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Copyright © 2017 Emanuelle Costa

Revisão: Vanessa Batista

Diagramação Digital: Taty Lima

Capa: Tatiane Nomedes Geraldete

Esta é uma obra de ficção.

Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são


produtos da imaginação do autor. Qualquer semelhança com nomes, datas e
acontecimentos reais é mera coincidência.

É proibido o armazenamento, ou a reprodução de qualquer parte


dessa obra sem o consentimento da autora.
Todos os direitos reservados.
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SUMÁRIO
SUMÁRIO
PRÓLOGO
PRIMEIRO E ÚLTIMO DIA NA KING
MÁGOA
TAMANHO
ESTRANHO INVASOR
NOIVADO DE KING
NÃO SOMOS AMIGOS, KING!
SURPRESAS
DEPOIS
MACHUCADA
APENAS AMIGOS
OS BEIJOS DE KING
MINHA GORDINHA
DELE
NAMORADA DELE
NAMORADOS
EU DIGO: EU TE AMO, MAS VOCÊ NÃO ESCUTA... OPA!
ESCUTA!
KING ME AMA
APAIXONADA POR KING
BRIGAS
OS PEDIDOS DE KING... OPS, BALTIMORE!
CONCLUSÕES
COM NOAH POR PERTO, TUDO MUDA!
GG... LINDA... MUDADA... DELE!
PRIMEIRA VEZ
MELHOR AMIGO
SONHOS REAIS
O PRESENTE É O MAIS IMPORTANTE
GORDA
ACABOU
VOCÊ, AQUI, AGORA!
JUSTIFICATIVAS
APENAS NÓS DOIS!
NOVO LAR
VIÚVA NEGRA
FICAREMOS JUNTOS
PASSADO
REAL FELICIDADE
SONHOS REALIZADOS
ENFIM CASADOS
“50”
TUDO UMA GRANDE MENTIRA
SEM PERDÃO
ACABOU DEFINITIVAMENTE
OUÇA-ME
HORA DE SER FORTE
TEM O PERDÃO, MAS NÃO TEM O AMOR.
DESCONFIANÇA
ALGO VERDADEIRO E SINCERO.
O PASSADO DE NOAH
SEM SEGREDO
GORDINHA!
A VIDA SEGUE
SEM VERGONHA
LAR DOCE LAR
SEM MEDO
BOAS DECISÕES
AS COISAS COMO SÃO
NOVOS COMEÇOS
UM PRESENTE DE CASAMENTO
PAPAI E MARIDO BOBÃO!
UMA MULHER FORTE
UMA MULHER PRONTA
DESPEDIDAS
PERDAS
SEMPRE 50
EPÍLOGO
PRÓLOGO
Despedidas

Entro na casa da árvore.


Parece menor a cada dia. Tenho dificuldade para me mover. Assim
que consigo colocar metade do corpo para dentro, sinto um puxão firme nos
meus antebraços.
Acabo caindo por cima do Noah. Ele ri como sempre e pra variar,
como se isso fosse muito engraçado, fecho a cara e me ergo.
Noah é o meu melhor amigo de infância, ele tem quatorze anos, usa
aparelho e tem cara de retardado — não é muito diferente de mim! —, ele
parece uma salsicha quando fica em pé. Noah também tem os olhos mais
lindos que já vi na terra, desde que me lembro. Apesar da cabeça dele
parecer uma cuia, os cabelos dele são lisinhos e bonitos! Adoro zoar com a
cara dele e perguntar sobre o comercial de shampoo pra pelo de cachorro,
ele fica superirritado com isso!
— Oi!
— Trouxe a mochila.
— Anda logo, sua gorda!
Estreito os olhos pra ele e faço cara de bosta. Noah se estica e me
puxa. De repente, ele me beija e eu fecho os olhos. Fico tão nervosa quando
ele faz isso... Não sei beijar de língua, nem ele! Então ficamos sempre como
dois retardados — que é o que somos — tentando perder o bv[1] um com o
outro, mas nunca passa de selinhos.
— Ai, sai! — Empurro-o pelo ombro e limpo a boca com força. —
Você me enoja, Baltimore.
Ele sorri como se não desse a mínima, puxo a mochila pra dentro da
casinha e fecho a porta. Se a minha mãe sonhar que estou aqui ela me mata,
e o Noah vem numa vala dupla comigo, com direito a ir para o inferno
juntinho também.
Noah puxa os cobertores e se afasta para o lado com as pernas
estiradas e o corpo meio curvado. Ele cresceu muito rápido, se brincar, com
menos de 1,70 de altura ele não fica até os dezessete anos.
Sento-me abrindo a mochila, estendo os doces e os salgadinhos para
ele, a nossa pequena TV em cores está ligada, é uma daquelas pequenas
bem antigas que funciona a base de bateria. Noah passa o braço ao redor da
minha cintura e me beija na bochecha.
— Por isso gosto de você, gordinha, sempre traz do bom e do
melhor.
Não queria que ele me chamasse assim, mas já me acostumei, o
Noah é muito espontâneo, eu também! Mas, acho que é por que a gente está
crescendo e ele meio que está se afastando mais de mim. Não almoçamos
mais juntos na escola desde que ele começou a andar com alguns rapazes do
time de basquete, ouvi dizer que ele vai entrar para o time da escola. Até
então, andamos bem distantes, mesmo que eu sinta que em meu coração ele
ainda seja o meu melhor amigo.
— Você não está mais almoçando comigo, Noah.
— É falta de tempo mesmo, Samantha.
Sei quando ele não gosta de algo, pois, me chama pelo nome
completo.
— Não precisa ficar de mi, mi, mi, seu chato.
— Me diz. Como está a sétima série sem mim?
Bombei ano passado! Claro que isso me afeta, estou repetindo de
ano... Noah já está na oitava série. Nós dois perdemos o ritmo, acho que foi
principalmente isso que nos afastou. Ele está numa turma diferente, com
pessoas diferentes. Nós estudamos juntos desde... sempre! Agora ele está
um passo a minha frente.
— Tá legal.
Ele me olha de um jeito estranho. Acho que o Noah mudou muito
esse ano, também não me disse, mas soube que a mãe dele conheceu outro
cara. Os vizinhos sempre fofocam muito na cidade, não que eu more na
cidade... Eu e os meus pais moramos num trailer afastado, não temos casa
própria como os pais do Noah têm — ou a mãe dele. Desde que o pai dele
morreu, há um tempo, eles moram sozinhos lá.
— Sam... Você não pensa em sair daqui?
— Claro que penso! Mas não posso deixar a minha mãe pra trás,
Noah, nem o meu pai.
Ele morde os lábios e reconheço seu olhar impaciente, sei que quer
me falar algo, mas acho que essa pequena distância na qual elaborou entre
nós dois está funcionando muito bem! Ele não confia mais em mim, acho
que aos poucos estamos nos tornando dois pequenos desconhecidos.
— Eu... eu...
— Te vi beijando a Jane Collins outro dia, ela é linda! Fica com ela.
Acho que ele me chamou pra me dar a notícia.
Tento sorrir, me inclino e beijo-o, apenas um selinho, me afasto e
engatinho para fora da casinha da árvore.
— Sam, as coisas... Eu... Eu...
— Tchau, Noah.
Saio da casinha e desço a escada com cuidado. Algumas lágrimas
caem enquanto me afasto do meu lugar predileto. Este é, definitivamente, o
meu adeus ao meu melhor amigo de todos os tempos. Já deveria saber...
Noah Baltimore e eu não seremos nada além de estranhos a partir de hoje.
PRIMEIRO E ÚLTIMO DIA NA KING
King.
A Gigantesca.
A Enorme.
A maior empresa de Comunicações do momento.
E eu irei trabalhar lá!
É o máximo.
Estou empolgada para o meu primeiro dia, desde que fui contratada,
este é definitivamente o meu maior e melhor emprego entre todos que já
tive!
Isso não é uma lanchonete, isso não é a casa dos Ferrow, isso sim é
uma empresa de verdade! A primeira filial que eles montaram aqui em
Charlotte, Carolina do Norte.
Imagino que as coisas na minha vida comecem a deslanchar agora,
com emprego fixo e convênio. Sei que eles não poderão cobrir a doença de
mamãe logo de cara, mas vou me esforçar muito para que tudo dê certo!
O prédio é novo, as pessoas também são bem jovens. Imagino que o
dono da empresa seja daqueles homens muito exigentes e tal, mas não ligo,
hoje é o meu primeiro de muitos dias na King, claro, meu cargo não é lá
essas coisas, mas o salário já vai ajudar muito!
Atravesso a rua e chego ao prédio, um segurança me orienta sobre a
entrada de funcionários. — Fiz a entrevista em outro lugar! — Logo que
viro o quarteirão, vejo uma pequena fila de novatas com bolsas e mochilas.
O lugar é enorme! Tenho que admitir que fiquei bem surpresa quando soube
que abririam uma filial deles aqui. A King tem sedes em muitos lugares, sei
tudo isso, pois, tivemos um pequeno treinamento de duas semanas no
mesmo local onde foram as entrevistas.
A fila anda rapidamente, meu horário será o da manhã, logo que
chega a minha vez, cumprimento a senhorita Donatela. Ela é a mulher da
contratação, logo de cara gostei dela. Apesar de ser daqueles tipos de
mulheres rabugentas e carrancudas, ela sorri pra mim e coloca o
cordãozinho preto com o meu novo crachá em meu pescoço. Serei
infinitamente grata por ela ter me dado o emprego.
— Obrigada, senhorita Donatela.
— Me espera lá dentro!
Donatela é alta, magra, uma senhora de uns cinquenta anos, tem
olhos azuis, lábios vermelhos e uma postura impecável! Usa saltos e um
conjunto de poliéster cinza, tem um colar de pérolas no pescoço. Ela é a
gerente das faxineiras, na verdade de todos os cargos referentes à limpeza.
E reparei que desde que nos conhecemos há duas semanas, ela tem sido
muito gentil e bondosa comigo, alguém que realmente entende que preciso
muito desse emprego. — Claro que eu não contei todos os meus problemas
para ela.
Entro e logo outra funcionária do lugar me conduz até os vestiários.
O lugar está cheio e movimentado, ela me dá a chave do armário e meu
uniforme, tudo em sacos plásticos, me explica que devo me trocar, me
entrega o par de sapatilhas, informa que devo prender os cabelos e some
para ir falar com outra funcionária.
Tem mulheres conversando e falando para todos os lados, elas se
trocam como se isso fosse a coisa mais comum e normal do mundo,
algumas seminuas, outras de alcinha, fico meio dura e me afasto. Não dá
pra me trocar na frente de tantas pessoas, morro de vergonha do meu corpo.
— Com licença, onde fica o banheiro? — Pergunto para uma
mulher parada a alguns armários do meu.
— Só seguir reto, ali, depois daquela divisória.
— Obrigada.
Acho o banheiro rapidamente, entro e fecho a porta. O espaço é
pequeno, abaixo a tampa do vaso e começo a me trocar, colocando minhas
roupas no vaso fechado. Eu jamais teria coragem de tirar as roupas com
tanta naturalidade para ninguém, mas tento não pensar muito nisso.
O uniforme é composto por um macacão que parece um saco no
meu corpo, é cinza, as sapatilhas são emborrachadas, depois que me visto,
me olho no espelho e quero rir, faço pose respirando fundo.
— Mais um dia GG, você aguenta!
Sempre tive problemas com peso e isso não é segredo, nem pra
mim nem pra ninguém. Hoje eu visto 50, meu peso é de exatos noventa e
dois quilos e sou mais alta que as garotas da minha idade. Claro que o que
sempre me salva, é aquela famosa frase das pessoas que me cercam: "mas
você é tão linda de rosto querida".
Ok, obrigada. Mas, eu preferiria ser ao menos um pouco mais
magra, dentro do possível!
Olho-me no espelho e fico pensando sempre sobre essa garota
gorda que ele reflete: ela tem olhos incríveis, lábios lindos, sobrancelhas
perfeitinhas, nariz afilado e reto... É eu não sou feia, mas apenas de rosto, e
isso nunca foi nem nunca será um grande atributo pra fazer com que eu
consiga realmente ser completa e feliz.
Mas não importa, não devo reclamar, devo ser grata, porque ao
menos eu tenho saúde, tenho forças pra prosseguir. Quando eu olho pra
minha mãe e a vejo sofrer lentamente com seu câncer, eu me sinto a pessoa
mais abençoada do mundo, mesmo que nunca me sinta realmente encaixada
nele.
Prendo meu cabelo com cuidado e passo um pouco de gel, que
trouxe na minha bolsa, pra que os meus cabelos não se soltem, analiso com
cuidado meu rosto sem maquiagem alguma, sei que eu deveria me arrumar
com mais cuidado, mas eu absolutamente não queria perder a hora, mamãe
se sentiu enjoada ontem à noite e papai... Papai, como sempre, deu trabalho
pra mim e Boo.
Boo é o dono do bar perto de onde moramos, papai fez de lá sua
residência fixa há alguns anos, e eu sinceramente não sei como ele o
suporta bêbado, acho que toda a vizinhança já entendeu que papai é um
incurável, e eles sempre são muito pacientes com ele, ele também não faz
mal a uma barata, a única coisa que faz é ficar bêbado e encher o saco, e
Boo é um poço de paciência! Espero que hoje ele fique com mamãe, que
ajude ela, ao menos está mais preocupado depois que começamos com as
sessões de químio há alguns meses.
Termino de me arrumar e volto para o vestuário, algumas mulheres
já estão prontas, outras se maquiam. Suspiro guardando meus problemas
dentro de mim. Não quero e nem serei uma pobre coitada.
Quando a vida me deu tantas situações complicadas e difíceis, eu
estava lá, enfrentando tudo de cabeça erguida, agora é que eu não baixo a
crista!
Tenho fé, tenho Deus, mamãe irá ficar boa, o câncer está em estado
inicial, tem tratamento! Apesar de eu saber dos riscos, farei de tudo para
que ela fique boa. Trabalhar na King é o primeiro passo.
— Atenção!
Donatela entra no vestiário estalando os dedos, ela mantém um
apito dourado no pescoço, logo que me olha, estende a mão me chamando,
sorrio um pouco sem graça pela forma como as mulheres daqui me olham.
— Prestem muita atenção! Este é o primeiro dia de vocês, quero
que todas se atentem! Serão divididas entre setores e as coordenadoras irão
lhes dar as orientações devidas, todo o cuidado é pouco, o senhor King está
na empresa.
Fico toda tensa só de pensar.
— Bom trabalho! Não se esqueçam de bater o ponto nas
intrajornadas, e cuidado com as conversinhas paralelas. Vão com Wandy!
Wandy é a moça que me deu o uniforme e as sapatilhas. Faço
menção de seguir a massa, mas Donatela me segura o ombro, lançando-me
um sorriso vasto, entendo que devo ficar. As outras moças seguem Wandy,
conversando, tagarelando, acho que são umas trinta ou mais, não contei!
— Você vem comigo, mocinha, me acompanha num café?
— Sim, senhorita.
— Pode me chamar de Donatela, querida.
Soube que gostava dela e ela de mim no momento da entrevista, eu
sou ótima em primeiras impressões.
— Acredito que desconheça a simpatia, mas é que quando eu te vi,
logo me lembrei de uma antiga amiga... Lily!
Minha mãe?
— Você é idêntica a ela.
— Lily?
— É, fomos amigas durante anos, até que eu fui para a faculdade e
ela se casou. Ela se mudou de Charlotte para uma cidade menor, depois
perdemos o contato.
Estou incrédula, mas nem falo nada, talvez Donatela esteja falando
de outra Lily!
Mamãe realmente se mudou de Charlotte, da grande cidade, nós moramos
maior parte de nossas vidas no trailer que papai tinha desde que eles
perderam a nossa primeira casa por não pagarem as hipotecas. Há três anos
consegui comprá-la de volta em nossa antiga vizinhança, tive que vender
meu antigo Cadillac, o trailer e gastei o dinheiro da minha poupança, mas
deu certo, as hipotecas estão em dia, e a grama do jardim está podada.
Apesar da nossa casa estar muito velha, é nossa!
— Você é muito parecida com ela, os olhos, os lábios... Lily era
uma mulher muito bonita.
— É mesmo?
— Sim!
Donatela tem olhos mais reluzentes enquanto fala da tal Lily. Nós
duas caminhamos pelos corredores internos da empresa, olho pra estrutura
sólida do lugar, tudo cheira a novo, soube que o prédio foi construído há
pouco tempo.
— Você deveria ter pedido algo menor, querida.
— É que eu fiquei com medo de não me servir! Vou costurar
quando chegar em casa.
— Você é lindíssima, querida, nunca se sinta diferente disto por
conta de pedaços de pano, são apenas roupas!
— E grandes!
Donatela riu colocando a mão na boca, subimos uma rampa que da
para um refeitório grande, passamos por uma catraca logo na entrada do
lugar e pegamos uma pequena fila de executivos.
Logo de cara percebo que aqui não tem distinção de cargos ou
funcionários... Mas não vejo ninguém usando um uniforme como o meu
aqui agora.
— Não se preocupe! Então, animada com o cargo?
— Sim, muito! Mal vejo a hora de colocar a mão na massa.
— Aqui é bem tranquilo, só reze para não ter incidentes. Como a
empresa é nova, tudo fica um pouco mais fácil, mas tem muitos
funcionários antigos que vieram transferidos pra cá.
— Legal.
— Eu vim da capital, nunca pensei que voltaria pra Charlotte.
— Eu nasci e cresci aqui.
— Eu também, como disse, fui pra universidade e aí tive que
mudar, nunca quis me casar.
Acho que Donatela só tem pose de durona, ou talvez seja por que
ela simpatizou muito comigo.
— Eu também não quero me casar — revelo dando de ombros.
— Você é muito jovem, querida!
— Tenho vinte e sete.
— Poxa, pensei que era mais nova, não te dava vinte.
— É a pele... Sedosa... Maravilhosa... E os meus olhos
encantadores!
Pisco deliberadamente, Donatela ri. Sempre gostei de fazer as
pessoas a minha volta sorrir, segundo mamãe, esse é o meu chamado de
vida, já que não consigo fazer ninguém se apaixonar por mim. As pessoas
se apaixonam pela minha personalidade, mas ela é forte também, o que me
torna muito dura em muitos sentidos da vida, às vezes. Mas gosto de passar
boa impressão para as pessoas, principalmente agora que preciso do
emprego.
— Aqui cresceu muito desde que me mudei.
— Eu gosto daqui, a cidade cheira a mato!
— Logo em breve pode começar a faculdade, te dou a maior força.
— Obrigada, senhorita Donatela.
Mesmo que eu saiba que talvez não chegue nem perto das portas da
universidade mais próxima, não tenho tido tempo nos últimos anos, papai
não para em um emprego fixo e com a doença de mamãe, tudo se tornou
ainda um pouco mais complicado, mas eu quero sim, logo que tudo estiver
bem, começar uma faculdade.
— Nossa... Senhor King na área...
Donatela se endireita, olho pra minha bandeja vazia e fico tensa de
repente. Ela basicamente sussurrou o que significa que o dono está perto,
me sinto nervosa, por que sei que não deveria estar aqui a essa hora, deveria
estar em algum canto da empresa, limpando o chão, lavando algum vidro,
esta é a minha função!
— Ele está atrás de você! — Donatela sussurrou discretamente. —
Meu Deus!
Tento sorrir, o homem deve ser mesmo muito importante, ele é o
dono de tudo isso, as pessoas nem devem saber como agir perto dele. Soube
que King é um bilionário muito jovem e bem-sucedido, mas nunca havia
ouvido falar sobre ele antes de saber que abririam uma filial da King aqui
em Charlotte. Dizem que é muito bonito e cheio de mulheres que caem aos
pés dele, que se deu bem, pois, o pai é um milionário rico do petróleo no
Texas. Eu, no entanto, não faço a menor ideia de quem seja.
Chegamos à parte da comida, me viro de lado e pego uma maçã,
escuto o som de silêncio, vozes baixas, tenho um pouco de receio de falar
ou agir de forma errada, hoje é o meu primeiro dia e já dou o azar de estar
perto do dono, me sinto nervosa.
— Você precisa melhorar os uniformes dos seus funcionários, K! —
Escuto uma voz feminina muito baixa. — Ela ficou cem vezes maior do que
já é nessa roupa!
Como?
Tento respirar depois de ouvir isso, sinto a mão firme de Donatela
segurando o meu pulso, nem olho, e por dentro me sinto um pouco
humilhada por ouvir isso de alguém.
Que ótimo! Primeiro dia e já estou sendo chamada de gorda por
algum funcionário da King.
Escuto algumas risadas, risadas baixas. Depois, Donatela aperta
meu pulso, mas não fala nada. Tem coisas na vida nas quais eu não me
submeto.
Ergo a cabeça e logo de cara, encaro um par de olhos azuis
profundos, e fico recebendo o choque em todo o meu corpo. Parece que
alguém está me sacolejando toda por dentro. Fico em silêncio, depois olho
para a moça morena ao lado dele, fecho a cara e me viro pra Donatela.
— Obrigada pelo emprego, mas preciso muito mais da minha
dignidade do que disto! — digo a força, e me afasto em silêncio.
Passo pela catraca e parece que o meu coração vai sair pela
garganta. — Não pode ser! Não é! Acho que estou vendo coisas, devo estar!
Eu acho que acabo de ficar completamente louca... aquele olhar... aquele
homem... Não pode ser! Ele foi embora, ele sumiu... Noah!
— Samantha... Sam... Sam... Volta aqui!
Alcanço o vestiário, quando sinto um puxão firme no braço, volto
pra trás e meu corpo todo treme com a brusquidão na qual sou puxada. Eu
encaro-o absurdamente incrédula.
É O NOAH!
Ele fica me olhando por alguns instantes em silêncio. — O mesmo
olhar que aprendi a amar com o passar dos anos, e o mesmo no qual me
incumbi de esquecer, cada detalhe deste olhar, a íris azul clara radiante, os
cílios loiros escuros e compridos, as sobrancelhas mais claras. Me
desvencilho de sua mão criando coragem.
— Tudo bem? — Ele pergunta baixo. Sua voz mudou
completamente, está mais grossa, firme.
— Sim — respondo e escondo dele a minha mágoa. — Me
desculpe.
— Eu...
— Vou só me trocar, já estou indo... de saída. — Estou nervosa. —
Bom te ver, Noah.
— Pra onde? Você trabalha aqui? — replica e parece confuso. —
Não pode ir embora.
— Acabo de me demitir — respondo e me afasto um pouco mais.
— Foi bom te ver, Noah.
Acho que não consigo falar mais nada.
Minha garganta queima demais, me sinto, ao mesmo tempo em que
humilhada, uma grande idiota, porque rever ele é como trazer à tona uma
dezena de coisas que deixei para trás quando Noah foi embora, quando ele
gentilmente me expulsou de sua vida. Éramos amigos, fomos amigos, mas
isso acabou há anos atrás.
— Também foi bom te...
Antes que ele complete a frase, entro no vestiário, pisco e tem
lágrimas nos meus olhos, respiro fundo e digo pra eu mesma que isso vai
passar... Como venho tentando fazer a treze anos... E vinha funcionando...
Até agora.
MÁGOA
Saio do vestiário.
Ao mesmo tempo em que fico chocada, abafo as sensações dentro
de mim que me dizem pra não me sentir assim. Donatela me olha bastante
séria ao lado do dono da empresa, ele em seu terno impecável e sapato
social reluzente, arrumo minha bolsa de lado, ignorando Noah Baltimore
completamente, ou a pessoa que ele representou na minha vida por algum
tempo, estendo a sacolinha com o uniforme e as sapatilhas, as chaves do
armário e o crachá.
— Eu sei o caminho da saída, Donatela. Muito obrigada pela
oportunidade.
— Mas... Mas...
— Meu número — interrompo-a, e enfio o papelzinho no bolso
dela. Esperava por ela, mas jamais esperei por Noah, cansei de esperar ele
há muitos anos atrás. — Com licença, que a garota enorme está saindo do
recinto.
Giro os calcanhares e me afasto de pressa de ambos, eu não irei
jamais me sujeitar a este tipo de coisa pra conseguir trabalhar em qualquer
lugar que seja! Prefiro fazer bico de faxineira na casa dos Farrew ou ser
garçonete a vida toda, mas eu não vou ficar sendo humilhada por ninguém
por causa do meu peso. Isso já acontece com muita frequência na minha
vida pessoal, já não basta isto, agora também no meu trabalho? Não
mesmo!
A vontade que me dá é de voltar lá e dar um tapa bem servido na
cara daquela vadia seca.
— Sam... Sam... Espera... Sam... Volta aqui!
Eu o ignoro completamente, não tenho porquê atender aos seus
chamados.
Noah não respondeu a nenhuma das minhas cartas durante três
anos, ele também não fez questão de mim em nenhum desses treze anos;
meus nervos vão ficando duros quando me lembro de todas as vezes que ele
deixou de almoçar comigo na escola pra comer com a filha dos Collins, de
todas as vezes que ele estava com os meninos do futebol americano usando
uma jaqueta azul idiota, e eu estava servindo de chacota para as líderes de
torcida, não esqueço o dia em que ele me viu na lanchonete da Betsy e
virou a cara pra mim... Aquela foi a última vez que eu o vi.
Depois disso, sumiu.
Evaporou.
Como diz mamãe, a terra comeu vivo!
Noah Baltimore morreu pra mim, ou ao menos foi isso o que eu
achei durante esses anos, desde que ele decidiu me desprezar e esquecer-se
da minha existência, pois, fiz o mesmo com ele.
— Sam...
Odiava quando ele fazia isso, tenho absoluta certeza que faz de
propósito pra me encher a paciência.
— Sam, volta aqui... Você não pode fazer isso!
— É muito cinismo, meu Deus.
Estou sorrindo de um jeito tão amargo que minhas bochechas doem
com o esforço. Não olho pra trás, entro na recepção da entrada de
funcionários e passo pela porta dos fundos.
— Saaammmm... Que droga, volta aqui!
— Vai para o inferno, Noah Baltimore!
Explodo e me viro para ele. Noah está a apenas alguns metros de
distância de mim, não penso duas vezes antes de fechar o punho e acertar
uma direita bem servida no nariz dele. Noah recebe o golpe muito mais que
surpreso e cambaleia pra trás colocando as mãos no nariz, um dos
seguranças se aproxima, sacudo minha mão fazendo uma careta porque
também machucou minha mão, o homem vem na minha direção, enérgico e
Noah ergue a mão direita pro rumo dele, meu coração dispara enquanto se
comprime, ele me olha ainda parecendo bem surpreso.
— Não vem atrás de mim — sibilo irritada —, en-ten-deu?
— Não. — Noah responde muito calmamente. — Pode repetir?
Ergo o dedo do meio pra ele e giro os calcanhares, depois me afasto
basicamente correndo daqui, passo pelo pequeno portão de funcionários e
saio da área do prédio. Enquanto me afasto, sinto a face molhada e em
minha cabeça vêm cenas da primeira vez que eu e Noah Baltimore fomos
pra escola: tínhamos quatro anos de idade, o pai dele ainda era vivo, meu
pai ainda não bebia, tínhamos uma casa, e ele sua família feliz.
Não sei o que aconteceu, só sei que uma parte do meu melhor
amigo se foi com a morte do pai dele.
Depois disso, milhões de coisas mudaram, mas ainda assim, Noah
não tinha direito algum de fazer o que fez comigo.
Ele me desprezou, ele me ignorou, e logo depois disso ele foi
embora.
Não tinha notícias dele há anos. Pensei tantas coisas, mas a última
pessoa a qual imaginei que reencontraria seria ele, ainda mais na King.
— Samantha, você quase quebrou o meu nariz!
Sinto um solavanco forte no braço. Consegui dar a volta no prédio
pra poder atravessar o sinaleiro, o ponto de ônibus fica a alguns metros de
distância, agora Noah está me encarando muito, muito sério, o olhar azul
cheio de uma raiva que eu nunca vi, o nariz dele está avermelhado, os
lábios dele cerrados e o maxilar trincado, tento me soltar do braço, mas ele
aperta com mais força.
— Você vai voltar pra dentro da empresa, colocar o uniforme e
trabalhar!
— Você não manda em mim!
— Eu sou seu chefe!
— Você não é o meu dono!
— Sam, não me tire a paciência que me resta!
Algo em seu olhar denuncia muito além de raiva, alerta, mas eu não
falo nada, ainda que saiba que não vou obedecer ele, me recuso a obedecê-
lo.
— Seja ao menos uma vez na vida, responsável e profissional!
— Está me falando sobre responsabilidade, Noah? Como você é
ridículo...
— É pra ir colocar o uniforme agora!
— Quem você pensa que é?
— O dono da empresa, ora, ou você acha que eu estou aqui de
brincadeirinha?
Meu corpo esfria. Noah me solta e toca o nariz que começou a
sangrar, ele ergue a cabeça e funga, depois pega um lenço no bolso interno
do terno.
— Sam?
Respiro fundo. Donatela vem toda apressada ao lado do segurança,
ela me olha preocupada, estou tremendo de tanta raiva, ao mesmo tempo
em que quero ir embora, me lembro da sensatez... Mamãe! Preciso me
manter aqui por ela, ao menos até arrumar algo melhor, contudo, não
preciso ficar passando certos tipos de humilhação por causa do trabalho,
mas... O que é realmente mais importante pra mim? Minha dignidade ou a
minha mãe?
— Não se aproxime de mim de novo, Baltimore.
— Não se preocupe. Isso não vai voltar a acontecer.
— É bom mesmo!
Afasto-me rumo a Donatela, não olho para trás, apenas odiando
Noah Baltimore por mais uma vez na vida, já foram tantas que até perdi as
contas, mas essa de hoje é a pior de todas.

Donatela me deu um tempo para que eu me acalmasse.


Embora não conseguisse, disse pra mim mesma que precisava do
emprego muito mais do que da dor da humilhação, então voltei pra dentro
da King e me troquei, depois disso acompanhei Donatela até onde eu
ficaria.
Colocou-me pra ajudar na cozinha, lavar pratos, depois ela sumiu e
eu fiquei o dia todo por conta dos pratos e talheres que me traziam a todo o
momento pra lavar, tentei esquecer o incidente com Noah, mas não
consegui, minha mente estava uma desordem.
Queria sair correndo da King, meu primeiro grande dia se resumiu
em algo misturado a frustração e tristeza, e já fazia muito tempo que não me
sentia assim.
Agora que o turno acabou, Donatela veio me buscar, mas não disse
nada. Acho que já passei vergonha demais durante o dia, ela me
acompanhou feito cão de guarda até o vestiário. Fui para o banheiro pra me
trocar, e ao retornar, Donatela me olha com uma cara...
— Você quase quebrou o nariz do dono da empresa, Samantha!
— Me desculpe.
— O homem está desorientado.
— Isso não é problema meu!
Donatela me olha como se eu estivesse falando algo muito grave.
— Ele veio aqui três vezes. — Estou espantada. — Me perguntou
diversas vezes onde você estava, mas eu disse que estava andando pela
empresa. Agora está aí fora, feito cão de guarda te esperando.
Sabia que ele não cumpriria com a palavra.
— Tem alguma outra saída?
— Samantha, você...
— Eu não quero ver ele agora, está bem?
— Qual é o problema?
— Noah é o problema, preciso me livrar dele.
— Quer se livrar do dono da empresa?
— Se possível, sim.
Do mesmo jeito que ele se livrou de mim há treze anos, do mesmo
jeito como ele me descartou há anos atrás.
— Mas o que aconteceu...
— Aconteceu que... — Olho em volta e percebo que algumas
moças estão nos ouvindo, puxo Donatela mais para perto. — Você pode ir
lá em casa pra um café e eu te conto!
— Menina!
— Não?
Donatela respirou fundo.
— Está bem.
— Ótimo, agora eu preciso sair daqui!
Olho em volta, mas não tem janelas, então vejo a moça com o
carrinho dos uniformes sujos se aproximando, olho para Donatela e ela me
encara horrorizada.
— Você o distrai, diz que não estou aqui.
Paro a moça do carrinho e entro nele, colocando as dezenas de
uniformes em cima de mim, Donatela me olha de um jeito reprovador, mas
eu sei que ela quer rir, as meninas jogam seus macacões em cima de mim e
faço uma careta odiando o odor que vem de alguns dos macacões.
— Lupe, empurre o carrinho normalmente até a lavanderia, ok? —
orienta Donatela.
— Si senhorita!
Lupe é mexicana, já dá pra ver, me encolho e escuto o som das
rodinhas. — Acho que apesar de eu ser gorda, não estou tão pesada assim,
ao menos a Lupe não reclamou! — Escuto o som da porta sendo aberta e
Lupe empurra o carrinho pra fora do vestiário.
— Cadê ela, Donatela?
— Sinto muito, senhor, acho que ela já foi embora!
— Não é possível! O pessoal da segurança a viu entrando aqui com
você. — A voz dele vai ficando distante. — Avise para que saiam dos
vestiários e banheiros, o guarda vai entrar e verificar se ela está ai.
Nossa, que extremo.
— Sim senhor, fique a vontade.
Ergo-me de fininho e vejo por entre Lupe, o executivo de terno e
gravata de longe, ergo o dedo do meio e mostro para ele, me mantendo
camuflada entre os uniformes fedorentos e soados. Lupe ri, mas nem me
importo, ela vira para direita e Noah some das minhas vistas, me sento
novamente entre os uniformes e sopro com força.
— Hoje não, morto vivo... Hoje não!

— Oi. mamãezinha!
— Oi, Jasmin!
Desde que me lembro, é assim que mamãe me chama, por mais
brega que isso seja, meu segundo nome é Jasmin, por causa da princesa da
Disney, do filme Alladdin. Mamãe havia feito uma promessa a uma antiga
amiga de que, se tivesse uma filha, colocaria este nome na criança, então
meu nome é Samantha Jasmin Diaz Manchester.
Mamãe é hispânica, papai é inglês, e eu acho que sou uma mistura
errada deles dois, algo que deu errado, pois, mamãe apesar de doente agora,
muito antes disso é uma mulher linda, com traços fortes e um corpo magro
de dar inveja a qualquer um, ela tem cabelos compridos e escuros, seios
pequenos, é mais baixa que eu, já papai é loiro, alto, olhos azuis claros, —
lindos — e é branco como uma vela, mas ele também não é gordo... Acho
que sou fruto de uma experiência mal resolvida entre eles.
Paro pra pensar um pouco. Eu realmente sou parecida com mamãe,
nós temos bocas parecidas e o mesmo formato do rosto, o que muda é que
ela tem olhos escuros, e eu olhos azuis como os de papai, meu cabelo está
pra um castanho claro com mel, é liso com pontas onduladas, eu os solto
logo que entro em casa, jogo os sapatinhos pra longe e me sento à mesa,
mamãe me serve café e bolo. Ela fica meio fraca às vezes, depois das
sessões de químio, mas sua força de vontade muitas vezes é maior que a
fraqueza. Acho que foi por isso, eu não sai daquele lugar e chutei o balde...
Preciso do convênio médico pra curar a minha mãe.
— Como foi o primeiro dia, meu amor?
Encontrei o Noah, fui humilhada pela vaca da funcionária do
Noah, dei um soco no Noah, e depois fugi do Noah... É, foi um excelente
primeiro dia!
— Foi... bom!
Recordo-me de quando eu era criança, das vezes que ele apanhava
na escola e eu estava lá defendendo ele, aquele merda, covarde, suja calças,
vivia se escondendo dos garotos da escola. O maior absurdo pra mim foi
ver no colegial, Noah andando com os mesmos garotos dos quais eu o
defendi.
— Gostou da empresa?
— Sim... É legal, trouxe até meu uniforme pra arrumar, mãe.
Provo do bolo, mas não tenho fome, não consegui comer nada
durante o dia todo, estava tentando não morrer de raiva e mágoa, mas
enfim, saí daquele lugar, estou longe daquele idiota, e farei o possível pra
me manter bem longe dele.
— Oi, Jas!
Papai entra na cozinha com os cabelos úmidos, ele me da um beijo
doce na cabeça e suspiro aliviada, ele não foi pro Boo! Fico feliz, porque se
eu tivesse que ir buscar ele lá por conta de mais uma bebedeira depois do
meu dia de cão, não sei o que faria.
Ele não dá trabalho, papai não é violento nem abusivo, diria que ele
é calmo até demais, o único problema dele é que ele acha que a vida é um
playground infinito, e quer beber todos os dias pra aliviar as frustrações da
vida dele. Mamãe fala que ele ficou assim depois que perdeu a grande
chance de ser treinador de um time de baseball, há alguns anos, acho que
ele nunca realmente vai superar isso, por que ele é assim desde que eu tinha
uns cinco anos, ou seja, sempre.
— Como foi o primeiro dia?
Uma droga!
— Foi bom — belisco meu bolo —, e na loja?
— Fraco!
Papai é vendedor de carros há algum tempo, ele não consegue fazer
uma venda a mais de seis meses, vive desmotivado, e desde que
descobrimos o câncer da mamãe, ele anda ainda mais depressivo, ninguém
merece...
— Pai, você consegue!
Ele me dá um sorriso amarelo e se senta de frente pra mim e puxa
mamãe para o colo dele. — Em algumas épocas da minha vida, sentia que
não havia amor entre eles, principalmente por conta das bebedeiras dele,
mas hoje percebo que ainda que papai seja lotado de defeitos e o vício pelo
álcool, mamãe nunca deixou de amá-lo, nem ele a ela, o único problema
dele é que não pode ver um copo de "cachaça" na frente! Só! Fora isso ele é
até um bom pai, com todas as dificuldades que passamos e problemas
financeiros, papai ainda foi ou tentou ser um pai presente. Não me recordo
dele ter faltado em nenhuma festinha da escola ou de não ter comparecido
aos meus aniversários na infância, mesmo que o que ele e mamãe me
oferecessem, na maioria das vezes, fosse um trailer numa área matada e
fogueiras nas noites frias. Somos uma verdadeira família, ou tentamos ser.
— O seu aniversário de vinte e sete anos se aproxima, querida,
pensamos em te levar no asilo pra ver o seu avô e fazer um bolo, chamar
suas amigas...
Não tenho amigas... Tem o Tyller, mas ele é gay, não conta!
Contudo, acho que se chamar ele já tá bom.
— Pode ser.
Mamãe sorri pra mim. Os cabelos dela não começaram a cair ainda,
mas ela está pálida como uma vela branca, os olhos fundos... Começamos a
químio há dois meses, o médico disse que ela reage bem ao tratamento, e eu
só espero que até que ela se cure, se mantenha firme e confiante, o câncer é
no pulmão, a maior ironia é que mamãe nunca fumou na vida, mas esta foi a
horrível doença que levou minha avó Fiance, há dez anos.
— Você realmente está bem, querida?
— Sim, só cansada mesmo. — Me lembro de algo. — Ei mãe, me
deixa te perguntar uma coisa, você conheceu alguém chamada Donatela?
Ela faz que sim, bem surpresa.
— Ela é a minha chefe no hotel.
— Sério?
— Sim, ela me disse que foram amigas...
Começo a falar sobre Donatela, características físicas, cor dos
olhos, cabelos, estatura, mamãe e papai me ouvem mais que maravilhados,
logo que termino de falar mamãe sorri toda alegre, e tenho absoluta certeza
que a minha mãe é a Lily, a qual Donatela se referia.
Mal termino de falar e escuto o som da campainha.
— Deve ser ela, combinamos de que ela viria aqui pra
conversarmos.
— Mesmo? — Mamãe dá um pulo e toca o cabelo. — Samuel,
vamos nos arrumar!
— Mas ora que...
— Tenho que estar bem, é uma antiga amiga de escola, vamos
Samuel.
Papai levanta e vai se arrastando, fazendo cara feia e reclamando,
sorrio e arrumo a mesa, tinha deixado meu endereço escrito junto com o
telefone para ela, para o caso dela querer me visitar. Acho que devo
explicações a minha nova chefe, ela merece.
Posso tentar explicar o que aconteceu com Noah, o que ele fez e
como tudo aconteceu.
Deixo os cabelos de lado e vou abrir a porta, arrumo a blusa no
corpo, tento sorrir, por mais que eu não queira ou consiga, depois abro a
porta, e lentamente o meu sorriso começa a se desfazer.
Donatela veio, mas ela não está sozinha... Noah Baltimore está
parado ao lado dela na varanda da minha casa.
TAMANHO
— Donatela?
Mamãe se aproxima da porta toda alegre — acho que não vejo um
sorriso assim em seu rosto há dezenas de milhares de anos. — Os lábios de
Donatela se arreganham num sorriso tão espontâneo quanto surpreso.
— Lily!
Dou espaço para que mamãe passe, ela colocou um vestido
estampado comprido e sandálias, ela não se maquiou, os cabelos ela
prendeu num coque no alto da cabeça, foi improvisado, mas ela está linda,
vejo um brilho intenso no olhar de mamãe e é recíproco no de Donatela,
elas duas se abraçam fervorosamente. Papai se aproxima usando uma de
suas camisas sociais, jeans e sapato, sua reação é de pura incredulidade
quando vê o fantasma Noah parado ao lado das duas mulheres que se
abraçam.
— Oi, senhor M.
Não precisa chamar o meu pai assim, seu retardado, não estamos
mais na quinta série.
— Noah!
Papai sempre gostou de Noah, não sei porquê! Deve ser porque era
um fingido que se fazia de coitado pra todo mundo. Papai o abraça com
tanta familiaridade que me dá nojo, mas não o culpo, somos humildes,
somos assim, eu jamais impediria meus pais de serem diferentes do que são
por causa de ninguém, Noah o abraça dando fortes tapas nas costas de
papai, mas está muito sério. Também nem ligo! Ele acha que porque criou
barba, cortou o cabelo, tirou o aparelho e os óculos e ficou rico, pode
aparecer assim do nada na minha vida?
— Você está linda, querida. — Mamãe fala chorosa, toca a face de
sua amiga de colégio com carinho. — Nem criou rugas!
— Nem você!
Acho que mamãe nunca me falou de suas amigas de colégio, esta é
a primeira que eu vejo que ela parece gostar, e Donatela também chora,
ambas estão muito emocionadas, sorriem, choram, papai eu acho que
também não conhece Donatela, eu diria que essa é a segunda maior
coincidência da minha vida, a primeira claro que aconteceu hoje cedo,
reencontrar o meu “ex-amigo de infância” depois de treze anos sem vê-lo.
— Samuel, essa é Donatela.
— Muito prazer! — Papai estende a mão e aperta a mão de
Donatela. — Foi de você que eu roubei a Lily.
— É! Mais ou menos.
Donatela sorri de ponta a ponta secando os cantos da face, mamãe
segura sua mão e a puxa pra dentro de nossa casa, a vontade que eu tenho
ao ver Noah entrando, é de dar uma voadora na cara dele, sinto ódio
pinicando minhas veias, mas guardo, ele ficou um pouco mais alto que o
meu pai, como eu pensei que seria, acho que 1,87 de altura ou mais.
— Quanto tempo, rapaz... Você ficou até bonito.
Pela primeira vez em anos, eu vejo Noah Baltimore sorrindo, e
apenas esse sorriso, sem aparelho, e dentes branquinhos faz o meu coração
disparar.
Mas também me lembra do sorriso do garoto tímido que eu conheci
em algum momento da minha vida, ele realmente ri da afirmação do meu
pai, abaixa a cabeça, tão confiante de si que se distancia novamente da
lembrança que eu tinha dele, o Noah que eu conheci não era assim.
— Que isso, senhor M!
Idiota, pare de sorrir, você acha que pode aparecer assim na minha
vida depois de treze anos chamando meu pai de senhor M?
— Por favor, sentem-se. Jas, querida, pegue um café pro seu
amiguinho.
Ai, pai! Para de agir assim. Como se ele estando aqui fosse algo
muito bom!
Reviro os olhos, vou para a cozinha espumando de raiva — acho
que dá pra alguém ouvir os meus passos a quilômetros de distância! —,
coloco café em xícaras coloridas que mamãe guarda para as visitas, depois
coloco numa bandeja, mas bem antes de sair enxergo o potinho de sal em
cima da geladeira, sorrio.
— Um pouquinho de sal não mata ninguém!
Nem fantasmas.
Pego o sal, jogo meia colher pequena e misturo no café, depois
retorno pra sala e começo a servir a todos, mamãe não para de falar com
Donatela, elas parecem àquelas pessoas que nunca se veem e quando se
encontram querem colocar o papo em dia, papai e Noah estão sentados no
outro sofá, estendo a xícara para papai, e deixo a última para Noah.
— Obrigado, Jas. — Ele fala com muita naturalidade.
Espere até beber esse café seu infeliz...
— Então, eu vou tomar um banho — explico e lhes dou o meu
melhor sorriso. — Estou fedendo.
— A uniforme! — insinua Noah, e bebe um vasto gole de café.
Ele faz careta e começa a tossir, pisco lentamente vendo-o se
engasgar, fica vermelho de tanto tossir, em meus lábios tem um sorriso
maravilhosamente maldoso, e me afasto indo para as escadas.
— Bem vindo de volta, Noah.

Saio do banheiro e logo de cara sinto os braços de Noah me


puxando para um abraço forte. Ele me aperta e me aperta, me sufocando
com seus braços fortes, me espremendo, fecho os olhos e tento afastar as
sensações que o abraço me desperta. Mal consigo me mover, aperto os
olhos, ele tira proveito por que estou sensível, acho que por causa da
mamãe, também pelo choque de tê-lo de volta aqui... Ou na minha vida.
— Por favor, não me bate!
Não respondo, não há vínculo entre eu e Noah, este acabou há
muitos anos. Eu não faço a menor ideia do motivo dele ter vindo atrás de
mim. O que ele quer? Pensei que ele tinha entendido o recado depois do
soco, mas isso não funcionou com ele.
Afasto-me arrumando o conjunto de moletom que uso pra ficar em
casa, Noah parece meio desajustado, ele me olha de cima abaixo em
silêncio, depois me dá um meio sorriso.
— Você ficou bonita, Bolinhos...
— Ai Meu Deus! Noah, como você é idiota.
Ele nem deveria estar aqui, ele nem deveria ter vindo! Não sei o que
ele quer, mas seja o que for, já vou cortar logo.
— Fala logo o que quer e vai embora!
— Não precisa gritar.
— Não deixei você entrar no meu quarto.
Ele enfia as mãos nos bolsos da calça social, depois gira os
calcanhares e sai do quarto fechando a porta, não conto três segundos e
escuto batidas.
— Posso entrar?
Engulo a vontade de rir. Bem, Noah sabe como me fazer rir,
admito! Depois ele entra no quarto e novamente fecha a porta, seu terno
preto é caro assim como seus sapatos, os cabelos dele são loiros e repicados
num corte pra frente, ele também tem ombros mais largos, o peito largo...
Noah cresceu.
— Eu gostei da decoração... É bem anos 2000.
Meu quarto tem pôsteres de Léo de Caprio e Jean Claude Van
Damme, uns do RBD e outros do N'SYNC, BSTB, todas as coisas que eu
sempre quis ter quando não tinha um quarto. Quando nós voltamos para
essa casa, eu mobiliei o meu quarto como sempre quis: cama rosa, guarda
roupas rosa, minha escrivaninha rosa, minhas pelúcias na cama e os meus
pôsteres que sempre quis colocar nas paredes, coisa que eu nunca consegui
quando morávamos no trailer.
— Você não jogou o Ted fora!
Ele indica a minha cama com a cabeça, olho para a primeira pelúcia
que Noah me deu, acho que tínhamos uns dez anos quando fomos num
parque de diversões e ele ganhou no tiro ao alvo pra mim, me sentia a
garota mais feliz do mundo por ter ganhado uma pelúcia de alguém, foi
nesse parque que eu o beijei ele pela primeira vez, havia tanta inocência em
nós dois. Sentia que nossa amizade duraria pra sempre, depois que nos
beijamos, limpamos nossas bocas e o empurrei, tomei a pelúcia que
coloquei o nome de Ted e sai correndo. Tinha dificuldade em lidar com
sentimentos, na verdade eu só soube o quanto amava Noah quando ele
realmente decidiu que eu não faria parte da vida dele.
— Nem o lixo queria. — Não minto. Até jogar álcool em Ted eu já
joguei, mas me via lavando ele e guardando-o novamente, cruzo os braços.
— Então Noah, em que posso te ajudar?
— É bom te rever. — Ele comenta e me fita. — Senti sua falta,
Bolinhos.
— Meu nome é Samantha Jasmine — corrijo e ele começa a sorrir
como se fizesse pouco de mim, me irrito, por que isso me da coragem pra
fazer as coisas. — Gostou do café?
— Adorei — responde e coça a barba. — Eu iria vir te ver, cheguei
hoje à cidade.
— Não deveria ter se dado ao trabalho — falo, parece que o meu
coração vai explodir.
— Queria te convidar para o meu casamento. — Noah vai se
casar! — Eu mesmo viria...
— Eu não vou!
Ele coça a testa, depois me olha com cara de quem comeu e não
gostou, o nariz dele está supervermelho, mas não ligo, por mim queria era
ter quebrado os dentes dele! Dentro de mim uma pequena desordem se
estabelece... Noah irá se casar, ele irá se casar!
— Pelo visto, só cresceu no tamanho.
A resposta tem duplo sentido pra mim, mas este "tamanho" a qual
ele se refere me machuca bem mais do que realmente deveria ser.
— Ah, não Jas... Eu não...
— SAI DAQUI! — berro furiosa, e tento respirar fundo, me
aproximo dele e Noah se encolhe com as mãos no rosto. — Sai daqui.
Começo a empurrar ele pra fora do quarto, quando consigo, bato
com a porta na cara dele.
— Eu voltarei, Jasmine Manchester! — diz ele num tom muito mais
ameaçador. — Eu me vingarei desse soco.
Pelo visto, eu cresci no tamanho, e ele não cresceu em nenhum
sentido.
ESTRANHO INVASOR
Mamãe convidou a Donatela para um almoço lá em casa no
domingo.
E desde que cheguei, ela não para de falar desse almoço, não para
de falar sobre sua infância, não para um segundo de repetir o quanto está
feliz por reencontrar mamãe. Acho que mamãe não contou da doença, e
acredito que nem deve contar, pois ainda é cedo, também não quero mais
ninguém com pena da minha mãe, já não basta os vizinhos fazendo cara de
dó quando souberam do câncer, parece que quando você fala essa palavra
pra alguém as pessoas entendem como um sinônimo de “morte”.
Hoje eu fiquei novamente como lavadora oficial dos pratos do
refeitório, não me sentia mal, o lugar me deu de certa forma muito mais
conforto do que estar em algum outro lugar da empresa e ter que dar de cara
com o dono.
Tentei pelo dia todo me distrair, esquecer a visita de Noah, nosso
encontro abrupto e o que ele me disse sobre se casar, mas ele não saiu dos
meus pensamentos.
Ele não deveria ter feito isso, ele não deveria ter voltado, eu não
preciso disso pra viver nem pra prosseguir, já tenho problemas demais na
minha vida pra ter que lidar com uma velha amizade fiasco de infância.
Acho que me assustei demais com sua presença, com a aparição de
um homem que conheci quando garoto, e que um dia acreditei ser o meu
melhor amigo, alguém que eu confiava e amava, amava muito.
Estressei-me tanto que mal consegui dormir à noite, a todo o
momento me revirava na cama, e entre um cochilo e outro me lembrava dos
olhos azuis de Noah, do sorriso dele, coisa que bani há anos, uma ponte
dentro de mim se formou e ficava comparando o garoto que vi crescer com
o homem que foi a minha casa ontem, me sentia idiota por me ver sorrindo
em alguns momentos e em outros chorando.
Já são cinco da tarde, acabei de tirar o uniforme, é hora de ir pra
casa, papai vai me pegar hoje, ele sempre pega algum dos carros pra teste
drive da loja, principalmente nos dias em que mamãe tem químio, nesse
quesito também nada a reclamar, papai sempre cuida dela quando mamãe
sai do hospital, em todos os sentidos.
Lavo o rosto, penteio meus cabelos, acho que Donatela se ocupou
muito pela tarde, pois quase não veio me ver depois do horário de almoço,
ela me lota de uma atenção que eu tenho absoluta certeza que irrita as
outras meninas da faxina. Ela gosta de mim e eu admito que apesar do
pouco tempo, tenho muita afinidade com ela.
Ligo o reprodutor do meu celular, Lupe se aproxima com o carrinho
dos uniformes e indica o carrinho.
— Quer carona, novata?
Lupe é uma mulher de uns cinquenta anos, de cabelo escuro e
poucas rugas na cara. Usa enfeites coloridos na cabeça, tem um sorriso
imenso nos lábios, mas logo uma ideia bizarra me toma a mente.
— Entra aí, hoje eu te dou carona.
Ela arregala os olhos, depois sorri e pula pra dentro do carrinho, lhe
entrego minha bolsa e empurro o carrinho para fora do vestiário. Até a
lavanderia é um corredor extenso numa descida, Lupe gargalha quando
tomo velocidade, e sorrio de seu entusiasmo, ela se segura nas bordas do
carrinho como uma criança feliz e alegre, na descida Lupe grita, alguns
funcionários da manutenção nos olham e sorriem, quando passamos pelas
portas da lavanderia me vejo gargalhando, Lupe também.
Rimos a beça e me despeço dela com um abraço, acho que não terei
tanta dificuldade em lidar com alguns funcionários afinal, e só me sinto
mais segura quando estou bem longe da King, o império cor de preto de
Noah, ou do homem que ele se tornou.
Ainda não sei bem como tudo aconteceu, mas eu tenho certeza de
que não quero saber, prefiro que as coisas continuem como estão: Noah
bem distante como sempre foi! Não temos mais nada em comum além de
uma infância feliz que acabou quando ele decidiu partir.
Fico sentada no ponto de ônibus, combinei de papai me pegar aqui
as seis, ele não demora muito e vejo do outro lado da rua o carro com o
emblema da concessionária estampada estacionar, ele abaixa o vidro e
acena, atravesso a rua olhando para os lados, a avenida que separa as duas
pistas não é perigosa, mas todo cuidado é pouco.
Sorrio e abro a porta de trás, entro e logo de cara dou um pulo no
acento, Noah Baltimore está sentado na outra ponta do banco me olhando
de cima abaixo, ele usa um terno escuro com camisa branca social, ele sorri
tão cheio de sarcasmo que meus nervos tremem, viro pra frente e o ignoro.
— Como foi o segundo dia, Jas?
— Foi ótimo. — Basicamente cuspo a segunda palavra. — Fiz
“amizades” e tudo mais — enfatizo amizades.
— Que bom, querida, chamamos o Noah para jantar conosco lá em
casa hoje, sua mãe fez rocambole.
Adoro o rocambole da minha mãe.
— Bom.
Aumento o volume do meu celular no máximo, deixo minha bolsa
no banco da frente e ligo os dados móveis do meu celular, não é assim dos
melhores, mas dá pra falar no chat e acessar redes sociais, não sou muito
ligada, Tyller é mais ligado nisso, ele inclusive me mandou mensagens de
voz no chat.
“Garota, tô boba com uma saia escocesa que eu vi aqui na lojinha
da esquina!”
Tyller ainda não contou para os pais dele que é gay — nem pra
ninguém —, nos conhecemos na lanchonete onde eu trabalhava, ele era o
caixa, duvido muito que ele conte, ele adora moda e ficar me infernizando
às vezes, mas desde então, somos bem próximos. Ele já me levou ao cinema
algumas vezes e acho que os pais dele pensam que estamos namorando,
mas no cinema não era a minha boca que ele beijava — quero rir ao
lembrar, faço careta, escuto o segundo áudio.
“Minha sogra ligou me chamando para o aniversário, já estou
empolgada!”
Sogra... Coitada da mamãe se pensa que eu e o Tyller temos algum
envolvimento.
“E o novo emprego?”
Suspiro. — Ele digita:

“Acho que eu não o vejo há umas duas semanas.”


Sinto uma cutucada forte na lombar e me encolho, me viro irritada
pro Noah, ele está virado pra frente com uma cara de sonso que só ele. Viro
pra frente e novamente levo outro cutucão na cintura, ele é rápido, me viro
pra ele e arfo irritada.
— Se você fizer isso mais uma vez, Noah Baltimore Terceiro, eu
juro que te dou um soco tão forte que você ficará sem nenhum dente na
boca! — ameaço apontando o dedo pra ele, Noah se vira lentamente pro
meu rumo.
— Fazer o quê? — pergunta cheio de cinismo, os olhos azuis tem
graça, sei que ele se esforça pra não rir.
Solto um grunhido alto, papai ri no banco da frente, me lembro de
todas as vezes que papai nos levou pros lugares no velho Cadillac, e me
sinto infantil.
— Ela fica brava no começo, mas depois passa, Noah — diz papai,
atento ao caminho.
— Conheço, senhor M! — Noah responde e me olha com um
interesse desnecessário. — Então, gostou da King?
Cínico!
— Sim, gostei — respondo a contra gosto. — Até agora ninguém
da segunda classe me chamou de gorda, obrigada.
O sorriso some dos lábios dele.
— Querida...
— Pai, não comece — peço chateada —, não quero falar disso.
— Noah nos convidou para o jantar de noivado dele. — Papai muda
de assunto. — Será em uma semana.
— Que legal, meus parabéns Noah. — Comemoro com um sorriso
falso. — Que bom que encontrou sua alma gêmea e serão felizes para
sempre.
— É! — Noah concorda novamente me analisando, e percebo que
não há felicidade alguma em sua afirmação.
Viro-me pra frente e não falo mais nada, não tenho nada a dizer,
mas tenho uma resposta para seu convite: não!

— Que mania feia você tem de entrar sem bater, Baltimore.


Estou enviando alguns e-mails para o hospital. Acabei de subir,
acho que nem o rocambole da minha mãe me fez criar apetite durante o
jantar, não consegui comer nem duas garfadas, bebi metade do suco, pedi
licença e subi. Meus pais sabem como foi difícil para eu lidar com o sumiço
de Noah, eles sabem que isso deixou um buraco imenso dentro de mim, mas
não foi apenas isso, a velha mágoa nunca se foi.
Mas decidi isolar isso dentro de mim, ignorar Noah, entendo os
reais motivos dele ter me procurado. Ele contou sobre seu noivado com
uma moça de Nova York, onde mantém residência fixa, disse para os meus
pais que eles namoram há algum tempo, e que conta com nossa presença
tanto para o jantar de noivado quanto para o casamento religioso que será
em algumas semanas.
Tudo assim, de repente; enquanto ele falava, eu me isolava em um
canto que deixei pra trás. Meus pais estão felizes com o convite é claro,
viram-no crescer basicamente, Wilma Baltimore foi amiga da minha mãe
durante anos, eles viviam por perto e nós também, mesmo que isso tivesse
mudado entre eles com o passar dos anos, eu sei que papai e mamãe gostam
realmente dos Baltimore.
Estou um pouco mais feliz, pois acabo de receber a confirmação do
hospital, de que mamãe poderá usufruir do tratamento completo com o
convênio, ela terá uma assistência maior! Estou enviando e-mails adoidado
para o novo hospital, quero que ela comece logo o tratamento nesse lugar.
Andei pesquisando no catálogo do convênio e percebi que os aparelhos são
mais avançados e os médicos excelentes.
— Seu pai me deixou dormir aqui.
— Ah, não me diga!
Irrito-me com essa situação, meus pais querem que eu faça as
“pazes” com Noah, mas eu não quero. Pra começar, eu estava ótima até ele
reaparecer na minha vida na fila da comida.
— Ele disse que posso puxar o gavetão da cama.
— Por que não vai pra sua casa?
— Estou num hotel.
— Durma na sala.
— Que besteira, Bolinhos!
Respiro fundo e conto até dez, eu realmente não sei o que ele
pretende com essa insistência, meus pais já concordaram em ir pra festa de
noivado, pro tal casamento, ele não tem mais nada o que fazer aqui.
— Então... O que fez de interessante nesses anos, Jas?
— Nada.
Acho que não posso contar da minha vida pra esse estranho
invasor que chamei de amigo.
— Sua mãe me disse que está namorando. — Isso é o que ela e os
pais do Ty pensam. — Fico feliz por você!
— E eu por você.
Meus dedos formigam enquanto digito nas teclas do meu teclado,
estou nervosa.
— Ele é daqui?
— É.
Quem sabe assim ele não para de ficar me importunando?
— Você não foi pra faculdade?
— Não.
— Eu fui.
— Bom pra você!
— Me formei em Publicidade e Propaganda.
— Legal.
— Senti sua falta, Sam.
— Bom.
Desligo o computador e pulo da cadeira pra cama, me deito
tentando fingir que estou relaxada, coisa que estou longe de sentir, olho
para o teto, meu corpo pula na cama e Noah se joga ao meu lado, mas
mantém distância.
— Ainda posso me desculpar?
— Não!
— E se eu te der chocolate?
— Ainda não, Noah.
— E o que eu faço?
— Me ignora.
Noah me olha, mas não me movo, estou dura.
— Você nunca vai me perdoar?
— Nunca.
— Nunquinha?
— Jamais!
— Nem se eu te der doces?
— Noah, eu cresci, você cresceu...
— Te quero de volta na minha vida!
— Ai, como isso foi podre, meu Deus!
Deliberadamente começamos a rir, nego com a cabeça, ele
realmente falou algo tão clichê?
— Sabia que você estaria furiosa.
— Eu sou assim.
— Ao menos pode pensar em me deixar conhecer seus filhos, se
tiver algum?
— Isso é nojento, Noah.
Novamente rimos. Noah se ergue e tira o terno, joga em cima da
minha poltrona e afrouxa a gravata, olho para o teto e me deito ficando de
costas pra ele, isso é tão... Estranho.
— Não deixaria minha melhor amiga de lado nesse momento. —
Noah fala e se deita novamente. — Me desculpe, mas não pode me privar
disso, Sam. Você é muito importante pra mim...
— Não fui durante esses anos...
— Minha vida mudou, Sam, eu tenho tantas prioridades e
responsabilidades agora.
— E no colegial?
— Sei que pisei na bola, mas fiz o que achava melhor pra mim.
— Não é o melhor agora que se mantenha longe?
— Não, não é.
— Não vou te perdoar, nossa amizade acabou há anos, Noah.
— Mas isso não nos impede de voltar a sermos amigos hoje,
impede?
— Você está me pedindo pra ser sua amiga, depois de tudo o que
me fez?
— Sim.
Nem respondo, acho isso muito absurdo, ele é um grande imbecil!
Mas uma dúvida me vem à cabeça.
— Por quê?
— Isso é algo que eu deixei pra trás.
— Eu não era boa o suficiente pra ser sua amiga, Noah?
— Eu não era mais o garoto que você conheceu, Sam. Eu cresci! E
foi algo que eu percebi que não se encaixava no seu mundo, queria novos
amigos, queria sair daqui.
— Entendo.
Ou seja, eu não era a melhor amiga do mundo.
— Não tinha a ver com você.
— Claro que não! Eu só não era mais a pessoa com quem você
queria estar, eu não era popular nem nada, era só uma valentona
desengonçada que as meninas adoravam zoar. Você se cansou de mim,
admita Noah!
— Você assustava as pessoas.
— E você tinha medo delas!
Ficamos em silêncio, nunca me questionei sobre como seria se um
dia reencontrasse Noah na minha frente, estava tão lotada de perguntas
sobre tudo, mas tudo o que tinha era nada: lembranças de nossa antiga
amizade, que não explicavam o porquê dele ter ido embora da minha vida.
Mas agora ele está aqui me dando respostas, me pedindo pra ser sua amiga
novamente e tudo aquilo fazia sentido, não me encaixava na vida de Noah
por que ele queria uma nova vida com pessoas novas, e tudo o que eu
significava pra ele ficara em sua infância, e eu talvez não fosse a garota
mais amável e dócil do mundo, e receptiva a novas amizades.
— Você ainda é a minha melhor amiga, Bolinhos, só precisa
perceber isso.
Não respondo, engulo a vontade de chorar, fico quieta, fecho os
olhos e decido que não quero mais falar sobre isso. Noah deixou de ser meu
amigo há muitos anos. Pra mim ele não passa de um estranho.
NOIVADO DE KING
Noah tinha deixado um pequeno bilhete de despedida no travesseiro
ao meu lado da cama, não dizia nada, apenas uma pequena frase:
“Te espero no meu jantar de noivado.”
Aquilo me irritou tanto que eu amassei o papel e joguei no lixo do
banheiro.
Naquele dia, duas coisas aconteceram.
A primeira foi que ao chegar a King, Donatela me informou que ele
havia voltado pra Nova York, e a segunda, foi que papai foi demitido do
emprego.
Agora eu estou sozinha no barco.
Mas ele vai receber seguro da previdência, contudo, já conversamos
e ele vai começar a procurar um novo emprego, ou ao menos, assim espero.
A semana foi normal e corrida. Comecei a me inteirar na King no
dia seguinte a partida de Noah, me sentia mais calma e tranquilizada em
saber que não esbarraria nele em qualquer lugar que fosse da empresa.
Na quarta, mamãe me avisou sobre o jantar de noivado, disse que
seria em Nova York e que Noah se encarregou de mandar as passagens
compradas pra gente ir no sábado de manhã, o jantar seria no sábado à
noite.
— Ele também mandou passagem pro Ty, avisa pra ele — dissera
mamãe toda entusiasmada.
Era a primeira vez em meses que eu a via feliz, então nem disse
nada.
Não me sentia, nem me sinto pronta pra ir a este jantar, mas sei que
se eu não for Noah vai virar um inferno na minha vida. Eu não sei como e
quando, mas ele descobriu o meu número de celular e ligou todos os dias da
semana, soube que era ele na primeira ligação, quando ele falou “alô”, eu
desliguei, desde então não atendo mais nenhuma.
Acabo de acordar levando um saculejão no corpo.
— Você quer fazer sexo antes ou depois do café, meu bem?
Me vejo rindo e me viro na cama. Ty se deita em cima do meu
corpo, como se isso fosse a coisa mais normal do mundo! A espontaneidade
dele me assusta às vezes, mas eu gosto, ele se tornou meu único amigo em
anos, apesar de eu ter bastante receio de fazer novos amigos, o senhor “vou
embora” me deixou traumatizada.
Ty tem olhos azuis lindos, os cabelos dele têm tons de cinza
dourados, ele tem fios grisalhos, apesar de ter uns trinta e poucos, é branco,
mas o corpo dele está de parabéns, isso lhe custa horas na academia e
corridas intensas aos sábados de manhã — coisa que nem nessa vida nem
na outra eu faço!
— Que tal só o café?
— Eu já trouxe a mala, quero desfrutar de uma viagem na primeira
classe.
— Quem sabe.
Enfim sábado! O dia do tal noivado. Ontem rolei na cama por
várias horas me sentindo tensa até conseguir dormir... Bebi meio vidro de
paracetamol de tanta dor de cabeça que sentia.
Ele levanta, usa jeans, uma camiseta preta e tênis. Quem olha de
longe até acredita que gosta de mulher! Ty é muito discreto, muito na dele,
mas desde o começo deixou muito claro que só queria amizade, até porque,
de mulher ele não gosta. Acho ele um desperdiçado, porque ele é
simplesmente lindo.
Por ser mais velho, tem um charme a mais, eu sempre achei caras
mais velhos algo bem sexy! Apesar de nem mesmo as moscas me quererem
por perto, eu já sonhei com muitos coroas da vizinhança, nenhum com
sucesso é claro, meus sonhos são bobos, cheios de fantasias onde príncipes
encantados existem e eu sou vinte quilos mais magra e uso tranças
douradas.
— Ele acha que somos namorados?
— É mais ou menos isso!
— Ele não vai te roubar de mim.
Isso soa bem ameaçador. Bem, afinal, não posso ser tão péssima
amiga assim, ao menos o Ty parece gostar de mim de verdade. Não temos
uma amizade de anos, mas ele se aproximou muito de mim nos últimos
meses e sempre é um fofo comigo, ele entende e respeita o meu espaço,
coisa que o Noah nunca fez e duvido que venha a fazer.
— Já escolheu seu vestido?
— Tem traças no meu guarda-roupa.
Ele sorri cheio de maldade.
— Sabia que não iria escolher, então passei na grife de uma amiga a
pedido de sua mãe e comprei.
— Awnt! — Soou sem um pingo de graça. — E os sapatos?
— Trinta e nove. Pés de princesas!
Mexo meus pés para os lados. Ty tem jeito com essas coisas, ele é o
vaidoso na relação, até depilação a laser ele faz! Eu custo a me depilar com
a Fátima, ela só falta arrancar a minha pele na cera.
— Vamos, mexe essa bunda gostosa, mulher. — E me dá uma
palmada ardida na bunda, dou um pulo e rolo na cama fazendo cara feia. —
Você tem que estar deslumbrante, mostrar pra esse sacana que jogou a
chance de te ter fora...
— Ty, não viaja, ok?
— Ele é o seu amor adolescente!
— Ele era o meu melhor amigo muito antes disso.
— Queria perder a virgindade com ele.
— Eu também queria uma Barbie Malibu, e nunca tive uma!
— Não importa, eu mesmo vou te deixar deslumbrante.
Só espero que essa droga de jantar não suba a cabeça de papai,
acima de tudo, me preocupo que ele beba além do que pode e fique fazendo
ceninha, mamãe disse que iria conversar com ele, mas eu já comecei a
rezar, já não quero ir e tenho a sensação forte de que isso não irá acabar
bem.

Um homem nos aguardava no aeroporto.


Papai já sabia do combinado, ele e Noah tinham conversado e se
planejado pro tal jantar, logo fomos conduzidos pra um carro de luxo muito
bonito, mas tentei esconder minha surpresa com aquilo, Ty estava a todo o
momento olhando em volta todo surpreso, assim como mamãe. Parecia
coisa de outro mundo.
Fomos levados pra um hotel. Eu estava supernervosa quando
saímos do carro, e cansada da viagem, foi muito fadigante. Nas poucas
vezes que viajei de avião eu estava sempre com medo da coisa cair e hoje
não foi diferente.
Eu e Ty ficamos em um quarto, e mamãe e papai ficaram em outra
suíte, fui direto pra cama e Ty veio logo atrás, me sentia destroçada.
— Sabe o que eu não entendo?
— Hum...
— Por que depois de todos esses anos e de tudo, ele quer que você
participe desse momento da vida dele?
— Se eu soubesse até explicaria, mas imagino que seja por estar
arrependido ou coisa assim.
— Acho que ele ainda tem uma quedinha básica por você, querida!
— Ele nunca teve uma queda por mim, Ty.
— Por que acha que não, bebê?
— Ele me chamava de gorda.
Ty começa a rir, e depois de alguns instantes ele fica de lado e passa
o braço em volta da minha cintura, se aconchegando. — Nunca tive essa
intimidade com um homem... Bem, teve o Noah, mas éramos jovens demais
na época, contudo, não sinto que o que eu e Ty fazemos seja errado, acho
que não.
— Não quer começar a treinar os beijos?
— Quem vê você com essa cara de apaixonado até acredita que não
senta no pepino.
Ele começa a rir. É, eu tenho um humor negro daqueles, mas
francamente, nem ligo.
— Seus lábios são lindos, querida! Precisa se olhar mais no
espelho, seus olhos, suas curvas, ninguém nunca vai te amar se você não se
amar, querida!
— Ai, Ty, casa comigo!
Vou pra cima dele apertando-o. — Ty, às vezes, deixa de agir como
uma vadia megera e age mais como meu amigo, acho que ele entende que
tem que dar um tempo em seu lado “bicha” e que estou fragilizada com a
chegada do Noah. Ele me apoia, contei pra ele sobre tudo o que aconteceu
entre eu e o Noah durante o voo, ele sabe de muitas coisas nas quais eu
jamais contei pra ninguém, principalmente que eu via em Noah meio que
uma paixonite de infância.
— Ele não sabe o que perde. — Ty desliza as mãos até a minha
bunda e aperta. — É durinha.
— Sabe, o que eu não entendo é... Por que ele voltou depois desse
tempo todo?
— Não é óbvio?
— Não!
— Ele quer achar motivos pra deixar tudo terminado, uma vez que
ele se resolver com você, não se sentirá culpado se casar com quem quer
que seja. Ele quer provar pra si mesmo que não sente nada por você.
— Poxa, o livro de romance nem começou e a autora já tá
caprichando no seu excesso de inteligência e fofura?
— Eu sou gay, querida, mas também sou homem.
— Então eu sou um assunto não terminado?
Faço uma careta quando ele faz que sim e não gosto disso.
— Tem que sair com classe, fechar com chave de ouro! Assim,
talvez ele te deixe em paz.
— Tenho chances com você?
E ergo as sobrancelhas, Ty sorri e seu sorriso é lindo e cheio de
maldade.
— Isso depende, querida, eu ainda não escolhi a minha barriga de
aluguel.
Ele quer ter filhos antes dos quarenta, o que eu não entendo é: como
quer ter filhos sem fazer sexo com uma mulher?
— Prometo que vou pensar com zelo — brinco e vou para o lado.
— Então... Temos que colocar um fim nisso.
Quero esquecer Noah definitivamente, quero que ele suma
novamente, quero instaurar a paz dentro de mim acima de tudo.
— Com classe, não se esqueça!
— O que isso significa?
— Que você estará linda hoje à noite.
— Esse livro está ultrapassado, Ty, garotas GG não ficam lindas
assim de uma hora pra outra.
— Meu amor, com um amigo gay é impossível não ficar linda,
ainda mais sendo GG!
Eu duvido, mas não questiono. Só espero que esse jantar acabe bem
rápido e que Noah me esqueça, assim como veio fazendo durante esses
últimos trezes anos.

— Eu não acredito que você trouxe algo tão justo...


Estou tentando puxar esse pedaço de pano pra baixo enquanto Ty
sai do taxi.
Antes que eu o matasse, ele se desculpou por tudo, tentou explicar,
mas de repente, quando me olhei no espelho me sentia ridícula por usar
algo tão curto.
A amiga dele dona da loja se enganou, eu visto 50, ela mandou 48,
e um vestido que deveria me bater na altura dos joelhos, bate na altura da
metade da minha coxa, é um vestido vermelho em forma de túnica de
apenas uma manga, ele é longo de um lado, mas o corte dele é vertical e
torto, formando um degradê no lado esquerdo do meu corpo.
Sinto-me pelada!
Sinto-me ridícula.
Sinto-me... Aff, que ódio!
— Você está perfeita.
E pra completar ainda me arrumou uma sandália superalta! Não
tenho o hábito de andar de salto, nunca gostei, eu já sou meio alta e usando
essa coisa eu pareço um jogador de basquete pronto pra uma cesta.
Papai e mamãe vieram na frente, para minha surpresa, o jantar será
num restaurante famoso de Nova York, e se eu já estava com raiva pelo fato
do vestido ser muito ousado e nada a ver comigo, fico ainda mais irritada
com o fato de que muitas pessoas me verão usando ele, inclusive meus pais!
— Já até imagino a cara feia que o meu pai vai fazer ao me ver usando isso.
Ty me maquiou levemente, algo não muito pesado, sequei meus
cabelos e os deixei soltos e de lado, segundo ele, estou espetacular, mas
estava com tanto ódio pelo vestido não me servir que nem quis me olhar no
espelho, só de ver minha perna toda exposta dessa forma eu já fico toda
irritada.
— Tente fingir que não se importa com ninguém, você sabe que
essa gente é metida. — Ty arruma as sobrancelhas.
Fecho a cara estreitando os olhos pra ele, a máscara para cílios irrita
meus olhos, mas nem falo nada. Ele fala isso porque ficou lindo no terno
azul que vestiu, está lindo e mais elegante que nunca. — Confesso, ele sabe
se vestir, e muito melhor do que a maioria dos homens que eu conheço.
Respiro fundo e caminhamos na direção da entrada do hotel, somos
recebidos por uma recepcionista de peitos grandes, mas bunda que é bom...
Ty sorri para ela e a mulher fica se derretendo toda, ele passa o
braço em volta da minha cintura enquanto seguimos a moça, tento não cair,
o salto é fino, se ao menos fosse plataforma já ajudaria!
Ele carrega a bolsinha que trouxe pra combinar com o vestido, puxo
o vestido pra baixo quando a recepcionista nos mostra a entrada do
restaurante, Ty agradece. É, ele está gato, admito, mas não sei qual é a parte
em que os meus pais acreditam que um homem como ele — sendo hétero
— iria me querer... Jamais!
— Sabe o que não acontece nos livros, querida? — Ty pergunta
enquanto me conduz pra dentro do restaurante.
— Não! — Estou olhando para os meus pés nas sandálias, até que
não são feias...
— O cara nunca fica com a garota legal. — Ty fala baixinho no
meu ouvido. — O melhor amigo dela fica com a garota legal no final!
Não entendo a exclamação, ele me cutuca e rio odiando isso, mais
pela cutucada do que pela vontade de rir, Noah gostava de ficar enfiando os
dedos dele nas minhas dobrinhas da barriga na infância, eu fingia que não
gostava, bem, ao menos fingia muito bem.
— Repita comigo, querida... Eu sou sexy...
Faço cara de fingida e sorrio olhando pra ele, interrompo-o.
— Eu sou sexy... Poderosa e bonita e nada nem ninguém vai dizer o
contrário!
Depois que digo acabo rindo muito disso, ele simplesmente é
irritante quando quer.
— Sam?
Ergo o olhar e Noah Baltimore se aproxima por entre as mesas, seus
olhos azuis contém um brilho estranho e diferente, ele abaixa o olhar e o
ergue me analisando de cima abaixo, Ty me aperta me trazendo pra terra. É
que durante dois segundos, me esqueci de respirar, Noah está de terno e
gravata, o terno é preto e de corte reto, seus cabelos loiros jogados pra
frente no mesmo corte, ele não fez a barba, é loira e clara assim como seus
cabelos, os olhos azuis mais lindos que nunca, assim não tem pulmão que
aguente.
— Oi. — Noah me olha de cima abaixo novamente, mas permanece
neutro, seu olhar não revela nada.
— Oi. — Devolvo e me sinto meio nervosa, me viro para o Ty. —
Tyller, este é o Noah, Noah este é o Ty, meu namorado.
Nunca apresentei ninguém como namorado pra ninguém, nem para
os meus pais.
— Muito prazer! — Ty sorri e estende a mão para Noah, ele aperta
a mão de Ty com firmeza. — Ela me falou muito de você, Noah.
— Espero que bem. — Noah diz me analisando novamente —
Certo?
— É! — Tento soar o mais normal possível. — E a sua noiva?
— Te apresento.
— Claro.
Noah gira os calcanhares, Ty sorri cheio de maldade olhando para a
bunda dele, lhe dou uma cotovelada!
— O que é? Não pode mais nem sonhar não?
— Estamos juntos!
— Precisa ser cego pra não ver que ele gosta de você!
Não acredito.
Nós o seguimos passando por entre as mesas, tento ignorar o
nervosismo, e logo que nos aproximamos enxergo a silhueta pequena da
moça alta e magra, ela deve ter a minha altura, tem cabelos negros e lisos, e
quando ela sorri o azul intenso em seus olhos se destaca, a boca dela é
perfeita, e ela usa um vestido preto longo de seda com uma abertura lateral
que deixa sua coxa morena e bem definida amostra.
— Merda! — Ty xinga baixinho.
Me da vontade de dar meia volta e sair correndo, uma frustração
intensa se forma na minha garganta quando ela se vira e sorri pra gente. Ela
me olha de cima abaixo com um sorriso ainda mais arregalado, e se
aproxima de Noah toda empolgada.
Sinto-me como a Júlia Roberts naquele filme “o casamento do meu
melhor amigo”, onde o meu ex-melhor amigo conheceu a garota dos
sonhos, linda e legal, coisa que eu nunca fui e nunca serei.
— Dyanna, esta é a Sam!
— Bolinhoss!
Dyanna vem abrindo os braços e me abraça assim tão de repente,
que eu fico sem ação, ela berra esse apelido ridículo que eu tento banir da
minha vida desde os cinco anos de idade. Noah nos olha com um pequeno
sorriso estranho nos lábios, e quando ela me solta, faz o mesmo com Ty.
Meu novo melhor amigo sorri assim, como se isso fosse a coisa mais
normal do mundo, mas dentro de mim, tudo vai lentamente se quebrando,
engulo a decepção.
— Você não sabe o quanto eu estou feliz por te conhecer, querida!
— Tá bem, Cameron Diaz... Tá bem! Seja “menas” querida! — Você é
absolutamente linda, eu amei seu vestido... Uau, que pernas!
Sinto-me ridícula por uma mulher assim me chamar de bonita,
quando eu na verdade, mal chego perto dos sapatos que ela usa.
— Obrigada — digo e tento sorrir — Você está deslumbrante!
— Eu amei o seu cabelo! — Dyanna fala e olha para Ty. — Estão
juntos?
— Namorando. — Ty responde e me olha com um pequeno sorriso
no rosto. — Em breve, não é amoreca? — Amoreca? Argh!
— Ah... Sim, claro! — digo apressada e olho para a deusa-linda-e-
super-gostosa-noiva-do-Noah-traidor-Baltimore! — Muito obrigada pelo
convite. Vocês estão de parabéns, tenho certeza de que serão muito felizes.
— Obrigada.
Dyanna sorri abraçando Noah, e isso me dá um embrulho forte no
estômago, como quando ele beijou a Jane Collins...
— Então, vamos achar nossa mesa? — Ty pega a mão de Dyanna e
a ergue, depois beija a mão dela com um sorriso cheio de charme nos
lábios. — Muito prazer, Baltimore.
— É King! — Corrige Noah, num tom muito seco.
— Que seja. — Ty também é meio rude com sua resposta.
Ele me puxa pra longe do casal. Meu coração vai se encolhendo,
mais, e mais, e mais, e eu sinto minha garganta queimar com isso.
— Calma, querida, a noite só começou!
Infelizmente!
NÃO SOMOS AMIGOS, KING!
— Ela nem é essas coisas... É muito seca!
Eu sei que o Ty fala isso pra fazer com que eu me sinta melhor,
meus pais já estão interagindo com os convidados do noivado, disso, nada a
reclamar! Papai é vendedor e mamãe muito gentil, também porque eles dois
vieram para o noivado e estão muito felizes por Noah. Eu estou evitando
olhar pra ele e a senhorita “imitação de Cameron Dias”, há basicamente
meia hora.
Dyanna é linda, simpática, e tem um entusiasmo em seu olhar,
supercativante! — Admito, ela é muito gentil, daquele tipo de garota que
conquista a gente apenas com um sorriso, acho que ela é uns cinco anos
mais nova que eu, e pelo menos uns quarenta quilos mais magra... Ela é
tudo o que eu nunca vou conseguir ser em toda a minha vida!
Mamãe me elogiou pelo vestido, disse que estou linda, papai apenas
fechou a cara pro Ty, depois os dois saíram da mesa. Agora estamos Ty e
eu, beliscando alguns quitutes que os garçons trazem pra nós. Eu mal
consigo comer alguma coisa e Ty já bebeu duas taças de champanhe, ele
adora esse tipo de coisa.
— Vem dançar comigo?
Tem um espaço separado para casais dançarem, músicos tocam num
canto do restaurante, músicas clássicas. — Claro que eu sei dançar! Graças
às aulas da senhorita Peneaut, sou voluntária no asilo estadual de Charlotte.
A senhorita Peneaut me dá aulas há algum tempo, tango e salsa, mas
francamente... Sinto-me ridícula em dançar na frente de quem quer que
seja! Só aceitei as aulas, porque ela queria retribuir ao fato de que, uma vez
por semana vou vê-la no asilo, ela e as outras matriarcas da cidade.
— Melhor não...
— Ora, vamos! Não seja injusta consigo mesma, querida.
— Me acharão ridícula!
— Bebê!
E dá uma de ofendido, acabo rindo da cara que ele faz. Ty sabe me
atormentar quando quer!
Ele levanta e me estende a mão, suspiro e morro de vergonha, mas levanto-
me, olho em volta e não vejo Noah nem sua noiva. Fico aliviada por isso!
Ainda não consigo espantar a sensação de incomodo com tantas pessoas me
olhando, mas enfim, quando o dia de hoje acabar, não irei rever Noah King
nunca mais em minha vida!
Ty vai até os músicos e quando retorna, o tango Roxanne começa a
soar nos violinos de um dos músicos. Sorrio negando com a cabeça,
também, a maioria das pessoas não está olhando, essa parte é pequena e
reservada, as mesas estão postas de forma que as pessoas ficam viradas pro
lado oposto. Ele estende a mão e aceito, então sou puxada com força contra
seu corpo, trombamos e colo a testa na dele.
— Não há nada que uma GG não possa fazer, querida!
Ele avança e recuo dois passos entrando na dança, seu braço
enlaçando minha cintura e sua outra mão segurando a minha, nossos passos
são curtos e mais intensos, Ty é daqueles tipos de caras que adoram fazer de
tudo um pouco, tem esse lado dele que cada dia se mostra tão interessado
que me surpreendo.
Não sei dançar de salto, mas tento e não preciso fazer muito
esforço, ele me conduz muito facilmente. O tango é tão... envolvente! Algo
que amo.
Bem, aprendi a gostar de muitas coisas depois que Noah foi
embora, claro, dentro das minhas limitações, obviamente que eu não tenho
condições de fazer coisas tão caras, não fui pra faculdade, mas aprendi a ter
várias profissões, já fui babá, manicure, cabeleireira, garçonete e atualmente
sou faxineira, não me envergonho, pois, disso tudo tirei sustento, consegui
dinheiro pra comprar nossa casa de volta e desde então ajudo meus pais, se
eu tivesse ido pra faculdade, nada teria aprendido, e talvez meus pais ainda
estivessem morando no trailer. Agora, muito mais que antes, mamãe precisa
de mim, e papai mesmo que seja um pé de cana, não é o pior pai do mundo,
nos ajuda então... — Noah King, não fiquei milionária, não emagreci, não
sou superlinda, mas eu sou até feliz com a minha vida!
Ty puxa a minha perna e a ergue, me agarro a ele inclinando-me
para frente, ele toca toda a extensão da minha coxa e me empurra, vou pra
trás e depois volto girando, quando nossos corpos colam, estou arfante, ele
me beija o pescoço, e dançamos trocando os pés pelo pequeno espaço, Ty
me gira e vou recuando pra trás olhando nos olhos dele, o final da música se
aproxima, acabo por rir quando ele faz cara de safado pra mim,
continuamos juntos a dança, ele me gira no final, e quando vejo, estou
grudada em seu corpo, ele segurando a minha perna enquanto tento me
equilibrar na outra, Ty me da um selinho, e começo a rir muito, aos poucos
volto pra realidade e escuto o som de aplausos.
— Você não vale nada, Tyller Loockwood!
— Não sou eu quem está olhando pro seu rabo ao invés de olhar pra
bunda seca da noiva! — Fico tensa enquanto me ergo. — Não olhe agora,
querida, já disse, confie em mim! Ignore-o.
Faço que sim com a cabeça, afinal, meti o Ty nisso, ele beija a
minha mão e passa o braço em volta da minha cintura, me puxa em direção
ao bar, as pessoas nos aplaudem bastante e fico vermelha. Realmente, não
pensei que alguém veria, tão pouco, me aplaudiria.
— Vou ao banheiro. Ele está bravo! Peça duas bebidas e finja pouco
interesse.
— Não...
— Confie mais em si mesma, você é ótima em dar foras!
Ty e eu nos aproximamos do balcão e ele me segura pela cintura,
logo depois ele me beija, fico meio perdida durante o beijo, não sinto nada,
absolutamente nada, contudo, tento corresponder da mesma forma, não
tenho experiência, tive um namorado há dois anos, mas durou apenas três
meses, ele queria coisas que eu não poderia dar. Quando Ty se afasta, estou
sem ar.
— Não me decepcione! — Ele diz e pigarreia. — Eu acho que vou
vomitar.
Ele coloca a mão na boca, e pigarreia de novo se afastando. Viro-
me para o balcão e o barman me olha se apoiando nos cotovelos, me sento
no banquinho e tento sorrir.
— Eu quero um conhaque e uma água, por favor.
O Barman está me olhando com um pequeno sorriso, devolvo o
sorriso, e ele pisca pra mim, minhas bochechas ficam vermelhas quando ele
me dá as costas. — Sério que ele piscou pra mim?
— Não sabia que dançava tango!
Noah King se senta no banco ao lado do meu, os olhos dele tem
algo que diz muito claramente que não aprovou nenhum pouco a minha
dança com o Ty. Ele está carrancudo — conheço —, quando não gosta de
algo, Noah nunca consegue disfarçar, acho que isso nem em outra vida
mudaria.
— É. Eu aprendi já faz um tempo.
— E esse vestido curto?
— Ty me deu.
Eu tento parecer indiferente ao olhar punitivo de Noah, ele sempre
foi bem daquele tipinho de cara que adora dar lição de moral, o carinha
certinho que não gosta de correr risco, acho que ele costumava ser o meu
bom senso, a voz da minha consciência, mas ele se foi, então desenvolvi
esse meu lado também bem fechado, foi como se uma porta se fechasse em
minha vida quando ele foi embora...
— Não gostei.
— Acho que tem que se preocupar com os peitos da sua noiva, que
pulam pra fora do vestido dela, não comigo, Noah. Tenho vinte e sete anos,
sou crescida e vacinada.
— Não sou obrigado a aprovar isso também. Onde conheceu esse
cara?
Ele fala baixo. — Como meu pai quando está bravo comigo e fica
sussurrando com medo das pessoas ouvirem nossas conversas. Ele fazia
muito isso quando íamos à igreja aos domingos, atualmente vamos apenas
eu e mamãe.
— Só falta me falar agora, que está apaixonada por esse charlatão.
— Ele não é um charlatão!
— Não gosto dele!
Ele está bravo.
E eu não entendo o motivo dessa reação, porque afinal de contas, eu
tenho muito mais motivos pra ficar furiosa com ele do que ele comigo.
— Não tem que gostar dele, Noah. Tenho muita consideração por
nossa antiga amizade, por isso, eu vim para o seu noivado — digo e me viro
para o barman, pego o conhaque e, irritada, bebo a dose num só gole. Desce
rápido, e me esforço pra não tossir.
— Ele é velho demais pra você.
Diria que Noah está com ciúmes se ele realmente não estivesse tão
irritado, acho que ele pensa que eu estou me exibindo pra chamar sua
atenção. — na verdade, eu estou tentando muito, fazer com que ele entenda
que não há mais espaço na minha vida pra ele, e que hoje será a ultima vez
que desejo vê-lo, e que só faço isso para que ele veja que mudei e que não
quero mais ter que lidar com ele... Para afastá-lo, assim como ele fez
comigo.
— Cuida da sua vida, Noah — aconselho e me acomodo no banco.
— Eu cuido da minha e do meu namorado!
— Ele gosta de chamar atenção!
Viro-me para ele, e percebo que os olhos azuis estão focados nas
minhas pernas, ele ergue o olhar depressa e me fita, de repente, desvia o
olhar para o lado, muito, muito sério. — acho que é só impressão minha,
Noah não olharia para as minhas pernas assim... Não o Noah que eu
conheço.
— Ele não precisa chamar atenção, Noah. Diria que está com inveja
dele, porque o Ty é gentil e simpático, um verdadeiro “gentleman”!
— “Gentleman”... — repete assim, meio chocado. — Aquela porta
não sabe o que é ser um “gentleman”.
— Antes de tudo, ele é o meu amigo e eu gosto muito dele.
— É mesmo? — Noah sorri contrariado. — Ama ele?
— Ama sua noiva?
Ele me encara assustado com a pergunta, eu crio coragem e levanto
pegando minha garrafinha d'água.
— Espero que você seja muito feliz com a sua noiva Noah, de
verdade! — As palavras saem muito naturalmente, mas por dentro estou me
quebrando toda por dizer isto. Olho no fundo dos olhos dele. — E espero
que Deus continue te abençoando imensamente, tanto a você quanto a sua
mãe, sei que vocês merecem muito serem felizes.
Ele fica em silêncio me olhando, os olhos cheios de um tipo de
desgosto ou coisa parecida. Não sei o que Noah quer de mim, não sei se
posso confiar novamente nele, não posso apagar da minha memória nossa
infância e tudo o que vivemos juntos, mas simplesmente não posso me
sujeitar ao que ele quer... Não posso mais ser sua amiga, acho que o que
tinha de ser já foi, e acabou quando ele foi embora! Não dá pra reatar algo
que deixou de existir assim do nada, nem fingir que estou feliz com
absolutamente nada.
— Boa sorte, Noah.
— Somos amigos, Sam...
— Não somos amigos, King!
Dizendo isso, me afasto, acho que não temos mais nada o que falar,
eu espero que Noah entenda que definitivamente nossa antiga amizade já
acabou, e qualquer que sejam suas intenções de que haja algum tipo de laço
entre ele e eu, foi cortado hoje.

