douglas

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Tratamento

A conduta depende de algumas variáveis a serem avaliadas pelo médico em


conjunto com a paciente, como: estabilidade hemodinâmica, integridade da trompa,
desejo de nova gravidez, características do saco gestacional e acesso a diferentes
terapias.
1. Tratamento clínico
a. Medidas gerais: solicitar hemograma e provas de função hepática e renal
antes de iniciar o tratamento; dosar o β-HCG no primeiro dia de
administração e no sétimo dia a contar do dia da administração –
administrar segunda dose se não houver queda de 15% do valor obtido
no dia 1, recomenda-se no máximo 3 doses; repetir dosagem semanal
do β-HCG até que seja indetectável.
b. Medicação: metotrexato (MTX) 50mg IM em dose única. Evitar, durante
o tratamento, toques vaginais, relações sexuais, exposição ao sol (risco
de dermatite pelo MTX), e AINEs pelo risco de anemia aplástica e
toxicidade gastrintestinal. O tratamento clínico pode ser eficaz e substituir
o tratamento cirúrgico quando:
➢Paciente estiver hemodinamicamente estável
➢Saco gestacional < 3,5cm
➢Dosagem de β-HCG ≤ 5.000 mUI/mL
➢Ausência de atividade cardíaca fetal

2. Tratamento cirúrgico conservador: salpingostomia. Consiste em enuclear o


ovo e conservar a trompa, que é deixada aberta para que a cicatrização ocorra
em segunda intenção. É indicada como primeira opção para:
a. Paciente com trompa contralateral doente
b. Paciente que quiser filhos futuramente
c. Ectopia tubária de pequenas dimensões, com trompa íntegra

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3. Tratamento cirúrgico radical: salpingectomia. É a retirada da trompa
acometida, sendo a melhor opção para:
a. Sangramento incontrolável, com gravidez recorrente na mesma trompa
b. Trompa muito lesada ou saco gestacional > 5cm
c. Mulheres com trompa contralateral normal

Doença trofoblástica gestacional

É o termo usado para nomear os tumores do trofoblasto viloso placentário. O


trofoblasto é o nome dado às células da camada externa do blastocisto, que invade o
endométrio. A doença pode ser benigna ou maligna. Quando benigna, é denominada
mola hidatiforme; quando maligna, pode ser mola invasora, coriocarcinoma ou
tumor trofoblástico do sítio placentário.

Fatores de risco

▪ Idade > 40 anos


▪ SOP
▪ Abortamentos prévios A gestação anterior normal é fator
▪ Mola hidatiforme anterior de proteção contra a doença.
▪ Inseminação artificial
▪ Tabagismo
▪ Anticoncepcional oral
▪ Exposição a radiação ionizante

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Mola hidatiforme

Classificação
Mola completa: feto, cordão e membranas estão ausentes. O
cariótipo pode ser 46XX ou 46XY, todos os cromossomos são de
origem paterna. Evolui para neoplasia em até 30% dos casos.
Mola parcial: feto, cordão e membrana amniótica estão
frequentemente presentes. O cariótipo é triplóide, com par
adicional de cromossomos. Evolui para neoplasia em até 10%
dos casos.

Diagnóstico
Clínico: sangramento vaginal de repetição tipo suco de uva/ameixa, útero amolecido,
em geral indolor e de tamanho aumentado para a idade gestacional, náuseas e vômitos
intensos pelos altos níveis de β-HCG, toxemia gravídica precoce. É comum o uso do
termo “útero em sanfona”: o útero aumenta de tamanho, o conteúdo é expelido e
o útero fica amolecido, aumentando novamente depois.
USG transvaginal: melhor método não invasivo para o diagnóstico. A imagem que
aparece é descrita como em nevasca/tempestade de neve. Na mola completa,
observa-se útero contendo material ecogênico, com múltiplas vesículas anecóicas de
tamanhos diferentes e ausência de feto. Na mola parcial, observa-se placenta grande,
de aspecto normal com lesões intraplacentárias anecoicas difusas.

β-HCG: na mola completa, está muito elevado (> 200.000mUI/mL), enquanto na parcial
está normal ou pouco aumentado.
SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 91
Tratamento
Consiste no esvaziamento molar por aspiração. Antes do esvaziamento, é
imprescindível solicitar hemograma completo, grupo sanguíneo e fator Rh,
determinação do nível de β-HCG e RX de tórax.
Após o tratamento, o β-HCG deve ser avaliado 48h após o esvaziamento molar,
e depois dosado semanalmente. Quando o resultado for negativo por 3 semanas
consecutivas, deve ser dosado mensalmente, por 6 meses. Finalmente, quando
negativo por 6 meses, o médico pode permitir a gravidez da paciente.

β-HCG negativo β-HCG negativo


Dosar
por 3 semanas por 6 meses Permitir gravidez
mensalmente
consecutivas consecutivos

Após o esvaziamento, ainda, a USG é


útil para sugerir malignização e para
acompanhar os cistos tecaluteínicos. A
histeroscopia também pode ser
recomendada para inspecionar a cavidade
uterina.
O aumento do nível de hCG > 10% a
partir de 3 valores obtidos no período de 2
semanas e a persistência de hCG detectável
por mais de 6 meses após o esvaziamento
molar sugerem malignidade.

MEDCURSO 2019

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 92


Gravidez gemelar
Introdução
A gemelaridade é um caso da obstetrícia que requer mais atenção, isto é, o pré-
natal deve ser mais cuidadoso e até mesmo o parto tem suas particularidades. Isso
ocorre porque as gestações múltiplas estão associadas a maior risco de complicações
maternas e fetais, incluindo as doenças intercorrentes da gestação, como hipertensão
e hemorragias, e letalidade.
Para compreender as especificações da gemelaridades, alguns conceitos
precisam ser estabelecidos:
➔ Zigotia: refere-se ao ovo
o Monozigótica: os gêmeos são originados do mesmo ovo – fertilização de
um óvulo por um espermatozoide. Podem ser monocoriônicos ou
dicoriônicos. Têm o mesmo genótipo, sexo, grupo sanguíneo, fatores
séricos, características físicas e tendências patológicas.
o Dizigótica: os gêmeos são originados de ovos diferentes – fertilização de
dois óvulos por dois espermatozoides distintos (mais comum).
Nesse caso, são obrigatoriamente dicoriônicos. O genótipo é distinto,
bem como as características fenotípicas.

➔ Corionia ou corionicidade: refere-se ao tipo de placentação, dependente do


momento da fertilização em que o zigoto se divide.
o Até 72h após a fertilização: dicoriônica diamniótica
o Do 4º ao 8º dia: monocoriônica diamniótica
o Entre o 8º e o 12º dia: monocoriônica monoamniótica
o Entre o 13º e o 15º dia: monocoriônica monoamniótica e a separação do
disco embrionário é imperfeita (gemelaridade imperfeita/siameses)

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Fatores de risco
▪ Drogas indutoras de ovulação
▪ Reprodução assistida
▪ História familiar da mulher: relacionada ao risco de gestações dizigóticas
▪ Idade materna: aumenta com o aumento da idade até 37 anos e após essa
idade, as chances diminuem, pela menor produção hormonal
▪ Raça: maior chance de gêmeos dizigóticos em mulheres negras
▪ Paridade: o aumento da paridade aumenta as chances de gestação gemelar
▪ Fatores nutricionais: mulheres altas e sobrepeso têm maior risco de gestação
gemelar dizigótica

Diagnóstico
▪ Anamnese: pesquisar fatores de risco; sensação de útero maior do que o
esperado para IG
▪ Exame físico: aumento exagerado da circunferência abdominal e do fundo
uterino, individualização de partes de dois fetos, palpação da cabeça fetal,
pequena para o tamanho do útero, ausculta dos BF de dois ou mais fetos
(identifica-se uma zona de silêncio entre os focos de ausculta e uma diferença
de FC de 10bpm entre os focos)
▪ Exames complementares: dosagem de beta-hCG (> 50.000mUI/mL levanta a
suspeita), USG (até 7 semanas de IG já é possível visualizar atividades de dois
embriões), ou RM (uso não é comum).

O diagnóstico de zigotia, em quase metade dos casos, não é possível antes do


parto, excetuando-se os casos em que se observam sinais claros, como sexo
discordante, placenta dicoriônica ou monocoriônica, Mais importante para o curso
obstétrico é diagnosticar a corionia, pois é este fator que está relacionado a
morbimortalidade. Esse diagnóstico pode ser realizado por meio de:

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▪ Saco gestacional: a melhor fase para o
diagnóstico da corionia é entre 6 e 9
semanas, pois é possível visualizar o saco
gestacional duplo ou único na USGTV.
Também é possível determinar se a gestação
é mono ou diamniótica, pelo número de
vesículas vitelinas presentes, entre 5 e 6
semanas de IG. Após 8 semanas de IG, o
âmnio é visualizado. Dois embriões vistos em
um único saco gestacional, não se
visualizando membrana entre eles, confirmam
uma gestação monocoriônica e monoamniótica (fig.4). A variedade
monocoriônica diamniótica é identificada entre 5 e 6 semanas pela presença
de duas vesículas vitelinas no mesmo saco gestacional, e, após essa época,
pela existência de membrana amniótica fina, separando os gêmeos (fig. 5).

▪ Twin peak sign ou sinal de


lambda ou sinal do Y: entre 11 e
14 semanas, também é possível
determinar a corionia, quando é
realizada a transluscência nucal.
Nesta fase, quando se encontram
duas placentas, determina-se a
dicorionia, ou pelo meio do sexo
fetal. Se apenas uma massa
placentária for visualizada, o que
define uma gestação dicoriônica é
o sinal do twin peak, que é,
basicamente, a presença de
tecido coriônico em forma de
cunha, visualizado na inserção
do septo intergemelar na
placenta. O septo deve ter
espessura maior do que 1,5mm.

