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Casos Práticos Resolvidos (AF) - CAT

Contencioso Administrativo e Tributário (Universidade de Lisboa)

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Anny Ferrarini (N.º56810)

Casos Práticos - Direito do Contencioso Administrativo e Tributário


Professor(a) Regente: Professor Doutor Vasco Pereira da Silva
Professor(a) Assistente: Mestre Tiago Serrão
Turma A - Subturma 2
Ano Lectivo 2020/2021

Comentários
(I) A circunstancia de o legislador ter optado por continuar a atribuir aos tribunais judiciais competência para
dirimir certos litígios jurídico-administrativos é fonte de inconstitucionalidade por preterição do disposto no
art. 212.º/n.º3 CRP.
(II) O art. 4.º ETAF revela a adopção pelo legislador de um conceito material de actividade administrativa.
(III) A impugnação de decisões da Administração Pública de aplicação de coimas, no âmbito do ilícito de mera
ordenação social, em matéria farmacêutica, integra a jurisdição administrativa.

Caso n.º1
(Hipótese prática n.º2 do livro “Casos Clínicos de Processo Administrativo”, páginas 46 e 47)

Caso n.º2
(Hipótese prática n.º16 do livro “Casos Clínicos de Processo Administrativo”, páginas 64 e 65)

a) F pretende propor uma ação administrativa de impugnação da decisão de encerramento praticada pela
Secretaria Regional da Saúde. Será titular de legitimidade activa para o efeito? A legitimidade processual é um
pressuposto processual cuja titularidade se afere por referência às alegações produzidas pelo autor. A
legitimidade processual analisa-se em activa e passiva, possuindo legitimidade activa quem alegue a
titularidade de uma situação cuja conexão com o objecto da ação proposta o apresente como que em
condições de nela figurar como autor1 - art. 9º/1 CPTA. Esta disposição base em matéria de legitimidade
tem, e dela assim resulta, que ser conjugada, consoante os casos, com o art. 9º/2 CPTA e com as disposições
constantes do Capítulo II do Título II do CPTA2; sendo particularmente relevante in casu o art. 55º/1, a)
CPTA, visto que a pretensão de F é impugnatória (impugnação do ato administrativo de encerramento da
farmácia). Da conjugação do art. 9º/1 CPTA com o art. 55º/1, a) CPTA resulta que F terá legitimidade
activa se for então titular de um interesse directo e pessoal, ou seja, um interesse atual, não hipotético (e não
eventual) e que se reporta à esfera jurídica do impugnante (autor/demandante)3. A reposta será então
positiva; não haverá ninguém com maior interesse do que F - proprietário - na impugnação do ato que
conduziu ao encerramento da farmácia.

b) A ação deve ser proposta contra a Região Autónoma da Madeira? A legitimidade processual é um
pressuposto processual cuja titularidade se afere por referência às alegações produzidas pelo autor; podendo
esta ser analisada em activa e passiva. Possui legitimidade passiva quem deva ser demandado na ação com o

1 Se, posteriormente, se chegar à conclusão de que a questão não se colocava nos termos em que o autor a apresentou haverá uma
absolvição do pedido, dado que o juízo em que se funda essa conclusão já é um juízo sobre o mérito da causa, sustentado no respectivo
julgamento.

2 arts. 55º + 68º + 73º + 77º-A CPTA.

3 A este propósito (à luz do art. 55º/1, a) CPTA) discute-se se o pressuposto do interesse processual, ou seja, o interesse em agir (a
necessidade que o demandante tem em obter uma protecção do sistema judicial público), não está consumido pelo pressuposto da
legitimidade activa. Isto porque o interesse directo pressupõe a necessidade de uma tutela judiciária.
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objecto configurado pelo autor, isto é, o autor deverá demandar em juízo quem alegadamente estiver
colocado, no âmbito dessa relação jurídica, em posição contraposta à sua. Sucede que este critério, constante
do art. 10º/1, 1º parte CPTA - que retoma o essencial das soluções consagradas no art. 30º CPC -, podendo
dizer-se que é o comum, acaba por ser de aplicabilidade residual, isto porque ele se circunscreve aos litígios
cuja estrutura se aproxima ao modelo do processo civil e que, estatisticamente, não são os mais
representativos no contencioso administrativo. A este critério restritivo da legitimidade, reportado à alegada
titularidade da relação material controvertida, tendem a sobrepor-se soluções de alargamento da legitimidade,
necessária nos múltiplos tipos de situações em que o litígio não pressupõe a pré-existência de uma relação
jurídica entre as partes. E é isto que o art. 10º/1, 2º parte CPTA tem em vista quando admite, em alternativa,
que as ações administrativas sejam propostas “[…] contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos
aos do autor.”4; prescindindo-se, desse modo, do critério da pré-existência de uma relação jurídica entre as
partes na ação. No presente caso não havia uma relação pré-existente entre F e a Secretaria Regional da
Saúde, pelo que será de se atender à 2º parte do art. 10º/1 CPTA, sendo incontestável que a Secretaria tem
um interesse contraposto ao do autor: esta pretende encerrar a farmácia por “estar em causa um “grave risco para
a saúde dos utentes”.” e o autor quer, claro está, manter o seu negócio aberto. Tecidas estas primeiras
considerações face à configuração dada pelo CPTA à legitimidade passiva, cabe agora perceber contra quem,
em concreto, deveria ser intentada a presente ação. A regra geral é a que consta do art. 10º/2 CPTA: nas
ações intentadas contra uma entidade pública deverá ser demandada a pessoa coletiva de direito público;
existindo, contudo, uma excepção a esta regra geral, constante do art. 10º/2, 2º parte CPTA: nas ações
dirigidas à pessoa colectiva Estado ou a uma das Regiões Autónomas, reportadas a ações ou omissões dos
respectivos ministérios ou secretarias regionais, deverá se demandado o ministério ou secretaria5 6. Tratando-
se, na presente hipótese, da prática de um ato administrativo por uma secretaria regional, a excepção aplica-
se, pelo que a entidade demandada não é a pessoa colectiva de Direito público Região Autónoma da Madeira
e sim a própria Secretaria Regional da Saúde.

c) Perante tal decisão de encerramento, um grupo de residentes na freguesia onde se encontra sita a farmácia
decidiu propor uma ação administrativa (autónoma), sustentando que tal decisório administrativo é altamente
lesivo dos interesses da população local. Terá legitimidade para o efeito? A par da disposição base em matéria
de legitimidade activa - art. 9º/1 CPTA -, há que atentar, em casos como este, ao art. 9º/2 CPTA (em
conjugação, claro está, com o art. 55º/1, f) CPTA). O art. 9º/2 CPTA contempla a chamada ação popular,
que é uma forma de alargamento da legitimidade activa em sede de contencioso administrativo, permitindo a
qualquer pessoa, “independentemente de ter interesse pessoal na demanda”, propor e intervir em processos “destinados
à defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos” (falamos, portanto, de interesse difusos)7. Para podermos
aplicar este preceito in casu, de modo a fundamentar a legitimidade activa deste grupo de residentes da
freguesia, temos de identificar na presente contenda um interesse difuso; esse interesse poderia ser a saúde
publica, ou seja, a própria circunstância destes residentes ficarem desprotegidos, por não terem uma farmácia
‘por perto’8. Em suma, este grupo teria legitimidade activa para propor esta ação administrativa impugnatória

4 Onde se incluem também os contrainteressados (art. 57º CPTA), que quando demandados constituem partes processuais passivas, em
litisconsórcio necessário com o demandado.

5 A razão de ser desta excepção prende-se com a complexidade organizatória da Administração Pública, sobretudo quando esteja em causa
a pessoa colectiva Estado.

6 Uma outra excepção a esta regra é o que determina o art. 10º/8 CPTA: no âmbito de litígios entre orgãos da mesma pessoa colectiva a
legitimidade passiva pertence ao orgão administrativo e não à pessoa colectiva ou ao ministério a que ambos os orgãos pertencem. Trata-
se de casos excepcionais em que o CPTA reconhece personalidade e capacidade judiciária a orgãos administrativos.

7 Os Profs. Vasco Pereira da Silva e Sérvulo Correia propõem uma interpretação correctiva do art. 9º/2 CPTA, e isto porque a expressão
“independentemente de ter interesse” não tem qualquer sentido à luz do art. 9º CPTA analisado no seu todo. Ora, se existisse um interesse
pessoal na demanda não faria sentido recorrer-se ao nº2, a legitimidade activa estaria justificada pelo nº1; e se assim não fosse o nº1 não
teria então qualquer utilidade prática. Assim, o critério de distinção entre o nº1 e o nº2 do art. 9º CPTA é a existência ou não de um
interesse pessoal, nos termos explicitados supra.

8Embora em sede de contestação tal seja facilmente impugnável, devido ao facto desta farmácia ser, segundo a Secretaria, um perigo para
os utentes.
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do ato administrativo de encerramento. Há apenas que fazer um último adendo a este respeito: discute-se se
os valores/bens elencados no art. 9º/2 CPTA, e na própria lei da ação popular (art. 1º/2 da Lei n.º83/95, de
31 de agosto) e no art. 52º/3 CRP, são taxativos ou exemplificativos, até porque são listagens não
coincidentes. O Mestre Tiago Serrão defende, como de resto parece consensual na doutrina, que se trata de
uma lista não fechada, não taxativa e portanto puramente exemplificativa; a letra dos preceitos mencionados
é um elemento que corrobora esta leitura, sendo utilizado o advérbio de modo “designadamente” ou a
conjunção “como”.

d) Perante as ações intentadas por F e pelo grupo de residentes, caberá ao Ministério Público a representação
em juízo do ente público demandado? O art. 11º/1 CPTA é claro ao afirmar que as entidades públicas
podem fazer-se representar por advogado, solicitador, licenciado em direito ou em solicitadoria e pelo
Ministério Público. Sucede que quanto a este último o preceito refere a “possibilidade de representação do Estado”,
pelo que a doutrina entende que esta possibilidade de representação é estrita da pessoa colectiva Estado e
não extensível a qualquer entidade pública; isto porque no início do preceito fala-se em entidades públicas e
nesta parte final há como que uma especificação (se assim não se considerasse, a referência ao Estado não
teria qualquer sentido). Assim, a representação do ente público demandado na presente hipótese nunca
poderia caber ao Ministério Público, visto estar em causa uma secretaria regional. Esta interpretação,
restritiva, da parte final do art. 11º/1 CPTA vem no seguimento de uma grande tensão existente em redor do
patrocínio judiciário dos entes públicos pelo Ministério Público. É a tensão envolvendo a questão de saber se
as várias posições, no quadro do contencioso administrativo, que o legislador atribui ao Ministério Público
são ou não compatíveis; isto porque, de facto, a principal posição do Ministério Público no contencioso
administrativo deve ser a de defensor da legalidade democrática, devendo fazê-lo como um ator público, pelo
que o legislador atribui legitimidade processual ativa ao Ministério Público, mas depois atribui-lhe também
funções de representação em juízo dos entes públicos, fazendo o Ministério ‘jogar dos dois lados’. Esta
multiplicidade de funções que o legislador atribui ao Ministério Público configura um quadro esquizofrénico:
diz que este deve intentar ações contra entidades públicas, mas simultaneamente diz que deve representá-las.
Em face disto, a leitura que se faz do art. 11º/1, parte final CPTA não é muito ampla, embora tal resulte da
sua literalidade; não só se restringe esta representação à pessoa colectiva Estado, como também se tem
entendido que a leitura do segmento final do preceito deve ser norteada pelo conceito de interesses
patrimoniais do Estado, cabendo então ao Ministério Público a representação do Estado nos domínios
contratuais e de responsabilidade extra-contratual9. Tradicionalmente em Portugal esta representação ocorria
justamente nesses 2 domínios do contencioso: “Sem prejuízo da representação do Estado pelo Ministério Público nos
processos que tenham por objecto relações contratuais e de responsabilidade, […].”, mas com a reforma de 2015 esta
consagração expressa fora retirada. A doutrina continua, não obstante a nova redação, também em
consonância com o que resulta do Estatuto do Ministério Público, a fazer então esta interpretação restritiva.

