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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ – UESPI

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS - CCSA


CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO
DIREITO PENAL I
PROF.ª: LYA RACHEL BRANDÃO E MENDES PINHEIRO

RESUMO DE DIREITO PENAL I

UNIDADE I – Introdução

Introdução ao Direito Penal

1. Conceito de Direito Penal


2. Características
3. Princípios Limitadores do Poder Estatal

___________________________________________________________________________

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL

1. CONCEITO DE DIREITO PENAL

Direito Penal é o ramo do direito público que define as infrações penais, estabelecendo as penas e
as medidas de segurança aplicáveis aos infratores. É o conjunto de normas e disposições jurídicas que
regulam o exercício do poder sancionador e preventivo do Estado.

Distingue-se, ainda, o Direito Penal em DP Objetivo e DP Subjetivo.

- Direito Penal Objetivo é o conjunto de normas editadas pelo Estado, definindo crimes e
contravenções, isto é, impondo ou proibindo determinadas condutas sob a ameaça de sanção ou
medida de segurança, bem como outras que cuidem de questões de natureza penal (exclusão de
crime, isenção de pena ...)
- Direito Penal Subjetivo é a possibilidade que tem o Estado de criar e fazer cumprir suas normas,
executando as decisões condenatórias proferidas pelo Poder Judiciário. É o próprio jus puniendi. É o
poder-dever que o Estado tem de exercer seu direito de punir caso as normas por ele editadas venham
a ser descumpridas.

2. CARACTERÍSTICAS

São características da lei penal:


- Exclusividade: somente a norma penal define crimes e comina penas (princípio da legalidade).
- Imperatividade: a norma penal é imposta a todos, independentemente da sua vontade. Assim,
praticada uma infração penal, o Estado, obrigatoriamente, deverá buscar a aplicação da pena.
- Generalidade: a norma penal vale para todos (erga omnes).
- Impessoalidade: a norma penal é abstrata, sendo elaborada para punir acontecimentos futuros e
não para punir pessoa determinada.

3. PRINCÍPIOS LIMITADORES DO PODER ESTATAL

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3.1 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA

O Direito Penal somente deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais
importantes. As perturbações mais leves do ordenamento jurídico são objeto de outros ramos do
Direito.

A interferência do Direito Penal só se dará quando os demais ramos do Direito se mostrarem,


comprovadamente, incapazes de proteger aqueles bens relevantes na vida do indivíduo e da própria
sociedade.

3.2 PRINCÍPIO DA LESIVIDADE

Juntamente com o Princípio da Intervenção Mínima limita de uma forma mais rigorosa o poder do
legislador, indicando quais são as condutas que poderão ser incriminadas pela lei penal, orientando
quais as condutas que afetem gravemente a direitos de terceiros.

As quatro principais funções do princípio da lesividade são:


a) proibir a incriminação de uma atitude interna – ninguém pode ser punido por aquilo que pensa
ou mesmo por seus pensamentos pessoais.
b) proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio do autor – o DP não
poderá punir aquelas condutas que não sejam lesivas a bens de terceiros, pois que não excedem ao
âmbito do próprio autor (autolesão / tentativa de suicídio).
c) proibir a incriminação simples de estados ou condições existenciais – impede que o agente seja
punido pelo o que ele é e não pelo o que fez.
d) proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico

3.3 PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL

Apesar de uma conduta se subsumir ao modelo legal não será considerada típica se for
socialmente adequada ou reconhecida, isto é, se estiver de acordo com a ordem social da vida
historicamente condicionada.

3.4 PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIDADE

O Direito Penal só deve intervir quando houver ofensa a bens fundamentais para a subsistência
do corpo social.

A norma penal exerce uma função suplementar da proteção jurídica em geral, só valendo a
imposição de suas sanções quando os demais ramos do direito não mais se mostrem eficazes na
defesa dos bens jurídicos, sendo a pena (sanção) o último recurso para a proteção do bem jurídico

3.5 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Tem por finalidade auxiliar o intérprete quando da análise do tipo penal, para fazer excluir do
âmbito da incidência da lei aquelas infrações consideradas como “bagatela”

O Direito Penal, por sua natureza fragmentária, só vai aonde seja necessário para a proteção do
bem jurídico.

