Você está na página 1de 7

1ª VARA DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COMERCIAIS E ACID. TRAB.

DE IPIAÚ

GILBERTO SANTOS NASCIMENTO, brasileiro, casado, filho de Lidia Oliveira dos Santos e pai ignorado, CPF
003.429.175-01, RG 1116030217, SSP-BA, sem endereço eletrônico, residente e domiciliado na Rua Marilia
Rocha, bairro Ubirajara Costa, nº 73, Ipiaú/BA, CEP 45570-000, telefone (73)9 9947-6026, através da
Defensoria Pública do Estado da Bahia, por um de seus membros infrafirmado, constituído na forma do art.
128, inciso XI, da Lei Complementar Federal, n° 80/94 c/c a Lei Complementar Estadual n° 26/06,
contando-se-lhe em dobro todos os prazos, vem, respeitosamente, perante V. Ex.ª, com fulcro na Lei n°
8.560/96, propor a presente:

AÇÃO DE NEGATÓRIA DE PATERNIDADE CUMULADA COM A INVALIDAÇÃO DE ASSENTAMENTO DE


REGISTRO DE NASCIMENTO

em face de JULIANA SILVA NASCIMENTO, menor impúbere, nascida aos 08/07/2012, neste ato
representada por sua genitora, NORMACI JESUS SILVA, brasileira, filha de Nelson da Conceição Silva e
Andrelina Laurinda de Jesus, RG nº 13.739.461-64 e CPF nº 026.320.275-51, residente e domiciliada na
Rua Esperança, nº 70, Bairro Euclides Neto, Ipiaú/BA, CEP 45570-000, telefone (73)9 8874-6968
consubstanciada nos motivos de fato e fundamentos jurídicos a seguir expostos:

1. DA JUSTIÇA GRATUITA

Inicialmente, requer sejam concedidos os benefícios da Justiça Gratuita, na medida em que o


Requerente se afigura carente de recursos financeiros, não podendo arcar com custas processuais e
honorários advocatícios, nos termos do art. 98 e 99 do Código de Ritos de 2015.

É dito isso, uma vez que o autor, não aufere ganho econômico suficiente para arcar com as
custas processuais. Em razão da insuficiência financeira do postulante, verifica-se, portanto, que ele não
pode custear com o adiantamento das despesas processuais, nem mesmo de forma parcelada ou diferida.

2. DA INEXISTÊNCIA DE ENDEREÇO ELETRÔNICO

DEFENSORIA PÚBLICA DE IPIAÚ


Rua Antonio Augusto Sá, nº 46, Conceição. Ipiaú/Bahia
CEP: 45570-000
As partes, em virtude da carência de recursos financeiros não dispõem de endereço eletrônico
(email). Esta circunstância, entretanto, não pode ser interpretada em desfavor das mesmas nem mesmo
acarretar, eventualmente, extinção de processo sem julgamento de mérito, em razão do que dispõe o
artigo 319, § 3º do Código de Processo Civil, sob pena de restar caracterizado óbice ao acesso à Justiça.

3. DOS FATOS

O Requerente manteve um relacionamento esporádico com a genitora da Requerida. Após tal


fato, a representante legal da menor comunicou ao autor que se encontrava gestante.

Assim, acreditando na versão dos fatos apresentada pela genitora da ré, promoveu o registro
civil de nascimento, declarando-o como sua filha JULIANA SILVA NASCIMENTO, nascida em 08/07/2012,
conforme certidão de nascimento em anexo.

Após o nascimento da menor, o Autor prestou toda a assistência material (contribuía com
uma pensão alimentícia) necessária, todavia, passou a desconfiar que a criança não fosse sua filha.

Outrossim, diante da persistência da dúvida, as partes, espontaneamente, submeteram-se à


realização do exame para análise do ácido desoxirribonucleico (DNA), com o fito de averiguar a
paternidade.

A colheita do material genético foi realizada, tendo como resultado conclusivo no sentido de
que o autor NÃO é o genitor da menor JULIANA SILVA NASCIMENTO, conforme documento em anexo.