e) Em que tribunal, em concreto, devem ser intentadas, por F e pelo grupo de residentes, as respectivas
ações? Os pressupostos processuais podem ser reconduzidos a duas categorias: os referentes aos sujeitos do
processo e os relativos ao objecto do processo. Os pressupostos referentes aos sujeitos dizem respeito ao
tribunal e às partes; quanto ao tribunal o que devemos apreciar é a sua competência para julgar a causa que é
submetida ao seu juízo. Esta competência deverá ser analisada em quatro planos distintos: em razão da
jurisdição, da matéria, da hierarquia e do território. No que respeita à competência em razão da jurisdição, o
que se pretende saber é se o litígio deverá decorrer perante a jurisdição administrativa ou perante os tribunais
judiciais/comuns; como está em causa um ato da Administração Pública, mais concretamente da
Administração Pública Regional, o presente litígio é da competência da jurisdição administrativa, por força
do art. 4º/1, b) ETAF. Tendo em conta que a jurisdição administrativa é também ela fiscal, e, portanto, no
seu seio temos tribunais administrativos e tribunais tributários/fiscais, existem regras de distribuição da

9 Sem prejuízo do Estado, por exemplo numa ação de responsabilidade, ser citado no Centro de Competência Jurídicas do Estado
(conforme estabelece o art. 25º/4 CPTA) e decidir que a sua representação seja feita pelo Centro ou por um advogado, não havendo na
letra da lei nada que obste a essa decisão.
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competência em razão da matéria, assentes no critério de diferenciação entre as matérias de Direito


administrativo e as matérias de Direito fiscal. O que separa os tribunais administrativos (e as secções de
contencioso administrativo) e os tribunais tributários (e as secções de contencioso tributário)10 é então a
especialização em razão da matéria11. No nosso caso seriam competentes os tribunais administrativos12. Tal
afirmação não é suficiente na medida em que temos diversos tribunais administrativos, pelo que se analisam
de seguida a competência em razão da hierarquia e do território de modo a determinarmos qual será,
concretamente, o tribunal competente para dirimir este litígio. Ora, os tribunais administrativos estão
organizados em três ordens de tribunais, escalonados verticalmente (em forma de pirâmide): temos, de cima
para baixo, o Supremo Tribunal Administrativo13 (art. 24º ETAF), no topo; depois os tribunais de 2º
instância, que são os Tribunais Centrais Administrativos (art. 37º ETAF); e na base os tribunais de 1º
instância, que são os Tribunais Administrativos de Círculo (art. 44º ETAF). A aferição da competência em
razão da hierarquia deve partir exatamente do topo para a base, numa lógica “por exclusão de partes”14: o
nosso litígio não se enquadra nem nas situações em que o art. 24º ETAF determina que o STA funciona, ou
atua, como um tribunal de 1º instância, nem nas situações em que o art. 37º ETAF prevê que os Tribunais
Centrais funcionam como 1º instância15, pelo que serão competentes in casu os Tribunais de Círculo. A este
propósito cabe não esquecer que desde o passado dia 1 de setembro de 2020 a jurisdição administrativa
conta com juízos especializados. Tal já era uma possibilidade prevista na lei, nos arts. 9º/1 e 4 + 44º-A
ETAF, tendo a especialização sido consagrada na prática pelo DL n.º174/2019, de 13 de dezembro16. No
nosso caso a especialização não era relevante na medida em que tal não foi estabelecido nas Regiões
Autónomas. Resta-nos, por fim, averiguar da competência em razão do território; cuja regra geral
encontramo-la no art. 16º/1 CPTA: “[…] os processos são intentados no tribunal da área da residência habitual ou da
sede do autor.”. Precisamente por se tratar de uma regra geral temos de atender às regras especiais constantes
dos preceitos seguintes, sendo aplicável à presente hipótese a regra que consta do art. 20º/1 CPTA, que
remete para o tribunal da área da sede da entidade demandada. Como a Secretaria Regional da Saúde tem
sede no Funchal, será competente para dirimir este litígio - à luz do mapa anexo ao DL n.º325/2003, de 29
de dezembro17 - o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal.

f) Que valor deve ser atribuído às causas em apreço? A toda a causa deve ser atribuído um valor certo e
expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido (art. 31º/1 CPTA). O
valor da causa é relevante para percebermos se haverá ou não recurso da sentença proferida em primeira
instância (art. 31º/2 CPTA), mas tal tem também implicações importantes ao nível da fixação das custas

10Faz-se aqui referência aos Tribunais Administrativos e às secções de contencioso administrativo porque todos os tribunais
administrativos funcionam de modo agregado, daí que todos se denominem de “Tribunal Administrativo e Fiscal de…”; mas há uma
excepção a esta regra, que é o de Lisboa, que não funciona, portanto, de modo agregado. Em Lisboa há uma separação entre o Tribunal
Administrativo de Círculo de Lisboa e o Tribunal Tributário de Lisboa.

11Passa-se com os tribunais (e secções) administrativas e fiscais, no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, o mesmo que sucede com
os tribunais criminais, de trabalho, de comércio ou de família e menores no seio dos tribunais judiciais: há uma especialização em razão da
matéria (ex: o tribunal criminal não é competente para dirimir litígios de Direito do trabalho).

12 Tal pode ser verificado, por exemplo, através de uma leitura a contrario sensu do art. 49º ETAF.

13 Doravante ‘STA’.

14O próprio art. 44º/1 ETAF é claro ao afirmar que “Compete aos tribunais administrativos de círculo conhecer, em 1.ª instância, de todos os processos
[…] cuja competência, em primeiro grau de jurisdição, não esteja reservada aos tribunais superiores.”; esta é portanto uma disposição residual.

15 Estes têm uma esfera de atuação essencialmente circunscrita aos recursos, embora haja casos em que tal não é assim - alíneas c), d) e e)
-, mas que na prática são raros.

16http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?
artigo_id=3224A0012&nid=3224&tabela=leis&pagina=1&ficha=1&so_miolo=&nversao=
Ao olharmos para o diploma concluímos que há efectivamente uma aposta na especialização mas nem todos os tribunais administrativos
foram contemplados com ela; para já apostou-se apenas no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, no Tribunal Tributário de
Lisboa e nos Tribunais Administrativos e Fiscais de Almada, Aveiro, Braga, Leiria, Porto e Sintra.

17 http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1422&tabela=leis&so_miolo=
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judiciais. Para percebermos qual é efectivamente esse valor temos de atender aos critérios constantes dos
arts. 32º ss CPTA. O presente caso tem um valor indeterminável (art. 34º/1 CPTA), pelo que se aplicará o
critério supletivo constante do art. 34º/2 CPTA, já que está em causa um ato administrativo sem valor
pecuniário18. Sendo o valor da causa superior ao da alçada dos Tribunais Centrais Administrativos, temos de
identificar qual é o valor desta alçada. Nos termos do art. 6º/4 ETAF, o valor da alçada dos Tribunais
Centrais Administrativos é igual ao valor da alçada dos tribunais da Relação, que é, segundo o art. 44º/2
LOSJ, de 30.000€, pelo que o valor da causa em apreço é de 30.000,01€.

18Ainda que se pudesse, em tese, ponderar a aplicação do critério especial constante do art. 33º/d) CPTA - já que se F não pode abrir a
farmácia então há aqui uma ablação do seu direito de propriedade -, tal não seria aplicável in casu porque, ainda que materialmente fosse
aceitável, formalmente não seria uma aplicação rigorosa. Poder-se-ia pensar também ser possível fazer uma aproximação, em termos
médios, aos danos que F tem por cada dia que a farmácia está encerada, sendo o valor da causa o valor obtido com essa análise (e nessa
medida seria relevante o art. 32º/5 CPTA); mas tal não poderia ser o nosso raciocínio porque o pedido de F é impugnatório e não
indemnizatório/reparatório (pelos eventuais danos decorrentes do encerramento da farmácia).
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Caso n.º3
(Hipótese prática n.º22 do livro “Casos Clínicos de Processo Administrativo”, páginas 71 e 72)

a) Qual a forma de ação que deve ser adoptada? A lei estabelece os modelos de tramitação que devem seguir os
diferentes processos, desde a propositura da ação até ao momento em que o tribunal vem a proferir a
correspondente decisão. Ao modelo de tramitação do processo dá-se o nome de forma de processo; esta
designação corresponde ao conjunto ordenado de atos e formalidades que devem ser observados na
propositura e no desenvolvimento da ação em tribunal, sendo que para cada tipo de processo corresponde
uma sequência específica de atos e formalidades. Até à reforma do contencioso de 2015, o CPTA distinguia
um conjunto de quatro formas de processo que qualificava como urgentes e um conjunto de duas outras
formas que, por contraposição, designava de não-urgentes. O Código estruturava os processos declarativos
não urgentes segundo um modelo dualista, assente na contraposição entre as formas de ação administrativa
comum e ação administrativa especial. Após a reforma, e portanto nos dias de hoje, a estrutura dualista
anterior foi afastada, pelo que todos os processos que correspondiam às formas referidas passaram a ser
submetidos a uma única forma de processo: a chamada ação administrativa. Assim, o art. 35º CPTA é a base
da destrinça que deve operar atualmente, que é a destrinça entre a ação administrativa (Título II - arts. 37º ss
CPTA) - ou seja, a forma processual principal não urgente - e o processo urgente (Título III - arts. 97º ss
CPTA)19 - que corresponde a uma forma processual de tramitação acelerada. Ora, nós só conseguimos
concluir qual a forma que deve ser adoptada no presente caso, ou melhor, se se deve adoptar o meio
processual regra - que é a ação administrativa -, se a contrario sensu concluirmos que o presente litígio não se
enquadra na forma processual urgente; e portanto, também aqui, utilizamos uma lógica “por exclusão de
partes”. Como o presente litígio não se enquadra em nenhuma das alíneas do art. 36º/1 CPTA, então a
forma adoptada deverá ser a ação administrativa. Posto isto, cabe ainda identificar qual a concreta pretensão
de Marta; aqui seria uma pretensão respeitante a um ato administrativo, mais concretamente uma pretensão
de impugnação do ato de classificação (art. 50º/1 CPTA). Em suma, o que teríamos nesta hipótese era uma
ação administrativa impugnatória (de um ato administrativo) - arts. 37º/1, a) + 50º ss CPTA.

