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Habeas corpus Criminal Nº 1.0000.24.

015901-2/000

<CABBCAADDAABCCBAADBCDABACACBDACBAADAADDABACCB>
EMENTA: HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS – PRISÃO
CAUTELAR – PRESSUPOSTOS E REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP
NITIDAMENTE PRESENTES – CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS
INSUFICIENTES À SOLTURA – SUBSTITUIÇÃO DA PREVENTIVA POR
PRISÃO DOMICILIAR – IMPOSSIBILIDADE – SITUAÇÃO EXCEPCIONAL
DEMONSTRADA. I – Demonstrada a gravidade concreta do delito de
tráfico de drogas e existindo nos autos a prova da materialidade e fortes
indícios de autoria, a prisão preventiva, medida de exceção, mostra-se
necessária para a garantia da ordem e da saúde pública, sendo
insuficiente a aplicação das cautelares previstas no art. 319 do CPP. II –
Os atributos pessoais do paciente não podem ser analisados
individualmente, sem que seja considerado todo o contexto dos autos,
sob pena de se trazer prejuízos à tranquilidade social e à manutenção da
ordem pública, fundamentos esses essenciais à análise da necessidade
da manutenção de qualquer prisão cautelar. III – A aplicabilidade da
decisão do STF no Habeas corpus coletivo nº 143.641/SP pode ser
afastada conforme as particularidades do caso concreto, de forma
excepcional.
HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº 1.0000.24.015901-2/000 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - PACIENTE(S):
GEISMAYRA CRISTINA GOMES MATOS - AUTORID COATORA: JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE JUIZ DE FORA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CRIMINAL do


Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da
ata dos julgamentos, à unanimidade, em DENEGAR O HABEAS
CORPUS.

DES. ALBERTO DEODATO NETO


RELATOR

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Habeas corpus Criminal Nº 1.0000.24.015901-2/000

DES. ALBERTO DEODATO NETO (RELATOR)

VOTO

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Geismayra


Cristina Gomes Matos, em que se alega constrangimento ilegal por
parte do Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Juiz de
Fora, que converteu a prisão em flagrante da paciente em preventiva,
diante da suposta prática do delito previsto no art. 33, caput, da Lei nº
11.343/06.
Pleiteia a defesa a revogação da cautelar, sustentando que a
decisão combatida não foi devidamente fundamentada e que não se
verificam os requisitos do art. 312 do CPP, principalmente por ser a
paciente primária, possuidora de residência fixa, trabalho licito e bons
antecedentes. Requer a substituição da prisão preventiva pela
domiciliar, alegando que a paciente tem três filhos menores de doze
anos, em consonância com o art.318-A do CPP e a decisão do STF no
Habeas corpus coletivo nº 143.641/SP (doc.1).
A liminar foi indeferida (doc.9).
Informações prestadas pela d. autoridade apontada coatora
(doc.10).
A Procuradoria-Geral de Justiça opina pela denegação da ordem
(doc.27).
É o relatório.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço o pedido.
A defesa almeja a revogação da prisão cautelar de Geismayra
Cristina Gomes Matos.
Entretanto, a decisão que converteu o flagrante em preventiva
(doc.4) encontra-se devidamente fundamentada, com base nas
circunstâncias do caso concreto, detalhando os fatos imputados à paciente

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e ressaltando sua periculosidade e necessidade de garantia da ordem


pública.
Extraem-se suficientes indícios de autoria e a certeza da
materialidade a partir do APFD, boletim de ocorrência, auto de apreensão
e exames preliminares de constatação de drogas (docs. 2/3), indicando a
apreensão vultosa quantidade de drogas.
Consta que policiais militares receberam informações de que a
paciente guardava drogas em sua residência, razão pela qual deslocaram-
se até o imóvel. No local, foram atendidos pela investigada, a qual,
questionada, confirmou que mantinha entorpecentes em depósito de
propriedade de pessoas ligadas a facção criminosa Comando Vermelho,
recebendo, para tanto, a quantia de R$300,00 (trezentos reais) por
semana.
No total, foram apreendidos 222 (duzentos e vinte e dois) invólucros
de maconha, com massa de 4470,05 g (quatro mil quatrocentos e setenta
gramas e cinco centigramas); 04 (quatro) invólucro de maconha, com
massa de 2.703,33g (dois mil setecentos e três gramas e trinta e três
centigramas); 69 (sessenta) buchas de maconha, com massa de 94,47g
(noventa e quatro gramas e quarenta e sete centigramas); 252 (duzentos e
cinquenta e dois) papelotes de cocaína, com massa de 898,69g (oitocentos
e noventa e oito gramas e sessenta e nove centigramas); 56 (cinquenta e
seis) unidades de lança perfume; 08 (oito) sacos contendo cocaína,
pesando 6.817,54g (seis mil oitocentos e dezessete gramas e cinquenta e
quatro centigramas); 80 (oitenta) invólucros contendo maconha, com
massa de 236,46g (duzentos e trinta e seis gramas e quarenta e seis
centigramas); 01 (uma) barra de crack, pesando 474,92g (quatrocentos e
setenta e quatro gramas e noventa e dois centigramas; 265 (duzentos e
sessenta e cinco) papelotes de cocaína, com massa de 738,65g
(setecentos e trinta e oito gramas e sessenta e cinco centigramas). Além
disso, foram apreendidos diversos petrechos utilizados para o tráfico.
Não se trata, a toda evidência, de manter presa a paciente apenas
em decorrência da gravidade abstrata do delito, mas de tratar com cautela

