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Aula 3 - Complicações Da Cirrose Hepática
Aula 3 - Complicações Da Cirrose Hepática
Principais complicações:
• Encefalopatia hepática
• Síndrome hepatorrenal
• Varizes esôfago-gástricas
• Ascite
• Peritonite bacteriana espontânea
ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
• Síndrome neuropsiquiátrica potencialmente reversível decorrente de um problema hepático agudo.
Hepatopatia crônica avançada (cirrose) – com problemas hepáticos de base, mais comum
Insuficiência hepática aguda (hepatite fulminante) – sem problemas hepáticos de base
Patogênese
• Complexa e multifatorial
• Principalmente decorrente de acúmulo de amônia no SNC
Provém do metabolismo de proteínas, são absorvidas pelos enterócitos e convertidas em amônia, caindo em
seguida na corrente sanguínea. Em condições normais, essa amônia é degrada pelo fígado em ureia, que não é
tóxica.
Em condições de hipertensão portal, insuficiência hepatocelular, fígado insuficiente/doente ou desvio do fluxo
habitual do fígado (circulação colateral), há alterações da amônia. A amônia sai do intestino caindo na corrente
sanguínea e passando pelo fígado onde é metabolizada e eliminada, nessas alterações, a amônia entra pela
circulação colateral (decorrente da hipertensão portal), e “by passar” o fígado, ou seja, não é metabolizada pelo
fígado, passa por outro caminho não sendo metabolizada em ureia (acúmulo de amônia devido a hipertensão
portal). Além disso, no fígado doente, os hepatócitos não são capazes de metabolizar totalmente amônia em
ureia. Assim, a amônia cai na circulação sistêmica chegando aos demais órgãos do corpo incluindo o SN.
No SNC, além do excesso de amônia, há aumento da captação de aminoácidos pela barreira
hematoencefálica (motivos não explicados) – a BHE fica mais pérvia e a amônia entra com maior facilidade.
Amônia causa edema cerebral do tipo celular (aumenta a osmolaridade dos astrócitos), inibe a atividade
elétrica neuronal pós-sináptica, aumento da produção e liberação de GABA – mediadores depressores do SNC
(depressor da atividade cortical) = diversos fatores que levam as alterações neuropsiquiátricas.
Quadro clínico
• Sonolência/letargia
• Agitação/agressividade/confusão mental
• Inversão do ciclo sono-vigília
Troca o dia pela noite continuamente
Exame físico
• Fala arrastada
• Bradipsiquismo
• Fetor hepaticus: cheiro “azedo”
• Flapping/Asterix
Extensão do braço e segurar o punho em 90°. O paciente com encefalopatia, vai deixar a mão cair em bater
de asa de borboleta
• Reflexos tendinosos alterados
• Crises convulsivas
• Postura de descerebração
RNM com espectroscopia: vê metabolismo cerebral – promissor (ainda não tem muitos estudos, não é feito na prática
clínica)
Tipos clínicos
EH mínima: imperceptível clinicamente,
paciente parece bem mas com testes
específicos é possível ver a EH.
EH aguda esporádica = OS
EH crônica = maioria das vezes já tem
acompanhamento com especialista.
EH associada à insuficiência hepática fulminante: paciente sem problemas de base que abre um quadro muito grave de
doença hepática e uma das manifestações da gravidade é a encefalopatia.
Encefalopatia Aguda pode ser:
• EH episódica: 1x em 6 meses
• EH recorrente: mais 1x em 6 meses
Fatores precipitantes
• HDA: hemoglobina fica no TGI, degrada em heme + globina. Globina é um aminoácido – reabsorvida – forma amônia
• Infecções: alteração permeabilidade intestinal e de BHE. Lembrar peritonite bacteriana espontânea (todo paciente
que chega ao PS com ascite é obrigatório descartar infecções de forma geral e puncionar ascite para ver se a infecção
no líquido ascítico.
• Desidratação/hipovolemia: excesso de diuréticos (furosemida, lasix) em pacientes cirróticos, PGV (paracentese de
grande volume) retirada de muitos litros de líquido ascítico sem reposição de albumina, paciente pode desenvolver
encefalopatia.
• Drogas psicoativas: álcool, sedativos (BZD e barbitúricos) – fazer endoscopia digestiva alta
• Procedimento cirúrgico (estresse, sedativos)
• Constipação intestinal: mais tempo de contato entre fezes e mucosa intestinal, mais absorção de proteínas.
