Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Nos Braços Do Inimigo - Fernanda Santana - Cleaned
Nos Braços Do Inimigo - Fernanda Santana - Cleaned
1º Edição
Março de 2023
NOTA DE AUTORA
SINOPSE
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
CAPÍTULO 40
CAPÍTULO 41
CAPÍTULO 42
CAPÍTULO 43
CAPÍTULO 44
CAPÍTULO 45
CAPÍTULO 46
CAPÍTULO 47
CAPÍTULO 48
EPÍLOGO
AGRADECIMENTOS
BIOGRAFIA
MAIS LIVROS DA AUTORA
REDES SOCIAIS
Antes de começar essa leitura, preciso deixar claros alguns pontos:
Nos braços do inimigo não é um livro dark, nem mesmo atua no
universo da máfia, embora vocês vão se deparar com alguns mafiosos pelo
caminho.
Porém, Lionel Rossi é um anti-herói e, como tal, pratica atos
moralmente questionáveis. Isso não quer dizer que o que ele faz é certo,
apenas que faz sentido dentro de sua história de vida. Os seus
comportamentos são duvidosos e, se você procura por uma redenção, sinto
lhe informar, mas não encontrará aqui.
Lionel é um anti-herói e continuará assim até o fim.
Aproveito para deixar o alerta de gatilhos encontrados na história:
Contém cenas de sequestro, violência gratuita, tortura e situações que
podem te causar desconforto.
Se ainda assim, decidir se aventurar nessa leitura, garanto que não irá
se arrepender.
Prometo lágrimas, surtos, adrenalina e cenas de tirar o fôlego.
Cenas de sexo explícito e palavras de baixo calão também estão
presentes na narrativa, por isso não é recomendada para menores de dezoito
anos.
Dito isso, desejo uma excelente leitura!
Um beijo,
Fê Santana
Quando o Banco Central Americano anuncia a chegada de uma nova
moeda, Lionel Rossi sabe que precisa agir.
Ele não só precisa adaptar o seu maquinário, como invadir um dos
sistemas mais seguros dos Estados Unidos para conseguir reproduzir a
moeda mais valiosa do mundo e prosseguir com seus negócios.
E, para isso, precisa dela.
Ava Stone é ninguém menos que a namorada foragida do contador de
seu maior rival e a peça-chave para o que ele precisa.
Quando Lionel rapta a hacker mais procurada do país, a garota tem
duas opções:
Aceitar a oferta de trabalho de Lionel ou voltar para as garras do
namorado abusivo.
Ele tem a segurança que ela precisa.
Ela tem a salvação para os negócios dele.
Um acordo é estabelecido e desperta a fúria de seu pior inimigo.
Entre trocas de farpas e provocações, uma atração surge onde menos
se espera.
Quando uma guerra é declarada, Lionel não só lutará pelos seus
interesses, mas por aquela que ousou entrar em seu coração.
Pela janela do meu quarto, vejo quando Elijah e Charles entram no
carro preto e somem de vista, acompanhados de seus seguranças. Respiro
fundo e sinto o coração bater acelerado dentro do peito.
Preciso agir.
Preciso fazer isso dar certo.
Abro o meu guarda-roupa, pegando apenas um vestido leve e um par
de sandálias rasteiras, para que não faça volume na mochila. Um boné, uma
peruca e um par de óculos escuros já estão escondidos no fundo dela. Abro
a gaveta e pego um envelope cheio de dinheiro, agradecendo aos céus por
Elijah sempre me pagar em mãos e nunca em conta bancária.
Meus documentos também estão aqui, junto tudo e bato na mochila
de modo a aplacar o volume e evitar chamar a atenção.
Olho tudo ao redor e confiro se não estou deixando nada importante
para trás. Quando saio do quarto e fecho a porta atrás de mim, tento
controlar a respiração e não demonstrar o nervosismo que me invade pelo
que estou disposta a fazer agora.
Caminho pelo casarão e sorrio para os rostos conhecidos à procura de
Andrew, o segurança que Elijah colocou atrás de mim feito um cão
farejador. Quando o encontro, vejo que está sentado tomando uma caneca
de café.
— Preciso ir ao mercado — anuncio tentando transmitir uma
tranquilidade que definitivamente não está em mim.
O moreno alto só arqueia a sobrancelha curioso.
— Não sei se é uma boa ideia.
— Emergência feminina. — Dou de ombros, mas ele não parece
convencido. — Prefere me levar, ou procurar um absorvente com abas nas
prateleiras?
A careta que ele me faz entrega tudo.
— Foi o que eu pensei.
— E por que a mochila? — Aponta para a bolsa nos meus ombros e
eu sinto as mãos suarem pela adrenalina.
— Você tem alguma mulher em casa, Andrew? — pergunto e ele
franze o cenho para mim. — Já vivenciou algum incidente vermelho?
O semblante do segurança se torna enojado; ele apenas assente antes
de se levantar da banqueta e virar o resto do café.
— Vamos então.
O grandalhão me guia até a garagem e eu me acomodo no banco
traseiro do carro preto, já sentindo o corpo tremer em expectativa. Precisa
dar certo. Há dias estou bolando esse plano e preciso muito conseguir.
— Pode me levar ao Maddison’s? — peço, escolhendo o mercado que
está em um ponto bastante favorável para mim.
— Tem um mercado aqui no bairro — aponta.
— Mas ele não tem banheiro — retruco. — A não ser que queira que
eu suje o seu carro de sangue e…
O moreno pragueja antes de assentir e me guiar para onde eu quero.
Homens e sua aversão à menstruação, como se isso fosse mesmo uma
aberração. No entanto, caiu como luva para mim hoje.
Quando chegamos ao local, desço do carro e logicamente Andrew me
acompanha pelos corredores do mercado. Faço o pagamento no caixa e
peço para ir ao banheiro, neste momento preciso agir rápido.
Entro na cabine e tiro o short jeans, tênis e camiseta que estou usando.
Jogo no lixo e visto a roupa que eu trouxe, ajeitando a peruca ruiva e os
óculos escuros.
Sei que Andrew me reconheceria de perto, mas, se me vir andando ao
longe de costas, eu consigo me camuflar no meio das pessoas.
Com a mochila presa nas costas, subo na pia do banheiro e alcanço a
janela que tem o espaço ideal para um corpo magro feito o meu. Eu me
impulsiono para fora e, quando olho para baixo, vejo uma pilha de caixotes
de madeira. Pulo sobre eles e o impacto causa um barulho alto demais.
Alerta, corro em disparada, dando a volta no quarteirão, e, como se
Deus ouvisse as minhas preces, um táxi desponta pela avenida.
Dou sinal e entro nele rapidamente, sentindo o meu coração bater
ainda mais forte dentro do peito.
Enquanto o motorista me leva ao meu destino, eu me abaixo, deitando
no banco traseiro, e faço uma prece em agradecimento.
Finalmente estou livre.
— Você tem certeza disso, Gavin?
Solto um suspiro e caio sentado na cadeira, não gostando nada do que
acabei de ouvir.
— Não se fala de outra coisa aqui, Rossi. É questão de tempo até sair
na TV.
— Certo. Qualquer novidade, me avise.
Encerro a ligação e sinto todos os músculos do corpo tensionarem-se.
Mas que caralho.
A última coisa que eu preciso agora é da porra do Banco Central
mudando a moeda.
Esfrego a mão pela barba me sentindo nervoso e ligo para o meu
advogado.
— Carter, preciso do conselho em meia hora na sala de reuniões.
Levanto-me da cadeira e vou até o barzinho de meu escritório me
servir de uma dose de uísque. Viro o líquido de uma vez só, sentindo-o
queimar a garganta, enquanto a mente trabalha feito uma engrenagem
pensando em uma solução.
Se Gavin estiver certo, eu vou ter que praticamente começar do zero.
Mudaram tudo.
O design das notas de dólar, tamanho e marca d’água.
Sirvo-me de mais uma dose de uísque, que desce rasgando em meu
peito.
Por que mexer no que está dando certo?
Porra!
E pensar no trabalho que vamos ter para readaptar toda a minha
produção. Fecho os olhos e inspiro fundo, não querendo acreditar no que
está acontecendo.
Sei que não vou aguentar ficar parado esperando pela reunião, então
decido procurar por Luke Hughes, o cara responsável pelo TI desde que
Nathaniel se foi.
E pensar nisso me faz rir sem humor algum. Logo na hora em que eu
preciso do meu melhor homem, a porra de um câncer o tira de mim.
Mas que desgraça.
Ando pelo casarão em direção à sala de tecnologia e o encontro
absorto em seu computador.
— Rossi — cumprimenta-me, tirando os fones de ouvido, logo que
nota a minha presença.
— Diga-me, Hughes — chamo, puxando a cadeira para me sentar
diante dele. — Já invadiu o sistema do Fed antes? — pergunto referindo-me
ao Federal Reserve, Banco Central americano, e ele arregala os olhos para
mim.
Era exatamente essa merda que eu temia.
— Não, senhor.
Praguejo e soco a mesa, fazendo sua caneca de café tremer sobre a
madeira.
— Acha que consegue fazê-lo? — pergunto olhando dentro dos seus
olhos, e o loiro engole em seco.
— Posso tentar…
— Porra!
Levanto-me em um rompante e puxo os cabelos nervoso.
— Não trabalho com tentativas, Hughes. Trabalho com certezas —
digo-lhe firme.
— O sistema do Banco Central é um dos mais seguros do mundo,
senhor. Semelhante ao da CIA e…
— Foda-se — corto-o. — Precisamos encontrar um jeito de acessar
aquela porra.
Só de pensar no que pode acontecer caso não consigamos, sinto meu
corpo estremecer…
Não…
Nem a pau.
Nós vamos conseguir.
Não importa como.
Saio de sua sala e caminho a passos largos em direção ao segundo
andar, onde encontro Scott Adams, o meu chefe de segurança, pelo
caminho.
— Algum problema, Rossi? — o moreno alto me pergunta, notando
minha inquietação.
— A porra do Banco Central vai lançar uma nova moeda.
— Ah, caralho…
— Por isso eu convoquei o conselho — aviso, guiando-o até a sala de
reunião.
Ao entrar, já encontro Nathan Phillips, meu contador, nos
aguardando.
— Rossi — cumprimenta-me em um aceno de cabeça. — Qual é a
emergência?
— Vou esperar todos chegarem para falar uma vez só.
Dirijo-me ao barzinho no canto da sala e pego três copos para nos
servir de uísque. Meus homens sentem a minha tensão, e aos poucos vão
chegando os outros membros do conselho para compor a mesa.
Daniel Carter, meu advogado; Kaylee Morgan, a responsável pelos
cassinos; Blake Watson, o chefe da fábrica e amigo de longa data; e Samuel
King, o informante que trabalha infiltrado com meu maior rival: Elijah
Rodriguez.
Carter tranca a porta da sala e eu me sento à ponta da mesa soltando
uma bufada antes de conseguir.
— Gavin trouxe notícias do Fed — solto e olho para cada um dos
presentes. — Vão mudar a moeda americana.
O som de murmúrios e xingamentos ecoa por toda a sala e eu apenas
dou uma batida na mesa para que se calem.
— A nova moeda entrará em vigor a partir de janeiro. Ou seja, temos
pouco mais de seis meses para adaptar todo o nosso sistema e maquinário.
— E já sabe quais serão as mudanças na nota? — é Watson quem
pergunta.
— Pelo que entendi, vão mudar o design, o tamanho e a marca
d’água.
— É uma merda quando eles mexem na porra da marca d’água — o
responsável pela fábrica resmunga.
— Não temos tempo para lamentações — rebato. — Precisamos agir
rápido.
— E o cara novo do TI dá conta do recado? — é Nathan quem
pergunta agora.
— Pior que não — resmungo, pressionando o ossinho do nariz. —
Sabemos que o sistema do Fed é seguro para caralho e sem o Nathaniel…
— Já sei quem pode ajudar — Samuel me interrompe e todo mundo à
mesa se vira para ele. — Elijah mantinha uma hacker que trabalhava para
ele, a garota criou um sistema que executava os arquivos do Fed.
Inclino o corpo e cruzo os braços sobre a mesa.
Isso muito me interessa.
— E por que mantinha? Ele não a tem mais?
— A garota fugiu — anuncia. — Era namorada de Charles Walker,
seu contador, e o cara era agressivo com ela.
Solto uma risada de deboche.
— Não é de se espantar vindo da corja de Elijah.
Um bando de pau no cu.
— Eu acredito que ela será a chave aqui, Rossi — Samuel completa.
— E você sabe para onde ela foi? — pergunto, mesmo sabendo a
resposta.
Se Rodriguez não a tem, é porque não faz ideia de onde a garota se
meteu.
— Não faço ideia, mas podemos pedir O’Connell para rastreá-la —
diz se referindo ao nosso detetive particular. — Provavelmente deve ter
mudado de nome e…
— Faça o que tiver que ser feito — interrompo-o. — Revirem cada
canto da porra deste país e tragam essa garota para mim.
Ele assente e vejo Carter pegar o telefone para acionar o detetive.
— E rápido. — Aponto para o relógio na parede atrás de mim. — O
tempo está correndo.
Montamos um plano de ação para as próximas semanas até localizar a
garota e, mesmo sabendo que tenho a melhor equipe, não consigo relaxar.
Só serei capaz disso quando tiver a garota em meu domínio.
Pisco os olhos com força quando a luz do sol atinge o meu rosto, e me
sento na cama em um impulso, quando finalmente percebo onde estou.
Que lugar é este?
Como eu vim parar aqui?
Olho para tudo ao meu redor e não faço a mínima ideia de onde
esteja.
— O que…
Afasto o lençol e noto que estou vestindo uma camisola, isso faz meu
coração bater feito louco e minha garganta se fechar.
O que fizeram comigo?
Em um instinto, toco a virilha e o fato de não sentir nenhum
incômodo me faz respirar um pouco mais aliviada. Mas, ainda assim, não
sei o que fizeram comigo, onde estou, o que querem…
Levanto-me da cama e encaro o quarto ao meu redor, simples, de
paredes brancas e poucos móveis. Uma rápida conferência em minha mente
e não consigo me lembrar de ter visto este cômodo na casa de Elijah. Será
que ele se mudou?
O som da porta se abrindo me faz recuar e me encolher ao lado da
cama, olhando para o homem assustada.
— Trouxe um café para você.
Atrás do brutamontes, entra uma mulher de meia-idade, com um
sorriso amistoso no rosto e uma bandeja de café da manhã nas mãos. Ela se
aproxima e a coloca sobre a cama, em um convite silencioso.
— Come alguma coisa — pede e eu apenas a encaro assustada, sem
dizer uma palavra. — Você ficou muito tempo dormindo, menina. Precisa
comer…
Sua declaração me faz arquear uma sobrancelha.
— Quanto tempo? — minha voz sai tão baixa, que mal me escuto.
— Mais de quarenta horas — responde e sinto um frio percorrer a
minha espinha.
O que eles fizeram comigo em todo esse tempo?
Em um ato instintivo, puxo a camisola para baixo e ela me olha com
empatia.
— Não precisa se preocupar, fui eu que troquei você — diz,
parecendo ler meus pensamentos. — Chegou aqui desacordada e eu fiquei
incumbida de cuidar de você.
Engulo em seco, sem desviar os olhos dela, pensando se devo
acreditar no que me diz.
Sinto como se estivesse dizendo a verdade, mas não posso confiar em
ninguém.
Não mais.
— Sr. Rossi não deixou nenhum homem encostar em você, não se
preocupe.
Sua voz é tranquila, mas causa um turbilhão dentro de mim.
Esse nome…
Ela disse…
— Rossi? — pergunto com a voz trêmula.
— Sim, Lionel Rossi é o meu patrão.
Ah, não…
Minha cabeça gira e minhas mãos tremem ao reconhecer.
Não, não, não, não…
— Inclusive, ele virá te ver quando terminar de comer. — A mulher
aponta para a bandeja à minha frente e eu sinto tudo se revirar dentro de
mim.
Aquela onda de pânico me toma mais uma vez e uma tontura me
invade, fazendo-me segurar na mesinha de cabeceira para não cair.
Não, Deus…
Ele não…
Tento inspirar fundo, mas o ar não chega aos pulmões, então sinto
tudo girar.
Uma ânsia de vômito me golpeia e, se eu não estivesse com o
estômago vazio, certeza que colocaria tudo para fora agora.
Não posso acreditar…
Não…
Não…
Ele não…
Deus…
Meu corpo vacila e eu caio sentada no chão, abraçando-me com força,
em uma tentativa falha de me proteger.
Deito a cabeça nos joelhos e sinto as lágrimas caírem, rolando pela
minha pele.
Lionel Rossi.
Que piada de mau gosto o destino preparou para mim.
Eu sempre ouvi esse nome e as piores coisas a seu respeito, por isso
não posso acreditar que vim parar logo aqui.
Por que, Deus?
Por que comigo?
Eu, que fugi de Elijah pelos últimos meses…
Eu, que tentei me esconder a todo custo…
Tentei refazer a minha vida e me tornar uma desconhecida…
Mas tudo isso foi inútil.
A vida é uma desgraçada mesmo por me trazer logo para as garras de
quem eu mais temia.
Não bastasse tudo que passei nas mãos de Elijah…
Tudo de mal que ele me fez…
Aperto o corpo contra mim e as lágrimas vêm com mais força,
fazendo tudo tremer.
Eu só queria sumir…
Eu só queria…
Solto um soluço engasgado, sentindo tudo doer dentro de mim.
Eu, que saí de casa fugindo de quem mais me fazia mal…
Fui parar logo nos braços do inimigo.
— A garota acordou — Naomi me comunica, logo que entra em meu
escritório.
Essa informação me faz largar o que estou fazendo e me levantar para
ir ao seu encontro.
— Ela já comeu? — pergunto e minha empregada faz uma careta.
— Quase nada, senhor. Está muito assustada.
Naomi me conta como foi o primeiro contato com Ava e acabo
ficando intrigado quando relata o desespero da garota ao ouvir o meu nome.
Não me surpreendo, porque, se ela conviveu por anos no cativeiro do
Elijah, deve me medir na mesma régua que a ele.
— Vou lá conversar com ela.
— Só tome cuidado. A coitadinha não está bem.
Assinto e passo por ela, indo em direção ao quarto onde Ava está
hospedada.
Aqui, onde trabalho, é um casarão que separei para meu escritório e
local onde alinho tudo sobre meus negócios. E na mesma propriedade
temos o galpão onde fabrico as notas falsas, tudo longe da minha
residência, para que as coisas não se misturem.
Por fora, é uma casa como qualquer outra no bairro, mas por dentro
tem o que carrego de mais precioso.
