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Flódio Santos Cuna

Reflexão sobre aspectos sintáticos da negação em português: um estudo de corpus feito


pelos (escrito) da Escola Secundaria de Tete.

Licenciatura em Ensino de Português

3o Ano

Universidade Púnguè

Extensão de Tete

2022
Flódio Santos Cuna

Reflexão sobre aspectos sintáticos da negação em português: um estudo de corpus feito


pelos (escrito) da Escola Secundaria de Tete.

Trabalho de Campo da cadeira de Sintaxe,


Semântica, Pragmática de Português I, a ser
submetido na Coordenação do Curso de

Licenciatura em Ensino de Português, como


requisito parcial de avaliação.

Docente: Prof. Doutor Rufino Alfredo

Universidade Púnguè

Extensão de Tete

2022

Índice
Conteúdo
1. Introdução.........................................................................................................................4
1.1. Objectivos gerais e específicos......................................................................................5
2. Revisão Bibliográfica........................................................................................................6
2.1. Negação na visão de Mateus et alii...............................................................................6
2.1.1. Negação na visão de Culioli......................................................................................7
2.1.2. Classificação dos valores da negação........................................................................7
2.1.3. Unidades negativas e os constituintes negados.........................................................9
2.1.4. Os marcadores de negação: não, nem e sem..............................................................9
Marcador de negação Não........................................................................................................9
2.1.5. Posição do marcador de negação Não.....................................................................10
2.1.6. Marcador de negação Nem......................................................................................12
2.1.7. Posição do marcador de negação nem.....................................................................13
2.1.8. Marcador de negação sem.......................................................................................13
2.1.9. Colocação de marcador de negação sem.................................................................14
2.1.10. Sintagmas com quantificadores negativos...............................................................15
2.1.11. Polaridade das unidades que expressam a negação.................................................15
2.1.12. Marcadores de negação e a polaridade negativa......................................................16
2.1.13. Polaridade de frases e o escopo do marcador de negação.......................................16
2.1.14. Concordância negativa.............................................................................................17
3. Considerações Finais.......................................................................................................18
Referencias Bibliográficas.....................................................................................................19
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Introdução

O presente trabalho fora desenvolvido no Curso de Licenciatura em Ensino de Português,


especificamente na cadeira de Sintaxe, Semântica e Pragmática de Português 1, o mesmo tem
como tema: Sobre aspectos sintáticos da negação em português; um estudo de um corpus feito
pelos alunos (escrito). O trabalho apresenta meramente um capítulo, onde abordo aspectos
sintáticos da negação em duas perspectivas, uma segundo Mateus eta lii e outra segundo Culioli.

Aspectos morfossintácticos, semânticos e pragmáticos, entendidos como correspondendo a


distintos níveis de análise linguística, podem ser considerados de forma unificada através de uma
perspectiva teórica enunciativa que entende como complementares o agenciamento de
marcadores (distribuição e organização dos termos no enunciado), a construção da significação
(valores que resultam de operações) e a relação com a situação de enunciado (composta pelo
parâmetros abstratos sujeito e espaço-tempo).

De acordo com esta perspectiva teórica, um termo, nomeadamente um termo negativo, entendido
como um marcador de operações que podem ser reconstruídas pela análise dos enunciados.
Assim, um termo, independentemente do seu estatuto morfológico, deve ser caracterizado
através da diversidade das estruturas enunciativas em que participa.

A partir dessa diversidade, se estabelecem as operações invariantes que correspondem


identificação desse termo. A análise e a explicação devem então considerar necessariamente
umas inter-relações entre invariabilidade e variabilidade: por um lado, as operações invariantes
que identificam o termo condicionam a amplitude de variação; por outro lado, a variedade de
operações que resultam da diversidade de contextos permite identificar as operações que
permanecem independentemente dos contextos.
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Objectivos gerais e específicos

Objectivo Geral

Falar dos aspectos sintáticos da negação em português.

Objectivos específicos

Definir a categoria negação na perspectiva Mateus et alii e Culioli;

Classificar os aspectos sintáticos da negação;

Indicar a posição dos marcadores de negação;

Detalhar o uso dos marcadores da negação;

Explanar a polaridade dos constituintes da negação;

Exemplificar os quantificadores da negação


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CAPÍTULO I – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Aspectos sintáticos da negação

Neste capítulo, faço uma revisão do ponto de vista descritivo, tendo como base a visão teórica de
dois autores e suas respectivas obras: na perspectiva de MATEUS et al (2003) e na perspectiva
de CULIOLI (1988), referente ao conceito e classificação da negação, as unidades negativas e os
constituintes negados, o uso e a posição dos marcadores de negação: não, nem e sem, os
sintagmas dos quantificadores negativos, a polaridade das unidades que expressam a negação, os
marcadores de negação e a polaridade negativa, a polaridade de frases e o escopo do marcador de
negação e por fim a Concordância Negativa.