▪ Sinal T: entre 11 e 14 semanas, na variedade monocoriônica, a inserção do


septo na placenta corresponde ao sinal T, e sua espessura é maior do que
1,5mm.

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Complicações
A gestação múltipla se associa a várias complicações. Para evita-las, o pré-natal
deve seguir o modelo de uma gestação de alto risco: maior frequência e monitoramento
constante. Dentre elas, a mais relevante é a síndrome da transfusão feto-fetal (STFF).

Síndrome de transfusão feto-fetal


A STFF envolve gêmeos monozigóticos monocoriônicos diamnióticos,
porque as circulações se comunicam na região da placenta. Essas comunicações são
normais em gestações monocoriônicas, mas a STFF acontece quando há
comunicações arteriovenosas com escassez de anastomoses arterioarteriais.
As anastomoses arterioarteriais são
necessárias nas gestações monocoriônicas, pois
compensam o desequilíbrio hemodinâmico
resultante do shunt arteriovenoso. Quando elas
são falhas, o sistema descompensa e favorece
um dos gêmeos. O sangue de um feto (doador)
é transfundido para outro (receptor) pelas
anastomoses placentárias. O doador fica
hipovolêmico, desenvolve palidez, oligúria,
oligodramnia, CIUR; enquanto o feto receptor fica
hipervolêmico, desenvolve poliúria, polidramnia,
hidropsia e insuficiência cardíaca.

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Diagnóstico: o melhor critério é a observação da diferença do líquido amniótica em cada
cavidade: bolsão > 8 cm na cavidade do feto receptor e < 2cm na cavidade do feto
doador.
Tratamento:
- Amniocentese seriada para o receptor: casos leves. Retira-se grandes
quantidades de líquido amniótico, para melhorar a circulação fetal e prevenir parto
prematuro por polidramnia.
- Fotocoagulação com laser (entre 16 e 26 semanas de IG): casos graves. As
anastomoses vasculares são ocluídas, interrompendo a troca de sangue.

Outras complicações
▪ Anemia
▪ Hiperêmese gravídica
▪ Síndromes hipertensivas
▪ Diabetes gestacional
▪ Polidramnia
▪ Abortamento (monozigóticas > dizigóticas)
▪ Amniorrexe prematura
▪ Parto prematuro
▪ Crescimento intrauterino restrito
▪ Placenta prévia
▪ DPP
▪ Anomalias congênitas
▪ Hemorragias pós-parto
▪ Insuficiência placentária
▪ Morte fetal intraútero
▪ Gêmeos conjugados: monozigóticas, monocoriônicas, monoamnióticas.
▪ Gêmeo acárdico ou perfusão arterial reversa do gemelar

Via de parto
As particularidades do parto múltiplo levam em consideração as possíveis
complicações mais frequentes nesse tipo de gestação. As gestações gemelares têm
maior incidência de hemorragia pós-parto, logo, o uso de ocitócicos e massagem uterina
é indicado.
Apesar de haver uma tendência à cesariana nos casos de gestação gemelar, as
indicações da via alta são praticamente as mesmas da via baixa – isto é, o parto normal
pode acontecer normalmente, salvo casos específicos:
▪ Trigemelares ou mais: associados a apresentações fetais anômalas,
prematuridade, prolapso de cordão, hemorragia por separação de placentas
▪ Monoamnióticas: podem complicar por prolapso ou enovelamento de cordões e
colisão de partes fetais
▪ Gêmeos unidos
▪ STFF
▪ Anomalias congênitas
▪ Fetos com vitalidade comprometida
SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 97
▪ Gestações diamnióticas com prematuridade extrema

Nas gestações monoamnióticas, o parâmetro principal que determina a escolha


da via de parto é a apresentação dos fetos. Assim, diante dos quadros:
1. Cefálico/cefálico: preferir via vaginal, menor risco de complicações,
apresentação mais comum
2. Cefálico/não-cefálico: a literatura favorece o parto via vaginal. Geralmente, o
gêmeo não-cefálico precisa de manobras obstétricas. Entretanto, se o segundo
feto for 25% maior do que o primeiro ou se a diferença de peso for >500g, a via
alta está indicada.
3. Não-cefálico/cefálico e não-cefálico/não-cefálico: cesariana.

A escolha da via de parto não é um consenso na comunidade médica.

Em alguns casos, após o parto via vaginal do primeiro gemelar, o segundo pode
mudar de posição, modificando, portanto, sua apresentação. Essa e outras
complicações (prolapso de cordão, apresentação atípica, sofrimento fetal agudo, DCP,
espasmos uterinos e complicações maternas) são indicação de cesárea para o
segundo gemelar.

Distócias específicas do parto gemelar


1. Um dos fetos em apresentação de nádegas pode descer, exteriorizar a pelve,
mas o parto não se conclui, pois a cabeça do segundo concepto funciona como
um obstáculo à passagem.
2. Ambos os fetos em apresentação cefálica podem se fixar ou se insinuar ao
mesmo tempo. A segunda cabeça adapta-se entre a primeira e o tronco, e é
impossível a progressão.
3. O parto pélvico do primeiro gemelar pode não se completar, pois sua cabeça
encrava na cabeça do segundo que, por sua vez, se encontra em apresentação
córmica.

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Rotura prematura de membranas
ovulares
Introdução
A rotura prematura de membranas ovulares (RPMO) ou amniorrexe prematura
é a rotura espontânea das membranas amnióticas antes do início do trabalho de
parto. A RPMO é pré-termo quando ocorre antes de 37 semanas e pode ser precoce
quando ocorre no início do trabalho de parto; oportuna quando ocorre ao final do
período de dilatação ou tardia quando ocorre durante a expulsão fetal.
Até 40% dos casos de prematuridade são causados por RPMO. Inflamação e
infecção são as principais causas de RPMO, mas dificilmente detecta-se o motivo
durante o acontecimento.

Fatores de risco
▪ Exames invasivos
▪ Incompetência istmocervical
▪ Inserção baixa da placenta
▪ Macrossomia
▪ Polidramnia
▪ Trabalho de parto prematuro
▪ Infecções genitais (strepto B, gonococo)
▪ Tabagismo
▪ Sangramento genital
▪ Vaginose bacteriana
▪ Gestação múltipla
▪ Deficiências nutricionais
▪ Doenças maternas
▪ Atividade sexual
▪ Traumatismo
▪ Passado de parto prematuro

Quadro clínico e diagnóstico


▪ Líquido claro ou amarelado escorrendo entre as pernas
▪ Exame físico e especular visualiza o líquido saindo pelo colo ou acumulado em
fundo de saco.
▪ Teste do papel de nitrazina: o líquido amniótico tem pH entre 6,5 e 7,5,
diferenciando-o do pH comum vaginal. A fita com nitrazina é introduzida no fundo
de saco posterior. Quando se visualiza a cor azul, o pH está na faixa do líquido
amniótico.
▪ Teste do fenol vermelho: tampão vaginal na vagina da paciente. Após um
tempo, adiciona-se gotas da substância e a coloração muda de laranja para
vermelho.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 99


▪ Teste da cristalização da secreção vaginal: colhe-se
o líquido obtido do fundo de saco vaginal e coloca-o
sobre uma lâmina. Após 10 minutos, o líquido seca e
apresenta a forma de samambaia. Durante a gestação,
por concentrações altas de progesterona, essa reação
não deveria acontecer.
▪ Presença de elementos fetais na secreção vaginal: lanugem, células da
epiderme fetal.
▪ Ultrassonografia: visualiza diminuição do líquido amniótico. O ILA (que mede o
maior bolsão vertical de líquido amniótico encontrado em cada um dos quatro
quadrantes uterinos) é considerado diminuído quando menor que 5 cm, ou
quando a medida do maior bolsão vertical for menor que 2 cm. A USG tem baixa
sensibilidade, porque resultados normais não descartam RPMO, e a
visualização de diminuição de líquido amniótico pode ser encontrada em
diversas patologias.
▪ Alfafetoproteína: enzima produzida pelo rim fetal que está em altas
concentrações no líquido amniótico. Quando presente na secreção vaginal,
indica RPMO.
▪ AmniSure: teste rápido que detecta proteínas placentárias no fluido vaginal.
Exame de custo muito elevado.

Prognóstico
As mulheres com RPMO podem desenvolver corioamnionite, endometrite e
sepse, além de terem risco aumentado para descolamento placentário e prolapso de
cordão.
O feto e o neonato também podem sofrer complicações, como prematuridade,
sofrimento fetal e malformações – especialmente a síndrome de Potter, decorrente da
compressão fetal na oligodramnia –, porque a maior parte das gestações com RPMO
evolui para o parto pré-termo em menos de uma semana de rotura.
No entanto, o prognóstico depende do volume de líquido amniótico, da
duração entre a rotura e o parto e da idade gestacional.