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os acusados de crimes responsáveis por consequências intensamente


negativas na sociedade.
Neste ponto, o art. 282, II, do CPP, prevê expressamente que, na
aplicação das medidas cautelares, deverá se observar a “adequação da
medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições
pessoais do indiciado ou acusado” (negritei).
O pedido de substituição da prisão preventiva pela domiciliar
também não pode prosperar.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do habeas corpus nº
143.641/SP, em 20/02/2018, concedeu a ordem para todas as mulheres
presas cautelarmente no território nacional, gestantes, puérperas ou mães
de crianças e deficientes, nos termos do art. 2º do ECA e da Convenção
sobre Direitos das Pessoas com Deficiências (Decreto Legislativo
186/2008 e Lei 13.146/2015), determinando a substituição da prisão
preventiva pela domiciliar.
No entanto, a prisão domiciliar não deve ser concedida em casos de
crimes cometidos mediante violência ou grave ameaça, contra seus
descendentes ou, ainda, em casos excepcionalíssimos.
Na ocasião do julgamento, consignou-se:

“Em face de todo o exposto, concedo a ordem para


determinar a substituição da prisão preventiva pela
domiciliar - sem prejuízo da aplicação concomitante
das medidas alternativas previstas no art. 319 do CPP
- de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas
ou mães de crianças e deficientes, nos termos do art.
2º do ECA e da Convenção sobre Direitos das
Pessoas com Deficiências (Decreto Legislativo
186/2008 e Lei 13.146/2015), relacionadas neste
processo pelo DEPEN e outras autoridades
estaduais, enquanto perdurar tal condição,
excetuados os casos de crimes praticados por
elas mediante violência ou grave ameaça, contra
seus descendentes ou, ainda, em situações
excepcionalíssimas, as quais deverão ser
devidamente fundamentadas pelo juízes que
denegarem o benefício.

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Estendo a ordem, de ofício, às demais as mulheres


presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e
de pessoas com deficiência, bem assim às
adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas em
idêntica situação no território nacional, observadas as
restrições previstas no parágrafo acima.
Quando a detida for tecnicamente reincidente, o juiz
deverá proceder em atenção às circunstâncias do
caso concreto, mas sempre tendo por norte os
princípios e as regras acima enunciadas, observando,
ademais, a diretriz de excepcionalidade da prisão.
Se o juiz entender que a prisão domiciliar se mostra
inviável ou inadequada em determinadas situações,
poderá substituí-la por medidas alternativas arroladas
no já mencionado art. 319 do CPP.
Para apurar a situação de guardiã dos seus filhos da
mulher presa, dever-se-á dar credibilidade à palavra
da mãe, podendo o juiz, na dúvida, requisitar a
elaboração de laudo social, devendo, no entanto,
cumprir desde logo a presente determinação. Caso se
constate a suspensão ou destituição do poder familiar
por outros motivos que não a prisão, a presente
ordem não se aplicará.
A fim de se dar cumprimento imediato a esta decisão,
deverão ser comunicados os Presidentes dos
Tribunais Estaduais e Federais, inclusive da Justiça
Militar Estadual e federal, para que prestem
informações e, no prazo máximo de 60 dias a contar
de sua publicação, implementem de modo integral as
determinações estabelecidas no presente julgamento,
à luz dos parâmetros ora enunciados.
Com vistas a conferir maior agilidade, e sem prejuízo
da medida determinada acima, também deverá ser
oficiado ao DEPEN para que comunique aos
estabelecimentos prisionais a decisão, cabendo a
estes, independentemente de outra provocação,
informar aos respectivos juízos a condição de
gestante ou mãe das presas preventivas sob sua
custódia.
Deverá ser oficiado, igualmente, ao Conselho
Nacional de Justiça - CNJ, para que, no âmbito de
atuação do Departamento de Monitoramento e
Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de
Execução de Medidas Socioeducativas, avalie o
cabimento de intervenção nos termos preconizados
no art. 1º, § 1º, II, da Lei 12.106/2009, sem prejuízo de
outras medidas de reinserção social para as
beneficiárias desta decisão.
O CNJ poderá ainda, no contexto do Projeto Saúde
Prisional, lançado durante o período em que exerci a