• Shunts portossistêmicos (desvios): veia porta para hepática e circulação sistêmica by passando o fígado
Espontâneos: esplenorrenal (hipertensão portal)
Cirúrgicos: incluindo o TIPS – shunt portossistêmico intra-hepático transjugular. Coloca-se um stent entre a
veia porta e a veia hepática. Indicações: HDA varicosa incontrolável (reduzir pressão intra-hepática). Isso faz
com que a amônia caia direto na circulação sistêmica sem passar pela metabolização hepática = encefalopatia
na maioria dos pacientes que fazem o procedimento.
Diagnóstico diferencial
• Encefalopatias metabólicas: hipóxia (DPOC), narcose, acidose
• Encefalopatias tóxicas: álcool, psicotrópicos
• Lesões intracranianas: hemorragia, infarto, tumor, abscesso, encefalite
• Distúrbios neuropsiquiátricos: esquizofrenia, bipolaridade
Diagnóstico
• Clínico
• História clínica e exame físico compatíveis
• Sem outras causas que os justifiquem (descartar diagnósticos diferenciais)
• Dosagem sérica de amônia (?): não dosa para diagnóstico de EH, pois não é específica nem sensível. Ou seja,
amônia normal ou baixa não descarta EH e amônia alta não afirma.
SÍNDROME HEPATORRENAL
Manifestações renais decorrentes de um problema hepático
• Insuficiência renal funcional
Não há lesões no rim (obstruções ou defeitos anatômicos)
• Potencialmente reversível (tratando o causar do síndrome há restabelecimento da função renal)
• Insuficiência hepática aguda ou crônica
• Ausência de doença renal: estrutural/não estrutural
Fisiopatologia
• Sistema porta do cirrótico completamente congestionado. Para compensar a congestão → vasodilatação (óxido
nítrico) → sistêmica e especialmente esplâncnica.
• Vasodilatação esplâncnica – redução do volume circulante efetivo – rim entende que está perdendo líquido – ativação
SRAA (retenção de sal e água) – vasoconstrição renal = redução da TFG = síndrome hepatorrenal
Diagnóstico
Critérios:
• Diagnóstico de cirrose com ascite
• Lesão Renal: Creatinina sérica > 1,5mg/dl ou aumento > 0,3 mg/dl em 48h ou > 50% do valor basal em até 7 dias
(últimos 3 meses)
Paciente cirrótico é desnutrido, creatinina basal muito baixa: por vezes não alcança 1,5mg de creatinina (por
exemplo, por apresentarem taxa basal o valor de 0,8 de creatinina pode ser considerado aumentado em
pacientes que normalmente tem 0,3 de creatinina basal)
• Ausência de melhora da creatinina sérica após 2 dias de retirada de diuréticos (pacientes ascítico em uso de
diuréticos) e expansão volêmica com albumina (1g/kg/dia) – importante salvar o rim e depois resolver ascite.
Se paciente melhora, exclui síndrome hepatorrenal. Se excluída, a causa é pré-renal.
• Ausência de choque – causa pré-renal
• Ausência de uso recente ou atual de drogas nefrotóxicas (lesão renal intrínseca)
• Ausência de doença parenquimatosa renal, definida por (1) proteinúria > 500mg/dia; (2) hematúria > 50 células por
campo de grande aumento e (3) US renal normal → problema renal de base descarta síndrome hepatorrenal
Fatores precipitantes
• Sangramento gastrointestinal
• Infecção (especialmente PBE)
• Diurese intensa com rápida perda de peso (desidratação)
• Paracentese de grande volume sem reposição de albumina
Tratamento SHR tipo 1 (paciente evolui rápido de forma • TTO definitivo: transplante hepático.
mais grave)
• Manter estado euvolêmico (hidratado) Tratamento SHR tipo 2
• Retirada de agentes nefrotóxicos (aminoglicosídeos • Manejo: ascite refratária
e anti-inflamatórios) e diuréticos • Restrição sódio
• Tratar infecção (se houver) • Restrição hídrica se hiponatremia
• Terlipressina: vasoconstricção esplâncnica + • Diureticoterapia: espironolactona + furosemida
albumina EV (aumentar pressão oncótica, paciente • Paracentese + reposição de albumina
com pouca albumina) • Considerar TIPS
• Casos refratários: TIPS (aliviar pressão portal) • Transplante hepático
HDA VARICOSA
• A HD no cirrótico pode ser varicosa ou não varicosa
• Sangramento proveniente de rupturas de varizes esofágicas ou gástricas.
