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SEMINÁRIO ADVENTISTA LATINO AMERICANO

DE TEOLOGIA
IAENE - 1994
PROF. JOÃO ANTONIO

FILOSOFIA

OBJETIVO: Contrastar o pensamento ocidental (filosofia grega) com


o pensamento Hebraico/bíblico.
Ajudar a eliminar os "óculos gregos" ao se estudar a
Bíblia.

O pensamento judeu-cristão foi mixado com a filosofia grega,


especialmente através de Agostinho (+ 430) e Tomás de Aquino (+
1274), que foi responsável pela Aristotelização do pensamento
teológico católico/cristão. Já Agostinho tentou explicar a
doutrina cristã usando conceitos platônicos.

Mas, antes deles, por volta do 2? século, os pais da Igreja,


apologistas, já haviam aceitado o pensamento grego e procuravam
explicar as doutrinas cristãs aos gregos educados de seu tempo,
usando a filosofia clássica. É verdade que eles tiraram os
pensamentos contrários à doutrina cristã. Por exemplo: os
filósofos gregos advogavam a eternidade da matéria, que seria co-
eterna com Deus. Daí seu conceito sobre a criação era totalmente
contrário ao relato bíblico. Assim, os apologistas tentaram fazer
uma cristianização da filosofia clássica, só que com isto
conseguiram helenizar o pensamento bíblico.

A tese desta matéria é que nem os reformadores conseguiram


realizar uma reforma completa. O princípio SOLA SCRIPTURA não foi
alcançado, porque o pensamento alimentado naquele tempo tinha
muitas idéias, conceito e pressuposições gregas. O movimento
liberal do século 19 tem algo positivo, pois propôs pela primeira
vez a doutrina cristã do 2? século em diante é uma corrupção do
cristianismo bíblico.

ADOLF VON HARNACK escreveu uma obra teológica em que diz que
o catolicismo é o resultado da mistura do cristianismo com o
pensamento da antiguidade (clássico: Sócrates, Platão e Aristóte-
les; e pré-clássico). Acrescenta: a dogmática católica é o
Cristianismo concebido e formulado desde o ponto de vista da

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filosofia grega.
Não só Harnack e outros protestantes, mas também pensadores
católicos, como HANS KÜNG.
A igreja católica considera a filosofia de AQUINO como
INSPIRADA. O concílio Vaticano I considerou-o como Doutor
Angélico, o que significa que a base para a teologia católica de
hoje é a obra de Aquino (este é o pensamento oficial da igreja
católica). As mudanças introduzidas pelo Vaticano II foram
superficiais; os conceitos básicos são TOMISTAS-ARISTOTELIANOS.

CONTRASTES entre o pensamento Grego X Hebraico:

1? Estático X Dinâmico

Os gregos estavam interessados em contemplação (estático) e


os hebreus em ação (dinâmico). Movimento não poderia ser a
realidade última para os gregos, para quem o ser deve distinguir-
se do vir a ser (tornar-se), e a realidade última deve ser
imutável. Para os israelitas a verdadeira realidade era a ação e
movimento.

Com isto pode ser associado o contraste grego de aparência e


realidade. O mundo estava repleto de fenômenos mutáveis, mas desde
que a realidade deve ser estática a mudança deve ser aparência
irreal.
Para os israelitas, entretanto, a aparência de uma coisa era
a manifestação de seu ser ou realidade, e uma manifestação válida
e adequada. O que não aparece em ação e movimento não seria real,
o que aparecia não era uma sombra secundária da realidade mas a
realidade em si. Não há, portanto, contraste de aparência e
realidade. James Barr, The Semantics of Biblical Language,
p.10,11.

Com relação à problemática do ser e do devir temos de


remontar aos intentos pré-socráticos de explicar ao inquietante
fazer-se e parecer das coisas por um princípio originário (arché).
HERÁCLITO produziu um impacto duradouro; foi o primeiro que
desenvolveu uma filosofia radical do devir, segundo a qual tudo
flui em meio da natureza antitética de todos os fenômenos.
PARMÊNIDES foi o primeiro que se atreveu a explicar todo devir
como uma aparência, e que atribuiu ao ser único, não só a
eternidade e a imutabilidade, se não também uma total imobilidade.
A oposição de Parmênides contra toda a classe de devir teve uma
influência quase universal e a filosofia posterior a ele, até

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Spinoza, deve ser entendida em grande parte como reação aberta ou
velada contra Heráclito. Em Parmênides se apoia a filosofia da
natureza (Empédocles, Anaxágoras, Leucipo e Demócrito) com sua
concepção dos elementos (átomos) imutáveis, o mesmo que a
ontologia de Platão, passando pela escola eleática e a crítica do
conhecimento por parte dos primeiros sofistas.
Dentro da linha de Parmênides, e em grande medida contra uma
radical filosofia do devir, estão construídas: não só a teoria
dualista das idéias de Platão, com seu menosprezo do mundo das
mudanças, que são puro fenômeno, se não também a filosofia
aristotélica da "energia", que tende a explicar o movimento, porém
aferrando-se ao NOUS imóvel; assim como a dinâmica filosofia da
emanação de Plotino, com sua concepção do UNO original, que não
tem vida; e por fim, em dependência de tudo isto, a metafísica
escolástica da Idade Média.

De uma maneira clara ou oculta, o Deus das distintas versões


da filosofia do devir, tanto em Eckhart como em Bohme, em Nicolau
de Cusa como em Giordano Bruno, em Malebranche como em Leibniz,
até chegar a Hegel, foi sempre um Deus vivente. Entretanto, a
desconfiança de certos filósofos gregos frente à filosofia do
devir de Heráclito se havia estendido também à idéia de Deus, e
havia cristalizado em torno dela. Porém a radical negação do devir
por parte de Parmênides, que por deixar intacto o ser se viu
obrigado a considerar como um erro humano toda a gama de mutações
e movimentos dentro do mundo, não pôde impor-se. Platão,
sobretudo, esforçou-se por superá-la. Em sua solução Platão não
somente se achava sob a influência da filosofia eleática do ser,
senão também sob o dualismo pitagórico. Assim, pois, se decidiu
por uma divisão da realidade, que havia de ter gravíssimas
conseqüências, e pela distinção entre um mundo falso, mal,
dissociado e sensível, que é o mundo do devir, e o outro mundo do
ser, que é o verdadeiro, o bom, o unificado e espiritual. Ainda
que particularmente nos Diálogos mais tardios, não se exclua todo
movimento nem no mundo das idéias (dialética) nem entre o mundo
das idéias e dos sentidos, sem dúvida, o mais decisivo e o que
haveria de ter maior futuro é a separação (korismós) entre o
mutável deste mundo espacial e temporal e o eternamente imutável
daquele outro que é superior ao tempo e ao espaço, e esta acima da
abóbada celeste.

