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MANUAL MSD
Versão para Profissionais de Saúde
Fibrilação atrial
(Fib A)
Por L. Brent Mitchell , MD, Libin Cardiovascular Institute of Alberta, University of Calgary
Revisado/Corrigido: jan 2023
Fibrilação atrial é ritmo atrial irregular e rápido. Os sintomas incluem palpitação e, às vezes, fraqueza, intolerância
a esforço, dispneia e pré-síncope. Em geral, pode haver formação de trombos atriais, acarretando risco
significativo de acidente vascular encefálico por embolia. O diagnóstico é realizado por ECG. O tratamento consiste
no controle da frequência com fármacos, prevenção de tromboembolia com anticoagulação e, às vezes, conversão
ao ritmo sinusal com fármacos ou cardioversão.
Atribuiu-se a fibrilação atrial a múltiplas ondas pequenas com reentrada caótica dentro dos átrios. Entretanto,
em muitos casos, o disparo de um foco ectópico dentro de estruturas venosas adjacentes aos átrios (em geral,
as veias pulmonares) é responsável pelo início e, talvez, pela manutenção da fibrilação atrial. Na fibrilação
atrial, os átrios não se contraem e o sistema de condução AV é bombardeado por muitos estímulos elétricos,
acarretando inconsistência de transmissão do impulso e frequência ventricular irregularmente irregular, que
normalmente se encontra nos limites de frequência da taquicardia.
A fibrilação atrial é uma das arritmias mais comuns, acometendo entre 3 e 6 milhões de adultos nos Estados
Unidos. Homens e caucasianos têm maior probabilidade de fibrilação atrial do que mulheres e negros. A
prevalência aumenta com a idade, uma vez que compromete quase 10% dos indivíduos com > 80 anos. A
fibrilação atrial tende a ocorrer em pacientes com cardiopatia subjacente.
A fibrilação atrial também pode prejudicar o débito cardíaco; perda da contração atrial pode diminuir o débito
cardíaco em cerca de 10% com frequência cardíaca normal. Essa diminuição geralmente é bem tolerada, exceto
quando a frequência ventricular torna-se muito rápida (p. ex., > 140 bpm), ou quando os pacientes já têm
débito cardíaco limítrofe ou baixo. Nesses casos, pode haver insuficiência cardíaca.
Classificação CHA(2)DS(2)-
As causas mais comuns da fibrilação atrial são
VASc da fibrilação atrial para
Doença coronariana
Cardiomiopatia
Hipertireoidismo
Bebedeira ou consumo abusivo de álcool de uma única vez (síndrome do coração pós-feriado)
Embolia pulmonar
Miocardite
Pericardite
Fibrilação atrial isolada é a fibrilação atrial sem causa identificável em pacientes com < 60 anos.
Fibrilação atrial persistente é a fibrilação atrial contínua que dura > 1 semana.
Fibrilação atrial persistente de longa da com duração > 1 ano, mas ainda há a possibilidade de restaurar o
ritmo sinusal.
Fibrilação atrial permanente não pode ser convertida em ritmo sinusal (o termo também abrange os
pacientes para os quais foi tomada a decisão de não tentar a conversão para o ritmo sinusal). Quanto mais
longa a existência da fibrilação atrial, menor é a probabilidade de conversão espontânea e mais difícil é a
cardioversão em virtude do remodelamento atrial (alterações induzidas por frequência atrial rápida na
eletrofisiologia atrial que são dominadas por diminuição da refratariedade atrial e também podem incluir
aumento de dispersão espacial da refratariedade atrial, velocidade de condução atrial desacelerada ou ambas).
O pulso é irregularmente irregular, com perda das ondas a do pulso venoso jugular. Pode haver deficit de pulso
(a frequência ventricular apical é mais elevada do que aquela palpada no pulso) porque o volume de ejeção do
ventrículo esquerdo nem sempre é suficiente para produzir uma onda de pressão periférica para um
batimento bem correlacionado com o batimento prévio.
Eletrocardiografia (ECG)
Ecocardiografia
O diagnóstico da fibrilação atrial é feito por ECG (ver figura Fibrilação atrial). Os achados incluem
Ausência de ondas P
Presença de ondas f (de fibrilação) entre os complexos QRS; ondas f são irregulares no tempo e na
morfologia; ondulações da linha de base com frequências > 300 bpm, geralmente mais bem vistas na
derivação V1 e nem sempre aparentes em todas as derivações
Fibrilação atrial
Outros ritmos irregulares podem se assemelhar à fibrilação atrial na ECG, mas podem ser distinguidos pela
existência de discreta onda P ou ondas de flutter que, às vezes, podem se tornar mais visíveis com manobras
vagais. O tremor muscular ou a interferência elétrica pode se assemelhar às ondas f, mas o ritmo subjacente é
regular.