• 50% cirróticos tem varizes esofágicas; 30% sangram; 30% morrem; 70% ressangram
• Esôfago coberto por cordões varicosos: arroxeados, tortuosos
Varizes gástricas
• Recidiva de sangramento varia de 25 a 90%
• Mortalidade de 20%
Consenso EASL
Acompanhamento
• Acompanhamento da função hepática, etiologia da cirrose, alfafetoproteina + USG para rastreamento de
hepatocarcinoma e endoscopia para diagnostico de varizes. Se na primeira endoscopia o paciente não tem varizes
repetir a endoscopia a cada 2 a 3 anos. Se tem varizes de pequeno calibre repetir a cada 1 a 2 anos.
Então:
• CH compensada sem varizes – EDA a cada 2 a 3 anos
• CH com varizes de pequeno calibre – EDA a cada 1 a 2 anos
• Varizes de médio e grosso calibre: precisa tratar
Profilaxia primária – nunca sangrou antes • Último caso sem ligadura: injeção de etanolamina (faz
• Varizes médio ou grosso calibre – ligadura elástica ou esclerose, seca a variz) – técnica mais dolorosa, com
β-bloqueador (propranolol, nadolol, carvedilol). mais retração cicatricial, mais tempo para erradicação.
Depende das condições do paciente, financeiro, OBS: ligadura elástica – feita de distal para proximal (de
contraindicação a β-bloq – critério do médico baixo para cima) nas varizes. Em caso de HD tratar primeiro
Ligadura elástica: erradicação das varizes em onde está sagrando ou onde pode ser um ponto de ruptura
menor intervalo de tempo sem necessidade de (sinal do monte de santa Helena).
usar medicação para o resto da vida.
• Varizes de pequeno calibre com sinais de alto risco Balão de Sengstaken-Blackmore (BSB)
(red spots – manchas hematocísticas), Child B ou C • Por via oral ou nasoenteral
Geralmente usa β-bloqueador, varizes de • Insuflar balão gástrico e esofágico – não se sabe onde
pequeno calibre são difíceis de fazer ligadura é o sangramento – estancando o sangramento de
elástica e custo fundo gástrico e esôfago. Cuidado para não causar
ruptura de esôfago (mortalidade alta) – insuflação dos
Conduta no sangramento – VARIZES balões com manômetro (controlado por pressão).
• Estabilização hemodinâmica: acesso, vias aéreas • Fazer tração do lado de fora para evitar que o balão
• Exames laboratoriais saia do lugar.
• PFC (transfusão de plasma) se INR > 1,7. INR não é Via nasoenteral: pode causar isquemia de aleta
um método muito bom para avaliação de sangramento nasal e lesão.
em pacientes cirróticos. • Só pode ficar por 24 horas
• Tx plaquetas se <50,000/mm3 • Na hora de desinsuflar, endoscopista deve estar ao
• Hb alvo 7-8 g/dl (transfusões só em valores menores) lado.
• Antibiótico profilaxia: Norfloxacina (casos menos
graves) ou ceftriaxona (grave) profilático 7 dias: reduz Casos refratários
infecções, mortalidade e ressangramento. Para • Tratados 2 vezes endoscopicamente e paciente não
TODOS os pacientes cirróticos com HD. para de sangrar.
• Lactulose para profilaxia de encefalopatia hepática • BSB - balão
• Vasoconstritor esplâncnico: terlipressina, • TIPS – stent que faz desvio de fluxo, muito utilizada
somatostatina, Octreotide – 2 a 5 dias para reduzir a pressão portal diminuindo o fluxo de
• EDA dentro de 12 horas de admissão – após sangue para a variz.
exames e condutas iniciais (estabilização, via aérea, • Derivação porto-cava (semelhante ao TIPS): conexão
resultado de Hb - pacientes com Hb de 2-3 – risco de cirúrgica (anastomose término-lateral ou
parada na mesa de endoscopia – primeiro transfusão terminoterminal)
e oxigenação) Impede transplante pois altera toda anatomia
A chance de mortalidade em pacientes que fazem TIPS não impede transplante
endoscopia em caráter de urgência (6h) não é
significativa a mortalidade de pacientes que fazem HDAV – Orientações de alta
endoscopia entre 6 e 24horas (estudo). • Propranolol/nadolol (β-bloqueadores) após 5 dias do
sangramento. Profilaxia secundária (paciente já
Tratamento endoscópico sangrou, fez tratamento endoscópico + receita de β-
Varizes gástricas bloqueador)
• Depende da localização das varizes. Reduz risco de ressangramento
• GOV1: ligadura elástica ou histoacryl (cianoacrilato) Redução da mortalidade
• GOV2, IGV1 e IGV2: só histoacryl • Programar nova ligadura elástica/escleroterapia –
Varizes de esôfago novo tratamento endoscópico
• Técnica de escolha: ligadura elástica Sessões a cada 4 semanas até erradicação
• Erradicar as varizes com menos sessões, menos Varizes gástricas com uso de cianoacrilato: repete
complicações a cada 2 a 4 semanas
Após erradicação: a cada 6 a 12 meses
ASCITE
Desenvolvimento da ascite na cirrose: hipertensão portal → liberação de óxido nítrico gerando vasodilatação esplâncnica
→ ↑ da pressão esplâncnica já desenvolve ascite + ativação do SRAA (retenção de sódio e água) + retenção da pressão
oncótica → formação da ascite no cirrótico é multifatorial.
