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Introdução

Nesta introdução, aborda-se a alta prevalência de alergias alimentares, especialmente alergias ao


amendoim, afetando 1-2% da população e mais frequentemente crianças. Também é ressaltado o
contraste entre essa realidade e a percepção pública exagerada da prevalência de alergias. O aumento
no número de alimentos envolvidos e a gravidade das reações é destacado, com foco na alergia ao
amendoim, que pode ser fatal e durar a vida toda. A introdução menciona que oito tipos de alimentos
são responsáveis pela maioria das alergias, incluindo alguns de origem vegetal. Explora-se a questão do
que torna certos alimentos vegetais mais alergênicos e a necessidade de compreender isso para avaliar
o potencial alergênico de novos alimentos. Além disso, a rede Protall, financiada pela União Europeia, é
introduzida, incluindo sua abordagem multidisciplinar para entender alérgenos de alimentos vegetais. O
objetivo do artigo é resumir o progresso alcançado por essa rede.

O que é uma alergia?

Existe alguma confusão em relação ao que constitui uma alergia alimentar em oposição à intolerância
alimentar. Uma definição geralmente aceite de alergia é que ela constitui uma reação de
hipersensibilidade em que os sintomas aparecem rapidamente e são causados pela exposição a
macromoléculas exógenas, também conhecidas como antígenos ou alérgenos. Essa reação resulta em
um aumento acentuado na reatividade e na responsividade a esse antígeno/alérgeno em exposições
subsequentes, resultando em efeitos adversos na saúde e é mais comumente mediada por uma classe
específica de anticorpos, conhecida como imunoglobulina E (IgE). Em contraste, as intolerâncias
alimentares são reações não mediadas pelo sistema imunológico, cujos sintomas podem às vezes levar
dias para se manifestar, um exemplo disso é a síndrome de intolerância ao glúten chamada doença
celíaca. Esta revisão está restrita às reações de hipersensibilidade anteriores, que são geralmente
alergias alimentares mediadas por IgE. Essas alergias têm duas fases: (1) sensibilização e (2) reação
subsequente à reexposição a um alérgeno, ambas as fases sendo desencadeadas por antígenos (quase
sempre proteínas) conhecidos como alérgenos.

Sensibilização alérgica

Para poder desencadear uma resposta imune, o antígeno deve ser apresentado às células competentes
do sistema imune, os linfócitos T (Figura 1). Essa apresentação é feita por células (macrófagos, células
dendríticas e linfócitos B) que são capazes de capturar o antígeno, processá-lo dentro da célula e
apresentá-lo na superfície da célula ligado a um receptor conhecido como complexo principal de
histocompatibilidade (MHC) tipo II. Além das moléculas MHC tipo II, esses tipos de células também
expressam moléculas de adesão costimulatórias importantes e, portanto, são chamadas de células
apresentadoras de antígeno profissionais (APCs). Após a captação de antígenos exógenos, essas células
os processam na via endocítica, após o que os fragmentos de peptídeo são seletivamente ligados na
fenda polimórfica das moléculas de classe II e transportados para a superfície da célula. Macrófagos
mucosos, células B progenitoras e células dendríticas (como as encontradas no intestino) migram para
os gânglios linfáticos regionais onde ocorre a apresentação do antígeno. Aqui, o complexo de 'peptídeo
estrangeiro mais molécula MHC própria' na superfície das APCs é reconhecido pelos receptores de
células T CD4+ (Brantzaeg, 2001). Isso desencadeia muitos outros eventos, incluindo a maturação das
células B em células secretoras de anticorpos. Em indivíduos predispostos, a resposta imune resultante
pode assumir a forma de uma chamada resposta Th2 levando à produção específica de IgE, em vez da
resposta "normal" de IgG. Mesmo em indivíduos predispostos, a maioria dos antígenos proteicos não
induz uma resposta de IgE. Não se sabe quais propriedades estruturais do alérgeno (se houver)
direcionam a resposta na direção de uma resposta alérgica (Th2).