King... Beijos... Fugas


— Você me deve uma dança, ao menos!
Reviro os olhos.
Não acredito que depois do gelo que eu dei nele, Noah veio atrás de
mim! Ainda mais porque consegui fugir do restaurante, na verdade, dei uma
escapada de mestre, falei pra mamãe que iria ao toalete, alguns instantes
depois sai para a cobertura do hotel, fica um andar acima do restaurante,
daqui ouço o som dos violinos, as músicas que embalam a festa de noivado
de Noah King — o estranho que me convidou pra sua festa de noivado.
O vento sopra meus cabelos pra longe, mas não sinto frio, me sentia
bem mais que sufocada lá embaixo, me sentia péssima, e ter que ficar
estrangulando o choro dentro de meu íntimo me deixou mal, tinha que sair,
deveria sair, já faz alguns minutos que eu estou aqui olhando à noite de
Nova York, admirando a metrópole em silêncio, pensei em tantas coisas, em
minha mente vinha tantas lembranças da minha infância, da minha
adolescência, e enfim de hoje, de quem eu fui, de quem eu queria ser e de
quem me tornei.
— Me concede esse tango, senhorita?
Suspiro, olho pro lado e ele está me olhando muito concentrado,
faço que sim, vencida por um pequeno cansaço, ergo a mão e estendo pra
ele, Noah toma a minha mão e a beija com gentileza, sinto pequenos
arrepios pelo corpo, parece que os meus nervos se abalam com isso.
Aproximo-me dele fisicamente, mas emocionalmente estamos
afastados. Próximo a nós, há uma piscina e várias plantas.
Noah passa o braço ao redor da minha cintura e me puxa com força
de encontro ao corpo dele — de repente, apenas isso é o suficiente para meu
corpo todo tremer.
— Não me disse que sabia dançar, senhor King! — digo com a voz
falha, o nervosismo forte me tomando toda.
— Você não sabe muitas coisas sobre mim, Samantha.
Ele avança e escuto o som dos violinos e de uma sanfona, “Por una
Cabeza” de Carlos Gardel começa a soar no andar de baixo, uma música
frustrada e intensa demais, um tango tão lindo e perfeito...
Acompanho seus passos e eu o fito recebendo a intensidade de seu
olhar, a força na qual Noah me encara é súbita e tremenda, ninguém jamais
me olhou assim, tão pouco transpareceu tanta confusão ao mesmo tempo.
Sensações através do olhar!
Este homem que dança comigo agora, está muito longe de ser o
meu melhor amigo de infância.
Dançamos em silêncio, apenas a música nos conduz, suas pernas
estão entre as minhas, seu braço me aperta contra seu peito, sua mão aperta
a minha com a força precisa, a angústia frisante em seu olhar me desperta
tanta curiosidade, ao mesmo tempo em que há essa intensidade fora do
comum.
Diferente do garoto que sorria para mim muito facilmente, exibindo
seu aparelho colorido... Diferente do garoto que muito gentilmente, uma
vez me levou amoras no trailer dos meus pais, escondido... Alguém doce e
gentil... Noah Baltimore... Meu único e verdadeiro amigo!
Este não é o meu Noah, este é outro Noah... Este é Noah King.
Ele me confunde muito mais do que pensei que confundiria.
Meu corpo estremece quando ele me aperta, e giramos na dança
mais intensa. Noah toca o lado do meu corpo com suavidade e puxa minha
coxa nua pra cima, e quando ele a toca, minha respiração acelera. Seguro-
me em seus ombros, completa e totalmente parada, mal consigo me mover.
Minha pele esquenta e me arrepio quando sua mão desce
gentilmente até a curva da minha nádega, enfiando-a no vestido... Perco o
ar! A mão de Noah está apertando a minha bunda...
Noah me fita, contraindo o maxilar com força, e depois ele me
aperta com mais força. Ele não espera — arfo — e do nada, me beija.
A boca dele me beija o lábio inferior com força, causando um estalo
alto, depois o lábio superior como se provasse a minha boca, meu coração
começa a disparar num ritmo intenso e forte, e a língua dele invade minha
boca com uma experiência fora do comum... Perco o ar por alguns
instantes.
Noah solta a minha perna e explora a minha boca com pressa, sua
língua é quente e faz com que eu sinta mais e mais arrepios, ela tem gosto
de uísque. Aperto os olhos e meus braços enlaçam seu pescoço, e movo
minha boca na dele no mesmo ritmo, as mãos dele tocam minhas costas e
minhas mãos se enfiam em seus cabelos, nos beijamos com paixão... Sinto
meu corpo todo flutuar, enquanto eu o correspondo.
Nossos corpos estão colados como numa moldura perfeita, meus
seios roçam em seu peito, e minha boca alcança a dele com total perfeição,
a boca dele é voraz e intensa, sinto borbulhas no estômago enquanto ele me
beija, nossas línguas se enroscam e trocamos nossos gostos...
Sinto-me estranhamente excitada, meu corpo todo reage ao beijo de
Noah... Noah!
— Não! — Eu o empurro para longe de mim, me dando conta do
que realmente faço, estou arfante, ele me olha terrivelmente confuso.
— Sam...
— Você está noivo! Isso foi um erro! — digo e sinto vontade de
chorar, começo a limpar a boca, úmida e quente, parece que ele sofre com
isso, mas deduzo que Noah faz isso apenas pra me chantagear. — Me deixe
em paz.
— Sam... Eu... Eu...
Não espero por mais nada. Afasto-me depressa e saio correndo em
direção às portas de vidro que ficam em frente ao elevador. Minha garganta
começa a se fechar e percebo o erro que cometi... Limpo meus lábios com
força; tanta força que eu os machuco.
Eu o beijei... Eu beijei um homem comprometido... Eu permiti que
ele me tocasse...
— Sam... Volta aqui... Por Deus, vamos conversar...
Entro no elevador, aperto o botão rapidamente e quando me viro, as
portas do elevador se fecham. Noah ainda nem chegou às portas de vidro, e
a última imagem que vejo dele é quando entra na antessala. Então, começo
a chorar descontroladamente.
SURPRESAS
— Por que eu fui beijar ele? Por quê?
Faço cara de choro e como mais um chocolate.
Chorei tanto no caminho para casa que meus olhos incharam.
Disse para os meus pais que Noah e eu discutimos por conta de
coisas passadas, mas enfim, não menti mesmo, eu e ele realmente
discutimos justamente por nosso passado, por ele ter partido, jamais diria
para eles que o beijei.
Depois do beijo chamei o Ty, disse para meus pais que não me
sentia bem, então viemos embora.
Não vi a Sara, mãe do Noah e não nos despedimos de ninguém, já
na suíte do hotel, chorei bastante, Ty tentou me tranquilizar, mas eu estava
muito assustada com o rumo das coisas. Contei para ele que beijei Noah,
que estava com medo do que senti quando o beijei, e Ty me deu apenas seu
ombro amigo e conselhos.
Nunca me senti assim! Tive dois namorados depois que Noah King
foi embora, um com vinte anos, e o outro há dois anos, mas nenhum deles
que beijei, me fez sentir tão diferente, especial... Quente.
Queria tirar as sensações que Noah me deixou na boca, eu a
limpava com tanta força que ficou mais inchada do que já é. Eu sempre fui
assim, nunca soube como lidar com os meus próprios sentimentos, por isso,
eu sempre estou e fico só, porque sei que se eu me envolver com alguém
vou acabar me machucando. Claro que o término dos meus dois namoros
não foi assim, tão impactante na minha vida, o primeiro terminou comigo
porque foi trabalhar fora, não sentia um amor infinitamente grande por ele,
mas sofri, pois namoramos por cinco meses. Ele não conheceu meus pais,
mas foi namorado do mesmo jeito! O segundo, depois de três meses de
namoro queria me levar pra cama, então eu terminei com ele, também não
me senti mal por isso.
Minha semana na King foi tranquila, mas a todo o momento ficava
com medo de virar algum corredor e dar de cara com o Noah, obviamente
que percebi com o passar desses dias, que ele não retornará a nossa filial, e
me sentia completamente mais calma por isso, mesmo que dentro de mim
estivesse com buracos ou sentindo como se perdesse algo novamente... Sua
presença.
Mais uma vez Noah deixou essa sensação em mim, e agora muito
pior, pois trouxe comigo essa lembrança terrível que foi beijar ele, a boca
dele, a língua dele, toda vez que fecho os olhos eu me lembro do beijo, de
sua mão me tocando a coxa, me apertando a bunda... E quanto mais eu
penso, mais me sinto estranha e mal.
Um calor me sobe e o desgosto vem junto.
Ele me faz sentir como se eu fosse especial e ao mesmo tempo
nada.
Donatela e mamãe estão se falando por telefone todos os dias, papai
ainda não começou a visitar o Boo, mas já até imagino como ele chegará
em casa hoje! É sábado e estou de folga, durante a semana acho que ele
teve bastante consciência de que não deveria beber, pois, mamãe teve
químio na terça e ela ficou por conta dele, então acho que é hoje mesmo
que ele vai chegar em casa as minhas custas.
Odeio o fato de o meu pai beber. Odeio com todas as minhas forças!
Já falamos sobre isso, discutimos, brigamos, mas nada parece surtir
efeito sobre ele, ele fala que não vai beber, depois de um dia ter sido ruim
na vida dele, ele some e recebemos a ligação do Boo avisando pra ir buscar
ele.
Comecei a parte da limpeza na empresa essa semana. Senti-me bem
em ter utilidade maior que lavar pratos, todos os dias Donatela e eu
almoçamos juntas, e ocupei minha cabeça, claro, sempre com o medinho
chato de encontrar o senhor King, mas com o passar dos dias fui
percebendo que ele não voltaria, quando questionei Donatela sobre isso, ela
me disse que ele era alguém muito ocupado e que só veio pra acertar
algumas coisas, mas que não viria a empresa com frequência.
Então de volta a minha vida maravilhosa, foquei no emprego,
também resolvi muitas coisas com o novo hospital onde mamãe fará o
tratamento, a documentação foi entregue com sucesso na quarta e a partir da
próxima sessão mamãe já fara nesse novo hospital.
Ao menos isso!
Papai ficou em casa com mamãe a semana toda, ele até limpou o
jardim e andou batendo uns pregos na cerca, mas no fundo no fundo eu sei
que ele só quer se sentir útil, mamãe parece mais disposta depois que
reencontrou sua amiga da época de colégio, e eu fico feliz por ela, pois o
tratamento é ofensivo demais e para que dê certo, ela tem que estar com o
emocional equilibrado.
Acho que a única a se ferrar na história fui eu.
— QUERIDA, — mamãe berra do andar de baixo — SEU
NAMORADINHO CHEGOU!
— MANDA ELE SUBIR! — berro de volta.
Ty!
Depois da festa nos falamos por telefone algumas vezes, eu não
sei... achei ele meio assim, acho que ele não gostou de me ver tão
depressiva, hoje teremos tempo pra colocar o papo em dia.
— Leva café pra ela, quem sabe ela não acalma os nervos — escuto
mamãe falando.
Faço cara feia.
Estou enfiada embaixo das minhas cobertas, me entupindo de
chocolate, engordando mais um pouquinho pra me sentir um pouco mais
infeliz quando me olhar na balança amanhã.
Me emborco abraçando o Ted. — fungo — Realmente, jamais
jogaria ele fora. Depois do divórcio, ele anda meio acabadinho, mas ainda
continua sendo minha pelúcia predileta.
Escuto o som dos passos de Ty, sinto o cheiro de café assim que ele
abre a porta, me viro na cama e quando giro solto um grito assustado, ao
mesmo tempo, caio da cama de bunda no chão completa e totalmente
chocada.
— Nossa! — Ele se aproxima apressadamente — Sam...
— NÃO CHEGA PERTO DE MIM! — berro, com o coração aos
pulos — FANTASMA... SAI... SAI!
Sinto-me idiota, Noah começa a sorrir segurando a caneca de café,
fecho a cara, me levanto e estou completamente nervosa.
— O que faz aqui, Ghost?
— Vim te ver.
— Pra quê?
— Não pode?
— Não! — Coloco as mãos na cintura. — Qual é o seu problema?
Eu disse para não vir atrás de mim, foi uma despedida!
— Mas eu vim, ora!
Noah King é impossível... Tanto quanto o Noah Baltimore.
Ele usa jeans e uma camisa de malha fina que alinha perfeitamente
o trapézio, os ombros dele estão mais largos nessa camisa e alguns
músculos braçais também, ele usa um tênis da Nike de cor preta, boné...
Acho que eu nunca o vi assim tão... Tão... Gostoso!
— Bela camiseta!
Uso uma camisa do Megadeth de cor preta, calça do Snoop e meias
cor de rosa, me sinto uma idiota!
Depois de alguns instantes, Noah se aproxima com a minha caneca favorita,
ele se senta na minha cama, como se isso fosse à coisa mais normal do
mundo e me estende a caneca — me sinto dentro de um sonho daqueles
bem loucos, e mal acredito que ele realmente esteja aqui.
Tudo o que eu mais quis evitar...
Por que ele veio? Por quê?
Aceito a caneca e me sento na cadeirinha do computador. Estou
com a cara fechada, encarando-o, esperando que fale, mas ele me olha e me
olha e não fala nada, está muito tranquilo, enquanto eu estou longe de me
sentir assim.
— Vou ficar um tempo na cidade.
A notícia faz com que o meu corpo pese.
— Não achei justo não te contar... Terminei com a Dyanna. —
Engulo um gole do meu café a força e mal acredito no que ele acaba de me
falar. — Pedi um tempo, preciso pensar em algumas prioridades da minha
vida. Não seria justo com ela vir para cá, ela também não queria vir pra
Charlotte. — Estou calada ouvindo tudo sem acreditar. — Minha mãe meio
que pirou, assim como meu pai... — Estou surpresa. — Eu sinto que perdi
minhas raízes. Quero poder retomar algumas coisas por mim mesmo.
— Bom. — Pigarreio. Mas isso não é bom!
— Somos amigos... Ainda... Certo?
— Noah...
— Olha... Eu agi por impulso, foi só um beijo, Jas! Prometo que
isso não irá mais acontecer.
— Pra começar, eu não te perdoei e nem sei se vou perdoar!
— Vai sim! Preciso te contar algumas coisas sobre como tudo
aconteceu.
— Ah, é? A parte que me ignora?
— Não, nesta parte eu tenho total parcela de culpa. — Bebo mais
um pouco de café, não vou perdoar ele, não importa o que diga ou faça. —
Abre a janela do quarto.
— Mal chegou e já está querendo mandar no meu quarto é?
— Como você é mal amada, Sam!
— Muito obrigada, King!
— Pode me chamar de Noah mesmo.
— Ok, Noah mesmo. — Estou sendo infantil, não ligo. Abro as
cortinas e depois a janela, Noah se estica na minha cama, jogando o tênis
pra longe. Não gosto disso, ao mesmo tempo em que ainda sinto o meu
coração bater com tanta força no peito, que parece que vai explodir.
— Sua mãe vai fazer rocambole pra gente, espero que você coma.
— Não tô afim!
— Como você é implicante!
— Ai, Noah! Fala logo.
— Não fui embora por querer, mamãe me levou a força. Eu não
queria ir! Quando ela se casou com Arthur King, ela basicamente me forçou
a ir junto.
Lembra-se daquele dia na casa da árvore? — Chocada faço que sim com a
cabeça. — Foi naquela noite que ela falou que logo que o ano acabasse nós
iríamos embora.
Sento-me no parapeito do janelão, olho pra rua pouco movimentada
e depois pra Noah, ele pega minha caixinha de chocolates num canto da
cama e começa a fuçar. — Bem, nunca imaginei que ele fora forçado ou
coisa assim.
— Você me afastou de propósito?
— Sim.
— Mas... Mas...
— Se eu dissesse que iria embora, você sofreria muito mais,
contudo, se a ignorasse, eu sabia que ficaria brava e trataria de me esquecer.
Te conheço, Sam, você é sempre muito birrenta.
Coço a nuca, isso é esclarecedor pra mim, mas acima de tudo é...
é... nem sei como explicar.
— Precisava ir com a minha mãe, Sam. Ela só tinha a mim, queria
proteger ela.
— Poderia ter respondido as minhas cartas!
— Que cartas?
— As que eu enviei pra você e que voltaram.
— Não recebi nenhuma carta!
— Mas eu enviei e voltaram.
— Tem certeza?
Levanto, vou até meu armário, pego minha caixinha das lembranças
e retiro o bolo de cartas, me aproximo da cama e jogo na direção dele. Noah
as analisa e fica incrédulo com aquilo.
— É o endereço da minha mãe.
— Eu sei, na época eu descobri na escola.
— Não entendo porque voltaram.
— Nem eu! Agora pode devolver que eu vou guardar.
— Não!
— Como?
— Já ouviu, Sam, são minhas cartas.
— Mas... mas... voltaram!
— Mas eram pra mim!
Ele não pode ler algumas coisas que estão nestas cartas.
Aproximo-me da cama toda apavorada, Noah me olha meio
zombeteiro e afasta a mão pro outro lado, tento pegar as cartas e ele me
puxa com o braço livre, acabo caindo em cima dele, arfante eu o encaro.
— Não vou mais embora sem falar nada, Jas, eu prometo.
— Não acredito em você.
Noah solta o bolo de cartas e me puxa, enfiando a mão em meus
cabelos. Ele me responde com um beijo.
DEPOIS
Ele me beija todo esfomiado.
Parece que o mundo vai acabar, tento ir para o lado, mas Noah me
prende num abraço forte, me instiga a beijá-lo também, a provar de sua
boca, a língua dele é forte e rápida, tem gosto de café, assim como a minha,
a barba no rosto dele arranha meu rosto, e ele novamente mergulha a língua
na minha boca, todo afoito, apressado.
— Vai ficar me rejeitando?
— Noah...
— É por causa dele, não é? Aquele merda!
Agora ele está muito bravo comigo.
Olho para Noah chocada com a irritação dele. Ele realmente não
gosta do Ty. Ele realmente tem ciúmes do Ty, pensei que fosse raiva ou
coisa assim, mas agora está explicito! Ele tem ciúmes!
C-I-Ú-M-E-S!
— Você não vai mais ficar com ele, Jas. Você... não quero que ele
chegue perto de um fio de cabelo seu!
— Noah, você está com ciúmes?
— Você ainda pergunta?
Nossa!
Meu coração dispara, tanto que quase sai pela minha boca. Ele me
beija a boca, agora com suavidade, apenas um breve selinho.
— Você vai terminar com ele?
— Eu... eu.. ah... bem...
— Ouça, eu gosto de você, Sam, bastante! Eu realmente não quero
que ninguém fique entre você e eu.
Arregalo os olhos, fico confusa e ao mesmo tempo bem surpresa
com a resposta. Vou para o lado, ele não me solta. Noah me fita, toca a
minha bochecha com carinho, assim, tão de repente, que me sinto nas
nuvens.
— Fomos amigos, somos amigos.
— Não precisava terminar com a Dyanna por minha culpa.
— Eu não terminei com ela por sua culpa. Terminei com ela,
porque depois do jantar de noivado ela deu um chilique.
— Por quê?
— Disse para ela que você não iria ao casamento e que eu viria
atrás de você. Então ela me pediu para escolher entre ela e você. — Nossa.
— Escolhi não continuar com o noivado.
— Isso é sério, Noah... E a sua reputação? A reputação da sua
família?
— Não me importo muito. Mamãe é claro, ficou furiosa, meu pai
riu na minha cara e me mandou viajar pra pensar no que eu fiz.
Não sabia que a senhora Baltimore ou King, e ele tinham uma
relação conturbada, muito menos que ele tratava o senhor King por pai.
— Você, mais do que ninguém sabe que eu odeio briga.
Você tem medo de briga... Eu não tinha, até que cresci e me tornei
meio covarde diante de algumas situações!
— Deixei mamãe falando sozinha, ela é amiga dos pais da Dyanna.
Não me importo, estou cansado deles!
— Dos pais dela?
— Dos meus também! — Suspiro. Pelo visto, ai vem... — Cansei.
Sabe Sam, acho que você pensa que a minha vida foi um mar de rosas esses
anos.
— Parecia feliz quando foi para o último ano.
— Não era de verdade.
— Parecia...
— Parecer não é ser, Sam!
Ele me dá um sorriso cansado, depois toca a minha face com o
indicador, não sei quem Noah se tornou, mas este cara ao meu lado não tem
sequer um resquício do garoto com quem eu cresci. Noah, apesar de tudo,
sempre foi muito feliz, percebo em seus olhos que ele está mais para
alguém fechado, alguém que se tranca em algo, só não sei explicar
exatamente o que.
— Não quero aquele idiota perto de você, vai terminar com ele.
— Como se você mandasse em mim!
— Entre ele e eu, quem você escolheria?
Ergo as sobrancelhas pra ele e faço cara de cínica, Noah me encara
fazendo a mesma cara. Mexo os ombros e a cabeça mantendo a mesma
expressão — me sinto como a mãe do "Cris", Rochele, quando quer dar
barraco, toda cheia de razão! —, ele aproxima mais o rosto do meu e
mantém a mesma cara, erguendo apenas a sobrancelha direita.
— Podemos ficar aqui o dia todo, Samantha Jasmin!
— Ai... Como você é insistente!
— Eu não entendi porque não me respondeu que me escolheria.
— Não é óbvio?
— Sam!
Agora da uma de ofendido! Bem, muitas coisas em Noah mudaram,
mas a essência continua a mesma: dramático, birrento, insuportável,
sentimental... — A lista se estende! O livro só terá 50 capítulos, a autora
não quer dar detalhes sobre ele agora, quer fazer mistério, se eu começar, só
vai acabar em 20189938339 depois de Cristo.
— Quando você menstruou pela primeira vez eu estava lá!
Dou um empurrão no ombro dele, Noah ri a beça com isso,
estrangulo o sorriso nos meus lábios, e fico querendo enforcá-lo pelo que
acabou de falar. Minhas bochechas queimam, e o pior nem foi isso, me
lembro como se fosse hoje, quando eu menstruei. Tinha onze anos, me
assustei e me tranquei no banheiro da escola por duas horas seguidas,
quando ele me achou eu estava morta de vergonha porque tinha sujado meu
jeans, Noah no instante seguinte, entrou pela janela do banheiro e me deu
seu moletom para que eu amarrasse na cintura, meia hora depois, estávamos
no trailer dos meus pais, nos olhando com estranheza. Ele parecia não
entender bem aquilo, e eu estava muito envergonhada por tudo, depois de
alguns instantes, um pouco depois que mamãe chegou, ele se deitou com a
cabeça no meu colo e assistimos a TV, juntos. Ele apenas disse:
“Isso é normal, Jas, depois você sara!”
E o assunto morreu ali.
— Você vai terminar com ele, não vai?
Volto pra realidade onde um Noah adulto me encara muito sério.
— O Ty é acima de tudo meu melhor...
— Não ouse! — interrompe ele, ameaçador — Você... me trocou
por ele?
— Me trocou pela Jane Collins!
— Jane não ficava limpando a boca quando eu a beijava.
— Ai, como você é dramático!
— Vai largar dele ou não?
— Você não era tão arrogante!
— Eu estou pedindo isto, quero nossa antiga amizade, apenas eu e
você, sem ninguém pra interferir, te devo isso.
Mas uma dúvida me cerca.
— Você vai embora?
— Não, e se eu for eu te levo, Bolinhos!
Ele sorri de um jeito que me faz tremer toda por dentro, empurro-o
pelo ombro e ele me puxa novamente pra si, me beija de leve e de novo, e
mais uma vez, selinhos lentos, meu estômago fica frio.
— Amigos não se beijam, Noah, para... com isso.
— Sempre te beijei, não vejo problema nisso.
— Tem um problema, não somos mais adolescentes, nem crianças!
— Justamente. Não devemos nos preocupar.
— Meus pais...
— Seus pais não saberão de nada! Poxa, somos amigos, Sam.
— Escolhe: Bolinhos, Sam, ou Jas, isso é chato, Noah!
— Você nem me chamou pelo meu antigo apelido.
— Perdedor?
Ele para de sorrir e estreita os olhos pra mim, agora eu sorrio.
— Borra calças?
— Dinossaurinho!
— Ai que nojo.
— Hei, você me chamou assim no pré!
— Claro! Você era parecido com um daqueles de braços pequenos e
pescoço grande.
— Há, há! Muito engraçado.
Ele começa a me cutucar, contra a minha vontade, começo a
espernear na cama, sorrio. — Ai, que ódio...
— SAAAM! — Mamãe está berrando — NOAAAH... PRECISO
DE AJUDA AQUI!
— Você fica com a batata! — Noah fala e levanta, rapidamente
recolhe o bolo de cartas do chão. — Minhas cartas!
— Você vai... ficar mesmo, Noah? — Começo a ficar tensa, saio da
cama.
— Sim, eu já estou vendo um apartamento para mim perto do
centro, da empresa, fique tranquila.
Sei que nunca mais conseguirei ficar tranquila tão facilmente em
toda a minha vida.
— Vim pra ficar Sam, não se preocupe! — Estou mais com medo
do que preocupada! — Vem, Sam!
E se afasta em direção à porta. Não sei, mas tudo me diz que essa
estadia do Noah não vai acabar bem! — Espero que não!
MACHUCADA
Mamãe ligou o som que fica em cima da geladeira.
Sam Smith ecoa na cozinha da nossa casa. Papai saiu pra buscar
cervejas e pelo olhar fulminante que lhe lancei antes dele sair, eu sei que vai
voltar com apenas um engradado, mamãe me indicou as batatas. — Noah
sempre amou o purê de batatas da minha mãe, não sei o que ele acha que
ela coloca de especial, mas enfim, eu imagino que eles estejam de tramóia,
todos eles! Se há algo que não posso negar, é que ele era o queridinho dos
meus pais.
Acho que os meus pais pensaram: “Ah, eles vão crescer e casar!”.
Bem, não foi exatamente assim.
Noah está no quintal dos fundos, andando pela grama e olhando em
volta, o boné está virado na cabeça, ele tem uma caneca de café na mão e
seu rosto está fechado. Nunca pensei que viveria pra vê-lo assim... Aqui.
— Noah cresceu, não é mesmo?
E como!
— Pois é, mãe.
Mamãe usa um de seus vestidos leves, seu cabelo preso num rabo
de cavalo simples, o mesmo olhar cansado de sempre... Antes ela não
parecia se cansar assim com tanta frequência, mas em partes, o tratamento a
deixa muito fragilizada.
— Mãe, senta ali...
— Nem pensar!
“Porque às vezes, tentar cuidar de Lily é uma missão impossível, e
dar ordens pra ela é como assinar uma sentença de morte!”
Dizia meu pai desde que eu era pequena, e a cada dia que passa, eu
concordo mais com ele! Ela é impossível e teimosa como uma porta, apesar
de ser muito doce. Mas, quando enfia algo na cabeça não há santo que tire!
Acho que essa parte eu herdei dela.
Mamãe me beija o topo da cabeça e sorri pra mim, me sinto como
açúcar, me derretendo por ela.
— Ele errou filha, mas vocês são amigos e devem ficar juntos.
Minhas bochechas queimam. Mamãe se volta para a carne que
tempera numa vasilha em cima da pia.
— Claro que Noah agora é um homem feito, está noivo, mas ele
ainda quer sua amizade.
Ele não contou pra mamãe que terminou o noivado.
— Todos nós merecemos segundas chances!
Estou espremendo as batatas no espremedor.
Sei que minha mãe acha que está fazendo um favor pra minha vida,
tentando inserir o Noah nela novamente, mas acho que ela nunca vai
entender como me sinto em relação a tudo isso, e também, se ela soubesse
que ele anda me beijando, duvido que aprove!
Meus pais são tão estranhos nesse sentido que nem sei o que dizer
ou pensar, apenas acho que eles esperam que eu morra virgem e que nunca
ninguém me queira, é isso o que eu realmente tenho feito com todas as
forças nos últimos anos, afasto as pessoas, e também não ajuda muito pesar
noventa e dois quilos e ter 1,67 de altura.
— Você não me disse por que não chamou mais o Tyller pra vir te
ver!
— Ele anda ocupado no trabalho mãe.
E nem iria querer depois da ceninha do Noah, acho que esse
encontro não acabaria bem.
— ah, ele é um bom rapaz, charmoso e bonito né filha, quem diria
que um homem daqueles iria se interessar por você?
Obrigada, mãe! Por destruir o resto do que sobrou da minha
autoestima, depois do colegial!
Não respondo, continuo a espremer as batatas, mamãe me olha
parecendo perceber o que me causou, mas tento sorrir, eu sei que não era a
intenção dela me magoar, e também sei que na vida real alguém como
Tyller, jamais iria me querer, nem alguém como Noah. Acredito
verdadeiramente que nenhum cara lindo e charmoso em sã consciência iria
me querer, mas não preciso de que me falem assim, tão escancaradamente.
— Você é linda, Jasmini, me desculpe...
— Tudo bem mãe, eu sei que não foi sua intenção.
Sempre quis muito entender o motivo de eu ser tão acima do peso,
meus pais não são gordos, ninguém da minha família tem sobre peso, eu, no
entanto, supero qualquer expectativa que seja quanto a isso, não sei a quem
eu sai, mas com certeza era a pessoa mais diferente da família. Mamãe é
magra e franzina, papai é alto, mas também não é gordo, sou a única que
gorda aqui.
— Filha...
— Mãe, eu já disse que está tudo bem. Eu tô bem!
Odeio quando ela ou meu pai fazem isso, parece que tem pena de
mim...
— Pronto. — digo deixando a vasilha com massa da batata
espremida e lavo minhas mãos. — vou lá em cima me trocar.
— Jasmine...
Não dou ouvido aos chamados.
Subo para o meu quarto com pressa e me certifico de que tranquei a
porta na chave, respiro fundo e seco minha face com força. Odeio chorar,
odeio!
Começo a arrumar a minha cama, depois pego uma muda de roupas
no guarda roupas e vou para o banheiro. Dispo-me e me olho no espelho,
tantas marcas no meu corpo... marcas feias e listradas, estrias, nas minhas
coxas, na minha barriga, nos meus seios, celulite na minha bunda...
Odeio-me!
Odeio o meu corpo.
Odeio o que vejo.
Abaixo a cabeça e visto o jeans engolindo o choro, por mais que as
lágrimas caiam em minha face, visto a blusa fina e depois outra de mangas.
É muito ruim se olhar no espelho e não se sentir bonita, ajustada,
importante... Magra.
Lavo meu rosto e prendo meus cabelos num coque simples, volto
para o meu quarto e calço um par de sapatilhas qualquer, arrumo a roupa no
corpo enquanto desço.
— Sam... O que foi?
— Nada!
Noah está se aproximando bem sério, ele me olha com uma cara
feia, que até fico com receio.
— Terminou com ele? É por isso que chora?
Qualquer coisa a você saber dos meus complexos, Noah.
— É, foi isso.
— Vai passar! Você apenas se acostumou com ele.
— Deve ser.
Noah passa o braço em volta da minha cintura e me abraça.
— Não chore, Sam, odeio quando chora!
— Você ainda continua chorão?
— Às vezes, quando eu fico pensando nas bifas que você me deu,
sim!
— É, bons tempos.
Ele sorri, um sorriso de lado e meio fechado, mas sorri.
— Por que trocou de roupa, Sam?
— Eu gosto mais dessas.
— Gostei do seu quintal, não é como morar no parque ou ter o rio
por perto, mas é legal!
— Bom.
Tento sorrir. Afasto-me dele, não sei o que dizer ou como agir,
parece que a cada crítica, cada pequena crítica, dezenas de coisas me vêm à
mente, mas ter Noah aqui principalmente, é o que me deixa acima de tudo
mais exposta.
— Sam...
— Você se importa por eu ser gorda?
Noah parece impactado com a minha pergunta. Obviamente que
não esperava por isso, nem eu esperava, a pergunta apenas estava entalada
em minha garganta há anos e, é claro, mamãe ter feito aquela insinuação
não ajudou.
— Sam...
— Sei que foi por isso, por eu ser gorda. Por isso você me
abandonou. — Limpo as lágrimas com raiva — Não queria ser visto
comigo, por que eu era gorda, não é isso?
Ele novamente não responde, e isso me machuca. Olho para o lado
e vejo minha mãe parada perto da porta da cozinha, ela parece magoada ou
coisa assim, fecho os punhos, nego com a cabeça. — Isso vai passar... Isso
vai passar... Isso vai passar...
— Eu gostava muito de você...
— Mas se afastou!
— Isso é algo que não posso mudar, Sam. Se quisermos ser amigos
novamente, temos que deixar o passado pra trás.
— Teve vergonha de mim?
— Sam...
— Quero que seja sincero.
Noah olha para baixo, trinca o maxilar, e eu sei que foi exatamente
isso.
— Eu mudei, Sam...
— Não precisa se prestar a este papel, Noah.
— Que papel?
— De querer reparar o seu erro. Eu já disse que te perdoo. Esquece
isso, volta pra Nova York e vive a sua vida!
— Desculpe, mas essa não é uma escolha sua.
— Filha, calma! Por favor, não foi a minha intenção. — Mamãe
reclama se aproximando. — Você é linda, Sam.
— Não preciso que mintam pra mim! — respondo sincera.
— Ela só está sensível, senhora "M", vou levar ela pro quarto até
que o almoço fique pronto.
Não queria ir pro quarto, mas mamãe fica fazendo cara de choro,
está arrependida por sua insinuação ter causado efeitos drásticos em mim,
Noah me segura pela cintura e me conduz até o meu quarto, quando
entramos me afasto dele.
— Sinto muito Sam, eu estou tentando consertar as coisas.
— Tinha vergonha de mim!
Dou-lhe as costas, me afasto até a janela e fungo.
— Me perdoa Sam, por favor.
— Me desculpe se o meu peso te envergonha, Noah.
— Não! Por favor, não pense isso, você é linda, Sam.
— Tem certeza?
— Absoluta!
APENAS AMIGOS
Depois de alguns momentos, mamãe aparece anunciando o almoço.
Fiquei sentada no batente da janela olhando para a rua, enquanto
Noah ficou sentado na minha cama, ambos em silêncio. Não sentia que
havia algo a dizer, tampouco queria que ele falasse algo pra me consolar,
ele sabe que odeio que sintam pena de mim.
Agora descemos para o almoço.
Papai está todo alegrinho. — Claro, vai beber! É a melhor hora do
dia pra ele, mas sei que ele não ficará alto, ele sabe respeitar as visitas, ao
menos, faz isso depois que o Noah anda dando as caras.
Mamãe me olha com uma cara... francamente, sei que não é a
intenção dela de me ferir, tampouco queria que ela se sentisse mal, o estado
de saúde dela é um pouco delicado, quero que ela se sinta bem, mas não
posso fazer nada para mudar como me sinto. Tento sorrir logo que entramos
na cozinha.
Sentamo-nos à mesa, Noah ao meu lado, e me recordo de todas as
vezes que mamãe nos serviu sopa na mesa de madeira que ela tinha do lado
de fora do trailer, ele sempre se sentava a minha direita e mamãe de frente
pra nós, ela nunca trabalhou fora, sempre foi do lar. Noah está novamente a
minha direita, mamãe de frente pra nós, papai se senta no lugar do chefe,
não tenho apetite, apesar de a comida parecer deliciosa e cheirar bem.
Mamãe sempre foi uma cozinheira de mão cheia.
— Quer uma cerveja, Jas?
— Não pai, obrigada.
Tento sorrir. Sirvo-me de um pouco de purê e rocambole. Parece
que a comida tem gosto de nada enquanto mastigo, não sinto prazer em
comer quando estou chateada, na verdade, eu já não ando comendo muito
por causa do meu peso, dai vir alguém e falar explicitamente pra mim que
eu estou gorda, — coisa que eu já sei há muito tempo! — me desanima
completamente.
— O que foi, Jas?
— Nada, pai.
Papai suspira profundamente, olho pro meu prato com desgosto.
— Filha, vocês dois são amigos, vocês nasceram basicamente
juntos e cresceram juntos...
— Eu sei pai, Noah e eu estamos bem...
— Não estão! — Papai insiste bastante sério.
Suspiro.
Olho pro Noah, depois pros meus pais.
— Fala pra eles que estamos bem, Noah, que reatamos nossa
amizade!
Noah me puxa e me aperta de lado me dando um beijo forte na face,
tão forte que amassa minha bochecha, aperto os olhos fazendo uma careta,
não quero falar sobre isso de novo, não quero que mamãe fique triste,
apesar de tudo, ela está fazendo o tratamento, e ficar irritada não irá ajudá-
la. Melhor guardar a minha dor para mim.
— Inclusive, ela disse que vai trabalhar como minha secretária na
empresa.
Eu não disse isso!
Olho pra cara do sonso, estreitando os olhos, ele me ignora
completamente. Papai parece muito feliz, enquanto mamãe sorri cheia de
emoção.
— Vou promover a Jas, ela é inteligente e merece uma
oportunidade.
Falso!
— Que coisa mais linda! — Mamãe fala toda derretida. — Viu
querido? Nossa filha irá longe!
Longe... Sei!
— Vai dar certo, querida! — Papai fala e segura minha mão. —
Você merece Jas, sempre foi inteligente!
Pelo menos isso.
Acho que no meu caso foi mesmo a falta de oportunidades, também
não me arrependo, meus pais precisavam muito mais de mim do que eu dos
estudos. Eu jamais escolheria ir pra faculdade e deixá-los pra trás.
— Já arrumou um lugar pra ficar, rapaz?
— Sim, comprei um apartamento perto da empresa.
— Não me disse que cargo você ocupa na King.
Espanto-me com a humildade do meu pai, apesar de imaginar que
Noah ocupe o cargo de filho do dono, ele deve ser o administrador da
empresa, sei muito sobre a King, mas sobre o Noah... Esse Noah... Fico
devendo.
— Meu padrasto é o dono, mas eu quem cuido de algumas coisas.
— E a noiva?
— É, Dinossaurinho — insinuo cheia de veneno —, e a noiva?
— Ela está em Nova York, terminamos! — Noah responde numa
tranquilidade tão cínica que fico desarmada.
Meus pais ficam boquiabertos, ele prova do purê da minha mãe e
mastiga muito calmamente, como se ter dado essa notícia fosse à coisa mais
normal do mundo, quando apenas há alguns dias atrás, ele estava noivando
com Dyanna.
— Mas filho, você noivou há uma semana!
— É, mas acho que ela e eu não temos o mesmo ponto de vista.
Papai se revira na cadeira, até deixa a cerveja de lado, Noah pega a
dele e bebe dois goles vastos — nunca o vi beber em toda a minha vida, não
deu tempo! Ele cresceu longe de mim, pelo visto adquiriu hábitos bem
diferentes dos que tinha quando jovem.
— Ela não quer ter filhos. — Noah fala e olha para mamãe, todo
“educadinho”. — Seu purê está ótimo, senhora "M".
Assim, ele parece tão fofo...
— Mas, isso não é motivo pra terminar, Noah, talvez sejam jovens
demais pra ter filhos! — argumenta mamãe me servindo suco.
Noah olha para o prato e mexe a comida, depois enfia outra garfada
de purê com rocambole na boca, ele mastiga lentamente, adquiriu muita
educação também, antes ele era tão... afobado pra comer, aliás, nós dois
éramos.
Bebo um pouco de suco, vendo o interesse desnecessário dos meus
pais, minha curiosidade só cresce. Eu deveria saber que ele tinha motivos
para terminar com a Dyanna, só que a primeira vista, ela me pareceu
alguém tão legal, não sou assim, uma completa recalcada, ela é linda,
educada e muito gentil, mas eu apenas a conheci numa noite e não nos
vimos mais, não sei quem realmente ela é.
— Dyanna é mimada, ela é modelo, cinco anos mais jovem que eu,
ela viaja muito e não temos as mesmas prioridades. Descobri isso na nossa
noite de noivado quando eu perguntei para ela se logo após o casamento ela
iria querer bebês... Ela me perguntou se eu estava louco. — Noah sorri, mas
isso não parece ter afetado ele nenhum pouco. — Depois disso eu avisei
que voltaria pra Charlotte, ela disse que não viria, acredito que por pirraça,
ela sempre quer que as coisas sejam do jeito dela, não dou sorte com
mulheres!
E olha pra mim, coro — bem, sou teimosa, que culpa tenho eu
disso? Eu sempre fui mandona, teimosa e briguenta. Claro, mudei bastante
com o passar dos anos, mas Noah não estava aqui para ver isso, hoje chego
a ser um pouco teimosa e mandona, mas briguenta... Isso mudou um pouco,
só reagi muito mal à chegada dele na King, simplesmente por que ele me
assustou com sua presença.
— A empresa daqui precisa bastante de mim, sempre que abro uma
nova filial eu tento ficar um tempo no lugar pra tomar conta, a gestão é bem
complicada no período de adaptação, mas já me acostumei.
— Talvez voltem. — Mamãe fala com desgosto — ela é uma moça
tão simpática.
— Não vou voltar para Dyanna, a simpatia dela é cativante, mas ela
me disse coisas que realmente me feriram, prefiro deixar do jeito que está,
senhora "M".
— Se você diz...
Mamãe dá de ombros, inconformada, papai reflete em silêncio,
depois ele muda de assunto, me sirvo de mais salada, mas apenas isso,
mamãe fecha a cara pra mim e coloca rocambole no meu prato, deixo de
lado as péssimas sensações e volto a comer ouvindo papai contar da
economia local — como se ele entendesse muito — e política, Noah
realmente se interessa por esses assuntos.
Quando terminamos o almoço, ajudo mamãe a tirar a mesa, lavo a
louça pra ela enquanto prepara o café, papai e Noah foram para sala assistir
a um jogo, daqui escuto os berros de papai.
— Filha.
Viro-me pra mamãe, ela me olha meio temorosa.
— Este rapaz... Ele não é pra você.
Nossa.
— Mãe... Do que está falando? — Fico meio nervosa.
— Sei que ama o Noah, ele é sua paixão de infância, mas não
misture as coisas, eu tenho certeza de que ele terminou com ela por sua
causa.
Fico dura enquanto seguro um copo cheio de espuma.
— Noah cresceu e mudou. Agora ele não pertence a nossa classe,
fiquei até com vergonha quando ele apareceu aqui hoje, talvez ele esteja
confundindo as coisas, Jas. Você é uma moça de família.
— Mãe, Noah e o eu somos amigos, ele jamais terminaria com a
noiva por minha causa, que ideia! — mesmo que ele tenha dito que foi mais
ou menos isso — Eu nem chego aos pés dela, a mulher é linda.
— Filha... Noah sempre foi apaixonado por você, e acho que isso
não mudou... Isso não tem a ver com sua aparência, Sam.
— Impressão sua.
— Não quero que se machuque novamente.
— Mas não quer que eu me afaste dele!
— Não. — Não entendo a minha mãe. — Quero apenas que sejam
amigos.
— Acho que está exagerando, nunca fomos mais nada além de
amigos, mãe, Noah e o eu somos adultos e nunca nos envolveríamos assim.
Olhe pra mim, eu peso noventa e dois quilos mãe, meu número é 50, o
vestido daquela mulher não me entra nem na coxa, acha que ele iria me
querer?
Mamãe fica calada, sei que ela realmente nunca tem a intenção de
me machucar com suas críticas, mas preciso deixar tudo bem claro com ela.
— Noah King é apenas um antigo amigo de infância e nada que
falem vai mudar isso.
— Você o ama?
Querer não é poder!
— Não mãe, apenas como irmão.
— Não quero te ver triste.
— Eu não ficarei.
— Não se aproxime demais dele.
— Apenas amigos!
Mamãe me dá um beijo na cabeça e se afasta levando café para os
homens. — respiro fundo.
— Apenas amigos.
Estou tentando me convencer disso, e assim será! Ou espero que
seja...
OS BEIJOS DE KING
— O que está fazendo, Sam?
Me escondendo de você!
— Ah, nada, organizando algumas coisas aqui.
Pensei que Noah iria embora depois do almoço, mas então ele e
papai ficaram na sala, conversando e vendo jogo, mamãe subiu para o
quarto dela e eu me sentia desajustada em ficar com ambos lá, ainda mais
depois do que a mamãe me falou. Não sabia se deveria ficar por perto,
então subi para o meu quarto e os deixei na sala, me joguei na minha cama
e aqui estou até agora, olhando para o teto, tentando encontrar dezenas de
desculpas pra ficar longe do Noah.
Eu tenho que estar próxima a ele, mas não sei se eles realmente
surtiram efeito, ainda mais com esse papo dele, de reatarmos a amizade e de
querer que eu seja sua secretária. Sei que ele não mentiria para os meus pais
sobre isso.
Noah se joga na cama e vem pra cima de mim me apertando, fico
toda dura, não sei se posso continuar com isso, logo em seguida ele me da
um selinho, me olha, sorri pra mim feito bobo.
— Você vai ser a minha assistente número 1!
— Noah...
— A resposta continua sendo não.
— Minha mãe acha que não devo aceitar, não quero me envolver.
O Sorriso desaparece dos lábios dele, e Noah me encara bastante
sério.
— Sam, eu gosto muito de você, acho que já percebeu isso!
— Apenas amigos, certo?
— Não quero só amizade, Sam.
Fico impactada com as palavras, Noah me dá um sorriso torto,
tímido.
— Gosto de você.
— Mesmo gorda?
— Sam!
Nego com a cabeça e o empurro. Me sinto nervosa com a situação,
acho que o Noah está brincando com a minha cara, só pode.
— Isso é ridículo!
— O que é ridículo? Meus sentimentos?
— Que sentimentos Noah?
— Os que eu tenho!
Estou de costas para ele, esfrego a face afastando as lágrimas, estou
farta de me sentir nervosa e mal, mas simplesmente as palavras de mamãe
ecoam em minha mente. — Não pode ser verdade... ele não me quer de
outra forma, por que iria querer?
— Sam, te rever me trouxe muitos sentimentos que tentei esconder
de todos, inclusive de mim mesmo.
— Não devemos!
— Por que não?
— Noah eu tenho uma vida, você também, as coisas mudaram.
— Isso não nos impede de sermos felizes, Sam. Eu... Eu... Eu te
quero Sam! Não apenas como amiga, quero você como namorada.
— Isso é uma loucura.
— Pois eu digo que não!
Ele toca as minhas costas, me levanto e seco a minha face. —
Odeio, odeio ficar chorando feito uma idiota!
— Não seremos Noah. Não podemos!
— Por que não? — Noah me vira pra ele e segura a minha face me
obrigando a fitá-lo — O que foi? Poxa Sam, me da uma chance?
— Pra quê? — questiono sufocando o choro — Pra nos
magoarmos? Não quero me ferir, Noah.
— Não vou te ferir, eu juro. — Ele fala e parece estar sendo
torturado. — Eu pensei em falar com os seus pais daqui a um tempo.
— Noah, você estava noivo há cinco dias...
— Não amava ela.
Fico parada, desvio o olhar, ele ergue novamente minha face e olha
no fundo dos meus olhos, bastante sério.
— Você é quem eu mais quero!
— Não sabe o que fala Noah, logo que for embora vai me esquecer.
— Eu não vou embora sem você, Sam.
Nego com a cabeça.
— Melhor não...
— Eu não estou perguntando Sam, eu estou avisando. Deixei minha
vida pra trás quando vim pra cá, eu quero ficar com você e eu ficarei com
você.
Fungo, porque cada palavra me queima de forma certeira por
dentro. Não queria me sentir esperançosa nem nada, eu sei que mamãe tem
razão, Noah não é pra mim, mas ele está me dizendo justamente o contrário,
me pedindo o contrário.
— Temos que esquecer o passado Sam, prosseguir.
— No momento, não sei se quero isso pra mim, Noah.
— Por que não?
— Ainda é cedo.
— Não saberemos se não tentarmos.
Suspiro, eu sei, Noah não vai desistir.
— Como é teimoso, King.
— Estou apaixonado!
Por dentro, parece que tem bichinhos andando pelo meu corpo todo,
meu estômago está cheinho deles.
— Foda-se-se o que as pessoas pensam Sam.
Ele fala isso e me beija. Beija-me muito mais bravo do que
apaixonado, sua boca é cheia de raiva e intensidade, sem carinho, mas me
vejo correspondendo aos seus lábios com a mesma vontade, a mesma
força... Estou angustiada, Noah também, ele está frustrado com a minha
resposta.
Puxa-me com força pro seu corpo, me aperta, suas mãos me
espremem enquanto sua boca explora a minha, agora com paixão, minhas
mãos sobem e toco seus ombros, sinto o calor de sua pele na ponta dos
dedos, a solidez de seu corpo colado ao meu e isso me desperta tantas
coisas.
Noah me beija como se fosse meu dono, e eu gosto disso.
— Sua boca é tão perfeita Sam, ADORO ela.
Ele me puxa com força me espremendo, suga minha língua com
força, a experiência é evidente, Noah é meio apressado, fico sem ar com o
beijo, então me afasto um pouco, sem fôlego, eu o encaro.
— Um fogo me consome há exatos treze anos, Jas.
Percebo que minhas mãos estão enfiadas nos cabelos dele. Noah
cola a testa na minha, os olhos me fitam incrivelmente azuis... — Lindo.
— Isso é muito clichê! — respondo e ele me aperta escondendo um
sorriso — Noah King, você é um conquistador.
— Apenas faço o que o coração manda Jas. — ele fala meu apelido
cheio de carinho — por favor, ao menos pense!
— Você realmente está falando sério? — pergunto incerta.
— Sim, muito! — ele me beija de leve — Senão, ao menos seja
minha melhor amiga até que nos conheçamos melhor.
— Não quero! — penso rápido — ninguém deve saber Noah, nem
os meus pais está bem?
— Por que não?
— Porque é muito recente o término do seu noivado, tudo isso é
muito rápido.
Ele suspira claramente chateado.
— O que a minha mãe pensaria de mim, Noah? E o meu pai?
Podemos esperar até a poeira baixar, manter nossa amizade.
— E os meus beijos? Amigos não se beijam lembra?
Faço que sim, ele fica tão bonitinho quanto emburra.
— Não me importa que me beije Noah, desde que não seja na frente
de ninguém!
— Está bem!
— Nos veremos sempre Noah, na empresa.
— Claro! Você vai ser minha assistente.
— Não sei se quero...
— Ah, não! Tudo bem você me rejeitar e não querer ser minha
namorada, Sam. Mas, não pode me negar o direito.
— Noah, eu sou faxineira!
Ele me encara bastante sério, como se o que eu tivesse acabado de
falar fosse algo muito grave.
— Eu gosto do trabalho...
— Pois eu não quero ver você trabalhando tanto assim; precisa
estudar Sam, você tem vinte e sete anos! Precisa ter uma formação.
— Não sinto que seja o momento...
— Eu sinto! Exijo que estude e se forme. Você é muito inteligente
Sam.
— Noah...
— Isso não, eu mesmo faço questão de lhe pagar uma faculdade!
— Eu não aceito.
Ele não me solta, respira fundo, como quando perdia muito a
paciência comigo, depois me olha e sei que seu olhar é muito prudente.
— Samantha Jasmine, por favor, aceite que eu faça isso por você.
— Não quero seu dinheiro.
— A empresa tem plano de carreira, ela te paga à faculdade Sam.
Poxa, deixa de ser orgulhosa!
— Ah.
Eu não sabia disso.
— Eu vou falar com os meus pais, ver se arrumo tempo.
— Você terá tempo pela manhã, a tarde será minha assistente e à
noite estará em casa.
Ele não sabe sobre o tratamento da minha mãe e prefiro assim.
— Durante alguns dias precisarei sair mais cedo, mamãe precisa de
ajuda aqui em casa.
— Não me importo! Desde que você estude!
— Eu prometo que vou pensar.
— Sam!
Reviro os olhos, Noah volta a me beijar, e esqueço a discussão
boba, a boca dele é muito mais interessante colada na minha.

Amigos diferentes
— Bom dia, Sammmmm! — E pula em cima de mim.
Escondo o sorriso ao mesmo tempo em que faço cara feia, Noah me
aperta com força e me dá um beijo afetuoso na bochecha, sei que mamãe
entra no quarto porque alguém abre as cortinas da janela.
— Mãe, por que você deixou ele entrar?
— Não deixei, seu pai foi pegar o jornal e ele entrou.
Isso é tão “Noah”, fingir que está tudo bem... — cara de pau.
— Tá precisando passar lustra móveis na cara dele! — resmungo
cheia de falsidade.
— Vim te buscar pra me ajudar com o meu novo apartamento. —
Alega ele indo para o lado, me olha com um sorriso largo — Peguei as
chaves há pouco.
Não gostaria que o Noah me visse assim, estou de pijama, os
cabelos desarrumados... Imagino que esteja parecendo uma bruxa, me ergo
puxando meus cabelos para o lado, mamãe sorri pra nós dois, imagino que
ela queira justamente isso, que sejamos apenas amigos, mas tão pouco ela
sai do quarto e Noah me empurra na cama e me beija ardentemente.
Safado!
Meus pensamentos saem de órbita, ainda não escovei os dentes,
acabei de acordar com o meu ex-atual-melhor-amigo pulando em cima de
mim e me beijando. Ele usa uma camisa de malha de cor preta e jeans, tênis
e está com o mesmo boné de ontem na cabeça, mas logo Noah está tirando
os tênis, se enfiando embaixo dos meus cobertores e vindo pra cima de
mim. Seu peso é confortável e gostoso.
— Noah...
— Vim te buscar, quero que conheça meu apartamento novo. E, que
tal mais tarde levarmos seus pais pra comer uma massa no centro?
Suspiro. É muito difícil resistir a Noah King, ele é cheio de
iniciativas, é carinhoso e um fofo!
— Como amigos! — completa e me dá um selinho leve. — Vem?
— Tá! — respondo reclamando. — Aff! Não me deixa nem dormir
direito.
— Nem deixarei! Amanhã eu trabalho o dia todo e quase não te
verei. Já liguei pra Donatela, ela irá te encaminhar para o RH pra arrumar
seus documentos. A partir da semana que vem você será minha assistente.
Apressadinho.
— Você vai ficar na minha sala e me ajudar com as ligações e e-
mails, que tal?
Parece muito fácil.
— Pode ser.
— Sobre a faculdade, esperaremos passar as festividades do ano,
em fevereiro você tenta uma bolsa na universidade local.
— Como você é teimoso, Noah.
— Eu só quero que você fique bem, Sam.
Ele sorri, e não sei porque coro!
— Vem ao meu apartamento comigo?
— Eu já disse que sim.
Noah me beija com carinho, me sinto flutuando e me vejo sorrindo,
apertando ele, tocando-lhe os cabelos e as costas. Eu sei que ele quer o meu
bem, que quer me ajudar, apenas não sei se estou pronta pra isso, mas
concluo que Noah faz isso muito mais por ser meu amigo do que por querer
me beneficiar com segundas intenções, ele gosta de mim, disso não duvido.
— Vamos?
Faço que sim com a cabeça e ele se afasta, me levanto e pulo pra
fora da cama, pego uma muda de roupas no armário e vou para o banheiro
me sentindo observada por ele, fico sem graça, porque de repente, Noah
cresceu, agora é adulto, e estamos tendo essa coisa que chamo de
"amizade".
Fecho a porta assim que entro no banheiro e me vejo sorrindo,
tocando meus lábios, tão boba e feliz com seu beijo. Ontem quando Noah
foi embora, fiquei me recordando de cada instante com ele, seus beijos, seus
carinhos, ficamos a tarde toda abraçados na cama fazendo cafuné um no
outro, não sei ser muito carinhosa, mas ele... Ele sabe.
Deixo a preguiça de lado me sentindo mais disposta e vou para o
banho, não me demoro, escovo os dentes e me visto, um jeans comprido e
uma camiseta branca de mangas, calço meu par de botas cano baixo que
deixei num canto aqui do banheiro e logo em seguida penteio meus cabelos,
eu os deixo de lado, passo um pouco do meu perfume, me sinto um pouco
melhor hoje.
A presença de Noah me faz bem.
Noah não sabe o quanto sempre quis que ele voltasse e que ele
estivesse aqui.
Ele sorri logo que saio do banheiro, pego minha bolsa e ele me puxa
me apertando.
— É bom te ter de volta, Noah.
— É bom estar de volta, Bolinhos.
Olhamo-nos por alguns instantes, acabo ficando sem graça e abaixo
o olhar, ele me beija a testa e depois a boca, com carinho. Enlaço-o pelo
pescoço devolvendo o beijo, me sinto novamente flutuando.
— VOCÊS DOIS! — mamãe berra do corredor e me assusto,
empurro Noah pra longe de mim. — NÓS JÁ ESTAMOS PRONTOS!
— Se importa se eles forem?
— Claro que não!
Noah sorri cheio de maldade.
— Ela vai ficar na nossa cola — deduzo, entendendo seu olhar. —
Fique longe, King.
— Ok. — Ele ergue as mãos em redenção.
Sorrio. — Não pensei que mamãe nos daria algum tipo de trégua,
bem, também não me importo muito, não estamos fazendo nada de errado,
contudo, só não quero que ela saiba dos nossos beijos, talvez os outros
amigos não se beijem, mas Noah e eu nos beijamos e não tem nada demais
nisso!
— Vamos no meu carro. — Noah avisa, abrindo a porta para que eu
saia — Comprei na loja de usados, é um modelo bem conservado.
— Bom.
Não consigo imaginar alguém como Noah comprando um carro
velho, não hoje, de qualquer forma, a mãe dele sempre lhe ofereceu uma
vida muito mais confortável do que a que os meus pais me ofereciam, o pai
dele era funcionário do estado, quando morreu deixou uma pensão bem
gorda para ambos, contudo, hoje Noah, sem sombra de dúvidas, deve ter
muito mais dinheiro do que eu posso imaginar.
Não havia parado para pensar, agora ele é rico, tem bastante
dinheiro, é um empresário de sucesso, muito além do que eu sempre achei
que seria.
Descemos em silêncio, mamãe já está pronta, usa um vestido
estampado e sandálias, papai usa uma camisa polo e jeans, sapatos, eu os
vejo e estou me sentindo orgulhosa, boba... — não consigo me imaginar
sem os meus pais, nunca consegui. Por isso, eu não fui pra faculdade, por
isso, eu moro com eles! E agora mais que nunca, eles precisam de mim.
Nunca tivemos muito, mas o que eles sempre me ofereceram me foi
o suficiente. Tive pais presentes em todos os momentos da minha vida.
Mamãe me acompanhou durante todas as reuniões da escola, papai ia às
minhas raras apresentações durante o ensino fundamental, — inclusive, eles
sempre estavam lá quando a mãe do Noah não podia ir — apesar de todos
os defeitos, são excelentes pais, se preocupam comigo sempre.
— Espero que não se importe Noah...
— Tudo bem senhor "M", eu iria chamar vocês! Podemos almoçar
em algum restaurante do centro...
Noah dirige ao mesmo tempo em que conversa com papai, olho
para minha mãe e abaixo a cabeça. Claro que eu estou morrendo de
vergonha do olhar acusador dela! Neste momento, eu sei que ela sabe que
Noah e eu estamos meio que... Burlando o sistema.
— Você ainda é virgem?
— Mãe! — Estou completamente ruborizada.
— Ótimo, espero que continue assim.
Nem respondo, eu tenho certeza de que Noah e eu não passaremos
disso que temos. Guardo o meu coração para o cara certo. Ele perdeu a
chance há muito tempo, e tudo o que temos hoje é uma amizade diferente.

Visitamos o novo apartamento do Noah. Não é muito grande, mas


tem bastante espaço, tem uma vista fantástica da cidade de Charlotte, fica
no centro e é bem mobiliado, tudo sofisticado e organizado, a decoração
bem natural dos apartamentos do centro, nada muito glamoroso, mas não
tão simples. Noah nos mostrou cada cômodo, todo empolgado! Mas, eu via
em seu olhar uma pontinha de receio. Ele parecia um pouco feliz e
temoroso, não o entendia.

Gostaria de ter um apartamento daqueles! — penso comigo, agora


deitada em minha cama.
Já anoiteceu.
O dia passou muito rápido, visitamos o apartamento do Noah, logo
em seguida fomos almoçar numa casa de massas no centro, mamãe parecia
um cão de guarda, claro que não tratou Noah mal em nenhum sentido, mas
conheço a minha mãe, ela não me quer perto demais dele, ainda que não
queira afastá-lo de mim, ela é complicada como eu ou até mais.
Fiquei sem graça com o fato de que ele não nos deixou pagar a
conta. Mamãe também não gostou, papai ficou sem graça, mas Noah sequer
permitiu que nós pagássemos pela refeição. Ele alegou que nos convidou,
portanto, não tínhamos que pagar.
Depois disso ele nos deixou aqui e partiu. Mantive-me distante,
porque sabia que para minha mãe, talvez um abraço, por mais que fosse
inocente, seria algo "demais". Quando chegamos fui limpar a casa, mas a
todo o momento eu percebia os olhares da minha mãe, ela realmente me fez
me sentir mal por tudo.
Talvez se eu evitar o Noah ela entenda que não estamos juntos, no
entanto, se eu fizer isso eu o afaste de mim. E realmente, não sei se quero
isso. Meu pai sequer pareceu notar alguma diferença, ele chegou, pegou o
engradado de cerveja e foi para os fundos com o rádio de mão, já sabia que
ele arrumaria motivos para encher a cara, disse que iria consertar a cerca,
mas até que ele não bebeu tanto como eu pensei e pouco antes de eu me
recolher ele estava subindo para o quarto, falando sozinho como sempre,
mas não parecia tão bêbado.
Está calor, e eu ficar inquieta assim não adianta nada. Já virei e me
revirei na cama dez mil vezes e nada de sono.
Só me lembro dos beijos de Noah, seus sorrisos, suas palavras, sua
boca... Ele se tornou alguém muito diferente do que eu pensei que seria.
Noah King é um cavalheiro.
Noah King é educado.
Noah King é...
Suspiro.
— Ele é tudo!
Sei que sorrio, abraço o Ted e suspiro novamente.
— Aquele idiota, babaca!
Não sei lidar com sentimentos, isso é conflitante dentro de mim,
também porque me lembro do passado, ainda que não deva, mas não posso
passar um apagador no meu cérebro e me esquecer de uma hora pra outra
de tudo o que aconteceu.
Fecho os olhos e me vejo novamente tocando meus lábios, sorrindo,
os beijos dele não saem de minha memória, a sensação permanece
queimando meus lábios desde cedo.
Escuto um som baixo, parecem ser batidas na porta, ascendo o
abajur, e escuto o som de um gemido baixo vindo da minha janela, logo em
seguida Noah King está invadindo o meu quarto, ele cai de lado e eu
encaro-o boquiaberta, Noah sorri e faz gesto de silêncio com o indicador
nos lábios, depois aponta para o abajur, ainda incrédula desligo, mal escuto
seus passos, mas de repente, ele está sentado na minha cama, enfiando a
mão nos meus cabelos e me beijando — a boca que quero na minha!
— Não deveria ter feito isso! — minha voz é um sussurro.
— Vim te buscar pra dormir comigo. — Noah fala.
Minhas bochechas queimam.
— Quero ir à casa da árvore.
— É longe daqui Noah... São nove da noite!
— Não importa, quero ir lá, até trouxe os cobertores e o chocolate
quente. Vamos Sam, por favor.
— Noah...
— Por favor, por favorzinhoooo!
— Meu Deus, como você é chato!
— Vem Sam.
Ele me beija, assim fica muito difícil falar "não" pra Noah King.
— Ai... Tá. Chega! — ordeno, fingindo irritação — como você é
insistente.
— Te ajudo a descer pela escadinha...
— Eu saio pela porta dos fundos, me espera atrás da casa dos
Japsen.
— Tá.
Noah me da um selinho e levanta. Ele é silencioso enquanto
caminha até a janela, vejo a silhueta dele se afastando novamente. Sinto-me
levemente excitada com o pedido, faz anos que não fujo no meio da noite
pra ir à casa da árvore.
Com o tempo eu parei de ir, lá se tornou um lugar que me causava
dor depois que Noah foi embora, ir lá e no lago, me trazia tantas
recordações de nossa infância e adolescência que eu mal conseguia pensar
direito no sofrimento que era estar lá.
Acho que faz uns cinco anos que não vou a casa da árvore, nós a
apelidamos secretamente de Barbie. Era um codinome para quando
estávamos na frente de nossos pais e não queríamos que eles soubessem que
iríamos pra lá. O pai do Noah construiu a casa pra gente quando tínhamos
uns cinco anos. Ela fica numa árvore no meio do bosque, perto do local
onde o velho trailer dos meus pais ficava.
Enfio um moletom na minha mochila, estou sorrindo enquanto pego
mais uma muda de roupa, toalha, e um par de tênis, seco, visto um
sobretudo quente, calço um par de sapatilhas qualquer e deixo a cama
revirada, mamãe sabe que saio muito cedo pra trabalhar — seis da manhã
— ela nem sempre acorda tão cedo para me ver saindo. Não faço barulho, e
desço em silêncio, mas sentindo-me tensa como sempre me sentia quando
fugia assim de noite para ir à "Barbie".
Saio pela porta dos fundos e passo pelo lado da minha casa olhando
para os cantos, atravesso o pequeno jardim da minha mãe e quando alcanço
o canteiro dos Japsen, Noah me puxa pelo braço, de repente, sorrio e nos
beijamos. Sinto-me tão... Tão... Livre!
— Vem!
Noah me puxa pelo braço e vamos correndo feito bobos pela rua,
estamos de mãos dadas quando avisto o carro dele — é um carro comum,
quatro portas, fiquei meio abismada quando vi, pois, não tem nada demais
no veículo, mas é confortável! — ele abre a porta para que eu entre e a
fecha, depois da à volta e entra, liga o carro e rapidamente o tira da vaga.
— Não é tão longe Sam, só meia hora pela rodovia.
— Acho que destruíram a estrada de terra.
— Não destruíram. Eu fui hoje à tarde, mas a Barbie está meio
baqueada.
— Não vou lá há anos.
— Pedi que um conhecido a consertasse pra mim, daqui a alguns
dias ela estará melhor, maior e mais confortável!
— Pretende ir lá mais vezes?
— Iremos Sam.
Dou de ombros, puxando o cinto, o que posso fazer além de
concordar com o meu melhor amigo?
— Sim, com certeza?

Tudo mudou? Nem tudo!

— Vem logo Sam!


Como se fosse muito fácil subir essas escadas de cordas depois de
dez anos!
Reviro os olhos, Noah já está no piso firme. Ele estacionou o carro
a alguns metros daqui, atrás de um salgueiro. — O bosque está escuro e
cheira a musgo, essa época do ano o clima fica quente demais e as plantas
reclamam.
Ele já subiu com o que trouxe e com a minha mochila, fiquei
assustada com a velocidade de Noah, ele subiu e desceu umas duas vezes a
escada velha de tiras, ela range enquanto eu subo e confesso que tenho um
pouco de medo que as taipas de madeira que servem de degraus quebrem
com o meu peso.
Acho que a queda seria das piores! Vinte metros! Seria
constrangedor se ele me visse caindo e eu iria parar no hospital!
Subo o último degrau com cuidado e me seguro nos tocos que
servem de puxador, Noah estende a mão, mas recuso e consigo subir, me
sento nas taipas velhas e olho ao redor, — daqui da pra ver algumas outras
árvores do bosque e o parque municipal de Charlotte — Noah puxa a
escadinha e se senta ao meu lado, ficamos com os pés de fora das tabuas,
me sinto meio idiota, não sei por quê.
— Acho que teremos que dormir na sala, no quarto não cabe nem
minhas pernas esticadas.
— Sem problemas!
— Quero expandir e colocar uma escada de madeira em espiral, o
que acha?
— Vai ficar bom.
— Vem!
Encanto-me com o entusiasmo do Noah, ele está tão empolgado que
me admiro.
Acho que ele sentiu muita falta da Barbie.
Nos levantamos, Noah vai na frente e abre a porta abaixando a
cabeça, ele colocou vários lampiões aqui deixando o lugar um pouco claro,
todo o lugar se resume num espaço circular com três divisórias: uma
pequena sala onde deixávamos uma TV a pilha e uma pequena mesa de
madeira com duas cadeiras, o meu quarto, e o quarto do Noah. Acho que o
pai dele não queria que os meus pais pensassem mal a respeito dele, e como
eu sou menina ele achava que deveríamos dormir em quartos separados,
mas nós nunca respeitávamos isso!
Tão logo o pai dele descia pra acampar no bosque, Noah vinha pro
meu quarto e dormíamos juntos, nós éramos daquelas crianças que dormiam
de cueca e calcinha, acho que até eu fazer sete anos, ainda nadava no lago
de calcinha e ele de cueca, não havia maldade em nós, acho que nunca
houve realmente.
O lugar não está tão sujo, diria que até organizado, olho pra Noah,
ele dá de ombros, envergonhado.
— Vim à tarde, aproveitei e dei uma limpada.
— Garoto exemplar.
— Alguém tem que manter a ordem na Barbie!
Sorrio. Noah indica os dois colchonetes que trouxe, ele anda
completamente curvado no lugar, eu também ando meio encolhida, nem
vou aos quartos. A sala está vazia, pego os colchonetes enrolados e os abro
no espaço vago, Noah abre a mochila que trouxe e exibe uma garrafa
térmica prateada e copos descartáveis.
— Trouxe M&M’s? — pergunto abrindo as janelas — Barbie cheira
a terra!
— Ela ficou muito tempo fechada. — Noah responde tirando o tênis
— Sim, eu trouxe seus M&M’s, Bolinhos!
Fico vermelha. — Tiro as sapatilhas e Noah pega dois cobertores
que trouxe em sua mochila, ele vai para o colchonete da esquerda com a
garrafa e os copos e um saco de M&M’s, aproximo-me e me sento ao seu
lado arrumando os cobertores em cima de nossas pernas, a mochila que ele
trouxe é daquelas de acampar, parece um saco grande, me pergunto há
quanto tempo ele estava planejando isso...
— Queria ter vindo antes? — Questiono.
— Desde o dia que cheguei, eu quis vir. — Noah responde e tira o
celular do bolso — Música?
— Por favor.
Olho em volta e tudo parece realmente muito menor do que era
antes. Noah mexe no celular e logo Johnny Cash, “The First Time Ever I
Saw Your Face”, começa a soar na nossa pequena Barbie, estreito os olhos
e sou ignorada. Ele coloca o chocolate quente nos copos todo cuidadoso,
Noah me estende o copo descartável com chocolate quente, depois ele pega
o dele e despejamos um pouco do M&M’s no copo com chocolate. —
Sempre fazemos isso, sempre! O chocolate sempre fica melhor assim.
A voz de Johnny Cash sempre fascinou muito o Noah, ele ama
músicas antigas, principalmente cantores com pegadas Country. Também
gosto, mas pensei que com o passar dos anos ele fosse esquecer essas
músicas e fosse aderir a novos gostos. Eu amava Britney Spears durante o
colegial, hoje, tudo o que escuto se resume em músicas alternativas e bregas
dos anos noventa, também escuto muito meus cantores favoritos ainda.
Bebo um pouco do chocolate, está delicioso, Noah passa o braço
em volta do meu ombro e me beija devagar, correspondo — não sou de
ferro, não consigo resistir a ele na maior parte do tempo! — Durante o
caminho até aqui, mal falei duas palavras, fiquei olhando o caminho escuro
até o parque, Noah também não falou muito, mas percebia-se de longe
nossa pequena empolgação, antes ele fazia todo o trajeto a pé, cortava
caminho pela trilha, eu sempre o admirei muito por isso, não havia barreiras
para Noah quando ele queria me ver, ou quando queria vir na Barbie jogar
conversa fora.
— Senti sua falta Sam. — Meu coração dispara, mas tento sorrir —
Sentiu minha falta?
Noah também não era tão carente... Era?
— Senti! — Consigo falar.
— Queria ter estado aqui em todos os momentos, mas não pude.
— Entendo que teve que ir com sua mãe.
— Eu não sou mais um rapaz medroso Sam. Sou dono de mim
agora, quero poder viver tudo o que não vivi com você.
Sorrio, um pensamento tolo me vem à mente.
— Acho que nem tudo, não é mesmo? Eu já fui até babá!
— Você entendeu!
Ele começa a sorrir, desvio o olhar e bebo um pouco mais do meu
chocolate. Noah faz com que eu me sinta quente com seu abraço. Estamos
longe da cidade, mas não sinto tanto frio, o lago fica a alguns metros daqui,
por isso, às vezes esfria bastante à noite.
Chuto os cobertores para longe e ele me beija de novo, enfiando a mão na
minha nuca, fazendo carinho no local, deixo meu chocolate de lado e nos
beijamos enquanto deitamos, Noah vem pra cima de mim e eu o beijo com
carinho.
— Sam...
— Humm...
— Você sabe que eu não sou mais virgem certo?
— Ai que nojo!
Ele sorri e fica me olhando, ele toca minha face com carinho e beija
a pontinha do meu nariz, sei que estou vermelha.
— Queria ter perdido com você — Noah fala, mas está bem sério
— e que você tivesse perdido comigo.
Ainda não perdi... Mas, você nunca saberá disso se depender de
mim!
— Por que esta falando isso, Noah? Pra parecer mais fofo?
— Queria ter lhe dito naquele dia, quando estivemos aqui pela
última vez, antes de ter me afastado de você definitivamente, que se você
me pedisse pra ficar eu ficaria Sam... Fugiria com você e faríamos uma
loucura! Quem sabe seus pais não te deixassem vir me ver ou vice e versa?
— Só tínhamos 14 anos, Noah! — replico bem mais que surpresa.
— Não me importava... Mas eu tinha medo de que talvez reagisse
mal com a ideia. Você nunca me deixou me aproximar demais depois que
crescemos.
— Nunca deixo ninguém se aproximar demais!
— Lockwood você deixou. — Reviro os olhos.
— Você também ficou ciumento?
— Eu sempre tive ciúmes de você, apenas ficava na minha porque
você nunca gostou de pessoas grudentas.
Percebo que Noah parece magoado comigo, não sei por que. Ele sai
de cima de mim e fica de lado me olhando bastante sério, não fazia ideia de
que ele sentia ciúmes de mim, nunca me passou pela cabeça que alguém
fosse se sentir assim em relação a mim... Por que sentiria ciúmes de mim?
Não sou tão bonita, não tenho grandes atributos físicos, nunca fui
interessante nem sexy...
— Acho que se eu voltasse e você estivesse casada, eu de uma
forma bem rápida, mandaria me livrar do corpo do seu marido!
— Não sei por que!
— Sabe que eu sempre gostei de você Sam, por isso faz pouco caso
de mim. Sempre fiz o que me pedia, sempre quis tentar me aproximar, mas
você sempre me afastava.
— Me trouxe pra cá pra ficar jogando as coisas na minha cara?
— Não, eu apenas estou explicando como me sinto. De repente, eu
tenho minha melhor amiga de volta e quero muito poder compartilhar como
me sinto com ela sobre a minha velha amiga.
— Sei.
Noah coloca a mão no meu braço e o toca com carinho. Nunca
percebi que ele tinha um lado carinhoso, claro, muitas vezes dormíamos
abraçados, ou quando íamos para o lago, eu deitava com a cabeça no colo
dele ou vice e versa, mas ele nunca demonstrou isso tão abertamente.
— Se der certo, mudo de vez em janeiro. Até lá, você e eu nos
resolveremos Sam!
— As coisas não são tão simples, Noah.
— Você quer complicar tudo! Não entendo o motivo disso.
— Gostaria de não ter perdido meu melhor amigo há anos, agora
muito menos.
Acho que ele não entende que eu nunca me toquei de que havia
sentimentos da parte dele também, eu nunca fui dessas garotas
namoradeiras; Noah sempre foi o meu pequeno refúgio, a pessoa para quem
eu confidenciava tudo do meu dia, alguém do qual eu sabia que poderia
contar... — claro que pensei muitas vezes em tê-lo como namoradinho, mas
aquilo para mim era distante, por que nossa amizade superava tudo, era
como se apenas aquilo fosse o suficiente pra mim.
— Para se envolver com alguém, o primeiro passo é se tornar
amigo da pessoa, Sam!
— Foi assim com a Dyanna?
— Não. Eu a conheci em Ibiza, depois disso a levei para jantar e
começamos a sair juntos. Levei-a pra conhecer os meus pais, e começamos
a namorar.
Não me surpreendo com a sinceridade de Noah, disso, não tenho
nada do que reclamar. Sincero ele sempre foi, e é algo que parece que não
mudou.
— Amava ela?
Noah suspira, assim, muito calmo. Parece pensar por alguns
momentos.
— Tem coisas que fazemos, e tem coisas que devemos fazer Sam.
Foi isso o que houve entre eu e Dyanna. — Ele pega o copo ao seu lado e
bebe um pouco, apoiado no braço. — Minha mãe acha que este é o
momento em que devo me casar e formar uma família; meu pai quer netos!
— Eles querem o melhor para você.
— Esse "melhor" não me faz feliz! Cansei de viver na sombra do
meu pai, de ser o filho que a minha mãe deseja que eu seja. Antes de ser a
senhora King ela era mais “a minha mãe”.
Não sabia que ela havia mudado com Noah, os olhos dele tem uma
espécie de mágoa.
— Ela acha que é o melhor para mim que eu faça o que ela quer,
mas chega um momento na vida de um homem que ele deve seguir seus
próprios passos.
— Falou pouco, mas falou bonito.
Ele sorri e revira os olhos. Até assim é bonito!
— Meu noivado com Dyanna era mais um dos caprichos da minha
mãe e uma conquista pro meu pai, eles dois não se conformam que àquela
não era a vida que eu queria levar, te rever me fez perceber que, por mais
que eu tentasse fugir do que eu sempre fui eu não conseguiria.
— O menino que andava de bicicleta sem pegar nos guidões!
— Hei, aquela bicicleta era maneira!
— Era a minha bicicleta, Noah.
Rimos, ele sempre andava na minha bike cor de rosa. Gostava de
andar de skate também, mas nunca levou jeito.
— Ainda continua a ser maneira, o que fez dela?
— Vendi. E o seu skate?
— Minha mãe jogou fora.
— Sua mãe precisa conversar com um psicanalista.
— Ela deixou que o nome do senhor King lhe subisse a cabeça
Sam, isso me irrita!
— Eles tiveram mais filhos?
— Infelizmente. Uma peste chamada Sabrine, ela tem dez anos.
Sorrio. Noah faz cara de tédio. Pego meu chocolate e bebo um
pouco.
— Não vejo graça, Sam.
— Eu vejo!
Noah sempre amou ser filho único. Benefícios? Ter tudo só pra ele!
— Você deveria ficar do meu lado.
— Ela é loira e tem olhos azuis como você?
— E, adoravelmente tem uma beleza clássica como a minha.
— Que fofo Noah, você tem uma irmã!
— Àquilo não é irmã. Àquilo é o diabo vestindo prada e cuspindo
músicas do Justin Bieber, de saia.

Gargalho. — O mais engraçado, é que ele parece realmente bravo.


Ele está! E não sabe o quanto fica sexy assim... Nunca imaginei que
pensaria algo assim, mas... Acho Noah King Sexy... Poxaaa vida hein!
— Os seus pais não quiseram mais filhos?
— Sem filhos, eu sou a primogênita mais amada do mundo...
"Sorry"!
Deixa o copo em uma mão e a outra ele ergue para cima e a balança
como aquelas dançarinas do vídeo do Justin Bieber no clipe "Sorry", rio
ainda mais. Noah King também é muito engraçado! Bem, o meu amigo
Noah sempre foi, se bem que ele estava mais pra desengonçado.
— Quando Sabrine nasceu mamãe mudou, e eu foquei na empresa,
nos negócios.
— Teve muitas namoradas durante esse tempo?
— Algumas. Não gosto de namorar.
— Ah.
Agora parecemos realmente dois amigos conversando, sem
frescuras, sem timidez, sem medo, sem vergonha.
— Não tenho paciência, elas querem algo que eu nunca posso
oferecer.
— Você tem dinheiro.
— Você acha que as mulheres as quais saio precisam de dinheiro,
Sam?
— Só estou falando que é o que muitas mulheres buscam.
— Querem amor... E isso eu não dou pra ninguém.
— Que amargo!
— É. Eu aprendi da melhor forma... No meu primeiro
relacionamento sério, há cinco anos, peguei a minha ex na cama com o meu
companheiro de quarto na faculdade.
Não sei o que falar, fui tomada por um choque enorme.
— Diria que ela foi o mais próximo do que eu cheguei a sentir de
amor. Depois disso eu só foquei na minha carreira, tive algumas amantes,
mas nada sério.
— Noah Baltimore com amantes... IM-PA-GÁ-VEL!
Ele começa a rir, a verdade é que estou assustada com a pequena
revelação.
— Sou homem.
— Sei.
— É sério, depois que a gente cresce começa a sentir umas coisas
estranhas quando namora. Não foi assim com você e o Tyller?
— Não. Ele sabe que se me encostar onde não deve, eu corto a mão
dele!
— Enquanto dançavam ele tocou!
— Era um tango... E não se faça de sonso, você apertou a minha
popa, Noah King.
Acabo por rir, por que Noah gargalha à beça com a minha acusação.
Bebo um pouco mais do meu chocolate.
— Eu posso, tenho direitos sob você. Ele não! Por falar em merda,
ele andou te beirando?
— Não.
Realmente, o Ty sumiu esse fim de semana. Amanhã vou ligar pra
ele.
— E a Dyanna?
— Ela me ligou algumas vezes esses dias, mas não temos o que
falar.
— Talvez essa não seja a decisão certa, Noah...
— Você é a melhor decisão que eu já tomei na minha vida, Sam.
Não vou voltar atrás. Não adianta o que ela fale ou faça, eu vou ficar em
Charlotte e nós ficaremos juntos, nem que seja como amigos!
— Talvez se arrependa.
— Jamais. — Só espero que não.
MINHA GORDINHA
Abro os olhos.
Já é dia, não parece muito tarde. Sinto um calor gostoso me
envolvendo toda e sorrio, Noah me aperta e sorrio ainda mais por que a
boca dele pousa no meu pescoço, a mão dele está me apertando na barriga,
as pernas dele estão entre as minhas, e estamos cobertos até o pescoço com
os cobertores.
Faz tanto tempo que não acordo tão cheia de felicidade... Paz...
Tranquilidade.
Parece que estou dentro de um sonho. Estamos tão quietos que dá
para ouvir o som dos pássaros lá fora, o vento sopra pela janela lentamente,
mais um dia que começa meio quentinho em Charlotte.
— Bom dia, Bolinhos.
— Bom dia, Dinossaurinho. — Sei que ele sorri.
— Pronta pra ir ao lago?
— Ah, não Noah...
— Vamos logo! Tenho que estar na empresa às dez.
E eu antes das oito. — me ergo meio que com preguiça, bocejo,
Noah fica de pé e me estende a mão, me levanto sozinha, ficamos curvados
enquanto saímos da Barbie, Noah me fez prometer, ontem antes de cair no
sono, que iriamos ao lago logo cedo.
Ele joga a escadinha pra baixo, e vou à frente tomando cuidado ao
descer, estou descalça, mas nem me importo. Só me sinto segura quando
meus pés tocam o chão. Menos de alguns segundos depois, ele está me
pegando pela mão e me puxando em sentido esquerdo.
— Vem logo sua pequena preguiçosa!
— Tem noção do quanto à água deve estar fria?
— Você prometeu Bolinhos.
Reviro os olhos — Noah me puxa pra ele e me beija devagar —
Suspiro.
Não me sinto muito a vontade de estar de pijama, ainda que me cubra o
corpo dos pés a cabeça e eu use sutiã e calcinha por baixo dos tecidos.
— Noah... Não vou me despir.
— Por que não?
Que pergunta difícil!
— Não temos mais sete anos, Noah.
— Até fazermos doze anos, você nadava de calcinha e sutiã. Não
vejo problemas nisso!
— É só que... eu cresci... muito!
Ele suspira e toca em meus ombros, abaixo a cabeça e me afasto um
pouco.
— Eu gosto de você assim, Sam...
— Não preciso que minta para que eu me sinta melhor.
— O pior de tudo é que eu não minto Samantha. Gostaria de lhe
falar que não é isso, mas nunca me senti tão atraído por alguém.
Nego com a cabeça e me afasto indo pelas árvores do bosque. Noah
não mentia nunca pra mim, mas acreditar naquilo parecia um pouquinho
impossível.
— Os livros não retratam garotas GG, Noah. Como pode se sentir
atraído por alguém tão gorda?
— Simplesmente me sinto.
Acelero os passos, desvio de algumas árvores, o chão é cheio de
relva úmida. — Ainda que ele diga isso mil vezes, não consigo acreditar.
Noah pode me falar o que quer que seja que ainda acreditarei nele. Mas
quando se trata disso... É incompreensível pra minha capacidade humana
que alguém goste de uma garota GG.
— Sam... Eu gosto do seu corpo.
— Acho que não tem explicação o fato de que esteve noivo de uma
garota uns quarenta quilos, mais magra do que eu, Noah.
— Isso não significa que eu não goste do seu corpo... Sam!
Acho que ele se irrita por eu estar basicamente fugindo dele... Mais
da conversa!
— Como pode se sentir atraído por mim? Tudo em mim é enorme!
— pergunto me virando de repente, eu o olho cheia de raiva e dor, isso me
consome por dentro — Meus seios são caídos, eu sou mais gorda do que a
minha mãe Noah, e ela me teve!
— Que comparação ridícula! — Noah fala incrédulo — Você é uma
mulher linda...
— SHIU! — ergo o indicador do "limite", ele sabe que quando faço
isso, não quero dar continuidade ao assunto.
— SHIU É O CARALHO! — Noah responde indignado — Por que
acha que eu não posso me sentir atraído por você? Amar você...
— Noah, cala a boca! — interrompo nervosa, apavorada — Você
chegou há uma semana e já está me deixando irritada.
— Pois que fique! — responde chateado — E abaixa esse dedo do
limite. Eu quero você sim e foda-se o que pensa sobre isso, não pode
mandar no meu querer.
— Você só pode estar brincando comigo!
— Não acredito que estamos brigando porque você não quer ficar
de sutiã e calcinha pra nadar! Minha avó usa biquíni, Sam!
— SUA AVÓ É MA-GRA! — berro e ele coça a face num gesto de
estresse. — SHIU!
Noah respira fundo, visivelmente irritado, ele passa por mim feito
um foguete, vai na frente pisando forte, eu o sigo também irritada com o
assunto. Não sei como acabamos brigando, estava muito bom pra ser
verdade!
O lugar é cheio de mato fechado e desértico, o lago está como
sempre imaculado, tem algumas rochas dos lados que formam uma clareira
linda em volta de todo o lugar. Noah está parado perto de uma das rochas
emburrado, os braços cruzados. — Suspiro — Acho que fui longe demais
com esse assunto, contudo, não quero fazer algo que me deixe constrangida.
— Noah...
— me deixa! Vai nadar de roupa sua gorda!
— Seu... Seu...
— É assim que gosta de ser tratada não é Sam? — Ele se vira para
mim, os olhos azuis cheios de tanta... dor? — Cansei disso. Que droga, não
dá pra ser menos complexa uma vez na vida?
— Você não sabe como é por que nunca foi gordo! — Acuso
magoada também.
— Sam estou pronto pra viver isso com você, mas tem que parar de
se sentir mal com o seu peso. Se quiser mudar isso, tem que mudar a si
própria pra não se sentir tão mal.
— Acha que eu já não tentei?
— Eu te aceito assim e te quero assim! É isso o que te apavora ou o
que as pessoas vão falar? Porque eu não me importo mais com o que dizem.
Estou aqui sendo completamente sincero com você, sobre como me sinto e
você me manda calar a boca, me chama de mentiroso... Isso eu não sou,
odeio mentira!
— Eu sei disso.
— Então pare com isso. Você é linda, Sam!
Suspiro. É muito difícil não acreditar nele.
— Vem, vamos entrar logo ou vou acabar me atrasando.
— Você não vai tirar as roupas?
— Não.
Irritei-o.
Aproximo-me e ele me estende a mão, aceito e ele me puxa pra si e
me olha de um jeito...
— Para com isso entendeu?
— Só respeita os meus limites.
— Eu respeito, mas não se diminua assim Sam. Você é linda,
Bolinhos!
Faço que sim, decidindo não discutir. Noah me puxa e logo em
seguida caímos no lago, afundamos e quando subimos, sopro o ar com
dificuldade, a água está gelada, acho que podem escutar meus gritos de
longe! Olho para Noah e ele está sorrindo e me puxando pra ele.
— Chega de briga, minha gordinha.
— Não sou sua gordi...
Mas antes que eu complete a frase, Noah me beija, e nesse
momento esqueço-me de tudo.
DELE
— Gostou do passeio?
Olho pra ele e faço que sim. Acabo de sair do “meu quarto”.
Usei-o para me secar e me trocar. Noah foi para o dele. A sala já
está perfeitamente arrumada, ele é bem rápido e prático. Mesmo que ainda
sinta um climinha depois da nossa discussão no caminho do lago, logo
estávamos nadando, lembrando-nos daquela vez que o pai do Noah acabou
sendo mordido por um coelho nas margens daquele mesmo lago e de
algumas vezes que ele e eu fugíamos depois da aula pra nadar ali, alguns
minutos depois, saímos e voltamos de mãos dadas para a Barbie, não
falamos nada, eu me sentia meio idiota por ter instigado o Noah a brigar
comigo, mas ao mesmo tempo, não me culpei, porque sei as minhas
limitações e as minhas complexidades. É algo que eu tento sempre deixar
de lado, mas parece uma missão impossível, sempre.
— Quero passar em algum lugar pra comer. Sugere algum lugar
Sam?
— Bem, sempre tem a lanchonete da Faith.
— Ela ainda é viva?
Sorrio com a pergunta, Noah está de jeans e uma camisa polo de cor
azul escura, os mesmos tênis, os cabelos jogados pra frente, mas meio
bagunçados, no olhar azul o mesmo senso brincalhão de sempre. Faith tinha
uns sessenta anos quando ele foi embora, mas ela sempre teve cara de bosta
e era uma completa mal amada. Isso mudou depois que os netos dela
vieram morar com ela há alguns anos. Acho que ela ficará muito feliz em
rever o Noah.
— Múmia? Sério?
— Não fala assim da Faith, ela é boazinha agora!
— Ela nunca gostou de mim.
— Ela nunca gostou de ninguém!
Vou na frente, desço com cuidado, lembrando-me da carranca da
Faith. Ela odiava quando o Noah e eu íamos a lanchonete dela,
simplesmente porque fazíamos a maior bagunça e acabávamos fazendo
guerra de batata frita e catchup. Pensando bem, ela tem os motivos dela!
Acabávamos sendo expulsos de lá, e ela tinha uma mania feia de puxar
nossas orelhas enquanto nos tirava do lugar, Noah lhe mostrava a língua e
eu o dedo do meio, eu sempre fui mais rebelde.
— Sempre soube que ela me odiava! Desde o dia em que papai
pediu catchup pra nós pela primeira vez que nos levou lá. Lembra Jas? Ela
expulsou até o meu pai.
Rimos. — Noah já está ao meu lado, nos afastamos e olho pra
Barbie, ela está velha, mas a árvore ainda é bem viva, e pra mim a nossa
antiga casinha ainda continua sendo o meu melhor e maior lar.
— Vou aumentar ela. Na próxima vez que viermos, ela estará
perfeita pra nós dois!
— Se quiser, posso ajudar aos domingos. Eu sei bater pregos!
— Deixe o trabalho sujo pra mim, Bolinhos.
Sorrio, ele me puxa e toma a minha mochila da mão, coloca sob o
ombro e carrega a dele com a outra mão enquanto mantém o braço em volta
da minha cintura.
— Deixei meu pijama estendido na janela do meu quarto.
— E eu as minhas roupas. Pego depois, fique tranquila!
— Eu adorei ter vindo Noah, de verdade, foi ótimo!
— Voltaremos mais vezes!
Espero que sim.