3.6 PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

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Ocorre com a seleção feita pelo legislador, quando escolhe as condutas positivas ou negativas,
que atacam nossos bens mais importantes. Feita a seleção, o legislador valora as condutas,
cominando-lhes penas que variam de acordo com a importância do bem a ser tutelado.

Os condenados serão classificados segundo os seus antecedentes e personalidade para orientar


a individualização da execução penal

Art. 5º, CF c/c art. 59, CP.

3.7 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Para não ser um ato de violência contra o cidadão, a pena deve ser, de modo essencial, pública,
pronta, necessária, a menor das penas aplicável nas circunstâncias referidas, proporcional ao delito e
determinada pela lei. (Marquês de Beccaria – 1764)

O princípio da proporcionalidade exige que se faça um juízo de ponderação sobre a relação


existente entre o bem que é lesionado ou posto em perigo (gravidade do fato) e o bem que pode
alguém ser privado (gravidade da pena).

O princípio da proporcionalidade rechaça o estabelecimento de cominações legais


(proporcionalidade em abstrato) e a imposição de penas (proporcionalidade em concreto) que careçam
de relação valorativa com o fato cometido considerado em seu significado global.

Possui duplo destinatário: o legislador e o juiz.

3.8 PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PESSOAL

“Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a


decretação do perdimento dos bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles
executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido” (art. 5º, XLV, CF)

Somente o condenado irá se submeter à sanção imposta pelo Estado.

“Nunca se pode interpretar uma lei penal no sentido de que a pena transcenda da pessoa que é
autora ou partícipe do delito. A pena é uma medida de caráter estritamente pessoal, haja vista ser uma
ingerência ressocializadora sobre o condenado”. (Zaffaroni)

3.9 PRINCÍPIO DA LIMITAÇÃO DAS PENAS

Art. 5º, XLVII – Não haverá penas:


a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados; (não exclui a volitividade)
d) de banimento;
e) cruéis. (que desconsidere o homem como pessoa – tortura)

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UNIDADE I – Introdução

Norma Penal

1. Norma Penal
2. Fontes
3. Interpretação
4.Integração da Lei Penal
5. A Lei no Tempo e no Espaço
6. Princípio da Legalidade
7. Conflito Aparente de Normas
8. Princípio da Especialidade
9. Princípio da Subsidiariedade
10. Princípio da Consunção
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1. NORMA PENAL

Normas Penais são aquelas cuja execução é garantida por uma sanção externa e
institucionalizada. (Norberto Bobbio)

A proibição e o mandamento que vêm inseridos na lei, são reconhecidos como normas penais.

A norma jurídico-penal tem a natureza imperativa e endereça-se a todos os cidadãos


genericamente considerados, através de mandados ou proibições, implícita e previamente formulados,
visto que a lei penal não contém ordem direta, mas sim vedação indireta, na qual se descreve o
comportamento humano pressuposto da conseqüência jurídica.

1.1 CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS PENAIS

I – NORMAS PENAIS INCRIMINADORAS


- Reservam-se à função de definir as infrações penais, proibindo ou impondo condutas, sob a
ameaça de pena. É a norma penal por excelência, sendo considerada normas penais em sentido
estrito.

II – NORMAS PENAIS NÃO INCRIMINADORAS


- tornam lícitas determinadas condutas;
- afastam a culpabilidade do agente, erigindo causas de isenção de pena;
- esclarecem determinados conceitos;
- fornecem princípios gerais para a aplicação da lei penal.

As normas penais não incriminadoras, subdividem-se em:

A) PERMISSIVAS
- permissivas justificantes: quando têm por finalidade afastar a ilicitude (antijuridicidade) da
conduta do agente (arts. 23 a 25, CP)
- permissivas exculpantes: destinam-se a eliminar a culpabilidade, isentando o agente de pena
(arts. 26, caput, e 28, §1º, CP)

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B) EXPLICATIVAS – visam esclarecer ou explicitar conceitos (arts. 150, §4º e 327, CP)

C) COMPLEMENTARES – fornecem princípios gerais para a aplicação da lei penal (art. 59, CP)

1.2 PRECEITOS DA NORMA PENAL INCRIMINADORA

I – Preceito Primário
- É o encarregado de fazer a descrição detalhada e perfeita da conduta que se procura proibir ou
impor.

II – Preceito Secundário
- cabe a tarefa de individualizar a pena, cominando-a em abstrato.

- Aquele que praticar a conduta descrita no preceito primário, terá como consequência a
aplicação da pena também nele prevista.

