Você está na página 1de 7

Tópico 3 - Criminalização do não recolhimento do ICMS antecipado

Tópico 1 Criminalização Icms Próprio Declarado E Não Pago


O Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou a RHC 163.334 em 11 de
dezembro de 2019. O recurso tinha como objetivo discutir se ou não, o ato de declarar
regularmente o próprio ICMS configura crime em si, sendo este o de apropriação
indébita. O Recurso Ordinário em Habeas Corpus gira em torno do estado de Santa
Catarina. Isso porque os gestores da empresa, após terem entrado três vezes em
programas de crédito tributário e não pagarem ICMS em vários períodos de vendas,
foram denunciados pela prática do crime previsto no artigo 2º, II da Lei 8.137 de 1990,
considerando a contumácia dos envolvidos.
O Juízo de primeira instância entendeu que o fato era atípico, assim absolvendo
os acusados. No entanto, o Ministério Público apelou quanto ao entendimento, e na
segunda instância houve reforma da decisão. Em sua avaliação, o segundo tribunal de
justiça do estado considerou que o fato era típico, assim dando prosseguimento da ação.
Rogério Schietti, no Superior Tribunal de Justiça, fez uma distinção significativa
entre as duas correntes ao votar como relator. Seu raciocínio centrou-se no
entendimento da 6ª Turma com a 5ª Turma do STJ. Onde se mostrou necessária a
distinção entre o ICMS e o imposto de substituição tributária. É o que se verifica no
seguinte trecho do acórdão:
A descrição típica do crime de apropriação indébita tributária contém
a expressão ‘descontado ou cobrado’, o que, indiscutivelmente,
restringe a abrangência do sujeito ativo do delito, porquanto nem todo
sujeito passivo de obrigação tributária que deixa de recolher tributo ou
contribuição social responde pelo crime do art. 2º, II, da Lei n.
8.137/1990, mas somente aqueles que ‘descontam’ ou ‘cobram’ o
tributo ou contribuição. A interpretação consentânea com a dogmática
penal do termo “descontado” é a de que ele se refere aos tributos
diretos quando há responsabilidade tributária por substituição,
enquanto o termo “cobrado” deve ser compreendido nas relações
tributárias havidas com tributos indiretos (incidentes sobre o
consumo), de maneira que não possui relevância o fato de o ICMS ser
próprio ou por substituição, porquanto, em qualquer hipótese, não
haverá ônus financeiro para o contribuinte de direito. (BRASIL, 2018,
on-line)

A Sexta Turma concluiu que a Lei 8.137/90, § 2º, II, não deve ser considerada
típica, na situação onde o contribuinte declara e não recolhe o ICMS próprio, sendo a
conduta tipificada a hipótese do contribuindo declarar e não recolher o ICMS no regime
de substituição tributária. Algumas decisões monocráticas da Quinta Turma seguem no
mesmo sentido que a Sexta Turma, apenas de divergentes neste caso.
De forma unanime, a Quinta Turma expôs que não existe a diferença mostrada
pela Sexta Turma. Declarando que em qualquer hipótese em que houver a declaração e
não recolhimento do ICMS, próprio ou no regime de substituição tributária, seria
considerado fato típico conforme artigo 2º, II da Lei 8.137 de 1990.
Em recurso ordinário interporto pela defesa no Habeas Corpus no STF, em face
ao acórdão da terceira turma do STJ. Houve a reversão da decisão, sendo estabelecida
uma nova tese que afirma que o contribuinte que, contumazmente e com dolo de
apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço
incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990. Essa decisão foi proferida pelo
juízo sob o número 163.334 em RHC de Santa Catarina, tratado pelo relator o Ministro
Roberto Barroso. Reforçando isto, seguindo o relator o Ministro Edson Fachin em seu
voto se posicionava da seguinte forma:
O que a conduta incrimina, portanto, no caso do ICMS, é essa ruptura,
causada pelo contribuinte de direito, entre a atividade de tributação
realizada pelo Fisco e o atingimento da riqueza concernente à
capacidade contributiva do consumidor. Nessas balizas, a conduta
incriminada, a meu ver, supera a faceta do inadimplemento fiscal,
porquanto se deixa de recolher aos cofres públicos valor, referente à
capacidade contributiva de terceiro, destinado aos cofres estaduais ou
distritais e que, segundo já decidiu este Plenário, não é pertencente ao
contribuinte de direito. Desse modo, a tipificação de conduta dessa
natureza não equivale a admitir o emprego do Direito Penal como
meio de enfrentamento a uma questão que se restringiria a uma dívida
com o Fisco. (BRASIL, 2019, on-line)