— Noah Isaac Baltimore, é você mesmo?


— Oi... Faith!
Faith Stwart tem seus setenta e tantos anos, os cabelos são cinza,
usa óculos de grau e o velho uniforme cor de rosa, que sempre usou desde
que me lembro, ela também usa dentadura agora...
Ela se inclina sob o balcão e aperta as bochechas do Noah com
força. Estreita os olhos e sorri, da uns tapinhas no rosto dele cheia de
maldade. — É, ela realmente nunca gostou da gente!
— E você sua falsa, nunca mais veio!
— Estava caçando emprego, Faith. Noah está visitando a cidade e
queria te ver!
— E continua feio do mesmo jeito!
O que sempre gostei em Faith foi o amargor e as piadas negras.
Noah sorri todo empolgado, eu sei que ele sentiu falta de Charlotte, de tudo
isso! — Eu sentiria se todas essas pessoas fossem importantes para mim, e
como elas são... Naturalmente me sentiria muito feliz em revê-las.
A lanchonete ainda é pequena, fica localizada no bairro onde moro
que é o mesmo onde Noah morou, mas a antiga casa dele não é muito perto
da minha, o lugar está sempre do mesmo jeito, mesas pra quatro, bancos de
couro, tradicionalmente parecido com o estilo Texano... Faith é do Texas,
ela mantém até um violão pendurado numa das paredes com chapéus de
Cowboy, e uma cela de couro acima da entrada da porta, Noah e eu sempre
apostamos que um dia essa cela cairia na cabeça de alguém, ele torcia muito
pra que caísse na de Faith, eu dizia que cairia na cabeça do prefeito que na
época era um banana!
— E o que o te trás aqui, meu jovem encapetado, depois de sumir
da cidade?
— Trabalho, Faith. Você não mudou nada!
Faith liga a máquina de café e começa a preparar dois cafés pra nós,
ela tem duas garçonetes e uma caixa, já trabalhei aqui depois do colégio por
um tempo, mas como ela dava preferência pra garotas mais velhas, acabei
perdendo a vaga.
A caixa fica olhando pro Noah como se quisesse comer ele desde o
momento em que colocamos os pés na calçada, e as duas garçonetes ficam
passando toda hora atrás de nós dois olhando pra ele, isso me irrita, acho
desnecessário.
— E vai ficar? Jovem fujão!
— Sim, claro. Sam precisa de alguém pra cuidar dela.
— Ela esteve muito descuidada, ainda mais com aquele pai que ela
tem! A mãe então, nem se fala.
Espero que ela não fale da doença de mamãe pra ele... Não fala
Faith... Não fala Faith... Não falaaa!
— Vão querer o de sempre? — Questiona Faith, para meu alivio.
— Rosquinhas recheadas com um café meio amargo! — Repetimos
Noah e eu ao mesmo tempo.
Eu o fito e ele sorri. De repente, ele se inclina e me da um selinho,
fico vermelha feito pimenta, me viro pra frente meio chocada. — Fizemos o
mesmo pedido por anos, por que deveria me chocar? Acho que é mais por
conta do selinho, não esperava. — Penso.
— Até que enfim contou pra ela, — Faith diz com um sorriso largo
no rosto — eu quero ir!
Do que estão falando?
— Pode deixar Faith. — Noah fala e segura a minha mão em cima
do balcão — Ela é complicada, mas eu voltei pra domar a fera.
— Já estava passando da hora! — Faith coloca as duas xícaras
diante de nós — Vou buscar as rosquinhas.
Ele entra na cozinha, Noah me olha e segura minha face fazendo
com que eu o fite.
— O que foi?
— Não faz isso. As pessoas podem confundir as coisas.
— Sam, estamos juntos!
— Somos amigos.
— Não importa o que pensam ou deixam de pensar!
— Isso pode chegar ao ouvido da minha mãe.
— Me poupará o trabalho de explicar pra ela.
Fecho a cara, Noah me beija de leve e se afasta, como se isso fosse
muito normal.
— Relaxe, Bolinhos, é hora de comer.
— Não falo nada, Noah King.
— Não precisa falar mesmo não, você é minha. Só!
Sou de Noah King, estou sorrindo por sua autoconfirmação, e
surpresa por ter gostado disso.
NAMORADA DELE
Noah parou a duas esquinas da empresa a meu pedido. Não quero
nenhum tipo de fofoca ou que desconfiem de nós, também não misturo as
coisas. Antes que eu saia do carro ele me puxa e me da um beijo lento e
gostoso, me fez sentir novamente nas nuvens! Em seguida, sai do carro,
vermelha, e com a minha mochila. Rumando a calçada.
Mal cheguei à empresa e Donatela já estava a minha espera. Ela me
explicou que Noah pedira que eu começasse a me organizar para a mudança
de cargo. — Em uma semana eu serei sua nova assistente! Eu me via
sorrindo e me sentindo super boba e feliz.
Mas voltei logo para a faxina e Donatela para o cargo dela, e só
voltamos a nos ver durante o almoço. Ela não parava de falar sobre os
planos que ela e mamãe fizeram de fazer um piquenique em alguns dias no
parque, me convidou inclusive e aceitei. Logo depois do almoço eu fiquei
mais por conta da limpeza das salas do primeiro andar.
Meu turno enfim acabou e me vi indo pra casa, ainda com um
sorriso nos lábios. Quando cheguei, mamãe estava a minha espera como
sempre na cozinha preparando o café. Parei de sorrir no momento em que
ela fechou a cara para mim, e percebi que ela sabia que eu tinha fugido no
meio da noite, mas ela não disse nada, pois, papai estava ali, sentado à mesa
lendo o jornal.
Subi para o meu quarto, ignorando a sensação ruim, não menti,
portanto não deveria me sentir culpada, certo? Sou maior de idade, não sou
mais uma criança. Sou dona dos meus atos, mamãe precisa entender isso.
Eu e Noah somos amigos, ainda que meio diferentes dos amigos
tradicionais, somos amigos. Ele quer se reaproximar e sei que posso confiar
nele, que mal há nisso? Nos beijamos e eu adoro estar com ele como
sempre foi e dai?
Tomei banho e agora vim pra minha cama, mal me deitei e escutei o
som de batidas na porta, dois segundos depois, Ty está entrando no meu
quarto usando óculos escuros e com roupas leves, sorrio ainda mais.
— Ora, ora, minha GG predileta sorrindo... Acho que viu um
passarinho King.
— Bobo! — A verdade é que estou tão feliz que acho que vou
explodir!
— Você sumiu!
— É. Compromissos! Minha mãe enfiou na cabeça que quer te
conhecer, ela viu as fotos que a sua mãe tirou no noivado do seu amor.
Ele vem e se joga do meu lado na cama, me viro e fico de lado, Ty
suspira e sinto que me esconde algo.
— O que foi?
— Promete que não vai contar pra ninguém?
— Claro!
Estranho a seriedade em seu olhar, Ty nunca foi tão sério.
— Fiquei com uma garota.
— QUÊ? — Meu berro é tão alto que até eu me assusto. Ty revira
os olhos, todo sem graça.
— Foi uma recaída!
— Já tinha ficado com garotas?
A cada resposta fico chocada e completamente embaraçada com
isso.
— Queria te ajudar, foi um erro.
— Como assim?
— Sabe a noiva do King?
Arregalo os olhos, Ty coça a barba, chateado, depois se senta na
cama. Mal consigo raciocinar direito... Ele ficou com a Dyanna?
— Parece que eles brigaram na noite do noivado. Ela foi ao nosso
hotel, pois, queria brigar com você, e eu estava na recepção dando em cima
de um dos porteiros, daí ela apareceu e tudo aconteceu muito rápido.

Conforme ele vai falando minha boca vai caindo, não acredito
nisso, não acredito que o Ty ficou com a Dyanna!
— Tentei persuadi-la no elevador, mas ela estava num acesso de
loucura... Então eu a seduzi e transei com ela no elevador.
Tampo a boca engolindo minha incredulidade, Ty está vermelho
feito um pimentão.
— Foi uma rapidinha! — justifica impaciente — Não me olhe
assim, Sam.
— Desculpe, mas é que não acredito que você transou com uma
mulher...
— Foi um momento de loucura, carência... E eu havia bebido muito
depois que você foi dormir, bebi no bar do restaurante do hotel. Eu não sei...
Àquela mulher... Ela tem algo que me deixou louco.
— O que?
— Ela é arrogante e prepotente. Adoro pessoas assim!
— Você está debochando da minha cara, Ty?
— Estou explicando como transei com a noiva do seu melhor
amigo no elevador!
Isso é muito estranho! Conheci o último namorado de Ty, ele era
super bonito e jovem. Nunca imaginei Ty com uma mulher. Simplesmente
não é dele essas coisas, ele é gay... ou era, nunca pensei que ele fosse se
relacionar com Dyanna também... Dyanna!
— Eles terminaram Ty.
— Nossa! — Ty franze a testa super sem graça.
— Não tem nada a ver com você. Eles brigaram e ele terminou com
ela.
— Tem razão, tem a ver com você não é mesmo? — Ele parece
triste.
— Por que está assim?
— Sinto como se eu perdesse algo, foi tão... estranho e bom.
— Não gostava de ter relações com mulheres?
— Já me decepcionei demais com mulheres, Sam.
— Mas gostava?
— São coisas diferentes...
— Mais uma vez Ty, gostava?
Ele suspira infinitamente e depois se rende.
— Sim, gostava.
— Merecia coisa melhor.
— Tem razão, você!
Sorrio e o abraço com força.
— E ai menina, como está sendo com o senhor King?
— Estamos reatando a amizade.
— Se fosse apenas amizade não é mesmo?
Ty me olha com uma cara de malicia.
— Ainda não aconteceu Ty... Nem vai acontecer, Noah e eu
somos... um velho amor de infância, brigamos mais que tudo!
— Mas, você o beijou.
Fico vermelha.
— Como sabe?
— Está nos seus olhos querida. — Ele toca a minha face.
— Sam eu cheguei...
Noah entra em meu quarto segurando uma flor, Ty e eu olhamos em
direção à porta e logo de cara percebo uma fúria intensa tomar a face dele.
Ty se levanta da cama e fica sem jeito, e eu fico paralisada.
— O que ele faz aqui? — Noah pergunta e respira fundo — Não
disse que terminou com ele?
— É. Terminamos! — Ty fala imediatamente — Mas somos
amigos.
— Ela não precisa de mais amigos. — Replica Noah, bastante sério
— Não se aproxime mais dela cara, Sam e eu estamos juntos.
Ty me olha e percebo que está prendendo o riso. Desvio o olhar
para o chão, pois estou morrendo de vergonha! Noah age como quando
tinha doze anos e parecia que ia explodir de raiva, ele sempre fica vermelho
quando o sangue lhe sobe a cabeça, as veias do pescoço latejam e ele fica
trincando o maxilar com força, rangendo os dentes como um cão raivoso.
— Juntos?
— É, estamos namorando, você é surdo?
— Pensei que fossem amigos...
— Somos muito mais que isso, você não tem permissão pra entrar
no quarto da minha mulher assim, Lockwood, entendeu?
Mulher Dele?
— Claro. — Ty concorda e pigarreia — Então, Sam, espero que dê
tudo certo para você. Você merece ser feliz.
— Obrigada, Ty. — Fico vermelha e mal consigo olhar na cara dele.
Tyller se inclina e beija a minha cabeça, escuto a respiração de
Noah mais forte, e logo em seguida Ty sai do meu quarto apressado, antes
de fechar a porta atrás de si, enxergo daqui um sorriso malvado nos lábios
dele.
— Não quero que veja ele. Eu já disse Sam!
Eu o encaro, ele está realmente irritado com a situação.
— Lhe trouxe esta flor. — Ele se aproxima apressado e me estende
a rosa de cor branca, depois se senta ao meu lado e respira fundo. Sei que se
controla... Mas também... Como eu poderia adivinhar que ele viria?
— Ainda gosta dele?
— Já disse que acima de tudo, somos amigos, Noah.
— Não serão mais. — Noah segura a minha mão e entrelaça os
dedos nos meus. — Desculpe, me exaltei! Mas não suporto que ninguém
encoste em você, Sam, ninguém além de mim.
— Não precisa ter ciúmes.
— Eu cuido do que é meu!
— Eu não disse que aceitaria ser sua namorada! Somos amigos!
— Besteira. Somos mais do que isso!
Escondo minha felicidade. Cheiro a rosa, ela é linda e delicada,
Noah me puxa e me beija com cara feia.
— Apenas minha, entendeu? Só minha, minha gordinha!
— Noah...
— Me deixa, Sam, caramba, é apelido carinhoso.
— Já existe um livro com esse nome!
— Então. É. A. Minha. Bolinhos. — A cada palavra, ele me da um
beijo. Sinto-me tão mimada e feliz... Faço bico.
— Bolinhos?
— É. Minha Bolinhos!
— Vou pensar em outro apelido pra você, Noah.
— O que quiser, desde que aceite.
— Aceitar o quê?
— Ser minha namorada.
Abaixo o olhar e suspiro.
— Noah...
— Por favor, só me dá uma chance Sam.
— Ainda é cedo.
— Não quero mais perder tempo, também não posso ficar entrando
e saindo aqui na hora que bem quero, sei que sua mãe já desconfia.
— Ela acha que não devemos ficar juntos, pensa que eu estraguei
seu noivado.
— Converso com ela e seus pais.
— Noah, isso não vai acabar bem!
— Eles precisam entender os meus sentimentos e as minhas
intenções, não quero esse sujeito vindo atrás de você também.
Suspiro.
— Tenho outra saída?
— Não!
Sinto-me contrariada. Que legal... Agora além de amigos, somos
namorados!
NAMORADOS
— Senhor "M"...
Estou tirando a mesa.
Nosso jantar foi silencioso e quieto. Estou morrendo de vergonha
por tudo! Primeiro por ele basicamente ter expulsado o Ty daqui, segundo
por estar morrendo de medo dele começar a falar e querer me pedir em
namoro para os meus pais. Eu sei que ele quer muito isso, mas sei que a
ideia é absurdamente rápida — isso é tão antiquado! — e terceiro: Porque
não sei se devo aceitar.
— Eu quero conversar com o senhor... Acho que já percebeu que eu
gosto muito da Sam.
— Claro rapaz. Sei que vocês ficaram afastados este tempo, mas
também sei que são grandes amigos.
— Eu gostaria que o senhor me permitisse namorar a Sam.
Coloco os pratos na pia e mamãe os lava completamente irritada.
Gostaria que ela não reagisse assim, mas sei que ela, como em todas as
fases da minha vida, só quer me proteger. Ela sabe que eu fiquei arrasada
quando ele foi embora.
Papai fica em silêncio, percebo que as minhas mãos tremem
enquanto guardo as sobras do jantar em vasilhas.
— Noah...
— Somos livres, Sam e eu nos gostamos... Gostaria muito que
respeitassem isso! Ela e eu queremos ficar juntos.
— Samantha não é qualquer uma Noah — mamãe fala com firmeza
— você não pode chegar aqui e fazer este pedido a ela, assim do nada.
— Acho que já perdi muito tempo para que alguém me impeça de
ficar com ela. — Noah responde e me olha — Eu não quero mais ficar
longe dela, de nenhuma forma.
— Sam é adulta e sabe o que faz, não vejo problema nisso. — Papai
fala com um pequeno sorriso — Desde que vocês dois não se magoem, por
mim tudo bem.
— Acho que estão se precipitando! Ainda ontem, Sam estava
namorando Ty. — argumenta mamãe e me olha — Você tem certeza de que
quer isso, Sam?
Eu Não sei.
— Acima de tudo somos amigos. O Noah está falando isso por que
ele tem vergonha de ficar entrando e saindo do meu quarto, e parecer
desrespeitoso. — respondo sincera — Só queremos ficar juntos, mamãe...
Com ou sem namoro! Só não queremos esconder nada de vocês.
Mamãe tem um olhar menos preocupado agora, ela sabe que sou
sincera.
— Esse namoro é sério?
— Sim senhora "M".
Noah levanta e vem pro meu lado, passa o braço em volta da minha
cinturam e eu fico ainda mais vermelha. Eu mal acredito que depois de
tantos anos, Noah está me pedindo em namoro formalmente pros meus
pais!
— Gosto da Sam. Nós temos nossos desentendimentos, mas
queremos reatar além de nossa antiga amizade... Queremos algo mais sério.
— Fico feliz rapaz — papai diz todo orgulhoso. — Sam merece um
namorado mais sério, alguém que lhe dê atenção.
Mamãe ainda parece ter receio, já papai, parece feliz e admirado.
Acho que ele nunca pensou que viveria pra me ver namorando alguém,
muito menos o Noah.
— Isso merece um brinde...
— De refrigerante! — corto e papai para de rir sem graça. — E
suco pra mamãe!
— Você está pegando pesado, Jas — reclama papai. — Um
momento assim deve ser comemorado com alegria!
Eu não vou deixar papai estragar esse momento por nada! Fecho a
cara, ele vê que eu não gosto e fica acuado, mamãe sorri satisfeita e vai até
a geladeira — ela não encara o alcoolismo do meu pai como uma doença.
Acho que se acostumou muito cedo com o fato de que ele bebe, ou de que
isso é normal pra eles, mas não pra mim. Posso não ser a pessoa mais
controlada do mundo em muitos sentidos, mas eu com certeza não peco
pelo excesso, ainda que esteja acima do peso, eu tenho me esforçado muito
pra não engordar mais, tenho comido tudo certinho na hora certinha...
Apenas não sei o que acontece, só não consigo perder peso...
— Vão lá pra sala, eu sirvo vocês!
— Não mãe, eu sirvo vocês, sente ai.
— Essa casa ainda é minha, mocinha. Vai! Eu faço o café.
Mamãe gosta de se sentir útil, apesar de tudo ela não gosta de se
vitimizar. Vou pra sala com Noah a contra gosto, sei que ela vai aproveitar
pra fofocar com papai, falar que não aceita e ele vai fingir que escuta e ficar
imensamente entediado com as paranoias dela, é sempre assim!
— Você acha que eu fui bem? — Noah pergunta logo que sentamos
no sofá. Ele passa o braço em volta da minha cintura.
— Foi — respondo, mas ainda estou bem constrangida com a
situação.
— Sam, eu... Eu...
Eu reconheço esse nervosismo de longe! Sempre que ele quer muito
falar algo, ele começar com esse “eu... eu” e trava. Viro-me pro Noah e
enxergo em seus olhos algo intenso, algo que nunca vi: a íris está mais
densa e cheia de sentimentos fortes...
— Fale.
— Sempre quis fazer isso.
Eu realmente fico surpresa com a afirmação.
— Eu tentei uma vez, quando tínhamos doze anos, mas acabei
desistindo. Seu pai começou a falar sobre basebol e eu fiquei sem graça.
— Sério?
— Sério, eu tinha muita vergonha.
— De quê?
— Talvez, de que me rejeitasse, risse de mim!
Eu sempre fui muito dura com o Noah, mandona, até meio chata,
bem, na verdade muito chata. Eu também tinha o dom de ser invasiva e
agressiva demais quando se tratava dele. Acho que o assustava muito, no
fundo, no fundo, muitas vezes ele me suportava. Bem, acho que mudei
algumas coisas, outras não, da pra entender porque ele tinha receio... Eu
jamais desconfiei que ele sentisse algo por mim.
— Abre a janela do quarto pra mim hoje? — Pergunta ele baixinho.
Minhas bochechas queimam.
— Quero dormir abraçadinho com você, Bolinhos!
— Ai, Noah...
— Aí vêm eles — Noah se endireita—, às onze e meia eu volto.
Desvio o olhar para o lado, tentando acalmar meu coração — ele
pula feito louco! — Noah King, a cada dia que passa me surpreende mais, e
a partir de hoje ele é o meu novo namorado!
— Acho que temos que dar um jeito nessa janela.

Durante o café a conversa não foi muito longa, estávamos cobertos


de vergonha por estar na mesma sala que os meus pais, agindo como dois
adolescentes bobos, sendo vigiados por eles. O acompanhei até a porta, e
depois de um selinho, ele se foi. Vim direto para o meu quarto, tomei
banho, coloquei um pijama limpo e aqui estava esperando ele.

Fecho o vidro da janela. Noah já está dentro do meu quarto,


levantando do chão, olho para os lados e fecho as cortinas, ele me abraça de
lado e me beija todo carinhoso, enlaço-o pelo pescoço. Seus cabelos estão
molhados, ele fez a barba e cheira a perfume masculino... — O cheiro
dele...
Seguro sua mão e o puxo pra cama, ele tira o tênis e se deita do lado
direito, me deito do meu lado e ele me abraça, voltando a me beijar, meu
estômago gela com seus beijos.
— Senti sua falta.
— Mas, você saiu daqui a duas horas!
— É, mas já estava sentindo falta da minha Bolinhos!
Me sinto assim em relação a ele também, apesar de tudo, sempre
tivemos muito disso, de estarmos juntos em horas vagas, Noah e eu a bem
da verdade, éramos inseparáveis, por isso eu fiquei arrasada quando ele foi
embora.
Abraço-o. Noah cola nossos corpos devolvendo o abraço, ligo o
abajur e me aconchego puxando os lençóis, ele me observa, está usando um
conjunto de moletom e meias, eu o abraço de novo e mal acredito em tudo
isso.
— Você até tomou banho, que fofo Noah.
— Ossos do ofício!
Quando criança até uns sete anos de idade, ele odiava tomar banho,
mas adorava piscina e dias de chuva. Noah Baltimore era a criança mais
estranha que eu já conheci! Com o passar do tempo, já estava acostumada e
pude entender que Noah só fazia as coisas quando lhe dava na telha, mas ao
mesmo tempo, ele era o filho mais obediente do mundo e um amigo fiel.
— O que foi, minha Bolinhos?
— Nada.
Eu o beijo com carinho, Noah me aperta e vem pra cima de mim me
apertando toda, meus dedos se enfiam nos cabelinhos da nuca dele, e me
sinto tão bem em estar com ele... Feliz, como nunca me senti com ninguém,
ele faz com que eu me sinta confortável.
— Sam...
— Hum?
— Eu gosto muito de você, muito mesmo.
Falamos baixinho. Sinto o hálito dele e o calor de seus lábios. —
sorrio — Noah toca minha face, afastando alguns fios de cabelo que saem
do rabo de cavalo que fiz mais cedo, ele sorri quando eu sorrio depois,
nunca imaginei que namoraria o meu melhor amigo de infância.
— Amanhã eu te pego aqui.
— Noah...
— O que tem de mal nisso? Te largo a dois quarteirões, quero ir
junto com você.
Noah parece tão... carente!
— O que foi Noah?
— Sobre?
— Você está tão carente!
— Não é carência Sam, eu apenas quero viver tudo o que não vivi
com você. Talvez não saiba, mas pra mim foram difíceis esses treze anos...
Eu sempre fui na minha, você sabe, mas é que você também não ajudava.
— Eu sei, eu sou difícil.
— Eu gosto de você assim! Eu também tinha medo sabe, não quero
mais ter medo de falar o que sinto por você, Sam. Li suas cartas hoje.
Fico sem graça.
— São infantis né?
— É, tem uma em que você escreveu duas páginas inteiras a frase
"morre, vai pro inferno"! Pensei: uau!
Tento não rir, essa foi uma das últimas que enviei pra ele. Me
recordo de uma outra...
— Leu a que eu avisei que tinha Antrax dentro?
— Li.
Noah começa a rir, tampo sua boca, ele faz que sim espantado e eu
faço gesto de silêncio.
— Você é muito criativa, Bolinhos.
— Eu sei, sem elogios.
Ele sorri daquele jeito que faz meu coração ficar pulando, toco sua
face.
— Eu sinto muito Sam. Também li as cartas que você enviou no
começo, desculpe, mas não cheguei a receber nenhuma delas.
Não consigo entender o porquê, Noah também está cismado, não
sei, mas acho que ele desconfia de algo.
— Não importa, ao menos sei que você se importava comigo. — ele
afirma e me beija— Tudo será diferente agora, Sam.
— Tomara.
Beijamo-nos. Dentro de mim estou convicta de que as coisas estão
bem diferentes. Agora não importa, Noah e eu estamos oficialmente
namorando.
EU DIGO: EU TE AMO, MAS VOCÊ
NÃO ESCUTA... OPA! ESCUTA!
— Bolinhos!
— Hum...
— Eu tenho que ir.
— Fica mais um pouco?!
— Já está amanhecendo.
Bocejo e me estico, Noah me aperta com carinho, o calor gostoso
do corpo dele me tomando toda, me viro pra ele e o abraço colocando a
cabeça em seu peito, metade do meu corpo em cima do dele, eu nunca
compartilhei de momentos assim com nenhum homem, mas também não
imagino como seria compartilhar isso com ninguém além dele.
— Você acorda todos os dias de madrugada?
— Sim, eu faço box pelas manhãs, bem cedo.
— Uau!
Soo tão irônica que me vejo sorrindo, Noah sorri, ele vem pra cima
de mim e fico de olhos fechados sentindo seu toque leve, meu coração
preso ao dele, tenho sentimentos fortes por Noah King, coisa que ainda não
sei explicar em palavras, e não sei o que é que me deixa mais revirada por
dentro.
— Você é linda, Bolinhos!
— Você acha?
— Sim. Seus lábios são perfeitos, eles são carnudos e rosados...
Quero essa boca pra mim.
— Uhhh... Noah sedutor.
Ele ri e me cobre de beijos, tenho dificuldade em levar tudo isso
muito a sério, simplesmente tenho um amigo que descobri que quer me
namorar desde a adolescência, mas não sei exatamente como agir diante
dele como namorado. Sou realmente complicada como ele diz.
— Adoro sua boca Sam, sempre achei ela muito sexy!
— Acho que você só melhorou o corte de cabelo, sua cabeça
parecia à cabeça de coco do Manual de Sobrevivência Escolar do Ned!
— E você parecia a Elvira a rainha das trevas.
— Lembra-se do nosso Halloween de 95? Sua mãe te vestiu de
Frankenstein, mas por ter te enfaixado demais, você ficou parecendo uma
múmia!
— Você caiu e ralou os joelhos.
— Papai fez curativos nos meus joelhos.
— E você comeu doces até dar dor de barriga!
— Você também!
— Ficamos dias de cama.
— Você fugiu lá para o trailer umas duas vezes!
— Fazíamos coco juntos!
— Ai Noah! Precisava lembrar-se disso?
— Mas era, ora!
Acabamos por rir, Noah tem uma memória tão afiada quanto a
minha, mas a bem da verdade, era que naquela época, éramos crianças e
não víamos maldade em nada. Fazíamos literalmente, tudo juntos e depois,
quando terminávamos as necessidades, mamãe nos levava para o lago e nos
dava banho. Noah sempre foi uma criança bem esperta quando se tratava de
achar o rumo do trailer dos meus pais, ele aproveitava que o pai estava nas
redondezas e vinha atrás de mim, quando nos encontrávamos ficávamos
brincando em alguma árvore ou correndo para cima e para baixo, enquanto
mamãe preparava o café, algum tempo se passava até o pai dele nos achar e
se desculpar e levá-lo dando-lhe sermões, mas o pai dele sempre foi bem
tranquilo, daquele tipo de pai que apoiava o filho em tudo.
— Conheço o seu corpinho dos pés a cabeça!
Falando isso ele começa a beijar o meu pescoço com carinho. Seus
beijos me provocam arrepios, enfio meus dedos em seus cabelos curtos e
trago sua boca pra minha, gosto de beijar o Noah. Gosto muito mesmo de
beijá-lo! Acho que nunca gostei tanto de beijar alguém antes.
— Ai Sam... Não me beija assim!
— Por que não? Eu gosto!
— Você está chupando a minha língua, querida!
— Não pode?
Afasto-me sem graça, Noah sobe o corpo e fica deitado entre as
minhas pernas, fico vermelha ao sentir sua firmeza entre as coxas, ele está
duro... muito duro.
— Isso responde a sua pergunta?
— Quer fazer xixi?
— Não tem a ver com xixi querida.
— Ah!
É um pouco difícil de acreditar que ele esteja realmente assim por
minha conta, Noah está excitado por minha causa!
— O que é Sam? Você não gostou? Estou te desrespeitando?
— Não é isso, é que eu... nunca... ninguém nunca demonstrou se
sentir assim por mim, por isso.
— Fala excitado? — As sobrancelhas dele se erguem e percebo
uma verdadeira surpresa em sua face. Seus olhos se enchem de um misto de
confusões ou coisa assim, Noah fica constrangido e percebo isso na cara
dele. Ele sai de cima de mim e vejo um pouco de incerteza em seu olhar.
— Porra Sam! Você... cacete!
Não entendo o que ele quer dizer, ergo-me e me sento na cama,
Noah se ergue e se senta ao meu lado.
— Você não acha que deveria ter me contado?
— Contado o que?
— Que ainda é virgem! — Coro.
Minhas bochechas queimam. Olho fixamente para o piso velho do
meu quarto. Fico imaginando um mundo onde as coisas para mim sejam
mais fáceis, onde eu consiga realmente ser como as outras pessoas há muito
tempo e nunca consigo. Absolutamente, eu não sou nada do que as outras
pessoas são. Não sei ser como elas, e também, fisicamente acho que o meu
peso extra não me ajude.
— Você me surpreende a cada instante Samantha, é sério!
— Não preciso que ria de mim Noah, eu só estava esperando a
pessoa certa.
— Essa pessoa sou eu!
Mal consigo olhar na cara dele, sinto vergonha.
— Eu não sei.
— Serei eu, eu sou seu namorado! Poxa, merecia saber antes.
— Não é nada demais.
— Está falando da boca pra fora, mas eu não vou te forçar a nada
Sam.
Olho pra ele e tento sorrir.
— Eu sei que não, me desculpe.
— Sam, para com isso! Você não sabe o quanto eu me sinto feliz e
honrado em saber disso, eu amo você!
Noah parece nervoso, percebo que suas mãos tremem um pouco e
fico dura em meu canto, olhando para seus olhos azuis, profundamente
sérios. As palavras me consomem lentamente por dentro, elas me queimam,
fazendo com que eu me sinta a pessoa mais feliz do mundo... Ele acabou de
falar que me ama? Ele acabou de falar que me ama!
— Não me repreenda, por favor, estava com isso entalado dentro do
peito há anos! Não posso mais me enganar, nem esconder isso de mim nem
de ninguém... Samantha Jasmine, eu amo você, não apenas como amiga,
mas também como alguém que quero ao meu lado.
— Noah...
— Te amo.
— Você está tremendo.
— Demorei a vida toda pra conseguir falar isso Sam, porra, como
queria que eu me sentisse?
Sorrio, e sinto vontade de chorar, pulo em cima dele e o beijo sem
me importar com mais nada, não penso duas vezes em dizer um:
— Eu também te amo Noah Isaac King!
Percebo logo que meu beijo tem um gosto salgado, mas as lágrimas
não são de tristeza e sim de alegria, demorei anos pra perceber isso, e acho
que essa é a primeira vez na vida que as coisas realmente são como
deveriam ser. Noah King e eu nos amamos desde... sempre!
KING ME AMA
Fecho os olhos. Estou tão feliz!
Acabo de sair do RH da King, entreguei todos os meus documentos
para a mudança de cargo.
Noah me explicou tudo hoje cedo, antes de pular literalmente pra
fora do meu quarto pela janela, estávamos, de repente, sorrindo e nos
abraçando. Uma hora depois, ele foi me buscar. Mamãe ainda está cismada,
durante o café ela mal falou comigo, mas entendo que talvez para ela seja
difícil acreditar que ele goste realmente de mim... Noah me ama!
Amo Noah. Estou tão feliz!
Donatela me acompanhou, mas há pouco teve que atender uma
urgência em seu setor, ela não me questionou sobre nada e se mostrou
muito feliz com a minha promoção.
Estou no refeitório ajudando o pessoal com os pratos, assim como
ela me pediu e depois de alguns momentos Donatela aparece com um
sorriso imenso nos lábios.
— O senhor King quer te ver agora Sam, ele quer falar sobre o
cargo.
— Ah, claro.
Tiro as luvas e a sigo em silêncio, me sinto um pouquinho ansiosa,
quero ver Noah e agradecê-lo mais uma vez pela oportunidade, quero
conhecer o cargo e me empenhar ao máximo. Nunca vim aqui, é um lugar
que não tem ninguém, me sinto travada.
Mas, tão logo chegamos ao andar da presidência, e de cara vejo na
recepção àquela loira azeda que me destratou no refeitório há algumas
semanas atrás. Donatela me segura pelo braço, como se dissesse: "fique
calma, estou aqui!", e eu sigo em silêncio. Passamos direto, de cabeça
erguida, em direção a uma porta larga de cor preta. As três secretárias usam
uniformes sociais pretos, são mulheres lindas, elas ficam atrás do balcão.
Donatela não fala nada. Passamos direto em direção à porta, de cabeça
erguida. A ante sala é clara e tem uma vista linda de Charlotte.
Passamos por essa porta e ela me deixa numa anti sala um pouco
menor, indica uma porta preta dupla e sorri.
— Estarei te esperando na outra recepção.
— Tá, obrigada.
Fico sentada no sofá de cor preta esperando por Noah, mas ele
começa a demorar. Não sei se é por que estou ansiosa, mas ele realmente
demora. Checo meu celular, quase vinte minutos e nada!
Escuto o som de um berro vindo da sala e dou um pulo, é um berro
feminino, olho para os lados e tenho novamente a impressão de ouvir os
gritos, me aproximo da porta sem fazer barulho. — Acho que ninguém vai
se importar se eu souber quem é a pessoa que grita certo? Afinal é da sala
do Noah!
Abro uma brecha da porta e tento ver. — Ai, sou curiosa, não tem
jeito!
— Você enlouqueceu Noah, você perdeu a noção do perigo
rapazinho!
Senhora Baltimore!
Bem, essa mulher é bem diferente da senhora Baltimore, ela usa um
vestido vermelho, curto e saltos altos, os cabelos estão curtos e mais
dourados do que nunca, ela não é nem metade do corpo da mulher que eu
convivi na minha infância! A mãe do Noah sempre foi gordinha, claro que
não como eu, mas ela era, eu lembro. Ela agora está magra e esbelta, usa até
luvas vermelhas que combinam com o vestido, o rosto imaculado, e a
maquiagem impecável, ela anda de um lado a outro, impaciente diante da
mesa onde Noah está sentado, ele usa o mesmo terno de mais cedo, porém,
está sem paletó e parece irritado ou coisa assim.
— Você vai procurar essa moça e vai terminar esse namoro...
— Eu não vou, mãe!
Sinto que o meu estômago fica girando com a ordem. Sarah
Baltimore, que agora é a senhora King, soa muito mais ameaçadora do que
nunca.
— Você perdeu a noção.
— Eu perdi tempo.
Ele é áspero e objetivo, eu acho que nunca o vi tão sério.
— Essa garota não tem nada a lhe oferecer, ela é gorda e pobre
Noah, os pais dela moravam num trailer!
Essas palavras me machucam profundamente.
— Não tem o direito de falar assim da Sam, ela é muito honesta...
— Ora, vamos! — Sarah faz um gesto exagerado com a mão — Foi
assim com aquela imbecil da Cora.
Cora? Quem é Cora?
— Sam é diferente e sabe disso. Por falar nisso, você não recebeu
algumas cartas há alguns anos no nosso antigo endereço?
Sarah parece pensar, mas é rápida.
— Quem cuida das cartas são os empregados, não tenho tempo pra
isso.
— É que ela me enviou...
— Noah meu filho, escuta a mamãe, você só está carente, a Dy vai
se retratar...
— Mãe eu não amo a Dyanna, eu amo a Sam, quer que eu desenhe?
Algo dentro de mim se revira, sinto vontade de chorar novamente,
ouvi-lo falar isso pra sua mãe de forma tão clara me deixa muito feliz, bem
mais que isso, Noah realmente me ama.
— Já falou com seu pai sobre isso? — Sarah se torna inflexível.
— Sim e ele me apoia.
— Pois eu não.
Noah respira fundo, se aproxima da mãe e coloca as mãos nos
ombros dela, Sarah parece que vai explodir.
— Eu te amo mamãe, mas não pode mais me impedir de ficar com
quem eu quero, eu tentei muito gostar da Dyanna, mas eu não sinto nada
por ela.
— Essa garota só quer nosso dinheiro...
— Sabe que não é verdade mãe, você sabe que a família da Sam
não é assim.
A calma que Noah aparenta é firme e decidida, mesmo que ainda
me sinta magoada com o que Sarah falou pra ele.
— O pai dela é um bêbado! Ela nunca vai se encaixar no nosso
mundo filho, ela será chacota para os jornais.
— Então acho que não devo pertencer a este mundo mãe, pois eu
não quero mais viver num mundo em que a Sam não esteja nele.
Coloco a mão na boca, e lágrimas me vêm à face, Noah beija a
cabeça da mãe.
— Filho, você sabe que se sair daqui não poderá mais contar
conosco certo?
Noah está muito sério quando a encara.
— Tudo bem então...
— Noah você não está falando sério!
— Quem falou foi a senhora não eu, precisa aceitar a Sam mamãe...
— Eu não vou aceitar.
— Então esta não é uma decisão minha!
Agora ele está realmente irritado, eu o vejo pegar o terno, as chaves
e a carteira, ele ainda pega um porta retrato na mesa e arregalo os olhos sem
acreditar.
— Se sair por essa porta, Noah, você deixará de ser meu filho.
— Acho que já faz muitos anos que deixei de ser seu filho senhora
King.
Afasto-me da porta, mas não consigo ficar nessa recepção, seco
minha face e saio dali, vou para a outra sala onde encontro Donatela, ela se
levanta da poltrona e fica me olhando bastante confusa.
— Ele estava demorando, então eu vim pra cá, acho que está com
alguém na sala dele.
— Ah.
Não demora muito e vejo Noah sair da sala me olhando com um
pequeno sorriso nos lábios, mas seus olhos estão avermelhados, abaixo a
cabeça e desvio o olhar, não queria isso, mas acima de tudo me sinto mal
por vê-lo brigando com a mãe por minha culpa.
— Vamos Sam?
— Tá.
Não tenho nada a dizer, Noah segura a minha mão e saímos juntos
do escritório, Donatela logo atrás, quando entramos no elevador a última
cena que eu vejo é de uma senhora King furiosa parada a alguns metros de
distância. Noah me puxa pra ele e me abraça, e fico em silêncio, pois esta é
a melhor coisa que posso fazer, por agora.
APAIXONADA POR KING
Viemos para o apartamento dele.
Noah foi tomar banho, e eu... eu estou sentada no sofá da sala me
corroendo por dentro, a cada segundo me lembro da discussão dele com a
mãe e só me sinto pior, eu não sei como as coisas irão ficar.
Claro que as coisas entre eles não terminaram bem, tenho absoluta
certeza de que ele não está bem com toda a situação, e ainda demoro pra
acreditar que entre o que os pais dele têm a oferecer e eu, ele tenha me
escolhido.
Escolheu a mim.
Uma garota GG, uma pé rapada, alguém com um pai alcoólatra que
não tem tanto dinheiro, — não tanto quanto ele tem hoje — deveria me
sentir feliz com isso? Só que não consigo, fico mais e mais nervosa com
tudo.
— Você nem trocou o uniforme, Jas.
— Ah, eu esqueci.
Realmente, nem deu tempo de pensar, logo que descemos para o
vestiário, apenas peguei a minha bolsa e viemos pra cá.
Noah usa jeans e uma camiseta escura, mas está sem sapatos, ele se
joga ao meu lado no sofá e se deita colocando a cabeça em meu colo ele me
olha e toca a minha face, cheio de carinho.
— Te amo Sam.
— Também te amo.
Me puxa pra baixo e me beija, retribuo o beijo. Noah sorri depois
de alguns instantes, ele segura a minha mão e entrelaça os dedos nos meus.
— O que foi Jas?
— Ouvi a conversa com a sua mãe.
Noah me olha absolutamente concentrado. Eu simplesmente não
consigo esconder a verdade, me sinto muito mal com tudo.
Ele se ergue e se senta ao meu lado, fico olhando para o meio da
sala dele fixamente, lembrando-me da conversa que Noah teve com a mãe
dele, olho para as minhas mãos e algumas lágrimas caem em minha face,
meus lábios tremem um pouco.
— Sam...
— Não quero que se afaste da sua família por minha causa, Noah.
— Foi apenas da boca pra fora, já falei com meu pai.
— Ela não gosta de mim Noah.
— Ela não tem que gostar de você Sam, eu tenho que gostar de
você!
Seco a minha face e o fito, Noah também tem olhos cheios de
lágrimas.
— Não deveria ficar assim... — nego e olho para as minhas mãos
novamente, me sentindo péssima. Parece que estão pisando em meu peito
com força — temos vidas diferentes Noah, você é importante agora.
— Você é importante! — Esclarece magoado — Preciso que aceite
que não será fácil Sam, temos que ficar firmes, sermos fortes.
— Estava muito bom para ser verdade. — digo e seco minha face.
Tento sorrir e tomo uma decisão — Ninguém precisa saber que estamos
juntos não é mesmo?
— Sam...
— Por favor, não quero te expor, nem a mim, eu sei que o meus
pais não são ricos nem nada, temos problemas como qualquer outra família
Noah, mas odiaria que você fosse motivo de chacota por minha causa. —
Corto e sou sincera. Limpo as lágrimas, isso dói pra caramba, por que eu
queria que as coisas fossem diferentes — Ainda podemos nos ver sempre!
Preciso do emprego, só que ninguém saberia.
— Não! — Noah fala concreto.
— Noah...
— Sam, Não! Chega desse assunto. — Interrompe e percebo sua
irritação — Não preciso te esconder, não precisamos disso, já falei com
meu pai, ele me mandou ser feliz, o problema da minha mãe é que ela é
uma enxerida controladora, mas eu já a coloquei no lugar dela, ela não vai
mais interferir.
— Não quero que fiquem brigados...
— Ela já me ligou pedindo desculpas, mamãe sabe muito bem com
quem mexe! Esquece ela! Ela não vai mais interferir no nosso
relacionamento.
Não acredito muito nisso.
— Já faz muito tempo que eu cresci Sam, você não sabe o quanto
foi difícil para mim, ir embora, queria ter vivido todos os momentos com
você, como tínhamos combinado.
— Não acha que eu sou uma ideologia?
Noah se ofende com a minha pergunta e segura a minha mão, de um
jeito muito brusco a puxa e sou puxada pra ele, me beija com tanta força
que perco o ar, depois me fita.
— Para com esse assunto Samantha, é sério, cacete, não vou te
largar, e você não vai terminar comigo.
— Não queria terminar...
— E nem vai!
Esse Noah é mandão, firme.
— Vou fazer pipoca, você vai ver filme comigo no meu quarto, na
minha cama.
Coro e faço sim com a cabeça.
— E se não tiver trazido roupas, não tem problema ficar pelada no
meu apartamento!
— Ai Noah, como você é nojento.
Ele começa a rir, o empurro e levanto do sofá, ele sabe como
estragar o momento, pego minha bolsa, ele levanta, me puxa de novo e me
beija todo carinhoso.
— Te amo Bolinhos.
— Te amo, meu amor.
— Gostei do apelido!
— Eu também.
Depois disso nos beijamos mais uma vez e me afasto até o
banheiro, sei que Noah me observa me afastar, mas não me importo, estou
um pouco mais confiante depois dessa conversa, e espero que as coisas
deem certo entre nós, com ou sem a permissão dos pais dele.
Já conheço bem o apartamento dele, tem dois quartos e apesar de
não ser dos maiores, é bem aconchegante. Liguei para casa, avisei a mamãe
que estava com ele. Queria saber se ela estava bem, ela apenas me explicou
que Donatela e ela decidiram fazer um passeio hoje à noite e que papai foi
pro Boo, mas ela parecia muito feliz em sair, disse que qualquer coisa
avisava e que era pra eu chegar antes das onze. Imagino que depois que
reencontrou sua antiga amiga, mamãe tenha dado um "up" na autoestima
também por que em partes, ela sempre foi muito caseira, não foi pra
faculdade, papai foi, mas desistiu. Ele deveria ter se formado em Educação
Física! Se fosse hoje, com certeza teria emprego fixo, mas sei que ele já
deve estar pesquisando algum, o seguro não vai durar pra sempre!
Tomei um banho agradável no banheiro do outro quarto, vesti a
roupa que saí da King, deixei minha bolsa na poltrona e vim pro quarto do
Noah.
Noah entra no quarto com uma bacia de pipoca e copos enormes
com canudos, me afasto da janela e vou ajudá-lo, ele também trouxe uma
sacola cheia de besteiras — arrumei um namorado que adora comer lixo...
Mas, bem, eu e ele sempre fomos assim, nós dois adorávamos comer
besteiras quando íamos a Barbie, ou quando estávamos juntos e quando
saíamos da escola passávamos na casa de doces da senhorita Wallace, e nos
empanturrávamos de sorvete com jujubas.
— É suco de morango, fiz pra você, Bolinhos!
— Você sabe como agradar uma mulher, King.
Beijo-o suavemente, Noah sorri cheio de malicia.
— Também sei agradar de outras formas, querida!
Estreito os olhos pra ele, e falo:
— Safadeza!
Noah ri, ele sabe que eu nunca vou levar muito a sério essa coisa de
"sedução", apesar de saber que no fundo, ele está tentando muito ser mais
meu namorado do que amigo.
— Tenho que tentar né?
— Você se esforça.
Vamos para cama, é de casal e tem muitos travesseiros, nos
sentamos e Noah deixa a bacia em cima do colchão, coloco os copos no
criado e ele liga a TV imensa, que fica na parede de frente pra cama.
— O que quer assistir?
— O que você quiser! — Pego um pouco de pipoca e começo a
comer.
— Documentários?
Faço uma careta, penso por alguns segundos.
— Coloca “Esqueceram de Mim”!
Ele começa a mexer no controle, tem um desses aplicativos com
internet sem fio que da pra ver séries e filmes na TV, seleciona o filme e se
senta ao meu lado, me encosto-me aos travesseiros, ele abre as sacolas
despejando vários chocolates na cama, me sinto tentada, mas engulo a
vontade de comer e lhe entrego o suco, não posso comer doce com tanta
frequência.
— Comprei pra você, come!
— Depois.
Bebo um pouco do meu suco e como pipoca. Acho que esse foi um
dos primeiros filmes que nós vimos juntos na casa dos pais dele durante um
natal. Meus pais me deixaram passar aquele natal com eles.
— Sam!
— Hum?
— Você anda comendo muito pouco... Venho observando isso nas
vezes que estive com seus pais, isso não é saudável.
Noah segura a minha face me obrigando a olha-lo.
— Não precisa ter medo de engordar, Sam.
— Não quero falar disso.
— Você tem que se alimentar direito!
— Eu me alimento direito.
— Donatela disse que não almoça há dias na empresa.
— Me sinto bem.
— Sam!
— Não tenho fome, é sério! Eu sempre como em casa...
— Sam, você não sabe mentir! Tem que se alimentar direito. Mais
tarde vou preparar algo para nós dois, você e eu. Entendeu?
— Mamãe quer que eu chegue antes das onze.
— Ainda são três da tarde querida!
— Tá bem, mas de verdade... como o chocolate depois!
— Ai de você se não comer.
Faço que sim e o beijo. Realmente não quero falar disso, me sinto
péssima com o meu corpo e estou, pela milésima vez, tentando mudar isso e
ouvir tudo aquilo da mãe dele só reforça o fato de que não me encaixo em
seu mundo. Sei que sou tudo o que ela disse.
— Você é linda Samantha, acho que apenas você não enxerga isso.
— É que quando eu fico em frente ao espelho, todo o meu corpo
toma o espaço diante dele.
Saiu de uma forma tão espontânea...
— O seu corpo toma o espaço que tem que tomar meu amor, ele é
perfeito.
Sorrio mais triste do que feliz ao ouvir isso.
— Você se tornou alguém muito gentil e amável Noah, obrigada por
isso!
— Por falar a verdade?
— Por você ser tão incrível comigo, carinhoso e acima de tudo
compreensivo, eu sei que eu sou meio... durona.
— Gosto de você assim, Sam.
— Apenas... não consigo me sentir bonita com o meu corpo.
— Mas você é.
— Ai, Noah... Casa comigo. Vem cá, me beija!
Abraço-o choramingando, ele sorri e me puxa, derramamos pipoca
na cama, mas não nos importamos, nos beijamos... Ele é tão fofo.
— Você está me pedindo em casamento senhorita?
— Sim... Sim... Sim!
— Eu aceito.
Sorrio e o fito.
— Acho que estou te esmagando...
— Cala a boca Sam, não queira que eu seja estúpido com você!
Agora ele fala bem sério.
— Você tem que parar com isso, tudo em você é delicioso, Sam.
Agora eu fico corada.
— Sua bunda é perfeita, suas coxas... Quero o seu corpo no meu,
você não sabe o quanto me excita!
— Não está excitado agora... E o que me diz, senhor King-louco-
por-garotas-GG?
— Claro! Me aliviei durante o banho.
Nossa!
Noah solta meus cabelos do coque, cheira-os e os toca. Ele parece
tão cheio de sentimentos por mim...
— Te admiro minha linda. Você é uma rainha perto de todas, Sam.
Só você não vê o quanto é linda! No dia do noivado quase enlouqueci
quando te vi com aquele vestido.
— Sério?
— Sério, por que acha que te beijei? Poxa Sam, como é difícil você
perceber as coisas! Sou muito atraído por você querida. Te desejo nesta
cama todas as noites... Quero te mostrar como isso pode ser bom.
— Ainda é cedo, Noah.
— Futuramente, eu espero! Quero seu corpo no meu, quero que
sinta como isso pode ser ótimo pra nós dois.
Isso é... é... maravilhoso!
Sorrio, Noah desliza as mãos até minha bunda e a toca com força,
fico arrepiada dos pés a cabeça.
— Te quero Sam!
— Também te quero Noah.
Ele me beija e voltamos para o nosso pequeno mundo, tudo o que
começamos a construir... Noah King é tudo o que quero agora e para
sempre, não importa o que digam ou façam, sempre irei amá-lo.
BRIGAS
Nós mais namoramos do que assistimos ao filme.
Os beijos de Noah... Indescritíveis.
Às vezes ele me beijava até me deixar sem ar, em outràs vezes, ele
era tão carinhoso comigo que me sentia derretida.
Acabamos dormindo.

Agora, acabo de acordar e sinto cheiro de comida.


