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08/11/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães

Acórdãos TRG Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


Processo: 644/13.0TTGMR.G1
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
EMPREGADOR
CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 29-06-2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
I – A cessão da posição do empregador no contrato de trabalho, nos
termos dos arts. 424.º e ss. do Código Civil, pressupõe três declarações
de vontade: a proposta e a aceitação do cedente e do cessionário –
suficientes para que se considere concluído o contrato – e o
assentimento do trabalhador, que pode ser anterior ou posterior à cessão
e é indispensável para que o contrato produza efeitos, sendo certo que
referindo-se a um contrato de trabalho por tempo indeterminado podem
se manifestar por qualquer forma.
II – Não obsta à verificação de transmissão de empresa ou parte de
empresa, nos termos do art. 285.º do Código do Trabalho, o facto de a
empresa antecessora exercer a actividade ao abrigo dum contrato de
prestação de serviços que cessou, quando, na situação concreta, por um
lado, tal contrato tinha por objecto a gestão duma unidade dotada de
autonomia técnica, organizativa e económica, e, por outro lado, tal
actividade foi levada a cabo com meios humanos e meios materiais que
transitaram todos da antecessora para a sucessora, sendo que os
primeiros eram todos seus trabalhadores e os meios materiais lhe
pertenciam em parte.
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO - PROCESSO N.º 644/13.0TTGMR.G1

1. Relatório

AA… intentou acção declarativa de condenação, com processo comum,


contra BB…, S.A., pedindo que seja declarada a ilicitude do seu
despedimento e condenada esta a reintegrá-lo ou a pagar-lhe a quantia
de € 11.241,72 a título de indemnização por antiguidade calculada até à
propositura da acção, bem como a pagar-lhe a quantia de € 3.000 a
título de indemnização por danos morais sofridos e a quantia de €
1.995,12 a título de retribuições que deixou de auferir calculadas desde
30 dias antes da propositura da acção até então, tudo acrescido de juros
de mora, à taxa legal, já vencidos até então no valor de € 185,68 e
desde então os vincendos até integral e respectivo pagamento.
Para o efeito alegou o autor, em síntese, que havia trabalhado
remunerada e subordinadamente, inicialmente, por conta da “CC…,
C.I.P.R.L.” e, depois, em virtude de uma transmissão dessa para a ré, o
autor passou a ser trabalhador da ré, só não tendo prestado trabalho

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efectivo a favor desta devido a um grave problema de saúde que


motivou baixa médica prolongada, sendo que logo que teve alta médica
o autor apresentou-se nesta para trabalhar mas foi impedido de o fazer,
sem prévio procedimento. Mais alegou que ficou privado de trabalhar e
de auferir a respectiva retribuição desde então, com o inerente prejuízo
não só monetário como também pessoal e familiar que transtornou toda
a sua vida, sofrendo grande angústia, perturbação e desgosto, já que
sempre fora um trabalhador competente e dedicado e ainda se sentia
válido para trabalhar e precisava desse dinheiro para as despesas do seu
agregado familiar.
Esta ré contestou, em suma, negando aquela alegada transmissão e
aquele alegado despedimento, considerando que o autor nunca deixou
de ser trabalhador da aludida CC. E terminou, pedindo a improcedência
da acção, com a sua absolvição, e a intervenção principal dessa outra
empresa na presente lide.
O autor não se opôs a este último pedido e o tribunal mandou intervir
como ré a CC, C.I.P.R.L..
Esta 2.ª ré contestou, em suma, alegando que houve transmissão do
autor para aquela 1.ª ré e não sendo impeditivo de tal o simples facto de
o autor ter estado ausente do trabalho por doença prolongada.
Por seu lado, a 1.ª ré veio refutar a versão da 2.ª ré, reiterando tudo
quanto já alegara na contestação.
Após a audiência prévia, realizou-se a audiência de discussão da causa,
finda a qual o autor declarou a sua opção pela indemnização de
antiguidade calculada até ao trânsito em julgado da decisão desta acção
(em detrimento da reintegração).
Seguidamente, pelo Mmo. Juiz a quo foi proferida sentença que
terminou com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, julgo a presente acção provada e procedente nos termos
sobreditos e, em consequência:
I - Declaro a ilicitude do despedimento levado a cabo pela 1ª ré, “BB,
S.A, relativamente ao autor, AA;
II – Condeno a mesma 1ª ré a pagar ao autor a quantia de € 16.034,20
a título de indemnização por danos morais (€ 3.000) e por antiguidade
até esta data (€ 13.034,20), acrescida da quantia eventualmente
vincenda a título de indemnização por antiguidade após esta data até
ao trânsito em julgado da decisão desta acção e tudo acrescido de
juros de mora, à taxa legal, contados desde a data do trânsito em
julgado da decisão desta acção até integral e efectivo pagamento.
III – Condeno a mesma 1ª ré a pagar ao autor a quantia que venha a
ser liquidada a título de compensação respectiva pelas retribuições que
o autor tenha deixado de auferir desde 30 dias antes da propositura da
acção até ao trânsito em julgado da decisão desta acção, depois da
dedução das importâncias que o autor tenha recebido a título de
subsídio de desemprego durante esse período (com a inerente
obrigação de a mesma ré entregar o respectivo valor total destas à
Segurança Social), acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar
da data da liquidação dessa quantia respectiva até integral e efectivo
pagamento;

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IV – Absolvendo a 2ª ré “CC – Cooperativa de Interesse Público de


Responsabilidade Limitada” da totalidade do pedido.
Custas a cargo da 1ª ré, tendo a acção o valor de € 16.034,20.»
Inconformada, a ré BB, S.A. interpôs recurso da sentença, formulando
as seguintes conclusões:
«I. Salvo o devido respeito, com a prova produzida em sede de
audiência de discussão e julgamento, não poderiam existir quaisquer
dúvidas sobre a inexistência de uma transmissão da unidade
económica.
II. Como analisaremos em pormenor, a Sra. Juiz de Primeira Instância
errou no julgamento da matéria de facto e de Direito e produz
afirmações na sua sentença perfeitamente inacreditáveis.
III. Ora, conforme se verá infra e, resultou provado à saciedade, a
exploração dos ecocentros pela 2ª Ré, não resultava de uma concessão
atribuída a esta, sendo esta uma mera prestadora de serviços
contratada pela SUMA/SERURB, que adquiriu a concessão por parte
da AMAVE.
IV. A própria CC assume isso na sua contestação, algo que a Exma.
Sra. Juiz a quo ignorou por completo.
V. Por outro lado, o Sr. Procurador do Ministério Público propõe uma
acção tendo por base um acordo de transmissão de posição contratual
que junta como doc. n.º 5 da petição inicial, sendo essa a sua causa de
pedir.
VI. Ora, como foi desenvolvido na contestação apresentada pela aqui
Recorrente, um acordo de cessão da posição contratual é regulado
pelos artigos 424º e seguintes do Código Civil, sendo absolutamente
diferente da transmissão de estabelecimento, atividade ou concessão,
prevista no artigo 285º do Código do Trabalho.
VII. Porquanto, numa cessão da posição contratual, a transmissão do
contrato de trabalho está sujeita ao acordo dos três sujeitos da relação
contratual, ou seja, do cedente, do cedido e do cessionário, nos termos
do artigo 424.º do Código Civil, o que claramente não aconteceu, no
caso em apreço.
VIII. Apesar de Cedente e Cessionário estarem de acordo com a
cessão, o trabalhador (cedido) não consentiu na cessão, nunca tendo
assinado o acordo de cessão da posição contratual, vd. doc. 5 da p.i..
IX. O Ministério Público juntou o acordo de transmissão da posição
contratual assumindo que o mesmo não foi assinado pelo trabalhador,
por motivo de força maior, doença súbita (enfarte do miocárdio
agudo), a que a Recorrente é absolutamente alheia, pelo que também
não se vislumbra onde exista qualquer acto ilícito, dolo ou culpa da
Recorrente BB, que dê depois lugar a uma indemnização por danos
morais.
X. O próprio trabalhador comportou-se sempre como se fosse
trabalhador da CC, remetendo as baixas médicas para essa empresa,
facto desvalorizado pela Sra. Juiz.
XI. A Sra. Juiz ignora igualmente as informações prestadas pela
Segurança Social, a pedido da Recorrente. A Sra. Juiz ignorou que o
trabalhador enviou para a CC, uma carta onde pedia que estes lhe

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remetessem o Mod. RP 5044-DGSS (cfr. doc.4 junto com a P.I.) ou seja,