b) Com o pedido de declaração de nulidade da decisão administrativa final, Marta pode cumular um pedido de
condenação da Administração à prática de ato legalmente devido, a saber, um ato de atribuição da
classificação de excelente? Todo o processo declarativo tem um objecto, que são as questões jurídicas sobre as
quais o tribunal é chamado a pronunciar-se no âmbito desse processo através da emissão da correspondente
sentença. O objecto do processo é identificado, à partida, por referência à pretensão formulada pelo autor,
que se dirige, por um lado à providência a conceder pelo juiz (à sentença que o autor solicita ao tribunal),
através da qual vai ser actuada a tutela jurídica pretendida; e, por outro lado, à produção de um efeito
jurídico, o efeito que há-de resultar da sentença e que, consoante os casos, se pode traduzir no
reconhecimento, por parte do tribunal, da existência ou inexistência de uma situação, de um efeito ou de um
facto jurídico, individualizado em função dos respectivos factos ou elementos constitutivos: a chamada causa
de pedir. Nesse sentido, pode dizer-se que o objecto do processo se define por referência à pretensão
formulada pelo autor, identificado pelo pedido e pela causa de pedir que por ele foram deduzidos. Feita esta
aproximação ao pedido e à causa de pedir, na presente sub-hipótese estava em causa a questão de saber se a
cumulação descrita era ou não possível. Ora, assim como no processo civil, também no contencioso
administrativo é possível a cumulação de pedidos: o CPTA introduziu no processo administrativo o princípio

19 No Título III nós encontramos todos os processos principais mas urgentes - art. 30º/1, a), b), c), d) e e) + arts. 97º ss + arts. 104º ss +
109º ss CPTA; e portanto daqui concluímos que nos processos principais mas urgentes cabem não só as ações administrativas urgentes
(arts. 97º a 103º-B CPTA), como também as intimações (arts. 104º a 111º CPTA).
Em contraposição aos processos principais mas urgentes estão as providências cautelares (arts. 112º ss CPTA), que são os processos
urgentes mas não principais.
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da livre cumulatividade de Pedidos, que se encontra consagrado no art. 4º CPTA20. Segundo este princípio
diferentes tipos de pretensões podem ser deduzidas em conjunto, contra o demandado, no âmbito de um só
processo, desde que exista uma conexão entre os pedidos, resultante de a respectiva causa de pedir ser a
mesma e única, ou de os pedidos estarem entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência, ou do
facto de a procedência dos pedidos principais depender essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou
da interpretação e aplicação das mesmas normas. Analisando agora o nosso caso em concreto: Marta teve
uma avaliação medíocre, e o que a autora pretende é não só conseguir a eliminação do ato do ordenamento
jurídico, mas também a obtenção de uma avaliação excelente e de facto não só não há óbice ao enquadramento
da cumulação nos termos do art. 4º/1, a) CPTA, como da conjugação art. 4º/2, 1º parte da a) + c) CPTA
(ou seja, pedido impugnatório + pedido de condenação da Administração à prática do ato legalmente
devido) resulta expressamente essa possibilidade21. E aqui há, por fim, apenas que fazer uma ressalva: não há
óbice à formulação do pedido de condenação à prática do ato legalmente devido, mas o julgador não se pode
substituir à Administração Pública, por força do princípio da separação de poderes, pelo que o que se limita
a fazer é a condená-la à prática de um ato, e sendo um ato discricionário (como seja esta avaliação), cabe à
Administração o preenchimento do concreto conteúdo do ato22.

c) A ação “pode ser proposta”, por Marta, “a todo o tempo” nos termos do estabelecido no art. 41.º do CPTA? A
regra base a este propósito é o art. 41º/1 CPTA; dispondo que “[…] a ação administrativa pode ser proposta a todo
o tempo.”, sendo que exceptuados ficam as disposições da lei substantiva e os arts. 50º ss CPTA. No nosso
caso seria particularmente relevante o art. 58º/1 CPTA; e se relembrarmos os conhecimento de Direito
administrativo, teremos em mente que a nulidade é um desvalor que só existe, segundo o Código do
Procedimento Administrativo, nos casos em que a própria lei expressamente assim o determine, ao contrário
da anulabilidade que tem um âmbito residual, e no presente caso nós não possuímos dados suficientes para
concluir ser o ato nulo ou anulável, pelo que a resposta possível a esta sub-hipótese é a de que se o ato for
nulo não há prazo para a impugnação e se o ato for anulável Marta tem apenas 3 meses para o impugnar
(art. 58º/1, b) CPTA)23.

d) A ação em apreço tem de ser instaurada contra que sujeito jurídico? A regularidade da constituição da
instância depende da observância de um conjunto de requisitos de admissibilidade de julgamento do mérito
da causa, isto é, do preenchimento dos pressupostos processuais. Estes podem ser reconduzidos a duas
categorias: os referentes aos sujeitos do processo e os relativos ao objecto do processo. Os pressupostos
referentes aos sujeitos dizem respeito ao tribunal e às partes; quanto às partes o que temos de de avaliar é a
sua personalidade e capacidade judiciária, o patrocínio judiciário e a legitimidade processual. Na presente
sub-hipótese estava em causa a legitimidade processual. Ora, a legitimidade processual é um pressuposto
processual cuja titularidade se afere por referência às alegações produzidas pelo autor; podendo esta ser
analisada em activa e passiva. Possui legitimidade passiva quem deva ser demandado na ação com o objecto
configurado pelo autor, isto é, o autor deverá demandar em juízo quem alegadamente estiver colocado, no
âmbito dessa relação jurídica, em posição contraposta à sua. Sucede que este critério, constante do art. 10º/1,
1º parte CPTA - que retoma o essencial das soluções consagradas no art. 30º CPC -, podendo dizer-se que é

20O CPTA, desde 2002, se mostra um Código “amigo da cumulação”, já que de facto há toda a conveniência e vantagem numa
concentração dos diversos pedidos numa mesma ação, desde que entre eles haja uma conexão. Esta ideia de abertura à cumulação é
bastante clara se atentarmos ao advérbio utilizado no art. 4º/2 CPTA: “designadamente”; pelo que não se trata de um elenco taxativo e existe
uma preocupação em se poder abarcar outras situações enquadráveis numa das alíneas do nº1 que legalmente fundamentem a cumulação.
A conveniência a que me referi expressa-se, fortemente, ao nível da tutela jurisdicional efectiva e ainda ao nível da economia processual.

21É relevante deixar nota que se discute se quando temos uma pretensão condenatória, se essa pretensão não abarca já ela a eliminação do
ato jurídico prévio colidente; ou seja, não bastará ao autor peticionar a prática do ato devido, já que essa condenação implica, em princípio,
a destruição dos efeitos jurídicos do tal ato colidente?

22 Tal já não é assim quando se trate de atos de conteúdo vinculado.

23Sem prejuízo de atentarmos ao art. 58º/3 CPTA, já que como o prazo de 3 meses é curto o Código prevê um conjunto de situações em
que a lei permite que a impugnação ocorra para lá dos 3 meses.
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o comum, acaba por ser de aplicabilidade residual, isto porque ele se circunscreve aos litígios cuja estrutura
se aproxima ao modelo do processo civil e que, estatisticamente, não são os mais representativos no
contencioso administrativo. A este critério restritivo da legitimidade, reportado à alegada titularidade da
relação material controvertida, tendem a sobrepor-se soluções de alargamento da legitimidade, necessária nos
múltiplos tipos de situações em que o litígio não pressupõe a pré-existência de uma relação jurídica entre as
partes. E é isto que o art. 10º/1, 2º parte CPTA tem em vista quando admite, em alternativa, que as ações
administrativas sejam propostas “[…] contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor.”24;
prescindindo-se, desse modo, do critério da pré-existência de uma relação jurídica entre as partes na ação. No
presente caso esta destrinça entre a 1º e a 2º parte do art. 10º/1 CPTA não era particularmente relevante na
medida em que existe uma relação jurídica, prévia ao litígio, entre Marta - que é conservadora do registo
predial - e o Instituto dos Registos e Notariado, I.P.. Tecidas estas primeiras considerações face à
configuração dada pelo CPTA à legitimidade passiva, cabe agora perceber contra quem, em concreto, deveria
ser intentada a presente ação. A regra geral é a que consta do art. 10º/2 CPTA: nas ações intentadas contra
uma entidade pública deverá ser demandada a pessoa coletiva de direito público. Estando aqui em causa uma
entidade pública - o IRN, I.P., que é uma pessoa colectiva de direito público que integra a administração
indirecta do Estado Português -, a ação deveria ser proposta contra o próprio IRN, I.P.. Cabe não esquecer
que existe uma excepção a esta regra geral, constante do art. 10º/2, 2º parte CPTA, mas esta não seria
aplicável in casu, já que a ação não era dirigida nem à pessoa colectiva Estado, nem a nenhuma das Regiões
Autónomas25. Por fim é importante dizer que caso Marta indicasse, na petição inicial, um orgão do IRN, I.P.
ao invés da própria pessoa colectiva, conforme tinha de fazer, os arts. 10º/4 + 78º/3 CPTA não entendem
haver nestes casos uma ilegitimidade passiva, consideram antes a pessoa colectiva citada através do orgão
indicado; é portanto um erro desculpável.

e) Imagine que, no decorrer da ação, o Conselho Directivo do Instituto dos Registos e Notariado, I.P. anula
administrativamente o ato administrativo em crise e pratica um novo ato que, no caso de Marta, passa a
classificar a sua prestação de mediana. A ação em curso pode continuar, tendo por objecto o novo ato? A
presente sub-hipótese reporta-se à possibilidade ou não de uma modificação objectiva da instância. Ora, o
Código é claramente tributário de um princípio de flexibilização do objecto do processo, prevendo soluções
nesse sentido. Estando em causa uma anulação administrativa do ato impugnado, acompanhada pela emissão
de um outro, há que atentar ao que dispõe o art. 64º CPTA. Embora o art. 64º/1 CPTA conceda ao autor a
possibilidade26 deste requerer que a ação prossiga contra o novo ato, e portanto embora tenha como ratio
uma flexibilização do objecto da instância, parte da sua letra vai em sentido inverso; se por um lado o
legislador quer ampliar, por outro parece querer restringir: a ação pode prosseguir, mas apenas se o novo ato
reincidir nas mesmas ilegalidades (tem de ser como que uma réplica do anterior). Assim, se não fizermos
uma interpretação restritiva deste preceito, ele valerá pouco, visto que é difícil, na prática, verificar-se uma
reincidência integral. O Prof. Mário Aroso de Almeida e o Juiz Conselheiro do STA Carlos Cadilha criticam
esta redação do art. 64º/1 CPTA - resultante da reforma de 2015 -, no CPTA comentado, posicionando-se a
favor da interpretação restritiva, de modo a conceder a esta disposição um efeito efectivamente útil; assim
também tem entendido a jurisprudência. Em abono a esta solução está a disposição espelho na ação
administrativa de condenação à prática do ato - art. 70º CPTA -, que dispõe que o autor pode “alegar novos
fundamentos”, pelo que não se compreende a solução adoptada no art. 64º/1 CPTA. No nosso caso, Marta
poderia então requerer que a ação prosseguisse contra o novo ato, até porque a sua insatisfação com a
classificação obtida, à partida, manter-se-á em face de um mediana, justamente com os mesmos fundamentos

24 Onde se incluem também os contrainteressados (art. 57º CPTA), que quando demandados constituem partes processuais passivas, em
litisconsórcio necessário com o demandado.