Saio da cama dele. A TV está desligada, a janela do apartamento
está aberta, trazendo uma brisa bem leve. Sorrio enquanto aprecio a vista de
uma Charlotte iluminada por luzes coloridas e com um céu estrelado, a
cidade realmente cresceu esses anos.
Não faço ideia de que horas sejam, — acho que umas sete — vou
ao banheiro e lavo meu rosto, me olho no espelho e não me sinto das piores,
meus cabelos estão desarrumados, mas nem ligo, Noah gosta de mexer
neles, estão cumpridos até a altura da cintura, prendo-os num nó no alto da
cabeça e volto para o quarto. Noah está entrando no quarto com uma
bandeja e duas taças finas de vinho. — Pelo cheiro bom, ele que fez... Fico
parada, olhando para o meu melhor amigo de infância.
— Macarrão com creme de queijo — Noah fala como se previsse
meus pensamentos — e pedaços de bacon.
— Meu pedido de casamento ainda está de pé, Noah! — Brinco
bem surpresa. Era um dos nossos pratos prediletos quando crianças.
— Eu já aceitei querida, estou esperando as alianças de noivado!
Noah King esta me jogando charme?!
Acabo por sorrir, volto para cama e Noah coloca a bandeja entre
nós dois, ele me beija cheio de carinho, depois indica minha refeição e eu
pego o prato — havia prometido que comeria, ainda que eu não queira
muito, mas não quero me chatear, não quero ouvir sermões sobre o que
devo comer e ele colocou uma porção razoável também...
— Cheira muito bem!
— Eu só sei fazer isso, confesso que sou uma derrota na cozinha...
E você, Bolinhos?
— Eu sei cozinhar. Mamãe me ensinou, mesmo que não precise
muito! Aos domingos ela gosta de descansar e papai adora peixe frito.
Então, sei fazer alguns pratos frios, mas nada demais.
— Mas não me deixaria passar fome, certo?
Começo a sorrir, pego meu garfo e inicio a refeição. O macarrão
está leve e cremoso, uma delícia! Minha boca se enche d'água com a
primeira garfada.
— Tenho uma funcionária que cozinha pra mim em Nova York.
— Deve ser legal poder ter pessoas que te servem sempre!
— É bom, mas se tornou apenas algo que eu preciso. Às vezes me
canso de tantos compromissos.
— Você se tornou muito ocupado?
— Você não sabe o quanto!
Nunca imaginei o Noah de terno e gravata, um executivo. Ele
sempre foi tão parecido com alguém que gosta de humanas, com a
paciência que tinha para ensinar as coisas para as pessoas, pensei que se
tornaria professor.
— Gosta do que faz?
— É legal, têm suas vantagens! Você pensa em fazer o que?
— Eu ainda não sei, não tem nada que eu possa falar que goste
muito. Sempre trabalhei de garçonete, babá, faxineira... Essas coisas! Eu
gosto de trabalhar no pesado.
Noah me olha e sei que quer falar algo, mas não fala, acho que não
gostou do que eu disse. Ir para a faculdade se tornou um sonho distante pra
mim há muitos anos! Nunca pensei nisso. A vontade veio quando Noah foi
embora, mas depois ela foi embora por que haviam mais motivos pra ficar...
Meus pais.
Hoje não penso tanto nisso, só quero ter dinheiro para ajudar com as contas
de casa e comprar as coisinhas pra minha mãe, nunca fui muito ambiciosa.
— Se conformaria se fosse do lar como sua mãe?
— Acho que sim. Eu gosto do serviço de casa, mas também gosto
de ter um salário só meu.
— Tem que ter mais ambição, Sam.
Eu o fito e penso bem antes de falar.
— Não consigo me imaginar longe deles, apenas isso.
— Em algum momento terá que deixa-los, Sam.
Queria não ter ouvido isso de você!
Minha mãe está com câncer, isso já é bem assustador pra mim,
também acho que com o passar dos anos se tornou muito cômodo e bom
estar com eles, apesar de eu já estar numa idade em que a maioria das
garotas já se casou e têm filhos, a maioria delas já se formou e tem alguma
profissão. Tento não pensar nisso, ainda mais agora que mamãe precisa
tanto de mim.
— E se... Se um dia nós dois... você sabe!
— Fala sobre ter... relações?
Mal consigo olhar na cara dele, Noah toca minha face com carinho.
— Estava falando se você realmente quiser casar comigo Sam...
Como faremos?
Eu o fito, paralisada no meu canto, Noah sorri nervoso, depois ele
se inclina e me beija suavemente.
— Quero te levar pra todos os lugares, quero que esteja comigo em
todos os lugares!
— Casar? — Meu cérebro parou nessa palavra.
— É Sam, casar, ter uma família.
— Noah...
— Não diz que é cedo pra isso, tá bem?
Ele respira fundo, seu olhar parece torturado, olho pra baixo e
percebo que Noah ficou triste com a minha reação, talvez ele esperasse que
eu ficasse feliz com isso, não é que eu não tenha ficado, mas ainda acho
rápido.
— Tem uma coisa sobre mim que não te disse...
— Por favor, só não me diz que está com câncer terminal. — Peço e
aperto os olhos interrompendo-o.
Escuto uma risada, eu o encaro um pouco amedrontada, e vejo em
seus lábios um sorriso largo e lindo, ele nega com a cabeça e novamente ri,
me sinto idiota.
— Mas é que quando o santo é bom demais...
— Bem, você quer que eu fale de um jeito delicado ou quer ter uma
conversa franca?
Ele bebe um pouco de vinho, eu o acompanho, sei que essa
conversa é bem importante, ainda estou constrangida com a minha grande
ideia de que ele talvez tivesse um câncer terminal, mas nem sei, eu
realmente mal acredito que tudo isso esteja acontecendo conosco.
— Não gostaria que as coisas entre nós dois fossem como tem sido
pra mim, Sam.
— E como tem sido pra você?
— Me relaciono logo de cara com a pessoa.
Ainda não entendo, Noah se inclina e me olha cheio de malicia.
— Transo, faço sexo.
— Ah!
Sorrio revirando os olhos, preciso beber um pouco do meu vinho
também.
— Você é muito fácil, Noah.
— Eu sou homem, é bem diferente!
— Desculpinha básica pra ficar usando o taco né?
— Com ciúmes?
Não quero que perceba, mas sim, estou, e está começando a me
deixar um tanto irritada o assunto. Ele mal começou, porém pensar em
Noah com outras mulheres... Isso não é nada legal.
— Não quero que perca assim do nada, — ele é cuidadoso ao falar
— podemos esperar até que nós realmente tenhamos a certeza de que
queremos ficar juntos.
— Eu não quero casar, Noah.
— Mas eu não quero tirar sua virgindade sem estar casado com
você!
Nossa.
— Por quê?
— Porque você é importante.
Sei que estou completamente vermelha. Noah toca a minha face
com carinho.
— Sou cristão Sam, e também sou homem, quero juntar o útil ao
agradável.
— Não nos vemos há anos.
— Me diz algo sobre você que eu não saiba, Sam? Me diz quantas
chances teremos para ser felizes juntos? Não quero perder a minha chance
de ser feliz com você.
— É muito rápido.
— É o melhor e o certo.
— Quanto tempo ficou com a Dyanna para poderem noivar?
— Oito meses.
— Só isso?
— Eu não sou tão namorador Sam! Tive a minha fase, mas já estou
com 27 anos, tenho negócios, e a última coisa da qual preciso agora é farra.
Quero alguém ao meu lado, que seja minha incondicionalmente.
— Era assim que desejava a Dyanna?
— Dyanna era mais como algo que eu tinha que ter, não era
exatamente o que eu queria ter.
— E eu sou o que?
— Apenas te amo, Samantha, e te quero na minha vida todos os
dias desde que voltei.
A resposta me paralisa, mas tenho mais perguntas.
— Por que não veio antes?
— Havia adormecido em mim o sentimento, não havia motivos
suficientes, estava focado nos negócios da empresa, no que meus pais
queriam.
— Noah, talvez esteja se precipitando!
— Sam eu não estou, poxa, eu já disse, apenas confie em mim.
— Não quero casar.
— Não posso ter relações com você sem estarmos casados.
— Então não teremos relações.
— Do que tem medo?
— De que vá embora, de que se afaste de mim e de que mais uma
vez me machuque tanto que isso destrua meu amor próprio, minha vontade
de continuar, que me isole tanto que faça com que eu me sinta solitária e
inútil para as pessoas, alguém vazia que não tem nada a oferecer a ninguém,
nem a ela mesma.
Noah desvia o olhar, machucado com a minha resposta, mas estou
sendo mais sincera que nunca, eu o amo, mas tenho tanto medo disso, ele
precisa entender.
— Me perdoe então, Sam, eu não irei embora. Casamento é algo
muito sério.
— Namoro e amizade também!
— Você não sabe o quanto eu queria ter ficado, o quanto queria não
ter feito aquilo.
— Então por que fez?
— Achei que fosse o melhor, mas com aquilo só te magoei mais e
mais.
— Perdeu com Jane?
— Sim.
Olho para as minhas mãos, perdi o apetite. Noah levanta segurando
a bandeja.
— Quer que eu te leve?
Ele se magoou e não entendo por que, eu também estou muito
magoada com o que acabo de ouvir, Noah diz que me ama, mas perdeu a
virgindade com a garota que eu mais odiava na escola, Jane Collins, não sei
por que ele fica chateado comigo! Decido não discutir também.
— Não precisa. Eu vou de taxi.
— Sam...
— Shiu! — Ergo o dedo do limite — Eu sou adulta e sei ir pra casa,
nos vemos amanhã na empresa Noah, tchau.
Saio do quarto bem antes que ele responda. Ainda tenho dificuldade
em pensar direito, mais uma briga, não exatamente, mas isso me servirá de
reflexão por essa noite.
OS PEDIDOS DE KING... OPS,
BALTIMORE!
— Você está muito calada, filha.
— É impressão sua, mãe.
— Ele não veio mais aqui, por quê?
Deve ter percebido que a ideia de casamento é uma loucura e que
estar comigo é o maior erro da vida dele.
— Ele trabalha, mãe.
— Sam, você está abatida e com olheiras, anda comendo na
empresa?
— Sim mãe, como sim. Eu vou limpar o jardim!
Não vejo o Noah há quatro dias.
Depois da nossa pequena briguinha, no dia seguinte, Donatela me
falou que ele teve que viajar para Nova York, algo importante da empresa,
depois disso não tive mais notícias dele.
Noah não ligou para minha casa nem para o meu celular, e nem
mandou mensagem, ele tem os meus números... Ele não se despediu nem
avisou que viajaria.
Fiquei triste no primeiro dia, pois foi a minha oficialização como
assistente dele na King. Donatela me mostrou a salinha onde eu iria ficar, é
um lugar até espaçoso com mesa e vários porta arquivos, depois me
explicou como seria minha função, levar pastas, atender telefones, nada
demais, muito fácil! A minha sala é uma ante sala da sala do Noah, então,
não me senti das piores.
Nos dias seguintes, Donatela me levou de volta para a cozinha, ela
ainda não tinha ordens para me deixar na função, então dia após dia, eu
fiquei esperando por notícias dele e... nada.
Me enfiei de cara no trabalho e disse pra eu mesma que não
adiantava me sentir daquela forma, eu apenas fui eu mesma e expus como
me sentia. Noah precisava saber que eu não quero casar, na verdade nem
agora e nem tão cedo! Também, as coisas pra mim não são assim, de uma
hora pra outra.
Apesar de sofrer um pouco com sua distância — claramente visível
— eu fiquei mais na minha, todas as tardes quando chegava do trabalho
estava me ocupando aqui em casa, ontem tive que ir buscar papai no Boo,
foi complicado, ele estava pra lá de Bagdá, e hoje, como mamãe quer
descontar a bebedeira dele de ontem na raiva, eu a acompanhei a químio.
Não foi fácil. O cabelo dela começou a cair, mamãe já falou com a
médica na hora, levaram-na para uma salinha do hospital e ela optou por
raspar a cabeça, chorei e sofri em silêncio, o médico disse que é normal
para o paciente, neste estágio do câncer, de os cabelos caírem, mas me senti
péssima. Mamãe sorriu mais querendo chorar que tudo. Agora, no lugar de
seus cabelos, tem um lenço colorido amarrado na cabeça. Ela está fraca,
mas não se dá por vencida e está preparando um café.
— Filha...
— Mãe, eu estou bem, ok?
Seco minha face. Não quero que ela me veja chorando, mas é que
tem hora que eu canso de ser eu mesma, eu canso de ter a vida que tenho, e
eu canso de sempre acabar afastando todo mundo com o meu jeito.
Eu sei por que o Noah foi embora e nem se despediu ou avisou,
sinto medo de que ele não volte, sinto tanto medo disso que nem sei como
agir, mas tenho absoluta certeza que a minha recusa foi o suficiente pra ele
querer se afastar, pra ele não querer permanecer por perto.
— Samantha... — Mamãe se senta na cadeira diante da minha —
ele te tratou mal? Brigaram?
— Nós dois apenas não combinamos, mãe, Noah e eu... crescemos
— explico com cuidado. — Não se preocupe com isso, vai passar.
— Ele foi embora, não foi? — mamãe pergunta magoada — Poxa
filha, sinto muito.
Sei que no fundo, apesar dela ter falado aquelas coisas, mamãe me
quer bem. Ela sabia que se eu continuasse com o Noah talvez eu fosse feliz,
eu mesma estava muito alegre com a presença dele aqui.
— Samantha, precisa entender que agora, Noah é um grande
empresário, ele tem muito dinheiro, e talvez o que tenha para oferecer a ele
não seja o suficiente.
— Foi o que deu a entender mãe, no primeiro problema ele já foi
embora, — nego com a cabeça, fungo — pelo ou menos deu pra sonhar um
pouquinho.
— Por que não liga pro Ty? Afinal sempre foram amigos...
— O Ty está viajando — recebi uma mensagem dele ontem, várias
na verdade, foi pra Jersey a trabalho — ele volta no domingo, acho que vem
me ver.
— Contei pra Donatela.
Mamãe tira o lenço da cabeça e vejo a mulher que mais amo em
toda a minha existência com a cabeça raspada, os olhos fundos, o semblante
pálido, ela não tem vergonha, mas sei que boa parte de sua pouca vaidade se
foi com isso. Mamãe não merecia essa doença, ninguém por pior que seja
merece.
— Podemos comprar perucas — mamãe sugere com lágrimas nos
olhos.
— É!
Levanto da cadeira e dou a volta na mesa, quero que ela saiba que a
apoio, que a amo, e que não tem nada pior do que vê-la assim, abatida, tão
diferente da mulher que me deu a luz, que eu vi com cabelos negros e
compridos, em outras épocas seus cabelos batiam nos ombros, e até alguns
dias atrás, tinha os cabelos mais curtos; a imagem de uma mulher de olhos
escuros e bochechas rosadas, minha mãe.
Quando a abraço encontro aqui o meu refúgio, choro um pouco,
estou tão machucada, tão lotada.
— A mamãe te ama, Sam.
— Eu te amo mamãe.
Nunca tive tanto medo de perder mamãe. A situação com Noah me
fragiliza, mas a minha mãe... o sentimento é forte demais.
— Quero que me ajude com as roupas da máquina.
— Tá mãe, eu estendo, você tem que descansar.
— Arrume a espreguiçadeira dos fundos pra mim.
Levanto-me e termino de preparar o café, a angústia me queima
toda dos pés a cabeça, eu não aguento ver a minha mãe assim, parece que
tudo estava dando certo, até Noah reaparecer na minha vida! Se ele não
tivesse voltado eu estaria frágil, mas não tão... quebrada, sem esperanças.
Saímos para os fundos, arrumo a espreguiçadeira para mamãe, ela
se deita e jogo um cobertor em cima dela, dou-lhe um beijo na cabeça —
ela não colocou o lenço — vou até a máquina e pego as roupas, coloco na
bacia e levo para o varal, nosso quintal é razoavelmente grande, ao menos
papai limpou tudo e começou a pintar a cerca. Aposto que ele está no Boo,
se estivesse em casa já teria descido.
Mamãe liga seu velho rádio a pilhas, ela serve café para nós duas,
mas sei que o dela, ela não vai conseguir beber nem um gole, ela vomita
muito depois das sessões. Neste momento, se encolhe toda embaixo do
cobertor, os calafrios também são comuns e a falta de apetite também.
Começo a estender as roupas, mamãe se esforça muito para manter-
se ativa. Eu a olho de relance, percebo que está ouvindo "Aleluia" na voz de
Damien Rice em seu pequeno rádio, e sei que esta é uma música que a
fortalece muito. Gostaria de fazer algo para aliviar a doença dela, para tirá-
la, pra que mamãe melhorasse de uma hora para outra, como quando a
gente gripa e toma remédios, dias depois sara... Mas, em seu caso sei que
isso não é tão fácil, possivelmente a longo prazo ela conseguirá se
reestruturar.
Depois de alguns instantes, após terminar de estender as roupas,
mamãe está parada ao meu lado com o cobertor nos ombros. A brisa sopra
os nossos lençóis de cama para o oeste, ela sorri com os olhos fechados e
respira fundo, sinto novamente vontade de chorar em vê-la tão diferente do
que sempre foi.
— Não chore Sam, os ventos ainda sopram para o Oeste.
Mamãe sempre me dizia essa frase quando passávamos por maus
bocados, ou em qualquer momento em que precisava de seus cuidados.
Sorrio entre lágrimas e toco sua face — não sei como Noah poderia me
pedir pra deixá-la... Eu não conseguiria... Não conseguiria deixar a minha
mãe para trás, não deixaria ela se quer pensar em viver sozinha,
simplesmente por que ela precisa de mim, eu a amo, e isso, não tem nada
nem ninguém que faça por nós, por ela, por mim. Sempre fomos uma pela
outra, em todas as dificuldades, até quando não tínhamos o que comer,
mamãe estava lá, tentando conseguir o que podia para mim.
— Eu gostei do corte mamãe, — toco o lugar onde há algumas
horas atrás, ainda tinha cabelos — ficou exótica.
— Eu sei! — Mamãe sorri com lágrimas nos olhos.
Sou muito mais alta que ela, beijo o topo de sua cabeça, e a abraço
chorando muito, por que não queria ter que vê-la assim.
— Lily?!
Olho pra varanda dos fundos e vejo o meu pai se aproximando todo
preocupado, as lágrimas não me impedem de ver a imagem da figura alta,
parada perto da porta, usando terno escuro — reconheceria esse olhar em
qualquer lugar que eu fosse.
— Lily! — Papai fala com cara de choro. Ele cheira a álcool —
Poxa vida querida.
Sinto um ódio do meu pai quando ele faz isso, faz tudo errado
depois enche a cara e usa isso como desculpa pra dizer que está depressivo,
e ainda que os fins não justifiquem os meios ele sempre se safa, mas só
acho que a minha mãe perdoa por que o ama, entende ele de um jeito que eu
jamais vou entender. Papai toca a face dela e começa a chorar, e eu sei que
ele está tão ou mais magoado que eu por conta disso.
— Estou bem Samuel. — mamãe retruca — Pare com isso, eu não
esqueci o que fez ontem.
— Nem eu. Minhas costas ainda doem, — reclamo e seco minha
face com força — estava no Boo?
— Não, eu estava dormindo.
— Está fedendo a álcool, pai!
— Eu não tomei banho, ou esqueceu que me deixou dormindo do
banheiro?
Pensei que ele havia levantado e tomado banho, deixei ele no
banheiro do corredor, dentro do box, mas a considerar pelo estado de
embriagues, é compreensível que não tivesse acordado. E como encontrei
mamãe no hospital, eu mal parei pra me lembrar dele.
— Vai tomar banho! — Mamãe fala um pouco envergonhada —
Noah.
— Senhora M. — sua voz está próxima — Algum problema?
— Nenhum! — mamãe responde e sorri — Não sabia que viria.
— Eu cheguei agora de Viagem. — explica muito calmamente e me
olha repreensivo — Você... não me disse que sua mãe está doente, Sam.
— Eu não gosto que fiquem falando. — Mamãe justifica. — Já
estou me tratando.
— Eu mesmo vou cuidar disso senhora M.
Acontece que ninguém pediu sua ajuda.
— Vai tomar banho! — Mamãe fala para papai.
— Vem. — Papai sai puxando ela — Querida, me perdoe?
Cínico. Hipócrita.
Eu amo o meu pai, mas tem hora que da uma vontade de...
— Acabei de chegar, e vim direto te ver, tudo bem Sam?
— É, indo!
Cruzo os braços, não estou tão irritada quanto magoada, ficamos
nos olhando por alguns instantes longos.
— Eu fui à Nova York, conversei com meus pais sobre nosso
casamento.
Meu estômago gela, meu coração parece que vai sair pela garganta.
— Minha mãe fez a cabeça do meu pai e ele me pediu pra escolher
entre a empresa e você.
— Noah...
— Me escuta, está bem?
Faço que sim, tenho alternativa?
Indico a varanda e vamos para os degraus, nos sentamos de frente
um para o outro.
— A viagem foi por que minha mãe me ligou dizendo que estava
passando mal, quando cheguei lá Dyanna e ela estavam no meu
apartamento, meu pai, eles queriam que eu voltasse com ela, foi uma briga
sem fim! Expliquei que estamos juntos, Dyanna foi embora e meus pais
começaram a jogar coisas na minha cara. — Noah fala bastante sério — Eu
disse que não vou te largar e meu pai me mandou escolher, disse que eu não
precisava contar com ele pra nada.
Não consigo emitir som algum.
— Tenho alguns bens, mas tive que vender tudo. Eu sai da King,
agora vou trabalhar por conta.
— Noah...
— Escuta, se eu ficasse na empresa eu não poderia estar sempre
aqui Sam, nem com você. Agora eu entendo por que não quer sair daqui, te
julguei tão mal, deveria saber que tinha seus motivos e que eram
importantes... Seus pais precisam de você, Sam.
— Desculpe, — digo sincera — também fui grosseira com você.
— Não foi Sam. Enfim, meus pais não aceitaram, me demiti da
empresa, coloquei meus imóveis a venda e voltei, vou montar um pequeno
negócio na empresa, com meu nome, Baltimore.
— Não deveria ter feito isso!
— Pensei em nos casarmos em cinco meses, o que acha?
Noah enfia a mão no bolso e retira de lá uma caixinha. Esqueço de
respirar neste instante.
— Espero que a resposta seja sim!
— Noah...
— Sim?
Eu o olho, a mão dele treme, e abre a caixinha, olho pra varanda
dos fundos da minha casa, para o quintal, para tudo isso, depois pra ele.
— Você vai morar aqui comigo... e com a minha família?
— A minha resposta é sim!
— Então Noah Baltimore, a minha resposta também é Sim!
CONCLUSÕES
— Mãe...
Noah e eu entramos na sala de mãos dadas. Mamãe está deitada no
sofá, toda encolhida, ela está sonolenta, papai acabou de subir para tomar
banho.
Antes de tomar qualquer decisão, quero conversar com ela pra que tudo
fique bem claro, mas apenas ela, Noah e eu.
— Fiz chá. — lhe estendo a caneca de chá de camomila — Algum
enjoo?
— Só cansaço mesmo. — Afirma mamãe se erguendo, seu
semblante é pacífico — Então... o rapazinho decidiu aparecer.
— Estava resolvendo algumas coisas. — Noah justifica sem jeito
— Gostaria de conversar com a senhora e o senhor M, juntos.
— Acho que ele não demora. — Mamãe aceita a caneca de chá e
nos sentamos no sofá de frente para o dela — Sam está deprimida, Noah.
Você não pode sumir assim.
Sabia que ela não deixaria isso barato...
— Eu sei, e peço desculpas por tudo, é que eu estou deixando Nova
York e quero me mudar definitivamente pra cá, estava organizando minha
mudança. Não vejo sentido em continuar na empresa dos meus pais —
Noah explica e segura a minha mão, a mão dele está gelada, soada e
tremula, ele está nervoso — Sam vai sair da King também, nós dois
decidimos juntos.
E pelo olhar dela, não gostou da ideia.
— Vendi meus imóveis, e com o dinheiro poderei investir em
alguma coisa pra mim. Quero que Sam venha trabalhar pra mim.
— Bem, se ela quiser...
— Eu mesmo pagarei seu tratamento — Noah fala — pode ficar
tranquila, quanto a isso não tem problemas.
— Seria pedir demais, Noah.
— Sabe senhora M, chega um momento na vida em que o orgulho
não nos vale de nada. Gostaria também de pedir a mão da Samantha
Jasmine em casamento.
Isso é constrangedor.
Mamãe bebe o chá como se isso fosse bem forçado, Noah a olha
bastante sério.
— Sam e eu nos amamos e não queremos ficar longe um do outro.
— É cedo para isso...
— Não quero esperar. — Noah interrompe — E, como vendi tudo,
também lhe peço moradia aqui, queremos nos casar e morar aqui com
vocês.
Nossa! Disso eu não sabia.
Mamãe me olha espantada depois faz que não com a cabeça.
— Jamais pediria que morassem aqui depois de casados.
— A senhora precisa de cuidados. Sam quer ficar perto de vocês,
ela não quer mudar daqui.
— Ora, mas... não há espaço para os dois aqui! Samuel e eu sempre
pensamos que um dia ela iria se casar e iria ter a própria casa.
— Precisa de ajuda mãe, ao menos agora — replico séria — e eu
não vou embora.
— Não podem namorar?
— Sim, claro. Esperaremos cinco meses, até que eu monte a
empresa e tudo mais.
— E pensa em fazer o que?
— Uma empresa de consultoria, nada grande demais. Sou
especialista na área! Seria mais viável que morássemos aqui esse tempo,
também havia pensado em mudarmos para o meu apartamento no centro,
mas é longe daqui.
Mamãe me analisa e estou coberta de vergonha. Não faço ideia do
que ela pensa agora, sei que a última palavra sempre é dela, papai é um
banana mesmo, e ele vem perdendo bastante a moral depois que começou a
beber demais.
— Os vizinhos falariam se morassem aqui e não fossem casados.
— Por mim me casaria amanhã, mas a Sam tem medo.
— Você está gravida Sam?
— Não mãe! Nossa! — falo nervosamente — Não estou não,
apenas queremos ficar juntos.
Ela suspira e pensa por alguns instantes.
— Também não posso falar nada, conheci seu pai e três meses
depois nos casamos. Claro que não tínhamos muito, sempre foi pouco,
mas... enfim, era o suficiente.
Mamãe sorri e nos olha com um tipo de orgulho bobo, me sinto tão
idiota.
— Por mim tudo bem, pode vir! Onde comem três, comem quatro.
Minha mãe sempre dizia.
— Não precisa se preocupar, eu ajudo com o que precisar! — Noah
responde e seus ombros caem em alivio — Podemos... dormir... no mesmo
quarto?
— Como se já não estivessem fazendo isso não é mesmo? —
pergunta mamãe cheia de veneno, Noah fica vermelho feito carmim, e eu
coberta de vergonha — Ou é um gato que escala a escadinha da casa?
Ele não responde, fico olhando para o chão, morta de vergonha. —
Nossa, minha mãe não dorme?
— Vou levar a Sam numa ginecologista...
— Mãe!
— Se ele quiser ficar, será sob as minhas condições!
Fico inquieta e cruzo os braços, irritada. — Não gostei disso.
— Ela vai começar a tomar anticoncepcional. Não queremos bebês
antes do casamento! Não vejo problema em te deixar ficar, Noah, mas acho
que já percebeu que não somos ricos como sua mãe.
— Isso é algo que não me importa. Eu gosto desse lugar, e logo que
a senhora se curar, eu e Sam mudaremos para minha antiga casa, não é
muito longe daqui.
— Sua mãe não vendeu?
— Vendeu, mas comprei de volta.
Estou surpresa.
— Vou reformá-la para nós.
Ele fez tudo de caso pensado.
— Então está combinado! — Mamãe afirma com um sorriso largo
— Parece que uma pequena raivosa vai se casar!
— Ai mãe...
— Podemos preparar um jantar oficial de noivado, Jas. — Mamãe
fala um pouco mais alegre — Hoje à noite que tal?
— Pode ser.
Noah retira a caixinha da bolsa e a abre, mamãe fica bem surpresa,
logo em seguida ele retira o anel de brilhantes da caixinha e coloca em meu
dedo com cuidado, ele ergue a minha mão e a beija.
— Eu perdi alguma coisa? — Papai desce as escadas apressado.
— Sente-se aqui Samuel, temos muito a falar...
Levanto-me e puxo a mão de Noah, — já fizemos nossa parte —
subimos para o meu quarto correndo, estou me contendo, há tanta felicidade
em mim que parece que irei explodir!
Ao entramos no quarto, Noah me puxa e me beija — sei que a partir de hoje
este será o nosso novo quarto, não apenas meu, e estou mais feliz que nunca
com isso!
COM NOAH POR PERTO, TUDO
MUDA!
— Acorda, preguiçosa!
— Ai Noah, me deixa dormir.
— Não!
Noah me aperta e me deito de bruços emburrada, ele vem e se deita
em cima de mim, fica cheirando meu pescoço e meus cabelos. — Sorrio ao
me recordar do sorriso da minha mãe, da felicidade estampada em seu
rosto. Ela realmente está feliz por mim e Noah, ela nos quer bem! Durante o
jantar, mamãe estava alegrinha e mais animada, papai ainda parecia lidar
com a ideia, mas até aceitou bem tudo.
Mamãe fez lasanha, eu a ajudei enquanto papai e Noah
conversavam na cozinha, o jantar foi simples e sem muita cerimônia, mas
apenas em vê-la melhor, eu me sentia muito mais feliz... mais contente.
— Sammmm...
— Ai Meu Deus! Como você é chato!
— Eu quero comer.
— Ainda são seis horas!
— Eu acordo esse horário pra malhar.
Noah malha?
— Então basta que se levante e vá "malhar".
— Mas eu quero comerrrr.
Odeio quando ele fala cantando. Pelo visto não perdeu a mania,
essa vozinha chata e insistente de quando quer alguma coisa me irrita.
Ele se afasta e eu me ergo. Sento na cama de costas para ele e Noah
toca as minhas costas, uso um conjunto de moletom, assim como ele.
Ontem, depois do jantar ele tomou banho no banheiro do corredor e eu no
meu, depois veio para o meu quarto e fomos dormir agarradinhos, estava
tão feliz com tudo... — Ainda estou!
— Bom dia, Bolinhos. — fala e carinhoso me puxa de volta pra
cama, vem pra cima de mim e me beija de leve — Obrigado por aceitar,
Sam.
— Obrigada por ficar Noah. — Sorrio e toco a face dele devagar —
Tem... Tem certeza que quer mesmo morar aqui?
— Sim, absoluta. Quero poder viver a vida que desejo e não o que
os meus pais querem pra mim, quero ser feliz com você Sam.
— Fiquei com tanto medo de que não voltasse.
— Desculpe, mas o que eu tinha pra resolver lá foi muito
estressante.
Não falamos ainda sobre isso.
Ele toca minha face com carinho.
— Sua mãe não me aceita por que eu sou...
— Shiu. Agora não Sam! Não é sobre você, é sobre o que eu
realmente quero. Mamãe é controladora, ela quer escolher até as minhas
cuecas!
— Claro, ela quer o seu bem...
— Ela quer o que ela acha que é bom pra ela, para a reputação dela
e do nome de Arthur. Já faz muito tempo que ela deixou de ser àquela mãe
atenciosa e amável, Sam. Gostaria que ela não fosse assim sabe.
Não sabia que a senhora Baltimore havia ficado assim! Ela sempre
foi tão gentil comigo, bondosa, e realmente é assustador ver que apesar da
semelhança física entre a mãe de Noah e aquela mulher que berrava na sala
dele de forma autoritária, ambas são muito diferentes.
— Isso não tem a ver apenas com o fato de que te escolhi, Sam.
Acho que a minha mãe se acostumou muito mal com o fato de que eu
sempre a obedeci. Desde que meu pai morreu, sempre fiquei do lado dela,
mas isso mudou muito depois que ela começou a desejar ser muito mais
uma King do que a minha mãe.
— Eu imagino que ter dinheiro seja uma grade responsabilidade.
— É uma responsabilidade que eu não quero mais pra minha vida.
Não vou pagar o preço por ser parte do que ela quer. Arthur realmente se
empenha em querer ser meu pai, mas isso não muda o fato de que ele é
manipulado pela minha mãe.
— Você não gosta da vida de homem rico?
— Gosto. Seria muito cinismo dizer que não, é muito bom ter as
coisas, conhecer lugares, poder ter conforto, mas eu realmente me sinto
meio deslocado em relação a tudo isso.
— Tipo: é bom, mas não é bom!
— É bem isso!
Noah sorri e aperta o meu nariz, fico vermelha.
— Não imagino as dificuldades que passaram neste tempo Sam. Me
perdoe falar, mas seu pai... Ele deveria mudar a postura dele.
— É difícil sabe? Quem está de fora acha que curar um alcoólatra é
algo muito fácil, mas não é. Papai acha normal beber durante a semana, eu e
mamãe já tentamos de tudo, mas quando ele quer beber ninguém segura ele.
— Nunca procuraram o... A.A[2]?
— Não precisa ter medo de falar Noah, mas não, nunca
procuramos. Mamãe não enxerga isso como uma doença, ela sempre apoia
ele, e agora com a doença dela tenho muito receio de aborrecê-la, o câncer
está num estagio inicial e o tumor é benigno, mas o estado emocional
interfere em muito.
— Deveria ter me dito.
Sei que sim, mas não achava que deveria.
— Gostaria que não sentisse pena de nós Noah, acho que já viu que
somos humildes. Eu tive que trabalhar muito com o meu pai pra comprar
esta casa de volta e, apesar de tudo, ele sempre trabalhou, e é honesto.
— Eu sei que o vício nunca mudou o caráter do seu pai, ele parece
o mesmo. Sua mãe também, mandona como você!
— Mamãe pode ser tudo, mas injusta ela não é.
— Não havia entendido sua recusa. Não tinha apenas receio de que
eu a largasse Sam, você realmente não queria deixar seus pais pra trás, pois
os dois sempre dependeram muito de você. Você é uma batalhadora! Estou
tão orgulhoso de você.
Estou vermelha feito um tomate.
— Acho que apenas não teve as chances certas nos empregos
certos. Ainda quero que estude, eu mesmo pago sua bolsa. Quero que venha
trabalhar comigo, quero tantas coisas com você Sam, viajar, te levar a tantos
lugares.
— Temos que economizar! — Essa frase foi a que eu ouvi a vida
toda do meu pai — Talvez quando eu estiver trabalhando e já recebendo o
meu salário.
Noah fica me olhando como se não entendesse minha sugestão.
— É que suponho que agora que não tem o amparo dos seus pais, as
coisas fiquem mais apertadas pra nós. Acabou de comprar a casa para nós
dois, e eu quero reformá-la antes de mudarmos pra lá. — Explico sem graça
— Eu sei que vai ser difícil Noah, não tenho mesmo muito a oferecer,
somos mais humildes, mas eu tenho muita vontade de trabalhar! Quando
entrei na King tinha esperança de ajudar no tratamento da minha mãe e ter
dinheiro para reformar esta casa.
Ele permanece calado, fica me olhando com seus imensos olhos
azuis, assim, tão... lindo.
— É. — Noah fala por fim, e tenho a impressão que me esconde
algo — Tenho um dinheiro que dá para pagar o tratamento da sua mãe e a
reforma, quanto a isso, não aceito que recuse.
— Eu vou te ajudar no que você precisar. — Afirmo mais séria —
Eu quero poder te ajudar em tudo na empresa, e se quiser eu até ajudo a
escolher o lugar, pode contar comigo pro que quiser Noah.
Ele sorri de lado, me puxa de repente e me beija cheio de vontade,
vem pra cima de mim e as minhas mãos estão em suas costas, sinto sua
ereção na minha barriga, mas não me importo. Não me importo com isso,
ele se sente atraído por mim, ele disse isso, e sei que é verdade.
— Você é fantástica, Bolinhos.
— Eu sei!
— Vamos! Preciso te levar na King para dar baixa nos seus
documentos.
— Noah... deixe-me falar só mais uma coisinha.
— Claro, minha gordinha.
Suspiro — ele gosta desse apelido idiota — depois sorrio e desfaço
a carranca.
— Eu te amo, Noah Baltimore.
— É mesmo, futura senhora Baltimore?
— É mesmo!
— De verdade?
— De verdade!
— Jura pela morte da Faith, hum? — pergunta e me beija — Pela
morte do guarda Július e da senhora...
— Garden? Aham! — falo correspondendo aos seus beijos — Juro
por tudo, seu bobão!
Sempre fazíamos esses juramentos idiotas, mas acabo sorrindo,
beijando-o, e me sentindo muito feliz, eu e Noah começaremos nosso novo
futuro agora, e espero estar pronta pra tudo! Quero viver tudo ao lado dele,
quero fazê-lo feliz, mas principalmente, quero ser feliz.
(...)
Donatela ficou super triste com o fato de eu pedir minhas contas,
mas pedi que ela viesse jantar conosco no sábado para que eu explicasse os
motivos da minha demissão. Noah me acompanhou até o Rh, lá ele mesmo
disse que estava me desligando, — claro, ele quis garantir que eu recebesse
todos os meus direitos — as garotas do RH pareciam desorientadas com a
presença dele, aposto que não sabiam que ele não trabalha mais na King.
Nós nem havíamos tomado café direito, Noah precisava resolver
muitas coisas, então nos trocamos, fiz um café simples e partimos. Agora
estamos no carro dele, saímos da King, claro que o meu objetivo não era
este, mas sinto que não encontraria lugar para mim lá, se continuasse
sabendo que a mãe dele não gosta de mim.
Talvez se Noah sumisse de vez eu até pensasse em arrumar outro
emprego, pois me sentiria péssima em saber que trabalhava em uma
empresa sua.
Não importa, não ficarei desempregada!
Percebo que estamos indo rumo ao centro de Charlotte. Noah dirige
em silêncio, ele é um excelente motorista.
— Onde estamos indo?
— Ao shopping, precisamos comprar umas roupas para você.
— Noah...
— A resposta é não. Quero que você seja uma secretária aplicada e
tem que estar bem vestida para o trabalho.
— Eu tenho roupas.
— Eu sei meu bem, mas precisa estar mais bem vestida querida,
mais... apresentável.
— Eu não gosto disso!
— Samantha, tem que confiar em mim. Estou nessa área há tempos!
Você é uma mulher linda, vou te deixar na loja e ir resolver algumas coisas,
te pego no horário de almoço pode ser?
Não gostei, mas também prefiro evitar a briga, estamos bem do
jeito que estamos.
— Está bem.
Noah toca a minha face com carinho.
— Quero que veja o quanto pode ficar ainda mais linda Sam. Você
é uma mulher belíssima! Fique tranquila, só precisa de compras, é isso o
que minha mãe sempre fala.
Não faço muito esse tipo, mas se ele insiste...
Noah estaciona e abre à carteira, me entrega um cartão de crédito de
cor preta, analiso o cartão e vejo que tem o meu nome nele, me espanto.
— É um adicional, é seu! Quero que compre o que achar melhor,
roupas íntimas novas também, e que você já vá pensando em algo pra usar
no nosso casamento no civil.
Nossa!
— Noah...
— Nos vemos às duas horas, querida. — Ele se inclina e tira meu
cinto de segurança, depois abre a porta e me beija de leve — Pode tomar
um sorvete, gordinha, eu deixo!
Me irrito.
Pego minha bolsa e saio do carro, ele realmente sabe como me
irritar, bato a porta com força e escuto uma risadinha enquanto o carro se
afasta. Suspiro, chateada. Noah anda induzindo uma dezena de situações
nas quais não quero fazer parte, isso me irrita.
Acostumei-me a fazer tudo sozinha é isso, então, ter alguém
querendo mandar em tudo e me enchendo de ordens... Não gosto, pronto!
Olho para as escadas rolantes, poucas vezes estive aqui, mas
conheço o lugar, suspiro já desanimada.
— Namorado, Sam... Namorado!
Eu acho que não vou conseguir encontrar nem metade da metade
das roupas que devo comprar nesse lugar, tenho certeza disso, as roupas
foram feitas pra crianças de quinze anos não pra garotas GG.
Só uma pessoa poderia me ajudar neste momento, Ty, mas ele está
viajando, então, não me vem ninguém a mente. Essa será uma missão solo,
frustrada, na qual tentarei profundamente não chorar nos provadores de
dezenas de lojas tentando fechar o zíper de algum jeans ou me sentindo um
saco de batatas em roupas sem graça para garotas Plus Size.
Queria ser Plus Size! Elas vestem 40, o que na verdade já é ser
obesa, por que hoje em dia, vestir 38 já é estar gorda. — Acho que pulei
quatro números na adolescência.
Ando e ando pelas lojas em busca de algum lugar que venda roupas
para garotas GG, mas não acho nada. No primeiro andar, manequins com
roupas lindas, conjuntos e vestidos maravilhosos, até biquínis, tudo
perfeito... para mulheres magras.
No segundo andar muito pior, mais moda jovem. Arrisco-me a
entrar em uma loja e sou basicamente ignorada pelas vendedoras, elas
atendem garotas que tem a cintura da finura da minha coxa, olho algumas
araras e só roupas com numeração até o 38 — como previ — e saio sem ao
menos ser atendida.
Já estou desanimada na primeira meia hora, nem quero imaginar
como farei pra sobreviver até às duas da tarde, — e ainda é dez, da manhã
— tudo foi muito rápido na King.
— Psiu, moça!
Viro-me espantada com o chamado, é uma das vendedoras da outra
loja, ela se aproxima olhando para os lados como se cometesse um crime ou
algo assim — não me lembro de ter esquecido nada lá!
— No terceiro piso abriu uma loja para garotas do tamanho GG, se
chama La Belle. Vai lá, é da minha tia, o preço é bem bacana.
— Obrigada.
— Fala que eu indiquei, ela te dá desconto, Bee!
— Sim, claro, obrigada.
— De nada! Boas compras.
Ao menos é educada.
Pego o elevador um pouco mais animada.
E Bee não se engana, logo que chego à La Belle, os manequins que
eu vejo através do vidro são de garotas GG. Roupas que não parecem sacas
de alguma coisa. São roupas lindas, logo que entro um rapaz vem me
atender, ele é super simpático e sorri todo articulado, é por isso que eu
adoro "as gay", eles são tão... espontâneos.
— Olá queridaaa! — fala meio arrastado — que linda, em que
posso te ajudar?
— A Bee, ela me indicou a loja.
— Prima minha, que graça, sou Bethoven, mas pode me chamar de
Beth.
Chique.
Sorrio, já gostei.
— Amei sua boca, seus olhos, o que procura gata?
— Qualquer coisa que me deixe com cara de secretária.
— Só para o trabalho?
— Meu namorado quer que eu me vista melhor, — já percebi isso
também, Noah quer que eu esteja bem — então Beth, eu acho que vou levar
bastante coisa.
— Ótimo! — ele olha para minha bunda e me vira de costas, fico
sem graça — Juaniitaa, trás umas peças da nova coleção, número 50, por
favor.
— Si senhor! — responde a voz feminina dos fundos da loja.
— Ah, mas com essa bunda gata, precisa de shorts também!
Eu? De shorts?
— E umas saias que ressalte ela. Você veio ao lugar certo, gata!
Beth me vira pra ele pelos ombros e olha para os meus seios.
— Um decote mais ousado, sei lá, vou montar uns looks, sente-se e
relaxe... — indica um sofá branco perto de algumas araras e vai para trás do
balcão — seu cabelo também precisa de um corte, querida. Temos um
salão, que tal uma limpeza de pele?
Algo me ocorre, e sorrio com a ideia.
— Poderiam cortar meu cabelo e me dar ele?
— Sim, claro! Já estou até pensando em uns looks com um novo
corte de cabelo, — Beth se entusiasma todo — seu namorado mal irá te
reconhecer.
— Vou mandar uma mensagem pra ele, avisar que vou tirar o resto
da tarde. — Enfio a mão na bolsa e pego o celular — Ele pediu, acho que
não vai se importar de eu gastar o resto da tarde com essa compra.
— Às vezes temos que mudar queridinha.
Acho que chegou a minha hora de dar uma mudadinha!
GG... LINDA... MUDADA... DELE!
Entro ouvindo a risada do meu pai.
Bem, ao menos não parece bêbado.
Já escureceu, e acho que demorei muito mais do que deveria no
salão com o Beth, mas ele insistiu tanto pra que eu desse essa repaginada
que acabei cedendo.
Comprei tantas coisas que mal consigo carregar todas as sacolas, o
taxista deixou tudo aqui na varanda, tenho que dar várias viagens para pegar
tudo, coloco as últimas sacolas num canto da sala.
Acabei me divertindo um pouco mais do que deveria hoje à tarde,
Beth tornou cada experimento e prova das roupas um momento muito bom
e menos frustrante.
— Você não é bom com jogo, rapaz... — Ouço papai falar todo
alegre.
— Não mesmo! — Noah afirma com voz risonha.
Sorrio.
Não acho que a minha "transformação" tenha sido das mais
interessantes, apenas comprei roupas — bem diferentes do que uso —
assim como Noah me pediu, cortei o cabelo e fiz limpeza de pele, também
ganhei a sobrancelha de graça, mas muito melhor que isso foi poder
resolver tudo o que eu queria. Em aproximadamente três dias o presente de
mamãe ficará pronto.
Beth meio que me produziu, acabei vindo com um jeans cintura alta
e uma blusa branca que me arrumou e sapatos, — ainda que deteste — mas
acho que o look ficou até bom! Essa é a primeira vez na vida que me sinto
um pouquinho bem comigo mesma.
Entro no banheiro da sala e me olho mais uma vez no espelho,
sorrio satisfeita com a roupa, com meu novo visual, sei que eu não sou feia,
eu apenas não estou em forma, mas achei essas roupas no Beth... elas se
encaixam perfeitamente em mim, não me sinto desconfortável nem feia
nelas, me sinto.... bonita.
— Sam?
Noah chama do lado de fora do banheiro.
— Sim?
— Fez muitas compras, que legal!
Reviro os olhos, termino de retocar o batom e abro a porta do
banheiro, Noah fica paralisado me olhando fixamente.
Não sou de usar maquiagem e acho que faz uns cinco anos que não
cortava o cabelo, a sobrancelha também não arrumava há tempos, até as
unhas eu fiz, realmente acho que fiquei bem diferente do que sempre fui.
Ele fica me olhando, de cima abaixo, como se não acreditasse, fico
de lado meio sem jeito e coloco a mão na cintura toda desajeitada.
— Eu... fiquei... bem? — Noah começa a sorrir do nada, fazendo
com que eu me sinta extremamente idiota, mas consigo meio que sorrir.
Isso deve ser bom, certo?
— Não acredito que deixou cortarem o seu cabelo!
Fecho a cara, faço menção de me afastar e Noah me puxa de volta,
ele me empurra contra a porta e me beija completamente apaixonado,
correspondo, engolindo a vontade de sorrir, me sentindo desejosa, por que é
assim que ele me faz sentir quando me beija dessa forma.
Seu beijo se torna mais intenso e perco o fôlego, minhas mãos
sobem pelos braços dele, e me sinto, de repente, quente, Noah explora a
minha boca com uma experiência incrível, me sinto tomada por essas
sensações gostosas que seu beijo proporciona, as mãos dele sobem dos
meus quadris para os meus seios, e ele aperta eles com força por cima da
blusa colada, meu coração dispara tanto que parece que vai sair pela boca,
as batidas latejam por todo o meu corpo se espalhando em ondas fortes, me
causam arrepios bons e diferentes.
Suas mãos descem para minha bunda e ele a aperta com tanta força
que meu corpo sobe, e Noah se esfrega em mim, sinto através do terno que
sua ereção está mais dura que nunca, arfo entregue aos seus lábios, aos seus
toques.
— Caralho, Sam! — ele se afasta de repente e respira fundo.
Fico confusa olhando pra ele, não entendo, ele está bravo comigo?
— Você... parece que os seus seios... sua bunda... poxa!
— O que? — Pergunto e olho para os meus seios, ainda estou
confusa e sem ar — O que tem de errado?
— Você nunca usou algo tão justo! — exclama e passa a mão nos
cabelos me olhando de cima abaixo — Você está muito gostosa.
Minhas bochechas queimam, Noah se aproxima de novo e volta a
me beijar todo cheio de vontade, também tenho vontade. Uma vontade que
começo a descobrir que agora existe, toco seus ombros mais largos, sinto na
ponta dos dedos os músculos dos ombros dele, os calinhos perto do
pescoço, Noah fica me apertando toda, ele toca minha bunda sem um pingo
de receio, fica apertando com força e isso é muito gostoso.
— Você está linda, — fala e afasta os meus cabelos para trás da face
— tudo em você é lindo, minha gordinha.
— Você acha mesmo? — pergunto, mas estou longe de me sentir
insegura. Eu sei que ele é sincero.
— Tenho certeza Jas. Poxa, está linda, minha Bolinhos. — Noah
fala e me olha no fundo dos olhos — Te amo Sam, você está linda!
— Obrigada! — falo sincera e algo me ocorre — Eu não achei justo
gastar só do seu cartão, então dividi as compras em dois, no meu e no seu,
eu parcelei tudo, se ficar apertado pra gente, sempre temos a poupança,
tenho um dinheiro guardado há um tempo.
Noah me fita de um jeito que não sei decifrar, depois me beija mais
uma vez, a boca cheia de batom cor nude, sorrio e abraço ele com força.
— Eu amei as roupas, não sou vaidosa você sabe, mas sinceramente
esta loja tinha de tudo, até biquíni me arrumaram.
— Mesmo? — Noah cheira o meu pescoço — Humm... E está
cheirosa como sempre.
— Beth me deixou tomar banho no banheiro de funcionários, eu fiz
depilação a lazer! Sinto-me tão chique! — Sorrio só de lembrar-me das
dezenas de micos que paguei quando a tia dele começou a sessão, eu na sala
e ele do lado de fora tagarelando.
— Você... depilou?
Eles deram desconto na depilação a lazer.
— É. — Respondo constrangida — Mas eu paguei com o meu
cartão, fique despreocupado.
— Depilou... aqui?
Noah desliza a mão até o meio das minhas coxas e aperta “lá” com
vontade, ele olha pra baixo e me fita, estou vermelha feito um pimentão,
sem ar, o coração disparado, meu corpo todo treme com seu toque,
lentamente faço que sim com a cabeça.
— Isso não é muito justo, Sam. — Noah fala baixinho e a mão
acaricia o local de cima pra baixo me causando arrepios em todo corpo, os
bicos dos meus seios pulam dentro do sutiã — que maldade comigo.
— É? — Estou sem ar, eu o fito e tento sorrir — Temos que
esperar?
Noah suspira, respira fundo e sei que está frustrado, ele se afasta um
pouco, depois parece tomar ciência e vejo uma pequena ponta de
arrependimento em seu olhar.
— Desculpe Sam, perdi o controle.
— Tudo bem, eu gostei.
— Gostou?
— Sim, não acho que seja errado nos tocarmos, só que, vai mais
devagar tá bem?
— Você não sabe o quanto estou indo devagar, Sam.
Acho que pra ele se tornou muito comum ter a mulher que quer,
quando quer.
— Você me desperta um desejo irracional.
Ouvir um homem falando isso pra mim parece até impossível, mas
me sinto realmente bem em ouvi-lo falando isso... Desejada, coisa que
nunca fui por ninguém, não dessa forma.
— Por quê? — Nem sei por que pergunto.
— Pergunta por que, Samantha? Você é um mulherão, tem tudo o
que eu mais gosto em uma mulher.
— Dyanna não era assim.
— Não me sentia atraído por ela, não dessa forma.
— Ela é linda e magra, — tento sorrir — eu queria ter aquele corpo.
— Pois, eu quero o seu corpo Sam, pra ser bem sincero, quero você
nua numa cama só pra mim, pra te provar que você é sim tudo isso e mais
um pouco.
— Mesmo sendo GG? Meu corpo não é perfeito Noah.
— Poxa vida, Sam, você tem que tirar isso da cabeça, tem que
esquecer esse complexo de inferioridade, GG ou não você é maravilhosa!
— Você não me deixa nem me sentir gorda e complexada, Noah
Baltimore.
— Claro que não, Samantha Manchester. É o meu dever como
noivo te provar que está equivocada.
Sorrio e puxo ele pela gravata, Noah está sem terno, mas tão
arrumadinho de camisa social, calça e sapatos. Não faço ideia de onde ele
esteve no dia de hoje pra ter usado algo assim. Quando me largou no
shopping ele estava de moletom. Ele se aproxima sorrindo, todo mansinho.
— Comprou lingeries?
Faço que sim com a cabeça, morrendo de vergonha é claro, Noah
me olha novamente apertando minha bunda.
— Não tem jeito, gordinha, sua bunda é um imã!
— Pode deixar suas mãos aí Noah Baltimore, eu deixo.
— Você é minha gordinha, minha noiva birrenta e mal humorada.
— Eu não sou mal humorada!
— E linda e teimosa...
— Isso é verdade.
Faço bico, ele mordisca minha boca com carinho.
Nos beijamos.
— Noah, Sam... parem de se agarrar no banheiro! A pizza está
pronta! — Avisa mamãe do lado de fora do banheiro.
Sorrio, limpo a boca dele com cuidado e depois a minha, Noah se
recompõe e eu também, quando saímos do banheiro escuto um berro alegre
de mamãe!
— Você cortou o cabelo querida!
Sorrio, abraço-a, ela não faz ideia do motivo, mas em breve vai
gostar muito do meu presente.
PRIMEIRA VEZ
Acordo e estou sozinha na cama.
Preciso confessar que é muito bom não ter que madrugar todos os
dias, há algum tempo vem sendo assim na minha vida.
Entro no banheiro me arrastando, fomos dormir logo após o jantar,
mas estava destroçada! Meu passeio ao shopping me rendeu cansaço.
Tiro a blusa do pijama e a calça, fico de sutiã e calcinha, afasto
meus cabelos pra trás das orelhas e analiso meu perfil no espelho, os meus
cabelos estão ondulados nas pontas mas eu amei o corte Chanel.
Escovo os dentes e vou para o box, tiro as roupas de baixo e entro
no chuveiro, a água parece mais quentinha hoje, a fiação da casa é antiga
então fica difícil tomar banho e tal, principalmente no inverno.
Começo a lavar os meus cabelos, e me vejo sorrindo de ponta a
ponta ao me lembrar de ontem à noite, pela primeira vez em meses mamãe
parecia realmente feliz, ao menos desde que descobriu a doença, Noah e
papai não paravam de falar sobre a liga, é algo do qual papai adora, ele
inclusive me levou a muitos jogos no decorrer desse tempo e me ensinou a
jogar, a mim e a Noah, fizemos planos de domingo ir a um campo afastado
da cidade com o Noah pra uma partida.
Meus pais adoram ele, isso é inegável, apesar do receio inicial de
mamãe, sei que ela também gosta muito do Noah, eles o viram crescer ao
meu lado, e preciso admitir que ele se esforça pra conseguir a confiança dos
meus pais... Age como um pau mandado da minha mãe — lavou a louça do
jantar — e um puxa saco do papai — ficou falando sobre baseball com ele
— o tempo todo.
Deixo a água cair na cabeça despreocupadamente, depois que
termino meu banho coloco meu roupão e volto para o quarto, não me
assusto com o fato de encontrar Noah sentado na cama mexendo no celular,
mas o fato dele estar sem camisa e suado...
Ele ergue a cabeça e me olha de cima abaixo, sorrio constrangida,
claro que o meu roupão é enorme, comprido, mas ainda assim me sinto
envergonhada, Noah levanta, usa apenas uma calça de malha e tênis, tenho
quase certeza que o meu coração agora deu um salto na garganta.
Salivo, e engulo a saliva com força conforme ele se aproxima. —
poxa, de onde saíram tantos músculos assim em você Noah?
— Bom dia, querida!
— Bo-bom dia!
Fico nervosa, não sei por que.
Os ombros dele estão mais largos sem camisa, o peitoral definido, a
barriga retinha, Noah tem abdome, e entradinhas... Entradinhas trincadas,
ele segura a minha face e se inclina, me beija de leve, minhas mãos
deslizam pelos lados de seu corpo.
— Seus pais saíram. Sua mãe queria comprar roupas novas.
— Tá.
— Estou de folga, já consegui um corretor para me arrumar um
imóvel. Pensei em descansar um pouco.
— Tá.
— O que foi?
— Nada!
Noah me puxa para ele e me beija todo carinhoso... Mas, o que eu
esperava encontrar por baixo dos moletons? Ele Cresceu! E como cresceu!
— Pensei em te levar pra almoçar fora, acredito que eles chegarão
tarde.
— Meu pai falou que vai comprar roupas novas pra ela?
— Acho que sim.
Papai sabe que não pode gastar muito, mas acho que ele não está
pensando muito no fato de que está desempregado, ele só quer ver a mamãe
sorrindo, coisa que não vemos com tanta frequência há meses. Eu também
quero, mas já tenho que ir colocando tudo na ponta do lápis, minhas
compras de ontem, as compras de mamãe de hoje...
— O que foi Sam?
— Nada, preciso arrumar um emprego pro meu pai, o seguro dele
vai acabar em alguns meses.
— Não precisa se preocupar, eu posso arrumar um cargo pra ele na
empresa.
— Meu pai é muito comprometido, ele não falta ao serviço...
— Não ensine o padre a rezar, Sam. Conheço seu pai muito bem, e
sei que apesar de beber, ele é um bom homem, trabalhador e honesto,
conheço-o desde pequeno. Acho que deveria se preocupar com outra coisa
agora.
— O que?
Ele aponta pra si mesmo e sorri, engulo o sorriso e coloco os braços
em volta de seus ombros, Noah beija a minha bochecha e me aperta com
força, sinto sua rigidez no meu estômago ainda que o tecido do roupão
impeça um pouco, coro.
— Você está todo suado, estava correndo assim no quarteirão?
— Usei a garagem do seu pai, tem corda e um saco de areia, uma
esteira e pesos.
— É! Quando ele completou quarenta anos, ele ficou barrigudo, aí
inventou que queria "malhar".
Papai também quase quebrou a coluna levantando uns pesos que
comprou de segunda mão dos Banks, me dá vontade de rir quando me
lembro das coisas absurdas que ele fez porque mamãe o chamou de velho
no dia de seu aniversário de 40 anos. Minhas mãos deslizam pelas costas
soadas de Noah e sinto a quentura de seu corpo, ele me aperta com mais
força, seus olhos azuis mais lindos que nunca.
— Vem para o banho comigo? — Pede baixinho, um pedido sincero
e calmo — Por favor, Sam.
— Eu tenho vergonha...
— Por quê?
Abaixo a cabeça e me afasto, Noah ergue minha cabeça, e eu não
sei por que tenho a impressão de que novamente ele está me analisando
muito, antes de falar o que quer.
— Pare! — Ordena com firmeza — Não faremos nada que não
queira, Sam.
— Não tenho medo disso, — confesso sincera — apenas não quero
que me veja nua.
— Samantha, eu amo seu corpo!
— Você nunca me viu sem roupa Noah, eu sou feia.
— Me deixe tirar as conclusões por mim mesmo.
Não queria ser assim, morro de vergonha do meu corpo, ontem na
hora da depilação fiquei a todo o momento, constrangida com a moça, ainda
que fosse seu trabalho, me sentia incomodada com seus olhares, com medo
de que tirasse algum julgamento da minha aparência, tenho celulite, estrias,
banha...
— Estamos noivos. Tem que perder essa vergonha excessiva, Sam.
E quando nos casarmos?
— As coisas não são tão simples.
— Você sabe que eu não me importo Sam.
— Mas eu me importo!
Noah respira fundo, depois faz que sim com a cabeça, tem receio de
me desagradar e tem mágoa em seu olhar, ele sorri meio decepcionado e me
beija de leve, depois se afasta e vai para o banheiro em silêncio.
Sinto vontade de chorar, por que aposto que nenhuma das mulheres
com quem ele saiu era tão cheia de frescuras, tão medrosa, tão complexada,
tenho medo de que talvez, quando ele me ver, ele se sinta muito pior do que
agora.
Aperto os punhos, fico parada por uns minutos. Não queria ser
assim, gostaria muito de ser diferente, mas não consigo. Claro que amo o
Noah, claro que confio nele, mas... Não me sinto confortável em ficar nua
na frente dele, ou de ninguém, eu sei que seria decepcionante se em algum
momento de nossa intimidade ele me olhasse e percebesse que eu não sou o
que ele pensa, na verdade que enxergasse realmente quem eu sou, como sou
por fora.
Eu não sou bonita fisicamente, eu sou... gorda!
Gorda, muito gorda, enorme.
E se ele me olhasse e quisesse rir de mim? E se ele me olhasse e
visse o quanto sou desproporcional? E se ele me olhasse e visse todo o
excesso de pele que tem na minha barriga? Os culotes, as dobras, a gordura
nas minhas coxas, meus seios caídos?
Acho que é quase impossível que um homem desses se sinta atraído
por mim, e que na vida real, alguém como ele jamais me veria diferente ou
iria me querer, homens como Noah preferem "Dyannas" da vida, garotas
como eu nasceram pra ficarem sozinhas, cuidarem de seus pais,
envelhecerem sós e ficarem para tias, por que homem algum gosta de
garotas GG, homens gostam de manequins 34.
— Quer saber? Foda-se!
Quando menos espero escuto a reclamação, sou puxada com força
pelo braço e meu corpo todo reage naturalmente quando ele me abraça,
Noah abre o roupão e escuto meus soluços ecoando pelo meu quarto, ele
puxa o roupão para baixo me beijando, suas mãos pousam na minha cintura
e eu o abraço sentindo sua necessidade, ele está nu, molhado, cheira a
sabonete.
Fecho os olhos entregue aos seus beijos e vamos aos beijos para a
cama, nossos corpos colados, me sento na cama e me deito e seu corpo vem
pra cima do meu com naturalidade, nos beijamos com mais lentidão e suas
pernas separam as minhas, toco suas costas, e minhas mãos se enfiam em
seus cabelos, nesse momento Noah me fita e lentamente me penetra.
Dói.
Mas eu o beijo, e ele é muito carinhoso comigo enquanto me
penetra mais uma vez devagar, toco suas costas e abro mais as pernas
recebendo-o, sua boca na minha, seu corpo roça no meu, todo o meu corpo
se arrepia com seu contato... estamos fazendo amor.
A mão dele desliza pelo lado do meu corpo e apalpa minha coxa
com força, sei que se controla para não me machucar, minha boca não larga
a ele, Noah toca meu quadril subindo mais e me preenchendo de vez, gemo
por que isso realmente me machuca, e queima dentro de mim, fico agoniada
com a sensação.
— Calma — sussurra entre o beijo.
Faço que sim com a cabeça, Noah se ergue apoiando-se nas mãos,
seus braços parecem pilares fortes dos lados da minha cabeça, ele me fita e
volta a mover os quadris me penetrando devagar, o vai e vem arde e a
sensação é um pouco desconfortável, mas me acomodo com seu corpo, nos
beijamos enquanto ele faz, toco seu pescoço e seus ombros encontrando seu
corpo com o meu.
Fecho os olhos e deixo que me beije, todo os lados de seu corpo e
tento relaxar, Noah deixa meus lábios e sem parar de me beijar desce para
os meus seios beijando-os com carinho, ele é extremamente cuidadoso
comigo, sei que quer me fazer sentir conforto e bem, ele ergue meu braço e
beija o lado das minhas costelas todo carinhoso, sinto cocegas mas é
gostoso.
— Linda! — Diz e volta lambendo meu seio direito cheio de
vontade.
Gemo, por que isso me causa prazer, sorrio e ele me penetra com
mais rapidez, sorrio me apoiando num cotovelo e toco sua face beijando-o,
recebendo-o parada, meu corpo de repente se encolhe todo com a sensação
de ser penetrada por Noah, dobro mais as pernas adorando a sensação.
Ele entra todo e isso incomoda, mas é bom ao mesmo tempo.
Gemo baixinho, meu corpo todo treme quando ele faz de novo e me
deito puxando-o pra mim, beijando-o enquanto ele volta a me penetrar mais
rápido, ele me possui com mais intensidade agora, rebola tão... gostoso em
mim.
— Gosta? — Pergunta baixinho.
— Sim! — Sai mais como um gemido — É gostoso.
Ele faz de novo, e de novo, depois segura na cabeceira da minha
cama fazendo mais rápido, as sensações me tomam da cabeça até os pés, me
encolho, me tremo toda, Noah beija meu seio fazendo gostoso, ele geme
baixo, seu corpo escorrega no meu, tão quente, macio, soado, também estou
soada, começo a sentir mais prazer e isso perdura me deixando louca, grito
com a sensação de tremedeira no meu centro, minhas coxas tremem, e
trepido perdendo o ar com as ondas repentinas que me tomam os pés a
cabeça.
Noah sai e seu clímax explode na minha barriga derramando o
líquido quente e branco, ele me beija com força, e parece que meu corpo
queima cheio de fagulhas, não sei o que é isso que brilha, mas me agonia
tanto ou mais que a dor, mas a agonia é deliciosa.
— Te amo. — Ele sussurra entre o beijo.
Encolho-me mais, ele me beija novamente, apenas posso dizer uma
coisa pra Noah nesse momento:
— Também te amo.
E agora?
Fecho os olhos e me sinto num sonho.
Um sonho tão lindo...
Isso foi perfeito e inexplicável.
Noah abandona o peso ao meu lado da cama, e quando ele se deita,
institivamente puxo os lençóis pra me cobrir, ele segura a minha mão, olho
para o lado ainda sem ar, ele está tão sério que sinto medo.
— Não Sam, não faz isso, por favor.
Estou morta de vergonha.
Parece que a minha consciência vem voltando bem rápido, mas
acato seu pedido, Noah me puxa para ele e fico de lado com metade do
corpo em cima do dele, ele beija minha cabeça e enfia a mão nos meus
cabelos, fico parada sem saber como agir, o que fazer, e agora?
— Você é perfeita Sam, eu adoro seu corpo assim, desse jeito.
— Obrigada.
— O que é agora?
Mas ele não está irritado, eu diria que está magoado e não entendo o
motivo, eu o olho, confusa.
— Eu sei que fiz merda está bem?
— Fez? — Questiono e parece que uma onda de decepção me toma
da cabeça aos pés, ele se arrependeu?
— Vou dar entrada nos papéis do casamento o mais rápido possível.
— Noah, esse não foi o combinado. — Respondo e engulo a
decepção — Você não gostou é isso?
— Não gostei do que? — Ele me olha confuso.
— De fazer sexo comigo! — respondo e me desvencilho de seus
braços, me viro na cama e me ergo de costas pra ele — Parece que foi um
erro que tem que reparar.
— Sam, você está fazendo de novo.
— O que?
— Tendo pena de si mesma, se minimizando. Eu apenas queria ter
te dado o que merece no momento certo, mas não consegui, poxa, você
acha que eu não gostei?
Não tenho resposta.
— Pois fique sabendo que eu gostei muito de fazer AMOR COM
VOCÊ, Samantha, e que quero me casar mais rápido para que tenhamos
mais liberdade.
— É muito rápido.
— Escuta Sam, nós nos conhecemos a vida toda, desde bebês
somos amigos, eu não vou permitir que este seu senso de pessimismo
destrua o nosso relacionamento.
— Não é senso de pessimismo, é a verdade, fui fácil. — Respondo,
mas não consigo me sentir arrependida.
— Sam, eu esperei treze anos por este momento... É decepcionante
que você se refira a nossa primeira vez dessa forma.
Ele está muito sensível... só pode!
Viro-me pra ele, Noah está com os olhos marejados de lágrimas, eu
sinto que o magoei profundamente com o que eu disse, e não sei por que,
mas vê-lo assim me parte o coração, não disse nada demais.
— Sabe que dia é hoje, Sam?
Não tenho resposta.
— Hoje é o aniversário do meu pai. Hoje ele faria quarenta e sete
anos, e hoje era pra ter sido um dia muito bom entre você e eu, mas você
não deixa.
Fico calada, minha garganta se fecha num entalo forte e doloroso.
— Desculpe-me se agi errado com você Sam, sei que merecia mais
que isso, queria muito que fosse nas nossas núpcias, que fosse diferente,
mas eu não consegui.
— E está magoado com isso?
— Claro! Você é a pessoa que mais amei por toda a minha vida, é
horrível sentir que te roubei algo, assim, sem mais nem menos, na casa dos
seus pais.
A cada resposta do Noah só me sinto pior, eu não sei se iria querer
que fosse depois que nos casássemos, por mais que pareça o mais certo, e é,
mas somos adultos e descubro a cada dia que passa que sinto desejo por ele,
atração, ainda que o tempo desde sua volta seja curto, Noah é maravilhoso
comigo, mas não é apenas isso, ele faz com que eu me sinta tão... quente.
— Está bem. — Digo por fim, depois me deito na cama de novo,
não olho pra nudez dele, Noah se aconchega e vem de novo pra cima de
mim com cara de cão sem dono — Tudo bem Noah.
Sinto que ele precisa mais de uma amiga do que de uma namorada
complexada neste momento. E eu preciso dele das duas formas, como
namorado e como amigo, eu sempre soube que ele nunca superou a morte
do pai dele, Noah costumava ficar muito calado e na dele quando se
aproximavam datas importantes como dias dos pais, natal, páscoa, dia de
ação de graças, e por fim o aniversário de seu pai, Max Baltimore, mas ele
sempre se fechava muito, pelo visto isso mudou bastante nesses anos.
— Você é a minha única família, Jas!
Aperto ele com força, Noah me beija o pescoço devolvendo o
abraço.
— Quer ir ao cemitério levar flores? — pergunto e ele faz que sim
com a cabeça — Eu vou cuidar de você meu... meu... dinossaurinho carente.
— É pra cuidar mesmo! — Noah fala com voz abafada.
Ele nunca superou a morte do pai, e acho que nunca vai superar,
sempre levávamos flores ao túmulo do pai dele nos aniversários de morte
ou quando o Noah queria, mas acho que ele ia muito mais vezes, escondido
da Sarah, quando queria falar com alguém que não fosse eu.
— Acho que precisamos de outro banho — ele fala baixinho — e
juntos.
— Juntos. — repito e esfrego meus pés nos dele — Seus pés estão
tão quentinhos, meu dinossaurinho.
— Preciso te arrastar para cama mais vezes pra me tratar com mais
carinho, Jas.
Eu não sei ser muito carinhosa com ninguém, descubro isso aos
poucos com nosso namoro, Noah é mais pegajoso, pelo visto hoje ele é
mais que antes, porque ele escondeu isso de mim por anos, ou será que só
eu não percebia que ele nutria sentimentos por mim e escondia?
— Você sempre gostou de mim assim, Noah?
— Sim.
Ele se ergue e me olha, toca a minha face com carinho.
— Apenas tive que ir. Tive que deixar o sentimento pra trás porque
me machucava muito a ideia de partir, mas me machucava muito mais a
ideia de te magoar, por isso, eu me afastei de você.
— Mas me magoou do mesmo jeito.
— Não foi porque eu estava indo embora, seria muito pior se eu
tivesse dito que te amo e tivesse partido.
— Talvez não!
— Talvez isso a impedisse de viver a sua vida, de conhecer novas
pessoas.
— Nem precisou, quem iria me querer Noah? Só você me quis até
hoje.
— Lockwood parecia gostar muito de você, — ele fecha a cara —
ainda bem que ele entendeu que você não o amava.
— Ty era mais meu amigo do que tudo.
— Amigo que queria te levar pra cama, sei, ele que não chegue
perto da minha gordinha.
— Ai Noah, deixa de ser ciumento!
— Mulher minha não tem amizade com homem.
— Ah, é? Mas eu tenho amizade com um homem!
Noah me encara irritado, oprimo a vontade de rir e faço cara de
bosta.
— Você — falo balançando a cabeça pros lados — espertão, não é
meu amigo?
— Sua sem graça, — seu semblante se suaviza e ele me beija até
que eu fique sem ar — indecente!
— Você quem me seduziu e eu sou indecente?
— Ai Sam... Não sei se aguentaria, você é deliciosa!
Agora eu fiquei realmente vermelha e sem graça.
— E agora que provei, quero mais.
— É mesmo? Pois está se esquecendo de uma coisa espertão: temos
que fazer exames de sangue, e, eu preciso ir a uma médica.
— Eu sempre me protejo nas minhas relações.
— Até com... ela?
— Dyanna?
— É.
— Claro, com todas sempre usei camisinha.
— E comigo esqueceu?
— Não foi planejado Bolinhos. Desculpe-me, perdi a cabeça.
Ele é fofo demais meu Deus!
— Ai para! Se não eu vou ficar com pena de você, vamos logo
levantar.
— Ah, não Saaaammmmmm!
— Aí, vai começar a miar de novo!
— Vamos namorar mais um pouco, meu amor?!
— Me chamou de amor?
— Prefere paixão?
Faço uma careta ele ri, a coisa mais linda que já vi em minha vida,
o sorriso dele, com ou sem aparelho, o beijo com carinho.
— Eu te amo Noah, e foi muito especial pra mim.
— Pra mim também, eu amo você Sam. Vem para o banho comigo
agora?
Não penso duas vezes antes de responder:
— Sim.
Ele sorri e sei que é assim que as coisas devem ser.
MELHOR AMIGO
Noah sai da cama.
Ergo-me ainda com receio e quando fico em pé, ele está me olhando
de cima a baixo, desvio o olhar e seguro sua mão.
— Vem, quero tomar café.
Noah me puxa e me beija.
— Você é linda, Sam.
— Você também é lindo!
— Não precisa ter vergonha de me olhar, eu não tenho.
— Claro, é homem.
— Você está bem? Não te machuquei muito, certo?
— Não, não machucou, estou bem!
— Sangrou um pouquinho.
Minhas bochechas queimam, Noah me aperta e suas mãos vão parar
na minha bunda.
— Isso é normal Sam, poxa vida, para!
— Eu não disse nada.
— Nem precisou, está vermelha feito um tomate.
— Eu nunca fiquei nua na frente de homem nenhum Noah, estou
morrendo de vergonha do meu corpo, me dá um tempinho pra assimilar
tudo.
— Desculpe Jas, mas é que também estou nervoso.
— Por quê?
— Me acharia idiota?
— Não, claro que não.
Noah toca a minha face e sorri.
— É que pra mim, também foi como se fosse minha primeira vez.
Sorrio, reviro os olhos, isso é tão... tão... Dinossaurinho!
— Não faz isso, não me menospreza.
— Parecia muito experiente para uma primeira vez senhor
Baltimore.
— Você não sabe o quanto eu me esforcei pra não te machucar!
Eu o abraço, Noah sorri meio bobo ou coisa assim. Claro que estou
constrangida, claro que estou morrendo de vergonha, mas ele faz com que
ao mesmo tempo me sinta a garota mais especial do mundo. Nunca pensei
que meu melhor amigo cresceria e se tornaria um homem fofo,
compreensivo, e até mesmo meigo, talvez seja porque esteja carente, mas
levando em conta tudo o que ele vem fazendo, sei que não, o Noah é assim.
Ele me espreme e vamos pro banheiro, entramos no box e ligo o
chuveiro, — é estreito, mas dá para nós dois — Noah me beija assim que a
água começa a cair em nossas cabeças, toco seus ombros, o corpo perfeito
do meu noivo perfeito... Acho que não quero pensar no quanto sou
imperfeita agora, Noah tem razão, preciso parar com isso, ele já demonstra
que gosta do meu corpo, ele fala isso, então preciso me acostumar com o
fato de que ficarei sempre nua perto dele... vamos nos casar!
Ficamos por alguns minutos abraçados, nos beijamos, suas mãos
tocam minha bunda, minha cintura, sobem e descem no meu corpo, ele me
pressiona contra a parede do banheiro nesse momento e toca meus seios,
depois ele os aperta com força, gemo, é involuntário, eu o olho e Noah está
com os olhos nos meus.
— Te quero Sam. — sussurra — Sou louco por você.
— Tem certeza que gosta do que vê?
— Eu adoro o que eu vejo.
Sorrio, toco sua bunda e o abraço, ficamos assim por minutos
embaixo do chuveiro, Noah me faz carinho na cabeça, tão quieto, mas isso
é muito bom.
Ele pega o sabonete e começa a me lavar intimamente, lava os meus
seios e a minha bunda, ele observa cada detalhe do meu corpo como se
admirasse muito isso, logo em seguida ele me entrega o sabonete, passo
sabonete o seu peito, em sua barriga e desço, seu membro está duro de
novo, — isso eu já sabia — eu o seguro guardando dentro de mim a
vergonha, e o lavo com cuidado. Ele me beija o pescoço e segura no box,
me olhando.
— Te amo Samantha!
— Você está muito sensível.
— Estou muito apaixonado.
— Eu também.
— É mesmo?
— Absolutamente!
Ele sorri, largo o sabonete e abraço ele com força.
— Ainda bem que você voltou.
— É, ou do contrário teria que se divorciar de Lockwood.
— E você da Dyanna.
— Eu não iria me casar com ela Sam, sabia que quando te visse na
festa de noivado não conseguiria prosseguir.
— Você sempre gostou de mim assim e nunca disse... Por quê?
— Tinha medo de que isso acabasse com a nossa amizade, são duas
coisas bem diferentes Sam.
Isso é verdade.
— Também porque tive medo de que se afastasse de mim.
— Talvez nós não estivéssemos prontos.
— Eu não estava pronto, mas eu sempre me imaginei casado com
você e com filhos, ou apenas tendo você por perto sempre.
— Isso é muito fofinho, Noah.
— Eu sei, eu sou muito fofinho!
— Suas ex gostavam disso? Dyanna?
— Sim, acho que por isso se apegavam tanto a mim.
Noah gosta de tratar as pessoas bem... No caso, gosta de tratar “as
mulheres muito bem”.
— Quantas namoradas você teve antes da Dyanna?
— Namoradas fixas, umas cinco, e você?
— Dois, mas não foi nada sério.
— Teve três namorados?
— Sim, algum problema nisso senhor "cinco fixas"? E o resto?
Cadê?
— Está com ciúmes das minhas ex, Bolinhos?
— Você pode ter ciúmes e eu não?
— Possessiva!
Faço cara de tédio e mostro o dedo do meio pra ele, Noah solta uma
gargalhada alta e me abraça com força.
— Não sabe o quanto senti falta disso Bolinhos, adoro quando você
se irrita.
— Eu não vou esquecer isso!
— Esta bem, eu transei com umas vinte e duas garotas até hoje.
Nossa! Isso tudo?
— Preciso aumentar a minha lista de contatinhos. — respondo
espantada — E namorou todas elas?
— Não, né Sam, eu sou homem, viajei muito, tive algumas
amantes, outras trabalharam comigo na King.
— Suas secretárias?
— Não, algumas funcionárias temporárias, eu não transei com
secretárias, é um contato muito pessoal.
— Transas, né?
— É. Não amei nenhuma delas, queria que eu dissesse que fiz
amor?
Ser amiga do Noah neste momento está sendo bem difícil. Entendo
bem o que ele queria dizer com "tinha medo que nossa amizade acabasse"
ou coisa assim, é difícil ouvir seu namorado falando que transou com mais
de vinte e duas mulheres e achar isso normal.
— Desculpe Sam, mas eu tenho um pequeno passado antes de ter
voltado e não gostaria que soubesse disso por ninguém além de mim.
— Eu sei e me sinto idiota por ficar brava, uma coisa não tem nada
a ver com a outra.
— Eu não gostaria de saber que transou com vinte e dois caras,
também, eu me coloco muito no lugar de quem eu gosto.
— Gostou delas?
Noah me encara meio espantado — realmente, estou sendo
possessiva, principalmente porque, se ele estava noivo de uma delas,
deveria ser porque no mínimo gostava.
— Sim, claro que gostei Sam, principalmente das minhas
namoradas, eu nutria carinho por elas.
Não tenho resposta, acho que estou estragando nosso primeiro
momento juntos, eu não sei por que eu sou assim, por que eu me importo?
Elas estão no passado dele certo?
— Sam, me desculpa...
— Não precisa se desculpar.
Talvez nem todas as mulheres do mundo dessem a mínima pra isso.
Eu comecei o assunto e me irrito por isso, Noah me ama, e eu o amo, mas...
realmente estou pronta para saber o que aconteceu durante esses treze anos?
Tudo o que fiz foi trabalhar para ajudar meus pais. Não namorei,
não sai, me fechei num mundo onde existia só nós três, nossos problemas e
nossas dívidas.
Noah não, ele enricou, se divertiu, saiu, teve muitas amantes e se tornou
alguém inteligente e lindo — coisa que eu nunca vou ser, não me
menosprezando, mas eu sei as minhas capacidades e limitações, não posso
me comparar a alguém que foi à uma universidade e tem um curso, alguém
que já conhece o mundo enquanto o meu mundo foi uma cidade pequena,
durante um tempo em um trailer velho com pouca comida, roupas usadas, e
apenas a vontade de ser alguém.
— Tudo bem — digo por fim — eu vou preparar o nosso café.
— Sam...
— Eu já disse que tudo bem Noah, não começa!
Saio do box, pego uma toalha na gaveta e me enrolo nela, entro no
meu quarto e quase tenho um enfarte! Ty está deitado em minha cama,
fazendo pose, arregalo os olhos, ele está de short branco e camisa preta, usa
um de seus chapéus e óculos Rayban, faço gesto de silêncio, escuto o som
do chuveiro sendo desligado, Tay para de sorrir e indico o chão, ele rola na
cama e cai soltando um gemido e se enfia embaixo da cama apressado. Meu
coração parece que vai sair pela boca, quando sinto os braços de Noah me
abraçando por trás.
— Eu faço seu café! — ele fala e me vira pra ele, está nu, coro — O
que foi?
— Nada! — Consigo falar, abro a toalha e o puxo pra dentro —
Olha, não quero brigar está bem?
— Eu também não quero brigar. — Noah me beija carinhoso.
— Então por que não pega o seu carro legal e vai até a Faith, buscar
uma torta de chocolate pra gente?
— Boa ideia. — Ele faz uma careta — Nossa, que perfume forte!
Cheiro de incenso.
O perfume do Ty!
— Deve ser o novo purificador que papai colocou no aquecedor, às
vezes solta cheiro.
— Esta bem minha gordinha. Ah, não te disse, as minhas coisas
chegam segunda, vou trazer apenas algumas e as outras já vão para nossa
casa.
Sorrio, é realmente bom saber que teremos um canto só nosso.
— Está bem, então vai lá, se quiser trazer alguma torta de sal para o
almoço...
— Anti-social.
— Prefiro descansar!
— Está bem, eu já volto.
Ele me dá as costas e vejo de relance uma pequena mancha preta no
lado de seu quadril, parece uma escrita, mas não dá pra ver direito, — acho
que é impressão minha — ele entra no banheiro, Ty sai rapidamente
debaixo da cama e toco ele para o quarto dos meus pais, depois que ele se
enfia lá, volto para o meu quarto e começo a me vestir, coloco uma das
minhas calças estampadas de malha e uma camiseta qualquer, Noah já vem
vestido do banheiro, percebo a pequena marca de sangue na cama e começo
a retirar os lençóis.
— Eu não demoro.
— Tá.
— Mas à noite iremos sair para jantar está bem?
— Está bem.
Nos despedimos com um beijo, descemos e eu o acompanho até a
porta, consigo respirar novamente quando o carro de Noah vira a rua, dois
segundos depois, Ty aparece do meu lado com um sorriso largo e cheio de
maldade nos lábios.
— Quanta saúde, meu Deus! Que maromba é aquela?
Fico vermelha feito um tomate.
— Ty!
— Como conseguiu perder a virgindade com aquilo Sam?
Seguro os lençóis com mais força contra o peito.
— Não preciso de julgamento agora, obrigada. Eu estou bem, Ty e
você?
— Conheço essa fase, recentemente tive que passar por isso, a
gente fica tão vulnerável não é mesmo?
Vamos para a cozinha, deixo as roupas de cama dentro da máquina
e quando retorno ele já está preparando o café, aparentemente bem, mas...
— Ela disse que está grávida!
— Que? — berro involuntariamente. Estou sufocando com a
notícia.
— Dá para acreditar? — Ty sorri com desgosto — Advinha quem
vai ser papai?
— Não... não... não!
— É isso mesmo, eu! — fala a contragosto — a razão da família, o
macho que o papai sempre quis!
Percebo certo desespero na voz de Ty, seu semblante apesar de
alegre esconde uma dor incrível, tinha parado de pensar nesse assunto há
alguns dias, não pensei que haveria consequências! Ty está desesperado
com isso. Acho que está mais é com dúvidas a respeito de si mesmo do que
com uma suposta consequência em si.
— Ty, calma!
— Eu estou calmo, você não faz ideia do meu surto quando fui à
Nova York e a encontrei numa das exposições do meu amigo. Ela disse: "eu
estou atrasada", e eu disse "não me diga", saímos do lugar e batemos boca,
brigamos e discutimos depois, transamos atrás de uma lixeira e Dyanna
falou que se estiver grávida o bebê é meu, olha que lindo!
Estou estarrecida.
Ty coça a face nervosamente.
É muita informação pra uma pessoa só, Dyanna grávida do Ty? Ty
transando com Dyanna de novo?
— O que você quer Ty?
— Eu não sei! — Fala, nervoso — Eu não sei o que ela tem,
quando ela chega muito perto eu só penso em duas coisa, a primeira é em
uma cama, a segunda é em me enfiar nela.
— Ty talvez...
— Eu sou passivo Sam, pas-si-vo!
Ele está tendo uma crise de identidade.
— Faz anos que eu não sinto atração por mulheres. Anos! Uns dez
anos!
Vou deixa-lo desabafar, Ty anda de um lado para o outro na
cozinha, impaciente.
— Dyanna quer que eu vá vê-la em uma semana, mas sei que se eu
for isso não vai acabar bem.
— Ela ainda está indo atrás do Noah!
— É, ela disse que também não gosta de mim e que queria muito
reatar com ele, mas ele não quer ela, e ela se sente rejeitada.
Isso também não é legal.
— O que eu faço Sam?
— Não vai vê-la, então!
— Mas eu quero vê-la!
— Então vai.
— Mas tenho receio!
— Então vai tomar no...
— Ok, calma! — Ty respira fundo, seus olhos estão cheio de
angustia — Eu acho que sou bi!
— Deve ser.
— Mas, eu tentei ficar com um cara há alguns dias e não consegui.
Vou coar o café, Ty se senta inquieto na cadeira.
— Posso viajar para o Sul e ficar um tempo lá.
— E se ela estiver mesmo grávida?
— Eu a mandei tirar!
Viro-me lentamente para ele, Ty está duro na cadeira, seu semblante
sério.
— Eu não estou pronto para ser pai.
— Deveria ter pensado nisso antes de transar com ela no elevador!
Não foi você que disse que queria um filho?
— Queria um filho com você Sam, eu te conheço e você mora aqui.
— Tá, mas o corpo é dela e a decisão também é dela!
— Você me apoia tanto!
— Eu estou falando a verdade, quer alguém que minta?
— Não, só estou apavorado demais com isso.
— Está apavorado com o fato de se sentir atraído por Dyanna, e não
com o fato de que exista uma possível gravidez? Te assusta o fato de querer
ficar com uma mulher porque é mais cômodo ser quem você sempre foi?
— E você e o King?
— É Baltimore.
— Eu estou vendo esse dedo na pedra, Sam.
Sorrio, olho para o meu anel de noivado, Ty fica parado ao meu
lado me olhando muito sério.
— Não acha que está indo rápido demais?
— Não fui eu que transei com uma mulher no mesmo dia que a
conheceu ok?
— Meu envolvimento com Dyanna é físico, não emocional.
Isso é verdade.
— Ele já quer te prender, mal chegou e já te fez cortar o cabelo!
Quantas vezes sugeri e você não quis?
Ele está com ciúmes.
— Ai, Ty... Na próxima vez cortamos do seu jeito.
Eu o abraço. Meu melhor amigo sorri e faz cara de choro, só me
resta agora uma coisa, lhe dar meu ombro.
— O que eu vou fazer Sam?
E começa a chorar.
— Calma! Tudo vai se resolver!
Isso serve para mim também!
SONHOS REAIS
— Sam?
— Hum...
— O que foi? Você mal tocou na torta!
Estou preocupada com Ty, mas você não vai saber disso.
— Nada, apenas pensando em... mamãe.
— Não precisa ficar preocupada, ela ficará bem. Eu já dei entrada
nos papéis do convênio particular para vocês três.
Não gosto disso. Não quero que Noah fique gastando sem
necessidade comigo ou com papai, ele já ajudará mamãe e isso será um
grande custo pra ele.
— Faith nos convidou para o casamento da neta dela, será em um
mês, ela está bem empolgada.
— Bom.
— Sam, o que foi? Você está estranha!
Suspiro.
Não consigo agir com indiferença quando tenho problemas, neste
caso, não é exatamente comigo, mas com o meu melhor amigo. Ty saiu
daqui desolado, ele mal sabe o que fazer da vida, e eu sei que isso não é da
minha conta, mas não da para ser insensível aos problemas dele, nem fingir
que esta tudo bem, porque eu sei que se fosse comigo ele também se
preocuparia. Não gosto de mentir, bem, talvez eu possa contar uma “meia
verdade” para o Noah, apenas para ele não pensar que o problema é ele,
porque a impressão que tenho é essa, ele está me paparicando desde que
chegou da Faith, ele sempre me trata super bem, com carinho, acho que ele
pensa que estou estranha por conta do que fizemos mais cedo.
— Você se arrependeu?
— Não Noah, isso não tem a ver conosco.
Logo que falo ele solta o ar dos pulmões como se isso o aliviasse,
mecho na minha torta predileta de chocolate e nozes sem vontade e bebo
um pouco de café.
— E o que é? — indaga Noah, incerto.
— Bem, um amigo acha que a namorada está grávida, ele não
esperava por isso — escolho cada palavra minunciosamente — ele não acha
que está pronto para ser pai, tampouco gosta dela.
— Amigo? — Noah coça a barba que cresce, pensativo — Que
amigo?
— Colega. — Corrijo querendo rir desse ciúme descabido dele —
Não pode?
— Claro que pode! — ele sorri franco — Poxa Bolinhos, é que eu
tenho medo de você arrumar um amigo legal e me deixar de lado.
— Não da pra te deixar de lado Noah, você não deixa! — Exclamo
e ele começa a rir, estou fazendo um gesto exagerado com as mãos — Poxa
vida, mil vezes tenho que ficar falando como é ciumento, Noé!
— Me deixa. — Reclama ainda rindo a beça, depois pigarreia —
Então, o seu colega vai ser pai?
— Ele é gay! — Revelo e Noah fica paralisado e meio confuso — É
o seguinte, ele conheceu essa mulher numa festa, tiveram um momento de
loucura, mas ele sempre foi gay, então está com dúvidas da sexualidade
dele, confuso.
— Isso é realmente complicado, — concorda Noah e me estende
uma garfada de torta — come!
Suspiro e aceito, Noah estende a mão e entrelaça os dedos nos
meus, olho para o pequeno solitário no meu anelar direito e mal acredito,
estamos realmente vivendo isso, estamos noivos!
— Ele gosta dela?
— Nem ele sabe, ele sofre por dúvidas com a sexualidade.
— Talvez ele goste dela e não admita.
Também pensei isso.
— Ele disse que está atraído por ela, Noé.
— Para de me chamar de Noé.
— Mas, é o seu nome Noé!
Noah fecha a cara, ele odeia que eu o chame de Noé. Adoro irritá-
lo, rio e dou a volta na mesa, me inclino e o cubro de beijos, ele sorri e
acaba me puxando para o seu colo e me apertando.
— Você é uma espertinha senhorita Manchester!
— Eu sou a inteligência em pessoa.
— Hum... é mesmo!
Ele me olha cheio de malicia e eu fico vermelha.
— Você deveria aproveitar enquanto estarei em casa esses dias,
quando eu começar a trabalhar, quase não terei tempo na semana.
— Aproveitar? — Repito fingindo-me de inocente — Não entendi.
— Ai Sam... — Noah enfia a mão no meio das minhas coxas e
esfrega os dedos lá, dou um pulo — Isso aqui é muito bom e eu quero mais
vezes.
— Voltando ao assunto do meu colega... — suspiro, sufocando os
arrepios que sinto no corpo todo com seu toque — Ele não sabe o que quer
e sofre com isso.
— É mesmo? — Noah beija as minhas costas carinhoso — Poxa
que pena.
— Você não era tão sedutor! — Minha voz quase não sai, estou
com os olhos fechados sentido mais e mais arrepios com seus beijos suaves,
quentes.
— Você também não era tão gostosa, Sam. — Ele fala baixinho, me
puxa os cabelos e beija meu pescoço com lentidão — Tão cheirosa... Sua
pele é perfeita meu amor.
— Noah...
— Aqui — ele me puxa de repente pelos quadris e sinto sua ereção
na bunda — é muito bom de pegar.
Noah Baltimore se tornou um safado... safado delicioso.
Ergo-me e ele abre o meu jeans rápido, não tiro a blusa, mas puxo a
camisa dele por cima da cabeça, nunca senti tanto desejo em toda a minha
vida, ele abre o jeans e enfia a mão no bolso.
— Camisinha, — exibe a tirinha laminada — certo?
— Aham!
Puxo a calça pra baixo com pressa, meu cérebro está funcionando
muito rápido, tiro a calcinha e sinto um puxão forte nos quadris, Noah puxa
minha camiseta mais pra cima e me empurra contra a mesa, não derrubo
nada, mas a louça da minha mãe faz barulho, me apoio e ele puxa minha
perna pra cima da mesa de forma que meu joelho se apoia na madeira, ele
se abaixa e me penetra, fecho os olhos e sorrio, a sensação é incomoda, mas
gostosa, sinto um friozinho gostoso na barriga.
Ele me puxa pelo pescoço pra trás e leva minha boca pra dele se
movendo em mim, isso é muito gostoso, me equilibro num pé e as mãos
dele sobem para os meus seios por baixo da camisa, quando ele os aperta
gemo, porque a sensação é muito boa, muito forte.
— Está machucando?
— Não.
— Dói?
— Está perfeito Noah.
Ele me puxa pra trás de forma que eu fico em pé e puxa a minha
perna pra baixo, me seguro na mesa enquanto ele se move, sopro o ar pela
boca querendo gemer muito alto, todo o meu corpo reage muito
rapidamente à sensibilidade, aos pequenos focos de prazer que ele desperta
em mim, e eu não faço a mínima ideia de como Noah consegue causar isso
em mim tão rápido.
Ele entra todo e incomoda um pouco, e me puxa me abraçando
enquanto se move, puxa as barras da minha camisa e ergo os braços
permitindo que ele a tire. — Arfo — Ele morde o meu ombro, meu pescoço
e me apoio na mesa novamente me empinando pra trás.
Noah me segura pelos quadris e faz mais rápido, a sensação é
gostosa e pulsante, meu corpo todo vibra enquanto ele me penetra, sorrio
sentindo as fagulhas se espalhando pelo meu corpo, ele aperta os meus seios
e a minha cintura, fico sem ar por alguns momentos recebendo algo mais
intenso, mais forte, e estremeço quando Noah me aperta, ele me puxa e me
ergo sentindo o pulsar quente que me reveste toda. Entrego-me a um
orgasmo leve e divino, ao prazer que me proporciona.
Ele me beija a boca com lentidão. Suas mãos estão entrelaçadas nas
minhas, estamos muito suados, Noah se afasta depois de alguns instantes e
fico tentando recuperar o ar dos pulmões enquanto começo a recolher as
minhas roupas, minha face queimam de vergonha, mas meu corpo... é
absolutamente impossível controlar as minhas pernas, o prazer ainda me
toma toda.
— Calma, Sam, — Noah fala me puxando para um beijo — calma!
— Eu estou calma. — Digo constrangida — não quero ficar nua, só
isso.
Noah toca minha face me fitando, seu olhar muito sério me
atravessa por completo.
— Eu te amo Samantha. Deixa disso! Quantas vezes precisarei
dizer que eu amo seu corpo assim? Você é perfeita pra mim.
Sorrio, algo torto e nervoso, incerto, como toda a vergonha que
sinto agora por ter feito o que acabei de fazer com ele aqui, e por estar
absolutamente nua diante dele a luz do dia, no claro.
— Desculpe — falo e olho para o lado.
— Ouça, — Noah faz com que eu o olhe — seu corpo é lindo Sam,
tudo em você é perfeito, você tem tudo o que eu quero e onde quero.
— Tá. — Tento sorrir — Eu vou subir, acho que preciso de outro
banho.
— Eu acho que nós devemos tomar banho e ficar na cama o resto
do dia. Só uma sugestão, é claro!
Penso por alguns instantes e me decido.
— Está bem, mas é você que vai cuidar do almoço.
— Feito.

— Mamãe queria que eu fosse engenheiro.


Noah está deitado em cima de mim, ele mantém a cabeça entre os
meus seios, ele brinca com o direito e cheira o esquerdo, beija, quero rir às
vezes das molecagens dele, estamos deitados no chão do meu quarto, os
lençóis jogados em algum canto do quarto, os travesseiros... Acabamos de
fazer amor mais uma vez. Poxa, ele é... é... fogo!
— Ela sempre foi muito insistente sabe.
— Ela parecia tão legal!
— Era! Depois mamãe enfiou na cabeça que havia um nome e uma
imagem a zelar...
Noah deixa a frase morrer, fico me perguntando o que o dinheiro
não é capaz de fazer com as pessoas... Com ele, acho que não mudou muito,
mas com Sarah Baltimore, deve ter subido à cabeça. Aquela mulher era
muito diferente da mãe de Noah, ao menos quem ela se tornou.
— Minha mãe se importa muito mais com o nome dos King do que
comigo.
Da pra entender a carência de Noah.
Puxo um travesseiro e apoio minha cabeça, ele fica me olhando
com o queixo entre meus seios, seu corpo pesa um pouco em cima do meu,
estamos completamente suados, faz calor, e ainda que queira me cobrir, ele
jogou tudo para longe de nós durante o sexo. Mal tomamos banho e viemos
para cama. Noah estava me atacando de novo, me beijando, agora a pouco
fizemos sexo na cozinha, ele tem um apetite sexual fora do comum.
— Quando tivermos um bebê, eu quero que ele seja assim como
você, Bolinhos! — Noah fala de repente.
Noah quer bebês comigo...
— Talvez não entenda, sabe Sam, você sempre pareceu me isolar
das minhas reais intenções, queria muito isso, mas antes não havia coragem
em mim. Eu era jovem, tinha tantos receios, hoje eu quero realizar todos os
meus sonhos com você.
Não tenho palavras pra descrever como me sinto agora, quero
chorar ao ouvi-lo falar isso, porque sempre foi o que eu mais quis de
alguém: poder me casar e ter uma família. Mas, nunca me passou pela
cabeça, que o meu melhor amigo fosse exatamente à pessoa que fosse
querer isso comigo.
— Não é rápido demais, ruim é perder tempo, não quero perder
mais treze anos da minha vida longe de você. Quando eu te vi na empresa,
só queria estar perto de você e poder ficar com você, nada mais importava.
— Você estava noivo, Noah!
— Não era de verdade, não o sentimento, meu noivado com
Dyanna era mais por aparência e status.
— Não imaginava que nutria esses sentimentos por mim!
— Nem fazia ideia?
— Não, você era como um irmão, um confidente... Algo que era
parte de mim sabe? — Minha garganta fecha — Por isso foi difícil quando
foi embora, me machucou de todas as piores formas, te ver se afastando de
mim.
— Me desculpe Sam. — Noah me olha com cara de choro — Eu só
tinha quatorze anos, pensei que estivesse fazendo o melhor, minha mãe só
tinha a mim e eu a ela.
Hoje não é o melhor dia pra falar do passado, estava me esquecendo
do aniversário do pai dele.
— Vamos ao cemitério?
— Mais tarde. Você está triste, Bolinhos?
— Não, eu estou com calor.
— Quer outro banho?
— Você não me deixou tomar banho direito Noah! Você me
arrancou do chuveiro e me trouxe pra cá.
Ele sorri e percebo uma ponta de vergonha em seu olhar.
— É difícil ser homem perto de você, Samantha. Sua bunda é... é...
porra, ela é!
Fico vermelha, Noah sorri maldoso.
— Por acaso, não gosta da nossa intimidade?
— Sim, é muito bom.
Toco sua face, minha mão se enfia em seus cabelos, Noah beija meu
seio com carinho, toma o bico deste entre os lábios e suga lentamente, sinto
uma fisgada gostosa no meio das coxas, é bom.
— Você é muito especial, Noah Baltimore!
— Eu te amo, Samantha Baltimore.
Sorrio revirando os olhos, ele se ergue me beijando, estou rindo
enquanto rolamos no chão do meu quarto — acho que podem ouvir minhas
gargalhadas de longe! Estou noiva de Noah Baltimore, nos casaremos e
moraremos em Charlotte, sonho melhor que este não há.
Rolo pra cima dele e Noah fica me olhando com um sorriso bobo
nos lábios.
— Será que eu estou pronta pra ser uma Baltimore? Quer dizer,
grandes decisões exigem grandes responsabilidades... — Ele me empurra e
fica por cima.
— Ah, Sam, você continua sendo uma palhacinha não é mesmo? —
Rouba-me um beijo e eu o empurro sorrindo da brincadeira.
— Eu... acho que você não lavou a louça do café mocinho, cadê a
responsabilidade?
Noah novamente me empurra e fica por cima, sorrio porque ele fica
me beijando o pescoço, sinto cócegas.
— Minha responsabilidade é você, minha Bolinhos.
— É mesmo?
— É mesmo! — Me beija — Te amo Sam, te amo, te amo!
— Também te amo Noah. — Nunca vou me cansar de falar isso —
Te amo mais que tudo!
— Poxa, — ele sorri meio incrédulo — tudo não é muito?
— Tudo é muito pouco perto do que eu sinto seu bobão!
Parecemos crianças felizes ao descobrir algo importante, o
significado do amor!
Nos beijamos por alguns momentos longos, e Noah puxa minha
perna pra cima, ele se ergue e se apoia nas mãos, seu corpo vem para o meu
com naturalidade e harmonia, sorrio segurando sua face e o beijo.
— Você não tem jeito, Noah, ai...
— Não quando se trata de você!
E eu adoro isso.
O PRESENTE É O MAIS
IMPORTANTE
Ele dorme ao meu lado, agarrado em mim, muito quieto e sereno,
sua cabeça em meu peito, sua respiração é calma e lenta. — Noah é muito
angelical enquanto dorme, admito! — Estamos nus em minha cama, metade
da coxa dele em cima da minha perna, seu corpo colado ao meu, e isso é
muito bom, meus dedos se enfiam lentamente em seus cabelos curtos e
lisinhos, analiso seu perfil, o homem que se tornou agora, se parece muito
mais com o menino que eu vi crescer, enquanto dorme.
Fico olhando seu corpo tão diferente do meu, Noah tem uma
bundinha e tanto, coxas definidas, costas largas que formam uma curva
bonita quando se aproxima da bunda, reparo na marca causada por um
calção talvez, eu não faço ideia, mas pela diferença de cor entre as costas e
a bunda — branca — concluo que ele esteve recentemente em algum lugar
com muito sol, analiso o quadril dele onde fica a divisão marcada pelo
bronze e enxergo a pequena mancha preta, só que percebo logo que não é
uma mancha, é uma tatuagem!
Arregalo os olhos, a tatuagem é quase minúscula, muito pequena,
estreito os olhos pra ler, e depois engulo a seco ao ler as três pequenas letras
rabiscadas por extenso:
“Sam”.
Sam!
Meu nome?
Noah se estica e fecho os olhos imediatamente, parece que o meu
coração vai sair pela boca, ele rola para o lado e olho de fininho, ele está
dormindo de costas pra mim, novamente olho para o lado do quadril e vejo
o meu nome por extenso na pele esbranquiçada.
Noah tatuou meu nome no corpo dele, não é possível!
Depois de alguns instantes me vejo rindo, abraçando ele com força,
não acho que havia necessidade dele fazer isso, há quanto tempo será que
fez? Me sinto infantil por ficar muito feliz por isso.
— Me deixa dormir mais um pouquinho Bolinhos, eu gastei muita
energia. — Pragueja sonolento.
— Tá bem. — Concordo e beijo o meio de suas costas.
Saio da cama, recolho a baderna que fizemos e jogo num canto,
Noah se estica e se ergue com cara de sono, pego um lençol e me enrolo —
vou esperar que ele me fale, vou fingir que não sei sobre isso e que não vi.
Talvez ele se sinta constrangido ou coisa assim. Conheço ele!
— Pode dormir, vou descer e preparar algo pra comer, já é tarde.
— Amor fica mais um pouco aqui! Vem cá, Sam.
— Sabe que se ficarmos aqui o dia todo não sairemos do quarto,
ainda precisamos ir ao cemitério.
Noah coça a face, fadigado. Suspira.
— Tá bem, então ao menos um banho juntos, Bolinhos?
— Era o que eu ia falar, mas me expulsou da cama e ficou me
falando que ia dormir e...
— Como você reclama Sam! — Corta ele, rabugento — Só sabe
reclamar.
Poxa.
Fico sem graça. Não respondo também. Acho que ele queria ficar
mesmo na cama e dormir e acabei acordando ele. — Vou até meu armário e
pego uma muda de roupa, roupa íntima e uma toalha seca, depois saio do
quarto e vou para o quarto dos meus pais, eu sei que eu sou reclamona, mas
não precisava passar isso na minha cara como se fosse a pior coisa do
mundo!
Entro no banheiro dos meus pais e fecho a porta, tomo banho
sozinha, refletindo um pouco sobre hoje, sobre tudo, as sensações não saem
do meu corpo apesar de tudo. Termino meu banho e estou bem melhor,
enquanto estou me arrumando, me olho o espelho, mas não noto muita
diferença da garota que eu era hoje mais cedo quando acordei — dizem que
a gente muda quando perde... Não vejo tanta diferença. Mas, ainda assim,
foi maravilhoso ter esses momentos com Noah.
Penteio meu cabelo para o lado e passo um pouco do perfume da
minha mãe, arrumo a camisa no meu corpo, e quando abro a porta do
banheiro, dou de cara com o Noah! Ele já tomou banho também, está com
um jeans seco e uma camisa preta de algodão, tênis, os cabelos arrumados
pra frente, ele meio que sorri pra mim.
— Tudo bem Sam?
— Sim, claro. Vou arrumar o almoço!
— Não quis parecer chato, é que quando estou com sono, eu fico
mal humorado.
— Eu entendo. Tudo bem.
— Tudo bem mesmo? Você não gostou!
— Não estava mentindo, eu sei que eu reclamo de tudo, não me
sinto mal com isso. Desculpe se isso te incomoda de alguma forma.
— Não quis ser grosseiro com você, se fui me desculpe.
— Não precisa se desculpar Noah, tudo bem.
— Estou meio arisco, não paro de me lembrar do meu pai. —
Suspiro, deveria ter imaginado! A data não é das melhores.
— Tudo bem. Vamos ao cemitério então, Noah.
— Não vou lá há treze anos, Sam... acho que não tenho sido o
melhor filho do mundo.
Noah está magoado, acho que subestimei o fato de que talvez o dia
de hoje não seja apenas ruim pra ele, talvez seja péssimo!
— Tudo bem, então, vamos e na volta passamos em algum lugar e
almoçamos.
Ele faz que sim com a cabeça e saímos do quarto dos meus pais.
Logo que entramos no meu quarto, percebo a organização e me
assusto, ele colocou tudo no lugar e arrumou minha cama — até trocou a
roupa de cama! — Vou até o armário e pego um par de sapatilhas, tiro a
camiseta branca que havia colocado e pego uma preta de manguinhas, logo
que visto, os braços de Noah estão me apertando, sua boca beijando meu
pescoço.
— Estou um pouco estressado Sam, parece que voltar me trouxe o
mesmo peso nas costas que eu carregava após a morte de papai.
— Não foi sua culpa, Noah.
— Eu sei, mas fico me recordando de tantas coisas sabe... Eu o
perdi cedo demais.
Viro-me para ele toco sua face com carinho, seus olhos azuis estão
mais intensos, a íris densa, ele está triste.
— Eu sei meu amor, — falo sincera — mas isso vai mudar! Sempre
que quiser ir eu irei com você.
— Fala isso de novo, por favor! — Pede, respirando fundo, fecha os
olhos.
— Sempre que quiser...
— Não essa parte, — Noah replica me interrompendo — a parte
que me chama de “meu amor”.
Sorrio, e vejo o semblante triste do homem que aprendo a amar
cada dia mais, e isso é tão... estranho! Não é como se sentisse sua dor por
sermos amigos, mas por algo que está muito além disso, por Noah ser o
homem que eu amo.
— Meu amor! — Repito e o abraço — Meu amor!
Noah me aperta enfiando a face no meu pescoço e cheirando os
meus cabelos, ele está realmente emotivo.
— Vamos, meu amor?
— Sim.

Passamos numa floricultura do centro.


Noah esteve calado até aqui, tão logo que chegamos ao túmulo de
seu pai o semblante dele se enche de dor, eu não havia parado pra pensar o
quão difícil deveria ser para ele, lidar com a perda do pai. Max Baltimore
morreu muito jovem. Lembro que ele saiu em uma viagem a trabalho e três
dias depois, Sarah apareceu desesperada em nosso trailer falando sobre a
morte do Marido. Noah estava como sempre calado, na dele, os olhos
fundos e avermelhados, fugimos pra Barbie e nos fechamos em nosso
mundo silencioso, e algumas coisas realmente não mudam.
Ele se abaixa e tira algumas folhas do tumulo do pai, me abaixo e
deposito em cima da pedra escura o buquê, Noah toca a lápide com a mão
aberta e a olha em silêncio. Eu sempre soube que a morte do pai lhe causou
um grande mal, mas não imaginava que ele não havia superado isso.
— Oi pai! — Noah fala baixinho — Senti sua falta, feliz
aniversário!
Isso me corta o coração.
Vejo um homem grande falando com um túmulo, poucas palavras,
mas coisas que eu sei que tem grande significado pra ele. Ele sente falta do
pai, e isto é algo que nem o tempo irá apagar de sua mente ou de seu
coração.
— Faz tempo que eu não venho papai, me desculpe, agora virei
com mais frequência!
Ele se ergue logo em seguida, me olha e percebo lágrimas em sua
face, me aproximo e 0 abraço com força, Noah devolve o abraço com a
mesma intensidade e ficamos abraçados por alguns momentos.
— Tudo bem Noah, — digo depois de alguns instantes — eu estou
aqui.
Ele me aperta mais e mais, fico quase sem ar, depois de me soltar,
seco sua face com as costas das mãos, me sentindo péssima em vê-lo assim
tão abalado.
— Vamos. — Ele fala num tom mais determinado.
Sei que ainda é muito difícil pra ele estar aqui, viver isso, passar por
isso, Noah sofre com a perda prematura do pai.
— Sim, claro. — Entrelaço os dedos nos dele — Vou te levar a um
lugar bem legal pra almoçarmos.
— Está bem meu amor.
Sei que talvez nada o anime hoje, mas espero ao menos que
melhore um pouco seu estado de espirito mais tarde.

— Nunca te disse, mas acho que nunca superei a morte do meu pai.
Estamos novamente na cama.
Nosso almoço foi rápido no centro, escolhi um restaurante qualquer,
mas não tínhamos muito apetite, comemos pouco, Noah também não puxou
assunto, se fechou em seu mundo triste. Eu não soube como agir, estava
diante de um homem crescido e adulto com um problema à qual ele não
sabia lidar, e eu não sabia o que fazer para que ele não percebesse que eu
não estava bem em vê-lo naquele estado de espírito.
Ele não me deixou pagar a conta, logo depois do almoço viemos pra
casa, subimos pro meu quarto e ele começou a se despir, se jogou na minha
cama apenas de cueca, seu olhar pedia algo além de atenção... carinho,
então, também tirei o jeans, os sapatos e a blusa e me deitei com ele na
cama. — Estou de calcinha e ele de cueca, ainda é constrangedor ficar
seminua diante dele, mas estou tentando ao máximo não ligar pra isso.
Ele está deitado em cima de mim, e eu acaricio seus cabelos e Noah
meu seio, nossa pequena convivência começamos a estabelecer hoje, e não
poderia ser melhor, ainda que um pouco incomodada com meu corpo.
— Sempre chorava no dia dos pais, na verdade, até uns três anos
atrás eu ainda sofria muito com isso.
— Imagino — digo e penso por alguns momentos — Minha mãe e
o meu pai são tudo o que eu mais amo Noah, eles são tudo o que eu sempre
tive. Quero que eles vivão muitos anos até a velhice; seu pai morreu quando
éramos muito pequenos.
— Eles viverão. — Noah entrelaça os dedos nos meus e me olha, o
queixo apoiado no meu peito — Tecnicamente, eles também serão meus
pais, ou sempre foram.
— Meu pai te adora!
— O senhor "M" é legal, ele é um bom sogro.
— Pode chamá-lo de Samuel!
— Não teria graça, perderia a emoção total.
Sorrio, Noah vai para o lado e aperta o meu seio com suavidade,
depois fica olhando-os enquanto os acaricia com lentidão, as pontas dos
dedos nos biquinho... me arrepio toda.
— Quando tivermos bebês quero que seus pais sempre fiquem com
eles! Não tive avós sabe, é ruim.
— Meu avô mora no asilo.
— O papa Man?
Reviro os olhos, Noah sorri surpreso, ele sempre chamou meu avô
de papa Man, por causa do sobrenome Manchester. Ele é o pai do meu pai,
meus outros avós morreram há um tempo. Foram perdas distantes, mas
tristes, mamãe não pode ir ao enterro de minha avó em Madri, meu avô
materno também morreu quando eu ainda era um bebê lá e minha avó
paterna morreu há cinco anos. Como não tínhamos dinheiro usamos a
previdência do meu avô para lhe pagar um asilo, antes da morte dela, eles
moravam num bairro distante daqui e a casa era hipotecada, então foi o
único jeito de manter ele seguro e bem, depois da morte da vó o vovô ficou
depressivo demais.
— E a sua avó também?
— Ela morreu há cinco anos. Foi um AVC, papai também sofreu
bastante com isso.
— Sinto muito Sam.
— Eu sei que sente.
— Eu saio pra surfar às vezes, é uma ótima terapia.
“Isso explica a marquinha nos quadris dele e a bunda
esbranquiçada.”
— E você Sam?
Noah não quer falar do pai.
— Eu leio às vezes, gosto de ouvir música.
— Ainda Nirvana?
— Deixa o Kurt, ele é só meu!
Ele também sabe do meu amor platônico pelo Kurt Cobain, apesar
de ouvir de tudo e gostar muito de pop, eu amo rock! Sempre ouvíamos
depois da aula pra matar a tarde.
— A menina do metal!
— Ao menos eu não ficava ouvindo ABBA escondido da minha
mãe e dançando feito o John Travolta...
— É, você dançava feito aquela gordinha do HairSpray!
— Você tinha inveja do meu rebolado Noah, admita.
— Você aprendeu a dançar tango com quem?
— Senhorita Penautt, do asilo, eu vou ver o meu avô e sou
voluntária.
— Quero um tango com você Bolinhos... outro tango!
— Você está tentando achar uma forma de pegar na minha bunda,
isso sim!
— Amor, eu pego na sua bunda quando eu quiser! Você é minha,
Sam, só minha!
— E eu sou possessiva?
— É!
Fecho a cara, mas Noah me cutuca fazendo-me cócegas, gargalho e
ele me puxa, vou pra cima dele, Noah aperta a minha bunda, enfiando as
mãos dentro da minha calcinha, me beija, minha boca é apenas dele nesse
momento.
— Então, você será a minha esposa em quatro semanas, Sam?
Quero sorrir, estou tão feliz.
— Sim, eu aceito.
Noah ri e meus lábios abafam sua risada, simplesmente o amo e não
quero pensar no amanhã, o agora é interessante! Casados ou não, isso não
mudará o fato de que nos amamos, o passado fica pra trás, temos nosso
presente, um ao outro e isso é o que realmente importa.
GORDA
Acabo de acordar.
Noah deixou um bilhete no lado dele da cama, leio.
“Bom dia, amor! O corretor me ligou e pediu que eu fosse ver
uma sala comercial no centro. Voltarei antes do almoço!”
PS: Eu te amo.
Noah.
Beijo o bilhete, estou tão, tão... feliz!
Não sei descrever as sensações em meu corpo depois de ontem,
depois que consegui arrastar o Noah pra fora do quarto, preparei sopa pra
nóms dois e ele foi buscar pão, ele voltou ao mesmo tempo em que meus
pais; mamãe estava carregando sacolas e papai com cara de sono, ela
arrastou ele por toda cidade pra comprar dois vestidos e um sapato novo,
isso é muito a minha mãe.
Papai e Noah falaram sobre a bolsa — como se papai entendesse
muito! — e mamãe ficou me contando o quanto estava feliz por ter ido ao
cinema, ela estava sorridente e eu me sentia feliz em ver minha família
reunida, — completamente reunida — faz tempo que eu não tenho
companhia à mesa. Eu sempre sentia um vazio quando, às vezes, olhava
para a minha direito e notava que faltava alguém, mas engolia aquilo.
Conforme os anos passaram, fui deixando de lado, mas ter o Noah de volta
é... maravilhoso!
Depois do Jantar lavei a louça e fiz café, Noah secou a louça,
guardou, mamãe e papai tomaram café e se recolheram e depois eu e Noah
fomos ver TV na sala, juntinhos. Acho que eram onze horas quando
subimos e fomos dormir.
Olho o despertador e me espanto. Faz um tempinho que não me dou
ao luxo de acordar tarde, já passa das sete e meia, saio da cama e desço, de
longe escuto as batidas de papai na cerca, a cozinha cheira a café e
manteiga, mamãe está com um lenço colorido na cabeça e usa um vestido
azul comprido. Faz tempo que não a vejo de vestido, sorrio e a abraço.
— Bom dia filha.
— Bom dia mamãe.
Ganho um beijo na cabeça, mamãe me sorri toda feliz, olho pela
janela da cozinha e vejo papai todo sorridente batendo os pregos, ele está de
calção e sem camisa, olho pra mamãe e ela cantarola toda sorridente... —
Hum... ontem teve!
— Então... — Falo indo pra mesa.
— Querida, poderia pegar o jornal do seu pai?
— Aham.
Papai deve ter esquecido, enfio um biscoito na boca e vou até o
correio, quero rir, meus pais sempre foram muito bons nessa coisa de
"sexo", apesar de o meu pai beber, ele na maioria das vezes "compareceu"
muito nesse quesito, mamãe e eu nunca falamos de sexo, nem ele falou
comigo, mas tinha dia que ficava realmente complicado dormir com tanto
barulho! Há algum tempo mamãe anda meio que isolando o papai,
principalmente depois da doença, acho que agora ela está começando a se
acostumar com isso e prosseguindo, não que antes fosse diferente, mas eu
percebi que eles meio que se afastaram nesse sentido depois que
descobrimos o câncer.
Pego o jornal e volto abrindo, papai gosta de ler o jornal desde que
me lembro, quando não tínhamos dinheiro pra pagar a assinatura ele sempre
pegava o do dia anterior na casa dos pais do Noah, nunca fomos desses
orgulhosos, se teve algo que papai sempre foi é humilde.
Abro na página de notícias assim que me sento à mesa do café e
enfio mais um biscoito na boca, mamãe foi para o quintal levar café pra
papai, observo pelo janelão ela parada ao lado dele, ele sorri com uma cara
de quem nem nega e aperta a bunda dela, preciso de um café, ergo o jornal
pra que eu não veja o resto e lentamente vou parando de sorrir ao ver uma
foto imensa estampada na coluna social.
Empalideço.
E aos poucos meus olhos vão se enchendo de lágrimas com a foto
que vejo, engulo a seco, e leio o título da matéria do Jornal, a coluna social
é escrita por uma blogueira famosa em Nova York.
Fico dura e meu coração vai doendo conforme vou lendo o começo
da matéria.