Minha sobrinha só sabe que sou dono de cassinos, nada além disso.
Um dia ela terá que saber sobre meu verdadeiro trabalho, mas não será hoje.
Eu preciso manter Amy longe de tudo isso para protegê-la.
Passo pelo segurança instalado na porta do quarto de Ava e dou uma
batida antes de entrar.
Quando adentro o cômodo, sinto uma brisa me alcançar e noto que a
garota está de pé, de costas para mim, olhando para a janela aberta à sua
frente. Percebo que não usa mais a camisola com que Naomi a vestiu, e sim
calça jeans e camiseta.
Raspo a garganta e ela se vira em minha direção, fazendo-me sentir
um estranhamento no peito.
A garota é bonita.
Não, bonita não.
Ela é linda…
Os cabelos escuros, lisos, caem abaixo dos ombros e sua pele clara
não tem nenhuma mancha.
Mas o que mais me chama a atenção são os seus olhos.
Por trás das íris castanhas, consigo enxergar dor.
Eu sabia que poderia encontrar uma garota assustada, arisca e até puta
de ódio. Mas a tristeza que vejo em seus olhos me intriga.
— Oi — solto e ela não diz nada.
Ava cruza os braços e continua me olhando com um semblante
desolado, não consigo identificar se é verdadeiro ou se faz parte de algum
teatro.
Não a conheço, não confio nela, não posso baixar a guarda.
— Naomi disse que você não comeu quase nada — falo com a voz
firme. — Gostaria de algo especial? Posso providenciar e…
— Por que me trouxe aqui? — ela me interrompe.
Ótimo.
Vamos direto ao ponto.
— Eu tenho uma proposta para você.
A garota franze o cenho para mim antes de caminhar até a cama e se
sentar nela, abraçando o travesseiro. Eu continuo de pé, a alguns metros de
distância, com as mãos dentro dos bolsos da calça preta social.
— E para me fazer uma proposta precisava me sequestrar? — diz
com mágoa na voz.
Isso me faz soltar um suspiro.
— Sinto muito que as coisas não tenham sido do seu jeito — minto, já
que não sinto um pingo de remorso. — Mas eu precisava falar com você
e…
— E achou que tinha o direito de me dopar e me trazer para um lugar
desconhecido? — sua voz é mais ácida agora.
— Você viu quem estava atrás de você? — Cruzo os braços e a olho
firme, vendo seu semblante se assustar. — Pois é.
Ava engole em seco e aperta a fronha do travesseiro nas mãos.
— Eu realmente fui atrás de você para uma conversa amigável,
porém, chegando lá, meus homens descobriram que Elijah já tinha
aparecido com toda a sua cavalaria.
Ouvir o nome do meu rival faz a garota ter um sobressalto.
— Eu não podia deixar que a levassem — digo, coçando a barba,
ficando impaciente.
— E nem passou pela sua cabeça perguntar se eu queria vir até aqui?
Porra.
Eu impedi que aquele filho da mãe colocasse as patas nela de novo e
a garota preferia o quê? Voltar para as garras do infeliz?
— Sei que saiu de Henderson fugindo de Charles e Elijah — começo,
vendo seus olhos marejados. — E sei o que fizeram com você e…
— Não — ela me corta. — Você não sabe.
Estreito os olhos para Ava, tentando buscar algo em seu semblante,
mas tudo que encontro é aquela dor. Não sei de todos os detalhes sobre o
que aquele pau no cu fez com ela, mas, pelo visto, é ainda pior do que eu
esperava.
Desgraçado.
— Eles vão te caçar onde você estiver, Ava — alerto e ela não volta a
me olhar. — E sabe do que eles são capazes.
Ela solta uma risada sem humor e eu troco o peso de uma perna para a
outra. Continuo de pé, encarando-a firme e tentando decifrá-la.
— Você está segura comigo — garanto-lhe. — Elijah não cruza o
meu caminho.
Ela apenas solta um suspiro, balançando a cabeça.
— E o que quer em troca?
Agora seus olhos tristes encaram os meus.
— Está sabendo que vão mudar a moeda? — pergunto e ela apenas
confirma. — Então, preciso invadir o sistema do Fed para ter acesso aos
arquivos da nova nota e sei que você é capaz de fazer isso.
Ava fica em silêncio por um instante, fitando o longe antes de voltar a
atenção para mim.
— E se eu não quiser?
Não é possível que essa garota seja burra o bastante para sequer
cogitar voltar para o mundo e dar de cara com Elijah.
Puta que pariu.
Burrice tem limite.
— Se não quiser trabalhar comigo, vou te deixar ir — minto, porque é
óbvio que não vou permitir uma coisa dessas.
Custei a encontrá-la e o meu tempo está curto. Só preciso usar todas
as minhas armas para convencê-la a aceitar esse acordo.
— Mas já aviso que não vai conseguir escapar de Elijah —
argumento. — Seus homens estão vigiando a minha propriedade. Estou
monitorando tudo pelas câmeras. Eles sabem que está aqui — blefo e vejo
seus olhos se arregalarem.
Elijah não sabe que eu estou com Ava.
Pelo menos não ainda.
Quando meus homens raptaram a garota, fizeram o trabalho de
eliminar todos os outros que foram atrás dela. Então não voltou ninguém
para contar história para o filho da puta.
Ainda de pé, observo a garota apertar mais forte o travesseiro em suas
mãos, parecendo travar uma batalha interna em pensamentos.
Que ótimo que estou conseguindo deixá-la confusa.
Vulnerabilidade sempre é uma carta na manga.
— E por que eu deveria confiar em você? — pergunta desconfiada.
— Já deve ter ouvido meu nome por aí, não é? — indago e ela apenas
balança a cabeça. — Sabe com o que eu trabalho. Elijah não é só o meu
concorrente, mas alguém que me enoja.
Falo em tom áspero, agora demonstrando que jamais teria ligação
com aquele lixo.
— Não apoio sua forma de trabalho e posso não ser o mais ético dos
homens, mas não encosto o dedo em nenhuma mulher. — Daqui consigo
ver que seu corpo se estremece de leve. — Elijah está longe de me alcançar,
Ava. Eu tenho clientes que ele nunca vai conseguir conquistar. E o meu
maior desejo é tirá-lo do caminho. Então, me diga, por que eu entregaria
você a ele?
Olho dentro de seus olhos e demonstro toda a minha firmeza.
Não estou brincando.
Não é possível que essa garota não consiga acreditar em mim.
— Preciso de alguém para tomar conta do meu TI e acessar os
arquivos do Fed. — Aponto o dedo para o meu peito e em seguida em sua
direção. — E você precisa se esconder de Elijah.
Seus olhos aflitos desviam-se dos meus agora.
— Além da sua segurança, ofereço um bom salário e vários
benefícios — proponho e ela me olha pensativa.
A garota parece inclinada a aceitar, mas ainda assim há algo que a
bloqueia.
— Eu te dou a minha palavra, Stone. Ele não vai te encontrar aqui —
minha voz é alta e bem mais firme agora. — Está segura comigo.
Fito-a por um momento e seu semblante confuso me diz que ela não
vai ceder por agora, então é melhor lhe dar um tempo.
Preciso ir com calma e conquistar sua confiança, caso contrário posso
colocar tudo a perder.
— Pode pensar com calma e me dar uma resposta amanhã — aviso,
ganhando sua atenção mais uma vez. — Não sei o que te disseram sobre
mim para estar tão assustada, mas acredite. Eu não sou como ele.
Só de falar isso, sinto náusea.
Jamais serei comparado com aquele verme.
Ava engole em seco e aperta o travesseiro mais uma vez.
— Pense no que quer comer e peça para Naomi. Ela vai providenciar
para você — digo e ela permanece em silêncio. — Quero que se sinta
segura e confortável aqui, então o que estiver ao meu alcance farei por
você.
Aceno para ela e saio do quarto, deixando-a sozinha.
Do lado de fora, encontro o segurança que designei para ficar de olho
em Ava.
— Reynolds, dê uma volta — peço, gesticulando com o dedo. —
Fique de olho na garota, mas saia da porta para dar um pouco de espaço a
ela.
— Deixa comigo.
Liam Reynolds balança a cabeça e sai de perto do quarto, indo para a
sala do outro lado do corredor, sem tirar o cômodo de seu campo de visão.
A segurança da minha propriedade é bastante reforçada, o que me
tranquiliza. Porém, a garota conseguiu escapar das mãos de Elijah, então
não vou facilitar para que aconteça o mesmo comigo.
Encontro Naomi na cozinha e vejo-a trabalhar ao lado da cozinheira.
— Veja o que a garota quer comer — instruo-a. — Deixei claro que
você providenciaria o que ela precisasse.
— Claro, Sr. Rossi — minha empregada me olha, solícita.
— Veja se ela precisa de mais alguma coisa. Algum canal pago, livro,
videogame, sei lá. — Dou de ombros e coço a barba. — Qualquer coisa que
a deixe mais confortável aqui.
— Pode deixar. Ela me parece ser uma boa menina. — Naomi me
abre um sorriso amistoso. — E me parte o coração vê-la tão assustada. Farei
de tudo para que se sinta melhor.
— Ótimo — concordo em um aceno. — Mantenha-me informado de
tudo.
Saio da cozinha e vou até o galpão da fábrica, encontrando Blake na
entrada.
— E aí, alguma novidade com a hacker? — ele me pergunta curioso.
— Fiz a proposta a ela, mas está resistente. Pelo visto, o filho da puta
do Elijah fez algo pior do que eu pensava.
O’Connell não conseguiu descobrir muita coisa do passado da garota,
mesmo com a ajuda de Samuel. Só sabemos que Charles era abusivo com
ela e Elijah a maltratava, não temos mais detalhes. Mas a forma como ela
me olhou hoje me diz que há muito mais nessa história.
— A garota está com medo de mim — revelo. — Deve pensar que eu
farei o mesmo que aquele bosta.
— Porra… — Blake esfrega a mão na barba, nervoso. — Pior que
temos pouco tempo, Rossi.
— Eu sei — respondo impaciente.
Cada dia que passa é um a menos para conseguir trabalhar e adaptar
toda a minha produção. Sem contar que tive que suspender as vendas por
tempo indeterminado. Não posso continuar produzindo notas que em breve
perderão a validade.
Que prejuízo do caralho.
— Preciso ganhar a confiança da garota, caso contrário ela não vai
colaborar.
— Está certo. — Ele suspira. — Só precisamos ser rápidos. Inclusive,
as ligações não param de chegar. Nossos clientes e parceiros estão
preocupados e querendo uma satisfação.
Praguejo baixo.
Ainda tem essa.
Não basta tudo que estou passando aqui, ainda tenho que lidar com
clientes que não querem nem saber. Só querem a porra do dinheiro certo.
— Vou dar um jeito nisso. Pedirei ao Carter para marcar uma reunião
com os principais parceiros, inclusive os russos. Com a garota em meu
poder, temos um trunfo.
Tiro um cigarro do bolso e o acendo com o isqueiro. Dou um trago
forte e jogo a fumaça para o alto.
— Eles só precisam confiar em mim.
Deixo o galpão e caminho de volta até o meu escritório, chamando
Carter para uma reunião de alinhamento de tudo.
Preciso acalmar os ânimos neste momento, ou ficarei louco.
O futuro dos meus negócios está nas mãos daquela garota.
Esfrego o rosto, impaciente.
Preciso fazer com que ela confie em mim.
Duas batidas à porta e eu vejo Naomi entrar no quarto, com o habitual
sorriso no rosto.
Essa senhora de semblante sereno me faz relaxar um pouco. Algo me
diz que posso confiar nela. Sinto como se tê-la por perto fosse uma garantia
de que Lionel não me fará mal.
Lionel Rossi…
Eu não esperava conhecê-lo um dia, muito menos que fosse tão
bonito.
Os olhos azuis são perfurantes e adornam bem o rosto de traços finos.
Os cabelos e a barba têm um tom castanho-claro com alguns fios brancos.
Eu arriscaria um palpite, ele deve ter uns quarenta anos e, pela sua postura
imponente, imagino que tenha o respeito de todos por aqui.
Ainda não sei se posso confiar nele, se posso acreditar que tudo o que
me diz é verdade. Mas, pela forma como se dirigiu a mim, pude perceber
que é bem diferente de seu rival.
Por anos sofri na mão de Elijah e seus capangas, que me tratavam
como lixo. Agiam como se eu fosse uma mercadoria descartável e que
estava ali apenas para servi-los.
Por isso, quando eu ouvi o nome de Lionel, simplesmente entrei em
pânico, por pensar que ele não só fosse igual, como muito pior.
Mas a firmeza que encontrei em seus olhos me intrigou.
Lionel não quis me forçar a fazer as suas vontades. É nítido que me
trouxe por puro interesse próprio, caso contrário não me tiraria de New
Richland. Mas, quando me disse que me deixaria ir embora, meu coração
falhou uma batida.
Mesmo me trazendo para este lugar contra a minha vontade, ele me
deu alternativa. Me deu chance de escolha e não me lembro da última vez
que isso aconteceu comigo.
E a sua promessa de que Elijah nunca chegaria perto de mim me
trouxe um pouco de conforto no peito.
Lionel não estava errado quando disse que Elijah me caçaria até o fim
do mundo. Eu bem sei o que aquele homem é capaz de fazer quando quer.
E, se ele sempre precisou de mim, agora ficou ainda pior com a mudança de
moeda.
Mesmo que eu não tenha motivos para confiar em Lionel, saber que
ele pode me oferecer a segurança de que eu preciso é tentador.
Neste momento, sinto que a única pessoa que pode me ajudar é ele.
— Sr. Rossi me pediu para vir até aqui — Naomi diz quando se
aproxima de mim.
Sentada na cama, aperto o travesseiro em uma tentativa inútil de me
proteger.
— Você quer comer alguma coisa em especial? Quer algum
passatempo? Roupas novas? — oferece.
— Não sei — solto por fim. — Eu só queria não ter que estar aqui…
— minha voz sai bem mais baixa agora.
— Se quiser ir embora, tenho certeza de que ele te deixa ir.
Seus olhos me analisam com cuidado.
— Mas, se eu sair daqui, vou me deparar com algo muito pior. —
Sorrio fraco.
Quando foi que minha vida se tornou essa tormenta?
Quando é que estar com um inimigo pode ser minha melhor opção?
Solto um suspiro me sentindo cansada.
Cansada de como minha vida virou um inferno sem que eu tenha
procurado por isso.
Era para eu ser uma jovem livre para viver, para me divertir…
E não uma prisioneira.
— Sei que não nos conhece — a empregada volta a falar. — Mas não
vamos machucá-la. Sr. Rossi não permitiria isso.
Sua voz é firme e me lembra as promessas de Lionel de não me
machucar. A forma como ele disse que não é como Elijah pareceu
incomodá-lo.
— Aproveite que ele lhe deu carta-branca e faça seu pedido.
Naomi me dá uma piscadinha cúmplice e eu sorrio.
Pela primeira vez desde que cheguei aqui.
— Não está com fome? — insiste.
Agora que o susto passou, consigo sentir mais vontade de comer.
Penso no que não como há muito tempo e então tenho um estalo.
— Acho que vou querer um fast-food — digo e vejo seu sorriso se
abrir. — Hambúrguer, batata frita e milk-shake.
Na cidadezinha em que eu morava, não tinha acesso a grandes redes,
então de repente me deu saudade de comer essas porcarias…
— Perfeito! Vou providenciar para você. — Ela se levanta da cama
sorridente. — Veja se gosta dos canais que temos. — Naomi aponta a TV
de frente para a cama. — Se precisar de mais algum, só me dizer.
Assinto e ela pede licença para sair.
Mas, quando está na porta, se detém.
— Sr. Rossi pode não ter o trabalho mais honesto. — Ela franze o
cenho para mim. — Mas não é uma má pessoa. Pode confiar.
Naomi me deixa sozinha e eu me deito na cama, fitando o teto por um
instante.
Penso em tudo que poderia ter me acontecido se Lionel não tivesse
aparecido, agora eu estaria nas mãos de Elijah e ele seria muito pior
comigo. Principalmente por ter fugido.
Suspiro e sinto um aperto no peito.
Essa não é a vida que eu queria.
Mas não posso negar que me sinto mais segura aqui dentro.
Se Lionel realmente cumprir o que me disse, poderei dormir em paz
depois de tantos anos.
Após comer o lanche que pedi, decido dar uma volta pela propriedade
de Lionel, para conhecer um pouco do que temos aqui.
Não o vejo de novo, porém percebo olhares furtivos por onde passo.
As empregadas me cumprimentam e os seguranças apenas me olham
atentos, vigiando cada um de meus passos.
O casarão é de apenas um pavimento, com um vasto pátio ao centro,
onde fica a maior concentração dos seguranças. São vários cômodos
espalhados pelo local, como cozinha, banheiros, lavanderia, sala de
reuniões, salas de operações, o escritório de Lionel e algumas suítes, como
aquela em que estou instalada.
Indo agora para fora do enorme casarão, noto um jardim com uma
fonte linda. Alguns banquinhos de madeira debaixo da árvore me fazem
pensar que deve ser uma delícia ler um livro ali, naquela calmaria.
Pelo que pude notar, Lionel não mora aqui. Apesar de toda sua
estrutura, o lugar parece ter sido projetado apenas para negócios, devido ao
entra e sai de pessoas bem-vestidas.
Fico pensando onde mora e se tem alguém por ele…
Pessoas desse tipo costumam ser sozinhas e lembro que não vi
nenhuma aliança em seu dedo. Mas acho pouco provável que seja solteiro.
Lionel Rossi exala poder, além de ser lindo…
Dando a volta pelo jardim, vejo um enorme galpão ao longe e, pela
segurança reforçada ao redor, imagino que seja onde são fabricadas as
notas.
Será que seu maquinário é semelhante ao de Elijah?
Será que usam a mesma tecnologia?
Sinto uma curiosidade crescer dentro de mim, mas não ouso me
aproximar. Prefiro caminhar por território seguro.
Em pouco tempo, circulo toda a propriedade e vejo que não há muito
mais o que fazer aqui. Afinal, não é um lugar para entretenimento, e sim
para trabalho.
Trabalho…
Ainda estou em dúvida se devo aceitar ou não a proposta de Lionel.
Sei que não tenho outra escolha e que é o melhor a ser feito, mas
ainda assim…
Queria tanto não ter que voltar para esse caminho.
Queria tanto ter uma vida livre, mas já entendi que isso é impossível
para mim.
Se eu sair daqui, Elijah vai me capturar no mesmo instante e me levar
de volta ao inferno.