25 Uma outra excepção a esta regra é o que determina o art. 10º/8 CPTA: no âmbito de litígios entre orgãos da mesma pessoa colectiva a
legitimidade passiva pertence ao orgão administrativo e não à pessoa colectiva ou ao ministério a que ambos os orgãos pertencem. Trata-
se de casos excepcionais em que o CPTA reconhece personalidade e capacidade judiciária a orgãos administrativos.

26 Não é obrigatório que assim seja, é um benefício do impugnante, uma faculdade.


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que a fizeram reagir em primeiro lugar27. Partindo então do princípio que Marta poderia requerer tal
modificação, resta-nos saber em que prazo tal deveria ocorrer. Diz-nos o art. 64º/2 CPTA que o
requerimento tem de ser apresentado no prazo de impugnação do ato anulatório, prazo esse que poderá ser
de 3 meses - se o ato for anulável - ou não estar sujeito a qualquer prazo - se o ato for nulo -, conforme
explicitado supra. Sucede que se fora praticado um ato anulatório, a ação administrativa impugnatória
instaurada por Marta perde o seu objecto, o que origina uma inutilidade superveniente da lide, pelo que para
evitar que o juiz julgue a instância extinta o impugnante tem não só de respeitar o prazo de impugnatório (já
que há um novo ato), mas também terá de apresentar o requerimento antes daquela decisão judicial. Temos
então, neste âmbito, um prazo cumulativo.

f) Considere que o ato anulatório e o novo ato, que classifica a prestação de Marta de mediana, foram
praticados um dia antes da propositura da ação contra o ato base. Todavia, no dia da propositura da ação,
Marta ainda não tinha conhecimento desse facto. Pode a ação prosseguir contra o novo ato? A ação poderá
prosseguir contra o novo ato nos termos do art. 64º/3, parte final CPTA. O que está subjacente a esta
solução é: o ato anulatório, no momento em que foi proposta a ação, não era oponível ao autor, pois ele não
tinha o conhecimento do mesmo, e por essa razão é possível, se ele assim entender, que o processo prossiga
contra esse novo ato (de que ele teve conhecimento posteriormente).

27 Uma análise mais precisa a este respeito dependeria de dados adicionais da situação concreta.
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Caso n.º4
(Hipótese prática n.º24 do livro “Casos Clínicos de Processo Administrativo”, páginas 73 e 74)

a) Que tipo de ação deve Y propor? A lei estabelece os modelos de tramitação que devem seguir os diferentes
processos, desde a propositura da ação até ao momento em que o tribunal vem a proferir a correspondente
decisão. Ao modelo de tramitação do processo dá-se o nome de forma de processo; esta designação
corresponde ao conjunto ordenado de atos e formalidades que devem ser observados na propositura e no
desenvolvimento da ação em tribunal, sendo que para cada tipo de processo corresponde uma sequência
específica de atos e formalidades. Até à reforma do contencioso de 2015, o CPTA distinguia um conjunto de
quatro formas de processo que qualificava como urgentes e um conjunto de duas outras formas que, por
contraposição, designava de não-urgentes. O Código estruturava os processos declarativos não urgentes
segundo um modelo dualista, assente na contraposição entre as formas de ação administrativa comum e ação
administrativa especial. Após a reforma, e portanto nos dias de hoje, a estrutura dualista anterior foi afastada,
pelo que todos os processos que correspondiam às formas referidas passaram a ser submetidos a uma única
forma de processo: a chamada ação administrativa. Assim, o art. 35º CPTA é a base da destrinça que deve
operar atualmente, que é a destrinça entre a ação administrativa (Título II - arts. 37º ss CPTA) - ou seja, a
forma processual principal não urgente - e o processo urgente (Título III - arts. 97º ss CPTA)28 - que
corresponde a uma forma processual de tramitação acelerada. Ora, nós só conseguimos concluir qual a
forma que deve ser adoptada no presente caso, ou melhor, se se deve adoptar o meio processual regra - que
é a ação administrativa -, se a contrario sensu concluirmos que o presente litígio não se enquadra na forma
processual urgente; e portanto, também aqui, utilizamos uma lógica “por exclusão de partes”. Como o
presente litígio não se enquadra em nenhuma das alíneas do art. 36º/1 CPTA, então a forma adoptada
deverá ser a ação administrativa. Posto isto, cabe ainda identificar qual a concreta pretensão de Y; aqui seria
uma pretensão respeitante a um ato administrativo, mais concretamente uma pretensão de condenação à
prática desse ato (art. 66º/1 CPTA), visto que o enunciado refere a existência de um prazo de 90 dias para a
emissão de uma decisão sobre o pedido de um Golden Visa por parte de Y. A omissão do Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras abre a porta para este meio processual, nos termos do art. 67º/1, a) CPTA. Em
suma, o que teríamos nesta hipótese era uma ação administrativa de condenação (à prática do ato
administrativo devido) - arts. 37º/1, b) + 66º ss CPTA.

b) Encontra-se verificado um dos pressupostos fundamentais, legalmente previstos, para a dedução de pedidos
de condenação à prática de ato devido? Se sim, qual? O pressuposto fundamental para a dedução de um
pedido de condenação à prática do ato devido é a existência de uma omissão por parte da Administração
Pública, o que se verifica in casu. A este propósito há que evidenciar uma distinção que deve operar neste
âmbito, que é a distinção existente entre o art. 67º/1 CPTA e o art. 67º/4 CPTA; há então que distinguir os
casos em que foi apresentado um requerimento que constitua a Administração Pública no dever de decidir
(constituindo essa decisão um ato administrativo) - à luz do art. 13º/1 CPA -, dos casos em que não foi
apresentado qualquer requerimento, mas em que a Administração está, ainda assim, obrigada a emitir um
ato29.

c) Z, amigo de longa data de Y, terá legitimidade processual para instaurar a competente ação judicial? A
legitimidade processual é um pressuposto processual cuja titularidade se afere por referência às alegações
produzidas pelo autor. A legitimidade processual analisa-se em activa e passiva, possuindo legitimidade activa
quem alegue a titularidade de uma situação cuja conexão com o objecto da ação proposta o apresente como

28 No Título III nós encontramos todos os processos principais mas urgentes - art. 30º/1, a), b), c), d) e e) + arts. 97º ss + arts. 104º ss +
109º ss CPTA; e portanto daqui concluímos que nos processos principais mas urgentes cabem não só as ações administrativas urgentes
(arts. 97º a 103º-B CPTA), como também as intimações (arts. 104º a 111º CPTA).
Em contraposição aos processos principais mas urgentes estão as providências cautelares (arts. 112º ss CPTA), que são os processos
urgentes mas não principais.

29 O art. 67º/4, a) CPTA está pensando para os atos administrativos vinculados.


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que em condições de nela figurar como autor30 - art. 9º/1 CPTA. Esta disposição base em matéria de
legitimidade tem, e dela assim resulta, que ser conjugada, consoante os casos, com o art. 9º/2 CPTA e com
as disposições constantes do Capítulo II do Título II do CPTA31. Ora, em primeiro lugar será relevante o art.
68º/1, a) CPTA, visto que a pretensão de Y é condenatória (à prática do ato administrativo devido). Da
conjugação do art. 9º/1 CPTA com o art. 68º/1, a) CPTA resulta que Z terá legitimidade activa se for titular
de um direito à emissão do ato ou titular de um interesse legalmente protegido nessa emissão, o que não
parece ser o caso, visto ser este apenas amigo de longa data do titular do direito, pelo que não há aqui uma
posição jurídica relevante. Em segundo lugar cabe perceber se a Z não poderia ser reconhecida legitimidade
processual activa à luz dos arts. 9º/2 + 68º/1, b) CPTA. O art. 9º/2 CPTA contempla a chamada ação
popular, que é uma forma de alargamento da legitimidade activa em sede de contencioso administrativo,
permitindo a qualquer pessoa, “independentemente de ter interesse pessoal na demanda”, propor e intervir em
processos “destinados à defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos” (falamos, portanto, de interesse
difusos)32. Para podermos aplicar este preceito in casu, de modo a fundamentar a legitimidade activa de Z,
temos de identificar na presente contenda um interesse difuso, que não há, portanto embora não sendo
relevante o facto de Z não ter um interesse pessoal na demanda - que efectivamente não tem -, também não
há aqui um interesse difuso que colmate a inexistência do interesse pessoal. Não há um interesse difuso
porque este é, por definição, um interesse supra-individual, que transcende a pessoa de Y, e a concessão de
um Golden Visa apenas interessa a este último. Em suma, a reposta à questão é negativa.

d) Em que prazo deve ser proposta tal ação? Tratando-se de uma situação de inércia da Administração, a
presente ação deveria ser proposta no prazo de 1 ano, contados desde o termo do prazo legal, portanto
passados os 90 dias referidos no enunciado, nos termos do art. 69º/1 CPTA33.

e) Imagine que, no decurso do processo, é praticada, pelo Director Regional de Lisboa e Vale do Tejo do
Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, decisão de indeferimento do pedido de Y. Poderá tal ato ser apreciado
no contexto da ação pendente? Em caso de reposta positiva, em que prazo deve ser solicitada tal apreciação
jurisdicional? A presente sub-hipótese reporta-se à possibilidade ou não de uma modificação objectiva da
instância. Ora, o Código é claramente tributário de um princípio de flexibilização do objecto do processo,
prevendo soluções nesse sentido. Estando em causa uma ação de condenação à prática do ato devido, há que
atentar ao que dispõe o art. 70º CPTA. Ora, tendo Director Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras indeferido o pedido formulado por Y (já não há, assim, uma situação de inércia e
passamos a ter um ato), o art. 70º/1 CPTA confere ao autor a faculdade de requerer a apreciação do ato de
indeferimento na ação pendente, podendo este, então, alegar novos fundamentos e oferecer diferentes meios
de prova. Y deverá apresentar o articulado próprio no prazo de 30 dias, contados desde a data da notificação
do ato, e, quando não tenha havido notificação, contados a partir da data do conhecimento do ato de
indeferimento (art. 70º/4 CPTA). A este propósito discute-se a razão de ser deste prazo, visto que passamos
de uma inércia para a existência de um ato, pelo que faria sentido aplicar-se os prazos constantes do art. 58º
CPTA - conforme faz o art. 69º/2 CPTA -, já que existe uma discrepância considerável entre este (curto)
prazo de 30 dias e os 3 meses estabelecidos pelo art. 58º/1, b) CPTA.

30 Se, posteriormente, se chegar à conclusão de que a questão não se colocava nos termos em que o autor a apresentou haverá uma
absolvição do pedido, dado que o juízo em que se funda essa conclusão já é um juízo sobre o mérito da causa, sustentado no respectivo
julgamento.

31 arts. 55º + 68º + 73º + 77º-A CPTA.