1.3 NORMAS PENAIS EM BRANCO

São aquelas em que há uma necessidade de complementação para que se possa compreender o
âmbito de aplicação de seu preceito primário.
Assim, embora haja uma descrição da conduta proibida, essa descrição requer, obrigatoriamente,
um complemento extraído de outro diploma para que possam ser entendidos os limites da proibição ou
da imposição feitos pela lei penal, uma vez que, sem esse complemento, torna-se impossível sua
aplicação.

Ex.: art. 237, CP / art. 16, Lei 6368/76.

2. FONTES DA NORMA PENAL

2.1 CONCEITO
Fonte é o lugar de onde provém o direito.

2.2 ESPÉCIES

a) Material, de produção ou substancial


- Refere-se ao órgão incumbido de sua elaboração.
- A União é a única fonte de produção de DP no Brasil.

b) Formal, de cognição ou de conhecimento


refere-se ao modo pelo qual o DP se exterioriza.

2.3 ESPÉCIES DE FONTE FORMAL

a) Imediata – lei

b) Formal – costumes e princípios gerais de direito


- COSTUME: conjunto de normas de comportamento a que as pessoas obedecem de maneira
uniforme e constante, pela convicção de sua obrigação;
- PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO: tratam-se de princípios que se fundam em premissas éticas
extraídas do material legislativo.

Os costumes podem ser de três espécies:

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- Contra Legem – inaplicabilidade da norma jurídica em face do desuso, da inobservância
constante e uniforme da lei;
- Secundum Legem – traça regras sobre a aplicação da lei penal;
- Praeter Legem – preenche lacunas e especifica o conteúdo da norma.

O costume não cria delitos, não os revoga e nem comina penas (princípio da reserva legal ou da
legalidade)

3. INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL

3.1 CONCEITO
- É a atividade que consiste em extrair da norma penal seu exato alcance e real significação

3.2 NATUREZA
- A interpretação deve buscar a vontade da lei, desconsiderando a de quem a fez. A lei terminada
independe de seu passado, importando apenas o que está contido em seus preceitos.

3.3 ESPÉCIES
I - Quanto ao SUJEITO que a elabora
a) Autêntica ou Legislativa: feita pelo próprio órgão encarregado da elaboração do texto. Pode ser:
contextual, quando feita dentro do próprio texto interpretado (art. 327, CP), ou posterior, quando a lei
interpretadora entra em vigor depois da interpretada.

OBS.: A norma interpretativa tem efeito ex tunc uma vez que apenas esclarece o sentido da lei.

b) Doutrinária ou Científica: feita por estudiosos e cultores do Direito.

OBS.: A Exposição de Motivos é interpretação doutrinária e não autêntica, uma vez que não é lei.

c) Judicial: feita pelos órgãos jurisdicionais (não tem força obrigatória)

II – Quanto aos MEIOS empregados


a) Gramatical, literal ou sintática: leva-se em conta o sentido literal das palavras.
b) Lógica ou Teleológica: busca-se a vontade da lei, atendendo-se aos seus fins e à sua posição
dentro do ordenamento jurídico.

III – Quanto ao RESULTADO


a) Declarativa: há perfeita correspondência entre a palavra da lei e a sua vontade.
b) Restritiva: quando a letra escrita da lei foi além da sua vontade (a lei disse mais do que queria
e, por isso, a interpretação vai restringir o seu significado).
c) Extensiva: quando a letra escrita da lei ficou aquém da sua vontade (a lei disse menos do que
queria e, por isso, a interpretação vai ampliar o seu significado).

3.4 O PRINCÍPIO “IN DUBIO PRO REO”

- Esgotada a atividade interpretativa sem que se tenha conseguido extrair o sentido da norma, a
solução será dar a interpretação mais favorável ao acusado.

3.5 INTERPRETAÇÃO PROGRESSIVA, ADAPTATIVA OU EVOLUTIVA

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É aquela que, ao longo do tempo, vai adaptando-se às mudanças político-sociais e às
necessidades do momento.

4. INTEGRAÇÃO DA LEI PENAL

4.1 ANALOGIA
Consiste em aplicar-se a uma hipótese não regulada por lei disposição relativa a um caso
semelhante. Na analogia, o fato não é regido por qualquer norma e, por essa razão, aplica-se uma de
caso análogo.
No Direito Penal, não se admite o uso da analogia para reger condutas não tipificadas na lei penal,
uma vez que não se pode ferir o princípio da reserva legal.