"HERDEIRO RICO COM GAROTA GORDA EM


LANCHONETE"

“Noah King, o herdeiro mais cobiçado de toda Nova York City,


após romper o noivado com sua lindíssima noiva Dyanna Miller, é visto
com esta garota que, digamos de bonita só tem os olhos e os cabelos. Tudo
indica que King esteja saindo com essa garota pra se divertir em sua antiga
cidade natal Charlotte. Eu acredito que esta é mais uma brincadeira que
"K" esteja fazendo conosco, francamente, não acho que ela se ajuste ao
padrão que Noah costuma ter quanto a namoradas, todo mundo sabe que
ele só sai com garotas da alta, esta deve ter sido um pequeno erro de
percurso não é mesmo?”
Sufoco o soluço em minha garganta, e saio da cozinha antes que
mamãe me veja chorando, subo pro meu quarto e tranco a porta, vou pra
minha cama e leio o restante da matéria.
"A garota que eu prefiro chamar de Willie, — sem ofensas! — é
desajustada, desengonçada e é claro, digamos... acima do peso. É, ela é
gorda!"
Essa palavra ecoa em minha mente e me machuca a cada segundo
mais e mais.
"Noah parecia muito confortável perto da Willie, eles dois comeram
e logo em seguida partiram, ainda não temos muitas informações sobre a
gordinha, mas ela já faz o maior sucesso entre as garotas mais zoadas da
minha página.”
“Noah, querido, acho que você está precisando de óculos ou de
bom senso, por favor!”
“Então, até descobrirmos de quem se trata, prefiro muito acreditar
que essa garota seja apenas um pequeno passatempo nas mãos do nosso
queridinho.”
Sem mais delongas, Flora.
Aperto os olhos e fico paralisada, vendo as lágrimas caírem nas
folhas do jornal, meu coração está dolorido e pesado, isso simplesmente me
destruiu.
ACABOU
Eu o vejo se sentar ao meu lado, Noah usa um terno e gravata, ele
está soado, fico parada, ainda é meio impossível que ele tenha me achado
aqui, não disse para os meus pais aonde eu ia, estava com a cabeça cheia
demais, meu coração estava doendo demais, me sentia péssima... Era algo
que não queria que mamãe visse. Me controlei ao avisar que precisava ir ao
centro resolver algumas coisas, quando na verdade, peguei minha bolsa,
calcei um par de tênis e vim pro único lugar onde eu me sinto realmente
sozinha, onde posso esvaziar a mente e apenas respirar: o bosque. Bem aqui
onde ficava o trailer dos meus pais, não exatamente aqui, onde estou agora
é a grande árvore, era aqui onde papai mantinha nossa mesa de refeições.
Permaneço olhando para o lugar onde tem muito mato, plantamos
um canteiro durante um tempo do lado direito, lembro que mamãe
pendurava vasos nos galhos dessa árvore nas épocas de natal, e que na
páscoa ela enfeitava tudo com ovos coloridos, passei metade da minha vida
nesse canto, lembro-me que eu era uma das meninas mais humildes da
escola, mas também era a que mais sorria, a que tinha pais presentes, e que
tinha o mais importante: amor.
Ainda que fosse pouco, tudo pra mim sempre foi suficiente, não
achava que precisava de mais, não sentia que precisava de algo além
daquilo, meu pai sempre me chamou de "gordinha linda" e a minha mãe
sempre me deu toda proteção e carinho do mundo, eu tive tudo e ao mesmo
tempo, muito menos que isso.
— Sam...
Acho que ele desiste de falar quando começa, e respira fundo, mas
não olho pra ele, não consigo, aquilo que eu li no jornal, ver minha foto
exposta daquela forma... a foto ocupava todo espaço impresso na página,
“Willie”, assim como aquela mulher me chamou, estava lá, enorme,
enquanto Noah King a beijava de leve, aquele beijo que eu não queria...
Deveria saber que isso não daria certo, deveria saber, deveria ter
dado ouvidos ao meu bom senso, a minha consciência. Por que eu achei que
daria certo ficarmos juntos? Somos tão... diferentes!
— Samantha...
Eu o fito, parece que arrancam meu coração do peito e enfiam
milhares de fagulhas nele, não queria olhar em seus olhos e ver toda essa
dor e desgosto, diria decepção, me viro pra frente novamente, abraço
minhas pernas.
— Isso vai passar Sam...
— NÃO, ISSO NÃO VAI PASSAR! — Berro, minha voz tem tanta
dor que queima, começo a chorar, meu berro ecoa por todo o bosque. —
Não vai passar porque tudo o que ela falou é verdade. Eu sou gorda, eu sou
uma baleia, e você é perfeito e rico, e isso não é pra ser, não devemos ser.
Tudo foi um erro, eu nem deveria ter começado essa droga toda!
Noah fica calado, os olhos azuis focados em mim, como quando eu
brigava com ele e ele não tinha resposta pras minhas acusações, acho que
ele sempre se choca quando eu fico realmente magoada ou furiosa, limpo
minha face com força, mas não adianta, as lágrimas caem e caem.
Levanto-me, porque já pensei e repensei demais nisso, e eu já me
decidi: simplesmente entendo que eu jamais vou me encaixar no mundo
dele, que não devemos ficar juntos, eu e Noah... impossível.
— Acabou.
— Não! — Noah fala, levantando — Você não pode fazer isso.
— Eu estou fazendo. — Tiro o anel de noivado, estendo para ele,
mas Noah fica imóvel me olhando como se não acreditasse — Pegue, dê a
alguém que te mereça de verdade.
— As coisas não se resolvem assim Sam, tenha um pouco de
paciência, as pessoas são preconceituosas. Não pode querer abandonar o
barco sempre que encontrar uma dificuldade. — Noah berra nervosamente
— QUE CACETE, COLOCA ESSA MERDA NO DEDO AGORA!
Assusto-me com sua reação também, mas não coloco o anel, fico
segurando na mão, estou tão... cheia disso. Ler aquela matéria destruiu meu
dia, destruiu a minha vontade de poder prosseguir com ele, de termos algo,
ela simplesmente acabou comigo tão rápido que mal sei explicar, é incrível
como as pessoas conseguem nos colocar no chão apenas com palavras, e é
muito pior saber que tudo o que elas dizem é verdade.
Fico calada, olho para a grama em volta da árvore. Não entra na
minha cabeça que eu deva ficar, porque eu sei que pagarei um preço alto
por tudo, eu não quero acordar amanhã e sofrer o que eu sofri hoje cedo, eu
não quero dar um soco no meu espelho do banheiro só porque a imagem
que eu vejo me machuca profundamente, estava começando a acreditar que
era realmente bonita, ao menos pra ele, até que alguém vem e fala que tudo
é mentira, e saber que Noah nunca ficou com outra garota gorda só reforça
o fato de que nada é como ele diz.
Como pode me amar e me aceitar se só ficou com Dyanna's da
vida?
— Samantha, temos que ficar juntos...
— Temos ou queremos?
— Eu amo você.
— Acho que você confunde as coisas Noah, você me amou pelo o
que eu representei na sua vida, — falo e choro, porque esta é a conclusão
que tirei durante o dia — você não ama quem eu me tornei, você não me
ama pelo o que eu sou hoje, você apenas me ama pela amiga que fui na
infância.
— Isso não é verdade Sam...
— Eu não me encaixo no seu mundo, eu não sou parte dele, então
acho que não podemos continuar!
— Sam...
— Acabou Noah, entende, apenas não era pra ser. — Me aproximo
dele e seguro sua mão, coloco o anel nela e a fecho, depois eu o olho,
soluçando — Eu te amo, mas não me peça pra me sujeitar a isso.
Depois que digo me afasto, então, acho que este é o nosso definitivo
fim.
— Acabou!
VOCÊ, AQUI, AGORA!
— Sua... Sua...
Depois que escuto isso sinto um puxão no braço.
Sou erguida do chão, e depois sinto que sou jogada para cima feito
algo muito leve, arregalo os olhos, depois meu corpo sacoleja e percebo que
Noah corre comigo em seu ombro, eu mal acredito que isso realmente esteja
acontecendo: ele está me carregando!
Caralho.
— Me coloca no chão, Noah Baltimore Terceiro...
Ele não responde, corre tão rápido que fico até tonta, depois de
alguns momentos vendo tanto mato, vejo as pedras e arregalo os olhos
quando sou arremessada. Solto um grito alto, e logo em seguida meu corpo
cai na água fria do lago, eu afundo e todo meu corpo se arrepia enquanto
estou afundando, subo depressa para a superfície, puxando o ar, Noah está
em cima da pedra, arfante, se apoia nos joelhos puxando o ar, soado,
arregalo os olhos também sem ar, mais pelo susto que tudo.
— Eu amo você Samantha, por quem você foi e por quem você é, e
não importa o que ninguém, nem você mesma diga, eu não vou desistir de
nós dois, — Noah fala com dificuldade — porra!
Aproximo-me das pedras com dificuldade, minhas roupas pesam,
subo vendo-o se aproximar, isso não muda o fato de que ainda estou
irritada, Noah me oferece a mão, eu a seguro e a puxo e ele cai de barriga
na água.
Acho pouco.
— Sua gorda desgraçada!
Olho pra ele de relance e ignoro, começo a tentar subir na pedra
muito mais furiosa do que ofendida, é como ver o meu melhor amigo de
cinco anos me chamando de "gorda desgraçada" outra vez, eu sei que é no
calor do momento e de verdade não me ofendo, mas me irrito, Noah falava
muito isso até fazermos sete anos, no dia que eu dei um tapão na boca dele,
nunca mais me chamou de "gorda desgraçada", às vezes de gorda, pra tirar
sarro mesmo ou pra se vingar, mas não de "gorda desgraçada", não gosto.
— Volta aqui sua gorda!
Ele me puxa pelos cabelos e caio de novo dentro d'água, gemo e me
viro tentando revidar, mas Noah me abraça prendendo meus braços pra
baixo, nossos pés alcançam as rochas do lago, eu o encaro, os olhos azuis
cheios de angústia, lágrimas, depois disso Noah me beija e me libera os
braços, eu os ergo abraçando ele, seu beijo é angustiado e forte, minha boca
dói com o esforço de beija-lo, mas também forço bastante porque a dor me
toma toda, soluço entre nosso beijo e ele me aperta com mais força, abafo a
dor dentro de mim, mas isso não funciona, pois agora percebo que Noah
compartilha de uma dor muito mais profunda.
— Não, — ele diz e afasta meus cabelos pra trás — Sam juro que
eu não sabia...
— Eu sei que você não sabia, eu sei que não é sua culpa Noah,
poxa, acha que eu pensaria isso de você? Só estou tão farta e magoada com
tudo, meu dia foi uma droga, — respondo e começo a chorar — ela me
humilhou da pior forma.
— Eu já estou cuidando disso. — Noah responde choroso — Porra,
Sam, você não vai terminar comigo entendeu? Eu te amo minha gordinha,
você é linda assim.
— Não importa o que você acha, às pessoas nunca vão nos aceitar
Noah, ninguém nunca vai nos ver como um casal normal...
— Para Sam, para com isso!
Eu o abraço com força, Noah me aperta na mesma proporção.
— Vamos pra Barbie, vamos esquecer um pouco de tudo, está bem?
— Isso não vai dar certo Noah, olhe pra mim!
Ele me olha e toca minha face com carinho, cola a testa na minha,
seus olhos estão profundos e plenos, mais claros ainda à luz do dia, mesmo
que avermelhados pelas lágrimas.
— Estou olhando Sam, e não consigo ver nada além de você, minha
noiva, minha amante, minha amiga, minha esposa, a mulher com quem
quero ficar todos os dias da minha vida, Gordinha, reclamona e chata,
apenas você, por quem foi e por quem é Samantha Manchester! Você, Aqui
comigo Agora e Sempre!
Fico sem palavras diante de sua pequena declaração, fecho os olhos,
e mais lágrimas caem de minha face, Noah as beija e depois beija a minha
boca com mais carinho, lentidão, meus lábios se rendem ao seu beijo, mas
tudo o que sinto no peito, é um carinho imenso por este homem, um amor
tão forte que transborda de dentro pra fora, apenas o amo, e sei que Noah
me ama. É algo tão simples e tão complicado. Sinto-me a mulher mais
sortuda do mundo em tê-lo ao meu lado.
— O caminho ao meu lado, Samantha, não é fácil, — ele enfia a
mão no bolso do terno e retira de lá meu anel de noivado — mas estou
muito disposto a viver isso com você, gorda ou não, apenas por quem você
é e por quem você se tornou, amiga ou não... por você.
— Talvez eu não seja a pessoa certa Noah, talvez...
— Você é tudo o que eu mais quero desde que nasci Sam, como
pode achar que não é? Desde que voltei estou tentando dizer isso, estou
falando e você não me escuta, além de gorda, desgraçada, tem problema de
audição?
Quero rir, Noah ergue a minha mão e enfia o anel no meu anelar
direito — como se fosse meu dono — o anel que lhe devolvi há alguns
instantes, mordo o lábio inferior chorosa, depois me jogo em cima dele
abraçando-o.
— Se tentar tirar esse anel do seu dedo de novo eu arranco ele
entendeu?
— Isso não vai acontecer, Noah!
— Nem se te chamarem de gorda de novo?
Penso por alguns instantes e apenas respondo:
— Nem se me chamarem de gorda de novo!
JUSTIFICATIVAS
Noah trouxe uma mochila, já tem colchonetes aqui, tenho a
impressão de que ele já estava com a intenção de me trazer na Barbie — ele
me puxa e me beija logo que entramos na sala. Lá fora o dia já está
acabando, o sol se põe.
Ele joga o terno pra longe e puxa minha camisa pra cima, ergo os
braços e logo em seguida ele joga a camisa pra longe também, abre meu
sutiã e joga pro outro lado, puxo a gravata e Noah desce beijando meus
seios. Fecho os olhos e deixo que ele tire meu jeans e a calcinha.
Tiro a camisa dele e ele se livra da calça, puxa a cueca pra baixo e
vamos nos beijando até os colchonetes. Não quero pensar em nada além de
nós dois, do nosso momento juntos. Quando seu corpo toca o meu, me
distancio de toda a droga que foi o meu dia.
O corpo dele está úmido e quente, a boca dele beija a minha, cheia
de desejo, Noah abre as minhas pernas e me possui lentamente e com todo o
cuidado do mundo, toco suas costas e não sinto dor, a sensação é ótima,
nossos beijos fazem barulho enquanto ele começa a se mover, ser dele é...
indescritível.
— Está bom amor? Te machuco? — pergunta baixinho, ele se move
lentamente — assim é bom meu amor?
— Sim meu amor. — respondo quase sem voz.
Fecho os olhos, ele entra e sai deliciosamente e meus quadris se
movem subindo e descendo com os dele, toco suas costas e minhas mãos
vão até a bunda de Noah, ele geme e aperto sua bundinha, ele desce e beija
meu seio com carinho, se movendo mais rápido.
— Você é tão quente meu amor, tão molhadinha!
Gemo quando ele me preenche, e sua a boca vai pro outro seio, me
arrepio e me encolho toda.
— Linda Sam. Você é perfeita, linda meu amor!
Confio nele, Noah me ama e eu o amo, e nada nem ninguém pode
dizer o contrário, nem meu medo, nem meus receios, nem o meu peso!
Fazemos devagar, nossos corpos começam a entrar no frenesi
delicioso, gemidos ecoam pela casa da árvore, e logo me vejo soltando
gritos, Noah acelera mais e mais fazendo com mais intensidade, sua boca
está no meu seio, seus olhos em todo o meu corpo, mas não sinto receio ou
vergonha, só consigo sentir...
— Prazer! — berro me encolhendo — AI, NOAH, POXA, AIII!
Ele tira de mim e vai pro lado se masturbando, faz na mão assim
que tira, se encolhe e geme alto me olhando, me tremo toda, gemo mais
alto, ele mordisca meu seio direito, a mão ainda se move na ereção, e ele
goza mais, depois segura e me olha.
— Senta um pouquinho, amor.
— Sentar?
— É, senta nele!
— Eu não sei fazer isso.
— Aprende! Vem, senta gostoso.
Me ergo e monto em cima dele, Noah se coloca dentro de mim e se
move, aperta meu seio com a mão limpa, gemo porque isso é muito bom, e
começo a mexer devagar, disso eu tenho bastante vergonha, ele me olha de
cima abaixo e seus olhos tem essa coisa nova que não sei decifrar. Me apoio
nos lados de sua cabeça me inclinando e Noah se move comigo, eu o beijo e
ele faz mais rápido, logo, fecho os olhos recebendo novamente o prazer em
todo o meu corpo, ele me beija com força, e perco o ar mais uma vez,
estremecendo em cima dele, meus quadris se movem sozinhos com os dele,
Noah faz dentro de mim e sinto um calor intenso percorrendo minha virilha,
minhas coxas, meus pés, alcançamos o prazer juntos, é recíproco e único, e
fico por alguns momentos parada beijando-o. É muito gostoso fazer amor
com o meu namorado, amigo, amante.
Vou para o lado e me deito de costas, Noah ergue-se, soado, ele se
estica e pega a camisa, limpa a mão, depois joga o tecido pra longe, deita-se
ao meu lado e me abraça colocando a cabeça em meu seio, meus dedos se
enfiam em seus cabelos, e fico olhando para o teto, tentando recuperar o ar.
Ainda não acredito que fizemos amor assim, nunca pensei que ficar por
cima seria tão excitante.
— As coisas não são tão simples, Sam. Não pode pensar em me
largar sempre que alguém falar mal de você. Infelizmente eu tenho uma
vida, assim como te disse, durante esses treze anos, eu construí uma
reputação, ou melhor, King construiu. E muito antes de eu voltar eu tinha
uma vida.
— Eu sei...
— Sabe mesmo? Então por que quer jogar tudo para o alto, Sam?
Por que não entende que eu não me importo?
— Não é você!
Ele me olha bastante sério.
— Tem razão. É com você, e isso me machuca muito mais, pois eu
te amo e odeio te ver assim. E pensar que quer me largar por causa disso me
deixa frustrado e magoado. Eu sabia que você tentaria fugir de alguma
forma Sam, quando vi o jornal jogado na sua cama eu fiquei louco! Sabia
que você tentaria fugir de mim e se esconder, você sempre se isola quando
sofre. Você não se abre com ninguém.
É muito ruim admitir que alguém esta certo, principalmente se essa
pessoa te conhece tão bem, que sabe que você não tem chance alguma de
rebater sobre isso.
— Nada e nem ninguém pode ditar com quem eu devo ficar ou com
quem eu quero, me tornei uma pessoa pública, me tornei alguém conhecido,
por causa da empresa, mas isso não da liberdade pra ninguém se referir a
você assim. Já contatei meu advogado, ele já está tomando as devidas
providências.
— Não queria pensar, me senti muito ofendida.
— Com razão. — Noah permanece tão sério que fico até meio
receosa — Ela não tinha o direito de falar daquele jeito com você. Mas eu
posso entender o motivo dela ter agido daquela forma.
— Conhece ela? — Questiono mais que surpresa.
— Sim. Seu nome é Cora, ela foi a minha namorada. É aquela que
te disse que me traiu com o meu companheiro de quarto.
Fico chocada com a revelação, Noah toca a minha barriga e beija a
minha face, ele está muito reflexivo.
— Não quero que se sinta ofendida nem magoada, neste momento,
preciso que seja mais minha amiga do que minha namorada, Sam.
Não sei o que falar, ainda não engoli o “minha namorada”.
— Eu e ela namoramos durante um ano, nós nos gostávamos muito,
mas algo aconteceu...
— Começa do começo. — Peço com um pouco de receio.
— Nos conhecemos duas semanas depois que começamos a
faculdade, começamos namorar um mês depois. Cora foi alguém que eu
gostei muito quando fui pra universidade, ela era uma moça muito especial
e gentil, mas tinha um problema... — Noah suspira concentrado, ele me
olha no fundo dos olhos — ela não se amava.
Ela não se amava? Não entendo!
— Ela era gordinha, Sam, assim como você. — Noah fala com
cuidado e fico dura no meu canto — Ela era acima do peso, mas eu nunca
me importei, tinha namorado algumas outras garotas quando fomos pra
Nova York, mas nenhuma delas tinha graça.
— Ela era gordinha, não é mais?
— Não. Depois de alguns meses que nós começamos a namorar, ela
optou por fazer uma cirurgia bariátrica.
— Nossa, e quanto ela pesava?
— Não sei Sam, eu nunca me importei com o peso dela.
— Era mais gorda que eu?
— Sim, um pouco mais!
Acho que para o Noah, isso realmente não importa. Pensei que ele
só havia namorado garotas manequim trinta e quatro, estou ainda impactada
com essa revelação.
— Depois que fez a cirurgia percebi que ela não era tão feliz quanto
antes, eu francamente não sinto que tenha mudado com ela sabe, mas via
que Cora não queria realmente ser daquela forma, ela fez porque se sentia
pressionada pelas amigas dela da faculdade. — Noah fala e se apoia na
mão, o cotovelo no colchonete, fica de lado me olhando — Ela não comia o
quanto queria, ela não se sentia feliz em saber que não poderia ter a mesma
alimentação de antes, ela perdeu muito peso e passou por várias cirurgias de
redução de pele, colocou silicone, depois disso, nós dois éramos vistos
como o casal perfeito da faculdade, Cora queria fazer parte dos grupinhos
da nossa turma, fazíamos o mesmo curso, mas eu nunca me senti bem,
sentia que ela queria algo que eu não podia oferecer.
— Ela queria ser popular!
— Sim, mas acho que ela queria ser aceita. Ela não se aceitava, não
se amava. E depois da cirurgia, ainda tinha crises existenciais incríveis. —
Noah parece distante — Eu a queria e ela queria ser suficiente para mim.
Ou talvez, só quisesse ser suficiente para carregar o nome do meu pai e
apresentá-lo à sociedade. Certo dia eu cheguei mais cedo e a peguei na
cama com o meu companheiro de quarto, depois disso, ela vivia me
procurando pra se desculpar, queria voltar, mas eu não perdoei, eu me sentia
tão mal.
O Noah é muito bonzinho, outra pessoa teria dado uma surra nela e
nele. Eu teria dado um chilique e depois da raiva, iria embora.
— Não disse nada não foi?
— Maldade se paga com bondade Sam, meu pai não me educou pra
ser um machista sem coração. — Ele responde e me derreto toda ao seu
lado — King me serviu pra alguma coisa, ele é um homem muito educado e
cortês, não sei como suporta a minha mãe.
— Deve ter sido terrível. — Concluo ficando de lado, toco seu peito
firme, ele se aconchega, enfia a coxa no meio das minhas pernas.
— Foi muito duro, mas eu não guardo mágoa, acho que a Cora sim.
— Por quê? Não foi ela que errou?
— Não sei, mas ela que tenha um bom advogado, porque as coisas
não vão ficar assim!
Noah me da um beijo doce nos lábios e me abraça, vem pra cima de
mim beijando meu pescoço... arregalo os olhos.
— Onde paramos?
— Eu por cima!
Ele ri e me beija com mais força. Esvazio minha mente, não quero
pensar em nada além do que temos. Mais tarde quando acordar, posso me
preocupar um pouco mais com os meus problemas. Agora não!
APENAS NÓS DOIS!
Sam acorda.
Basta que se mova no colchonete que sinto, ela se ergue e se senta
de costas pra mim, observo suas costas e eu a toco lentamente, ela olha pra
mim meio de lado e sorri, e basta que faça isso pra que me sinta bem, feliz
— algo que não tenho sido há um bom tempo.
Sam despertou em mim algo que havia matado há muitos anos,
alguém que eu fui e deixei de lado, algo que eu nunca deveria ter feito:
deixado pra trás o homem que fui quando parti.
Toco seus cabelos curtos e puxo seu corpo quente pro meu, vou pra
cima dela, gosto do aconchego da minha mulher. Sim, minha mulher, por
que seria diferente?
Ela é apenas minha, fui seu primeiro e serei seu último.
É muito bom estar com Sam, ainda que ela tenha mudado bastante
desde que eu a vi pela ultima vez neste lugar. Foi deprimente deixa-la aqui,
foi a pior coisa que eu fiz. Claro, mais por obrigação do que por querer, mas
eu estava muito confuso na época.
Havia mamãe, havia eu e havia um estranho que queria casar com
ela, e tudo o que eu sabia era que não poderia deixar mamãe ir sozinha,
depois que o meu pai morreu eu me responsabilizava demais por ela.
Queria suprir a falta que meu pai fazia na vida dela com a minha
presença, não me dava conta de que nada poderia reparar o vazio que papai
deixara, nem em mim. Partir foi a decisão mais fácil que mamãe tomou. Ela
estava tão lotada das lembranças da morte de papai que decidiu ir embora,
me levou junto, e eu levei comigo grande parte do que tive com a Sam.
Uma infância alegre e feliz, momentos únicos, e um mundo onde
existíamos somente ela, eu e grandes aventuras.
Claro que no último ano antes de partir fiz merda, mas aquilo não
significava que eu não a amava ou que eu não me importava com ela, tudo
o que eu queria era poder ir embora sem magoá-la, mas por fim, ainda que
sem querer, magoei muito mais do que deveria.
Falar sobre ir embora não era uma opção, não havia como escolher
entre a minha melhor amiga de infância — e amor da minha vida — e a
minha mãe. Eu era apenas um garoto que dependia muito mais de uma mãe
depressiva do que de uma amiga valentona.
Observo Sam em seu silêncio.
Aos poucos percebo que muitas coisas mudaram nela, ela é tão
cautelosa agora, ela se fechou mais do que já era fechada. Antes, Sam
também não era tão incerta quanto à sua aparência, e não quero imaginar o
quanto sua autoestima deve estar baixa depois de ontem.
Quando me lembro de Cora, parece que o meu coração arde de
ódio, fúria e raiva, por que não acredito que ela teve coragem de fazer o que
fez e falar o que falou de Sam. Como se não bastasse ter me colocado um
par de chifres na época da faculdade, ela agora também quer destruir meu
namoro com a minha gordinha?
Não vou permitir que isto aconteça.
Sam e eu ficaremos juntos dessa vez.
Finalmente consegui ter coragem de me declarar, de colocar pra
fora os sentimentos que guardei um tempo e tentei isolar do meu coração, a
verdade é que eu amo essa mulher desde sempre, eu a amo dos pés a
cabeça, sem tirar e nem por, e isso, por mais romântico que pareça, foi e é a
coisa mais complicada que tenho feito em toda a minha vida.
Sam não é fácil, e percebo que a vida não foi tão grata com ela
nesses últimos treze anos. Sei que ela deu muito duro para ajudar os pais,
mas não fazia ideia de que ela havia passado por tantas dificuldades
financeiras para conseguir comprar a velha casa dos Manchester de volta.
Em parte culpo o pai dela, em outra a mãe, mas não os julgo, eles
sempre foram tão pobres, só que saber que ela quase passou fome enquanto
eu estava em muitos lugares do mundo vivendo uma vida muito melhor que
a palavra “boa”, me irrita, faz com que eu me odeie um pouco mais, pois,
acredito que se eu estivesse aqui ou ao menos tivesse tentado falar com ela,
não teria passado tanta dificuldade.
Sam é genial, esperta, mas ela também não estudou, estava muito
ocupada ajudando os pais, e isso me magoa muito mais. Fiquei me
perguntando esses dias, se eles haviam tirado os sonhos dela ou se a vida os
tirou, por que tudo o que aconteceu foi muito injusto pra ela, ela não
estudou, ela não tem um bom emprego, ela trabalha de domingo a domingo
e segundo sua mãe teve épocas que ela trabalhava em dois empregos pra
ajudar nas contas da casa, tive medo de falar quando ela me disse há alguns
dias que Sam também tentou suicídio há cinco anos, me arrepio todo só de
pensar nisso, porque sempre guardei dentro de mim a esperança de que ela
estava bem, feliz, e as coisas pra ela não foram assim.
— Te amo. — Ela fala baixinho e me abraça com carinho — Te
amo Noah!
Abraço a minha gordinha.
— Também te amo, Sam.
Sam beija a minha cabeça e me ergo, eu a fito me sentindo cheio de
sorte, feliz, coberto de sentimentos por ela. Quero que Sam tenha tudo o
que não teve, quero lhe dar tudo o que ela merece, inclusive o meu amor.
— Tudo bem querida?
— Muito bem!
Ela sorri e sinto esse friozinho desgraçado no estômago. Lembro-
me de quando estávamos com seis anos, na época dos dentes de leite, ainda
que banguela, ela sempre me causava essa coisa na barriga, nenhuma
mulher foi capaz de me causar isso até hoje.
— Você é linda, Samantha.
— Obrigada meu amor.
Eu a beijo.
Sam é simplesmente e absolutamente linda pra mim, e não importa
o que digam ou façam, ela ainda continuará sendo linda, e tudo o que mais
quero sempre.
Não vou permitir que ninguém diga ou faça o contrário, Cora que
me aguarde.
NOVO LAR
Acabamos de sair do consultório.
A médica me fez tantas perguntas que fiquei até meio confusa, mas
deu tudo certo, colhemos sangue e agora estamos indo pra casa.
Noah dirige parecendo mais tranquilo, mas a médica foi bem clara
com nós dois, com as possibilidades de que eu talvez engravide depois de
ontem. Ela marcou o meu primeiro papanicolau pra semana que vem, até lá
não podemos ter relações sem camisinha, e ela também disse que vai me
receitar um anti-concepcional, assim que eu fizer os exames necessários.
Estava com um pouco de vergonha no começo, mas estou melhor agora,
Noah quer que estejamos prontos pra vivermos nosso casamento, claro que
não parei pra pensar num bebê agora, e pensando bem eu fui bem
inconsequente ontem, mas é que eu estava tão feliz com tudo que não quis
me preocupar, agora não sei se me sinto tão preocupada quanto deveria! Eu
não sei o que acontece comigo quando estou com o Noah, ele me faz agir
como uma completa irresponsável.
— Pensei em contratar um pintor para pintar a casa dos seus pais,
mas acho que sua mãe está bastante fragilizada com a saúde dela, então,
pensei em deixa-los na nossa casa.
— A casa da sua mãe?
— Sim, vamos mobiliar, e logo que mobiliarmos nós levamos seus
pais pra lá.
A ideia é bem vinda, mamãe precisa mesmo ficar quieta.
— Não vai durar mais que duas semanas, amor!
— Bem, por mim não há problema, eu te ajudo a pagar o pintor,
meu pai não vai aceitar que pague tudo sozinho.
— Não precisa se preocupar com isso querida, eu disse que pago.
Suspiro, pois, não gosto nenhum pouco que Noah fique gastando o
resto do dinheiro que tem comigo e com os meus pais. Aproveitadora eu
não sou, também por que sei que agora ele não conta mais com o amparo da
mãe, de King, sei que as coisas para nós dois não serão fáceis, Noah não
contará com tanto dinheiro como vem contando estes últimos anos, nem
com tanto conforto, eu não tenho muito a oferecer, não tinha parado pra
pensar nisso.
— Samantha...
— Eu quero começar a trabalhar logo, assim nós dois podemos
juntar dinheiro, tem a minha poupança, não é muito, mas já ajuda. Eu sei
que o que tenho a oferecer não é muito, — eu não sou muito — mas quero
realmente te ajudar.
— Amor eu tenho um dinheiro.
— Não quero que sua mãe pense que somos aproveitadores, que
quero seu dinheiro, Noah.
— Acontece que a minha mãe não fará parte da nossa convivência,
vocês são a minha família e tudo o que quero é lhes dar o melhor, confie em
mim, meu dinheiro dá amor.
— Sei que é bem intencionado...
— Não sou bem intencionado Sam, mas me ofende, sou homem e
quero poder sustentar você. Seus pais precisam que a casa esteja bem, pois,
sua mãe está doente. Quando nos casarmos eles ficarão lá e a casa tem que
estar pronta pra recebê-los, ela precisa dessa pintura e pequenos reparos.
Sempre soube disso, mas não temos tido dinheiro pra consertar.
— Vou pagar e vamos escolher os móveis hoje à tarde.
— Vamos?
— Sim, eu vou te levar na casa com uma decoradora, ela vai te
mostrar tudo, daí começam a mobiliar logo que possível.
Mandão!
— Com você tem que ser assim porque é teimosa demais! Tem
horas que me deixa nervoso Sam, poxa vida, odeio brigar.
Sei disso também, mas não queria brigar também, não tinha
intenção, mas se ele insiste não vou me opor, não pedi que ele fizesse nada
disso, contudo sei que é necessário.
— Já falei com um colega advogado da cidade, ele vai organizar
tudo pro nosso casamento.
— Quer se casar na igreja também?
— Sim, claro, você não?
Não posso responder um "não" assim de cara, ainda mais sabendo
que Noah ficaria muito magoado em saber os motivos, mas fico calada, não
sei o que dizer, não tem como falar pro meu noivo que não me imagino num
vestido de noiva simplesmente por não ser como uma noiva convencional,
alguém magra e linda, eu não sou, não me imagino num vestido de noiva
nem hoje, nem nunca.
— Não quer?
— Pode ser.
Noah estende a mão e toca a minha face.
— Você é perfeita Sam, me desculpe, estou sendo grosso, é que eu
odeio que fique debatendo comigo sobre dinheiro. Eu sei que você vai me
ajudar e te agradeço, você é honesta e honrada, meu amor.
Inclino-me e me aconchego a ele, apoio minha cabeça em seu
ombro e beijo sua face, também não quero brigar, estávamos muito bem
quando acordamos hoje, me sentia segura e feliz, bem, ainda estou, mas sei
o que terei de enfrentar à partir de hoje depois do que aquela mulher
colocou num jornal usando minha foto.
— Te amo minha gordinha, vamos nos casar e ter nosso canto!
— Tá bem, mas sem o “gordinha”.
— Ok, Bolinhos do mal!
Acabo por rir, eu sei que tudo só está começando e, para que as
coisas realmente deem certo, tenho que me adaptar a Noah ou a sua nova
vida e a quem ele se tornou. Ele vem fazendo muitas concessões por mim,
ele me ama e eu o amo a cada segundo mais. Não posso, nem vou permitir
que nada atrapalhe de vivermos nossos sonhos. Prometi isso pra mim
mesma ontem, e vou cumprir!
— Reforma, casa, igreja... aqui vamos nós! — Vejo um sorriso de
felicidade nos lábios do meu magrinho, mas ele não precisa saber desse
apelido brega e bobo que inventei pra ele, ao menos não agora.

Mamãe se encheu de ideias quando ouviu a palavra "casamento".


Papai até que não se queixou sobre pintar a casa, mas ele fez
questão — como eu havia dito — de pagar com o dinheiro que ele tem
guardado pra ajudar na reforma, Noah recusou até cansar dele, papai é
insistente.
Então nós quatro passamos o resto da manhã falando sobre isso,
Noah avisou para mamãe que ela poderia escolher a cor da tinta e tudo
mais, ela se mostrou muito feliz, quanto ao casamento, ela fez questão de
querer arrumar tudo, a decoração da igreja — como se fossemos chamar
umas mil pessoas! — e o jantar que segundo ela, vai dar no dia que
assinarmos os papéis, o assunto do almoço foi o casamento, mas eu até que
gostei, na verdade me entusiasmei tanto que comecei a pensar nas pessoas
que teria que chamar: a Faith com certeza, Noah falou o nome dela primeiro
que eu quando mamãe pegou uma folha de papel e uma caneta, Donatela foi
a segunda, vovô foi o terceiro, e assim foram aparecendo os nomes e
formamos uma pequena lista de apenas vinte convidados, fiquei sem graça
de falar o nome do Ty, mas decidi conversar primeiro com o Noah
particularmente sobre isso, antes de nos sujeitarmos a outra discussão na
frente dos meus pais.
Após o almoço subimos pro nosso quarto e ficamos um tempinho
deitados, acabamos por dormir, mas acho que não muito, Noah me acorda
pra um banho antes de irmos a nova casa pra encontrar a decoradora.
Nosso banho é muito gostoso, namoramos um pouquinho e também
há muito carinho entre nós dois, mais harmonia estampada em nossos
corpos, e eu pela primeira vez definitivamente não estou morrendo de
vergonha dele, Noah toca meu corpo e me lava de forma natural e
carinhosa, nos beijamos e trocamos olhares mais quentes, mas não temos
tempo pra nada, não podemos demorar.
Saio do box primeiro, me seco e pego uma das minhas roupas novas
pra poder ir com ele ao nosso novo cantinho. — Estou feliz — Visto uma
calça jeans cintura alta de cor azul escura, e uma blusa colada branca com
umas letras de estampa, coloco por dentro do jeans assim como Beth me
ensinou, e decido usar as minhas maquiagens que não uso há um tempo.
Vou pro banheiro da sala pra me maquiar, deixo meu cabelo partido no
meio e passo o batom, quando termino, me olho no espelho e me sinto
renovada, mais bonita.
Eu não tenho apenas olhos e cabelos bonitos, eu sou bonita, apesar
de estar acima do peso eu sou até bonita, tenho sobrancelhas bonitas e uma
boca muito bonita, minha cintura não é lá essas coisas, mas ela é mais fina e
eu tenho bunda.
— Amoooor, sua mãe fez café, vem tomar um pouco antes de
irmos!
— Já vou!
O Noah tem essa coisa de se familiarizar muito rapidamente, mas
ele já conhece muito bem os meus pais, volto correndo pro meu quarto e
coloco sandálias baixas, mamãe lavou metade das minhas roupas novas,
mas vou falar com ela pra que deixe pra mim, não quero que ela se esforce
demais, passo perfume e pego minha bolsa com os meus documentos, desço
correndo pra cozinha, me sento à mesa ao lado de papai, fico de frente pra
Noah, mamãe fica me olhando, enquanto papai sorri pra mim meio
surpreso.
— O que foi? Eu borrei o batom? — Pergunto confusa.
— Não, é que você está linda! — Noah fala de repente.
Fico vermelha, ele está de jeans e camiseta, tênis, seus cabelos
como sempre estão jogados pra frente, me sirvo de um pouco de café
enquanto papai me beija na cabeça.
— Você é linda Jas, — papai fala — ninguém deve dizer o
contrário.
— Obrigada pai, — falo sem graça — eu não vou permitir, pode
deixar!
— Nem eu. — Noah reafirma me olhando de cima abaixo.
Eu sei que não.

A decoradora nos espera na porta da casa.


A casa dos Baltimore foi reformada e parece muito melhor do que
antes, a antiga vizinhança de Noah ainda é a mesma, não mudou, mas é
tranquila, não fica longe da casa dos meus pais, mas fiz questão de não
colocar os pés nessa rua nos últimos treze anos, era muito ruim vir aqui e
me lembrar de tudo.
— Oi! Me chamo Nice, que prazer conhecê-la.
— O prazer é meu, Nice, sou Samantha.
Noah me pega pela cintura logo que abre a porta, a casa por dentro
está mais espaçosa, mas está vazia, me lembro da decoração e da
organização que Sarah Baltimore fez nesta casa durante várias vezes até
eles irem embora, havia fotos do Noah pra todo lado, a instante da TV era
cheia de bibelôs, muitas coisas às quais realmente que ela gostava, mas foi
nessa sala que eu mais fiquei com o Noah, assistíamos a TV e brincávamos
sempre juntos, o chão é mais de taco velho, a casa está novinha por fora e
por dentro, e tem inclusive uma lareira.
Nice começa a falar das ideias que tem, nos mostra catálogos,
subimos para o andar de cima e ela vai falando das cores, dos estilos — eu
sempre fui muito simples, mas confesso que poder ter a opção de escolher
quais os móveis que poderei ter num lugar meu é fantasticamente
maravilhosa.
Noah e eu olhamos os catálogos de cores e decidimos por um
branco gelo, Nice explica como podemos mobiliar cada ambiente da casa
da forma que quisermos. Ela nos mostra fotos de decorações logo que
entramos no cômodo que será o nosso quarto, — este era o quarto dos pais
do Noah — ele abre a janela e me lembro que antigamente haviam cortinas
ali e a cama de casal ficava na parede da porta, mas Nice sugere algo bem
diferente, Noah concorda assim como eu, ela faz anotações, também
conversamos bastante sobre incluirmos algumas plantas na casa, é bem
maior que a casa dos meus pais, acho que os antigos donos aumentaram
com o passar desses anos.
Ficamos horas e horas decidindo como será a decoração dos quartos
e da sala, e quando me dou conta, já estamos no jardim dos fundos
decidindo como será a grama, o canteiro, Nice sabe como transformar os
sonhos das pessoas em realidade...
— Ótimo, então está combinado, começamos amanhã!
Fico feliz e entusiasmada, Nice se despede depois disso e nos deixa
a sós em nossa nova casa.
— O que achou Bolinhos?
Pulo em cima dele, em resposta, eu o beijo, acho que ele percebe
logo minha resposta e a entende. Eu simplesmente amei!
VIÚVA NEGRA
A semana transcorreu mais rápido do que imaginei.
Durante todos os dias Noah saiu cedo pra resolver as coisas de sua
nova empresa.
Mamãe começou a organizar tudo pra nossa cerimônia no religioso
enquanto Noah pegou meus documentos e procurou um advogado pra
resolver o do casamento no civil.
Ficarei em casa durante todos os dias, até Noah resolver onde ficará
sua nova pequena empresa. — estou de molho — Papai me deu a ideia de
empacotar algumas coisas por conta da pintura da casa.
Na quinta- feira, mamãe teve químio, então foi o mesmo processo,
mas fomos eu e papai acompanhá-la dessa vez. Ela saiu cansada e enjoada.
Aproveitei e lavei minhas roupas novas, organizei algumas malas
que o Noah trouxe no meio da semana, ele tem tanta camisa social que eu
nem sabia por onde começar, camisas, calças, sapatos, e cuecas.
Jamais pensei que fosse me envolver com um executivo, claro que
sonhei e sonhei diversas vezes que encontraria alguém legal e tal, mas não
um homem de negócios, e é isso o que eu penso que seja o mais
interessante, irei me casar com um cara de negócios, mas que também é
legal e é o meu melhor amigo.
Acordei mais cedo, enfim sábado, mas quando levantei o Noah já
não estava na cama, ele saiu pra correr, deixou um recado colado na
geladeira. Aos poucos vamos nos encaixando novamente um na vida do
outro, não mudamos muito durante esses anos, acho que apenas crescemos
e demos prioridades diferentes a áreas de nossas vidas, determinadas áreas.
Fiquei com trauma do jornal, então nem vou pegar, mesmo que não
tenhamos tocado no assunto ainda, me enoja lembrar das palavras daquela
mulher sem noção, pensei muito sobre tudo isso, mas não encontro motivos
pra essa tal de Cora me odiar, pra ela nos atacar assim, principalmente a
mim. Decidi não me preocupar, porque o que importa é o que eu e Noah
queremos, não devo nada pra ninguém, eu e ele nos amamos e queremos
nos casar, ficar juntos e é isso o que faremos.
Também pensei na mãe de Noah e em toda a situação com calma,
no Ty, ele não deu notícias, me preocupo com ele, não quero que nada de
mal lhe aconteça, porém, confesso que o meu entusiasmo com o casamento
foi como uma peneira para os meus problemas, fico tão feliz de pensar que
em breve nos casaremos que mal acredito.
Preparo o café quando escuto o som da campainha, vejo as chaves
do Noah penduradas no lado da porta e concluo que são as dele, corro,
porque sei que a semana foi cansativa pra mamãe, até mesmo pra papai, ele
não bebeu essa semana — ufa! — e cuidou dela e de alguns afazeres da
casa sozinho. Eu me ocupei em cuidar da pequena mudança do Noah e suas
malas.
Quando abro a porta parece que o meu coração vai sair pela boca, a
belíssima mulher de conjunto vermelho parece respirar elegância, ela usa
uma saia cintura alta, vermelha, com um terninho da mesma cor e sapatos
pretos, um chapéu chamativo e óculos escuros, eu nunca vi Sara Baltimore
tão bela em toda a minha vida.
— Eu vou ser bem direta garota, quanto quer pra deixar o meu filho
em paz?
Fico paralizada com a pergunta, e o meu coração dispara
imediatamente, Sara me olha sob seus óculos enormes de cor marrom. Eu
não acredito que ela se deu ao trabalho de vir aqui me oferecer dinheiro pra
largar o Noah. Realmente, ele tem razão! Essa mulher não é a Sara que eu
conheci toda a minha vida.
Mas apesar do choque, eu sinto dentro de mim que não devo me
curvar, dentro de minha mente me lembro das palavras do Noah no lago e
me sinto forte, nem Cora, nem a sociedade nem a mãe dele podem nos dizer
o que devemos fazer, ou o que queremos, nos amamos e nos casaremos,
com ou sem o apoio deles.
— Samantha, você está surda querida?
— A resposta é não, e eu não sou sua querida!
— E continua atrevidinha pelo visto.
Puxo a porta e a fecho, Sara recua dois passos largos como se não
quisesse encostar em mim, acho que chegou o momento de eu reagir a vida
como sempre fazia quando criança...
— Eu deposito o dinheiro quando você quiser, basta que fale e eu
transfiro!
— Quem é você? — pergunto chateada — O que fizeram com a
senhora Baltimore?
Sara me olha como se a pergunta fosse idiota, eu me lembro que ela
me adorava, e eu a adorava, mas então ela arrumou um namorado, Noah se
afastou de mim e eles foram embora, foi tudo tão rápido, milhões de coisas
passaram pela minha cabeça, mas jamais imaginei que ela havia enricado e
ido embora.
— Você acha que sou tola, Sam? Acha que eu não sei o que quer?
— O seu achar não me importa nenhum pouco!
— Noah é um rapaz lindo, rico, ele tem classe, pode-se ver de longe
que vocês dois não servem um para o outro, só é uma diversão nas mãos
dele, uma ilusão da infância!
Ela despeja tudo e isso me machuca, mas me mantenho firme. Da
vontade de arrancar estes óculos da cara dela, olhar no fundo dos seus olhos
e falar tantas coisas, mas me controlo, porque acima de tudo ela é mãe do
Noah, infelizmente, nem sombra da Sara que eu conheci.
— Você é gorda, Sam, não seja ridícula! O Noah não te quer.
Isso também machuca... Mas ergo minha cabeça, eu não vou
permitir que mais ninguém se refira a mim dessa forma, eu prometi para
mim mesma há uma semana, que nada nem ninguém vai me por pra baixo.
— Pois é, mas foi essa gorda que ele pediu em casamento, e é com
esta gorda que ele vai se casar e morar na sua antiga casa. — Respondo
bastante séria e Sara tira os óculos com um sorriso falso no rosto, os olhos
azuis afiados, me preparo pra mais uma enxurrada de acusações.
— Ora, não seja tola! Noah só está confuso. Ele deve sentir muita
pena de você, veja essa espelunca aos pedaços, até mesmo eu tenho pena,
sinto vontade de lhe pagar uma reforma.
— Pois fique com o seu dinheiro, porque eu prefiro morar numa
espelunca, do que viver humilhando as pessoas. Você não merece o amor de
ninguém, essa pessoa que se tornou é superficial e vazia...
— Me poupe garota, gorda, Willie... É assim que a chamam?
Fecho os punhos, e quando Sara ri sinto vontade de chorar. Engulo
o choro, e escuto o som da porta abrindo atrás de mim.
— Sam! — mamãe chama — Nossa, Sara!
Sara por alguns momentos parece um tanto incrédula ao rever
mamãe, acho que não esperava vê-la careca, nem eu, mas mamãe não
parece muito bem, ela se esqueceu de colocar o lenço e só vestiu um hobbie
por cima da camisola, lanço um olhar magoado pra Sara, não quero
continuar discutindo com ela perto da minha mãe, sei que isso iria feri-la
profundamente, acho que ela nem ficou sabendo da história do jornal, pois
nem comentou comigo.
— Olá Sara, bem vinda, — mamãe fala com um pequeno sorriso —
veio ver o Noah?
— Eu... vim... eu... ah, claro! — Sara diz com um sorriso mais falso
que nota de quatro reais — estava perguntando a Sam se ele está ai.
— Acho que ele foi correr. — mamãe responde e me olha — Tudo
bem?
— Sim mamãe! — respondo e tento sorrir — Me espere na sala, eu
já levo seu café.
— Tá! — mamãe sorri para Sara — Estamos muito felizes com a
união da Sam e do Noah, esperamos que venham para o casamento.
— Ah, claro! — O semblante de Sara está... indecifrável.
Mamãe vai até ela e sinto vontade de puxa-la pra longe da cobra,
mamãe a abraça com uma afeição que há anos não vejo, elas eram até
amigas antigamente. Claro, meus pais sempre foram amigos dos pais do
Noah, mas isso acabou a um tempo, Sara da umas batidinhas leves nas
costas de mamãe e vejo a falsidade estampada em seu sorriso, depois
mamãe entra dentro de casa fechando a porta atrás de si, eu encaro a mãe do
Noah com raiva, mágoa, tudo.
— Ela está morrendo?
— Não, ela está com câncer. — odeio quando fazem esse tipo de
comentário.
— Não tenho pena de vocês!
— Não preciso da sua pena!
— Mãe?!
Fico dura, nem havia percebido, mas o Noah já estava subindo os
degraus da varanda, ele olha pra mãe como se não acreditasse, Sarah fica
assustada, eu tenho absoluta certeza de que essa megera não contava com
isso.
— O que faz aqui? Eu disse pra não vir!
— Eu sou sua mãe, tenho direito de me preocupar com você, bebê!
Noah vem para o meu lado muito sério, me dá um beijo na cabeça e
faço menção de entrar, pois, não quero mais olhar na cara dessa viúva
negra, dessa naja sem coração.
— Quero te convidar pro nosso casamento mamãe!
Sara engole a saliva a força, sua reação não é diferente, parece que
a qualquer momento ela vai explodir de ódio.
— Que casamento, Noah? Você perdeu o bom senso? — Sara
pergunta num tom muito baixo — Você só pode estar louco.
— Nunca escondi meus sentimentos pela Sam, mãe, eu sempre te
disse que gostava dela...
— Você tinha treze anos, Noah...
— Bem, eu ainda a amo, você vem? King!
Eu não sei o que se passa na cabeça do Noah, é evidente que a
família dele não me aceita, e mesmo assim ele insiste que eles venham para
o nosso casamento.
— Você está fazendo isso para se vingar de mim, porque eu fui
embora desse inferno de cidade não é mesmo?
— Não mãe, eu amo a Sam, nós dois queremos ficar juntos...
— Meu filho, será que não entende que essa garota não é pra você?
Ela é gorda e desajustada! Veja, ela... ela é desproporcional meu filho!
Abaixo a cabeça e percebo que choro.
— Eu odeio você mãe! — Noah diz com tanta mágoa na voz que eu
sinto dentro do meu coração isso — Odeio você mais do que tudo, se o meu
pai fosse vivo ele teria nojo de você, das suas atitudes, eu me envergonho
de ser seu filho.
Sara fica calada, assim, muito chocada com o que o filho fala.
— Sam e eu nos casaremos, não precisa vir. E fique sabendo você,
que ela é completamente ajustada pra mim, ela não é uma oportunista como
você, que só se casou com alguém pra ter as coisas.
— Noah... — falo, mas ele não me escuta.
— Tenho vergonha de ser seu filho, tenho nojo do seu preconceito.
Me esquece! Esquece que sou seu filho. A partir de hoje eu estou morto pra
você, assim como meu pai.
Sara não responde. Noah abre a porta e me puxa pra dentro da casa,
depois passa as mãos em minha face com força e me beija.
— Calma. — Fala baixinho.
Faço que sim, engolindo o choro, escuto o som dos saltos descendo
os degraus da varanda e enquanto se afastam só desejo que nunca mais
tenha que ver Sara King na minha vida, ainda que eu tenha certeza de que
esta não foi a primeira, das muitas vezes que nos veremos.
FICAREMOS JUNTOS
— Estava com medo que ela fosse fazer isso.
Eu também estaria se ela fosse minha mãe! Eu não o culpo por nada
do que tenha acontecido, pois, ele me defendeu, mas não é apenas por isso,
pois eu sei que ele me aceita, que me ama, e que está disposto a tudo pra
ficar comigo, mas as outras pessoas não se importam com isso; elas não nos
respeitam, e eu já sabia disso, só que não tinha parado pra pensar, porque se
fosse qualquer “Zé Ninguém” na face da terra, seria muito mais fácil me
relacionar, mas Noah não é qualquer um! Eu sei que ele tem uma reputação,
um nome e que é importante, ainda que se negue a aceitar, quem ele se
tornou é algo que nunca poderá mudar.
Contudo, a viúva negra foi embora, então nós fingimos que nada
havia acontecido. Não quero aborrecer minha mãe. Esforcei-me para sorrir,
e fizemos o café, percebi que ele estava magoado, tanto quanto eu, — acho
que até mais — ele ficou muito magoado com as coisas que a mãe dele me
disse. — Eu contei pra ele.
Noah não é como os outros caras, ele é sensível, coisa que eu nunca
havia percebido antes, ele fica tão magoado quando se trata de quem ele
ama, acho que foi mais difícil porque é a mãe dele, e ter que dizer coisas
assim pra própria mãe deve machuca mil vezes mais do que pra qualquer
outra pessoa no mundo. Pior é saber que é a própria mãe é daquele jeito!

Mamãe acordou indisposta, a doze dessa semana com certeza foi


mais forte, a deixou mais fragilizada, papai percebeu que apesar dos nossos
sorrisos, nem eu nem Noah estávamos bem, então ele nos expulsou da
cozinha logo que terminamos o café. Fico grata por isso, porque pelo ou
menos uma vez na vida, ele parece se esforçar e se controlar pra não cair de
cara na bebida. Acho que ver a mamãe assim o deprime, mas ele sabe que
se deixar a peteca cair também, só vai prejudicá-la mais. Depois que ela
passou a máquina zero na cabeça, ressaltou a real importância de sua
doença, um pouco da gravidade, então, acho que papai vê agora como as
coisas estão sérias, coisa que não via no começo do tratamento.
Mesmo que progrida, o câncer no colo do pulmão é presente, e ela
precisa do tratamento até o fim para que fique completamente curada.
— Por isso não quero te deixar só, mamãe é capaz de tudo.
— Sei que ao falar isso talvez você se magoe muito, mas não quero
te esconder sabe, ela veio me oferecer dinheiro.
— Já imaginava, ela fez isso com a Cora também.
Nossa!
— O que ela tem contra as GG?
— Ela é uma cínica.
— Eu disse para ela que não aceitava e ela começou a baixaria, se
fosse uma dama de verdade não se prestaria a esse papel.
Noah age mais como meu melhor amigo do que como namorado,
ele está pensativo, já chorei tanto depois que subimos, ele me deu seu colo,
agora deitamos e estou encolhida aceitando seu abraço, o carinho que faz na
minha cabeça, assim, muito calmo, ele começa a falar.
— Não sabe o quanto me sinto mal com esta situação, meu amor.
— Desculpe Noah, sua mãe é uma sem noção! Eu jamais iria querer
seu dinheiro.
— Eu sei querida, confio em você, já na minha mãe... nada que
venha dela me surpreende. Ela é manipuladora sabe?!
— O que fizeram com ela, Noah?
— A família King pode ser bem persuasiva, ela não soube se impor,
então cedeu ao que a família de Arthur queria: uma dama da sociedade que
zela pelo nome deles.
— Eu gostava dela.
— Pois então desgoste!
Ele está sendo duro.
— Ela é a sua mãe.
— Ela “era” minha mãe. Uma pessoa que chama a minha mulher
de gorda e a humilha dessa forma, não pode ser chamada de mãe.
— Não quero que odeie ela, deixa essa parte para mim, está bem?
Fungo. Chorei tanto que meu nariz entupiu. Noah sorri, ergo-me e
me deito em cima dele e sou apertada, beijo seu pescoço, e encontro ali o
meu refúgio.
— Eu não vou desistir da gente. — Digo sincera — Eu quero ser
feliz ao seu lado.
— Seremos felizes, minha gordinha linda!
— Mas, também não quero que fique bravo com ela!
— Mamãe vai analisar isso com calma, ela sempre faz isso, daí vou
colocar ela no lugar dela e depois, ela virá com o rabo entre as pernas me
pedir perdão.
— Você a ofendeu, Noah.
— Ela te ofendeu, ela me ofendeu, e ela desrespeitou a casa dos
seus pais, pessoas que sempre cuidaram de mim, zelaram por mim... Sara
King desconhece a palavra limites, Sam, está na hora dela saber que eu
cresci e estou vivendo minha vida. Se ela não aceita ao menos que respeite,
pois eu nunca fui contra o casamento dela com King, ainda que não
aceitasse.
Suspiro.
— Você é a minha mulher, a minha esposa, e nada da o direito dela,
nem Cora e nem ninguém te ferir.
— Por falar na ex gorda... como vai o caso dela?
— Meu advogado já entrou com o processo, me disse que a
demitiram do jornal.
— Isso foi extremo!
Estou bem mais que surpresa, Noah me olha como se não ligasse
muito.
— Extrema é a indenização que o jornal terá que pagar por tudo o
que ela disse!
— Você processou o jornal?
— Claro que processei, e também a processei. Algumas pessoas
estão muito irritadas com os ataques que ela fez no jornal, ainda mais
porque é um veículo de acesso a todos os lugares.
— Só quero que tudo dê certo.
— Vai dar certo, Bolinhos, só tenha paciência está bem?
— Sim, eu terei. — Com certeza!
PASSADO
— Tudo bem?
— Sim!
— Bom dia minha gordinha!
Não tem jeito, o apelido pegou.
Quanto mais eu tento me livrar desse apelido, mais o Noah insiste
em me chamar de "gordinha", nem me irrito mais, acho que ambos ficamos
tão abalados com a visita da viúva negra que estamos mais carentes um do
outro que nunca, mal descemos ontem, ficamos em nosso quarto,
quietinhos, silenciosos, papai comprou comida pronta, mas eu não queria
comer, não sentia fome, só comi porque o Noah insistiu muito, tomamos
um banho depois do almoço e ficamos quietos, deitados. Sei que a
discussão com Sara o abalou mais que tudo, de noite eu fiz um chá e o
tomamos com biscoitos, ficamos na sala com os meus pais vendo TV —
como fazíamos quando o Noah vinha dormir conosco quando éramos
crianças — até tarde, mamãe ainda parecia indisposta e não conversamos
muito, e papai cuidou dela direitinho.
Acho que ele está caindo na real.
Noah cheira meu pescoço todo carinhoso, acabo de acordar, é
manhã de domingo, estou com preguiça, hoje ele não foi correr, sinto cheiro
de café e torrada, sorrio, e me viro puxando-o pra mim, Noah sorri e me
beija se enfiando nas cobertas, acho que ainda é muito cedo.
Ele vai puxando a blusa do meu pijama pra cima enquanto nos
beijamos, ergo os braços e deixo que ele a tire, depois puxo a dele vendo-o
se erguer, Noah fica de joelhos na cama e observo sua musculatura perfeita,
a barriga definida, os braços definidos, o peito dele parece uma rocha, ele é
muito sexy sem camisa.
Toco os lados dos seus braços e ele volta a me beijar lentamente,
puxo a calça dele pra baixo e ele vai pro lado tirando-a, puxo a minha calça
também, tirando-a junto com a calcinha, jogo pra longe e Noah pega as
camisinhas que guardou no criado, beijo seu peito sentindo que temos mais
liberdade quanto ao sexo, sei que ele gosta do meu corpo e eu adoro o dele.
Ele vem pra cima de mim assim que coloca o preservativo, me beija
puxando minha perna pra cima, toco suas costas enquanto ele me possui,
isso é tão bom, tão gostoso, me sinto mais feliz que nunca, nos beijamos e
me movo com ele subindo e descendo, nossos corpos nessa união perfeita e
inexplicável, toco sua face e o fito, Noah se move lentamente deslizando
pra dentro e pra fora, os lábios cerrados, os olhos azuis e reluzentes, Noah
afasta as cobertas pra longe e se ergue nos observando.
Tento não fazer barulho, mas isso se torna uma missão quase
impossível, pois estamos muito sensíveis, ele fazendo assim, bem devagar,
faz com que eu o sinta por completo, e não sei... enquanto me observa,
parece que me deseja tanto, que me cobiça tanto, que meu corpo reage a
isto muito naturalmente.
Toco seu pescoço acelerando, seu ritmo me deixa mais úmida,
quente, ele geme e coloco a mão em sua boca querendo rir, Noah rebola e
mordisca meus dedos levemente me dando mais prazer, agora eu gemo, e
ele me beija fazendo mais rápido, arfo com as ondas que me tomam toda,
meu corpo todo reage muito naturalmente a ele.
Noah afasta a minha outra perna pro lado e abaixa beijando meu
seio com força, seus movimentos quase me enlouquecem por alguns
instantes, e mordo meu travesseiro pra não gritar com o prazer que me
invade toda, o orgasmo me invade como um raio e ele se ergue me dando
um beijo possessivo, seus gemidos saem com o beijo, sua coxa sobe pra
cima da minha e ele me penetra mais duas vezes com força se entregando
também ao frenesi, ele deixa minha boca e volta para os seios, aperta o
esquerdo e o mordisca com força me dando mais e mais prazer.
Ele desaba estremecendo em cima de mim, estamos sem ar,
completamente soados, eu o aperto com a perna, seu suor escorre junto com
o meu, e o meu corpo treme com o prazer dele, olho para o teto e nunca vi
tantas estrelas, estou sorrindo.
Ficamos quietos, arfantes, até que nos acalmamos, Ele me beija o
pescoço e faz carinho nos meus cabelos, meu dedos estão em suas costas,
sinto o suor, mas não me importo, observo seu corpo nu em cima do meu,
tão quente, tão gostoso, me sinto novamente dentro de um sonho lindo e
maravilhoso.
— Era pra ter ao menos comido seu café meu amor.
Olho pra minha mesinha e vejo a bandeja com uma caneca de café e
torradas, sorriu, beijo sua cabeça.
— Obrigada, meu amor.
— Ao invés disso, você virou a comida!
— Você perde a amizade, mas não perde a piada não é mesmo
senhor Baltimore?
— Jamais! Amigos em primeiro lugar.
A voz dele está mansa, calma. Olho para o lado, Noah se ergue e
apoia a cabeça na mão, o cotovelo no colchão, ele toca meus lábios e me
beija de leve, correspondo.
— Você não me contou por que tem cicatrizes aqui — Noah segura
minha mão e toca meu pulso com o polegar.
Coro.
E ao mesmo tempo quero esconder dentro de mim o segredo, mais
por causa da dor do que por vergonha, mas eu sei que não posso mentir pra
ele, nem omitir, ainda que quisesse é como ele disse: antes dele voltar eu
tinha uma vida, e digamos que a minha vida durante um tempo era uma
droga e eu não queria mais vivê-la.
— Mamãe não contou? — Questiono, pois imaginei que mamãe
contaria.
— Mais ou menos. — Noah fala me fitando, assim muito sério.
— Eu tive depressão uma época, estava mais gorda que hoje, com
uns cento e vinte quilos, — confesso sincera — achava que a dor não
passaria, então tentei colocar um fim nela.
Noah me olha, mas não vejo julgamento em seus olhos. Eu nunca
contei isso para ninguém. Ainda morávamos no trailer, foi tudo uma grande
confusão; quando por fim cortei os pulsos, esperei lentamente pela morte,
mas não deu tempo, papai chegou do serviço e me pegou nos fundos do
trailer, desmaiada, e quando acordei, meus pais estavam chorando comigo
num hospital, os meus pulsos enfaixados e dentro de mim, um medo imenso
do julgamento que teria deles, mas assim como Noah, eles reagiram de uma
forma diferente, o que me fortaleceu é claro. Meus pais me amam e aquilo
só me reforçou isso, que não importava nada do que falassem, eles me
amavam e eu prosseguiria por eles.
— Você é linda, Sam, só você não enxerga...
— É difícil se achar linda vestindo 50, Noah!
— Não é não, seu peso te prejudica?
— Eu não sou sedentária. Eu só não consigo perder o peso que
sobrou depois da tentativa... eu estacionei nos 90 quilos. — falo
constrangida — É muito ruim se sentir feia Noah, ao menos, você sempre
foi bonito e tal, eu não...
— Tudo isso está na sua cabeça Sam, poxa vida, não faz mais isso
ok?
— Eu não vou fazer, só estava muito deprimida, parecia que nada
dava certo, também estava desempregada, não conseguia faxina nem nada,
aí fiquei mais deprimida, também foi na época que perdemos a minha avó.
— Se eu soubesse...
— O passado é algo que não podemos mudar Noah, tudo o que
temos é o nosso presente e o nosso futuro.
Noah suspira e me beija.
— Te amo Sam, não faz mais isso está bem? Só de pensar que eu
poderia vir aqui e você não estaria, isso me deixa louco!
— Não vai mais acontecer.
Foi algo que prometi a mim mesma.
— Você já escolheu o seu vestido de noiva, Bolinhos?
— Ainda não, eu não pensei nisso.
Fico mais tranquila por ele mudar de assunto.
— Então providencie Bolinhos, você será a noiva mais linda, meu
amor.
Sorrio. Sinto-me confiante em ouvir isso dele.
— Uma Bolinhos linda de noiva.
— Hummm...
— Pensei em te levar à praia na nossa lua de mel, o que acha?
Nunca fui à praia... Lua de Mel?
— Não vamos ter muitos gastos?
— Amor, esqueça as dívidas, eu tenho dinheiro, eu sei até onde
podemos gastar.
— Não quero te dar despesas!
— Não dará, é o mínimo que posso fazer por você.
— Vou falar com os meus pais, meu amor, — sorrio e o beijo,
apenas um selinho — dependendo do estado de mamãe, nós iremos.
— Ela ficará bem, — Noah afirma seguro de si — apesar de tudo,
estou muito feliz Sam, me sinto livre e feliz aqui.
— Eu te amo meu biscoitinho de coco!
— Também te amo, meu copinho de leite azedo!
Acabamos por rir, Noah aperta o meu seio com suavidade, depois
sua boca o toma com carinho, sorrio me esticando, ele sobe e me fita cheio
de malicia.
— Pronta para o segundo round, senhora Baltimore?
— Extremamente pronta!

Acabo de sair da médica.


