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PARTE I – NOÇÕES GERAIS 1. 2. O objecto do Direito do Trabalho
1. Introdução ao Direito do Trabalho (DT)
1. 1. Noção
De acordo com o Prof. Jorge Leite, o Direito do Trabalho é o
conjunto de normas jurídicas, de origem estadual e
convencional, que visam regular, com vista à sua
normalização, as relações individuais e coletivas que têm
como seu elemento unificante e desencadeante o trabalho
assalariado.
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A resposta é, de acordo com o Prof. António Monteiro Fernandes,
negativa.
O DT não é o Direito de todo o trabalho. Não cabem no seu objecto
todas as modalidades de exercício de uma actividade humana
produtiva ou socialmente útil.
Assim, importa determinar qual é a modalidade de trabalho que é
tratada pelo DT.
Em primeiro lugar, e partindo do pressuposto de que o Direito regula
fenómenos de relação, podemos excluir todas as actividades
desenvolvidas pelos indivíduos para a satisfação de necessidades
próprias (por exemplo: a preparação de uma refeição). Contudo, se
essa mesma actividade for realizada em proveito alheio já pode
recair no âmbito do DT.
Em segundo lugar, o DT diz respeito às formas de trabalho livre,
voluntariamente prestado afastando assim as actividades forçadas
ou compelidas.
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A designação “Direito do Trabalho” (DT) parece à
partida inteiramente esclarecedora quanto à matéria
que trata: um conjunto de normas cujo objecto é o
trabalho humano, nas várias modalidades em que ele
se apresenta na vida social. Será, então, correta a
noção de que nele se contêm as normas reguladoras de
todas as formas pelas quais o trabalho se revela e
concretiza na vida social?
A terceira nota refere-se a ideia que só interessa ao
DT o trabalho remunerado, i.e., aquele que se realiza
mediante uma contrapartida económica fornecida
pelo seu beneficiário directo. O DT não disciplina o
trabalho gratuito.
Depois, a quarta nota diz respeito ao facto do DT
disciplinar as relações de trabalho subordinadas (i.e.,
no quadro de uma actividade que é organizada e
dirigida por outrem).
Por fim, importa notar que nem todo o trabalho
dependente ou juridicamente subordinado é objecto
de regulação pelo DT. O trabalho na Administração
Pública é disciplinado pelo Direito Administrativo.
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Contudo, importa notar que 700 000 destes

trabalham para a Administração Pública (AP).
As situações abrangidas pelo Direito do Trabalho (DT)
correspondem ao modelo largamente dominante no O Professor António Monteiro Fernandes apresenta o
mercado de trabalho em Portugal. seguinte quadro nas suas lições:

Numa população total de 10 444 000 pessoas, População ativa 5 222 600

estavam ocupadas em 2022, de acordo com a População ocupada 4 908 700

PORDATA, 4 908 700 pessoas. Destas, 4 164 700 Trabalhadores por conta de 4 164 700
outrem
indivíduos, ou seja, 80 % da população ocupada são Com contrato sem termo; 3 478 000
trabalhadores por conta de outrem, exercem a sua
Com contrato a termo 573 300
actividade remunerada em regime de subordinação,
Com outras situações 113 400
estariam cobertos pela regulamentação laboral.
Trabalhadores por conta 711 400
própria
Outras situações 32 600

