Conceituar sepse e choque séptico • Os mecanismos propostos para a imunossupressão
-> A sepse em 2016 recebeu uma nova definição (sepse 3) incluem uma mudança de citocinas pró-inflamatórias (TH1) que define como: para citocinas anti-inflamatórias (TH2), produção de • Uma resposta desregulada do hospedeiro à infecção, mediadores anti-inflamatórios (p. ex., receptor de TNF levando à disfunção orgânica aguda. solúvel, antagonista de receptor de IL-1; e IL-10), apoptose Critérios: Infecção suspeita (ou documentada) e ≥ 2 pontos de linfócitos. Em alguns pacientes, os mecanismos na avaliação de falência orgânica relacionada à sepse contrarregulatórios superam as respostas inflamatórias e a (QSOFA). supressão imune resultante torna esses pacientes - PA sistólica >100mm/hg; suscetíveis a superinfecções. - FR > 22icm Ativação e lesão endotelial. - Nível de consciência: Glasgow <15. • O estado pró-inflamatório e a ativação das células • -> Choque séptico: é um subgrupo da sepse no qual endoteliais associadas à sepse desencadeiam anormalidades circulatórias, celulares/metabólicas extravasamento vascular generalizado e edema tecidual, subjacentes levam a um aumento substancial da que tem efeitos deletérios tanto no fornecimento de mortalidade. nutrientes como na remoção de resíduos. • É caracterizado quando pacientes necessitam de terapia • Esta alteração vascular impede a perfusão tecidual e pode vasopressora para elevar a pressão arterial média para 65 ser exacerbada por tentativas de suporte ao paciente com mmHg ou mais com uma concentração sérica de lactato líquidos intravenosos. O endotélio ativado também acima de 2,0 mol/L a despeito de adequada reanimação aumenta a produção de óxido nítrico (NO) e outros volêmica. mediadores inflamatórios vasoativos (p. ex., C3a, C5), o que 2. Explicar o mecanismo fisiopatológico da sepse pode contribuir para o relaxamento do músculo liso -> A sepse resulta de uma complexa interação entre o vascular e hipotensão sistêmica. microrganismo infectante e a resposta imune, Indução de um estado pró-coagulante. pró-inflamatória (e anti) e pró-coagulante do hospedeiro. • A sepse altera a expressão de muitos fatores que Respostas inflamatórias e anti-inflamatórias. favorecem a coagulação. As citocinas pró-inflamatórias • A resposta imune inata é responsável pelo processo aumentam a produção de fator tecidual pelos monócitos e, inflamatório inicial na sepse. Ela é mediada pelos possivelmente, pelas células endoteliais e diminuem a receptores de reconhecimento padrão, como os receptores produção de fatores anticoagulantes endoteliais, como o Toll-like (TLR) e o CD14, que reconhecem os patógenos ou inibidor da via do fator tecidual, trombomodulina e seus produtos, identificados como PAMPs (padrões proteína C. Eles também reduzem a fibrinólise. moleculares associados a patógenos). • O extravasamento vascular e o edema tecidual diminuem • Os TLR-2 reconhecem os peptideoglicanos das bactérias o fluxo sanguíneo no nível dos pequenos vasos, produzindo gram positivas, enquanto os lipopolissacarídeos (LPS) das estase e diminuindo a lavagem dos fatores de coagulação gram negativas são reconhecidos pelos TLR-4. ativados. • Na ativação, as células imunes inatas produzem inúmeras • Atuando em conjunto, esses efeitos desencadeiam a citocinas, incluindo TNF, IL-1, IFN-γ, IL-12 e IL-18, bem ativação sistêmica da trombina e a deposição de trombos como outros mediadores inflamatórios, que vão ativar o ricos em fibrina em pequenos vasos, muitas vezes em todo sistema imune adaptativo e induzir a resposta inflamatória. o corpo, comprometendo ainda mais a perfusão tecidual. • Espécies reativas de oxigênio, prostaglandinas e fatores Disfunção de órgãos. ativadores de plaquetas (PAF), também são ativados. Essas • A hipotensão sistêmica, o edema intersticial e a trombose moléculas efetoras induzem as células endoteliais (e outros dos pequenos vasos diminuem a liberação de oxigênio e tipos de células) a aumentar a expressão da molécula de nutrientes para os tecidos que, devido à hipóxia celular, adesão e estimular ainda mais a produção de citocinas e não conseguem usar adequadamente os nutrientes que são quimiocinas. fornecidos. -> O estado hiperinflamatório, iniciado pela sepse, • O dano mitocondrial resultante do estresse oxidativo desencadeia mecanismos imunossupressores prejudica o uso do oxigênio. Os elevados níveis de citocinas contrarregulatórios, que podem envolver tanto células e mediadores secundários diminuem a contratilidade imunes inatas como adaptativas. miocárdica e o débito cardíaco, e o aumento da • Como resultado, os pacientes sépticos podem oscilar permeabilidade vascular e lesão endotelial podem levar à entre estados hiperinflamatórios e imunossuprimidos síndrome do desconforto respiratório agudo. durante a evolução clínica. • Em resumo, esses fatores podem conspirar para causar falência de múltiplos órgãos, particularmente rins, fígado, pulmões e coração, culminando no óbito. 