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Poder Judiciário

Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba


Gabinete da Desembargadora Maria de Fátima Moraes Bezerra Cavalcanti

Acórdão
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000092-42.2009.815.0301 – Pombal
RELATORA : Des.ª Maria de Fátima Moraes Bezerra Cavalcanti
APELANTE : Gilvam Grigório da Silva
ADVOGADO : Admilson Leite de Almeida Júnior – OAB/PB 11211
APELADO : Josiana Josias Alves da Silva
ADVOGADO : Defensor Público

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE


CASAMENTO C/C IMPUGNATÓRIA DE PATERNIDADE.
VÍCIO. ERRO ESSENCIAL. PROVAS SATISFATÓRIAS.
REQUISITOS AUTORIZADORES. ART. 1.556 E ART. 1.557,
INCISO I DO CC. REFORMA DA SENTENÇA.
PROVIMENTO DO APELO.

Nos termos do art. 1.556 do CC, "o casamento pode ser anulado
por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao
consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro".

Devido o acolhimento do pedido de anulação do casamento por erro


essencial relacionado a comportamentos anteriores do cônjuge, que
somente foram descobertos após a realização.

O erro sobre a honra e boa fama do cônjuge está relacionado a


comportamentos anteriores ao casamento, dos quais o nubente não
tinha conhecimento, e que, quando descobertos, tornou
insuportável a vida em comum.

Considerando a existência de provas capazes de macular o ato, por


vício, ressoa evidenciada a anulação do casamento, irradiando os
efeitos dela decorrente. Sentença reformada.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos, acima identificados:

ACORDA a Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba,


por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO APELO.

Apelação Cível nº 0000092-42.2009.815.0301


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RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível (fls. 139/145) interposta por Gilvam Grigório


da Silva buscando reformar a sentença (fls. 131/133) proferida pelo Juiz de Direito da
3ª Vara da Comarca de Pombal, nos autos da Ação de Anulação de Casamento c/c
impugnatória de paternidade promovida pelo apelante em face do Josiana Josias
Alves da Silva, que julgou parcialmente procedente para declarar que o apelante “não
é o pai biológico do menor Ângelo Alves da Silva, determinando a exclusão de seu nome do
assento de nascimento do menor, e julgo improcedente o pedido de anulação do casamento por
erro essencial”.

Ressaltou a inexistência dos requisitos para anulação do casamento.

Em apelação, o recorrente alega: 1) somente após algumas discussões


ocorridas depois da concretização do matrimônio ficou sabendo que não era o pai do
menor Ângelo, embora o tenha reconhecido como filho e o registrado; 2) tal
comprovação veio a ser ratificada com o resultado do exame de DNA; 3) a apelada
afirmou que durante o período do namoro não lhe foi fiel; 4) ao casar não tinha
conhecimento da infidelidade e que não era o possível pai criança; 5) o casamento
somente se realizou por conta do estado de gravidez; 6) houve erro essencial quanto a
boa honra e a boa fama da recorrida, dada a falsa percepção que tinha da apelada . Ao
fim, requer a reforma da sentença.

Ausência de contrarrazões, fls. 192

A Procuradoria de Justiça, em parecer, opinou pelo provimento do


apelo, pois os “elementos caracterizadores do erro essencial sobre a pessoa do cônjuge,
motivador da anulação do casamento entre parte, foram evidenciados”, fls. 158/160.

VOTO

O autor, Gilvam Grigório da Silva, pleiteou a anulação do casamento


realizado com Josiana Josias Alves da Silva, sob o argumento de que houve erro
essencial quanto à apelada. Também se insurgiu no tocante a paternidade de Ângelo
Alves da Silva.

Sustenta que enamoraram por aproximadamente um ano, tempo em que


a promovida engravidou, circunstância que a motivou a contrair núpcias.

Logo após o casamento, precisamente quatro meses depois, a criança


nasceu, e o reconheceu como filho.

No entanto, durante a convivência, os desentendimentos surgiram,


culminando com discussões, oportunidades em que a esposa revelou, concomitante ao
então namoro, mantinha relações sexuais com terceiros, e não sabia precisar se ele era o
pai da criança.

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Diante dessa situação, houve rompimento do enlace, com a realização
do exame de DNA no menor Ângelo Alves da Silva, cujo resultado foi de que o
apelante não é seu pai biológico dele, fls. 25.

Por força dessa circunstância, promoveu a presente ação, que foi julgada
parcialmente procedente, apenas para declarar que o apelante não é pai biológico do
menor.

Deixou de acolher o pedido de anulação do casamento “pois não há


qualquer conduta que desabone a parte demandante em relação ao meio social por ela
frequentada, e, durante o namoro não existe uma obrigação de fidelidade, existe dever moral, em
alguns tipos de namoro, e isso não ficou claro nos depoimentos juntados aos autos. Não é
possível que em pleno século XXI alguém afirme que foi obrigado a casar porque sua namorada
estava grávida, e isso não significa que ela fosse uma desonrada”.

