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1.

Introdução

A séculos a humanidade tem registado uma cultura de impunidade face às atrocidades


cometidas em conflitos. Os crimes permanecem impunes de certa forma tem dado
“carta-branca” aos criminosos para cometerem delitos.

É verdade que não se pode esquecer o trabalho empreendido pelos tribunais ad hoc,
constituídos para reprimir crimes específicos e contribuíram consideravelmente para a
criação de um Tribunal penal internacional permanente.

A comunidade internacional sentiu claramente a necessidade de adoptar novas normas e


criar instituições capazes de garantir punições efectivas para os crimes internacionais,
introduzindo, sobretudo, o individuo nas questões penais internacionais. Esta nova
instituição pode significar um mecanismo extremamente poderoso de contenção de
novos genocídios, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e de agressão.

É nesse contexto que o presente trabalho de pesquisa tem como tema: Justiça Penal
Internacional; tem como objectivo Geral: Compreender a justiça penal internacional;
por conseguinte, tem como objectivos específicos: Descrever os antecedentes da
criação do Tribunal Penal internacional; Identificar a jurisdição do Tribunal Penal
internacional; Explicar a relevância da justiça penal internacional para a humanidade;

A elaboração desta pesquisa justifica-se pelo facto de ser um tema de grande relevância
para a humanidade, e irá de certa forma contribuir no incremento do conhecimento
sobre a responsabilização penal internacional de crimes cometidos nos mais diversos
conflitos do mundo à comunidade estudantil em geral.

No que tange a metodologia, utilizou-se a pesquisa bibliográfica recorrendo a algumas


obras ligadas ao tema em causa.

Quanto a estrutura, o trabalho está dividido em três partes: a introdução, o


desenvolvimento a conclusão e as respectivas referências bibliográficas.

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2. Justiça Penal Internacional

2.1 Conceitos Importantes

Para uma melhor compreensão do tema em alusão julgamos necessário que se


compreendam alguns conceitos importantes:

a) Direito Penal internacional e Direito internacional Penal


Diversos doutrinários contemporâneos mantém a diferenciação entre os dois ramos. É
preciso que se delimite de maneira clara o objecto de estudo e as peculiaridades de cada
um desses distintos ramos jurídicos para que se debruce sobre uma justiça penal
internacional.

Direito Internacional Penal é o ramo do Direito penal que trata dos crimes
essencialmente internacionais, ou dos crimes com natureza internacional, isto é,
estariam abrangidas as infrações de estrutura puramente internacional. Nesse direito o
crime tem originariamente uma natureza internacional, é originariamente previsto nos
tratados por recobrir prática de factos que ofendem valores da comunidade internacional
no seu todo, tem de ocorrer na sociedade internacional e devem ser julgados e punidos
por Tribunais internacionais.

Enquanto no Direito Penal Internacional compreender-se-iam as infrações previstas e


apenadas nos ordenamentos jurídicos internos mas que assumem dimensão
transnacional, ou seja trata dos crimes com conexões internacionais. São os casos de
crime de terrorismo, corrupção, branqueamento de capitais, crimes fiscais
transnacionais.

Neste direito o tipo de crime contem descrição de factos accão ou omissão que se proíbe
no território dos Estados, mas que pela natureza, podem ocorrer nos territórios de dois
ou mais Estados. A origem e a natureza do crime é nacional, mas internacionaliza-se
através de acordos de cooperação judiciária entre os Estados destinados a combate-los
transnacionalmente que permitem que os tribunais do Estado em cujo território o crime
foi praticado seja o competente para julgar os autores da prática do crime. (Brito &
Freitas 2018, p. 2)

Podemos assim dizer que a emergência do Tribunal penal internacional é seguramente


produto da criação de um direito internacional penal e não de um direito penal

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internacional uma vez que o enfoque do presente trabalho será a responsabilização de
crimes de natureza internacional.

b) Tribunal Penal Internacional (TPI)

Para Cardoso (2012) o tribunal Penal internacional é uma organização internacional


independente, com personalidade jurídica internacional própria com jurisdição sobre
pessoas pelos crimes mais graves de transcendência internacional como casos de
genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e agressão.

3. Antecedentes históricos no âmbito da criação do Tribunal penal internacional

A ideia de uma jurisdição penal internacional esteve presente ao longo de todo o século
XX. Houve muitas tentativas de criação de uma corte internacional permanente.

Segundo Brandão (2006) a primeira tentativa de criação de um tribunal internacional


penal surge com a proposta de Gustave Moynier numa reunião do Comitê Internacional
da Cruz Vermelha, celebrada em 03 de janeiro de 1872 mas que infelizmente na época
não surtiu qualquer resultado.