a declaração de situação de desemprego, necessária à instrução do
requerimento do subsídio de desemprego, que demonstra que o mesmo
sabia que o seu empregador não era a BB mas sim, a CC.
XII. A CC não era detentora de qualquer estabelecimento ou tinha a
concessão de qualquer exploração, a mesma continuou a ter outros
colaboradores, e o Autor desta acção comportou-se sempre como
trabalhador desta empresa, remetendo-lhes a baixa e depois
solicitando-lhes o Mod. 5044.
XIII. Acresce ainda que, a Mma. Juiz de Primeira Instância, sem
qualquer razão válida, descredibilizou por completo as testemunhas da
Recorrente, o que jamais se poderá aceitar.
XIV. Destarte, mesmo que existisse fundamento para a
descredibilização de todas as testemunhas arroladas pela Recorrente, o
que recusamos, pois as mesmas responderam com isenção, de forma
completa e coerente, a prova dos factos constantes da contestação
apresentada pela aqui Recorrente foi igualmente efetuada pelos
documentos juntos aos autos e pelos depoimentos de parte do A. e
testemunhas arroladas pela 2ª R., como adiante se demonstrará e a
sentença deveria ter concluído pela inexistência de qualquer
transmissão da unidade económica.
XV. A Recorrente entende que deviam ter sido dados como provados
factos constantes da contestação que foram perfeitamente
demonstrados em sede de audiência de discussão e julgamento.
XVI. Entende assim o Recorrente que, salvo o devido respeito por
melhor opinião, que a douta sentença não deu como provados factos
absolutamente imprescindíveis à descoberta da verdade material, que
se encontram alegados na contestação e que foram cabalmente
provados em audiência de discussão e julgamento.
XVII. A Recorrente, com o presente recurso, pretende assim
demonstrar a percepção absolutamente errada por parte da
Meritíssima Juiz a quo dos obstáculos amontoados no caminho que lhe
era apontado percorrer.
XVIII. Entre outras matérias que impõem alteração da conclusão a
retirar das mesmas, entende a Recorrente que ao ponto 3 dos factos
provados deveria ter sido dada resposta distinta.
XIX. O ponto 3 dos factos provados refere o seguinte: “Na sequência
desta sociedade, a exploração e gestão do sistema multimunicipal de
triagem, recolha, valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos
do Norte Central, onde se inclui o concelho de Guimarães,
inicialmente da responsabilidade da 2ª Ré foi concessionada à 1ª Ré
que, efectivamente, passou a realizá-la e englobando os ecocentros de
Guimarães, Fafe, Famalicão e Santo Tirso, conforme organigrama
constante de fls. 12 e cujo teor aqui se dá por reproduzido.”
XX. Ora, conforme resultou da prova produzida nos autos, não só pelas
testemunhas da 1ª R. como pelas testemunhas da 2ª R. e pela
documentação junta aos autos, não tendo sido feita qualquer contra-
prova pelo A., nunca a 2ª Ré deteve qualquer concessão pública que
respeitasse à exploração do ecocentro de Aldão ou de qualquer outro.

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De facto, a concessão sempre pertenceu à Associação de Municípios


do Vale do Ave (AMAVE), conforme resulta, não só da prova produzida
em audiência de discussão e julgamento mas também da própria Lei,
veja-se o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 235/2009, de 15 de Setembro,
que deu origem à aqui Recorrente.
XXI. Por sua vez, dada a extensão das tarefas que tinha acometidas, a
AMAVE viu-se forçada a transmitir a sua concessão pública relativa
aos Ecocentros, à SERURB – SERVIÇOS URBANOS, LIMITADA
posteriormente, SUMA – SERVIÇOS URBANOS E MEIO AMBIENTE,
S.A.. Subsequentemente, foi a própria SERURB quem contratou
diversos prestadores de serviço, como foi o caso da 2ª Ré.
XXII. Comecemos pela análise do depoimento do Legal Representante
da 1ª R., DD, que depôs de forma clara e isenta, com recurso a datas e
pormenores importantes que demonstram o amplo e pormenorizado
conhecimento que detinha sobre os factos. O referido Legal
Representante é, deste modo, claro ao afirmar que a concessão da
exploração e gestão do sistema multimunicipal de triagem, recolha,
valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos do Norte Central
pertenceu à AMAVE, expondo de forma assertiva todo o processo de
constituição da 1ª R. bem como, da intervenção da SUMA/SERURB na
gestão dos ecocentros. O Sr. Eng. DD é também claro ao identificar a
posição da 2ª R. como um mero prestador de serviços da
SUMA/SERURB (Cfr. ficheiro áudio nº
20160928101334_3442585_2870539, min. 00:04:59 a 00:08:10)
XXIII. Acresce que, pela análise do depoimento da Legal Representante
da 2.ª R. se percebe que esta tinha conhecimento de que nunca a 2.ª R.
teve a concessão da exploração e gestão do sistema multimunicipal de
triagem, recolha, valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos
do Norte Central (Cfr. ficheiro áudio nº
20160928142038_3442585_2870539, min. 00:22:45 a 00:23:45)
XXIV. Destaque-se que, na sequência do seu depoimento, a referida
Legal Representante, chega mesmo a referir que a SUMA era devedora
da 2.ª R., o que nos parece óbvio na medida em que a 2.ª R. prestava
serviços àquela concessionária. (Cfr.: ficheiro áudio nº
20160928142038_3442585_2870539, min. 00:26:37 a 00:27:35)
XXV. Também a testemunha Eng. Célia …, arrolada pela Recorrente,
ex-trabalhadora da AMAVE, que demonstrou um conhecimento
bastante claro sobre a concessão pública de exploração e gestão do
sistema multimunicipal de triagem, recolha, valorização e tratamento
de resíduos sólidos urbanos do Norte Central atribuída à AMAVE foi
directa ao referir que a concessão sempre pertenceu a esta entidade
que, entretanto, a transmitiu para a SUMA/SERURB (Cfr. ficheiro
áudio nº 20160928150846_3442585_2870539, min. 00:01:16 a
00:02:20)
XXVI. E posteriormente, cfr. ficheiro áudio nº
20160928150846_3442585_2870539, min. 00:05:52 a 00:06:54.
XXVII. Atente-se também no depoimento da testemunha Sr. Eng. José
…, ex-administrador da Recorrente, que depôs com bastante clareza e
isenção, salientando pormenores e circunstâncias que demonstram o

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contacto direto que esta testemunha teve com todo o processo de


criação da Recorrente (Cfr. ficheiro áudio nº
20160928152329_3442585_2870539, min. 00:01:31 a 00:04:44).
XXVIII. Inclusive a testemunha arrolada pela 2.ª R. Vítor …, seu ex-
trabalhador, referiu conhecer quem era o detentor da concessão (Cfr.
ficheiro áudio nº 20160928162717_3442585_2870539, min. 00:07:04
a 00:07:26).
XXIX. A testemunha Vítor … refere inclusive que havia outros
prestadores de serviços a desempenhar funções nos ecocentros, a par
da 2ª R. (cfr. ficheiro áudio nº 20160928162717_3442585_2870539,
min. 00:07:40 a 00:08:08).
XXX. A testemunha Vítor …, depõe inclusive sobre “quem mandava no
ecocentro”, referindo que era a AMAVE quem fornecia os ecopontos à
2ª R. (cfr. ficheiro áudio nº 20160928162717_3442585_2870539, min.
00:08:39 a 00:09:11).
XXXI. Assim, do DL nº 235/2009, de 15 de Setembro, dos documentos
juntos pela 2ª R. por requerimento datado de 05/10/2015 e que se
referem às cartas com o assunto “Cessação de Contrato de Prestação
de Serviços”, “Prorrogação de Contrato” e “Cessação Contratual”;
da cópia do contrato de prestação de serviços celebrado em
16/05/2005 com a CC C.I.P.R.L. Ldª ou seja, com a 2ª R., junto aos
autos pela SUMA, após ofício judicial para o efeito bem como, dos
depoimentos que supra se transcrevem resulta que nunca a exploração
e gestão do sistema multimunicipal de triagem, recolha, valorização e
tratamento de resíduos sólidos urbanos do Norte Central, onde se
inclui o Concelho de Guimarães, foi da responsabilidade da 2ª Ré. E,
neste caso, o depoimento da testemunha Vítor … é particularmente
relevante porque, tendo trabalhado no ecocentro aquando da
concessão da AMAVE, demonstrou um conhecimento amplo e claro
sobre o modo de funcionamento dos ecocentros, nomeadamente de
quem fornecia os contentores, com que os prestadores dos ecocentros
trabalhavam bem como, quem efectivamente dirigia o funcionamento e
organização do ecocentro de Aldão, que era a AMAVE.
XXXII. Porquanto, o ponto 3 dos factos provados deverá ser alterado,
passando a conter o seguinte: “Na sequência desta sociedade, a
exploração e gestão do sistema multimunicipal de triagem, recolha,
valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos do Norte
Central, onde se inclui o concelho de Guimarães - inicialmente da
responsabilidade da AMAVE – ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS DO
VALE DO AVE que, por sua vez, transmitiu a concessão à SERURB –
SERVIÇOS URBANOS, LIMITADA (posteriormente, SUMA –
SERVIÇOS URBANOS E MEIO AMBIENTE, S.A.) -, foi concessionada
à 1ª Ré que, efectivamente, passou a realizá-la e englobando os
ecocentros de Guimarães, Fafe, Famalicão e Santo Tirso.”
XXXIII. Acresce que, é exagerada e infundada a importância que a
Mma. Juiz a quo dá ao depoimento da Legal Representante da 2ª R.
que, para além de demonstrar um comportamento desadequado
perante o Tribunal na medida em que, entrava em diálogo com o
próprio Autor e com o Mandatário da 2ª R., durante a inquirição

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daquela, questionando-o sobre factos de que não se recordava, para