EXCEÇÃO: É possível o uso da analogia quando a situação não envolver norma incriminadora.

Ex.: O art. 128, II, CP, dispõe que o aborto praticado por médico não é punido “se a gravidez
resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu
representante legal”.
Nesse caso, como não se trata de norma incriminadora, mas PERMISSIVA, é possível estender o
benefício, analogicamente, à gravidez resultante de atentado violento ao pudor.

4.2 DISTINÇÃO ENTRE ANALOGIA, INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA E INTERPRETAÇÃO


ANALÓGICA

- ANALOGIA: na analogia não há norma reguladora para a hipótese;


- INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA: existe uma norma regulando a hipótese, de modo que não se
aplica a norma do caso análogo; contudo, tal norma não menciona expressamente essa eficácia,
devendo o intérprete ampliar seu significado além do que estiver expresso.

- INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA: após uma seqüência casuística, segue-se uma formulação

genérica, que deve ser interpretada de acordo com os casos anteriormente elencados.

4.3 ESPÉCIES DE ANALOGIA


- Legal ou “legis”: o caso é regido por uma norma reguladora de hipótese semelhante;

- Jurídica ou “juris”: a hipótese é regulada por princípio extraído do ordenamento jurídico em seu

conjunto;
- “In bonam partem”: a analogia é empregada em benefício do agente;

- “In malam partem”: a analogia é empregada em malefício do agente.

5. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Art. 1.º, CP - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação
legal. (nullum crimen, nulla poena sine praevia lege.)

5.1 ASPECTOS DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

I. ASPECTO POLÍTICO
Trata-se de garantia constitucional fundamental do homem.
Protege o cidadão contra toda e qualquer invasão arbitrária do Estado em seu direito fundamental
de liberdade.

II. ASPECTO JURÍDICO


- Somente haverá crime quando existir perfeita correspondência entre a conduta praticada e a
previsão legal; dessa forma, só haverá crime nas hipóteses taxativamente previstas.
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- As medidas de segurança, apesar do seu caráter essencialmente preventivo, também estão
sujeitas ao princípio da legalidade.

5.2 PRINCÍPIOS INERENTES AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

a) PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL: somente a lei, em seu sentido mais estrito, pode definir
crimes e cominar penas.

- RESERVA ABSOLUTA DA LEI: nenhuma outra fonte “subalterna” pode gerar a norma penal. A
matéria penal compete estritamente ao Poder Legislativo.

OBS.: A Medida Provisória, apesar de ter força de lei, não é lei e, segundo a maioria dos
doutrinadores, não pode dispor sobre matéria penal, sob pena de ofender o Princípio da Separação dos
Poderes com a invasão do Poder Executivo na esfera de competência do Poder Legislativo.

Entretanto, autores há que defendem a possibilidade de uma MP dispor sobre matéria penal
desde que sua vigência fique submetida à condição suspensiva de sua conversão em lei pelo
Congresso Nacional. Assim, tão logo deixem de existir como ato normativo do Poder Executivo, terão
plena eficácia na esfera criminal.

- TAXATIVIDADE E VEDAÇÃO AO EMPREGO DA ANALOGIA: a lei penal deve ser precisa, uma
vez que um fato só será considerado criminoso se houver perfeita correspondência entre ele e a norma
que o descreve. Não se admite que o tratamento punitivo adotado para uma ação específica possa ser
estendido para uma conduta que se mostre aproximada ou assemelhada.

O princípio da legalidade, estatui que não há crime sem lei anterior que o defina. Dessa forma,
exige que a lei determine (descreva) a conduta delituosa em todos os seus elementos e circunstâncias,
a fim de que somente no caso de integral correspondência pudesse o agente ser punido.

- TAXATIVIDADE E DESCRIÇÃO GENÉRICA: a reserva legal impõe também que a descrição da


conduta criminosa seja detalhada e específica, não se coadunando com tipos genéricos,
demasiadamente abrangentes.

Deve-se evitar expressões vagas e de sentido equívoco, capazes de alcançar qualquer


comportamento humano e, por conseguinte, aptas a promover a mais completa subversão no sistema
de garantias da legalidade.

Ex.: qualquer conduta contrária aos interesses nacionais; qualquer vilipêndio à honra alheia.