Antes de Platão, Anaximandro entendeu o primeiro princípio


como o carente de limites (apeiron) e o divino (theion); Xenófanes
falou de forma imprecisa do Deus único; e tanto Parmênides como

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Heráclito conceberam seu logos como uma realidade impessoal. Para
o próprio Platão que submete a duras críticas o mundo dos deuses
homéricos, cheio de contradições, o princípio originário é
absolutamente imóvel e imutável. Porém no Timeu fala de um
demiurgo que, se bem não é o criador do mundo, sem dúvida é o seu
arquiteto e enquanto tal, está subordinado à idéia, de forma que
pelo menos pode duvidar-se de que se para Platão este demiurgo é o
único Deus no mais rigoroso sentido. Em todo caso, para Platão o
princípio supremo é o sol espiritual, que ele descreve nos livros
sete e oito da Politéia. Este sol espiritual é idéia do bem, que
se acha no cume da pirâmide das idéias. Ainda quando a idéia
suprema não esteja suficientemente ressaltada sobre as demais
idéias, sem dúvida, ela é o divino que se basta a si mesmo e ocupa
o trono na hierarquia do mundo eternamente imutável das idéias. Em
todo caso, se opõe totalmente ao deus Heráclito (e também ao dos
estóicos), isto é, a um deus que devem (devir = vir a ser). De
fato, ainda que o deus Heráclito esteja descrito como uma
realidade separada do todo, sem dúvida se identifica com a série
dos elementos que se contradizem e lutam entre si, com o fogo
vivente que, como alma e razão do mundo, penetra todo o universo
fluente e as contradições dos fenômenos em sua condição enigmática
e ambígua.

Também em Aristóteles vêem alguns certa incongruência entre


o bem supremo que a tudo atrai e o primeiro motor imóvel. Este
divino nous, ainda sendo ato puro, está tão petrificado na
imutabilidade e até tal ponto exclui todo movimento, que somente
se conhece a si mesmo e não admite nenhum prattein nem poein sobre
outra coisa.

Na terceira estrela da tríade, em Plotino, que em grande


parte supera dinamicamente a rigidez platônica na base de seus
extratos do ser que emanam uns do outros, o supremo princípio de
todo ser, o Uno, permanece em uma imutabilidade rígida, de forma
que Plotino exclui dele até a vida.

Assim, pois estes três grandes representantes da filosofia


grega tiveram uma concepção eleática, se não do ser, pelos menos
do divino. A eternidade, imutabilidade e absoluta imobilidade que
Parmênides atribuiu ao ser enquanto tal, atribuíam eles ao supremo
princípio de todo ser. Neste sentido, a idéia platônica do bem, o
motor imóvel de Aristóteles e o Uno de Plotino, correspondem ao
ser de Parmênides.

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No pensamento de Platão, o que mais persistentemente se
impôs, foi o rígido korismós entre o mundo das idéias de Deus (da
idéia do bem) e o mundo fenomênico dos sentidos (que é feito da
matéria má). Essa separação confere à filosofia platônica um traço
sumamente dualista e não permite uma interna relação ôntica entre
a idéia e a coisa; daqui provém a manifesta hostilidade de Platão
frente ao mundo da matéria e dos sentidos.

Aristóteles mudou as transcendentes idéias divinas de


Platão desde o céu das coisas a este mundo. Porém com ele se fez
maior a distância entre o mundo e o primeiro princípio. A parte do
impulso divino com que se põe em movimento o mundo, este e Deus
vivem a margem um do outro desde toda a eternidade. Este Deus não
conhece nem ama ao mundo; não se deve atribuir-lhe nenhuma ação
causal, nenhuma providência, nem nenhuma classe de legislação ou
ordenamento moral. E tudo isto porque Aristóteles crê que isto é
próprio do caráter absoluto de seu Deus; pois todos estes últimos
atributos significariam um passio, uma potentia em seu actus
purus.

Também o Uno divino de Plotino existe separado do mundo, que


não é conhecido por Deus. Por haver saltado da unidade, o mundo
está caído. A matéria é o elemento mau do qual o homem deve
libertar-se.

Em virtude de seu ponto de partida, que é a busca do


primeiro princípio pelo procedimento indutivo, os clássicos da
filosofia grega descuidaram tanto a mobilidade viva de um Deus que
a tudo conhece e ama, como sua comunidade com o mundo e a
humanidade. É preciso que não percamos de vista a este Deus do
platonismo, do aristotelismo e do neoplatonismo, o qual,
certamente, não se identifica com o mundo à maneira estóica, porém
se acha infinitivamente afastado dele para apreciar que inaudita
pretensão mostrava a pregação cristã ao falar de um Deus que atua
vivamente na história. Já o mero pensamento de um Deus criador que
intervém em forma viva, imediata e direta no ser e no devir do
mundo (e da matéria), conhece e ama o mundo e sua história, se
achava em flagrante contradição com a concepção grega da rígida
transcendência de um Deus imutável. Porém outra classe de
dificuldades completamente distintas esperavam a frase "o Logos se
fez carne", ao pensamento de uma definitiva revelação de Deus
naquele homem que se chamou Jesus, à idéia de uma identificação
que de algum modo se havia produzido entre Deus e o homem. Pois, o
absolutamente transcendente e estranho ao mundo e ao homem, ia

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revelar-se em um homem e identificar-se com ele? O que é todo
quietude imperturbável, o que se conhece somente a si mesmo sem
experimentar movimento, como ia rebaixar-se até fazer-se homem,
até tomar a natureza humana e converter-se em "carne" e homem
desprezível?

2 ? O contraste entre abstrato e concreto. É um procedimento


característico do pensamento grego operar com abstrações. Não é
suficiente saber o que é um bom cavalo, deve-se definir o que é "o
Bom". Termos abstratos como qualidades e propriedades são centrais
na discussão. Este procedimento pode ser ligado com a natureza
estática do pensamento grego mencionado acima; para alcançar a
realidade deve-se abstrair o problema do tempo e lugar particular
(específico), e a abstração é um termo estático.

O pensamento Hebreu, por outro lado, não opera com abstra-


ções; seus termos sempre são relacionados ao objeto ou situação
real e não a uma abstração. Similarmente os israelitas argumentam
não por fazer uma premissa e então mostrar o que deve seguir dela,
mas por apresentar uma série de situações - imagens relacionadas.
O maior uso de abstrações pelos gregos pode também ser chamado uma
intelectualização do pensamento comparado com os Hebreus.

3 ? O contraste na concepção do homem. A tradição Pitagórica


- Platônica é geralmente tomada como a tradição grega típica para
este propósito. No pensamento grego o homem é visto como uma
dualidade, com uma alma imortal aprisionada ou confinada em um
corpo mortal; os dois estão apenas temporária ou acidentalmente
relacionados.

No pensamento Hebreu a "alma" é a pessoa vivente em sua


carne; "alma" e "carne" não são separadas, mas uma é a
manifestação exterior e visível da outra. Não há pensamento da
alma vivendo a parte do corpo.

Em contraste com o pensamento Hebreu, o pensamento grego faz


o homem bem próximo de um super-homem e divino com a idéia da alma
e super-materializa e despersonaliza por tratar o corpo como
matéria. A importância desta diferença particular para os teólogos
cristãos é, naturalmente, sua ligação com as diferentes concepções
da imortalidade da alma e a ressurreição do corpo.
'O problema da existência da alma e de seu caráter substan-
cial é, indubitavelmente, o problema antropológico mais difícil.
Platão foi o primeiro a enfrentá-lo de modo explícito e rigoroso.