posteriormente se pronunciar sobre os mesmos (cfr. ficheiro áudio nº
20160928142038_3442585_2870539, min. 00:06:36 a 00:06:40 e
00:18:56 a 00:19:09; 00:46:29 a 00:47:00).
XXXIV. A referida Legal Representante demonstra até um discurso
memorizado e não espontâneo sendo que, em determinado momento, o
Mandatário da 2ª R. refere a existência de uns contratos, sem
especificar de que contratos se está a referir, sendo que a referida
Legal Representante, refere-se aos tais concretos, como se soubesse do
que se tratava, mesmo sem que o Mandatário tivesse referido a quais
contratos se estava a referir. (Cfr. ficheiro áudio nº
20160928142038_3442585_2870539, min. 00:07:16 a 00:07:27).
XXXV. A Legal Representante da 2ª R. chegou mesmo a interromper o
depoimento das testemunhas da 1.ª R., sem que fosse, obviamente,
autorizada para o efeito, aproveitando o momento da acareação para o
efeito (cfr. ficheiro áudio nº 20160928152329_3442585_2870539, min.
00:23:42 a 00:24:38 e 00:27:05 a 00:27:12).
XXXVI. E ainda, pretendendo “prestar esclarecimentos” sobre o seu
depoimento, já depois deste ter terminado, e sem que tivesse sido
determinado pela Mma. Juiz a quo ou sequer requerido pelas partes,
que isso sucedesse.
XXXVII. Acresce que, como não poderia deixar de ser, a Legal
Representante da 2ª R. foi inquirida em sede de Declarações de Parte.
Ora, tal como sucede com a prova por Depoimento de Parte, as
Declarações de Parte apenas podem incidir sobre factos pessoais ou
de que o depoente deva ter conhecimento. À data da atribuição da
concessão à 1ª Ré, a Legal Representante da 2ª R. era funcionária
desta, sendo responsável pela área financeira da empresa, nem sequer
era Legal Representante desta, visto que, só assumiu a qualidade de
Legal Representante aquando da liquidação, uma vez que se tornou
liquidatária.
XXXVIII. Acresce que, logo no início do depoimento, a referida Legal
Representante referiu, de forma espontânea ter interesse na acção,
como aliás não poderia deixar de ser, na medida em que representa a
Co-Ré na acção. Pelo que, a apreciação deste depoimento deve ser
feita com parcimónia pelo Tribunal, na medida em que se trata de um
depoimento de alguém que tem um interesse concreto na causa.
XXXIX. Mesmo relativamente a matérias sobre as quais a referida
Legal Representante deveria ter tido conhecimento, porque se tratam
de factos por ela presenciados, e cujo conhecimento lhe é exigido em
virtude das suas funções, esta referia não conhecer e não se recordar
de tais factos (Cfr. ficheiro áudio . ficheiro áudio nº
20160928142038_3442585_2870539, min. 00:15:26 a 00:16:20).
XL. Acresce que, quando confrontada com as incongruências do seu
discurso, a Legal Representante da 2ª Ré EE recua, procurando
corrigir factos que lhe poderiam ser prejudiciais (cfr. ficheiro áudio nº
20160928142038_3442585_2870539, min. 00:17:38 a 00:19:28).
XLI. O mesmo se diga sobre o Depoimento de Parte do A. cujo crédito
deverá, naturalmente, ser aferido com algum cuidado uma vez que se

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trata de alguém com interesse notório na causa.


XLII. Pelo contrário, a Mma. Juiz a quo dá todo o crédito ao
depoimento do A. e da Legal Representante da 2ª Ré, ignorando e
descredibilizando por completo o depoimento de todas as testemunhas
da 1ª Ré, essas sim isentas dado não terem qualquer interesse na
causa.
XLIII. Assim, cumpre destacar o depoimento de Célia … e João …,
ambos ex-trabalhadores da AMAVE que participaram no processo de
recrutamento da 1ª R. aquando da sua criação e que, como tal,
demonstraram um conhecimento bastante claro, isento e
pormenorizado dos factos e de todo esse processo.
XLIV. Também a testemunha Srª. Drª. Julieta …, responsável de
recursos humanos da 1ª R. demonstrou uma postura idónea, tendo
deposto apenas sobre os factos que presenciou, mostrando um
conhecimento bastante próximo dos factos, o que permitiu um
depoimento claro e esclarecedor.
XLV. Outrossim, o Sr. Eng. José …, ex-administrador da 1ª R. que,
sendo administrador da 1ª R. aquando da sua constituição, participou
no processo de recrutamento de novos colaboradores para trabalharem
na 1ª Ré, em todas as valências para as quais esta fora constituída,
teve um discurso bastante claro, isento e desapaixonado, fornecendo
pormenores circunstanciados e que denotam o conhecimento directo
que teve dos factos (Cfr. ficheiro áudio
20160928152329_3442585_2870539, min. 00:28:35 a 00:29:52).
XLVI. Por fim, destaque-se igualmente o Legal Representante da 1ª R.,
o Sr. Eng. DD, actual Director Geral desta. Ao longo de todo o seu
depoimento, e tal como referido supra, o referido Legal Representante
depôs de forma clara e isenta, abordando os factos sobre os quais teve
um conhecimento direto e sobre os quais não tinha nenhum interesse
visto que, a maior parte do seu discurso e dos factos por si relatados é
corroborado por documentos juntos aos autos que nem sequer são da
produção da 1ª R.
XLVII. Pelo que, os depoimentos do Legal Representante da 1.ª R. e
das testemunhas Eng. Célia … e Eng. José …, tal como as testemunhas
João … e Dra. Julieta … merecem todo o crédito, não se
compreendendo porque razão a Mma. Juiz a quo conclui na sentença
que os mesmos denotaram “falta de espontaneidade, parcialidade e
incoerência, desmerecendo credibilidade”.
XLVIII. De facto, esta é mais uma prova do errado juízo valorativo do
Tribunal a quo, nos presentes autos.
XLIX. Pelo que, mais uma vez, se convida os Ilustres Juízes
Desembargadores do Tribunal da Relação de Guimarães a ouvirem a
inquirição destas pessoas que, ao contrário do que sucedeu com a
Legal Representante da 2ª R. sabiam daquilo de que falavam, não se
“esqueciam” de factos por eles presenciados nem tampouco
procuravam corrigir afirmações já avançadas.
L. Assim, tendo em consideração que apenas a Legal Representante da
2.ª Ré referiu que a transferência dos trabalhadores da 2.ª R. para a 1.ª
R. resultou de uma imposição e não de um processo voluntário,

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resultante do convite feito pela administração da 1.ª R., impõe-se a


alteração do ponto 6 dos factos provados.
LI. Acresce que, um juízo de racionalidade e razoabilidade mostra que
os Administradores da 1.ª R. tinham noção de que o processo de
transmissão dos contratos de trabalho não era automática, razão pela
qual fizeram a proposta aos trabalhadores da 2.ª R. dos ecocentros,
para que assinassem os contratos de transmissão da posição
contratual, cf. o modelo do doc. 5 junto com a p.i..
LII. Vejamos, deste modo, o depoimento do próprio A. (cfr. ficheiro
áudio nº 20160928104419_3442585_2870539, min. 00:10:12 a
00:10:30).
LIII. E o depoimento do Sr. Eng. DD (cfr. ficheiro áudio nº
20160928101334_3442585_2870539, min. 00:18:48 a 00:21:57).
LIV. E da testemunha Eng. José … (Cfr. ficheiro áudio
20160928152329_3442585_2870539, min. 00:01:31 a 00:02:39):
LV. Cfr. também ficheiro áudio nº
20160928152329_3442585_2870539, min. 00:07:46 a 00:10:58:
LVI. Destaque-se que, resulta dos factos provados sob o ponto 6 que “6
– Em data não concretamente apurada anterior a 22/2/2010, numa
reunião onde estiveram presentes o autor e representantes de ambas as
rés, foi comunicado ao autor que, em virtude daquela transmissão
aludida no item 3, ele transitava da 2ª ré para a 1ª ré, passando a ser
trabalhador desta com efeitos a partir de 3/3/2010”.
LVII. O teor do transcrito ponto 6 induz a conclusão de que resultou
provado que foi comunicado ao autor que a sua transição para os
quadros da 1.ª R. era automática e que, não era necessário o seu
acordo para que tal transição de processasse pelo que, o autor era
obrigado a aceitar tal transição, o que é falso!!!
LVIII. Conforme resulta dos depoimentos supra-transcritos, onde se
inclui o depoimento do próprio autor, apenas a Legal Representante da
2.ª R. refere que, na aludida reunião, foi difundido junto dos
trabalhadores da 2.ª R. de que o processo de transição para os quadros
da 1ª Ré era automático e obrigatório, o que foi contrariado por todos
os outros depoimentos supra-transcritos, onde se inclui o do próprio
autor, que negou ter sido uma imposição por parte da 1.ª R.
LIX. Ademais, se assim fosse, que sentido faria a elaboração dos
contratos de cessão de posição contratual celebrado com apenas
alguns dos trabalhadores da 2.ª Ré.
LX. Pelo que, se impõe a alteração do ponto 6, devendo este passar a
conter o seguinte: 6 - Em data não concretamente apurada anterior a
22/2/2010, numa reunião onde estiveram presentes o autor e
representantes de ambas as rés, foi comunicado ao autor que, em
virtude da criação da 1ª Ré, ele poderia, caso assim pretendesse,
transitar da 2ª ré para a 1ª ré, passando a ser trabalhador desta com
efeitos a partir de 3/3/2010.
LXI. Na sequência do que se refere supra, também o ponto 14 dos
factos provados deverá ser alterado nestes termos: 14 – Na sequência
do descrito no item 3, aceitaram integrar os quadros da 1ª R., em
Março de 2010, os outros oito trabalhadores que prestavam serviços

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no ecocentro, tendo todos continuado a prestar as suas funções


doravante para esta empregadora que passara a levar a cabo tal
actividade.
LXII. Novamente, a Mma. Juiz a quo deu como provados os pontos 13
e 15 com base apenas no depoimento da Legal Representante da 2ª R.,
que como se viu supra, não merece todo esse crédito, ignorando por
completo todas as demais provas.
LXIII. Assim, as testemunhas José …, Célia … e Julieta …, referiram
que nunca tiveram qualquer conhecimento da existência de um
trabalhador da 2ª R. que tencionava assinar o contrato de transmissão
da posição contratual e, deste modo, passar para os quadros da 1ª R.,
só não o tendo feito por ter estado impossibilitado por motivos de
saúde (Cfr ficheiro áudio nº 20160928152329_3442585_2870539, min.
00:10:59 a 00:11:56)
LXIV. Cfr. também ficheiro áudio nº
20160928160813_3442585_2870539, min. 00:01:50 a 00:04:19.
LXV. Cfr. ainda ficheiro áudio n.º
20160928150846_3442585_2870539, min. 00:04:23 a 00:05:52.
LXVI. A própria legal representante da 2ª R. refere que nunca mandou
as baixas recebidas pelo Autor, para a 1ª R. (Cfr. ficheiro áudio nº
20160928142038_3442585_2870539, min. 00:37:11 a 00:37:21).
LXVII. Porquanto, o ponto 13 deverá ser alterado para o seguinte: 13-
Através de contacto directo do A. aquando da cessação da sua baixa
médica, a 1ª Ré teve conhecimento da existência e cessação da baixa
médica do autor.
LXVIII. Quanto ao ponto 15, terá que se concluir que o mesmo foi
erradamente dado como provado, uma vez que nenhuma prova foi
produzida sobre este, tendo apenas a Legal Representante da 2ª R.
referido que, a 1ª Ré não ficou com a frota envelhecida (Cfr. ficheiro
áudio nº 20160928142038_3442585_2870539min. 00:36:18 a
00:37:10).
LXIX. A este respeito, atente-se no depoimento da testemunha da 2ª R.
Vítor … que referiu que era a própria AMAVE quem fornecia os
contentores à 2ª R. (Cfr. 20160928162717_3442585_2870539, min.
00:08:39 a 00:09:12).
LXX. Pelo que, o ponto 15 deverá ser dado como não provado.
LXXI. Por fim, incumbe-nos também focar no ponto 19 dos factos
dados como provados uma vez que, nenhuma prova concreta foi feita
quanto a esta matéria, que foi dada como provada. Aliás, o facto de, a
cada vez que o Autor se deslocava às instalações da A. e lhe ser
negado que fosse trabalhador desta, este ir embora sem manifestar
qualquer discordância ou sequer questionar aquela informação
prestada é paradigmático de que o autor sempre se conformou com
aquela situação (Cfr. ficheiro áudio nº
20160928104419_3442585_2870539, min. 00:19:41 a 00:20:49).
LXXII. Pelo que, também o ponto 19 deverá ser dado como não
provado.
LXXIII. A sentença recorrida enquadra a cessação do contrato de
prestação de serviços da SERURB/SUMA com a 2ª R. e a consequente