Por fim, a decisão do RHC 163.334, estabeleceu o entendimento do Supremo


Tribunal Federal que para incorrer no delito do artigo 2º, inciso II da Lei 8.137 de 1990,
o contribuinte deve possuir dolo de apropriação, sendo devedor contumaz do ICMS.
Com isso, os ministros manifestam a intenção de proteger os contribuintes e os
responsáveis pela cobrança incansável do ICMS, ainda que a título próprio ou
substitutivo, como podemos observar no que é dito no plenário:
A caracterização do crime depende da demonstração do dolo de
apropriação, a ser apurado a partir de circunstâncias objetivas factuais,
tais como o inadimplemento prolongado sem tentativa de
regularização dos débitos, a venda de produtos abaixo do preço de
custo, a criação de obstáculos à fiscalização, a utilização de “laranjas”
no quadro societário, a falta de tentativa de regularização dos débitos,
o encerramento irregular das suas atividades, a existência de débitos
inscritos em dívida ativa em valor superior ao capital social
integralizado etc. Fixação da seguinte tese: O contribuinte que deixa
de recolher, de forma contumaz e com dolo de apropriação, o ICMS
cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal
do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990. (BRASIL, 2019, on-line)

Derradeiramente, a proteção da ordem tributária e explicações que focam nas


consequências das decisões levam ao reconhecimento da tipicidade comportamental. De
um lado, o desvio de ICMS, que tem a maior sonegação do país, esse que vem causado
graves prejuízos ao erário nacional e à livre concorrência, conforme exposto no acórdão
já citado no presente trabalho. Por outro lado, é existe uma dificuldade alguém ser preso
por esse crime, visto que deve ser considerada a intenção genuína da ação do
empresário para tipificação, seja enriquecer ilicitamente, prejudicar a concorrência ou
financiar a própria atividade, prejudicando assim os cofres públicos.