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Em Fédon, ele examina a objeção daqueles que negam à alma o
caráter substancial, dizendo que ela nada mais é do que um
epifenômeno do corpo: a alma não seria outra coisa que uma
concordância magnífica dos elementos constitutivos do corpo.
Platão refuta esta objeção, observando que a alma, longe de estar
em harmonia com o corpo, a- cha-se praticamente em permanente
discórdia com ele. De fato, as e- xigências da alma estão em
perene contraste com as do corpo. Por e- xemplo, "o corpo sente
ardência e sede, mas a alma, ao contrário, instiga-o a não beber;
sente a fome, e a alma instiga-o a não co- mer; e assim em mil
outros casos nos quais percebemos que a alma o- põe-se às paixões
do corpo". Para Platão, portanto, não existe ne- nhuma dúvida de
que a alma é uma substância, uma substância de na-tureza
espiritual, incorruptível e imortal. Ela própria constitui a
verdadeira e autêntica natureza essencial do homem. O homem é a
alma. O corpo é a prisão em que a alma espia as suas culpas.
Após Platão, o problema da substancialidade da alma continua
levantando controvérsias muito sérias, recebendo soluções diferen-
tes e discrepantes. Alguns autores (Agostinho, Descartes, Leib-
nitz), seguindo o exemplo de Platão, afirmam que a alma é uma ver-
dadeira substância e que sua substancialidade identifica-se com a
do homem. As razões alegadas para sustentar essa tese, são, em
par- te, de ordem gnosiológica (por exemplo, a posse de verdades
absolu- tas que não parecem extraídas da experiência).
Segundo outro grupo de filósofos ( Lucrécio, Pomponazzi, Ho-
bbes, Marx, Comte, os neopositivistas, os estruturalistas e muitos
outros pensadores contemporâneos), a alma não é absolutamente uma
substância, mas simplesmente um epifenômeno da corporeidade. São
notórias as razões aduzidas para sustentar esta posição. Na
opinião deles, a única fonte de todas as coisas é a matéria. Dela
se desen- volve tudo aquilo que observamos no universo, inclusive
o homem. (Mesmo o que de mais elevado e sublime existe nele, como
a ciência, a arte e a moral, é fruto da inexaurível potência da
maté- ria). Portanto, até o conjunto daqueles aspectos superiores
do ho-mem, os quais são explicados comumente postulando-se a
existência da alma, não é fruto de "um espírito que habita a
máquina", mas sim o resul- tado mais ou menos casual de um alto
grau de evolução da matéria.
Segundo Tomás de Aquino, que sobre esse ponto julga
interpretar o pensamento autêntico de Aristóteles; conforme o
grande grupo de discípulos que teve o Aquinate durante a chamada
II Escolástica (Silvestre, Gaetano, Suárez) e durante o
renascimento neotomista (Mercier, Gilson, Maritain, Masnovo, De
Finance, etc.), a posse, por parte do homem, de uma alma

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espiritual é uma verdade indiscutível. Porém, eles não partilham
da tese de Platão segundo a qual a alma identifica-se com o homem,
pois a alma por si só não está em condições de desenvolver todas
as atividades típicas do homem, como sentir, falar, trabalhar,
jogar, etc. Entretanto, sendo a alma dotada de algumas atividades
próprias, como refletir, raciocinar, julgar, desejar livremente,
eles também afirmam que a alma possui um ato próprio de ser e que,
portanto, é uma substância completa: uma substância completa na
ordem da existência, mas não na ordem da especificação. Ela
consegue sua própria especificação na escala dos seres somente
quando se une ao corpo.
Finalmente, há um outro grupo de filósofos, encabeçados por
Hume e Kant, que por razões de ordem gnosiológica, nega que possa
ser resolvido o problema da substancialidade da alma. Este é um
problema relativo à "coisa em si", enquanto que a nossa mente é
competente somente no que diz respeito à esfera dos fenômenos.
Hoje, com a profunda crise que a metafísica vem atravessando e com
o ceticismo que está agredindo até a ciência, a posição agnóstica
de Kant e Hume encontra um número sempre maior de defensores.
Estreitamente vinculados ao problema da substancialidade da
alma, há, na antropologia três outros problemas principais: origem
da alma, relação da alma com o corpo e fim último do ser humano.

Ao problema da origem da alma, os filósofos propuseram as


seguintes soluções:

- traducianismo, ou seja, derivação da alma dos filhos da


dos pais (analogamente ao que acontece com o corpo). Essa posição
foi assumida por Tertuliano e Agostinho, para tornar inteligível a
transmissão do pecado original.

- emanação do ser supremo: do Logos, segundo os estóicos; do


Uno, segundo os neoplatônicos; da Substância, segundo Spinoza; do
Espírito absoluto, conforme os idealistas.

- criação simultânea de todas as almas antes ou no próprio


momento da origem do mundo. Essa tese foi proposta por Platão,
Fílon de Alexandria e Orígenes.

- criação individual e direta de cada alma individual por


Deus, no próprio momento da formação do corpo. É a tese mais
divulgada entre os pensadores cristãos de todos os tempos,
compartilhada também por quase todos os expoentes máximos da
filosofia moderna (Descartes, Vico, Campanella, Locke, Berkeley,

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Leibnitz, etc.).

- evolução da matéria: é a tese sustentada por todas as


correntes modernas de inspiração materialista.
Atualmente, dessas soluções, as três primeiras não encontram
mais defensores e o campo das escolhas ficou, portanto, reduzido a
duas: criação individual por Deus e evolução da matéria. Qual a
legítima? As almas derivam diretamente de Deus ou são, ao contrá-
rio, derivadas da matéria?
A nosso ver, a segunda solução possui somente um argumento
em sua defesa: a promoção do conhecimento científico na medida
exclusiva de qualquer verdade e, em conseqüência, a recusa de
levar em consideração fenômenos que não são suscetíveis de
comprovação experimental, como o fenômeno da reflexão, do livre
arbítrio, da autotranscendência, etc. Porém, para quem não quer
prestar fé ao dogma do cientificismo, a derivação da alma da
matéria não encontra nenhuma justificativa e torna plausível, em
oposição, a tese de sua origem pela criação. Pelo contrário, uma
vez que para explicar fenômenos como a reflexão, o juízo, o
raciocínio, a autotranscendência, o livre arbítrio, etc. admita-se
no homem a existência de um elemento espiritual, a alma, não é
mais possível derivar o ser do grau inferior, do mundo físico, da
matéria, pois, entre a alma, que se revela em sua essência e
propriedades, e o mundo físico, abre-se um abismo que nenhum
processo evolutivo de ordem material tem a possibilidade de
preencher. Por conseguinte, parece-nos que sobre essa questão
tenham completa razão aqueles filósofos que sustentam que a alma
origina-se do alto, isto é, tenha uma origem espiritual e não
material. Seu argumento, reduzido ao cerne, é o seguinte: a origem
da alma deve ter conformidade com o seu ser. Ora, sendo o seu
ser de natureza espiritual, é necessário concluir que também a sua
origem tenha caráter espiritual, que dizer, ela não pode ser
causada senão por Deus; portanto, deve-se tratar de criação, pois
assim se denomina a ação comum com a qual Deus provoca a
existência das criaturas.
O problema das relações entre alma e corpo recebeu também,
soluções muito discrepantes, que, entretanto, são - em geral -
muito coerentes com as posições que os autores adotaram sobre o
problema da natureza da alma e da sua substancialidade. As mais
significativas são as seguintes:

- união acidental. É umas das teses mais bem aceitas;


sustentada inicialmente por Pitágoras e Platão, foi em seguida
retomada e desenvolvida por seus inúmeros discípulos, dos quais os

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mais ilustres são Agostinho, Boaventura, Descartes, Malebranche e
Leibnitz. Todos esses autores consideram acidental a união entre
alma e corpo, isto é, uma união entre duas substâncias já inteira-
mente estruturadas, cada uma dotada de um ato próprio de ser, duas
substâncias absolutamente heterogêneas e, portanto, alheias a
qualquer ligação profunda e duradoura. Platão, como é notório,
compara a união da alma ao corpo àquela do timoneiro ao navio ou à
do cavaleiro ao cavalo. Malebranche fala de uma união meramente
ocasional; Leibnitz de uma harmonia preestabelecida. Descartes,
enfim, fixa uma localização exata para a ligação entre a alma e o
corpo: ela acontece na glândula pineal.