Distinção entre analogia e descrição genérica.

6. CONFLITO APARENTE DE NORMAS

Configura-se o conflito aparente de normas quando existe uma pluralidade de normas regulando
um mesmo fato criminoso, sendo que, na realidade, apenas uma delas é aplicável.

Para que exista o conflito aparente são necessários os seguintes elementos:


a) pluralidade de normas;
b) unicidade ou unidade de fatos;
c) aparente aplicação de todas as normas ao fato;
d) efetiva aplicação de apenas uma norma.

6.1 PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE


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De acordo com o Princípio da Especialidade se, no caso concreto, houver duas normas
aparentemente aplicáveis e uma delas puder ser considerada como especial em relação à outra, deve o
julgador aplicar esta norma especial (lex specialis derrogat generali).

Considera-se norma especial aquela que possui todos os elementos da lei geral e mais
alguns, denominados “especializantes”.

Ex.: Homicídio e Infanticídio.

Para se avaliar a especialidade de uma norma em relação à outra, basta compará-las


abstratamente, sem que seja necessário avaliar-se o caso concreto. Basta uma leitura dos tipos penais,
para se saber qual deles é especial.

6.2 PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE


Em havendo duas normas aplicáveis ao caso concreto, se uma delas puder ser considerada
subsidiária em relação à outra, aplica-se a norma principal, denominada primária, em detrimento da
norma subsidiária (lex primaria derrogat subsidiariae).

Ao contrário da especialidade, a subsidiariedade não pode ser avaliada abstratamente. O


intérprete deve analisar o caso concreto e verificar se, em relação a ele, a norma é ou não subsidiária.

A norma subsidiária é menos ampla que a norma primária. Dessa forma, primeiro se deve
tentar encaixar o fato na norma primária, e não sendo possível, encaixa-lo na norma subsidiária.

Norma subsidiária é aquela que descreve um grau menor de violação de um bem jurídico, ficando
absorvida pela lei primária, que descreve um grau mais avançado dessa violação.

Ex.: estupro e constrangimento ilegal.

6.3 PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO


A relação de consunção ocorre quando um fato definido como crime atua como fase de
preparação ou de execução, ou ainda, como exaurimento de outro crime mais grave, ficando, portanto,
absorvido por este.

Difere da subsidiariedade, pois nesta enfocam-se as normas (uma é mais ou menos ampla que a
outra), enquanto que na consunção enfocam-se os fatos, ou seja, o agente efetivamente infringe duas
normas penais, mas uma deve ficar absorvida pela outra.

Hipóteses em que se aplica o princípio da consunção:


a) Crime Progressividade: ocorre o crime progressivo quando o agente, desejando desde o ínicio
a produção de um resultado mais grave, mediante diversos atos, realiza sucessivas e crescentes
violação ao bem jurídico. Nessa hipótese, o agente responderá apenas pelo resultado final e mais grave
obtido, ficando absorvidos os atos anteriores.

Ex.: para cometer o homicídio, o agente precisa passar pela lesão corporal. Nesse caso, só
responde pelo resultado final (homicídio) que era o resultado por ele pretendido desde o início.

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UNIDADE II – APLICAÇÃO DA LEI PENAL (12h/a)


1. Princípios Reguladores do Direito Penal
1.1 Princípio da Legalidade (art. 1.º)
1.2 Retroatividade da Lei Mais Benéfica (art. 2.º)
1.3 Lei Excepcional ou Temporária (art. 3.º)
1.4 Tempo do Crime (art. 4.º)
1.5 Lugar do Crime (art. 6º)
1.6 Territorialidade (art. 5.º)
1.7 Extraterritorialidade (art. 7.º)
1.8 Pena Cumprida no Estrangeiro (art. 9.º)
1.9 Contagem de Prazo (art. 10)
1.10 Frações Não Computáveis da Pena (art. 11)
1.11 Legislação Especial (art. 12)
_______________________________________________________________________

UNIDADE II – APLICAÇÃO DA LEI PENAL (12h/a)

1. Princípios Reguladores do Direito Penal

I. RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA (ART. 2.º)

- Art. 2.º:Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando
em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
- Parágrafo único: A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos
anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

- A lei penal (art. 5.º, XL, CF / art. 2.º, CP) é irretroativa; a lei penal que beneficia o agente é
retroativa, excepcionando a regra acima.