Ela fez o exame de papanicolau e me receitou um anticoncepcional,
disse que até então tudo está bem, Noah me espera na recepção, bastante
concentrado em seu celular, combinamos hoje cedo de que ele me pegaria
aqui, a semana foi mais cheia pra ele com a nova implantação da sua
empresa.
Fiquei em casa ajudando mamãe com os preparativos do casamento,
ela ligou para Donatela na segunda, e na terça à noite, sua melhor amiga
estava lá em casa, indicando dezenas de sugestões para o meu convite de
casamento. Comecei a pensar no vestido na quarta, os meus dias eu tenho
tirado pra organizar a casa no lugar de mamãe, papai não bebeu, mas
também ficou todo estressado e arrumou um novo hobbie, além da cerca,
ele decidiu limpar todo o sótão e a garagem, segundo ele, quer deixar tudo
pronto para o pintor.
Na quinta, pesquisei muitos modelos do vestido de noiva pela
internet. Todos os dias, bem cedo, Noah saia para resolver os assuntos do
novo escritório e só chegava após o horário de almoço — ele arranjou um
notebook, então, ele ficava em seu computador e eu no meu — depois
descíamos para ajudar mamãe com o jantar. Noah meio que distrai papai
também, sua vinda me ajuda bastante e acho que isso o tem ajudado muito a
se controlar quanto a bebida.
Coloquei um jeans escuro e uma blusa de mangas compridas de cor
cinza, um jeans mais colado, deixei meus cabelos soltos e me maquiei,
calcei botas cano baixo, Noah avisou que me pegaria no médico e que me
levaria no Beth, decidi ir vê-lo para pedir sugestão do vestido.
Noah não vê quando me aproximo, algumas mulheres estão
sentadas nas cadeiras perto dele, ele não se dá conta que elas olham para ele
como se quisessem devorá-lo, quando me veem elas não parecem se quer
me notar, eu me sinto muito grata porque parece que ninguém me
reconhece, acho que é porque eu estava de costas, a foto que saiu no jornal
é de perfil e eu estava com os cabelos mais compridos. Ainda que eu diga
para mim mesma que não importa o que Cora disse, nem quem viu ou
deixou de ver, desde o dia que eu e Noah fomos para Barbie e decidimos
viver nosso relacionamento, penso que devo me preocupar apenas com nós
dois, nossa vida, não com o que os outros pensam. Eu sei que estou acima
do peso, eu sei que não sou perfeita como querem que eu seja, —
principalmente Sara — mas eu o amo e ele me ama assim, então, problema
de quem não gosta!
Sento-me ao seu lado e cruzo a perna, fico olhando-o concentrado
no celular, ele digita rápido.
— Oi!
— Oi! — Noah me olha rápido e se volta para o celular, depois me
olha fixamente.
Usa camisa social azul clara, jeans, tênis e terno, seu olhar é de
surpresa, sorrio, ele fica me olhando, assim, como se eu fosse algo muito
bom ou sei lá, às vezes é difícil entender o Noah, ele sempre foi tão
“desalienado”, agora ele cresceu e está um homem feito, lindo e sexy, e seus
olhares apesar de duvidosos são belos e claros.
Ele se inclina e me beija, assim do nada, sorrio e respondo ao
beijinho me sentindo tão feliz com isso, eu e Noah temos vivido muito bem
esses dias nosso namoro, noivado, mas prefiro pensar que é como se fosse
realmente um casamento, ele mora comigo, dormimos juntos, estamos
juntos à tarde e conversamos bastante, ele me ajuda com o jantar e quando
mamãe não deixa, ele me ajuda com os pratos, aproveitamos essa semana e
ficamos recordando de dezenas de coisas da infância, foi uma boa semana.
— Demorei muito?
— Não, cheguei há uns dez minutos, tudo bem?
— Sim, acho que temos que passar na farmácia.
— Claro.
Nos levantamos, Noah segura a minha mão e enfia o celular no
bolso, entrelaço os dedos nos dele e saímos do consultório, não ligo muito
para o que falam ou vão falar, já prometi para mim mesma que nada nem
ninguém irá nos atingir, iremos nos casar... tantas mudanças prestes a
acontecer, Noah já deu muitas provas de que me ama e não preciso de nada
além disso para que sejamos felizes.
Ainda tenho dificuldade quanto ao meu peso, sei que a família dele
não me aceita, que as coisas não serão sempre tão simples, depois da visita
da viúva negra semana passada eu e ele tivemos essa semana muito calma,
mamãe não teve sessões essa semana, ela até que não estava tão fragilizada
quanto à semana passada, longe da químio ela fica mais tranquila, ainda que
meio cansada às vezes, terá retorno em alguns dias para alguns exames de
rotina, começaram as reformas há alguns dias também, e eu imagino que o
nosso novo lar esteja sendo mobiliado neste momento.
Entramos em seu carro e Noah se inclina pra trás, sorrio, ele me
estende um pequeno buquê de rosas vermelhas, simples, mas que pra mim é
de grande significado.
— Pra você Bolinhos.
— Obrigada meu amor.
Fico muito feliz, pois nunca ganhei flores de ninguém, me inclino e
o beijo com carinho. Claro que estou super contente das coisas darem certo
entre nós dois!
— Ela falou alguma coisa sobre os exames de sangue?
— Sim, disse que os meus estão muito bons, me passou
anticoncepcional, tenho que tomar depois da minha próxima menstruação.
— E sobre... aquele dia?
— Bem, ela disse que eu não estou grávida, fez exames e um
transvaginal, parece tudo bem.
— Que bom, acho que um bebê agora te deixaria meio cansada e
nervosa demais, não é mesmo meu amor?
Noah liga o carro, colocamos o cinto, não tenho fé com meu
buquezinho, Noah desperta um lado feminino em mim que nunca tive, mas
que também nunca ninguém cativou...
— Ainda é cedo também, — Noah está atento ao caminho — quero
curtir nosso casamento!
Penso da mesma forma, está muito bom ficar com ele ao meu lado,
eu não sou assim tão jovem, mas ter um bebê agora... mamãe com câncer,
papai tentando se reestruturar... não sei se conseguiria lidar com tudo, ainda
que Noah estivesse aqui, sei que precisamos trabalhar bastante também,
muitas coisas mudariam se eu engravidasse.
— Eu também, — sorrio esperançosa — mas quem sabe em dois
anos?
— Quero filhos logo, pelo menos três!
Noah nunca quis irmãos, mas o mais irônico nisso tudo é que ele
sempre quis ter uma família maior, ele tem avós maternos, mas até onde me
lembro seus avós paternos não moram aqui. Fico me sentindo meio boba
porque simplesmente não consigo imaginá-lo cuidando de três crianças ao
mesmo tempo. Eu já fui babá uma época da minha vida e sei que paciência
é uma dádiva para poucos, não seria uma missão fácil.
— Não?
— Um atrás do outro?
— É, se a diferença de idade for muito grande, será como eu e
Sabrine; tenho idade de ser tio dela.
— Nem tanto né? Eu já estou com vinte e sete, não posso demorar
muito. Acho que se você não voltasse, eu morreria virgem!
— Tinha o Tyller!
— Não fiz sexo com o Tyller, meu amor.
— Aposto que ele tentou.
Sorrio ao me lembrar do que o Ty me contou sobre Dyanna, e,
francamente quero muito rir.
— Teremos um bebê no momento certo, amor!
— Assim espero!
REAL FELICIDADE
Os preparativos para o casamento transcorreram perfeitamente.
Há algumas semanas decidi ir a um especialista em moda Plus Size,
— para garotas GG's como eu — para ver a questão do meu vestido, não
deu outra, ou outro: Beth!
Ele nos recebeu muito bem e ficou super feliz em saber que eu
casarei em breve. Depois da nossa visita ao Beth, eu sabia exatamente o que
eu queria, ele me deu muitas dicas de vestidos e me indicou o ateliê de uma
parenta costureira no dia em que fomos à sua loja no shopping, Noah ficou
surpreso em saber que Beth nada mais era que um homem, ou mais ou
menos aquilo.
No dia seguinte eu estava indo ao ateliê com mamãe, como foi
indicação, basicamente ganhei desconto, o lugar ficava em um bairro
próximo do centro, mas muito bom, mamãe quer participar de tudo comigo,
e eu não recusei é claro, pois só de vê-la mais feliz e disposta eu estava
também naturalmente mais feliz.
Tirei as medidas, falei os modelos, e a moça já pegou um pronto de
tecido cru, apenas forro como modelo para que eu falasse o queria, se
dependesse de mamãe, eu me casaria feito uma árvore de natal, queria
pérolas, pedraria, só faltou querer por pisca-pisca, mas eu determinei logo
que não queria nada demais, claro, não quero chamar mais atenção do que
eu já chamarei.
Donatela nos ajuda com o pequeno buffet, ela também quer ajudar
na decoração, então, quanto a isso não me preocupo, mas tivemos que
correr atrás de uma igreja, havia a preocupação com o local da festa que
será para apenas trinte convidados, e o que colocar no cardápio, tudo fica a
minha escolha e de Noah.
Ele ajuda muito pouco, simplesmente o meu noivo adora tudo o que
eu dei de sugestão, o Noah é muito simples, ele é como eu, qualquer coisa
está bom, algo que eu pensei que havia mudado, mas pelo visto continua do
mesmo jeito.
Aos poucos, os fantasmas dos meus receios foram ficando de lado,
durante o dia fui resolvendo as coisas do casamento, e à noite Noah e eu
estávamos em nosso mundo, conversando, tagarelando e lembrando dos
melhores momentos de nossas vidas, e claro, nós andamos tendo bastante
intimidade...
Coro só de lembrar.
As duas últimas semanas foram de correria intensa, e hoje eu
acordei menstruada, faltando exatamente uma semana para que eu me case
no civil e no religioso, Noah conseguiu um horário cedo no cartório, então
marcamos nossa cerimônia para o horário da tarde, não vejo muita
diferença também.
Levantei um pouco mais cedo que ele, aos sábados e domingos
Noah não trabalha, ele fica o dia todo comigo, e com meus pais, nós
aproveitamos também os fins de semana para cuidar da nossa mudança,
papai está cuidando das roupas dele e alguns pertences, e eu mal acredito
quando me lembro que ele não anda bebendo esses dias, ele nunca havia
conseguido ficar tantos dias sem beber, desde que começou com o que
chamamos de "depressão", mas eu tenho o meu pé bem atrás, porque sei
que papai anda mais para tenso do que feliz com isso.
Um dia antes do casamento nós levaremos nossos pertences para a
nova casa, um pintor veio aqui e já conversou conosco, assim como um
servente, eles organizaram a pequena reforma da casa dos meus pais, ainda
que acredite que isso vai dar um pouquinho mais de trabalho.
Mas a verdade é que andamos mais felizes com a chegada do Noah,
minha mãe com o casamento e papai parece querer tratá-lo como um filho
que nunca teve, ele o chama de "filho" quando precisa de algo, Noah o
ajuda a arrumar a garagem e o sótão para a reforma, papai também corre
com o Noah todas as manhãs bem cedo, acho que por isso está mais
disposto e longe do álcool.
Mamãe tem feito acompanhamento, mas em todas às vezes papai
foi, disse que as plaquetas estão normais e que o tratamento está dando
resultados, me sinto mais tranquila também nesse quesito, o convênio que o
Noah paga é muito bom, mamãe é muito bem atendida, bem tratada e o
médico é o mesmo que a atendia no convênio da King.
King.
Noah não fala mais neles, eu acho que ele se feriu demais com a
mãe, tanto que mal toca no nome dela, parece que ele quer esquecer Sara e
sua família, mas eu não concordo, porque sei que isso é algo que faz mal
pra ele, reconheço a cada dia pequenos pedaços do amigo incrível que tive
na infância, o único, mas ao mesmo tempo Noah adquiriu uma
personalidade e um lado diferente de quem ele era, ele cresceu, e em alguns
sentidos, ele é absolutamente fechado, calado, muitas vezes ele fica me
olhando e não fala nada, em algumas vezes nesses dias discutimos também,
porque o Noah não é tão flexível quanto a alguns assuntos, Ty é um deles.
Quinta discutimos pois, disse que queria que Ty viesse para o nosso
casamento, Noah disse que não via motivos de eu convidar meu "ex" pro
nosso casamento, e eu não sabia se poderia contar tudo sobre Ty não ser
meu ex namorado, ficamos meio brigados ontem o dia todo, ele veio me
abraçar na cama à noite, então tecnicamente estamos ainda meio que
brigados.
Me estressei com a pirraça dele, Noah é muito ciumento, e eu não
sei se gosto disso, na verdade não gosto, não acho fofo, ciúmes pra ele é
algo ligado ao controle, e este lado eu acho que foi algo que desenvolveu no
decorrer desses anos, porque se era assim, eu nunca vi antes.
Tenho comido menos desde as provas do vestido, não acho que
tenha conseguido perder peso, mas algumas medidas eu perdi, quero estar
bem na igreja, quero me sentir uma noiva linda, eu sei que jamais vou
chegar perto daquelas garotas 34 que eu vejo nos filmes, na TV, nos
comerciais de perfume, mas também acho que nada me impossibilita de ser
ao menos dentro do possível alguém bonita, cada dia que passa eu tenho
acreditado mais nisso.
Alguns vizinhos vieram repentinamente falar com mamãe durante a
semana, mas eu entendi a falsidade como forma de descobrir sobre nossa
vida, porque na boca dessa gente, meu pai é um cachaceiro e a minha mãe
uma doente terminal, e eu uma gorda acomodada, algumas vezes eu até
ouvia os Simpson's falando a respeito da minha aparência, comentários
desnecessários, em outras os filhos deles que tem a minha idade
basicamente e são formados na faculdade local, quando visitavam os pais,
me olhavam e riam, faziam comentários sobre minha aparência também,
mas foi algo que eu permiti me ferir, depois que Cora fez e do que Sara
falou tudo aquilo, meu couro engrossou, claro que não agirei como uma
estúpida, mas não vou mais permitir que ninguém fale coisas assim sobre
mim.
Escovo os dentes, acabo de sair do banho, escuto o som da porta do
banheiro, e assim do nada vejo meu noivo entrar no banheiro sem camisa,
com cara de sono, a calça do pijama na altura dos quadris, onde um deles
está marcado com o meu nome, desvio o olhar engolindo a seco, porque o
Noah sempre me surpreende quando fica pelado, sem camisa, ou de
qualquer jeito, seu corpo é lindo e perfeito, e cada dia eu descubro o quanto
é bom desfrutar de momentos mais íntimos com ele.
Ele não fala nada, vai pro vaso, sabe que eu ainda estou magoada
com sua negativa em relação ao Ty, mas eu aposto que se ele soubesse da
vaca da ex noiva dele, com certeza ele não agiria assim, contudo não me
sinto no direito de falar nada, eu não falei com Ty esses dias, ele não atende
as minhas ligações, liguei na casa dos pais dele alguns dias atrás e a mãe
dele disse que ele está viajando com um amigo, a vida dele é uma eterna
férias, ele sempre saia com caras que tinham dinheiro, mas eu sei que o Ty
também tem dinheiro, ele que não quis estudar, os pais são controlados, o
pai um ex sargento do exército e a mãe advogada, então acho que é isso,
contudo ainda me preocupo.
Saio do banheiro, vou até meu armário, já vesti a calcinha e o sutiã,
procuro uma roupa mais leve pra ficar em casa, nunca gostei de ficar "de
mal" com o Noah, nunca aguentamos mais que dois dias sem nos falar
quando crianças, claro que entendo o ponto de vista dele, mas ele também
tem que ter mais flexibilidade, ainda que eu fique imaginando como seria se
ele chamasse Dyanna para o nosso casamento, odiaria a ideia, mas o Ty... o
Ty é um amigo que aprendi a amar e a gostar, ele tem sido meu único amigo
ultimamente. Olho-me no espelho da porta do meu armário e não me sinto
assim, das mais diferentes, mas um pouco melhor do que sempre fui, mais
bonita!
Meu celular toca e vou pegar na cabeceira da cama, me sento na
cama e atendo imediatamente ao ver o nome no visor.
— Sam?
— Onde você está? Você sumiu!
— Eu tive que acompanhar a naja à Grécia!
Nossa.
— Está falando da mãe do bebê?
— Lógico! Quem mais seria?
A voz do Ty está tão dura... eu realmente não faço ideia do que está
se passando na cabeça dele, na vida dele.
— E então...
— Ela realmente está grávida e estamos juntos!
Caio sentada, poxa, parece que levei uma rasteira nas pernas.
— Não fique tão surpresa, eu prefiro entender que isso seja uma
recaída, Dyanna é muito carente e problemática, jovem, precisa de alguém
pra cuidar dela.
— Está com ela por pena? — Arregalo os olhos, incrédula.
— Não exatamente, ela carrega um filho meu no ventre, até que a
criança nasça eu fico com ela.
— Quanto ao... ao...
— Eu estou dando um tempo de tudo, Dyanna e eu... é inexplicável.
Engulo a seco.
— Contou pra ela sobre...
— Ela sabe que eu não gosto de mulher.
Essa é a coisa mais complexa que ouço na minha vida.
— E agora?
— E agora é viver e parar de lamentar.
— Meu casamento é sábado da semana que vem!
— Eu vou!
Eu já sabia que ele faria questão de vir.
— Tudo bem por ai?
— Sim.
— Sua mãe?
— Ela está muito feliz.
— King é esperto, sabia que ele não te deixaria escapar.
Sorrio, acho que nós dois não deixaremos escapar mais nenhuma
chance.
— Estou feliz por você Sam, você merece a felicidade mais que
qualquer pessoa que eu conheço.
— E você? Está feliz com ela?
— Tecnicamente sim, Dyanna é muito infantil, mimada, é difícil
cuidar dela, tem hora que da vontade de matar.
— Ao menos você está... vivo!
Ele ri do outro lado da linha.
— É, ainda bem, chego na sexta.
— Vai trazer ela?
— Lógico que não, meu bem, Dyanna não quer ser vista comigo,
ela tem vergonha de mim!
— Por quê?
— Não sou o seu querido King, também sou mais velho que ela, e
ela têm uma reputação.
— Ela está errada.
— Se eu fosse ela me envergonharia de mim, afinal, o “viadinho”
aqui, só serve pra comer ela na cama.
Fala isso com tanto desgosto que dói dentro de mim.
— Sinto muito Ty.
— Não sinta, só vou esperar que ela fique estável emocionalmente
para poder largar ela, já procurei um advogado para saber meus direitos de
pai.
— Pensa com calma.
— Eu preciso desligar, acho que ela acordou.
— Cuidado!
— Eu tenho cuidado!
Suspiro.
— Te amo Sam, se cuida.
— Tá, beijo.
Desligo, me sinto mal, apesar de saber que tecnicamente o Ty está
bem, mas sei que no fundo ele não está.
— Era ele?
Dou um pulo, Noah me puxa e caio deitada na cama, tento me
ajeitar meio assustada, enquanto ele vem para cima de mim, está enrolado
numa toalha, mas não parece bravo nem nada.
— Sim, — não vou mentir — era o Ty.
— Ele vem? — Noah me olha bastante enigmático.
— Sim!
— Está bem.
Noah me beija com carinho, mas sei que ele não gostou, decido
falar a verdade, ou ao menos um pouco dela.
— Ele já está com outra pessoa Noah. Ele conheceu um novo
alguém, deixa de ciúmes.
— Disso eu não sabia. — Noah parece bem surpreso — não quero
ficar brigado, Bolinhos, ontem você me deixou abandonado na cama.
— Estava com cólicas também, — confesso — desceu!
— Menos mal não acha? — Noah fica deitado em cima de mim.
— Sim.
— No domingo nos viajamos.
— Viajaremos?
— Sim, pra praia.
Estou sorrindo, ao mesmo tempo, muito surpresa e feliz.
— Mudamos na segunda, eles começaram a reforma.
— Nossa casa já está mobiliada?
— Sim, não tive tempo de te falar, podemos ir ver como ficou
amanhã.
— Está perfeito.
— Não acha que deveria ter me dito que ele está com outra pessoa
ontem?
— Você é muito ciumento, Noah.
— Se fosse o contrário iria gostar?
— Não.
— Então!
Suspiro, ele me beija novamente, também não quero ficar brigada
com ele.
— Poxa vida minha gordinha, não me despreza!
Carente!
Mas consigo entender.
— Se não fosse tão ciumento...
— Eu sou assim meu amor, poxa vida, entende.
— Está bem, seu chato!
— Sua... sua... gordinha sem coração!
Noah me beija, seus lábios são intensos e fortes, ele joga a toalha
pra longe e toco seu corpo, mas o bom senso fala mais alto.
— Amor, eu estou naqueles dias!
— Ah é! — Ele respira fundo, se afasta e levanta — Vou esperar
pacientemente pela nossà noite de núpcias.
Eu o vejo se afastar com um sorriso coberto de malicia nos lábios e
apenas falo:
— Eu também! — Ansiosamente.
SONHOS REALIZADOS
Estou maravilhada enquanto olho em volta, toda a decoração da
casa ficou absolutamente magnifica.
Estamos no nosso quarto agora.
Noah acabou de tirar a venda dos meus olhos, sorrio de ponta a
ponta olhando ao redor, ele fez tanto mistério que eu quase roí minhas
unhas.
Mas isso supera todas as expectativas!
A cor das paredes é num tom pastel, e todo o resto da decoração
também, desde as roupas de cama até a banca com os vasos de flores que
ficam embaixo do painel da TV enorme na parede, tem cortinas num tom de
palha, dois sofás idênticos com almofadas perto dessas cortinas, um criado
a esquerda e uma banca de vidro a direita com um enfeite simples, a
decoração é etérea e simples, mas tão sofisticada que fico completamente
maravilhada.
Noah me puxa pela mão e me conduz para o banheiro, ele está
muito empolgado também, acho que nem ele havia vindo ao nosso novo lar
antes dessa nova decoração.
O lugar ficou lindo e espaçoso, bem aproveitado, tem uma banheira
embutida, várias plantas ao redor do balcão de madeira, e uma pedra com
lavatórios idênticos, a esquerda um box com vidro transparente e dois
chuveiros, No outro canto do banheiro tem dois vasos e um bidê, Noah me
puxa e me beija com carinho, ele parece tão feliz, claro, esta foi a casa onde
cresceu, pra onde veio desde que nasceu, onde ele teve uma infância feliz e
onde seus pais decidiram criá-lo, percebo tanta felicidade em seu olhar. —
Vem, quero te mostrar o quarto de hóspedes e o meu escritório.
E vai me puxando, o quarto de hóspedes tem cama de casal e
armário, jamais imaginaria algo tão confortável para as visitas, no caso,
meus pais, que ficarão aqui até que reformem nossa casa, tenho absoluta
certeza que mamãe vai adorar ficar aqui, a decoração é muito parecida com
o que ela gosta. Neste quarto tudo é branco, tem até janelas com cortinas
transparentes e tudo, o banheiro é pequeno, mas bem maior que o banheiro
dos meus pais.
O Escritório fica no fim do corredor deste segundo andar, é amplo,
tem tudo o que é necessário para que Noah trabalhe em casa se precisar,
também gosto porque é muito parecido com ele, algo simples e organizado,
mas o que mais me encanta é a série de prateleiras com livros, nessa estante
tem livros de todos os tipos, acho que com o passar dos anos Noah mudou
mesmo, porque desde que o conheço a única coisa que ele adorava ler eram
quadrinhos, agora nessa estante tem livros de economia, empreendedorismo
e tudo mais, uma mesa espaçosa com computador moderno, e lugares com
gavetas pra ele guardar o que quiser, uma janela larga de inox blindada,
com vista pra rua, a vizinhança é bem sossegada.
Saímos do escritório, estou emocionada de saber que morarei aqui,
o Noah sabe que o meu maior sonho sempre foi ter uma casa minha, bem,
realizei quando consegui pagar as hipotecas da casa dos meus pais, nós
sempre moramos num trailer, mal havíamos ficado na antiga casa, desde
que me lembro, meu lar era o parque, o lugar afastado de tudo e de todos,
sorrio enquanto descemos para o andar de baixo, não passamos no outro
quarto, mas acho que não é muito diferente do quarto de hóspedes, deve ter
ficado vago, estamos tão empolgados, logo que entramos na sala de visitas
me vejo chorando, porque nunca nem em um sonho muito perfeito, sonhei
com algo tão lindo.
Tem um aquário logo na parede da frente, duas cadeiras
almofadadas que fazem conjunto com um sofá maior e largo, todo o lugar
respira classe e beleza, uma sofisticação linda e maravilhosamente bem
colocada, no centro, candelabros e um pequeno vaso de flores, alguns
quadros na parede ao lado da TV que fica de frente para os sofás, uma
mesinha de canto com um abajur e enfeites, os móveis tem contraste de
madeira e contraste de cor branca, e temos um castiçal de teto lindo, lareira
e mais espaço com uma decoração linda em dois ambientes.
Uma sala de jantar no outro ambiente com uma mesa com muitas
cadeiras em tom pastel, castiçais de teto transparentes, tudo lindo, o
ambiente da sala de jantar é mais natural e menos sofisticado, uma banca ao
lado da cozinha, olho pro Noah completamente feliz, estou arfando de
felicidade, ele não sabe o quanto eu sempre quis tudo isso, apenas um lugar
meu, uma casa minha, um lugar bonito e perfeito, talvez isso seja muito
medíocre para as outras pessoas, mas não pra mim!
Outro ambiente com mesas de vidro para visitas, este eu me lembro
que escolhi com a decoradora, é lindo!
A cozinha é absolutamente dos sonhos, tem tudo, fogão, geladeira,
uma mesa pra refeições, forno, tudo em tons de branco e de inox.
Pulo em cima do Noah e o abraço, vendo meu sonho mais que
concreto diante de mim, ele, um lar, uma família, uma nova vida.
— E viveram felizes para sempre! — Noah fala com a voz
embargada.
— Para sempre!
Reforço e o beijo, assim... muito feliz com tudo. Seremos felizes, eu
acredito, eu tenho fé! Hoje mais do que nunca, tenho a certeza de que Noah
e eu seremos muito felizes.
ENFIM CASADOS
— Você está magnifica, querida! — Olho-me no espelho.
Estou um tanto incerta quanto a um punhado de coisas, mas pela
primeira vez na vida me sinto realmente linda.
De manhã estava super nervosa com a assinatura dos papéis, mas
agora estou apavorada.
A semana foi corrida, cheia, lotada, mal sei definir, mas deu tudo
certo, Donatela arruma a saia do meu vestido de noiva enquanto Beth pega
o véu.
Chegou o grande dia, o grande momento da minha vida, o dia do
meu casamento.
Papai me espera do lado de fora do ateliê, acabou que o meu dia de
noiva foi super estressante, primeiro porque estava muito ansiosa com tudo,
segundo porque eu e Noah mal sabíamos como agir quando chegamos ao
cartório, estava prestes a dar o maior passo da minha vida, e eu dei, ao lado
do meu melhor e maior amigo de todos.
Acho que para mim e o Noah só foi meio natural, no momento que
assinamos os papéis do casamento ambos sorriamos, trocávamos olhares, eu
fui com um look montado pelo Beth, uma saia cintura alta de cor preta e
uma bata de mangas que usei por dentro, sandálias mais altas, soltei o
cabelo, e Beth me arrumou uma maquiadora, estava bonita quando assinei
os papéis, e o Noah, estava simplesmente lindo.
Logo que desci, ele me esperava na sala, as mãos enfiadas nos
bolsos da calça, o semblante mais vívido que nunca, pra nós dois tudo isso
tem um grau de relevância e importância extrema.
Noah sabe muito bem como se vestir, desde que mudou-se pra
nossa casa tenho percebido seus looks, sempre social, roupas de marca,
tanto quanto o dinheiro dos pais puderam comprar, me sentia honrada
quando assinamos os papéis, ambos sorriamos um pro outro, o juiz nos
desejou felicitações.
Noah e eu trocamos alianças, e eu me segurei muito para não chorar
durante o ritual, esse foi o momento mais emocionante para mim durante
toda a cerimônia, Donatela e papai foram nossas testemunhas, mamãe
também veio e acompanhou tudo de perto, ela tirou tantas fotos que eu
quase fiquei cega, ela sempre foi assim, e sempre será assim.
Amei a minha aliança de casamento, é fina e de prata, Mas o Noah
me disse que não havia necessidade de que eu tirasse para ele levar pra
igreja, pois comprou outras alianças para o casamento no religioso, achei
chique demais, mas estava tão feliz com a minha aliancinha de casamento
que mal cabia em mim de felicidade, ela está agora no meu dedo esquerdo,
e meu anel de noivado na minha mão direita.
Logo em seguida saímos com nossa certidão pronta, meus pais e
Donatela estavam muito felizes, mas de repente tínhamos que correr com os
preparativos para a festa hoje à tarde, que será num pequeno salão no
centro, Donatela conseguiu o lugar, ela e mamãe cuidaram dos convites e eu
ajudei com tudo, conheci o lugar há três dias, Noah não me deixou saber
quanto custava o aluguel, mas é agradável, tem pista de dança e tudo.
Donatela cuidou desta parte em conjunto com o meu marido,
Marido!
M-a-r-i-d-o!
Sorrio de ponta a ponta quando Beth joga o véu sob minha cabeça,
e Donatela se emociona toda, é muito bom ter a melhor amiga da minha
mãe participando disso também, saímos do ateliê com a ajuda da Samara, a
costureira, serei eternamente grata a ela por ter feito esse vestido para mim.
Quando saio do ateliê, papai coloca as mãos na boca, maravilhado,
tento não chorar desde que sai do cartório, desde então ele me deixou aqui e
foi embora, combinamos que só me pegaria agora, antes do casamento.
Noah foi ter o dia dele com meu pai, disse que iria cortar o cabelo — como
se precisasse — e pegar o smoking no centro, mas eu sei que ele achou que
me deixava aqui pra que nada saísse do combinado.
Mas enfim, chegou o momento.
Papai me abraça com cuidado, mas não falamos nada. Nosso
casamento será numa pequena igreja não muito longe daqui, Beth me ajuda
a colocar o vestido para dentro do carro do Noah, nos despedimos e aceno
para Samara, que vai para o carro dele ao lado de Donatela, e logo me vejo
indo para o meu novo destino.
— Pronta Jas?
— Prontíssima, papai.
Sam Baltimore
As portas da igreja são abertas.
Meu coração está pulando no peito, minha respiração está entre
cortada, meus olhos se voltam para as pessoas que se levantam dos bancos,
poucos convidados, apenas trinta e cinco, dentre eles, alguns amigos dos
meus pais, poucos vizinhos de confiança. Da família do Noah não veio
ninguém. Vejo Faith e sua família, seus netos, ela está emocionada, assim
como Banks, o guarda que nós conhecemos desde crianças.
Papai segura meu braço com firmeza e sorrio pra ele, a vontade de
chorar não sai de nós dois, me sinto a mulher mais feliz e afortunada do
mundo.
Meu avô veio, mal acredito que conseguiram tirar ele do asilo!
Tem um fotógrafo tirando fotos nossas, mas permaneço firme,
seguro o braço de papai e Donatela arruma meu vestido, Beth me entrega o
buquê, e vejo no altar não muito distante, o meu noivo a minha espera,
Noah Baltimore.
Meus olhos encontram os dele ainda que entre o véu, Noah usa um
smoking preto com gravata borboleta, ele sorri assim que encontra meu
olhar, e ficamos nos olhando por um instante extenso, até que papai puxa
meu braço com suavidade para que eu vá de encontro ao meu marido.
Escuto o som de alguém cantando, Noah está com as mãos para
trás, me olhando de forma penetrante, sorrio e mordo o lábio com força, ele
pediu que cantassem “Heaven” do Bryan Adams, porque sabe que essa é a
minha música predileta, a que eu mais escutava com ele durante a infância,
nascemos no mesmo ano, e nos anos 90 esse era um dos hits mais tocados
nas rádios do país.
O cantor é acompanhado por um violino e ele canta com uma moça
num canto da igreja, perto do altar, o padre eu conheci há alguns dias, é o
mesmo que celebra a missa aos domingos que eu e meus pais íamos antes
de mamãe adoecer, nunca fui de viver enfiada em igreja, mas sempre
respeitei a vontade dos meus pais.
Enquanto me aproximo do altar, vou sentindo uma paz tremenda me
tomando dos pés a cabeça, e quando papai me entrega a Noah meu coração
está transbordando de alegria e amor, todas as minhas incertezas quanto a
ficar bem no vestido acabou há alguns dias, contudo, ele me olha com tanta
admiração agora, que eu tenho absoluta certeza que se eu viesse com um
pijama, ainda assim seria linda aos seus olhos.
Noah abraça papai e logo em seguida tira o véu da minha cabeça,
mamãe está à direita, mas não vejo ninguém da família dele, Sara não veio,
nem Arthur King, mas acho que Noah guarda isso muito bem, de tudo e de
todos, porque ele sorri de ponta a ponta.
Esperamos que os cantores parem, ainda sinto a mesma emoção
intensa me tomando dos pés a cabeça. Ficamos de frente um para o outro e
Noah segura as minhas mãos e sinto seus dedos frios, nossas mãos soam,
este é o momento mais importante de nossas vidas.
Logo em seguida o padre começa a celebrar o casamento, fiz os
meus votos há três dias é claro, não queria deixar passar em branco, mamãe
disse que fez os dela faltando uma semana, logo depois do inicio da
cerimônia nos ajoelhamos, e mamãe e papai vieram com um terço de
madeira e colocam em nossas mãos, eu não imaginei que Noah fosse assim
dos mais tradicionais, mas acredito que apesar de Sara ter sido uma mãe
obcecada, ela também o ensinou o caminho correto.
O padre faz todo o ritual e fala sobre a importância do casamento,
tantas coisas, apenas de ouvir me sinto renovada, claro que eu nunca fui das
mais religiosas, mas acho que isso não é algo ligado a fé, que é algo que eu
tenho fixo em minha vida.
— Você, Noah Baltimore Terceiro, aceita Samantha Jasmini
Manchester como sua legítima esposa, para amá-la e respeitá-la, em todos
os momentos de suas vidas, nos momentos de alegria e tristeza, saúde e
doença, até que a morte os separe?
— Sim! — Noah responde imediatamente.
— Você, Samantha Jasmini Manchester, aceita Noah Baltimore
Terceiro como seu legítimo esposo, para amá-lo e respeitá-lo, em todos os
momentos de suas vidas, nos momentos de alegria e tristeza, saúde e
doença, até que a morte os separe?
— Sim! — Respondo também com um sorriso imenso.
Chega o momento dos votos.
Ficamos um de frente para o outro, de joelhos. Donatela se
aproxima com duas alianças numa almofadinha, ela foi a minha madrinha,
ou algo assim ao lado de Beth, fica de lado enquanto vejo Noah olhar no
fundo dos meus olhos com seus olhos mais azuis que nunca.
— Eu decorei os meus votos — Noah fala baixinho — felizmente!
Sorrio. Ele segura as minhas mãos, nervoso, o som do violão ecoa
na igreja e a melodia de Johnny Cash, “The first time ever I saw your face”
começa, sinto vontade de chorar.
— Acho que a primeira memória que tenho da minha melhor
amiga, é de uma menina mal humorada me mandando comer a sopinha de
letras da escola, tínhamos três anos, você basicamente não se lembra de
como me fez comer àquela sopa toda... na verdade não fez, despejou o prato
de sopa na minha cabeça. — Noah fala demonstrando um sorriso
esplêndido nos lábios e eu começo a ouvir gargalhadas de todos,
gargalhadas e risadas, mas estou sorrindo — Sabia que desde aquele
momento eu havia encontrado a garota certa, alguém com quem eu poderia
contar para sempre, essa garota é você, Bolinhos! — ele faz uma pequena
pausa, meus olhos se enchem de lágrimas — Alguns anos se passaram e
você cresceu e se tornou a mulher admirável e corajosa, piedosa e cheia de
amor pela família, alguém com quem eu desejo estar todos os dias da minha
vida, alguém a quem encontro repouso nos dias ruins, apoio nos momentos
complicados, mas principalmente alguém que me entende como nenhuma
outra pessoa, porém, não apenas isso, mas sim porque acredito que você
seja algo muito maior que uma simples amiga, você me escuta, você me
entende, você me ama, e eu te amo mais que tudo, Samantha, como amiga,
mulher, como minha companheira para o resto dos meus dias.
A igreja está silenciosa, mas escuto alguns soluços, mamãe está
chorando, Donatela também, papai permanece duro, mas vejo em seus
olhos lágrimas contidas, meu coração está tão cheio de amor por este
homem, que mal sei se consigo falar.
— A noiva! — o padre fala com cuidado.
— Estive pensando há alguns dias atrás, sobre os melhores e os
piores momentos da minha vida, e ali eu vi um ser estranho com uma
cabeça que parecia um coco, — começo porque também decorei meus
votos, e agora escuto mais risadas na igreja, Noah começa a sorrir e fica
vermelho — e ele também morria de medo de cobras — aviso pra todos na
igreja e papai começa a gargalhar, provavelmente lembrando de um dia que
Noah se mijou de medo de uma lagarta que achamos no trailer.
— Isso não vale — Noah fala risonho — era uma lagarta de fogo
Sam, e ela era gigante!
Ai é que todos riem mais, inclusive o padre, demora um pouco até
que nós consigamos nos recompor.
— Ele parecia àqueles meninos abandonados quando queria doce e
ele também adorava comer porcaria até passar mal, ele era o Batman e eu
era o Robin, ele era o meu melhor amigo medroso e divertido, meu único e
verdadeiro amigo. — continuo olhando no fundo dos olhos dele — Quando
alguém o machucava eu também me machucava, porque não conseguia
imaginar como era não me sentir como Noah sentia, quando alguém brigava
com ele eu tomava as dores, por muito tempo ele foi um irmão pra mim, o
meu escudo, e o garoto com quem eu dividi todos os meus segredos, um
psicólogo, um médico, um amigo!
Noah abaixa a cabeça com cara de choro.
— Preciso te dizer, Noah Baltimore, que ser sua amiga é a missão
mais incrível do mundo, a melhor aventura, e que me sinto grata por todos
os pequenos momentos de toda a minha infância que você esteve lá, ainda
que os caminhos que tenhamos escolhido para nossas vidas tenha nos
afastado, eu preciso dizer que você foi e sempre será o meu único e
verdadeiro amigo, meu único e verdadeiro companheiro, meu único e
verdadeiro amor, — sorrio e as lágrimas começam a cair em minha face e
na face de Noah — e como diria Johnny Cash: "E a primeira vez, que deitei
contigo, Eu senti seu coração, tão perto do meu. E sei que a nossa alegria
iria encher a terra, e durar até o fim dos tempos, meu amor. A primeira vez
que vi seu rosto".
Donatela se aproxima com as alianças e Noah pega a minha, é uma
aliança grossa cravejada por pedrinhas brancas, douradas e um tom mais
clara, é completamente cravejada, fico maravilhada com a joia.
Ele a coloca em meu dedo e depois beija minha mão com carinho,
todo choroso, pego sua aliança e seguro sua mão, é lisa e grosa, apenas
ouro, sinto o peso frio da joia reluzente e enfio no seu anelar esquerdo.
Nós nos viramos para o padre e ele prossegue com a cerimônia.
— Então, pelo poder em mim investido, em nome de Cristo, eu os
declaro Marido e Mulher! Pode beijar a...
Mas antes que o padre fale, eu puxo Noah pra mim e nos beijamos.
— Te amo! — Digo, me afastando um pouco.
— Eu te amo! — Noah cola a testa na minha — Agora, por Deus e
pelo homem, estamos casados, oficialmente, senhora Baltimore Manchester.
Sorrio e volto a beijá-lo, porque dentro de mim não cabe de tanta
felicidade. Enfim, casados!
“50”
Suspiro tão feliz, acabamos de aterrissar.
Noah entrelaça os dedos nos meus e me sinto dentro de um filme
maravilhoso de romance e amor.
Saímos da igreja regados a arroz, a todo instante o fotógrafo
capturou nossos momentos juntos, mas não me sentia incomodada, mesmo
que odiasse tirar fotos! Fomos para o carro, papai assumiu o volante e
Donatela me ajuda a colocar o vestido para dentro do carro. Noah se sentou
ao meu lado no banco de trás e mamãe na frente.
— Nos vemos no salão! — Donatela falou com um sorriso largo.
Eu e Noah sorrimos pra ela e acenamos pra todos, olhei pra mamãe
vendo o lenço em sua cabeça e me lembrei de algo, deixei passar batido,
mas ela ainda assim estava linda de vestido de noite, meus pais estavam
lindos, todos os convidados, tudo estava perfeito.
Papai ligou o carro e logo estávamos nos afastando da igreja.
Fomos direto para o salão de festas, durante o caminho mamãe não parava
de falar um segundo sobre o quanto eu estava linda, sobre quanto o
casamento estava perfeito, dezenas de coisas me vieram a mente naquele
instante.
Eu estava casada com Noah.
Eu me sentia a mulher mais feliz do mundo.
Eu nunca mais seria a mesma Sam dali em diante.
Até que chegamos ao lugar e os convidados também chegavam. O
lugar estava pronto pra nos receber com direito a tudo: garçons, uma mesa
imensa de frios, e pequenas mesas decoradas, o lugar não é muito grande e
nem havia necessidade.
Alguns momentos depois, quando os convidados chegaram, papai
propôs um brinde, pela primeira vez em anos eu o vi brindar com um copo
de água, mamãe chorou um pouco, assim como eu, Donatela fazia de tudo
para fazer todos se sentirem a vontade, ela é mais experiente com eventos.
Haviam sorrisos e todos trouxeram presentes, utensílios domésticos,
eu já tenho muito deles, mas fiz questão de abrir um por um durante a festa
com o Noah, via as reações adversas de todos, rimos, nos divertimos e
ganhamos a primeira dança, claro, uma música muito romântica e lenta,
Noah a todo momento me beijava, sorria pra mim, trocamos olhares e
palavras de afeto, estamos mais sintonizados, mais unidos.
Achei ruim que o Ty não foi, assim como ele havia dito que iria,
esperei até o último momento da festa para cortar o bolo, eu e Noah demos
nosso primeiro pedaço pra mamãe e o segundo para Faith, que sorriu toda
feliz. Tiramos fotos com todos, depois tivemos que partir pra casa, a festa
continuava quando saímos do salão.
Passamos em nosso novo lar, às vezes, quando entrava naquela casa
durante a semana, me sentia ainda surpresa, feliz, a sensação de friozinho
na barriga todas as manhãs quando eu acordava durante a semana, pois a
minha nova casa é linda, bem decorada, a casa dos sonhos de qualquer
mulher!
Troquei meu vestido de noiva com a ajuda do meu esposo, — ai,
Esposo! — por um jeans, tênis e uma blusa de mangas de cor branca com
detalhes de bordados escuros.
Noah trocou seu smoking impecável por uma camisa branca de
mangas, uma calça jeans e sapatos.
Então pegamos nossas malas e antes de partir, eu deixei o meu
pequeno presente na cama de mamãe com um bilhete, eu espero muito que
ela goste.
Liguei pra ela assim que entramos no aeroporto, Noah e eu não
conversamos muito desde então, ele ficou fazendo mistério sobre qual voo
nos pegaríamos, e me distraí tanto conversando com mamãe que nem vi
qual o destino de nossa viagem.
Dormi, dormi, e dormi, acordei agora a pouco, e estamos saindo do
avião, me senti tonta logo que descemos, acho que por conta que a latitude
que não fez bem, mas essa viagem demorou muito mais do que apenas uma
viagem local.
A viagem foi longa.
Pego minhas bolsa no compartimento e Noah a nossa mala de mão,
acho que ambos dormimos demais.
O avião está quase vazio, acho que fizemos umas três paradas, mas
nada demais, logo que saímos sinto um sopro de vento forte na minha face e
meus olhos se deparam com o sol forte e uma imensidade azul, mar?
— Bem vinda a Male, Bolinhos!
Fico olhando em volta há todo momento.
Nosso percurso é num hidroavião de cor vermelha.
Eu mal acredito que Noah me trouxe pras Ilhas Maldivas, eu
realmente nunca pensei que ele me traria pra tão longe!
Nosso percurso é silencioso e eu acho que ele percebe logo pelo
meu entusiasmo que eu gostei muito de vir pra cá, só conhecia o lugar por
fotos, ele mexe no celular e algumas vezes me olha, fico meio sem graça de
parecer tão "garota de cidade pequena", mas eu sou assim, nunca sai do
país, o máximo que sai de Charlotte foi pra viagens a cidades vizinhas e
aquele dia em Nova York.
Depois de uma hora e meia chegamos ao nosso hotel.
Não é bem um hotel, é um lugar formado por pequenos chalés no
meio da praia, o piloto do hidroavião nos ajuda a entrar na pequena lancha
que nos espera, e eu fico feito uma bocó olhando em volta e sorrindo. —
Poxa vida, Maldivas!
A visão é fantástica e surreal.
Somos levados com a nossa bagagem para o nosso chalé submerso,
e logo que subimos no tablado de madeira, o homem ajuda Noah com as
malas, depois o homem parte e eu fico olhando para o chalé,
completamente e totalmente maravilhada.
Tem uma piscina do lado de fora, uma escadinha para descer para o
mar, que é de cor azul lucida, espreguiçadeiras, um sofá, tudo em tons de
verde e branco, a cabana é suspensa por tocos de madeira, toda e
completamente de madeira, e muito antes que eu fale, sou erguida no colo
assim do nada por Noah, ele sorri como se isso fosse uma missão muito
banal e me carrega pra dentro da cabana, me sinto envergonhada com a
situação, eu não via necessidade dele fazer isso.
Quando ele me coloca no chão eu o olho com cara feia, mas ele me
ignora e sai indo buscar as malas.
O lugar é arejado e limpo, a sala composta por sofás e puffs, tem
TV, som, e uma espreguiçadeira acolchoada para casal, portas que dão para
o lado de fora também, mas não é grande, vou direto procurando o quarto e
quando o acho me maravilho com a modernidade, tudo lindo, bem
decorado. Noah me abraça por trás, e sorrio, vendo o mar absolutamente
lindo diante de meus olhos, uma brisa maravilhosa sopra, me deixando
ainda mais em paz com a cena que vejo.
— Gostou, meu amor?
— É perfeito Noah.
— Quer tomar um banho?
— Sim.
— Vou dar um mergulho, volto em meia hora.
— Já esteve aqui?
— Algumas vezes.
Ele beija a minha face e se afasta indo para o outro lado, olho para
as malas e percebo suas reais intenções, Noah quer que eu me arrume, ele
acha que preciso de um tempinho pra me arrumar pra nossa primeira noite
de núpcias, me dou conta disso e pego a minha mala.
Acho o banheiro e me tranco aqui, Beth arrumou minha mala, ele a
chamou de "mala das núpcias", colocou algumas lingeries eu sei, e quando
abro e só vejo lingeries pequenas, espartilhos e camisolas transparentes. —
Quero dar cria!
Claro, por que essa é a minha lua de mel, ok estou menos
complexada com o meu corpo, mas sério?
Tomo banho sem saber o que usar realmente, mas depois opto por
uma lingerie preta com cintas ligas, — eu de cintas ligas, ok! — ela é
composta por um sutiã preto com detalhes de rendas, calcinha preta também
de rendas, as ligas vem com uma meia comprida, que se prendem a parte de
cima do conjunto, me olho no espelho do banheiro e até que não me sinto
assim, das mais gordas, esconde tudo.
Acho que essa é a primeira vez na vida que me sinto realmente sexy
ou algo próximo disso, atraente.
Não me maquio muito, mas passo batom escuro e seco meus
cabelos, os jogo pro lado, escuto três batidas na porta.
— Jas, tudo bem ai?
— S-sim, eu já vou!
— Tá! Estou te esperando.
Deveria ter colocado um salto, ter pegado minha nécessaire,
passado perfume, arrumo a camisola preta por cima da lingerie e respiro
fundo. Escondo os meus receios sobre o corpo, não precisei de lingeries
para o Noah gostar de mim há algumas semanas, nem pra ele se sentir
atraído por mim, mas definitivamente sei que esta noite tem que ser especial
para os dois.
Abro a porta do banheiro e logo que saio vejo um Noah nu em pé,
perto da porta aberta, a visão esplendorosa do meu marido nu, me causa
arrepios fortes no corpo, mordo o lábio inferior e vou até ele tentando
parecer natural, Noah está molhado dos pés a cabeça, os braços dobrados,
parece meio distraído ou coisa assim.
Fico ao lado dele, Noah me olha com o canto do olho e fico vendo-
o arregalar os olhos enquanto me olha de cima abaixo.
— Porra!
— Não fiquei bem?
— Eu estava tentando seduzir alguém aqui, ok?
Acabo rindo.
Noah me beija nesse momento eu o enlaço pelo pescoço com força
correspondendo ao seu beijo, vamos caminhando pra cama enquanto nos
beijamos.
— Tomou o anticoncepcional?
— Comecei quinta.
— Perfeito.
Voltamos a nos beijar.
Também o quero, faz dias que não fazemos amor, sinto falta dele
nesse sentido também, toco seu peito firme, seus braços, Noah me empurra
e caio deitada na cama, assim meio assustada, e ele vem pra cima de mim
cheio de vontade, nossas bocas se unem novamente com intensidade.
— Você está linda querida, absolutamente linda.
Eu o fito e o beijo, mais lentamente, Noah beija meu pescoço e
desce para os meus seios, beija o decote da camisola e a puxa pra cima, me
ajuda a tirar depois de alguns instantes e fica me observando, sua ereção é
clara e evidente, estendo a mão e o toco. Nunca fiz isso, ele respira fundo e
fecha os olhos, me ergo e fico de joelhos na cama, ele também, fica de
frente pra mim, segura a minha face com cuidado e me fita.
— Você não sabe o quanto estou feliz, Sam.
— Eu também estou muito feliz.
Ele toca meus ombros, e suas mãos puxam as alcinhas do sutiã pra
baixo, toco seu corpo lentamente, e nossas bocas novamente se unem, fecho
os olhos e ele me puxa pro seu corpo puxando minhas mãos pro seu peito,
pro seu coração, dispara tanto que parece que vai sair do lugar, assim como
o meu.
— Ele é todo seu.
Sorrio tão feliz que pulo em cima dele, Noah cai pra trás e ri
quando subo nele, arrumo o sutiã e ergo os quadris, ele puxa a calcinha para
o lado e me sento nele, entrelaçamos as nossas mãos e começo a me mover
lentamente sob ele, está duro e quente, do jeito que eu adoro.
Ele solta as minhas mãos e aperta minha bunda por cima da
calcinha, segura meus quadris e se move mais rápido jogando meu corpo
pra cima a cada movimento, penetra com força, intensidade, me inclino pra
frente me movendo pra cima e pra baixo com ele, tenho um marido com um
desejo incontrolável às vezes, ele surpreendentemente se ergue e me joga na
cama, abre as minhas pernas e começa a fazer com força, afastando a
calcinha para o lado.
Me seguro na cabeceira da cama e solto uns gritos altos, a sensação
de prazer vai me tomando dos pés a cabeça, nunca tivemos essa liberdade, e
eu nunca senti como se Noah estivesse tão excitado, enquanto faz ele olha e
faz com mais força, mais rápido, sorrio levando as estocadas fortes na
intimidade, e alcanço muito rapidamente meu primeiro orgasmo, é intenso,
avassalador e demorado, Noah me beija com paixão e estremece, dentro de
mim despeja com força o líquido quente.
Depois se ergue e volta a se mover mais devagar, me apoio nos
cotovelos e eu o beijo me movendo com ele, toco sua face com carinho,
meus dedos se enfiam em seus cabelos, nossos corpos se unem numa
lentidão mais gloriosa, estou mais sensível.
Fecho os olhos e me entrego ao homem que amo, ao meu marido,
eu sei que a partir de hoje todos os meus dias serão mais felizes, Noah
Baltimore me ama, e eu o amo, estamos casados, e hoje começaremos um
novo “felizes para sempre juntos”.
TUDO UMA GRANDE MENTIRA
Acordo.
Estou sozinha na cama.
Mas já amanheceu e a manhã invade nosso quarto lentamente, a
primeira coisa que vejo é o mar diante de meus olhos, apenas uma
imensidão azul e perfeita, automaticamente sorrio depois me sento na cama,
lentamente, observo as peças íntimas jogadas no chão e sorrio.
Demoro um pouco para me situar, me enrolo num lençol de cama e
tenho a impressão de ouvir a voz baixa de Noah vindo de algum lugar da
casa, saio da cama e vou ao banheiro, pego uma camisola na mala e visto,
sem fazer barulho, vou em direção à sala, a voz dele vem de lá, mas
paraliso porque escuto uma segunda voz... e essa voz eu conheço muito
bem.
— Você está louco!
É a voz de Sara!
Aproximo-me do canto da parede e espio sem saber como agir,
arregalo os olhos, pois Sara King está em pé na sala, usando um vestido
floral, ao lado de um homem grisalho que usa óculos, ele tem estatura
mediana e parece ter uns sessenta anos, e também usa roupas leves, Noah
está na outra ponta da sala com os braços cruzados, usa uma calça de
pijama e camisa branca, pisco, atônita, Sara e Arthur King estão aqui!
— Quando vai contar pra ela a verdade, Noah? Você não ama
aquela garota!
Sara tem o dom de me causar buracos no peito, ela tem o dom de
me ferir, mas fico calada, analisando a única pessoa que me interessa neste
momento, meu marido, Noah.
— Não posso deixar a Sam nesse momento, ela precisa de mim
mamãe!
Ele parece até muito pacífico para quem estava muito ferido com a
última visita da mãe.
— Ela sabe do seu romance com Donatela?
— Nem vai saber, isso foi antes de eu ver ela na King.
Perco a respiração por alguns segundos, e fico parada recebendo
uma pequena punhalada no peito.
— Noah, não deveria ter se casado com a Sam.
— Eu gosto dela mãe!
— Você não a ama.
— Isso não tem a ver com amor mãe, você mais do que todo
mundo, sabe que a Sam precisa de mim, ela até tentou se matar por minha
culpa.
— Deixa ele Sara, ele sabe o que faz, já casou, deixe ele casado
com a moça até que a mãe dela morra em paz.
— Pai! — Noah fala bastante sério — Não fala assim, ok? Eu
respeito muito a Sam e gosto dela.
— Claro que gosta só que isso já foi muito longe! — Sara replica
perplexa — contou pra ela que não saiu da King?
— Não, — Noah olha para a porta aberta da sala — nem ela vai
saber até que esteja bem o suficiente pra lidar com tudo.
— As pessoas não se casam por pena Noah, as pessoas se casam
por amor. — Arthur King fala concreto — Já pensou na dor dessa moça
quando souber que tudo foi uma mentira?
As palavras ecoam dentro de mim e vão me destruindo lentamente.
— Nada foi uma mentira pai, eu gosto da Sam, eu quero ficar com
ela, eu apenas não disse que sai da King e não contei sobre Donatela, ela era
um caso antigo.
— Ficou com Donatela!
Noah não responde, fica calado, e sinto como se alguém me
enforcasse.
— Ela não quer se afastar por conta da mãe da Sam, elas são
amigas.
— Isso virou um rolo! — Sara reclama — Você nem deveria ter
começado, Dy tinha concordado em casar com você, estava tudo arranjado.
— Acontece que eu não gostava dela, mãe, nem atração eu sentia
pela Dyanna — Noah replica num tom mais duro.
— E comia a Donatela! — Arthur fala debochado e parece querer
rir.
Algumas lágrimas começam a cair pela minha face.
— Não, eu "não comia a Donatela", nem antes de reencontrar a
Sam, eu não "comia a Donatela", eu rompi com ela há muitos anos atrás, eu
a trouxe para esta filial pela competência dela, Donatela é adulta e sabe
separar as coisas, e pra sua informação, quando eu estava com a Dyanna,
era apenas eu e ela. Donatela sabe que Sam é mais importante, só que ela é
amiga da Lily, e virou toda essa merda.
— Sabe que Sam não vai te perdoar quando souber, certo? — Sara
pergunta num tom severo. — Se eu soubesse que você iria fazer isso com
ela, eu teria avisado pra ela naquele dia.
— Eu não fiz nada com a Sam. Eu já disse que gosto dela mãe, e é
com ela que eu vou ficar, o passado já ficou pra trás, depois que eu a
encontrei na empresa, tem sido apenas eu e ela.
— Isso não muda o fato de que mentiu para ela, — Sara retruca
curta e grossa. — a mãe ela está com câncer terminal, Noah, sabe o quanto
isso vai ser duro pra ela?
— Não! — Meu grito é ouvido por todos, e eu me afasto
percebendo os olhares voltados pra mim.
De todas as coisas que já ouvi na minha vida, esta é a pior.
Noah me olha e vem na minha direção, assim como Arthur, mas
saio correndo, procuro uma saída, a porta mais próxima, encontro uma com
uma passarela extensa que dá pra praia, saio correndo, a dor queimando no
meu peito, sinto como se pequenas fagulhas se formassem na minha
garganta, e uma dor aguda me toma completa e totalmente, fecho os olhos
enquanto corro e parece que todo o meu corpo está dormente, alcanço a
areia e corro mais, muito mais, tento afastar a dor e meus pulmões que
queimam, doem, meu coração.
— Samantha!
É a última coisa que escuto. Logo em seguida eu desmaio.
SEM PERDÃO
Quando acordei me sentia grogue, a pessoa que estava ao meu lado
era a última que eu pensei que estaria, e quando eu desmoronei, Sara King
me deu colo, ela me abraçou e simplesmente me deu seu silêncio doloroso.
Meu coração estava destruído, embargado de dor.
Em minha mente só vinha mamãe, memórias da minha infância, e a
dor me consumia.
Silenciosamente Sara me deu colo e apoio, ela não dizia nada, mas
estava ali, sei que ela sabia que eu não iria aceitar que aquele homem
estranho, a quem chamei de melhor amigo por anos e marido por alguns
momentos estivesse ali.
Uma enfermeira apareceu e me medicou novamente, então
adormeci.
Não conseguia pensar em nada além da dor, acreditava que mamãe
ficaria bem, que ela sararia, e muito pior do que a dor da traição e das
mentiras do Noah era imaginar que mamãe daqui a algum tempo não estaria
comigo.
Tudo se misturou dentro de mim, e o meu primeiro dia na "lua de
mel" se resumiu num dia doloroso, cheio de frustração, confusão, eu só
queria poder estar longe de tudo aquilo, de Noah, das descobertas, das
mentiras dele.
Tornei a acordar no dia seguinte e Sara estava lá. Eu me sentia um
pouco pior que no dia anterior, mas desta vez ela agiu de uma forma que eu
jamais pensei que agiria, Sara cuidou de mim.
Me sentia tão quebrada e fragilizada que não queria sair da cama,
mas ela e a enfermeira me ajudaram, o sedativo me deixava calma, muito
calma, coisa que eu não me sentia por dentro, depois disso ela e a
enfermeira me levaram para o banheiro e me deram um banho, a força
havia saído de mim, e eu só chorava silenciosamente, com a dor de
imaginar que mamãe morreria.
Em minha mente eu lembrava também do casamento na igreja, dos
dias que Noah passou comigo na casa dos meus pais, da casa que ele
arrumou para nós dois morarmos e sentia que tudo era uma grande ilusão,
uma mentira, e as constatações queimavam dentro de mim a todo o
momento.
Noah Baltimore mentiu pra mim.
Noah Baltimore me enganou.
Noah Baltimore não me ama!
Estas foram às três piores constatações que eu tive na minha vida.
Depois me lembrei de mamãe e só sentia a dor insuportável dentro
de mim me matando pouco a pouco.
Sara insistiu pra que eu comesse — o que é uma grande ironia —
mas eu não conseguia, só ficava chorando, em silêncio, num mundo onde
me sentia estranha e invasora, um mundo no qual eu tinha certeza de que eu
nunca pertenci, ao mundo dela e de seu filho.
Aquele dia não foi pior que o dia seguinte.
Novamente quando acordei, Sara estava lá, mas a enfermeira não
me sedou, e como os efeitos dos sedativos passaram tudo o que eu tinha era
mais e mais dor, contudo, não foi pior do que ver Noah entrando no quarto
logo depois do meu banho.
Encontrei seu olhar e ele parecia de alguma forma abalado, eu não o
vira depois da minha "fuga" ao saber da verdade, ouvi seus chamados e
desmaiei, e ter que encará-lo foi péssimo. Noah se aproximou, mas não
dizia nada, e quando ficou diante de mim eu não pensei duas vezes, lhe dei
uma bofetada no rosto, tirei as alianças de casamento e noivado e joguei
nele, e acho que estava em meu ápice da loucura quando cuspi nele, — sim,
eu me recordo que fiz isso — e Noah recebeu aquilo em silêncio, muito
antes que eu avançasse nele, Sara o mandou sair do quarto, eu havia perdido
toda a sanidade que me restava, Noah simplesmente se virou, me deu as
costas e saiu sem olhar pra trás.
E os dias foram passando lentamente, até chegar ao dia de hoje,
mais um dia em que acordo e me dou conta de toda essa farsa, mas chorei
tanto durante estes cinco dias, que eu mal consigo chorar mais, não estou
sedada, mas não tenho forças, os pensamentos se organizam lentamente em
minha cabeça, mas os sentimentos não me impedem de ainda sentir a
mesma dor que venho sentindo desde que soube dos reais motivos pelos
quais Noah se casou comigo.
Ele sentia pena de mim, ele não se casou por amor, ele se casou
porque soube que mamãe tem câncer e é terminal, ele se casou em
consideração a nossa amizade de infância, ele se casou porque se sente
culpado por eu ter tentado me matar, Noah se casou por qualquer motivo
egoísta, menos por amor.
Todos sabiam, acho que exceto eu e meus pais sabíamos, e muito
pior, Noah teve um caso com Donatela, a melhor amiga da minha mãe, a
única mulher que eu comecei a acreditar que poderia ser minha amiga, ela
nos visitou durante esses meses, ela esteve na minha casa, ela jantou
conosco, com Noah, e ela e Noah já estiveram juntos... Se é que ainda não
estão.
— Bom dia!
Sara entra no quarto. Eu preciso reconhecer que apesar dela ser uma
bruxa, ela tem sido a única pessoa na qual eu consigo tolerar, ainda que eu
saiba que mentiu pra mim também, contudo acho que não foi exatamente
ela, talvez os pais de Noah sejam as pessoas mais preconceituosas do
mundo, mas não se sentiam no direito de falar nada pra mim, Sara mesmo
deixou isso claro naquela conversa.
— Eu fiz panquecas!
A enfermeira abre a porta do quarto, me levanto e me sento, Sara se
aproxima com a bandeja, e se senta diante de mim, seus cabelos loiros
presos num rabo de cavalo, seus olhos azuis mais reluzentes que nunca,
acredito que apesar de tudo, a viúva negra esteja feliz, porque ela sabe que
o que eu sentia por Noah começou a acabar há uns dias atrás, não confio
mais nele, não acredito mais nele, e se eu o amo... isso também nem eu sei
mais.
— Temos uma surpresa pra você! — Sara fala empolgada.
— Compraram minhas passagens de volta? — Pergunto e não
consigo se quer pensar em comer.
— Seus pais chegam amanhã!
O que?
— Como? — a pergunta sai mais como um berro.
— Foi uma ideia que o Arthur teve, nós sabemos que é importante
que aproveite o tempo que tem com a sua mãe. — Sara responde com um
sorriso falso nos lábios — Ficaremos por mais duas semanas, família, todos
reunidos!
— Não! — Respondo começando a ficar brava com ela — Eu não
quero ficar aqui, eu vou entrar com os papéis pra anular o casamento, eu
vou voltar pra casa e cuidar da minha mãe!
— Ora não seja tola, você e o Noah se amam...
— Você é uma dissimulada senhora King! — Acuso
interrompendo-a e Sara fica sem graça — Noah não me ama, — falar isso
me machuca — esse casamento é uma farsa pra ele.
— Você está exagerando! — Sara faz pouco caso — Acha que ele
não gosta de você? Ele se casou com você!
— Por pena! — digo e ela não responde confirmando isso — Eu
vou anular o casamento, vai ser o melhor para os dois.
— Sabe Samantha, eu realmente me equivoquei sobre você...
— Não preciso da sua pena, nem da pena de ninguém!
Engulo a vontade de chorar. Sara me fita muito séria agora.
— Eu não queria que você tivesse ouvido a conversa, você não
deveria nem saber disso tudo, talvez, quem sabe, não fossem felizes? Talvez
você não acredite, mas o Noah realmente ama você, ou reaprendeu a amar,
ele sofreu muito esses anos, te reencontrar foi algo que o mudou
completamente, Noah só achou que fazia o melhor não te contando, porque
quando eu soube e disse pra ele, ele se desesperou, ele sabia que você
ficaria péssima.
Não respondo.
— Eu soube no dia que ela começou o tratamento com o convênio
do Noah, nós fazíamos questão de pagar o melhor especialista, mas nos
disseram que o tumor já tomou conta de boa parte do pulmão direito, o
médico disse que é irreversível e que só um milagre pode salvá-la.
Isso os médicos não me disseram, quando acompanhei mamãe a
clínica eles apenas diziam que ela reagia bem ao tratamento, que ela estava
"bem", começo a duvidar agora se eles contaram para o papai, se ele sabe,
porque eles não poderiam esconder isso ao menos dele.
— Papai sabe?
— Sua mãe também sabe Samantha, ela nos pediu que não
contássemos pra você.
Sinto vontade de chorar.
— Queremos que vocês fiquem bem, eu sou muito contra o
casamento, vim inclusive pra tentar persuadir o Noah, mas ele não quer se
divorciar.
— Não sei por que.
— Ele gosta de você!
— Ele teve um caso com a amiga da minha mãe!
Sinto nojo só de lembrar.
Sara me encara tão... tão... irritada.
— Isso foi há muitos anos. Donatela é funcionária de uma filial de
Nova York, eles não sabiam que isso iria acontecer, Noah não sabia que ela
era amiga da Lily e vice e versa.
— Por que está tentando me convencer, Sara? Você mesma não
quer esse casamento!
— Quero que o meu filho durma à noite Samantha, quero que ele
encontre paz e felicidade, isso é algo que ele não tem tido há muito tempo,
claro que me oponho a este casamento, você nunca será uma mulher a
altura de ser uma King, mas sei que o Noah é verdadeiramente feliz ao seu
lado.
— É um relacionamento baseado em mentiras.
— Não é mentira Samantha, Noah apenas não lhe contou sobre
coisas do passado dele.
— Ele mentiu sobre a empresa.
— Ouça...
— Não adianta nada que faça ou fale Sara. Eu me divorciarei do
Noah. Tudo não passou de uma ilusão, e logo que voltarmos para Charlotte,
nós assinaremos os papéis.
— Espero que você mude de ideia, Samantha.
— Eu não vou mudar!
ACABOU DEFINITIVAMENTE
— Jas!
A felicidade está estampada no semblante da minha mãe.
Dezenas de coisas se passam na minha cabeça logo que a abraço, e
eu simplesmente não consigo esconder a dor que sinto por ela, quando seus
braços me enlaçam eu a aperto com carinho, força, com todo o amor que
sinto dentro de mim.
Fiz questão de vir buscar ela no aeroporto. Sara veio comigo, me
recusei a ver o Noah ontem, eu não quero olhar na cara dele, ainda que
saiba que terei que fazer isso por duas semanas, acho que Sara fez isso
justamente para que Noah e eu nos acertemos, mas eu já avisei pra ela que
isso não irá acontecer.
Mamãe sorri tão feliz. Não esperava que eles viessem, eu pensei
tantas coisas sobre essa lua de mel, eu fiz tantos planos, no fundo me sinto
idiota por ter imaginado que seriamos apenas eu, meu novo marido e um
paraíso tropical.
Deixo a dor de lado e sorrio. Abraço papai e imagino que para eles
saberem disso, seja algo tão doloroso e assustador quanto pra mim, eu
estava tão contente com a minha nova vida que não me dei conta do que
realmente acontecia, papai não parou de beber apenas por conta da doença
de mamãe, acho que ele parou porque sabia que ela morreria e que esta vem
sendo uma vontade dela há muito tempo, e mamãe vem ficando muito mais
tempo ao meu lado porque sabe que seu tempo aqui na terra será um pouco
curto.
E eu acho que isso é muito pior do que saber que o Noah me traiu
de alguma forma com a amiga dela, que ele se casou comigo por qualquer
coisa que não seja amor, mas que principalmente, é muito pior, porque
daqui a algum tempo — não sei quanto — mamãe não estará comigo.
As coisas começaram a fazer muito sentido pra mim ontem à noite.
Pensei muito sobre a chegada do Noah e todos os acontecimentos
que nos envolveram durante esses meses.
Quando Noah soube que mamãe estava doente ele me pediu em
namoro, mas quando soube que o câncer não tem cura, ele se apressou com
o casamento, porque ele sabia que isso seria um duro golpe pra mim, ele
não me falou onde seria a nova empresa porque não há nova empresa, ele
nunca se demitiu de fato da King, Noah comprou uma nova casa pra que
morássemos juntos para reformar a casa dos meus pais, com certeza para
que mamãe tivesse algum conforto em seus últimos dias, e ele só casou
comigo, justamente por saber que esse seria — será — o pior momento da
minha vida.
Não há amor, não há companheirismo e duvido que haja alguma
atração, Noah se casou comigo apenas porque eu fui sua melhor amiga de
infância, alguém por quem tem alguma compaixão, ele não me acha linda
nem atraente, e eu acho que só dorme comigo pelo fato de que é homem e
sente desejo de homem, necessidade, nada, além disso.
Enquanto eu me entreguei verdadeiramente a ele, Noah se entregou
apenas a pena que sentia por mim.
— Você vai amar os dias aqui querida. — Sara fala pra mamãe logo
que entramos no hidro avião.
Sento-me um pouco longe delas, mamãe está tão feliz que não
quero que perceba a minha infelicidade, sei que os dias que ela terá comigo
aqui serão muito bons pra ela e papai, eu não gosto disso, por mim teria
voltado pra casa, procurado o cartório e entrado com a anulação do
casamento e no dia seguinte pegaria as minhas coisas e as dos meus pais e
voltaria para minha antiga casa, mas não é isso o que Sara King induziu, eu
não sei o que ela e Arthur King pensam ao tentar fazer isso, mas eu não vou
mudar de opinião.
— Jas! — Papai chama, estou olhando para o mar lindo, mas isso
não causa efeito algum dentro de mim — O que foi?
— Nada papai, — lhe dou meu melhor sorriso — só estou cansada
mesmo.
— Donatela mandou lembranças — papai avisa.
Diga pra ela enfiar as lembranças no...
— Ficamos surpresos com a ligação de Sara, sabemos que ela não
gosta muito da gente, — papai comenta baixinho — mas, acho que ela
percebeu a moça de ouro que você é, e que não quer o dinheiro deles não é
mesmo?
— Deve ser. — coitado, não sabe nem da metade — Sara é gentil.
Sinto-me obrigada a falar isso, pois foi ela quem cuidou de mim
esses dias depois do baque.
— Vocês serão muito felizes, Jas, Noah e você foram feitos um pro
outro.
Faço que sim, papai beija a minha cabeça e me seguro pra não
chorar, fico desejando que o percurso seja lento, mas ele acaba muito antes
que eu veja, e quando o hidroavião para na lancha que nos aguarda Noah
nos espera, não olho na cara dele, mamãe e Sara descem na frente e papai
vai logo em seguida com as malas, Noah estende a mão para mim, seus
olhos estão fundos e ele tem olheiras, mas imagino que sejam devido a
preocupação de que eu fale para os meus pais sobre tudo, contudo, guardo
novamente a minha dor e aceito a ajuda pra descer, nos acomodamos e me
sento ao lado dele, olho pra sua mão esquerda onde tem os nossos dois
anéis de casamento e pra minha mão, eu nem sei onde foram parar os meus
depois que joguei na cara dele, não quero saber.
Esse falso...
— Aqui é lindo! — Mamãe fala com um sorriso imenso —
Obrigada Sara, por nos convidar.
— Que nada querida, você vai amar o hotel, — Sara fala sorridente
— a enfermeira também estará lá pra qualquer coisa que precise.
— Estas semanas não tenho químio. — Mamãe fala e olha pra mim
— O que foi Jas?
— Ela ficou meio chateada, eu não avisei que chamaria vocês. Ela
achava que eu deixaria passar a semana do aniversário do meu bebê!
Aniversário do Noah!
Conto mentalmente nos dedos e percebo que o aniversário dele é
em alguns dias, me esqueci completamente.
— Você sabe que a família é a coisa mais importante para nós, —
Sara diz fazendo de conta que vive na terra do Nunca, toda feliz —
queremos comemorar a altura, estou organizando essas duas semanas para a
diversão de todos nós, passeios, descanso, e é claro, a festa de aniversário,
faz anos que a Sam não participa de nenhuma.
Não gosto disso...
Ela começa a falar dos planos para o aniversário do Noah, ele
estende a mão e lentamente segura a minha assim, como se não quisesse
nada, não queria que ele me tocasse, mas sei que se reagir mal a tudo meus
pais desconfiarão, e a última coisa que eu quero na face da terra, é que eles
saibam que esse casamento é um fiasco, uma mentira coberta de dor e
incerteza por minha parte, ao menos não agora. Não quero estragar a
felicidade dos meus pais, não quero que mamãe saiba de nada, sei que ela
ficaria muito abalada com tudo.
Logo que deixamos papai e mamãe no chalé deles, Sara os
acompanha e me deixa a sós com o Noah na lancha, antes que eu saia, o
homem dá a partida, Noah me olha bastante sério, calado, daquele jeito
indecifrável que às vezes me olha, acho que nesses momentos eu deveria
perceber o que ele realmente pensava quando me olhava assim.
Ele tinha pena de mim, deveria pensar "coitada da Sam, vou casar
com ele pra que não sofra tanto, vou dormir com ela pra lhe devolver a
autoestima, vou dizer que a amo pra que ela se sinta especial, vou dizer que
a acho linda pra que ela se sinta bonita".
— Eu sinto muito, Sam.
— Não precisa sentir!
Essa é a nossa primeira conversa, e eu farei questão de que seja a
última, não preciso da pena de Noah Baltimore, não preciso de seu dinheiro,
não preciso de migalhas. Hoje mais do que nunca, ele é mais um estranho
para mim, ele nem chega perto do meu melhor amigo, acho que o Noah que
eu conheci, morreu em algum momento de sua vida.
— Gostaria que...
— Não precisa se preocupar Noah, eu não vou contar para os meus
pais, vou esperar até que voltemos, depois procuro um advogado.
— Você vai querer o divórcio?
— É o melhor.
Ele olha para baixo com desgosto, mas não acredito em seus
sentimentos, são falsos, me mantenho distante dele, olho em volta me
sentindo tão... pequena.
— Poderia me perdoar?
— Não, isso não é uma opção!
— Mas, eu não quero o divórcio, Sam.
— Eu não acredito em uma palavra se quer que venha de você,
Noah.
Isso parece feri-lo, mas imagino que seja apenas encenação, acho
que até a viúva negra é mais sincera comigo que ele.
— Por favor, pense com cautela...
— Não há o que pensar Noah.
A lancha para e eu saio dela, subo no tablado do chalé e não olho
pra trás, entro no quarto que deveria ser o lugar onde eu passaria os dias e
noites mais incríveis da minha vida e fecho a porta de dentro, observo o pôr
do sol nas Maldivas, E me permito chorar em silêncio.
— Acabou!
OUÇA-ME
Sara me avisou que meus pais desceram pra praia e exigiu que eu
fosse também.
Sinto-me péssima, mas sei que ficar trancada no quarto não vai
convencer os meus pais de que Noah e eu estamos bem, de que tudo está
bem, ainda que eu não deva, eles não têm nada a ver com isso, eles não têm
nada a ver com os meus problemas, ou se eu fui uma otária e se o Noah foi
um merda de um mentiroso.
Procuro em minha mala o maiô que trouxe para ficar aqui, mas não
encontro, tudo o que encontro são biquínis, e mais biquínis, entradas de
banho, Beth não colocou o meu maiô!
Suspiro frustrada.
Vejo-me obrigada a colocar o biquíni, ele é pra garotas GG, ele me
serviu no dia que experimentei, e de fato ficou até bom, a calcinha é menor
e a minha barriga fica toda amostra, a parte de cima tapa tudo e tem
listrinhas, é de cor preta.
Coloco uma entrada de banho por cima e pego o protetor mais que
desanimada, queria que os meus pais estivessem em Charlotte, eu queria
estar em Charlotte, trancada em meu quarto com os meus pensamentos,
longe de tudo isso, perto da segurança que o meu lar sempre me deu, mas
infelizmente a vida não é isso, e ela não tem se resumido em me isolar de
tudo e todos, tudo isso mudou quando Noah voltou pra minha vida, ainda
que por pena.
Saio do quarto e vou para sala colocando os fonezinhos do meu
reprodutor nas orelhas, ela me avisou muito gentilmente que toda a família
me esperaria na praia, aumento o volume no máximo, porque a quietude das
Maldivas nunca foi tão irritante, sempre achei que fazer as coisas na minha
vida resumia-se em fazer o que era o certo, mas pela primeira vez desde que
eu decidi fazer isso, fazer o certo está sendo demais pra mim.
Dentro de mim uma revolta gritante cresce.
Eu nunca odiei tanto ter que viver uma situação na minha vida toda.
O mais inacreditável de tudo isso é saber que eu caí direitinho na
mentira dele, na lábia, e que me entreguei a ele de uma forma na qual nunca
me entreguei a ninguém, dei meu coração numa bandeja para Noah
Baltimore, em troca, ganhei mentiras, pena, omissões. Quando me recordo
do nosso casamento é ainda pior, meus votos foram os mais sinceros e
puros, enquanto os de Noah... foram tudo uma invenção, entreguei a ele
meu corpo, minha confiança, enquanto Noah teve um caso com a melhor
amiga da minha mãe...
Aproximo-me da praia e vejo meus pais em espreguiçadeiras, Sara
sempre ao lado de mamãe, — como se gostasse dela de verdade — a viúva
negra enxuta usando um biquíni vermelho pequeno, — já deu para perceber
que a cor predileta da Sara é vermelho — e os cabelos presos num coque
super descolado, Arthur King, branco feito à neve, com óculos escuros no
rosto ao lado dela, e a direita, sentada na areia, vejo uma garota de uns doze
anos de idade de cabelos loiros e compridos, ela usa um maiô cor de rosa e
é meio rechonchuda, construindo um castelo de areia com ela, está Noah, de
calção, desvio o olhar quando ele ergue a cabeça pra mim e vou me juntar
aos meus pais.
— Jas! — papai usa um calção e também está branco que nem uma
vela — Estávamos te esperando.
— Bom. — falo e me sento na areia olhando para o mar lindo
diante dos meus olhos, mas nada em mim muda.
— Oi! — A menina loira fica diante de mim com um sorriso aberto
com aparelho cor de rosa — sou Sabrine Monique King, você deve ser a
minha cunhada!
Cunhada não, ex cunhada!
— Oi Sabrine, muito prazer! — Falo, porque sei que nem a garota,
nem ninguém, tem a ver com isso, sorrio.
— Seja bem vinda à família! — Sabrine fala. Ela é uma cópia exata
de Arthur, tem sardas e os lábios pequenos, olhos puxados — Você quer vir
brincar comigo e com o Noah?
— Deixa ela Sabrine, — Sara fala e bebe um pouco de seu coquetel
— a Sam é anti-social!
Lanço um olhar reprovador pra Sara, ela pisca pra mim, a viúva
negra faz com que todos acabem rindo, inclusive meus pais, me ergo com
cara feia e tiro a entrada de banho, ela me olha de cima abaixo como se
estivesse bem surpresa.
— Estou bem? — Pergunto para os meus pais, mas não me importo
muito com o fato de que sou gorda, eu sou mesmo, o que posso fazer sobre
isso? Adianta ficar chorando?
— Uau! — Arthur King fala boquiaberto, e Sara lhe da um olhar
mortal — Quer dizer, está bom!
— Está linda Sam! — mamãe elogia sincera.
— Vou nadar, vem Sabrine.
Resisto em provocar Sara, porque hoje eu não estou num bom dia e
se eu quiser mostrar pra todos que estou bem, tenho que me manter o mais
fria possível, Sabrine segura minha mão e vamos juntas pra água.
— Noah querido, acompanhe sua esposa, — Sara berra e meus
ombros sobem — ela pode se perder!
Vaca!
Noah aparece do nada do meu lado e passa o braço em volta da
minha cintura, me puxando para perto dele, finjo que não me importo, eu
sei ser a rainha da ignorância também.
— Você ficou linda com este biquíni, Bolinhos!
Bolinhos é o cara...
— Obrigada Noah.
Sabrine corre na frente e entra na praia, ela sorri de ponta a ponta
enquanto mergulha, as águas são lúcidas e calmas. Quero me soltar de
Noah, me afastar dele, mas sei que isso seria invasivo demais, meus pais
perceberiam.
— Samantha eu amo você, por favor, reconsidere, — Noah fala
baixo, num tom muito baixo — pense com cuidado, vamos conversar.
— Deveria ter pensado antes de ter feito tudo o que fez. Eu não
tenho nada a conversar com você. — Respondo concreta, mas dentro de
mim tudo dói.
— Eu te amo...
— Para de mentir Noah, poxa, você não cansa? — Meu sorriso é
cheio de dor, estamos parados de frente para o mar, Sabrine um pouco
afastada, mergulhando tão feliz, alheia a dor que sinto no peito — Chega de
mentiras!
— Eu não minto sobre isso, eu não menti sobre nada!
— Não? — Me assusto com a ousadia dele em continuar a tentar
manter as mentiras, eu o fito — Qual é o seu problema? Você é tão mau
caráter assim? Tão sem coração? Você é um monstro Noah, você brincou
com os meus sentimentos.
Ele fica calado, me olha, os olhos azuis começam a se encher de
lágrimas, mas não consigo me comover.
— Para me ajudar não precisava disso, bastava que voltasse a ser
meu amigo, eu recusaria o dinheiro do tratamento da minha mãe com
certeza, mas você fez tudo errado do começo ao fim. Não esperava que se
aproximasse de mim por pena, apenas por consideração a uma amizade
antiga, para se desculpar por ter ido embora. — Falo tudo o que está
entalado também. Ele quer, ele vai ter — Eu acreditei em você, eu me
entreguei a você, e você mentiu pra mim, isso é muito pior do que ter ido
embora.
— Sam eu não queria isso...
— Iria continuar a manter a farsa? Iria me deixar ter amizade com
Donatela? Ou você iria esperar a minha mãe morrer para ir embora?
— Não Sam, que droga! — Noah fala amargurado — Não fiz por
mal, eu realmente queria ajudar no começo, mas depois percebi que te amo.
— Pois eu não acredito num amor falso, num amor por pena.
— Não é pena Sam, você é tudo o que eu quero.
— Você só quer me ver bem, mas não se preocupe porque logo,
logo eu estarei bem. Longe de você, que só sabe fazer mal as pessoas.
— Sam, não! — Ele começa a chorar.
— Você é um ator perfeito, Noah! Deveria fazer novela.
— Eu amo você Sam, eu não quero me separar, me deixa explicar
como tudo aconteceu, por favor, — Noah pede desesperado — por favor,
Sam, me perdoa...
— Não! — respondo secamente, e escondo a dor no coração em vê-
lo assim, não devo e não vou me sentir assim em relação a ele, ele não
merece.
— Eu te amo Sam! — Noah fala choroso — Me perdoa, por favor,
você é tudo o que eu quero... eu imploro, Sam.
Assim do nada, Noah se ajoelha ao meu lado e segura a minha mão,
fico dura, chocada com a reação dele, ele chora feito uma criança
desconsolada, olho para Sabrine que está com os olhos arregalados para nós
dois, e depois olho para os nossos pais sentados nas espreguiçadeiras, Sara
parece querer matar o Noah, enquanto Arthur ri a beça e os meus pais estão
sorrindo. Acho que imaginam que Noah se declara pra mim ou coisa assim.
— Por favor, Sam, me perdoa. Me da uma chance para eu poder me
explicar.
— Eu não... — Tento soltar a mão dele, mas Noah a segura com
firmeza, não para de chorar — Noah levanta, e para com isso.
— Vai me deixar falar?
— Eu já disse que não!
— Samantha por Deus, por tudo, me deixa falar! Só me ouve,
depois eu deixo você fazer o que quiser.
Eu o fito, e faço uma promessa secreta a mim mesma depois disso.
— Tudo bem Noah, vamos voltar para o chalé e resolver isso agora.
— Está bem.
Noah se ergue e depois limpa a face, ele ordena que Sabrine vá ficar
com seus pais e segura a minha mão. — É hora de lavar a roupa suja!
HORA DE SER FORTE
Entramos no nosso quarto.
Suspiro. Noah fecha a porta e me aproximo da porta que tem vista
para o mar.
— Quando eu voltei, eu realmente estava noivo de Dyanna, estava
determinado a me casar com ela, mas não sabia como me sentiria quando
visse você, logo depois da festa de noivado eu tinha certeza que não havia
motivos para que eu me casasse com ela, porque estava muito atraído por
você, Sam!
Não acredito, mas fico calada, Noah está atrás de mim, um pouco
distante, acho que ele entende que não precisamos fingir longe dos meus
pais, que não quero ser tocada por ele.
— Tinha esse novo sentimento que explodia dentro de mim sabe, eu
alimentei ele boa parte da minha vida por você, mas não era isso, não era
como se fosse minha amiga de infância, eu a desejava como mulher, eu
ainda a desejo como mulher.
— Acho que você precisa de óculos.
— Você não tem ideia do que causa em mim, Samantha.
Realmente, tanta pena que o homem consegue transar comigo
apenas para que eu me sinta melhor...
— Rompi com Dyanna, voltei para Charlotte, contudo, Donatela
estava lá, mas simplesmente o que tivemos no passado ficou para trás, ela e
eu não temos mais nada, nos envolvemos quando ela trabalhava em Nova
York há alguns anos.
— Quantos anos?
— Seis anos.
Sinto-me frustrada por imaginar que ele dormiu com a amiga da
minha mãe, enojada na verdade.
— Tudo ficou para trás Sam, eu estava determinado a ficar com
você, mas então eu soube da doença da sua mãe, mamãe me disse que é
irreversível, fiquei preocupado, eu sabia que você precisaria de muito apoio,
também tinha esse seu ex, Tyller, que ficava nos rondando, então decidi
casar com você.
Ele fez tudo de caso pensado.
— Sua mãe me pediu que não contasse, assim como seu pai, essa
foi à única coisa que eu não me arrependo de ter te contado.
— Se casou comigo por pena!
— Isso é o que a minha mãe fala, mas não foi por pena Sam, me
casei porque te amo, porque desejo ficar com você.
— Por pena!
— Não, Sam! Estou te falando...
— Se fosse amor você não teria omitido.
— Se não fosse amor, eu não repetira tantas vezes o quanto te amo,
o quanto é importante pra mim, que você é o meu tudo.
Quero chorar.
Noah chora livremente.
— Não poderia falar sobre Donatela, pois ela é amiga da sua mãe,
parecia injusto e eu só fiquei sabendo naquele dia em que a obriguei a me
levar ao seu endereço, até então, não fazíamos ideia de que sua mãe e ela
eram amigas de adolescência.
— Ainda assim, continuou a permitir que ela fosse minha amiga?
— Donatela e eu não sabíamos Sam, o que eu poderia fazer? Falar
pra ela se afastar da sua mãe? Que direito eu tinha?
— É mentira, continuam juntos...
— Não é mentira, eu não a via há anos, ela veio transferida de Nova
Jersey, eu mal sabia que ela estava aqui Sam.
— Não importa o tamanho da mentira Noah, você mentiu pra mim.
— Não menti sobre quem eu era, nem sobre o que eu sentia, eu
estou sendo muito sincero desde que voltei, apenas não disse por que sabia
que não iria me aceitar, uma vez que ela é amiga da sua mãe e
frequentemente nos veríamos na casa de seus pais e na empresa.
— Imagino que tenha sido muito divertido rir as minhas custas...
— Do que você está falando Sam? Porra! Eu nunca faria isso, eu
me importo com você.
— NÃO QUERIA QUE SE IMPORTASSE DROGA! — meu grito
é cheio de dor — Não queria sua pena, eu só queria me sentir amada como
eu sou, por quem eu sou!
— Eu te amo por quem você é e do seu jeito, Sam!
— Que amor é esse que omite as coisas? Que esconde as coisas?
Que amor é esse que se permite apenas um "gostar", me responde!
— É O MEU AMOR! — Noah esbraveja choroso — O meu amor é
sincero, e todo o resto fora à história da sua mãe está no meu passado.
— Odeio você!
— Sabe que isso não é verdade. Eu estou falando a verdade pra
você, estou pedindo que você entenda que eu não poderia falar.
— Seria melhor que mentir.
— Perderia você Sam. E eu não estou disposto a te perder nunca
mais!
— Você já me perdeu.
— Não! — Noah fala magoado — Você não vai se separar de mim.
— Eu tenho o direito de fazer o que eu quiser Noah.
— Então faça com cautela, pense com cuidado, eu não sou esse
monstro que você pensa, eu me casei com você porque eu amo você e quero
uma família ao seu lado, não foi por pena Sam, se fosse, eu não me
prestaria a este papel. Casamento é algo muito sério.
— Eu ouvi sua mãe falando.
— Você também viu as brigas que eu tive com a minha mãe por sua
causa, o quanto eu estou me dedicando pra que tudo dê certo.
— Mentiu sobre a King.
Tento arrumar argumentos suficientes para afastá-lo de mim, mas
Noah encontra resposta pra tudo, o pior é que ele é convincente demais.
— Sobre isso sim, mas é porque alguns dias depois da briga entre
mamãe e eu, meu pai me procurou e conversou comigo, ele precisa de mim
na empresa. Eu iria te falar logo que voltássemos.
— Eu não quero viver com alguém que mente pra mim Noah, você
iria gostar se fosse com você?
— Não, mas não foi uma opção, eu também tenho sentimentos
fortes por você Sam, e fiz tudo motivado pelo o que sinto, ainda que não me
perdoe, gostaria que pensasse com mais calma. — Fico calada.
— Eu não sou perfeito Sam, eu cometi um erro, peço perdão por
ele.
— Por que está comigo?
— Porque eu tenho sentimentos por você!
— Sentimentos de pena?
— Amor!
Estamos parados um de frente para o outro, Noah chorando e eu
também, o peso que sinto nos ombros parece que é arrancado, mas não sei
se estou pronta para perdoar.
— Eu vou pensar Noah, mas se ficarmos juntos, não será mais a
mesma coisa.
Ele fica calado, eu sei que o feri com a hipótese de não ter mais
sentimentos, mas eu ao contrário dele não vou mentir, não seria justo acima
de tudo comigo mesma.
— Melhor voltarmos!
Ele faz que sim com a cabeça, seca a face e sai do quarto em
silêncio, respiro fundo e meu coração fica pulando no peito, seco as
lágrimas, elas não me adiantaram de nada.
— Chega de lágrimas Sam, hora de ser forte. Chegou a hora de
recomeçar, Sam!
TEM O PERDÃO, MAS NÃO TEM O
AMOR.
Abro os olhos.
Ontem foi um longo dia, um dia exaustivo eu diria.
Ficamos na praia por toda a manhã e almoçamos por lá também,
Sara conhece os donos do hotel, e fomos muito bem tratados, a todo o
momento Noah me rondava, ele ficou mais na dele, mas ficou sempre por
perto, algumas vezes apenas me deu beijos na cabeça e arrumou alguma
desculpa para ir diversas vezes ao chalé.
Sara conversou com meus pais, assim como Arthur, e confesso que
ambos estão sendo muito gentis com a minha família, fiquei com Sabrine na
praia, fizemos castelos de areia e me esforcei para parecer ali, conectada a
uma nova realidade, mas sempre as palavras de Noah me vinham à mente,
tantas coisas, tanto as lembranças das declarações de Sara quanto às de
Noah, mas não me confundia, tinha fixo dentro de mim que eu não poderia
perdoá-lo assim tão facilmente, ainda que tenha repetidas vezes me falado
que me ama, que tenha se ajoelhado, que tenha implorado que eu o perdoe,
eu não estou pronta pra isso.
Não me decidi simplesmente porque minha cabeça está cheia, estou
cansada de tudo isso, algumas vezes me deu vontade de chamar meus pais e
falar a verdade, outras vezes eu tinha completa e absoluta certeza de que se
eu o fizesse os magoaria profundamente, tenho medo da reação de mamãe.
Principalmente disso.
Saber que ela tem um câncer terminal me destrói também, me
indaguei quantos dias eu terei com mamãe aqui na terra, e ontem à tarde,
quando me despedi dela eu prometi pra mim mesma que irei aproveitar até
o último segundo ao seu lado, com ou sem Noah.
Já era difícil lidar com o câncer, agora a doença é mais presente que
tudo em nossas vidas, ela levará mamãe pra longe de mim para sempre.
Parei muito pra pensar sobre isso, ao menos sobre essa parte, e me
coloquei um pouco no lugar do Noah, eu não sei como reagiria se eu
soubesse... se realmente teria contado pra ele se a situação fosse invertida,
ainda que odeie Sara não desejo sua morte, e eu acho que na pior das
hipóteses, eu não conseguiria dizer logo de cara para Noah que sua mãe
morreria em breve.
Como eu daria essa notícia? Quais palavras eu usaria? Eu me
sentiria péssima de falar sobre morte, tão pouco de dar uma notícia assim
pra o meu próprio marido. Sara também disse que os meus pais pediram
para não me falar que eles sabiam, mamãe sabia, então tecnicamente, o
Noah só seguiu o que os meus pais lhe pediram, ainda que tenha que
admitir que ele na melhor das hipóteses, deveria ter falado, eu não sei se ele
estaria pronto pra falar, se fosse eu com certeza não estaria pronta.
Noah está dormindo na sala. Quando chegamos, me tranquei no
quarto e ele só veio pegar o travesseiro e um lençol, não tenho pena, não
quero ele dormindo na mesma cama que eu, eu não quero ele perto demais,
ainda estou bem fragilizada.
Não serei boba dessa vez, não me deixarei levar por palavras
bonitas, não me iludirei com Noah Baltimore.
Fecho os olhos.
Sinto cheiro de café invadindo minhas narinas logo em seguida,
tomei algumas decisões, farei algumas exigências, eu não sei bem ao certo
se tudo o que farei é a melhor coisa para mim, mas com certeza é muito
melhor do que sofrer de amor por quem não merece.
Eu me recuso a continuar a sofrer, não quanto a Noah, preciso
providenciar que mamãe fique bem, ela será o meu foco de hoje em diante.
— Sam eu posso entrar? Fiz nosso café!
— Sim.
Acredito que ficar evitando ele não leve a nada; quero distância,
mas isso seria muito inútil. Para ficar longe de Noah eu teria que estar fora
desta ilha em um lugar seguro e bem longe, mas ainda assim, sentiria que
ele estaria ao meu lado, o sentimento é presente, as lembranças dos dias
perfeitos nos quais ficamos juntos.
Estava muito bom pra ser verdade.
Sento-me na cama, Noah entra carregando uma bandeja linda de
café da manhã, mas não tenho ânimo, sinto como se uma parte de tudo o
que vivi com ele fosse a melhor coisa que me aconteceu na vida, — é —
mas, uma outra me foi arrancada com todos os sonhos que construí com o
nosso casamento, com o que eu sinto por ele, eu sei que nunca mais será a
mesma coisa. Mas a última coisa que eu não vou fazer neste momento, é
ficar lamentando as consequências das más escolhas dele, dos erros dele,
isso me atinge tanto que parece que não vai sarar, não vai ter fim, mas eu
não vou fazer isso comigo mesma.
Nada de pena, é justamente por isso que eu e o Noah estamos
assim, pelo sentimento de pena que seus pais alegam que ele sente, precisei
pensar muito nisso, porque quando ouvi a conversa, em nenhum momento
se quer, eu ouvi isso da boca dele, eu não posso falar coisas que o Noah não
é, o que ele não fez, quem vivia falando que ele tem pena de mim desde o
começo é a Sara, e foi justamente dela que ouvi isso.
Não vou permitir que isso me destrua.
Já me decidi quanto a este relacionamento, agora é prosseguir e
tentar conviver com a minha escolha.
Ele se senta diante de mim, eu sei que ele não anda dormindo, o
termo "dormir na sala" é apenas figurativo, Noah está péssimo, tanto quanto
eu, eu sei que ele não se prestaria ao papel de se casar comigo apenas por
pena, deve ter sentimentos por mim, mas ele precisa saber quais
sentimentos, ele tem que se dar conta, e só vai saber a partir de hoje.
— Eu pensei bastante, — digo olhando-o, e ele fica em silêncio, usa
apenas a calça do pijama, e é incrível como para mim, neste momento, toda
sua beleza perdeu um tanto bom de brilho — acho que seria um duro golpe
para minha mãe se me divorciasse de você agora, nosso relacionamento deu
um "up" nela.
Noah me estende uma caneca de café, suspiro, e me preparo para
ouvir a absoluta verdade sobre mamãe agora.
— Quanto... quanto tempo ela tem?
— Os médicos disseram que um ano no máximo!
Noah parece sofrer com isso, ele sofre, não acho que finja gostar
dos meus pais, não seria ele, boa parte de quem é ainda tem a essência do
garoto que representou pra mim na infância, mas eu não quero mais isso,
preciso estar forte agora mais do que nunca, um ano é muito pouco,
absolutamente pouco pra mim, meu coração dói só de pensar que em um
ano mamãe não estará comigo.
— Quero tornar esse tempo com ela o melhor possível, — confesso
sincera — mas, eu também quero começar a ter uma nova vida, e por isso
eu decidi que quando ela partir, iremos assinar o divórcio.
— Sam...
— Esta é a minha decisão, e eu não irei voltar atrás. — Sou
absolutamente sincera, Noah se cala, tem tanta dor em seus olhos... mas
não, não assim — Quero começar a fazer faculdade, trabalhar na King, e
nas horas vagas, cuidar dela e ficar com ela, porque eu sei que ela não irá
aceitar que me falem.
— Ela é orgulhosa como você!
— O divórcio é justo e é o certo Noah. Ninguém casa com ninguém
por pena, estou conversando com você em consideração a nossa amizade,
porque se fosse outra, teria ido embora e nem te daria a chance de falar.
— Por que é o certo?
— Nunca mais seria a mesma coisa!
— Por que não? Você sempre ficaria magoada quando soubesse de
alguma ex minha? Ou é porque você está com o ego ferido pelo o que a
minha mãe falou? Acha que me prestaria ao papel de me casar com você,
por pena?
— Me responda você Noah, por que escolheu não falar a verdade?
Por que você não disse que me amava quando sua mãe falou que sentia
pena de mim e por isso se casou? E quando seu pai insinuou sobre
Donatela? Por quê?
— Estava muito irritado por ela ter vindo, você acha que eu não
tenho coração?
— Acho que é justamente pelo fato de querer muito me ajudar, que
você fez isso.
— Eu amo você Samantha, eu fiz o que achava certo pra você,
independentemente do meu passado, da King, da sua mãe, acima de tudo
está o seu amor.
— Iria se casar com Dyanna por aparência, o que impediria que se
casasse comigo por pena?
— Eu gostava dela, mas não a amava.
— Mas disse que gosta de mim e que me ama.
Noah coça a face, absolutamente calmo, mas vejo que ele está
muito mais infeliz do que tenta aparentar, suas mãos tremem.
— Existem várias formas de eu dizer eu te amo; eu te falei isso à
vida toda, e você nunca reparou Sam.
— É mesmo? E quando foi?
— Quando nós íamos à Barbie o que eu sempre te dizia quando
íamos dormir?
Abaixo a cabeça e me recordo da palavra, e isso me machuca.
— Que eu era muito especial.
— Essa era a minha forma de dizer "eu te amo", Sam.
— Não queria que me amasse apenas como amiga, Noah, talvez
estejamos equivocados.
— Eu não estou equivocado, você só apareceu na hora que a minha
mãe começou a tentar manipular a situação.
— Ela até me defendeu.
— Antes disso... — ele começa a falar e depois desiste — Ttudo
bem, a questão não é essa.
— Realmente.
Bebo um pouco de café.
Noah me olha muito sério, muito concentrado.
— Como eu dizia, quero trabalhar e estudar, e também quero que
meus pais morem comigo.
— E nós?
— Não será um casamento de verdade, Noah.
— Você não vai me perdoar?
— Perdoo, mas não me submeto mais a isso.
— Isso é injusto!
— Você não se colocou no meu lugar, toda escolha tem
consequências.
— Eu quero uma chance Sam.
— Você desperdiçou a sua chance quando omitiu a verdade de mim.
— Você nunca falha com as pessoas não é mesmo? Você é perfeita!
Ele está tão magoado, mas eu também estou muito ferida.
— Não levo em consideração quanto aos seus pais, pois, foi algo
que sua mãe pessoalmente me pediu: para que eu não te falasse. Então, eu
não falei, portanto, não menti sobre isso. Sobre a King, eu iria falar logo
após a lua de mel, mas acima de tudo é o meu trabalho, não justificando, e
sobre a Donatela...
— Não levo em consideração quanto aos seus pais, pois, foi algo
que sua mãe pessoalmente me pediu: para que eu não te falasse. Então, eu
não falei, portanto, não menti sobre isso. Sobre a King, eu iria falar logo
após a lua de mel, mas acima de tudo é o meu trabalho não justificando, e
sobre a Donatela...
— Aquela vadia! — Reclamo, e Noah me fita chateado — Por que
está irritado? Não foi bom ter tido um casinho com ela?
— Ela é alguém que está no meu passado, mas que faz parte do
presente da sua mãe, se eu falasse sobre ela, você com certeza entenderia
mal.
— Eu não sou assim.
— Acabei de falar o nome dela e você a chamou de vadia.
— Porque ela é uma vadia!
— O que importa é que isso foi há muito tempo, e eu não poderia
mudar o fato de que ela era amiga de sua mãe. Não havia o que falar,
porque ela e eu não temos nada, NA-DA, NADA!
Não sei como reagiria se ele houvesse dito isso antes, mas eu não
vou aceitar isso.
— Também, tem idade pra ser sua mãe não é mesmo?
— Samantha, eu amo você, VOCÊ!
— Teve a oportunidade e jogou fora.
— Eu quero uma chance!
— Eu não vou te dar chances.
— Eu mereço uma chance! Todos erram, ou você nunca omitiu
nada de ninguém?
Omiti sobre o Ty, e eu menti sobre namorarmos, também não disse
sobre Dyanna. Mas que diferença faz se eu falar?
Não importa o tamanho da mentira, não deixa de ser uma mentira,
não sobre o Ty estar com a Dyanna, mas sobre o Ty ter sido meu namorado,
ele nunca foi algo além de um grande amigo... então sim, eu menti pro
Noah, pra manter meu ego menos ferido diante dele e sua nova noiva, pra
não parecer que estava por baixo, mas eu menti.
— Eu não vou viver uma mentira Noah, eu não quero sua pena...
— Para de repetir isso Sam, parece que está tentando encontrar
pretexto pra me afastar, eu sei que me ama da mesma forma que te amo!
— Grande amor não é mesmo? — Pergunto, mas não lhe dou o
tempo de responder — Pois bem, que prove que me ama, não em nome de
nossa amizade, mas em nome do amor que diz sentir, eu quero ser sua
assistente e quero que mande a Donatela para outra filial. Eu vou fazer
faculdade em meio período, e nos dias que mamãe precisar mais de mim a
minha atenção será absolutamente dela, não espere por uma esposa
dedicada e carinhosa Noah, tudo o que você terá dentro da sua casa é uma
estranha, alguém que você terá acabado de conhecer, alguém que terá que
conquistar, alguém que você terá que convencer do seu amor.
— Eu entendo...
— Se no final, após a doença de mamãe vencê-la, e você tiver
provado que suas intenções e seu amor é verdadeiro, eu posso pensar em
ficar com você.
— Pensar?
— É, porque eu não sou obrigada a ficar com alguém sem amor.
— Sam... você está insinuando que não me ama mais? — Os lábios
dele tremem — Sammm...
— Agora já pode sair. — indico a porta e bebo um pouco do meu
café — Pode ir descendo, daqui a pouco eu vou pra praia.
— Mas... mas...
— SAIA, NOAH! — ordeno com mais firmeza. — Se quiser que eu
fique com você, vai ser assim, ou do contrário, assino o divórcio logo que
chegarmos em Charlotte, você não entendeu?
Ele faz que sim, depois levanta e sai do quarto em silêncio. Quando
ele fecha a porta, suspiro, olho desanimada pra torrada com creme de ricota,
respiro fundo e de novo.
— Eu não derramo mais uma lágrima por ele... isso é que não!
DESCONFIANÇA
— Você tá brava com o meu irmão?
Acho que até a Sabrine já percebeu que eu e o Noah não estamos
bem.
Mas acredito que seja porque eu fico mais com ela do que com
qualquer outra pessoa daqui, não suporto olhar na cara da Sara e ver que
ela, assim como Arthur, fingem que nada aconteceu, mas acredito que isso
seja porque eles não querem que os meus pais tenham uma má impressão de
como está sendo essa "lua de mel" em família.
Mantenho-me próxima do Noah apenas o necessário, mas depois da
conversa de ontem, acho que ele já percebeu que as coisas entre nós dois
não serão tão fáceis.
Sinto que toda essa reviravolta em nosso relacionamento nos
desgastou profundamente num período curto de dias, não durmo direito,
nem ele dorme direito, também o vejo mexendo no prato, mas comer, ele
não come, fica a espreita me olhando sempre, acho que ele percebe agora as
reais consequências dos erros dele.
Por mais que eu tente me convencer de que minha decisão foi a
melhor, sinto realmente que talvez tenha me precipitado, mas não quero
voltar atrás e eu não vou voltar atrás.
— Não, nós dois só discutimos outro dia.
— Entendo, minha mãe briga com o meu pai, mas daí ele paga o
salão dela e ela fica bem.
Sabrine e eu estamos em boias fornecidas pelo hotel, ambas
bebemos água de coco, estamos aqui perto do meu chalé, Noah está lá
dentro, Sara e mamãe estão na piscina submersa e acho que Arthur King e
papai foram pedir o almoço. Para eles tudo está normal, mamãe sabe que eu
sou bem na minha quanto ao meu namoro com o Noah, nós não somos de
demonstrar afeto na frente dos meus pais, então, acho que não perceberam
ainda o climinha entre nós dois. A normalidade a qual Sara encara minha
briga com o Noah é estranha, porque de uns dias para cá, eu percebo que ela
está muito calminha, pensei que quando soubesse do nosso casamento faria
um inferno, talvez que tentasse persuadir o Noah, mas... o que esperar da
cobra? De certa forma ela conseguiu certo?
— Você odeia a mamãe né?
Não... Imagina!
— Não.
— Esse seu “não”, não me convence. Eu não sou bobinha, Sam.
Quero rir da audácia dessa garota.
Sabrine me lembra bastante eu quando criança, rechonchuda,
sardenta, mas ela é linda, tem traços clássicos e cabelos loiros como fios de
ouro, ela usa um maiô cor de rosa e óculos da mesma cor, não tem nem
peito ainda, mas já parece ser muito vaidosa, ela fica falando sobre o EXO,
bandas coreanas, moda, e o "seu marido" JB.
— Mamãe não gosta de você porque você quer roubar o Noah da
gente. A Dy até tinha concordado em morar lá em casa!
De boba ela não tem nada, me sinto curiosa sobre isso.
— Mesmo? — questiono como quem não quisesse nada — Noah
moraria com vocês?
— É — Sabrine fala fazendo pouco caso — Você sabe que ele tem
que cuidar dos negócios do meu pai né? Somos ricos!
— Então — pigarreio — não é porque eu sou gorda?
— Acho que é porque a minha mãe é obcecada pelo Noah sabe, ela
trata ele como se fosse um bebê — Sabrine responde fazendo careta —
acho também que é porque você lembra a Cora. Mamãe viu que o Noah
sofreu muito por conta daquela vadia mentirosa, aproveitadora de uma figa.
— Que boca suja! — reclamo e Sabrine tapa a boca com uma mão,
ela me faz sorrir — Cora fez o Noah sofrer?
— Sim, o meu pai diz que o Noah é um coração de açúcar.
Coração de açúcar que machuca os outros.
— Sabe... O meu irmão gosta mesmo de você, Sam.
— Claro, somos amigos de infância.
— Acho que ele é louco por você. Ele parece triste, sei lá, o Noah
não é assim, ele é um cara que gosta de agradar a todos em volta dele, ele
parecia tão feliz quando chegamos, depois da conversa com os meus pais,
ele tá assim. Será que a mamãe brigou com ele pra valer?
— Não sei Sabrine, — peguei só a metade da conversa— eles
estavam conversando.
— Não, não estavam. — Sabrine olha em direção da mãe e puxa a
minha boia — Eu estava aqui fora, nós viemos sem avisar. Acho que
mamãe queria fazer uma surpresa.
— Sei. — falo sem jeito.
— Aí eu fiquei na lancha, porque o cara estava tirando as malas, aí
ele me colocou no tablado e fiquei de fora, o Noah disse pra eles irem
embora, mas mamãe disse que não iríamos embora sem ele.
Nossa.
— Mamãe falou que Noah deveria vir conosco porque era o certo, e
falou algo sobre vocês e Noah ficou mais zangado, ele disse que gostava de
você.
Essa parte eu peguei.
— Depois ele disse que te...
— Sabrine querida, venha passar protetor! — Sara está berrando.
Sabrine para de falar na hora, droga, a irmã do Noah sai da boia e
vai andando até a escadinha, logo vejo Noah descendo a escadinha, ele vem
nadando em minha direção, eu o observo se aproximar em silêncio, depois
ele se inclina e coloca os braços na ponta da boia me olhando de cima
baixo.
— Oi!
— Oi Noah.
— Sabrine te encheu muito a paciência?
— Ela percebeu que não estamos bem, se preocupa com você.
— Você também não está comendo direito, Sam. Tem que se
alimentar.
Noah se inclina e me beija a face, ele estende a mão e toca minha
bochecha, seu toque me causa arrepios, ainda que não deseje me sentir
assim, não consigo pensar em nenhuma desculpa pra que as sensações
saiam do meu corpo, não posso e não vou me entregar pro Noah novamente
assim, não faz sentido que eu o faça depois de tudo o que ele fez.
— Tudo parece muito confuso Sam, eu sei que falhei, mas gostaria
que reconsiderasse.
— Acho que já sabe a minha resposta.
— Disse que preciso reconquistá-la, sua confiança, pra isso precisa
me permitir não é verdade?
Concordo, é o justo.
— Sim.
— Então não acho que seja grande coisa que me deixe demonstrar o
quanto amo você, quero que aceite vir comigo para um jantar a dois hoje à
noite, pode ser?
— Sim, claro.
Suspiro enquanto eu o vejo nadando pra longe, só espero estar
fazendo a coisa certa.
Reações
Sam não confia em mim... No entanto, eu a amo tanto.
Tive cuidado em quanto pude para preservar tudo o que havia
acontecido, mas não posso mudar as consequências de tudo o que fiz, a
forma como aconteceu, nada foi planejado, nada foi arquitetado, nada foi
por pena, ela precisa entender, precisa enfiar isso na cabeça dela.
Como me casaria com alguém por pena?
Por mais que eu tenha muitas vezes me questionado sobre a rapidez
do nosso envolvimento, por achar realmente que estava me apressando, eu
nunca pensei que o que eu sentia era pena, eu sei o que eu sinto, eu não sou
um sem noção, amo Samantha, eu só preciso que ela entenda.
Estou irritado com os meus pais, furioso com a minha mãe e
magoado com a situação, mas sei que a minha esposa tem motivos de sobra
pra reagir daquela forma.
Meus pais foram absolutamente odiosos quando falaram aquilo,
estava tão nervoso que não percebi a real intenção da minha mãe em ter
vindo, ela não foi ao meu casamento de pirraça, e agora, meus pais estão
fazendo isso para testar a Sam, para fazer com que ela desista do
casamento, eu se quer sabia que eles estavam aqui, e não faço a mínima
ideia de quem disse pra eles que eu estaria aqui.
Suspiro.
Tenho estado tão nervoso com tudo, e mal tenho apetite, não
consigo pensar direito em nada além do meu casamento, tudo está em risco,
e eu não quero perder a Sam por conta disso.
Donatela é alguém que estava em uma gaveta em minha vida, algo
que eu não fazia ideia de que ressurgiria assim, ainda mais como amiga da
minha sogra. Não pude contar do avanço do câncer a pedido dos meus
sogros, eu já sabia que a Sam ficaria destruída quando soubesse, eles
queriam contar quando estivesse mais perto, contudo, graças ao meu pai,
Sam soube da pior forma, estou sem falar com ele desde então por conta
disso.
Reencontrar Sam foi a melhor coisa que me aconteceu na vida, mas
com ela vieram tantos pequenos problemas, a doença da mãe dela acredito
que seja o pior, eu consegui falar com um amigo médico, que trabalha com
células tronco, quero submeter a mãe dela à um novo tratamento, mas só se
ela aceitar, o médico disse que é terminal, mas... eu quero que Lily viva um
pouco mais, quero que a Sam e eu tenhamos um pouco mais de tempo com
ela.
Pensar na hipótese de que Sam não me ama me abala de todas as
piores formas, simplesmente não compreendo como pode deixar de amar
depois de dias, prefiro acreditar que não, nos amamos e ela é tudo o que
mais quero.
Acho que tudo só aconteceu na hora errada.
Organizo a mesa e ascendo às velas, todos se foram, agora estamos
apenas eu e ela, quero que a Sam me perdoe, principalmente pelo fato de
não ter dito, eu não imaginei que as coisas tomariam essa proporção, mas já
está feito.
A nossa lua de mel deveria ser maravilhosa, apenas nós dois aqui,
eu e Sam aproveitando cada dia nas Maldivas, em nosso canto, longe de
tudo e de todos, mas ao invés disso o que temos é mais e mais distância,
contudo, estou a disposição de recomeçar, de tentar provar para Sam que ela
está equivocada, porque simplesmente a amo mais do que qualquer coisa na
vida.
— Noah?
Ergo o olhar e a fito em silêncio.
Ela usa um vestido estampado mais curto, os cabelos estão soltos e
de lado e Sam se maquiou, eu jamais vi uma mulher tão linda e formosa
quanto a minha em toda a minha vida.
— Por favor!
Eu sei que se eu quiser que as coisas voltem ao normal — se
voltarem — eu terei que mudar completamente, mas não apenas isso, eu
farei de tudo pra que a Sam me perdoe, ela precisa entender como tudo
funcionou, e este é o primeiro passo pra que ela volte apenas a olhar pra
nosso relacionamento da forma como deve olhar.
ALGO VERDADEIRO E SINCERO.
Agora mais do que nunca, eu não desistirei dela.
Eu a amo!
Jantar
Quis parecer que estou bem.
Coloquei um vestido de estampas que Beth selecionou para algum
momento especial, sandálias um pouco mais altas, escovei meu cabelo e
passei uma camada fina de maquiagem, percebi que estava bem mais
abatida durante o momento em que me maquiei, o rosto mais fino, mas não
me sentia mal.
Noah puxa a cadeira pra que eu me sente, ele colocou a mesa da
sala pra dois, tem castiçais com velas, a sala está com a porta aberta, uma
brisa leve sopra no anoitecer das Maldivas, pensei muito bem em tudo, mas
não queria misturar as coisas, não sei se estou sendo sensata ou não, porém
acho que esse processo é o fundamental pra nós dois.
Teremos que ficar aqui por mais alguns dias e eu não quero manter
o clima péssimo que estávamos tendo nos primeiros dias após a minha
descoberta, não estou com clima para fingimento com meus pais hoje à
noite, não quero olhar para a cara da Sara, enfim, seremos apenas eu e
King.
Noah vai até o carrinho e o puxa com as refeições tampadas, e um
balde com o que parece ser um vinho dentro, não estou com fome, mas o
que vale é a intenção.
— Pedi camarão com lagosta, tudo bem pra você?
— Sim, claro.
Nossos olhares se encontram, Noah usa uma camisa de mangas fina
e uma calça de brim azul escura e sapatos, aqui faz calor de dia e à noite o
tempo é fresco, mas acho que esse é o primeiro jantar realmente formal que
temos desde que ele voltou. Acredito que por isso ele tenha tido tanto zelo,
em nenhuma das vezes, desde que ele reapareceu na minha vida, me
convidou pra um jantar ou apenas fomos nós dois, meus pais sempre
estavam lá, nunca parei pra pensar que nunca tivemos momentos apenas a
dois, passeios, todas essas coisas que casais fazem juntos, apenas estávamos
em casa, durante essas semanas, muito ansiosos com o casamento, antes
disso, conversando sobre assuntos voltados ao passado, a nossa infância.
Noah realmente não se abriu completamente comigo, nem eu com ele,
porque estávamos conectados a nossa amizade, ainda que sentíssemos
paixão e desejo, nossas conversas sempre acabavam na infância, em tudo,
menos em quem nos tornamos, poucas vezes falamos sobre o presente,
ainda que eu sinta que ele não tenha mudado muito, eu acho que eu não
mudei.
Esse talvez tenha sido o meu maior erro, permanecer na mesmice,
não tentar mudar quem eu fui, não quanto à personalidade, isso eu sei que
nunca mudarei, mas ao menos quanto ao meu jeito de lidar comigo mesma,
nunca me amei, nunca me senti bonita, o mais próximo disso eu senti
quando o Noah voltou, e eu fui ao Beth. Sei que isso não é bom, percebo
realmente que isso NÃO É BOM!
Ainda sinto que isso nunca acabe entre nós, a amizade é presente,
mas odeio pensar que ele se casou comigo por isso, ou por pena, mas como
ele disse que não lhe dou um crédito, eu também não havia parado pra
pensar na gravidade disso, me enchi de dor e mágoa, mas... ele seria mesmo
capaz de casar comigo por pena? Acima de tudo Noah é um grande
herdeiro, ele talvez não precisasse se submeter a isso apenas por sentir
pena, afinal de contas, nossa condição de casamento é de Parcial de bens,
então tudo o que é dele é meu, ao menos metade, alguém não seria tão tolo,
em segundo lugar, se sentisse pena, como poderia sentir atração? E nos
momentos em que ele me procurou? Noah demonstrava tanto carinho por
mim quando fazíamos amor, em alguns momentos, paixão e desejo, isso
seria por pena? A pena desperta o desejo de um homem? A atenção? Ele
seria realmente convincente? Em algum momento demonstraria sentimento
de piedade, mas não foi assim durante esse tempo.
— Vinho! — Noah fala enquanto nos serve.
— Obrigada.
Bebo um pouco de vinho, Noah coloca os pratos diante de nós dois
e duas cestinhas, uma com camarão e a outra com lagosta aberta e
temperada, salivo, porque nunca vi camarões tão grandes e vermelhos e a
lagosta parece muito bonita.
Depois que nos serve ele se senta, começo a comer a lagosta com os
talheres, logo que provo está uma delícia, muito saborosa, Noah come como
sempre me olhando bastante concentrado.
— Está bom?
— Sim!
Bebo mais vinho, a mistura é deliciosa, há dias não tenho apetite
pra nada.
— Você está linda Samantha.
— Obrigada.
Minhas bochechas queimam, seu tom é sincero, eu sei que sim, ele
estende a mão e toca a minha face com carinho, com a ponta do indicador
toca meus lábios, o gesto me causa arrepios dos pés à cabeça, novamente a
pontinha de vontade me toma toda, mas isolo.
— Sua boca é linda, Sam. É algo muito atraente em você, sempre
achei sua boca sim linda.
— É muita gentileza sua.
— É a verdade.
— Não quero falar do passado. Fale-me, Noah, o que você faz na
King?
Me sinto curiosa quanto a isso.
Noah está absolutamente surpreso com a minha pergunta.
— Eu administro o lugar.
— O senhor King se aposentou?
— Papai cansou dos dias de trabalho, Sabrine quer atenção assim
como minha mãe, atualmente, eu sou o CEO da empresa.
— Sempre tem que ter um CEO nos romances não é mesmo?
Ele sorri, algo lindo e fascinante.
— No seu não seria diferente, Sam!
— A maioria dos romances que eu leio retratam garotas magras,
lindas.
— Isso não significa que elas são mais lindas que você, Samantha.
— Eu sei disso, mas na vida real é muito complicado ser linda,
concorrendo com Dyanna's da vida.
— Se sente inferiorizada pelo seu peso?
Como se você já não soubesse.
— Sim, você se esqueceu do meu primeiro dia na King, há meses
atrás?
Fico satisfeita de não ter que ficar falando da nossa briga, dos
motivos que arruinaram nossa lua de mel.
— Eu a desliguei.
Não sabia o que o Noah havia feito com aquela linguaruda que me
chamou de gorda, fico chocada com a revelação.
— Eu não mantenho esse tipo de comportamento na empresa, é
algo que repudio. Não era a postura de uma profissional minha. Não gosto
que os meus funcionários se sintam inferiorizados nem humilhados, o que
ela fez foi errado.
— Mas eu era apenas uma faxineira!
Noah parece refletir muito sobre isso.
— Realmente, você era apenas uma faxineira, — concorda — mas,
uma faxineira da King é igual a qualquer outra funcionária, não acho que
ela iria mudar a postura dela, ela não era melhor do que você em nada.
— É muito estranho que a sociedade recrimine garotas GG não
acha?
— Concordo plenamente.
— Eles tratam a gente como se não fossemos pessoas com
sentimentos.
— Não acho que seja pra tanto.
Não sei por que, mas acho que o Noah só falou isso pra continuar o
assunto, porque ele sabe que se não falarmos sobre qualquer coisa, tudo o
que terá é o meu silêncio, bem, se ele quer falar sobre isso... este será nosso
assunto da noite, também qualquer coisa é melhor do que ficar brigando,
isso me faz mal, nos faz mal.
— Você vê grandes filmes retratando garotas GG como principais?
Elas com homens lindos e charmosos?
— Bem, não muitos, mas deve ter algum Sam.
Noah bebe um pouco de seu vinho, assim muito calmamente.
— Quando uma garota magra e também uma garota GG passam na
rua, pra quem os homens olham?
— Isso é uma questão individual.
— Vou dizer quem olha pras gordinhas, aquele cara da obra, o cara
que cuida da portaria... — quando começo a falar, Noah acha graça, mas
sou sincera — homens bonitos querem mulheres bonitas, eles preferem um
status a um relacionamento de verdade com uma mulher de verdade.
— Você está exagerando!
Fico abismada com esse pouco caso.
— Obviamente que eu quero uma mulher de verdade e um
relacionamento de verdade e a minha mulher é linda pra mim, Sam, isso é
muito relativo, é individual.
— Mas não venha me dizer que todos os homens da alta sociedade
gostam de garotas GG.
— Eu sou da alta sociedade e eu casei com uma garota GG, e daí? E
daí que eu gosto dela? E daí que eu adoro as curvas dela ou adoro o corpo
dela? O que uma garota 36 teria a me oferecer diferentemente de você, seria
o único fato de que eu a amaria por quem ela é e não por um número.
— Ela não seria um Número 50?
— Mas ela ainda não seria você, Sam. E este é o problema!
Fico sem graça, Noah estende as mãos e pega um camarão sem
fazer cerimônia.
— Mesmo assim, eu ainda penso que é muito hipócrita por parte da
sociedade, falar que o que importa é o que temos por dentro e não vender
revistas com garotas GG's na primeira página.
— Sim, Sam, eu concordo.
— Parece que fomos feitas apenas pra duas coisas: comer e ser
amigas das pessoas, ninguém se importa se estamos bem, se temos
sentimentos; ninguém questiona como nos sentimos com nossos corpos,
acham que somos preguiçosas; eu mesma já tentei muitas vezes emagrecer
através de dietas e exercícios e nunca consegui.
Pego um camarão, Noah já está no segundo. A carne é deliciosa e
saborosa.
— Tem gente que acha que eu sou gorda porque como muito, tem
dia que eu fico o dia todo sem comer, não janto, já fiz dietas nas quais bebia
apenas um copo de leite à noite e se quer pedia uma grama.
Noah fecha a cara, dou de ombros, o que posso fazer?
— Perdi as contas das vezes que me matriculei numa academia do
bairro e nada, fazia meses de exercícios e nada, a gente desanima sabe, eu
também trabalhei sempre, era difícil encontrar horários pra exercitar, nem
sempre tivemos carro, ando de metrô.
— Imagino que seja complicado, mas não pode ficar se restringindo
Sam, tem que ser saudável.
— Eu queria ter uma dessas doenças que você pega e perde uns
vinte quilos sabe? — mordo o camarão e o Noah arregala os olhos, mastigo
e engulo — o que? É o meu sonho! Me deixa!
Ele acaba por rir, sabe que brinco, ainda é muito lindo ver o Noah
rindo assim, meu coração dispara feito louco.
— Tem gente que pensa que alegria de gordo é comer, mas o pior
nem é isso, o pior de tudo no meu caso, é quando alguém chega e fala: —
afino a voz — “querida, você é tão linda de rosto, mas precisa emagrecer, se
fosse mais magra seria linda!” — Noah gargalha, ergo o dedo do meio pra
cima — meu...
— Olha a língua! — Noah repreende ainda rindo — Isso não é
muito delicado.
— As pessoas acham que eu tenho preguiça, ninguém pensa que eu
trabalho todos os dias, às vezes em dois lugares, antes de entrar na King é
claro, e muitas vezes eu não tenho tempo, serviço de faxina é pesado,
garçonete, cansa, no final do dia você só quer um banho e cama.
— Você ficou muito boca suja.
— É a força do hábito, eu não consigo fingir que sou muito
delicadinha, que fica se fazendo de difícil e sendo uma cocozinho pra
conquistar ninguém, ou me aceita assim ou não aceita.
— Ser feminina não é ser cocozinho, Sam!
— Sabe o que eu acho muito engraçado? Vocês se envolvem com
essas garotas e não sabem, mas elas dão pra cães, gatos e cachorros, e
depois elas ficam se fazendo de bobas para melhor passar pra conquistar
vocês! — falo e ele volta a rir pegando outro camarão — Isso é tão...
frustrante!
— Acho que é por isso que eu adoro você Sam, você é sempre tão...
direta, sincera, eu amo isso em você!
— Boca suja não se esqueça! — completo, mas sei que estou
vermelha.
— Que seja! Muitos homens não enxergam as qualidades de se
casarem com mulheres lindas como elas são, você é assim, eu gosto da sua
espontaneidade, por mais que pareça grosseria, você é direta em tudo o que
quer.
— Quando... quando você fica com alguém o que mais te atraí?
— De verdade?
— Sim!
Noah sorri e se inclina pra frente e eu também, depois, assim do
nada, ele vem em minha direção e me rouba um selinho, fico vermelha feito
um tomate, mas sem reação, ele sorri novamente como se tivesse ganhado
na loto.
— A bunda é claro!
Estreito os olhos e me irrito.
— Dyanna não tinha bunda.
— Por isso eu prefiro você, tem pra dar e vender... Pra dar!
Fico ainda mais vermelha, estendo a mão e dou um empurrão no
ombro dele, Noah ri mais e mais de tudo.
— Com muitas garotas eu confesso que fiquei mais pela aparência,
outras me cativaram, por qualidades, mas a única que eu imagino que tenha
me conquistado de todas as formas, tenha sido você.
— Claro, éramos amigos.
— O mais interessante nisso tudo é que eu me perguntava muito
isso quando voltei Sam, se era uma questão de amor de infância, só que
quando eu te encontrei no meu noivado e dançamos aquele tango, meu pau
subiu, então, não acho que tenha sido por isso.
— Lava essa boca antes de falar isso pra mim seu imundo! —
Ordeno. Mas estou rindo, Noah também ri, que coisa, pau?!
— É claro que eu também tinha dúvidas sobre os sentimentos, mas
eu queria muito ficar com você, eu adoro o seu corpo; adoro quando você
me toca, tudo em você me atraí, seu sorriso, sua bunda, seus olhos, sua
bunda, sua... pequena coisinha que eu gosto, sua bunda!
— Seu pornográfico! — Acuso. E pela primeira vez em dias,
gargalho.
— O quê? — Noah fica se fazendo de bobo.
— Não paga de Sandy, Noah!
— Quem é Sandy?
— Sandy, Sandy e Júnior!
— Quem é Sandy e Júnior, Sam?
Como esperava que ele soubesse?
Rapidamente começo a falar sobre a dupla brasileira que eu ouvia
muito quando era adolescente, mais um álbum internacional, adorava, Noah
parece encantado, ao mesmo tempo muito interessado, eu gosto de músicas
daquelas bandas, mexicanas, ainda que ame Rock, meu gosto tem sido uma
mistura total esses anos, principalmente na adolescência.
Nosso assunto caminha pra este rumo, Noah fala de algumas
influências da adolescência, da época da faculdade, ele sempre amou
country e blues, mas nunca pensei que viveria pra vê-lo falando que gosta
do Linkin Park, ainda mais ele que sempre foi mais na dele, não faz a linha
revoltado.
Quando percebo, o vinho e os camarões já acabaram, e também só
tem restos de lagosta no meu prato assim, como no de Noah, acho que por
essa noite é só.
Levanto-me.
— Obrigada pelo jantar Noah, foi ótimo!
— Que bom que gostou.
Ficamos nos olhando por alguns momentos, depois dou a volta na
mesa e eu o abraço com força, Noah devolve o abraço e ficamos assim por
um enorme tempo, sinto seu calor, seu carinho, toda essa coisa que ainda
sentimos um pelo outro, é tão... forte, mas ainda precisamos muito saber se
realmente é isso o que queremos, eu preciso saber se é realmente isso o que
quero!
Ainda mais depois de tudo.
— Vou dormir. — Aviso e me afasto, não sou de ferro nem o Noah,
a minha forma de mantê-lo distante é respeitada, ele apenas faz que sim e se
afasta — Boa noite, Noah.
— Boa noite Sam! — Ele fala me olhando apenas com um pequeno
sorriso.
Enquanto me afasto ele me observa em silêncio, a última coisa que
vejo antes de virar para o corredor do quarto é um sorriso largo nos lábios
dele, percebo ao entrar no meu quarto, que também sorrio, ainda que não
deva.
Ele é Sincero
Acordo e fico olhando pra vista maravilhosa lá fora do quarto.
Sinto-me um pouco mais disposta hoje, mas acima de tudo, fico pensando
na noite de ontem, no jantar.
Foi um bom jantar, admito, dentro do possível, agradável.
Saio da cama e coloco um dos biquínis que o Beth colocou na
minha mala, me olho no espelho e me agrado desse biquíni, é justo como o
outro, mas não ficou tão feio, se eu quiser mudar a percepção que tenho de
mim mesma devo começar a me sentir feliz com a minha condição e o meu
corpo, ainda que as outras pessoas não entendam a minha cabeça, ainda que
achem que exagero, mas é muito simples, no final das contas reina tudo o
que mamãe sempre me falava desde pequena, que tenho que me amar pra
que as pessoas me amem e pra que eu as ame.
Mamãe.
Da um aperto no coração, uma dor absoluta e forte, mas ela é o meu
principal motivo pra tentar prosseguir com tudo.
Visto um short e abro a porta do quarto, logo de cara vejo Noah
pronto pra bater, ele segura uma caneca de café, está de cueca, fico um
pouco vermelha a me ver observando-o de cima abaixo.
— Bom dia Sam! — Noah me olha de cima abaixo também, depois
sorri lentamente — está de saída?
— É. Eu quero ficar com a minha mãe. — Respondo constrangida.
— Eles foram para um passeio de barco, chegam para o almoço.
Pensei em ficarmos na piscina. — Noah fala e me estende a caneca.
Mamãe deve estar curtindo este passeio como um tipo de férias que
nunca teve. Nós nunca saímos do país. Aceito a caneca que o Noah me
estende e ele afasta meus cabelos para trás da orelha, sinto seu carinho, toca
minha face e estou novamente derretendo com seu olhar, ainda que não
deva.
— Dormiu bem?
— Sim e você?
— Não é como abraçar você à noite, mas dormi!
O grande problema é esse: Noah é um fofo!
— Bom! — bebo um pouco do meu café — Você já tomou café?
— Não, eu acabei de acordar!
Não gostaria de estar tão distante do Noah, mas preciso resolver
isso muito antes de decidir realmente o que quero.
— Eu quero falar com você sobre o meu cargo de assistente na
King, pode ser?
— Claro!
Vamos pra sala, a mesa já está posta, Noah puxa a cadeira para que
eu me sente e se senta diante de mim, tem bastante comida, o pessoal do
hotel nos atende super bem.
— Não iria querer ficar só em casa mesmo, quero começar a
faculdade ano que vem, mas quero voltar a trabalhar logo que voltarmos pra
casa.
— Entendo. Você tem liberdade pra sair a qualquer hora do dia,
Sam.
— Meus pais poderão morar conosco?
— Você já perguntou se seus pais querem?
Não falei com eles sobre nada, e não parei pra pensar que talvez
eles recusem. Principalmente minha mãe, ela nunca aceitaria, pensando
bem... ela não vai querer isso.
— Não queria que mamãe ficasse longe de mim neste momento,
Noah.
— Eu conversei com um colega que é médico; gostaria de submeter
sua mãe a um novo tratamento com células tronco.
Tratamento?
Dentro de mim tudo se agita e fico assim, meio surpresa com a
ideia, eu sei como é que funcionam esses tratamentos, eles são difíceis e
quase impossíveis pra nós, nunca teríamos dinheiro suficiente pra submeter
mamãe a um tratamento com células tronco.
— Ele tem um consultório; o câncer da sua mãe não tem tratamento
nem cura, mas podemos tentar!
— Isso não ficaria muito caro?
— Dinheiro não é problema, Sam. Só quero te deixar ciente de que
o tratamento é uma solução temporária e nada impede de que sua mãe viva
um pouco mais conosco.
Meu coração fica meio acelerado, e eu me encho um pouquinho de
esperança, porque sei que mamãe merece isso, eu faço tudo para que ela
fique bem, farei tudo pra que ela fique ao menos um tempo a mais comigo.
— Sim, claro Noah! Eu ficarei muito grata se ajudar, descobrimos
há alguns meses, sabe, foi tudo tão rápido!
— Por isso eles não queriam que você soubesse Sam, eu mesmo
queria ser a última pessoa a te falar isso.
Consigo entender, ainda que meus pais queiram me proteger, não
acho justo que ao menos papai não me dissesse, mas não sei se um pai
gostaria de falar para seu filho que em breve morreria, sinto calafrios de
pensar nisso.
— Este tratamento com células tronco diminui o tamanho do tumor
que tem no pulmão da sua mãe a longo prazo, e quem sabe ela fazendo este
tratamento, não tenha um pouquinho de mais tempo conosco?
Noah tem um senso de sensibilidade muito grande, mas eu sei que
ele gosta muito dos meus pais, da minha mãe.
— Acha que vai funcionar?
— Temos que tentar Sam!
Suspiro.
— Então vamos tentar!
— Sim Sam, juntos?
Ele estende a mão e segura a minha, no dedo, os anéis de
casamento, mas na minha mão não tem nada, ainda assim, sinto que o nosso
laço é maior que isso, sorrio um pouco esperançosa.
— Sim, juntos!