Epítopos de IgE

Os locais em uma proteína que são reconhecidos por anticorpos são chamados de epítopos. Duas
formas diferentes de epítopos foram identificadas, lineares e conformacionais. No primeiro, apenas a
sequência primária de um polipeptídeo está envolvida na ligação do anticorpo, mas os epítopos
conformacionais são formados a partir de vários segmentos da cadeia polipeptídica (que podem estar
bastante distantes na sequência de aminoácidos de uma proteína) que são reunidos espacialmente pela
estrutura tridimensional da proteína (van Regenmortel, 1992). A maioria dos epítopos é considerada de
natureza conformacional e é particularmente difícil de definir em relação aos alérgenos alimentares,
onde o processamento pode ter um efeito disruptivo na estrutura proteica nativa.

Desencadeando uma reação alérgica

Na reação alérgica dependente de IgE, as moléculas de IgE se ligam aos receptores Fc na superfície das
células mastocitárias e basófilos teciduais (Figura 2). Quando o alérgeno se liga a várias moléculas de IgE
na superfície do basófilo ou mastócito (um evento conhecido como ligação cruzada), ele desencadeia
uma resposta intracelular que resulta na degranulação, com liberação de mediadores farmacológicos
pré-formados. Esses mediadores incluem aminas vasoativas como a histamina, que causam aumento da
permeabilidade vascular, vasodilatação, espasmo brônquico e secreção de muco. Mediadores
secundários liberados incluem leucotrienos, prostaglandina D2 e mediadores quimiotáticos que atraem
células sanguíneas, principalmente eosinófilos e basófilos, para o local da reação. Após algumas horas,
as células mastocitárias ativadas produzem várias citocinas, IL-3, IL-5 e GM-CSF, que produzem atividade
pró-inflamatória. Uma gama semelhante de citocinas é produzida pelos linfócitos Th2, que são ativados
simultaneamente pelo alérgeno. Quando a reação entra na fase tardia, a infiltração celular e a liberação
de numerosos mediadores estão envolvidas (Centner & de Weck, 1995; Crusse & Lewis, 1999).

Vias de exposição na sensibilização a alérgenos alimentares

Geralmente se assume que a sensibilização aos alérgenos alimentares clássicos, como leite, ovo,
amendoim e peixe, ocorre através do trato gastrointestinal.

Hipótese de Sensibilização Respiratória vs. Gastrointestinal

Este trecho do texto explora a hipótese de que a sensibilização original a alérgenos pode ter ocorrido
através do sistema respiratório em vez do trato gastrointestinal. Além disso, destaca que a presença de
anticorpos de reação cruzada no sangue de pacientes não indica qual alergia surgiu primeiro: alergia ao
pólen ou alergia alimentar. Um estudo de Kazemi-Shirazi et al. (1999) investigou essa questão usando
soros de pacientes com síndrome de alergia oral.

Proteínas de Transferência de Lipídios não Específicas (LTP)

Este trecho menciona que nem todas as alergias a frutas podem ser explicadas por reações cruzadas
com pólen. Recentemente, proteínas de transferência de lipídios não específicas (LTP) em maçã e
pêssego foram identificadas como alérgenos clinicamente relevantes, sem reações cruzadas com o
pólen. Essas proteínas LTP são mais estáveis do que alérgenos que reagem ao pólen de Bet v 1, tornando
mais provável que as LTPs sensibilizem o organismo através do trato gastrointestinal.

Diversidade e Complexidade das Proteínas de Alimentos de Plantas

Este trecho aborda a complexidade das proteínas presentes nos alimentos de origem vegetal. Moléculas
de grande diversidade e número estão presentes nesses alimentos, o que torna desafiador isolar e
caracterizar todas as proteínas. No entanto, avanços na genômica e sequenciamento de proteínas
permitiram uma melhor compreensão das relações estruturais e evolutivas das proteínas, incluindo
alérgenos importantes.

Banco de Dados de Alérgenos de Alimentos de Plantas

Descreve a criação de um banco de dados de alérgenos de alimentos de plantas para apoiar estudos na
área. Estabelece critérios para a inclusão de alérgenos no catálogo, incluindo a produção de uma
resposta mediada por IgE e a identificação de alérgenos importantes que causaram reações alérgicas em
pacientes.