OBS.:
- O princípio de que a lei não pode retroagir, salvo para beneficiar o acusado, restringe-se às
normas de caráter penal.
- A lei processual não se submete ao princípio da retroatividade em benefício do agente. Nos
termos do art. 2.º do CPP, a norma de caráter processual terá incidência imediata a todos os processos
em andamento, pouco importando se o crime foi cometido antes ou após sua entrada em vigor ou se a
inovação é ou não mais benéfica.
- Importa apenas que a norma esteja em andamento, caso em que a regra terá aplicação, ainda
que o crime lhe seja anterior e a situação do acusado, agravada.
- Por norma processual entende-se aquela cujos efeitos repercutem diretamente sobre o
processo, não tendo relação com o direito de punir do Estado (ex.: liberdade provisória – exigências e
conveniências do próprio processo)
- Será de caráter penal toda norma que criar, ampliar, reduzir ou extinguir a pretensão punitiva
estatal, tornando mais intensa ou branda sua satisfação.
- Assim, normas que criam novos tipos penais incriminadores ou ampliam o rol das causas
extintivas da punibilidade têm conteúdo nitidamente penal; e a lei que proíbe a liberdade provisória ou
transforma uma infração em inafiançável, certamente, possui caráter restritivo da liberdade – em razão
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do processo -, sem causar aumento correspondente no direito de punir do Estado, sendo puramente
norma processual.

- No caso de normas penais híbridas, onde uma parte da norma é processual e a outra é
nitidamente penal (art. 366, CPP), não será possível “dividir” a aplicação da norma em duas partes.
Assim, deverá prevalecer o caráter penal, para fins de retroatividade em benefício do agente.

- HIPÓTESES DE LEI POSTERIOR

a) “Abolitio Criminis”: lei posterior deixa de considerar um fato como criminoso, revogando
o tipo penal incriminador. Como o comportamento deixou de constituir infração penal, o Estado perde a
pretensão de impor ao agente qualquer pena, operando-se, aqui, a extinção da punibilidade (art. 107, II,
CP). Como conseqüência, cessarão todos os efeitos penais, principais e secundários. Os efeitos
extrapenais, entretanto, subsistem (art. 2.º, CP), cessando, apenas, os efeitos penais da condenação.
b) “Novatio Legis in Mellius”: é a lei posterior que, de algum modo, traz um benefício para o
agente. Nesse caso, bem como no anterior, a norma penal retroage e aplica-se imediatamente aos
processos em julgamento, aos crimes cuja perseguição não se iniciou e, também, aos casos já
encerrados por decisão transitada em julgado.
c) “Novatio Legis in Pejus”: é a lei posterior que, de qualquer modo, venha a agravar a
situação do agente no caso concreto.
d) “Novatio Legis” Incriminadora: é a lei posterior que cria um tipo incriminador, tornando
típica conduta considerada irrelevante penal pela lei anterior.

- COMBINAÇÃO DE LEIS

A maioria dos autores entende não ser possível a combinação de leis ou a divisão de uma norma
para aplicar somente a parte mais benéfica, sob o argumento de que o juiz estaria invadindo a esfera de
competência do legislador, criando uma nova lei (imposição de sursis sem condições – lei anterior, ou a
pena de multa).

- “LEX MITIOR” E O PERÍODO DA “VACATIO LEGIS”

Durante a vacatio legis, a lei ainda não começou a propagar seus efeitos, logo, não pode ter
eficácia imediata, nem retroativa, até porque é possível a sua revogação antes mesmo de entrar em
vigor (art. 263, da Lei 8069/90, revogado pela Lei dos Crimes Hediondos). Por essa razão, não haverá
aplicação retroativa até a entrada em vigor da lei.

II. LEI EXCEPCIONAL OU TEMPORÁRIA (ART. 3.º)

- Art. 3.º: A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou
cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.

a) LEI EXCEPCIONAL: é a feita para vigorar em períodos anormais, como guerras,


calamidades etc. Sua duração coincide com a do período incomum.
b) LEI TEMPORÁRIA: é feita para vigorar em um período de tempo previamente fixado pelo
legislador. Traz em seu bojo a data de cessação de sua vigência. É uma lei que desde sua entrada em
vigor tem data marcada para sair do ordenamento jurídico.