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criação da BB a quem foram adstritas as funções de exploração e


gestão do sistema multimunicipal de triagem, recolha, valorização e
tratamento de resíduos sólidos urbanos do Norte Central, onde se
inclui a exploração do ecocentro de Aldão, Guimarães numa
transmissão da unidade económica.
LXXIV. Ora, a regulação da matéria relativa à transmissão da unidade
económica resulta da transposição para o ordenamento nacional da
Directiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março de 2001.
LXXV. Ao nível do Código do Trabalho (CT), o art. 285.º estabelece
que “em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de
empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou
estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se
para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho
dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo
pagamento da coima aplicada pela prática de contraordenação
laboral”.
LXXVI. A aplicabilidade do regime previsto no art. 285º do CT exige,
portanto, a verificação de dois elementos cumulativos, ou seja, que
exista uma transmissão de empresa ou estabelecimento (ou parte
destes) e que o objecto da transmissão corresponda a uma unidade
económica.
LXXVII. Começando pela análise do conceito de unidade económica
importa salientar que, devido ao carácter extremamente lato deste
conceito, para averiguar da existência de uma unidade económica é
fundamental a ponderação sobre o “tipo de estabelecimento, a
transferência de bens corpóreos, a continuidade da clientela, o grau de
semelhança da actividade exercida antes e depois da transmissão, a
assunção de efectivos, a estabilidade da estrutura organizativa, etc”
(cit. JOANA SIMÃO, Questões Laborais, nº20, 2002, Coimbra
Editora).
LXXVIII. Tal como defende JÚLIO VIEIRA GOMES, “parece que
existirá uma entidade económica quando a parte de empresa ou
estabelecimento represente um conjunto de meios organizados, com
suficiente autonomia para poder funcionar independentemente no
mercado” (Cit. Direito do Trabalho, Volume I, Coimbra Editora, 2007,
p. 815).
LXXIX. Recorrendo ao caso concreto, tal como resultou provado,
nunca a 2ª R. teve a concessão da exploração do ecocentro. De facto, a
concessão da exploração do ecocentro era, originariamente da
AMAVE, tendo sido a AMAVE, quem cedeu a concessão à SERURB,
posterior SUMA que, por sua vez contratou os serviços da 2ª R. para
uma parte do trabalho no ecocentro.
LXXX. Assim, a 2ª R. prestava serviços à SERURB/SUMA, serviços
esses que eram por esta solicitados e tinham diretrizes específicas uma
vez que, quem tinha a concessão era a AMAVE e, a SERURB/SUMA. A
atividade prestada pela 2ª R. e seus trabalhadores, onde se inclui o A.,
no ecocentro estava limitada por aquilo que a SUMA/SERURB a
contratavam. A 2ª R. não tinha qualquer autonomia no
desenvolvimento da atividade, sendo esta uma mera prestadora de

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serviços.
LXXXI. Pelo que, a 2ª R. não era, sequer, proprietária das instalações
nem dos meios de produção sendo que, até os próprios contentores do
ecocentro eram colocados pela AMAVE, conforme resultou da prova
feita em audiência de discussão e julgamento.
LXXXII. Assim, a 2ª R. foi contratada pela SUMA/SERURB para
“Receber nos quatro Ecocentros os resíduos constantes no artigo 1º,
do Regulamento de Descarga de Resíduos nos Ecocentros do SIRVA;
Receber nos quatro ecocentros, os resíduos constantes nas futuras
atualizações, do Regulamento citado na alínea a); Transportar os
resíduos recebidos nos quatro Ecocentros para a Estação de Triagem,
para a Estação de Compostagem, ambas da AMAVE, ou para o locais
autorizados para a recepção dos resíduos em causa” (Cfr. Contrato de
prestação de serviços celebrado entre a SERURB e a 2ª R., junto aos
autos).
LXXXIII. Jamais se poderá considerar que a concreta prestação de
serviços da 2ª R. constitui uma unidade económica.
LXXXIV. As tarefas desenvolvidas pela 2ª R. no ecocentro de Aldão (e
nos restantes), não eram autónomas e independentes. A 2ª R.
necessitava sempre das ordens e dos meios fornecidos pela AMAVE e
SUMA.
LXXXV. Nunca a 2ª R. poderia explorar o Ecocentro de forma
autónoma na medida em que, as atividades que desenvolvia não eram
sequer autonomizáveis, sendo meramente instrumentais de outras
porque se referiam apenas à logística de recepção de resíduos aquando
da sua chegada ao ecocentro e transporte dos resíduos para os locais
onde os mesmos seriam tratados.
LXXXVI. A existência de uma unidade económica averigua-se,
portanto, através do conceito de estrutura organizativa, sendo aferido
pela existência, ou não, de uma estrutura organizativa destinada à
prossecução de um determinado fim.
LXXXVII. Ora, para além da 2ª R. não deter uma estrutura
organizativa no que concerne às tarefas pelas quais foi contratada
pelos ecocentros, esta nem sequer desenvolvia uma atividade
autonomizável e completa visto que, a 2ª R. só integrava uma parte do
processo não independente das restantes tarefas desenvolvidas no
ecocentro.
LXXXVIII. As tarefas desenvolvidas pela 2ª R. nos ecocentros
propriedade da AMAVE não visavam um fim mas, apenas um meio na
medida em que esta apenas recebia resíduos, não desenvolvendo
qualquer outra atividade com estes.
LXXXIX. Os restantes prestadores de serviços que prosseguiam as
restantes finalidades do ecocentro não eram, sequer, contratados pela
2.ª R. mas sim, pela SERURB/SUMA, porque era esta quem geria os
ecocentros e que detinha aquela atividade, ao contrário da 2.ª R. E se a
SERURB/SUMA não tivesse renovado o contrato de prestação de
serviços com a 2ª R.? Esta também deixaria de prestar serviços no
ecocentro.
XC. A propriedade dos ecocentros nunca foi transferida para esta

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sendo que, nem a própria SERURB era proprietária das instalações,


dado que a sua concessão estava dependente da concessão atribuída à
Associação de Municípios do Vale do Ave (AMAVE), razão pela qual,
aquando da criação da 1ª Ré, a SERURB/SUMA cessou o contrato de
prestação de serviços com a 2.ª R., conforme consta dos próprios
documentos juntos por esta com a sua contestação, e juntos pela
SUMA, aquando da notificação judicial para o efeito.
XCI. A remuneração dos serviços prestados encontra-se fixada na
cláusula 6.ª do contrato de prestação de serviços porque a 2.ª R. era,
efetivamente uma prestadora de serviços contratada pela SERURB e
como tal, era remunerada pelo serviço prestado.
XCII. Não era com o produto do trabalho desenvolvido que a 2.ª R. era
remunerada visto que os meios e a estrutura organizativa do ecocentro
não lhe pertenciam e esta não detinha a exploração do ecocentro.
XCIII. Centrando-nos agora no conceito de transmissão, este exige a
outorga de um negocio translativo entre cedente e cessionário porque
“parece ser jurisprudência maioritária entre nós a exigência de uma
relação directa entre cedente e cessionário” (cit. JOANA SIMÃO,
Questões Laborais, nº20, 2002, Coimbra Editora).
XCIV. No caso em apreço não existe sequer qualquer relação entre a
AMAVE e a 2ª R. ou, no limite entre a 2ª R. e a 1ª R. pelo que, nem
sequer estamos perante uma transmissão uma vez que, quem
efetivamente detinha uma unidade económica e que a transmitiu à 1ª R.
foi a AMAVE.
XCV. A Diretiva Comunitária 2001/23/CE do Conselho, de 12 de
Março de 2001 e a própria transposição para o Direito Nacional da
mesma, visaram proteger os trabalhadores que, pertenciam ao cedente
e que, como tal, com a transmissão para o cessionário, viriam os seus
contratos serem transmitidos para o cessionário.
XCVI. A referida Diretiva Comunitária não visa acautelar a posição
dos trabalhadores dos prestadores de serviços que, hão-de estar
sempre dependentes das condições do mercado e que nunca poderão
ver no seu vínculo com os credores da sua prestação, uma relação
estável, perpétua e permanente pelo que, não há nestes casos, qualquer
necessidade de acautelar expectativas já criadas.
XCVII. Situação distinta é a dos trabalhadores de um estabelecimento
que é transmitido para outrem. Esses sim, necessitam de proteção na
medida em que são absolutamente alheios aos negócios que o seu
empregador fará com “o imobilizado” da empresa.
XCVIII. A 2ª R. não explorava por meio próprio os ecocentros, nem a
concessão da AMAVE lhe foi cedida, como aconteceu com a SERURB.
O Autor era um trabalhador da 2ª R. e não da SERURB/SUMA ou da
AMAVE pelo que, nunca o seu contrato poderia ser transmitido ope
legis para a 1ª R. por via do art. 285º do CT.
XCIX. Acresce que, contrariamente ao que sucedeu com a 1ª R., a
quem foi fixado como objecto social a exploração e gestão do sistema
multimunicipal de triagem, recolha, valorização e tratamento de
resíduos sólidos urbanos do Norte Central, onde se inclui a exploração
do ecocentro de Aldão, Guimarães, a 2ª R. tem como objecto social