MATEUS et al (2003, p. 769), Podemos caracterizar a negação nas línguas naturais como uma
operação que, atuando sobre uma expressão linguística permite denotar quer a inexistência da
situação ou de entidade originalmente reportadas por essa unidade, quer o valor oposto da
propriedade ou quantidade por ela designadas.

O exemplo (1) e (2) ilustram o primeiro caso e (3) e (4) o segundo.

(1) As obras não vão acabar antes de Setembro.


(2) As crianças não telefonaram a nenhum amigo ontem.
(3) Nem todos os projetos foram aprovados pela direcção.
(4) O António vai ouvir não poucos ralhos por ter desrespeitado.

O valor negativo ou positivo presente nas expressões linguísticas é frequentemente designado


como polaridade, respectivamente, polaridade negativa ou positiva. No português a
polaridade positiva é raramente assinalada pela presença de um marcador específico. Assim por
defeito, todas as expressões linguísticas que não contenham nenhum elemento negativo exibem
polaridade afirmativa (cf. (5a) e (5b). De facto, a partícula sim, o marcador de polaridade
positiva por excelência, só ocorre em contextos muito restritos.

(5) (a) As obras vão acabar antes de Setembro? _Sim, vão.

(b) Os meteorológicos pensam que o tempo se agrava nas próximas horas.


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(6) Eu não vou permitir que você fale assim comigo.

A polaridade negativa, pelo contrário requer explicitamente a presença de elementos negativos,


como ilustra o exemplo em (6).

Negação na visão de Culioli

O estudo da negação obriga a considerar previamente uma distinção entre marcadores e


operações. Esta distinção deve integrar necessariamente qualquer proposta de descrição e de
análise do funcionamento da negação e de qualquer outra categoria linguística que tente
compatibilizar a diversidade dos dados com a procura de uma invariante (CULIOLI 1988:92):

A tarefa do teórico é procurar dar conta da diversidade e da complexidade. Em outras palavras,


há um dispositivo invariante e sequências não irregulares de operações que regulam todos esses
fenómenos ligados à negação, durante a produção e reconhecimento das formas textuais?

A categoria linguística da negação considerada, de um modo geral, como


transcategorial, estabelecendo, por isso, relações com diversas categorias
(determinação, modalidade, tempo-aspecto e outras). Alguns marcadores de
negação refletem, em si mesmos, essa característica transcategorial: nunca, de
modo nenhum, ninguém. Outros participam em agenciamentos de marcadores
que relacionam diversas categorias: relação entre o marcador no e adverbiais
temporais como j e ainda, relação entre no e verbos modais (poder, dever, ter
de), CULIOLI (1988, p. 92).

CULIOLI (1988, p. 93), introduz, sem pretender ser exaustivo, quatro tipos de indicadores
negativos: (i) indicadores como (não), sem e nem e a respectivamente distribuídos na relação
com verbais; (ii) afixos negativos como in- e mal- (incrédulos, inábeis); (iii) lexemas de
conteúdo negativo como recusar, temer, impedir, desprovido de; tristeza; raramente; (iv)
negativos indefinidos como nunca, nada.

Classificação dos valores da negação

Para o Português, MICUSAN (1969; 1970) organiza morfologicamente os vocábulos que


exprimem valores negativos da seguinte forma:

a) Advérbios de negação
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Advérbios de negação são palavras que pertencem a uma subclasse dos advérbios e que podem
ser modificadores do grupo verbal ou de constituintes do grupo verbal. Tradicionalmente
considerava-se ‘não’ o único advérbio de negação, mas as gramáticas mais atuais já admitem
outros, como vemos abaixo.

Exemplos:

a) Advérbios

De negação propriamente dita: não; tampouco;

De quantidade com valor negativo: nada;

De tempo com função negativa: jamais; nunca

De lugar com valor negativo: nenhures

b) Pronomes e adjectivos (pronominais negativos): nenhum; ninguém; nada;


c) Conjunto com valor adverbial: nem
a) Preposição: sem
b) Locuções adverbiais

Locuções adverbiais

CUNHA & CELSO denomina locuções adverbiais como o conjunto de duas ou mais palavras
que tem valor de advérbio e de regra, as locuções adverbiais se formam da associação de uma
preposição com um substantivo, com um adjectivo ou com um advérbio.

Locuções adverbiais

De negação propriamente dita: qual nada; pelo contrário; nem por sombras; também no; etc.

De modo: de nenhum modo; de nenhuma maneira; de modo algum de tempo: nunca por nunca;
nunca mais; em tempo algum, etc.