Conduta terapêutica
Para definir a conduta nos casos de RPMO, deve-se levar em consideração:
1. Presença de infecção: obrigatória a interrupção da gestação independente da
IG, preferencialmente por via vaginal para evitar infecções via cesárea. Nesse
caso, a antibioticoterapia ampicilina 2g IV 6h/6h + gentamicina 5mg/kg por dia
ou 1,5mg/kg 8/8h deve ser iniciada e mantida até 48h após o último episódio
febril. Clindamicina ou metronidazol podem ser adicionados se parto cesáreo.
Há presença de infecção materna ou fetal se 2 ou mais parâmetros:
▪ Leucocitose materna >15.000céls/mm³
▪ Taquicardia materna >100bpm
▪ Taquicardia fetal >160bpm
▪ Sensibilidade uterina
▪ Líquido amniótico com odor fétido

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 100


2. Ausência de infecção
▪ IG ≥34 semanas: interrupção da gestação; via de parto a ser escolhida
por critérios obstétricos.
▪ IG entre 24 e 34 semanas: conduta conservadora para preservar o
amadurecimento pulmonar fetal. Internação da gestante, mantê-la em
repouso e hidratada. A avaliação da vitalidade fetal e de possíveis
infecções deve ser frequente. Além disso, institui-se corticoterapia para
reduzir o risco de síndrome de angústia respiratória e outras
complicações nos fetos prematuros; e tocolíticos a fim de prolongar a
gestação por 48h – período necessário para realizar a corticoprofilaxia.
Geralmente, a tocólise é utilizada apenas com o fim de permitir a
administração de corticoides. Os antibióticos também têm eficácia
comprovada em reduzir a morbidade neonatal, no esquema ampicilina
2g IV 6/6h por 48h + azitromicina 1g VO dose única. Após,
amoxicilina 500mg 8/8h VO por 5 dias.
▪ IG < 24 semanas: a decisão deve ser decidida por cada caso, pois a
sobrevida é baixa nos fetos que nascem nessa fase, as complicações
são frequentes e a corioamnionite atinge boa parte dos casos. Caso seja
optada a conduta conservadora, recomenda-se que a paciente fique em
repouso em casa e cheque a temperatura frequentemente, até que se
atinja 24 semanas e o protocolo acima possa ser utilizado.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 101


SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 102
hemorragias da SEGUNDA metade
da gestação
Placenta prévia
É a implantação total ou parcial da
placenta no segmento inferior do útero após 28
semanas de gestação. Ocorre em 1 a cada 200
gestações que chegam ao termo e é um achado Teoria da migração placentária: a placenta
comum na USG entre 16 e 20 semanas. 90% altera suas relações anatômicas com o
desses achados normalizarão até o termo, devido segmento inferior uterino, tendendo ao
a teoria da migração placentária – por isso, o fundo do útero que é mais vascularizado. Isso
porque o útero precisa estirar suas fibras à
diagnóstico de placenta prévia só pode ser medida que a gestação avança. Esse
confirmado após as 28 semanas de IG. processo geralmente termina na 28ª semana

Fatores de risco

➔ Cesariana prévia: principal fator de risco pela cicatriz uterina


➔ Intervenções uterinas anteriores: miomectomia, curetagem, entre outras
➔ Multiparidade
➔ Intervalo interpartal curto
➔ Tabagismo
➔ Gemelaridade: por maior distensão uterina

Classificação

1. Baixa: localizada próxima ao colo do útero, sem atingi-lo.


2. Marginal: atinge o orifício interno do colo do útero, sem recobri-lo.
3. Parcial: atinge o orifício interno do colo e o recobre parcialmente.
4. Completa ou centro-total: recobre totalmente o orifício interno do colo do útero.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 103


Manifestações clínicas

O quadro clínico se limita, na


maioria das vezes, a uma
hemorragia indolor, de cor
vermelho vivo, intermitente, de
intensidade variável, autolimitada e
sem causa aparente, mais
frequente no final do segundo e ao
longo do terceiro trimestre. O
sangramento se exterioriza sempre
e totalmente, diferente do
sangramento do descolamento
prematuro de placenta.
Algumas gestantes,
principalmente as com placenta
prévia centro-total, podem
apresentar um sangramento entre a
26ª e a 28ª semana de gestação,
chamado sangramento sentinela.
Nestas, o sangramento é
intermitente e abundante, com
necessidade de internações
transfusões frequentes.

Diagnóstico
➔ Exame físico: após aferir os sinais vitais da gestante, os achados no exame
obstétrico costumam ser:
o Palpação abdominal: tônus uterino normal, estática fetal alterada –
situações oblíquas e transversas, apresentação pélvica, apresentação
cefálica alta, e outras apresentações fetais anômalas
o Ausculta: BCF presentes e normalmente sem alterações, CTG mostra
boa vitalidade fetal
o Exame especular: realizado cuidadosamente para evidenciar a origem e
a quantidade do sangramento
o Toque vaginal: NUNCA deve ser realizado na suspeita de inserção baixa,
porque pode provocar sangramento intenso. Se for necessário o toque
nessa situação, é recomendado que esteja próximo ao parto e com as
condições estruturais para o parto já preparadas. Na inserção baixa, o
toque vaginal revela a presença de um tecido esponjoso, com ausência
do rechaço fetal.
➔ Exames complementares
o Ultrassonografia: seguro e simples para o diagnóstico da localização
placentária e sua posição em relação ao OI do colo do útero. Pode ser
realizado via abdominal ou transvaginal, este último de maneira
cuidadosa, não introduzindo mais do que 3cm do transdutor na vagina e
SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 104
este não deve atingir o colo. O ecodoppler obstétrico deve ser realizado
para diagnosticar acretismo placentário sempre que uma placenta
prévia for diagnosticada e também nos casos de implantação anterior
baixa sobre a área de cicatriz de cesáreas anteriores.

o Ressonância nuclear magnética: também pode ser usada, principalmente em


placentas posteriores, porém os resultados não são superiores aos da USG
transvaginal. Ela apresenta a vantagem de não ser examinador-dependente,
porém, a pouca acessibilidade ao exame limita sua indicação.

Acretismo placentário é a infiltração anômala da parede uterina pela


placenta. É classificada em:
▪ Acreta: quando adere apenas ao miométrio, sem invasão
▪ Increta: quando acomete o miométrio
▪ Percreta: quando a invasão ultrapassa o miométrio e acomete a
serosa do útero, podendo invadir a bexiga ou o intestino.
São fatores de risco a idade materna avançada, mulheres submetidas a cirurgias
uterinas, a posição da placenta que determina menor vascularização do miométrio e
anormalidades uterinas. O tratamento é a
realização do parto com 36 semanas e,
dependendo do grau, a histerectomia deve ser
indicada para increta e percreta.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 105


Conduta terapêutica

Depende da quantidade de sangramento, da condição hemodinâmica materna e


da idade gestacional.

1. Na gestação pré-termo
➔ Se não houver sangramento ativo, conduta expectante
➔ Abstinência sexual
➔ Uso de corticoterapia até 34 semanas para acelerar a maturidade
pulmonar – betametasona 12mg IM ou dexametasona 10mg IM.
➔ Suplementação de ferro para evitar anemia
➔ Constante monitoração dos níveis de hematócrito e de hemoglobina
➔ Gestantes Rh-: uso de imunoglobulina anti-D quando apresentar
sangramento
➔ Se sangramento ativo: avaliar a condição hemodinâmica e só internar em
caso de hemorragia excessiva.
2. Na gestação a termo
➔ O parto deve ser realizado. A via de parto é baseada no julgamento
clínico, auxiliado pela informação ultrassonográfica
▪ Se a placenta prévia for marginal, de menor grau, com borda fina
e apresentação cefálica encaixada, pressionando a borda
placentária, o parto vaginal pode ser permitido.
▪ No caso de placenta prévia centro-total, a cesariana é indicação
absoluta, devendo ser realizada com programação planejada.
➔ Solicitar exames: hematócrito e hemoglobina; tipagem sanguínea ABO
Rh; coagulograma.
➔ Gestantes Rh-: uso de imunoglobulina anti-D.
➔ Em todos os casos, a disponibilidade de sangue é mandatória.

Diagnóstico diferencial

▪ Descolamento prematuro de placenta


▪ Rotura uterina
▪ Rotura de vasa prévia

Descolamento prematuro da placenta (DPP)

É a separação completa ou parcial da placenta normalmente implantada


antes do nascimento do feto, em gravidezes acima de 20 semanas, causando
sangramento uterino e redução do aporte de O2 e nutrientes ao feto. Ocorre em 0,4% a
3,5% de todas as gestações e é importante causa de morbimortalidade fetal
(relacionada a área do descolamento e prematuridade) e materna (por hemorragia,
choque, CIVD, e histerectomia).

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 106


Fatores de risco

▪ Hipertensão gestacional ou preexistente


▪ Rotura prematura de membranas ovulares
▪ Cesariana prévia
▪ Tabagismo
▪ Idade materna avançada
▪ Uso de drogas
▪ Condições que causem sobredistensão uterina, como polihidrâmnio e gestação
gemelar
▪ Trauma
▪ DPP em gestação anterior
▪ Amniocentese, cordocentese

Fisiopatologia

O primeiro fenômeno que ocorre é a hemorragia decidual, inciando o


descolamento. Como consequência disso, um hematoma retroplacentário se forma, e
tende a invadir a placenta, formando um “buraco” na superfície. A partir da formação do
hematoma, diversos eventos são desencadeados:
➔ Esse hematoma ativa a cascata de Infiltração de sangue na parede uterina
coagulação, aumenta a área
descolada e, assim, uma hemorragia
maior acontece, junto com o aumento
do volume do coágulo.
➔ Infiltração sanguínea na parede
uterina
o O sangue extravasado irrita o
tecido uterino e promove
contração das miocélulas e
hipertonia uterina, com o

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 107


aparecimento de metrossístoles. O consumo de oxigênio pelo
miométrio aumenta, o que significa, para o feto, hipóxia, hipercapnia e
acidose.
o Causa desarranjo da estrutura miofilamentar, diminuindo a capacidade
contrátil do miométrio, passando da hipertonia para hipotonia –
denominado apoplexia uterina ou útero de Couvelaire.

O útero de Couvelaire é mais bem percebido


no pós-parto (quando o parto intervém nesta
etapa). É possível observar que a hipotonia
impede a hemostasia adequada, causando
hemorragias. Nesse caso, um evento natural,
a ligadura dos vasos uterinos por retração
das fibras (ligaduras vivas de Pinard) deixa
de acontecer

Cerca de 20% dos sangramentos não se


externalizam para o canal vaginal, se limitam
ao espaço retroplacentário. Isso é
denominado hemorragia oculta.

Esse sistema é cíclico, permite a progressão da DPP e, desse modo, ela se torna
irreversível. A consequência desse ciclo vicioso é hipóxia grave, devido a redução da
área placentária funcionante e pela hipertonia uterina.