Após esta frustrada tentativa de Moynier, veio uma outra, mais forte, visando o
estabelecimento de uma jurisdição penal internacional com o Tratado de Versalhes em
1919, que pôs fim à Primeira Guerra Mundial.

Este tratado havia previsto levar o Imperador Guilherme II a comparecer perante um


tribunal internacional por «atentado supremo contra a moral internacional e a autoridade
sagrada dos tratados», bem como instaurar acção penal contra as pessoas suspeitas de
haver cometido actos contrários às leis e costumes da guerra. Esta que indiscutivelmente
era a primeira possibilidade de submeter um criminoso de guerra a um Tribunal
Internacional não se concretizou em razão da negativa da Holanda, país onde o
Imperador havia se refugiado, em extraditá-lo, por considerar que se tratava de crime
político, logo, não passível de extradição.

Depois dessas tentativas inglórias, chega-se então ao principal marco da história do


Direito Internacional Penal: após a Segunda Guerra Mundial e o estabelecimento dos
Tribunais de Nuremberg e Tóquio.

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Os tribunais penais militares internacionais de Nuremberg e Tóquio tinham o
objetivo de processar e julgar os principais responsáveis, na Alemanha e no Extremo
Oriente, pelas atrocidades cometidas na Segunda Guerra Mundial.

Os tribunais penais militares internacionais de Nuremberg e Tóquio tinham o


objetivo de processar e julgar os principais responsáveis, na Alemanha e no Extremo
Oriente, pelas atrocidades cometidas na Segunda Guerra Mundial.

Dentre os fatores políticos que contribuíram para a recente criação do Tribunal


Penal Internacional, pode-se explicitar: o fim da Guerra Fria que originou uma tipologia
de conflitos étnicos, raciais e religiosos, na maioria dos casos não-internacionais, nos
quais ocorreram catástrofes humanitárias e massacres, ameaçando a ordem jurídica e
pondo em risco a paz e a segurança internacionais, reforçando a opinião dos Estados, de
outros atores internacionais e da opinião pública em favor da ampliação da capacidade
de sanção do Direito Internacional neste contexto

Tais situações foram tão fortemente sentidas pela comunidade internacional


que ela foi capaz de criar, num curto espaço de tempo, os tribunais criminais
internacionais ad hoc para a antiga Iugoslávia (1993) e para Ruanda (1994).

Esse é um breve resumo dos antecedentes da criação do TPI. Ver-se-á, a seguir, uma
amostra mais detalhada da atuação dos tribunais penais que antecederam o Tribunal
Penal Internacional, desde o final da Segunda Guerra Mundial até o fim da Guerra Fria.

3.1. Tribunal de Nuremberg

O Tribunal de Nuremberg foi estabelecido em 08 de agosto de 1945, tendo seus


julgamentos estendidos de 20 de novembro de 1945 a 01 de outubro de 1946. Seguindo
os moldes deste tribunal foi também criado o Tribunal de Tóquio, em 19 de janeiro de
1946 para julgar e punir os criminosos de guerra do Extremo Oriente. Nestes tribunais
iniciou-se a definição dos crimes internacionais, além de fomentar a contextualização do
Direito Internacional Penal, como regime específico e distinto da responsabilidade
internacional este Tribunal Militar Internacional tinha a missão de julgar e punir de
maneira apropriada e sem demora, os grandes criminosos de guerra dos países europeus
do Eixo.

Imputou-se aos acusados a prática dos seguintes ilícitos penais: crimes contra a
paz, crimes de guerra e crimes contra a humanidade, sendo estes os de mais difícil

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definição, pois não faziam parte de nenhum tratado anterior, diferentemente dos crimes
de guerra, previstos na Convenção de Haia, de 1907, e na Convenção de Genebra
relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra, de 1929.

A grande contribuição do Tribunal de Nuremberg consistiu na implementação


da idéia de responsabilidade penal dos indivíduos (por crimes contra a paz, a
humanidade e de guerra) no plano internacional, pois perante esta corte os particulares
compareceram como acusados por seus crimes, demonstrando que o ser humano
também pode sofrer diretamente sanções internacionais.

Este tribunal foi vítima de muitas contestações e críticas uma vez que estes tribunais,
pelo seu funcionamento, ignoraram o princípio fundamental da legalidade dos crimes e
das penas e, pela sua composição, aplicaram o direito e a justiça dos vencedores sobre
os vencidos.