De lugar: em nenhum sítio; em nenhuma parte

c) Substantivos: um vintém, um pingo


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A negação é uma categoria ausente na generalidade das gramáticas do Português, sendo referida
apenas em raras e avulsas considerações. Constitui excepção a gramática de MATEUS et al
(2003:645), cujo capítulo sobre a negação introduz algumas questões essenciais no estudo da
sintaxe da negação (MATOS 2003:767).

Os termos negativos do Português apresentado MICUSAN (1970:56) foi proposto tendo em


conta um estudo comparativo com o Castelhano e o Romeno. Especificamente em relação ao
Português, o quadro apresenta algumas lacunas e inclui termos de importância secundária.
Porém, constitui uma tentativa pioneira de organizar morfologicamente os termos de valor
negativo, tentando revelar a relação entre a negação e outras categorias.

d) De tempo: nunca por nunca; nunca mais; em tempo algum, etc.


e) De lugar: em nenhum sítio; em nenhuma parte
f) Substantivos: um vintém, um pingo

Unidades negativas e os constituintes negados

Nos constituintes negados, a polaridade negativa decorre da presença de certas unidades, os


marcadores de negação e os quantificadores negativos (1).

Estamos a referir-nos a itens lexicais como ninguém, nada, nunca. Nota se,
porém que o seu estatuto quantificacional tem sido alvo de debate. Assim por
exemplo, LAKA et al (1997:234) assumem a sua natureza quantificacional
(universal ou existencial), enquanto DESPREZ (1997:123) defende que são
sintagmas indefinidos de valor quantificacional variável. MATEUS et al
(2003:770).

Os marcadores de negação: não, nem e sem

Os marcadores negativos são núcleos que negam as unidades sobre que tem escopo. O português
europeu apresenta três marcadores de negação fundamentais que ocorrem em domínios
estruturas diversos, à saber: não, nem e sem.

Marcador de negação Não


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Não é o marcador de negação mais generalizado: para além de ser o marcador prototípico da
negação frásica, pode negar sintagmas ou itens lexicais, como exemplificado respectivamente em
(1), (2) e (3), seguintes:

(1) Nós não comprámos esse telefone.


(2) Os docentes mas não os alunos participaram nesse seminário.
(3) (a) Esse problema coloca-nos uma questão não-resolúvel.

(b) o arguido declarou-se não-culpado

Em (1), a negação tem escopo sobre o predicado, comprámos esse telefone. Em (2) o constituinte
negado é o sintagma nominal os alunos, que é posto em contraste com constituinte nominal os
docentes. Em (3), a negação afecta apenas a palavra a que esta associado (resolúvel). Neste
ultimo caso não funciona como um afixo (3a) que, por vezes, comuta com prefixos de negação cf.
(4), como i (n) em (4), sendo a sua natureza como componente da palavra materializada
graficamente pela presença de um hífen (veja-se (3)).

(4) Esse problema coloca-nos uma questão irresolúvel.

No caso em 4, em MATEUS et al (1992:678) são apresentados como prefixos de negação ab-,


abs-, a-, de-, des-, in-, i-, ir-, anti-, os quais são ilustrados por exemplos como os seguintes:

(i) Nomes: impossibilidade; inacção, desconcerto;


(ii) Adjectivos: anormal, impermeável, ilegal, antiaéreo;
(iii) Verbos: abdicar, amover, decrescer, desviar.

Posição do marcador de negação Não

Os marcadores de negação padrão em Português Europeu, precedem o constituinte que negam.

 Na negação o predicado,
 Na negação sintagmática todo o sintagma em questão, lexical a palavra negada.

Na negação frásica, a posição canónica do marcador de negação não é no início do constituinte


que exprime o predicado. Independentemente do tipo de frase envolvido, seja ela declarativa,
interrogativa e imperativa.
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Exemplos:

(5) Os jogadores não têm assumido as suas obrigações na preservação do equipamento


(6) Neymar Jr não tem ido aos treinos ultimamente?
(7) Não faça esforço demais!

Não, enquanto marcador de negação frásica, forma como o verbo que precede. Nos complexos
verbais corresponde o primeiro elemento verbal, como uma unidade sintática que não pode ser
fragmentada. Esta propriedade é atestada pelos exemplos que se seguem mal formados.

(8) *Telefonou ninguém não durante a tua ausência.


(9) *Tem eles não afirmado que as listas de espera na educação podem desaparecer.

Quando o marcador não parece ocorrer depois do primeiro verbo, explica pelo facto de poder ser
um verbo que ainda não se auxiliarizou.

(10) Os meninos podem não ter lido esse livro.

