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08/11/2020 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa


Processo: 817/12.3TMLSB-A-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: ALTERAÇÃO DE ALIMENTOS
EFICÁCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 14-09-2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Quer seja de fixação inicial da prestação alimentar, quer de aumento
da prestação, a sentença retroage os seus efeitos ao momento da
propositura da acção (art. 2006 do CC).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo
assinados.

Relatório:

H requereu em 21/10/2015 contra o seu ex-marido, P, uma execução


de alimentos devidos por este à filha menor de ambos, pelo valor
mensal de 220€, de Maio de 2012 a Outubro de 2015 (42 meses), no
total de 9240€, mais 913,37€ de juros e 87,89€ de outras despesas de
Set/Out2015. Isto com base na sentença proferida no processo
principal de alteração à regulação do exercício das responsabilidades
parentais.

O executado deduziu oposição à execução, entre o mais dizendo, no


que ainda importa, que o valor de 220€ mensais de alimentos
resultam de uma alteração à prestação alimentar anteriormente
fixada por acordo em 150€, alteração decretada por sentença de
31/08/2015, ainda nem sequer transitada em julgado, pelo que não
eram devidos (invoca para o efeito o disposto na 2ª parte do art. 2006
do Código Civil); de qualquer modo, sempre entregou à sua ex-
mulher mais do que 350€ mensais.
A exequente contestou a oposição, impugnando, entre o mais dizendo
que não se aplica ao caso a 2ª parte do art. 2006 do CC, já que ela tem
a ver com os incumprimentos, isto é, aos alimentos fixados, não pagos
e devidos desde a data em que o devedor desses alimentos já fixados
entrou em mora; aplica-se antes a 1.ª parte do 2006 do CC, sendo,
portanto, devidos tais valores desde a data da propositura da acção
de alteração.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença, julgando a
oposição procedente quanto ao desconto do valor de 477€ e no mais

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confirmando a execução no sentido de estar o executado obrigado ao


pagamento da prestação de alimentos fixada a favor da sua filha.

O executado recorre desta sentença, alegando o seguinte (em síntese


feita por este acórdão): a sentença exequenda só foi proferida em
Julho de 2015 e só tem eficácia depois do trânsito em julgado, só
valendo para as prestações que se vencerem depois; ela não pode ter
eficácia em relação às prestações que se venceram desde o início do
processo de alteração; mesmo que se entenda o contrário, o valor em
dívida seria só o valor mensal de 70€ em que a prestação foi
aumentada (de 150€ para 220€), pois que o executado esteve a pagar,
durante todo esse período (do início do processo, Abril 2012, até à
sentença, Julho de 2015), mais de 350€ por mês, como até decorre da
circunstância da sentença não ter dado como não provada a
afirmação que fazia nesse sentido no art. 20-b da petição de
embargos. Assim, não são devidos 38 prestações (até Julho de 2015) x
220€; ou, quando muito, só são devidos 38 prestações x 70€.
A exequente contra-alegou dizendo, na parte útil, que os valores
entregues pelo executado não correspondem à prestação alimentar
exequenda, mas a metade das despesas com o colégio e com outras
despesas; e que o valor das prestações vencidas a partir do início do
processo de alteração é, retroactivamente, o fixado na sentença de
alteração (invoca para tanto o disposto na primeira parte do art. 2006
do CC), tudo tal como foi decidido pela sentença recorrida.
*

Questões que importa decidir: se o valor fixado à prestação alimentar


(220€) deve valer retroactivamente desde o início do processo de
alteração; e se, entendendo-se que sim, no caso apenas seria devido o
valor do aumento (70€).
*

Na sentença recorrida deram-se como provados os seguintes factos:


1.- Por acordo celebrado na CRC, o executado e a exequente
acordaram em 30/10/2010 que o pai pagaria pensão de alimentos no
valor de 150€, bem como metade das demais despesas, cfr. fls. 26 e ss.
dos autos principais, ficando a menor à guarda da mãe.
2.- Por sentença datada de 31/08/2015, de fls. 443 e ss. dos autos
principais, foi a prestação de alimentos alterada, fixando-se em 220€
mensais, acrescida de repartição de despesas em 60% para o
progenitor, onde se incluíram todas as despesas escolares, actividades
extracurriculares e explicações (estas ultimas desde que acordadas
previamente por ambos), bem como as despesas de saúde.
3.- Interposto recurso de tal decisão, veio o Tribunal da Relação de
Lisboa, em 28/06/2016, confirmar tal decisão, mantendo a proporção
da repartição das despesas e apreciando a pretensão do progenitor no