Não deveria considerar uma escolha dessas, mas entre voltar para as
garras de quem só me fez mal e trabalhar para seu inimigo…
Não preciso pensar demais para ter a resposta.
Afinal, “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”.
— Mandou me chamar, senhor? — Naomi pergunta logo que entra
em meu escritório.
— Como está a garota? Alguma evolução?
Desde que conversei com ela ontem, deixei-a o restante do dia à
vontade. Sei que deu uma volta pela propriedade e pediu alguns livros para
ler, produtos pessoais e um fast-food para comer.
Hoje tratei de não a incomodar logo cedo, mas meu prazo está
correndo. Não posso deixar que ela me responda quando bem entender.
— Está mais tranquila agora. Um pouco menos desconfiada — relata.
— Ótimo.
— Ainda está assustada, mas acho que é questão de tempo até se
soltar.
— Continue dando a ela todo o suporte de que precisar e me
mantenha informado de tudo.
— Está certo.
— Ela está no quarto agora?
— Pelo que eu vi, está no jardim lendo um livro.
Confiro a imagem das câmeras no monitor e encontro-a sentada no
banco de madeira, debaixo de uma árvore.
— Vou falar com ela.
Deixo o escritório e caminho a passos largos em direção à área
externa da casa, parando apenas quando me aproximo dela. O som do meu
sapato esmagando o gramado chama a sua atenção.
Ava ergue o olhar para me encarar e consigo notar o vinco que se
forma entre as sobrancelhas. Mas seus olhos parecem mais calmos agora,
menos doloridos.
— O morro dos ventos uivantes? — pergunto, apontando para o
exemplar que ela tem em mãos.
— É o meu clássico favorito — responde.
E, pelo seu tom de voz, consigo encontrar uma firmeza que antes não
havia ali. Isso me dá uma fagulha de esperança, talvez ela concorde em
colaborar.
— Já ouvi muito a respeito, mas nunca li.
— Não gosta de ler? — pergunta, com o semblante levemente
curioso.
— Não tenho tempo para isso — rebato.
Eu já divido a minha vida entre cuidar dos cassinos, da falsificação de
dinheiro e ser um pai para a minha sobrinha. Evidentemente não me sobra
tempo para leituras.
Mas, quando digo isso, seu semblante murcha um pouco.
— Posso te interromper? — pergunto, ainda encarando-a de pé.
— Você já fez isso.
Sua expressão impaciente me faz sorrir. Essa é muito melhor do que a
dolorosa que encontrei ontem.
— Quero te mostrar a fábrica.
Quando digo isso, seus olhos se iluminam. Ela rapidamente fecha o
livro, marcando a página em que parou, e se coloca de pé.
— Curiosa para conhecer o trabalho, Stone? — indago, arqueando a
sobrancelha para ela.
— Preciso saber onde estou me metendo.
— É justo.
Conduzo-a até o galpão e, quando passamos pela segurança, o som
das impressoras ecoa o ambiente. Por mais que eu tenha pausado as vendas,
preciso entregar as últimas encomendas prometidas.
Os olhos de Ava brilham quando ela percorre o extenso galpão,
parecendo impressionada com o que vê.
Decido apresentar a ela cada processo, por isso guio-a até a seção de
conferência do papel.
— Aqui é feito o controle de qualidade de cada folha. — Aponto para
os grandes rolos de papel. — Ele passa por uma conferência rigorosa, para
que não tenha nenhum defeito.
— É você quem fabrica o papel? — pergunta e eu nego.
— A matéria-prima vem de fora do país e eu tenho um fornecedor
que trabalha exclusivamente para mim. Ele já me entrega os rolos prontos.
— Hummm…
Ava toca uma folha e eu lhe mostro as três camadas que o compõem,
dando uma explicação rápida sobre todos os testes a que são submetidos.
— A marca d’água é impressa ainda no processo de fabricação do
papel. Note que todas as folhas já vêm com ela.
Pego uma lanterna no balcão e ilumino o papel, mostrando as marcas
espalhadas por toda a folha.
— É incrível… — murmura e eu sorrio.
Esse trabalho é o meu maior orgulho.
— Ali fica o armazenamento das tintas. — Aponto para uma parede
lateral do galpão. — Cada nota tem uma combinação diferente de cores e é
outro trabalho minucioso para que saia impecável.
— Imagino que sejam bem resistentes — comenta.
— São feitas para suportar tudo. Sol, chuva, água do mar.
Absolutamente tudo.
Ava assente e observa cada canto deste lugar até eu lhe apresentar a
área de impressão.
— E ali as folhas passam por três processos distintos de impressão até
chegar ao resultado final.
Calço um par de luvas e pego uma das folhas já impressas de notas de
cem dólares para mostrar a ela. Ava inclina o corpo para observar o papel
bem de perto e o seu cheiro me invade.
É um misto de chocolate com avelã, um aroma diferente de tudo que
eu já senti.
— Parecem mesmo de verdade… — sussurra e eu solto uma risada.
— Elas são de verdade, Ava. Só não são registradas pelo Banco
Central.
Ela assente e eu largo a folha inteira, levando-a à próxima seção.
— E aqui é feito o corte, milimetricamente calculado.
Aponto para as máquinas e mostro o exato momento em que dividem
a folha de papel, liberando as cédulas perfeitas.
Alcanço uma da pilha e entrego a ela, que pega com cuidado de
minhas mãos.
— Um presente de boas-vindas — proponho e Ava abre um esboço
de sorriso.
— Mas ainda não aceitei sua proposta…
— Ainda.
Levo-a à última etapa, onde as notas são embaladas e preparadas para
os malotes.
— Aqui o setor de logística faz toda a conferência das notas e registro
interno delas. Se tiverem um mínimo defeito, são descartadas
imediatamente. Eu só trabalho com perfeição. — Aponto para a minha
equipe, que trabalha com maestria. — Esses são os últimos pedidos que
temos para entregar por esses dias. Por enquanto as encomendas estão
suspensas, até que eu adapte a minha produção.
Tiro as luvas da mão e jogo na lixeira, cruzando os braços para
encará-la.
— Temos um enorme desafio, Ava. E eu preciso de você.
A garota desvia o olhar do meu e parece relutante.
— Eu não queria voltar para essa vida… — confessa e eu toco seu
cotovelo, conduzindo-a para fora do galpão.
O contato da minha pele na sua causa uma estranheza dentro de mim.
— E tem outra escolha? — pergunto quando chegamos novamente ao
jardim. — Você já está envolvida até o pescoço nesse mundo, não há como
voltar atrás…
A garota suspira e me abre um sorriso fraco.
— Queria tanto não ter conhecido Charles…
Seu olhar vai longe agora e parece se envolver em lembranças.
— Infelizmente não é possível mudar o passado. Mas posso garantir
que ninguém mais fará mal a você. Aceite minha proposta. Tenha a
segurança de dormir em paz sabendo que nunca mais será machucada.
Ava abraça o corpo e olha para o céu por um longo momento antes de
assentir.
— E quando o meu trabalho acabar?
— Como?
— Depois que eu invadir o sistema do Fed e dar a você o que quer. O
que fará comigo? — pergunta me encarando firme agora.
Dou um passo em sua direção, encurtando a nossa distância, e
ficamos cara a cara. Quase consigo sentir sua respiração daqui.
— Um sistema como o seu precisa ser mantido — afirmo. — E
protegido de uma possível invasão. Então, mesmo que me entregue os
arquivos para confecção da nova nota, seu trabalho não terminará comigo.
Não desvio meus olhos dos seus para que ela entenda que estou
mesmo falando sério.
Ava Stone é altamente qualificada e eu seria burro se a deixasse
escapar. Se depender de mim, terá emprego vitalício comigo.
Seus olhos castanhos perfuram os meus e, quando percebe que não há
dúvidas aqui, finalmente decide ceder.
— Tudo bem.
Um alívio tremendo toma conta de mim e meu coração se acelera
dentro do peito na expectativa do que está por vir.
Porra!
Nós vamos conseguir.
— Do que você precisa?
Ava faz uma lista para começar o trabalho e imediatamente aciono
Mia para providenciar.
Com tudo acertado, não consigo conter um sorriso.
É, Elijah… Você se fodeu.
E eu não poderia estar mais feliz por isso.
— Você vai comigo para San Diego? — indago Lionel quando ele me
diz que já fez a reserva no hotel em nome de Caroline.
Antes de fugir das garras de Elijah, fiz um backup do programa que
eu criei para ele e deixei em um cofre em San Diego. Deu trabalho demais
criar aquele sistema para simplesmente abandonar.
E, agora que aceitei a oferta de Lionel, preciso buscar o backup para
prosseguir. Por mais que tenha um sistema próprio para confecção das
notas, não é habilitado para executar os arquivos do Fed como o meu.
— Com toda certeza. Não que eu não confie em meus seguranças,
mas prefiro estar por perto.
Arqueio a sobrancelha e assinto.
Lionel ainda é um mistério para mim.
Por mais que eu tenha aceitado sua proposta, não consigo ter certeza
de que posso confiar cem por cento nele. E mesmo que tenha demonstrado
ser uma pessoa diferente de seu rival, não posso deixar de ficar em alerta a
seu respeito.
Não sei o que é capaz de fazer comigo…
Na verdade, a essa altura da minha vida, sei que não posso confiar em
ninguém. Mas o que me fez ceder, além de saber que sem a sua ajuda
estarei nas mãos de Elijah de novo, foi a forma como depositou sua
confiança em mim.
Em todos os anos de trabalho com seu rival, este nunca me levou até a
fábrica de dinheiro falso. Apenas me mostrava algumas filmagens e levava
as notas já prontas para mim. Elijah jamais permitiu que eu entrasse lá,
dizia que aquele não era lugar para mulheres.
Sempre tive muita curiosidade para saber como é. Por isso, quando
Lionel me levou para o galpão e me mostrou todos os processos para
confecção das notas, algo dentro de mim se acendeu. Um gesto que para ele
poderia ser rotineiro, para mim, significou muito.
Então foi ali que Rossi me convenceu a aceitar sua proposta. E peço
aos céus para não estar cometendo um erro.
— Nós vamos passar apenas uma noite lá — explica e interrompe
meus pensamentos. — Vamos amanhã de manhã e retornaremos no dia
seguinte.
Engulo em seco e abraço meu corpo pensando na proximidade dessa
viagem, mas sei que não tenho escolha. Lionel não vai me deixar ir sozinha
e, sendo bem sincera, eu também não me sentiria segura dessa forma. É
irracional isso, já que acabei de conhecê-lo, mas saber que ele estará por
perto me tranquiliza.
Só espero que ninguém me olhe diferente nesse percurso, já que
viajarei sozinha com vários homens que nunca vi.
— Tudo bem — respondo em um suspiro.
Que escolha eu tenho?
— Preciso da peruca loira e das lentes azuis — constato.
Quando acordei, há alguns dias aqui em Las Vegas, já estava sem a
peruca, mas as lentes coloridas eu tirei e joguei no lixo.
— Já providenciei para você — diz. — Naomi está incumbida de te
ajudar a fazer as malas.
A empregada de Lionel foi uma boa surpresa desde que cheguei aqui.
Ainda não confio por completo nas pessoas deste lugar, mas ela me causou
uma boa impressão. Pelo menos tem feito de tudo para que eu me sinta bem
por aqui e é bom conversar com uma mulher, no meio de um ambiente, em
sua maioria, masculino.
— Certo…
— O computador com as configurações que você pediu chega no fim
da semana. E o laptop também.
— Tudo bem.
Olho para o escritório de Lionel e vejo-o de braços cruzados, com o
quadril encostado na mesa. Noto o quanto é imponente.
Não é um homem dado a sorrisos, está sempre com o semblante sério
e uma firmeza na voz impressionante. Até o jeito como anda pela
propriedade chama a atenção.
Lionel anda como se fosse dono do mundo.
E a sensação que eu tenho é de que é exatamente assim.
— Precisa de mais alguma coisa? — pergunta e eu nego. — Está
liberada agora.
Ergue a cabeça em direção à porta e eu assinto.
Quando estou do lado de fora, encontro Liam Reynolds, o segurança
incumbido de me vigiar, e aceno para ele. O homem tem cara de poucos
amigos, mas pelo menos não me olha como se fosse me devorar.
Sinto um calafrio só de pensar na forma como os homens de Elijah
me encaravam…
Volto para o meu quarto e encontro Naomi me esperando com a mala
aberta sobre a cama.
— Trouxe algumas roupas novas para você!
O sorriso terno que a senhora abre faz o meu coração se aquecer
dentro do peito.
— Mas você sabe o meu gosto? — Faço uma careta para ela em tom
de brincadeira.
— Claro que sei!
As sacolas que Naomi me abre dizem que realmente conhece minhas
preferências. São várias calças e shorts jeans, além de camisetas leves e
confortáveis. Encontro também alguns pares de tênis e sandálias baixas.
— Você não me parece ser alguém que gosta de salto alto — arrisca
um palpite.
— Não mesmo. É tudo perfeito, Naomi. Obrigada!
— Tenho mais uma coisa para você…
A mulher mexe em algumas sacolas e pega uma caixinha de veludo,
chamando a minha atenção.
— Notei que quando chegou usava um brinco pequeno de pedra.
Como Lionel me pediu para comprar um presente de boas-vindas para você,
pensei que fosse uma boa escolha.
Meu coração se acelera dentro do peito quando pego a pequena caixa
de suas mãos. Ao abrir, encontro um colar de ouro com uma pedra delicada,
que combina bastante com os brincos.
— É lindo… — sussurro ao tocar a joia.
— É um presente de Rossi para você — diz e eu sinto meu coração
errar uma batida.
Vou até a penteadeira na lateral do quarto e coloco o colar, sentindo-o
encostar em minha pele e vendo o quanto ficou lindo.
— Obrigada, Naomi.
— Agradeça a ele. — A senhora dá de ombros. — Agora vamos fazer
as malas?
Pelos próximos minutos, Naomi me ajuda a organizar tudo para a
viagem e me conta que não sai da cidade há muitos anos. Ela é viúva, cuida
do neto nas horas livres e, quando fala dele, seu semblante se ilumina. A
senhora aproveita para me mostrar alguns vídeos do pequeno no celular, é a
coisinha mais fofa.
Vê-la falar com tanto orgulho da família me faz sentir um aperto no
peito por saber que sou completamente sozinha no mundo.
Já faz uns bons anos que não sei o que é ter amigos e até mesmo uma
família…
A tarde passa voando e, quando já é noite, fico deitada no quarto
vendo um filme qualquer na TV.
Meu coração está acelerado de ansiedade pela viagem de amanhã e
por sair desta fortaleza de Lionel pela primeira vez.
Ainda que a viagem seja feita em seu jatinho particular e com
segurança reforçada, não consigo deixar de pensar na possibilidade de ser
descoberta.
A sensação que eu tenho é de que, assim que atravessar esses muros,
serei levada de volta para as garras de Elijah, e pensar nisso me causa ânsia
de vômito.
Isso não pode acontecer.
Preciso confiar que Lionel vai cumprir a sua promessa e me manter
segura.
Preciso confiar, ou ficarei maluca.
Desço do jatinho e Lionel toca as minhas costas enquanto me guia até
o carro preto que já espera por ele. Ainda que eu esteja usando um casaco
fino, um arrepio percorre a minha pele por senti-lo me tocando, mesmo que
de forma sutil.
Por mais que esteja usando a peruca e óculos escuros, prefiro andar de
cabeça baixa até ser acomodada no banco traseiro do veículo. Atrás de nós,
mais um carro é seguido pelos seguranças de Lionel.
Para a viagem de hoje, conseguiram uma segunda via dos documentos
falsos que fiz para Caroline Williams, pois acabei deixando os que eu tinha
para trás. Espero que o banco não seja resistente em me fornecer uma cópia
da chave. A original ficou em um cofre, em uma cidade vizinha a New
Richland.
— Vamos primeiro para o hotel fazer o check-in — a voz grossa de
Lionel interrompe meus pensamentos. — Deixamos nossas coisas lá e
seguimos para o banco.
— Tudo bem.
Assinto e encosto a cabeça no vidro, vendo a cidade de San Diego
através da janela. É diferente estar aqui de novo sem ter aquela sensação
ruim de perseguição.
Eu me lembro bem de como foi assustador vir até aqui fugindo de
Elijah e com medo de ser descoberta.
Lionel conversa com o motorista e seus seguranças, mas não presto
atenção alguma. Estou mergulhada em pensamentos e lembranças não
muito boas da minha vida.
Quando chegamos ao hotel, fazemos o check-in e ele se apresenta
como Richard Freeman, meu suposto noivo. O sorriso irresistível que dirige
à recepcionista enquanto acerta os detalhes de nossa hospedagem me faz
sentir um frio na barriga.
É uma versão que até então eu não conhecia.
Com tudo liberado, subimos pelo elevador até o décimo andar do
hotel.
— A suíte é única, apenas para manter as aparências — explica
quando abre a porta e me revela o interior.
Meu corpo inteiro se estremece por toda essa proximidade com ele.
Não vamos ficar juntos, não é?
— Não vamos ficar no mesmo ambiente — diz, fazendo-me respirar
um pouco mais tranquila. — São dois quartos distintos.
Aponta para as duas portas separadas pela ampla sala com sofás,
televisão, uma minicozinha e uma linda sacada.
— Você nem vai notar a minha presença — avisa. — Pode guardar os
seus pertences.
Pego minha mala e abro a porta do meu quarto, sendo surpreendida
com a enorme cama king-size. Ao lado também há uma sacada com vista
para a cidade e um banheiro luxuoso.
Admiro tudo maravilhada e penso que mais tarde, quando ficar
sozinha em meus aposentos, vou querer desfrutar de um banho de espuma.
Sempre tive vontade de experimentar um e não vou perder essa
oportunidade.
Deixo minha mala num canto e pego a bolsa, conferindo todos os
documentos de Caroline. Confiro o meu visual no espelho e saio do quarto,
encontrando Lionel de pé na sacada.
Quando nota a minha presença, ele se vira para mim. Engulo em seco
ao vê-lo me encarar com aquela intensidade azul. Lionel usa uma camisa de
botões branca e calça cáqui. Os óculos modelo aviador estão encaixados na
gola da camisa. Percebo que as mangas estão dobradas na altura dos
cotovelos, revelando algumas tatuagens em seus braços.
Logo que eu o conheci, notei uma de crucifixos no pescoço e me
pergunto se ele tem mais algumas pelo corpo.
— Pronta? — pergunta com a voz grossa e eu assinto, engolindo em
seco.
A sua presença, tão próxima a mim, me intimida.
Deixamos a suíte e já encontramos seus seguranças nos aguardando
no corredor. Noto que estão todos usando roupas descontraídas para
disfarçar um pouco a missão de cada um por aqui.