Principais Famílias de Alérgenos de Proteínas de Alimentos de Plantas que Sensibilizam via Trato
Gastrointestinal

Explora como a maioria dos alérgenos de proteínas de alimentos de plantas que sensibilizam através do
trato gastrointestinal pertence a três grupos principais de proteínas de plantas: prolaminas, cupinas e
superfamílias de proteases de cisteína. Fornece informações sobre a prolamina superfamily e a presença
de proteínas relacionadas, como as albuminas de armazenamento 2S, proteínas de transferência de
lipídios não específicas (nsLTP) e inibidores de α-amilase e/ou tripsina.

Comparação de Estruturas e Funções de Proteínas

Discute as semelhanças nas estruturas e funções das proteínas de cada grupo e como todas essas
proteínas desempenham papéis defensivos contra pragas e patógenos. Destaca as diferenças nas
características físicas dessas proteínas, como massa, ligação a lipídios e estabilidade.

Proteínas de Cupina
Este trecho aborda a família de proteínas de cupina, destacando a diversidade dessas proteínas e sua
origem em bactérias e plantas. Menciona as proteínas de armazenamento 7S e 11S que são comuns em
sementes de plantas e compartilham semelhanças em suas estruturas tridimensionais. Além disso,
descreve as principais proteínas alergênicas nesse grupo.

Propriedades Físicas e Estabilidade das Proteínas Alérgicas

Explora as propriedades físicas das proteínas alergênicas, como tamanho e estabilidade à


desnaturalização e proteólise, e como essas propriedades podem estar relacionadas à sua capacidade
de causar alergias.

Família de Proteases de Cisteína

Este trecho menciona a família de proteases de cisteína, também conhecida como família C1 ou
papaina-like, e destaca sua identificação original.

Proteína de Soja Glycine Substituindo Cisteína

Uma proteína de soja substituiu a cisteína no sítio ativo e foi associada às vacúolas de armazenamento
da soja.

Alérgenos Alimentares Resultantes de Alérgenos Inalantes de Reação Cruzada

Existem alérgenos alimentares mais diversos originados da sensibilização por inalantes. Eles podem ser
divididos em dois grupos com base na sensibilização via pólen ou látex.

Alérgenos Relacionados a Bet v 1 e Bet v 2

A proteína Bet v 1, relacionada a alergias ao pólen, resulta em reações alérgicas a proteínas presentes
em frutas e vegetais. Bet v 2, outro alérgeno de pólen, é uma profilina e causa reações a proteínas em
diversos alimentos vegetais. Ambos têm relação com proteínas defensivas de plantas.

Proteínas PR e Alérgenos de Frutas e Vegetais

Proteínas PR10, que incluem Bet v 1, são proteínas de defesa vegetal e levam a alergias alimentares
relacionadas a frutas e vegetais. Outras proteínas PR de látex também resultam em alergias cruzadas a
alimentos.

Classes Principais de Alérgenos de Alimentos de Plantas

A maioria dos alérgenos alimentares de plantas se encaixa em classes como cupinas, prolaminas e
proteases de cisteína, sensibilizando principalmente via trato gastrointestinal, ou são relacionados ao
pólen/látex, sensibilizando principalmente por inalação e relacionados a proteínas de defesa. Enzimas e
proteínas estruturais celulares não parecem ser alérgenos importantes.
Fatores Contribuintes para Alérgenos Alimentares

Vários fatores, incluindo estabilidade a baixo pH, proteólise e a capacidade de ligação a lipídios e outras
moléculas, podem contribuir para a alergenicidade das proteínas.

Como Esse Conhecimento Ajuda?

Esse conhecimento pode aprimorar a avaliação de riscos alergênicos de alimentos, incluindo alimentos
geneticamente modificados e processos de produção inovadores, auxiliando na compreensão da base
molecular das alergias alimentares.

Avaliação de Riscos Alergênicos por Biotecnologia

A avaliação de riscos alergênicos relacionados a alimentos é um desafio complexo, e uma abordagem


baseada em árvore de decisões foi proposta pela FAO/OMS em 2001. No entanto, não se conhece
totalmente o que torna uma proteína um alérgeno alimentar. Portanto, a abordagem se baseia em
comparações diretas e indiretas da estrutura do alérgeno.

Primeira Etapa: Comparação de Sequências

A primeira etapa proposta pela FAO/OMS envolve a comparação da sequência de uma proteína "nova"
com a de todos os alérgenos conhecidos. Se uma correspondência com mais de 35% de homologia for
encontrada, é provável que haja reatividade cruzada. No entanto, a homologia sozinha não é suficiente
para determinar a alergenicidade.