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sentido de retirar a menor do estabelecimento de ensino já


frequentado, tendo concluído que, em virtude de a opção pela
frequência do ensino particular por parte da filha menor ter sido
tomada por ambos os progenitores antes do divórcio, “alterar nestas
circunstâncias o enquadramento escolar da jovem, sem a anuência
desta, seria susceptível de agravar aquele quadro, com efeitos
nefastos no seu desenvolvimento educacional e estabilidade
emocional. Deverão, por isso, os progenitores continuarem a fazer um
esforço financeiro para manterem aquela frequência escolar, sendo
que o progenitor, como infra frisaremos, mantém condições
económicas conducentes a tal”, cfr. fls. 514 e ss. dos autos principais.
4.- Em 21/10/2015 a progenitora intentou execução contra o
progenitor, pedindo: (1) o pagamento dos valores devidos desde a
propositura dos autos principais (27/04/2012) concretizando 220€ x
38 meses, (2) as prestações de alimentos referentes aos meses de Julho
a Outubro de 2015, (3) parte das despesas de saúde no valor de
38,59€, (4) juros de mora, (5) taxa de justiça e despesas.
5.- No âmbito da execução foram penhorados saldos: 277,87€ (fl. 52)
+ 3619,80€ (fl. 54) + 5100,00€ (fl. 68), no total de 8997,67€.
6.- O executado entregou em 31/08/2015, à progenitora, 127,95€, fl.
26.
7.- A 06/10/2015, o executado entregou à progenitora 350€, fl. 27.
8.- Resulta de sentença proferida que: “As questões de particular
importância da vida da menor serão decididas por acordo de ambos
os progenitores”.
9.- Em 08/10/2015 o executado manifestou-se contra a manutenção da
menor em colégio privado, à progenitora, por carta, fl. 28.

Acrescentam-se os seguintes factos que resultam provados com base


na sentença proferida e no ac. do TRL:
10.- Na sentença referida em 2 ficou provado que:
G) A menor frequenta o Colégio […] desde os 3 anos de idade. No
ano lectivo de 2014/2015 frequentou o 9º ano de escolaridade.
[…]
AJ) O executado paga metade da mensalidade do colégio da filha,
bem como a actividade extracurricular de vólei, no valor de 50€
mensais. Comparticipa em metade do prémio de seguro de saúde da
menor. Compra--lhe ocasionalmente roupa e calçado.
AL) No ano lectivo 2013/2014, pela frequência do 3º ciclo do ensino
básico no Colégio […] era devida a mensalidade de 450€,
compreendendo os meses de setembro a junho seguinte. O almoço
fornecido pelo colégio para o 3º ciclo ascendia a 134€, reduzido a 114€
nos meses de setembro, dezembro e abril.
11.- E depois, nela, escreveu-se que:
O regime vigente quanto a alimentos fixou a prestação mensal fixa a
contribuição de 150€ mensais […]

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Quanto a despesas escolares, incluindo alimentação no colégio […], a