A fibrilação atrial também pode produzir um fenômeno que simula ESV ou a taquicardia ventricular (fenômeno
de Ashman). Esse fenômeno normalmente ocorre quando um intervalo R-R curto segue um intervalo R-R longo;
o intervalo mais longo prolonga o período refratário do sistema de condução infra-hisiano e o(s) complexo(s)
QRS subsequente(s) é(são) conduzido de modo aberrante, geralmente com morfologia do ramo direito.
A ecocardiografia é realizada para avaliar os defeitos estruturais cardíacos (p. ex., dilatação atrial esquerda,
alterações da movimentação de parede VE sugestivas de isquemia prévia ou atual, valvopatias e
cardiomiopatia) e para identificar fatores de risco adicionais para acidente vascular encefálico (p. ex., trombo
ou estase sanguínea atrial e placa aórtica complexa). Os trombos atriais têm maior probabilidade de se
localizar nos apêndices atriais, sendo detectados melhor pelo ecocardiograma transesofágico do que pela
ecocardiograma transtorácico.
Nos paroxismos agudos de frequência elevada (p. ex., 140 a 160 bpm), utilizar bloqueadores IV do nodo AV
(para doses, ver tabela Antiarrítmicos). ATENÇÃO: os bloqueadores do nó AV não devem ser utilizados em pacientes
com síndrome de Wolff-Parkinson-White quando uma via acessória AV está envolvida (indicada pela duração de QRS
largos); esses fármacos aumentam a frequência de condução pela via acessória, provocando possivelmente fibrilação
ventricular.
Os betabloqueadores (p. ex., metoprolol, esmolol) são preferidos se houver suspeita de excesso de
catecolaminas (p. ex., em doenças da tireoide ou casos desencadeados por exercício físico).
Os bloqueadores dos canais de cálcio não diidropiridínicos (p. ex., verapamil, diltiazem) também são eficazes. A
digoxina é menos eficaz, mas pode ser preferível se houver insuficiência cardíaca. Esses fármacos podem ser
utilizados por via oral para controle da frequência a longo prazo.
Controle do ritmo
Em pacientes com insuficiência cardíaca ou outro comprometimento hemodinâmico diretamente atribuível à
fibrilação atrial de início recente, está indicada a restauração do ritmo sinusal normal para melhorar o débito
cardíaco. Em outros casos, a conversão da fibrilação atrial ao ritmo sinusal é ideal, mas as fármacos
antiarrítmicos com capacidade de fazer isso (classes Ia, Ic e III) têm risco de efeitos adversos e podem aumentar
a mortalidade. A conversão para o ritmo sinusal não elimina a necessidade de anticoagulação crônica.
Para conversão aguda, podem ser utilizadas cardioversão sincronizada ou fármacos. Antes de tentar converter,
deve-se controlar a frequência ventricular para < 120 bpm, e muitos pacientes devem ser anticoagulados (ver
Prevenção da tromboembolia durante o controle do ritmo). Se fibrilação atrial existir por > 48 horas, deve-se
administrar anticoagulantes por via oral aos pacientes (a conversão, independentemente do método utilizado,
aumenta o risco de tromboembolia). Deve-se manter a anticoagulação por > 3 semanas antes da conversão ou
pode ser administrada por um tempo menor antes da conversão se o ecocardiograma transesofágico (ETE) não
mostrar trombo atrial esquerdo. Deve-se manter a anticoagulação por pelo menos > 4 semanas depois da
cardioversão. Muitos pacientes precisam de anticoagulação crônica (ver Medidas a longo prazo para prevenir
tromboembolia).
Para certos pacientes com fibrilação atrial paroxística recorrente, que conseguem identificar o início da arritmia
pelos sintomas, alguns médicos indicam dose única de flecainida (300 mg para pacientes ≥ 70 kg; caso
contrário, 200 mg) ou propafenona (600 mg para pacientes ≥ 70 kg; caso contrário, 450 mg) que o paciente
pode levar consigo e tomar quando ocorrer a palpitação (abordagem "pill-in-the-pocket"). Essa conduta deve
ser limitada a pacientes sem disfunção do nó SA ou AV, bloqueio de ramo, prolongamento do intervalo QT,
síndrome de Brugada ou doença cardíaca estrutural. Seu risco (estimado em 1%) é a possibilidade de converter
a fibrilação atrial em um ritmo mais lento de flutter atrial com condução 1:1 e frequência de 200 a 240 bpm. A
frequência dessa complicação pode ser reduzida coadministrando um fármaco de supressão nodal AV (p. ex.,
um betabloqueador ou um antagonista do cálcio não diidropiridínico).
Os procedimentos de ablação que alcançam isolamento elétrico das veias pulmonares do átrio esquerdo
podem prevenir a fibrilação atrial sem causar BAV. Em comparação com outros procedimentos de ablação, o
isolamento das veias pulmonares tem índice de sucesso menor (60 a 80%) e maior índice de complicações (1 a
5%). Consequentemente, com frequência reserva-se esse procedimento para os melhores candidatos (p. ex.,
pacientes mais jovens sem doença cardíaca estrutural significativa, pacientes sem outras opções, como aqueles
com FA resistente a fármacos, ou pacientes com disfunção sistólica do ventrículo esquerdo e insuficiência
cardíaca.