- união substancial. É a tese que Aristóteles contrapôs a


Platão e Tomás de Aquino a Agostinho. Segundo o Estagirita e o
Aquinate, a união entre alma e corpo é uma união profunda,
substancial, duradoura, pois não é o encontro entre duas substân-
cias já dotadas de um ser autônomo antes de se encontrarem, mas
sim de dois elementos substanciais dos quais ao menos um, o corpo,
não dispõe de um ato de ser próprio. A sua união é semelhante à da
matéria com a forma substancial: dois elementos que se compenetram
do começo ao fim, de modo a formar uma só, única substância.

- identificação da alma com o corpo. É a tese dos


materialistas, positivistas, neopositivistas, estruturalistas e
outros autores, que, negando à alma qualquer caráter substancial,
dissolvem o seu ser no da corporeidade.

- posição agnóstica. É a posição de Hume, Kante e de seus


respectivos discípulos, os quais, considerando que nada se possa
dizer da alma como "coisa em si", concluem que logicamente não é
possível sequer expressar-se sobre a natureza de suas relações com
o corpo.
Também o problema do fim último do ser humano segue o
caminho já traçado anteriormente pelas soluções elaboradas pelos
diferentes autores para o problema da natureza da alma e da sua
substancialidade. Três são as soluções básicas:

- extinção do ser do homem com a morte: a morte não somente


marca o fim do corpo, como de todo o ser do homem, alma inclusive.
Esta tese, que até o fim do século passado havia encontrado o
apoio de pouquíssimos pensadores, tornou-se, a partir de
Feuerbach, Marx, Comte, Nietzsche, a tese mais seguida. Atualmente
é defendida pela maior parte dos existencialistas, neo-
positivistas, materialistas, marxistas, estruturalistas e por

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muitos outros ainda.

- sobrevivência da alma após a morte do corpo. Esta tese


avançada no campo filosófico, primeiramente por Pitágoras,
Sócrates e Platão, foi em seguida retomada e desenvolvida, com
ampla argumentação, por quase todos os filósofos medievais e
modernos. Entre os argumentos mais sugestivos a favor da
imortalidade da alma lembramos os seguintes:

a) argumento de Platão. Baseado no conhecimento que a alma


possui das idéias do Belo, Bem, Verdadeiro, Justo, Santo, etc.
Ora, esse conhecimento é alcançado não por meio dos sentidos, mas
antes afastando-se deles. O espírito possui, portanto, uma vida
própria, que se desenvolve sozinha, independentemente do corpo. Ao
cumprir sozinha sua busca, a alma lança-se em direção àquilo que é
puro, eterno, imortal e sempre igual a si mesmo; e sentindo a
própria afinidade a isso, ali permanece por todo tempo que lhe é
permitido, encontrando paz no seu vaguear. E, posta em contacto
com tal realidade, permanece ela mesmo constante e imutável". A
afinidade, o parentesco com a Idéia, que é eterna, é o fundamento
do argumento platônico. Enquanto espírito, a nossa alma é feita
para a Idéia, dela se alimenta e por ela vive a vida do espírito.
Mas a Idéia é eterna, imutável. Conseqüentemente, a nossa alma,
que é afim a ela e vive dela, é também eterna e imutável.

b) argumento de Santo Agostinho. Baseado também no conheci-


mento da verdade eterna. "A alma, diz Agostinho, no conhecimento
intelectivo atinge a verdade. Ora, enquanto sede da verdade , a
alma é imortal, da mesma forma que aquela. Com efeito, se o que se
encontra num sujeito é eternamente duradouro, é necessário que o
próprio sujeito seja eternamente duradouro. Mas, visto que cada
ciência reside sempre num sujeito, é preciso que a alma dure para
sempre. Dado que a ciência é verdade, e a verdade dura para
sempre, a alma também dura para sempre, nem se poderá nunca dizer
que ela morre".

c) argumento de Tomás de Aquino. Baseado no desejo natural


que o homem possui de sobreviver à morte e de não morrer jamais.
Eis como S. Tomás raciocina: "É impossível que uma tendência
natural seja vã. O homem anseia, por natureza, a perdurar
perpetuamente. Isso parece claro pelo fato de que o ser é aquilo
que é por todos desejado; o homem pode, através do intelecto,
perceber o ser, não somente num dado momento (como se realiza hic
et nunc), semelhante aos animais irracionais, mas de forma

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absoluta. Portanto, o homem logra a perpetuidade em seu lado
espiritual, ou seja, na alma, pela qual percebe o ser
absolutamente e conforme cada momento".

d) argumento de Descartes. Baseado na impossibilidade de


provar que a alma humana seja consumida pelo tempo e destinada a
perecer. "Não temos nenhum argumento e nenhum exemplo que nos
persuada que a morte ou o aniquilamento de uma substância, como o
espírito, deva seguir-se a uma causa tão insignificante quanto uma
mudança de figura, a qual não é outra coisa que uma forma, e além
disso uma forma do corpo e não do espírito... Não temos nenhum
argumento nem exemplo que possa nos convencer da existência de
substâncias espirituais sujeitas a serem aniquiladas"

- posição agnóstica. A posição daqueles que consideram que o


problema da sobrevivência do homem, após a morte do corpo, seja
insolúvel. Indícios desta posição encontram-se já em alguns
filósofos da Idade Média (Abelardo, Scoto, Ocam), e do
Renascimento (Valla, Zabarella, Gaetano). No entanto, torna-se uma
posição muito seguida a partir do momento em que ela é aprovada
por dois dos expoentes máximos da filosofia moderna - Hume e Kant
- que, como sabemos, em virtude de seus postulados
epistemológicos, sustentam que a esfera da realidade objetiva
(seja ela material ou espiritual) é inacessível à nossa mente. A
posição agnóstica é muito difundida até em nossos dias. Existem,
hoje, muitos estudiosos que não negam a imortalidade da alma,
porém consideram não ser possível resolver esse problema por meio
de provas obtidas pela metafísica. Há um grupo de teólogos,
guiados por Barth e Cullmann, que consideram a teoria da
imortalidade da alma incompatível com a Revelação bíblica e,
portanto, consideram que o cristianismo primitivo tornou-se
culpado de um erro imperdoável, no momento em que traduziu a
doutrina bíblica da ressurreição dos mortos na teoria grega da
imortalidade da alma.'

4 ? Finalmente, e para sumarizar, o contraste pode ser


expresso como o contraste entre o tipo divisivo, analítico do
pensamento grego e o tipo de totalidade do pensamento Hebreu.
Desde aqui, e vários exemplos podem ser dados, o pensamento grego
é suposto ter produzido divisões e distinções desconhecidas aos
Hebreus - ser e vir - a - ser, realidade e aparência, tempo e
eternidade, alma e corpo, espírito e matéria, grupo e indivíduo.
O uso de tais distinções é suposto ter permanecido comum na
cultura Européia, e pelo menos algumas delas têm forçado o seu

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caminho dentro da teologia cristã, onde têm criado problemas que
nunca teriam surgido se a base judaica do pensamento cristão
tivesse sido mantida em mente.