Brandão (2006, p.40) afirma que :

O Tribunal de Nuremberg há de ficar como uma nódoa da civilização


contemporânea: fez tabula rasa do nullum crimen nulla poena sine lege (com
um improvisado Plano de julgamento, de efeito retroativo, incriminou fatos
pretéritos e impôs aos seus autores o “enforcamento” e penas puramente
arbitrárias); desatendeu ao princípio da “territorialidade da lei penal”;
Estabeleceu a responsabilidade penal de indivíduos participantes de tais ou
quais associações, ainda que alheios aos fatos a ele imputados, funcionou em
nome dos vencedores, que haviam praticado os mesmíssimos fatos
atribuídos aos réus; suas sentenças eram inapeláveis, ainda quando
decretavam a pena de morte.

Mas apesar disso, pode-se concluir que não existia qualquer outra alternativa!

3.2. Tribunal de Tóquio

Em 19 de janeiro de 1946, com base no acto de rendição do Comandante Supremo das


Forças Aliadas, foi instituído o Tribunal Militar Internacional para o Extremo Oriente,
com sede em Tóquio, tendo a mesma base do Tribunal de Nuremberg, o Acordo de
Londres.

O tribunal de Tóquio também tinha competência para julgar crimes contra a paz, crimes
contra as Convenções de guerra e crimes contra a humanidade. Toda a base de atuação

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deste Tribunal era semelhante ao seu precursor, o Tribunal de Nuremberg, com
pequenas distinções a saber:

 Nuremberg tratava apenas de guerra declarada, o Estatuto do Tribunal de Tóquio


previa como crime “o planeamento, a preparação, o início e a implementação de
uma guerra declarada ou não;
 Não havia no Tribunal para o Extremo Oriente a previsão da responsabilização
das organizações como no Tribunal de Nuremberg;
 A Carta de Tóquio não excluía a possibilidade de recurso contra as decisões da
Corte, como ocorreu em Nuremberg.

Como ocorrera com o de Nuremberg o tribunal de Tóquio também sofreu duras críticas
uma vez que nem todos os acusados foram condenados, muitos criminosos de guerra
foram libertados pelos americanos sem sequer serem processados, penas foram
reduzidas, enfim, houve um desvirtuamento do objetivo principal que era a punição
efetiva dos que haviam atentado contra a paz e segurança internacionais.

3.3. Os tribunais penais internacionais ad hoc

Foi necessário que ocorressem a guerra do desmembramento da Jugoslávia e o


genocídio de Ruanda para que o Conselho de Segurança se decidisse pela criação de
dois tribunais penais internacionais para julgar as violações do DIH cometidas nestes
dois territórios.

Os criminosos de guerra, que continuaram a agir livremente nos inúmeros


conflitos que tiveram lugar na segunda metade do século XX. A situação de
absoluta impunidade perdurou até recentemente, quando a comunidade
internacional decidiu intervir na ex-Iugoslávia, onde uma luta fratricida lançou
sérvios contra croatas e outras etnias, e em Ruanda, em cujo território
extremistas hutus massacraram os rivais da nação tutsi. (Deyra 2001, p.153)

3.3.1. Tribunal Penal internacional da Ex-Iugoslavia

O tribunal da Jugoslávia surge face a pressão da comunidade internacional que por meio
da Resolução nº 808, de 22 de fevereiro de 1993, tomando por base o relatório desta
comissão, no qual ficaram evidenciadas as detenções e violações sistemáticas, massivas
e organizadas de mulheres, em particular mulheres muçulmanas, decidiu submeter à
aprovação um estatuto para criação de um Tribunal Penal ad hoc para julgar os

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principais responsáveis pelas graves violações ao Direito Internacional Humanitário
cometidas no território da ex-Jugoslávia desde 1991. E logo em seguida em 25 de maio
de 1993, foi estabelecido o Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia, por
meio da Resolução nº 827 do Conselho de Segurança da ONU, com sede em Haia.

Este tribunal tem a competência para julgar as violações graves às Convenções


de Genebra de 1949, violações das leis ou dos costumes de guerra, genocídio e crimes
contra a humanidade decorrentes da prática que ficou conhecida como depuração étnica,
cometidos no território da Iugoslávia desde o ano de 1991 até a data em que se celebrar
a paz.

3.3.2. Tribunal penal Internacional de Ruanda

Este tribunal surgiu nos mesmos moldes do Tribunal da Ex-Iuguslavia.

Como a maior parte dos países africanos, iniciou seu processo de independência no
início dos anos 60, em decorrência do processo de descolonização. Desse momento em
diante, esta região da África se viu composta por povos de diferentes etnias e
historicamente rivais, situação que, somada às dificuldades econômicas e políticas,
resultou em inúmeros conflitos, como o de Ruanda.