Classificação
I – só detectada pelo USG (ascite mínima, exame físico
normal);
II – ascite moderada, detectada pelo exame físico (macicez
móvel+);
III – grande ascite com importante distensão abdominal
(piparote +)
Investigação
• Hipertensão porta ou doença do peritônio?
• Paracentese diagnóstica – obrigatória. Qualquer ascite a
ser diagnosticada – coleta do líquido ascítico para estudo.
Celularidade total/diferencial, proteínas totais, albumina
GASA (gradiente albumina de soro ascítico): Albumina
soro - Albumina ascite.
GASA < 1,1 g/dl = exsudato = doença peritoneal
GASA ≥ 1,1 g/dl = transudato = hipertensão portal
Tratamento
• Tratar doença de base.
• Restrição de sódio: 2g de sódio ao dia = 4g
de sal = duas colheres de chá rasas (melhor
controle ao usar sachês após refeição pronta). Já tem ativação do SRAA, vai reter ainda mais sódio e piorar a
ascite.
• Restrição de água só se Na < 120-125 mEq/L (1 a 1,5L/dia) = hiponatremia.
• Diurético (espironolactona – antagonista da aldosterona) – agir na fisiopatogenia da ascite, pois a vasodilatação
esplâncnica ativa o SRAA.
Máximo perda de peso 0,5 kg/dia se não tiver edema em MMII. Se edema MMII associado: até 1kg/dia – peso
em jejum. Se começar a perder mais peso cuidado com complicações – síndrome hepatorrenal, encefalopatia
Associar furosemida nos casos refratários (se mesmo assim não for bem aumentar a dose de espironolactona,
ainda sem resultados aumentar a dose de furosemida)
• Ascite tensa (desconforto respiratório) – paracentese de alívio
Mandar para análise – 20 a 30 mL
≥ 5L – repor 6 a 8g de albumina/L (do total de líquido retirado) – evitar complicações.
Paciente cirrótico Child C apresenta hemorragia digestiva Assinale a alternativa correta sobre pacientes com cirrose
alta. Realizada endoscopia digestiva alta que evidenciou portadores de ascite:
varizes de esôfago sem sinais de sangramento ativo. Qual a. Deve ser realizada paracentese diagnóstica a
a melhor conduta dentre as opções abaixo? todos os cirróticos com qualquer complicação da
a. Estabilização hemodinâmica, octreotide ou cirrose.
terlipressina por 2 a 5 dias, antibioticoprofilaxia com Recomendação dos Guidelines internacionais,
ceftriaxone por 7 dias, ligadura elástica das varizes de inclusive do EASL (anexo)
esôfago. b. Antes de colher o líquido ascítico, é importante a
b. Estabilização hemodinâmica, octreotide ou determinação do INR, pois o risco de
terlipressina por 2 a 5 dias, propranolol por 7 complicações hemorrágicas é elevado.
dias, antibioticoprofilaxia com ceftriaxone por 7 dias, c. Deve ser realizada restrição de líquidos em
ligadura elástica das varizes de esôfago. doentes com ascite mesmo quando a
c. Estabilização hemodinâmica, octreotide ou concentração sérica de sódio é normal, devido ao
terlipressina por 2 a 5 dias, antibioticoprofilaxia com risco de agravamento.
ceftriaxone por 7 dias, esclerose das varizes de d. A perda mínima de peso recomendada durante o
esôfago. tratamento com diuréticos deverá ser de 0,5
d. Estabilização hemodinâmica, octreotide ou kg/dia em doentes sem edema periférico e 1
terlipressina por 2 a 5 dias, propranolol por 7 kg/dia em doentes com edema periférico.
dias, antibioticoprofilaxia com ceftriaxone por 7 dias,
esclerose das varizes de esôfago.