O marcador não pode encontrar-se em adjunção estreita ao verbo, apenas admitindo que
pronomes clíticos se interponham. Exemplo:

(11) Neymar Jr não lhe ofereceu ainda nenhum presente de aniversário.


(12) Neymar Jr ainda não ofereceu nenhum presente de aniversário à Benedita.

O marcador de negação frásica não pode ser redobrado. Assim em frases exclamativas, uma
nova ocorrência de não pode surgir numa posição periférica pós-frásica. Exemplo:

(13) Neymar Jr não diria isso à Benedita, não!


(14) Não saio do quarto hoje, não!

A estrutura das frases negativas foi desde os finais dos anos 80 e durante a
década de 90 alvo de investigação intensiva. A partir do estudo de POLLOCK
(1989:234) forma propostas representações da estrutura da frase que expandem
a categoria funcional Flex em dois nós distintos T (empo) e Ac (ordo).
POLLOCK (1989:234) propõe ainda que o marcador de negação frásica
projecte uma categoria funcional entre as projecções de T e Ac, a natureza de
clítico verbal ou de quase clítico do núcleo levaria o núcleo negativo a elevar-
se e a adjungir-se ao verbo em T. MATEUS eta lii, (2003:776).
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O marcador de negação não não pode surgir quando na frase existe um sintagma negativo
precedendo o complexo verbal. Veja-se o contraste entre (15) e (16).

(15) Nenhuma menina viu esse filme.


(16) *Nenhuma menina não viu esse filme.

Para a frase poder ser interpretada como negativa, a presença do marcador de negação é
obrigatória quando nenhum outro elemento negativo precede no domínio frásico o núcleo verbal.
Veja os exemplos seguintes:

(17) Não vi esse filme.


(18) Vi esse filme.

Marcador de negação Nem

Nem é o marcador de negação tipicamente utilizado na coordenação. Exemplo:

(19) Neymar Jr e a Angélica não leram o jornal nem viram o seriado.

Segundo MATEUS et al (2003:772), quando opera no domínio da coordenação, nem acumula as


funções de conjunção e de marcador de negação, podendo ser parafraseado por e não, quando
coordena frases, como em (20). Porem, quando coordena sintagmas que não envolvem o núcleo
verbal da frase, nem não pode comutar com e não deste modo os exemplos (21) e (22) são
malformados.

(20) Neymar Jr e a Angélica não leram o jornal não viram o seriado.


(21) *Não foram nem ao campo e não ao jardim.
(22) *Não foram e não ao campo e não ao jardim.

Ainda sobre MATEUS et al (2003, p. 772), quando não é uma conjunção de coordenação, nem
surge como modificador dos adverbiais mesmo e sequer, podendo este último encontrar-se
explicitamente realizado ou subentendido (veja-se (23)).

(23) Neymar Jr e Messi não fizeram festa de aniversário, por isso nem sequer/nem
mesmo o Mbappé foi convidado.
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Ocorre também como marcador de negação do quantificador todos (cf. (24)). Em (24), todos não
poderia ser substituído por outro quantificador indicado pluralidade como mostram os exemplos
impossíveis de (25).

(24) Nem todos os meninos compareceram ao seminário.


(25) *Nem alguns/muitos/poucos meninos compareceram ao seminário.

Posição do marcador de negação nem

Em construções de negação frásica, a distribuição do advérbio é bastante restrita. Nestes casos,


ocorrem sempre em posição de adjacência à esquerda do verbo, mesmo em construções
interrogativas que envolvem a inversão do sujeito com o verbo.

Exemplos:

a) Neymar Jr (nem) comprou flores à Angélica.

b) O que (nem) comprou Neymar Jr à Angélica?

Em construções de negação do grupo verbal, o advérbio pode modificar qualquer constituinte do


grupo verbal. Neste caso, ‘nem’ encontra-se adjacente ao constituinte modificado, conforme
abaixo:

Exemplos:

a) modifica todo grupo verbal.

Neymar Jr (nem comprou flores à Angélica ontem).

b) modifica o objeto direto

Neymar Jr comprou à Angélica ontem (nem flores), mas livros.

c) modifica o advérbio de tempo

Neymar Jr comprou flores à Angélica (nem ontem), mas hoje.

d) modifica o objeto indireto

Neymar jr comprou flores ontem (nem à Angélica), mas à Inés.


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Marcador de negação sem

Sem funciona como uma preposição de sentido negativo, como em (26), ou um complementador
negativo (veja-se (27)), que nas frases finitas integra a locução sem que (cf. (28)). Pode ainda
ocorrer como um afixo como em (29) e (30):

(26) Os meninos resolveram os exercícios sem ajuda do professor.