Este surge em face da solicitação da ONU à Comissão de Direitos Humanos um


relatório da situação, culminando com a aprovação da Resolução nº 955 do Conselho de
Segurança, em 08 de novembro de 1994, também por solicitação do próprio governo
ruandese, estabelecendo-se um Tribunal ad hoc para Ruanda, nos mesmos moldes do já
existente na região da Antiga Iugoslávia.

O Tribunal de Ruanda tem competência para julgar as pessoas presumivelmente


responsáveis por atos de genocídio e outras violações graves ao Direito Internacional
Humanitário cometidos no território de Ruanda e por cidadãos ruandenses que, por
ventura, os tivessem cometido em territórios de Estados vizinhos, entre 01 de janeiro e
31 de dezembro de 1994, bem como de cidadãos estrangeiros, por crimes cometidos
naquele país. (Brandão 2006, p.49)

O Tribunal foi oficialmente instalado em 27 de junho de 1995, com sede em Arusha,


capital da Tanzânia.

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Apesar desses tribunais terem sido extremamente importantes para a criação do actual
tribunal internacional e de terem alcançado vários aspectos positivos, criação destes
tribunais ad hoc foi objecto de duras críticas segundo Deyra (2001):

 Em primeiro lugar, o modo da sua criação, que rejeitou a via convencional


em benefício de uma resolução do Conselho de Segurança, considerada mais
rápida e sobretudo mais eficaz, uma vez que o TPIJ e o TPIR foram
estabelecidos enquanto medidas coercivas adoptadas ao abrigo do capítulo
VII da Carta. Sendo assim, os TPI ficam órgãos subsidiários do Conselho de
Segurança, estando por isso subordinados à acção do seu criador.
 Em segundo lugar, os TPI traduzem uma justiça manietada e extraordinária:
justiça manietada pelos membros permanentes do Conselho, que decidem
quem vai ser julgado e por que crime; justiça extraordinário uma vez o
direito ordinário existente -Comissão internacional para o apuramento dos
factos e exercício da competência universal – poderia ser aplicada
 Por último, a criação de tais tribunais tem como efeito diferir a instituição de
uma jurisdição internacional permanente.

Todavia, o contributo dos TPI, embora limitado, não deverá ser negligenciado, tanto no
que diz respeito às questões de procedimento como às questões substanciais (papel do
costume no DIH). A experiência destes dois tribunais permitiu progredir em termos da
vontade de cumprir a obrigação de punir os criminosos de guerra.

Trata-se de um passo largo no sentido da criação de um Tribunal penal internacional,


permanente e universal.

4. O tribunal Penal internacional

O Tribunal Penal Internacional (TPI), uma das principais instituições internacionais que
foram criadas no final do século XX, é hoje um dos actores fundamentais na proteção
dos direitos humanos, em particular quando as violações desses direitos atingem um
patamar de gravidade que constituem crimes internacionais.

Este tribunal foi criado por um tratado internacional multilateral, o tratado de Roma em
1998. De lembrar que Em 1996, a Assembleia Geral decidiu convocar a Conferência
diplomática de plenipotenciários das Nações Unidas sobre a criação de um tribunal
penal internacional, que teve lugar em Roma, de 15 a 17 de Julho 1998.

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“O objectivo era muito ambicioso: tratava-se de lutar contra o fenómeno da impunidade
dos criminosos de guerra e genocidas, pondo fim à necessidade de estabelecer tribunais
repressivos numa base circunstancial.” (Deyra 2001, p. 154)

Este tribunal teria a personalidade e capacidade jurídicas internacionais necessárias ao


desempenho das suas funções e a prossecução dos seus objectivos e que poderá exercer
os seus poderes e funções nos termos do seu estatuto, no território de qualquer Estado
parte e, por acordo especial, no território de qualquer outro Estado, conferindo-lhe
autonomia face as outras organizações internacionais, como a ONU.

O Tribunal penal internacional tem a sua sede em Haia e é composto por dezoito juízes
de várias nacionalidades.

4.1. Fundamento Legal do Tribunal Penal Internacional

Para Brandão (2006) O fundamento legal do TPI pode se estabelecer de duas formas:

Um tratado internacional ou por meio de uma resolução do Conselho de Segurança das


Nações Unidas.

Ao se estabelecer uma corte internacional permanente por meio de um tratado, como


ocorreu no Estatuto de Roma, a legitimidade do Tribunal é maior, especialmente em
função do reconhecimento de sua jurisdição por um número maior de Estados.