Paulo e Platonismo

by Ronald H. Nash

in Chistianity and the Hellenistic World

É freqüentemente declarado que os escritos do apóstolo Paulo


no N.T. exibem dualismo Platônico. Este capítulo examina as
alegações à luz da evidência disponível.
Este capítulo examinará os argumentos para a opinião de que
Paulo tomou emprestado ou foi influenciado pelo Platonismo. As
publicações que afirmam uma dependência Paulina do Platonismo
tendem a concentrar-se em acusações similares. Por exemplo, os
escritos de Paulo supostamente evidenciam uma visão dualística do
mundo, uma visão que é dita ser especialmente clara em sua radical
distinção entre a alma humana e o corpo. E mais, é alegado, Paulo
manifesta a típica aversão Platônica ao corpo, o corpo sendo mau,
uma prisão da alma, da qual o cristão anseia ser libertado. Até
que este livramento realmente ocorra por meio da morte, o cristão
Paulino é suposto denegrir seu corpo através de várias práticas
ascéticas. Tais são as acusações que aparecem em quase cada
publicação alegando a dependência de Paulo do Platonismo.
Estas alegações são tipicamente apoiadas por referências a
passagens nos escritos de Paulo. Ocasionalmente, porções dos
textos que parecem apoiar a alegação são citadas. Mais
freqüentemente, o autor simplesmente dá a localização do texto
entre parênteses, seguro de que poucos leitores realmente se darão
ao trabalho de conferir se o verso diz o que se alega. E é
precisamente neste ponto que as alegações da dependência Paulina
do Platonismo caem. Quando os alegados textos-prova são estudados
por alguém treinado em teologia, vê-se que os versos nada provam.

13
Um Estudo das Alegações Maiores

Um bom lugar para começar nosso exame destas alegações e os


textos-prova relevantes é um livro de 1928, por George Holleg
Gilbert, intitulado Greek Thought in the New Testament. Gilbert
escreve:

Em sua visão da constituição do homem, o apóstolo [Paulo] se


posiciona como os filósofos gregos antes que com as Escrituras
Hebraicas. Com Platão ele [Paulo] pensa de um ser humano como
consistindo de um homem exterior e um homem interior (2 Cor.
4:16), e com a filosofia grega em geral ele pensa do corpo como a
prisão do espírito (Rom. 7:24; 8:23). Com a fé Órfica ele sustenta
a doutrina do pecado original e localiza o princípio mal na
"carne", onde foi entronizado desde o momento da transgressão de
Adão (Rom. 5:12). O aspecto duplo deste pensamento encontra sua
expressão clássica em Rom. 7:15-18.

Quando um autor comete tantos erros em tão curto espaço, o


real desafio é saber por onde começar uma refutação. Mas eu
gostaria de lembrar ao leitor de que houve um tempo em muitas
universidades e seminários quando erros como este mantinham o
status de uma doutrina oficial. Comecemos com a alegação de
Gilbert de que a distinção em 2 Cor. 4:16 entre um homem exterior
e interior prova a dependência de Paulo do Platonismo. Eis o
verso:
"Por isso não desanimamos: pelo contrário, mesmo que o nosso homem
exterior se corrompa, contudo o nosso homem interior se renova de
dia em dia" (ARA). Sinceramente, isto dificilmente soa como
Platonismo. Paulo está usando uma forma muito comum de linguagem
popular em seus dias (e hoje), para descrever o que poderia ser
óbvio para muitas pessoas totalmente desinformadas sobre Platonis-
mo. Muitas pessoas sentem sua força e saúde física definhando ao
mesmo tempo que sentem um crescimento mais forte mental ou
espiritual. Onde está o Platonismo em tudo isto? Ironicamente, a
terminologia "homem interior e exterior" nem mesmo aparece nos
escritos de Platão. Este significativo deslize da parte de Gilbert
sugere que ele estava tão disposto a ler Paulo em Platão como o
contrário.
O que dizer da alegação de que Paulo pensa do corpo humano
como uma prisão do espírito? Outra vez, é importante ver o que o
alegado texto-prova realmente diz. Romanos 7:24 lê: "Desventurado
homem que sou! quem me livrará do corpo desta morte?" (ARA). É

14
óbvio que neste verso Paulo não usa nem a palavra prisão
(phylake) nem a idéia de que o corpo é uma prisão da alma. Na
verdade, em nenhum lugar na Escritura Paulo escreve do corpo em
termos de uma prisão. Com toda probabilidade, Paulo neste verso
usou a palavra corpo metaforicamente.
O outro texto-prova de Gilbert é igualmente inútil em
estabelecer seu caso. Romanos 8:23 lê: "E não somente ela, mas
também nós que temos as primícias do Espírito, igualmente gememos
em nosso íntimo, aguardando a adoção de filhos, a redenção do
nosso corpo" (ARA). Se prova alguma coisa, este verso desaprova a
tese de Gilbert, desde que a redenção que Paulo espera é a glória
que seguirá sua ressurreição corporal, uma esperança não-
Platônica.
A próxima alegação de Gilbert é provavelmente central à
inteira questão da alegada dependência de Paulo do Platonismo.
Praticamente cada autor que alega tal dependência refere-se ao
repetido uso de Paulo da palavra "carne" em contextos associados
com mal. O que poderia ser mais natural para qualquer escritor que
aborda os escritos de Paulo já convencido de que Paulo é um
Platonista do que concluir que sua visão da carne é uma reflexão
da crença Helenística de que matéria e corpo são maus? É certo que
Paulo repetidamente descreve um conflito moral. Platão descreveu
uma luta similar entre a razão e o desejo. Os dualistas
posteriores viam a luta em termos de um conflito entre corpo e
espírito. Paulo identifica os antagonistas como carne e espírito.
O filósofo Gordon Clark adverte contra uma leitura desatenta de
Paulo que faria o termo "carne" usado por Paulo significar
"corpo". Em vez disto, diz Clark, "um pouco de atenção torna claro
que significa, não corpo, mas a natureza humana pecaminosa herdada
de Adão." O teólogo J. Gresham Machen apresenta o real significado
do uso de Paulo do termo carne.
O uso Paulino do termo "carne"... não encontra real paralelo
no uso pagão. E a divergência aparece não somente na terminologia
mas também no pensamento. À primeira vista pode parecer haver um
paralelo entre a doutrina Paulina da carne e a doutrina grega da
matéria má, que apareceu nas seitas Órficas, em Platão e seus
sucessores. Mas o paralelo não resiste a um exame mais atento.
Segundo Platão, o corpo é mau porque é material; é a prisão da
alma. Nada poderia estar mais distante do pensamento de Paulo. De
acordo com Paulo, a ligação da alma e o corpo é inteiramente
normal, e a alma à parte do corpo está em uma condição de nudez. É
verdade, o corpo será mudado na ressurreição ou na vinda de
Cristo; será feito mais adequado para o Reino de Deus. Mas em
qualquer caso, não há em Paulo qualquer doutrina da inerente

15
malignidade da matéria.
A condenação de Paulo da "carne" como má não têm
absolutamente qualquer referência ao corpo humano. Não se refere
ao estofo físico do corpo mas antes a um defeito psicológico e
espiritual que leva o ser humano ou a criatura à frente do
Criador. Como Machen explica:

A "carne" em Paulo, quando usada em seu sentido


desenvolvido, ético, não significa a natureza material do homem;
inclui tudo o que o homem recebe por geração ordinária. O
contraste entre a "carne" e "espírito", portanto, não é o
contraste entre matéria e espírito; é um contraste entre a
natureza humana, da qual o pecado se apossou, e o espírito de
Deus.

