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CASOS PRÁTICOS DE TEORIA

GERAL DO DIREITO CIVIL



COMPILADO E RESOLVIDO POR:
- BENEDITA SEQUEIRA
- ANA RITA CARNEIRO
- PEDRO DUARTE MARQUES
- VANESSA VALE

1.

A, tendo aceite uma oferta de trabalho no estrangeiro, decidiu vender todos os seus bens antes de
deixar o país. Assim, vendeu os radiadores e a caldeira do aquecimento central de sua casa a B e,
mais tarde, antes ainda de estes serem desmontados, vendeu a própria casa a C e o seu recheio a D.

B, um mês depois da venda da casa, apresentou-se no local, juntamente com um técnico, a fim de
desmontar os aparelhos do aquecimento central. C, no entanto, não permitiu a entrada de B,
dizendo que os ditos aparelhos eram seus. Perante o sucedido, B pretende ser indemnizado por A,
mas este defende-se dizendo que o contrato de compra e venda do aquecimento central não foi
validamente celebrado, na medida em que não revestiu a forma de escritura pública exigida para
bens imóveis. Por outro lado C sente-se enganado porque julgava ter comprado a casa mobilada. No
entanto, quando a foi habitar, já D tinha retirado todo o recheio da casa.

Quid juris?

No caso prático em apreço estamos perante três contratos de compra e venda. De facto, o
contrato de compra e venda vem definido na lei como o contrato pelo qual se transmite a
propriedade de uma coisa ou de um direito mediante um preço (artigo 874º CC). Não obstante o
principio da liberdade de forma consagrado no artigo 219º CC, e atendendo a uma necessidade de
publicidade e segurança jurídica, quanto aos bens imóveis, o legislador estabeleceu a exigência
que o contrato de compra e venda que tenha por objeto esses bens, só seja válido se for celebrado
por escritura publica ou documento particular autenticado (artigo 875ºCC). Refere o artigo 879º
que a compra e venda tem como efeitos essenciais a transmissão da propriedade da coisa, a
obrigação de entregar a coisa e a obrigação de pagar o preço. Quer isto dizer que, por mero efeito
da compra e venda se transmite a propriedade da coisa independentemente da sua entrega ou do
pagamento do respetivo preço. Nos termos do artigo 880º CC na venda de bens futuros de frutos
pendentes ou de partes componentes ou integrantes de uma coisa, o vendedor fica obrigado a
exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos. Se as partes
atribuírem ao contrato carácter aleatório é devido o preço independentemente da transmissão
dos bens não chegar a verificar-se.

O primeiro contrato teve como objeto as caldeiras e os radiadores. Estes, nos termos do artigo
204º nº1 e) as partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos, as quais, conforme definido no
nº3 correspondem a toda a coisa móvel ligada com carácter de permanência ao prédio.

Não obstante o principio da liberdade de forma consagrado no artigo 219º CC, e atendendo a uma
necessidade de publicidade e segurança jurídica, quanto aos bens imóveis, o legislador
estabeleceu a exigência que o contrato de compra e venda que tenha por objeto esses bens, só
seja válido se for celebrado por escritura publica ou documento particular autenticado (artigo
875º); determinando o incumprimento do requisito de forma nulidade nos termos do artigo 220º
CC, a qual tem efeitos retroativos conforme estabelecido no artigo 289º do CC.

Assim, se por regra e uma vez que se trata de um bem imóvel, seria necessária escritura publica ou
documento particular autenticado para se assegurar a observância da forma legal exigida, o objeto
apesar de imóvel (artigo 204º nº3) é transacionado como coisa móvel, na sua mobilidade futura.
Há, assim, no negócio, uma antecipação da mobilidade da coisa, sendo nesta perspetiva que as
partes a transacionam. Isto não significa, no entanto, que estejamos perante um contrato compra
venda de uma coisa futura.
Assim, o contrato de compra e venda dos radiadores e das caldeiras, apesar de não ter sido
celebrado por escritura publica ou documento particular autenticado, é valido pois a exigência de
forma não se aplica ao negocio.

Sendo o negocio celebrado validamente, estamos perante uma aquisição derivada translativa. Nos
termos do artigo 408º nº1 CC, por regra, nos contratos relativos à transferência de direitos reais os
efeitos dão-se diretamente em virtude do contrato. No caso em apreço, e uma vez que estamos
perante uma parte integrante, a transferência não se verifica no momento da separação, nos
termos do artigo 408º nº2 CC.

Assim, apenas os efeitos de natureza obrigacional ocorrerão imediatamente, sendo que o efeito
principal do negocio celebrado, que é a transmissão da propriedade da coisa, não irá dar-se
imediatamente, contrariamente ao normal num contrato com eficácia real. A aquisição derivada
translativa irá demorará algum tempo, em função do tempo que a separação das partes
componentes irá ter em relação ao imóvel (artigo 880º CC).

Concluindo, e uma vez que não se produziu efeito real, à data da venda das caldeiras e dos
radiadores continua a ser A.

A, entretanto vende a casa a C. Relativamente a este segundo negocio, deixam-se aqui as


considerações supra quanto à forma e efeitos do contrato.

A casa, é uma coisa imóvel nos termos do artigo 204º nº1 a) CC. Tratando-se da compra e venda de
um imóvel, nos termos do artigo 875º CC, trata-se de um negócio sujeito a forma, ou seja, que tem
que ser celebrado por escritura publica ou DPA. atendendo a que o negocio terá obedecido à
forma exigida, verifica-se de imediato, nos termos do artigo 879º CC a produção de efeitos reais e
consequente transmissão da propriedade da coisa. Assim, estamos perante uma aquisição
derivada translativa, e C passa a ser o proprietário da casa. Atendendo a que os radiadores são
partes integrantes do imóvel nos termos do artigo 872º CC; a obrigação de entrega abrange, salvo
estipulação em contrário as partes integrantes. C será, assim, o proprietário dos radiadores, caso
nada tenha sido ressalvado, acompanhando as partes componentes naturalmente o destino do
imóvel a que estão ligadas.

Quanto a B, por incumprimento do contrato, B terá uma pretensão indemnizatória contra A. A e B


celebram contrato de compra e venda, pelo que, não tendo havido efeitos reais, mas apenas
efeitos obrigacionais, levanta-se a questão apenas da responsabilidade contratual, ao abrigo dos
artigos 798º e seguintes do CC que estabelecem que o devedor que falta culposamente ao
cumprimento da obrigação se torna responsável pelo prejuízo que causa ao credor.

Como já se disse, o proprietário é C atendendo que a venda a B não teve efeitos reais mas apenas
efeitos obrigacionais.

Relativamente ao terceiro negocio, trata-se de uma compra e venda de uma coisa composta. Com
efeito, nos termos do artigo 206º CC, é havida como coisa composta ou universalidade de facto a
pluralidade de coisas móveis que pertencendo à mesma pessoa têm um destino unitário. Quanto
às coisas compostas não estabeleceu o legislador nenhuma exigência de forma aplicando-se o
artigo 219º CC que estabelece que não depende da observância de forma a validade da declaração
negocial. Esta venda realizou-se posteriormente à venda do imóvel onde o recheio se encontrava
e, por isso, poderia levantar-se a questão da coisa composta ter acompanhado o bem imóvel. Não
é assim, porquanto não estando ligada materialmente ao prédio com carácter de permanência,
não há obrigação de entrega da coisa nos termos do artigo 882º nº2 CC, aplicável apenas às partes
integrantes, aos frutos pendentes e aos documentos relativos à coisa ou direito. Ainda, o recheio é
uma coisa acessória nos termos do artigo 210º CC, ou seja, uma coisa móvel que não constituindo
parte integrante está afeta por forma duradoura ao serviço ou ornamentação de uma coisa. Nos
termos do nº2 do artigo 210º CC, os negócios jurídicos que tenham por objeto a coisa principal não
abrangem, salvo declaração em contrário, as coisas acessórias. Assim, C adquiriu a casa com as
partes integrantes mas sem as partes acessórias que foram vendidas, validamente, a D.

2.

Em Outubro de 2005 D, agricultor da zona do Dão, vendeu a E, produtor vinícola, a sua colheita de
uvas do ano seguinte. Entretanto, em Fevereiro de 2006, D vendeu a sua quinta a F. Nesse mesmo
ano, na época das vindimas, E vem exigir de F as uvas que tinha comprado no ano transacto.

Quid juris?

Na situação em apreço, estamos perante dois contratos de compra e venda, um de bens imóveis e
outro de coisa futura. A quinta é um bem imóvel, nos termos do artigo 204º nº1 a) CC e a colheita
das uvas uma coisa futura. O conceito de coisa futura vem definido no artigo 211º do CC
abrangendo as coisas que não tem existência material (como na situação em apreço com as uvas)
e as coisas que apesar de terem existência material não têm autonomia jurídica ou não estejam
em poder daquele que delas dispõe ou aquele não tem direito, quando sobre elas faz um negócio
jurídico. Neste sentido, se distingue coisas absolutamente futuras de coisas relativamente futuras.
A prestação de coisa futura é permitida pelo legislador, nos termos do artigo 399º CC desde que
não haja disposição em contrario e no que diz respeito ao contrato de compra e venda, o
legislador admite a venda de bens futuros nos termos do artigo 880º nº1 CC em que se estabelece
que o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os
bens vendidos, segundo o que for estipulado ou resultar das circunstâncias do contrato. Mais
estabelece o nº2 do referido artigo que se as partes atribuírem ao contrato carácter aleatório é
devido o preço ainda que não tenha sido feita a prestação.

Relativamente à compra e venda da colheita/bem futuro, aplica-se o principio da liberdade de


forma consagrado no artigo 219º CC, não se exigindo, por isso, qualquer forma como necessidade
de validade do contrato. Por regra, a mera celebração de contrato desencadeia a produção de
efeitos obrigacionais e efeitos reais. No entanto, e nos termos do artigo 408º nº2 CC, se a
transferência respeitar, entre outros a coisa futura, o efeito real apenas se verifica quando a coisa
for adquirida pelo alienante, ou seja, tratando-se de frutos naturais no momento da sua colheita
ou separação. Existe, no entanto, nos termos do artigo 880º nº1 a obrigação do vendedor de
exercer as diligencias necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos.

Relativamente ao segundo contrato, estamos perante uma compra e venda de um bem imóvel,
nos termos dos artigos 204º nº1 a), 874º e 875º CC. Não obstante o principio da liberdade de
forma consagrado no artigo 219º CC, e atendendo a uma necessidade de publicidade e segurança
jurídica, quanto aos bens imóveis, o legislador estabeleceu a exigência que o contrato de compra e
venda que tenha por objeto esses bens, só seja válido se for celebrado por escritura publica ou
documento particular autenticado (artigo 875ºCC). Refere o artigo 879º que a compra e venda tem
como efeitos essenciais a transmissão da propriedade da coisa, a obrigação de entregar a coisa e a
obrigação de pagar o preço. Quer isto dizer que, por mero efeito da compra e venda se transmite a
propriedade da coisa independentemente da sua entrega ou do pagamento do respetivo preço.

Assim sendo, quando nascem as uvas, o proprietário delas é F, uma vez que estas acompanham o
imóvel vendido (artigos 880º nº1 e 882º nº2 CC). Assim, verificar-se-á apenas incumprimento
contratual por parte de D relativamente a E, gerando-se obrigação de indemnizar nos termos dos
artigos 798º e seguintes do CC.

Pelo contrario, se o negocio celebrado entre D e F fosse inválido por falta de forma (por exemplo),
com os efeitos previstos no artigo 289º CC, designadamente de restituição de tudo o que tivesse
sido prestado, então E poderia exigir a D o cumprimento do contrato.

Outra questão pertinente prender-se-ia coma fixação, na venda da colheita, do valor de venda
desta, ainda sem existência material. Nesta situação, se o preço fosse fixado de antemão, o
contrato seria um contrato de natureza aleatório porque existe uma prestação certa pelo
comprador (o valor do preço) e uma a prestação incerta do vendedor (as uvas). Nesta situações de
negócios aleatórios, apesar de haver uma correspetividade de prestações de ambas as partes,
estas sujeitam-se a incerteza não sabendo pelo menos uma delas, quais os sacríficos patrimoniais
a que estão sujeitas.

**Nota: Casas pré fabricadas: são móveis ou imóveis? classificação depende da ligação ao solo que
exista.

3.

Em Março deste ano, A e B celebraram um contrato de resinagem relativo a um pinhal de que o


primeiro era proprietário na zona de Leiria. No entanto, antes que se tivesse procedido à extração da
resina das árvores, o pinhal foi devastado por um violento incêndio. Assim, B pretende que A lhe
devolva o preço entretanto pago pela resina. Terá êxito na sua pretensão?

(Cfr. Acórdão do STJ, de 23 de Abril de 1998, in Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do STJ, VI, 2,
1998, pp. 46 a 49)

Na situação em apreço estamos perante um contrato de compra e venda, o qual vem definido na
lei como o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa ou de um direito mediante
um preço (artigo 874º CC). O legislador estabeleceu o principio da liberdade de forma consagrado
no artigo 219º CC, nos termos do qual a validade da declaração negocial, por regra, não depende
da observância de forma especial.