(27) Neymar Jr e Messi partiram para férias sem se despedirem de nós.
(28) Neymar Jr e Messi partiram para férias sem que se despediram de nós.
(29) Os sem-terreno revoltam-se contra o governo central.
(30) As manifestações de apoio aos sem-abrigo são particularmente visíveis no Natal.

Em suma sem assume o estatuto de marcador de negação sintagmática ou de negação frásica.

Colocação de marcador de negação sem

No âmbito de negação frásica, o marcador negativo sem funciona como um complementador.


Ocorre, pois, antes de qualquer outro elemento da frase subordinada que introduz visualizado em
(31), (32) e (33).

(31) Neymar Jr saiu de casa sem a Angélica ter reparado nisso.


(32) Esse menino chora sem que tenha motivos para o fazer.
(33) … [scomp sem que [sflex tenha motivos para o fazer]].

A frase subordinada funciona como o seu domínio de negação. Nesse domínio de negação
nenhum outro marcador de negação frásica é admitido (veja-se (34) e (35).

(34) *Neymar Jr saiu de casa sem a Angélica não ter reparado nisso.
(35) *Esse menino chora sem que não tenha motivos para o fazer.

Na frase subordinante, porém, a presença de um marcador de negação é permitida. A sua co-


ocorrência com sem produz um efeito de cancelamento da negação, que os exemplos em (36) e
(37).

(36) Neymar Jr saiu de casa sem a Angélica ter reparado nisso.


(37) Esse menino não chora sem que tenha motivos para o fazer.
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Os exemplos a cima denotam situações que podem ser reportadas pelas frases afirmativas
correspondentes, ou seja:

(38) Neymar Jr saiu de casa, tendo a Angélica reparado nisso.


(39) Esse menino chora apenas quando tem motivos para o fazer.

Quando funciona como marcador de negação sintagmática. Sem procede o sintagma negado;
dada a sua natureza preposicional, como explicitado em (40).

(40) O Flódio fez o trabalho [sp sem [a ajuda do professor, Doutor Rufino]].

Sintagmas com quantificadores negativos

MATEUS et al (2003:773), para além dos sintagmas negados através de marcadores de negação,
existem outros que devem a sua natureza negativa à presença de quantificadores negativos que
podem por si sós ou em combinação com nomes formar uma expressão negativa. Os exemplos a
seguir ilustram estes casos.

(a) Ninguém gosta de levar bronca.


(b) Nada satisfaz o âmago de Flódio.
(c) Nunca se soube a posição exacta do navio Titanic.
(d) Nenhuma mulher gosta de ser maltratada.
(e) Em nenhuma ocasião a Angélica descurou as suas obrigações

O quantificador que ocorre com o núcleo nominal realizado é preferencialmente nenhum (a) e
pode aparecer em posição pré ou pós nominal, conforme (41) e (42). Em posição pós-nominal, e
exclusivamente nesta posição, surge também com sentido negativo o quantificador algum (a)
modificando um nome no singular veja-se (43) e (44).

(41) Mulher nenhuma gosta de ser maltratada


(42) Em ocasião nenhuma a Angélica descurou as suas obrigações.
(43) Pessoa alguma gosta de ser maltratada.
(44) Em ocasião alguma a Angélica descurou as suas obrigações.
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Polaridade das unidades que expressam a negação

MATEUS et al, (2003:700) usualmente, as unidades que expressam a negação tem polaridade
negativa inerente, ou seja, por isso sós veiculam o sentido da expressão linguística a que se
aplicam. Porém, há expressões que só são interpretadas como negativas quando estão sob facto
de elementos intrinsecamente negativos. São expressões de polaridade subespecificada.

MATEUS et al (2003:780),

Os dados da diacronia atestam a perda do valor negativo dos marcadores de


negação frásica ou seja as unidades que por excelência detém a carga de
polaridade negativa das frases. Essa perda semântica é usualmente compensada
pela utilização de palavras de reforço, inicialmente sem valor negativo, mas
que, dado contexto em que ocorrem acabam por o adquirir, e numa fase
posterior, substituir as iniciais, que acabam por desaparecer. Esse processo
evolutivo é usualmente designado ciclo de jespersen. Nesta língua o marcador
de negação inicial, ne, foi reforçado por pas, etimologicamente, uma palavra
não negativa (pas=passo), a par de outras que designavam igualmente
quantidade mínimas (miette=migalha, point=ponto), actualmente pas assumiu o
valor de verdadeiro marcador de negação e tende na oralidade a ocorrer só,
prescindindo da presença de ne.
Marcador de negação e a polaridade negativa

Em Português, na generalidade dos casos, os marcadores de negação apresentam polaridade


negativa intrínseca. Essa propriedade verifica-se tanto na negação frásica e sintagmática como na
negação a nível da palavra. A ausência do marcador negativo a sua substituição por sem sentido
negativo faz com que a expressão linguística afectada assuma polaridade positiva.