Descemos pelo elevador e seguimos até o estacionamento, onde mais
uma vez me acomodo no banco traseiro, ao lado de Lionel. Sentada tão
próximo dele, consigo notar o seu perfume marcante.
É um aroma amadeirado forte e bem másculo.
— Está tranquila para fazer o que precisa? — ele me questiona e eu
confirmo.
— Só preciso parecer confortável ao seu lado.
— Não será difícil. Caroline e Richard são um casal apaixonado —
diz pegando a minha mão para beijar.
E essa mínima proximidade dele causa um rebuliço dentro de mim.
Minha respiração pesa e Lionel dá uma piscadinha para mim antes de
me soltar, iniciando uma conversa com Liam ao seu lado.
Durante todo o trajeto até o banco, meu coração fica acelerado dentro
do peito e eu penso no quanto é perigoso ter esse homem por perto.
Preciso me lembrar de quem é o sujeito ao meu lado e de como
manipula tudo para conseguir o que quer.
Preciso me lembrar disso todas as vezes que ele me olha de um jeito
diferente.
Quando chegamos à porta do banco, Lionel desce do carro comigo,
acompanhado de Liam e Caleb, o outro segurança. Mesmo que não possam
entrar armados, os homens ficam à espreita e em comunicação com os
seguranças de fora, caso seja necessário.
— Lembre-se de que você é uma noiva apaixonada — Lionel sussurra
em meu ouvido logo que adentramos o local e um arrepio percorre a minha
espinha.
Apenas assinto para ele enquanto caminhamos lado a lado em direção
ao gerente do banco, que para a minha sorte me reconhece.
— Srta. Williams, que bom revê-la — o funcionário me saúda logo
que apresento meus documentos.
— O prazer é meu, Isaac — respondo, lendo o seu nome no crachá e
me lembrando de quando estive aqui pela primeira vez.
Sorrio olhando para Lionel ao meu lado.
— Richard Freeman — ele se apresenta e estende a mão para o
gerente, que a aperta sorrindo. — Sou o noivo de Caroline.
A forma como ele diz a palavra noivo causa um estrago dentro de
mim.
— Meus parabéns pelo noivado! — Isaac indica com a mão para que
nos sentemos à sua frente. — Para quando é o casamento?
— Daqui a um mês — digo, tentando sorrir sem demonstrar o quanto
estou nervosa com essa mentira. — Mas já estamos em clima de lua de mel.
— E como estamos… — Lionel diz, inclinando-se para depositar um
beijo em meu ombro.
Minhas pernas bambeiam pelo contato e eu endireito o corpo para
disfarçar o quanto isso mexeu comigo.
— Então, Isaac. Com todo o processo de mudança para o novo
apartamento, acabei perdendo as chaves do meu cofre. Pode me fornecer
uma cópia?
— Perfeitamente.
O gerente abre a gaveta e retira uns formulários de lá.
— Só precisa preencher esses documentos, por favor.
Pego a caneta de suas mãos e faço o que me pede tomando o cuidado
de fazer a caligrafia de Caroline, e não a minha. Com tudo pronto, uma
nova cópia me é entregue e eu sou direcionada até o setor onde ficam os
cofres.
Lionel me acompanha no percurso e eu sinto meu coração se acelerar
em expectativa. Quando digito a combinação da senha e abro a porta, uma
fechadura é revelada e uso a chave em minhas mãos para destrancá-la.
Ao ver o pacote embrulhado que abriga o HD, abro um sorriso de
alívio.
— É isso? — Rossi me pergunta e eu confirmo.
Pego o pacote e desembrulho com cuidado, reconhecendo a peça
preta lá dentro.
— O maior projeto da minha vida está aqui — sussurro ao me
lembrar dos meses de trabalho intensivo para conseguir chegar ao resultado.
— Certo. Vamos guardar para levar a Las Vegas com segurança.
Assinto e guardo o pacote na minha bolsa, trancando o cofre ao final.
Quando saímos, acenamos para Isaac em despedida e encontramos
Liam e Caleb nos aguardando na saída.
— Tudo certo — Lionel se pronuncia e os homens nos acompanham
até o carro.
Dentro do veículo, pega o HD de minhas mãos, guarda dentro de uma
maleta codificada e eu mentalizo rapidamente a combinação, para o caso de
precisar.
O trajeto de volta para o hotel é feito de forma bem mais leve, pois
sabemos que o pior já passou.
Não vejo a hora de voltar para Vegas e começar o trabalho, pois eu
amo o que faço.
— O que quer comer para o almoço? — Rossi me pergunta logo que
entramos na suíte que vamos compartilhar.
— Vamos ter que sair? — indago.
Por mais que eu queira passear por San Diego, não me sinto segura
em andar por aí.
— Não, vou pedir para o serviço de quarto.
— Ah…
Enquanto descolo a peruca da cabeça e liberto meus cabelos, Lionel
pega o menu em cima da mesa e estende para mim.
Pego o cardápio de suas mãos e o analiso, pensando em qual
sanduíche escolher.
— Cabelos loiros não combinam com você.
Sua voz é baixa e eu ergo os olhos para encará-lo.
Ele umedece os lábios devagar e arqueia a sobrancelha de leve.
— Você fica bem melhor morena — a voz rouca faz o meu coração
bater feito um louco dentro do peito.
— Eu também acho — respondo e dou um passo para trás,
distanciando-me dele. — Vou querer um sanduíche de carne com queijo —
digo, devolvendo-lhe o cardápio.
— Mais alguma coisa?
— Pode ser um refrigerante.
Lionel assente e se vira para pegar o telefone, a fim de fazer o pedido.
Aproveito a deixa e vou até a sacada da suíte, onde me debruço no
parapeito desejando ver a cidade abaixo de nós. Ainda que esteja de dia,
San Diego é linda com todos os seus prédios e avenidas largas. O rio que a
circula dá um charme a ela.
— À noite fica ainda mais bonita.
A voz de Rossi surge atrás de mim e eu não me viro, apenas sinto-o
se posicionar ao meu lado.
— Só não é mais bonita que Vegas — comenta.
— Las Vegas é incrível…
Faz um bom tempo que não faço um programa noturno na cidade do
pecado, mas sei o quanto é linda à noite. Com todas aquelas luzes,
chafarizes, roda-gigante…
Cada cassino é um espetáculo à parte.
— Como é o seu? — pergunto e vejo um sorriso de lado se abrir.
Fiquei sabendo que, além do dinheiro falso, Lionel tem uma rede de
cassinos em Vegas, que mantém sua aparência de empresário bem-sucedido.
— São cinco ao todo — comenta e eu consigo perceber um toque de
orgulho em sua voz. — Três deles também contam com serviço de hotel.
Lionel faz um breve relato da estrutura de cada um deles e eu me
pego curiosa para conhecê-los.
— Eu gostaria de visitá-los — confesso, mesmo sabendo que não é
possível.
— Sem chance — ele me corta. — Tenho certeza de que há homens
de Elijah em todos os meus cassinos vigiando os meus passos.
— Eu sei. — Suspiro.
Meu olhar vai ao longe no instante em que a campainha toca para
entregar o almoço.
Lionel se afasta de mim para receber o pedido e eu o acompanho.
Quando me entrega as embalagens, eu estranho, pois o meu é o único
pedido.
— Preciso sair para resolver alguns assuntos — diz, pegando o
celular e desviando o olhar para a tela. — Fique à vontade para acionar o
serviço de quarto quando quiser.
— Ok…
— Liam está lá fora. — Rossi aponta para a porta atrás de nós. — Se
precisar de alguma coisa, basta chamá-lo.
— Tudo bem.
Lionel apenas acena antes de sair do cômodo, deixando-me
completamente sozinha. Solto um suspiro e levo o sanduíche até a bancada
da pequena cozinha para comer.
Por um instante tive a esperança de que ele fosse ficar comigo, mas
como fui tola.
Eu sou apenas alguém que vai lhe dar o que quer, nada mais.
Preciso me lembrar disso todos os dias.
Abro as embalagens e dou uma mordida no sanduíche enquanto penso
no que fazer hoje.
Ainda é cedo e só vamos retornar para Vegas amanhã de manhã, então
vou ter que procurar alguma coisa para fazer nessa suíte sozinha pelo resto
do dia.
Lembro-me daquela banheira maravilhosa que vi ao chegar e abro um
sorriso.
Termino de comer e já sei exatamente o que fazer.
— Ora, ora… — Abro um sorriso amistoso ao avistar os quatro
russos entrando em minha sala de negociações. — Se não é a cavalaria
eslava chegando ao meu cassino.
Brinco e o primeiro a fazer um xingamento em russo é Mikhail
Yaroslav, o antigo Brigadier da Bratva.
— Se você me desse boas notícias, Lionel, certamente eu não sairia
da Rússia para vir até aqui.
Cumprimento Demian, atual Brigadier, Ruslan, o advogado dos
russos, e Dmitri, o cara que já se divertiu muito a minha custa.
— Fiquei sabendo que suspendeu a produção de notas frias —
Mikhail comenta logo que todos se sentam à mesa.
Pego uma garrafa do meu melhor uísque e sirvo aos meus parceiros,
antes de me juntar a eles.
— Não adianta nada fabricar notas que sairão de circulação em
poucos meses, Mikhail. — Faço uma careta antes de beber um gole do
uísque.
— E já tem alguma solução para isso? Sabe do nosso acordo e…
Assinto de pronto.
— Já estou cuidando disso. A melhor hacker do país está trabalhando
para mim. Vamos invadir o sistema do Fed e pegar o arquivo de que
precisamos para adaptar todo o meu maquinário.
Faço um relato do que enfrentei nos últimos dias e a projeção para os
próximos meses, deixando claro que estou fazendo o meu melhor para
reverter essa situação.
Os russos me analisam para ver se captam alguma dúvida em minha
voz. Mas eu sempre fui aberto com eles, nunca precisei mentir e é por isso
que temos uma aliança que já dura há anos.
Eu forneço as notas para eles com preço bem abaixo do mercado e em
troca eles fazem o serviço sujo quando necessito.
— Se precisarem de poucas notas, consigo fornecer — informo. —
Só não posso entregar grandes malotes, porque é prejuízo até para vocês.
Os homens se entreolham e é a vez de Ruslan me questionar.
— Já tem uma previsão de quando começa a entregar a nova moeda?
— A porra do Banco Central anunciou que começa a circular em
janeiro. — Paro para esfregar a barba. O ódio que eu tenho de ter que
mudar toda a minha vida por um capricho do governo. — As notas velhas
vão sair de circulação aos poucos até serem totalmente exterminadas. Pelos
meus planos, em dezembro consigo entregar o novo dólar para vocês.
Os homens comentam entre si algumas coisas em russo que não faço
ideia do que seja e aproveito para nos servir de mais uma dose. Encaro-os
firme e mostro que estou falando sério, mas não preciso de muito esforço,
porque Mikhail me conhece. Sabe que sou um homem de palavra.
— Seremos os primeiros a receber a nova nota. — Mikhail bate o
dedo indicador na mesa e eu confirmo.
— Pode contar com isso. O primeiro malote irá diretamente para a
Bratva.
Os homens se levantam da mesa e eu os cumprimento para sair.
— Sabe que eu vim até Las Vegas só para falar com você, Lionel? —
Mikhail me lança um olhar ameaçador, mas eu não me intimido.
— Nós nunca tivemos problemas antes, Yaroslav. Não vamos ter
agora — garanto e ele assente.
— Preciso voltar à Rússia amanhã. Mantenha Damien informado de
tudo.
Assinto e aproveito a deixa para irritá-lo.
— Então o Avtoriyet da Bratva agora usa uma coleira no pescoço? —
provoco-o e ele me lança um olhar furioso.
Já faz um bom tempo que não o vejo e a última notícia que tive é de
que não só se casou, como agora tem uma filha.
— Coleira não é algo que um russo use, Rossi — debocha. — Mas
costumamos ter leões em nossos zoológicos.
Mikhail aperta o meu ombro antes de se afastar de mim e acompanhar
os outros russos para fora do meu cassino.
Fico parado pensando em como ele sabe do leão, sendo que nunca me
viu sem camisa e eu nem sequer mencionei a tatuagem.
Balanço a cabeça e sigo pelos corredores do cassino, conferindo se
está tudo em ordem. A casa está cheia e isso me dá uma sensação boa do
caralho. Pelo menos um dos meus negócios não foi afetado pela merda do
governo.
Desço o elevador até o subsolo, onde acontecem os jogos
clandestinos. Essa parte é restrita e temos controle absoluto de quem
participa, porque a última coisa que eu preciso é de mais problemas para as
minhas costas.
Como em Las Vegas a prostituição é proibida, não ofereço o serviço
em meus cassinos, porém, nessas salas privativas, os homens que
participam dos jogos podem vir acompanhados de quem bem entenderem.
Passo pelas salas e cumprimento alguns conhecidos, inclusive o
diretor da escola de Amy, que é viciado em jogos de apostas altas.
Com tudo certo, decido voltar para casa mais cedo que o habitual, a
fim de pegar minha sobrinha ainda acordada. Desde que consegui trazer
Ava, tenho ficado mais tempo na sede para acompanhá-la no trabalho e me
certificar de que tudo esteja correndo bem. E, com isso, quase não tenho
passado muito tempo com Amy, preciso reverter essa situação.
No estacionamento, encontro Donald me aguardando dentro do carro
blindado para me levar para casa. Durante o trajeto, ligo para Carter. Deixo-
o a par da reunião que tive com os russos e já acertamos os nossos próximos
passos.
Agora que Ava teve acesso ao sistema que ela mesma criou, estamos
cada vez mais perto de chegar à invasão. Seu último pedido foi providenciar
uma senha de usuário válido do Fed para acesso. Já pedi Gavin para
encontrar um funcionário acima de qualquer suspeita para uma conversa
amigável.
Ainda que eu esteja nervoso para caralho com tantas mudanças
acontecendo, consigo ver uma luz no fim do túnel. Estamos cada vez mais
perto de conseguir tudo de que precisamos para confeccionar as notas
novas.
Enquanto isso, Elijah segue desesperado.
Pensar nele me faz sorrir.
Pelas notícias que recebi de Samuel, aquele bosta está desnorteado
sem saber o que fazer para acompanhar as mudanças. E estar na frente dele
mais uma vez me dá um gostinho ainda melhor.
Se ele não conseguir adaptar seu maquinário a tempo, eu serei o
principal fornecedor do novo dólar neste país, já que os outros que conheço
são ainda menores que Elijah e não me oferecem perigo.
Pensar nisso me deixa ainda mais orgulhoso.
Quando o carro adentra os portões da minha residência, dispo-me da
minha postura de empresário e desço do veículo, encontrando a casa em
silêncio.
Atravesso a porta principal e vejo Stacy, a babá de Amy que fica no
período noturno quando preciso, vendo TV no sofá.
— Geller, onde está Amy? — pergunto e a garota rapidamente se
endireita no sofá.
— Está no quarto lendo um livro, senhor — responde de pronto. —
Ela não quis ver TV comigo.
— Certo. Está dispensada.
Enquanto Stacy junta suas coisas para sair, subo o elevador rumo ao
quarto de Amy, encontrando a luz acesa no final do corredor. Dou duas
batidinhas e coloco a cabeça para dentro, vendo a pequena sorrir ao me ver.
— Tio Lion! — exclama, fechando o livro imediatamente.
— O que está lendo, coração?
Inclino-me e beijo sua testa com carinho.
— O guia do mochileiro das galáxias — responde me mostrando o
livro de capa azul.
— Hummmm… E é bom?
— Sim! Estou adorando!
Seu sorriso alegre aquece o meu peito.
Tiro os sapatos dos pés e ajudo-a a se mover na cama para que eu me
acomode ao seu lado.
— Pensei que não fosse te encontrar acordada — comento, fazendo
pequenos círculos em seu rostinho.
— A Stacy me chamou para ver um filme, mas eu não quis. Fiquei
aqui deitada lendo e perdi a noção da hora.
— Isso é bom. Senti saudade, coração.
Aperto seu nariz e ela ri.
— Eu também, tio… Muito trabalho?
— Bastante. — Suspiro. — Mas não vamos falar disso agora.
A última coisa que eu quero pensar é em trabalho quando estou com
Amy.
— Terminei uma tela hoje — comenta, orgulhosa.
— Jura?
— Sim! Amanhã, sob a luz do sol, eu te mostro.
— Vou adorar. Sabe que eu amo as suas pinturas. E o que é desta vez?
— Eu fiz um leão — murmura e noto suas bochechas ficarem mais
rosadas.
— Um leão?
— É… Fiz pensando em você — sua voz tímida faz o meu coração
errar uma batida.
— Aposto que ficou incrível — digo, beijando sua testa mais uma
vez. — E como é esse leão? Vive em um zoológico? — pergunto me
lembrando da provocação de Mikhail.
— Não! — responde rápido. — Coitadinho… Zoológico é muito
solitário. Ele está em seu habitat natural — explica. — Em sua posição de
rei da selva.
— Gostei disso.
— Eu acho que seu nome combina com você, tio — comenta e eu
arqueio a sobrancelha para ela. — Às vezes você anda como se fosse um
rei, com um jeito de leão.
Solto uma gargalhada de sua percepção.
— Ah, é?
— Sim! Você não anda encurvado, nem parece ter medo de nada.
Parece mesmo um leão.
— Ah, mas nisso você está enganada. Eu tenho medo, sim.
— De quê? — pergunta curiosa.
— De perder você.
A pequena estreita os olhos para mim.
— Tio… Você não vai me perder.
— Mesmo quando você se tornar uma artista mundialmente famosa?
Faço um semblante carente e ela ri.
— Mesmo, mesmo. Você tem avião particular, esqueceu? É só deixar
um comigo, que eu sempre virei te ver.
Agora é a minha vez de gargalhar.
— Já está de olho em meus aviões, Amy Rossi?
A carinha sapeca dela é meu tudo.
— Não foi você que disse que tudo que é seu é meu? Pois então. Os
aviões também.
— Está certa. Eu deixo um com você.
Ela sorri orgulhosa e eu abro os braços para que se aninhe em meu
peito. Quando o faz, acaricio seus cabelos e vejo seus olhos pesarem de
sono.
— Você nunca me deixou, tio Lion. Mesmo quando podia ter feito
isso… — sua voz é muito baixa agora. — Então eu nunca vou deixar você.
Aperto-a mais contra mim e beijo seus cabelos macios.
— Eu amo você, coração.
Amy sorri de olhos fechados, aninhada em meu peito.
Por um momento, sou invadido pelas lembranças do dia em que
Candice foi baleada e levada às pressas para o hospital.