Refere o artigo 879º que a compra e venda tem como efeitos essenciais a transmissão da
propriedade da coisa, a obrigação de entregar a coisa e a obrigação de pagar o preço. Quer isto
dizer que, por mero efeito da compra e venda se transmite a propriedade da coisa
independentemente da sua entrega ou do pagamento do respetivo preço. Nos termos do artigo
880º CC na venda de bens futuros de frutos pendentes ou de partes componentes ou integrantes
de uma coisa, o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador
adquira os bens vendidos. Se as partes atribuírem ao contrato carácter aleatório é devido o preço
independentemente da transmissão dos bens não chegar a verificar-se.
A resina é um fruto natural nos termos do artigo 212º do CC. Com efeito, é uma coisa que se
produz periodicamente e que provem diretamente de uma coisa. Tal como uma colheita, a resina
é uma coisa futura. O conceito de coisa futura vem definido no artigo 211º do CC abrangendo as
coisas que não tem existência material (como na situação em apreço com as uvas) e as coisas que
apesar de terem existência material não têm autonomia jurídica ou não estejam em poder
daquele que delas dispõe ou aquele não tem direito, quando sobre elas faz um negócio jurídico.
Neste sentido, se distingue coisas absolutamente futuras de coisas relativamente futuras. Nos
termos do artigo 204º nº1 c), os frutos naturais são considerados coisas imóveis.

A prestação de coisa futura é permitida pelo legislador, nos termos do artigo 399º CC desde que
não haja disposição em contrario e no que diz respeito ao contrato de compra e venda, o
legislador admite a venda de bens futuros nos termos do artigo 880º nº1 CC em que se estabelece
que o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os
bens vendidos, segundo o que for estipulado ou resultar das circunstâncias do contrato. Mais
estabelece o nº2 do referido artigo que se as partes atribuírem ao contrato carácter aleatório é
devido o preço ainda que não tenha sido feita a prestação.

Relativamente à compra e venda da resina/bem futuro, e apesar de ser considerada uma coisa
imóvel, nos termos do artigo 204º nº1 c) CC, aplica-se o principio da liberdade de forma
consagrado no artigo 219º CC, não se exigindo, por isso, qualquer forma como necessidade de
validade do contrato. Assim, se por regra e uma vez que se trata de um bem imóvel, seria
necessária escritura publica ou documento particular autenticado para se assegurar a observância
da forma legal exigida, o objeto apesar de imóvel (artigo 204º nº3) é transacionado como coisa
móvel, na sua mobilidade futura. Há, assim, no negócio, uma antecipação da mobilidade da coisa,
sendo nesta perspetiva que as partes a transacionam. Isto não significa, no entanto, que
estejamos perante um contrato compra venda de uma coisa futura.

Quanto aos efeitos do contrato, por regra, a mera celebração de contrato desencadeia a produção
de efeitos obrigacionais e efeitos reais. No entanto, e nos termos do artigo 408º nº2 CC, se a
transferência respeitar, entre outros a coisa futura, o efeito real apenas se verifica quando a coisa
for adquirida pelo alienante, ou seja, tratando-se de frutos naturais no momento da sua colheita
ou separação. Existe, no entanto, nos termos do artigo 880º nº1 a obrigação do vendedor de
exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos.

Quanto ao direito de B exigir a devolução do preço entretanto pago pela resina, este dependerá
do facto de entre A e B ter sido celebrado um negócio aleatório ou comutativo. Com efeito, e
apesar da correspetividade da prestação de ambas as partes, se A e B pretenderam sujeitar-se a
uma incerteza, fixando o preço da resina na sua totalidade e independentemente do que
efetivamente conseguissem colher, então estaríamos perante um negocio aleatório sendo o preço
devido mesmo havendo impossibilidade da prestação, nos termos do disposto no artigo 880º nº2
CC. Se, pelo contrário, as partes tiverem estabelecido um valor por cada quilo de resina, tendo-se
feito o adiantamento de uma pequena parte estaríamos no âmbito de um negocio comutativo em
que as partes sabem de antemão os sacríficos patrimoniais a que estão sujeitos e nessa situação o
vendedor ficará apenas obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador
adquira os bens vendidos correndo o perecimento ou deterioração da coisa por causa não
imputável ao alienante por conta do adquirente.

** Nota: Conclusão do acórdão - o contrato não é aleatório e por isso o preço não era devido.

4.

A é credor de B da quantia de 2.500 euros, em virtude de um empréstimo realizado em favor deste


último em Dezembro de 2008. Nada ficou acordado quanto ao momento da devolução da quantia
emprestada, tendo, no entanto, A, concordado com a restituição da quantia em singelo.

Entretanto B, encontrando-se com sérias dificuldades económicas, doou a sua casa a um seu filho e
vendeu uns terrenos de que era proprietário a um seu empregado, tendo sido acordado com este a
devolução dos mesmos terrenos quando B se restabelecesse financeiramente.

Terá A alguma possibilidade de agir contra estes negócios?

(Não é caso de exame)

O contrato celebrado entre A e B é um contrato de mútuo. Com efeito, nos termos do disposto no
artigo 1142º CC, mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra
coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.
Não obstante o principio da liberdade contratual previsto no artigo 219º CC; estabelece o artigo
1143º CC que o contrato de mútuo superior a 20000 euros só é valido se for celebrado por
escritura publica e de valor superior a dois mil euros se for celebrado por documento assinado
pelo mutuário. O contrato de mútuo pode ser oneroso ou gratuito, consoante tenham as partes
estipulado, ou não o pagamento de juros como retribuição do mútuo (artigo 1145º CC).

Quanto à classificação entre contrato unilateral e bilateral, o contrato de mútuo é ainda


considerado um contrato unilateral porquanto se considera que o empréstimo faz parte
integrante do contrato pelo que apenas haverá a obrigação de uma das partes, obrigação esta que
se traduz na restituição de outro tanto do mesmo género e quantidade.

Nos termos do artigo 1144º CC, com a entrega as coisas mutuadas tornam-se propriedade do
mutuário, contrariamente ao que se verifica noutros contratos como por exemplo, o comodato
(contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra coisa móvel ou imóvel para que se
sirva dela com obrigação de restituir). Na situação em apreço, e atendendo ao valor mutuado, nos
termos do artigo 1143º CC, para se cumprir a exigência de forma bastará documento assinado pelo
mutuário. Ainda, e atendendo a que não se estabeleceu o prazo para a devolução da quantia
mutuada, nos termos do artigo 1148º nº1 CC, a obrigação do mutuário só se vence 30 dias após a
exigência do seu cumprimento. Aplica-se, assim, o regime do artigo 777º CC onde se refere que na
falta de estipulação de prazo cabe ao credor a interpelação do devedor no sentido do
cumprimento. Também, o artigo 805º CC estabelece que o devedor só fica constituído em mora
depois de ter sido interpelado judicial ou extra judicialmente para cumprir.

Esta interpelação judicial ou extra judicial consubstancia, dentro dos simples atos jurídicos, que se
distinguem dos negócios jurídicos porquanto os efeitos produzidos decorrem diretamente da lei,
independentemente de existir ou não uma vontade concorrente no mesmo sentido, um quase
negocio jurídico uma vez que há uma manifestação exterior de uma vontade. Os efeitos da
interpelação decorrem diretamente da lei embora haja uma declaração de vontade por parte do
credor.
Quanto à compra e venda realizada, este negocio encontra-se viciado de simulação. A simulação,
verifica-se sempre que por acordo entre declarante e declaratário e no intuito de enganar
terceiros houver divergências entre a declaração negocial e a vontade real do declarante (artigo
240º nº1 CC). Nos termos do nº2 do referido artigo 240º, o negocio simulado é nulo, mais
estabelecendo o artigo 242º CC a possibilidade dos próprios simuladores entre si arguirem a
simulação. Não haverá, no entanto, possibilidade de arguir a simulação pelo simulador contra
terceiro de boa fé consistindo a boa fé na ignorância da simulação ao tempo em que foram
constituídos os respetivos direitos (artigo 243º CC). A nulidade, decorrente da simulação é
invocável a todo o tempo, pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal e tem efeito retroativo
nos termos dos artigo 286º e 289º CC.

Quanto ao contrato de doação de bem imóvel, este é o contrato pelo qual uma pessoa, por
espírito de liberdade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um
direito, ou assume uma obrigação, em beneficio do outro contraente (artigo 940º nº1 CC).
Efetivamente, a doação tem como principais efeitos a transmissão da propriedade da coisa ou da
titularidade do direito, a obrigação de entregar a coisa e a assunção da obrigação, quando for esse
o objeto do contrato (artigo 954º CC). Não obstante o principio da liberdade de forma
estabelecido no artigo 219º no CC, segundo o qual a validade da declaração negocial não depende
por regra da observância de forma especial, impõe o artigo 947º do CC que a doação de bens
imóveis só é valida se for celebrada por escritura publica ou por documento particular
autenticado.

Para garantir o cumprimento das obrigações, estabelece o CC o principio geral segundo o qual
respondem todos os bens do devedor suscetiveis de penhora, nos termos do artigo 601º CC. Mais
estabaelceu o legislador mecanismos de conservação de garantia patrimonial. A impugnação
pauliana, prevista nos artigos 610.º e seguintes do CC permite que um credor possa perseguir os
negócios celebrados pelo seu devedor, ou seja, de poder atacar os negócios celebrados pelo seu
devedor, para garantia de cumprimento do seu crédito. Imagine-se que o devedor pratica uma
série de atos, colocando em risco a satisfação do credito do credor. Nestas situações, o legislador
faculta ao credor a possibilidade de, preenchidos determinados requisitos impugnar determinados
negócios.

São requisitos da impugnação pauliana os atos que envolvam diminuição da garantia patrimonial
do crédito desde que o crédito seja anterior ao ato, ou tendo sido posterior ter sido o ato
praticado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor e resultar do
ato a impossibilidade para o credor de obter a satisfação integral do seu crédito ou agravamento
dessa possibilidade, nos termos do artigo 610º CC. Ainda, nos termos do artigo 612.º do CC esta
possibilidade de impugnar os atos do devedor é muito mais fácil ou difícil, consoante os atos em
causa sejam onerosos ou gratuitos, porque no caso dos contratos onerosos, o credor – à partida –
não fica desprotegido. Os atos onerosos só podem ser impugnados, quando o credor consegue
provar a má-fé do devedor e do terceiro (quando foi praticado para o prejudicar). Quanto aos
negócios gratuitos, independentemente de terem sido ou não praticados de boa ou má fé,
poderão ser impugnados.

Assim, na situação em apreço, e atendendo a que estão preenchidos os requisitos da impugnação


pauliana referidos supra, a doação da casa ao filho facilmente, podia ser impugnada, uma vez que
se trata de um negócio gratuito. Já quanto à venda (contrato oneroso), seria muito mais
dificultada a impugnação pauliana, na medida em que se teria de provar a má-fé das partes, ou
seja, o intuito de o prejudicar.
Nos termos do artigo 618º CC o direito de impugnação caduca ao fim de 5 anos contados da data
do ato impugnável.

5.

B, pretendendo comprar uma máquina de cortar relva eléctrica, enviou uma carta nesse sentido à
empresa C, especializada na venda de materiais de jardinagem através de catálogo, especificando o
modelo pretendido. A carta foi expedida, na modalidade de correio azul, no dia 14 de Abril. Na noite
do mesmo dia 14, aquando da realização das suas compras mensais num hipermercado, B deparou-
se com o mesmo modelo de máquina de cortar a relva na secção de promoções, à venda por um
preço substancialmente inferior. Assim, pretendendo desvincular-se da encomenda efectuada,
enviou nessa mesma noite um fax para os escritórios da empresa C, considerando sem efeito a sua
carta de 14 de Abril. A pessoa encarregada de "despachar" as encomendas tomou conhecimento do
fax na manhã do dia seguinte, no início do expediente, antes mesmo de receber a correspondência
do dia, onde se incluía a carta de B. Poderá B devolver a máquina encomendada quando, dias mais
tarde, ela é enviada à cobrança para a sua morada?