Quadro clínico

▪ Dor abdominal: varia de leve desconforto até dor intensa, associada ou não a
sangramento vaginal. Nos casos da inserção da placenta em posição posterior,
a dor é lombar e, na gestante em trabalho de parto, a dor persiste entre as
contrações.
▪ Sangramento
o Hemorragia exteriorizada: vermelho vivo
ou vinhoso
o Hemoâmnio
o Sangramento retroplacentário

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 108


o Coagulopatia pode estar presente, devido ao consumo de fatores de
coagulação pelo coágulo retroplacentário e pela CIVD
o Hipertonia uterina
o Sofrimento fetal: diagnosticado pela cardiotocografia ou ausculta fetal
o Sinais de hipovolemia materna: taquiparcia, hipotensão, palidez cutâneo-
mucosa, sudorese e oligúria

MEDCURSO 2019

Diagnóstico

É essencialmente clínico. Na anamnese e no exame físico, verifica-se:


▪ História de sangramento vaginal, síndrome hipertensiva, traumatismo abdominal
ou outro fator de risco
▪ Obsevar a história de sintomatologia gradual, que se faz em algumas horas
relacionada a área de descolamento placentário e a intensidade da hemorragia
oculta
▪ ABCDE da reanimação: vias aéreas pérvias, padrões de respiração e circulação
▪ Sinais vitais: observar taquicardia e alterações posturais da pressão
▪ Exame obstétrico: medida de altura uterina, BCF, hipertonia uterina
▪ Monitoramento fetal: padrão não tranquilizador na CTG
▪ Palpação abdominal: contrações tetânicas, dor abdominal
▪ A USG pode ser realizada para excluir diagnósticos diferenciais; observa-se
hematoma retroplacentário em 20% dos casos

Classificação

➔ Grau 1: leve (DPP crônico). Manifesta-se sangramento vaginal, ausência de dor


ou de hipertonia e o feto está vivo, sem sinais de sofrimento.
➔ Grau 2: intermediário. Manifesta-se sangramento vaginal, dor e hipertonia. O feto
está vivo em sofrimento.
➔ Grau 3: grave. Apresenta as características do grau 2, associado a óbito fetal.
o Grau 3A: sem coagulopatia
o Grau 3B: com coagulopatia

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 109


Conduta terapêutica

Uma vez diagnosticada a DPP, deve-se solicitar hemograma completo, tipagem


sanguínea ABO Rh, coagulograma e exames de rotina para doença hipertensiva,
quando apropriado. A partir disso, o tratamento depende do grau de DPP:
➔ Grau 1: diagnóstico geralmente é feito no pós-parto, logo, não houve
repercussões maternas ou fetais.
➔ Grau 2: o parto vaginal, quando iminente, é possível, se o feto e a mãe
estiverem estáveis. O trabalho de parto deve estar em franco progresso. A
amniotomia deve ser realizada a fim de diminuir a pressão intrauterina, que
consequentemente diminui o sagnramento e a passagem da tromboplastina
(causadora de CIVD). Se a evolução do trabalho de parto não for rápida e
favorável, e/ou se houver instabilidade materna ou sofrimento fetal, a cesárea
deve ser realizada imediatamente.
➔ Grau 3: o parto vaginal é aconselhável. Deve-se adotar os mesmos cuidados
de monitoração hemodinâmica e coagulação materna.

Rotura uterina

É uma complicação muito grave em obstetrícia, sendo uma importante causa de


morbimotalidade materna, que pode acontecer durante a gestação ou durante o parto.
Um pré-natal de alta qualidade influencia demais a frequência de casos de rotura
uterina. Consiste no rompimento parcial ou total do miométrio, causando uma
comunicação entre a cavidade uterina e a cavidade abdominal. É classificada em:
1. Completa: rotura total da cavidade uterina, configurando-se como uma urgência
obstétrica, levando a risco de vida tanto a mãe quanto o feto.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 110


2. Incompleta: o peritôneo visceral permanece intacto. Geralmente, não é
complicada, podendo permanecer assintomática após um parto vaginal.
Fatores de risco

▪ Cicatriz uterina (cesariana)


▪ Curetagem uterina com perfuração
▪ Miomectomia
▪ Acretismo placentário
▪ Trauma abdominal
▪ Anomalias uterinas
▪ Hiperdistensão uterina
▪ Uso inapropriado de ocitocina

Quadro clínico
▪ Deterioração do padrão dos batimentos
cardíacos fetais
▪ Gestante queixa de dor aguda, de forte
intensidade No início da gravidez, o quadro é o abdome
▪ Sangramento vaginal agudo grave. Muitas vezes, não é possível
▪ Parada das contrações distinguir a rotura uterina da gravidez
▪ Subida da apresentação ao toque vaginal: ectópica e o diagnóstico acaba sendo feito
apenas no momento da laparotomia. Na
útero em ampulheta segunda metade da gravidez, o quadro
▪ Partes fetais palpáveis facilmente no tende a ser mais brando, mas com a
abdome materno mesma gravidade.
▪ Taquicardia importante e hipotensão grave

Apresentação inicial x apresentação tardia da rotura

O termo útero em ampulheta se refere à síndrome de Bandl-Frommel


ou síndrome de distensão segmentária, que acontece na rotura uterina
iminente durante o trabalho de parto. Por conta da distensão das fibras
musculares, à palpação abdominal percebe-se, próximo ou na altura da
cicatriz umbilical, o relevo do anel que separa o corpo uterino do segmento inferior (Sinal
de Bandl). Além disso, também na palpação, percebe-se os ligamentos redondos na
face ventral do útero, distentidos e retesados (Sinal de Frommel). Nessa situação,
uterolíticos podem ser utilizados para controlar a distensão e evitar uma rotura efetiva.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 111


Conduta terapêutica

➔ Na gravidez: estabilidade hemodinâmica, fornecer O2 em máscara e dois


acessos venosos calibrosos com SF a 0,9% e laparotomia exploradora
imediatamente, com anestesia geral.
➔ No trabalho de parto: na presença de dor abrupta de forte intensidade, sinais de
choque hipovolêmico, parada de progressão do TP e elevação da apresentação
fetal (Sinal de Reasens), a conduta cirúrgica deve ser realizada. O
procedimento dependerá da extensão da lesão, de uma simples rafia uterina até
a histerectomia.

Rotura de vasa prévia


É um sangramento dos vasos sanguíneos fetais que atravessam as
membranas amnióticas de modo anômalo, passando sobre o orifício interno do colo.
Está associada à inserção anormal dos vasos fetais dentro das membranas.
É uma causa rara de hemorragia, ocorrendo geralmente em gestantes com
implantação baixa da placenta e inserção velamentosa de cordão. A perda sanguínea
é de origem fetal, fato este que mostra a urgência dos eu diagnóstico.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 112


O principal fator de risco (50% dos casos) para a rotura de vasa prvia é a
inserção velamentosa do funículo umbilical (IVC), que ocorre em até
2% de todas as gestações. Fisiologicamente, o cordão umbilical é
envolvido pela gelatina de Wharton, que protege seus vasos contra
traumatismos. Na IVC, essa gelatina, que deveria estar bem próxima da placenta, se
distancia, e os vasos umbilicais ficam entre o âmnio e o córion, facilitando a ocorrência
de vasa prévia.

Normal x IVC

Quadro clínico
▪ Hemorragia no final da gravidez ou durante o trabalho de parto, no momento do
rompimento da bolsa aminótica, porque a inserção do cordão se dá nas
membranas, fora da região placentária

Diagnóstico
▪ Diagnóstico pré-parto: é difícil, podendo ser
percebido por intermédio do toque vaginal e pela
amnioscopia (com a visualização dos vasos
sanguíneos atravessando as membranas pelo
orifício interno do colo)
▪ USG com doppler colorido: pode detectar a vasa
prévia no anteparto e deve ser considerada em
gestantes de alto risco (placenta prévia, inserção Amnioscopia
velamentosa de cordão)

USG com doppler

Conduta terapêutica: cesariana imediata sob anestesia geral

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 113


Parto pré-termo
Introdução

O parto pré-termo ou prematuro é aquele ocorrido entre 20-22 semanas e 37


semanas completas de IG (antes de 20-22, é considerado abortamento). Essa
intercorrência responde por 75% da mortalidade perinatal a por 50% da morbidade. A
prematuridade é classificada em:
▪ Extrema: <28 semanas
▪ Grave: 28-30 semanas
▪ Moderada: 31-33 semanas
▪ Quase-termo: 34-36 semanas (mais comum)

Do mesmo modo, o recém-nascido prematuro nasce com peso mais baixo, e


também pode ser classificado em:
▪ Baixo peso: <2500g
▪ Muito baixo peso: <1500g
▪ Extremo baixo peso: <1000g

Além do baixo peso, o prematuro pode apresentar complicações como


hipoglicemia, persistência do canal arterial, síndrome de angústia respiratória, displasia
broncopulmonar, anemia, infecções, problemas alimentares, problemas neurológicos,
enterocolite necrotizante, hemorragia intraventricular e retinopatias.
A etiologia da prematuridade é multifatorial, mas pode ser espontâneo ou
indicado e acontece, na maioria das vezes, por rotura precoce das membranas
ovulares.
MEDCURSO 2019

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 114


Fatores de risco

▪ História de parto pré-termo – fator mais expressivo!