Exemplos:

(45) Os jornais não noticiaram o desastre.


(46) Os jornais noticiaram o desastre.

O conteúdo negativo do marcador de negação frásica é especialmente evidente. Ele pode ocorrer
isoladamente, recuperando por si só o conteúdo elíptico de uma frase negativa:

O exemplo a seguir ilustra uma questão e uma resposta.

(47) Os jornais noticiaram o desastre? É a pergunta. Não é resposta


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Polaridade de frases e o escopo do marcador de negação

Nem todas as frases que contem constituintes exibindo marcadores negativos apresentam
polaridade negativa. A interpretação de uma frase como afirmativa ou negativa depende do
domínio sintático que os marcadores de negação afectam. Veja-se os exemplos seguintes:

(48) Neymar Jr não viu a Angélica e o Messias também não viu.


(49) Neymar Jr viu a Angélica e o Messias também viu

O complementador negativo sem, embora introduza uma frase que é interpretada como negativa
não admite coordenações com frase em que a expressão de polaridade também não apareça. Pelo
contrário é a expressão também que pode ocorrer, confira a frase seguinte:

(50) *Neymar Jr saiu sem que a Angélica o cumprimentasse e a Benedita também não.
(51) Neymar Jr saiu sem que a Angélica o cumprimentasse e a Benedita também.

Nota: em sintaxe, o escopo de uma unidade coincide tipicamente com o seu domínio de
comando.

Concordância negativa

Segundo MATEUS et al (2003:789), designa-se por Concordância Negativa a propriedade que


algumas línguas têm de permitirem, em certas circunstâncias, a ocorrências num mesmo domínio
sintático de mais de um constituinte negativo, sem que por isso a frase seja malformada ou as
diferentes instâncias de negação se cancelem umas às outras e a expressão linguística passe a ser
interpretada como positiva.

As frases seguintes apresentam Concordância Negativa, respetivamente nos domínios frásicos e


sintagmático.

a) Ninguém diz nada nunca.


b) Neymar Jr não cumprimentou ninguém.
c) Nunca ninguém viu ainda esse jogo de futebol.
d) Devido às chuvas torrenciais os camponeses ficaram sem nada.
e) *O pessoal não-docente compareceu a nenhuma reunião.
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CAPÍTULO II – METODOLOGIA: A RECOLHA DE DADOS

Introdução

Na perspetiva de GUBA et al (1981),

Todo o processo de pesquisa precisa de apresentar um valor próprio, aplicabilidade,


consistência e neutralidade de forma a ter valor científico. Assim, o rigor procurado, usando
um paradigma quantitativo, é conseguido usando critérios de validade interna e externa,
fiabilidade e objetividade, num paradigma qualitativo procura-se a confiabilidade usando
como critérios a credibilidade, ou seja a capacidade dos participantes confirmarem os dados,
a transferibilidade, ou seja, a capacidade de os resultados do estudo serem aplicados noutros
contextos, a consistência ou seja, a capacidade de investigadores externos seguirem o mesmo
método usado pelo investigador e a aplicabilidade ou confiabilidade, ou seja, a capacidade de
outros investigadores confirmarem as construções do investigador.

Devido a necessidade da investigação sobre a realização de aspectos sintáticos da negação


nem, não e sem por falantes do português moçambicano implicou a adoção de certas técnicas
sobre a natureza dos dados a recolher e sobre os materiais, procedimentos e tratamento dos dados
recolhidos. Dada a insuficiência de corpora específicos sobre aspectos sintáticos da negação, a
utilização de inquéritos afigurou-se como uma metodologia adequada para os propósitos do
trabalho.

No corpus do Português escrito de Tete constituído no sistematizado em Cadernos de Pesquisa,


por exemplo, são anotados, apenas, alguns casos de ocorrência de aspectos sintáticos da negação
sem e não em falantes do português moçambicano, L2.

(1) Neymar Jr saiu de casa sem a Angélica ter reparado nisso.


(2) Esse menino não chora sem que tenha motivos para o fazer.

O Corpus escrito

Na concepção de TODOROV (2001), corpus é um “conjunto, tão variado quanto possível, de


enunciados efetivamente emitidos por usuários da referida língua em determinada época”. Para
TRASK (2004), corpus é “um conjunto de textos escritos ou falados numa língua, disponível
para análise”
19

Uma das finalidades dos inquéritos era de verificar qual é o domínio dos informantes
relativamente ao uso de aspectos sintáticos da negação. No entanto, identifiquei e inqueri dez 10
estudantes de classes distintos encontrados no meu Bairro, variando de classes entre 8 a e 10a. Os
presentes inqueridos apresentam resultados diversificados.