O caso em apreço enquadra-se em matéria


regulada pelo Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14
de fevereiro que transpõe a Diretiva n.º
2011/83/UE do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa
aos direitos dos consumidores




A questão que se coloca aqui é, no enquadramento geral, se trata/se temos contrato ou não, foi
ou não celebrado um contrato com obrigação de pagar a maquina da relva. Em termos concretos,
atendendo à sua declaração de vontade sendo expressa, o critério pela qual nos pautamos para
saber se é uma aceitação ou se é uma proposta, é o critério de qual é o valor da declaração de
vendedor? É o catálogo, e qual é o seu valor? Pois a questão que se coloca é se ele está a aceitar
uma proposta ou se está a fazer uma nova proposta. O catálogo pode ser um convite a contratar
ou uma proposta contratual, sendo esta a primeira declaração de vontade por parte de C.
Consecutivamente, quanto a este catálogo tínhamos de referir o dl 24/2014 no artigo 21º, de
forma a concluir se este mesmo catalogo assumiu as características/elementos formais/essenciais
referidas nesse decreto de lei especial. Caso, o vendedor se vincule a esse mesmo catalogo, temos
uma proposta contratual, senão existir é, a sua declaração torna-se apenas um mero convite a
contratar.
B enviou uma carta a dizer que quer aquela máquina, existe vontade de vinculação, mas esta ou é
uma proposta da aceitação anterior ou é uma proposta de convite a contratar. É uma declaração
expressa, artigo 217º, sendo esta mesma declaração assistida pela liberdade de forma de acordo
com o artigo 219º, já que se trata de um bem móvel, não estando enquadrado no artigo 204º. Mas
qual o seu efeito/eficácia ? (é proposta ou aceitação?) B emite uma declaração negocial, mas
depois muda de opinião, pois se fosse uma proposta partimos da irrevogabilidade do artigo 230º,
sendo que no nº2 a proposta fica sem efeito. E se a declaração de B é uma aceitação aplica-se o
artigo 235º nº2 antes de chegar ao proponente. Quanto à eficácia desta declaração? Artigo 224º:
doutrina da receção, em que as declarações tornam-se eficazes quando chegam ao destinatário.
Por isso quanto às declarações que B emitiu, quando é que estas tornam-se eficazes? O fax só é
eficaz quando abrir o horário de expediente, concretamente no dia 15 de abril e não no dia 14 à
noite, pois devemos ter e, conta o horário de funcionamento da empresa C, porque o fax só pode
ser conhecido quando chega, não interessa se foi enviado de madrugada, pois o fax só adquire
eficácia quando este pode ser devidamente conhecido/analisado. A carta, só se torna eficaz
quando chega ao estabelecimento da empresa. Em suma, não chega a haver contrato, pois quer
sendo proposta ou aceitação, o contrato não se chega a concluir, porque o fax em que expressa a
vontade de revogabilidade ou da proposta (nº2 do artigo 230º) ou da aceitação (nº2 do artigo
235º) por parte de B chega primeiro do que a carta onde o mesmo expressa celebrar op contrato
de compra e venda com a prestação de obrigação de pagar o preço da máquina. Assim, B não terá
que pagar a máquina.

6.

No dia 12 de Abril A telefonou a B propondo-lhe a compra da sua mota da marca BMW, com
matrícula de 2000, pelo preço "de mercado". B respondeu imediatamente "negócio fechado",
ficando combinado que A iria buscar a mota à garagem X, onde ela estava guardada, e que
"levantaria" a chave na recepção da mesma garagem. No entanto, quando A foi buscar a mota dois
dias mais tarde, foi informado que a mota tinha sido roubada na véspera, juntamente com outros
veículos motorizados que se encontravam na garagem. Perante esta situação, A entende não ter que
pagar a quantia de 2.000 euros que B lhe vem exigir, apesar de concordar que este era o preço
correspondente à antiguidade e estado de conservação da moto... se esta lhe tivesse sido entregue.

No dia 12 de abril A telefonou a B propondo-lhe a compra da sua mota da marca BMW (bem
móvel sujeito a registo, daí que seja obrigatória a publicitação da aquisição, como garantia de
eficácia face a terceiros), com matrícula de 2000, pelo preço "de mercado". B respondeu
imediatamente "negócio fechado". Nos termos do artigo 219º CC, por regra, a declaração negocial
não depende da observância de forma especial. Também, e à contrario do previsto no artigo 875º
CC, o contrato de compra e venda de bens móveis não exige a celebração por escritura publica ou
DPA. Na situação em apreço, temos duas declarações negociais expressas, nos termos do artigo
217º nº1 CC, uma vez que foram feitas por palavras, sendo que se tornaram eficazes no momento
do telefonema de acordo com a teoria da receção. O facto de não ficar estabelecido o valor ou o
preço não afasta a perfeição da declaração negocial, não sendo, por isso, de aplicar o artigo 232º
CC, e considerando-se assim que as partes acordaram todas as cláusulas sobre as quais qualquer
delas tenha jugado necessário o acordo. Com efeito, e nos temros do artigo 879º CC, podem as
partes não determinar o preço e celebrar validamente um contrato desde que o preço seja
determinável. Estabelece a este propósito o artigo 883º CC que se o preço não estiver fixado por
entidade publica e as partes não o determinarem nem convencionarem o modo dele ser
determinado, vale como preço contratual o que o vendedor normalmente praticar à data da
conclusão do contrato ou, na falta dele, o de mercado ou bolsa no momento do contrato e no
lugar em que o comprador deva cumprir. Mais estabelece o artigo 885º nº1 CC que o preço deve
ser pago no momento e no lugar da entrega da coisa.

Considerando-se celebrado o contrato, deste decorrem dois efeitos obrigacionais,


designadamente a obrigação de entrega da coisa e obrigação de pagar o preço; tínhamos aqui uma
aquisição derivada translativa. Para além destes efeitos obrigacionais, nos termos do artigo 879º
CC a compra e venda tem ainda como efeito a transmissão da propriedade da coisa, a qual se
verifica, por regra, por mero efeito do contrato, nos termos do artigo 408º nº1 CC. Assim sendo, A
é proprietário da mota, tendo por isso a obrigação de pagar o preço nos termos do artigo 879º c) e
875º CC. Mais estabelece o artigo 876º CC que transmitida a propriedade da coisa e feita a sua
entrega o vendedor não pode resolver o contrato por falta de pagamento da coisa. A entrega da
coisa não chegou a realizar-se por facto não imputável a B. Ora, levanta-se a questão de quem
assume o risco pelo perecimento ou deterioração da coisa. Nos termos do artigo 796.º n.º 1 do CC
transferida a propriedade da coisa, há transferência de risco. Com efeito, nos contratos que
importem a transferência de domínio sobre certa coisa ou que constituam ou transfiram um
direito real sobre ela, o perecimento ou deterioração da coisa, por causa não imputável ao
alienante corre por conta do adquirente, salvo se a coisa tiver continuado em poder do alienante
em consequência de termo constituído a seu favor. Assim, poderíamos dizer que se justifica A ter
de pagar mesmo tendo ficado sem a mota, porque poderia, ainda assim, ter ido buscar a mota, no
momento em que se tornou proprietário.

Aula Prática 12/03/2018

Acórdão Tribunal da Relação do Porto - Processo nº 713/09

Declaração tácita não é a mesma coisa que silencio e, portanto, não está sujeito às mesmas regras
que a declaração tácita. A falta de um comportamento equivale ao silencio e só pode ser tido
como declaração negocial nos termos do artigo 218º CC. Uma declaração tácita pressupõe uma
declaração/comportamento negocial – é um meio indireto. Dedução desse comportamento de
uma vontade no sentido declarativo distinto. Em suma, o erro está no facto de a declaração tácita
não ser a mesma coisa que o silêncio, sendo que a omissão da declaração negocial é equivalente
ao silêncio, pois isso pode ser tomado como declaração negocial, nos termos do artigo 218º, sendo
que a declaração tácita propõe um comportamento. O comportamento não é extraditado a essa
mesma vontade, há vontade negociar mas do comportamento deduz-se a possível vontade,
enquanto que no silencio não há comportamento, mas sim omissão. Assim neste caso trata-se de
silêncio, só não se trata de silêncio quando a lei exige que a mesma declaração seja expressa.

7.

a) A recebeu no dia 10 de Abril uma carta de B pela qual este manifestava o seu desejo de lhe vender
a sua casa de férias pelo preço de 200 mil euros e respondeu-lhe uma semana mais tarde, via fax,
mostrando-se disposto a pagar 170 mil euros pelo imóvel.
Alguns dias depois, B enviou a A uma segunda carta dizendo que aceitava a sua oferta e marcando a
escritura pública de compra e venda para 15 de Maio.

No dia acordado, quando A compareceu no cartório notarial, tomou conhecimento de que a casa de
férias de B tinha entretanto sido vendida por este a C, pela quantia de 190 mil euros. Quid iuris?

Na situação em apreço estaremos no âmbito negocial com vista à celebração de um contrato de


compra e venda de um bem imóvel. Nos termos do artigo 875º do CC que a compra e venda
(contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa ou de um direito mediante um preço)
de bens imóveis só é valida se for celebrada por escritura publica ou por documento particular
autenticado. Assim sendo, aceitando-se a carta como declaração negocial esta sempre seria nula
porquanto carece da forma legalmente prescrita, nos termos do artigo 220º CC. Ainda, e nos
termos do artigo 232º é necessário que as partes tenham acordado em todas as cláusulas sobre as
quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo. Assim sendo, e uma vez que não se
encontram preenchidos os requisitos de validade da declaração negocial podemos entender a
carta como inicio de negociação de um contrato, o mesmo se verificando com a carta de aceitação.
Nos termos do artigo 227º CC na formação dos contratos (tanto nos preliminares como na
formação) devem as partes proceder segundo as regras da boa fé sob pena de responsabilidade
pelos danos culposamente causados à outra parte, designadamente o interesse contratual
negativo.

Quanto ao fax, também aqui, à semelhança do que se referiu supra, estaríamos mediante uma
declaração de vontade invalida por inobservância de forma legal nos termos do artigo 220º CC.

Assim, na situação em apreço, e atendendo ao estado avançado das negociações, apesar de não
existir contrato haverá responsabilidade pré contratual de B por violação culposa do principio da
boa fé na formação do contrato, nos termos do artigo 227º CC. Havendo danos resultantes da
culpa in contrahendo a indeminização não se refere ao interesse positivo mas apenas ao interesse
negativo, ou seja, reporta-se aos danos resultantes de ter existido confiança na validade do
contrato, danos estes que são os que não teria sofrido se não tivesse confiado na realização do
contrato; só se indemnizando o interesse positivo, ou seja, o interesse de cumprimento, se a dita
culpa estiver na violação de um dever de conclusão de um contrato. Aqui, a boa fé é analisada em
sentido objetivo, ou seja, como regra de conduta; devendo colocar-se o lesado na situação em que
estaria se não tem chegado a depositar uma confiança afinal frustrada, na celebração de um
contrato válido e eficaz.

b) Supondo que, não obstante o contrato concluído com C, é celebrada a escritura de compra e
venda agendada para 15 de Maio e que A regista imediatamente a sua aquisição (antes mesmo de C
o fazer), diga que direitos assistem a A sobre o imóvel.

No primeiro negócio não temos razão nenhuma para inspecionar a invalidade do negócio
celebrado, sendo que produz os seus efeitos em que o C torna se proprietário por via do artigo
879º, sendo que a sua aquisição é inoponível para efeitos de registo de acordo com o artigo 4º do
Código de registo predial. Relativamente a A, este não é proprietário, já que se trata de um acordo
de venda de bens alheios, sendo a mesma nula por efeitos do artigo 892º, contudo A registando,
temos o efeito central do registo e o efeito de decadência do direito de propriedade e a
prevalência do direito de registo, A torna-se assim proprietário, sendo uma exceção ao princípio
do nemo plus iuris, em que C vê o seu direito de proprietário decair.
Em suma: efeito central do registo (CRP)

1º negocio: formalmente valido, produz efeitos, C torna-se proprietário 879º e 408º CC. Sendo
valido, a sua aquisição é inoponível a terceiros para efeitos de registo (CRP)

2º negocio: venda de bens alheios, ilegitimidade do transmitente, não pode transmitir direito que
não existe na sua esfera, principio nemo plus iruis, aquisição derivada translativa. A nada adquiria.
A regista antes de C, 3º para efeitos de registo, efeito central do registo, A torna-se proprietário.
exceção ao principio nemo plus iuris.

8.

1. A, pretendendo arrendar um apartamento de que era proprietário na zona de Matosinhos,


colocou para o efeito um anúncio num jornal de âmbito nacional, indicando a área do imóvel, a sua
localização e o preço pretendido. Perante as inúmeras respostas recebidas, A decidiu colocar novo
anúncio no mesmo jornal, exigindo uma renda superior em 20% à indicada primeiramente.

Perante o sucedido, Z, cuja resposta foi a primeira a chegar à redação do jornal, vem reivindicar para
si a condição de novo arrendatário da fracção, acrescentando, porém, que apenas pagará a renda
inicialmente publicitada. Terá razão na sua pretensão?

Na situação em apreço estaremos no âmbito negocial com vista à celebração de um contrato de


arrendamento de um prédio urbano para habitação. Nos termos do artigo 1069º do CC o contrato
de arrendamento urbano deve ser celebrado por documento escrito desde que tenha duração
superior a 6 meses. Ainda, e nos termos do artigo 232º é necessário que as partes tenham
acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo.
Assim sendo, e uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos de validade da
declaração negocial podemos entender o anuncio como inicio de negociação de um contrato, o
mesmo se verificando com a respostas. Há assim, portanto, apenas um convite a contratar, não
havendo por isso um contrato que vincule as partes.

Nos termos do artigo 227º CC na formação dos contratos (tanto nos preliminares como na
formação) devem as partes proceder segundo as regras da boa fé sob pena de responsabilidade
pelos danos culposamente causados à outra parte, designadamente o interesse contratual
negativo, equacionando-se, por isso, apenas a questão da responsabilidade pré contratual de A.