32 Os Profs. Vasco Pereira da Silva e Sérvulo Correia propõem uma interpretação correctiva do art. 9º/2 CPTA, e isto porque a expressão
“independentemente de ter interesse” não tem qualquer sentido à luz do art. 9º CPTA analisado no seu todo. Ora, se existisse um interesse
pessoal na demanda não faria sentido recorrer-se ao nº2, a legitimidade activa estaria justificada pelo nº1; e se assim não fosse o nº1 não
teria então qualquer utilidade prática. Assim, o critério de distinção entre o nº1 e o nº2 do art. 9º CPTA é a existência ou não de um
interesse pessoal, nos termos explicitados supra.

33 Os 90 dias que a Administração tinha para decidir contam-se em dias úteis, visto tratar-se de um prazo inferior a 6 meses (art. 87º/d) a
contrario sensu CPA); já o prazo de um ano é corrido (art. 87º/d) CPA).
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f) Deterá o tribunal poderes de pronúncia ilimitados para precisar o pedido de Y? A resposta a esta questão
conduz-nos até ao art. 71º CPTA. Diante deste preceito duas ideias se impõem firmar: a primeira é a de que
há uma regra comum a todo o contencioso administrativo que é a do respeito pelo princípio da separação de
poderes - princípio esse que está subjacente ao art. 71º CPTA -, na medida em que há que estabelecer
barreiras muito claras entre aquilo que cabe ao poder judicial e aquilo que é da competência da
Administração Pública, muito devido aos traumas do contencioso administrativo. Os verdadeiros tribunais
administrativos, por força desse princípio, não podem administrar, ou seja, devem limitar-se a julgar as ações
e omissões da Administração Pública, e não substituir-se a esta por completo; sucede que essa tarefa é
particularmente difícil quando falamos em ações administrativas de condenação à prática do ato devido. Ora,
a este propósito há que distinguir as atuações da Administração que são discricionários - que são, de resto,
quase todas - e aquelas que são vinculados (estas existem sobretudo em sede de Administração Tributária);
sendo a discricionariedade administrativa a reinar, o Código é claro ao afirmar que existem limitações
impostas ao poder judicial por força do princípio da separação de poderes nestes casos, não podendo o
tribunal determinar o conteúdo do ato (arts. 3º/1 + 71º/2 CPTA). Assim sendo, a resposta à questão
depende do regime aplicável à concessão destes Golden Visa: se do regime resultar que não há
discricionariedade, isto é, que basta ao interessado juntar determinados documentos para obter o visto, e
tendo Y juntado tais documentos, não teremos qualquer problema se o tribunal se substituir à Administração
Pública - condenando-a à prática do ato de concessão do visto ou, tendo esta indeferido o pedido,
concedendo ele próprio o visto; agora se do regime resultar que, não obstante o interessado fazer a junção
dos documentos necessários, cabe à Administração uma avaliação da relevância do investimento concreto
para efeitos da atribuição do Golden Visa, o tribunal neste caso não se pode substituir à Administração, deve
limitar-se, no fundo, a explicitar quais as barreiras que a Administração Pública deve observar no momento
da prática do ato de decisão (não pode ser proferida uma pronúncia substitutiva do ato administrativo). Em
suma, saber se o tribunal possui ou não poderes ilimitados de pronúncia depende de uma análise do regime
dos Golden Visa, conforme explicitado supra. Para terminar, deixo apenas uma nota quanto à segunda ideia
que é passível de ser extraída do art. 71º CPTA, a que me referi no início desta reposta: o art. 71º/1 CPTA
visa tornar claro que as pronúncias judicias neste tipo de ações são pronúncias efectivamente condenatórias,
não se limitam a reforçar a necessidade de uma atuação por parte da Administração Pública.

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Caso n.º5
(Hipótese prática n.º28 do livro “Casos Clínicos de Processo Administrativo”, páginas 77 e 78)

a) Os regulamentos administrativos são impugnáveis na jurisdição administrativa? Um regulamento


administrativo é um conjunto de normas jurídicas emanadas no exercício do poder administrativo, por um
orgão de uma pessoa colectiva que integra a Administração Pública, ou por uma entidade pública que não
integre a Administração, ou ainda por uma entidade privada que para tal esteja habilitada por lei (art. 136º/1
CPA)34. Os regulamentos são, portanto, regras de conduta, dotadas de generalidade - aplicam-se a uma
pluralidade de destinatários definidos através de conceitos/categorias universais - e de abstracção - o
comando regulamentar aplica-se a uma ou mais situações definidas pelos elementos típicos constantes da
previsão normativa35. A nossa Constituição não fornece qualquer critério de definição da fronteira material
entre o domínio legislativo e o regulamentar, pelo que apenas por aspectos orgânico-formais é que é possível
estabelecer a destrinça entre lei e regulamento: será uma lei todo o ato normativo que provenha de um orgão
com competência legislativa e que assuma a forma de lei36 e é um regulamento o ato normativo que
provenha de um orgão com competência regulamentar e que revista a forma de regulamento37 38. Feita esta
introdução o que é importante reter, no âmbito do contencioso administrativo, é que tratando-se de normas
cuja emissão se processa no exercício de poderes conferidos pelo Direito administrativo - e sendo as regras
sobre a sua produção regras de Direito administrativo - incumbe à jurisdição administrativa fiscalizar a
observância dessas regras, nos termos do art. 4º/1, b) e d) ETAF.

b) Qual a forma da ação que deve ser adoptada? A lei estabelece os modelos de tramitação que devem seguir os
diferente processos, desde a propositura da ação até ao momento em que o tribunal vem a proferir a
correspondente decisão. Ao modelo de tramitação do processo dá-se o nome de forma de processo; esta
designação corresponde ao conjunto ordenado de atos e formalidades que devem ser observados na
propositura e no desenvolvimento da ação em tribunal, sendo que para cada tipo de processo corresponde
uma sequência específica de atos e formalidades. Até à reforma do contencioso de 2015, o CPTA distinguia
um conjunto de quatro formas de processo que qualificava como urgentes e um conjunto de duas outras
formas que, por contraposição, designava de não-urgentes. O Código estruturava os processos declarativos
não urgentes segundo um modelo dualista, assente na contraposição entre as formas de ação administrativa
comum e ação administrativa especial. Após a reforma, e portanto nos dias de hoje, a estrutura dualista
anterior foi afastada, pelo que todos os processos que correspondiam às formas referidas passaram a ser
submetidos a uma única forma de processo: a chamada ação administrativa. Ora, atualmente é o art. 35º
CPTA o preceito base para procedermos à destrinça que deve operar neste âmbito, que é a distinção entre a
ação administrativa (Título II - arts. 37º ss CPTA) - ou seja, a forma processual principal não urgente - e o

34Do ponto de vista funcional um regulamento é sempre um ato normativo emanado no exercício do poder administrativo, e isto tem
particular relevância quando falamos de orgãos da Administração que são também orgãos políticos e legislativos, como seja o Governo -
que tem amplas competências normativas de carácter legislativo (art. 198º/1, a) CRP) e regulamentar (art. 199º/c) CRP) -, só relevando
enquanto regulamento as normas jurídicas emanadas no desempenho das atribuições administrativas.

35 Recorde-se que a generalidade e a abstracção são os elementos definidores de uma norma jurídica.

36 Estando os atos legislativos excluídos da jurisdição administrativa por força do art. 4º/3, a) ETAF.

37 A distinção entre ambos tem utilidade em três níveis, segundo o Prof. Freitas do Amaral: ao nível do fundamento jurídico - a lei tem por
base a CRP e o regulamento só será válido se tiver uma lei que atribua competência para a sua emissão [art. 112º/7 CRP]) -, ao nível da
ilegalidade - uma lei contrária a outra lei revoga-a, ou coexistem na ordem jurídica com diversos domínios de aplicação, já o regulamento
contrário a uma lei é ilegal - e, por fim, ao nível da impugnação - uma lei só poderá ser impugnada com fundamento em
inconstitucionalidade perante o Tribunal Constitucional e um regulamento pode ser impugnado administrativa e contenciosamente com
fundamento em ilegalidade.

38A distinção entre regulamento e ato administrativo já é bastante mais clara: o regulamento, enquanto norma jurídica, é uma regra geral e
abstrata e o ato é uma decisão individual e concreta.
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processo urgente (Título III - arts. 97º ss CPTA)39 - que corresponde a uma forma processual de tramitação
acelerada; sendo que nós só conseguimos concluir qual a forma que deve ser adoptada no presente caso, ou
melhor, se se deve adoptar o meio processual regra - que é a ação administrativa -, se a contrario sensu
concluirmos que o presente litígio não se enquadra na forma processual urgente. Como o presente litígio não
se enquadra em nenhuma das alíneas do art. 36º/1 CPTA, a forma adoptada deverá ser a ação administrativa.
Posto isto, cabe ainda identificar qual a concreta pretensão de J; aqui seria uma pretensão respeitante a
normas jurídicas, mais concretamente uma pretensão de impugnação da norma jurídica que inibe a prestação
de serviços dos táxis-carrinha de 9 lugares no Aeroporto do Funchal. O que teríamos então nesta hipótese
era uma ação administrativa impugnatória (de uma norma jurídica constante de um regulamento
administrativo) - arts. 37º/1, d) + 72º ss CPTA. Sucede que não podemos deixar de atentar ao facto de que J
é um taxista de profissão (e proprietário de um táxi-carrinha de 9 lugares), pelo que este está inibido de
exercer a sua actividade profissional, ou seja, foi-lhe vedado o exercício do seu direito de iniciativa privada
(art. 61º/1 CRP), o que causa, inevitavelmente, consideráveis constrangimentos económicos, pelo que poder-
se-ia considerar aqui a possibilidade de J requerer a adoção de uma providência cautelar40. Há um meio
cautelar que responde a esta situação, que é uma providência cautelar conservatória41, através da qual é
emitido um pedido de paralisação, de manutenção do statu quo ante, pelo que o pedido deverá ser de
suspensão da eficácia destas normas; tal resultado é obtido, isto é, a suspensão dos efeitos dá-se a partir do
momento em que a AP é citada (art. 128º/1 CPTA ex vi art. 130º/4 CPTA).

c) Em que tribunal deve ser intentada a ação? Que valor deve ser atribuído à causa? Os pressupostos
processuais podem ser reconduzidos a duas categorias: os referentes aos sujeitos do processo e os relativos
ao objecto do processo. Os pressupostos referentes aos sujeitos dizem respeito ao tribunal e às partes;
quanto ao tribunal Para concluirmos em qual Tribunal deverá ser intentada a ação temos de analisar os
pressupostos processuais referentes ao tribunal, e o que devemos apreciar é a sua competência para julgar a
causa que é submetida ao seu juízo. Esta competência deverá ser analisada em quatro planos distintos: em
razão da jurisdição, da matéria, da hierarquia e do território. No que respeita à competência em razão da
jurisdição, o que se pretende saber é se o litígio deverá decorrer perante a jurisdição administrativa ou
perante os tribunais judiciais/comuns; como está em causa um regulamento da Administração Pública
Regional, o presente litígio é da competência da jurisdição administrativa por força do art. 4º/1, b) ETAF.
Tendo em conta que a jurisdição administrativa é também ela fiscal, e, portanto, no seu seio temos tribunais
administrativos e tribunais tributários/fiscais, existem regras de distribuição da competência em razão da
matéria, assentes no critério de diferenciação entre as matérias de Direito administrativo e as matérias de
Direito fiscal. O que separa os tribunais administrativos (e as secções de contencioso administrativo) e os
tribunais tributários (e as secções de contencioso tributário)42 é então a especialização em razão da matéria43.