Tópico 2 Elisão, Evasão Fiscal E O Devedor Contumaz


O contribuinte não é obrigado a pagar tributos em excesso, ultrapassando os
previstos em lei, como também não tem obrigação de escolher dentre as opções viáveis
de incidência de carga tributária, aquela que incida com maior tributação a depender do
contexto. Existindo formas lícitas de evitar o pagamento do fisco através de
planejamento efetuado pelo contribuinte. Este que, no que lhe concerne, nunca deve
usar meios ilegais para reduzir sua carga tributária.
A elisão fiscal acontece quando o contribuinte através do planejamento tributário
evita ou diminuí impostos por meios legais. Exemplo disto, seria a escolha do
contribuidor pelo regime do lucro presumido, ao invés do lucro real. Podendo ser
praticado também perante o tempo, antecedendo o fato gerador na intenção de não o
praticar de forma lícita, abstendo de uma atividade que resulte em um imposto. A título
de exemplo, uma empresa que tenha mudado sua sede para outro domicílio de modo a
aproveitar incentivos fiscais de uma determinada região, com a intenção de reduzir sua
carga tributária, é uma prática não prevista em lei, porém, não ilícita, o que acabaria por
se caracterizar como a elisão fiscal. (JÚNIOR; OLIVEIRA; FRAGA, 2021)
Assim é possível vislumbrar, conforme posições já mencionadas anteriormente
no presente artigo, que ao infringir a lei tributária existem contribuintes que muitas
vezes ocultam suas infrações evitando a detecção ou modificando o evento do fato
gerador. Em outras palavras, geralmente removem as consequências da regra tributária
já em vigor no mundo real através de atos ilícitos. Sendo isto considerada a evasão
fiscal, uma prática com o mesmo intuito da elisão fiscal, porém, com a utilização de
meios ilícitos para concretização do objetivo que é evitar ou anular o fisco.
A evasão pode ocorrer por ociosidade intencional do devedor, onde este opta por
ignorar os impostos que devem ao fisco, sendo de forma em que recusar pagar ou até
mesmo declarando e não pagando o tributo ao qual lhe foi incidido por lei, sendo este
declarado pelas autoridades fiscais. Além da inércia do devedor, a evasão também pode
ocorrer quando o contribuindo utiliza de métodos ilícitos, como fraude, conluio e
simulação para evitar o pagamento do tributo. (JÚNIOR; OLIVEIRA; FRAGA, 2021)
Sendo a evasão fiscal crime, cujas penas são previstas em lei, e tais atos causam
grandes prejuízos aos cofres públicos, existe o desafio da detecção de possíveis fraudes,
mesmo que seja após a consumação do ato já praticado. Essa prática reduz a equidade
fiscal e prejudica o papel da política econômica tributária, sendo um dos grandes focos
do governo a diminuição desse crime. A necessidade de fortalecer a fiscalização para
evitar que empresas com esse hábito de sonegar a lei fujam de suas obrigações fiscais é
clara, fiscalizando seus negócios, evitando e punindo a continuidade dessa prática, além
de processar quem já cometeu esse ato ilícito, com a finalidade de recuperar dos cofres
públicos o que é devido. (BECHO; SIMÕES; FEDERIGHIL, 2021)
Entre a Elisão Fiscal e a Evasão Fiscal, onde estaria a caracterização do Devedor
Contumaz? Estes estariam caracterizados pelo não pagamento do tributo, assim não
podendo esta prática ser caracterizada como elisão ou evasão fiscal. Os devedores
contumazes, no que lhe concerne, caracterizam-se não apenas pelo valor da dívida, mas
também pela repetição de suas ações, principalmente inadimplência injustificada de
suas obrigações fiscais.
Embora punível no domínio da fiscalidade administrativa, tal incumprimento
fiscal, ainda que tenha carácter injurioso, não constitui, em princípio, ato de
responsabilidade criminal. No entanto, em recente decisão do STF no RHC de número
163.334/SC, mostrou-se que essa prática pode ser incidida na esfera penal, conforme
resultado polêmico proferido pela Suprema Corte.
A discussão deve ir muito além de saber se o inadimplemento declarado do
ICMS se enquadra como crime. É preciso repensar o crime de infração tributária em
sentido amplo, e não apenas definir se é desvio de dinheiro público ou sonegação fiscal.
Na situação que vivemos atualmente, é necessário punir comportamentos que realmente
prejudicam a sociedade, como lavagem de dinheiro, esquemas de corrupção em grande
escala, sendo mais comuns hoje. Em vez de empresários que investiram seu dinheiro e
seus empregos para construir seus negócios, acabam sendo levados para o cais e
tratados ao lado de criminosos, assassinos, sequestradores. Tudo porque, num
determinado momento de desagrado empresarial, viu-se em atraso no pagamento de
algum tipo de imposto. (LISBOA, 2019)
No julgamento já discorrido no presente trabalho, o STF interpreta o campo
incidente do tipo especificado no art. 2, II, Lei n.º 8º, 137/1990, atribuindo este crime ao
contribuinte conhecido na jurisprudência como “apropriação indébita tributária”, onde
foi caracterizado que o contribuinte ao realizar persistentemente e dolosa, deixa de
reclamar e recolher-se de ICMS próprio, deixando de o repassar, estaria incidindo neste
delito. Esta decisão altera até então o entendimento predominante sobre a não
criminalização do inadimplemento contumaz.
O prejuízo causado pela prática do devedor contumaz equivale à sonegação
fiscal em termos de impacto na contribuição. No entanto, mesmo gerando igual dano,
ainda não existe uma determinada e direta punição do praticante deste ato. Os devedores
fiscais contumazes, acabam utilizando desta conduta para fugir do pagamento de
impostos, baratear seus custos e impor preços abaixo do mercado, fazendo da
inadimplência sua vantagem competitiva, pois com custos menores conseguem oferecer
produtos abaixo do preço de mercado. Sendo o processo judicial lento e levando anos
para uma devida conclusão, para que no derradeiro fim seja declarada a inviabilidade da
cobrança da dívida, gerando rombos consideráveis nos cofres públicos de contribuição,
enquanto vantagem ilícita, econômica e não punível aos devedores contumazes
tributários. (BECHO; SIMÕES; FEDERIGHIL, 2021)
Ao reunir o conhecimento doutrinário tributário, fica evidente que a linha de
pensamento destes qualificam os devedores contumazes como os contribuintes, que
aproveitam a lentidão da lei para evitar a cobrança de impostos dentro de um prazo,
rotineiro e sistemático, e reduzir os custos de arrecadação e, com isso, tentar adquirir
vantagem econômica. Muitas vezes com seu produto o vendendo abaixo do preço de
mercado, criando a inaceitável concorrência desleal com empresas similares que
contribuem devidamente conforme a lei, assim não repassando os impostos ao governo
e aumentando os lucros. Esse tipo de contribuinte não é fácil de ser identificado, devido
alta carga tributária no Brasil, nem todos os contribuintes deixam de pagar dolosamente.
Tópico 3 - criminalização do não recolhimento do ICMS antecipado;