Insta aduzir a inexistência de paternidade afetiva entre as partes.

Assim, tendo o autor a certeza de que não é o pai biológico da requerida e do resultado do
exame de DNA, vem recorrer ao Judiciário a fim de que seja negada a existência da paternidade, bem como

seja procedida a nulidade do registro civil no tocante ao genitor da menor JULIANA SILVA NASCIMENTO.

4. DA FUNDAMENTAÇÃO JURIDICA

Estado de Filiação é questão que diz respeito à própria condição de pessoa, sendo direito
personalíssimo e indisponível de interesse de todos, inclusive da Requerida. Assiste-lhe, antes de tudo, o
DIREITO de fazer constar de seu registro a verdade, ter conhecimento de quem seja o seu verdadeiro pai.

DEFENSORIA PÚBLICA DE IPIAÚ


Rua Antonio Augusto Sá, nº 46, Conceição. Ipiaú/Bahia
CEP: 45570-000
Diante disso, a ação negatória de paternidade não possui os exíguos prazos decadenciais de
outrora, como afirma, inclusive, o Prof. Carlos Alberto Gonçalves:

A rigidez desse sistema vem sendo abrandada pela jurisprudência,


especialmente em face do progresso científico, que permite afastar, com
absoluta certeza, por meio do exame de DNA, a paternidade biológica.

Não pode desejar a sociedade que prevaleça por mero rigor formal e em desrespeito à
realidade dos fatos, uma mentira, especialmente quando diz respeito ao estado de filiação, direito
indisponível e personalíssimo. Soa absurdo fazer prevalecer no registro de assentamento do Menor o nome
de um pai que na realidade não o é. É o que se pretende provar nos presentes autos.

É bom ressaltar que houve no presente caso um reconhecimento espontâneo feito pelo autor
na mais absoluta boa fé. E a boa fé merece sempre todo o amparo e o prestígio do bom direito, devendo
sempre prevalecer em detrimento daqueles que usam de artifícios com o fim de enganar terceiros. Esta é a
regra em matéria de direito.

Em questões dessa natureza interessa a todos o prevalecimento da verdade real. De acordo


com este entendimento está o ensinamento do Festejado Civilista Caio Mário da Silva Pereira:

Na paternidade reconhecida o pai concede status ao filho, que o seja


biologicamente. Em contendo o ato uma proclamação de paternidade que não
corresponde à realidade (o pai reconhece como seu filho que o não é), o
reconhecimento, embora formalmente perfeito, e até inspirado em pia causa,
não pode produzir o efeito querido, e será anulado por falsidade ideológica, em
se provando a inverdade da declaração( wissenserkarung), no pressuposto de
corresponder à verdade, e somente produzirá o efeito que a lei lhe atribui
quando à manifestação formal corresponder o pressuposto fático da relação
biológica paternal subjacente.

Embora seja a certidão de nascimento, um documento que goza de fé pública, há ressalva


para a possibilidade de alegação contrária no art. 1.604 do Código Civil de 2002. No caso em tela, o
requerente não possui qualquer dúvida de que não é o pai da criança.

Art. 1.604 – Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro
de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.

DEFENSORIA PÚBLICA DE IPIAÚ


Rua Antonio Augusto Sá, nº 46, Conceição. Ipiaú/Bahia
CEP: 45570-000
A decisão abaixo colacionada aplica-se ao caso em tela, senão vejamos:

O princípio da irrevogabilidade dos atos do registro civil não é absoluto,


comportando sua anulação quando ocorrem vícios do ato jurídico ou se
demonstrada a falsidade ideológica. (Ac. Unânime da 4a Câm. Civ. do TJSP, AC
194.503, rel. Des. Ferreira de Oliveira, JTJSP, 15:259. No mesmo sentido: RT,
301:273). (grifos aditados)

Portanto, conforme faz prova a documentação anexa, é de se reconhecer a falsidade do


registro de assentamento da criança , determinando-se a exclusão do nome do Autor, bem como os avós
paternos da certidão de nascimento da mesma, uma vez que não se pode refletir em um documento
público um fato que não corresponda à realidade, sendo imperiosa a anulação do registro.