Ainda, A ao decidir não arrendar pelo valor inicialmente pedido, mas exigindo 20% a mais de
renda, poderíamos estar no âmbito da aceitação com modificações prevista no artigo 233º CC.
Esta importa a rejeição da proposta só implicando uma nova proposta se for suficientemente
precisa. Assim sendo, e uma vez que não há um acordo de vontades Z não poderá arrogar-se como
arrendatário da referida fração.

2. E se, entretanto, A morre num acidente de automóvel, antes mesmo de responder a Z?


Como se referiu, a aceitação com modificações se for suficientemente precisa equivale a nova
proposta caso contrário implica rejeição da proposta nos termos do artigo 233º CC. Ora, se A
morre antes de responder a Z que pretende arrendar o imóvel pelo valor inicial, então uma vez
que o declaratário morreu, a proposta torna-se ineficaz.

9.

A e B acordaram na celebração de um contrato pelo qual o primeiro venderia ao segundo um imóvel


de que era proprietário pelo preço de 100.000 euros. No entanto, na escritura de compra e venda, o
preço declarado foi apenas de 50.000 euros, pretendendo desta forma A e B minorar as suas
obrigações fiscais. Ainda assim, as partes redigiram um documento particular, assinado por ambos,
onde constava o real preço do imóvel e através do qual A e B se comprometiam a não revelar as
verdadeiras condições do negócio e a não invocar qualquer invalidade a ele inerente.

B, porém, após o pagamento da quantia de 50.000 euros, declarou a A que "a sua dívida estava
liquidada" e nada mais lhe devia, como de resto decorria da própria escritura pública. Poderá A,
perante esta atitude de B, exigir a devolução do imóvel, alegando a nulidade do contrato celebrado?

Na situação em apreço estamos perante um contrato de compra e venda de bens imóveis, o qual
vem definido como contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa mediante um
preço (artigo 874º CC). O artigo 875º CC estabelece que a a venda de bens imóveis só é válida se
for celebrada por escritura publica e o artigo 879º CC os efeitos da compra e venda
designadamente os efeitos reais (transmissão da propriedade da coisa) e os efeitos obrigacionais
(obrigação de entregar a coisa e obrigação de pagar o preço). No contrato celebrado verifica-se
uma divergência da vontade e da declaração, uma vez que A e B contataram em 100 mil euros o
valor da venda, declarando na escritura celebrada apenas o valor de 50 mil euros. Assim, estamos
perante um negocio simulado, ou seja, por acordo entre o declarante e o declaratário e no intuito
de enganar terceiros verifica-se divergência entre a vontade negocial e a vontade real dos
declarantes. Com efeito, para além da divergência há um conluio entre as partes e vontade de
enganar terceiros, nomeadamente a administração fiscal). O negocio simulado é nulo, nos termos
do artigo 240º nº2 CC. Na situação em apreço, verifica-se uma simulação relativa objetiva quanto
ao valor do negocio porque existe efetivamente um outro que as partes quiseram realizar (artigo
241º CC).

O negocio A e B à 50 mil euros é um negocio simulado, portanto nulo e o negocio A e B à 100 mil
euros é um negócio dissimulado.

Nos termos do artigo 241º nº1 CC, ao negocio dissimulado é-lhe aplicado o regime que lhe
corresponderia se fosse concluído sem dissimulação não sendo a sua validade prejudicada pela
nulidade do negocio simulado; exigindo-se no entanto a observância da forma exigida por lei.
Assim, o negocio simulado é apreciado separadamente do negocio dissimulado. No caso em
apreço, não temos indicação de vício substancial. A questão levanta-se quanto à forma do
negocio: artigo 241º nº2 CC. Pode aproveitar-se a forma do negocio simulado? Segundo Antunes
Varela, tendo em conta o principio geral de aproveitamento da forma, sim (Antunes Varela). Já
Mota Pinto é mais rigoroso em relação ao aproveitamento da forma. Contudo, tem-se entendido
que se poderia aproveitar a forma do negocio simulado e, por isso, o dissimulado seria
formalmente valido na medida em que temos escritura publica em que A vende a B, nos termos
artigo 875ºCC. Assim sendo, e uma vez que o negocio é válido, B tem que pagar.

A pode requerer nulidade? Nos termos do artigo 242º do CC, a nulidade do negocio simulado pode
ser arguida pelos próprios simuladores entre si ainda que a simulação seja fraudulenta e com
intuito de prejudicar terceiros. Não pode a nulidade ser arguida pelo simulador contra terceiro de
boa fé enquanto ignorância da simulação ao tempo em que foram constituídos os respetivos
direitos, nos termos do artigo 243º CC.

No caso, “as partes redigiram um documento particular, assinado por ambos, onde constava o real
preço do imóvel e através do qual A e B se comprometiam a não revelar as verdadeiras condições
do negócio e a não invocar qualquer invalidade a ele inerente”. Este pacto não se pode sobrepor
aos interesses públicos, sendo este compromisso assumido entre A e B inválido porquanto
contraria os princípios de ordem publica, pelo que as partes não podem afastar particularmente a
possibilidade que têm de invocar nulidade.

Assim, quanto à possibilidade de A poder obter de volta o imóvel com arguição da nulidade, B é
proprietário do imóvel. Com a declaração de nulidade do 1º negocio não obtém a propriedade do
imóvel porque já transmitiu a propriedade com o 2º negocio que como se disse aproveita a forma
do primeiro.

A tem o direito de exigir o que falta pagar (50 mil euros), sendo que, e uma vez que se trata de um
documento autentico e que, portanto, faz fé publica, nos termos do artigo 370º nº2 e 371º do CC,
não é admissível a prova de testemunhos contra documento autentico, nos termos do artigo 394º
CC.

Concluindo, A pode arguir nulidade do negocio simulado, no entanto, não obtém a propriedade do
prédio de volta porque esta se transmitiu a B com a celebração do negócio dissimulado que é
valido, logo e, uma vez que comprou por 100 mil euros, B tem que faltar o valor em falta.

10.

B, correligionário político de C (titular de um cargo público), pretendendo compensá-lo por diversos


favores que este lhe prestou ao longo de vários anos de luta partidária, resolveu oferecer-lhe um
quadro a óleo de Amadeo de Souza-Cardoso, pertencente à sua coleção particular. No entanto,
pensando que este tipo de “atitudes” poderiam ser vistas com desconfiança pelos partidos da
oposição e pelo público em geral, combinou com D, negociante de arte, realizar com este um
“negócio fantasma”, pelo qual lhe venderia o óleo em questão, devendo D, de seguida, realizar com
C um outro negócio do mesmo teor. Ficou acordado que nenhum preço seria pago aquando destas
transações. Assim, em Fevereiro deste ano, B e D reduziram a escrito um contrato de compra e
venda do óleo de Souza-Cardoso. Porém, D, vendo-se na posse do quadro e do título de aquisição
respectivo, mudou de opinião e recusou-se a entregar o quadro a C quando este, no dia acordado, se
dirigiu ao seu estabelecimento a fim de “levantar” o quadro.

Diga de quem seria a propriedade do quadro tendo em conta que, entretanto, D o vendeu a E.

No caso em apreço, estamos perante uma situação de simulação, ou seja, de divergência entre a
vontade declarada e a vontade real do declarante. Com efeito, B queria doar a C, mas vendeu a D,
ficando combinado que depois D venderia a C. Trata-se, portanto, de uma simulação relativa
subjetiva com interposição fictícia de pessoas e objetiva quanto à natureza do negócio (porque os
negócios simulados eram compras e vendas e o negocio dissimulado era uma doação). O segundo
negócio projetado simulado não chegou a acontecer.

O negócio dissimulado não chegou a acontecer – estava projetado, mas só o teríamos com a
realização do segundo negócio simulado.

Assim, B continua a ser o proprietário do quadro porque só temos um negócio nulo, que não
produz efeitos jurídicos nos termos do artigo 240º CC.

No entanto, apesar do negocio ser nulo, D vendeu a E o referido quadro, levantando-se a questão
de E ser ou não protegido - problema de proteção de terceiros de boa fé relativamente a negócio
inválido. De acordo com o princípio nemo plus iuris e atendendo à nulidade decorrente da
simulação do negocio celebrado entre B e D, à partida, D nada adquiriu e por isso não pode
transmitir (aquisição derivada translativa – nemo plus juris). No entanto, estamos no âmbito das
exceções a este princípio, aplicando-se o artigo 243º, onde se refere que a nulidade proveniente
da simulação não pode ser arguida pelo simulador contra terceiro de boa fé. Assim, para E
adquirir, tinha de desconhecer a simulação no momento da celebração do negócio, com ou sem
culpa.

Se tudo tivesse ocorrido conforme o combinado, tínhamos dois negócios nulos por simulação e um
negócio válido (o dissimulado), formal e substancialmente – teríamos negócio de doação,
levantando-se apenas a questão da forma se não houvesse traditio.

11.

F casou em Agosto de 2005 com G, o qual era conhecido pela sua moral conservadora, razão pela
qual F lhe ocultou alguns factos ocorridos durante a sua vida de solteira. G veio, no entanto, a
falecer precocemente em Dezembro de 2007, em consequência de um acidente de viação. Alguns
meses antes F havia sido abordada por um seu antigo condiscípulo, H, que exigira que ela lhe doasse
um barco de recreio, sob pena de contar a G factos da vida passada de F, designadamente o facto de
ela ter vivido maritalmente com I durante vários anos. F acedera prontamente às exigências de H e
em Julho de 2007 comprara a J um barco de recreio usado, que imediatamente doara e entregara a
H. Porém, para que o seu marido de nada desconfiasse, F havia convencido J a fingir uma compra e
venda com H, de modo a que, embora sendo ela a pagar o preço acordado, não figurasse como
interveniente no negócio que J e H reduziram a escrito.

F pretende hoje reaver o barco que doou a H, pelo que, já em Janeiro deste ano, instaurou a
competente ação.

Terá F êxito na sua pretensão? A solução seria a mesma se o objecto do negócio tivesse sido um
terreno?

Mesma lógica do anterior.

Se fosse um terreno aplicava-se a regra do registo; questão da forma.

Simulação relativa subjetiva. contraente real que é suprimido, não se trata de interposição fictícia
de pessoas, oculta-se um contraente que é um contraente real (F).

Negócio simulado e dois negócios dissimulados. O simulado é nulo (artigo 240º CC). Barco de
recreio não está sujeito a forma. Artigo 241º CC.

Negocio J-F e F-H, em ambos os negócios a vontade F de comprar e depois doar está inquinada em
virtude de uma ameaça de H. Negócios dissimulados são

Artigo 255º CC, vício da vontade. Verificam-se os pressupostos. A ameaça é ilícita. Anulabilidade
com fundamento em coação.

Negocio J-F à artigo 256º 2ª parte.

Negocio F-H à anulável, artigo 256º 1ª parte

Artigo 287º CC à F só terá êxito na sua pretensão se arguir anulabilidade dentro do tempo.

12.

X, especialista em filatelia e colecionador de selos raros, sabendo que Z, seu habitual fornecedor,
dispunha de um selo que há muito tempo procurava, decidiu-se a adquiri-lo imediatamente, antes
que outros colecionadores tivessem conhecimento da sua existência. No entanto, não podendo
deslocar-se pessoalmente ao estabelecimento de Z, pediu ao seu amigo W que o fizesse, dando-lhe
instruções precisas quanto ao selo a adquirir: um selo "D. Maria II" de 1853. W, uma vez no
estabelecimento de Z, pediu-lhe "o selo raro de 1953, com a D. Maria II, para o Sr. X". Z, embora
estranhando o pedido de X, uma vez que o selo em causa (uma edição comemorativa da edição do
selo de facto pretendido por X) era bastante vulgar, limitou-se a cumprir com o pedido. Poderá X,
uma vez descoberto o engano, "desfazer" o negócio?

Estamos numa situação de divergência entre vontade e declaração, no entanto, não parece que
haja dolo. Nos termos do artigo 250º nº1 CC, a declaração negocial transmitida de forma inexata
por quem seja incumbido da transmissão pode ser anulada nos termos do artigo 247º CC, desde
que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade para o declarante do
elemento sobre que incidiu o erro. Mais estabelece o artigo 250º nº2 CC que é sempre anulável a
declaração se a inexatidão for devida a dolo do intermediário.


W está apenas a emitir de forma errada a informação de X, não estando a atuar em
representação, é um simples núncio – não é um representante, é menos, não chega a tanto, nem é
intermediário – limita-se a transmitir uma declaração negocial alheia, não tendo autonomia,
sendo mais um “fio de telefone”.

Assim sendo, a declaração negocial transmitida por H pode ser anulada nos termos do artigo
247º CC, ou seja, desde que preenchidos os requisitos do erro na declaração aí estabelecidos
(artigo 250º nº1 CC). Quer isto dizer que, para poder ser anulada a declaração negocial
inexactamente transmitida, o declaratário tem que mais ou menos participar/conhecer a vontade
do declarante. Na situação em apreço, parece-nos que mesmo que Z não soubesse da
essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro, parece-nos que não podia ignorar essa
essencialidade, ou seja, para que o negocio seja anulável, Z tinha que saber mais ou menos o
negocio que X queria fazer. Assim sendo, X poderá arguir a anulabilidade da declaração negocial
no prazo estabelecido no artigo 287º CC. Ainda, só tem legitimidade para arguir a anulabilidade,
contrariamente do que se verifica com a nulidade, as pessoas em cujo o interesse a lei estabelecer.