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apenas tarefas relacionadas com reaproveitamento e recolha de sucata,


sem sequer especificar em que zona geográfica tal tarefa é realizada.
C. Nem sequer o objecto social da 2ª R. se relaciona com gestão de
ecocentros e, muito menos, com a gestão de ecocentros no Norte
Central, onde se inclui o ecocentro de Aldão em Guimarães. Tal
identificação não consta do objecto social da 2ª R. porque nem sequer
poderia constar na medida em que esta nunca foi uma concessão da 2ª
R. nem esta desenvolveu essa atividade de forma autónoma ou
independente, por meio próprio.
CI. Por fim, importa-nos também referir um último pormenor que,
salvo o devido respeito, nos parece ter escapado à Mma. Juiz a quo
visto que, a Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março de 2001
afasta expressamente do regime da transmissão da unidade económica,
os casos de reorganização administrativa ou transmissão de funções
administrativas entre instituições oficiais. Ora, à data dos factos, tal
como resulta do Decreto-Lei nº 235/2009, de 15 de Setembro, a 1ª R.
era uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos. Pelo
que, a sua criação e consequente transferência da concessão da
AMAVE para a 1ª R. (cfr. preâmbulo do Decreto-Lei nº 235/2009),
ocorreu por exigência de organização administrativa uma vez que,
houve necessidade de criar uma única entidade que prosseguisse o fim
público de gestão dos resíduos de toda a área do Norte Central, por
forma a agilizar tais processos, concentrar meios e esforços e tornar o
sistema de gestão de resíduos mais eficaz e menos dispendioso para o
erário público.
CII. O contrato de trabalho do A. não poderia transmitir-se
automaticamente (ope legis) com a criação da 1ª R. Assim sendo, o A.
nunca deixou de ser trabalhador da 2ª R. pelo que, se este foi
ilicitamente despedido, foi fruto do comportamento da 2ª R.
CIII. Jamais poderá ser assacada qualquer responsabilidade à 1ª R.
uma vez que, não tendo o A. assinado o acordo de transmissão da
posição contratual com a 1ª R., o seu contrato nunca se transferiu para
esta.
CIV. Ora, a celebração de tal cessão da posição contratual consistiu
num acordo absolutamente voluntário, não consubstanciando qualquer
imposição legal em virtude da concessão.
CV. Se não ocorreu transmissão da unidade económica entre a
SUMA/SERURB e a 1ª Ré, jamais poderia acontecer com um prestador
de serviços daquela.
CVI. Mediante a cessão da posição contratual, prevista nos artigos
424º e seguintes do Código Civil, e tendo em consideração os dados do
caso em apreço, o empregador (cedente), com o consentimento do
trabalhador (cedido), transmite a terceiro (cessionário) a sua posição
no contrato de trabalho.
CVII. De facto, não restam dúvidas quanto ao facto da descrita cessão
da posição contratual ter carácter meramente convencional, tal como
sucedeu no caso em apreço, relativamente a apenas alguns dos
trabalhadores da CC que foram cedidos à Recorrente através de
acordos de cessão da posição contratual.

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CVIII. Pelo que, para que seja celebrada a referida cessão da posição
contratual é necessária a convergência de três declarações de vontade
ou seja, a proposta e a aceitação do cedente e do cessionário e o
assentimento do trabalhador.
CIX. Assim, no caso concreto, o acordo de cessão da posição
contratual não produziu os devidos efeitos visto que, o A./Recorrido
nunca assinou o acordo de transmissão da posição contratual, nem
nunca se comportou como trabalhador da Recorrente.
CX. Na verdade, o A. não poderá reclamar a produção de efeitos
inerentes a uma relação jurídica que não se consumou.
CXI. De facto, no caso em apreço, não pode ser atribuído valor
declarativo ao silêncio, nos termos do artigo 218º do Código Civil
visto que, seria necessário um consentimento expresso do A.,
consentimento, esse, que não foi prestado.
CXII. Com todo o respeito, tal parece-nos bastante claro, devendo a
BB, S.A. ser absolvida de todos os pedidos, porquanto, o A. nunca foi
ou sequer se comportou como trabalhador desta empresa, pois que
sempre justificou as suas faltas por doença à Ré CC e só quando esta
ficou com dificuldades económicas e o A. viu que ficaria sem posto de
trabalho, foi montada uma falsa tese de transmissão de
estabelecimento, que nunca existiu pelas razões supra-expostas.»
O autor e a co-ré apresentaram respostas ao recurso, pugnando pela sua
improcedência.
O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente
devolutivo.
Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, e colhidos os vistos dos
Exmos. Adjuntos, cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente,


sem prejuízo das questões que são de conhecimento oficioso, as
questões que se colocam a este tribunal são as seguintes:
- modificação da decisão sobre a matéria de facto;
- transmissão do contrato de trabalho do autor da 2.ª para a 1.ª ré.

3. Fundamentação de facto

Os factos provados são os seguintes:


1 – A 2.ª ré (“CC, Cooperativa de Interesse Público de
Responsabilidade Limitada”) é uma cooperativa cuja constituição foi
registada em 19/9/1997, tendo como um dos objectos a reciclagem e o
reaproveitamento de quaisquer resíduos sólidos e com registo de
dissolução em 9/02/2012 – cfr. fls. 115 a 122 dos autos e cujo teor aqui
se dá por reproduzido.
2 – A 1.ª ré (“BB, S.A.”) é uma sociedade com constituição registada
em 24/09/2009 e que tem por objecto exclusivo a exploração e gestão
do sistema multimunicipal de triagem, recolha, valorização e
tratamento de resíduos sólidos urbanos do Norte – cfr. fls. 103 a 114
dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
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3 – Na sequência desta sociedade, a exploração e gestão do sistema


multimunicipal de triagem, recolha, valorização e tratamento de
resíduos sólidos urbanos do Norte Central, onde se inclui o concelho de
Guimarães – que anteriormente a AMAVE – ASSOCIAÇÃO DE
MUNICÍPIOS DO VALE DO AVE dera em concessão à SERURB
(posteriormente, SUMA), a qual, por seu turno, adjudicara à 2.ª ré a
prestação dos serviços de gestão dos respectivos Ecocentros nos termos
do contrato de fls. 189 a 194 –, foi concessionada à 1.ª ré que,
efectivamente, passou a realizá-la e englobando os Ecocentros de
Guimarães, Fafe, Famalicão e Santo Tirso (alterado em conformidade
com o constante do ponto 4.1.).
4 – O autor (AA), por contrato escrito celebrado em 1/10/1997 e com
início nessa data, foi admitido ao serviço da 2.ª ré, por tempo
indeterminado, para sob as ordens, direcção e fiscalização desta e
mediante remuneração lhe prestar os serviços e as tarefas inerentes à
categoria profissional de trabalhador de limpeza no Ecocentro de
Guimarães – cfr. fls. 10 dos autos e cujo teor aqui se dá por
reproduzido.
5 – De então em diante, o autor prestou esse trabalho em proveito da 2.ª
ré e cuja remuneração se foi alterando, tendo em Janeiro de 2010 o
valor mensal de € 488,78, acrescido de € 6,41 por dia a título de
subsídio de alimentação.
6 – Em data não concretamente apurada, anterior a 22/02/2010, numa
reunião onde estiveram presentes o autor e representantes de ambas as
rés, foi comunicado ao autor que, em virtude da situação aludida no
item 3, as rés estavam de acordo em que ele transitasse da 2.ª ré para a
1.ª ré, passando a ser trabalhador desta com efeitos a partir de
3/03/2010 (alterado em conformidade com o constante do ponto
4.1.).
7 – E também lhe foi proposto que, para defesa dos respectivos direitos,
a fim de salvaguardar com exactidão, quer a sua antiguidade, quer a sua
categoria profissional, horário de trabalho e remuneração, assinasse um
acordo tripartido entre ambas as rés e o autor nos termos constantes de
fls. 14 a 16 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
8 – E cuja minuta, datada de 19/02/2010, lhe foi entregue já assinada
por ambas as rés e que o autor levou para poder analisar antes de
assinar e devolver e que só não o fez devido ao descrito no item
seguinte.
9 – No dia 22/02/2010, o autor deu entrada no Serviço de Urgência do
Hospital de Guimarães, tendo-lhe sido diagnosticado um enfarte agudo
do miocárdio e tendo ficado internado até ao dia 26/02/2010 – cfr. fls.
17 a 34 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
10 – Após a saída do Hospital de Guimarães, o autor esteve de baixa
médica, ininterruptamente, até ao dia 5/02/2013 - cfr. fls. 35 dos autos e
cujo teor aqui se dá por reproduzido.
11 – Em virtude dessa doença e durante esse período, o autor esteve
impedido de trabalhar, inicialmente para a 2.ª ré e depois, desde a
aludida transmissão, para a 1.ª ré.
12 – Os boletins relativos às baixas médicas do autor (documentos de