cláusula 5ª, nº 2, prevê que são suportadas a metade pelos pais.
[…]
Na prática, o progenitor está a pagar metade das despesas com o
colégio que a filha frequenta, metade das despesas de saúde e a
totalidade com actividades extracurriculares.
[…]
No que se refere às necessidades da menor, a progenitora, em
alegações, elencou as seguintes despesas mensais:
- frequência de colégio 554€;
[…]
Cabe desde logo precisar quanto ao colégio que a frequência são
450€, acrescido de 134€ ou 114€ de almoço, em razão dos
discriminados meses (se incompletos, como início de ano e férias de
Natal e Páscoa, reduz). E ainda assim, não são todos os meses do ano.
Como consta dos documentos juntos pela progenitora, julho e agosto
não são pagos.
A alimentação, fazendo a menor o almoço em tempo de aulas no
colégio (valor incluindo nas despesas de colégio) […]
[…] julga-se adequado estabelecer:
- a prestação fixa de alimentos mensal a favor da menor em 220€;
- a comparticipação do progenitor em 60% e a comparticipação em
40% pela progenitora nas despesas de educação da filha
(presentemente incluindo mensalidade e almoço no colégio e
enquanto o frequentar; bem como nas despesas de saúde da menor,
incluindo prémio do seguro de saúde a seu favor e nas despesas com
explicações e actividades extracurriculares que ambos acordem
previamente.
Tenha-se em conta que a prestação fixa se reporta a alimentação
(excluindo a feita no colégio) […]
[…]
Nestes termos, […] mantém-se o (s) acordo (s) vigente (s) de
regulação das responsabilidades parentais, com as seguintes
alterações:
Cláusula 5ª
1.- O progenitor pagará de prestação fixa de alimentos à menor a
quantia mensal de 220€, até ao dia 8 de cada mês […]
2.- O progenitor comparticipará em 60% de todas as despesas
escolares da menor, incluindo actividades extracurriculares e
explicações, estas últimas desde que acordadas previamente por
ambos. A progenitora comparticipará em 40% nestas despesas.
[…]
12.- No recurso que o executado interpôs para o TRL, ele disse:
A pensão alimentar devida a menor conforme fixado reconduz-se a
quantia mensal nunca inferior a 630€;
[…]
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A ponderação entre necessidades da menor, dever de esforço do


progenitor e capacidades financeiras reais deste, deverá dar lugar a
pensão alimentar no valor global de 353,85€, valor que o recorrente
já suporta […].
13.- O TRL disse, entre o mais, o seguinte no acórdão referido em 3:
Das necessidades/despesas da menor:
Flui do provado que as despesas com a frequência do colégio privado
e a alimentação aí tomada (almoço} importam as seguintes quantias:
- a mensalidade de €450, nos meses de Setembro a Junho;
- a mensalidade de €134 (de alimentação) nos meses de Outubro,
Novembro, Janeiro, Fevereiro, Março, Maio e Junho;
-a mensalidade de €114 nos meses de Abril, Setembro e Dezembro,
totalizando tudo a quantia global de €5780 (o que aponta para uma
quantia média mensal de €481,70).
A acrescer a estas despesas, para além das de saúde e com as
actividades extracurriculares, temos as demais despesas de
alimentação (registando-se que se apurou que a menor e a
progenitora jantam habitualmente em casa dos avós matemos),
vestuário, calçado, higiene pessoal, outras despesas que a menor
possa ter, como por exemplo, com actividades de lazer, prendas de
aniversário dos amigos, idas ao cabeleireiro etc.
Fazendo apelo a critérios de normalidade, para o estrato
socioeconómico da jovem e dos seus progenitores, aquelas despesas
importam por certo uma quantia média mensal não inferior a €340,
assim estimadas: - €150 para a alimentação; - €80 para vestuário e
calçado; - €30 para produtos de higiene; - €80 para as outras
despesas.
Da repartição das despesas médias mensais da jovem pelos seus
progenitores:
Na sentença o requerido ficou obrigado a suportar as seguintes
quantias:
- €220 em dinheiro;
- 60% das despesas escolares, as quais importam na actualidade a
quantia média mensal de €289,02;
- seguro de saúde da jovem, cujo valor não resulta da factualidade
provada;
- 60% das despesas de saúde.
Quanto às despesas com as actividades extracurriculares e
explicações, terão de ser acordadas entre os progenitores (caso em
que suportará 60% do respectivo valor). Registe-se, todavia, que na
actualidade o requerido suporta os custos da actividade
extracurricular de vólei da jovem, no valor de 50€ mensais.
Os referidos valores importam uma quantia média mensal que
rondará, por certo, os €580.”
*

