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a INTRODUÇÃO À FISCALIDADE 

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Uma das principais manifestações da evolução do ordenamento jurídico-tributário revela-se precisa- Neste caso, não é necessária uma lei da AR, verificando-se uma considerável dose de autonomia por
mente na construção da ideia de legalidade fiscal. parte da administração fiscal.
O princípio de legalidade, expresso no artigo 103.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa  
 
(CRP) impõe que os impostos e os seus elementos essenciais (incidência; taxa, benefícios fiscais e
b) Princípio da igualdade
garantia dos contribuintes) têm necessariamente de ser criados por lei. Neste sentido, o princípio da
 
legalidade está intrinsecamente ligado ao princípio democrático, visto que os impostos apenas Pedra basilar do sistema politico-constitucional português, o princípio da igualdade assume uma
podem ser criados e desenvolvidos/regulamentados pelo órgão que representa directamente o povo ampla variedade de significados e dimensões no âmbito do ordenamento jurídico português. No
soberano – a Assembleia da República. De facto, o artigo 165.º n.º 1, alínea i) estabelece que as entanto, apesar de ser um conceito ética e politicamente construído, o princípio da igualdade [na sua
matérias referentes a impostos são da reserva relativa da Assembleia da República dimensão formal e material] adquire, no âmbito do direito fiscal, particular significado. Por um lado,
(AR). Quer isto dizer que os impostos apenas podem nascer ou de uma lei da Assembleia da Repú- tal como foi sublinhado pelos primeiros teóricos do liberalismo politico americano, a noção de que a
blica ou de um decreto-lei autorizado, habilitado primeiramente por uma lei de autorização legisla- carga fiscal deve ser suportado numa lógica de igualdade entre cidadãos, embora uma igualdade
tiva nos termos do artigo 165.º, n.º 2, 3 e 4 da CRP. Sem este pressuposto formal, os impostos serão diferenciada, isto é, os cidadãos deverão suportar os tributos de acordo com a sua capacidade contri-
ilegais e considerados nulos. O princípio da legalidade é, especificamente, caracterizado no artigo butivo e não consoante quaisquer outros critérios, nomeadamente raça, género, religião, nacionali-
8.º da Lei Geral dade, etc. Alguns autores apontam duas dimensões geométricas ao principio da igualdade fiscal: a
Tributária, onde é definido o seu âmbito. igualdade horizontal e a igualdade vertical.
Isto quer dizer que o princípio da legalidade assenta fundamentalmente em duas ideias: o auto-con- Neste sentido, a obrigação do pagamento de impostos é mediada pela capacidade contributiva.
sentimento e a reserva de lei. No primeiro caso, tal como acima se referiu, está implícito o funda- Implica, assim, igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade hori-
mento democrático da representatividade, segundo o qual os impostos devem ser criados e zontal) e diferente imposto para os que dispõem de diferente capacidade contributiva, na proporção
aprovados pelos representantes políticos da comunidade. No segundo – ainda que em ligação com

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desta diferença (igualdade vertical).
este postulado prévio – está a ideia de que todo o processo de criação jurídico-tributária deverá estar
enquadrado num encadeamento formal e legislativo previamente estabelecido, garantindo a estabili-
Esta não é, no entanto, a única derivação lógico-constitucional do princípio da igualdade, no nosso H
ordenamento jurídico. Também se traduz, de facto, na obrigação da imposição de medidas diferenci-
dade jurídica e a igualdade [formal e material]. O principio da reserva de lei (formal) implica que adoras de modo a obter uma igualdade de oportunidades necessária à igualdade real entre cidadãos.
haja sempre uma intervenção de lei parlamentar, seja esta uma intervenção material a fixar a própria É neste contexto que se justifica a discriminação positiva da família, ou as deduções à colecta em
disciplina dos impostos, ou uma intervenção de carácter meramente formal, autorizando o Governo- sede de IRS em função do número de filhos, por exemplo. Este objectivo está consagrado no artigo
legislador, as assembleias legislativas regionais ou as assembleias das autarquias locais a estabele- 67.º, n.º 2, alínea f) e no artigo 104.º da CRP e no artigo 6.º da Lei Geral Tributária: “A tributação
cer, dentro de certas coordenadas que hão-de constar da respectiva lei de autorização, essa disciplina respeita a família e reconhece a solidariedade e os encargos familiares, devendo orientar-se no sen-
(Art. 165º, nº1 al. i) da CRP). Por outro lado, o principio da reserva material de lei, referido com tido do conjunto dos rendimentos do agregado familiar não esteja sujeito a impostos superiores aos
base na dogmática alemã por principio da tipicidade, exige que a lei (lei da Assembleia da Republi- que resultariam da tributação autónoma das pessoas que o constituem”.
ca, decreto-lei autorizado, decreto legislativo regional ou regulamento autárquico) contenha a disci- Como refere Casalta Nabais, alguma doutrina recente tem apontado importantes críticas e objecções
plina tão completa quanto possível da matéria reservada, matéria que, nos termos do nº2 do art. 103º ao princípio da igualdade assim compreendido, sobretudo nos seguintes termos:
da CRP, integra, relativamente a cada imposto, a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garan- a) As que vêm neste principio um objectivo de nivelamento social e o consequente desígnio
tias dos contribuintes. de aniquilamento da liberdade individual;
Todavia, o princípio da legalidade não pode ser levado ao extremo, sob pena de total impraticabili- b) As que argumentam com a indeterminabilidade e equivocidade no conceito contido na
dade. O seu objectivo é, sobretudo, que os elementos essenciais sejam definidos por lei. Daí ser expressão ‘capacidade contributiva’, a qual, para além de esquecer os múltiplos conceitos
necessário conjugar com o princípio da praticabilidade, de modo a que administração fiscal goze de indeterminados com guarida nas actuais constituições que as jurisdições constitucionais
alguma discricionariedade ao nível da luta contra a evasão fiscal. A título de exemplo, o CIRS per- têm de interpretar e aplicar, partilha, ao fim e ao cabo, da ideia do carácter meramente
mite à Autoridade Tributária corrigir o valor de mercado dos bens atribuído pelo empresário indivi- pragmático dum tal princípio;
dual aquando da sua afectação à empresa ou da sua transferência para o seu património individual. c) As que se apoiam na falta de previsão constitucional expressa do conceito de ‘capacidade

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