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certificado de incapacidade temporária para o trabalho por estado de


doença emitidos pelo médico nos termos constantes de fls. 36 a 71 dos
autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido), que lhe foram sendo
entregues, fê-los chegar aos serviços administrativos da 2.ª ré.
13 – Através da 2.ª ré, a 1.ª ré teve conhecimento da situação de
ausência do autor por estado de doença, desde antes de operar a aludida
transmissão e, subsequentemente, teve conhecimento dessa sua
situação de incapacidade temporária para o trabalho por baixa médica
prolongada e, também, teve conhecimento da data em que essa situação
iria cessar por alta médica do autor.
14 – Na sequência do descrito no item 3, também transitaram da 2.ª ré
para a 1.ª ré, em Março de 2010, os outros oito trabalhadores afectos
aos mesmos ecocentros, tendo todos continuado a prestar as suas
funções, doravante, para esta empregadora que passara a levar a cabo
tal actividade.
15 – E também a 1.ª ré passou a utilizar na sua actividade as
instalações, equipamentos e maquinismos que antes eram utilizados
pela 2.ª ré na mesma actividade, com excepção da frota envelhecida
(alterado em conformidade com o constante do ponto 4.1.).
16 – No dia 6/02/2013 (dia imediatamente seguinte à alta médica), o
autor apresentou-se no seu local de trabalho, nas instalações da 1.ª ré
sitas no Ecocentro de Guimarães, a fim de aí retomar e exercer as suas
funções de trabalhador de limpeza, mas foi impedido pela 1.ª ré de o
fazer e de sequer entrar nas instalações, alegando esta que ele não era
seu funcionário.
17 – De um momento para o outro, o autor viu-se desempregado e, de
então em diante, ficou privado de trabalhar, quando pretendia fazê-lo
por gostar e sentir-se capaz e válido após aquela doença.
18 – E também o autor deixou de poder contribuir para as despesas do
seu agregado familiar, tanto mais que tinha uma filha a estudar e só a
mulher trabalhava.
19 – O descrito nos itens 16 a 18 causou-lhe angústia, tristeza e
desgosto, transtornando-lhe negativamente a vida, não só profissional
como pessoal, familiar e social.
20 – No dia imediatamente seguinte àquela alta médica, a 2.ª ré enviou
para a Segurança Social, que recebeu, a comunicação via fax nos
termos constantes de fls. 176-177 dos autos e cujo teor aqui se dá por
reproduzido.
21 – A 2.ª ré também enviou ao autor a carta, datada de 27/03/2013,
nos termos constantes de fls. 13 dos autos e cujo teor aqui se dá por
reproduzido.
22 – O autor começou a receber subsídio de desemprego em Maio de
2013 – cfr. fls. 125 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido.

4. Apreciação do recurso

4.1. Suscita-se, em primeiro lugar, a questão da alteração da decisão


sobre a matéria de facto, nos termos do art. 662.º do Código de
Processo Civil, tendo em conta que a Apelante observou devidamente
os ónus de impugnação prescritos pelo art. 640.º do mesmo diploma
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legal.
Os pontos da matéria de facto que a Recorrente considera
incorrectamente julgados são os que o tribunal a quo deu como
provados sob os n.ºs 3, 6, 13, 14, 15 e 19.
Vejamos cada um deles:
A)
3 – Na sequência desta sociedade, a exploração e gestão do sistema
multimunicipal de triagem, recolha, valorização e tratamento de
resíduos sólidos urbanos do Norte Central, onde se inclui o concelho de
Guimarães, inicialmente da responsabilidade da 2.ª ré, foi
concessionada à 1.ª ré que, efectivamente, passou a realizá-la e
englobando os ecocentros de Guimarães, Fafe, Famalicão e Santo
Tirso, conforme o organigrama constante de fls. 12 e cujo teor aqui se
dá por reproduzido.
A Apelante sustenta que, tendo em conta o que resulta do DL n.º
235/2009, de 15/09, dos documentos juntos pela 2.ª ré que se referem
às cartas tendo por assunto “Cessação de Contrato de Prestação de
Serviços”, “Prorrogação de Contrato” e “Cessação Contratual”, do
contrato de prestação de serviços celebrado em 16/05/2005 com a 2.ª
ré, junto pela SUMA, bem como dos depoimentos do legal
representante da 1.ª ré e das testemunhas Célia …, José … e Vítor …,
nas passagens indicadas, aquele ponto deve ser alterado no sentido de
passar a constar como provado o seguinte: «Na sequência desta
sociedade, a exploração e gestão do sistema multimunicipal de
triagem, recolha, valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos
do Norte Central, onde se inclui o concelho de Guimarães -
inicialmente da responsabilidade da AMAVE – ASSOCIAÇÃO DE
MUNICÍPIOS DO VALE DO AVE que, por sua vez, transmitiu a
concessão à SERURB – SERVIÇOS URBANOS, LIMITADA
(posteriormente, SUMA – SERVIÇOS URBANOS E MEIO AMBIENTE,
S.A.) -, foi concessionada à 1ª Ré que, efectivamente, passou a realizá-
la e englobando os ecocentros de Guimarães, Fafe, Famalicão e Santo
Tirso.»
Em primeiro lugar, constata-se que a decisão recorrida fundamentou
este ponto apenas de forma genérica. Em segundo lugar, verifica-se que
os documentos invocados pela Apelante comprovam realidade algo
diversa da dada como provada, mas que, por outro lado, vai além da
contemplada pela redacção proposta por aquela, com relevância
fundamental para a decisão da causa. Tendo em conta o que
inequivocamente resulta de tais documentos (e considerando ainda o
diploma legal indicado), os depoimentos testemunhais são irrelevantes
no que os contradizem ou deturpam.
Assim, com base na aludida prova documental constante de fls. 185 a
194, no que respeita ao ponto da matéria de facto em apreço, considera-
se provado o seguinte (alteração introduzida no local próprio):
3 – Na sequência desta sociedade, a exploração e gestão do sistema
multimunicipal de triagem, recolha, valorização e tratamento de
resíduos sólidos urbanos do Norte Central, onde se inclui o concelho de
Guimarães – que anteriormente a AMAVE – ASSOCIAÇÃO DE

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MUNICÍPIOS DO VALE DO AVE dera em concessão à SERURB


(posteriormente, SUMA), a qual, por seu turno, adjudicara à 2.ª ré a
prestação dos serviços de gestão dos respectivos Ecocentros nos termos
do contrato de fls. 189 a 194 –, foi concessionada à 1.ª ré que,
efectivamente, passou a realizá-la e englobando os Ecocentros de
Guimarães, Fafe, Famalicão e Santo Tirso.
B)
6 – Em data não concretamente apurada, anterior a 22/02/2010, numa
reunião onde estiveram presentes o autor e representantes de ambas as
rés, foi comunicado ao autor que, em virtude daquela transmissão
aludida no item 3, ele transitava da 2.ª ré para a 1.ª ré, passando a ser
trabalhador desta com efeitos a partir de 3/03/2010.
A Apelante sustenta que, tendo em conta o que resulta dos depoimentos
do autor e das testemunhas Gerardo … e José …, nas passagens
especificadas, aquele ponto deve ser alterado no sentido de passar a
constar como provado o seguinte: «6 - Em data não concretamente
apurada anterior a 22/2/2010, numa reunião onde estiveram presentes
o autor e representantes de ambas as rés, foi comunicado ao autor que,
em virtude da criação da 1ª Ré, ele poderia, caso assim pretendesse,
transitar da 2ª ré para a 1ª ré, passando a ser trabalhador desta com
efeitos a partir de 3/3/2010.»
Em primeiro lugar, considera-se desadequado que, em sede de matéria
de facto, se tenha qualificado a situação do ponto 3 como sendo de
transmissão, uma vez que o thema decidendum é precisamente o da
verificação ou não de transmissão do estabelecimento. Em segundo,
compulsados os depoimentos que se pronunciaram sobre o carácter
obrigatório ou facultativo da passagem dos trabalhadores da 2.ª para a
1.ª ré, constata-se que os depoentes parecem referir-se essencialmente à
percepção e opinião com que ficaram e não propriamente ao que foi
inequivocamente afirmado pelos representantes das duas rés, sendo
inúmeras as contradições e imprecisões, pelo que se entende que não
pode dar-se como provado que tenha sido comunicado pelas mesmas
mais do que aquilo que resulta do “Acordo de Transmissão de Posição
Contratual” constante de fls. 14 a 16, que foi entregue ao autor já
assinado por ambas as rés.
Assim, com base na aludida prova documental, no que respeita ao
ponto da matéria de facto em apreço, considera-se provado o seguinte
(alteração introduzida no local próprio):
6 – Em data não concretamente apurada, anterior a 22/02/2010, numa
reunião onde estiveram presentes o autor e representantes de ambas as
rés, foi comunicado ao autor que, em virtude da situação aludida no
item 3, as rés estavam de acordo em que ele transitasse da 2.ª ré para a
1.ª ré, passando a ser trabalhador desta com efeitos a partir de
3/03/2010.
C)
14 – Na sequência do descrito no item 3, também transitaram da 2.ª ré
para a 1.ª ré, em Março de 2010, os outros oito trabalhadores afectos
aos mesmos ecocentros, tendo todos continuado a prestar as suas
funções, doravante, para esta empregadora que passara a levar a cabo