- São leis ultra-ativas, pois regulam os fatos ocorridos durante sua vigência, mesmo após sua
revogação. Assim, mesmo que a lei posterior, vigente à época do julgamento do fato, seja mais
benéfica, não retroagirá.

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- São leis de curta duração que perderiam toda a sua força intimidativa se não tivessem a
ultra-atividade.

- Somente será admitida a retroatividade de lei mais benéfica posterior a uma lei excepcional ou
temporária se aquela fizer expressa menção ao período anormal ou ao tempo de vigência, passando a
regular o fato praticado sob a égide das leis ultra-ativas.

III. TEMPO DO CRIME

- Art. 4.º: Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o
momento do resultado.

TEORIAS SOBRE O MOMENTO DO CRIME


a) Atividade: O crime considera-se praticado no momento da conduta comissiva ou omissiva;
b) Resultado: O crime é praticado no momento da produção do resultado;
c) Ubiqüidade ou Mista: O crime considera-se praticado no momento da conduta e no
momento do resultado.

TEORIA ADOTADA PELO CÓDIGO PENAL


- O CP adotou a teoria da Atividade. Como conseqüência principal, a imputabilidade do agente
deve ser aferida no momento em que o crime é praticado, pouco importando a data em que o resultado
venha a ocorrer.

OBS.: Em matéria de prescrição, o CP adotou a teoria do resultado. O lapso prescricional


começa a ocorrer a partir da consumação, e não do dia em que se deu a ação delituosa (art. 111, I, CP)

IV. LUGAR DO CRIME

- Art. 6.º: Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou
em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir o resultado.

- O CP adotou a Teoria da Ubiqüidade, segundo a qual o lugar do crime é tanto o da conduta


quanto o do resultado. Deve-se observar que os meros atos preparatórios não constituem objeto de
cogitação para determinar o lócus delicti, pois não são típicos.

- Outras teorias foram levantadas a respeito do local do crime


a) Teoria da Atividade: lugar do crime é o da ação ou omissão, sendo irrelevante o local da
produção do resultado;
b) Teoria do Resultado: lugar do crime é aquele em que foi produzido o resultado, sendo
irrelevante o local da conduta;

- Já o CPP, ao contrário, adotou como regra para a fixação da competência a que estabelece ser
competente o foro (comarca) no qual o crime se consumou (art. 70,CPP) - Teoria do Resultado.

V. TERRITORIALIDADE DA LEI PENAL

- Art. 5.º: Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito
internacional, ao crime cometido no território nacional.
(...)

a) Princípio da Territorialidade: a lei penal só tem aplicação no território do Estado que a editou,
pouco importando a nacionalidade do sujeito ativo ou passivo.
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b) Princípio da Territorialidade Absoluta: só a lei penal brasileira é aplicável aos crimes cometidos
no território nacional.
c) Princípio da Territorialidade Temperada: a lei penal brasileira aplica-se, em regra, ao crime
cometido no território nacional. Excepcionalmente, porém, a lei estrangeira é aplicável a delitos
cometidos total ou parcialmente em território nacional, quando assim determinarem tratados e
convenções internacionais.

- A lei penal brasileira adotou o princípio da Territorialidade Temperada. Assim, aplica-se o DP


brasileiro nos crimes cometidos no território nacional, de modo que, todos os que aqui estiverem,
brasileiros, estrangeiros ou apátridas, residente ou em trânsito pelo Brasil, serão submetidos à nossa
legislação por fatos criminosos aqui praticados.

- Exceção: No caso de normas de direito internacional (tratados, convenções e regras) dispuserem


em sentido contrário.

- Território Nacional:
a) aspecto material: compreende o espaço delimitado por fronteiras geográficas (abrange o
solo e o subsolo, sem solução de continuidade e com limites reconhecidos, as águas interiores, o mar
territorial, a plataforma continental e o espaço aéreo).
b) aspecto jurídico: abrange todo o espaço em que o Estado exerce sua soberania.

- O art. 5.º, §1.º, do CP considerou, para efeitos penais, como extensão do território nacional, as
embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer
que se encontrem, bem como as aeronaves e embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade
privada, que se acharem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.

- Assim, onde não houver soberania de qualquer país (alto-mar e espaço aéreo) se ocorrer uma
infração penal a bordo de aeronave ou embarcação mercante ou de propriedade privada, de bandeira
nacional, será aplicada a legislação brasileira.