4.2. Jurisdição do Tribunal Penal internacional

A jurisdição do TPI foi bastante discutida na conferência de Roma, na qual surgiram


três propostas para fixar a jurisdição do tribunal:

1- A primeira, apresentada pela Comissão de Direito Internacional das Nações


Unidas, previa a liberdade dos Estados-parte para aceitar ou rejeitar a jurisdição
do Tribunal em relação a crimes específicos e por prazos determinados;
2- A segunda, defendida pela França, pregava o “regime de consentimento”,
segundo o qual haveria a necessidade da aquiescência de todos os Estados-parte
envolvidos, em cada caso individual e contra cada sujeito individualmente
considerado, para que o Tribunal pudesse exercer sua jurisdição;
3- A terceira, sustentada pela Alemanha, propunha o princípio da jurisdição
universal e direta do Tribunal.

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Naturalmente que as duas primeiras teriam uma atuação fraca em relação a ultima,
surgindo assim a ideia estabelecer um meio-termo entre as três propostas que culminou
com a definição de um sistema complexo, de jurisdição restrita e complementar, ou seja,
prevalece a regra do esgotamento dos procedimentos internos como condição para que
se dê início à jurisdição internacional.

A jurisdição deste Tribunal pode ser analisada sob os critérios material, pessoal,
Temporal e territorial, lembrando que a regra geral é a aceitação de pleno direito da
jurisdição do Tribunal a partir do momento em que o Estado se torna parte no Estatuto.

Quanto ao aspecto material, previstos no artigo 5º do estatuto de Roma estabelece que


os seguintes crimes são da competência do TPI: crime de genocídio, crimes contra a
humanidade, crimes de guerra e o crime de agressão.

4.2.1. Crime de Genocídio

Segundo o art.º. 6 do Estatuto de Roma, entende-se por "genocídio", qualquer um dos


actos que a seguir se enumeram, praticado com intenção de destruir, no todo ou em
parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, enquanto tal:

a) Homicídio de membros do grupo;


b) Ofensas graves à integridade física ou mental de membros do grupo;
c) Sujeição intencional do grupo a condições de vida com vista a provocar a sua
destruição física, total ou parcial;
d) Imposição de medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo;
e) Transferência, à força, de crianças do grupo para outro grupo

4.2.2. Crimes contra humanidade

Qualificados como “qualquer acto praticado como parte de um ataque generalizado ou


sistemático contra uma população civil e com conhecimento de tal ataque”, incluem:
a) Homicídio;
b) Extermínio;
c) Escravidão;
d) Deportação ou transferência forçada de populações;
e) Encarceramento ou privação grave da liberdade física em violação a normas
fundamentais de direito internacional;
f) Tortura;

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g) Estupro;
h) Escravidão sexual, prostituição compulsória, gravidez imposta, esterilização
forçada ou outros abusos sexuais graves;
i) Perseguição de um grupo ou coletividade com identidade própria, por motivos
políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais ou religiosos;
j) Desaparecimento de pessoas;
k) Apartheid; e
l) Outras práticas que causem grande sofrimento ou atentem contra a integridade
física ou saúde mental das pessoas.
4.2.3 Crimes de Guerra

O Tribunal terá competência para julgar os crimes de guerra, em particular quando


cometidos como parte integrante de um plano ou de uma política ou como parte de uma
prática em larga escala desse tipo de crimes.

Entende-se por "crimes de guerra”:

a) As violações graves às Convenções de Genebra, de 12 de Agosto de 1949, a saber,


qualquer um dos seguintes atos, dirigidos contra pessoas ou bens protegidos nos termos
da Convenção de Genebra que for Pertinente:

 Homicídio doloso;
 Tortura ou outros tratamentos desumanos, incluindo as experiências biológicas;

b) Outras violações graves das leis e costumes aplicáveis em conflitos armados


internacionais no âmbito do direito internacional, a saber, qualquer um dos seguintes
atos:

 Dirigir intencionalmente ataques à população civil em geral ou civis que não


participem diretamente nas Hostilidades;
 Dirigir intencionalmente ataques a bens civis, ou seja bens que não sejam
objetivos militares.

4.2.4. Crime de agressão


“Crimes contra a paz (crimes de agressão), ou seja, a preparação e o desencadear de
uma guerra de agressão ou feita em violação dos tratados” (Deyra 2001, p.145)

Uma pessoa comete um “crime de agressão” quando, estando em condições de controlar


ou dirigir efetivamente a ação política ou militar de um Estado, tal pessoa planifica,