Como alternativa, a anulabilidade fundada em erro na declaração não será procedente se o


declaratário aceitar o negócio como o declarante o queria.

13.

Em Janeiro de 2000, A adquiriu a B uma pintura a óleo intitulada “Pôr do Sol”, da qual constava, no
canto inferior direito, manuscrito, “José Malhão/1919”. No momento da entrega da obra foi
imediatamente pago o preço acordado de vinte e cinco mil euros.

Alguns meses mais tarde, quando A confiou a pintura a um galerista para lhe ser colocada uma nova
moldura, este levantou algumas reservas sobre a autenticidade do quadro, o que levou A a solicitar
um exame pericial do mesmo ao Instituto Português do Património Cultural. Tendo esta entidade
concluído, em Novembro do mesmo ano, que a obra em causa não era da autoria do pintor José
Malhão. Apercebendo-se, então, A de que o valor comercial do quadro não ultrapassava os cento e
cinquenta euros, pretende agora de B a devolução do preço pago acrescido dos juros entretanto
vencidos.

B, por sua vez, alega que também ele desconhecia a falsidade da pintura, sendo certo que esta se
encontrava em depósito no Museu José Malhão até ser adquirida por A e que, inclusive, o mesmo
museu por diversas vezes se tinha interessado pela sua aquisição.

Quid juris?

(Cfr. Acórdão da Relação do Porto de 9 de Maio de 1994, in Colectânea de Jurisprudência, III, 1994,
pp. 194 a 197).

Neste caso não temos nenhuma divergência entre a vontade e a declaração, em que A diz quero
comprar este quadro e outro diz que quer vender esse mesmo quadro. O erro está presente não
no objecto, mas sim nas características do mesmo. Consecutivamente, trata-se de um erro na
formação da própria vontade, pois a formação da vontade assentou em motivos que eram
erróneos, pois ele forma a vontade num determinado sentido e expressa-a devidamente, mas não
saber que o quadro não é daquele autor, o processo formativo da vontade está inquinado, não
assentando em bases verdadeiras, mas sim em motivos que não correspondiam com a vontade,
temos assim um erro-vício enquadrado na modalidade do erro sobre o objeto, previsto no artigo
251º. O erro em questão é essencial, e para ser anulável como vamos resolver isto? Quer o
vendedor quer o comprador, estão em erro, e por isso mesmo o negócio é anulável, uma vez que o
comprador só compra se o objeto tiver aquelas determinadas características que são essenciais,
sendo que o requisito essencial é que o declaratário conheça ou não ignore a essencialidade do
elemento sobre qual incidiu o erro, pois o regime do artigo 251º em termos da anulabilidade é
aplicável o disposto pelo artigo 247º. Sendo que o prazo de arguir a anulabilidade só se inicia
quando a pessoa que está em erro sabe da existência desse mesmo erro.

14.

Em Agosto de 2006, A celebrou com B um contrato de compra e venda, mediante escritura pública,
de um terreno com 2.000 m2.

Alguns meses mais tarde, depois de ter solicitado aos serviços camarários competentes uma licença
de construção com vista à edificação de uma moradia no local, A foi informado por estes serviços de
que o terreno em causa se encontrava situado na “Reserva Ecológica Nacional”, concretamente
numa “Área de Salvaguarda Restrita”, onde não era admitida a construção de moradias para
habitação própria.

Perante esta informação, A sente-se enganado por B e pretende reaver dele o preço que pagou pelo
imóvel. B, no entanto, alega que embora soubesse que A procurava um terreno para construir,
pensava que ele não desconhecia o facto de o terreno estar integrado na “Reserva Ecológica
Nacional”, imaginando que A iria aí construir a sua moradia clandestinamente.

Quid juris?

(Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Novembro de 1999, in


<http://www.dgsi.pt>).

Igual ao anterior. Erro sobre o objeto do negocio à artigo 251º CC à anulável (artigo 247º CC).

15.

A, convencido de que sofria de uma grave doença que em breve o vitimaria, decidiu dispor do seu
património ainda em vida a favor dos únicos parentes que tinha: os seus dois sobrinhos B e C. Depois
de uma reunião em sua casa em que pôs B e C ao corrente do seu estado terminal, deslocaram-se ao
cartório notarial onde foram celebradas as escrituras públicas de doação de uma moradia na
Avenida da Boavista e de uma quinta no Minho a favor de B e de C, respectivamente.

Algum tempo depois, A realizou novos exames médicos que revelaram a inexatidão do primeiro
diagnóstico. Perante a expectativa de muitos anos de vida, A, verdadeiramente “renascido”,
pretende reaver as suas propriedades.

Poderá A reaver, efetivamente, os imóveis doados?


Na situação em apreço, não estamos perante um caso de divergência entre a vontade e a
declaração. Com efeito, a declaração de vontade de A, de doar a B e a C o seu património,
corresponde, efetivamente, à sua vontade, não havendo por isso divergência entre vontade
declarada e a vontade real.

No entanto, verifica-se erro sobre os motivos que determinaram a vontade, nos termos do artigo
252º CC. Nos termos do referido artigo, o erro que recaia nos motivos determinantes da vontade
mas não se refira à pessoa do declaratário nem ao objeto do negocio só é causa de anulação se as
partes houverem reconhecido por acordo a essencialidade do motivo. No nº1 do artigo 252º CC,
teve-se a preocupação de garantir o principio da confiança impedindo a anulação de um negocio
que a contraparte nunca teria realizado em termos problemáticos. O nº2 do referido artigo
estabelece ainda que se o erro recair sobre as circunstâncias que constituem a base do negocio e
aplicável o disposto sobre a resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias
vigentes no momento em que o negocio foi concluído. Para que releve o erro sobre os motivos
determinantes da vontade é necessário que tal erro seja essencial e que ambas as partes tenham
aceite e reconhecido essa essencialidade.

A fazendo prova da essencialidade do erro e de que ambas as partes reconhecem o erro, então,
poderá arguir a anulação do negocio. Artigo 437º CC à requisitos

16.

G, comerciante, perante a ameaça de H (a quem G deve várias centenas de milhares de euros) de


requerer ao tribunal competente a sua insolvência, concorda em vender ao mesmo H o seu
automóvel da marca Jaguar pelo preço de cem euros. Algum tempo mais tarde, depois de ter pago
integralmente a sua dívida a H, G pretende reaver o automóvel alienado. Poderá fazê-lo? Quid juris
se G opta antes por receber de H o preço acordado (tendo em conta que este não tinha sido pago no
momento da conclusão do contrato)?

Artigo 255º nº3 CC

17.

D, antiquário, convenceu E a vender-lhe alguns livros da biblioteca que havia herdado de um seu avô
dizendo-lhe que, apesar do seu escasso valor (não mais de 100 €, assegurou), estava disposto a
pagar-lhe o dobro dessa quantia pela sua antiguidade e por ser um curioso das matérias tratadas.

Alguns dias antes de o negócio se concretizar, E recebeu um telefonema de F ameaçando-o


fisicamente, prometendo “partir-lhe as pernas” caso não vendesse os referidos livros a D.

E ignorou as ameaças de que foi alvo mas, ainda assim, decidiu ir avante com o negócio,
considerando o preço oferecido por D muito vantajoso.
Um ano mais tarde, E tem conhecimento de que F tinha entretanto adquirido os livros em causa a D
por um valor elevadíssimo, visto tratarem-se de algumas primeiras edições de tratados clássicos de
direito.

1ª Hipótese: E, pretendendo reaver os livros vendidos, intenta uma ação judicial com fundamento
no comportamento de F.

2ª Hipótese: E alega ter sido enganado por D.

Quid iuris?

Artigo 253º e 254º CC

246º CC à mas não se verifica

18.

A, encontrando-se crivado de dívidas e sendo constantemente pressionado pelos seus credores para
pagar, resolveu pedir ajuda a um seu amigo de infância, B. Numa conversa mantida pelo telefone, B
disponibilizou-se a emprestar a A a quantia por ele pedida para fazer face a uns juros de que era
devedor e que entretanto se venciam.

a) Diga em que momento se poderá considerar celebrado um contrato de mútuo entre A e B.

O mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra ou outra coisa fungível ficando a
segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade (artigo 1142º CC). Nos
termos do artigo 1143º o contrato de mútuo de valor superior a 2000 euros consubstancia uma
exceção ao artigo 219º que estabelece o principio da liberdade de forma, exigindo o legislador a
celebração de documento assinado pelo mutuário ou escritura pública/DPA caso seja superior a
20000 euros. Com a entrega das coisas mutuadas estas tornam-se propriedade do mutuário nos
termos do artigo 1144º CC sendo certo que é aplicável à responsabilidade do mutuante, no mútuo
gratuito o artigo 1134º CC. Ainda, o contrato de mútuo pode ser oneroso ou gratuito consoante as
partes tenham ou não convencionado o pagamento de juros, sendo certo que havendo dúvidas o
mútuo se presume oneroso.

À semelhança do contrato de deposito de comodato e de penhor o mútuo é um contrato que


tradicionalmente a doutrina e a jurisprudência classificava como negocio real, ou seja, como
aquele negocio em que se exige, para além das declarações de vontade das partes, formalizadas
ou não, a prática anterior ou simultânea de um certo ato material. Atualmente, estes contratos
continuam a ser configurados como contratos reais pois na sua definição não se faz referencia a
qualquer obrigação do mutuante, de entrega do objeto/dinheiro; antes de considerando o ato
material da entrega como elemento de estrutura do negocio.

Assim, o contrato entre B (mutuante) e A (mutuário) só se considera concluído com a entrega de B


a A da quantia mutuada.

b) Supondo que B só fingiu aceder ao pedido de A porque o viu tão desesperado que temeu que este
atentasse contra a própria vida — mas que nunca foi sua intenção emprestar-lhe qualquer quantia
—, pronuncie-se sobre as possibilidades que A tem de obter de B o cumprimento da sua promessa,
indicando, por outro lado, os argumentos que B poderá aduzir para obstar ao seu cumprimento.
Como já se referiu na resposta à alínea anterior, o contrato de mútuo é um contrato real que não
se considera perfeito com o simples acordo das partes revestido da forma de vida quando exigível.

A doutrina tem entendido que o contrato de mútuo, verificando-se a não entrega da coisa é um
contrato nulo mas que pode ser convertido num contrato de promessa de mútuo. Com efeito, à
convenção pela qual uma das partes se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as
disposições do contrato prometido excetuadas as relativas à forma que pela sua razão de ser não
devem ser extensivas ao contrato promessa (artigo 410º CC). Ora, o artigo 830º CC estabelece a
execução especifica do contrato promessa segundo o qual se verifica uma atuação judicial que
vem substituir o comportamento do faltoso de forma a garantir ao promitente mutuário obter a
entrega da coisa pelo promitente mutuante.

Parte da doutrina entende que o contrato não obstante ser um contrato que as partes quiseram
como rela este poderá ser convertido em contrato promessa mas não será suscetivel de execução
especifica. Contrariamente, se as partes não quiserem o contrato como real este deve ter-se como
perfeito com o simples acordo das partes (Mota Pinto)

c) Suponha, por último, que B efetivamente adiantou a A a quantia por este solicitada e que, como
contrapartida, A concordou em vender a B a produção de vinho verde que vier a obter este ano
numa pequena vinha que ainda lhe resta na região de Mondim de Basto. Caracterize o contrato
celebrado entre A e B e identifique o momento da transmissão do direito real sobre a produção
vinícola objecto do contrato.

Na situação em apreço, temos que o contrato de mútuo independentemente de assumirmos a


posição da doutrina que entende da necessidade da entrega da coisa para que o contrato seja
celebrado, está validamente celebrado. No entanto, o contrato de mútuo por regra tem como
contrapartida, sendo oneroso, a obrigação de pagamento de juros e não já de qualquer outra
prestação. Assim, parece estarmos perante um contrato de natureza atípica, designadamente uma
figura contratual estabelecida pelas partes que não corresponde aos tipos regulados pela lei, mais
concretamente um contrato misto que reunirá elementos de dois ou mais contratos total ou
parcialmente regulados na lei. Na situação em apreço teremos cláusulas de um contrato de mútuo
e de um contrato de compra e venda de bens ou coisas futuras. Com efeito, nos termos do artigo
211º CC são coisas futuras as que não estão em poder do disponente ou a que a este não tem
direito ao tempo da declaração negocial, mais estabelecendo o artigo 212º CC que diz-se fruto de
uma coisa tudo o que ela produz periodicamente. A venda de bens futuros vem prevista pelo
artigo 880º CC, sendo certo que nos termos do nº1 na venda de bens futuros, de frutos pendentes
ou de partes componentes ou integrantes de uma coisa, o vendedor fica obrigado a exercer as
diligências necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos. O nº2 do artigo 880º CC
consubstancia no âmbito da compra e venda de frutos pendentes um contrato aleatório, ou seja,
em que as partes se submetem a uma álea, ou seja, à possibilidade de ganhar ou perder. Nesta
situação, o risco corre por conta do comprador, sendo devido o preço ainda que a transmissão dos
bens não chegue a verificar-se. Assim, consoante as partes tenham querido ou não submeter-se a
esta possibilidade de ganhar ou perder (celebrando assim um contrato aleatório) a propriedade
transmite-se com a entrega da coisa.