A New International Version torna claro a questão ao


traduzir sarx ("carne") pela frase natureza pecaminosa. Por
exemplo, Romanos 7:5, um verso freqüentemente usado como um texto-
prova para a alegação de que Paulo cria que a matéria era má, lê:
"Porque, quando vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas
postas em realce pela lei, operavam em nossos membros a fim de
frutificarem para a morte" (ARA). Uma vez que se entenda o que
Paulo queria dizer com o termo carne, nenhum dos textos em que ele
usa o termo em seu sentido ético pode apoiar a afirmação de que
ele era um dualista Platônico. Considere a conhecida passagem de
Romanos 7:15-18, onde ele descreve sua batalha moral interior:

"Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir,


pois não faço o que prefiro, e, sim, o que detesto. Ora, se faço o
que não quero, consinto com a lei, que é boa. Neste caso, quem faz
isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim, isto é, na
minha carne (natureza pecaminosa - NIV), não habita bem nenhum..."
(ARA).

Paulo, então, nunca ensinou que seu corpo fosse mau ou a


fonte de seu pecar. Os seres humanos cometem atos pecaminosos
porque nascem com uma natureza pecaminosa. O uso de Paulo de carne
nesta maneira não tem paralelo no uso pagão. O ensino de Paulo era
indubitavelmente derivado do V.T., embora ele desenvolva além do
seu uso no V.T.
A alegação de que Paulo cria que a matéria é má é também
refutada por sua crença de que o destino último dos seres humanos
redimidos é uma vida infindável em um corpo ressurreto, não a
existência desincorporada de uma alma imortal (como sustentada

16
pelos Órficos, os Pitagóricos e Platão). A doutrina de Paulo da
ressurreição do corpo (I Cor. 15:12-58) é claramente incompatível
com uma crença na malignidade inerente da matéria. Tentar atribuir
um dualismo matéria má-espírito bom a Paulo também tropeça no fato
de que Paulo cria na existência de espíritos maus (Efé. 6:12), uma
crença que obviamente implica que nem todo espírito é bom. O fato
adicional de que Deus pronunciou Sua criação "boa" (Gên. 1:31)
também demonstra quão longe o dualismo está do ensino do Velho e
Novo Testamentos.
É um erro igualmente sério ler um dualismo Platônico no
ensino bíblico da natureza humana. Como os clássicos britânicos
A.H. Armstrong e R. A. Markus explicam:

Na tradição judaica-cristã o homem é um todo único do


qual o corpo é tanto uma parte como a alma; e por esta
maneira de pensar a ressurreição do corpo é uma parte
natural e inevitável de qualquer doutrina da vida futura...

Armstrong e Markus salientam ainda que "os teólogos


cristãos insistem que os corpos ressuscitados serão corpos humanos
reais, entretanto espiritualizados e transformados, e não corpos
astrais ou celestiais, assim permanecendo fiéis à tradição
judaica-cristã..."
A esta altura, então, seria difícil imaginar duas opiniões
em tão agudo contraste como as visões Cristã e Helenística do
homem.

Outras Acusações Contra Paulo

O último ponto daqueles que procuram evidência de Platonismo


em Paulo consiste em apelar para vários textos em que Paulo
presumivelmente denigre o corpo, advoga o ascetismo, ou menciona
agredir o próprio corpo. Gilbert apela a II Coríntios 5:4 a fim de
apoiar sua afirmação. Ele considera que Paulo neste verso está
apresentando o corpo material como "uma casa em que o espírito
está sobrecarregado e sofre - esta é a imagem longamente familiar
aos pensadores gregos." Enquanto que pode ser assim, é também uma
imagem familiar a milhões de seres humanos que nunca ouviram falar
de Platão mas que já sofreram dores de cabeça, artrite, etc. Tudo
o que Paulo está fazendo é referir a alguma coisa que cada ser
humano que já experimentou doença ou chegada da velhice conhece
pessoalmente.
Mas Gilbert não concluiu ainda com Paulo. Daquilo que ele

17
classifica como a "triste visão de Paulo do corpo" ("Mas esmurro o
meu corpo, e o reduzo à escravidão, ..." I Cor. 9:27 - ARA), diz
que Paulo tem prazer em perseguições, injúrias, necessidades, pois
ele sente que tais coisas contribuem para sua força interior (II
Cor. 12:10)." A acusação de que Paulo era um asceta é falsa, um
fato claro para qualquer um familiarizado com o todo de seus
escritos. Paulo sabia como estar humilhado e como abundar (Fil.
4:12). Ele escreveu os mais fortes ataques do N.T. contra o
ascetismo (ver Col. 2:16-23).
Clark corretamente observa que o ensino de Paulo "não é
motivado por um desejo de libertar uma alma divina de uma tumba
corporal, muito menos pela idéia de que a dor é boa e o prazer é
mau. Antes, Paulo estava envolvido em uma corrida, e para vencê-la
era necessário colocar de lado todo peso bem como o pecado que o
assediava. Disposto a sofrer apedrejamentos e açoites pelo nome de
Cristo, ele nunca praticou auto-flagelação."

A visão de Paulo sobre o sexo e o casamento também tem sido


grandemente distorcida. Uma vez que alguém aceita que Paulo era um
dualista Helenístico típico que denegria o corpo humano, é simples
concluir que tal pessoa deve ter desprezado o sexo e o casamento e
advogado o celibato. Entretanto, os textos que são apresentados em
suporte desta coclusão são isolados tanto do seu contexto imediato
ou das declarações qualificantes em outros escritos Paulinos, ...
A verdade é que Paulo apoiou o matrimônio (ver I Tim. 3). Ele usou
o relacionamento matrimonial como uma ilustração da íntima ligação
entre Cristo e Sua igreja. (Efé. 5). Ele advertiu contra ascetas
heréticos que proibiam o casamento (I Tim 4:1-5). A maioria da
confusão sobre a visão de Paulo concernente ao sexo e matrimônio
baseia-se numa leitura equivocada do que ele diz em I Coríntios 7.
Mas como ressaltado pelo erudito bíblico Robert Gundry - nada
naquele capítulo apoia a tese dualista:

De acordo com o capítulo 7 [de I Coríntios], o


celibato voluntário é bom; mas por causa do impulso sexual Deus
proveu o casamento para evitar relacionamentos ilícitos.
Dentro do casamento, então, deveria haver uma completa doação
dos parceiros um ao outro. Paulo deseja que todos possam estar
livres de responsabilidades maritais, como ele está, não
porque o ascetismo seja espiritualmente superior, mas porque
o solteiro pode devotar plena energia a pregar o evangelho.
Ele compreende, entretanto, que neste assunto a vontade de
Deus varia para os diferentes cristãos.