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prepara, inicia ou realiza um acto de agressão que por suas características, gravidade e
escala constitua uma violação manifesta da Carta das Nações Unidas.
Por “acto de agressão” se entenderá o uso da força armada por um Estado contra a
soberania, a integridade territorial ou a independência política de outro Estado, ou em
qualquer outra forma incompatível com a Carta das Nações Unidas. De conformidade
com a resolução 3314 da Assembléia Geral das Nações Unidas, de 14 de dezembro de
1974, qualquer dos atos seguintes, independentemente de que se tenha ou não
declaração de guerra, se caracterizará como ato de agressão:

a) A invasão ou ataque pelas forças armadas de um Estado do território de outro


Estado, ou toda ocupação militar, ainda que temporária, que resulte de tal
invasão ou ataque, ou toda anexação, mediante o uso da força, do território de
outro Estado ou de parte dele;
b) O bombardeio, pelas forças armadas de um Estado, do território de outro Estado,
ou o emprego de quaisquer armas por um Estado contra o território de outro
Estado;
c) O bloqueio dos portos ou das costas de um Estado pelas forças armadas de outro
Estado;
d) O ataque pelas forças armadas de um Estado contra as forças armadas terrestres,
navais o aéreas de outro Estado, ou contra sua frota mercante ou aérea;
e) A utilização de forças armadas de um Estado, que se encontram no território de
outro Estado com o acordo do Estado receptor, em violação das condições
estabelecidas no acordo ou toda prorrogação de sua presença em tal território
depois de terminado o acordo;
f) A ação de um Estado que permite que seu território, que foi posto a disposição
de outro Estado, seja utilizado por esse outro Estado para perpetrar um ato de
agressão contra um terceiro Estado;
g) O envio por um Estado, ou em seu nome, de bandos armados, grupos irregulares
ou mercenários que levem a cabo atos de força armada contra outro Estado de tal
gravidade que sejam equiparáveis aos actos antes enumerados, ou sua
substancial participação em tais actos.

4.3. A competência do TPI

A competência do TPI pode ser exercida quando um Estado passa a ser parte do
Estatuto, ou seja, ele aceita a competência do TPI sobre os crimes mencionados acima.
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Um estado que não seja parte no Estatuto pode fazer uma declaração aceitando a
competência do tribunal.

Todos os estados que não ractificaram o Estatuto poderão fazer uma declaração em caso
de necessidade aceitando a competência do TPI.

4.4. Penas aplicáveis pela justiça penal internacional

De acordo com o disposto no art.º. 110 do Estatuto de Roma, o Tribunal pode impor à
pessoa condenada por um dos crimes acima citados as seguintes penas:

a) Pena de prisão por um número determinado de anos, até ao limite máximo de 30


anos;
b) Pena de prisão perpétua, se o elevado grau de ilicitude do fato e as condições
pessoais do condenado o justificarem.
Além da pena de prisão, o Tribunal poderá aplicar:
a) Uma multa, de acordo com os critérios previstos no Regulamento Processual;
b) A perda de produtos, bens e haveres provenientes, direta ou indiretamente, do
crime, sem prejuízo dos direitos de terceiros que tenham agido de boa-fé.

4.5. Princípios Fundamentais do Tribunal internacional Penal

Segundo Lewandowski (2002) TPI assenta-se em alguns princípios fundamentais a


saber:
 Princípio de Complementaridade;
 Princípio da universalidade;
 Princípio da responsabilidade penal individual;
 Princípio da irrelevância da função oficial;
 Princípio da responsabilidade de comandantes e outros superiores;
 Princípio da imprescritibilidade.

O princípio de complementaridade

O princípio da complementaridade representa um dos aspectos mais


importantes do Estatuto de Roma. Sua finalidade é assegurar que o Tribunal exerça o
papel que lhe é atribuído sem interferir indevidamente com os sistemas jurídicos
nacionais, a quem continua a incumbir a responsabilidade primária de investigar e
processar os crimes. ( Brandão 2006, p.61)

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De acordo com o mesmo, a Corte somente atua se o Estado que tem jurisdição
sobre determinado caso não iniciou o devido processo ou, se o fez, agiu com o
intuito de subtrair o acusado à justiça ou de mitigar-lhe a sanção. Justifica-se porque
compete em primeiro lugar aos Estados o dever de reprimir os crimes capitulados no
estatuto do Tribunal, até para que a repressão se faça de modo mais eficaz. A Corte,
pois, atua apenas subsidiariamente, agindo sobretudo na hipótese em que ocorre “a
falência das instituições nacionais

Ao contrário dos tribunais ad hoc, que são concorrentes e têm primazia sobre as cortes
nacionais, o Tribunal Penal Internacional tem caráter excepcional e complementar e
somente aplicar-se-á aos crimes de extrema gravidade nele definidos: o crime de
genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e o crime de agressão.

Princípio da Universalidade

Pelo qual os Estados-partes colocam-se integralmente sob a jurisdição da Corte, não


podendo subtrair de sua apreciação determinados casos ou situações.

Princípio da responsabilidade penal individual

Segundo o qual o indivíduo responde pessoalmente por seus atos, sem prejuízo da
responsabilidade do Estado.