Infelizmente ela não resistiu, mas seu último pedido foi que eu
cuidasse de seu bebê.
Naquele dia, eu perdi a minha irmã caçula e ganhei de presente essa
garotinha, que se tornou o meu tudo.
— E como funciona o seu sistema? — Aponto para a tela do laptop
de Ava.
Sentados em meu escritório, a garota me apresenta a sua criação.
Desde que pegamos o backup, ela fez a instalação e toda a configuração
necessária. Agora ele está pronto para ser utilizado.
— Eu criei um spyware que executa os arquivos específicos do Fed.
Não temos como criar um software idêntico ao deles, mas eu só preciso
executar os arquivos para ter acesso às notas — explica, orgulhosa. —
Assim, eu tenho a opção de instalar esse spyware no computador que
iremos invadir para buscar os arquivos ou simplesmente trazê-los para que
ele apenas execute.
Assinto e a vejo me mostrar cada passo de seu sistema,
impressionando-me. Ela é mesmo bastante talentosa.
Ava Stone não é só um rostinho bonito e um corpo perfeito, a garota é
um gênio.
Constatar isso só me faz pensar no quanto tive sorte de encontrá-la.
— Ainda bem que eu já tinha o backup salvo — diz me encarando
agora. Seus olhos castanhos são muito mais calmos do que quando chegou
aqui há algumas semanas. — Porque eu demorei meses para criar esse
sistema.
Faço uma careta só de pensar no atraso que seria se ela tivesse que
recriá-lo do zero.
— Você será recompensada por isso — aviso.
Sei que já lhe ofereci um alto salário pelo trabalho, mas faço questão
de pagar um bônus generoso pelo software. Se não fosse por essa garota de
apenas vinte e cinco anos e dona de um cérebro invejável, eu estaria fodido.
Ava apenas assente e termina a sua apresentação.
— E qual o próximo passo agora? — pergunto ansioso.
— Eu acho um tanto arriscado enviar o spyware por e-mail ou até
pen-drive no computador para roubar os arquivos. O sistema do Fed é muito
seguro, vai detectar a ameaça e pode nos causar problemas.
— O que sugere então?
— Acho melhor acessar o sistema lá na sede do Fed.
— Em Washington DC? — indago e ela assente.
— Se conseguir acesso a um laptop de um usuário ativo deles, será
perfeito. E um login e senha válidos. Assim eu faço o acesso, exporto os
arquivos e só executo em meu sistema.
— Certo, vou pedir ao Gavin.
— Precisa ser um usuário que acesse essa parte do sistema do Fed.
Porque não são todos os funcionários que têm tal permissão.
Assinto e anoto em um bloco todas as informações que Ava me passa
para pedir ao Gavin a fim de localizar um funcionário que tenha o acesso de
que precisamos e que seja acima de qualquer suspeita.
O que será feito com ele depois é problema dos russos.
— Certo. Vou pedir ao Gavin para encontrar esse funcionário e,
quando tivermos tudo pronto, viajaremos para Washington.
Ava assente e fecha o laptop para se levantar, mas não sem antes
encarar o porta-retratos em minha mesa com uma foto de Amy.
— É sua filha? — pergunta com a voz baixa.
— Sobrinha — respondo seco.
— Ah…
Noto um misto de curiosidade e decepção passar em seu olhar, então
decido ceder um pouco.
— Mas eu cuido dela como se fosse filha.
A minha voz sai firme e Ava parece um pouco desconcertada ao
assentir e se levantar.
— O senhor precisa de mais alguma coisa? — pergunta com o
notebook fechado nas mãos.
Ela me olha de uma forma reservada e eu já reparei que fica
intimidada com a minha presença. Não que isso seja alguma novidade para
mim, mas há algo nela que é diferente.
O jeito como age quando estou por perto, a forma como desconfia até
da própria sombra…
Ava Stone me intriga.
Mesmo que esteja mais familiarizada com o ambiente, ainda consigo
notar seu receio. Ela anda encurvada pelos corredores, como se fosse ser
machucada por alguém.
— Por enquanto não — respondo. — Eu te aviso quando tiver
novidades sobre o acesso ao Fed.
— Certo. Com licença.
Ergo a mão para a porta e ela assente antes de sair e me deixar
sozinho. Fico por um momento pensando no que sei sobre essa garota e o
que ela esconde.
Quando O’Connell a investigou, tudo que conseguiu descobrir é que
ela morava com a mãe e o padrasto em Kingman, lá conheceu Charles.
Pouco depois, os dois fugiram para Las Vegas. A garota terminou a
faculdade e passou a trabalhar para Elijah em Henderson, onde nunca mais
teve paz.
Por mais que eu saiba detalhes técnicos de sua vida, há uma parte em
que eu não consegui ir além.
Bom, talvez seja melhor assim.
Não preciso de mais problemas para mim.
Ava está aqui a trabalho e irá continuar assim.
Decido deixar esses pensamentos de lado, ligar para Gavin e agilizar
o nosso processo.
— Rossi? — o funcionário do Fed não demora a atender a chamada.
— Gavin, preciso de você.
— Claro. Pode falar.
— Preciso acessar o laptop de algum usuário do Fed.
— Hummm…
Passo-lhe todas as informações que Ava me pediu para conseguir
acessar o sistema e ele ouve tudo com atenção.
— Certo. Vou procurar alguém nesse perfil e te retorno.
— Seja rápido — peço. — O tempo está correndo.
— Deixa comigo, Rossi.
Encerro a ligação um pouco aliviado de estar chegando perto e, ao
mesmo tempo, aflito pelo que está por vir.
Temos muito trabalho à frente.
Quando Ava acessar o sistema e conseguir os arquivos com o novo
layout da nota, precisarei enviar a nova marca d’água para o fornecedor de
papel fazer a adaptação e sei que isso demanda tempo. Além do mais,
minha equipe precisará fazer vários testes de combinação de tintas até
conseguir as cores idênticas da nova nota.
Tudo isso demanda tempo, porque eu sempre prezei pela perfeição e o
relógio não para de correr. Por mais que estejamos caminhando para o
nosso objetivo, só vou ficar tranquilo quando pegar em minhas mãos a
primeira nota impressa.
Levanto-me e vou até o barzinho me servir de uma dose de uísque.
Aproveito para acender um cigarro e vou até a janela do meu escritório,
onde tenho a visão de uma boa parte da minha propriedade.
Ainda parado, observo o exato momento em que Ava chega àquele
mesmo banco de madeira com um livro nas mãos. A garota olha para todos
os lados antes de se sentar e finalmente abrir o exemplar.
Aproveito o momento sozinho para reparar melhor nela e confirmar o
quanto é bonita. Quando cruza as pernas e o short jeans sobe um pouco,
revela mais de suas coxas firmes, fazendo-me virar um longo gole de
uísque.
— Rossi? — a voz de Blake surge atrás de mim e eu tenho um
sobressalto antes de me virar para ele.
— Caralho, Watson. Se anuncie, pelo menos.
Meu amigo franze o cenho para mim e tenta olhar por sobre o meu
ombro, mas eu o impeço.
— O que veio fazer aqui? — pergunto e ele ri.
— Às vezes me esqueço do quanto você é gentil — debocha e eu
reviro os olhos. — Vim te ver, não posso?
Estreito os olhos para ele, que ri mais.
— Está com saudade, Watson? — provoco-o. — Sua esposa não está
lhe entretendo o bastante?
— Filho da mãe.
— Uísque? — ofereço e ele aceita.
Sirvo um copo e entrego a ele.
— O nosso pessoal está parado — comenta, bufando. — Não tem
nenhuma previsão de quando vamos começar a trabalhar nessa nova nota?
— Estou aguardando notícias do Gavin sobre o funcionário de que
vamos roubar o acesso ao sistema. Ava já deixou tudo pronto. Logo que
conseguirmos, viajaremos para Washington para a invasão.
Blake me analisa antes de dar um gole na bebida.
— E você acha que a garota dá conta, Rossi?
— Ela acabou de me apresentar o sistema que criou e foi bem
convincente. Preciso confiar, Blake. Ava é a nossa única chance.
Watson suspira, assentindo.
— Nosso tempo está curto.
Ele coça a barba impaciente em uma mania bem parecida com a
minha.
— Eu sei. Estou na cola do Gavin. Logo que ele me passar as
informações do funcionário, entro em contato com os russos para fazer o
que for preciso.
Ele assente em concordância.
— Não vou sair de Washington sem esses arquivos em mãos. Nem
que para isso eu tenha que explodir uma bomba no prédio do Fed.
O responsável pela fábrica solta uma gargalhada.
— Por que eu não duvido de que você faria isso?
— Porque não é para duvidar mesmo.
Dou o último trago no cigarro e libero a fumaça, apertando a bituca
no cinzeiro. Encosto o quadril na mesa e olho para a janela ao longe, mas
daqui não tenho a visão da garota.
— Minha cabeça está a ponto de explodir — confesso, voltando o
olhar para o meu amigo.
Blake Watson me conhece desde que eu era um moleque de dezesseis
anos que trabalhava em um supermercado para ajudar a pagar as contas de
casa.
— Eu faço ideia — comenta, puxando uma cadeira para se sentar de
frente para mim.
— Porra! Eu odeio que as coisas saiam do meu controle. — Esfrego a
barba impaciente. — Estava tudo dando certo, meus negócios só crescendo,
até essa desgraça do governo decidir interferir na moeda.
Desencosto-me da mesa e vou até o barzinho pegar a garrafa de
uísque para nos servir de mais uma dose. Viro o líquido de uma vez só e tiro
mais um cigarro do bolso para acender.
— Você está fumando demais ultimamente — repreende-me. — Não
tinha parado com essa merda?
Balanço a mão para ele antes de dar um trago e soltar a fumaça.
— A única pessoa que um dia mandou em mim está debaixo da terra
— solto me referindo à minha mãe.
— Não estou tentando mandar em alguma coisa, Lionel. Eu só me
preocupo com a sua saúde. Desde quando alguém que tem asma pode
fumar?
Reviro os olhos para ele e dou mais um trago.
— Cuida da sua vida, Blake.
Fecho a cara e sirvo mais um pouco de uísque, oferecendo a ele, que
recusa.
— Antes de ser meu chefe, você é meu amigo — avisa, levantando-
se. — Sempre vou me preocupar com você.
O homem vira as costas e me deixa sozinho no escritório. Termino de
fumar e apago o cigarro no cinzeiro, voltando para a janela, mas não vejo
mais a garota lá.
Como se a vida tivesse dado ouvidos a Blake, sou invadido por uma
crise de tosse.
A sequência vem forte e me causa dificuldade para respirar. Com os
passos trôpegos, vou até a minha gaveta e reviro minhas coisas procurando
pela bombinha.
Puxo de uma vez e repito o movimento mais duas até finalmente a
tosse ceder.
Ergo o olhar em direção à porta e vejo Blake ao final do corredor,
encarando-me com o cenho franzido. Ele só balança a cabeça em decepção
antes de sumir de vista.
Caio sentado na cadeira e fecho os olhos por um instante.
Penso na loucura que minha vida se tornou nas últimas semanas e no
quanto preciso que os próximos passos sejam certeiros, caso contrário
ficarei louco.
Se Ava não conseguir concluir o seu trabalho, será a minha ruína.
Tudo que construí em mais de vinte anos está nas mãos dela agora.
Não há como ficar tranquilo até que tudo dê certo.
Pego outro cigarro no maço e acendo, fumando mais uma vez.
Que se foda.
Eu já vou para o Inferno mesmo.
A viagem até Washington foi bem mais tranquila do que a primeira
que fiz ao lado de Lionel. Eu me sinto um pouco mais à vontade com ele a
cada dia, embora nosso contato seja estritamente profissional.
A verdade é que, desde que cheguei à sua propriedade, tenho
observado todos os seus passos. Calada no meu canto, noto como age, como
se relaciona com as pessoas, como se porta com o mundo.
Lionel Rossi não é um cara fácil.
Nem mesmo parece se esforçar para agradar às pessoas.
Mas é um homem de palavra.
Tudo que ele promete, ele cumpre.
E isso é algo que eu tenho valorizado muito desde que cheguei a Las
Vegas. Como prometido, ninguém invade o meu espaço, ninguém encosta
em mim e a minha segurança é cuidada por ele.
Isso tem me feito respirar bastante aliviada.
Não consigo parar de pensar que a qualquer momento posso ser
descoberta por Charles e Elijah, mas também sei que Lionel não deixaria
isso por menos. Pelo ódio que tem do rival, muito mais do que me proteger,
não quer perder para o seu inimigo.
Então eu não duvido nada de que ele o caçaria até o fim do mundo
para me trazer de volta.
E isso, ao mesmo tempo que me assusta, me conforta.
Atravesso o hall de entrada do hotel e mais uma vez estou disfarçada.
Porém, agora a peruca é ruiva, as lentes de contato são verdes e eu uso
óculos sem grau no rosto.
Hoje eu não sou mais Ava Stone, nem Caroline Williams, e sim Emily
Brown. Uma estudante de Economia que veio fazer uma visita guiada na
sede do Banco Central acompanhada de seu mentor, Dr. Steven Shaw, o
personagem de Lionel.
É uma loucura como a minha vida tem parecido um filme desde que
conheci Charles.
É uma coleção de atividades ilícitas e identidades falsas da qual não
me orgulho. Porém sei que não me restam alternativas.
Com o check-in realizado, Lionel e seus seguranças me conduzem até
o andar de nossa suíte. Onde, mais uma vez, ficaremos em local
compartilhado.
— Daqui a pouco vou trazer os dados de que você precisa — Lionel
avisa logo que adentramos o elevador.
Assinto em silêncio e, quando chegamos ao nosso andar, Liam arrasta
a minha mala até o quarto que vou dividir com Rossi.
Ao abrir a porta noto uma suíte presidencial incrível. Ainda mais
bonita que a que dividimos em San Diego, consigo me sentir bastante
acolhida aqui.
— Pode acomodar suas coisas, Ava. — Lionel aponta para uma das
portas, logo que ficamos sozinhos. — Farei contato com os russos, que já
estão com o funcionário do Fed.
A voz firme de Lionel me causa um arrepio.
Não quero nem pensar no que esses tais russos fizeram com o
funcionário que tem o acesso de que eu preciso.
Sei que homens como Lionel não costumam ter conversas amigáveis
e, pelo pouco que percebi, esses seus amigos russos têm um conceito bem
diferente de diversão.
Engulo em seco, tentando evitar esse pensamento.
— Tudo bem. Me chame quando estiver com o acesso em mãos.
Ele assente e eu entro em meu quarto, fechando a porta atrás de mim.
Olho para tudo ao meu redor e abro um sorriso.
O quarto é lindo...
Uma enorme cama king-size com colcha branquinha, armários de
madeira clara, cortinas grossas e um banheiro digno de filme.
Deixo minhas coisas no canto e jogo o corpo na cama, fitando o teto
branco por um instante. Aproveito este momento sozinha imersa em
pensamentos. Minha mente voa longe e vai até o pequeno cômodo em que
eu morava sozinha há algumas semanas.
É inegável o quanto tenho tido mais conforto com Lionel.
Apesar dos pesares, venho levando uma vida digna.
Tenho um quarto muito maior do que eu já tive na vida, tenho roupas
confortáveis e comida boa. Além de saber que posso circular pela
propriedade, sem medo de ser atingida.
Posso não ser uma pessoa completamente livre, mas há muitos anos
eu não sei o que é liberdade.
Mergulhada em pensamentos, perco a noção do tempo em que estou
sozinha, quando ouço uma batida à porta e me levanto de pronto.
— Este é o laptop do funcionário. — Lionel me entrega logo que abro
a porta. — E aqui, as senhas de que você precisa.
O papel amassado está sujo de sangue.
Arregalo os olhos para ele, que simplesmente dá de ombros.
— Faça o que precisa ser feito — Rossi diz e eu assinto, engolindo
em seco.
Abro o pedaço de papel e encontro as senhas de acesso ao sistema,
além da rede Wi-Fi do prédio da Fed. Isso vai ser bem melhor do que eu
previa. Posso acessar diretamente o notebook dele, fazer o download de
tudo de que preciso e transferir para o meu sistema para executar os
arquivos e utilizá-lo em Las Vegas.
— Podemos ir? — pergunto a ele, que confirma.
— Sim, estou com as credenciais.
Assinto e, neste momento, meu coração já está acelerado dentro do
peito. A adrenalina do que está por vir quase me causa ânsia de vômito.
— Certo. Vou pegar as minhas coisas.
Entro no quarto e abro a mochila, colocando o laptop e o HD externo
que separei para levar. Com tudo pronto, encontro Lionel me aguardando no
espaço em comum de nossa suíte.
— Pronta? — pergunta e eu confirmo. — Não podemos errar, Ava.
Lionel olha no fundo dos meus olhos e encara com tanta firmeza, que
engulo em seco. Meu coração erra uma batida e eu só assinto rapidamente.
— Pode confiar em mim.
Ele me analisa por um instante antes de aquiescer.
— Então vamos.
Descemos pelo elevador e eu aperto a mochila com força, sentindo as
mãos tremerem e suarem de nervosismo.
É uma adrenalina semelhante à que senti no dia em que fugi da
propriedade de Elijah.
E o peso da responsabilidade de hoje me atinge.
Eu preciso fazer tudo perfeito, não posso dar um passo em falso, caso
contrário vou arruinar os negócios de Lionel. E não posso permitir que isso
aconteça.
Lionel Rossi depositou todas as suas fichas em mim e não posso
falhar.
Quando entramos no carro alugado, eu me acomodo no banco traseiro
ao lado dele e nem consigo prestar atenção no que conversa com Liam e os
outros seguranças. Minha mente repassa o tempo inteiro tudo o que eu
preciso fazer, tudo o que planejamos para dar certo.
Fecho os olhos e respiro fundo, inspirando forte para soltar o ar. Faço
isso repetidas vezes e sinto Lionel tocar a minha coxa, fazendo-me abrir os
olhos imediatamente para encará-lo.
O contato de sua pele na minha, ainda que sobre o jeans, me faz
queimar.
— Você está bem?
— Estou — respondo, balançando a cabeça. — É só a importância da
nossa missão hoje.
Seus olhos azuis não se desviam dos meus e noto seu cenho franzir de
leve.
— Você vai conseguir, Stone.
Diz isso com tanta firmeza que faz o meu coração se acalmar um
pouco.
Mas bem pouco.
Assinto e vejo as ruas de Washington passando pela janela, até chegar
ao nosso destino.
A fachada imponente da sede do Federal Reserve me lembra um
pouco a da Casa Branca.