39 No Título III nós encontramos todos os processos principais mas urgentes - art. 30º/1, a), b), c), d) e e) + arts. 97º ss + arts. 104º ss +
109º ss CPTA; e portanto daqui concluímos que nos processos principais mais urgentes cabem não só as ações administrativas urgentes
(arts. 97º a 103º-B CPTA), como também as intimações (arts. 104º a 111º CPTA).
Em contraposição aos processos principais mas urgentes estão as providências cautelares (arts. 112º ss CPTA), que são os processos
urgentes mas não principais.

40No caso a tutela cautelar resolve a questão, e há uma ‘palavra mágica’ no caso que permite rejeitar o meio processual principal urgente
intimação (arts. 109º ss CPTA): J pretende impugnar as normas jurídicas e a intimação não tem um objecto impugnatório, a AP é antes
condenada a uma conduta que “se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia”; aliado a isto, o
próprio art. 109º/1, parte final CPTA deixa claro que este meio processual principal e urgente deve ser utilizado apenas em casos
excepcionais, quando a tutela cautelar não dê resposta.

41 Por oposição às antecipatórias.

42Faz-se aqui referência aos Tribunais Administrativos e às secções de contencioso administrativo porque todos os tribunais
administrativos funcionam de modo agregado, daí que todos se denominem de “Tribunal Administrativo e Fiscal de…”; mas há uma
excepção a esta regra, que é o de Lisboa, que não funciona, portanto, de modo agregado. Em Lisboa há uma separação entre o Tribunal
Administrativo de Círculo de Lisboa e o Tribunal Tributário de Lisboa.

43Passa-se com os tribunais (e secções) administrativas e fiscais, no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, o mesmo que sucede com
os tribunais criminais, de trabalho, de comércio ou de família e menores no seio dos tribunais judiciais: há uma especialização em razão da
matéria (ex: o tribunal criminal não é competente para dirimir litígios de Direito do trabalho).
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No nosso caso seriam competentes os tribunais administrativos44. Tal afirmação não é suficiente na medida
em que temos diversos tribunais administrativos, pelo que se analisam de seguida a competência em razão da
hierarquia e do território de modo a determinarmos qual será, concretamente, o tribunal competente para
dirimir este litígio. Ora, os tribunais administrativos estão organizados em três ordens de tribunais,
escalonados verticalmente (em forma de pirâmide): temos, de cima para baixo, o STA (art. 24º ETAF) no
topo; depois os tribunais de 2º instância, que são os Tribunais Centrais Administrativos (art. 37º ETAF); e na
base os tribunais de 1º instância, que são os Tribunais Administrativos de Círculo (art. 44º ETAF). A aferição
da competência em razão da hierarquia deve partir exatamente do topo para a base, numa lógica “por
exclusão de partes”45: o nosso litígio não se enquadra nem nas situações em que o art. 24º ETAF determina
que o STA funciona, ou atua, como um tribunal de 1º instância, nem nas situações em que o art. 37º ETAF
prevê que os Tribunais Centrais funcionam como 1º instância46, pelo que serão competentes in casu os
Tribunais de Círculo. A este propósito cabe não esquecer que desde o passado dia 1 de setembro de 2020 a
jurisdição administrativa conta com juízos especializados. Tal já era uma possibilidade prevista na lei, nos
arts. 9º/1 e 4 + 44º-A ETAF, tendo a especialização sido consagrada na prática pelo DL n.º174/2019, de 13
de dezembro47. No nosso caso a especialização não era relevante na medida em que tal não foi estabelecido
nas Regiões Autónomas. Resta-nos, por fim, averiguar da competência em razão do território; cuja regra
geral encontramo-la no art. 16º/1 CPTA: “[…] os processos são intentados no tribunal da área da residência habitual
ou da sede do autor.”. Precisamente por se tratar de uma regra geral temos de atender às regras especiais
constantes dos preceitos seguintes, sendo aplicável à presente hipótese a regra que consta do art. 20º/1
CPTA, que remete para o tribunal da área da sede da entidade demandada. Como a Secretaria Regional dos
Transportes da Região Autónoma da Madeira tem sede no Funchal, será competente para dirimir este litígio -
à luz do mapa anexo ao DL n.º325/2003, de 29 de dezembro48 - o Tribunal Administrativo e Fiscal do
Funchal. /// A toda a causa deve ser atribuído um valor certo e expresso em moeda legal, o qual representa
a utilidade económica imediata do pedido (art. 31º/1 CPTA). O valor da causa é relevante para percebermos
se haverá ou não recurso da sentença proferida em primeira instância (art. 31º/2 CPTA), mas tal tem
também implicações importantes ao nível da fixação das custas judiciais. Para percebermos qual é
efectivamente esse valor temos de atender aos critérios constantes dos arts. 32º ss CPTA. O presente caso
tem um valor indeterminável (art. 34º/1 CPTA), pelo que se aplicará o critério supletivo constante do art.
34º/2 CPTA, já que está em causa um processo respeitante a normas emitidas no exercício da função
administrativa. Sendo o valor da causa superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo, temos de
identificar qual é o valor desta alçada. Nos termos do art. 6º/4 ETAF, o valor da alçada do Tribunal Central
Administrativo é igual ao valor da alçada dos tribunais da Relação, que é, segundo o art. 44º/2 LOSJ, de
30.000€, pelo que o valor da causa em apreço é de 30.000,01€.

d) Qual o pedido concreto que deve ser formulado? Qual deverá ser o concreto objecto processual? O autor
deveria propor uma ação cuja objecto é a declaração da ilegalidade da norma jurídica que inibe a prestação de
serviços dos táxis-carrinha de 9 lugares no Aeroporto do Funchal, nos termos do art. 72º/1 CPTA.
Tratando-se de uma norma jurídica imediatamente operativa - ou seja, uma norma regulamentar que lesa

44 Tal pode ser verificado, por exemplo, através de uma leitura a contrario sensu do art. 49º ETAF.

45O próprio art. 44º/1 ETAF é claro ao afirmar que “Compete aos tribunais administrativos de círculo conhecer, em 1.ª instância, de todos os processos
[…] cuja competência, em primeiro grau de jurisdição, não esteja reservada aos tribunais superiores.”; esta é portanto uma disposição residual.

46 Estes têm uma esfera de atuação essencialmente circunscrita aos recursos, embora haja casos em que tal não é assim - alíneas c), d) e e)
-, mas que na prática são raros.

47http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?
artigo_id=3224A0012&nid=3224&tabela=leis&pagina=1&ficha=1&so_miolo=&nversao=
Ao olharmos para o diploma concluímos que há efectivamente uma aposta na especialização mas nem todos os tribunais administrativos
foram contemplados com ela; para já apostou-se apenas no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, no Tribunal Tributário de
Lisboa e nos Tribunais Administrativos e Fiscais de Almada, Aveiro, Braga, Leiria, Porto e Sintra.

48 http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1422&tabela=leis&so_miolo=
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directamente os destinatários, sem necessidade de um ato concreto de aplicação49 -, e não incorrendo esta
norma numa ilegalidade por qualquer dos fundamentos constantes do art. 281º/1 CRP, J deverá requerer a
declaração de ilegalidade da norma com força obrigatória geral, nos termos do art. 73º/1, a) CPTA (sendo
então o objecto processual a norma imediatamente operativa). A menção ao art. 281º/1 CRP (de
inconstitucionalidade ou de ilegalidade reforçada) tem uma razão de ser: a declaração da ilegalidade com
força obrigatória geral de uma norma por qualquer um dos fundamentos previstos neste preceito fica
excluída da jurisdição administrativa, competindo tal declaração ao Tribunal Constitucional. Há apenas um
desvio a esta regra, que é o constante do art. 73º/2 CPTA: estabelece o Código que apesar da declaração
com força obrigatória geral estar vedada aos tribunais administrativos nestes casos, ainda assim quem seja
prejudicado pela norma poderá requerer a declaração da ilegalidade com efeitos circunscritos ao seu caso
específico.

e) Poderá a ação dar entrada em Tribunal, sete meses após a publicação da Portaria? Os prazos a serem
respeitados neste âmbito dependem do tipo de ilegalidade em que a norma incorre: se for uma ilegalidade
material, o pedido poderá ser feito a todo o tempo (art. 74º/1 CPTA); se for uma ilegalidade formal ou
procedimental, da qual não resulte uma inconstitucionalidade50, o pedido apenas poderá ser feito no prazo
de 6 meses a contar da data da publicação do diploma donde conste a dita norma (art. 74º/2, 1º parte
CPTA)51. No nosso caso não se tratava de uma ilegalidade nem formal nem procedimental, e sim material,
pelo que J poderia pedir a declaração de ilegalidade da norma a todo o tempo, pelo que a reposta à questão é
afirmativa.

f) Poderá J cumular com o pedido de declaração de ilegalidade de norma regulamentar um pedido de natureza
indemnizatória? Todo o processo declarativo tem um objecto, que são as questões jurídicas sobre as quais o
tribunal é chamado a pronunciar-se no âmbito desse processo através da emissão da correspondente
sentença. O objecto do processo é identificado, à partida, por referência à pretensão formulada pelo autor,
que se dirige, por um lado à providência a conceder pelo juiz (à sentença que o autor solicita ao tribunal),
através da qual vai ser actuada a tutela jurídica pretendida; e, por outro lado, à produção de um efeito
jurídico, o efeito que há-de resultar da sentença e que, consoante os casos, se pode traduzir no
reconhecimento, por parte do tribunal, da existência ou inexistência de uma situação, de um efeito ou de um
facto jurídico, individualizado em função dos respectivos factos ou elementos constitutivos: a chamada causa
de pedir. Nesse sentido, pode dizer-se que o objecto do processo se define por referência à pretensão
formulada pelo autor, identificado pelo pedido e pela causa de pedir que por ele foram deduzidos. Feita esta
aproximação ao pedido e à causa de pedir, na presente sub-hipótese estava em causa a questão de saber se a
cumulação descrita era ou não possível. Ora, assim como no processo civil, também no âmbito do
contencioso administrativo é possível a cumulação de pedidos: o CPTA introduziu no processo
administrativo o princípio da livre cumulabilidade de pedidos, que se encontra consagrado no art. 4º CPTA52.
Segundo este princípio diferentes tipos de pretensões podem ser deduzidas em conjunto, contra o
demandado, no âmbito de um só processo, desde que exista uma conexão entre os pedidos, resultante de a
respectiva causa de pedir ser a mesma e única, ou de os pedidos estarem entre si numa relação de

49Por oposição às normas regulamentares ñ imediatamente operativas, isto é, normas cujos efeitos não se projeta imediatamente, mas
apenas através de atos administrativos de aplicação.