Ensaios clínicos randomizados abordando a necessidade de anticoagulação oral de longo prazo após um
procedimento de ablação aparentemente bem-sucedido estão em andamento.
Prevenção de tromboembolia
Prevenção da tromboembolia é um objetivo importante no tratamento de pacientes com fibrilação atrial. As
diretrizes atuais da American Heart Association/American College of Cardiology/Heart Rhythm Society
recomendam o uso da classificação CHA2DS2-VASc e de fatores cardíacos específicos para orientar a terapia
tromboembólica.
São tomadas medidas a longo prazo para prevenir o tromboembolia em certos pacientes com fibrilação atrial
dependendo do seu risco estimado de acidente vascular encefálico versus risco de sangramento (p. ex., de
acordo com a classificação CHA2DS2-VASc e a ferramenta HAS-BLED ).
A conversão da fibrilação atrial com um fármaco antiarrítmico ou com cardioversão com CD leva a um maior
risco de eventos tromboembólicos. São necessárias considerações adicionais ao realizar a cardioversão se um
paciente com fibrilação atrial não passou por anticoagulação. Se cardioversão urgente é necessária por
comprometimento hemodinâmico, a cardioversão é realizada e a anticoagulação é iniciada assim que possível
e continuada por pelo menos 4 semanas. Se o início do episódio atual de fibrilação atrial ocorre claramente
e continuada por pelo menos 4 semanas. Se o início do episódio atual de fibrilação atrial ocorre claramente
dentro de 48 horas, a cardioversão pode prosseguir sem anticoagulação prévia ou subsequente em homens
com classificação CHA2DS2-VASc de 0 e em mulheres com classificação CHA2DS2-VASc de 1 (recomendação
classe IIb).
Se o início do episódio atual de fibrilação atrial não está claro depois de 48 horas, deve-se anticoagular o
paciente por 3 semanas antes e, pelo menos, 4 semanas depois da cardioversão, independentemente do risco
tromboembólico previsto do paciente (recomendação classe I). Como alternativa, iniciar a anticoagulação
terapêutica, fazer ecocardiograma transesofágico (ETE) e, caso nenhum coágulo seja visto no apêndice atrial
esquerdo ou no átrio esquerdo, a cardioversão pode ser realizada, seguida de pelo menos 4 semanas de
anticoagulação (recomendação de classe IIa).
As diretrizes para a terapia antitrombótica na fibrilação atrial diferem de acordo com as regiões. As diretrizes
atuais nos Estados Unidos são:
Recomenda-se terapia anticoagulante oral a longo prazo para pacientes com estenose mitral de origem
reumática, valva cardíaca artificial mecânica e fibrilação atrial não valvar com escore CHA2DS2-VASc ≥ 2
em homens e ≥ 3 em mulheres (recomendação classe I) e pode ser considerada para pacientes com
fibrilação atrial não valvar e escore CHA2DS2-VASc ≥ 1 em homens e ≥ 2 em mulheres (recomendação
classe IIb).
Não se recomenda terapia antitrombótica para pacientes com fibrilação atrial não valvar e escores
CHA2DS2-VASc de 0 em homens e 1 em mulheres (recomendação classe IIa).
Pacientes com fibrilação atrial e valva(s) mecânica(s) cardíaca(s) são tratados com varfarina.
Pacientes com fibrilação atrial e estenose mitral significativa são tratados com varfarina.
Para pacientes com fibrilação atrial não valvar que precisam ser tratados com um anticoagulante oral, fornece-
se uma recomendação classe I para a varfarina com uma razão normalizada internacional (RNI) alvo de 2,0 a
3,0, apixabana, dabigatrana, edoxabana e rivaroxabana. Para pacientes elegíveis para a terapia anticoagulante
com um anticoagulante antagonista da vitamina K (como a varfarina) ou um anticoagulante não antagonista da
vitamina K (como apixabana, dabigatrana, edoxabana ou rivaroxabana), preferem-se os últimos (classe I de
recomendação).
Essas diretrizes gerais são alteradas em pacientes com insuficiência renal mais do que moderada.
O apêndice atrial esquerdo pode ser ligado cirurgicamente ou fechado com um dispositivo transcatéter quando
a terapia antitrombótica apropriada é absolutamente contraindicada.
É possível estimar o risco de sangramento de um paciente específico com quaisquer ferramentas prognósticas,
das quais a mais utilizada é o HAS-BLED (ver tabela Ferramenta HAS-BLED para prever o risco de sangramento
em pacientes com fibrilação atrial). A escala HAS-BLED é mais adequada para identificar as condições que, se
modificadas, reduzem o risco de sangramento do que para identificar os pacientes com risco mais alto de
sangramento que não devem receber anticoagulação.