Descemos do carro e apresentamos as credenciais fornecidas por
Gavin para a segurança. Quando nossa entrada é liberada, sinto meu corpo
pesar uma tonelada e caminho ao lado de Lionel até o hall do prédio.
— Tem certeza de que você está bem? — pergunta, tocando meu
ombro com cuidado.
— Sim — respondo, sentindo o coração saltar pela boca. — Só
precisamos fazer isso logo e voltar para o hotel.
Lionel apenas assente antes de nos conduzir até a recepcionista, que
nos encaminha para o guia. Minhas mãos suam e, ao contrário de mim, que
estou uma pilha de nervos, o homem ao meu lado caminha com uma
tranquilidade invejável.
Por onde passa, Lionel Rossi anda como se fosse dono de todo o
mundo.
Começamos a visita guiada pelo prédio do Banco Central, quando
começo a colocar o nosso plano em prática.
— Dr. Shaw, preciso ir ao banheiro — aviso e ele confirma com um
aceno.
— Perdão, Sr. Johnson — Lionel interrompe o guia com a voz serena.
— Minha aluna precisa ir ao banheiro, poderia indicar o caminho?
— Claro! É por aqui.
Acompanho o senhor de meia-idade até o corredor, onde ele aponta
para uma porta ao final deste.
— Obrigada. Podem continuar a visita, que os encontro depois —
anuncio. — É uma emergência feminina.
Abro um sorriso tímido e os homens assentem antes de voltarem ao
trabalho, então disparo pelo corredor em direção ao banheiro.
Tranco-me na última cabine e abaixo a tampa do vaso para me sentar.
Meu coração esmurra o peito enquanto abro o zíper da mochila e
pego o laptop do funcionário do Fed. Digito a senha de acesso com os
dedos trêmulos e, quando eu finalmente conecto-me à rede e abro o sistema,
meu sorriso se expande.
— Isso!
Navego pelo sistema que me é tão familiar em busca de todos os
arquivos de que Lionel precisa e, neste momento, meu celular vibra no
bolso.
Lionel: E aí?
Eu: Consegui acessar o sistema. Estou buscando os arquivos para
download.
Lionel: Ótimo. Mantenha-me informado.
Deixo o celular de lado e volto a atenção para o computador à minha
frente, onde mergulho no sistema.
A adrenalina por finalmente estar dando certo invade o meu peito e só
me encoraja a continuar.
Conecto o HD externo no laptop e, logo que o download dos arquivos
se finaliza, começo o processo de transferência para o dispositivo. Essa
parte é um pouco mais lenta devido ao tamanho deles e eu começo a
balançar as pernas ansiosa.
— Vai... Por favor...
Fico aflita com a demora e só consigo pensar que o tempo está
correndo, eu posso a qualquer momento ser pega cometendo um crime
federal.
Caramba, se me pegam aqui, não tem advogado no mundo que me
tire da cadeia.
Lionel: Dando certo?
Recebo a mensagem e digito, vendo que passei da metade da barra de
transferência.
Eu: Sim. Estou quase acabando.
Envio sua resposta no momento em que a porta do banheiro se abre e
sinto o meu corpo inteiro congelar. Prendo a respiração enquanto ouço o
som de saltos andarem até a cabine ao lado, e uma desconhecida começa a
fazer xixi.
Em meu colo, o laptop chega perto do final da transferência e eu sinto
uma gota de suor escorrer pela coluna. Ainda imóvel, acompanho o
momento em que a mulher dá descarga e sai da cabine. Ouço o som da
torneira sendo ligada e em seguida, das mãos sendo secas.
Quando a porta se abre e os barulhos de saltos somem de vista, eu
finalmente solto o ar de dentro dos pulmões.
— Caralho...
Olho para a tela do laptop e vejo a imagem que me traz paz:
100%.
Graças a Deus.
Desconecto o HD externo e enfio de volta na mochila, em um
compartimento secreto, para que, caso revistem a minha bolsa, não seja
visto com facilidade.
Desligo o laptop do rapaz e enfio o papel com a senha dentro do
bolso. Guardo tudo e saio da cabine, pegando o celular para avisar Lionel.
Eu: Estou pronta. Onde você está?
Lionel: No mesmo andar. Consegui segurar o guia aqui.
Aproveito para jogar água no rosto antes de sair e me refrescar um
pouco. Seco-me e saio do banheiro, andando de cabeça baixa em direção a
Lionel e o guia.
— Srta. Brown — a voz de Rossi finge preocupação. — Sente-se
bem?
— Não muito, professor — minto, fazendo minha melhor cara de
doente. — Não me sinto confortável em continuar com a visita. Podemos ir
para casa?
— Poxa vida... Estava tão interessante.
O olhar de decepção dele é impagável.
— Sr. Johnson, se importaria se continuássemos esta visita em outro
horário? Podemos remarcar e...
— Claro! Não há problema nenhum. Basta entrarem em contato com
o setor responsável para remarcação.
— Certo. Muito obrigado pela disponibilidade.
— Disponha. Melhoras, menina!
Apenas assinto e abaixo a cabeça, abraçando o corpo e sendo
conduzida por Lionel para fora do prédio do Fed. O carro de Liam está nos
aguardando na porta. Quando entramos e finalmente o veículo arranca, eu
emito um suspiro.
— Puta que pariu — solto e ouço risada desses homens.
— Deu tudo certo? — Lionel pergunta e eu assinto.
— Está tudo no HD. Quando chegar ao hotel já faço a transferência
para o meu laptop e os testes no sistema.
— Ótimo.
Encosto a cabeça no banco e respiro fundo, ainda sentindo meu corpo
tremer.
— Está tudo bem, Ava?
— Eu quase caguei na calça, Rossi — afirmo, virando a cabeça para
ele. — E nem foi no sentido figurado.
Liam solta uma risada alta no banco da frente.
— Por Deus do céu, eu tinha a sensação de que alguém ia entrar
naquele banheiro e me pegar em flagrante. Já conseguia me ver sendo
presa, sentenciada à pena de morte.
Todos os seguranças riem, menos Lionel.
Ele me encara com uma intensidade tão grande, que me faz engolir
em seco.
— Isso não aconteceria nunca, Ava — diz, inclinando-se levemente
para a frente. — Eu jamais permitiria.
A firmeza com que me diz isso causa um estrago dentro de mim.
Porque, mesmo que eu não faça ideia do como, sinto que o que ele diz
é muito sério.
Lionel Rossi jamais falharia comigo.
— Elijah, não! Não, por favor! Não!
Acordo com os gritos de Ava e sinto o coração esmurrar dentro do
peito.
Pulo da cama e tropeço nos chinelos, quase caindo para pegar a minha
arma em cima da mesinha de cabeceira.
Abro a porta do meu quarto em um rompante no momento em que
Liam entra na suíte em posição de ataque.
Sinalizo para ele, que passa na minha frente em direção ao quarto de
Ava. Engatilho o revólver e me posiciono na retaguarda do segurança, que
faz um sinal antes de abrir a porta.
— Elijah, não! — Ava grita e meu coração parece que vai voar pela
boca.
Mas, quando adentramos o cômodo, não vemos nada.
Ava está se debatendo na cama em verdadeiro pavor, e parece ainda
estar dormindo.
Isso foi um pesadelo?
Abaixo a arma e vou até a sua cama enquanto Liam confere todo os
cantos de seu quarto, buscando alguma pista, mas não encontra nada.
— Tudo limpo, Rossi.
Enfio o revólver no bolso da calça e toco o rosto de Ava, que está
ensopado de suor. Sinto um tremendo alívio por ver que só se trata de um
sonho.
— Porra, que susto! — Liam resmunga e eu assinto, sinalizando para
que ele saia.
Quando finalmente estou sozinho com Ava, continuo tocando o seu
rosto e noto lágrimas escorrerem pela sua pele.
A garota parece me sentir, pois abre os olhos e me encara assustada.
Sua primeira reação é se sentar imediatamente, afastando-se de mim.
— O que está fazendo aqui? — pergunta receosa.
Noto que ela puxa o lençol para cobrir o corpo do pijama minúsculo
que está usando, mas não tem muito sucesso. Ava embola o tecido todo e
não cobre o que precisa, atraindo a minha atenção para suas coxas
descobertas.
— Você me assustou — digo. — Começou a gritar o nome de Elijah e
me fez pensar que ele estava aqui. Liam e eu entramos com tudo em seu
quarto.
Ava engole em seco e desvia os olhos dos meus, demonstrando
timidez.
— Você está bem? — pergunto e ela nega. — Vou buscar água.
Levanto-me da cama e a garota não se move nem um milímetro. Do
lado de fora do quarto, vou até o frigobar pegar uma garrafinha de água e
aproveito para buscar uma toalha umedecida em meu banheiro, guardando a
arma.
Quando volto, Ava está com o corpo totalmente coberto e ainda me
encara com os olhos apavorados.
Sento-me ao seu lado na cama e entrego a garrafinha a ela, que pega
com os dedos trêmulos. Dá pequenos goles na água e parece se acalmar um
pouco.
Estico a toalha em sua direção e toco seu rosto, limpando um pouco
do suor. A garota estremece com meu contato, mas logo cede, permitindo-
se ser cuidada.
Imagino que esteja exausta.
Hoje o dia foi tenso para todos nós, mas principalmente para ela.
Ava ficou extremamente nervosa com o nosso plano e por muitas
vezes eu me perguntei se ela realmente conseguiria. Não por não ser capaz,
e sim por estar uma pilha de nervos.
Mas a garota mostrou a que veio e fez tudo com maestria.
Quando voltamos ao hotel, exportou todos os arquivos em seu laptop,
eles foram executados com sucesso no sistema que ela criou. Quando vi
surgir na tela a imagem das novas notas com todos os detalhes de que
preciso, soltei um grito de comemoração.
Porra.
Ela conseguiu.
Foi então que pedi aos meus seguranças que destruíssem o laptop do
funcionário do Fed e dei sinal aos russos para que finalizassem o serviço
com ele.
Os caras têm uma eficiente equipe de limpeza, que não deixa um
rastro sequer.
Com tudo pronto, deixei Ava descansando o restante do dia, pois
notei sua exaustão. E agora acordar no meio da madrugada por causa de um
pesadelo só me faz ter mais certeza do quanto esse dia foi puxado para ela.
— Precisa de mais alguma coisa? — pergunto e a garota nega.
Termino de passar a toalha em seu rosto e afasto-me, vendo-a me
encarar.
— Consegue dormir de novo?
Ava nega mais uma vez.
Olho para o quarto ao nosso redor e penso no que fazer, quando sua
voz baixa chama minha atenção.
— É um leão tatuado em suas costas? — pergunta e eu arqueio a
sobrancelha para ela até me lembrar de que estou sem camisa.
Com todo o susto que passei, acordei e vim até o seu quarto do jeito
que eu estava. Só agora percebo que estou com os pés descalços, sem
camisa, vestindo apenas uma calça de moletom.
— É, sim.
Viro-me de costas para que veja a tatuagem mais de perto.
A imagem de um leão raivoso rugindo ocupa toda a minha pele, da
nuca até a cintura.
— É linda... — a voz de Ava é um pouco mais calma agora.
Volto a encará-la e percebo que seus olhos estão menos aflitos.
— Você não tem nenhuma? — puxo assunto, a fim de distraí-la um
pouco.
— Não.
— Tem vontade de fazer alguma?
— Acho que sim, não sei...
Estreito os olhos para ela, que engole em seco antes de continuar.
— Houve um tempo em que eu queria várias coisas, Lionel. — Seu
olhar abaixa por um instante. — Atualmente só quero dormir em paz.
A dor em sua voz é palpável e eu sinto um aperto no peito.
Ava é muito nova para ter enfrentado o que quer que tenha sido.
É boa e inteligente demais para ter merecido isso.
— Quer que eu te deixe sozinha? — pergunto e ela nega com certo
desespero.
— Se importa de ficar mais um pouco? Estou com medo de ficar
sozinha...
— Tudo bem.
Levanto-me da cama e saio do quarto para buscar uma lata de cerveja.
Quando retorno, Ava me encara com curiosidade.
— Quer uma?
— Não, obrigada.
Assinto e me sento do outro lado da cama, encostando o corpo na
cabeceira.
— Vou adiar mais um dia a viagem de volta, ok?
— Não precisa...
— Amanhã você não sai quarto, descansa, fica à vontade para fazer o
que quiser e retornamos no dia seguinte.
Dou um gole na cerveja e Ava me encara antes de assentir.
— Tudo bem.
Tamborilo os dedos na coxa enquanto penso no que fazer, já que não
tenho muito assunto com ela. Nunca conversamos mais do que o
profissional.
— Pode me falar da sua sobrinha? — pergunta e eu sinto meu coração
se fechar dentro do peito.
Não sei se é seguro...
Ava parece perceber, pois seu olhar se entristece.
— Se não quiser, não tem problema.
A tristeza em sua voz me faz ceder.
Porra, essa garota quase entrou em colapso hoje em uma missão que
salvou a minha pele e eu não posso retribuir um pouco?
— Amy tem dez anos — começo.
Viro a cabeça para olhar Ava e noto seu semblante se iluminar.
— Eu cuido dela desde que nasceu. Minha irmã faleceu no parto.
— Ah... Eu sinto muito.
Balanço a cabeça.
— Já faz muito tempo.
Isso não é mentira, faz mais de dez anos que perdi Candice, mas não é
como se ainda não doesse.
Ela foi morta de uma forma cruel e a pessoa que fez mal a minha irmã
e ao meu coração não só foi brutalmente assassinada, como teve seus
pedaços atirados aos lobos.
Um brinde aos meus amigos russos!
— E como ela é? — a voz de Ava me faz voltar para a realidade.
— A Amy? Ela é perfeita. — É impossível conter um sorriso. —
Extremamente inteligente. Ama ler e pintar. É uma artista e tanto.
— Jura? — O interesse genuíno de Ava me faz continuar.
— Sim! Ela faz telas incríveis. Amy Rossi é o meu maior orgulho.
A garota ao meu lado abre um sorriso sincero, que me faz perceber o
quanto é bonita.
Mesmo com o semblante assustado, os cabelos meio bagunçados e a
pontinha do nariz vermelha, ela é linda.
Eu já sabia disso desde que a recebi em minha casa pela primeira vez.
Mas hoje consigo percebê-la melhor.
É como se ela se despisse da sua pose de profissional e me mostrasse
o seu verdadeiro eu.
Sinto que, pela primeira vez, estou conhecendo a verdadeira Ava.
— Ela me arrasta para a Disney quase todos os anos. — Faço uma
careta e a garota ri.
E o som da sua risada me traz um certo alívio.
— Não brinca!
— Ser tio de menina não é para os fracos — ironizo e ela ri mais.
— Não consigo imaginar Lionel Rossi na Disney — zomba. —
Usando um chapéu de orelhas do Mickey.
Ava gargalha e eu só balanço a cabeça sorrindo.
— Não é para tanto.
— Vai me dizer que nunca usou um?
Seus olhos me desafiam e eu acabo rindo.
É óbvio que Amy já me obrigou a passar por isso.
— Aí, eu não disse?
A garota gargalha tanto que eu só balanço a cabeça.
— Mas deve ser incrível ter alguém — comenta quando se recupera
da crise de risos.
— Ela é a parte boa da minha vida — explico. — É o meu lado mais
puro.
Ava acena de leve, olhando para o longe por um momento, e me
parece estar imersa em lembranças.
— E você não tem família? — pergunto, mesmo que já saiba a
resposta.
Ava volta a me olhar quando dá de ombros, negando.
— Eu nunca tive um pai, porque ele sumiu quando soube da gravidez.
— Filho da puta.
— E minha mãe se casou quando eu ainda era criança. E bom...
Digamos que o meu padrasto não era bom para mim.
Ava diz em seus olhos o que não sai em palavras. Eu sinto meu punho
se fechar, amassando a lata de cerveja já vazia em minhas mãos e atirando-a
no lixo.
Caralho...
— E então eu conheci Charles — comenta e consigo perceber como
sua voz se entristece agora. — Pensei que com ele estaria segura, mas mais
uma vez estava enganada...
Os olhos de Ava lacrimejam e eu sinto um aperto no peito.
Fico parado, travado na cama, sem saber como agir. Sem saber o que
fazer. Eu não sou a porra de um terapeuta, nem alguém que saiba consolar
ninguém. Muito menos alguém que pode tomá-la nos braços e dar-lhe
conforto.
E Ava merece isso.
Merece ser acolhida por alguém.
Que com toda certeza não sou eu.
O silêncio se instala no quarto e começo a me sentir sem lugar,
quando percebo os olhos de Ava pesarem. Fico parado esperando que pegue
no sono para finalmente me levantar da cama.
Acomodo os lençóis em seu corpo e afasto os cabelos de seu rosto,
vendo-a dormir tranquila.
Isso me faz respirar aliviado.
Pelo menos a garota conseguiu voltar a dormir.
Apago a luz do quarto e encosto a porta, soltando um suspiro antes de
voltar ao meu.
Porra.
Que noite.
Que susto.
Que bagunça dos infernos.
Que isso nunca volte a acontecer.
Pisco os olhos repetidas vezes antes de abri-los e encarar a escuridão
do quarto. Ainda que o dia tenha amanhecido, as cortinas grossas impedem
a luz do sol de entrar.
Espreguiço-me na cama e me sento, olhando tudo ao meu redor. Noto
a toalha em cima da mesinha de cabeceira e me lembro do cuidado de
Lionel comigo nesta madrugada.
E só de pensar nisso, sinto meu rosto ruborizar.
Eu morri de vergonha por tê-lo acordado com um pesadelo meu e
achei gentil de sua parte ficar comigo até que eu dormisse de novo, mesmo
que ele não estivesse completamente à vontade com essa proximidade.
A preocupação de Lionel comigo me mostrou um lado que até então
eu não conhecia. Ainda mais quando me contou um pouco sobre a sobrinha.
Isso me fez imaginar que deve perder toda a postura de homem de negócios
quando está com a pequena.
Eu daria tudo para conhecer esse seu lado, ver como ele é com a
sobrinha, mas sei que não será possível.
Lionel não é um homem que se abre tão fácil e, só de ter tido uma
conversa com ele sobre qualquer coisa que não seja trabalho, já foi um
enorme avanço.
Decido me levantar da cama e vou até o banheiro para tomar um
banho rápido. Com toda a tensão da madrugada, ainda consigo sentir
resquícios de suor pregados pelo corpo.
Entro no chuveiro e aproveito para lavar os cabelos, sentindo a água
quente me relaxar um pouco. Enquanto me lavo, lembro-me de Lionel me
dizendo que adiou nossa viagem de retorno para amanhã.