19.
1. Por ocasião da recente visita do Papa Bento XVI ao Porto, A contratou com B, mediante o
pagamento de uma avultada quantia, a possibilidade de utilizar a varanda de um apartamento deste
último a fim de assistir às cerimónias religiosas agendadas para esta cidade. Verificou-se, no entanto,
que no dia previsto para o efeito foi negado a A o acesso ao prédio de B pelos agentes da polícia
responsáveis pela segurança da cerimónia, tendo A sido informado no local que toda aquela zona
tinha sido evacuada conforme tinha sido atempadamente comunicado aos moradores logo que foi
anunciada a visita Papal. Desiludido, A pretende conseguir de B a devolução da quantia já paga pela
utilização da varanda. Quid iuris?

O objeto da relação jurídica é o objeto do direito subjetivo que constitui ou lado ativo da mesma
relação. Com efeito, o objeto é aquilo sobre o qual recaem os poderes do titular de direito sendo o
conteúdo o conjunto de poderes ou faculdades que o direito subjetivo comporta. Estabelece o
artigo 280º a contrario os requisitos do objeto negocial, estabelecendo-se que é nulo o negocio
jurídico cujo objeto seja física ou legalmente impossível, contrário à lei ou indeterminável, mais
estabelecendo que é o nulo o negocio contrario à ordem pública ou ofensivo dos bons costumes.
Na situação em apreço, parece-nos que estaremos perante uma situação de impossibilidade legal
por quanto haveria evacuação da zona, não podendo, assim, B, celebrar com A o contrato em
apreço. Havendo impossibilidade legal, verifica-se nulidade nos termos do artigo 280º CC a qual é
invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo
tribunal nos termos do artigo 286º CC, tendo efeitos retroativos e por isso devendo ser restituído
tudo o que tiver sido prestado ou se a restituição em espécie não for possível, o valor
correspondente, nos termos do artigo 289º nº1 CC.

2. A situação alterar-se-ia se, diferentemente, as cerimónias em causa tivessem sido canceladas face
à impossibilidade de deslocação do Papa em virtude da nuvem de cinza que afectou o tráfego
aéreo?

Diferentemente, nesta situação, não haveria impossibilidade quanto ao objeto/contrato,


verificando-se, no entanto, impossibilidade de cumprimento. Nos termos do artigo 762º CC, o
devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado, mais estabelecendo
o nº2 do referido artigo que no cumprimento da obrigação, bem como no exercício do direito
correspondente devem as partes proceder de boa fé. Estabelece o artigo 790º CC que, em caso de
impossibilidade objetiva, tornando-se impossível a prestação por causa não imputável ao devedor
se extingue a obrigação. Ainda, o artigo 795º CC estabelece que no âmbito de contratos bilaterais
como é o caso se uma das prestações se tornar impossível, fica o credor desobrigado da contra
prestação e tem o direito se já tiver realizado de exigir a sua restituição nos termos previstos para
o enriquecimento sem causa (artigos 473º CC e seguintes).

20.

D adquiriu uma cómoda num leilão de antiguidades por 5.000 euros. No catálogo previamente
distribuído aos assistentes, a cómoda vinha descrita como “Cómoda do séc. XIX; pau-santo com
embutidos; base de licitação: 3.500 euros”. O preço foi imediatamente pago no final do leilão, e a
cómoda foi entregue em casa de D no dia seguinte.

Alguns dias mais tarde, quando D levou a cómoda a um especialista para fazer um pequeno
restauro, foi informado por este de que a cómoda não era, na realidade, de pau-santo mas sim de
castanho pintado. Indignado, D confrontou, de imediato, E, leiloeiro, com esta realidade. E limitou-
se, no entanto, a alegar que desconhecia por completo tal facto, acrescentando que ele próprio
tinha adquirido o móvel em causa na convicção de que se tratava de pau-santo.

1. Caracterize o processo contratual encetado por D e E e diga em que momento se considera


celebrado o contrato de compra e venda.

O contrato de compra e venda é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa
mediante um preço. Na situação em apreço, e tratando-se de um leilão, o preço da venda vai
sendo negociado em função do interesse dos potenciais compradores, considerando-se o negocio
celebrado no momento da ultima apresentação de proposta de preço.

2. Poderá D reaver o montante pago, tendo em conta que havia muito tempo que havia pedido
a E que o informasse sempre que surgissem no mercado móveis de pau-santo, de que era
grande apreciador, nunca tendo adquirido na leiloeira em causa mobiliário com
características diferentes?

O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado estabelecendo o
nº2 do artigo 762º CC um principio geral de boa fé que vincula ambas as partes. Ainda, o artigo
763º CC estabelece que a prestação deve ser realizada integralmente e não por partes. Nos termos
do artigo 769º CC a prestação deve ser feita ao credor ou ao seu representante estabelecendo-se
nos artigo 772º CC e seguintes as regras quanto ao lugar da prestação. Nos termos dos artigos
777º CC e seguintes, o prazo da prestação pode ser estipulada previamente pelas partes sendo
certo que se assim não for o credor tem o direito de exigir a todo o tempo o cumprimento da
obrigação e bem assim o devedor pode a todo o tempo exonerar-se dela através do cumprimento.
Na situação em apreço, estamos perante um contrato de compra e venda de uma coisa defeituosa
porquanto a cómoda (objeto do contrato de compra e venda) não tinha efetivamente as qualidade
asseguradas pelo vendedor (artigo 913º nº1 CC). Na venda de coisas defeituosas o comprador
deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da coisa no prazo de 30 dias depois de
conhecido o defeito e dentro de 6 meses após a entrega da coisa nos termos do artigo 916º nº1 e 2
CC. Mias estabelece o artigo 914º CC que o comprador tem o direito de exigir do vendedor a
reparação da coisa ou se esta tiver natureza fungível a sua substituição, sendo certo que a
obrigação não existe se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade de que a
coisa padece. Na situação em apreço parece-nos que o vendedor não tinha conhecimento de que a
cómoda não tinha as qualidades por si asseguradas, sendo de castanho e não de pau santo pelo
que se aplica o artigo 915º CC que nos remete para o artigo 909º CC. Nos termos do artigo 909º CC
nos casos de anulação fundada em simples erro o vendedor é obrigado a indemnizar o comprador
ainda que não tenha havido culpa, mas a indeminização abrange os danos emergentes do
contrato.

No entanto, o artigo 915º CC faz uma ressalva e estabelece que a indeminização prevista no artigo
909º CC não é devida se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade de que
a coisa padece. Assim, entendendo-se que não havia culpa, não haverá lugar a indemnização.

21.

A e B viveram maritalmente durante 23 anos num apartamento adquirido pela primeira com recurso
ao crédito à habitação. A partir de um dado momento B começou pedir a A que colocasse metade da
fracção em seu nome dizendo-lhe que ou A outorgava a escritura pública de transmissão de metade
da fracção ou a abandonava. A acabou por ceder à pressão de B e, mediante escritura pública, A e B
outorgaram o contrato de compra e venda através do qual esta declarou que “pelo preço de trinta
mil euros vend[ia] (...) metade indivisa da fracção com um aparcamento (…)”, e que “já recebeu do
comprador o citado preço”. B não entregou, porém, a A o preço referido na escritura.

Um ano mais tarde A e B separaram-se e B vem propor uma ação de divisão de coisa comum, que A
contesta dizendo que “o contrato de compra e venda invocado pelo autor com vista à presente ação
de divisão de coisa comum, (foi) simulado, para enganar os filhos da ré, e que esta assinou, (...) com
medo e receio de que o mesmo a abandonasse”.

Tendo em conta a factualidade descrita, pronuncie-se sobre a viabilidade da pretensão de B.

[Acórdão do STJ de 11.04.2013 (Hélder Roque), in <http://www.dgsi.pt>]

22.

A encomendou a B a compra de 500 ações ao portador do Banco X. B, uma vez que ele próprio era
titular de uma grande quantidade de ações de X, e que as pretendia vender, nomeou C seu
substituto, combinando com ele a venda das ações. Assim, C comprou a B, em nome de A as 500
ações do Banco X.

Pronuncie-se sobre a validade deste negócio.

Atua em representação de outrem aquele (representante) que realiza um ou mais atos jurídicos
em nome desse outrem (representado). Ora, tendo o representante poderes para praticar o ato
em nome alheio e confinando-se na realização dele aos limites dos poderes que lhe competem,
aquele produz os seus efeitos na esfera jurídica do representado. Ainda, se o ato for praticado em
nome de outrem sem que tenha havido atribuição de poderes de representação ao seu autor, o
ato é ineficaz em relação ao representado enquanto não for por este ratificado, o mesmo
acontecendo se o representante exceder os poderes que detém e desde que a outra parte
conhecesse ou devesse conhecer o abuso. As disposições relativas à representação constam dos
artigo 258º a 269º CC sendo certo que o legislador estabeleceu dois tipos de representação: a
representação legal e a representação voluntária. A representação legal resulta da própria lei
como mecanismo estabelecido para suprir as incapacidades do menor do interdito e do inabilitado
e voluntária quando resulta de um ato voluntário designado de procuração. Nos termos do artigo
262º CC a procuração é assim o ato pelo qual alguém atribui a outrem voluntariamente poderes de
representação. Estes poderes de representação podem ser atribuídos para uma generalidade de
atos, para uma categoria de atos ou para um ato em concreto (como se verifica na situação em
apreço). Isto é, o representante pode ter poderes gerais ou poderes especiais para o ato. Na
situação em apreço estamos perante uma situação de representação voluntária estabelecendo o
artigo 263º CC que o procurador não necessita de ter mais do que a capacidade de entender e
querer exigida pela natureza do negocio, sendo que o nº2 do artigo 262º CC a necessidade de
forma em função da forma exigida para o negocio a realizar. No presente caso pratico, B nomeou C
seu substituto. Não temos a informação de que A tenham permitido a referida substituição de
procurador ou que tal substituição resulte do conteúdo da procuração ou da relação jurídica que a
determina pelo que e aplicando o artigo 264º CC parece-nos que o procurador não poderia fazer-
se substituir por outrem. Assim sendo, e não sendo a substituição válida, a atuação de C
enquadrar-se-á no âmbito do artigo 268º CC – representação de poderes. O negocio celebrado por
uma pessoa em nome da outra sem poderes de representação é ineficaz em relação a este
enquanto não for ratificado. Logo, enquanto o negocio não for ratificado não é valido porquanto C
não podia agir em representação de A uma vez que não lhe foram conferidos os respetivos
poderes, dependendo a produção de efeitos jurídicos do contrato da ratificação de A.

23.

D, natural de Lisboa, tendo obtido transferência da Faculdade de Direito da Universidade de


Coimbra para a Faculdade de Direito da Universidade do Porto, e pretendendo encontrar alojamento
nesta última cidade, pediu à sua colega E para o ajudar nesta procura. E, apesar de o ano lectivo já
estar a decorrer, conseguiu encontrar um quarto vago num apartamento propriedade de F. Este, no
entanto, não foi esclarecido de que o quarto não era para E, mas sim para D, pelo que quando o
mesmo D se apresenta no local, pretendendo ocupar o quarto, F não permite a sua entrada.

Terá F razão nesta sua atitude? Poderá ele exigir a renda acordada a E?

Na situação em apreço estamos no âmbito da representação. A representação pode ser legal ou


voluntária sendo certo que o negócio jurídico celebrado pelo representante em nome do
representado nos limites dos poderes que lhe competem produz os seus efeitos jurídicos na esfera
jurídica deste ultimo. No presente caso prático estamos no âmbito da representação voluntária
nos termos da qual D terá outorgado procuração a E no sentido deste contratar com outrem o
arrendamento de um quarto. Uma vez que o negocio (contrato de arrendamento) exige forma
escrita, a procuração para ser valida, também ela deverá revestir a forma escrita nos termos do
artigo 262º nº2 CC. Na situação em apreço parece-nos que, uma vez que nao existe forma escrita
para a procuração, que existirá representação sem poderes devendo o negocio ser ratificado. Por
outro lado, parece-nos que na negociação entre E e F, o primeiro não terá referido que age em
representação de D. Por essa razão, e não havendo representação a partida a renda poderá ser
exigida.

24.

A encarrega B, seu filho de 17 anos, de comprar uma enciclopédia "do reino animal e vegetal". B,
estudioso das ciências da natureza, escolheu a obra que entendeu mais reputada na matéria depois
de analisar as diferentes opções existentes na livraria de C, habitual fornecedor de A. A enciclopédia
em 10 volumes foi entregue na casa de A, tendo B pedido a C para somar o preço respectivo "à
conta" de A na livraria, uma vez que a enciclopédia era para A e essas tinham sido as instruções
dadas pelo seu pai (A liquidava no fim de cada mês os montantes em débito na livraria). No entanto
A, tendo-se entretanto desinteressado do estudo da natureza, recusa-se a pagar quando C no fim do
mês em questão lhe apresenta a conta correspondente, argumentando que a compra foi efectuada
pelo seu filho e por isso nem sequer é válida, uma vez que este ainda não completou 18 anos de
idade.