▪ Hemorragia anteparto, RPMO, anomalias uterinas, conização
▪ Fatores fetais/intrauterinos: gemelaridade, anomalias fetais, polidrâmnio
▪ Hábitos de vida: tabagismo, uso de drogas ilícitas, estresse, abuso físico
▪ Parto pré-termo indicado: desordens hipertensivas, hemorragia e sofrimento
fetal agudo e crônico (CIUR)
▪ Reprodução assistida
▪ Infecção: corioamnionite, bacteriúria, vaginose bacteriana
▪ Fatores demográficos: baixo nível socioeconômico e educacional, idade materna
<18 anos e >35 anos
▪ Assistência pré-natal deficiente, baixo peso pré-gravídico e ganho de peso
inadequado na gravidez

Predição e diagnóstico

Existem três grandes marcadores de parto prematuro:

1. Medida do comprimento do colo uterino: o


comprimento do colo é estável nos dois
primeiros trimestres da gravidez. O tamanho
esperado é >30mm. Em mulheres
assintomáticas, com 22-24 semanas, o
comprimento do colo < 25 mm (medido via
USG transvaginal) aponta risco de parto
prematuro. Quanto mais curto o colo, maior
o risco.
2. Vaginose bacteriana: aumento significativo
de parto prematuro nas portadoras
assintomáticas.
3. Fibronectina fetal: é uma glicoproteína marcadora de disrupção
coriodecidual. Fisiologicamente, está ausente ou muito baixa na secreção
vaginal a partir de 24 semanas. Quando ≥ 50ng/mL entre 24-26 semanas,
aponta risco elevado de prematuridade. Devido ao alto curto, esse marcador
não é muito utilizado.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 115


O diagnóstico de parto prematuro ocorre quando, na faixa de IG já mencionada,
a gestante inicia 1 ou 2 contrações dolorosas a cada 10min, promovendo
modificações no colo e com persistência de pelo menos 1h, mesmo após repouso de
30min; ocorre o apagamento do colo em 80% e aumento da dilatação em mais de
2cm, bem como sua centralização.

Prevenção

➔ Comprimento do colo uterino: a identificação de um colo uterino curto pela


USG transvaginal mostrou-se um poderoso preditor de PPT
➔ Progesterona
o Administrar em mulheres com história de parto prematuro anterior e/ou
colo curto
o Iniciada a partir de 16 semanas e mantida até 36 semanas
o Progesterona vaginal, 200mg, VV, ao deitar
➔ Tratamento de vaginose bacteriana
o Mulheres com história de PPT ou abortamento de segundo trimestre:
rastrear infecção no primeiro trimestre
o O tratamento deve ser precoce, antes de 16 semanas
o Clindamicina 300mg 2x/dia VO por 7 dias ou Metronidazol 500mg VO
8/8h por 7 dias.

Conduta

Diante do diagnóstico, a paciente deve ser internada e o examinador procede


com a confirmação da idade gestacional, avaliação da vitalidade fetal, afastamento
da possibilidade de corioamnionite, e investiga RPMO. A partir disso, situações
diferentes podem acontecer:

Inibição do trabalho de parto

É conduta considerada entre 24 e 34 semanas (antes, o prognóstico neonatal é


ruim, e, depois, a prematuridade possui influência pequena na sobrevida neonatal). Inibir
o TP é válido, portanto, quando há possibilidade de melhorar o prognóstico do bebê
adiando o parto.
1. Tocólise: possui o único objetivo de permitir o amadurecimento pulmonar.
Tocolíticos de escolha:
a. Bloqueadores de canal de cálcio: nifedipina, promove efeito relaxante
no miométrio. Dose inicial: 10mg VO, de 15 a 20 min até a dose máxima
e 40mg durante a primeira hora. Depois, 10 a 20mg VO de 4 a 6h. Seus
efeitos colaterais incluem rubor, cefaleia, náusea e, raramente, IAM,
dispneia intensa, hipóxia materna, hipotensão com morte fetal e fibrilação

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 116


atrial. Contraindicações: hipotensão, ICC, disfunção do ventrículo
esquerdo e uso concomitante de sulfato de magnésio.
b. Agonistas beta-2-adrenérgicos: salbutamol, terbutalina, ritodrina.
Dose: 5 ou 10 ampolas diluídas em 500mL de soro glicosado a 5%.
Efeitos colaterais: taquicardia, tremores, náusea, vômitos, hiperglicemia,
EAP, hipotensão, isquemia miocárdica, arritmias. Contraindicações:
cardiopatias, glaucoma de ângulo fechado, anemia falciforme, passado
de EAP. Uso cauteloso: hipertiroidismo, asma, DM.
c. Outros: sulfato de magnésio, inibidores da cicloxigenase (indometacina),
antagonistas da ocitocina (atosiban).

Contraindicações absolutas Contraindicações relativas


Doença materna de difícil controle Placenta prévia
Corioamnionite Dilatação >4cm
Malformações fetais incompatíveis com a vida IG > 34 semanas
Óbito fetal
Sofrimento fetal agudo
Instabilidade hemodinâmica materna

2. Amadurecimento pulmonar: reduz a incidência de síndrome aguda respiratória


e outras complicações e da mortalidade neonatal. Um único curso de
corticoterapia deve ser administrado em gestantes entre 24 e 34 semanas. O
corticoide estimula a síntese e a liberação do surfactante nos alvéolos
pulmonares fetais. O efeito máximo ocorre 24h após a administração da última
dose, a há relatos de inutilidade do seu uso antes de 24 semanas, pois o
pulmão do concepto parece não responder. A corticoterapia aliada a tocolíticos
beta-agonistas aumenta o risco de edema pulmonar.
a. Betametasona: 12mg IM/dia por 2 dias.
b. Dexametasona: 6mg IM de 12/12h por 2 dias.

Assistência ao trabalho de parto

No caso de não haver benefícios em prolongar a gestação ou quando houver


contraindicação à tocólise ou falha na tocólise, o parto deve ser realizado. A via de parto
leva em consideração idade gestacional, integridade das membranas, peso estimado,
condições cervicais e condições de assistência neonatal. Desse modo, na assistência
ao parto prematuro, deve ocorrer:
▪ Monitorização fetal rigorosa
▪ Amniotomia tardia (acima de 8cm de dilatação) – antes, deve ser evitada
▪ Episiotomia ampla como medida de proteção à cabeça fetal (não é um
consenso)
▪ Fórcipe de alívio se o peso fetal estimado for > 1500g
▪ No caso de apresentação pélvica, indicar cesariana – em apresentação
cefálica, a via vaginal pode ser indicada!
▪ Profilaxia intraparto para GBS (Streptococcus agalactiae) é obrigatória, a
menos que haja cultura negativa há < 5 semanas. A profilaxia é feita com
penicilina cristalina ou ampicilina.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 117


Neuroproteção: a prematuridade é fator de risco para paralisia
cerebral, e quanto mais prematura for a gestação, maior o risco. Por
conta disso, desde a década de 80, encontram-se evidências da menor
incidência de paralisia cerebral quando administrado sulfato de
magnésio na gestante.

Retirado de Rotinas Assistenciais da Maternidade-Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro: Neuroproteção


na prematuridade.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 118


Hiv na gestação
Introdução
A transmissão vertical do vírus HIV depende expressamente da carga viral da
mãe e, sem qualquer intervenção, a taxa de transmissão fica em torno de 25,5%. Diante
da infecção materna, pode ser transmitido:
➔ Durante a gestação: por via transplacentária, a partir da 8ª semana
➔ Durante o parto: por contato direto com o sangue ou secreção cervicovaginal
através da pele, da exposição traqueobrônquica ou por ingestão, sendo essa a
principal via de transmissão, chegando até 75%.
➔ Pós-parto: aleitamento materno.

Vários fatores se relacionam com a taxa de transmissibilidade do vírus, além da


carga viral materna. Entre eles, destacam-se a ruptura prolongada das membranas
amnióticas, o uso de antirretrovirais pela mãe, o comportamento materno (incluindo uso
de drogas), via de parto e ocorrência de hemorragia intraparto.
Em 1994, o estudo Aids Clinical Trial Group (ACTG 076) revolucionou os
protocolos do HIV na gestação, pois foi ele que evidenciou a importância da profilaxia
gestacional e no trabalho de parto. Os dados demonstraram que as mães e os neonatos
que receberam AZT tiveram riscos diminuídos de transmissão, chegando a uma redução
de 67,5%.
Há muitas divergências quando o assunto é HIV na gestação, seja quanto à
profilaxia ou indicação de via de parto. Muitos estudos ainda são constantemente
realizados a fim de chegar a um consenso, mas o Ministério da Saúde tem um protocolo
específico para estas situações, atualizado pela última vez em 2015. Com aplicação
das medidas sugeridas pelo MS, a taxa de transmissão pode cair para 2%.

Terapêutica para prevenção da transmissão vertical de HIV

1. Triagem sorológica: com consentimento e aconselhamento propício, o teste


rápido para HIV deve ser realizado no primeiro semestre da gestação, para
todas as gestantes. Se o resultado for reagente, a gestante é encaminhada para
serviços especializados em DSTs. Se for não reagente, um novo teste deve ser
realizado no terceiro trimestre.
o Mulheres não testadas ou que não apresentem seu resultado até a data
do parto devem ser testadas na maternidade.
o Gestantes de alto risco (soronegativas com parceiros infectados,
profissionais do sexo, usuária de álcool e outras drogas, múltiplos
parceiros, portadores de IST ou parceiros com outras IST, provenientes
de regiões de alta prevalência de HIV, portadoras de TB, independente
do tempo desde a realização do último teste) também devem realizar o
teste na admissão para o parto.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 119