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tal actividade.
A Recorrente sustenta que, por razões semelhantes às atinentes ao
ponto 6, a redacção deste ponto deve ser a seguinte: «Na sequência do
descrito no item 3, aceitaram integrar os quadros da 1ª R., em Março
de 2010, os outros oito trabalhadores que prestavam serviços no
ecocentro, tendo todos continuado a prestar as suas funções doravante
para esta empregadora que passara a levar a cabo tal actividade.»
Todavia, o ponto 6 refere-se ao que previamente foi comunicado ao
autor, sendo que os pontos seguintes o completam, enquanto o ponto 14
se refere simplesmente à situação em que ficaram os outros oito
trabalhadores a partir de Março de 2010, em termos que
inequivocamente são reais. A testemunha Fernando …, inclusive,
afirmou que não aceitou a transição para a 1.ª ré e por isso propôs uma
acção contra a 2.ª ré, que perdeu, não havendo elementos que permitam
concretizar melhor as situações de cada um dos oito colegas do autor.
Assim, improcede a pretensão da Apelante nesta parte.
D)
13 – Através da 2.ª ré, a 1.ª ré teve conhecimento da situação de
ausência do autor por estado de doença, desde antes de operar a aludida
transmissão e, subsequentemente, teve conhecimento dessa sua
situação de incapacidade temporária para o trabalho por baixa médica
prolongada e, também, teve conhecimento da data em que essa situação
iria cessar por alta médica do autor.
A Apelante sustenta que, tendo em conta o que resulta dos depoimentos
das testemunhas José …, Célia … e Julieta …, aquele ponto deve ser
alterado no sentido de passar a constar como provado o seguinte:
«Através de contacto directo do A. aquando da cessação da sua baixa
médica, a 1ª Ré teve conhecimento da existência e cessação da baixa
médica do autor.»
Não obstante, tendo em conta que ambas as rés tinham já assinado o
“Acordo de Transmissão de Posição Contratual” referente ao autor,
entende-se que aqueles depoimentos não são convencedores de que a
situação do mesmo não foi devidamente averiguada e esclarecida pelas
rés, pela inverosimilhança que teria tal desinteresse, pelo que inexiste
fundamento para alterar a decisão do tribunal recorrido baseada no
depoimento firme e verosímil da legal representante da 2.ª ré e ainda no
do autor.
E)
15 – E também transitaram da 2.ª ré para a 1.ª ré as respectivas
instalações e equipamentos e maquinismo daquela afectos a tal
actividade, salvo a frota envelhecida.
A Apelante sustenta que a factualidade em apreço deve ser dada como
não provada, por falta de prova, sublinhando a passagem do
depoimento da legal representante da 2.ª ré em que a mesma afirma que
não transitou para a Recorrente a frota envelhecida e a passagem do
depoimento da testemunha Vítor Pereira em que o mesmo afirma que
era a AMAVE que fornecia os contentores à 2.ª ré.
Não obstante, dos depoimentos em apreço resulta efectivamente que a
1.ª ré passou a utilizar na sua actividade as instalações, equipamentos e

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maquinismos que antes eram utilizados pela 2.ª ré na mesma


actividade, com excepção da frota envelhecida, independentemente de
a quem pertencessem, sendo pacífico que as instalações não eram
efectivamente propriedade da 2.ª ré mas que podiam ser da mesma
algumas viaturas e equipamentos (cfr. a Cláusula 4.ª do contrato de
prestação dos serviços de gestão dos Ecocentros de fls. 189 a 194).
Assim, por uma questão de rigor terminológico, no que respeita ao
ponto da matéria de facto em apreço considera-se provado o seguinte
(alteração introduzida no local próprio):
15 – E também a 1.ª ré passou a utilizar na sua actividade as
instalações, equipamentos e maquinismos que antes eram utilizados
pela 2.ª ré na mesma actividade, com excepção da frota envelhecida.
F)
19 – O descrito nos itens 16 a 18 causou-lhe angústia, tristeza e
desgosto, transtornando-lhe negativamente a vida, não só profissional
como pessoal, familiar e social.
A Apelante sustenta que a factualidade em referência deve ser dada
como não provada por falta de prova, na medida em que sempre que o
autor se deslocava às instalações da 1.ª ré e lhe era negado que fosse
trabalhador desta se ia embora sem manifestar qualquer discordância
ou sequer questionar aquela informação.
Não obstante, considera-se que esta mera circunstância não é suficiente
para determinar a alteração da decisão do tribunal recorrido
fundamentada nos depoimentos das testemunhas Avelino Barbosa, José
Ribeiro e José Fernandes.
Termos em que se atende parcialmente a impugnação que a Recorrente
faz da decisão sobre a matéria de facto.
4.2. Importa, então, apreciar e decidir se ocorreu transmissão do
contrato de trabalho do autor da 2.ª para a 1.ª ré.
Provou-se que o autor era trabalhador da 2.ª ré e que em data não
concretamente apurada, anterior a 22/02/2010, numa reunião onde
estiveram presentes o autor e representantes de ambas as rés, foi
comunicado àquele que, em virtude da situação aludida no item 3, as
rés estavam de acordo em que ele transitasse da 2.ª ré para a 1.ª ré,
passando a ser trabalhador desta com efeitos a partir de 3/03/2010.
E também lhe foi proposto que, para defesa dos respectivos direitos, a
fim de salvaguardar com exactidão, quer a sua antiguidade, quer a sua
categoria profissional, horário de trabalho e remuneração, assinasse um
acordo tripartido entre ambas as rés e o autor nos termos constantes de
fls. 14 a 16 dos autos, cuja minuta, datada de 19/02/2010, lhe foi
entregue já assinada por ambas as rés e que o autor levou para poder
analisar antes de assinar e devolver, o que só não fez porque no dia
22/02/2010 deu entrada no Serviço de Urgência do Hospital de
Guimarães, tendo-lhe sido diagnosticado um enfarte agudo do
miocárdio, ficando internado até ao dia 26/02/2010. Após a saída do
Hospital de Guimarães, o autor esteve de baixa médica,
ininterruptamente, até ao dia 5/02/2013, em virtude do que esteve
impedido de trabalhar, inicialmente para a 2.ª ré e depois, desde a
aludida transmissão, para a 1.ª ré.

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Mais se provou que ambas as rés tiveram conhecimento da situação


descrita e que no dia 6/02/2013 (dia imediatamente seguinte à alta
médica) o autor apresentou-se no seu local de trabalho, nas instalações
da 1.ª ré sitas no Ecocentro de Guimarães, a fim de aí retomar e exercer
as suas funções de trabalhador de limpeza, mas foi impedido pela 1.ª ré
de o fazer e de sequer entrar nas instalações, alegando esta que ele não
era seu funcionário.
Estabelece o art. 424.º, n.º 1 do Código Civil que, no contrato com
prestações recíprocas, qualquer das partes tem a faculdade de transmitir
a terceiro a sua posição contratual, desde que o outro contraente, antes
ou depois da celebração do contrato, consinta na transmissão.
Acrescenta o art. 425.º do mesmo diploma legal que a forma da
transmissão, a capacidade de dispor e de receber, a falta e vícios da
vontade e as relações entre as partes definem-se em função do tipo de
negócio que serve de base à cessão.
Considerando a factualidade em apreço, julgamos que o denominado
“Acordo de Transmissão de Posição Contratual” constante de fls. 14 a
16 se reconduz sem margem para dúvidas a uma cessão da posição
contratual regulada nas disposições legais transcritas, sendo certo que é
pacífica a sua admissibilidade, em princípio, nas relações jurídicas
laborais.
Como diz Pedro Romano Martinez (Direito do Trabalho, Almedina,
2013, p. 716), “[a] cessão do contrato de origem convencional pressupõe três
declarações de vontade: a proposta e a aceitação do cedente e do cessionário e
o assentimento do trabalhador, que pode ser anterior ou posterior à cessão.”
Nos termos do citado art. 425.º, o acordo de cessão dos autos não tinha
que ser reduzido a escrito, uma vez que o contrato de trabalho por
tempo indeterminado não está sujeito a essa forma, sendo certo,
todavia, que o foi e que os respectivos contraentes, ou seja, o cedente
(2.ª ré) e o cessionário (1.ª ré), o assinaram; com tal acordo de
vontades, ficou concluída a celebração do contrato, sendo o
consentimento do outro contraente no contrato de trabalho (autor), que
no caso seria dado posteriormente, mero requisito de eficácia, como
claramente resulta do art. 424.º, n.º 1.
Ora, o autor, isto é, o trabalhador cedido, só não assinou o documento
escrito porque sofreu um enfarte agudo do miocárdio em 22/02/2010,
ficando internado até 26/02/2010 e de baixa médica até 5/03/2013, em
virtude do que nesse período não trabalhou para a 2.ª ré nem, depois da
data da transmissão do contrato (3/03/2010), para a 1.ª ré,
apresentando-se, todavia, para trabalhar para esta logo no dia seguinte
ao da alta.
Posto isto, deve ter-se em conta que, se a forma escrita nem sequer era
exigida para a celebração do acordo de cessão da posição contratual do
empregador, muito menos o era para a mera prestação de
consentimento pelo trabalhador, que a podia até manifestar previamente
ou posteriormente à celebração daquele, inclusive tacitamente (cfr.
Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra
Editora, 4.ª edição, p. 402).
Ora, estando o contrato de trabalho do autor suspenso, nos termos do
art. 296.º, n.ºs 1 e 3 do Código do Trabalho (desde 27/02/2010, por
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logo se saber que o impedimento ia durar mais de 30 dias – cfr. fls. 36),
por doença do mesmo em termos que eram do conhecimento de ambas
as rés, o que é certo é que logo após a cessação da suspensão o mesmo
assumiu inequivocamente a intenção de aceitar a transmissão, ao
apresentar-se para trabalhar junto da 1.ª ré.
Só assim não seria de entender se antes, expressa ou tacitamente,
tivesse manifestado não a aceitar, o que não pode deduzir-se da mera
entrega das baixas médicas junto da 2.ª ré, tendo em conta que o
contrato de trabalho estava suspenso desde data anterior à transmissão.
Acresce que, sabendo a 1.ª ré que tinha celebrado com a 2.ª ré um
acordo de cessão da posição contratual de empregador no contrato de
trabalho com o autor, e que este estava impedido de trabalhar desde
data anterior à da transmissão, em termos que determinavam a
suspensão do contrato de trabalho, seria até abusivo nos termos do art.
334.º do Código Civil invocar a não assinatura do aludido acordo pelo
mesmo, se tal formalidade fosse necessária, para o rejeitar como seu
trabalhador.
Em face do exposto, entende-se que o contrato de trabalho com o autor
se transmitiu da 2.ª ré para a 1.ª ré por força da vontade destas, com o
consentimento do autor, ou seja, em virtude de cessão da posição
contratual do empregador nos termos dos arts. 424.º e 425.º do Código
Civil.
Ainda que assim não se entendesse, sempre a transmissão se teria
verificado ope legis, como entendeu o tribunal recorrido.
Com efeito, estabelece o Código do Trabalho de 2009:
Artigo 285.º
Efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento
1 — Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de
empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou
estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se
para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho
dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo
pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 — O transmitente responde solidariamente pelas obrigações vencidas
até à data da transmissão, durante o ano subsequente a esta.
3 — O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável à
transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa,
estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente
responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes
tenha exercido a exploração.
4 — O disposto nos números anteriores não é aplicável em caso de
trabalhador que o transmitente, antes da transmissão, transfira para
outro estabelecimento ou unidade económica, nos termos do disposto
no artigo 194.º, mantendo-o ao seu serviço, excepto no que respeita à
responsabilidade do adquirente pelo pagamento de coima aplicada pela
prática de contra-ordenação laboral.
5 — Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados
com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou
acessória.