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O DT é o ramo de Direito que regula o trabalho
subordinado, hétero-determinado ou não-autónomo.
À prestação de trabalho com esta característica
corresponde, um título jurídico próprio: o contrato de
trabalho. É através dele que “uma pessoa se obriga,
mediante retribuição, a prestar a sua actividade a
outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e
sob a autoridade destas” (ver o artigo 11º do Código
do Trabalho).
O DT apresenta-se assim sob o signo da protecção ao
trabalhador e como um conjunto de limitações à
autonomia privada individual.
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O contrato de trabalho é enquadrado por uma
constelação de normas que vão desde as condições
pré-contratuais, passam pelos direitos e deveres
recíprocos das partes, atendem com particular
intensidade aos termos em que o vínculo pode
cessar, e vão até aspectos pós-contratuais (como a
preferência na readmissão e a abstenção de
concorrência).
Para além das relações individuais fundadas no
contrato de trabalho entre um empregador e um
trabalhador, o DT abrange também as relações
colectivas que se estabelecem entre organizações
de trabalhadores (por exemplo: os sindicatos) e
empregadores, organizadas ou não.
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1. 3. As funções do DT
A) A função mais correntemente atribuída ao DT é,
justamente, a de compensar a debilidade
contratual originária do trabalhador, no plano
individual. Em suma, estamos perante uma função
compensatória e tutelar.
Este objectivo é prosseguido, de acordo com o Prof.
António Monteiro Fernandes, através de 4 vias:
Em primeiro lugar, pela limitação da autonomia
privada individual, i. e., pelo condicionamento da
liberdade de estipulação no contrato de trabalho
(por exemplo: definição normativa de condições
mínimas de trabalho).
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B) O DT tem também uma função garantística (i.e.,
de promover a especifica realização, no domínio
das relações laborais, de valores e interesses
reconhecidos como fundamentais na ordem
jurídica global). Dado o elevado grau de implicação
da pessoa do trabalhador – o trabalho não pode
afectar negativamente a sua vida, a sua integridade
física e psíquica, a sua dignidade moral e social. Dai
a ligação estreita entre o ordenamento laboral e os
direitos fundamentais na Constituição (CRP).
C) A função padronizadora é a terceira função do
DT e diz respeito ao funcionamento da economia: é
a de garantir uma certa padronização das
condições de uso da força de trabalho.
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Em segundo lugar, o ordenamento laboral estrutura
e delimita os poderes de direcção e organização do
empregador, submetendo-os a controlo externo
(administrativo, judicial e sindical).
Em terceiro lugar, o ordenamento laboral organiza
e promove a transferência do momento contratual
fundamental do plano individual para o colectivo.
Em quarto lugar, o DT estrutura um complexo
sistema de tutela dos direitos dos trabalhadores
que tende a suprir a sua diminuída capacidade
individual de exigir e reclamar.
A padronização tem um duplo efeito regulador:
condiciona a concorrência entre as empresas, ao
nível dos custos do factor trabalho; e limita a
concorrência entre trabalhadores, na procura de
emprego e no desenvolvimento das relações de
trabalho.
Neste sentido, o DT atua à margem e contra o
mercado em virtude de limitar a plena flexibilidade
no uso de trabalho.
D) A quarta e última função do DT é a função de
ajustamento. As normas laborais devem adequar-
se e compatibilizar-se às exigências da gestão das
empresas e às condições da economia.
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Não há emprego sem empresas.

Assim, tradicionalmente, o trabalho independente
A lei do trabalho tem uma função de ajustamento e o trabalho na administração pública não era
na medida em que organiza e estrutura as relações abrangido pelo DT. Mas as fronteiras não são fixas:
de trabalho face à evolução das condições reais da o ordenamento privatístico do trabalho tende a
economia e das empresas. alastrar a fenómenos que, originariamente, por não
corresponderem de modo integral às
1. 4. As fronteiras móveis do Direito do Trabalho características do trabalho assalariado
(juridicamente subordinado) estavam excluídos do
O objeto do DT define-se em torno da prestação de seu âmbito.
trabalho subordinado, livre, remunerado, no
quadro de uma relação contratual jurídico-privada. Aponta-se correntemente uma tendência
expansiva do DT orientada pelas ideias de
Para lá destas fronteiras, existem modalidades debilidade contratual e de dependência
jurídicas de prestação de trabalho em beneficio de económica.
outrem cuja regulação escapa ao domínio do DT.
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Essa tendência manifesta-se, em particular, quanto

a duas modalidades de prestação de trabalho Nestas situações de dependência económica, há
tradicionalmente excluídas do objecto do DT. uma tendência para estender a tais modalidades
de trabalho os dispositivos fundamentais da
A primeira é a que genericamente se designa por proteção juslaboral (ver o artigo 10º do CT).
trabalho autónomo ou autodeterminado.
Caracteriza-se por a actividade do prestador ser
programada e conduzida pelo seu próprio critério
de organização e funcionalidade, tendo em vista a
obtenção de um resultado devido a outrem. Por
exemplo: o advogado; o empreiteiro; o
cabeleireiro.

O trabalho autónomo está fora do objecto do DT.