2. Antirretroviriais na gestação: todas as gestantes infectadas devem usar três
antirretrovirais, e a TARV não deve ser suspensa no pós-parto, independente
dos níveis de linfócitos TCD4 no início do tratamento – que pode acontecer a
qualquer momento da gestação. A TARV pode ser iniciada antes da obtenção
de resultados de linfócitos TCD4 e da carga viral. Antes de iniciar o tratamento,
recomenda-se fazer a genotipagem, exame que confirma o código genético do
vírus, mas o tratamento não deve ser atrasado se o resultado não sair. Dos três
antirretrovirais, dois devem ser inibidores de transcriptase reversa
análogos de nucleosídeos e nucleotídeos (ITRN) e um deve ser inibidor da
transcriptase reversa não análogos de nucleosídeos (ITRNN).
o ITRN
i. Primeira linha: A associação entre
tenofovir e lamivudina (TDF/3TC) Gestantes que já estavam
é a preferência nas gestantes, pela em uso de TARV antes da
maior adesão no tratamento, já que gestação e apresentam
é apenas uma dose diária. Além supressão da carga viral devem
disso, é menos tóxico (quando manter o mesmo esquema. Se
houver carga viral detectável,
comparado a zidovudina) e tem
após 6 meses de início ou troca
atividade contra a hepatite B. de esquema, em 2 vezes de
ii. Segunda linha: se essa associação medida com intervalo de 4
não for possível, a segunda linha é semanas, devem ser
zidovudina + lamivudina consideradas em falha
(AZT/3TC). virológica. Assim, recomenda-se
iii. Terceira linha: abacavir + a genotipagem para identificar
resistência a TARV e determinar
lamivudina (ABC/3TC).
a troca para um esquema com
iv. A didanosina é contraindicada na maior chance de supressão viral.
gestação, pois aumenta o risco de Nesses casos, a carga viral deve
defeitos congênitos. ser superior a 1.000 cópias/mL e
o ITRNN o uso da TARV deve ser regular,
i. Primeira linha: efavirenz (EFV). com adesão, por pelo menos 6
meses.
Essa medicação já foi
contraindicada na gravidez, mas
atualmente é bem tolerada e recomendada, especialmente
porque pode ser usada conjuntamente com as medicações para
tuberculose.
ii. Segunda linha: nevirapina, quando houver contraindicações para
EFV. A nevirapina deve ser evitada em pacientes com contagens
de TCD4 maior do que 250 céls/mm³ ou com hepatotoxicidade
prévia. Por conta dessas complicações, a nevirapina deve ser
iniciada escalonadamente: 1comp/dia nos primeiros 14 dias;
depois 1 comp/12h a partir do 15º dia.
o Se o ITRNN não puder ser utilizado, o esquema será inibidor de protease
(IP) + ritonavir
i. Primeira linha: lopinavir + ritonavir (LPV/r), duas doses diárias
12/12h
ii. Segunda linha: atazanavir + ritonavir ou saquinavir + ritonavir.

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3. Exames laboratoriais na gestante HIV+

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Tabela MEDCURSO 2019

4. Vacinação na gestante HIV+

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Tabela MEDCURSO 2019

5. Quimioprofilaxia antirretroviral no momento do parto: administra-se


zidovudina via IV durante todo o trabalho de parto até a ligadura do cordão
umbilical. Essa medida só não deve ser realizada em gestantes que
apresentem carga viral indetectável após 34 semanas de gestação. A TARV,
se estiver em uso, é mantida no dia do parto.

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6. Manejo obstétrico
o Via de parto: a definição da via de parto deve ser baseada no resultado
da carga viral materna, a partir da 34ª semana. Se a carga viral for
desconhecida ou superior a 1.000cópias/mL, a cesariana eletiva está
indicada, a fim de reduzir a transmissão vertical do HIV. Se a carga for
inferior a esse valor, em gestantes em uso de antirretrovirais, a via de
parto vaginal é indicada.
o Uma vez que a decisão pela cesárea seja tomada, deve-se considerar:
i. Confirmar a idade gestacional pela DUM, altura do fundo
uterino e USG do primeiro trimestre, se possível. Essas medidas
auxiliam o estabelecimento da data do parto operatório eletivo, a
ser realizado na 38ª semana gestação, evitando a
prematuridade iatrogênica.
ii. Se houver indicação para cesárea eletiva e o TP começar antes
da data da cirurgia, estando a gestante com dilatação cervical
mínima (menor que 4cm), iniciar AZT e realizar cesárea, se
possível, após 3h de infusão contínua.
iii. Sempre que possível, realizar parto
empelicado.
iv. Realizar completa hemostasia de todos
os vasos da parede abdominal e ligar o
cordão umbilical imediatamente.
v. O uso de cefalotina ou cefazolina 2g
intravenosa, em dose única, após o
clampeamento do cordão, é indicado.
o Parto vaginal
i. Procedimentos invasivos durante a gestação e durante o trabalho
de parto ficam contraindicados.
ii. Deve-se evitar partos instrumentalizados, mas, quando
necessário, preferir o fórcipe.
iii. Administrar AZT IV desde o início do TP até o clampeamento do
cordão umbilical, se a carga viral não for indetectável.
iv. Se a bolsa amniótica estiver íntegra, a progressão do trabalho
do parto deve ser mantida naturalmente, a fim de evitar
manipulação das membranas até o rompimento, o que aumenta
os riscos de transmissão vertical.
v. Monitorar o trabalho de parto preferivelmente por partograma,
para evitar os toques repetidos.
vi. Evitar a bolsa rota por tempo prolongado – após 4h de ruptura,
aumenta a taxa de transmissão vertical.
vii. Não se contraindica o uso de uterotônicos.
viii. Amniotomia e episiotomia devem ser evitadas.
ix. Depois da expulsão, o clampeamento do cordão deve ser
imediato.

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o Manejo da ruptura de membranas em IG <34 semanas: se não houver
corioamnionite ou sofrimento fetal, sugere-se observação e uso de
medicamentos dependendo da causa da ruptura.
o Manejo da ruptura de membranas em IG >34 semanas: resolução da
gestação deve ser considerada após infusão endovenosa de AZT. A
decisão de via de parto depende das condições obstétricas e da carga
viral.

7. Puerpério: mesmo em uso de TARV, a transmissão vertical pode acontecer pela


amamentação. Assim, mulheres HIV+ devem ser orientadas a não amamentar,
e informadas sobre o direito de receber fórmula láctea infantil, pelo menos até
os 6 meses de idade do bebê. Para facilitar o processo, a cabergolina em dose
de 1mg, VO, dose única, deve ser administrada, a fim de inibir a lactação. A dose
pode ser repetida se continuar. Em casos excepcionais, em que a cabergolina
não esteja disponível, pode-se tentar o enfaixamento das mamas com atadura,
mantido por 10 dias desde o parto. A TARV deve ser mantida.

8. Cuidados com o RN
o Limpá-lo com compressas macias todas as secreções visíveis logo após
o nascimento e encaminhá-lo para banho com água corrente, ainda na
sala de parto
o Se a aspiração de vias aéreas for necessária, proceder delicadamente,
evitando traumatismos em mucosa
o Iniciar a primeira dose do AZT solução oral, ainda na sala de parto,
ou, pelo menos, nas primeiras 4h após o nascimento
o Acrescentar nevirapina à profilaxia com início nas primeiras 48h de vida
em casos de mães que não têm carga viral < 1.000 cópias/mL
documentada no último trimestre de gestação ou que têm histórico de
não utilização de antirretrovirais

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 125


Síndromes hipertensivas
gestacionais
Introdução
O grupo de síndromes hipertensivas gestacionais se refere à distúrbios
hipertensivos que se desenvolvem na segunda metade da gravidez, como
consequência das alterações ocorridas na invasão trofoblástica. A hipertensão durante
a gestação é a segunda maior causa de morte materna no Brasil e está associada
ao aumento do índice de cesárias.
Define-se a hipertensão durante a gravidez como a pressão arterial sistólica
≥140mmHg ou pressão diastólica ≥90mmHg com a paciente em repouso, sentada,
no braço direito com o mesmo no nível do coração e com duas medidas espaçadas
por, pelo menos, 4h, não devendo ser espaçadas por mais de 7 dias.

Classificação
1. Hipertensão crônica: observada antes da gravidez, ou antes de 20 semanas
de gestação, ou diagnosticada pela primeira vez durante a gravidez e não se
resolve após o parto. Este tipo não está associado diretamente às modificações
gestacionais, mas mulheres previamente hipertensas podem sofrer
agravamento do quadro durante a gestação.
2. Pré-eclâmpsia: é a doença exclusiva da gestação e se caracteriza pelo
aparecimento de hipertensão e proteinúria após a 20ª semana de gestação
em gestantes previamente normotensas. Na sua vigência, a mortalidade
perinatal está aumentada em cinco vezes.
a) Pré-eclâmpsia leve: PA ≥140/90mmHg (em duas ocasiões espaçadas de
4h) + proteinúria ≥300mg/24h.
b) Pré-eclâmpsia grave: PA ≥160/110mmHg (em duas ocasiões espaçadas
de 4h) + proteinúria ≥2g/24h ou +
▪ Oligúria menor que 500mL/dia ou 25mL/hora
▪ Níveis séricos de creatinina maiores de 1,2mg/dL ou duplicação
do valor normal na ausência de outras doenças renais
▪ Edema agudo de pulmão *MEDCURSO
▪ Sinais de encefalopatia hipertensiva (cefaleia e distúrbios visuais)
▪ Dor epigástrica ou no hipocôndrio direito
▪ Evidência clínica e/ou laboratorial de coagulopatia
▪ Plaquetopenia <100.000/mm³
▪ Aumento de enzimas hepáticas (AST ou TGO; ALT ou TGP; LDH)
e de bilirrubinas
▪ Presença de esquizócitos em esfregaço de sangue periférico
c) Pré-eclâmpsia sobreposta à hipertensão crônica (ou hipertensão
agravada pela gravidez): é o surgimento da pré-eclâmpsia em mulheres
com hipertensão crônica ou doença renal. Nessas gestantes, essa
condição se agrava e a proteinúria surge ou piora após a 20ª semana de

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 126


gravidez. Pode surgir trombocitopenia (plaquetas < 100.000/mm³) e
ocorrer aumento das enzimas hepáticas.
3. Eclâmpsia: é a presença de convulsões
tônico-clônicas generalizadas ou coma em Geralmente, as convulsões são
mulher com qualquer quadro hipertensivo, não autolimitadas, de 2 a 3 min, e precedidas
causada por epilepsia ou qualquer outra doença de cefaleia, alterações visuais,
convulsiva. Pode ocorrer na gravidez, no parto epigastralgia e dor no quadrante
superior direito do abdome.
e no puerpério imediato.
4. Hipertensão gestacional sem proteinúria
a) Hipertensão transitória da gravidez: pressão retorna ao normal 12
semanas após o parto (diagnóstico retrospectivo, uma vez que a
elevação da PA pode, ainda durante a gestação, se mostrar uma pré-
eclâmpsia).
b) Hipertensão crônica/doença vascular hipertensiva crônica: se a elevação
persiste 12 semanas após o parto.