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Da discussão dos factos


Visto o teor das alegações do executado, considera-se conveniente
começar pelo fim delas, discutindo os factos dados como provados ou
não, de modo a precisá-los.
Na sentença recorrida, numa parte dedicada aos factos não provados,
consta que não foram dados como provados quaisquer outros factos,
e concretamente os factos alegados nos arts. 19, 20-a, 25 2ª parte, 29,
80, 82, da petição inicial e 11 e 32 da contestação.
Daqui tira o executado a conclusão de que está provado que ele,
desde Abril de 2012, entrega à exequente, todos os meses, quantia
mensal nunca inferior a 350€ (alegado no art. 20-b da petição inicial
de embargos) pois que, senão, a sentença também teria feito constar
como não provado o facto alegado em 20-b.
A verdade é que o executado esquece que na sentença se dá como não
provado o facto alegado no art. 29 da PI, que é o mesmo facto alegado
em 20-b. Pelo que a sentença, para o incluir nos factos não provados,
não tinha que referir os dois artigos da PI de embargos.
De resto, mais à frente a sentença recorrida diz expressamente o
seguinte:
[…] cumpre salientar que ficaram dúvidas ao tribunal se o
progenitor tem pago apenas 60% da mensalidade do colégio
directamente a esta entidade ou se entrega valor variável à
progenitora todos os meses superior a 60% da mensalidade. Acresce
que também não resulta claro se o progenitor tem pago algum valor
por conta dos 220€ mensais, mas a verdade é que nada foi provado
nesse sentido. Ora, sempre cabia ao progenitor o ónus da prova dos
pagamentos efectuados, o que não sucedeu, pelo que não restou ao
tribunal senão considerar apenas os pagamentos comprovados
documentalmente.”
Ou seja, a sentença aceita que o executado terá pago a
comparticipação das despesas a que estava obrigado, mas não sabe
em que termos nem o seu preciso valor, pelo que não o deu como
provado. E, por outro lado, entende que não há nenhuma prova de,
para além desse pagamento, o executado tenha pago algum valor da
prestação alimentar em sentido estrito, ou seja, dos 220€ mensais.
Ora, a dívida exequenda, o objecto do processo de embargos, no
essencial, diz respeito ao pagamento da prestação alimentar de 220€
por mês, de Maio 2012 a Junho 2015, e não ao pagamento da
contribuição para outras despesas (em valor superior a 350€
mensais).
Pelo que o valor dos 350€ mensais que o executado dizia ter entregue
sempre desde Abril de 2012, não eram propriamente objecto destes
autos, embora o executado tente sugerir que sim, pois que age como
se entendesse que com tal entrega de 350€ mensais estava a pagar a
prestação alimentar a que estava obrigado,
Posto isto, não há dúvida que a sentença recorrida entende que o
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executado não fez qualquer prova do pagamento da prestação mensal


dos 220€ mensais e que é isso que se está a discutir nestes autos, não o
valor dos 350€ mensais que ele diz ter entregado (o que é muito
provável ter acontecido, como já resulta de tudo o que antecede) e
que esse facto foi dado como não provado.
Sendo esse o objecto do processo – o não pagamento dos 220€ mensais
– era ao executado, como seu devedor, que cabia o ónus da prova do
cumprimento das obrigações cabe ao devedor (art. 342/2 do CC).
Ficando não provados os factos que poderiam permitir a conclusão
de que o executado tinha feito o pagamento, ele, se quisesse impor a
conclusão contrária, teria que ter recorrido da decisão da matéria de
facto, de modo a fazer tais factos nos factos provados, que era, repete-
se, o pagamentos dos 220€ e não dos 350€.
*

Diga-se, no entanto, o seguinte:


Aceite-se, em benefício da discussão, que o executado realmente
entregou à exequente pelo menos 350€ todos os meses. É muito
provável que ele o tenha feito como já se disse.
Se este facto se desse, expressamente, como provado, tal não
implicaria solução diferente da seguida na sentença recorrida.
Pois que, como claramente decorre da sentença do processo de
alteração, ele ficou de pagar uma prestação alimentar em sentido
estrito, de 220€ mensais, mais uma comparticipação (em metade)
para despesas escolares, incluindo a alimentação no colégio, despesas
de saúde e a totalidade com actividades extracurriculares.
Tudo isto dava, por certo, uma pensão de 220€, mais, pelo menos,
360€ de comparticipação para despesas, num total de, pelo menos,
580€ mensais (nas contas do TRL).
Nas contas do executado até dava mais, ou seja, 630€ mensais. Por
isso é que ele queria que o todo ficasse reduzido aos 350€ mensais que
dizia já estar a pagar.
Mas não lhe foi dada razão e por isso ele não pode deixar de saber
que ficou de pagar, pelo menos, 220€, mais uma comparticipação que
seria sempre superior a 350€ mensais.
Logo, se ele tiver estado a pagar 350€ mensais, o que é bem possível
ter acontecido, tal não corresponde a mais do que ao pagamento do
valor de quase toda (mas nem sequer toda) a comparticipação das
despesas.
Em suma: ele sabe que tem que pagar pelo menos cerca de 580€ e só
terá vindo a pagar 350€, ficando por pagar mais de 220€.
Assim sendo, tendo a exequente tido o cuidado de só pedir os 220€
mensais que o executado não estava a pagar, não tendo pedido nada
da comparticipação que seria superior a 350€, não há o perigo de,
executando-se o executado por 220€ mensais, estar a duplicar o valor
por ele pago.