18
Após uma intensiva investigação da visão de Paulo sobre o
sexo e o casamento, Herman Ridderbos conclui que "não há base para
a opinião de que sobre bases ascéticas-dualistas Paulo considerou
o intercurso sexual em si mesmo como pecaminoso, ou que ele julgou
o casamento sobre a base de motivos ascéticos-dualistas. O
contrário é que ocorre. Paulo valoriza o casamento como uma
instituição de Deus, protegida pelo mandamento expresso de Cristo,
para ser aceita e experimentada em liberdade cristã. Mesmo em I
Coríntios 7, ... em nossa opinião não se descobrem motivos
ascéticos-dualistas com referência ao casamento."

Por agora, é suficiente dizer que a acusação de dependência


Paulina do dualismo Platônico é extremamente fraca.

OS ESCRITOS HERMÉTICOS E PAULO

Os escritos Herméticos constituem outra representação do


pensamento Gnóstico não-cristào. Afirmações da alegada dependência
Paulina destes escritos são examinadas à luz de fontes históricas
externas e (internamente) o uso de Paulo do termo gnosis.

Neste capítulo exploraremos a possibilidade de que a forma


de Gnosticismo que aparece na assim chamada Hermética, ou escritos
Herméticos, influenciou o Cristianismo primitivo.

A HERMÉTICA

A literatura Hermética é uma coleção diversa de tratados


escrita no Egito no segundo e terceiro séculos A.D., tratados que
representam uma forma especulativa e nào-cristã de Gnosticismo. A
reconstrução dos escritos baseia-se em manuscritos escritos em
Grego que datam a partir do 14? século. Por causa das teorias
desenvolvidas por Richard Reitzenstein, a Hermética começou a
ser usada neste século como evidência para um Gnosticismo pré-
cristão. Os escritos pretendem ser revelações de Thoth, um deus
egípcio também conhecido como Hermes Trimegisto. [Hermes foi um
dos deuses gregos. Durante a helenização do Egito, Hermes foi
identificado com o deus egípcio Thoth. O título "Trimegisto"
parece ser a tradução grega de um título egípcio que significa
"muito grande" (lit. "três vezes grande"). Hermes é também

19
conhecido sob os nomes Poimander e Asclépio].

Os escritos Herméticos são uma estranha mistura de idéias


egípcias, gregas e judaicas, com alguma influência do Oriente. Os
escritos são Gnósticos. Por exemplo, eles evidenciam o tradicional
dualismo Gnóstico. A alma humana é aprisionada em um corpo, mas
por meio da gnose ela pode se libertar da influência da matéria e
fazer seu caminho de volta para Deus. Os gregos consideravam
Hermes como o mensageiro dos deuses. Durante o período
Helenístico, Hermes foi considerado como o deus especial da
sabedoria. Isto ajuda a explicar sua adoção por certos Gnósticos,
desde que a literatura Hermética retrata Hermes como o revelador
do conhecimento secreto, freqüentemente em forma de diálogo, sobre
coisas como Deus, criação e salvação.

O número de tratados da literatura Hermética varia de 14 a


19. A coleção completa geralmente recebe o título de Poimander,
embora este rótulo descreva mais acuradamente o primeiro tratado
somente. Para nossos propósitos, os dois mais importantes tratados
são o primeiro e o décimo terceiro, desde que eles evidenciam os
mais claros paralelos com porções do N.T.

TEORIA DA DEPENDÊNCIA PAULINA

Richard Reitzenstein, argumenta que Paulo foi influenciado


pelo Gnosticismo dos escritos Herméticos. O maior suporte para sua
posição foi a presença do que Reitzenstein afirmou serem conceitos
e linguagem Gnósticos nos escritos de Paulo - por exemplo, gnosis
(conhecimento), phos (luz), photizo (trazer à luz), e metamorphoo-
mai (ser transformado ou mudado). Naturalmente, estas eram também
palavras comuns em uso no grego ordinário, mas é útil ignorar este
fato quando se pretende provar que Paulo foi influenciado pelo
Gnosticismo. Enquanto Paulo, na visão de Reitzenstein, pode não
ter sido o primeiro Gnóstico, ele foi certamente o maior gnóstico.

Ao argumentar que Paulo derivou importantes elementos de sua


teologia dos escritos Herméticos, Reitzenstein sustentou que
porções significativas da Hermética foram escritas antes das
Epístolas Paulinas. Uma data tão precoce para a Hermética é hoje
quase universalmente rejeitada, um fato que torna as alegações de
uma influência Hermética sobre a teologia cristã extremamente
implausível. Vários eruditos surgerem 200 ou 300 A.D. como a data

20
mais precoce para a literatura. Segundo o filósofo Gordon Clark,
uma autoridade em pensamento Helenístico,

Nenhum dos tratados foi escrito antes da era Cristã e


eles não foram colecionados em um grupo único muito antes de
300 AD.... Sem evidência suficiente para garantir maior
exatidão, o mais seguro é considerar os tratados como tendo
sido produzidos em algum tempo durante o segundo e terceiro
séculos.

Sem discussão, a literatura Hermética foi escrita após a


morte de Paulo, sugerindo que se elementos cristãos aparecem nos
escritos, eles foram tomados de empréstimo do Cristianismo.

O Primeiro Tratado

O primeiro tratado da Hermética, intitulado Poimander, é


claramente o mais significativo em toda a coleção. Especula-se que
o título vem da língua egípcia e sugere "o conhecimento de Deus".
A raiz da palavra egípcia é alterada por seu uso grego e é usada
para referir a alguém que medeia a revelação. Daí Poimander é o
nome do deus revelador que comunica a mansagem revelada. Poimander
usa várias tradições mitológicas diferentes para explicar a origem
do mundo, os começos do homem e a redenção que pode libertar a
raça humana de sua prisão corporal. Portanto, encontramos em
Poimander um esboço da cosmologia, antropologia e soteriologia
Gnóstica. No tratado, o deus Poimander revela o caminho da
salvação a seu profeta e então encarrega-o de pregar a mensagem ao
mundo. A alegação de sincretistas como Reitzenstein é que o N.T.
contém significativas similaridades ao tema geral do Poimander e
sua mensagem de salvação. Mas, naturalmente, a menos que o tratado
possa ser datado suficientemente precoce, quaisquer paralelos
genuínos (se eles existem) sugeririam que o Cristianismo o
influenciou, e não vice-versa.

Reitzenstein desenvolveu um engenhoso argumento em defesa de


uma data precoce para o Poimander. O Pastor de Hermes é um escrito
cristão apócrifo da metade do segundo século AD. Segundo Reitzens-
tein, esta obra cristã baseou-se numa primitiva versão do Poiman-
der. Mas, naturalmente, nenhuma evidência atestando a existência
desta primitiva versão foi descoberta. Como Machen observa, o
argumento de Reitzenstein "não tem obtido qualquer consenso
geral."

21
Da mesma forma, sérios problemas surgem quando notamos as
significativas diferenças entre a soteriologia do Poimander e a
salvação descrita por Paulo e outros escritores do N.T..
Analisando este ponto, Gordon Clark argumenta que a salvação
oferecida pelo Poimander em seu primeiro tratado "é deificação
procurada por uma revelação cosmológica; mas para Paulo salvação
nào é deificação e a mensagem pela qual a salvação é mediada, em
vez de ser cosmológica, é um relato de fatos históricos recentes -
a morte e ressurreição de Jesus Cristo." E acrescenta: "No N.T. a
morte de Cristo salva; em Hermes o indivíduo é salvo por aprender
cosmologia." Outras significativas diferenças poderiam
semelhantemente ser notadas. Por exemplo, não há lugar no
pensamento de Paulo para o panteísmo que é tão proeminente em toda
a Hermética. Por razões como esta, portanto, as extensas
generalizações de Reitzenstein têm sido rejeitadas.