No fim das contas, um dia de descanso me fará muito bem.
Olho para o lado e vejo a banheira de hidromassagem. Acho que vou
pedir alguns sais de banho para o hotel e curtir um momento relaxante mais
tarde.
Termino o banho e pego uma camiseta e short jeans para vestir.
Respiro fundo e abro a porta do quarto, procurando por Lionel até
encontrá-lo debruçado na sacada. O movimento que eu faço atrai sua
atenção e então ele se vira para me encarar.
Vejo que voltou a vestir seu habitual traje: calça social e camisa de
botão, que hoje é de um tom azul-claro. A peça destaca bastante a cor de
seus olhos.
A forma como Lionel me encara me lembra esta madrugada, em que
o vi pela primeira vez sem camisa.
E, nossa...
Ele é lindo.
O peitoral é magro e tem o abdômen firme, mas não foi isso que me
chamou mais a atenção nele.
E sim suas tatuagens...
Eu já havia notado que ele tinha uma de crucifixo no pescoço, só não
sabia que, do mesmo lado, descem várias espalhadas pelo braço até a altura
da mão. Enquanto o outro braço segue completamente liso.
O peitoral também não tem nenhuma marca, mas as costas...
Eu me surpreendi quando ele se levantou e revelou a imagem de um
leão rugindo, cobrindo as costas por inteiro, não deixando um pedaço de
pele descoberto.
Toda aquela ferocidade do animal me fez engolir em seco ao pensar
no quanto me parece combinar com ele.
Lionel parece esconder uma bravura dentro de si.
— Bom dia, Ava — ele me cumprimenta se aproximando de mim e
me tira do transe.
— Bom dia — respondo, encarando-o um pouco tímida.
— O café da manhã está servido.
Aponta para a mesa farta no canto, em que eu nem tinha reparado.
Aquiesço e vou até ela para me sentar. Diante de tanta coisa boa, fico
perdida, sem nem saber por onde começar.
— Se sente melhor? — ele me pergunta, encostando a mão no braço
da cadeira de frente para mim.
Sirvo um pouco de café na xícara antes de responder.
— Bem melhor. — Dou um gole na bebida quente e ergo os olhos
para encará-lo. — Obrigada por ficar comigo.
Lionel balança a cabeça como se não fosse nada, mas só eu sei o
quanto sua presença significou para mim.
— E me desculpe — digo, sentindo minhas bochechas esquentarem.
— Sei que te assustei e atrapalhei a sua noite de sono...
— Não é nada, Ava. — Sua voz grossa sempre vai me causar
arrepios. — Essas coisas acontecem. — Dá de ombros. — E ontem foi um
dia muito exaustivo.
Assinto e estico a mão para pegar uma torrada e geleia.
— Os pesadelos são recorrentes? — pergunta e minha mão trava,
fazendo-me encará-lo.
— Mais ou menos — respondo baixo, retomando o movimento.
Abaixo o olhar enquanto passo a geleia na torrada, sentindo um bolo
se formar em minha garganta.
Lionel fica um tempo parado me fitando em silêncio e, quando vê que
não vou dizer mais nada, esfrega a barba baixa em um gesto costumeiro.
— Mudei o nosso horário de voo de volta para amanhã cedo, ok? —
diz e eu aceno. — Pode ficar à vontade para pedir o que quiser. Porém não
tem permissão para sair deste quarto.
Ele me encara firme e eu engulo em seco, balançando a cabeça.
— Está certo. Acho que vou querer uns sais de banho para usar na
banheira mais tarde — comento, enquanto pego outra torrada para comer.
— Pode pedir o que quiser, Ava.
A firmeza com que fala o meu nome faz meu coração dar um salto no
peito.
— Obrigada.
Continuo a comer e Lionel se afasta da mesa, indo até a sacada para
fazer algumas ligações. Não consigo ouvir direito, mas, pelo que posso
notar, está dando notícias para o Blake, o responsável pela fabricação das
notas.
Sei que, quando voltarmos a Las Vegas, teremos um longo trabalho
pela frente para a adaptação de toda a produção de Lionel e isso é
empolgante. Pela primeira vez poderei acompanhar de perto esse processo,
o que me deixa bastante feliz.
Gosto de me sentir útil e Rossi valoriza muito o meu trabalho.
— Você consegue ficar sozinha hoje? — ele me pergunta quando
acabo o café e me levanto da mesa.
Lionel caminha em passos firmes em minha direção e me sobressalto
por tê-lo tão perto. Eu me sinto tão pequena perto dele e não é só na
estatura.
— Consigo, sim. Liam está por perto, não está?
— Sim. Deixei mais dois seguranças com ele no corredor atentos a
cada movimento seu.
Eu deveria me sentir desconfortável com tudo isso?
Deveria.
Mas só consigo me sentir grata e acolhida.
Lionel consegue fazer com que eu me sinta sempre segura.
— Certo.
— Vou aproveitar que estou na cidade e resolver alguns assuntos,
encontrar alguns clientes.
— Tudo bem — respondo, sem conseguir disfarçar o
descontentamento.
Não posso negar que gostei de tê-lo por perto, mesmo que saiba que
isso não é certo.
— Se precisar de alguma coisa, sabe o meu número. — Ergue o
aparelho celular e eu confirmo. — Além do mais, Liam está a uma porta de
distância.
— Tudo bem, Rossi. Pode ficar à vontade para fazer tudo que precisa.
Eu vou ficar bem.
Abro um meio sorriso para ele, que me analisa antes de assentir.
— Até mais, Ava.
Lionel passa por mim e deixa um rastro de seu perfume, fazendo-me
fechar os olhos por um instante para senti-lo.
Quando ele fecha a porta da suíte e me deixa sozinha, eu solto um
suspiro.
Olho para tudo ao meu redor e penso no que eu vou ficar fazendo
neste quarto de hotel o dia inteiro.
Penso nos livros que deixei em Las Vegas e me arrependo de não ter
trazido nenhum. Estava tão ansiosa para essa viagem que nem me atentei a
esses detalhes.
E seria tão bom ler um livro naquela banheira...
Já sei!
Abro a porta do quarto e encontro Liam parado no corredor, com a
postura ereta. Sinalizo para ele.
— Pois não, Srta. Stone?
Reviro os olhos para ele e coloco as mãos na cintura.
— Liam, quantas vezes já te falei que não precisa de tanta
formalidade comigo? Pode me chamar de Ava.
O moreno alto balança a cabeça em uma careta.
— Desculpe, é força do hábito. Está precisando de mim?
— Sim!
— Pode falar.
— Em primeiro lugar, me desculpe por tê-los assustado esta
madrugada. — Mordo a pontinha do indicador, mais uma vez constrangida.
Ainda não consigo acreditar que fiz dois homens armados entrarem
em meu quarto para me defender de um pesadelo.
Meu Deus, que vergonha!
— Não se preocupe com isso.
Liam me olha firme e eu aceno de leve.
O segurança que Lionel colocou em minha cola me assustou a
princípio, mas depois me mostrou que não é uma pessoa ruim, é só de
poucas palavras mesmo. E, por mais que ele esteja sempre armado e em
posição de alerta, não me deixa desconfortável.
Eu já me acostumei com sua presença.
— Eu queria um livro para ler, já que vou passar o dia no quarto e não
trouxe nenhum de Vegas. Sei que você tem ordens para não sair daqui, mas
poderia pedir um daqueles grandalhões para me comprar um livro?
Aponto para os outros seguranças de Lionel no corredor.
— Não é mais fácil pedir a livraria para que entregue aqui?
Nossa, como não pensei nisso?
Acho que tudo que enfrentei nas últimas vinte e quatro horas afetou o
meu raciocínio.
— Mas tenho autorização para fazer isso? — indago.
Lionel me disse que eu poderia pedir qualquer coisa do hotel, mas não
falou nada de fora dele.
— Rossi deixou autorização expressa para atendermos qualquer
pedido seu, desde que não cruze essa soleira.
O segurança aponta para o chão e faz uma linha imaginária,
delimitando o quarto do corredor.
— Está bem. Vou ligar para a livraria. Se chegarem com o meu
pedido, você já sabe o que é.
— Perfeitamente, Srta. Stone.
— Liam! — repreendo-o e ele abre um meio sorriso.
— Desculpe, Ava.
— Bem melhor assim. Obrigada.
Peço licença e fecho a porta do quarto, já procurando no catálogo
livrarias da região. Aproveito para solicitar os sais de banho e um balde de
gelo com espumante.
Se eu vou passar o dia todo sozinha neste quarto de hotel, que seja
aproveitando da melhor forma possível.
— Um feito desses merece um brinde! — Blake anuncia, vibrando
pelo sucesso do sistema de Ava. — Libera o espumante, Rossi!
A insinuação de meu amigo tira uma gargalhada de todos no galpão e
eu apenas balanço a cabeça, sorrindo.
Hoje não há como não sorrir.
A nova marca d’água já está com o fornecedor de papel para
fabricação das novas folhas. Enquanto ele adapta seu processo, aqui na
fábrica estamos realizando vários testes de combinações de tintas para
alcançar a coloração perfeita. Estamos preparando tudo para que, tão logo
recebamos o papel novo, já iniciemos a produção.
Estou com encomendas na fila de espera e clientes aflitos para receber
a nova moeda americana. Principalmente porque sou o único fabricante que
deu garantia de que entregará dentro do prazo estipulado pelo governo.
Saber que estou um passo à frente da concorrência me enche de
orgulho.
— Providencie o champanhe, Mia — peço a minha assistente e ouço
som de aprovação. — E alguns petiscos. Hoje é dia de comemorar!
Minha equipe em peso vibra enquanto Mia começa a preparar o
coquetel, em cima da hora. Caminho até Ava, que está no canto. Ela admira
tudo ao seu redor e está com um sorriso orgulhoso desde que retornamos de
Washington há alguns dias.
— Então Lionel Rossi dará uma festa?
Cruza os braços me encarando enquanto me aproximo dela.
— Não é motivo de comemorar? — indago e Ava empina o queixo
para mim.
— Com toda certeza. Principalmente porque eu quase tive um ataque
de pânico naquele Banco Central.
A careta que ela faz me tira uma gargalhada.
— Então hoje será recompensada. — Encaro-a firme, e ela engole em
seco.
Seus olhos castanhos são muito mais intensos agora.
Ava Stone nem parece a mesma garota assustada que chegou aqui há
pouco mais de um mês.
— Obrigado, Ava. — Aqui, próximo a ela, vejo o quanto fica
pequena se comparada a mim. — Você fez a sua parte e eu cumprirei com a
minha promessa. Continuará trabalhando comigo e terá a segurança de que
precisa.
— Obrigada por confiar em mim.
Ela me encara de lado agora, com um rubor passando pela sua face,
enquanto coloca uma mecha de cabelo atrás da orelha.
— Nós formamos uma boa equipe. — Pisco para ela, que sorri.
— É. — Suas íris escurecem um pouco agora. — Formamos, sim.
— Olha o champanhe! — Blake grita e chama a nossa atenção.
— Mas já?
Vou ao seu encontro e Ava me acompanha.
— Eu peguei na sua adega. — Meu amigo abre o sorriso mais
atrevido do mundo.
— E quem te deu permissão para isso? — Tento fingir braveza, mas é
impossível estar bravo hoje.
Porra!
Salvamos meu negócio.
Que alívio do caralho.
— Fica na sua, Rossi!
Blake agita a garrafa em suas mãos e, quando dispara a rolha, toda a
minha equipe vibra. Em pouco tempo, as taças surgem e brindamos essa
vitória.
— Não pensem que está tudo ganho! — digo logo que dou um gole
no espumante. — Na verdade, o nosso trabalho só está começando.
Enquanto todos engatam em uma conversa animada, o pessoal do
bufê com que temos parceria começa a chegar com bandejas de petiscos e
saímos do galpão em direção ao jardim.
Eu converso um pouco com cada membro da minha equipe, mas fico
sempre de olho em Ava me certificando de que esteja à vontade. Mas, a
cada taça de champanhe que ela bebe, se solta mais um pouco e acho graça
de sua espontaneidade.
A garota que até pouco tempo só andava encolhida pelos corredores,
agora está conversando e gargalhando com todos os presentes. E essa
imagem me faz pensar que essa deveria ser a Ava antes de tudo ter
acontecido. Antes de ter conhecido o verme do Charles, que lhe apresentou
a Elijah.
— E eu quase caguei nas calças — comenta rindo com uma
funcionária do setor de conferência de notas. — Eu já estava sentada no
vaso mesmo, nem precisava me levantar para isso.
O som de sua gargalhada me faz sorrir.
— Essa história nunca deixa de ser boa — Liam comenta ao seu lado.
— Você viu a minha cara, Lionel — Ava fala meu nome com a voz
levemente arrastada e eu sorrio.
— Eu vi.
— Eu ia enfartar se aquele arquivo demorasse mais cinco minutos
para fazer a transferência — comenta com os olhos brilhando. — Vocês
teriam que me tirar daquele banheiro de ambulância.
Ela aponta para Liam e para mim em uma careta, o que faz todo
mundo rir.
— Ainda bem que não foi preciso — brinco.
— E você me valorize, Sr. Lionel Rossi. — A garota aponta o dedo
para mim e caminha em minha direção. — Eu arrisquei a minha pele por
sua causa.
Os olhos dela brilham e eu apenas seguro a sua mão, massageando
seu dedo, abaixando-o.
— Eu valorizo, Stone. — Encaro-a firme e ela entreabre os lábios
piscando os olhos devagar.
Percebo que um clima diferente se formou aqui e, pela forma como as
pessoas nos olham, decido recuar.
Solto a mão de Ava e dou um passo para trás, raspando a garganta.
Olho para o lado e vejo Blake vindo em nossa direção com uma
garrafa de uísque nas mãos e agradeço mentalmente a interrupção.
— Que porra é essa, Blake? Deu para roubar minhas bebidas hoje?
— Hoje é dia de comemoração.
Ele passa por mim e abre a garrafa, servindo a bebida para alguns
funcionários.
— É... Mas precisava pegar meu uísque mais caro?
Tomo a garrafa de suas mãos para conferir o rótulo.
— Deixa de ser pão-duro, Rossi. Você tem dinheiro para comprar
um caminhão cheio dessas.
Resmungo, tirando uma risada de todos, e então decido ceder. Se eu
bem conheço meu amigo, vai passar a noite saqueando a minha adega só
para me provocar, e se eu me estressar com isso é pior.
— À garota Stone — Blake propõe um brinde e entrega a ela uma
dose do uísque.
Ela dá conta de beber isso?
Uísque é forte para caralho.
Mas a morena não se intimida e pega o copo, virando a dose de uma
vez e fazendo uma careta bastante engraçada ao final.
Não resisto a soltar uma gargalhada.
— Uísque não é para amadores, garota — decido provocá-la e ela
empina o queixo para mim.
— Eu invadi um dos sistemas mais seguros do mundo, Lionel —
mais uma vez diz meu nome de forma arrastada. — Acha que um simples
uísque me intimida?
— Quer mais uma dose então? — ofereço, apontando para a garrafa
na mão de Blake.
— Não estou com vontade.
Ela dá de ombros, fazendo-me gargalhar.
— Amarelou, Stone? — provoco Ava, que faz uma careta fofa para
mim.
— Prefiro o espumante.
Ergue a taça no momento em que o garçom do bufê a enche
novamente.
Decido deixá-la à vontade em um papo animado com os funcionários,
enquanto me sirvo do uísque, e fico de longe acompanhando tudo.
Encostado na árvore, encaro o céu estrelado acima de nós e sinto
vontade de fumar um charuto. Com o copo nas mãos, caminho até o interior
da casa e vou para o meu escritório pegar um.
Abro a caixa de madeira e tiro um charuto de lá. Trago até o nariz e
inspiro o aroma, fechando os olhos por um instante. Pego o cortador na
caixa e faço o corte preciso na ponta, acendendo-a com o isqueiro.
Com o charuto aceso em mãos, eu me apoio na mesa e levo-o aos
lábios, dando duas puxadas lentas antes de soltar a fumaça.
Aprecio seu sabor e o aroma, pensando na loucura dos últimos dias.
Em como eu finalmente encontrei uma luz no fim do túnel e consegui
agarrá-la.
Como se fosse atraída por meus pensamentos, a minha luz caminha
em minha direção e se detém na porta, com os olhos levemente pesados.
— Veio ficar sozinho? — Ava pergunta antes de adentrar o cômodo.
— Vim fumar um charuto. — Ergo a mão para ela antes de puxar a
fumaça mais uma vez.
— Acho chique isso. — Aponta para as minhas mãos e eu arqueio a
sobrancelha para ela.
— O quê?
— Beber uísque fumando charuto. Parece coisa de mafioso de filme.
Solto uma gargalhada ao ver que também encosta o quadril na mesa
imitando minha posição.
— Você anda vendo muito filme de máfia? — pergunto e ela balança
a cabeça negando.
— Não muito.
O silêncio se instala no cômodo, mas dura só alguns minutos. Percebo
que o álcool deixa Ava bem mais tagarela do que o normal.
— Você não gosta de festas? — pergunta.
— Não sou muito disso. — Dou de ombros.
— Nem mesmo para a sua sobrinha?
Balanço a cabeça negando.
— Crianças têm que ter festas de aniversário, Lionel! — Ava faz um
biquinho de reprovação e eu não consigo conter um riso. — Com direito a
palhaços malabaristas.
— Não acho que seja a cara de Amy e...
— Você deveria fazer mais isso — ela me interrompe.
— O quê? Festas?
— Sorrir. Você fica lindo sorrindo.
Ava umedece os lábios devagar me encarando de um jeito tão intenso
que faz o meu coração dar um salto dentro do peito.
Eu fico quieto, quando vejo-a arrastar o quadril para ficar mais
próxima a mim.
— Você ficou sério de repente — diz e eu franzo o cenho para ela. —
Aí, quando franze o cenho assim, parece que vai matar alguém.
Sua constatação me faz rir.
— Ah, é?
Pouso o copo na mesa e o charuto no cinzeiro, cruzando os braços
para ela.
— Eu percebo você, Lionel — diz e eu a encorajo a continuar.
Quero ver até onde ela vai com isso.
— Você sempre está sério, com o semblante fechado. Não se permite
abrir para ninguém...
Ava coça o queixo para me analisar.
— Mas eu consigo perceber você. Imagino que, por trás de toda
postura séria no trabalho, tem um cara legal. — Ergue o dedo e encosta em
meu peito.
Tento controlar a respiração para não demonstrar o quanto essa
proximidade está mexendo comigo.
— Não sei nada sobre você — comenta, com a voz mais baixa agora.