— Você gostou daqui?


— Sim, é perfeito! — Estou deitada tomando sol.
Noah está deitado ao meu lado de sunga, não olho muito, ele usa
óculos de sol. Nunca parei para reparar o quanto nós dois somos
branquelos, passei muito protetor solar, mas ainda é cedo, pensei bastante
na conversa sobre o tratamento de mamãe, mas com cautela, ele não
prometeu nada, contudo, qualquer foco de esperança é bem vindo.
Ele não entende muito sobre o assunto, mas disse durante o café,
que logo que voltarmos procuraremos esse amigo médico, para ele nos
explicar tudo, vamos conversar com mamãe e papai logo que eles
chegarem, já estou um pouco ansiosa.
— Podemos voltar depois se desejar!
— Você sempre vem aqui?
— Às vezes, vim umas três vezes, gosto de paz e silêncio.
Ele é muito pacífico.
Eu também gosto de ficar na minha às vezes.
— Você não acha que está na hora de deitar de bruços não?
Viro-me e Noah se apressa e pega o protetor antes de mim, depois
se estica ficando de joelhos, fecho a cara.
— Me devolve!
— Eu passo em você, deixa disso Sam!
— Eu prefiro passar.
— Eu sei o que faço, deixa de ser rancorosa amor!
Amor é uma ova!
Viro a cara também, não sou obrigada.
O problema é que o Noah sabe ser persuasivo quando quer, ele é
um chato, se eu levantar e sair andando vai parecer que não sou adulta o
suficiente pra lidar com ele e com sua aproximação. Noah quer reestruturar
nosso relacionamento, mas eu não vou esquecer assim, tão fácil.
— E a sua amante Donatela?
— Ela não é minha amante. — Responde e despeja a loção em
minhas costas — Eu já pedi que arrumassem uma filial pra transferi-la, mas
acho que ela quer esperar sua mãe voltar para se despedir.
E mamãe vai sentir muita falta da única amiga que teve e fez parte
de sua vida nos últimos meses, alguém que ama, mas também, alguém que
foi fria o suficiente pra ter tido um caso com o meu marido no passado e ter
organizado meu casamento.
— Explicou pra ela os motivos?
— Claro, eu liguei pra ela e disse que você já sabe a verdade.
Não consigo não me sentir curiosa quanto a isso.
— E... ela?
— Ficou magoada, disse que sentia muito, e que iria, que não tem
problema, mas que quer falar com sua mãe por telefone sempre, não quer
perder o contato.
Não sinto pena de Donatela, ela não sentiu pena de mim, se bem
que não queria lhe despertar isso, mas não teve respeito pela minha pessoa,
eu jamais em condição de ex-amante de um homem, me prestaria a
organizar o casamento dele, da esposa dele, contudo, eu imagino que pra ela
tenha sido algo bem complicado, porque ela sabia que não poderia negar
isso pra mamãe, nem pra mim, porque nós não sabíamos da verdade.
Ele despeja o protetor solar nas minhas costas e logo em seguida as
mãos dele deslizam pra cima, para os meus ombros, mais para uma carícia
do que pra um gesto comum, fecho os olhos, fico com o rosto apoiado em
minhas mãos, me sinto tensa. Noah me tocar é... divino.
— Sabe... não falamos sobre a outra parte! — Noah fala baixo, sua
voz é concentrada.
— Que parte? — pergunto incerta.
— Sobre fazermos amor; — as mãos dele apertam meus ombros
com suavidade — sinto desejo!
Estou corada.
— Claro, é homem, deve sentir desejo!
— Pensei que nossa lua de mel seria recheada de surpresas, queria
muito poder aproveitar todos os momentos com você.
Não duvido da sinceridade dele, eu também tinha tantas
expectativas, e cada uma delas se frustraram com tudo o que aconteceu, não
estou com clima para nada, ainda que me sinta meio atraída por ele, claro
que me sinto, eu gosto de tudo o que compartilhamos, nossa primeira noite
foi inexplicavelmente excitante.
— Sinto sua falta na cama, dos seus beijos Sam, do seu corpo no
meu, — as mãos dele descem até a minha bunda, suspiro — logo agora que
nós dois estávamos indo tão bem... acontece tudo isso.
— Você fez isso! — acuso porque não tenho resposta.
— Tem razão, mas eu estou pedindo perdão, Sam!
— Não dá pra esquecer da noite pro dia, Noah.
— Eu sei, é só que te amo e odeio ficar longe de você Sam, você
está sendo muito fria comigo.
— Não queria que as coisas fossem assim.
— É minha culpa em muitos sentidos, mas tente compreender.
— Eu estou tentando Noah.
Ele espalha o protetor nas minhas pernas com cuidado. Cada toque
arrepia cada centímetro da minha pele, depois ele se deita mais próximo de
mim, estamos no tablado de fora ao lado da piscina em cima de toalhas, me
apoio nos cotovelos e observo a pequena tatuagem no quadril dele, estendo
a mão e toco.
— O que significa isso? “Te amo, Donatela”?!
— COMO VOCÊ É INFANTIL, SAM — esbraveja irritado.
Ele realmente se irrita!
Fico constrangida, depois me ergo e vou pra dentro de casa de
pressa, sei que estou indo longe demais, mas é que imaginar ele com
Donatela me deixa tão... tão... magoada! Confiei demais em Noah, confiei
muito em Donatela, e isso é algo que eu jamais poderei mudar, ainda que
ela esteja no passado dele.
— Sam... — Noah chama, mas entro no quarto e fecho a porta antes
que ele consiga me alcançar. — Sam, abre a porta, vamos conversar!
Estou chorando.
Não é tão fácil lidar com isso também, não é tão fácil me permitir
perdoar, isso foi há alguns dias atrás, como posso me esquecer? Donatela
foi a pessoa que eu mais adorei quando cheguei a King, alguém que eu
conheço bastante e gosto, e infelizmente Noah teve um caso com ela, como
posso lidar com isso sem sofrer?
— Querida, me desculpe, não queria gritar.
A voz dele parece meio abafada.
— Por favor, querida, abra a porta, vamos conversar.
— Eu... — nego com a cabeça — melhor não, Noah.
— Me deixa explicar a história da tatuagem, eu prometo que não
vou me irritar. Sam, por favor, para com isso! Estamos casados, eu errei,
mas temos que nos acertar, temos que estar juntos!
Eu penso por alguns momentos, e sei que ele tem razão em alguns
sentidos. Isolar-me não vai funcionar, e não ouvi-lo muito menos, tão pouco
fugir, seco minha face e me aproximo da porta. Respiro fundo e a abro,
Noah me olha completamente chateado.
— Desculpe-me, não queria gritar com você.
— Tudo bem.
Noah me puxa pelo braço e eu vou muito rapidamente, depois ele
me abraça com força.
— Eu sei que está frágil e sensível, me desculpe Sam, odeio te ver
chorar.
Noah me aperta com mais força, ele não sabe a angústia que sinto
em pensar em Donatela e ele juntos, em ter que revê-la, eu não quero nunca
mais vê-la, seria péssimo, me sentiria mais machucada do que estou, ainda
que eu fingisse que estou bem e agisse com frieza.
— Só existe você Sam, apenas você.
— Disse que iria falar da tatuagem.
Me afasto, mas Noah me puxa novamente, ele segura a minha face
e me beija, toco sua face, me rendendo ao beijo. Eu não sou de ferro, tão
logo planejei me manter afastada e não consigo... eu não consigo me afastar
assim tão bruscamente dele, eu devo me afastar porque é um risco estar tão
próxima dele, mas eu me sinto vulnerável.
Ele me abraça com carinho e toca os meus ombros, sua boca
explora a minha com lentidão, mas depois me toco do que realmente
acontece e me afasto, ele me olha, mas está conformado, sua boca
vermelha, úmida pelo nosso beijo. Tento respirar mais devagar, meu
coração está pulando no peito.
— É o seu nome, acho que você já viu, eu fiz quando eu cheguei
em Nova York, Sam!
— Sua mãe sabe?
— Sabe. Quando ela viu, nós brigamos, só tinha quinze anos, mas
não me importei.
— Está bem, me desculpe pela insinuação.
— Não fale essas coisas.
— Está bem Noah, quer voltar pra tomar sol?
— Sim.
Ele torna a passar o braço ao redor da minha cintura, e me beija a
cabeça, vamos juntos para o lado de fora, mas fico apenas calada, porque é
o que posso fazer nesse momento.
O PASSADO DE NOAH
— Você já perdoou o meu filho?
Estou olhando para a escuridão das Maldivas.
Fico surpresa com a presença de Arthur King, ele está de short e
uma camisa vermelha com estampas de flores brancas, estamos no chalé
dos King. Logo que entardeceu, Sara ligou pro Noah avisando que era para
nós virmos jantar com eles e meus pais.
Quando vi mamãe de vestido agora a pouco, simplesmente me vi
sorrindo, há em mim uma imensa esperança de que nós consigamos reduzir
o tumor no pulmão dela, causado pelo câncer. Minha tarde com o Noah
girou em torno desse assunto, nosso almoço foi basicamente planos para
com mamãe, também sobre a King e nada mais.
Me choca que Arthur me pergunte isso, ele sabe o que ele e Sara
causaram em mim há dias atrás, mas me sinto melhor hoje, apesar da
discussão com Noah naquela hora da manhã, depois disso ele entendeu que
eu queria um pouco mais de distância, a respeitou e nosso assunto por todo
o dia foi minha mãe e meu novo cargo na King, nada além disso.
— Por que deveria? O senhor não está feliz por ter nos separado?
Arthur King tem um semblante mais relaxado do que imaginei por
anos, encontrar em um homem sério e de negócios, ele sorri surpreso com
minha pergunta. Ele está com o rosto queimado pelo sol, parece uma
lagosta.
— Bem, não. Eu não gosto de vê-lo sofrer.
— No entanto, não o poupou de suas insinuações maldosas.
— Eu não insinuei nada, apenas falei a verdade, mas acho que fui
egoísta em agir daquela forma. Eu peço perdão por ter falado aquilo,
daquele jeito.
Estou ainda mais surpresa com a atitude de King, mas fico parada,
recebendo isso em silêncio.
— Vejo que nossas atitudes vêm machucando muito vocês,
sinceramente, não era esse o meu intuito. Você está roubando o meu melhor
funcionário de mim.
Minhas bochechas queimam, Arthur sorri amigavelmente.
— Precisei entender que não preciso do Noah em Nova York. Foi
preciso que ele se demitisse por alguns dias pra eu poder perceber, que
acima de tudo ele é o meu filho, e tudo o que importa é a felicidade dele.
— Sara não pensa assim.
— Sara só está com medo do que vão pensar. Temos um nome
Samantha...
— O nome é mais importante que a felicidade do filho?
Ele fica parado me olhando, bem mais que impactado com minha
pergunta.
— Sabiam que eu o amava Noah, e que este momento era pra ter
sido a melhor coisa que teríamos, no entanto, vocês apareceram e
destruíram nossa lua de mel.
— Não é um mal irreparável, Samantha, o Noah ama você!
— Sara disse que ele sente pena!
— Você prefere acreditar na Sara ou no seu marido?
— Não o ouvi falar que me ama na sala.
— Claro! Você chegou já no final da discussão.
Eles não pareciam estar discutindo.
Arthur olha para os lados, um tanto incerto.
— Sara insistiu que viéssemos. Ela soube através da secretária do
Noah que ele havia reservado as passagens para Maldivas.
— Por que o senhor está cochichando?
— Porque não quero “me meter nesse assunto".
Sei...
— Quando chegamos Noah ficou furioso, ele nos mandou embora,
mas Sara começou a falar sobre você; Noah disse que te amava e que não
queria se separar de você, acho que você ainda estava dormindo, Sara
surtou, pois, ele nos expulsou do chalé.
Arregalo os olhos bem mais que surpresa.
— Sara meio que me apertou para eu tentar convencer o garoto a
ceder, ela acha que o casamento pode acabar com a reputação dela.
— Por quê?
— Sara é editora de uma revista, você não sabe?
— Não!
Estou incrédula a cada revelação.
— Desculpe Sam, eu particularmente acho você uma jovem muito
bonita, mas a Sara teme que isso influencie para que as edições da revista
dela caiam, e as vendas, uma vez que ela domina o mundo da moda na
cidade de Nova York.
Nunca iria saber se ele não me dissesse...
— Noah ama você, mas ele mesmo não sabe se expressar diante de
muita pressão, ele fica nervoso e acaba não falando coisa com coisa,
imagino que saiba que depois do acidente...
— Que acidente?
Meu Deus!
Arthur franze a testa completamente surpreso.
— Ele não te contou?
— Não!
— Noah sofreu um acidente de moto há alguns anos, ele perdeu boa
parte das memórias da infância, eu mesmo não pensei que ele fosse voltar a
recuperá-las.
Parece que alguém esta dando pequenos socos na boca do meu
estômago.
— Ele havia esquecido muitas coisas... inclusive você!
Engulo a seco.
— Foi uma grande surpresa para nós quando ele nos ligou falando
que se recordara de você, Samantha. Sara teme por isso também, porque pro
Noah, muitas coisas que ele viveu com você, foram deletadas da cabeça
dele, até mesmo com o próprio pai, isso o frustra às vezes.
Ele fica me olhando espantado, acho que pensou que Noah havia
me falado sobre isso, e eu devolvo o olhar pra ele bem mais que surpresa.
— Noah nunca esqueceu realmente você Samantha, mas ele se
tornou outra pessoa depois que saiu de Charlotte.
— Pai! — Noah chama e percebo que ele se aproxima ao nos
encontrar aqui fora — Tudo bem? Algo errado?
— Não. — Arthur sorri e olha para o filho com um tipo de
admiração ou coisa assim — Samantha disse que achou a vista daqui
incrível, estava falando para ela da nossa casa no Caribe, pode levá-la
quando quiser!
— Claro papai!
Percebo pelo brilho nos olhos de Noah, que ele realmente ama
Arthur King como um pai, e não sei como agir diante dele neste momento,
Arthur entra no chalé.
Noah usa uma camisa de mangas preta e um calção de malha, ele fica ao
meu lado. Escolhi outro vestido mais estampado pra esse jantar.
— Tudo bem querida?
— É claro!
Viro-me pra frente. Não sei o que dizer ou como agir. Noah sofreu
um acidente, ele perdeu a memória, no entanto, ele voltou e lembrou-se de
mim, ele não parecia ter se esquecido de nada! Ele não mudou comigo, não
como era. O que aconteceu? Como foi isso?
— Mamãe está nos chamando para o jantar. Gostaria de pedir que
usasse nossas alianças de casamento, Sam.
— Eu não sei onde joguei.
— Eu as peguei!
Ele retira as alianças do bolso e o nosso anel de noivado, depois ele
segura a minha mão e enfia as duas alianças no meu dedo esquerdo e o anel
de noivado no meu indicador, analiso as joias perfeitas e caras, e me
pergunto: “como não imaginei que ele não teria dinheiro?” Esse anel cheio
de pedrinhas deve ter custado uma fortuna!
— Obrigada.
— Depois, quando não quiser usar, você tira!
Reviro os olhos, Noah sorri com o meu pouco caso e me puxa para
um abraço, me encolho apertando-o, e tenho ainda um pouco mais de
certeza de que não nos conhecemos o suficiente depois que ele voltou pra
Charlotte, ele me esconde muitas coisas de sua vida, do que houve nesses
treze anos. Vejo sob seu ombro, Sara nos olhando da porta do lado de
dentro da sala. Ela segura uma taça de vinho e seu olhar azul é cheio de
faíscas. Irrito-me, pois, ela não tem esse direito sob nossas vidas, nem que
fosse a própria estilista de moda. Seguro a nuca de Noah e o puxo para um
beijo gostoso, acho que ainda não sei tudo sobre ele, mas eu não vou deixar
que essa mulher arruíne o que temos, assim, tão facilmente por um
capricho, — ainda que Noah tenha me omitido a verdade — só percebo que
tudo não passou de uma pequena armadilha da Sara para nos separar.
Mas isso é que não, se eu fizer não será por culpa ou influência dela! Eu
mostro pra ela, que eu sou gorda, mas o Noah não vai me largar só porque
ela é dona de uma revista. Isso é que não! Se fizermos isso, será por decisão
nossa.
SEM SEGREDO
— Bom dia querida!
Sorrio.
Noah entra no quarto e está só de cueca, sobe na cama, — às vezes,
eu só acho que ele finge que nada aconteceu, porque isso faz parte de sua
personalidade, — ele parece ter acabado de acordar, tem cara de sono, se
enfia embaixo dos meus lençóis e me abraça, há dias que não ficamos
juntos nessa mesma cama, desde que chegamos na verdade.
— Dormiu bem?
— Sim.
Ele me beija a face com carinho, sua mão cobre os meus dedos e
entrelaça os dedos nos meus, sinto um enorme carinho vindo dele, mas
ainda assim, quero tirar essa conversa de "acidente" a limpo, pra mim não
fez muito sentido.
— Noah... antes de me reencontrar na King, você pensava muito em
mim?
— Sim, às vezes sim!
— Seu pai me falou sobre o acidente. Você teve sequelas?
Noah respira fundo. Viro-me pra ele, afasto meus cabelos pra trás, e
ficamos nos olhando por um momento intenso, ele não quer falar sobre isso.
— E se eu te contasse que me lembrei de boa parte de tudo o que
vivemos quando te reencontrei?
Isso é inacreditável.
— Eu me esforço muito, Sam, pra me lembrar de algumas coisas,
mas você foi à única pessoa da qual eu tinha lembrança vívida na mente, e
ao mesmo tempo não havia nada, te ver na King foi absolutamente
apavorante.
— Por quê?
— Me vieram coisas à mente, imagens... me sentia confuso.
— Quer dizer que havia se esquecido de mim?
— Você era como um borrão na minha mente antes de eu
reencontra-la, quando eu te vi, eu sabia que te conhecia de algum lugar,
fiquei meio confuso, porque me vieram memórias de nós dois na casa da
árvore, no trailer, tantas coisas, o resto eu fui lembrando, ler suas cartas me
ajudou muito.
— Quer dizer que você não lembrava de mim?
— Lembrava Sam, mas não muito, por isso estranhei quando me
falou que enviou as cartas. Se as tivesse recebido antes, com certeza a
minha memória teria funcionado melhor.
— Como foi isso?
— Quando eu fiz dezenove anos, ganhei uma moto do meu pai.
Enfiei na cabeça que sabia pilotar e comecei a correr demais na moto,
aconteceu que um carro me chapou e eu acabei sofrendo um acidente,
estava com capacete, mas a pequena lesão me deixou meio lento.
Noah sorri pensativo.
— Me lembro que eu sofri o acidente e quando acordei no hospital,
trocava os nomes de todos. O médico disse que tive amnésia temporária
devido a pancada. Eu também fiquei vários meses meio que sem saber de
várias coisas pessoais, mamãe teve que me levar pra casa dela, porque tinha
momentos em que eu desmaiava, graças a uma cirurgia, descobrimos que
era um coágulo na cabeça e ele foi retirado, mas ainda assim não me
lembrava.
Fico calada, mais que surpresa com isso, Noah estende a mão e toca
minha face.
— Diria que quando eu te vi, senti algo estranho dentro de mim...
— Isso... Por isso você se separou da Dyanna?
— Mais ou menos!
Noah se deita de costas e olha para o teto, parece pensativo.
— Quando a pedi em noivado, sentia que fazia algo muito errado.
Eu não sabia por que tinha memórias de você, mas isso eu associava a
coisas ruins. Eu gostava de Dyanna, mas sentia que faltava algo, e quando
te vi na King, eu só pensava: “Sam!”
E isso me apavorou, porque foi como trazer boa parte da minha vida de
volta.
Ele me olha e vejo tanto medo em seu olhar; ainda que não consiga
entender o motivo de Noah não ter me falado sobre isso, estou incrédula
quanto a uma centena de coisas nesse momento, mas eu jamais pensaria mal
dele nesse sentido, não foi culpa dele!
— Queria voltar para Charlotte. As lembranças vinham e eu só
ficava mais e mais inquieto. No dia do meu noivado, eu sabia que fazia algo
muito errado sabe.
— Por quê?
— Porque quando eu te vi na King, tive absolta certeza de que
amava você, Sam. Não era coisa apenas de infância. Foi como ver uma
nova mulher, mas que eu amei assim que vi.
Engulo a seco, Noah estende a mão e toca minha bochecha.
— Sabia que não poderia ficar com Dyanna ou com nenhuma outra,
porque meu coração é seu. Sou idiota por isso?
Minha garganta se fecha e Noah parece tão magoado.
— Queria lembrar mais de papai, senti que o abandonei por tantos
anos, simplesmente não me lembrava dele, nem de você e quando vim pra
Charlotte, eu queria recuperar as lembranças, queria manter o sentimento
vivo dentro de mim. Eu a amava Sam, sempre a amei. Mas, fui embora e
você não merecia tudo o que fiz. Antes do acidente eu vivia com a culpa,
depois do acidente, tudo o que eu tinha era a lembrança de uma amiga de
infância e nada mais.
— Se eu soubesse eu teria ido atrás de você...
— Foi tudo muito rápido. Depois disso eu vivi vários
relacionamentos, mas sempre sentia que faltava algo. Mamãe não falava de
você, papai não chegou a te conhecer pessoalmente; era como se você
estivesse lá e ao mesmo tempo não existisse, quando você foi ao meu
noivado eu já estava mais situado, tudo o que queria era estar com você,
viver tudo o que eu não vivi nesses anos, mas ainda tinha muitas dúvidas se
conseguiria ser o mesmo.
— Isso explica porque às vezes, você fica me olhando e calado,
pensando demais.
— Eu fico tentando me lembrar de tudo, porque muitas coisas eu
naturalmente esqueci, logo que fui a sua casa, contei do acidente para os
seus pais, sua mãe me deu os nossos álbuns de fotografias e vários vídeos
nossos da infância; aos poucos vou me lembrando de tudo. Quando me
lembrei da Barbie, eu só queria estar lá com você, me lembrava de tudo aos
poucos.
— Não acha que deveria ter me dito?
— Não queria que pensasse que minha aproximação era por conta
disso, tudo o que mais desejava era ter você ao meu lado, porque quando
estamos juntos, eu me sinto ligado ao que eu era antes do acidente, antes de
ir pra longe.
Estar com você me faz muito feliz, Samantha, gostaria que soubesse.
Fico calada, ele toca minha face afastando uma lágrima pra trás, se
inclina e me abraça com carinho, depois me beija de um jeito carinhoso,
soluço e choro em silêncio. Noah me aperta e me beija mais uma vez, sinto
suas lágrimas em minha face.
— Sam, Noah!
É a voz da Sara.
Escuto o som dos passos dela no corredor, Noah não me solta,
ficamos abraçados por alguns momentos, e sinto que ele também ignora a
mãe. Ele está magoado é claro, com a intromissão dela.
— Esperamos você para o café querida. Acho que o Noah saiu para
correr. — Sara fala do lado de fora do quarto — Você está bem?
Vaca Falsa!
— Sim — respondo —, eu já vou!
— Queria conversar com você, Samantha, querida. Você e o Noah
já decidiram quando vão assinar os papéis do divórcio?
Noah me olha agora endurecido, faço que não com a cabeça.
— Ainda não falamos sobre isso. — digo sincera — Nós não vamos
nos divorciar, Sara.
Ela não responde, mas escuto o grunhido de longe.
— Está bem "querida", estamos esperando no Hotel.
Ele me olha e me olha em silêncio. Suspiro e me ergo, me sento na
cama, Noah se senta ao meu lado e segura a minha mão.
— Nada de segredos Noah, nada de omissões está bem?
— Está bem!
— Acho que temos muitas coisas a conversar sobre esses últimos
treze anos.
— Eu também acho!
— Então faremos isso nesses dias de Lua de Mel, está bem?
— Sim.
Inclino-me e o abraço, Noah me beija e não recuo. Sinto que esta é
a melhor decisão. — É!
Ela Tem Que Aceitar
— Sam! Sabrine! Noah!... ALMOÇO!
Mamãe acena.
Noah e eu estamos com Sabrine, fazendo castelos de areia. Após o
café com meus pais e os meus sogros viemos para praia. Mamãe estava tão
feliz que não me permiti me sentir triste por sua doença. Eu afasto da mente
as palavras "tempo" e "terminal", sei que posso ter mais esperança, mas não
é por isso! É que eu não quero que ela perceba que eu sei, pois isso pode
machucá-la e muito.
É muito natural pra mim, estar com a irmã de Noah, eu gosto de
Sabrine. Olhar ela tem sido uma distração, um passatempo em nossos dias
aqui nas Maldivas. Mas quando Noah se aproxima demais, eu me sinto um
pouco travada, às vezes ele me olha de um jeito que me deixa constrangida.
Ontem foi um dia assim, na verdade, tem sido assim há dois dias desde que
conversamos sobre o acidente.
Acordamos, colocamos roupas de banho e descemos para praia pra
ficarmos com nossos pais, me mantenho distante de Sara, mas faço questão
de que ela perceba a minha presença, porque eu sei que tudo o que ela quer
é arruinar meu casamento e me afastar do Noah, e eu não farei isso.
Percebi que ela está mais irritada com isso que nunca, incomodada
também, além de estar me evitando; ela percebeu que Noah e eu tentamos
nos acertar, aproveitei esses dias pra ficar mais com meus pais, Arthur King
ou Rei Arthur como papai o chama, é simpático, não me trata mal, mas
muitas vezes eu o vejo meio que sendo “capacho” de Sara, e eu realmente
não entendo porque ele é assim em relação a ela, parece que todos tem
medo da Viúva Negra, até os empregados do hotel parecem temorosos perto
dela.
Mamãe sempre está por perto. Carequinha, mas sorridente, papai
não a larga por um segundo, e eles estão mais unidos que nunca. Nenhuma
gota de álcool! Não vejo papai bebendo há dias, e se bebe deve ser muito
escondido. Claro, me importo muito com ele também, mas a delicadeza da
doença de mamãe é muito mais grave.
Meu relacionamento com o Noah é apenas... estável.
Não brigamos nesses dois dias, e ele veio dormir comigo nas duas
noites, mas tudo o que tínhamos era o silêncio, não me sentia estranha por
aquilo e nem sinto, não quero ficar perguntando do passado dele, ainda que
queira saber muitas coisas, mas não vou ser invasiva demais. Ele também
entendeu que eu preciso de uns dias pra engolir tudo, mas mantemos mais
respeito depois da conversa, mais cordialidade, e mais carinho.
Trocamos beijinhos, abraços, e eu me sinto novamente mais
próxima dele, ainda que eu perceba que Noah sinta falta de mim em outros
sentidos.
Não me sinto difícil, não me sinto vingativa, eu apenas não quero ir
pra cama com ele por ir. Mágoa não é algo que se esqueça com sexo, no
momento apenas esquecemos, mas... e depois? É como fugir de um
problema e quando voltar, ele estará lá, então, não quero ter que fazer sexo
com o meu marido por carência. Sempre fizemos por amor, e quero que
continue assim, ainda que eu e ele estejamos na cama todas as noites e eu
sinta que ele me deseje, ele nem disfarça! Fica me olhando quando estou de
biquíni e não tira os olhos de mim, se fico de sutiã e calcinha, Noah está me
observando, ou se, à noite enquanto jantamos uso algum vestido, ele fica
olhando para as minhas pernas, para o decote do vestido...
Isso elimina uma porção de dúvidas que ainda permaneciam
adormecidas dentro de mim, me sinto tola por um dia ter pensado que era
gorda demais pra ele, que Noah sentia apenas muita pena de mim e não me
queria justamente por isso, meu corpo, porque é justamente o contrário que
acontece.
Ele fica me beirando, me dá uns beijos às vezes, que me fazem
perder o ar, depois quando me afasto ele me abraça por trás se esfregando
em mim, mas não fala nada, parece um cachorro querendo atenção e sexo,
não quero que seja apenas isso; ainda que seja muito bom saber que ele me
deseja e que gosta do meu corpo assim.
GORDINHA!
Vamos para a mesa no quiosque do hotel, Sabrine é a primeira a se
sentar, meus pais e os pais de Noah se sentam de frente pra nós dois e
Sabrine, o garçom começa a servir: frutos do mar, peixe cozido, camarão,
tem cerveja, suco e refrigerante; tenho tido mais apetite também, Noah vem
comendo comigo sempre, tudo aquilo vai ficando pra trás, apenas tento
prosseguir e esquecer.
— Sabrine seja educada, coma menos!
Esta não é a primeira vez que eu vejo a Sara recriminando Sabrine
por comer algo. Sempre que nos sentamos para comer, ela fica podando a
menina, falando para ela mastigar devagar, e eu acho que a Sabrine nem
come tanto assim, ela só é uma criança que gosta de doces como qualquer
outra. Olho pra Sara em reprovação, ela me lembra um pouco aquelas mães
obcecadas por perfeição, e só de pirraça, encho meu prato de camarões,
pego limão e me sirvo de um copo enorme de coca, mamãe arregala os
olhos, ela sabe que eu não como assim! Arthur também, Noah percebe a
minha irritação, mas não fala nada.
— Vai acabar passando mal querida! — Sara fala numa insinuação
cheia de maldade — E engordar um pouco mais não acha?
— Está com pena de pagar camarão pra sua nora, Sara? —
questiono e começo a comer, coloco boa parte do meu camarão para
Sabrine — Come Sabrine, camarão é saudável.
— É gorduroso...
— Mãe, deixa de ser complexada, a Sabrine ainda é pequena. —
Noah repreende duramente.
— Deve ter se esquecido de como é bom comer! — Falo e Sara
respira fundo prestes a dar um chilique. Começo a comer meu primeiro
camarão, Sabrine e Noah fazem o mesmo.
— Levo uma alimentação saudável, me exercito, Arthur e eu
sempre estamos malhando, procurando manter a forma.
— Bom pra você. — dou de ombros.
— Não pensa em emagrecer?
— Mãe! — Noah repreende visivelmente irritado.
— Não. — falo e percebo que isso incomoda meus pais e Arthur —
Eu sou saudável, nunca senti nada de diferente, e eu gosto do meu corpo
assim.
— As pessoas não gostam de mulheres gordas!
— Eu não preciso que as pessoas gostem de mim, Sara. Agora, se
você depende do amor do resto do mundo pra viver, este não é um problema
meu. Tenho meus pais e o Noah, e eles são suficientemente bons pra mim.
Sara fica calada com a minha resposta.
— Você é ligada demais a aparência das pessoas. Esqueceu-se de
onde saiu e quem era muito antes de se tornar alguém com dinheiro, perdeu
suas origens! Ninguém é obrigado a aceitar a sua forma de viver.
— Apenas me preocupo com a reputação do Noah e da nossa
família.
— Não acho que o meu peso destrua a reputação da sua família
Sara. Eu sou honesta e trabalhadora, nunca precisei roubar nada de ninguém
pra comer, e meus pais são pessoas honestas, dignas, se ao menos devesse
algo pra sociedade, ainda valeria a pena você ser contra mim, mas acho que
esse é um preconceito que você tem a respeito da minha pessoa.
Mamãe está orgulhosa assim como papai, Noah segura a minha mão
em cima da mesa me dando apoio. Sara permanece em silêncio, irritada e
com certeza, constrangida com a minha resposta.
— Eu não estudei, eu sou acima do peso, meus pais não são ricos,
mas eu sou uma pessoa que respeita o seu filho, que o ama acima de tudo, e
eu exijo um pouco de respeito da sua parte e quero que você entenda que
nós dois ficaremos juntos e que nos amamos!
— Eu apenas não concordo que morem tão longe...
— Besteira Sara, podemos visitá-los sempre! — Arthur corta — Já
chega Sara. Estamos em um momento em família, Noah nos permitiu ficar
pra que aproveitemos os momentos com ele e a Sam e com os pais dela,
deixe Sabrine comer em paz, e deixe Samantha e Noah em paz também.
Sara não fala mais nada.
Por essa eu não esperava!
Noah me beija a cabeça e voltamos a comer, mamãe muda de
assunto percebendo o climinha. Agora mais que nunca me sinto confiante
de novo, Sara que entenda que as coisas não serão mais do jeito dela, ela
que aceite. Vai entender com o tempo que não cederemos as suas vontades.
A VIDA SEGUE
Andei dando uma volta na ilha.
Passei na lojinha do hotel e escolhi o meu presente.
Não temos muitas opções, mas acho que ele vai gostar. Hoje é o
aniversário do Noah, eu até sai da cama sem fazer barulho pra poder
comprar a lembrancinha. Eu sei que ele vai gostar.
Faltam dois dias para nós voltarmos pra Charlotte, não queria que a
nossa estadia aqui tivesse sido tão cheia de altos e baixos, momentos tão
ruins, ao menos, dentro do possível, eu e ele estamos até bem. Sara não
participou do nosso jantar ontem à noite, mas também não fez falta. Arthur
alegou que ela se recolheu mais cedo, mas eu sabia que era por causa da
discussão do almoço.
Também não me importo.
Eu não vou permitir que Sara, nem ninguém, dite como devo viver,
o que devo comer, se devo ou não estar acima do peso.
Nunca parei pra pensar em mim, eu sempre olhei pra dentro de mim
mesma, e tudo o que enxergava era alguém que tentava sobreviver ao
preconceito que as pessoas tinham a meu respeito, mas nunca enxerguei que
o preconceito estava dentro de mim.
Não posso mais me permitir ver no espelho algo que eu não sou. Eu
não sou magra, eu não sou esbelta, eu não tenho pernas finas nem cintura
fina, nem seios pequenos e durinhos, pelo contrário, eu sou gorda, tenho
estrias, tenho celulite, e minha bunda é grande, minhas coxas são grandes,
tudo em mim é grande, mas... e daí? E dai que eu sou uma garota GG? Ficar
me lamentando me levará a algum lugar?
Sofri depressão, cheguei ao meu limite e cortei os pulsos. Meu pai é
um alcóolatra e minha mãe tem câncer. Tenho pais que precisaram de mim
sempre, e sempre ressaltaram a importância disso em minha vida, contudo,
eu acho que eu permitia me recriminar, eu me diminuía, e isso durante toda
a minha vida, não resolveu os meus problemas. Estando ou não acima do
peso. Eu sempre me superei pra conseguir ser alguém melhor, ainda que
não me sentisse, nem por dentro nem por fora.
Nada do que eu faça ou fale vai mudar o que as pessoas pensam
sobre mim, eu sei que se eu fosse magra, muitas coisas seriam diferentes na
minha vida, mas eu não sou, e não sei bem se isso resolveria todos os
problemas que eu tenho dentro de mim, pois isso não é algo externo, é algo
interno.
A chegada de Noah e todos esses acontecimentos só me fizeram
perceber o quanto eu me esqueci de mim mesma nesses anos, o quanto
matei a minha vontade de sonhar e o quanto me entreguei à vida do jeito
que ela era, tanto que na primeira oportunidade que eu tive de ser feliz eu
basicamente me entreguei completamente, acreditando que aquilo seria um
cano de escape para o real problema, e não é o meu peso, sou eu! E eu
tenho que mudar isso.
Não posso viver um casamento onde o meu marido tem que ficar
me motivando a me sentir bonita, falando que devo me aceitar, com dúvidas
a respeito dos sentimentos dele sendo que minha baixa estima é o meu
problema. Prometi pra eu mesma que não farei mais isso e eu não farei!
Terei dificuldades, estar com Noah me custa uma pequena parcela,
e estarei bem mais susceptível a tudo, mas esse é um preço que eu quero e
vou pagar.
Tem o passado dele, Donatela, as omissões, mas isso eu prefiro não
colocar agora novamente entre nós. Consigo ver as coisas com clareza aos
poucos, Noah teve sim um caso com Donatela, mas isso foi há alguns anos,
muito antes de me rever, preciso aceitar o fato de que ele tinha uma vida
antes de voltar a Charlote também, não posso mudar o passado dele, não
posso remover Donatela de sua história, e a única coisa que posso fazer se
opto pelo casamento é aceitar, mas apenas o passado, eu também não sei se
fosse eu, se conseguiria falar para o meu marido, noivo, seja lá o que fosse.
Colocar-me no lugar dele me ajuda bastante a pensar com mais calma.
Mas não digo nada, quero que as coisas entre nós fluam de um jeito
mais natural.
Noah não é perfeito e tenho que entender isso, ele também tem todo
o direito do mundo de cometer erros, eu mesma cometo, do que adianta
ficar julgando ele e o crucificando por tudo? Isso só o fará infeliz, só me
deixará mais frustrada, então prefiro não pensar nisso agora.
Entro em nosso chalé, vou pro quarto, e fico surpresa em ver Noah
pelado, perto da porta, olhando a paisagem. Minhas bochechas queimam, e
me sinto constrangida, me pergunto se ele sempre fará esse tipo de coisa
quando estivermos em casa... será que ele gosta de ficar andando nu?
— Opa! — Noah fala e se vira. Desvio o olhar — O que é isso
hein?
— Nada — coloco a sacola atrás das costas e evito olhar sua nudez
— Hum... então, vai ficar assim, peladão, dentro de casa sempre?
— Por que você acha que eu não quero que os seus pais morem
conosco pra sempre, Sam? — Noah pergunta e me olha de cima abaixo.
Sinto-me quente. — O que é? É o meu presente?
— Você é muito sem graça! — reclamo e indico a cama — Vai pra
sala e só volta pro quarto em vinte minutos, por favor.
Noah parece estranhar, estreita os olhos pra mim, faço cara de quem
não se importa e vou para o banheiro, acho que não posso ficar evitando
mais isso. Noah me quer, ele vai me ter. Eu também o quero!
Tomo um banho rápido, me seco bem, passo um pouco do
hidratante que trouxe, deixo o meu cabelo de lado, e volto para o quarto,
arrumo nossa cama, fecho as cortinas da porta que dá pra vista do mar,
calço os sapatos e me deito de bruços na cama, fico esperando Noah voltar,
mas ele começa a demorar não sei por quê. Nossos pais começaram as
comemorações à noite, mamãe me disse ontem que queria descansar hoje,
acho que ela e o papai estão aproveitando bastante essa viagem.
Escuto o som da porta e quando percebo, Noah está parado
segurando um buquê de flores, me apoio num dos braços e o fito, bastante
surpresa, ele usa uma cueca.
— Então senhor Baltimore... Enfim, sós!
SEM VERGONHA
Noah fica parado me olhando como se visse um fantasma ou coisa
assim.
Juntei toda a minha autoconfiança pra fazer isso, mas sinto muita
vontade de rir da cara de surpresa que ele faz, parece que levou um enorme
susto ou algo assim, não me movo.
Demora um pouco até que ele dê o primeiro passo, colocando o
resto do corpo pra dentro do quarto, e vejo que na mão esquerda carrega
uma caixinha de chocolates, o que acho mais incrível é que hoje é o seu dia,
não o meu, e Noah me trouxe chocolates e um buquê de flores — isso é
muito mais que fofo!
— Poxa! — ele fala e chuta a porta com o pé — Esse é o meu
presente?
— O primeiro. — Digo tentando afastar toda a minha insegurança,
e uma sobrancelha dele sobe automaticamente.
— Tem mais? — Noah se aproxima da cama e me olha de cima
abaixo incrédulo — Você é deliciosa querida!
— Gosta disso?
— Se eu gosto?
Noah joga o buquê num canto da cama e a caixa no outro, depois
puxa a cueca pra baixo, arregalo os olhos vendo sua ereção firme, duro.
— Se isso não é gostar, eu não sei o que é, Samantha!
— Bom, — engulo a seco — pode tirar os meus sapatos?
Tento parecer sedutora, coisa que nunca fui, não sei nem como
seduzir alguém, mas pelo menos eu tentei! Parece funcionar muito, além
das minhas expectativas.
— Não, não precisa tirar, está perfeita assim.
Noah joga a cueca pra longe, depois segura o meu pé, indo para o
lado da cama, ele se inclina e beija meu tornozelo, depois sua boca
lentamente beija minha panturrilha, fazendo com que arrepios leves se
espalhem pelo meu corpo, arrepios de prazer que não sinto há quase duas
semanas.
Eu o observo subir, seus beijos quentes, úmidos, Noah saliva, eu
fico totalmente arrepiada com seus beijos, ele sobe os beijos pela parte
traseira da minha cocha e alcança minha bunda, beija os dois lados das
minha nádegas e mordisca cada uma delas lentamente, arqueio com a
sensação, é muito boa.
Sinto vontade de morder algo também, Noah me olha tão cheio de
desejo que me sinto mais confiante que nunca, ele sobe cheirando minhas
costas e minha pele toda se ouriça quando ele cheia o meu pescoço, meus
cabelos, meu couro cabeludo se arrepia todo, me agito quando ele se
esfrega na minha bunda.
— Confia em mim, Sam?
— Eu confio.
— Não tenha vergonha está bem?
— Eu não terei.
— Eu amo seu corpo.
— Eu sei.
— Vire-se e abra as pernas pra mim, amor.
A voz dele está carregada, Noah me beija o ombro e ele fica de
joelhos na cama, me viro, e abro as pernas, ele me olha, e respira fundo,
toco sua barriga, seu peito, e a minha mão desce para sua ereção, eu o toco
sem receio, as mãos dele deslizam até os meus seios e ele os toca com
carinho.
— Acho que vou te machucar, meu amor.
— Faça como quer, é o seu aniversário!
— Você é uma mulher e tanto, Samantha.
O corpo masculino e diferente do meu, vem pra cima do meu, mas
ele começa a me beijar com força, toco suas costas e seu corpo com uma
mão enquanto a outra o toca lentamente, sinto sua ansiedade através do
beijo, sua vontade e a fome que foi alimentada com os dias sem sexo, sem
toques, também sinto falta dele nesse sentido, mas o Noah... acho que ele
realmente está faminto.
Ergue-se, apoia as mãos dos lados da minha cabeça e me penetra
sem fazer rodeios, a sensação me esquenta, subo com a força penetrante,
meus seios pulam quando ele faz de novo e gemo. Não me machuca, pelo
contrário, me dá prazer, muito prazer.
Eu o beijo me movendo com ele, tentando acompanhar seu ritmo,
Noah mete com força, e meu corpo o recebe perfeitamente, estou tão úmida,
sorrio com as ondas de prazer que vem dos pés a cabeça, e Noah morde
meus lábios enfiando a língua na minha boca.
Puxa a minha perna pra cima e começa a estocar com mais força,
minha cabeça sai pra fora da cama e observo tudo de cabeça pra baixo,
meus cabelos caindo da cama, ele beija meu pescoço e desce para os meus
seios, tudo se espalha dentro de mim, calor, um frio intenso na barriga,
parece que os meus pés queimam, e assim do nada, ele me puxa me
beijando, me encolho recebendo sua intensidade, seu olhar no meu, sua
paixão estampada em seu semblante, em seus olhos, em sua boca.
Ele geme baixo assim como eu, e continua me provando, um prazer
que nunca senti na vida, algo forte, primordial, intenso, tudo, mal consigo
suportar a sensação de ser preenchida, me apoio nos cotovelos e meu corpo
todo treme, minhas cochas estremecem e minha virilha lateja, Noah sai e
escancara minhas pernas me abocanhando, não oprimo o grito, ele me
lambe sem um pingo de receio, sem vergonha, e eu gozo em sua boca.
Sua língua me percorre toda do começo ao fim e ele enfia o dedo
dentro de mim, ele separa as dobras da minha carne e se debruça chupando
o local lentamente, a língua é quente e rápida, a carícia me provoca um
orgasmo mais violento que o outro e sinto uma necessidade gutural de me
esfregar nele pra matar a ânsia, ele segura meus quadris na cama, pois
percebo que a força me obriga a subir com eles pra cima, o dedo dele é
rápido e minha carne treme por dentro.
— NOAH! — estou gritando — POR FAVOR...
Ele morde os lábios íntimos e beija a virilhas com cuidado, depois
abre as minhas pernas e as ergue, descendo até minha entrada, e faz amor
com a língua lá, me contraio recebendo sua língua quente e experiente...
perco o fôlego, e o sangue que percorre as minhas veias está muito quente,
me queima toda.
Não consigo me controlar, me livro dos sapatos com os pés, e com
o pé direito, empurro-o para longe de mim pelo ombro, Noah cai sentado na
cama e tem um sorriso maldoso nos lábios.
— Calma, Sam!
— Que calma?
Quero matar a vontade que me consome.
Quero matar o desejo nos olhos do homem que amo.
Subo em cima dele e me sento em sua ereção ficando de joelhos na
cama, eu o beijo sentindo o meu gosto, sua boca é deliciosa e quente, e os
meus quadris se movem rapidamente em cima dele, rebolo sentindo-o todo
em mim enquanto subo e desço, Noah aperta a minha bunda com força e
suas mãos arranham minhas costas suavemente, as sensações não saem de
mim, e deixo seus lábios permitindo que chupe meus seios, meu corpo todo
estremece de prazer nesse momento, e aperto os olhos pra mais uma onda
de orgasmos intensos.
Isso é muito bom.
Isso é muito delicioso.
Empurro-o na cama me entregando ao prazer, acelerando, meu
corpo encontrando o dele perfeitamente, meu encaixe, meu amante, meu
marido. Noah me move com mais força e sinto-me presa a ele por alguns
instantes, mas apenas como se fossemos nós dois, únicos nesse mundo.
A conexão perdura e não escuto nada, não vejo nada, meu olhar está
nos olhos dele, pele com pele, corpo no corpo, coração com coração. Noah
estremece.
Olho para baixo e eu o vejo desfrutar de um gozo rápido, forte, e
enquanto subo e desço também gozo, e rebolo até que não consiga mais,
depois caio em cima dele vendo algo que me lembra de focos brilhantes.
Noah respira com dificuldade, ele esta arfante, eu também, mas nossos
quadris ainda se movem no fim do prazer, o clímax tomando-o todo, fecho
os olhos, e sorrio, me ergo juntando forças nos braços, eu o beijo
lentamente, Noah me dá um tapa forte na bunda e eu adoro isso, e o nosso
prazer se torna um só.
LAR DOCE LAR
— Essa foi ótima!
— É melhor do que comer!
Noah ri, e fico envergonhada com a minha resposta, estamos
soados, essa já é a terceira vez no dia, acho que até os funcionários do hotel
nem chegam perto do nosso chalé de tanto que gritei e Noah também. O sol
começa a se pôr e uma brisa leve entra em nosso quarto.
Não saímos da cama por nada e pra nada, e eu acho que quem quer
que tenha tentado se aproximar do nosso chalé, se afastou quando ouviram
nossos gemidos, apesar dos chalés serem bem divididos e afastados, mas
prefiro assim, gosto assim, o dia foi extremamente maravilhoso.
Descobri que tenho um marido cheio de safadeza, Noah tem uma
experiência fora do comum, e ele não é o tipo de homem que tem frescura
na cama, o que ele tem de fofo ele tem de safado, a todo o momento
estávamos descobrindo também nossos corpos, nos tocando, me permiti
mais e mais, queria prazer, Noah me quer e eu o quero, e não sinto que
tenha feito nada de errado, somos casados.
Estou deitada de bruços e ele deitado em cima de mim, fizemos
sexo e eu fiquei de quatro, não tive vergonha, não havia medo nem receio
em mim de parecer gorda ou fora do padrão, nem medo de que ele reparasse
na minha celulite, Noah estava focado em outras partes do meu corpo.
Da segunda vez, ele fez devagar, fiquei de lado e ele me tocou
durante todo o amor, me beijou, e me cobriu de palavras carinhosas, me
sentia protegida, zelada, também o chamei de amor e me via sorrindo com
ele, havia muita cumplicidade e lentidão no nosso amor.
Então dormimos, e quando eu acordei, ele me cutucava com a
varinha mágica dele, há pouco estávamos de novo fazendo sacanagem,
Noah adora sexo oral, não me deixou chegar perto dele, mas não me largou,
ele fez de mim seu pequeno objeto de tortura, e eu ainda não sei explicar
bem todas as limitações que tinha quanto a isso, por que cada uma das três
vezes eu percebia meu corpo totalmente entregue ao prazer.
Não é que das outras vezes não tenha sido bom, mas é que dessa
vez eu não me sentia travada, nem com medo, por que por mais que antes
eu me entregasse, não estava completamente entregue a ele, depois que ele
decidiu fazer amor com o que eu mais gosto, me virou na cama e me deu
uns tapas na bunda, acho que a minha bunda está vermelha, e por acaso
isso, foi há alguns instantes atrás.
Fizemos amor assim, muito rápido, muito selvagem, estávamos nus,
Noah me possuindo e me apertando os seios com força, me dando
experiências que nunca vivi na vida e que não quero viver com mais
ninguém além dele.
Ainda sinto que iremos nos descobrir muito mais nesse sentido.
— Amor!
— Hummmm...
— Você é fantástica.
— Sou?
Apoio-me no cotovelo, Noah está deitado de costas, ainda estamos
soados; observo sua nudez, ele é sem dúvidas, um homem fantástico
também.
— Sim! — Ele sorri e me olha, estou de bruços, depois de alguns
instantes parece receoso — Não vai se afastar de novo certo?
— Não, — respondo e engatinho até ele — não mesmo!
Não darei esse gostinho à mãe dele.
— Você é linda meu amor.
— Eu sei!
Meus cabelos caem de lado enquanto colo a testa na dele, eu o
beijo, Noah me corresponde apertando meus quadris e me abraça com
força.
— Te amo meu amor, muito mesmo, Samantha, não duvide mais
disso.
Tudo aquilo nos magoou profundamente, sofri muito, mas o Noah
também sofreu, parece que faz muito tempo, mas foi há alguns dias.
Vivemos muitas coisas num período de duas semanas.
— Ficou pra trás. — respondo e sorrio — Acho que devemos tomar
um banho e ir para o hotel, sua mãe quer cantar os parabéns.
— Não queria ir!
Nem eu mas...
— Meus pais estão aqui, Sabrine também, seria uma desfeita.
Noah me beija e faz que sim, depois me afasto e me estico, as
minhas virilhas doem, meus braços também, mas eu não ligo. Se eu for
sentir essa dor depois do amor, quero sentir sempre. Ergo-me e me sento na
cama, Noah me abraça por trás e me puxa de volta, sorrio enquanto ele abre
as minhas pernas.
— Você não vale nada, Baltimore! — Mas a minha voz está
mergulhada no desejo.
— Me chame de amor, querida.
Não falo, já estamos nos beijando novamente, já estou me
entregando ao meu marido, ao meu amor!

O jantar de aniversário estava perfeito.


Nesse sentido, não tenho nada a falar de Sara.
Ela organizou tudo para que todos nós nos sentíssemos bem,
comemoramos o vigésimo oitavo aniversário do meu marido em alto mar,
no iate que o hotel aluga para alguns hóspedes. Havia funcionários nos
servindo e o sorriso não saia dos lábios do meu marido.
Noah e eu não nos desgrudamos.
Ainda que Sara tentasse muito ser o centro das atenções, ela foi
ignorada por nós dois, Sabrine ficou super feliz, assim como meu pai e
Arthur, mamãe então, nem se fala, acho que estes dias tem sido os melhores
dias da vida dela e de papai.
Após o jantar, composto por saladas e frutos do mar, cantamos
parabéns, os funcionários nos entregaram chapéus, aqueles de papelão
coloridos e velinhas na hora do parabéns, nesse momento, vi o meu marido
tão feliz que me emocionei, estávamos reunidos com nossas famílias e
apesar da apatia de Sara por mim, e de todo climinha, ele realmente estava
transbordando de felicidade, eu também!
Cantamos parabéns pra você juntos, Sara e Arthur ao lado dele
com Sabrine, papai filmou tudo, enquanto eu e mamãe ficamos do lado da
mesa batendo palmas, mas eu percebi que acima de tudo Sara ama muito
ele, ela o tratava como sempre o tratou em seus aniversários de infância,
aquela foi à primeira vez na viagem que eu me lembrei dos dias de quando
éramos pequenos, dos sorrisos de Noah quando estava ao lado dos pais, e
via naquele momento o mesmo sorriso arregalado e feliz que não via há
anos.
Ele ama seus pais, até mesmo Arthur que não é seu pai biológico,
Noah os respeita, e eu, apesar de tudo, jamais o colocaria contra Sara e
Arthur. O que eu tinha pra resolver com ela eu já disse, se ela insistir em
tentar atrapalhar nosso casamento eu realmente terei que isolar ela
totalmente da minha vida, não é algo que quero, porque prefiro resolver
tudo pacificamente, mas com a minha nova sogra as coisas não funcionam
assim ao que me parece.
No final da noite voltamos pra ilha e me despedi dos meus pais e
dos King, mas Sara manteve distância, e eu respeitei, é claro. Ainda que me
sinta próxima de Sabrine e de Arthur, antes que fossemos para o nosso
chalé, mamãe me chamou num canto e conversamos um pouco; ela me
disse que Noah a procurou há alguns dias pra falar do novo tratamento, me
via abraçada à mamãe e com receio de falar daquilo, mas ela estava
renovada e cheia de esperanças, então também concordei, pois confio em
Noah e sei que ele quer o melhor pra ela, depois disso ela me apertou e foi
encontrar papai no tablado.
Fui pro meu chalé, onde Noah e eu encontramos intimidade e uma
noite cheia de surpresas, lhe dei meu presente, e ele pareceu bem surpreso
quando me viu saindo do banheiro usando uma lingerie preta com cinta
liga, e segurando um chicote pequeno, me sentia mais ousada que nunca.
A nossa noite foi maravilhosa.
Mal dormimos, mal conversamos, só estava muito ansiosa pra ter
aqueles momentos com ele; no final da noite, quando já estava
amanhecendo, pulamos na água gelada e natural do mar e nadamos me senti
livre, liberta, de alguma forma como se deixasse tudo pra trás, começaria ali
com Noah, uma nova fase das nossas vidas.
Nadamos nus.
E eu não tinha um pingo de medo de que nos vissem pelados ali,
fizemos amor ali mesmo e depois subimos pro nosso chalé, acabei
dormindo sorrindo na sala.
Os dois dias seguintes foram bem tranquilos, mas com o retorno pra
Charlotte começamos a organizar algumas coisas, fizemos um passeio em
família na tarde de ontem, no dia anterior jantamos num dos barcos do
hotel, conheci um pouco mais Arthur King; ele adora pescar nas horas
vagas e é um empreendedor de sucesso e é simpático, agora, com Sara foi
entediante, só falava de moda pra mamãe — como se ela entendesse — e de
revistas, de ensaios, tendências... Sabrine era a mais divertida, na noite de
ontem, após o jantar ela me arrastou para o karaokê do hotel, nessa época
do ano o lugar é meio vazio, mas arrancamos gargalhadas dos casais e
famílias que ali estavam.
Depois ficou ainda pior quando papai e Arthur começaram a cantar,
mamãe nem se arriscou, o melhorzinho da noite foi o meu marido, ele
estava lindo cantando "Lonely" do Akon, e eu enxergava que algumas
mulheres o olhavam sim, apesar de Noah ter no dedo duas alianças de
casamento, mas nem me importei, eu sabia que ele era meu. Que ele É
MEU!
Acabamos de chegar em casa.
E sentir o cheiro do meu novo lar é divino.
Mamãe já foi logo pra cozinha, papai carrega as malas, — ele
pegou tanto sol que parece mais uma lagosta — Noah o ajuda. O percurso
até aqui foi marcado pelas mesmas tagarelices de Sara, eu tentei isolar ela o
máximo possível, tudo bem, entendo que esse é o seu mundo, mas ninguém
é obrigado a ficar a ouvindo falar de modelos raquíticas e tendências. Por
fim, o Noah se estressou e soltou um:
— Mãe chega! Pelo amor de Deus, cala a boca!
Acho que não fomos somente nós que agradecemos quando ela se
calou, algumas pessoas que estavam na área VIP do avião também
pareceram agradecer! Sara ficou sem graça, ainda que eu não tenha me
sentido feliz em vê-la constrangida, foi um alivio não ter que ouvi-la mais
falando de moda, roupas, moda, modelos, moda, enfim... coisas que não me
interessam.
Olho ao redor e suspiro. Parece que passaram meses desde que
saímos daqui, mas enfim, em Charlotte! Noah desce conversando com
papai sobre a reforma, e eu sei que logo, logo meus pais voltarão para casa
deles, contudo, quero aproveitar esses dias com eles, com mamãe
principalmente!
— Sam, Noah, Samuel... CAFÉ!
Papai vai à frente reclamando, mamãe não deveria fazer tanto
esforço, e Noah vem ao meu encontro me puxando pra ele, nos beijamos.
— Mais tarde vamos estrear a cama como se deve amor!
Sorrio, minhas bochechas queimam, mas não sinto muita vergonha,
arrumo a gola da camisa dele.
— Lar doce lar, meu amor!
SEM MEDO
— Amor! — Dou um pulo.
Noah entra no banheiro pelado, sinto minha face vermelha. Ele
acabou de acordar, isso é muito natural pra ele, mas me sinto um pouquinho
constrangida.
— Bom dia amor!
— Bom dia, Bolinhos.
Ele vem na minha direção e me dá um beijo na cabeça, depois abre
a tampa do vaso ao lado e coloca a mão na parede, eu o observo em sua
rotina matinal, algo que jamais fiz com outro homem.
— Você vem pra King comigo?
— Preciso resolver algumas coisas antes.
— Que coisas?
— Conversar com os meus pais, também quero que mamãe
descanse um pouco. Que dia veremos o seu amigo?
— Quinta.
Em dois dias, fico satisfeita.
— Queria que viesse comigo para conhecer o cargo, o trabalho, o
que acha?
— Ocuparia o dia todo?
— Não, talvez no máximo duas horas, também tenho uma reunião
antes do almoço.
Noah não sabe que eu odiaria ver Donatela na empresa, quanto a
isso ainda não sei como lidar dentro de mim, não seria nada legal estar com
Noah e dar de cara com ela, quero evitar ao máximo a situação.
— Sam?
— Acho que posso ir, vou falar com mamãe!
— Está bem, fique a vontade pra ver o que fica melhor.
Noah me deixa realmente feliz com sua forma de fazer as coisas,
ainda que seja um teimoso em alguns sentidos, em outros ele é muito
tranquilo. Ele vai para o box e eu observo-o através do vidro transparente,
de costas pra mim tem um homem esplendido tomando banho, o corpo que
eu adoro, do homem que conheço por toda a minha vida, há um tempo foi
meu melhor amigo, hoje ele é o meu marido, meu amante... a cama ontem
foi muito bem estreada, também estou nua.
Saio do meu pequeno transe quando Noah se vira, levanto e vou pro
box, gostaria que ele ficasse mais um tempinho comigo, curtimos a nossa
lua de mel muito pouco, a série de desentendimentos entre nós dois por
conta das revelações nos lotou, e eu o afastei muito, agora é que sinto que
nos aproximamos de verdade, da forma que nos permitimos nos conhecer
realmente, na cama e fora dela, Noah mudou um pouco desses dias pra cá,
percebo um lado dele tão intenso que mal sei descrever, acho que antes ele
tinha receio de me mostrar esse seu lado, vergonha de algum julgamento,
mas eu adoro, principalmente o jeito como ele me trata na cama.
É safado, tem a boca é suja, e ele fala umas sacanagens que me
tiram do sério, é um homem realmente diferente do homem com quem
dormi mês passado, alguém que começa a se abrir comigo completamente.
Entro e ligo o meu chuveiro, ele me puxa e vou sorrindo, quando me beija
eu o correspondo, e eu o toco sentindo sua rigidez entre os dedos.
— Pensei que não viria me dar um bom motivo pra não ir trabalhar
hoje, senhora Baltimore!
Sorrio cheia de malicia.
— O senhor leu meus pensamentos, senhor Baltimore!
Quero que Noah seja realmente verdadeiro comigo, que me mostre
o quanto tudo isso é parte de seu mundo, mas principalmente ele entenda
que eu não tenho mais receio ou vergonha de meu corpo. Eu adoro que ele
me observe, por que isso me inflama toda.
Beijo seu pescoço e seu peito, e a minha boca vai descendo para sua
barriga, e quanto mais eu o beijo eu o toco, vendo-o enfiar os dedos nos
meus cabelos; Noah quer muito isso, acho que ele não quer me forçar a
nada, mas sei que ele deseja compartilhar tudo comigo.
Minha língua toca sua pontinha e escuto um gemido baixo, fico de
joelhos sentindo a carícia leve na cabeça, é tão gostoso o jeito como ele me
trata, me toca, ele é muito carinhoso comigo. Eu o seguro e o coloco em
minha boca, e começo a lhe dar prazer com ela, toco sua bunda enquanto eu
o chupo, e sinto que seu prazer também me enche de prazer, não consigo
enfiar tudo... — Ty tinha razão, porque antes eu nunca havia percebido o
quanto o meu marido é grande!
Massageio-o enquanto chupo, Noah perde o ar algumas vezes, mas
acho que faço certo, ele move os quadris em direção a minha boca e
permito que entre mais e mais, fecho os olhos e beijo mais embaixo
ouvindo-o gemer mais alto, toco suas coxas, e lambo sua virilha.
— Amor...
Volto pra sua ereção e coloco-o na minha boca novamente, ergo o
olhar e ele afasta meus cabelos pra trás, seus olhos estão com uma
intensidade diferente, sua boca força um "o" sacana, e ele geme baixinho,
eu o olho enquanto movo a boca nele, enfio o máximo que consigo e sugo
com força, por alguns instantes ele parece perder o ar, e depois tenta me
afastar, mas eu o puxo com meus lábios vendo-o se tremer todo, isso é forte
e quente, mas engulo, depois de alguns instantes quando ele se acalma me
ergo, e Noah me beija cheio de paixão.
Abraçamo-nos e ficamos assim por minutos extensos, apenas eu e
ele em nosso pequeno mundo.
— O que foi? — Noah pergunta depois de alguns momentos, me
afasta um pouco e me fita — Você quer me dizer algo?
— Não quero ir à empresa e dar de cara com ela, — confesso
incerta — me sentiria muito mal.
— Donatela será transferida, ela não está indo a empresa mais.
— Ela disse quando virá ver mamãe?
— Acredito que ainda esta semana, não tenho contato com ela,
apenas conversei naquele dia.
Não sei mais o que pensar. Sentia-me tão ferida, contudo, percebo
que isso mudou completamente as nossas vidas, mas principalmente a de
Donatela, ela terá que partir, ela terá que ir embora, não queria isso, mas
não confio mais nela.
— Pode pedir pra ela vir hoje, enquanto estivermos na empresa,
então.
— Está bem, vou pedir a Clarissa que ligue pra ela e fale sobre isso.
— Obrigada Noah, por entender.
— Eu realmente peço desculpas por isso, Sam. Por te submeter, eu
jamais pensei que uma situação assim aconteceria.
Nem eu.
— Vou me vestir, preciso secar meu cabelo.
Beijo ele por mais alguns instantes, Noah escorrega a mão até o
meio das minhas cochas e me toca com carinho.
— Quero essa coisinha na minha boca mais tarde!
— Claro, mas primeiro negócios, depois prazer.
Noah suspira e me solta erguendo os braços.
— Estraga prazer.
Enxaguo-me rindo, me lavo e Noah lava o cabelo dele, depois saio
do box, alguns momentos depois me seco e vou para o nosso pequeno
closet, acho que alguma empresa de mudança providenciou nossa mudança,
pois tudo está arrumadinho, decido colocar uma das minhas roupas novas,
— suspiro — hoje será um dos muitos dias que começarei minha nova
vida ao lado de Noah, um novo emprego e novas esperanças; desejo acima
de tudo que eu consiga ser forte pra enfrentar tudo o que ainda virá. Eu sei
que Sara não vai se dar por vencida e tem a doença de mamãe tudo mais,
mas eu não vou desistir de tentar ser feliz, não apenas por ela e todo o resto,
mas principalmente por mim.
BOAS DECISÕES
Acabei decidindo não ir com o Noah. Quando ele saiu do banheiro
avisei que preferia ficar em casa, Noah não questionou o motivo nem disse
nada, e quando nos despedimos depois do café, eu o acompanhei até a porta
e nos beijamos. Ele sabia que eu iria esperar que Donatela viesse visitar
mamãe, não queria parecer uma maníaca ciumenta. Tentei colocar todos os
meus pensamentos em ordem, até o momento que ouvi o som da
campainha... ela havia chegado para o almoço.
Estava ansiosa e preocupada, até que desci e vi mamãe sentada na
sala, e havia um sorriso imenso nos lábios dela, mamãe estava usando o
presente que deixei em sua cama no dia de meu casamento.
Milhões de coisas me vieram à mente quando vi Donatela sentada
no sofá, de mãos dadas com a minha mãe. Alguém que confiei e que
aprendi a amar num pequeno espaço de tempo, e que minha mãe com
certeza amava de verdade; uma verdadeira amiga pra minha mãe com
certeza.
E quando nossos olhares se cruzaram tudo o que havia ali, pra mim
pareceu algo tão... estranho.
Não conseguia imaginar Noah com Donatela, nem vice e versa. Ela
me olhava com tanto medo e receio que até acho que mamãe havia notado,
mas eu sorri, pois estava muito feliz em ver minha mãe com o presente,
bem vestida e maquiada, qualquer coisa que desarmasse o sorriso de mamãe
também me magoaria, essa seria uma nova fase na minha vida e na vida de
mamãe.
Logo me juntei a elas, fiquei um pouco nervosa no começo, mas
depois eu estava tentando realmente entrar no assunto, via mamãe super
empolgada com seus novos cabelos, cortei meu cabelo e pedi que fizessem
uma peruca pra ela com os fios, com direito a franjinha que ela tinha e tudo,
— a peruca é tão perfeita que parecem mesmo os cabelos de mamãe! Mais
compridos é claro! — Donatela a todo o momento sorria e a abraçava.
Lógico! Estava se preparando pra dar a notícia, eu sentia ao mesmo tempo,
que aquilo seria o melhor pra mim, mas que com certeza seria péssimo pra
mamãe, por que naquele instante eu sabia que mamãe queria todos que
amava por perto, inclusive Donatela, que me escondeu coisas que me
arruinaram, me destruíram e me magoaram, mas que nada tinha a ver com a
minha mãe.
Não parecia justo... e não era. Donatela fez parte de um passado que
teve com Noah, e aquilo acabou, e agora ela fazia parte do presente da
minha mãe, que era algo muito importante pra ela, pras duas.
Senti-me traída, mas nunca fui egoísta; aquilo não se tratava apenas
da minha felicidade, mas da felicidade de outras pessoas. Eu me magoei
muito, e tudo aquilo quase destruiu meu casamento, pensei tantas vezes em
abandonar tudo, e a única coisa que me veio a cabeça foi a minha mãe.
— Mãe, a senhora não quer ir buscar um café? Talvez Donatela
queira mais uns biscoitos!
— Ah, claro! Que indelicado da minha parte, com licença amiga.
Donatela tornou-se ou voltou a se tornar, muito mais que uma
amiga pra minha mãe, ela era como uma irmã pra ela. Quando mamãe saiu
da sala, ela parecia prestes a chorar, mas esta não era minha intenção, eu sei
que o Noah fez tudo motivado pelo meu rancor, minha mágoa. E eu também
não confio mais nela, mas é injusto que ela vá embora assim, só por causa
disso.
— Não diga pra ela que vai embora. Vou conversar com Noah pra
ele te arrumar um emprego em alguma empresa aqui na cidade.
— Não era a minha intenção, Sam...
— Eu entendo que não era intenção sua, nem que você não me
devia satisfação da sua vida.
— Eu sabia que destruiria nossa amizade pra sempre.
— Destruiu.
Havia muita dor no olhar dela.
— Peço perdão Sam, foi tudo apenas um acaso do destino. Noah e
eu... jamais o veria diferente hoje, é algo que ocorreu no passado.
— Eu entendo. Mamãe precisa muito mais de você do que pensa,
peço que não fale da transferência, seria um duro golpe pra ela.
— Não posso ficar. Sinto-me envergonhada por tudo.
Olhei-a no fundo dos olhos e senti vontade de chorar, porque tudo
aquilo o que aconteceu na ilha não foi culpa de Donatela, mas
consequências do que ela viveu com Noah.
— Você não terá contato comigo Donatela, logo mamãe voltará pra
casa dela, quero que você a visite sempre. Ela começara um novo
tratamento e precisa de uma amiga de verdade.
— Imagino que sim, mas...
— Vou falar com o Noah, ele vai te arrumar um emprego em
alguma empresa boa da cidade. Só quero que saiba que não me sentiria bem
se você permanecesse na King, seria muito ruim te encontrar na empresa.
— Eu entendo.
— Eu sei que é errado o que eu faço, mas preciso de um tempo pra
me situar, e ficar olhando pra você, sempre vai me magoar muito.
Escutei os passos de mamãe e guardei pra mim o assunto.
Donatela pareceu entender o que eu queria, e então novamente eu as
deixei conversando, e não senti como se aquela fosse a pior decisão da
minha vida.
Confio em Noah, mas não confio em Donatela, ainda que ele
também tenha culpa, muita culpa! Eu consegui compreender sua posição
em tudo. Talvez eu estivesse agindo errado por decidir banir ela da minha
vida, mas então me lembrei de que apesar de tudo ela era amiga da minha
mãe, e que nos meses anteriores aqueles, ela nunca esteve próxima do Noah
mais que o suficiente, eles nunca deram indícios de que havia algo durante
os preparativos pelo casamento, mas ela não tinha direito de querer ser
minha amiga depois de tudo...
Enfim, eu estava confusa, subi para o meu quarto e lá fiquei o resto
do dia, senti um pouco de cólica no fim da noite e bebi um remédio, por fim
dormi, não queria ficar pensando naquilo.
O Amor É o Mais Importante
Olho ao redor.
Espero Noah sair de uma reunião que está tendo com alguns
diretores.
Ontem eu não o vi direito.
Lembro que acordei e ele estava deitado ao meu lado me abraçando,
depois voltei a dormir, quando acordei hoje cedo, ele havia deixado um
pequeno bilhete dizendo que precisava resolver coisas importantes na King.
Acredito que estava cansada devido à viagem, pois não estava
habituada, a cólica passou e a minha menstruação desceu, mas muito pouco.
Hoje cedo quando levantei não sentia mais dor, não havia parado pra contar
os dias, mas desceu mais cedo, o anti concepcional desregulou tudo, ou não
sei, liguei pra médica hoje cedo.
Papai acompanhou mamãe ao médico para sua última sessão de
químio, ela parecia empolgada. Amanhã será sua primeira visita ao médico,
amigo do Noah, mas antes disso ela precisava dessa dose do medicamento.
Combinei com papai hoje cedo de que será ele quem ficará
responsável por acompanhar mamãe às consultas e tudo mais; ele não achou
ruim, se preocupa com mamãe.
Eu disse que ao invés dele trabalhar, eu ajudaria com as despesas de casa
com o meu salário. — Nada mais justo, pois ele não poderá mais trabalhar
pra fora até que tenhamos algum retorno do novo tratamento.
Claro que estou ciente dos riscos, mas prefiro não pensar nisso,
quero ver como mamãe reage ao tratamento com células tronco.
Ele tem uma secretária chamada Clarissa que me recebeu super
bem, ela já me trouxe cafézinho duas vezes e me trata como se eu fosse
alguém extremamente importante. E eu me sinto importante. Acordei e vim
pra King, entrei pela porta da frente, dos executivos, e logo de cara já me
veio a mente várias ideias, coisas novas... bem, não sei se o Noah me dará
ouvidos, mas eu conheço bem o outro lado. Vi Lupe na recepção e dei um
abração nela, fazia tempo que eu não a via, ao mesmo tempo, as
recepcionistas me olhavam com carinha de nojo.
Só foi o tempo de eu ir lá e dizer que eu era a esposa do Noah, logo
que falei meu novo sobrenome, uma delas já me conduziu ao elevador e me
deu um novo crachá, acho que não me reconheceram, pois a última vez que
estive aqui foi para ir ao Rh e usava roupas menos sofisticadas, hoje vim
um pouco melhor.
Pensei bastante em Donatela, em tudo o que falamos e não me
arrependo da decisão. Logo mamãe estará na casa dela, morará com papai e
precisará de uma amiga, alguém que a visite sempre, eu irei todos os dias
ou darei um jeito de ir vê-la, quero que mamãe se sinta querida e amada, ela
precisará muito de todo apoio possível.
— Como eu disse reagende à visita de Brigs...
Escuto a voz de Noah, quando me viro ele fica me olhando de cima
abaixo, sua secretária, Clarissa, muito bem vestida, está ao lado dele — é
ela é muito magra e bonita, mas eu não ligo muito pra isso, vim à altura.
Sequei meus cabelos, passei uma make básica, coloquei um
vestidinho estampado, calcei um par de botas cano baixo de cadarços, e
vim. Beth havia dito que, para eu ficar sexy, tinha que usar uma jaquetinha
de couro preta por cima, então vesti. Sigo as dicas de moda que ele me deu
quando inseriu as roupas nas minhas malas, naquelas compras que fiz antes
do casamento. Sentia-me bem e bonita quando mamãe me elogiou, mas
antes, quando me olhei no espelho, eu estava sorrindo feito boba, porque
me sentia linda! É muito bom descobrir que apesar de não ser perfeita aos
olhos dos outros, a gente é realmente bonita, mas apenas pra nós mesmas.
Nunca me valorizei antes, agora me sinto bem mais arrumada e
animada com minha aparência.
Noah usa terno, gravata, sapatos, e um relógio daqueles bem caros
no pulso, mais sexy e lindo que nunca!
Sinto o peso de seu olhar, tão logo ele olha para as minhas pernas, claro que
a minha intenção era valorizar o que eu tenho de mais bonito, as pernas e a
bunda, o vestido é soltinho em tons de preto com florzinhas brancas.
— Algo mais senhor King?
Senhor King?
— Não Clarissa. Não quero que me incomodem também.
— Sim senhor, com licença.
Clarissa sai feito um foguete do escritório. Ando pelo lugar
lentamente, vendo que Noah acompanha cada passo meu com atenção.
— Gostei da sua sala senhor... King — falo seu último nome com
um certo ar de superioridade.
— Será sua sala também. — Noah enfia as mãos dentro da calça —
Tudo bem?
— É um lugar espaçoso. Eu também gostei muito da sua mesa —
lentamente me aproximo da mesa dele —, a vista aqui é incrível.
Tem alguns janelões com vista para a cidade, a sala é realmente
sofisticada e muito bonita, tem um aquário — eu sei que ele ama esses
peixinhos coloridos — e sofás mais ao lado, pinturas, e na mesa do Noah
um notebook com um mouse, a poltrona dele é preta e grande, todo o
ambiente bonito e que deixa claro um certo ar de imponência.
— Não me avisou que viria querida...
— Queria te fazer uma surpresa!
Acho que o Noah está com medo, porque sabe que ontem Donatela
esteve na nossa casa, e acredito que como ele não tem contato com ela,
deva estar pensando que brigamos ou coisa assim, eu e ele não
conversamos. Toco a mesa de Noah com a ponta dos dedos enquanto me
aproximo de sua poltrona, então me sento no acolchoado confortável, Noah
se aproxima e assim muito de repente, se ajoelha diante de mim.
— O que foi Sam? Vocês conversaram? Brigaram? Deveria deixar
isso pra trás, eu realmente peço perdão por tudo! Não havíamos concordado
em esquecer? Você nem me esperou ontem para o jantar. Eu me enrolei todo
aqui e não deu pra ir antes, fiquei muito preocupado com tudo.
Fico olhando para ele e vejo-o tão... triste!
— O pior sentimento é o de culpa. Eu sei que eu falhei, mas quero
recomeçar com você, o que eu vivi com Donatela ficou pra trás. Nós dois
nem amizade temos, eu só quero que saiba que independente do que você
decidiu depois de falar com ela, eu não vou permitir que queira se separar
de mim, estávamos indo tão bem!
Ergo uma perna e depois a outra e coloco em cima dos braços da
poltrona puxando o vestido pra cima, Noah arregala os olhos,
completamente incrédulo.
— Acho que esqueci a calcinha em algum lugar do closet amor!
Noah puxa a cadeira e parece cego ou algo assim, depois ele se
inclina e me beija o meio das cochas com força, sorrio mais que surpresa, e
minhas mãos se enfiam em seus cabelos, ele afrouxa a gravata e eu sei que
ele vai adorar a minha surpresa.

— Você vai pra casa comigo?