Contudo, há cada vez mais situações de trabalho
autodeterminado mas dependente.
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Artigo 10.º
Situações equiparadas
1 - As normas legais respeitantes a direitos de personalidade, igualdade e não
discriminação e segurança e saúde no trabalho, bem como os instrumentos de
regulamentação coletiva de trabalho negociais em vigor no âmbito do mesmo
setor de atividade, profissional e geográfico, são aplicáveis a situações em que
ocorra prestação de trabalho por uma pessoa a outra, sem subordinação
jurídica, sempre que o prestador de trabalho deva considerar-se na
dependência económica do beneficiário da atividade.
2 – (…).Para efeitos do presente Código e sem prejuízo do disposto na Lei n.º
101/2009, de 8 de setembro, que estabelece o regime jurídico do trabalho no
domicílio, considera-se haver dependência económica sempre que o prestador
de trabalho seja uma pessoa singular que preste, diretamente e sem
intervenção de terceiros, uma atividade para o mesmo beneficiário, e dele
obtenha o produto da sua atividade de acordo com o disposto no artigo 140.º
do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança
Social.
3 – (…).
4 – (…).
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1. As normas aplicáveis aos trabalhadores em
regime de “nomeação” (exemplo: forças armadas,
polícias e diplomatas);
2. O do “contrato de trabalho em funções públicas”
que cobre todo o universo restante da
administração directa e indirecta do Estado bem
como as administrações regionais e autárquicas.
Este contrato de direito público é regulado pela Lei
nº 35/2014 que aprovou a Lei Geral de Trabalho
em Funções Públicas (LGTFP).
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A segunda diz respeito às relações jurídico-públicas
do trabalho, com especial relevo para as que se
estabelecem entre o Estado e os seus
trabalhadores (i.e., os “funcionários públicos”).
Contudo, assiste-se em Portugal a um movimento
forte de privatização do emprego público.
Assim, após a entrada em vigor da Lei 12-A/2008,
de 27 de Fevereiro, e outros diplomas legais,
existem três estatutos jurídicos no sector público:
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Contudo, o artigo 4º desta lei manda aplicar
diversas disposições do Código de Trabalho (CT) e
utiliza o regime do CT como direito subsidiário. Por
exemplo, vejamos o artigo 68º, nº 1, da LGTFP
Artigo 68.º - Remissão
1 - Sem prejuízo do disposto na presente lei, é
aplicável aos trabalhadores titulares de um vínculo
de emprego público o regime previsto no Código
do Trabalho em matéria de trabalho a tempo
parcial e de teletrabalho.
Tal significa que os artigos 165º e seguintes do CT
são aplicáveis aos trabalhadores da AP com um
vínculo de emprego público.
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3. e, ainda, o contrato de trabalho, regulado pelo 1. 5. O conteúdo do Direito do Trabalho

Código de Trabalho, aplicável, em geral, ao pessoal
do sector empresarial do Estado (ver o Artigo 17º
do DL 118/2013, de 3 de Abril).
O sector empresarial do Estado compreende: as
empresas publicas e as empresas participadas bem
como as entidades públicas empresariais (por
exemplo: os hospitais).
Assim, é notória a penetração da disciplina
constante do Código de Trabalho no emprego
público.
De acordo com o Prof. António Monteiro Fernandes
a prestação de trabalho subordinado pode estar na
origem de relações jurídicas de diversa natureza.
Assim temos:
a) Relação individual de trabalho (cujos sujeitos são
o trabalhador e a entidade empregadora, e cujo
facto determinante é o contrato celebrado entre
estes.

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b) Relação entre o empregador e o Estado – cujo
conteúdo consiste num conjunto de deveres que o
empregador deve observar no desenvolvimento da
relação individual de trabalho. Estes deveres
assentam na “tutela dos interesses gerais que
relevam do trabalho e cujo cumprimento é
fiscalizado pela administração estadual do trabalho
e sancionado por meios de natureza pública”);
Assim, nas relações do primeiro tipo estão em
causa interesses privados, nas de segundo,
interesses públicos; na do terceiro, interesses
coletivos, de classe, de categoria profissional ou de
ramo de atividade económica.

c) Relações coletivas de trabalho – em que os

sujeitos da relação individual aparecem
consideradas sob o angulo das categorias em que
se inserem. A partir destas relações pode “resultar
a regulamentação de relações individuais, por via
de convenção coletiva”.
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