- O art. 5.º, §2.º, CP determinou também a aplicação da lei brasileira aos crimes praticados a
bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em
pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar
territorial do Brasil.

- Componentes do Território

a) Solo ocupado pela corporação política;


b) Rios, lagos, mares interiores, golfos, baías e portos;
c) Mar territorial: faixa de mar exterior ao longo da costa, que se estende por 12 milhas de
largura, medidas a partir da baixa-mar do litoral continental e insular brasileiro (Lei n.º 8.617/93). Aqui, o
Brasil exerce sua soberania plena (exceção: direito de passagem inocente);
d) Zona contígua: faixa que se estende das 12 às 24 milhas marítimas, na qual o Brasil
poderá tomar medidas de fiscalização, a fim de evitar ou reprimir infrações às leis e regulamentos
aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários, no seu território ou mar territorial (não é território
nacional).
e) Zona econômica exclusiva: faixa que se estende das 12 às 200 milhas marítimas, contadas
da mesma base que serve ao mar territorial, onde o Brasil tem direitos de soberania para fins de
exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos, das
águas sobrejacentes ao leito do mar, deste e seu subsolo, e ainda no que se refere a outras atividades
visando à exploração e aproveitamento da zona para finalidade econômica (não é território nacional).
f) Espaço aéreo: parte integrante do território nacional, possuindo o Brasil exclusiva soberania
sobre ele, inclusive por imperativos de segurança nacional Lei n.º 7.565/86);
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g) Espaço cósmico: o espaço cósmico poderá ser explorado e utilizado livremente por todos
os Estados, em condições de igualdade e sem discriminação, não sendo objeto de apropriação nacional
por proclamação de soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio.
h) Navios e aeronaves: quando públicos consideram-se extensão do território nacional;
quando privados, também, desde que estejam em mar territorial brasileiro, alto-mar ou no espaço aéreo
correspondente.

VI. EXTRATERRITORIALIDADE DA LEI PENAL BRASILEIRA

- É a possibilidade de aplicação da lei penal brasileira a fatos criminosos ocorridos no exterior.

- Princípios Norteadores
a) Princípio da Nacionalidade Ativa: aplica-se a lei nacional do autor do crime, qualquer que
tenha sido o local da infração;
b) Princípio da Nacionalidade Passiva: aplica-se a lei no nacional do autor do crime quando
este for praticado contra bem jurídico de seu próprio Estado ou contra pessoa de sua nacionalidade.
c) Princípio da Defesa Real: prevalece a lei referente à nacionalidade do bem jurídico lesado,
qualquer que tenha sido o local da infração ou a nacionalidade do autor do delito (princípio da
proteção);
d) Princípio da Justiça Universal: todo Estado tem direito de punir qualquer crime, seja qual
for a nacionalidade do agente ou da vítima e o local da infração, desde que o sujeito ativo esteja dentro
de seu território;
e) Princípio da Representação: a lei nacional é aplicável aos crimes cometidos no estrangeiro
em aeronaves e embarcações privadas, desde que não julgados no local do crime.

- Observando-se o art. 7.º, CP, percebe-se que:


- no art. 7.º, I, a, b, c e d, foi adotado o princípio da defesa real;
- no art. 7.º, II, a, foi adotado o princípio da justiça universal;
- no art. 7.º, II, b, foi adotado o princípio da nacionalidade ativa;
- no art. 7.º, II, c, foi adotado o princípio da representação;
- no art. 7.º, § 3.º, foi adotado o princípio da defesa real;

VII. PENA CUMPRIDA NO ESTRANGEIRO

- Art. 8.º: A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime,
quando diversas (as penas) ou nela computada, quando idênticas.

VIII. EFICÁCIA DE SENTENÇA ESTRANGEIRA

- A homologação de sentença estrangeira no Brasil compete ao STF e somente será possível


quando a aplicação da lei brasileira produzir os mesmos efeitos da lei estrangeira (vide arts. 787 a 790,
CPP).

- A homologação depende:
a) de pedido da parte interessada, na hipótese de reparação de danos
b) para outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade
judiciária emanou a sentença, ou na falta de tratado, de requisição do Min. Da Justiça.

IX. CONTAGEM DE PRAZO (art. 10, CP)

X. FRAÇÕES NÃO COMPUTÁVEIS DA PENA (art. 11, CP)

XI. LEGISLAÇÃO ESPECIAL (art. 12, CP)


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