50 Já que se desta ilegalidade resultar uma inconstitucionalidade o prazo passar a ser o do art. 74º/1 CPTA.

51Do art. 74º/2, 2º parte CPTA resulta que se se tratar de uma carência absoluta de forma legal ou de preterição de consulta pública -
portanto, dois vícios especialmente gravosos, nas palavras do Prof. Vieira de Andrade -, a declaração pode ser pedida a todo o tempo e
não apenas no prazo de 6 meses, independentemente de não serem estes vícios materiais.

52O CPTA, desde 2002, se mostra um Código “amigo da cumulação”, já que de facto há toda a conveniência e vantagem numa
concentração dos diversos pedidos numa mesma ação, desde que entre eles haja uma conexão. Esta ideia de abertura à cumulação é
bastante clara se atentarmos ao advérbio utilizado no art. 4º/2 CPTA: “designadamente”; pelo que não se trata de um elenco taxativo e existe
uma preocupação em se poder abarcar outras situações enquadráveis numa das alíneas do nº1 que legalmente fundamentem a cumulação.
A conveniência a que me referi expressa-se, fortemente, ao nível da tutela jurisdicional efectiva e ainda ao nível da economia processual.
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prejudicialidade ou de dependência, ou do facto de a procedência dos pedidos principais depender


essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas normas.
Analisando agora o nosso caso em concreto: J pretende não só a declaração de ilegalidade com força
obrigatória geral da norma regulamentar, como também uma indemnização - e aqui supus eu pelos danos
sofridos pela impossibilidade do exercício da sua actividade - e de facto não só não há óbice ao
enquadramento da cumulação nos termos do art. 4º/1, a) CPTA, como da conjugação do art. 4º/2, 1º parte
da b) + f) CPTA (ou seja, pedido impugnatório + pedido de condenação da Administração à reparação de
danos causados) resulta expressamente essa possibilidade.

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Caso n.º6
Maria intentou uma ação administrativa contra o Instituto de Emprego e Formação Profissional,
tendo por objeto a impugnação de um ato praticado por esse ente público.
1) Na petição inicial não consta o domicílio profissional do respetivo mandatário. Dessa omissão decorre
alguma consequência processual? O processo inicia-se com a apresentação da petição inicial pelo autor,
considerando-se a ação proposta logo que esta seja recebida na secretaria do tribunal53 - art. 78º/1 CPTA. A
petição inicial é a peça escrita por meio da qual o autor solicita a tutela jurisdicional pretendida, sendo esta
(no que respeita à sua estrutura) deduzida de forma articulada. A petição inicial deverá conter todos os
elementos previsto no art. 78º/2 CPTA, sendo um desses elementos justamente o domicílio profissional do
mandatário judicial (art. 78º/2, c) CPTA), sendo que, segundo o art. 80º/1, c) CPTA, essa omissão terá
como consequência a recusa do recebimento da petição inicial pela secretaria do tribunal54. Ora, nos termos
do art. 80º/2 CPTA esta recusa tem os efeitos que lhe correspondem na lei processual civil, já que à luz dos
arts. 552º/1, b) + 558º/c) CPC esta omissão é também na jurisdição civil um fundamento de recusa da
petição pela secretaria. É à secretaria que cabe, em primeira linha, o controlo formal externo da petição
inicial, justamente para situações como esta, em que temos uma omissão dos elementos exigidos. O ato de
recusa da secretaria está, de acordo com os arts. 157º/5 + 559º/1 CPC ex vi art. 80º/2 CPTA, sujeito a
reclamação para o juiz e, no caso do juiz confirmar o não recebimento, a autora poderá ainda recorrer para
os Tribunais Centrais (art. 559º/2 CPC ex vi art. 80º/2 CPTA). Não havendo reclamação da recusa por parte
de Maria ou, havendo-a, uma vez proferida a decisão definitiva que a confirme - quer pelo juiz do Tribunal
de Círculo ou em sede de recurso -, a autora poderá apresentar nova petição, corrigindo o vício, no prazo de
10 dias (contados desde a recusa ou desde a notificação da decisão judicial), mantendo-se a instância e
considerando-se a ação proposta na data da apresentação da primeira petição (art. 560º CPC ex vi art. 80º/2
CPTA). Tudo quanto foi exposto corresponde à lógica tradicional do processo administrativo, isto é,
corresponde ao processo materializado, e em que a desmaterialização era apenas uma solução como que
secundária; a solução anteriormente estabelecida era então a de que se deveria optar, preferencialmente, pelo
processo electrónico, o que era motivado por meio de incentivos (como seja, por exemplo, a redução das
taxas de justiça). Com a revisão de 2019 a regra passou então a ser a do processo electrónico, nos termos do
art. 24º/1 CPTA, sendo poucas as situações em que tal não vigora. O Código, no art. 24º/5 CPTA, prevê
então as situações em que se pode ainda fazer uso dos meios ditos tradicionais (elencados nas alíneas): causas
que não importem a constituição de mandatário e em que a parte não esteja patrocinada. Por uma questão
lógica atinente à própria formulação do enunciado da presente sub-hipótese (há uma alusão ao mandatário
judicial de Maria), a presente causa não integra, claro está, a excepção, pelo que esta ação administrativa
impugnatória deveria ser tramitada eletronicamente. Sucede que, ainda que vigore hoje um verdadeiro
modelo de processo administrativo electrónico, em alguns preceitos do Código não há uma adequação a esta
nova realidade, nomeadamente, para o que nos importa nesta primeira sub-hipótese, nos arts. 78º + 80º.
Desde logo quando se diz que a ação considera-se proposta quando esta seja recebida na secretaria (art. 78º/
1 CPTA), pelo que se presume, portanto, uma apresentação física, quando isso hoje é a excepção e não a
regra; a apresentação do articulado ocorre hoje por via do suporte informático, o SITAF55. Depois, se lido
isolamento, do art. 78º/2 CPTA extrai-se que o articulado em si tem de integrar todos aqueles elementos
identificados e isto não faz sentido, é uma solução legal que produz um resultado de duplicação; o legislador
parece olvidar-se de que grande parte destes requisitos são necessariamente cumpridos pela parte aquando
do preenchimento dos formulários, padronizados, disponibilizados pelo sistema informático. O art. 78º/2
CPTA parece então estar pensado para as situações em que não se utilizam os meios informáticos. Também
o art. 80º CPTA está construído atendendo ao paradigma anterior, visto que a recusa, por regra, já não é
promovida pela secretaria, e sim pelo próprio sistema informático, nos temos do art. 80º/3 CPTA; assim, o

53É assim constituída a instância, isto é, a relação jurídica (por natureza dinâmica) existente entre as partes e o tribunal, dizendo-se a partir
daí pendente a ação.

54 A recusa deverá ser acompanhada da indicação, por escrito, do respectivo fundamento.

55 Sistema Informático dos Tribunais Administrativos e Fiscais (cujo ‘irmão’ na jurisdição comum é o Citius).
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art. 80º/1 e 2 CPTA é aplicável apenas às situações excepcionais, em que se utilizam os meios tradicionais.
Em suma, não integrando o caso de Maria a excepção (art. 24º/5 CPTA), em bom rigor esta situação nunca
poderia acontecer, visto que as informações quanto ao domicílio do seu mandatário constam da chave de
acesso deste à plataforma, pelo que essa omissão nunca se daria56.

2) Maria está legalmente obrigada a proceder à junção de todos os documentos que repute necessários à prova
da factualidade relevante ou poderá remeter para o processo administrativo? Nos termos do art. 78º/4, parte
final CPTA, Maria poderá remeter para o processo administrativo57. Sucede que, embora esta seja a regra,
existem documentos que têm necessariamente de ser juntos, sendo que no presente caso a autora deveria
juntar um documento comprovativo da emissão do ato (art. 79º/3, a) CPTA), a par da remissão.

3) Qual a consequência derivada da falta de impugnação especificada, em sede de contestação? A resposta seria
semelhante se se estivesse diante uma ação administrativa tendente à efetivação da responsabilização civil
extracontratual administrativa do ente público em apreço? Toda a defesa do demandado deve ser deduzida
nas respectiva contestação, devendo nela ser tomada posição em relação aos factos que constituem a causa
de pedir invocada pelo autor (art. 83º/1 e 3, 1º parte CPTA). Quanto à falta de impugnação especificada58 -
artigo a artigo ou facto a facto -, o legislador previu, no art. 83º/4 CPTA, uma solução dual: se estiverem em
causa atos administrativos ou normas, a falta de impugnação especificada não importa a confissão desses
mesmos factos, cabendo ao tribunal apreciar essa falta livremente; já não será assim nas ações que não
tenham por objecto um ato administrativo ou uma norma, nessas a fala importa a confissão. Em suma, se na
presente ação o Instituto de Emprego e Formação Profissional não procedesse a uma impugnação
especificada o Código não atribui directamente uma consequência, deixando que o juiz aprecie livremente
essa conduta; já se fosse uma ação administrativa tendente à efetivação da responsabilização civil
extracontratual administrativa do ente público em apreço, a consequência seria a confissão.59

4) Imagine que, na contestação, é deduzida uma exceção de caducidade do direito de ação. Pode Maria
responder em sede de tréplica? A reposta é negativa, a tréplica é um articulado que apenas o demandado tem
ao seu dispor, nos termos do art. 85º-A/6 CPTA, pelo que Maria não tem um direito a tréplica. A tréplica
serve para que o demandado possa reponder, de forma articulada, às excepções deduzidas na réplica, no que
respeita ao pedido reconvencional.60

5) Maria teve entretanto conhecimento que, um caso similar ao seu, conheceu decisão diferente por parte do
ente público em apreço. Poderá dar nota disso ao Tribunal? A regra geral nesta âmbito é a de que os factos
constitutivos, modificativos ou extintivos supervenientes podem ser deduzidos em novo articulado, pela
parte a que aproveitem, até ao encerramento da discussão - art. 86º/1 CPTA. Sucede que, do que parece
resultar do enunciado, Maria não teve conhecimento de um facto superveniente, ela teve foi conhecimento
supervenientemente de um facto anterior, o que, nos termos do art. 86º/2 CPTA, releva, ainda assim, para
efeitos da sua dedução num novo articulado, até ao encerramento da discussão. Assim, a reposta à questão é
afirmativa. Nestes casos específicos, de atuação desigual perante situações semelhantes, é relevante trazer tal

56 Os usuários do SITAF têm como que uma conta, donde constam todas as suas informações, incluindo o domicílio profissional.

57Processo este que se reporta aos documentos que constituem o procedimento administrativo (art. 1º/2 CPA), devendo ser junto pela
entidade administrativa demandada, segundo o art. 84º/1 CPTA, ou seja, pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional.

58A este propósito é importante não confundir a falta de contestação - que tem consequências processuais civis aplicáveis
subsidiariamente ao processo administrativo - e a falta de uma impugnação especificada.

59Esta solução não faz sentido, visto que há aqui uma posição que é favorável à Administração Pública, e isso pode ser problemático no
quadro do princípio da igualdade entre as partes (ou de armas), já que o que temos aqui é um claro benefício para uma das partes.