Consoante já explanado, o estado familiar, in casu, encontra-se seriamente vilipendiado, em


razão da publicidade e formalização que foi dada, por meio do assentamento no registro nascimento, a
uma situação inverídica, a saber, uma relação de parentesco inexistente.

Carlos Roberto Gonçalves1, lastreado nos ensinamentos de Serpa Lopes, pontifica:

“O estado é elemento integrante da personalidade e, assim, nasce com a pessoa e


com ela desaparece. Por isso, as ações de estado são imprescritíveis. Se, por um
lado, não se perde um estado pela prescrição, por outro não se pode obtê-lo por
usucapião”. (grifos aditados)

Cuidando-se, como se cuida, de seara tão cara aos direitos cujos fundamentos e eficácia
sofrem recondução à dignidade humana, qualquer óbice formalista, para desconstituição de registros,
exibe-se como rigor vetusto e não autorizado.

A toda evidência, o Ordenamento Jurídico não tolera a perpetuação de consectários de falsas


percepções acerca da realidade. O erro, provocado 2 ou não, acarretou a alardeada situação de fato que não
acha guarida na verdade mundana.

Abaixo, representativo precedente judicial:

Negatória de paternidade com exoneração de alimentos. Exame de DNA


1
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 1, parte geral. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 170.
2
Dolo.
DEFENSORIA PÚBLICA DE IPIAÚ
Rua Antonio Augusto Sá, nº 46, Conceição. Ipiaú/Bahia
CEP: 45570-000
conclusivo pela exclusão. Inadmissibilidade do argumento de que a paternidade
socioafetiva deva em todo e qualquer caso prevalecer sobre os vínculos
biológicos. Hipótese ademais em que os laços entre o autor e a criança não
decorreram da intenção autônoma de afirmação de paternidade socioafetiva,
mas do mesmo erro de fato que levou o autor a registrar o menor como seu
filho. Afeto que não pode nesse caso ser óbice à busca da verdade e se prestar a
criar fato consumado motivado por falsa percepção da realidade, com todas as
relevantes consequências jurídicas daí decorrentes. Registro civil que deve
obedecer ao princípio da veracidade, quando feito com intuito de espelhar os
laços biológicos. Sentença de improcedência confirmada. Apelação do Ministério
Público desprovida. (Apelação 1165830320078260009, TJ-SP, 2ª Câmara de
Direito Privado, Rel. Fabio Tabosa, 29/05/2012). (grifos aditados)

Importante salientar que a prova material que excluiu a paternidade do Requerente sobre o
Requerido, além de inconteste, só veio concretizar o que já era um fato para os mesmos: A completa
ausência de relação afetiva entre o até então pai, e seu filha. Nesse sentido, a jurisprudência tem seguido
pelo caminho da desconstituição da paternidade, vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. EXAME DE DNA.


AUSÊNCIA DE AFETIVIDADE ENTRE PAI REGISTRAL E FILHO. ANULAÇÃO DE
REGISTRO DE NASCIMENTO. POSSIBILIDADE, NA HIPÓTESE. No caso, não há
razão para se prestigiar uma paternidade registrada em estado de erro,
principalmente quando inexistente paternidade socioafetiva e ausente a
paternidade biológica, confirmada por exame de DNA. Recurso desprovido.
(Apelação Cível Nº 70026016311, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS.)