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E o executado, face ao que antecede, não pode deixar de saber isto


perfeitamente, pretendendo com os embargos obter aquilo que sabe
ter perdido com a sentença de alteração, confirmada pelo acórdão do
TRL.
*

Art. 2006 do CC
Posto isto, cabe agora decidir a questão do art. 2006 do CC,
relativamente à qual é também evidente a falta de razão do
executado.
O art. 2006 do CC dispõe que “os alimentos são devidos desde a
propositura da acção, ou estando já fixados pelo tribunal ou por
acordo, desde o momento em que o devedor se constitui em mora,
sem prejuízo do disposto no art. 2273º”.
Parafraseando Antunes Varela, diga-se que a primeira parte da
norma, vale para os casos “em que a obrigação nasce ex novo, a
requerimento judicial do carecido.” A segunda parte vale para os
casos em que a prestação alimentícia foi fixada pelo tribunal ou por
acordo dos interessados, “à margem da acção da prestação de
alimentos”. Ora, uma prestação fixada numa alteração da prestação
de alimentos não é fixada à margem dela, mas nela própria, pelo que
a razão de decidir é a mesma da da primeira parte e não a da
segunda. Nesta hipótese, a lei podia ter considerado “os alimentos
devidos desde o momento da existência da situação de carência do
autor” ou podia tê-los considerado “exigíveis apenas desde a data em
que a decisão proferida transitasse em julgado”, mas entendeu que,
“comprovando-se em juízo a situação de carência do autor, o
demandado de algum modo podia e devia contar com a sua obrigação
de supri-la, desde a data em que soou a campainha de alarme que é a
propositura da acção.” (CC anotado, págs. 584-586, vol. V, Coimbra
Editora, 1995, págs. 584-586)
Assim, é evidente que a alteração tem de ter efeitos retroactivos ao
momento da propositura da acção (assim, já os antigos acs. do TRL
de 13/05/1977, publicado no BMJ 269/196, e do TRP de 11/12/1980,
BMJ 302/314, citados por David Valente Borges Pinho, Da protecção
judiciária dos menores e do Estado, Braga & Xavier, Lda, 2.ª ed,
1981, pág. 59; no mesmo sentido, Organização tutelar de menores, de
Rui Epifânio e António Farinha, Almedina, 1987, pág. 411, que citam
no mesmo sentido o ac. do TRP de 13/12/1979, BMJ 293/434, e o ac.
do TRL de 30/03/1982, BMJ 321/424; mais recentes, no mesmo
sentido, os acs. do STJ de 24/01/2002, proc. 02B2219, do TRL de
17/06/2014, proc. 3306/2004-2, do TRC de 25/03/2010, proc.
1330/07.6TBPBL.C1, que cita vários outros, e do TRP de 07/11/2011,
proc. 114-J/1999.P1; no mesmo sentido, ainda, Clara Sottomayor,
Regulação do exercício das responsabilidades parentais nos casos de
divórcio, 6ª ed, Almedina, 2016, pág. 353), embora o montante dos
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alimentos só passe a ser definitivo com o trânsito em julgado da


decisão (neste sentido, com desenvolvimento, Remédio Marques,
Algumas notas sobre alimentos, 2.ª edição, Abril 2007, págs. 173 a
181), o que não impede que os alimentos possam ser executados antes,
com as normais cautelas da execução de sentenças sujeitas a recurso
com efeitos meramente devolutivos.
*
Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente.
Custas pelo executado.

Lisboa, 14/09/2017.

Pedro Martins
Arlindo Crua
António Moreira

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