A diferenciação entre pré-eclâmpsia, hipertensão crônica e pré-eclâmpsia


sobreposta é difícil, mas baseia-se numa anamnese bem colhida. Uma
PA ≥ 180/110mmHg fala mais a favor de hipertensão crônica, bem como
a fundoscopia pode revelar detalhes sobre o aumento de PA anterior à
gravidez. Por outro lado, o aparecimento recente de proteinúria, trombocitopenia e
elevação de enzimas hepáticas falam mais a favor de pré-eclâmpsia sobreposta.

Fatores de risco
A entidade hipertensiva mais importante da obstetrícia é a pré-eclâmpsia.
Nesse sentido, são fatores de risco para o desenvolvimento desse quadro clínico:
➔ Hipertensão arterial crônica
➔ História de doença hipertensiva durante a gestação anterior
➔ Diabetes tipo 1 ou tipo 2
➔ Doença renal crônica
➔ Doenças autoimunes, tais como LES ou síndrome do anticorpo antifosfolipídeo
➔ Primíparas
➔ Idade materna ≥40 anos
➔ Intervalo entre as gestações superior a 10 anos
➔ IMC ≥35 anos na primeira consulta
➔ História familiar de pré-eclâmpsia
➔ Gestação múltipla

Fisiopatologia
A pré-eclâmpsia, principal causa de morte materna no mundo, é conhecida
como a doença das teorias. Nos últimos anos, diversos avanços na área médica
permitiram aprofundar nossos conhecimentos sobre a sua etiopatogenia. Sabemos,
atualmente, que fatores genéticos, como a interação entre HLA paterno e linfócitos
NK maternos, estão envolvidos na origem da placentação deficiente, um dos principais
fatores de risco da pré-eclâmpsia. Fatores imunológicos, como a falha do

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 127


estabelecimento da reação inflamatória tipo 2 na implantação do embrião, também
poderiam dificultar a invasão trofoblástica.
O conceito de que a pré-eclâmpsia não é uma doença única, mas um conjunto
de doenças com manifestações clínicas comuns veio para ajudar na elucidação do
problema. A pré-eclâmpsia é considerada, hoje em dia, um estado inflamatório com
disfunção endotelial sistêmica.

MEDCURSO 2019

Conduta terapêutica
➔ Gestantes com fatores de risco para PE: iniciar AAS 100mg/dia, à noite, a
partir de 12 semanas, e manter até 37 semanas.
➔ Pré-eclâmpsia leve
o Tratamento ambulatorial com consultas semanais
o Períodos de repouso diários em decúbito lateral
o Dieta normossódica e hiperproteica
o Não prescrever diuréticos de rotina (apenas em casos específicos)
o Evitar dieta hipossódica
o Avaliação da vitalidade fetal
o Avaliação laboratorial: proteinúria de 24h, clearance de creatinina,
hematócrito, hematoscopia, contagem de plaquetas, ureia, creatinina,
ácido úrico, proteínas totais e frações, enzimas hepáticas e bilirrubinas
Indicações de antecipação do parto
Maternas Fetais
Aumento persistente da PA até níveis de Restrição grave do crescimento fetal
gravidade
Cefaleia grave e distúrbios visuais persistentes
Dor epigástrica grave persistente, náuseas ou Suspeita ou comprometimento da vitalidade
vômitos fetal
Contagem de plaquetas < 100.000/mm³
Deterioração progressiva da função hepática ou Oligodrâmnio (índice de líquido amniótico <p10
renal para a IG
Suspeita de DPP
Trabalho de parto ou sangramento IG confirmada de 40 semanas

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 128


➔ Pré-eclâmpsia grave
o Internação da paciente e estabilização do quadro clínico
o Controle rígido da PA e dos sintomas
▪ Medicação de ataque (manter PA diastólica entre 90 e
100mmHg): hidralazina 5mg EV, em bolus, lentamente, durante
1 a 2 min, repetida a cada 15 min (diluir 1 ampola de 20mg em
água destilada – qsp 20mL – e aplicar 5mL). A dose máxima em
bolus e de 20mg. A queda na pressão arterial começa dentro de
15 a 30mmin, e dura de 2h a 4h (dose máxima total 40mg – 2
ampolas)
▪ Medicação de manutenção (caso a PA diastólica se estabilize em
valores < 100mmHg): hidralazina 25 a 50mg VO de 6h/6h (dose
máxima 200mg/dia) e/ou metildopa 250 a 750mg VO de 6h/6h
(dose máxima de 3g/dia) e/ou nifedipina 20mg VO de 6h/6h
(dose máxima 120mg/dia).
o Cateterismo venoso e vesical (sulfato de magnésio)
o Dieta normossódica e hiperproteica
o Avaliação da vitalidade fetal
o Aceleração da maturidade fetal: betametasona 12mg a cada 24h, 2
aplicações IM
o Avaliação laboratorial conforme rotina da pré-eclâmpsia leve, a cada 3
dias
o Profilaxia de eclâmpsia
▪ Medicação de ataque: sulfato de magnésio 4g EV, em dose
única (diluir 8mL da solução a 50% em 42mL de soro glicosado a
5% e ministrar, com bomba de infusão, em 10min)
▪ Medicação de manutenção: sulfato de magnésio 1 a 2g por
hora, EV (diluir 20mL da solução a 50% em 480mL de soro
glicosado a 5% e ministrar com bomba de infusão 50 a 100mL por
hora)
▪ Só continuar a medicação se
diurese > 30 mL/h; FR >10 irpm
e reflexo patelar presente.
Intoxicação por magnésio pode causar
▪ Manter a medicação por 24h depressão muscular, respiratória e
após o parto. Antídoto do sulfato parada cardíaca – por isso, a avaliação
de magnésio: gluconato de desses parâmetros e a disponibilidade de
antídoto são necessárias.
cálcio 1g EV perfundidos em
10min.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 129


➔ Síndrome HELLP: é o
quadro clínico
caracterizado por
hemólise, elevação
de enzimas hepáticas
e plaquetopenia.
Embora acompanhe outras doenças, em obstetrícia, é considerada como
agravamento do quadro de pré-eclâmpsia. É indicação de antecipação do parto,
e, antes, faz-se um resgate de dexametasona sempre que plaquetas
<50.000/mL, e controle dos outros parâmetros.

➔ Eclâmpsia
o Cuidados gerais: manter o ambiente tranquilo e silencioso, decúbito
elevado a 30º e face lateralizada, cateter nasal com O2 5L/min, punção
de veia central ou periférica calibrosa, e cateter vesical contínuo. Após
estabilização do quadro, iniciar os preparativos para interrupção da
gestação.
o Terapia anticonvulsivante: prevenir convulsões recorrentes em mulheres
com eclampsia e prevenir o aparecimento de convulsões nas mulheres
com pré-eclâmpsia. O sulfato de magnésio é a droga escolhida e deve
ser usada nas seguintes situações:
▪ Gestantes com eclâmpsia
▪ Gestantes com pré-eclâmpsia grave admitidas para conduta
expectante nas primeiras 24h
▪ Gestantes com pré-eclâmpsia nas quais se indica a interrupção
da gestação e existe dúvida se a terapia anticonvulsivante deve
ser utilizada (a critério do médico assistente).
➔ Doença vascular hipertensiva crônica
o Durante a gravidez: pacientes que apresentem PAD > 100mmHg ou que
estavam fazendo uso de medicação anti-hipertensiva antes da gravidez
com bom controle pressórico devam ser medicadas durante a gestação.
As drogas de escolha são alfametildopa, hidralazina,
betabloqueadores (evitar BB no segundo e terceiro trimestre de
gestação, especialmente atenolol e propranolol) e bloqueadores de
canais de cálcio. Os diuréticos devem ser evitados e os inibidores da
ECA são contraindicados.
o No puerpério: inibidores da ECA, betabloqueadores, bloqueadores
do canal de cálcio e diuréticos em pacientes que não estejam
amamentando. Nas lactantes, recomenda-se não utilizar os IECA e os
diuréticos.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 130


Doença hemolítica perinatal
Introdução
O agente Rh é uma proteína sanguínea que pode ou não estar presente no
sangue humano. No primeiro caso, diz-se que a pessoa possui Rh (Rh positivo); no
outro, Rh – (Rh negativo).
Apesar das recomendações existentes em relação à profilaxia com
imunoglobulina anti-D serem divulgadas e conhecidas, a aloimunização materno-
fetal ainda afeta cerca de cinco a cada 1.000 gestações.
Embora a principal causa seja falha na administração da imunoglobulina,
alguns casos ocorrem por dosagem inadequada, uso de drogas endovenosas e
transfusões de sangue. 98% dos casos são devidos a antígeno D do fator Rh e 2% a
antígenos atípicos como Kell, E ou C.
A aloimunização Rh pode levar à hidropsia e ao óbito fetal ou neonatal, e
costuma ser mais grave com os antígenos D e Kell.
Na avaliação da
gestante com aloimunização,
é importante a caracterização
da história obstétrica
(antecedente de óbito fetal ou
neonatal por hidropsia,
exsanguíneo transfusão
neonatal, idade gestacional
dos eventos), pois a conduta
depende do antecedente de
acometimento fetal ou
neonatal.
A eritroblastose fetal é uma doença hemolítica causada pela incompatibilidade
do sistema Rh do sangue materno e fetal: quando o fator Rh da mãe é negativo e o do
feto, positivo. Quando isso acontece, durante a gestação, a mulher produz anticorpos
anti-Rh para tentar destruir o agente Rh do feto, considerado “intruso”.