Na situação em apreço estamos no âmbito da representação. A representação pode ser legal ou


voluntária sendo certo que o negócio jurídico celebrado pelo representante em nome do
representado nos limites dos poderes que lhe competem produz os seus efeitos jurídicos na esfera
jurídica deste ultimo. No presente caso prático estamos no âmbito da representação voluntária
nos termos da qual A encarrega B de celebrar um contrato de compra e venda de uma
enciclopédia. Nos termos do artigo 263º CC, o procurador não necessita de ter mais do que a
capacidade de entender e querer exigida pela natureza do negocio que haja a efetuar, o que se
verifica na situação em apreço. Assim sendo, e uma vez que não se verifica abuso de
representação nem representação de poderes, o negocio jurídico celebrado por B e C produz os
efeitos jurídicos na esfera de A não podendo por isso este recusar-se a pagar, alegando
incapacidade do procurador por ter menos do que 18 anos (artigo 258º).

25.

A, solteiro, titular de uma grande fortuna, decidiu doar um solar do século XIV, que havia herdado
dos seus avós, ao seu sobrinho e afilhado B. A, no entanto pretende condicionar a doação à
residência de B no solar, bem como ao seu casamento com C, filha de um seu grande amigo de
infância.

• Poderá a escritura de doação ser lavrada com este conteúdo?

O legislador estabeleceu a possibilidade das partes estabelecerem determinadas condições ou que


os negócios jurídicos comecem ou cessem a partir de determinado momento (condição e termo).
Com efeito, nos termos do artigo 270º CC as partes podem subordinar a um acontecimento futuro
e incerto a produção dos efeitos do negocio jurídico ou a sua resolução (artigo 270º CC).
Estabelece o artigo 271º CC que será nulo o negocio jurídico subordinado a uma condição
contraria à lei ou à ordem publica ou ofensivo dos bons costumes. O negocio jurídico em epigrafe
é uma doação, contrato pelo qual uma pessoa por espírito de liberalidade e à custa do seu
património dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito ou assume uma obrigação em
beneficio de outrem (artigo 940º CC). A doação de bens imóveis é celebrada por escritura publica
ou DPA, sendo certo que com a mera celebração do contrato se transmite a propriedade da coisa,
se verifica a obrigação de entregar a coisa nos termos dos artigo 954º e 955º CC. Mais estabelece o
artigo 963º CC que as doações podem ser oneradas com encargos e o 967º CC que as condições ou
encargos físicas ou legalmente impossíveis contrários a lei ou à ordem publica ou ofensivos dos
bons costumes ficam sujeitos às regras da matéria testamentária sendo por isso inválidos.

• E se A pretendesse sujeitar a doação à exigência de B nunca vender o imóvel a D, seu inimigo


visceral, que por várias vezes mostrara já interesse em o adquirir? Seria esta cláusula válida?

A doação é um contrato gratuito em que, por espírito de liberalidade, alguém dispõe


gratuitamente de uma coisa, só estando sujeito a cláusulas modais (onerados com encargos)
dentro dos limites do valor da coisa ou do direito. Parece-nos, assim, que atendendo ao que se
referiu quanto às condições contrarias à lei, à ordem publica ou ofensivas dos bons costumes que
esta condição não será valida.

• Supondo que A efetivamente doou o imóvel a B, introduzindo, no entanto, no contrato esta


última cláusula referida, diga se o mesmo A poderá exigir o solar de volta quando, dois anos
mais tarde, toma conhecimento que o seu sobrinho o vendera a D por uma soma
considerável.

Admitindo-se que esta cláusula/condição era valida, nos termos do artigo 272º CC haveria a
obrigação de B de agir segundo os ditames da boa fé por forma a não comprometer a integridade
do direito da outra parte. Por outro lado, admitindo-se que esta condição seria contrária à lei, à
ordem publica ou ofensiva dos bons costumes, o negocio (doação) seria nulo, nos termos do artigo
271º CC. Caso fosse nulo, não haveria produção de efeitos jurídicos apenas se salvaguardando
terceiros de boa fé, neste caso D, preenchidos os requisitos do artigo 291º CC.

26.

Em Maio de 2008 A ofereceu a B, seu filho, um automóvel. B era um ex-toxicodependente e A


avisou-o de que o automóvel deixaria de ser seu se nos 5 anos seguintes B “voltasse às más
companhias e ao consumo de drogas”. B passou de imediato a utilizar o automóvel.

Em Novembro de 2008 B vendeu o automóvel a C. A, acreditando que B voltou ao mundo das drogas
e que a venda do automóvel se destinava já a custear o seu vício, exigiu a sua devolução imediata e
ofereceu-o ao seu filho mais novo.

1ª hipótese: De facto B não recuperou da sua dependência, voltando a consumir drogas a partir de
Fevereiro de 2009, tendo ingressado num centro de desintoxicação em Abril último.

O negócio trata-se de uma doação sobre condição resolutiva, em que a claúsula acessória típica,
sendo uma c condição no âmbito do artigo 270º sendo resolutiva em que os efeitos do negócio
começam por se produzir plenamente, mas estão subordinados a um acontecimento futuro e
incerto. E quanto à ilicitude da cláusula? Está em causa uma doação, e o artigo 967º manda aplicar
quanto às condições os artigos 2230º e ss.— nomeadamente no artigo 2232º são proibidas as
condições que imponham a condicionante conviver com determinadas pessoas especificamente,
assim está condição seria contraria a esta disposição e nesse segmento, sendo a consequência
nula na parte relativa à proibição de conviver com determinadas pessoas, em que há uma redução
automática do negócio afastando-nos da regra do 271º que conduziria tal como já o vimos à
nulidade total do negócio. —> quando a condição é contrária à lei, não afeta o negócio no seu
todo, na media em que tenhamos uma condição contraria à lei, mas tenhamos que aplicar o
regime do testamento, em que só será nula a condição em questão. Se fosse num negócio oneroso
o negocio seria nulo e não se salvaria nada, no negocio anterior apenas existe uma redução à sua
parte válida.

A primeira hipótese seria a verificação da condição, o tal acontecimento futuro e incerto, em que
haveria a destruição retroativa automática dos efeitos do negócio, artigo 276º, assim estamos no
negocio na dependência da condição. Entretanto o pai tinha oferecido ao filho mais novo, verifica-
se a doação. Quando B vendeu a C ainda não se tinha verificado a condição, só se irá verificar em
FEV de 2009, assim o filho mais novo é proprietário desde a celebração do negocio com o pai por
causa da destruição retroativa dos efeitos. Tudo se passa como se A tivesse sido sempre
proprietário, pois quando se verifica a tal condição tudo se passa como se ele tivesse adquirido
desde inicio, destroem-se retroativamente todos efeitos já produzidos, por via da aplicação do
artigo 276º.

2ª hipótese: B estava sob o efeito de estupefacientes quando contratou com C.

Parece-nos que, na situação em apreço, B se encontra numa situação de incapacidade acidental.


Para além das situações de incapacidade de exercício, designadamente a menoridade, a
inabilitação e a interdição, o legislador procurou salvaguardar situações em que, por qualquer
causa, alguém emite uma declaração negocial encontrando-se incapacitado de entender o sentido
dela ou em que não tinha o livre exercício da sua vontade. Nestas situações, o legislador
estabeleceu como consequência a anulabilidade do negocio desde que a situação de incapacidade
seja notória ou conhecida do declaratário. Para que a declaração negocial seja anulada, é
necessário que no momento em que é feita, o autor dela se encontre, por doença ou por qualquer
causa acidental como delírio febril, embriaguez, sonambulismo, demência ou consumo de
estupefacientes, em condições especificas tais que não lhe permitam entender e querer e que esse
estado psíquico seja notório ou conhecido do declaratário. Assim sendo, e desde que C tenha tido
consciência desta situação de incapacidade, a compra e venda celebrada pode ser anulada nos
termos do artigo 287º CC, ou seja, dentro do ano subsequente a cessação do vício podendo ser
arguida por B e tendo efeitos retroativos nos termos do artigo 289º nº1 CC.

3ª hipótese: B recuperou completamente, tendo A criado a convicção do contrário por o ver


frequentemente acompanhado de D, também toxicodependente, mas em fase de recuperação.—> a
não verificação da condição é esta mesma hipótese, como não se verifica a condição, C será
proprietário, sendo que as partes inclusive tinham introduzido um limite de tempo para a
condição que era de cinco anos, ultrapassando o prazo estipulado os efeitos produzem-
se/consolidam-se, ganham eficácia plena e X nada adquire.

27.

A herdou uma quinta no Alto Minho com um solar e uma capela particular bastante degradados e a
precisar de um restauro profundo. Uma vez avaliados os custos da respectiva obra, e vendo-se A
sem possibilidades económicas para arcar com a despesa por inteiro, não hesitou quando recebeu
uma proposta de compra da capela, por um preço bastante alto, vinda do pároco local. Apesar de
ser intenção inicial de A manter aquele património na família, pareceu-lhe que o sacrifício da capela
seria um custo menor que permitiria salvar o imóvel principal, para além de proporcionar um novo
local de culto à freguesia.

Algum tempo após a outorga da escritura de compra e venda do imóvel, A constata, no entanto, que
este está a ser usado como garagem para o automóvel do pároco, não manifestando este último
qualquer intenção de a restaurar ou sequer abrir ao culto.

A, sentindo-se ultrajado com a atitude do padre, pretende “desfazer” o negócio, argumentando que
se soubesse da sua intenção nunca lhe teria vendido a capela.

Quid iuris?

28.

B e C venderam um terreno ao Município onde este se situava estabelecendo-se no contrato que o


local se destinava a acolher a feira mensal da região. O terreno estava localizado numa zona muito
central e as partes introduziram no contrato uma cláusula de acordo com a qual a utilização do
terreno para um fim distinto dava direito aos vendedores recuperarem o imóvel. Quando a Câmara
Municipal decidiu transferir a feira mensal para um parque municipal de exposições e deu início à
construção de blocos de apartamentos no terreno, B e C intentaram uma ação com vista à
recuperação do prédio em causa. Qual deverá ser o fundamento da referida ação?

[Cfr. Acórdão do STJ de 19/10/2004 (Araújo Barros), in http://www.dgsi.pt

29.

A, tendo completado 80 anos, doou todo o seu vasto património imobiliário ao seu primo B, ficando
estipulado no contrato que este último lhe deveria pagar uma pensão mensal de mil euros. Durante
o primeiro ano posterior ao contrato B cumpriu com a obrigação assumida mas, no início do
segundo ano, deixou de pagar alegando que o seu primo ainda tinha ficado com um conjunto muito
valioso de móveis que poderia sempre vender.

A, muito magoado com a atitude do primo B, vem intentar uma ação com vista à devolução das suas
propriedades com fundamento nos arts. 270º e 276º do Código Civil. Terá êxito na sua pretensão?

As partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos jurídicos
do negocio ou a sua resolução designando-se no 1º caso que estamos perante uma condição
suspensiva e no segundo numa condição resolutiva. Na situação ema preço estaríamos perante
uma condição resolutiva uma vez que a doação tem subjacente a obrigação de pagar uma pensão
mensal de 1000 euros sendo por isso esta uma cláusula modal. Nos termos do artigo 966º CC, o
doador pode pedir a resolução da doação fundada no não cumprimento dos encargos desde que
tal esteja previsto no contrato. Mais estabelece o artigo 963º nº2 CC que o donatário não é
obrigado a cumprir os encargos se não dentro dos limites do valor da coisa ou do direito doado.
Nos termos do artigo 272º CC aquele que contrair uma obrigação ou alienar um direito sob
condição resolutiva deve agir na pendência da condição segundo os ditames da boa fé. Tratando-
se de uma condição resolutiva, aposta a um contrato de execução continuada ou periódica e nos
termos do artigo 434º nº2 CC a resolução não abrange as prestações já efetuadas nem prejudica a
validade dos atos de administração ordinária realizados.

30.

C, pretendendo adquirir um terreno agrícola para iniciar um negócio de agricultura biológica, foi
convencido por D, procurador de E, de que um terreno de que este era proprietário em Paredes
reunia as condições ideais para o efeito. Numa visita ao local o terreno encontrava-se, inclusive,
alagado, tendo D explicado que “a água era tanta que teria que ser encanada para não invadir as
plantações”. Celebrado o negócio, C vem a descobrir que o terreno não dispunha de qualquer fonte
de irrigação e que D mandava vir uma cisterna de água sempre que algum interessado visitava o
local.
1. Que direitos assistem a C?