O Estado já se posiciona no sentido de que não há qualquer benefício para a criança, a


manutenção de uma paternidade apenas jurídica, in verbis:

AÇÃO NEGATORIA DE PATERNIDADE. ANULACAO DE REGISTRO DE

DEFENSORIA PÚBLICA DE IPIAÚ


Rua Antonio Augusto Sá, nº 46, Conceição. Ipiaú/Bahia
CEP: 45570-000
NASCIMENTO. PRESUNCAO PATER EST. PRINCIPIO DA VERDADE REAL.
PREVALENCIA DA PATERNIDADE BIOLOGICA. Apelação Cível. Direito de
Família. Ação negatória de paternidade c/c anulação de registro de nascimento.
Dois exames de DNA que afastam, em definitivo, a paternidade. Autor que
registrou a menor em seu nome, sob o manto da presunção "pater est". Inexiste
qualquer benefício para a criança a manutenção de uma paternidade
exclusivamente jurídica, permeada por sentimentos de rejeição, traição e
mágoa. O autor, embora tenha criado a menor como se fosse sua filha, desde que
descobriu a traição, a vê como a materialização do adultério, com todos os
sentimentos negativos que a situação envolve. Direito da criança de perseguir a
verdade real acerca de sua filiação, através de ação investigatória de
paternidade. Prevalência da paternidade biológica sobre a afetiva. Sentença que
se mantém, desprovendo-se o recurso. (TJRJ. APELAÇÃO CÍVEL -
2007.001.15172. JULGADO EM 21/08/2007. DECIMA SEGUNDA CÂMARA CIVEL
- Unanime. RELATORA: DESEMBARGADORA DENISE LEVY TREDLER)

É válido também, ressaltar a necessidade da presente demanda para que o direito da


requerida de obter a verdade de sua real filiação seja respeitado por todas as partes envolvidas no caso.

3. DOS PEDIDOS

Por tudo quanto exposto, requer:

a) A concessão dos benefícios da justiça gratuita, nos termos do arts. 98 e 99 do


CPC/2015;

b) Seja recebida a presente petição inicial, a despeito da inexistência de endereço


eletrônico das partes, a teor do §º 3, do art. 319 do CPC/2015;

c) O desinteresse na audiência de conciliação/mediação, nos termos do art. 334, §


4º do CPC/2015;

d) Seja declarada a inexistência de relação de filiação entre o Requerente e a


Requerida, bem como a nulidade do assentamento do registro de nascimento

DEFENSORIA PÚBLICA DE IPIAÚ


Rua Antonio Augusto Sá, nº 46, Conceição. Ipiaú/Bahia
CEP: 45570-000
da menor, procedendo-se, consequentemente: (a) à exclusão do nome do autor,
GILBERTO SANTOS NASCIMENTO, do assentamento do registro civil de
nascimento de JULIANA SILVA NASCIMENTO,; (b) à exclusão do patronímico
NASCIMENTO do nome da criança; (c) à exclusão dos nomes dos avôs paternos,
a srª. Lidia Oliveira dos Santos;

e) Seja intimado o membro do Ministério Público para intervir no feito, nos


termos do art. 178, II do CPC/2015;

f) Seja determinada a expedição de mandado ao competente Cartório de Registro


Civil das Pessoas Naturais, a fim de promover as devidas alterações;

g) Seja condenada a parte ré nas custas processuais e nos honorários


advocatícios de sucumbência, nos termos do art. 85, parágrafo 2° do CPC/2015,
sendo que estes deverão ser depositados no Fundo de Assistência Judiciária da
Defensoria Publica do Estado da Bahia- FAJDPE/BA, com fulcro no art. 265 da
Lei Complementar n° 26/2006 e inciso I do art. 3° da Lei 11.045/2009,
mediante pagamento em boleto bancário a ser emitido pelo Defensor Publico
através do site da Defensoria Publica do Estado da Bahia;

h) Produção como meio de prova, prova documental e de oitiva de testemunhas


arroladas posteriormente.

Atribui-se à causa o valor de R$ 1.212,00 (mil e duzentos e doze reais).

Nestes termos,
Pede deferimento.

Ipiaú/BA, 15 de Junho de 2022.

RAPHAEL VARGA SCORPIÃO


DEFENSOR PÚBLICO

DEFENSORIA PÚBLICA DE IPIAÚ


Rua Antonio Augusto Sá, nº 46, Conceição. Ipiaú/Bahia
CEP: 45570-000

Você também pode gostar