3. Explicar o mecanismo das principais manifestações clínicas da CIVD sepse O quadro de coagulação intravascular disseminada (CIVD) é Hipotensão decorrente do alto consumo de plaquetas, consumo de • O quadro de sepse é frequentemente acompanhado por fibrinogênio e consumo de fatores de coagulação que hipovolemia, devido à dilatação arterial e venosa e perda ocorre no estado hiperinflamatorio na sepse. de fluídos para o espaço extravascular (terceiro espaço), 4. Identificar os principais focos primários de infecção que além perda de líquidos pela febre, sudorese, estase podem evoluir para sepse gastrintestinal. Além de intensa vasodilatação por conta das • A sepse poder estar relacionada a qualquer foco citocinas pro-inflamatórias -> diminui RVP. infeccioso, entretanto as infecções mais comumente Disfunção de órgãos associadas são a pneumonia, a infecção intra-abdominal e • Os pacientes sépticos têm um consumo de oxigênio (VO2) a infecção urinária. Pneumonia, na maior parte dos elevado e altamente dependente de sua oferta levantamentos epidemiológicos, é o foco responsável pela (dependência patológica). O aumento do VO2, associado à metade dos casos. São ainda focos frequentes a infecção diminuição na extração de oxigênio pelos tecidos relacionada a cateteres, meningites, endocardites entre periféricos e às alterações profundas na microcirculação, outros. estão relacionados com uma progressiva hipoxia tecidual e • O foco infeccioso tem íntima relação com a gravidade do disfunção progressiva de órgãos. processo. Por exemplo, a letalidade associada à sepse de Acidose foco urinário é reconhecidamente menor do que a de • É caracterizado pelo lactato elevado que pode ser outros focos. decorrente da hipóxia tecidual, pois a sua produção ocorre • É importante lembrar que qualquer infecção no corpo em estados de metabolismo anaeróbio celular. Onde a pode evoluir para sepse, especialmente em pessoas com célula produz 2 ATP e ácido lático que convertido em sistema imunológico enfraquecido, idosos, recém-nascidos, lactato e H+. pacientes com doenças crônicas ou pacientes que estão se • Anormalidade na glicólise pode levar a uma disfunção na recuperando de cirurgias ou outras intervenções médicas regulação da glicemia, podendo ocorrer hiperglicemia. invasivas Esse aumento na disponibilidade de glicose pode levar a um 5. Investigar/ identificar os órgãos alvo que podem estar aumento na produção de lactato, pois há mais substrato envolvidos no processo séptico. disponível para a glicólise. • Todos os mediadores envolvidos na geração de resposta Disfunção renal inflamatória acabam por levar a três fenômenos • Desde o início da sepse, a hipoperfusão tecidual (com ou fundamentais: a lesão do endotélio capilar com sem hipotensão) e a lesão inflamatória resultam em um extravasamento de líquidos; a vasodilatação, com queda da dano isquêmico e disfunção tubular renal. Há oligúria resistência vascular sistêmica (RVS); e a microtromboses progressiva com queda da taxa de filtração glomerular e por ativação da coagulação e fenômenos de adesão de elevação da creatinina. leucócitos ao endotélio. • Ocorre também um processo de coagulação intravascular • Essas alterações vasculares se manifestarão em todos os renal criando microtrombos glomerulares. órgãos; a maior perfusão determina maior gravidade das Disfunção neurológica lesões. Portanto, órgãos bastantes perfundidos, como os • A hipoperfusão cerebral ocorre quando há uma pulmões, rins, fígado e cérebro, sofrerão lesões mais diminuição do fluxo sanguíneo para o cérebro o que pode intensas. levar à diminuição do fornecimento de oxigênio e • Nos pulmões ocorrem edema e congestão, focos de nutrientes para as células cerebrais, o que pode levar à hemorragia, infiltrados inflamatórios, formando um disfunção cerebral e à diminuição da consciência. exsudato acompanhado de fibrose e proliferação de células alveolares. • A inflamação generalizada, também pode afetar as • Os órgãos podem