Na situação em apreço, verifica-se erro que atinge os motivos determinantes da vontade e que se
refere ao objeto do negocio. Com efeito, a vontade de C adquirir o terreno de E, a vontade
pressupunha que o terreno tinha uma fonte de irrigação. Nos termos do artigo 251º o erro que
atinja os motivos determinantes da vontade e se refira ao objeto do negocio, torna-o anulável nos
termos do artigo 297º CC que nos exige que o declaratario conhecesse ou não devesse ignorar a
essencialidade para o declarante do elemento sobre que incidiu o erro. Assim sendo, parece-nos
que C poderá requerer nos termos do artigo 287º CC que a compra e venda celebrada seja
declarada anulada.

2. Diga o que poderá C fazer quando souber que afinal D nem sequer tinha uma procuração de E
para vender o dito terreno.

A procuração, no âmbito da representação voluntária e o ato pelo qual alguém atribui a outrem
voluntariamente poderes representativos sendo certo que deverá revestir a forma exigida para o
negocio que o procurador deva realizar (artigo 262º CC). Atendendo a que, na situação em apreço
estávamos no âmbito da compra e venda de um bem imóvel (artigos 874º, 875º e 204º nº1 a) CC)
era necessária que a procuração revestisse a forma de escritura ou DPA. Assim, verifica-se que D
agia no âmbito de representação sem poderes, pelo que o negocio é ineficaz em relação a C, caso
não seja ratificado por E ao abrigo do artigo 268º nº1 do CC. Neste sentido, C poderia
unilateralmente revogar o contrato uma vez que desconhecia a falta de poderes de representação
de D (artigo 268º nº4 CC).

31.

C prometeu, numa conversa mantida com o seu único filho, D, doar-lhe uma vivenda de que era
proprietário na zona das Antas se este casasse com E, uma parente afastada da sua mulher. D veio a
casar algum tempo mais tarde com E e a escritura de doação do imóvel foi lavrada de seguida sem
qualquer menção ao casamento.

Volvidos alguns meses, D e E divorciaram-se e D assumiu uma relação homossexual mantida com X
há já muitos anos.

3. C, profundamente abalado com os acontecimentos, vem exigir o prédio de volta. Terá êxito
na sua pretensão?

A declaração de C, de prometer doar a D uma vivenda, caso este viesse a casar com E não
consubstancia uma declaração negocial. Com efeito, a declaração negocial é uma expressão
juridicamente relevante da vontade de uma pessoa de celebrar determinado ato ou negocio
jurídico que, sendo realizada na forma adequada poderá levar à produção de determinados
efeitos jurídicos a partir do momento da sua recepção ou do conhecimento por aquele a quem se
destina. Admitindo-se, no entanto, que foi realizada uma doação com a condição de D casar com
E, esta condição (acontecimento futuro e incerto ao qual as partes podem subordinar os efeitos de
um negocio jurídico ou da sua resolução), esta condição nao pode ser admitida pelo nosso
ordenamento jurídico. Com efeito, e nos termos do artigo 271º é nulo o negocio jurídico
subordinado a uma condição contrária à lei, à ordem publica ou ofensiva dos bons costumes,
conforme a situação em apreço. O negocio celebrado entre pai e filho é uma doação de bens
imóveis regulada no artigo 940º e que vem definida como o contrato pelo qual uma pessoa, por
espírito de liberalidade e à custa do seu património dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um
direito em beneficio de outrem. Mais estabelece o artigo 963º que as doações podem ser
oneradas com encargos sendo o donatário obrigado a cumprir com os encargos apenas dentro dos
limites do valor da coisa doada. Atendendo a que, por mero efeito do contrato de doação se
transmite a propriedade da coisa, com a celebração do contrato e desde que o mesmo obedeça ao
requisito de forma (artigo 939º CC que nos remete para as normas da compra e venda e 947º CC),
o qual, por dizer respeito a bens imóveis deve ser feito por escritura publica ou documento
particular autenticado, C não terá êxito na sua pretensão.

4. Supondo a factualidade do caso anterior, diga quem é o titular do direito de propriedade


sobre o imóvel atendendo à seguinte hipótese:

Antes mesmo de intentar qualquer ação com vista à devolução do prédio, C não hesita em aceitar
uma oferta de F pela sua aquisição, celebrando com ele um contrato de compra e venda mediante
documento particular autenticado. F, verificando que o prédio se encontrava inscrito no registo
predial em nome de C, regista de imediato a sua aquisição.

Partindo do pressuposto que D não registou a aquisição derivada translativa em seu nome, e que a
eficácia dos contratos se verifica apenas inter partes, levanta-se a questão de poder opor o seu
direito de propriedade perante F. Com efeito, com a celebração do contrato de formação, de
imediato se transmite a propriedade da coisa. No entanto, para que D pudesse opor o seu direito
perante terceiros deveria ter procedido ao respetivo registo de aquisição na conservatória do
registo predial competente. No nosso OJ e relativamente a bens imóveis e bens móveis sujeitos a
registo, o legislador exige que o titular do direito respetivo proceda à inscrição/averbamento do
respetivo direito, sob pena de não o poder invocar perante terceiros. Na situação em apreço, C,
vende a F um bem cuja propriedade não lhe pertencia (bem alheio) o que determinaria a nulidade
da mesma, uma vez que o vendedor carece de legitimidade para a realizar, nos termos do artigo
892º CC..

32.

C entregou à sua afilhada D a quantia de 30.000€, correspondentes às poupanças de uma vida de


trabalho, a fim de D fazer obras em sua casa e construir um novo quarto para albergar C e lhe
proporcionar habitação e agasalho no seu agregado familiar para o resto da sua vida. Volvidos 2
anos, C continua a viver num lar e pretende obter o dinheiro de volta. Quid iuris?

A doação é o contrato pelo qual uma pessoa por espírito de liberalidade e à custa do seu
património dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito ou assume uma obrigação em
beneficio de outrem (artigo 940º CC). A doação só pode abranger bens presentes sendo
considerada doação a liberalidade remuneratória de serviços recebidos pelo doador que não
tenham a natureza de divida exigível. As doações de coisas móveis obedece ao principio de
liberdade de forma previsto no artigo 219º CC, não dependendo por isso de qualquer formalidade
externa quando acompanhada da tradição da coisa, sendo que na falta de tradição deve ser
reduzida a escrito. Entendendo-se que C será maior e não interdita nem inabilitada terá
capacidade para fazer doações (artigo 948º CC) sendo que se verifica capacidade passiva de D ao
abrigo do artigo 950º CC. Com a doação transmite-se a propriedade dos bens, sendo certo que o
legislador estabelece a possibilidade de se estabelecerem cláusulas modais, ou seja, das doações
poderem serem oneradas com encargos. A cláusula modal é uma cláusula acessória típica dos
contratos de doações que impõe ao respetivo beneficiário a obrigação de adotar um determinado
comportamento sendo certo que caso a cláusula modal seja considerada nula, por ter um objeto
físico ou legalmente impossível, ilícito ou imoral, nem por isso a liberalidade é invalida, pelo que a
propriedade do bem se transmite na mesma. Ainda, a cláusula modal só obriga, dentro dos limites
da liberalidade e caso assim não se verifique é redutível, na medida em que os excede. Sendo
valida a cláusula modal, se o beneficiário da liberalidade incumprir o encargo, o doador ou os
herdeiros deste podem exigir o seu cumprimento nos termos do artigo 965º CC sendo inclusive
possível até resolver a liberalidade com fundamento no incumprimento se o doador assim o tiver
estabelecido no contrato (artigo 966ºCC). Na situação em apreço, constitui doação modal o
contrato pelo qual C doa a D 30 mil euros com a condição de D fazer obras em sua casa e construir
um novo quarto para albergar C e lhe proporcionar habitação e agasalho no seu agregado familiar
para o resto da sua vida. Sendo assim, e fazendo-se referencia ao que se referiu supra, C pode, ao
abrigo do artigo 965º CC exigir a D o cumprimento do encargo. Tal não sucederia apenas se o
encargo fosse nulo por ser físico ou legalmente impossível, contrario à lei, contrario à ordem
publica ou ofensivo dos bons costumes. Nessa situação, a doação manter-se-ia eficaz,
desaparecendo apenas a tal cláusula modal nula.

33.

A vendeu a B um automóvel da marca Mercedes em segunda mão por 28.000€. O veículo havido
sido importado da Alemanha e apresentava uma quilometragem de 85.000kms. O aspecto geral da
viatura era bom e B pagou o preço a pronto. A emitiu a seguinte “Declaração”:

Declara, sob compromisso de honra, sem quaisquer reservas e para todos os devidos e legais efeitos,
ter procedido, no dia 20-12-14, à venda de um veículo automóvel a … B … pelo preço de € 28.000,00,
importância que recebeu deste, da qual lhe dá a correspondente quitação.

Mais declara que, à data da referida venda B, o veículo apresentava uma quilometragem de cerca de
85.000 Kms.

Por ser verdade e corresponder à sua vontade, vai a presente declaração ser datada e assinada, em
sinal de plena e total concordância com o seu teor.

Porto, 20-12-2014”.

Algum tempo mais tarde, tendo B mandado fazer uma revisão ao carro durante uma viagem à Suíça,
o funcionário da Mercedes de Lausanne efetuou uma busca informática ao histórico do veículo e
verificou que este, numa intervenção mecânica realizada em 28-11-13, na Alemanha, apresentava
no conta-quilómetros uma contagem de 138.410kms.

B vem agora exigir a devolução do preço pago dizendo que nunca teria comprado o carro se
conhecesse o seu verdadeiro estado, correspondente a um preço de não mais do que 17.500€. A
argumenta, porém, que quando importou o carro este “marcava” 79.000kms e que nunca
desconfiou que o conta-quilómetros pudesse ter sido alterado.

Diga se B terá êxito na sua pretensão.

[Ac. do STJ de 28.04.2016 (Abrantes Geraldes), in <www.dgsi.pt>]


Na situação ema preço, estamos perante a compra e venda de um bem móvel sujeito a registo nos
termos do artigo 874º CC e 205º CC. Com a mera celebração do contrato de compra e venda
produzem-se os efeitos previstos no artigo 879º designadamente a transmissão da propriedade da
coisa, a obrigação de entregar a coisa e de pagar o preço. O negocio sob Júdice é um negocio
consensual que nao exige qualquer formalização sendo por isso celebrado ao abrigo do artigo 219º
CC. O contrato decorre de duas declarações de vontade, a vontade do vendedor e a vontade do
comprador. Acontece que, no presente caso pratico, a vontade do comprador se encontra viciada
por erro sobre o objeto do negocio, o qual terá atingido os motivos determinantes da vontade. O
erro sobre o objeto do negocio abrange não apenas a sua identidade mas as suas qualidades.

No caso prático, o comprador adquiriu um automóvel que pensava e que lhe tinha sido afiançado
ter determinado a quilometragem, que aceitou como verdadeira atendendo a que o referido
veiculo apresentava em geral bom estado de conservação. Estamos, assim, no âmbito do erro
sobre o objeto designadamente no que tange às suas qualidades. Nos termos do artigo 251º CC, o
erro sobre o objeto do negocio determina a anulabilidade do mesmo, preenchidos os requisitos do
erro na declaração, ou seja, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a
essencialidade, para o declarante do elemento sobre o qual incidiu o erro. Estamos assim no
âmbito de erro essencial uma vez que constitui o motivo determinante da vontade do agente. Na
situação em apreço, parece-nos que se encontrarão preenchidos os requisitos do artigo 247º CC
para o qual nos remete o artigo 251º CC, designadamente que o vendedor tivesse consciência ou
pelo menos não ignorasse o carácter essencial para o comprador, num negocio da quilometragem
do veiculo vendido. Assim, e nos termos do artigo 251º CC o contrato de compra e venda
celebrado pode ser anulável sem necessidade do comprador provar o conhecimento do erro pelo
vendedor e bastando-lhe apenas provar que o vendedor conhecia ou devia conhecer a
essencialidade dos motivos ligados ao objeto que o levaram a contratar. Ainda, relevante aqui
para que se comprove o erro sobre as qualidades do objeto é o facto do vendedor ter emitido
declaração da quilometragem do veiculo tendo havido por isso falsa representação da identidade
da coisa que levou o comprador a contratar. Sendo o negocio anulável, o comprador poderá ao
abrigo do artigo 287º CC requerer a sua anulabilidade com os efeitos previstos no artigo 289º CC.

Alternativamente, a atuação de A podia ser enquadrada, também no âmbito e falta de vícios da


vontade como dolo e portanto, ao abrigo do artigo 253º CC. Com efeito, entende-se por dolo a
utilização de qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência
de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação pelo declaratário
ou terceiro do erro do declarante. O legislador consagra, assim, no artigo 253º CC o dolo positivo e
o dolo negativo sendo certo que o dolo positivo se verifica numa atuação com a intenção ou
consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração e o dolo negativo na dissimulação
pelo declaratario ou por terceiro do erro do declarante. O dolo negativo só é ilícito quando as
concepções dominantes no comercio jurídico, uma estipulação negocial ou a lei imponham o
dever de elucidar o declarante. À semelhança do que se referiu quanto ao erro, também o dolo
pode requerer a anulação da declaração ao abrigo do artigo 287º CC dentro do ano subsequente à
cessação do vício que lhe serve de fundamento.

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