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presidência do referido órgão, atuar junto às esferas


competentes para que o protocolo de entrada no
ambiente prisional seja precedido de exame apto a
verificar a situação de gestante da mulher. Tal diretriz
está de acordo com o Eixo 2 do referido programa,
que prioriza a saúde das mulheres privadas de
liberdade.
Os juízes responsáveis pela realização das
audiências de custódia, bem como aqueles perante
os quais se processam ações penais em que há
mulheres presas preventivamente, deverão proceder
à análise do cabimento da prisão, à luz das diretrizes
ora firmadas, de ofício.
Embora a provocação por meio de advogado não seja
vedada para o cumprimento desta decisão, ela é
dispensável, pois o que se almeja é, justamente,
suprir falhas estruturais de acesso à Justiça da
população presa. Cabe ao Judiciário adotar postura
ativa ao dar pleno cumprimento a esta ordem judicial.
Nas hipóteses de descumprimento da presente
decisão, a ferramenta a ser utilizada é o recurso, e
não a reclamação, como já explicitado na ADPF 347”
(negritei).

No caso em analise, está evidente que a paciente não se mostra


imprescindível no cuidado de seus filhos. Ao contrário, as circunstancias
como se deram a prisão em flagrante delito evidenciam que Geismayra
expõe as crianças ao tráfico de drogas e situação de extremo risco, pois,
em tese, atua com habitualidade na guarda de entorpecentes para facção
criminosa de notória periculosidade.
Dessa forma, diante da gravidade e excepcionalidade do caso, não
vejo como conceder à paciente a prisão domiciliar, diante da extrema
necessidade de sua segregação cautelar para a garantia da ordem pública.
Registro, ainda, que as condições pessoais do paciente não
podem ser analisadas individualmente, sem que seja considerado todo
o contexto dos autos, sob pena de se trazer prejuízos à tranquilidade
social e à manutenção da ordem pública, fundamentos esses
essenciais à análise da necessidade da manutenção de qualquer
prisão processual. A respeito:

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“A primariedade, os bons antecedentes e a residência


e o domicílio no distrito da culpa são circunstâncias
que não obstam a custódia preventiva, quando
ocorrentes os motivos que legitimam a constrição do
acusado” (JSTJ 2/267).

Por fim, observados todos os requisitos legais, a prisão processual


não representa afronta ao princípio da presunção da inocência. Não há
qualquer incompatibilidade entre a segregação cautelar e referido princípio,
que veda, em verdade, a antecipação dos efeitos da sentença, não
produzindo interferência alguma em sede de análise da necessidade da
manutenção da prisão preventiva. Sobre isso:

“Inexiste incompatibilidade entre o princípio da


presunção de inocência e o instituto da prisão
preventiva, podendo esta ser decretada quando
presentes os requisitos autorizadores, estando
caracterizada, portanto, sua necessidade” (STF - HC
88362-SE - 2ª T. - Rel. Min. Joaquim Barbosa - DJU
24.11.2006 - p. 89) JCPP.580 JCPP.499.

“A presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII) é relativa


ao Direito Penal, ou seja, a respectiva sanção
somente pode ser aplicada após o trânsito em julgado
da sentença condenatória. Não alcança os institutos
de Direito Processual, como a prisão preventiva. Esta
é explicitamente autorizada pela Constituição da
República” (art. 5º, LXI) (STJ - RT 686/388).

Diante do exposto, acompanho o parecer ministerial e denego o


habeas corpus.

DES. EDUARDO MACHADO - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. WANDERLEY PAIVA - De acordo com o(a) Relator(a).

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SÚMULA: "DENEGARAM O HABEAS CORPUS."

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