apresentar vasos sanguíneos com funções cerebrais normais. As citocinas inflamatórias microtromboses, êmbolos gordurosos, com ou sem sinais liberadas durante a sepse podem afetar as sinapses de diátese hemorrágica. nervosas, alterar a função das células cerebrais e levar a • Os rins também ficam edemaciados e congestos, uma diminuição do nível de consciência. podendo apresentar microtromboses, hemorragias • Além disso, durante a sepse, o corpo pode acumular glomerulares, exsudato inflamatório e necrose tubular, e toxinas, como amônia e ácido láctico, que podem ter raramente ocorre necrose glomerular. efeitos tóxicos no cérebro e contribuir para a baixa da • O fígado fica congesto, com alterações degenerativas de consciência. hepatócitos, que podem chegar à necrose zonal ou centrolobular. Essa hepatite inespecífica ou reacional acompanhado de estase biliar. • No cérebro, observam-se congestão e hemorragias petequiais, trombos de fibrina, alterações degenerativas de neurônios podendo chegar até a necrose. 6. Identificar os sinais precoces de disfunção orgânica e 8. Caracterizar pneumonia (fisiopatologia, quadro clínico, relacioná-los com a gravidade da doença diagnóstico, principais agentes e CURB65 nas PAC) As principais disfunções orgânicas são: Definição Pneumonia adquirida na comunidade (PAC) - Hipotensão (PAS < 90 mmHg ou PAM < 65 mmHg ou • é a infecção do trato respiratório inferior causada por queda de PA > 40 mmHg) (disfunção cardiovascular) agentes adquiridos na comunidade ou com surgimento em - Oligúria (≤0,5mL/Kg/h) ou elevação da creatinina até 48 horas após admissão hospitalar. (>2mg/dL); (disf. Renal) Etiologia - Relação PaO2/FiO2 < 300 ou necessidade de O2 para • Podem ser bacterianas ou virais. Frequentemente, a manter SpO2 > 90%; (disfunção respiratória) infecção bacteriana segue uma infecção viral do trato - Contagem de plaquetas < 100.000/mm3 ou redução de respiratório alto. Muitas variáveis, como o agente 50% no número de plaquetas em relação ao maior valor etiológico específico, a reação do hospedeiro e a extensão registrado nos últimos 3 dias; (disfunção hematológica) do envolvimento, determinam a forma da pneumonia. - Lactato acima do valor de referência; Streptococcus pneumoniae (pneumococos). - Rebaixamento do nível de consciência, agitação, delirium; É a causa mais comum de pneumonia aguda adquirida na - Aumento significativo de bilirrubinas (>2X o valor de comunidade. referência) (disfunção hepática) Haemophilus influenzae 7. Descrever os princípios do tratamento da sepse (hidratação, • É uma bactéria gram-negativo, de causa importante de etc.) infecções do trato respiratório inferior e meningite aguda PACOTE DE 1 HORA com risco à vida em crianças jovens. Em adultos, é uma causa muito comum de pneumonia aguda adquirida na comunidade. • Está bactéria é um colonizador onipresente da faringe, onde existe em duas formas: encapsulada (5%) e não encapsulada (95%). Embora existam 6 sorotipos da forma 2) Coleta de duas hemoculturas de sítios distintos em até encapsulada, o tipo b, é causa mais frequente de doença uma hora, e culturas de todos os outros sítios pertinentes invasiva severa. Com o uso de vacinas conjugadas contra H. (aspirado traqueal, líquor, urocultura) antes da influenzae, a incidência da doença causada pelo sorotipo b administração do antimicrobiano. diminuiu. Em contraste, as infecções pelas formas não 3) Prescrição e administração de antimicrobianos de amplo encapsuladas estão aumentando. espectro para a situação clínica, por via endovenosa, • A sobrevida de H. influenzae na corrente sanguínea está visando o foco suspeito, dentro da primeira hora da correlacionada à presença da cápsula, que, como a dos identificação da sepse. A redução da carga bacteriana ou pneumococos, previne a opsonização pelo complemento e fúngica é fundamental para o controle. Não se deve fagocitose por células hospedeiras aguardar a identificação do agente infeccioso para instituir Staphylococcus aureus -> mais grave a terapêutica. A antibioticoterapia inicial deve ser ampla o • Importante causa de pneumonia bacteriana secundária suficiente para alcançar os prováveis agentes infecciosos, em crianças e adultos saudáveis após doenças respiratórias incluindo uma ou mais drogas. virais (sarampo em crianças e gripe em crianças e adultos). 