— Além do seu trabalho e que tem uma sobrinha.
— Ava...
— Você só tem a Amy? Não tem uma namorada? Alguma família que
mantém escondida?
— Ava...
Afasto-me um pouco dela, mas a garota se aproxima mais, encurtando
nossa distância.
— Eu gostaria de saber mais sobre você — suas palavras fazem o
meu coração bater um pouco mais forte agora.
Continuo imóvel quando ela se aproxima ainda mais de mim.
— Gostaria de saber qual é sua comida favorita... O que gosta de
fazer na sua folga...
A garota não tira os olhos de mim e eu não impeço esse monólogo,
vendo até onde ela quer chegar.
— Você é um homem interessante, Lionel... — meu nome sai
arrastado de seus lábios. — Rossi...
— E você bebeu demais — acuso, tentando disfarçar o quanto essa
garota está mexendo comigo.
— Pode ser. — Ela dá de ombros. — Mas você continua sendo
interessante para mim.
Seus olhos me encaram firmes agora e daqui eu consigo sentir o
cheiro do álcool de seu hálito. Mas consigo sentir também o aroma de
chocolate e avelã tão característico dela.
Parece vir de seus cabelos...
Cabelos esses que caem sobre os olhos, e eu toco o seu rosto em um
gesto impulsivo para afastá-los.
Consigo sentir o momento em que sua pele se arrepia pelo meu
contato e, por mais que eu saiba o quanto isso é errado, não me afasto.
Meus dedos percorrem sua pele macia e Ava não tira os olhos de
mim, encarando-me como se eu fosse o centro de seu mundo agora.
Engulo em seco ao vê-la fechar os olhos devagar e inclinar o rosto em
minha direção.
Eu deveria repeli-la, deveria afastá-la, mas não consigo sair daqui...
Não consigo me mover e...
— Ah, encontrei você!
A voz de Naomi surge na porta e nos assusta, fazendo-me soltar Ava
de uma só vez.
A garota me olha confusa antes de se virar para a empregada.
— Eu notei que sumiu e fiquei preocupada com você — Naomi
continua.
— Ah... Está tudo bem.
Consigo notar um tom de decepção passar em seu rosto e finjo
indiferença a isso.
Não posso deixar transparecer o quanto sua proximidade mexeu
comigo.
— Eu estava conversando com Lionel e...
— Pode cuidar dela, Naomi — corto-a e seu semblante se entristece.
— Você se excedeu um pouco na bebida hoje, Ava, é melhor descansar.
A garota desencosta o quadril da mesa e me olha por um instante
antes de se afastar.
— Não é a bebida que me fez gostar da sua companhia, Rossi.
Ergo os olhos para ela, mas Ava já deu as costas para mim, indo ao
encontro de Naomi.
Quando finalmente estou sozinho, encho o copo de uísque e viro-o de
uma vez, pensando no que foi que aconteceu aqui.
Eu teria que ser burro demais para não perceber o clima que se
formou.
Garota, garota...
Como vou te olhar da mesma maneira depois desta noite?
— Hummm... Deu um erro aqui.
— Erro? Qual?
Arrasto minha cadeira de rodinhas até a mesa de Luke Hughes, o cara
que cuida do TI de Lionel e que hoje é meu parceiro de trabalho. Ele não
tem tanto conhecimento quanto eu, mas é um ótimo hacker.
— Este aqui.
Luke aponta para a tela de seu computador de mesa e eu peço licença
para tentar corrigir. Como fui eu que criei o sistema, fica mais fácil de
identificar o problema e ir atrás da solução.
Sentado ao meu lado, o rapaz me assiste mergulhar no sistema e fazer
uma série de testes até finalmente descobrir.
— Caramba, Ava. — Assobia enquanto vê o software funcionando
normalmente agora. — Você é foda mesmo.
Olho para ele por cima do ombro e sorrio.
Diariamente recebo elogios desde que cheguei aqui, mas ainda não
me acostumei a recebê-los.
— Esse é o maior projeto da minha vida, Luke.
Viro a cadeira para ficar de frente para ele, que inclina o corpo e apoia
os cotovelos nas coxas para me encarar.
— E você entregou de mãos beijadas para o Rossi? — pergunta com
curiosidade.
— Ele me pagou muito bem por ele.
Ainda não consigo acreditar que Lionel me transferiu nada menos que
meio milhão de dólares só pelo sistema.
Apenas por ele.
Fora todos os benefícios que concede e outras gratificações. Além do
alto salário mensal.
Ele realmente valoriza muito o meu trabalho.
Uma pena que só me enxergue como alguém útil para ele, nada mais.
Desde o pequeno coquetel que fizemos para comemorar o sucesso da
operação, Lionel tem me evitado. Já faz mais de semana que ele passa por
mim e trata apenas do necessário, eu queria entender por que age assim.
Sei que posso ter me excedido e falado demais naquele dia, mas não
disse nenhuma mentira, por isso não me arrependo.
Lionel é um homem muito fechado, de poucas palavras, mas sei que
esconde algo bom. Alguém que leva a sobrinha à Disney todos os anos não
pode ser um cara tão frio como ele transparece ser.
E, mesmo que eu saiba qual é o meu lugar aqui, não consigo conter a
curiosidade por ele.
Algo dentro de mim quer saber mais a seu respeito...
Quer se aproximar...
— Imagino que deve ter tido um trabalhão para criar — Luke chama
a minha atenção e eu pisco os olhos para ele.
Nem percebi que viajei aqui, deixando-o falar sozinho.
— Demorei meses para desenvolver, mas valeu a pena.
Olho para as telas dos computadores à nossa frente e sorrio orgulhosa.
Se houve uma coisa boa em conhecer Elijah, foi trabalhar nesse software.
Enquanto ficava ali mergulhada naquela programação, eu me esquecia um
pouco de todo o caos em que minha vida tinha se transformado.
— E como valeu. Você realmente arrasou, Ava.
Luke toca o meu ombro com carinho e sorri.
— Obrigada, Luke. — Dou um tapinha em sua mão em
agradecimento.
Sorrio antes de girar a minha cadeira e dar de cara com Lionel me
encarando na porta, com uma cara de poucos amigos.
Neste momento, meu sorriso morre.
— Preciso falar com você, Stone — sua voz sai grossa e ele dá as
costas, sumindo de vista.
— Eita, o chefe está bravo — Luke brinca e eu faço uma careta.
— Quando é que Lionel não está?
O rapaz gargalha e eu me levanto da cadeira, já sentindo o coração se
acelerar dentro do peito. Não gostei nadinha da expressão do nosso chefe.
— Bom... Deixe-me ver o que ele quer comigo.
— Boa sorte.
Aceno e saio da sala de programação, cumprimentando Liam no
corredor e indo em direção ao escritório de Rossi.
Quando chego à sua porta, dou uma batida e ele me autoriza a entrar.
— Pois não?
Lionel está parado de costas para mim, olhando para a janela, com as
mãos nos bolsos da calça social preta.
— Recebi notícias do fornecedor de papel e estão finalizando o ajuste
da marca d’água — comenta, virando-se para me olhar. — Mais alguns dias
e eu recebo a prévia do novo formato.
A notícia é maravilhosa, mas seu semblante não está nada feliz.
— Jura? — indago e ele assente.
Lionel cruza o escritório e vai até o barzinho no canto se servir de
uma dose de uísque. Ele me oferece e eu recuso.
— Sim, os testes foram satisfatórios e, quando eu aprovar a
impressão, farão a aplicação em toda a folha para começar a produzir as
bobinas de papel.
— Isso é ótimo, Lionel.
Abro um sorriso, mas sua expressão continua fechada.
Juro que não estou entendendo que bicho o mordeu.
— Por que está assim? Não era para estar feliz?
— Eu estou feliz, Ava.
Solto uma risada.
Com essa cara de cu?
Ele só pode estar de gozação comigo.
— Não me parece...
— Eu só achei que merecia saber disso. Pode voltar ao trabalho.
Ergue o copo de uísque em direção à porta e estreito os olhos para ele.
Eu poderia muito bem virar as costas e voltar para a sala de
programação, mas me recuso.
Quero entender o porquê de Lionel estar agindo assim.
— O que foi que eu fiz, Rossi? — Cruzo os braços e o encaro firme,
em um tom de desafio. — Desde a comemoração, você vem me tratando
como se eu fosse nada para você.
Suas íris azuis se escurecem e ele vira o uísque de uma vez antes de
pousar o copo na mesa.
— E o que necessariamente você é para mim, Ava? — pergunta
áspero e eu engulo em seco. — Além de alguém que eu pago muito bem
para trabalhar para mim?
Sinto como se suas palavras me estapeassem.
— Não venha me dizer que você sempre me tratou assim, Lionel,
porque não é verdade.
Suas sobrancelhas se unem ainda mais em um semblante fechado.
— Bebeu de novo, garota? — sua pergunta ridícula me choca.
Esse homem só pode estar de brincadeira comigo.
— Você está assim só porque eu disse que te achei um homem
interessante? É isso? — questiono e, quando sua expressão vacila, sei que
encontrei a verdade.
— Você é nova demais... — desdenha. — Não sabe do que está
falando...
E é nessa hora que meu sangue ferve.
— Eu não sou a porra de uma criança, Rossi — rebato falando
mais alto agora.
Balanço a cabeça nervosa.
— Não foi a bebida que me fez querer saber mais de você, Lionel —
solto, vendo seu semblante se tornar confuso. — Se não é capaz de lidar
com o interesse genuíno de uma mulher em algo que não seja somente a
porra do seu dinheiro, tudo bem. Só não precisa me tratar como uma
criança, porque eu não sou.
Viro as costas para ele e saio de seu escritório, sentindo um bolo se
formar em minha garganta.
Encosto o corpo na parede do corredor e fecho os olhos, respirando
fundo, lutando contra a vontade de chorar.
Não posso fraquejar assim, pelo menos não na frente de todo mundo.
Não sei o que Lionel faz comigo, porque bagunça tanto a minha
cabeça, já que eu nunca me senti assim antes.
E, mesmo que me doa a forma como ele vem me tratando, preciso
fingir indiferença.
Engulo o choro, recuperando o que resta do meu orgulho para andar
até a sala de programação e voltar ao trabalho.
Se Lionel quer apenas um contato profissional, que seja.
Pagarei na mesma moeda.
— Está sumido dos cassinos, Rossi — a chefe da rede comenta ao se
aproximar de mim e erguer o corpo para beijar o meu rosto.
— Essa nova moeda está me tirando do sério, Kaylee — resmungo e
ela assente.
Kaylee Morgan trabalha para mim há mais de dez anos e gerencia
toda a rede de cassinos. Ela é minha porta-voz quando não estou por aqui.
— Fiquei sabendo que finalmente estão conseguindo adaptar a
produção, né?
— Porra, ainda bem.
Aperto o ossinho do nariz e penso no quanto tudo isso tem me tirado
o sossego nos últimos meses. Tudo saiu dos trilhos desde que o governo
anunciou essa mudança e eu tenho trabalhado em dobro nessa nova missão.
Tenho passado bem menos tempo em casa com minha sobrinha e reduzido
minhas vindas aos cassinos.
Mas pelo menos sei que ele está em boas mãos.
Aqui do escritório de Kaylee, observo as câmeras de segurança dos
principais pontos do cassino, vendo que, mais uma vez, a casa está cheia.
Saber que o faturamento dos cassinos não caiu tem sido um alívio e
tanto. Ainda que não sejam minha fonte de renda principal, estão me
ajudando bastante nesse período conturbado de fabricação das notas.
— Mais alguns meses e estou livre dessa merda — completo,
cruzando os braços e encostando o quadril na mesa.
— Isso está te tirando do sério, né?
Kaylee se aproxima de mim e eu consigo sentir seu perfume
adocicado. Os cabelos da morena estão presos em um rabo de cavalo e os
lábios pintados de vermelho se abrem em um sorriso que eu conheço bem.
— Se estiver precisando aliviar o estresse... — Ela toca o colarinho da
minha camisa e me encara com os olhos verdes. — Tem sempre um quarto
disponível.
Kaylee Morgan sempre foi minha foda fácil.
Eu nunca fui de me envolver com mulheres no trabalho, mas com ela
sempre foi diferente. Nunca houve complicação, nem cobranças, Kaylee é
ainda mais resolvida nesse sentido do que eu. Solteira convicta, ela sempre
deixou claro que usa o sexo apenas para benefício próprio e todas as vezes
que trepamos foi puramente carnal.
Nunca houve mais do que isso e sempre funcionou para nós dois. Não
temos um relacionamento, muito menos exclusividade. Apenas transamos
quando temos vontade.
E seu convite não podia vir em um momento mais oportuno.
Desde que saí do meu escritório mais cedo, pouco depois de uma
discussão ridícula com Ava, decidi sair daqueles ares e vir para os meus
cassinos.
Aquela garota dos infernos tem atormentado a minha mente há dias e
eu tenho certeza de que uma boa trepada agora vai resolver o meu
problema.
Não penso demais, apenas puxo a morena pelo braço e nos levo até a
recepção do hotel, onde pego uma chave de um quarto vazio. Pelo elevador,
subimos do cassino aos quartos e durante todo o trajeto não digo uma
palavra sequer.
Minha cabeça está uma bagunça e a morena parece perceber isso, pois
não insiste em conversas inúteis, como Ava faria.
Quando abro a porta do quarto, Kaylee avança sobre mim, tentando
beijar a minha boca, e eu me esquivo. Não estou com tempo para essa
merda.
— Você está mesmo nervoso hoje, Rossi.
A morena morde o meu pescoço e desce as mãos pela minha camisa,
abrindo os botões, mas, por mais que eu conheça cada canto de seu corpo e
adore comer esta mulher, o tesão não vem.
O cheiro do perfume de Kaylee só me faz lembrar que não é o aroma
de chocolate e avelã de Ava. Isso me faz ficar ainda mais puto.
Garota dos infernos.
Quando desce as mãos até a minha calça e toca o meu pau mole,
Morgan se afasta, fazendo uma careta.
— Ih... Pelo visto você não está mesmo bem hoje.
— Minha cabeça está um inferno, Morgan — resmungo, afastando-
me dela.
A morena faz um beicinho pesaroso enquanto me vê fechar os botões
da minha camisa, puto de ódio.
— Pelo visto não vai rolar mesmo, né? — pergunta e eu nego.
Meu sangue ferve de raiva daquela garota que só veio para foder a
minha cabeça.
Quando foi que eu neguei fogo para uma mulher, principalmente para
Kaylee?
Meu pau a reconhece de longe e já fica duro com uma piscada de olho
que ela dá.
Mas agora o filho da puta resolveu esquecer que é gente para ficar
encolhido no meio das pernas.
Saio do quarto sem nem me despedir de Morgan e disparo para o
elevador, em direção ao casarão da fábrica.
Já sei exatamente aonde ir e aquela cretina me paga.
Vai se arrepender por ter mexido comigo, Stone.
Esmurro a porta do quarto de Ava, que em pouco tempo a abre, com o
olhar assustado.
— Rossi? O que aconteceu?
Para piorar a minha vida, a garota veste um short minúsculo e uma
camiseta tão justa que daqui consigo ver os bicos dos seios. E essa
constatação faz meu pau reagir dentro da calça.
Ah, então agora você vai subir, filho da puta?
Entro em um rompante e bato a porta atrás de nós, vendo-a ter um
sobressalto.
— A sua intenção era foder a minha mente, Stone? — pergunto,
puxando-a pelo braço e deixando-a a centímetros de mim.
Seus lábios estremecem devagar e, quando o cheiro de avelã com
chocolate atinge o meu nariz, eu perco a porra do juízo.
Dou um tranco em seu corpo e circulo-a com o braço, prendendo-a
em mim quando ataco a sua boca de um jeito feroz.
Ava parece demorar uma fração de segundos para entender o que está
acontecendo e tenta se afastar de mim, empurrando o meu corpo, sem
sucesso.
— Lionel, eu não...
— O caralho que não quer!
Colo a boca na sua e engulo os seus protestos, sentindo-a se debater
contra mim até finalmente ceder. Aos poucos seus tapas vão cessando e
seus lábios se abrem por completo, dando espaço para minha língua.
Seguro seu queixo com força enquanto devoro sua boca e Ava reage
instintivamente, circulando o meu pescoço, puxando minha nuca de um
jeito tão bruto que quase arranca os meus cabelos.
Meu pau já está duro feito um porrete dentro das calças e eu só
projeto o corpo para a frente, esfregando a ereção nela, que geme desejosa.
— Era isso que você queria, Stone?
Afasto-me apenas para raspar a barba pelo seu pescoço e morder a
sua pele, que fica levemente avermelhada. Ouço sua respiração pesada
quando a pego pelo quadril e a carrego até a mesa de madeira no canto,
onde a ponho sentada.
Ava abre as pernas para me receber e eu puxo seus cabelos com força,
erguendo seu queixo antes de devorar a sua boca de um jeito tão bruto, que
faz a garota arfar.
— Lionel... — ela geme quando subo as mãos pelo seu corpo e puxo
a camiseta para baixo sem um pingo de cerimônia.
Seus peitos pulam e eu me afasto apenas para apreciar essa visão.
Lambo os lábios antes de apertar os mamilos entre os dedos, caindo de boca
em um deles.
— Ai, Rossi... — a garota geme e eu não afrouxo a mão.
Vejo o quanto seu quadril rebola em desespero, louca para se aliviar,
mas não vou dar esse gostinho a ela.
Pelo menos não ainda.
Continuo chupando seus peitos com gosto e a garota me puxa pelos
cabelos, guiando minha boca de um bico a outro, fazendo-me dar atenção
aos dois.
Seu quadril se arrasta na mesa e se esfrega mais em mim em um
pedido silencioso de alívio.
Minhas mãos massacram seus mamilos enquanto continuo chupando-
os e lambuzando com a minha saliva.
— Lionel...
— Quis me tirar do sério, Ava? — pergunto, afastando-me dela e
encarando seus olhos nublados de tesão.
Minhas bolas estão doloridas, meu pau está louco para se enterrar
nessa boceta, mas não vou comer essa garota hoje.
Vou mostrar com quem é que ela está mexendo.
Beijo sua boca mais uma vez enquanto meus dedos esfregam os seus
mamilos e corro os lábios até o seu ouvido.
— Vai ter que terminar o serviço sozinha.
Mordo o lóbulo da sua orelha e dou um beliscão em cada mamilo
antes de me afastar.
— Lionel... — ela me chama, mas eu simplesmente viro as costas,
deixando-a sozinha sobre a mesa.
Bato a porta ao sair e pego o caminho para ir para a minha casa.
Preciso de um banho gelado agora.