— Claro.
Estamos deitados no sofá do escritório, ambos nus. Noah está em
cima de mim, ele faz caracóis com as pontas dos meus cabelos, acabamos
de fazer amor aqui e não tenho vergonha disso. Sorrio quando ele mordisca
o bico do meu seio, ele sabe como me arrancar sorrisos depois desses
momentos loucos que descobrimos um com o outro.
— Gostou da surpresa?
— Sim, quero várias surpresas dessas quando vier trabalhar
comigo.
— Com certeza farei muitas destas surpresas.
Ele me beija, me paparica, também paparico ele e lhe faço carinho
na face, nos beijamos, temos uma sintonia muito melhor na cama depois de
tudo.
— Não briguei com Donatela, mas eu pedi que ela não fosse
embora. Disse que você vai dar as contas à ela e arrumará um emprego para
ela em alguma empresa da cidade. Mamãe precisa de todo amor e carinho
neste momento. Seria um duro golpe que sua única amiga fosse embora.
— Pensou bem nisso?
— Me senti idiota por exigir algo dela, sei que tiveram isso antes de
mim, mas pensei: poxa, ela não deveria ter organizado nosso casamento, ao
menos em consideração a tudo. Foi estranho.
Noah beija a pontinha do meu nariz com carinho.
— O que decidir eu apoio!
— Como consegue separar tudo?
Ele franze a testa bem surpreso com a minha pergunta.
— Bem, quer mesmo falar sobre isso?
Sinto-me pronta pra falar sobre o passado dele desde que decidi que
era com ele quem eu queria ficar nas Maldivas.
— Sim.
Não tenho medo, nem insegurança.
— Quando me envolvi com ela eu estava meio confuso. Nos
conhecemos na King, saímos algumas vezes e jantamos, mas não tínhamos
nada em comum, foi apenas algo que compartilhamos durante alguns dias.
— Entendo.
É difícil ouvir isso dele, mas é muito melhor que uma mentira, uma
omissão, contudo não me sentiria nada segura se me falasse isso nas
vésperas de nosso casamento, talvez eu desistisse e não compreendesse,
porque foi isso o que aconteceu quando eu soube.
— Não havia sentimento Sam, apenas saímos algumas vezes.
— Eu sei.
— Como você e o Ty, que namoraram, mas não se amavam tanto e
não são mais que dois amigos.
Ty!
Suspiro.
Sei que já passou da hora de falar a verdade pro Noah sobre o Ty,
mas preciso falar primeiro com ele, ao menos para deixar tudo claro antes
de parecer que ando falando sobre sua sexualidade pro meu marido, espero
muito que o Noah me entenda.
— Tudo bem mesmo, amor?
— Sim, claro! Eu adorei sua sala, você vai me deixar trabalhar aqui
com você?
— Claro. Você vai ter uma mesa só sua com suas coisas.
— E uma caneca da Pequena Sereia.
— Meu Deus, como você é lindinha minha Bolinhos.
Faço bico, Noah me beija, e decido me esquecer dos problemas, de
Donatela, de tudo. Não vou me preocupar com o passado, o presente é tudo
o que eu tenho: Noah. O amor que sentimos um pelo outro, tudo vai dar
certo dessa vez.
AS COISAS COMO SÃO
Nossa semana foi completamente lotada.
No dia seguinte a minha visita a King, levamos mamãe ao médico.
Ela não estava tão cansada, mas sim otimista. Fomos nós quatro, eu estava
muito satisfeita quando o doutor Cruise, amigo de Noah nos informou sobre
como funcionava o tratamento, como as células cancerígenas reagiriam, e
quais eram os efeitos colaterais. Papai ainda estava meio confuso, mas
mamãe disse que faria tudo o que pudesse para que tudo desse certo. Esse
tratamento não é muito diferente de uma medicação, porém, ele exige muito
mais cuidado com o paciente, mamãe ficará internada um número de dias
maior no hospital, então papai e eu revezaremos na semana para dormir
com ela, Noah inclusive, disse que ele mesmo poderia revezar conosco.
Todo o tratamento é uma série de coisas que incluem um tipo de
tratamento mais extensivo, logo de cara o médico falou sobre alguns efeitos
colaterais, mas não tão agressivos quanto à quimioterapia. Saímos de lá
mais esperançosos.
No dia seguinte eu e Noah acordamos cedo e fomos para King,
nosso primeiro dia juntos, não tive muita dificuldade em ficar ali atendendo
telefones, Clarisse me explicou sobre as pastas que eu deveria carregar para
a mesa do Noah e como funcionava o meu computador, me senti grata,
apesar de alguns momentos do dia Noah ir para algumas reuniões, eu soube
separar as duas coisas, ele é quem parecia que não sabia como separar!
Toda vez ficava tentando me agarrar, se esfregando em mim quando
estávamos a sós, em um dado momento eu não resisti e fugimos para o
banheiro dele, fizemos sexo ali, muito rápido, extasiados e empolgados.
Dizem que essa é a melhor fase do casamento, e eu acredito nisso,
pois foi assim quando chegamos em casa naquele dia, e no sábado pela
manhã. Ficamos com meus pais no sábado à tarde, mas logo que fomos para
o nosso quarto, estávamos como dois coelhos, transando ainda de roupas.
Me sentia torturada no domingo de manhã, quando acordei e o Noah estava
montando em mim e fazendo sexo comigo lentamente, nosso domingo
também foi em família.
Aos poucos fomos nos habituando a pequena rotina, e os dias foram
se passando, acordávamos cedo, e depois de um banho íamos pra King, e
assim foi por mais duas semanas. Na primeira semana, papai nos avisou que
na semana seguinte ele e mamãe voltariam pra casa, então aproveitei o
máximo que podia com mamãe, fiquei tão pegajosa que ela várias vezes me
mandou sair de perto. Levei ela pro cinema à noite e saímos pra fazer as
compras do mês pras duas casas, compramos roupas pra ela, e logo tive que
lidar com o fato de que ela retornaria pra casa dela na semana seguinte.
Mamãe certa vez me deu colo, pois voltei a sentir cólicas de novo,
não entendia o que acontecia, meu anti concepcional acabou e a
menstruação não descia, só vinha uns risquinhos.
Na segunda semana, marquei com a médica à tarde. Sai mais cedo
da King, Noah não achou ruim, — alguns dias da semana anterior também
sai mais cedo para ficar com mamãe, e resolver as questões da casa — ela
me mandou suspender o anti concepcional, eu me atrapalhei toda quando
ela me explicou sobre meu período fértil, e ela me pediu exames de sangue,
sai de lá fazendo careta depois que a enfermeira me tirou dois cilindros de
sangue.
Na terça, meus pais me disseram que a reforma acabara, e eu fiz
cara de choro, mas mamãe prometeu que papai traria ela no sábado pra
almoçarmos juntos — acho que eles também querem voltar pra vida deles,
terem intimidade. Nunca estiveram tão unidos, mas eles também querem
sexo. — eu acho!
Na quarta meu celular tocou — depois de quase um mês sem
receber ligação de ninguém — eu o atendi, e a ligação mudou o meu dia.
Na quinta, eu estava com Noah arrumando motivos pra ele me levar
ao Beth na hora do almoço, ele não queria, mas eu precisava conversar com
alguém, e esse alguém não era exatamente o Beth. Ele me levou e ficou de
me pegar as sete. Me deu o resto da tarde de folga, prometi pra ele faria
lasanha.
Quando entrei na loja fiquei chocada ao ver o cara que sumiu da
minha vida no último mês, usando jeans largado e uma camisa masculina de
malha fria, ele conversava com Beth no balcão, mas era muito diferente do
homem afeminado que sempre conversou comigo, me aproximei na calada
e dei umas cutucadas nele!
Tyller Loockwood se virou e me olhou de cima abaixo, me
analisando toda, depois ele sorriu amigavelmente e me abraçou com força.
Eu o espremi vendo Beth fazer careta, obviamente que me aproximei do
Beth nesse tempo que o Ty sumiu.
Logo me despedi de Beth, expliquei que retornaria dali alguns
momentos, pois eu e Ty precisávamos conversar, ele não gostou muito, mas
deixou meu horário marcado com a prima pra depilação a laser e disse que
estaria me esperando.
Ty e eu fomos para um café ali perto e eu mal cabia em mim de
tanta felicidade, queria falar tudo o que acontecera, mas ele também parecia
mudado, diferente da última vez que nos vimos, não parecia tão nervoso ou
estressado.
— Dyanna está grávida, e ele é meu! — disse ele primeiro que eu.
Fiquei boquiaberta — Estamos juntos, estou tentando lidar com tudo.
— Entendo. — falei apenas, ainda mais curiosa — Você me
abandonou.
— Precisava de um tempo sozinho, tive tantas dúvidas da minha
sexualidade, acho que ainda sou gay, mas eu também me sinto muito hétero,
ultimamente tenho sido mais hétero que tudo, trouxe ela pra conhecer os
meus pais.
Eu não sabia se me sentia infeliz ou feliz por Ty, mas eu com
certeza percebia que ele não estava pedindo minha opinião, nem estava
infeliz, ele estava apenas... quieto.
— Dyanna não é uma pessoa ruim sabe, ela ainda é uma vadia
teimosa, mas nós estamos nos entendendo bem, ela precisa que o pai do
bebê esteja lá pra assumi-lo. E eu sou o pai, então decidi arcar com as
consequências dos meus atos.
— Me sinto culpada.
— Que nada, a culpada é ela, aquela oferecida sem escrúpulos! Não
pode me ver e me arrasta pra cama.
Percebia o mesmo tom um pouco descarado na voz do Ty, mas eu
via que ele estava bastante reservado e feliz, ele em breve seria pai.
— Estamos morando juntos, eu a acompanho nos desfiles dela,
todos já sabem que "namoramos". Tem momentos que dá vontade de matar
a vaca, mas você sabe, enquanto o meu filho estiver dentro dela não posso
fazer nada.
— Fico muito feliz por você, Ty. O que importa é ser feliz.
— Não fui ao seu casamento porque ela deu uma crise de ciúmes no
dia, precisava ver! Quando eu me lembro... dá vontade de matar.
— O amor é lindo!
— É, mas e o marombudo hein?
Fiquei vermelha e depois disso contei sobre tudo o que aconteceu
na nossa lua de mel, as descobertas, desde o momento da briga até o
momento da reconciliação, das insinuações de Sara e de como eu a
respondi, dos momentos em que tentei afastar o Noah, tantas coisas que
aconteceram... Ty basicamente xingou Donatela a todo momento, sentia ali
que tinha meu melhor amigo de volta.
Perguntei ao Ty, se ele se incomodava que eu falasse a verdade para
o Noah e sua resposta foi bem irreverente, depois disso, me despedi dele
com um abraço, e eu combinei que nos encontraríamos dali a uma semana.
Quando entrei no Beth, Ty estava acenando pra mim e entrando em um
carro novo. Dentro do carro a motorista era uma morena de olhos azuis, ela
fez uma careta pra mim, mas eu sorri, depois, de um jeito muito infantil,
Dyanna se inclinou e beijou Ty, me via surpresa em vê-lo correspondendo a
ela, mas decidi não julgar e nem ter algum tipo de estranheza, pois eu o
amava como ele era: meu amigo, hétero ou homo. Sentia que as coisas em
minha vida retornavam onde deveriam estar, e eu estava feliz da vida com
aquilo.
Quando entrei na loja do Beth, ele veio cheio de perguntas, suspirei,
e encontrei ali um novo amigo. Eu sabia que teria um resto de tarde bem
longo com ele, mas tudo o que importava era que as coisas estavam muito
bem.
NOVOS COMEÇOS
Mamãe começou o tratamento e logo eu, Noah e papai estávamos
na clínica onde ela ficou internada. Fiquei com ela a todo o momento
depois que foi pro quarto. Mamãe não tirava o sorriso dos lábios, depois da
primeira aplicação ela passou à noite toda em observação por enfermeiros
da clinica, o doutor Cruise nos visitou várias vezes durante o dia seguinte e
assim os dias foram passando.
Ela ganhou alta no fim daquela semana, reagiu bem aos primeiros
passos, o médico indicou descanso, mas não a proibiu de muitas coisas. O
tratamento não é muito diferente de uma internação pra quimioterapia, mas
não é tão pesado, é menos agressivo ao organismo de mamãe. O médico me
pediu amostras de sangue pra algumas pesquisas, não me neguei em dar.
Continuei a ir todos os dias com Noah pra King, nós saíamos todos
os dias mais cedo e íamos pra casa dos meus pais, a reforma foi muito bem
vinda, tudo estava muito bom, desde a pintura até a reestruturação da casa,
me sentia bem de saber que mamãe tinha conforto, estava bastante feliz
com o resultado, nossa casinha merecia aquilo.
Papai estava sempre cuidando de mamãe, zelando por ela, lhe
dando algo que o álcool lhe arrancou com os anos, um pouco do carinho
que ele não tinha, ele também conversou bastante com o Noah durante os
jantares na casa dos meus pais.
Enfim, entramos em outubro e eu acordei no primeiro dia do mês
com uma ligação de Sara. Inoportuna, pois era sábado, o primeiro dia de
folga que tivemos realmente depois que mamãe começou o tratamento.
Noah me abraçava enquanto se enfiava embaixo dos cobertores.
— Bom dia querida!
Eu não sou sua querida!
— Bom dia Sara!
Noah estava se livrando da minha calcinha e eu sorria em vê-lo
erguer a cabeça pra fora do cobertor, intrigado por saber que sua mãe ligara,
puxei o cobertor pra cima de sua cabeça e ele abriu minhas pernas
começando o delicioso sexo oral.
— Então...— eu me segurava com o prazer que sentia, meus seios
estavam latejando com o prazer que a boca do meu marido me dava.
— Quero convida-los pra meu primeiro evento da revista pra
coleção outono querida, vocês vêm certo?
Queria dizer que não, mas sabia que precisava consultar o Noah.
— Acho que posso falar com o Noah. — eu lutava contra vontade
de gemer, prendia a respiração subindo e descendo com seus beijos íntimos.
— Estaremos esperando querida, traga seus pais.
Depois disso ela desligou na cara de pau.
Joguei o telefone pra longe e puxei os cobertores para o lado,
vendo-o me chupar deliciosamente, apoiei meu pé em seu ombro e esqueci
Sara, me entregava aos orgasmos que ele me proporcionava. Era muito
melhor me concentrar na boca do meu marido do que na minha sogra
indesejada.
UM PRESENTE DE CASAMENTO
Sam me pediu pra sair mais cedo hoje.
Não me importo. Na verdade eu amo a minha vida de casado, ou a
minha nova vida, a senhora "M" parece reagir bem ao tratamento, o senhor
"M" também parece mais centrado, ele inclusive se ofereceu pra ficar
cuidando do nosso jardim, ainda que me recuse a aceitar, prefiro entender
que ele não quer que as coisas sejam assim tão de mão beijadas pra eles.
Estamos no começo de Outubro e tudo passou muito rápido, Sam
está comigo agora no escritório, mas foi embora mais cedo, disse que
passaria na casa dos pais pra checar se estava tudo bem, ela parece se
adaptar muito bem, e a bem da verdade, eu sei que estou casado com uma
mulher extremamente inteligente, ela trabalha bem com Clarissa e quando
não tem o que fazer sai na empresa checando outros departamentos, aos
poucos se mistura com alguns outros funcionários.
Acho que as coisas enfim começaram a dar certo pra mim e pra
Sam.
Vasculho em minha mente a última vez que estava tão feliz e só me
vêm lembranças da infância, em todas elas Sam estava lá, sorrindo,
banguela, me dando ordens, durona, e ao mesmo tempo, sendo a única
pessoa que me compreendia na face da terra, bem, acho que as coisas não
mudaram.
Ela trabalha fora meio período, mas cuida da casa, não temos
empregados, e até que pra três meses de casados nós dois estamos até nos
saindo bem.
A vida sexual...
Suspiro ao entrar no carro e me pego sorrindo. Não tenho
explicações, é uma surpresa a cada dia. Essa semana ela se enfiou embaixo
da minha mesa e quase me deixou louco, eu não sei quem anda dando dicas
pra Sam, mas espero que continue, ela anda fazendo umas coisas
maravilhosamente excitantes durante o sexo na cama.
Tenho que admitir que não consigo sair de perto, e não acho que é
porque estamos no começo, eu sempre quis ser assim com ela, sou homem,
acho que tenho alguma experiência, mas sempre quis uma intimidade maior
com a minha mulher, ela está menos envergonhada, e me satisfaz de um
jeito único na cama.
Adoro quando transamos na minha mesa, ou no banheiro, ou na
cozinha.
Em qualquer lugar com a Sam é maravilhoso!
Sinto-me tão imensamente feliz que não sei explicar isso, ela me
transmite tanta paz, tanto amor; sinto-me conectado a ela, mas não como se
fossemos apenas amigos, é algo tão forte e verdadeiro que só cresce dentro
de mim.
Graças a Deus nos resolvemos. Agora o mais importante é a minha
sogra.
Lily precisa muito melhorar, eu sei a importância dela na vida da
minha mulher, do meu sogro, e na minha vida, nos abalaríamos muito se
algo acontecesse a ela, Cruise foi sincero, me disse toda a verdade sobre as
chances, são poucas, mas promissoras, também disse aos pais dela e
separadamente pra Sam. Ela não quer que a mãe saiba que ela já sabe sobre
seu estado de saúde. Sam não quer que a mãe sofra ou se preocupe com sua
dor, eu sei que ela às vezes chora, já peguei ela chorando várias vezes, no
nosso banheiro, e não havia palavras em mim pra saber como dizer pra ela
não se sentir daquela forma. Sam tem medo de perder a mãe e eu tenho
medo de que a Sam não consiga superar isso, mas ela tem sido forte,
contudo, sei que ninguém é de ferro.
Papai disse que no começo é assim, mas que depois as coisas vão
ficando mais escassas com o passar do tempo, eu não acho que seja o nosso
caso, minha gordinha é fogosa, ela gosta de ser agradada e de me agradar, e
não tem um cantinho dela que eu não adore.
Dirijo com paciência, pois o trânsito hoje está insuportável. Sam
falou sobre a viagem pro evento da minha mãe, ela tem me ligado todos os
dias. Parece ignorar a seriedade do câncer de Lily, mas tenho feito o mesmo
com ela, não atendo e quando atendo falo que estou ocupado e desligo,
simplesmente não estamos em clima de ir pra Nova York pra nada que
mamãe faça, tudo o que queremos é um pouco de paz, voltar a Charlotte foi
a melhor decisão da minha vida, pois encontro aqui a paz que não tive
durante anos, é menos movimentado, uma cidade relativamente grande, mas
não é caótico nem poluído como Nova York.
Passo na floricultura e compro umas flores pra minha gordinha —
ela odeia que eu a chame assim, então sobrou pro pensamento, mas às vezes
não se irrita tanto — e depois vou pra casa, pego a correspondência no
correio e aceno pros Jordan, eles são vizinhos dos meus pais a mais de trinta
anos, ou eram, até eu e mamãe irmos embora. Eu era colega do filho deles,
mas foi embora e deixou os pais aqui, a vizinhança no bairro mudou um
pouco, mas ainda é conservadora.
Entro dentro de casa e escuto Ed Sheran, assim logo de cara, sinto o
cheiro se espalhando pela casa, comida... ela está cozinhando pra mim,
como tem feito desde que seus pais foram pra casa deles. Deixo a
correspondência na mesa de centro e vou pra cozinha, encontro Sam
cantando com uma colher de pau na mão. Escondo o buquê atrás de mim, e
sorrio porque ela está de calcinha e avental, assim muito natural, com os
cabelos um pouco mais longos, presos num rabinho de cavalo, tive a
impressão de que a cintura dela anda mais fina, mas nada mudou muito
nela, acho que eu é quem engordei, pois me casei com uma cozinheira de
mão cheia.
Sam canta “Thinking out loud”, gritando, ela dança pros lados e
aponta pra parede do fogão toda alegre, acabo por rir da minha esposa;
muito raramente eu a vejo assim, na verdade, ainda sinto que a Sam é um
pouco travada nesse sentido comigo, ela ainda é bem engraçada, é cheia de
ficar fazendo gracinha, mas não faz essas coisas.
Aproximo-me de fininho e abraço ela por trás com um braço, ela da
um pulo, e quando cheiro seu pescoço, Sam se arrepia toda, ela vira o rosto
para que eu a beije, e me beija me dando um pouquinho mais de felicidade
por sua presença, por sua empolgação.
— Pra você minha Bolinhos!
— Uma flor, pra outra flor! Que fofo!
Sam se vira e nos beijamos, não é algo sexual, ela é tão mais
carinhosa comigo, me sinto cheio desse sentimento forte por ela... amor.
— Eu tenho uma surpresa pra você. Quero que você suba pro
quarto e tome um banho e que me espere sentado na cama.
— Não posso esperar pela surpresa aqui não meu amor?
— Noah, sem perguntas!
— Mandona!
— Vai logo.
Beijo ela e lhe dou um tapa na bunda, quando ela reclama saio
correndo pro quarto. Acho que é isso, em boa parte percebo que ganhei uma
esposa, mas a minha melhor amiga sempre estará bem aqui, ela me aceita,
ela me dá bronca, e ultimamente ela vem me dando uma pequena série de
patadas às vezes, acho que é normal da Sam também bancar a dramática,
mas eu a amo assim, eu a quero assim, e quanto mais ficamos juntos, mais
quero estar com ela.
É muito bom estar casado com alguém que se conhece há anos, mas
que também conhece um pouquinho a cada dia.
Lembro-me de muitas coisas, mas outras eu esqueci. Conversamos
sobre o passado de noite, às vezes, quando estamos na cama ela me conta
de algumas coisas que eu não lembro, depois do acidente minha vida
mudou de cabeça pra baixo. Se um dia, eu contasse como tudo aconteceu
pra mim quando eu vi a Sam na King, as pessoas não acreditariam...
Simplesmente eu havia esquecido completamente dela, e quando a vi, foi
como se ligassem um despertador na minha cabeça.
Sam Caiu no Esquecimento.
E retornou num momento da minha vida em que eu achei que tinha
tudo, uma bela noiva, um bom cargo, e uma nova filial da minha empresa,
mas então ela estava lá, expondo meu passado em minha cabeça como um
filme, e quando eu a vi sabia que não haveria mais ninguém em minha vida
além dela.
Termino o banho e coloco uma cueca leve, me sento e ligo a TV,
Sam demora, mas chega carregando uma caixa daquelas bem grandes, ela
usa uma blusa de alcinhas e os cabelos estão úmidos, acho que usou o
banheiro do quarto dos pais dela.
— Feliz dois meses e vinte e sete dias, meu amor!
Sorrio. O presente parece enorme, puxo Sam pra um beijo, ela se
senta na cama e coloca a caixa enorme diante de mim, parece ansiosa, fico
curioso, ergo a caixa achando que é pesada e me surpreendo, pois é super
leve.
— O que é? Uma bike cor de rosa?
— Anda logo, abre King!
Abro o papel de presente e deslacro a caixa, e logo em seguida vejo
que tem outra caixa dentro desta caixa, com um papel de presente
semelhante, estreito os olhos pra Sam e ela dá de ombros como se dissesse
"não posso fazer nada", depois abro essa outra caixa de papel cor preta e
tem outra caixa, começo a ficar realmente curioso quando abro esta caixa e
encontro uma caixa ainda menor, e vou abrindo as caixas, quando percebo
que a minha esposa se dedicou muito pra embalar esse presente, por fim,
chego a uma caixa de cor azul escura muito pequena, abro esta e vejo que é
a última, então me deparo com algo inesperado.
— Uma chave?
— É a chave do meu coração, não é fofo?
Sorrio, vejo a bagunça que fiz com as caixas e os papéis, mas tem
uma tirinha de papel grudada na chave com uma mensagem, leio.
“Siga as pistas do seu coração, vá ao closet e pegue a próxima
pista.”
Olho pra Sam, mas não caibo em mim de curiosidade, me levanto e
ela vem logo atrás como se não soubesse de nada.
— Sua sonsa!
— Ai, anda logo, abra o seu lado do closet!
Vou até os meus armários e a primeira coisa que vejo quando abro a
porta é um pequeno cartão de cor azul, eu pego imediatamente e leio:
“Muito bem, agora siga as pistas e vá à sala, conte vinte passos
até achar a próxima pista.”
Desço basicamente correndo, havia me esquecido do quanto é bom
essas brincadeiras, gostava muito quando criança. Logo que chego ao
ultimo degrau da escada, Sam vem descendo lentamente muito
despreocupada, começo a contar os passos olhando ao redor, super curioso,
e ansioso. Sam sabe que eu sou assim, ela fez isso de propósito só pra me
ver sofrendo lentamente com o nervosismo de ganhar algo dela.
— Preferia sexo!
— Se apresse King.
Sam Mexe no Home teather, depois uma música doce começa a
soar pelas caixinhas de som, na TV, Christina Perri - A Thousand Years
começa, estreito os olhos pra ela e me vejo diante do balcão do armário da
sala.
— Me deu a chave do balcão da sala?
— Não quer o presente King? Que desfeita!
Percebo que ela está um pouco insegura, ou será que se magoou
com a minha pergunta?
Viro-me pro balcão e me abaixo abrindo a portinha, depois enfio a
não e encontro outra caixinha, mas essa é de cor marrom, tem um ponto de
interrogação e outro recadinho grudado.
“Abra-me, mestre!”
Isso é muito a Sam.
Abro a caixinha, rasgando o papel de cor marrom, depois rasgo o
lacre então fico paralisado ao me deparar com dois pequenos pares de
sapatinhos de bebês, um é cor de rosa, e o outro é azul. Minha mão começa
a tremer e vejo o pequeno recado grudado na tampa da caixa.
— Parabéns papai, somos uma menina e um menino!
Ergo o olhar, e vejo tudo embaçado. Bem diante de mim está à
mulher que mais amo no mundo, e dentro dela tem dois bebês gerados por
mim. Começo a chorar, e Sam também chora, eu a abraço sem esperar por
mais nada porque dentro de mim tudo começa a se romper, meu coração
parece que vai sair pela boca, eu a aperto com tanta força que sei que lhe
arranco o ar dos pulmões.
Eu a fito, e não sei explicar como me sinto neste momento, é algo
tão forte que parece que vou explodir, e tudo o que consigo nesse momento
é beija-la.
Serei pai! Sam está grávida de gêmeos! E isso é a coisa mais
maravilhosa que poderia acontecer em nossas vidas.
PAPAI E MARIDO BOBÃO!
Noah não para de ficar alisando a minha barriga.
Não notei muito diferença de quatro meses pra cá, mas eles me
enganaram direitinho, assim como a médica.
Fiquei incrédula e totalmente nervosa quando fui a médica pegar os
exames de sangue há três dias. Milhões de coisas se passaram pela minha
cabeça muito antes disso, porque bastou que ela me falasse as três
palavrinhas mágicas e eu comecei a sentir pequenas ondas se mexendo na
minha barriga.
"Você Está Grávida!"
E se eu não estivesse sentada eu cairia no chão estatelada, porque
não acreditava! Isso não foi muito chocante em vista do tempo aproximado
de gravidez. Logo que ela abriu o exame de sangue, arregalou os olhos e me
mandou trocar de roupa pra fazer um ultrassom.
Obedeci e me deitei em sua maca, e a médica começou o exame
toda apressada, foi a primeira vez na minha vida que eu ouvi o som dos
coraçõezinhos deles, logo em seguida ela disse mais duas palavras
assustadoras:
"São Gêmeos!"
E eu estava tentando entender tudo aquilo.
Ela ainda falou:
"Você está com aproximadamente dezoito semanas e três dias de
gestação!"
E eu estava soando. Imediatamente liguei pra primeira pessoa que
me veio a cabeça: papai!
E ele foi à clínica me encontrar.
A médica disse que os exames de papanicolau não deram alteração,
nem que dava pra saber que eu estava grávida naqueles primeiros exames
após minhas primeiras relações com o Noah, porque simplesmente era
muito recente, explicou que devido ao anti concepcional, eu menstruei e
que por distúrbio hormonal minha menstruação viera apenas em pequenos
focos.
Passou-me mais uma bateria de exames, vitaminas, e me marcou a
próxima consulta que será em duas semanas. Eu estava absolutamente
chocada quando sai do consultório. Papai que me esperava na recepção, me
olhava com medo, e só quando entramos no taxi eu tive coragem de falar.
— Papai, eu tô grávida!
Papai arregalou os olhos e disse:
— Você não parece grávida!
Senti-me num pico de estresse e nervosismo e berrei:
— É porque eu sou gorda, pai!
Depois disso tive uma crise de choro. Fomos pra casa e contei pra
mamãe, ela chorou o resto da tarde e fez bolo pra mim, não sabia como
faria pra contar pro Noah, até que decidi não me desesperar nem tirar
conclusões precipitadas a respeito daquilo, então decidi fazer uma surpresa.
Meus pais me apoiam, foi algo inesperado, mas eles realmente estão
felizes com a gravidez, e mamãe já está até pensando no enxoval.
— Eles já chutam? Será que eles me escutam amor? Conhecem a
minha voz?
— Comecei a sentir que mexem a algumas noites.
— Se sente enjoada?
— Não, nem cansada nem nada, nem a médica entendeu o que
houve!
— Foi a nossa primeira vez na Barbie, certeza.
— Também pensei isso.
Estamos sentados em nossa cama, às caixas e papéis de presentes
jogados pra todo lado, colocamos comida em nossos pratos e viemos pra cá,
Noah chorou bastante e eu também, este momento é o mais importante de
nossas vidas.
— Acho que eles vão adorar a Barbie!
— Eu também amor.
Noah deixa o prato de lado e se inclina, cola a cabeça na minha
barriga, — sorrio — ele parece um bobão alegre! Eu tive os meus receios
em contar, mas não esperava por uma reação ruim da parte dele, claro que
foi super rápido, mas estou grávida, ainda é meio surreal pra mim.
— Oi, o papai ama você dois!
E beija a minha barriga dezenas de vezes todo feliz, ele se ergue e
me beija sorrindo.
— Te amo minha gordinha.
— Só hoje.
— Você é a gordinha mais teimosa que eu já conheci na vida!
— E você é o papai mais bobão que eu já conheci na minha vida!
Rimos e nos beijamos. Meu esposo faz cara de choro de novo, toca
a minha barriga.
— Poxa vida Bolinhos, vamos ter bebês!
— Sim, vamos ter bebês.
— Te amo meu amor.
— Eu também te amo, papai chorão!
Sinto algo tão forte quando o Noah chora, isso nunca vai passar,
basta que eu o veja assim que também me sinto assim, mas não é
infelicidade, eu e ele estamos muito felizes, seremos pais.
O telefone toca.
Noah seca a face e se estica, pega o telefone e coloca no viva voz.
— Noah?
— Sou eu. Cadê a incompetente da sua esposa?
— Mãe!
— Ótimo, eu pedi pra ela avisar, o evento é no sábado, por favor,
preciso de toda a minha família aqui.
Olho pra ele e Noah está realmente contrariado.
— Nós iremos, Sara, — respondo — e você será vovó!
Ai, essa eu não perco, não mesmo! Terei poucas chances de
provocar Sara como se deve.
Escuto o som de algo caindo, e um berro de Arthur, Noah desliga a
ligação sorrindo.
— Ela mandou dizer que está muito feliz.
Acabo rindo, e percebo que o Noah também não a leva a sério,
contudo, sei que tenho que tomar cuidado com ela, Sara é uma cobra.
— Acho melhor comemorar da melhor forma!
Eu o fito e acabo por sorrir.
— Sorvetee... ehhhh!
Noah sai da cama levando os pratos.
— Eu fico com a louça.
— É bom mesmo!
— Você pode me esperar nua.
— O que eu não faço por você, King?
Tiro a blusa e a calcinha e nesse momento ele deixa os pratos na
bancada embaixo da TV e volta pra cama. Acho que dá pros vizinhos
escutarem nossas gargalhadas de longe.
Uma Linda Mulher
Disse pra mim mesma que não permitira que Sara me intimidasse.
Nem ela, nem ninguém. Então eu e Noah embarcamos pra Nova York na
manhã de sábado bem cedo.
Estávamos entusiasmados, o baile seria à noite, mas não havia
preocupação em nós dois, não estava insegura, nem com medo, nem nada.
Eu não permitiria que ninguém me magoasse, e eu não deixaria que nada do
que dissessem sobre minha aparência mudasse quem eu começava a me
tornar.
Eu sei que eu não posso mudar o mundo, nem as estatísticas, nem
as tendências, mas eu posso mudar a forma como penso sobre mim e fazer
todos perceberem através disso que eu sou muito mais do que eles pensam
que eu seja.
Chegamos ao apartamento de Sara no horário de almoço, ontem eu
havia pedido pro Beth me arrumar um vestido e um sapato; Ty me mandou
um SMS falando que também marcaria presença no tal baile com sua
namorada super modelo do ano, Dyanna, mas não me preocupava, eu só
estava e ainda estou muito feliz com os bebês, com a gravidez, com o meu
casamento.
Sabrine saltitou de felicidade quando nos viu, e Arthur abraçou
Noah cheio de orgulho e felicidade, mas Sara não estava aqui. Arthur disse
que ela estava correndo por conta do evento, eu não me importei, achei
melhor assim, mas sabia dentro do meu coração que ela estava apenas nos
evitando, na verdade me evitando, porque os meus bebês não são bem
vindos pra ela.
Mas não me importei também, eu e Noah queremos os bebês, não
foram planejados, mas eles são tudo o que já amamos, fizemos tantos
planos nesses dias de descoberta que mal sabemos por onde começar.
Papai e mamãe decidiram não vir, mamãe estava um pouco
indisposta, mas ela parecia bem quando eu a visitei ontem à noite, e no dia
anterior.
Noah e eu sempre vamos à casa dos meus pais ou vice e versa; Noah
comprou um carro pra eles — eu que pedi! — Quando chegamos com o
automóvel eu via um sorriso incrédulo nos lábios de mamãe, papai meio
que rejeitou a ideia até que lhe expliquei que era pra ficar levando mamãe
pros lugares, eu mesma pagarei para o Noah com o meu salário.
Mas eu sei que ele não vai aceitar, conheço! Noah acha que porque
estamos casados tem que pagar até o ar que eu respiro. Incomoda-me um
pouco o fato dele pagar o tratamento de mamãe e tudo mais nas duas casas
às vezes. Farei questão de convencê-lo a pagar tudo aos poucos, ainda que
eu saiba que não consiga assim tão facilmente; logo que mamãe adquirir um
pouquinho mais de independência, papai começará com o trabalho na King.
Temos tantos planos pra nossa família.
Gostaria que os pais e a irmã dele também participassem disso, mas
pelo o que noto apenas Sabrine e Arthur querem realmente dividir esses
momentos comigo e Noah.
Depois do almoço eu e Noah fomos para o quarto que era dele,
dormi o resto da tarde, confesso que o almoço foi muito melhor sem a Sara
tentando podar a Sabrine ou falando de moda. Arthur não parava de falar
dos netinhos, ele ficou super feliz de saber que são dois, Sabrine então,
quando eu os olhava os sentia tão sozinhos... ambos precisavam de um
pouco mais de cuidado por parte da Sara, principalmente Sabrine, que está
entrando na adolescência. — Não a acho mimada, mas ela é uma criança
que parece que não viveu a infância. Carente, a todo o momento queria
chamar minha atenção — Arthur King é um daqueles homens de negócios
que tem qualquer coisa menos uma mulher por perto, Noah me disse que
poucas vezes, depois que sua mãe abriu a revista, tinha tempo pra King ou
ele, até mesmo Sabrine, então acabei por convida-los para o natal com
minha família. Não sei se Sara irá, mas Arthur e Sabrine irão, via em seus
semblantes a felicidade com o convite.
— Amorrrrr!
Saio dos devaneios.
Arrumo meu vestido e me olho no espelho, Beth é excelente na
hora de escolher roupas pra mim, ele até montou o jeito que eu deveria
deixar meus cabelos, deu trabalho!
Estou no banheiro há umas duas horas. Expulsei o Noah logo que ele
terminou de se barbear. Os sapatos combinam perfeitamente com o vestido,
me sinto muito bonita com esse look.
O Vestido é preto e com mangas, o decote "V" bem aberto, mas tem
um tipo de véu transparente que deixa toda a parte da frente e a parte de
cima dos braços aberta, ele bate na altura das minhas canelas e é bastante
colado, justinho no meu corpo, mas bem confortável, ressaltou minha
cintura e valorizou minhas curvas, deixei meu cabelo natural e passei uma
pomada, fiz uma maquiagem bem leve, mas que delineia um pouco dos
olhos, os sapatos são plataforma e muito bonitos, de todas às vezes que me
vesti bem, esta é sem sombra de dúvidas a que eu me sinto mais próxima de
estar muito... muito sexy!
Passo meu perfume e saio do banheiro colocando os brincos, Noah
está sentado na cama usando terno e gravata, sorrio pra ele enquanto me
afasto até a poltrona pra pegar a minha bolsa de mão.
— Pronto. Desculpe o atraso, estava me arrumando meu amor.
Sorrio, e me aproximo de Noah, ele fica de pé me olhando de cima
abaixo, muito admirado...
Entrego-lhe minha bolsinha e arrumo sua gravata, eu tenho um marido
lindo, e me sinto muito bem de saber que além dele ser todo e somente meu,
ele também me acha linda. Noah me olha de uma forma única, que jamais
ninguém me olhou, e isso às vezes me intimida, mas também me deixa
muito feliz, porque eu sei que ele me ama, e também que me acha
realmente bonita do jeito que eu sou, gordinha, alguém diferente de todas as
mulheres que ele conheceu, exceto pela tal da bruxa Cora.
Eu o olho de cima abaixo.
Ele me devolve o olhar com admiração e tanto... carinho.
— Você está absolutamente linda, Jas.
Não sei o que sinto quando ele me chama de Jas, ele me chamava
mais assim na infância, sorrio um pouco envergonhada, há muita
sinceridade em seu olhar, em suas palavras, e fico transbordando de amor
pelo meu esposo, toco seu terno e me estico, ainda que esteja de salto não o
alcanço, Noah se inclina e me beija com lentidão, carinho, me sinto total e
completamente feliz ao seu lado.
— NOAHHHHHH!
Sabrine chama e nos interrompe.
— Melhor irmos, — digo e ele passa o braço ao redor da minha
cintura — quero chegar cedo.
— Eu também. — Noah fala cheio de malicia — Dai sobra tempo
pra eu ter uma sobremesa digna!
— Adoro sobremesas senhor King.
Ele mal sabe da surpresa que guardo pra essa noite.
UMA MULHER FORTE
Entramos no salão de festas do Plaza.
Do lado de fora quase fiquei cega com as dezenas de flashes na
minha direção, mas sabia que quando aceitei vir, estava me sujeitando à
exposição. Não tinha parado pra pensar que Noah tinha alguma vida social,
nós vivemos na nossa cúpula em Charlotte e temos uma vida comum como
qualquer outra pessoa. Depois dos acontecimentos com Cora, eu não vi
mais coisas sobre nós dois nos jornais, nem na mídia.
Tive vontade de sair correndo agora a pouco, mas apenas sorri,
tentei não parecer forçada e estava extremamente envergonhada quando me
chamavam de senhora King e pediam que eu sorrisse pra eles, mas não
demoramos muito, graças a Deus.
— Desculpe amor!
— Tudo bem.
Noah me deu um beijo e ainda que me sinta nervosa eu tento me
manter firme.
Esta é uma parte de sua vida a qual eu terei que me habituar,
vivemos em Charlotte, longe disso, mas sempre que precisar ele terá que vir
ou ir de lá para algum lugar, e eu terei que acompanhá-lo, não posso viver
me escondendo por causa do meu peso, não posso sentir vergonha do meu
corpo.
Caminhamos de braços dados pelas mesas, às pessoas nos olham de
cima abaixo, logicamente por que Noah é importante, e depois de alguns
momentos vejo Sara se aproximando com uma taça de champanhe na mão,
ela usa um vestido vermelho lindo com detalhes perfeitos abaixo da cintura,
os cabelos loiros e curtos penteados pra trás num topete estonteante, Arthur
ficou pra trás conversando com outro homem, Sabrine está com ele.
É! A Viúva Negra é linda, tenho que admitir... Ela está sem sutiã?
Sara fica diante de nós dois e me olha de cima abaixo como se não
acreditasse, eu a encaro tentando parecer que não me importo com seu
julgamento.
— Belo vestido, Sam. — fala ela, mas parece mais despeitada do
que tudo. É como se ela dissesse: "vadia, você ficou linda nesse vestido".
— Belos peitos, Sara! — digo com os olhos focados nos seios dela.
Depois de uns segundos me dou conta do que falei, Noah está rindo
discretamente e Sara está completamente constrangida com meu comentário
— desnecessário —, mas foi tão espontâneo que mal sei o que dizer.
— São naturais!
— Os meus também.
— Espero que esteja cuidando bem dos meus netos.
É muito engraçado ouvir uma mulher visivelmente obcecada por
beleza e vaidosa como Sara, dizer a palavra "netos", a impressão que tenho
é que soa mais como um xingamento. Acho que ela pensou que no primeiro
problema Noah e eu desistiríamos. — Claro, teria desistido na lua de mel se
não tivesse percebido as intenções dela de nos separar.
— Eles estão bem. — Olho pra minha barriga, e a toco. — Bem
seguros, é claro.
— Bom. — Fala fazendo pouco caso. — Então, a nossa mesa fica
ali. — ela indica uma mesa redonda e grande — Estou recebendo pessoas
importantes agora, Noah querido, você me acompanha?
Noah me olha e depois olha pra mãe e fala:
— Sam e eu não comemos nada mamãe, depois, com licença.
E sai me puxando pra longe dela. Sara não gostou, precisa ser cego
pra não ver o sorriso falso em seus lábios, mas acho que esta é a forma que
o Noah encontrou para, meio que se vingar dela por tudo. Ele está dando
um gelo nela.
Não que eu quisesse isso, minha intenção não é afastar o Noah da
Sara, eu sei que ela é mãe dele e eu não posso mudar isso, mas acho que ela
própria acabou colocando uma corda no pescoço quando tentou nos afastar.
O fato de que, talvez, ela não saiba respeitar a decisão dele de ficar comigo,
também é uma evidência forte de que ela, com certeza, é contra o nosso
casamento. Talvez se eu tentasse provar alguma coisa pra ele, Noah achasse
que tudo isso era invenção minha, então eu apenas o deixo perceber aos
poucos a mãe que tem, na verdade, ele sabe como Sara é, e acho que
justamente por isso, ele anda nos mantendo bem longe dela.
Noah puxa a cadeira para que eu me sente, percebo que a todo o
momento as pessoas nos olham, alguns mantêm a descrição, mas outros
sequer fazem isso. Não posso fingir que não me incomodo, mas não me
deixo intimidar, eu estou bonita, eu estou fina, esse vestido custou os olhos
da cara, assim como os sapatos; Noah está bem e acho que estou a sua
altura, e nada me torna melhor ou pior que nenhuma das secas que
frequentam este lugar.
Sabrine vem pro meu colo, e Arthur se junta a nós, em nenhum
momento eu parei pra pensar no que Noah se tornou, em quem ele era;
comigo ele é tão simples e humilde que nem me dei conta — realmente —
de que é um grande herdeiro, sua mãe dona de uma revista, seu pai de uma
grande multinacional.
Parece que esse pequeno choque de realidade me deixa um pouco
aérea, e demoro um pouquinho pra voltar pra realidade, Noah entrelaça a
minha mão por cima da mesa e me sinto mais confiante... forte, logo isso
passa.
— Ai, lá vem ela! — Sabrine fala com apatia na voz — Coraline!
Esse é nome do filme daquela menina de olho azul e cabeça grande,
acho o nome tão exótico... e famíliar!
Ergo o olhar e vejo uma belíssima morena de olhos azuis se
aproximando, ela usa um vestido azul lindo, é magérrima, alta, os cabelos
escuros estão bonitos num penteado de lado, elegante; brincos lindos, ela
tem lábios carnudos, nariz pequeno, sobrancelhas bem delineadas — lembra
um pouco Dyanna, mas tem olhos um pouco mais escuros e é um pouco
mais magra, porém, ainda consegue ter um pouco de peito.
Quando eu a olho vejo em seu olhar algo sedutor, ela é absoluta e
completamente linda de toda e qualquer forma, estou diante de uma
segunda Dyanna da vida, alguém que não precisa de um esforço sequer pra
amanhecer divando.
Noah a olha com apatia assim como Sabrine, Arthur franze a testa
bem surpreso.
— Boa noite! — fala a Coraline e sorri, mas seus olhos estão em
mim, depois em Noah.
Percebo neste momento de quem se trata... Cora... Coraline!
Cora!
— Boa noite. — Arthur King fala com uma educação seca.
Sabrine parece um cão de guarda pronto pra atacar. Noah está tenso,
eu sei que sim, eu mesma me sinto tensa com essa chegada repentina,
principalmente depois de tudo o que essa mulher me fez sentir, da forma
como ela me humilhou publicamente, mas tento parecer apenas... firme!
— Pai!
Mas não é Noah que está chamando Arthur de pai, e sim outro
rapaz que se aproxima da mesa. Este é moreno de olhos castanhos, como os
de Arthur. Noah segura a minha mão com mais firmeza, o rapaz parece ter
mais ou menos uns vinte e poucos anos, eu acho, ele usa um smoking preto,
os olhos dele se voltam pra Noah e percebo um pequeno clima, as coisas
aqui não vão ficar boas...
— Noah, Sabrine! — O rapaz fala e passa o braço ao redor de Cora,
com toda intimidade do mundo.
Arthur King tem outro filho? Ele está junto de Cora?
Incrédula é a palavra que me descreve bem neste momento.
— Connam! — Sara se aproxima toda apressada — Que bom que
veio, querido. E ainda trouxe a sua namorada!
Sabrine se remexe no meu colo com cara feia, Noah olha pra mãe
como se quisesse matá-la, seu rosto começa a ficar vermelho de raiva...
— Sentem-se. — Sara fala e me olha, depois pra Noah com um
sorriso vasto, mas falso.
Ela fez de propósito!
— Querida, receio que não conheça o Connan, ele é filho do
primeiro casamento do Arthur, está é Coraline, a namorada dele, ela é
minha nova colunista de moda!
Noah parece que vai explodir, e ao ver a reação de Arthur, ele
também não sabia de nada. Pergunto-me como, depois de tudo o que Cora
fez comigo e com Noah, a Sara teve coragem de contratá-la pra um jantar
com a família? E esse Connan, filho de Arthur, como tem coragem de
namorar alguém tão ruim e preconceituosa.
— Boa noite!
E pra completar a felicidade, Ty e Dyanna.
O que é isso? Um episódio de “Greys Anatomy” com uma fusão de
algum episódio de “Dragon Ball Z”?
— Oi, Ty! — falo forçado e vejo Dyanna ao lado dele, trocar
beijinhos com Sara.
— Loockwood! — Noah estende a mão para um cumprimento
concreto com Ty.
— King!
Ty está elegante com um smoking cor de chumbo e Dyanna com
um vestido longo de noite, que delineia bem a barriga dela, por ser assim
muito magra, a barriga dela já parece grandinha. Sara indica mais dois
lugares a mesa, Ty e Dyanna se sentam, mas Noah não parece nem surpreso
nem incomodado, ainda que a tensão não tenha saído do corpo dele.
— Você está absolutamente linda grávida, Dy! — Sara elogia e
bebe um pouco de seu espumante — A barriguinha linda.
Olho pro Ty, não deu tempo de eu lhe contar sobre a minha
gravidez, mas ele parece tão diferente com a gata seca... tão... feliz, e isso
não parece falso, na próxima vez que nos vermos eu vou contar tudo pra
ele.
— Sam também está gravida! Não é maravilhoso?
Sara me olha com aquele sorriso dela, cheio de falsidade. A viúva
negra está atacando, da melhor forma na qual ela sabe: de forma embutida.
— Você está grávida? — Ty pergunta e percebo sua surpresa.
— Descobrimos há cinco dias. — Afirmo constrangida.
— Que bom Sam! — Ty fala com sinceridade e sorri abertamente
pra mim. — Poxa, seus pais devem ter dado pulos de alegria.
— Sim, mamãe ficou superempolgada, ela já quer comprar o
enxoval e tudo! — Confesso e sorrio e olho pro Noah. — São gêmeos.
— Um casal! — Noah completa e seu semblante suaviza.
— Que bom. — Dyanna fala e não soa falsa. — Descobrimos o
sexo do nosso bebê há uns dias também, é uma menina!
Ty sorri de ponta a ponta, eu acho que na verdade ele está caidinho
pela Dyanna, ele apenas não admite, ela também parece mais próxima dele,
não sei se por aparência, mas está inclinada em sua direção... é, eles
combinam.
— Ouvi boatos de que se casaram! — Cora fala num tom de voz
muito cordial. — Parabéns aos dois.
— Não eram boatos. Nos casamos sim, no religioso e no civil! —
afirmo. — Estávamos em lua de mel.
— Foi mais uma viagem em família! — Sara corrige.
— Claro, foi o aniversário do Noah! — digo. — Nossas famílias se
reuniram, a Sara foi super gentil em convidar meus pais! Foi mais como
uma viagem pra todos nós ficarmos juntos.
— Papai e eu pescamos — Sabrine fala contente — e o tio Samuel
também foi conosco.
— Soube que sua mãe tem câncer! — Cora comenta.
Mas isso realmente não me tira o sorriso dos lábios, eu sei o que
essa vaca infeliz quer, ela quer me atingir, mas ela não vai.
— Sim, ela está se tratando.
— E não tem medo de, sei lá... dela morrer?
— Bem, eu tenho, mas acho que Deus sabe tudo o que faz e permite
nas nossas vidas, minha mãe é forte, ela vai conseguir.
— Nesses casos é importante ficar com a família.
— Eu estou com a minha família. A família do meu marido é a
minha família, Coraline.
— Você é bem mais magra pessoalmente.
— Cora já chega! — Connan fala com certa descrição — não
viemos aqui pra isto!
Esse parece ser daqueles bem diretos, mas não me intimido,
permaneço olhando pra Cora, seus olhos azuis mais escuros, cheios de
deboche pra mim. Olho pra Dyanna e percebo alguns traços um pouco
comuns, boca grande, olhos azuis, mas a Dyanna é mais bochechuda, e tem
sobrancelhas mais finas, o rosto de Cora é mais chupado, ela é mais ossuda
que Dyanna, percebo algo.
Na verdade chego a uma conclusão muito... estranha.
— Acho que o que te incomoda não é o fato de eu ser gorda, Cora.
— De repente todos da mesa olham pra mim — Acho que o que te
incomoda, é o fato de que você mudou quem você era por causa das
pessoas, e eu não, você gostava de si mesma, mas as pessoas te julgavam
pela sua aparência e você não soube ser forte o suficiente pra saber lidar
com aquilo.
— Eu sou feliz com o meu corpo, querida — Cora fala num tom
amargo e sorri, mas isso é falso — Visto trinta e seis, peso 50 quilos...
— E dai? — pergunto chateada — E daí que você é magra? Você
não se ama! Você é um produto, algo que se vendeu pra sociedade, alguém
vazia que arruína os sonhos de dezenas de garotas GG no mundo. Você é o
lixo das etiquetas da sociedade, e quanto mais eu conheço pessoas como
você, mais eu me sinto mal, me sinto péssima de pensar que garotas se
cortam e tentam se suicídar por não se sentirem perfeitas o suficiente pra
pessoas como você! — Cora fica paralisada me olhando. Seu olhar é duro
— Você não sabe o que causa nas pessoas ao chamá-las de gordas, ao
menospreza-las, ao diminui-las! Quantas garotas GG's não são lindas
apenas por serem quem são? Quantas delas não são inteligentes? Quantas
delas não são capazes? Você acha que uma etiqueta pequena e estreita pode
diminuir o tamanho das pessoas, mas você é pequena, você é diminuída,
não por fora, mas por dentro, você é o lixo das etiquetas que alimentam a
sociedade, Cora!
Depois que falo parece que o entalo em minha garganta que
retornou depois desses meses vai embora, e Cora fica parada me olhando
em silêncio, como uma estátua, chocada. Em meus olhos têm lágrimas, olho
pro Noah e ele parece espantado e ao mesmo tempo orgulhoso. Viro-me pra
Sara.
— Obrigada pelo convite!
Levanto-me, escuto a primeira palma quando começo a me afastar
da mesa — fungo — e a mão de Noah está me enlaçando à cintura. Sabrine
se apressa e pega a minha outra mão, e escuto dezenas de aplausos, e mais e
mais aplausos enquanto me afasto, mas saio de cabeça erguida, ainda que
chore, porque eu estou certa, e não importa o que digam ou pensem... Eu
sou uma garota GG, eu sou linda, eu sou uma número 50 e tenho muito
orgulho disso.
UMA MULHER PRONTA
— Consegui um vinho!
Estou na banheira.
Noah se aproxima com duas taças e uma garrafa de vinho tinto.
Dei uma crise de choro no caminho até o apartamento dos pais dele,
quando chegamos lá, eu me sentia péssima em pensar que Sara chegaria ali
e tentaria me expor ao ridículo, depois de tudo o que disse na festa dela e de
toda a atenção que eu chamei não esperava que ela reagisse bem é claro.
Noah e eu pegamos nossas coisas, naturalmente que ela não sairia
no meio da festa, assim do nada, pra vir atrás de nós, seria ainda mais
constrangedor pra ela, ainda que minhas palavras não servissem pra
ninguém ali além de Cora, eu simplesmente disse tudo o que havia abafado
dentro de mim desde que Cora me desmoralizou no jornal.
Quis falar e falei, e não tenho vergonha disso, mas me sentia mal
em pensar em tudo, então nós avisamos pro Arthur que iriamos para um
hotel, ele veio no carro de trás nos seguindo, deixamos Sabrine com ele e
partimos. Meu sogro é um homem bom, eu só acho que ele é manipulado
demais pela cobra da viúva negra.
Noah achou uma vaga em um hotel no centro e aqui estamos desde
então. Ao chegarmos, ele me despiu e me colocou na banheira com água
quente, agora é que eu parei de chorar, parece que eu lavei a minha alma
depois de tudo, falar como me sentia pra Cora me aliviou, chorar também;
não sinto que fiz nada de errado, não sinto que fiz ataques de ódio, apenas
falei o que eu pensava e penso e não me arrependo, se tivesse que falar dez
vezes seguidas, eu diria.
Noah tirou o terno, a gravata e a camisa, a calça, está apenas de
cueca, ele me entrega uma taça com vinho e entra na banheira de cueca
mesmo, me viro e me encosto nele sentindo seu carinho, seu abraço
compreensivo.
— Estou orgulhoso de você minha bebê chorona.
Sorrio. Acho que pareço uma monstra com a make toda borrada!
Sinto que estraguei a chance de eu e Noah aproveitarmos uma noite
importante. Ainda que eu soubesse que Sara tentaria alguma coisa pra nos
perturbar, jamais imaginei que ela chamaria Cora pra tentar me atingir,
engoli a vontade de falar coisas pra minha sogra também, porque eu sabia
que aquele não era o local pra lavar roupa suja, mas da Cora simplesmente
não aguentei.
— Acha que eu fui longe demais?
— Ela tem que aprender o lugar dela.
Fungo. Noah beija a curva do meu pescoço, fecho os olhos, me
lembro de Ty e sinto que devo isso ao Noah.
— Ty e eu nunca namoramos! — revelo e me viro pra ele na
banheira, os olhos de Noah estão focados em mim — Nós sempre fomos
muito amigos, mas não tivemos nada de verdade, só não queria ir
desacompanhada ao seu noivado.
Noah me olha e espero pelo pior, depois de alguns momentos me
sinto totalmente tensa, ele sequer diz alguma palavra, então suspira e depois
me encara bastante sério.
— Ele me ligou há um tempo e me disse Sam. Disse que ele estava
com Dyanna e que vocês nunca tiveram nada, me explicou tudo.
Fico surpresa... bem mais que isso! Ty contou pro Noah?
— Eu não fiquei chateado, na verdade me senti aliviado de saber
que vocês dois nunca tiveram nada.
— Não queria ter mentido...
— Eu sei Sam, eu realmente pensei muito nisto, me escuta, eu
pensei nisso quando nós brigamos nas Madivas... omitir as coisas de você
nos afastou bastante, mas isto não tinha a mesma gravidade do que eu omiti.
Claro, fiquei irritado no momento em que ele me disse.
— E quando foi isso?
— No dia do nosso casamento, ele ligou no seu celular e eu atendi.
Depois ele disse que não poderia ir e começou a contar a verdade sobre
vocês dois, que nunca tiveram nada, mas pra mim não importava muito, me
senti mais aliviado em pensar que ele sequer te tocou além daquele dia.
Ciumento!
Contudo, eu estou aliviada com toda situação.
— Pensei: “se ela não falou é porque é algo que não pertence a ela.”
Também sabia que não queria expor ele ao ridículo, talvez ele até sentisse
algo por você, mas você nunca o amou não é mesmo verdade?
— Nada além de amizade, mas eu odiaria chegar ao seu noivado
permitindo que você me visse sozinha. Ty sugeriu que fingíssemos que
éramos namorados.
— Entendo.
O Noah é tão... maduro!
Às vezes é claro, quando ele não está fazendo ceninha ou teimando
pra conseguir alguma coisa.
Olhamo-nos por alguns momentos e me recordo de algo.
— Percebi que as suas duas ex namoradas são um pouco parecidas
comigo, a cor dos olhos, lábios cheios, sobrancelhas mais grossas, Dyanna é
mais, mas todas elas são morenas, olhos pra um tom azul, ainda que eu as
ache lindas... isso é estranho!
— Acho que em meu sub consciente eu só queria encontrar alguém
que me lembrasse você, Sam.
Faço que sim com a cabeça, deixo a taça de lado e me inclino sobre
ele, abraço Noah, colocando a cabeça em seu peito, ele deixa a taça dele
também na pedra da banheira e me abraça com carinho, nos beijamos.
— Muitos desafios gordinha... Preciso que seja forte!
— Eu serei meu magrelinho!
Noah sorri, e seu sorriso me fortalece, e apenas isso me basta pra
prosseguir.
DESPEDIDAS
Os meses seguintes passaram muito depressa.
Trabalhamos todos os dias na King e mamãe continuou com o
tratamento dela.
Havia dias bons e havia dias ruins.
Meu casamento era — e é — sólido, mas a doença de mamãe nos
deixa sempre abalados, principalmente meu pai.
Soube que Donatela a visitou diversas vezes durante esses meses,
mas mamãe vive ultimamente de altos e baixos. Noah e eu começamos a
organizar o quarto dos gêmeos, quando eu entrei no sexto mês.
Nosso Natal foi simples, com os meus pais, Arthur, Sabrine, e pra
minha total surpresa, Connor. Quando eu soube que Arthur o traria, fiquei
com medo e com o pé atrás, mas Noah — que também não vai com a cara
dele — me contou que ele rompeu com Cora um pouco depois da festa de
Sara.
Sara não veio passar o natal conosco.
Eu vi o nosso primeiro natal muito bom, havia presentes, meus pais
estavam ali, mamãe com seu tratamento promissor e Sabrine paparicando
minha barriga, mas Noah... algo faltou pra ele, a presença de sua mãe.
Eu e ele viajamos no ano novo.
Fomos pro Caribe e foi como uma segunda lua de mel, ainda que
me preocupasse com mamãe, o médico nos tranquilizou, foi algo que me
deixou consideravelmente bem, me ajudou a pensar em muitas coisas, mas
principalmente curtir um tempo que não tive com o Noah nas Maldivas.
Eu e ele descobrimos mais confiança, paz, harmonia, conversamos
muito e é claro, havia muito amor ali pra compartilharmos na nossa cama.
Amor e paixão, dividimos nas duas semanas seguintes um prazer que era
apenas pertencente ao nosso mundo.
Eu era a esposa dele, a amiga dele, mas também era sua amante, e
ele tinha esses três papéis na minha vida, e algo muito além daquilo, ele era
o pai dos meus bebês.
Quando retornamos, a rotina estava lá, mas não permiti que ela
entrasse em nossas vidas, me tornei algo maior que uma assistente naquele
mês, Clarissa foi promovida para um cargo melhor — propositalmente — e
eu virei secretária do Noah em tempo integral.
Aquilo não era fácil.
Mas eu já conhecia o trabalho, já sabia o que fazer, e me ocupar era
muito bom. Em mim só havia uma incerteza: a reação de mamãe ao
tratamento.
Entrei no sétimo mês e recebemos uma notícia péssima, o tumor no
pulmão dela não diminuiu tanto quanto esperado, e me abalei muito, neste
mês tudo era motivo pra eu chorar, milhares de coisas se passavam pela
minha cabeça, mas eu só queria que a minha mãe estivesse lá quando meus
bebês nascessem.
Os dias transcorreram, e hoje eu completo exatos oitos meses,
minha barriga está bem maior, muito maior na verdade, eu ando tentando
me alimentar do jeito certo, da melhor forma, sigo a dieta da médica e os
gêmeos estão bem, os meses voaram.
Ainda fragilizada, deprimida. Eu e Noah acabamos de chegar da
empresa, decidimos passar aqui na casa dos meus pais pra ver como ela
está, encontro a minha mãe carequinha, escassos cabelos na cabeça, na
cozinha; ela desanimou com a notícia do médico, claro que ela não sabe que
eu sei de sua situação clínica, sempre que a vejo lhe dou um abraço forte, e
tenho medo e receio de que estes sejam os últimos abraços que dou na
minha mãe.
É muito ruim viver com medo de perder a mãe.
Ela toca a minha barriga como sempre faz e a beija, os gêmeos
andam se mexendo mais desde que entrei no quinto mês, o Noah vai pros
fundos encontrar papai, ele também anda bem abatido, ambos temos nos
preparado pro pior, ainda que tenhamos muitas esperanças de que tudo reaja
bem, a esperança não morre.
— Sabe Sam...
Olho pra mamãe, e ela sorri pra mim, bastante abatida. A doença
deixa muito evidente que é presente, desde que descobrimos vem
rapidamente consumindo mamãe, ainda que faça tratamento, papai não me
deixa ver nem ela me deixa saber, mas sei que é comum que tussa sangue às
vezes, eu não quero ver a minha mãe assim.
— Eu quero muito ver os seus bebês nascerem — mamãe fala
tocando minha barriga — e eu estou muito feliz pela mulher que você se
tornou nesses meses, logo quero te ver formada e que continue a trabalhar
com o seu marido.
— Você vai ver mãe! — eu tenho muita fé que isso aconteça, mas
dentro de mim tudo está tão incerto, mamãe sorri e abaixo a cabeça, começo
a chorar — a senhora vai ficar bem!
— Eu sei que sim! — ela sorri e me abraça com carinho, tanto zelo
e cuidado que mal sei descrever o quanto seu amparo me deixa contente por
apenas isso — não importa o que aconteça Jas, eu sempre estarei ao seu
lado.
Sinto como se me despedisse da minha mãe, fecho os olhos e faço
uma oração silenciosa.
— Eu te amo, Samantha Jasmine.
— Eu te amo, mamãe!
PERDAS
Cinco anos depois, Charlotte.
Saímos do cemitério.
Noah me beija a bochecha e parece meio abalado, quanto mais
tentamos durante esse tempo deixar tudo de lado pra arrumar um momento
pra vir aqui, mas parecemos apertados. Acho que algumas coisas mudaram
bruscamente esses anos, mas não acho que tenha sido tantas coisas.
Estou mais uma vez grávida.
Bem, na verdade esta é a minha terceira gestação em cinco anos.
Quando eu me pergunto se estou louca, Noah vem e me joga o
papinho de que temos que aproveitar enquanto estamos jovens. Desta vez,
mais uma menina, e eu não sei onde vamos parar com tantas fraldas!
Lucinda e Dominic tinham apenas quatro meses quando engravidei
de Helena, e agora estou grávida de mais uma, decidimos depois de muita
discussão, colocar o nome dela de Lilyanne, em homenagem a minha mãe.
Mamãe!
Sorrio. Enquanto o meu marido dirige toco minha barriga, Lilyanne
é um belo nome, o nome da minha rainha, da mulher que mais amo na
minha vida.
O cemitério vai ficando pra trás e com ele algumas lembranças
ruins.
A primeira coisa que me lembro é da ligação de Arthur.
A segunda coisa é a reação do Noah quando soube da notícia.
A terceira coisa que me recordo, é de como isso nos abalou.
Infelizmente, alguns dias antes do parto dos gêmeos, recebemos a
notícia de que Sara veio a falecer, o corpo dela foi achado em sua sala na
"S" Magazine, a revista dela. Quem a encontrou foi uma de suas secretárias,
mas não foi bem um encontro, tudo o que soubemos depois do velório dela
arrasou o Noah e também me abalou.
Tudo foi tão... confuso.
As perdas foram de muitas partes, a confusão começou quando Sara
tentara mandar Coraline embora; segundo relatos das secretárias de Sara,
ela estava decidida a mandar Coraline embora por conta de alguns surtos
psicóticos da moça, mas parece que Coraline não soube como lidar com
aquilo; ela entrou na sala de Sara e atirou várias vezes nela e depois se
matou. Sara, infelizmente, veio a falecer devido aos ferimentos.
Quando recebemos a notícia, aquilo devastou Noah, também fiquei
abalada. Mamãe ainda estava naquela fase completamente arrastada pra
morte do câncer, tive que ser forte e Noah também, papai então, teve que
ser forte por nós todos, havia ali mamãe doente, devastada por uma doença
sem cura, eu devastada pela doença de mamãe, e Noah pela morte de sua
mãe.
Dentro de mim tudo estava destruído.
Não gostava de Sara, mas eu não desejava sua morte, eu não queria
que ela terminasse daquela forma. Queria que minhas crianças conhecessem
a avó.
Os gêmeos nasceram numa manhã de fevereiro e seus nascimentos
foram a maior alegria que eu poderia sentir em toda a minha existência,
apesar da morte de Sara ainda abalar muito o Noah e todo o resto da
família. Nós recebemos nossos bebês com todo carinho e amor.
Foi um parto normal bem rápido, e eu mal acredite quando segurei-
os em meus braços, Dominic saiu primeiro, com dois quilos e novecentos
gramas e Lucinda foi a segunda com cem gramas a mais que o irmão, um
minuto mais velho. Contei nos dedos o tempo que levei pra trazê-la ao
mundo, ela estava ansiosa e chorosa quando o médico a entregou pra mim,
seu pai ao meu lado, chorava feito bobo, tão feliz de repente por tê-los, que
mal acreditava.
Noah é um homem humilde e forte e eu o admiro muito por isso.
Meses depois eu descobri que estava grávida de Helena, respeitei o
resguardo, mas não me atentei aos remédios.
Com a morte de Sara, Arthur e Sabrine vieram pra Charlotte e ele
retomou boa parte da administração da empresa. Connor o ajudou na época,
e eu percebia que uma pequena distância que existia entre os dois estava
sendo preenchida com a ausência de Sara, não gosto de pensar nela como
alguém ruim, mas ela permitiu que as coisas ruins a tomassem, e acabou
perdendo a própria identidade por conta do dinheiro, e é incrível que isso eu
não veja isso em Arthur, que é muito mais rico que ela.
Meus pensamentos voltam pros meus filhos logo que Noah
estaciona o carro diante de nossa casa.
Nos mudamos com a chegada de Helena, ela nasceu no ano
seguinte, numa manhã de Natal, fruto de outro parto normal. Gorda,
comprida, com três quilos e quinhentas gramas, Noah e eu a chamamos de
pequena bezerra, pois ela mamou muito mais que Dominic e Lucinda
durante os primeiros dias no hospital.
Agora essa...
Toco minha barriga, Lilyanne é quietinha, mas essa foi a primeira
gestação na qual me senti realmente enjoada.
Eu meio que me dedico mais aos bebês gêmeos, agora que fizeram
quatro anos, Helena tem dois e meio.
Olho pro meu marido, ele se inclina e me beija, tamanha felicidade
eu sei que jamais encontrarei com mais ninguém, o Noah é... o Noah!
Ele se tornou um paizão, alguém com quem posso contar em todos
os momentos, o meu melhor amigo e confidente.
— Hei! — Papai acena da varanda.
Nossa casa é meio afastada da cidade, o bairro é perto de uma
reserva, papai adora vir pra cá. Saio do carro, e o vejo segurando Helena no
colo, e logo em seguida meus olho se enchem quando eu a vejo.
— Samm, Noah, Samuel...
— Café! — eu e Noah falamos juntos.
Papai dá um pulo contrariado.
Suspiro.
Quando eu olho pra minha rainha, eu quero chorar.
Enfrentamos tantas coisas nesses anos que mal sei explicar.
Mamãe passou por duas cirurgias que quase a mataram, tentamos
tudo até o último recurso, e esse recurso veio de algum lugar do Alabama.
Mamãe removeu os pulmões doentes e gastos pelo câncer, e ganhou
dois pulmões novinhos de uma garota que veio a falecer em um acidente de
carro. Eu simplesmente estava esgotada e descrente quando ela passou pelo
tratamento com células tronco, o doutor Cruise ainda tentou remover o
tumor, mas ele retornou a crescer, mamãe não deu metástase, mas não havia
mais uso para um dos pulmões, e outros pequenos focos de tumores
começavam a brotar.
Simplesmente era algo impossível, clinicamente.
Mas ela não desistiu, e eu não deixei que ninguém tirasse nossas
esperanças.
Eu a vejo agora, com cabelos curtos, dando ordens pra Dominic e
Lucinda irem pra dentro, mas o menino é teimoso igual a ela, corre e vem
na nossa direção.
Pula em cima do pai, Noah o cobre de beijos, nossas crianças são
loiras, nenhuma puxou a mim, são todas muito parecidas com o pai,
também entendo que por conta do meu pai, mas... que natureza injusta!
— Vem, Luci! — papai pega Lucinda antes que ela escape.
Subimos a varanda, hoje fomos visitar os túmulos de Sara e Jorge, o
pai de Noah, ele chorou um pouco, não é algo que se supere assim, ainda
mais a mãe que morreu de uma forma tão cruel e repentina. Sabrine ainda
sofre bastante, assim como o Arthur, mas acho que eles aprenderão a lidar
com a ausência definitiva de Sara.
Nós também.
Olho pra mamãe e a puxo para um abraço.
Houve momentos que eu realmente pensei que iria perdê-la, mas ela
está aqui, bem diante de mim como deveria estar: saudável! Bem, ela ainda
se recupera do transplante, faz apenas dois anos, mas está muito melhor até
do que antes.
— Eu te amo,mãe!
Eu nunca perco a chance, por que eu sei que nunca é tarde ou cedo
pra dizer o quanto eu a amo! Sempre valorizei muito a minha mãe, mas a
doença me fez dar dez vezes mais valor a tudo o que ela é e representa pra
mim.
— Eu também te amo, filha!
É muito bom ouvir isso.
Ela toca a minha barriga e me sinto realmente em paz.
— Sam, Lily! — papai chama de dentro de casa.
— Café! — eu e mamãe completamos sorridentes, ela beija a face
da minha Helena com carinho e entramos abraçadas dentro da minha casa.
Eu peço silenciosamente a Deus que ela fique comigo por um bom
tempo.
SEMPRE 50
Alguns anos depois...

Aeroporto de Charlotte, EUA.

— Você vai obedecer o vovô e a tia Sabrine!


— Eu vou obedeche o vovô e a tia Sabline!
— E você vai ficar quietinha!
— Eu vou fica quietinha!
Olho pra Lilyanne.
Em seus olhos vejo o brilho da criança mais sapeca e linda que já vi
em toda a minha vida. Não é porque ela é minha filha, mas ela
simplesmente tem uma luz própria.
Ela tem muito do Noah, mas também vejo um pouco da Sara nela,
na verdade muito, a personalidade dela é completamente oposta a minha e a
do meu marido, é sapeca, teimosa, e respondona, e ela só tem três anos!
Fico imaginando onde ela vai parar... acho que diferentemente de Dominic,
Lucinda e Helena, Lilyanne é muito mais que ativa, ela tem iniciativa,
daquelas crianças que nunca esperam, é impaciente, mas ela sabe quando eu
falo sério.
Deixaremos ela e Helena com meu sogro e Sabrine, eu e Noah
vamos viajar pra comemorar nosso nono aniversário de casamento. Nove
anos! Parece que foi ontem, mas simplesmente dentro de mim nunca me
senti tão empolgada com mais uma de nossas viajens.
Beijo a cabeça de Lilyanne, Noah se despede de Dominic, Helena e
Lucinda, os três já são um pouquinho maiores, eles são simplesmente
grudados no pai, e ele faz cara de choro enquanto os aperta, o meu marido é
assim: muito sensível, sentimental, carinhoso, um pai e tanto pras nossas
crianças! Há nove anos, quando engravidei dos gêmeos, eu não tinha medo
nem receio de que fosse um pai ruim, mas Noah supera toda e qualquer
expectativa.
Meus olhos estão em Lilyanne, meus pais me abraçam enquanto
papai a ergue no colo, nós viajamos todo ano nas férias com as crianças, e
quando o Noah precisa viajar por alguma eventualidade da King, eu o
acompanho, mas nem sempre vamos juntos, as crianças sofrem muito
quando nos afastamos; nos acostumamos a tê-las conosco, e só de pensar
que ficaremos duas semanas longe delas, já fico com o coração apertado.
Noah se aproxima e vamos nos afastando de nossa família.
Soube que Arthur está saindo com Donatela, mamãe é meio
fofoqueira, ela me falou tudo, sempre, desde que a Sara morreu ela vive
tomando conta do Arthur e da Sabrine, em parte porque a minha cunhada
era uma criança ainda quando sua mãe morreu.
Acho que não me incomodo, Donatela e eu não nos falamos com
frequência nem nos vemos com frequência, mas acho que o fato dela
sempre estar na casa dos meus pais deu uma força pra que Arthur se
interessasse por ela, é bonita, mantem-se jovem, por que não?
A mágoa ficou pra trás e eu vivo apenas a minha vida como tem
que ser vivida ao lado do Noah.
Tantas coisas mudaram desde que nos casamos...
Tivemos nossas crianças, mudamos de casa, Sara morreu, mamãe
passou por um tratamento difícil, um transplante arriscado, mas sinto como
se nada disso mudasse o que eu e ele temos.
Claro, sempre que nós brigamos, eu me lembro daquele momento
ruim que vivemos nas Maldivas, há nove anos e repenso com cuidado em
tudo, depois conversamos, e conversamos, e discutimos, e nos resolvemos.
Tem dia que brigamos e ficamos o resto do dia sem nos falarmos,
mas tem dia que o Noah consegue mesmo me irritar e acabo expulsando ele
da cama ou dou greve — mamãe me ensinou isso — e ele vem feito um
cachorro comer na minha mão... ou comer outra coisa!
Ainda continuo uma garota GG, eu ainda sou acima do peso,
mantenho até os dias atuais oitenta e quatro quilos, sou saudável, meus
filhos são saudáveis, e eu me cuido dentro do possível.
A rotina de ser a mulher de Noah me exige apenas que eu cumpra
com o dever de ser sua esposa e mãe de seus filhos, também secretária nos
momentos que posso. Decidimos dar um tempo em filhos justamente por
conta disso, não temos babás!
Sabrine agora tem vinte anos e está no terceiro ano da faculdade,
ela é estagiária na King.
Connor é sócio do Noah, eles restabeleceram a antiga amizade, e Arthur se
sente mais útil sendo conselheiro chefe da empresa.
Mamãe tem me ajudado na educação das crianças; papai largou o
álcool e tem se dedicado a função de ajudar ela com nossos filhos, eles dois
adoram nossas crianças! Papai diz que reaprendeu a viver pequenos
momentos que não viveu comigo quando eu era criança, e com o
nascimento de Lilyanne, ele e o Dominic são inseparáveis! Papai é o nosso
motorista, sempre os leva e trás dos lugares; mamãe cozinha e cuida dos
afazeres domésticos.
Sabrine mora com Arthur em um apartamento no centro, mas vive enfiada
lá em casa, na casa de mamãe — acho que ela ainda sente muita falta de
Sara, assim como o Noah, mas ela aprendeu a entender a dor e a viver com
o que tinha: seu pai e seus irmãos.
Noah e eu embarcamos.
Sempre que viajamos ficamos juntinhos, é uma das dezenas de
manias que temos. Desde que nos casamos, vivemos momentos de tristeza e
muitos altos e baixos, mas também criamos nosso vínculo inquebrável com
o passar desses anos.
Ele e eu... não sei descrever bem.
Quando, há nove anos eu o reencontrei na King, estava apavorada
demais com a hipótese de revê-lo, magoada, tão ferida... mas não era apenas
aquilo, eu tinha medo de reencontrar Noah, porque sabia que ele era o
grande amor da minha vida, e preferia viver com a decepção dele ter me
largado do que lidar com aquilo, porque em minha mente, ele era o meu
melhor amigo e deveria permanecer aquilo para sempre.
Eu e Ty nos vemos sempre...
Suspiro.
Ele e Dyanna tiveram uma menina... e um menino... e uma
menina... e mais um menino!
Eu o chamo de invejoso! Ele deve ser, porque fez questão de ter
quatro filhos, assim como eu! Ele tem um senso de sensibilidade muito
grande, e eu realmente às vezes, não conseguia compreender o que houve
com Ty — completamente — em relação a sua sexualidade, até que um dia,
durante um de nossos cafés da tarde, ele me contou a sua triste história de
abandono. Lógico, fiquei muito triste. Ty fora abandonado no altar por sua
noiva, isso o destruiu, depois disso ele começou a sair com homens — claro
que não justifica —, mas ele também disse que se sentia muito atraído por
homens, e me contou umas barbaridades que ele a Dyanna faziam — e
ainda fazem — na cama por conta desse seu lado meio selvagem.
Mas, principalmente, o quanto ele descobriu a felicidade ao lado
dela. — O Beth fala que é um desperdício! — Aliás, eu transformei Beth
em meu Personal Stylist! E com a ajuda do Noah, também investi na Loja
dele e abrimos duas franquias juntos. Ele tem sido muito requisitado com as
GG's de Charlotte e de Nova York! Temos colhido bons frutos das roupas
que ele fabrica, os looks que ele monta, já fala até em vendas por internet,
ainda que eu foque mais na King.
Tenho focado muito na empresa do meu marido, principalmente
porque ele tem precisado muito de mim, claro que com o nascimento das
crianças, nós dois meio que ficamos mais por conta delas, mas eu nunca
abandonei o meu posto de secretaria dele.
Noah me chama de "serviçal", é um abusado! Também, nem sempre nossa
convivência no escritório é das melhores, mas eu sei separar as coisas.
Meio que cochilo durante o voo, Noah dorme feito uma pedra, leio
um pouco e acabo por dormir.
Logo que acordo ele está cheirando meu pescoço.
— Acorda fofucha!
Eu sei quando o meu marido quer sexo, e também sei quando ele
quer carinho.
E ele quer sexo!
Saímos do avião.
E nosso caminho até o hotel é bastante demorado, eu sinto que uma
pequena tensão sexual cresceu entre eu e Noah, conforme o percurso foi
demorando, não que não tenhamos feito sexo recentemente, ontem à noite
fizemos um amorzinho bem gostoso na nossa cama, mas é que parece que
agora é que temos tido mais tempo pra nós! As crianças estão crescendo, e
isso os deixa um pouco mais independentes.
Chegamos ao hotel e percebo a impaciência do Noah, sua pressa, às
vezes ele fica até mal humorado quando vem à vontade e não tem como nós
fazermos.
Fazemos check-in no hotel e subimos para o nosso quarto, mal o carregador
deixa as malas e vai embora, ele me empurra no primeiro sofá que vê pela
frente e vai arrancando minhas roupas.
— Seu pervertido!
— A culpa é sua pela greve do mês retrasado!
Não me lembro de ter feito greve há dois meses, mas me vejo
tirando às roupas muito rápido e Noah tirando as dele, ainda nem tirei meu
sutiã quando ele me penetra por trás rapidamente. Arfo, e ele entra mais,
apertando meus ombros, me puxa se sentando no sofá e me acomodo
apoiando os pés no estofado, abrindo as pernas, Noah me dá um tapa no
meio da minha intimidade e me olha de lado, apertando meu seio com a
outra mão.
Me seguro no encosto do sofá e começo a me mover lentamente em
sua ereção, seus olhos nos meus, Noah toca a parte de dentro das minhas
coxas e me beija o pescoço com carinho, fecho os olhos entregue as ondas
de prazer que ele me proporciona. Me movo bem depressa, pois, também
quero muito isso.
Adoro a nossa intimidade.
Parece que a cada ano que passa ficamos melhores nisso.
Noah aperta os meus seios com força e puxa minhas pernas pra
baixo, ele me empurra e me apoio na mesinha, depois começa a meter com
mais força em mim, ergo a perna novamente, apoiando-a na mesinha e
abrindo pra que ele entre mais, meta mais! Ele puxa meus cabelos e me
morde as costas com força, estocando com força, mas apenas
suficientemente pra que aumente meu prazer.
Ele geme enquanto me penetra e me dá uns tapas fortes na bunda,
— grito! Eu sempre grito, porque é muito insuportável o jeito como ele me
faz sentir prazer. Noah judia de mim às vezes, ele sabe como eu gosto e fica
fazendo isso! — quando chego perto do orgasmo, ele vai parando, me
deixando quase louca, mas hoje estamos com pressa, bastante pressa.
Os orgasmos me atingem na certa e fico parada, recebendo os
choques intensos que percorrem meu corpo, me viro pra ele ainda gemendo
e me ajoelho, eu o coloco em minha boca e ele geme alto enquanto permito
que goze na minha boca. Beijo ele todo e o engulo, lhe dando mais e mais
prazer. Meu marido me puxa pelo braço, acabo caindo em cima dele no
sofá, sorrimos um pro outro e nos beijamos, sinto que a paixão é algo que
jamais acabará em nosso relacionamento.
Ainda que o casamento seja uma missão desgastante, acho que não
existe segredo melhor do que agradar um ao outro, fazer concessões, o
Noah sempre me dá flores, eu particularmente, adoro receber flores em
qualquer momento do dia, na empresa não, teve uma época em que foi
constrangedor ter pessoas comentando a nosso respeito. Odeio que
especulem nossa vida conjugal, mas em casa, ou quando eu venho primeiro
e ele chega com flores, é simplesmente como se tudo em mim se
abrandasse.
Vamos ao cinema, e nós sempre tiramos tempo pra namorar — acho que
isso nos mantém bem próximos um do outro, mas nada se compara a ela...
Barbie!
Virou mesmo a casinha das crianças, mas é acima de tudo nosso
xodó, sempre que podemos, escapamos até ela, todos os nossos filhos foram
concebidos na Barbie, o Noah gosta de transar lá, mas não é isso! Nós
encontramos principalmente, refúgio e um pouco de paz no bosque. Aquele
lugar foi palco de nossa infância, dos momentos mais felizes da minha vida,
e dos mais difíceis.
— No que pensa, minha gorduchinha?
— Nas crianças e na Barbie.
— Você não consegue ficar longe deles, não é verdade?
— Nem você, seu bobão.
— É verdade, Jas! Vou ligar para o papai e pedir que eles venham
semana que vem!
Sorrio, me apoio num cotovelo, minha perna em cima dele. Noah
está como sempre, lindo! Ele engordou um pouco nesses anos, mas o corpo
dele está sempre em forma, claro, corre, malha, ele se cuida muito, mas não
é algo ligado à aparência. Ele gosta de se exercitar, é como um passatempo
anti estresse pro meu marido.
Toco seu peito, ele está deitado de costas no sofá, sempre que eu o
olho me vem à mente, a imagem do menino que eu amei durante toda a
minha infância, mas também do homem que aprendi a amar e desejar em
sua vida adulta.
A amar muito mais que tudo.
A admirar muito mais que tudo.
— Nove anos! — Noah vira a face pro meu lado e me fita pensativo
— Poxa, parece que foi ontem que você me deu um soco no nariz.
Toco sua face, e meu coração fica todo apertado.
— Eu nunca permitiria que fosse embora, Noah Baltimore.
Seus olhos azuis me fitam cheios de significado.
— Tinha que ser tão sexy e apaixonante falando isso, Sam?
— Tinha!
Noah olha cada centímetro do meu corpo e umedece os lábios, não
tenho um pingo de vergonha. Deixei meus receios sobre meu corpo de lado
há alguns anos. Eu tenho estrias, eu tenho celulite, e os meus seios estão
ainda mais flácidos, mas quando me olho no espelho, eu não consigo me
sentir muito diferente do que sempre fui. A garota que estava dentro de
mim, frustrada, sumiu de vez naquele jantar da "S Magazine", eu
simplesmente deixei os complexos de lado e tenho sido quem eu sou, uma
Número 50.
Mas uma Número 50 feliz, bem casada e mãe de quatro filhos, com
pais maravilhosos, uma cunhada chatinha e um sogro simpático.
— Como eu consegui viver treze anos da minha vida sem você,
Samantha?
Meus lábios tremem um pouco, e eu abaixo o olhar tentando
prender as lágrimas.
— Bem, digamos que eu só estava guardada no melhor lugar dentro
de você.
— No meu coração!
Sorrio, mas não consigo prender as lágrimas, depois eu o beijo me
sentindo alguém muito feliz com tudo.
— Te amo, Samantha Jasmine!
— Te amo, Noah Isaac!
Nos olhamos, e ele me aperta, me recosto em seu peito, e me sinto
acolhida, em paz, Noah me beija a cabeça e ficamos quietos. Eu sei que eu
jamais me encaixarei nos padrões, eu sei que eu jamais conseguirei ser
eleita a garota mais linda do mundo, eu sei que algumas pessoas não
entendem e não aceitam o fato de que o meu marido me escolheu como sua
esposa, mas eu sou o suficiente pra ele, eu sou linda da minha forma, eu sou
perfeita do meu jeito. Ainda existe uma parte de mim que sente bastante
receio pelo preconceito das pessoas, mas extingui o preconceito que eu
tinha sobre eu mesma, mudei meus conceitos, e nesses incríveis nove anos
que se passaram, eu venho amando muito mais alguém do que tudo, eu
mesma!
Acho que ninguém é feliz para sempre, pois a felicidade é alvo
constante de uma busca de todo e qualquer ser humano na face da terra, mas
eu sou incansável, eu ando conseguindo ter bastante felicidade.
Sendo quem eu sou.
Por Noah e minha mãe, por meu pai e os meus filhos, mas
principalmente por mim mesma.
EPÍLOGO
O Que o Futuro Nos Reserva
Quatorze anos se passaram...

— Soube que ela é filha de alguém importante, mãe!


— De São Francisco!
Olho pro Noah e ele franze a testa fazendo pouco do entusiasmo de
Helena e Lucinda, Lilyanne está fatiando o repolho, desinteressada.
É complicado às vezes tentar lidar com as minhas filhas. É tão mais
prático lidar com o Dom! Ele é obediente, não tagarela tanto, e sempre está
disposto a me ajudar em tudo o que preciso. Mas isso era quando ele ainda
era pequeno, e uma criança que vivia sob o meu domínio.
Lucinda e Helena também foram pra faculdade. Lucinda terminou
no mesmo ano que seu irmão gêmeo, Helena se formou ano passado,
Lilyanne é a única que permanece na faculdade, ela entrou há um ano.
Quem diria, eu, mãe de três jovens administradores?
Mas não apenas deles.
Tem a Jade, ela foi a nossa última filha, depois dela fechamos a
fábrica, contra a vontade do Noah é claro, mas ele precisava entender que
eu não poderia continuar tendo tantas crianças daquela forma, ainda que
todas elas viessem com saúde, eu estava me desgastando demais com a
King e com elas, agora já estão todas crescidas.
Jade tem treze anos, ela foi a única que saiu a mim, morena, cabelos
escuros, olhos pra um azul mais escuro como o meu, e ela também saiu a
minha genética, é gordinha! As meninas passaram por essa fase, mas foram
e são muito diferentes dela, sempre tento conversar com a Jade, mas tem
sido um pequeno desafio tentar convencê-la a ser apenas ela mesma, eu e o
pai a amamos do jeito que é. Agora ela está fatiando o tomate, ao lado de
Lilyanne. Noah fala que é só uma fase, mas tenho cuidado, já passei por
isso. — Há muitos e muitos anos atrás é claro! Mas sei bem como é! Não
mudei, e o Noah adquiriu uma barriguinha que só Deus na causa.
Vinte e dois anos de casados, um menino, quatro meninas depois, e
eu continuo com o mesmo peso, visto o mesmo jeans, mas isso não é
diferença pra mim em nenhum sentido.
Dominic se mudou pra Nova York pra cuidar de uma de nossas
filiais lá, Lucinda cuida da King daqui com a ajuda de Helena, Noah e eu
temos trabalhado também na empresa nos últimos treze anos, desde então,
temos equilibrado muito bem as duas áreas de nossas vidas.
Mas, ter tantas mulheres dentro de uma casa, às vezes é desgastante,
e elas só param quando o pai manda parar, às vezes, quando não funciona,
eu dou o grito, ai elas param!
A mudança do Dominic pra Nova York mexeu muito comigo, mas
percebi logo que o meu filho se tornara um homem independente e feito, ele
é jovem e cheio de sonhos. Mas eu já havia me acostumado com a distância
quando ele foi pra Universidade e estudou fora, vinha apenas nos feriados e
nas férias, contudo, nos falamos quase todos os dias desde que ele foi de
vez pra lá.
As meninas são mais apegadas a nós, ao pai, Noah também as mima
muito, passa muito a mão na cabeça delas, e depois de vinte e dois anos de
casamento, cinco filhos e agora o Dominic com a primeira namorada, —
que trás pra que eu conheça — eu já me sinto preparada para o próximo
passo...
— Eles chegaram. — Cochicha Helena, toda empolgada.
Noah vem e me segura pela cintura, nós nos vestimos pra ocasião.
Meus pais estão viajando com Arthur e Donatela, eles inventaram de fazer
um cruzeiro, Sabrine esteve aqui mais cedo, mas foi embora, está grávida
do segundo filho e já começou a sentir algumas contrações; estamos
atentos, o marido dela está viajando a negócios.
Arrumo a gola da camisa do Noah por cima do suéter enquanto
vamos pra sala, ele me beija um pouco antes que entremos na sala, sorrio, e
me sinto um pouco inadequada, Jade, Lucinda, Helena e Lilyanne vem logo
atrás. Nós nunca recebemos uma namorada do Dominic aqui, estamos
surpresos e um pouco felizes com a visita, ele disse que viria passar esse
feriado conosco e que traria uma amiga, logo, concluímos que esta amiga é
também sua namorada. Não faço ideia de quem seja, mas as meninas já
andam bisbilhotando a vida da moça. Não me lembro de como se chama.
Logo ele entra na sala de mãos dadas com ela.
Dominic é loiro como o pai, tem olhos azuis como os dele, o sorriso
dele lembra o sorriso de Sara — Sim, Sara — mas algo muito gentil e doce
que me lembra o Noah. Não sei descrever o que sinto quando olho pro meu
filho, pois ele é simplesmente um dos meus melhores presentes de toda a
vida, todos eles são, mas Dominic é um menino bom, eu sei que sim, é
pacífico como o pai, ainda que seja teimoso e cabeça dura como eu, a
insistência herdou do Noah.
Analiso a pequena moça ao lado dele, ela parece um pouco tímida,
tem cabelos curtos, é magra e baixinha, meio franzina, os olhos são de um
verde exótico e a cor de sua pele é morena, lábios grandes e rosados, nariz
perfeitinho, ela usa um vestido preto cubinho, e segura uma bolsa com a
outra mão, ela sorri meio envergonhada, parece meio acanhada ou coisa
assim. Eu e Noah vamos ao encontro deles, estou muito feliz de conhecer a
primeira namorada do meu filho.
Noah vai abraçá-lo, sentimos muita falta do Dominic, logo em
seguida, as irmãs o abração, meus olhos não saem da moça.
— Muito prazer, sou Samantha, a mãe do Dom.
Ela sorri pra mim, e não tenho dúvidas de que gosto logo de cara
dela.
— Charlotte Carsson.
Aperto sua mão, tenho a impressão de que eu e Charlotte seremos
grandes amigas.
Espero que não apenas isso.

Fim

[1]
BV é abreviação de “boca virgem”.

[2]
A. A é a abreviação para “Alcóolatras Anônimos”.

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