Com efeito, pelo momento, a questão a ser avaliada cinge-se tão somente
a possibilidade de se anular o casamento das partes, sob a alegação de erro essencial
sobre a pessoa do cônjuge virago.

O Código Civil dispõe sobre a anulação de casamento:

Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por
parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.

Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:


I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal
que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne
insuportável a vida conjugal;
III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não
caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz
de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;

No caso em análise, alega o apelante que houve erro quanto à pessoa da


apelada no que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, erro este que
tornou insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado, ora recorrente.

Por erro essencial compreende-se aquele que influenciou diretamente


um dos cônjuges na sua manifestação de vontade. Vale dizer, o erro deve ser
determinante, de modo a concluir-se que, sem ele, a pessoa nem teria cogitado em se
casar.

Como se infere dos autos, tal erro essencial diz respeito ao fato de o
recorrente ter contraído núpcias, voluntariamente, ao compreender que seria o pai da

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criança, pois, ao seu entender teria vivenciado um relacionamento com fidelidade, sem
jamais desconfiar de relacionamentos paralelos da mulher.

Ao pensar na fidelidade da parceira, correspondente, no mínimo, ao


comportamentode boa honra, boa fama, o que seria conduta normal de um casal
enamorado.

Com o passar dos dias, essa não foi a realidade encontrada, pois o
apelante se deparou com notória infidelidade, notadamente ao realizar o exame de
DNA e ficar constatado não ser o pai da criança, que registrou com seu filho biológico.

Essa circunstância é bem razoável para “duvidar” da boa fama da


parceira, circunstância que ele desconhecia e apenas ficou ciente após o casamento e
nascimento da criança, situação que tornou insuportável a vida em comum.

Aliás, a apelada, no seu depoimento constante em CD, afirmou que ao


casar, o apelante não sabia das traições, muito menos de que não seria o pai do infante.
Afirmou, ainda, que o casamento foi motivado pela gravidez.

Pelos depoimentos, bem se percebe que o erro essencial se mostra


evidente, vez que as dúvidas quanto à boa fama e a boa honra da recorrida se
revelaram após a realização do casamento.

Afinal, "o erro ou ignorância é o resultado de uma falsa percepção, noção, ou


mesmo da falta (ausência) de percepção sobre a pessoa, com que se está convolando núpcias [...]
Há no erro, desse modo, um falso conceito (falsa ideia) ou uma falta de conceito sobre a
realidade, motivo pelo qual o agente (em virtude dessa visão deturpada) celebra o negócio.
Assim, o erro há de ser o motivo determinante do casamento. Se o cônjuge conhecesse aquela
situação, não teria casado. “ (Processo nº 00048006120178070016 (1165794), 2ª Turma Cível
do TJDFT, Rel. João Egmont. j. 22.04.2019, DJe 24.04.2019).

Assim, o comportamento pessoal e social que o cônjuge virago levava


antes do casamento, somente veio ao conhecimento do apelante após a sua
concretização, sendo certo que é motivo suficiente para invalidá-lo, dada a falsa
percepção sobre a boa conduta da pessoa com quem se relacionava.

Aliás, como bem realçado no parecer do Parquet, “a própria apelada, em


sua oitiva, confirmou os fatos alegados na inicial, e nem ao menos soube explicar a razão de ter
enganado o namorado, ora apelante, na época.

Restou demonstrado, também, que as núpcias só se convolaram e razão da


suposta paternidade, sem a qual o autor não teria casado com a Sra. Josiana”, fls. 160.

Por isso, diversamente do entendimento esposado pelo magistrado a


quo, o pedido de anulação do matrimônio se mostra autorizado, exatamente pelo que
preceitua o CC, art. 1557, inciso I.

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Neste cenário, dou provimento ao apelo, para reformar o capítulo da
sentença impugnado, para julgar procedente o pedido de anulação do casamento
formalizado entre Gilvam Grigório da Silva e Josiana Alves da Silva, com base no art.
1.557, inciso I do CC.

Após o trânsito em julgado, expeça-se mandado de averbação para fins


de cumprimento do preceituado na Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973,
notadamente o art. 29, I, art. 100.

Honorários advocatícios a serem suportados integralmente pela apelada,


fixados em R$1.000,00 com base no art. 85, §8º do CPC, suspensa, porém, a sua
exigibilidade, em função da gratuidade da justiça deferida à recorrida.

É como voto.

Presidiu a sessão o Exmº. Des. José Ricardo Porto. Participaram do


julgamento, eminente relatora Desa. Maria de Fátima Moraes Bezerra Cavalcanti, o
Des. José Ricardo Porto e o Des. Leandro dos Santos. Presente à sessão a Exmª. Drª.
Vanina Nóbrega de Freitas Dias Feitosa, Procuradora de Justiça.

Sala de Sessões da Primeira Câmara Cível “Desembargador Mário


Moacyr Porto” do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, em 08 de outubro de 2019.

Desa Maria de Fátima Moraes Bezerra Cavalcanti


RELATORA
G/04

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