O princípio da irrelevância da função oficial

Permite que sejam responsabilizados chefes de Estado ou de governo, ministros,


parlamentares e outras autoridades, sem qualquer privilégio ou imunidade

Princípio da responsabilidade de comandantes e outros superiores

Exige que todos os chefes militares, mesmo que não estejam fisicamente presentes no
local dos crimes, envidem todos os esforços ao seu alcance para evitá-los, sob pena de
neles ficarem implicados.

Princípio da imprescritibilidade

De acordo com o qual a ação criminosa jamais terá extinta a punibilidade pelo decurso
do tempo, embora ninguém possa ser julgado por delitos praticados antes da entrada em
vigor do Tratado

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4.6. Limitações do TPI

Apesar da competência do TPI ser mais ampla do que os tribunais ad hoc, os seus
poderes são infinitamente mais restritos.

 Os Estados signatários têm a possibilidade de não reconhecer a competência do


TPI durante um período de sete anos no que diz respeito aos crimes de guerra;
 Em segundo lugar, uma questão pode ser submetida ao TPI na sequência de
queixa de um Estado parte no tratado, do Conselho de Segurança ou por
iniciativa da acusação mas, neste último caso, a acusação deverá obter de uma
«câmara preliminar» de juízes a autorização para abrir instrução e o Conselho de
Segurança, mediante uma resolução adoptada ao abrigo do capítulo VII, pode
solicitar-lhe que suspenda as investigações por um período de doze meses,
renovável.
 O TPI apenas pode exercer a sua jurisdição na condição de que o Estado em cujo
território o crime seja cometido ou o Estado de que seja cidadão o presumível
autor sejam partes no tratado.

5. A justiça penal internacional e sua relevância para a Humanidade

Os tribunais nacionais tem um papel preponderante e primordial no julgamento dos


supostos crimes guerra. Ademais, o estabelecimento de uma corte internacional não
obsta de modo algum o trabalho empreendido pelos tribunais especiais já mencionados,
que foram instituídos para reprimir crimes relacionados com situações específicas.

Durante toda a história da humanidade tem sido possível se cometer crimes e


atrocidades que permanecem impunes, tem-se registado clara cultura de impunidade, o
que tem de certa forma dado “carta-branca” aos criminosos para cometerem tais
atrocidades.

Isso nos remete a ideia de que o sistema de repreensão baseado apenas no direito
internacional apresentava graves deficiências, especialmente por não garantir o
julgamento de indivíduos. Portanto, sentia-se a necessidade de adoptar novas normas e
criar instituições capazes de garantir punições efectivas para os crimes internacionais,
introduzindo, sobre tudo, o individuo nas questões penais internacionais.

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A justiça penal internacional é a tentativa da comunidade internacional de julgar e punir
as pessoas que cometem crimes contra a humanidade, tendo, portanto o objectivo de
evitar impunidade. O impacto da atuação da justiça penal internacional sobre tudo do
TPI tem sido um mecanismo extremamente poderoso na contenção de novos
genocídios, crimes contra humanidade, crimes de guerra e agressão que tem
atormentado a humanidade durante o curso do seculo XXI.

Mas apesar disso vários sectores da sociedade civil, principalmente nos Estados Unidos,
tem-se manifestado contra alegando que o TPI ainda não esta suficientemente
organizado.

Apesar de uma parcela considerável da população mundial não ter ratificado, mais de
dois terços dos Estados que integram a ONU subscreveram o tratado de Roma.

Seja como for, a relevância histórica do Tratado não pode ser subestimada, pois a mera
existência do Tribunal, terá o condão de limitar o darwinismo no campo das relações
internacionais, onde prevalece a lei dos Estados mais fortes em face das nações mais
débeis. Mas a maior contribuição que a justiça penal internacional (TPI) poderá dar para
consolidar a paz, a segurança e o respeito aos direitos humanos no mundo será fazer
com que ele transite de uma cultura de impunidade para uma cultura de
responsabilidade. (Lewandowski 2002, p. 195)

6. A justiça penal internacional em África

Para (Teles & Martins 2017, p. 027):

Nos últimos anos, o TPI assistiu a um nível de actividade judicial sem precedentes. Esta
tendência deverá continuar. Estão a ser realizados exames preliminares em dez
situações distintas em todas as regiões do mundo (incluindo no Afeganistão, Colômbia,
Iraque/Reino Unido, Palestina e Ucrânia), existem dez investigações em curso
(incluindo na Geórgia) e três julgamentos foram concluídos em 2016.