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6 — Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto no


n.º 1 e na primeira parte do n.º 3.
Este preceito legal, que corresponde, com alterações, ao art. 37.º da
LCT e ao art. 318.º do Código do Trabalho de 2003, transpôs para o
nosso ordenamento jurídico a Directiva n.º 2001/23/CE, do Conselho,
de 12/03/2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados
Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em
caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos ou de partes
de empresas ou de estabelecimentos, a qual substituiu a Directiva n.º
77/187/CEE, do Conselho, de 14/02/1977, alterada pela Directiva n.º
98/50/CE, do Conselho, de 29/06/1998.
Por seu turno, a noção de unidade económica constante do n.º 4
reproduz a constante do art. 1.º, n.º 1, alínea b) da Directiva n.º
2001/23/CE, que, quanto a este ponto, recolheu o ensinamento da
jurisprudência do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia,
segundo o qual é considerada transmissão a transferência de uma
unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta como
um conjunto organizado, não apenas de meios materiais, mas também –
e nalguns casos, em razão da natureza da actividade desempenhada,
principalmente – de trabalhadores, com o objectivo de prosseguir uma
actividade económica, seja ela essencial ou acessória.
Devido ao elevado grau de indeterminação deste conceito, para
averiguar a subsistência de uma unidade económica são frequentemente
enunciados por aquele Tribunal os critérios considerados relevantes, a
saber: o tipo de empresa ou estabelecimento, a transferência de bens
corpóreos, a continuidade da clientela, o grau de semelhança da
actividade exercida, antes e depois da transmissão, a assunção de
efectivos, a estabilidade da estrutura organizativa, etc..
Isto é, a jurisprudência do Tribunal de Justiça vem evidenciando uma
crescente independência face aos critérios próprios do direito
comercial, abandonando uma perspectiva predominantemente material
de empresa ou estabelecimento, enquanto unidade onde sobressaem,
segundo a visão clássica, os elementos do activo, mormente os bens
patrimoniais, valorizando predominantemente a característica da
identidade após a mudança de titular.
Em conformidade, para que parte da empresa ou estabelecimento possa
ser considerada como tal para efeitos do disposto neste preceito legal, a
unidade destacada da empresa ou estabelecimento global tem de ser
dotada de uma autonomia técnico-organizativa própria, com identidade
distinta.
Conforme refere Pedro Romano Martinez (Op. Cit., p. 718), “[b]asta
uma transmissão de facto da empresa ou estabelecimento, sem base num título
específico nem continuidade contratual, mas tem sempre de haver transmissão
de elementos integrantes da empresa ou estabelecimento e não mera alienação
de bens, que não integram uma unidade empresarial. Ou seja, para haver
transmissão de empresa ou estabelecimento é imperioso que se transfira uma
organização específica, com autonomia, não bastando a cessão singular de
elementos de certa unidade empresarial sem identidade própria.”
Nesse pressuposto, à luz do normativo que se deixou transcrito, a
transmissão da empresa ou estabelecimento não afecta, em regra, a
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subsistência dos contratos de trabalho, nem o respectivo conteúdo, tudo


se passando, em relação aos trabalhadores, como se a transmissão não
tivesse tido lugar, ficando o adquirente com todos os direitos e
obrigações emergentes do contrato de trabalho que vigorava com o
transmitente.
Isto é, “…o contrato de trabalho não se extinguirá, antes registará uma
modificação de carácter subjectivo, uma mudança de empregador, sendo o
transmitente substituído pelo adquirente na titularidade dos contratos de
trabalho. Dar-se-á, nesta hipótese, uma sub-rogação ex lege do transmissário
nas relações contratuais laborais do transmitente. Ora, ao acolher este
princípio de transmissão automática da posição contratual do empregador, a lei
inspira-se, sem dúvida, numa preocupação fundamental: a de garantir a
manutenção do emprego dos trabalhadores na hipótese de transmissão da
unidade económica em que laboram. Mas outros interesses relevantes
concorrem para este regime legal, desde logo o da tutela da operacionalidade
do próprio estabelecimento, isto é, a ideia de garantir ao respectivo
transmissário um estabelecimento funcionante, não desprovido de mão-de-obra.
Trata-se, em suma, de um regime de protecção centrado na ideia de
continuidade dos vínculos laborais, os quais acompanham o estabelecimento ou
a empresa transmitida de forma automática, isto é, independentemente da
vontade do transmitente/adquirente” (João Leal Amado, Contrato de
Trabalho, Coimbra Editora, 2009, pp. 194-195).
Ora, quanto a esta questão, concorda-se com a fundamentação e
solução acolhidas pelo tribunal recorrido, na medida em que a
factualidade assente evidencia efectivamente uma situação de
continuidade entre as duas rés na gestão dos Ecocentros do Norte
Central, onde se inclui o concelho de Guimarães, uma vez que
anteriormente a AMAVE – ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS DO
VALE DO AVE a incluiu na concessão que deu à SERURB
(posteriormente, SUMA), a qual, por seu turno, a adjudicou à 2.ª ré nos
termos do contrato de prestação de serviços de fls. 189 a 194, e,
posteriormente, tal gestão foi incluída na concessão atribuída à 1.ª ré,
que, efectivamente, passou a realizá-la.
Isto é, por um lado, a 1.ª ré sucedeu à 2.ª ré na gestão dos Ecocentros;
por outro lado, e isso é que é determinante, a 1.ª ré passou a levar a
cabo tal actividade utilizando todos os outros oito trabalhadores afectos
aos Ecocentros que antes aí trabalhavam por conta da 2.ª ré e as
instalações, equipamentos e maquinismos que antes eram utilizados
pela 2.ª ré na mesma actividade, com excepção da frota envelhecida.
Falece, pois, o argumento da Recorrente no sentido de não haver
transmissão de empresa ou parte de empresa da 2.ª ré para a 1.ª ré pelo
facto de aquela exercer a actividade ao abrigo dum contrato de
prestação de serviços que cessou, na medida em que, na situação
concreta em apreço, por um lado, tal contrato tinha por objecto a gestão
dos Ecocentros, actividade que por natureza – e como se confirma pelo
teor daquele contrato – é dotada de autonomia técnica, organizativa e
económica, e, por outro lado, tal actividade foi levada a cabo com
meios humanos e meios materiais que transitaram todos da 2.ª ré para a
1.ª ré, sendo que os primeiros eram todos seus trabalhadores e os meios
materiais lhe pertenciam em parte.
Aliás, como resulta do já acima explicitado, e se diz na sentença

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08/11/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães

recorrida, citando o Acórdão da Relação do Porto de 14 de Abril de


2008, disponível em www.dgsi.pt, é indiferente que tenha, ou não,
existido entre transmitente e transmissário, com ou sem interposição de
terceiros, qualquer negócio translativo da propriedade do
estabelecimento ou empresa ou dos seus elementos, nomeadamente,
corpóreos ou materiais.
Neste contexto, é por demais evidente o absurdo da pretensão de
apenas deixar de fora da unidade económica transmitida o autor, que,
aliás, fora igualmente objecto de transmissão através de acordo escrito
e assinado entre as rés, apenas pelo facto de o mesmo ter entretanto
sido acometido de doença grave e prolongada que motivou que o não
chegasse a assinar.
Pelo exposto, conclui-se que se operou a substituição da 2.ª ré pela 1.ª
ré na titularidade do contrato de trabalho celebrado com o autor, como
sucedeu na dos celebrados com os demais trabalhadores, de modo
automático e independente da vontade de ambas e mesmo da vontade
dos próprios trabalhadores (embora haja discussão jurídica sobre a
existência ou não de um direito de oposição por parte do trabalhador,
questão que não se coloca nos autos).
Improcede, pois, o recurso.

5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, e, em


consequência, em confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.

Guimarães, 29 de Junho de 2017


Alda Martins
(Eduardo Azevedo
Vera MariaSottomayor

SUMÁRIO (elaborado pela Relatora):


I – A cessão da posição do empregador no contrato de trabalho, nos
termos dos arts. 424.º e ss. do Código Civil, pressupõe três declarações
de vontade: a proposta e a aceitação do cedente e do cessionário –
suficientes para que se considere concluído o contrato – e o
assentimento do trabalhador, que pode ser anterior ou posterior à cessão
e é indispensável para que o contrato produza efeitos, sendo certo que
referindo-se a um contrato de trabalho por tempo indeterminado podem
se manifestar por qualquer forma.
II – Não obsta à verificação de transmissão de empresa ou parte de
empresa, nos termos do art. 285.º do Código do Trabalho, o facto de a
empresa antecessora exercer a actividade ao abrigo dum contrato de
prestação de serviços que cessou, quando, na situação concreta, por um
lado, tal contrato tinha por objecto a gestão duma unidade dotada de
autonomia técnica, organizativa e económica, e, por outro lado, tal
actividade foi levada a cabo com meios humanos e meios materiais que
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08/11/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães

transitaram todos da antecessora para a sucessora, sendo que os


primeiros eram todos seus trabalhadores e os meios materiais lhe
pertenciam em parte.
(Alda Martins)

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