QUADRO I: NÚMEROS E PERCENTAGENS

NÚMEROS E Homem Mulher


PERCENTAGENS

Numero 7 3

Percentagem 70% 30%

Material e procedimentos

Material e procedimento no teste de produção provocada O teste de produção provocada foi


precisamente aplicado a dez 10 sujeitos falantes do português moçambicano inquiridos, com o
intuito de mostrar algumas estruturas linguísticas, em particular aspectos sintáticos da negação
nem, não e sem, em diferentes contextos de realização:

 A ocorrência do marcador negativo sem antes de qualquer outro elemento da frase


subordinada que introduz visualizado em;
 A ocorrência do marcador de negação não no início do constituinte que exprime o
predicado;
 A ocorrência do marcador negativo nem em posição de adjacência à esquerda do verbo.

As frases selecionadas para a produção de inquéritos distribuem-se em frases simples. Os


sujeitos deveriam produzir uma frase da seguinte forma: Produze duas frase com simplesmente
um verbo para cada marcador de negação Nem, Sem e Nem. Os mesmos deviam escolher e
colocar o marcador de negação (Não) numa das frases que se seguiam em baixo.

Os alunos tinham que produzir duas frases simples para cada marcador de negação Nem, Sem e
Nem.
20

Uma das perguntas que se fez aos inqueridos para testar o seu domínio quanto ao uso do
marcador de negação não foi a seguinte:

Escolhe e coloque o marcador de negação (Não) numa das frases que se seguem:

____Vi esse filme.

Vi____esse filme.

Vi esse filme_____.

Vi esse____filme.

Tratamento dos dados escritos

Posteriormente a recolha de dados realizou-se a leitura dos dados fornecidos por sujeitos falantes
do português moçambicanos inquiridos para a verificação da integridade das respostas. Em
seguida fiz a comparação das respostas dadas pelos inqueridos onde pude perceber a
percentagem dos que formularem bem e dos que responderam com algumas dificuldades.
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CAPÍTULO III–DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

A negação, fenômeno amplamente difundido nas línguas, tem tradicionalmente, lugar de


destaque nos estudos da área de Semântica. Há uma série de questões envolvendo a negação que
merecem atenção em abordagens que se voltam para semântica das línguas naturais, uma vez
que, de modo geral, as línguas apresentam diversas formas de expressar semanticamente a
negação de conteúdos veiculados nos enunciados de sentenças. Pode-se falar da existência de
negação lexical, negação de constituinte e negação sentencial. Neste capítulo, apresento, em
primeiro lugar, os resultados dos inquéritos aplicados aos sujeitos falantes do português
moçambicano inquiridos, o que constitui o conjunto de dados fundamentais com que
trabalhámos. Na segunda parte, faço a análise semântica dos fenómenos encontrados.

Aspectos sintáticos da negação do português falado em Moçambique

Um dos aspectos que aproxima o português falado em Moçambique do português falado em


Portugal é o que diz respeito às possibilidades de negação sentencial. O português europeu
apresenta determinadas estruturas sentenciais para expressar a negação, como nas frases “Não
quero não” e “Quero não”.

 Casos em que o marcador de negação é adjacente ao verbo e subjacente ao próprio verbo


conforme ilustra o exemplo em (1).
 O marcador de negação frásica não pode ser redobrado. Assim em frases exclamativas,
uma nova ocorrência de não pode surgir numa posição periférica pós-frásica conforme
ilustram ((2) e (3)).
 Em construções de negação do grupo verbal, o advérbio pode modificar qualquer
constituinte do grupo verbal. Neste caso, ‘nem’ encontra-se adjacente ao constituinte
modificado, conforme ((4) e (5)).

(1). Não quero não ir à Maputo.

(2). O António não diria isso, não.

(3). Não saio do quarto hoje, não


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(4). A Maria nem comprou flores ontem.

(5). Nem comprei sapatos e nem calções.

Resultados de tarefa de produção provocada

Os resultados da tarefa de produção perante aspectos sintáticos da negação mostram que os


sujeitos do português falado em Moçambique inquiridos realizam de forma diversificada.

Posição do marcador de negação

 Não

Quanto à posição do marcador de negação não, dos 10 alunos inqueridos 6 colocam-no adjacente
ao verbo.

 Nem

Quanto à posição do marcador de negação nem, dos 10 alunos inqueridos 8 colocam-no


adjacente ao constituinte negado.

 Sem

Quanto à posição do marcador de negação sem, dos 10 alunos inqueridos 8 colocam-no


adjacente ao SN e 2 subjacente ao SN.