Segunda Etapa: Outras Considerações

Outras considerações, como a fonte da proteína e sua estabilidade à digestão e processamento de


alimentos, são importantes na avaliação. Qualquer proteína identificada como potencial alérgeno deve
ser confirmada usando anticorpos específicos.

Terceira Etapa: Testes com Soro Alergênico Humano

Quando não há relação com alérgenos existentes, o próximo passo envolve testar a proteína em relação
a soros alérgicos humanos bem definidos. Isso ajudará a determinar se a nova proteína possui epítopos
IgE idênticos aos presentes em alérgenos inalantes ou alimentares relacionados.

Recursos Importantes para Avaliação

Recursos como bancos de dados de sequências alérgenas são úteis na etapa inicial de comparação de
homologia. No entanto, a falta de conhecimento detalhado da estrutura de alérgenos dificulta a criação
de estratégias racionais para reduzir a alergenicidade.

Redução da Alergenicidade por Tecnologia de Alimentos

A tecnologia de alimentos visa reduzir a alergenicidade por meio da remoção irreversível de alérgenos
ou modificação da estrutura dos alérgenos para evitar reconhecimento pelo sistema imunológico. No
entanto, a escolha da tecnologia depende das características dos materiais brutos e especificações do
produto.

Efeitos do Processamento Térmico na Alergenicidade

Alguns alérgenos são termoestáveis, enquanto outros, especialmente os relacionados a síndromes de


alergia cruzada pólen-fruta/vegetal, são mais termolábeis e podem ser destruídos por processamento
térmico.

Modificação Química Induzida pelo Processamento

O processamento químico dos alimentos também pode afetar a alergenicidade, como a redução na
capacidade de ligação de proteínas alergênicas em amendoim após fritura ou fervura. Por isso, entender
o impacto do processamento é crucial para reduzir a alergenicidade dos alimentos.

Alergias Alimentares e Processamento de Alimentos

Reações Alérgicas e Potenciais Neoalérgenos

Diferenças na prevalência de alergias alimentares, como alergias a amendoim nos EUA e na China,
podem estar relacionadas aos padrões de consumo. A formação de neoalérgenos relacionados à reação
de Maillard pode desempenhar um papel nessas diferenças.

Processamento Enzimático

O processamento bioquímico de matérias-primas pode ajudar a remover a alergenicidade dos


alimentos. Algumas proteínas alergênicas do trigo, por exemplo, podem ser tratadas com proteases para
diminuir a alergenicidade, sem prejudicar as propriedades funcionais.

Tecnologia de Processamento de Alta Pressão

A alta pressão tem sido explorada como uma alternativa ao processamento térmico para alterar a
conformação dos alérgenos e reduzir sua atividade alergênica. Isso envolve a preferencial liberação de
proteínas alergênicas com o uso de pressão, o que pode ser complementado com enzimas proteolíticas
para reduzir ainda mais a alergenicidade.

Direções Futuras

Uma compreensão aprimorada das características estruturais comuns a alérgenos de alimentos vegetais
permitirá investigar seu papel na alergenicidade. Isso pode levar a melhores métodos para avaliar riscos
alergênicos em alimentos novos e à redução da alergenicidade por meio de processamento de
alimentos.

Diagnóstico e Tratamento
O entendimento da estrutura dos alérgenos e como ela afeta as interações com o sistema imunológico
também pode melhorar o diagnóstico e tratamento de alergias alimentares. Atualmente, o diagnóstico é
limitado, mas avanços podem levar a métodos diagnósticos mais rápidos e eficazes.

Desafios e Terapias

Para aqueles com alergias alimentares, a exclusão dietética é muitas vezes a única opção, o que pode ser
desafiador. A pesquisa em terapias eficazes para alergias alimentares é fundamental e depende da
compreensão molecular dos alérgenos alimentares.

Considerações Finais

A compreensão aprofundada da alergenicidade dos alimentos e o desenvolvimento de estratégias de


processamento para reduzi-la têm o potencial de melhorar a segurança alimentar e a qualidade de vida
das pessoas com alergias alimentares. Além disso, avanços na área de diagnóstico e tratamento
oferecem esperança para um futuro em que as alergias alimentares sejam gerenciadas de forma mais
eficaz.

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