Diagnóstico
▪ Teste de Coombs indireto: (pesquisa de anticorpos irregulares) positivo com
título 1/16 para anti-D e qualquer título para outros antígenos, especialmente
Kell. A variação da densidade óptica da concentração de bilirrubina fetal no
comprimento de onda de 450nm (ΔDO450) é plotada no gráfico de Liley e define
a conduta a ser tomada.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 131


▪ Dopplervelocimetria da artéria cerebral média: com medida do pico de
velocidade sistólica em cm/seg, com correção do ângulo de insonação. Este
valor se correlaciona com anemia fetal moderada e grave, com sensibilidade
próxima de 100% e taxa de falso-positivo de 12%.
▪ USG: pode revelar sinais como espessamento e alteração da ecogenicidade
placentária, hepatoesplenomegalia com aumento de circunferência abdominal
do feto, duplo contorno da bexiga, estômago ou vesícula biliar, ou derrame
pericárdico com aumento da hidrocele e do líquido amniótico, ascite ou
hidropisia. No entanto, são todos sinais tardios, que aparecem em fetos
severamente anêmicos com déficit de hemoglobina acima de 7g/dL.

Conduta
A profilaxia é dever de todos os médicos, para que esta doença seja erradicada.
Na eventualidade do diagnóstico de aloimunização, a gestante deve ser encaminhada
para centros de referência para o acompanhamento da gravidez.
Todo feto anêmico deve ser transfundido para prevenir a hidropisia, que
aumenta o risco de óbito e sequelas neurológicas. Para tanto, é necessária
cordocentese e bolsa de sangue específica para esse procedimento, que deve ser
realizado em centro de Medicina Fetal.
A prevenção da sensibilização pelo fator Rh deve ser realizada pela
administração de imunoglobulina anti-D nas seguintes situações em mulheres Rh
negativo:
▪ Após procedimentos invasivos em mulheres gestantes: amniocentese,
cordocentese, biópsia de vilo corial;
▪ Após aborto, gravidez ectópica ou mola hidatiforme;
▪ Após o parto de mulheres com Coombs indireto negativo e recém-nascidos Rh
positivo;
▪ Após sangramento obstétrico (placenta prévia, por exemplo) com risco de
hemorragia feto-materna significativa.
Idealmente, a imunoglobulina deverá ser administrada até 72 horas após o
parto ou evento obstétrico, mas há evidências de proteção contra sensibilização se
administrada até 13 dias e há recomendações para que seja administrada em até 28
dias. Gestantes Rh negativo submetidas à laqueadura tubária também deverão
receber imunoglobulina anti-D.
SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 132
Diabetes gestacional
Introdução
A diabetes mellitus gestacional é a intolerância à glicose, de gravidade variável,
com início ou primeiro diagnóstico durante a gravidez e que desaparece após o parto.
Pelos novos critérios preconizados pelo International Association of Diabetes and
Pregnancy Study Group, o diabetes diagnosticado durante a gravidez pode ser
classificado como prévio ou gestacional.
Na gestação normal, são comuns como alterações no metabolismo materno
a hipoglicemia de jejum, o catabolismo exacerbado dos lipídios e a progressiva
resistência à insulina. A partir do segundo trimestre, a prioridade do organismo
materno é transferir o metabolismo de energia da oxidação dos carboidratos para os
lipídios, a fim de preservar a glicose para o feto. Como resposta a isso, há aumento da
produção de insulina.

Fisiopatologia
A resistência a insulina é causada por produção placentária de hormônios
contrainsulínicos (hormônio de crescimento placentário, cortisol, lactogênio
placentário humano e progesterona) e pela associação com aumento do aporte
calórico, deposição de gordura materna e diminuição de exercícios físicos. A resistência
à insulina não é acompanhada pela resposta adequada das células beta-pancreáticas.

Fatores de risco
▪ História familiar de diabetes
▪ IMC pré-gestacional > 30
▪ Ganho ponderal excessivo durante a gravidez
▪ Idade > 25 anos
▪ História de feto > 4kg
▪ História de intolerância à glicose
▪ História de perda fetal inexplicada ou malformação fetal
▪ Peso de nascimento da paciente >4kg ou <2,7kg
▪ Hemoglobina glicada ≥5,7%
▪ Síndrome dos ovários micropolicísticos
▪ Uso regular de glicocorticoides
▪ HAC ou relacionada à gravidez

Rastreamento e diagnóstico
O objetivo do rastreamento é identificar as gestantes assintomáticas que tenham
alta probabilidade de desenvolverem diabetes. Como 90% das gestantes apresentam
algum fator de risco, o rastreio universal parece ser a melhor abordagem.
O método ideal de rastreio ainda é controverso, podendo ser realizado por meio
de glicemia de jejum, glicemia pós-prandial, TOTG, ou curva glicêmica.
SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 133
O diagnóstico de DM pré-gestacional se dá, na primeira consulta pré-natal, por:
➔ Glicemia de jejum ≥126mg/dL ou
➔ Hemoglobina glicosilada ≥6,5% ou
➔ Glicemia plasmática aleatória ≥200mg/dL

A elevação da glicemia de jejum ou da hemoglobina glicosilada, em outro


momento, confirmam o diagnóstico.

Já o diagnóstico de DM gestacional acontece por:


➔ Glicemia de jejum ≥92mg/dL e <126mg/dL, em qualquer idade gestacional, em
duas medidas distintas, ou
➔ Entre 24-28 semanas: TOTG de 2h com 75g de glicose anidra, com pelo menos
1 dos valores alterados:
o Glicemia de jejum ≥92mg/dL e <125mg/dL ou

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 134


o Glicemia com 1h ≥180mg/dL ou
o Glicemia com 2h ≥153mg/dL.

Complicações
Hiperglicemia materna

Macrossomia > distocia e lesões


no parto

Hiperglicemia/hiperinsulinemia Neonatais > hipoglicemia,


Complicações fetais
fetal hiperbilirrubinemia > UTI

Tardias > obesidade infantil,


doença cardiovascular

Abordagem no pré-natal
O objetivo é evitar e identificar precocemente as principais complicações, por
meio do fornecimento de um controle glicêmico adequado. A abordagem multidisciplinar
é mandatória (obstetra, endocrinologista, nutricionista, enfermeiro, psicólogo), para que
haja, em conjunto, dieta adequada, atividade física regular e iniciar insulina, se for
necessário.

Consultas
➔ Primeira consulta
o Avaliação conjunta com a
equipe de endocrinologia
o Monitorização da glicemia em
jejum e 1h pós-prandial Na prática, ajusta-se a dose do hipoglicemiante se a
paciente já utilizava. Na teoria, a ANVISA não aprova, a
o Manter hipoglicemiantes orais conduta correta é suspender e iniciar insulina quando
(se já fazia uso) ou iniciar necessário, pois alguns estudos levantaram dúvidas
insulina, se necessário sobre a associação com malformações fetais. Outros
o Solicitar fundoscopia e países já liberaram a metformina por causa dos seus
benefícios e por ter sido provada em alguns estudos uma
avaliação da função renal, se droga segura. Caso o médico opte por manter a
diabéticas pré-gestacionais medicação, a paciente deve estar alertada sobre a não
o USG para avaliação da liberação da ANVISA.
vitalidade fetal e IG.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 135


➔ Nutrologista: consultas a cada 1-2 semanas nos casos de DM prévio, e de
acordo com a necessidade nos casos de DMG

Tratamento
▪ Dieta hipocalórica
▪ Exercícios físicos 3-4x/semana, de 20 a 30 min
▪ Glicemia alvo
o Pré-prandial: ≤95mg/dL
o 1h pós-prandial: ≤140mg/dL
o 2h pós-prandial: ≤120mg/dL
▪ Insulinoterapia: indicada para DM tipo 1 e DMG sem controle com dieta
o 1º trimestre: 0,8 U/kg/dia
o 2º trimestre: 1 U/kg/dia
o 3º trimestre: 1,2 U/kg/dia
o Dose total dividida em 2/3 em jejum (2/3 NPH e 1/3 insulina de ação
rápida) e 1/3 ao deitar (1/2 NPH e ½ insulina de ação rápida)
▪ Alternativa à insulina: metformina em dose máxima de 2500mg/dia,
geralmente iniciando 500mg 2x ou 3x ao dia

Interrupção da gestação
Recomendada em pacientes com tratamento só em dieta, até 40 semanas e em
pacientes em uso de insulina de 38/39 semanas. Nas pacientes bem controladas, a
indicação de via de parto é obstétrica.

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 136


Antes da cirurgia, os cuidados abaixo são necessários:
▪ Na véspera: prescrever 1/3 a ½ da dose de insulina NPH em uso
▪ Manter perfusão venosa de soro glicosilado durante todo o ato cirúrgico e no
pós-operatório, enquanto em dieta zero
▪ Suspender a insulina durante o parto para evitar hipoglicemia e risco fetal
▪ Manter glicemia durante o parto entre 70 e 110mg/dL, verificando a cada 1h

No pós-parto:
▪ DM pré-gestacional
o Retornar a 1/3 da dose de insulina usada na gestação
o Retornar após 1 semana ao ambulatório de nutrologia
▪ DM gestacional
o Dieta livre
o Não usar insulina de rotina
o Retornar ao ambulatório em 6 semanas para TOTG

SAÚDE DA MULHER | NATHALIA CARDOZO | MEDICINA UFRJ MACAÉ 2020.1 137

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