Uso do adverbio de negação ‘nem’ do português em algures de Tete.


Muita gente em algures da cidade de Tete, confunde e utiliza o adverbio de negação ‘nem’ como
se fosse sinônimo da palavra ‘também’, ou seja, o nem passa a desempenhar a função de
inclusão.

Alguns exemplos:
a) Fala para o António esperar-me nem eu vou para lá.
Se levarmos em consideração o conceito de adverbio de negação nem, as frases em cima estão
completamente erradas, porque dizer nem eu vou para lá, estás a afirmar que você não vai.

Vamos troncar o adverbio nem com o adverbio também:


b) Fala para o António esperar-me, eu também vou para lá.
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O exemplo da alínea b, mostra que as duas pessoas vão ao mesmo sitio, ao contrário do primeiro
exemplo onde tronca-se o adverbio ‘também’ pelo adverbio de negação ‘nem’.

Normalmente, este adverbio é utilizado para expressar a ideia de comparação, equivalência ou


similitude.
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Considerações Finais

Após a pesquisa desencadeada por mim e que culminou com a realização deste trabalho pude
concluir que a tradição gramatical portuguesa considera ‘nem’ apenas uma conjunção
coordenativa correlativa, que ocorre sempre na estrutura ‘nem … nem’. Em outras palavras ela
tem a função de correlacionar duas frases coordenadas, independentes sintaticamente.

Porém, muitos autores atuais divergem na classificação desta palavra. É o caso da gramática de
Antônio Afonso Borregana, na qual se inclui ‘nem’ na subclasse dos advérbios de negação.
Confirma também está classificação o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, dando como
exemplo: “Nem pense em fazer isso”.

A maioria dos gramáticos consideram tal palavra apenas como conjunção coordenativa, mas
torna-se completamente aceitável, com base em diversos exemplos, que a palavra seja
considerada um advérbio de negação.
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Referências Bibliográficas

__S/A. Gramática Moderna da Língua Portuguesa. 3a edição. Escolar; Lisboa; 2015.

Mateus et al. Gramática da Língua Portuguesa. 7a edição. Caminho; Lisboa, 2003.

Instituto António Houaiss. Dicionário Electrónico Houaiss da Língua Portuguesa. S/l: Editora
Objectiva, 2001.

CULIOLI, Antoine. Pour une linguistique de l’énonciation. Editions, OPHRYS, 1999

ANTONIO, Moreno Aspectos da negação no português uma abordagem enunciativa.


Universidade Nova de Lisboa. Tese de Doutoramento. (2005).
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ANEXOS

Questionário produzido para os alunos da 10a classe.

Este inquérito fora produzido no âmbito da cadeira de Sintaxe, Semântica e Pragmática de


Português I, o mesmo tem como finalidade à recolha de dados dos falantes moçambicanos,
para uma comparação com o português europeu.

i) Dados preliminares

Género____________.

Turma_____.

Nacionalidade______________.

Aula da disciplina de Português que mais te marcou______________________.

ii) Questões sobre a colocação de marcadores de negação (Não, Nem e Sem).

A partir dos constituintes linguísticos que se encontram entre parênteses, formule uma
frase correta ao seu critério.

(1) (matriculado, mas, foi, o João, não, a escola, vem)


______________________________________________________________________________
(2) (O Flódio, os doces, comer, nem, tempo, levou, para,)
______________________________________________________________________________
(3) (vivem, a Maria, os meninos, não, sem,)
______________________________________________________________________________
(4) (chegam, os, tempos, verão, de, turistas, não)
______________________________________________________________________________
(5) (foram, nem, os, ao teatro, todos, alunos)
______________________________________________________________________________
(6) (direitos, alguns, funcionários, os, consideram, não)
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______________________________________________________________________________
(7) (desporto, contestam, todos, a, adeptos, derrota, do, os)

______________________________________________________________________________

(8) (Neymar Jr, sem, que o, a Benedita, cumprimentasse saiu, e a Angélica também)

______________________________________________________________________________

Produza uma frase utilizando os advérbios de negação (nunca e jamais)

__________________________________________________________________.

__________________________________________________________________.

Aponte a frase que está bem formulada.

Neymar Jr saiu de casa sem a Angélica não ter reparado nisso.

Neymar Jr saiu de casa, tendo a Angélica reparado nisso.

Produza uma frase utilizando os marcadores de negação (Nem, Sem e Nem)

_____________________________________________________________________.

_____________________________________________________________________.

_____________________________________________________________________.

Escolha e coloca o marcador de negação (Não) numa das frases que se seguem:

____Vi esse filme.

Vi____esse filme.

Vi esse filme_____.

Vi esse____filme.

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