Aqueles que sustentam uma influência Hermética sobre o


Cristianismo do 1? século têm freqüentemente alegado que o 13?
tratado transmite a idéia de que a salvação depende de nascer de
novo. Como Eduard Lohse explica esta idéia: "O processo de
renascimento, que significa deificação, não pode ser percebido com
os olhos físicos, mas ocorre como uma total transformação em uma
visão mística e estática. A transformação é tão completa que a
pessoa renascida pode dizer que é alguém diferente. Entra-se no
caminho da regeneração por uma deliberada decisão, mas colocando
de lado as paixões que a pessoa leva dentro de si... Onde a GNOSIS
é atingida, a injustiça é posta em fuga e o homem se torna justo".

Escrevendo quase 50 anos antes de Lohse e sob a aparente


influência de Reitzenstein, Harold R. Willoughby argumenta que
havia pouca dúvida de que a religião Hermética enfatizava uma
experiência pessoal de regeneração.

Mas a maioria dos anteriores argumentos contra o Hermetismo


como uma fonte da doutrina do N.T. serve igualmente para desquali-
ficar os apelos ao 13? tratado. Novamente, a natureza da transfor-
mação descrita pelo escritor do 13? tratado é qualitativamente
diferente da transformação do N.T.; é deificação. Desde que a
maioria dos eruditos datam o Corpus Hermeticum 13 ao final do 3?
séc. A.D., é difícil ver como ele poderia ter influenciado o
Cristianismo tão cedo. É inteiramente possível que as diferenças
entre o Tratado 13 e o restante da literatura Hermética sejam
resultado de uma influência cristã. Alegações de uma possível

22
influência cristã sobre este tratado são discutidas por William C.
Grese em um livro intitulado Corpus Hermeticum XIII and Early
Christian Literature. Enquanto a discussão de Grese deixa a
questão sem uma decisão, muitos eruditos pensam que é plausível
uma possível influência cristã sobre o Tratado 13. Finalmente,
como Machen sugere, sabemos "que os mestres pagãos do 2? século
(os Gnósticos) teriam estado prontos a adotar elementos cristãos e
ansiosos por dar a seus sistemas uma aparência cristã. Por que
deveria um procedimento similar ser negado no caso, por exemplo,
de Hermes Trimegisto? Se o paganismo do 2? séc., sem modificar seu
caráter essencial, podia algumas vezes realmente adotar o nome de
Cristo, por que seria inacreditável que o compilador da Literatura
Hermética, que não foi tão longe, teria permitido elementos
cristãos em sua obra sincrética? Por que deveria a similaridade de
linguagem entre Hermes e Paulo, supondo que exista, ser
considerada como provando a dependência de Hermes de Paulo?"

Naturalmente, é também possível que os paralelos entre o


N.T. e o Tratado 13 possam não refletir uma influência causal em
nenhuma direçào, mas seja somente o resultado de ambos partilharem
um ambiente comum.

O USO DE PAULO DE GNOSIS

O substantivo gnosis aparece 23 vezes nas Epístolas


Paulinas. Enquanto a proeminência do termo nos escritos de Paulo é
discutida usualmente no amplo contexto da alegada relação de Paulo
com o Gnosticismo em geral e não simplesmente à literatura
Hermética, é conveniente demonstrar quão frágil qualquer caso
baseado no uso de Paulo de gnosis realmente é. Consideremos alguns
versos e como um Gnóstico verdadeiramente comprometido poderia lê-
los:

Rom. 15:14 -? substituir "conhecimento" por "gnoses".

II Cor. 4:6 -? Idem

Fil. 3:8 -? Idem

O mero fato de que tais declarações possam ser lidas em uma


luz Gnóstica não significa que as palavras contenham em qualquer
sentido uma mensagem Gnóstica. Muitos anos atrás uma popular

23
canção
americana continha o verso, "Dois mundos diferentes - nós vivemos
em dois mundos diferentes." Se esta canção de amor estivesse
disponível no primeiro século e Paulo tivesse se referido a ela,
posso imaginar alguns sincretistas usando-a como prova do envolvi-
mento de Paulo com a crença Platônica de dois mundos. O
significado surge de todo o contexto em que as palavras são
usadas, e o contexto de Paulo torna claro a ênfase não-Gnóstica e
ocasionalmente anti-Gnóstica em seu pensamento. É interessante ver
como os proponentes de uma influência Gnóstica sobre Paulo
raramente referem-se às vezes quando ele denegriu gnosis, algo que
nenhum Gnóstico faria. Por exemplo, Paulo nota quão inútil a
gnosis seria se lhe faltasse anor (I Cor. 13:1-2). Ele fala do
tempo quando a gnosis passará (v. 8).

"Gnosis na igreja primitiva (incluindo Paulo) nào é um termo


técnico; não é mais técnico do que, por exempl;o, 'sabedoria'. Em
I Cor. 12:8 ele aparece, nào isolado, mas junto com muitos outros
dons espirituais de natureza amplamente diversa. Gnosis, portanto,
nào ocupa a posição de proeminência que deveria ocupar se a teoria
de Reitzenstein fosse correta. É, realmente, de acordo com Paulo,
importante; e é um dom de Deus. Mas que razão há para recorrer às
religiões de mistério Helenísticas (ou Gnosticismo) a fim de
explicar sua importância ou sua natureza? Outra explicação está
muito mais à mão - o V.T. A possibilidade de influência do V.T. em
Paulo não precisa ser estabelecida por um elaborado argumento, e
nào se opõe ao seu próprio testemunho. Pelo contrário, ele apela
ao V.T. muitas vezes em suas epístolas."

A Gnosis encontrada nos escritos Herméticos é, como Machen


explica, uma revelação mística e imediata do deus único. Gnosis
não era considerada como um alcance do intelecto; era uma
experiência garantida pelo favor divino. O homem que recebia tal
favor era exaltado acima da humanidade ordinária; realmente ele já
estava deificado.

Mas Paulo diminui a importância das visões místicas. Era


suficiente para os conversos de Paulo "receber o relato histórico
da obra redentora de Cristo, através do testemunho de Paulo e
outros. Este relato, transmitido oralmente, é uma base suficiente
para a fé; e através da fé vem a nova vida. A visão mística era
central nas religiões helenísticas. Mas de acordo com Paulo, a
poderosa mudança era produzida pela aceitação de uma simples
história, um relato do que havia acontecido somente há uns poucos

24
anos antes, quando Jesus morreu e ressuscitou. A partir da
aceitação desta histria procede um novo conhecimento, uma gnosis.
Mas esta gnosis em Paulo não é o meio da salvação, como nas
religiões de mistério, (e Gnosticismo); é somente um dos efeitos
da salvação. Esta diferença nào é uma mero detalhe. Pelo
contrário, envolve um contraste entre dois mundos de pensamento e
vida inteiramente diferentes.

Portanto, nem mesmo o freqüente uso de gnosis por Paulo


estabelece que seu pensamento dependeu em qualquer modo do
Gnosticismo.

25

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