Apesar disso, nos últimos anos o TPI tem atravessado momentos delicados do ponto de
vista político, sofrendo críticas da maioria dos países africanos e da União africana em
particular. Primeiro pelas contradições e obstáculos constitucionais que o estatuto de
Roma e a legislação da maior parte dos países africanos possui.

O desempenho do TPI tem sido objecto de críticas, acusações e cada vez mais
desconfiança, nomeadamente de individualidades com alta responsabilidade política e
social, no contexto africano e lusófono em parte alimentadas pela constatação de que a

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maior parte dos processos que têm merecido a atenção deste tribunal internacional têm
como suspeitos personalidades africanas, mais precisamente da África Negra.

Sintomático dessa crescente onda de desconfiança sobre a isenção e imparcialidade do


TPI, são as recentes declarações prestadas por altas individualidades africanas, aquando
da realização da XV Sessão Extraordinária do Conselho Consultivo da União Africana ,
ocorrida em Adis Abeba (Etiópia), a 11 de outubro de 2013, em que, na Cimeira de
Chefes de Estado e de Governo que se seguiu houve pronunciamentos muito claros
sobre a perceção que setores importantes do poder político e da sociedade civil têm da
atuação do TPI, chegando, inclusive, a sugerir a retirada de alguns países do TPI.
(Ambos, Palma, Dias & Mendes 2015, p. 54)

Fruto dessas desconfianças, Burundi, África do Sul e Gâmbia, tendo estes dois últimos
subsequentemente «retirado a sua retirada» no início de 2017).

6.1. A questão da incompatibilidade constitucional com as normas do TPI

Muitos países africanos apesar da pressão para que ratifiquem o tratado de Roma ainda
enfrentam problemas de incompatibilidade entre a constituição e as normas do TPI,
como o caso de Moçambique.

O TPI prevê penas de prisão perpétua, e extradição ou entrega de nacionais para


julgamento no Tribunal Penal internacional em Haia, o que como exemplo para a
constituição Moçambicana constitui um obstáculo (art.º 61 e 67 da Constituição da
República).

Uma outra questão contraditória é a de imunidades oficiais. Outra questão, também


bastante aventada como obstáculo à adesão ao TPI, prende-se com o facto de o Estatuto
ter adotado o princípio da irrelevância da qualidade oficial como um dos seus pilares
fundamentais (artigo 27.º), o que briga com a consagração constitucional de imunidades
oficias, rectius, do Chefe de Estado, dos deputados e dos membros do Governo.

De lembrar que, apesar de Moçambique não ter ractificado, impede de cooperar com o
tribunal.

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7. Conclusão

Do que foi exposto, algumas ideias são destacadas como sendo mais relevantes,
assumindo, descarte, as vestes de “conclusões”.

Como visto, O tribunal penal internacional constitui um dos maiores avanços da


comunidade internacional em termos de justiça penal internacional, no sentido de
efetivar e verdadeiramente proteger os direitos da pessoa humana.

A árdua tarefa de implementação de um tribunal penal internacional veio garantir e


satisfazer os mais altos padrões de justiça e transparência.

A maior contribuição que a justiça penal internacional poderá trazer para consolidar a
paz, a segurança e o respeito dos direitos humanos no mundo será fazer com que ele
transite de uma cultura de impunidade para uma cultura de responsabilidade.

Pode-se concluir que a corte penal internacional é uma vitória para a humanidade
porque vem suprir as maiores lacunas institucionais existentes. Evidentemente que a
justiça penal internacional veio ampliar e melhorar o sistema do Direito internacional.

No entanto, não resta dúvida sobre a relevância deste, sendo que para uma efectiva
legitimidade do TPI, seria necessário a ratificação de seu estatuto por parte da maioria
das nações, o que lhe garantiria uma autoridade de facto.

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8. Referência Bibliográficas

Lewandowski, E (2002). O Tribunal penal internacional: de uma cultura de impunidade


para uma cultura de responsabilidade. Brasil, São Paulo

Deyra, M (2001). Direito Internacional Humanitário. Portugal, Lisboa: Comissão


nacional para as comemorações do 50º aniversário da declaração dos Direitos do
Homem e a década das NU para a educação em matéria de direitos humanos

Brito, W & Freitas, P (2018). Estatuto de Roma do Tribunal Penal internacional:


comentários. Edicao DH-CII Direitos Humanos- centro de investigação interdisciplinar

Cardoso, E (2012). Tribunal Penal internacional: conceitos, realidades e implicações


para o Brasil. Brasil: FUNAG

Brandão, RC (2006). Tribunal Penal internacional: uma nova realidade do Direito penal
internacional para a garantia da segurança dos Direitos Humanos. Brasil, Rio de Janeiro:
Universidade Gama Filho

Constituição da República de Moçambique

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