60O CPC contém soluções distintas a este respeito: primeiro que tudo foi eliminada a figura da tréplica, pelo que o réu não pode
responder à réplica do autor e, em segundo lugar, a réplica só é admissível na medida em que o réu deduza reconvenção (art. 584º/1
CPC), sendo a única excepção a esta regra a que consta do art. 584º/2 CPC, referente às ações de simples apreciação negativa.
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facto ao conhecimento do tribunal porque o ato padece de um novo vício, a par daqueles já indicados em
sede de petição inicial, nomeadamente a violação do princípio da igualdade61.

6) Tendo presente que a exposição fáctica, promovida na petição inicial, apresenta várias imprecisões, o que
deve fazer o juiz do processo? O juiz deve, nos termos do art. 87º/1, b) + 3 CPTA, em sede de despacho
pré-saneador, convidar Maria a suprir as imprecisões na exposição da matéria de facto da sua petição inicial,
fixando um prazo para que o faça. Se a autora não o fizesse dentro do prazo estabelecido, o juiz absolveria o
Instituto de Emprego e Formação Profissional da instância (art. 87º/7 CPTA). Cabe apenas deixar uma
nota de que esta atuação do juiz deverá respeitar o disposto no art. 87º/5 CPTA, pelo que estas alterações à
matéria de facto não podem deturpar o objecto do processo.

7) Na petição inicial, Maria arrolou duas testemunhas, mas, já depois da apresentação da contestação,
apercebeu-se da conveniência em arrolar mais uma testemunha. Pode fazê-lo? Se sim, em que fase
processual? Sim, Maria poderá arrolar mais uma testemunha. A autora poderá alterar o seu requerimento
probatório em sede de audiência prévia (art. 87º-A/6 CPTA) ou em até 20 dias antes da data em que se
realize a audiência final (art. 89º-A/5 CPTA).

8) Tendo oficiosamente constatado que a ação administrativa foi intentada fora de prazo, o que deve o juiz
fazer? Em que momento processual deve ocorrer tal atuação processual? Qual o valor processual de tal
decisão? A intempestividade constitui uma excepção dilatória (art. 89º/1 e 4, k) CPTA)62, cuja verificação -
como ocorreu no presente caso - obsta ao prosseguimento da ação e ao conhecimento do mérito da causa,
nos termos do art. 89º/2 CPTA, pelo que o juiz deverá absolver o Instituto de Emprego e Formação
Profissional da instância (ao conhecer desta excepção no despacho saneador - art. 88º/1, a) CPTA). Esta
decisão do juiz deterá valor de caso julgado formal, segundo o art. 88º/4 CPTA.

9) Imagine que, enquanto juiz, entende que Maria é parte ilegítima. Todavia, só se apercebeu de tal questão
meses depois de ter proferido despacho saneador. Pode, neste quadro, julgar procedente tal exceção, em sede
de sentença final? A ilegitimidade de Maria constitui uma excepção dilatória (art. 89º/1 e 4, e) CPTA), cuja
verificação obsta ao prosseguimento da ação e ao conhecimento do mérito da causa, nos termos do art. 89º/
2 CPTA, pelo que o juiz deverá absolver o Instituto de Emprego e Formação Profissional da instância.
O conhecimento desta excepção deverá ocorrer em sede de despacho saneador, segundo o art. 88º/1, a)
CPTA), e, atendendo ao que dispõe o art. 88º/2 CPTA, artigo este que consagra o princípio da preclusão,
ou se conhece até àquele momento das questões prévias referenciadas no art. 88º/1, a) CPTA ou estas já não
poderão ser de todo conhecidas63. Assim, a reposta à questão é negativa; o juiz não poderá nem sequer
conhecer da excepção em sede de sentença final, quanto mais julgá-la procedente. Esta solução conduz-nos,
no entanto, a uma reflexão sobre o sentido lógico desta disposição, visto que não é concebível que se possa
proferir uma decisão de mérito sobre uma causa cuja autora é parte ilegítima. Por um lado percebe-se que o
legislador queira concentrar o saneamento numa só fase do processo, mas por outro não se compreende
soluções como a desta sub-hipótese, pelo que na prática existe uma flexibilização na interpretação e na
aplicação do art. 88º/2 CPTA.

61Lembrando que os princípios gerais da actividade administrativa são normatividade, ou seja, permitem invalidar atos e normas, já que
consubstanciam parâmetros de controlo da atuação da administração.

62Até 2015, o Código, no seu art. 89º/1, h) utilizava a expressão “caducidade do direito de acção”, não havendo qualquer dúvida quanto à
qualificação desta excepção - ação intentada fora de prazo - como dilatória. Com a reforma passou a utilizar-se uma expressão que é
pouco clara, sendo difícil de a aplicar à petição inicial, pelo que há quem defenda que esta é efectivamente uma excepção dilatória, mas que
não está (necessariamente) prevista, de forma expressa, no art. 89º/4 CPTA, não se aplicando, portanto, a alínea k) nessas situações; até
porque, e convém não esquecer, que este preceito contém um elenco meramente exemplificativo.

63 Além de que as questões que sejam efectivamente decididas não poderão ser reapreciadas em momento posterior.
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10) O ente público demandado entende que se torna necessária a realização de uma perícia. Maria discorda e
defende nos autos que a pretensão do demandado tem um único objetivo: atrasar o processo. Quid iuris? Nos
termos do art. 90º/3 CPTA, se o juiz considerar que a realização da perícia é necessária ao apuramento da
verdade poderá ordenar que esta seja feita no âmbito da instrução; podendo também, se a considerar
claramente desnecessária, indeferir o requerimento do Instituto de Emprego e Formação Profissional,
destinado à realização da perícia64, por meio de um despacho fundamentado. Se o art. 90º/3 CPTA não
existisse, o juiz continuaria, ainda assim, a poder fazer uso deste poder discricionário à luz do seu dever geral
de gestão processual (art. 7º-A/1 CPTA).

11) No final da audiência final, o demandado requereu que as alegações fossem apresentadas por escrito e de
modo sucessivo, ou seja, primeiro pela autora e só depois pelo demandado, no prazo de 30 dias para cada
parte. Enquanto juiz, deferiria tal pedido? Tendo havido audiência final65, e no caso da matéria da presente
contenda assim o justificar (ou no caso de qualquer das partes não prescindir da sua apresentação), o juiz, no
termo da audiência, pode determinar que as alegações sejam apresentadas por escrito no prazo simultâneo
de 20 dias - art. 91º/5 CPTA. Assim, o pedido poderia ser deferido, mas apenas parcialmente; isto é, o juiz
poderia determinar que as alegações fossem apresentadas por escrito, mas nunca no prazo de 30 dias e muito
menos de modo sucessivo.

12) Tratando-se de um processo complexo, o juiz da causa, depois da audiência final, decidiu convocar mais dois
juízes e formar coletivo para proferir acórdão final. Poderá fazê-lo? A regra geral a este propósito é a de que
a causa decorre perante um juiz singular, competindo-lhe a decisão, de facto e de direito, dos processos que
lhe sejam distribuídos - art. 40º/1 ETAF. Contudo, em casos excepcionais, quando esteja em causa uma
questão de direito nova, complexa, que suscite dificuldades sérias e que tenha uma potencialidade de vir a ser
replicada (não podendo, portanto, tratar-se de um caso visivelmente isolado), o presidente do tribunal de
círculo66 em que decorre a ação poderá determinar que nela intervenham todos os juizes do tribunal, nos
termos do art. 93º/1, a) CPTA, a pedido (ou não) do juiz da causa. A ratio por detrás desta solução é a de
que, à partida, um colectivo de juizes a decidir sobre a causa constitui uma garantia de uma melhor decisão,
ou seja, se há mais do que um juiz a reflectir sobre o caso, a ponderar e a motivar a decisão fáctica e
juridicamente haverá, em princípio, uma melhor decisão. Ora, o art. 93º CPTA é verdadeiramente
excepcional, pelo que é necessário que todos os seus pressupostos aplicativos estejam verificados no caso
concreto, visto que só nesses casos excepcionais é que haverá uma relevância da decisão ser tomada por um
leque de juizes. Em suma, o juiz da causa não poderia ele próprio convocar os juizes para formar um
colectivo para proferir um acórdão, teria de o propor ao presidente do tribunal, cabendo a este a ‘palavra
final’; e nunca seriam apenas dois juizes, a lei é clara ao afirmar que intervirão todos os juízes do tribunal
(sendo o quórum de 2/3)67.

13) Na petição inicial, Maria sustentou, entre outros vícios, que o ato impugnado violava o princípio da
proteção da confiança. Esta violação, no entender de Maria, suportava-se em três argumentos autónomos.
Porém, em sede de decisão final, o Tribunal só analisou dois dos argumentos invocados por Maria, tendo
imediatamente concluído que a violação de tal parâmetro não ocorria. Terá o Tribunal preterido o disposto
no artigo 95.º, n.º1 e n.º3 do CPTA? Quando falamos do art. 95º/1 e 3 CPTA há, desde logo, uma
apontamento a se fazer: o nº3 está numa relação de especialidade com o nº1; e isto porque o nº3 está
pensado para os processos impugnatórios e o nº1 é geral. Dito isto, a norma relevante in casu será o art. 95º/
3 CPTA, estabelecendo este preceito que o tribunal deverá pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade

64 Requerimento probatório este que é admissível à luz do art. 83º/2, parte final CPTA.

65 Não havendo lugar à realização da audiência final, o preceito aplicável seria o art. 91º-A CPTA.

Não se tratando de um tribunal de círculo, o art. 93º CPTA não se poderá aplicar, visto que os tribunais superiores - Tribunais Centrais
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Administrativos Sul e Norte e Supremo Tribunal Administrativo - já funcionam em colectivo.

67 Existe, no entanto, uma excepção a esta regra constante do art. 93º/2 CPTA.
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Anny Ferrarini (N.º56810)

que tenham sido invocadas. Ora, também aqui há uma distinção que deve ser feita, que é a distinção entre
causas de invalidade e argumentos; a causa de invalidade invocada por Maria era a violação do princípio da
protecção da confiança por parte da Administração, aquando da pratica do ato sobre que incide a presente
ação, os argumentos são aquelas três razões autónomas por si invocadas que sustentam esta invalidade.
Evidentemente que a autora utilizou, e fez bem, diversos argumentos, mas a lei não impõe que haja um
conhecimento integral desses argumentos68, apenas das causas de invalidade, havendo uma omissão de
pronúncia se o Tribunal não apreciar essa causa69. Em suma, não parece haver no presente caso uma
preterição do disposto nos preceitos legais referenciados.

68Até porque, e entrando aqui nos domínios da realidade prática, é muito difícil sabermos onde efectivamente começa e termina um
argumento, pelo que defender-se que o juiz deverá pronunciar-se sobre todos os argumentos é defender uma tarefa quase impossível, ou
pelo menos consideravelmente morosa.

69Nos processos impugnatórios o juiz deve, inclusive, identificar causas de invalidada diversas das que tenham sido alegadas pelo
demandante. No nosso casso o tribunal poderia perfeitamente afirmar, oficiosamente, que o princípio da confiança não fora violado mas
que o da igualdade foi, mesmo não tendo a autora alegado tal causa de invalidade. Esta solução legal é uma consequência clara do
brocardo latino iura novit curia, que dita que juridicamente os poderes do tribunal devem ser consideravelmente dilatados.
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