4) Soluções cristaloides são recomendadas como primeira • A pneumonia estafilocócica está associada à alta escolha para ressuscitação de pacientes em choque incidência de complicações, como abscesso pulmonar e séptico e, atualmente, são o tipo de fluido mais utilizado empiema. Indivíduos que abusam de drogas intravenosas nos Estados Unidos. apresentam alto risco de desenvolvimento de pneumonia 5) Uso de vasopressores para pacientes que permaneçam estafilocócica em associação com endocardite. com pressão arterial média (PAM) abaixo de 65 (após a QUADRO CLÍNICO infusão de volume inicial), sendo a noradrenalina a droga • A apresentação clínica da PAC varia amplamente, desde de primeira escolha. Não se deve tolerar pressões abaixo de uma pneumonia leve, caracterizada por febre, tosse e falta 65 mmHg por períodos superiores a 30-40 minutos. Em de ar, até uma pneumonia grave, caracterizada por sepse e casos de hipotensão ameaçadora a vida, pode-se iniciar o dificuldade respiratória. vasopressor mesmo antes ou durante a reposição volêmica. • O quadro clínico típico clássico da PAC é representado pela pneumonia pneumocócica. A doença se apresenta de forma hiperaguda, entre 2 e 3 dias, tendo como história principal dispneia, tremores, febre alta (39-40oC), dor torácica pleurítica e tosse produtiva com expectoração purulenta esverdeada. • O exame físico normalmente evidencia prostração, taquipneia, taquicardia e hipertermia. Os achados do exame do aparelho respiratório podem variar de simples estertores finos até a síndrome de consolidação pulmonar e/ou a síndrome de derrame pleural. DIAGNÓSTICO • Essa estimulação da inflamação gera a produção local de • O diagnóstico da pneumonia baseia-se em achados citocinas e causam extravasamento capilar e acúmulo de clínicos (febre, tosse, expectoração, dor torácica) e achados células inflamatórias. Essa sequência inicia um círculo de exame físico (estertores crepitantes, sinais de vicioso, no qual células inflamatórias adicionais são atraídas consolidação, taquipneia, taquicardia) confirmados pela e a liberação subsequente de mais citocinas é estimulada. radiografia de tórax. • Esse exsudado inflamatório progressivo (infiltram os • A radiografia de tórax também é importante para alvéolos), que é detectado na radiografia como uma avaliação da gravidade, identificação de complicações pneumonia, causa um desequilíbrio da ventilação-perfusão, (p. ex., derrame pleural) e diagnóstico diferencial. gerando hipoxemia. Avaliação da gravidade e definição do local de tratamento Os pacientes com diagnóstico de PAC devem ser sempre avaliados quanto à gravidade da doença, pois isso tem impacto direto na redução da mortalidade. Os escores de prognóstico disponíveis dimensionam a gravidade e ajudam a predizer o prognóstico da PAC, guiando a decisão quanto ao local de tratamento. • Mental Confusion, Urea, Respiratory rate, Blood pressure, and age ≥ 65 years (CURB-65): ◊ Confusão mental (escore ≤ 8, segundo o abbreviated mental test score); ◊ Ureia > 50 mg/dl; ◊ Frequência Respiratória > 30 ciclos/min; ◊ Blood pressure: pressão arterial sistólica < 90 mmHg ou pressão arterial diastólica < 60 mmHg; ◊ Idade ≥ 65 anos. -> Cada critério recebe um ponto, totalizando um escore de 0 a 5. Um escore mais alto indica maior gravidade e maior risco de complicações. Os pacientes com escore 0 ou 1 têm baixo risco e podem ser tratados em regime ambulatorial. Pacientes com escore 2 ou mais têm um risco mais elevado de morte ou complicações e podem necessitar de internação hospitalar. Fisiopatologia PAC • Os microrganismos conseguem acesso ao trato respiratório inferior pela microaspiração a partir da orofaringe (a via mais comum), por disseminação hematogênica ou por contiguidade ou continuidade de uma área vizinha com infecção. • A sequência fisiopatogênica se inicia com a adesão de microrganismos ao epitélio respiratório, onde se multiplicam, colonizando-o. • Para chegar aos alvéolos, os microrganismos superaram múltiplos obstáculos, como os batimentos ciliares e a força da tosse que desloca microrganismos aderidos ao muco. Sobreviveram à ação de enzimas e anticorpos IgA e citocinas liberados localmente, resistiram ou se evadiram da fagocitose e outros mecanismos locais de defesa do hospedeiro. • Após colonização no trato respiratório inferior, os agentes infecciosos atuam produzindo substâncias, invadindo células e desencadeando a resposta inflamatória que resultará na pneumonia. • Como exemplo, S. pneumoniae produz pneumolisina e enzimas implicadas na destruição celular, além de apresentar cápsula para dificultar a fagocitose e ação de macrófagos de defesa.