A criminalização do não recolhimento do ICMS antecipado tem sido objeto de


intensos debates na doutrina e na jurisprudência brasileira, devido à sua complexidade e
impactos no cenário econômico do país. Inicialmente, é importante destacar que o
ICMS antecipado foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro com o objetivo de
antecipar o pagamento do imposto devido pelos contribuintes em determinadas
operações, a fim de evitar a evasão fiscal. Entretanto, o não recolhimento do ICMS
antecipado passou a ser considerado uma infração fiscal, que pode ensejar sanções
administrativas e, em alguns casos, até mesmo ações penais.
A criminalização do não recolhimento do ICMS antecipado teve início com a
edição da Lei nº 8.137/90, que tipificou como crime a conduta de deixar de recolher, no
prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social. Posteriormente, a Lei
Complementar nº 87/96 estabeleceu que o não recolhimento do ICMS antecipado
poderia ser caracterizado como crime contra a ordem tributária, nos termos do artigo 1º,
inciso II, da Lei nº 8.137/90.
No entanto, o tema passou a ser objeto de intensos debates na doutrina e na
jurisprudência, especialmente no que se refere à sua constitucionalidade. Isso porque
alguns juristas argumentam que a criminalização do não recolhimento do ICMS
antecipado violaria o princípio da legalidade e da proporcionalidade, uma vez que a
exigência do imposto antecipado já seria uma forma de sanção.
Nesse sentido, Helperin (2020) destaca que a criminalização do não
recolhimento do ICMS antecipado representa uma preocupante inversão dos valores
jurídicos e, ainda, uma ameaça à atividade econômica, ao equilíbrio fiscal e à própria
ordem jurídica. Ressaltando que a medida pode ser considerada desproporcional, tendo
em vista que a exigência do ICMS antecipado já seria uma forma de sanção.
Por outro lado, há aqueles que defendem a constitucionalidade da medida,
argumentando que o não recolhimento do ICMS antecipado pode ser caracterizado
como crime de sonegação fiscal, uma vez que a conduta representa uma forma de
ocultação de receita. Nesse sentido, a jurisprudência tem se manifestado no sentido de
que a conduta de não recolher o ICMS antecipado pode ser enquadrada como crime de
sonegação fiscal, nos termos do artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90.
O histórico da criminalização do não recolhimento do ICMS antecipado tem sido
marcado por intensos debates na doutrina e na jurisprudência brasileira. Embora a
medida seja objeto de críticas por parte de alguns juristas, a jurisprudência tem se
manifestado no sentido de que a conduta pode ser enquadrada como crime de sonegação
fiscal, o que evidencia a necessidade de uma análise cuidadosa do tema. (LISBOA,
2019)
É preciso destacar que a questão do não recolhimento do ICMS antecipado
envolve não apenas aspectos jurídicos, mas também econômicos e sociais. A adoção de
medidas extremas, como a criminalização, pode gerar impactos negativos na atividade
econômica e prejudicar a sociedade como um todo. Portanto, é necessário buscar um
equilíbrio entre a necessidade de combater a sonegação fiscal e a preservação dos
direitos fundamentais e do desenvolvimento econômico do país.

Você também pode gostar