Você está na página 1de 8

ACO M PA N H AMENTO P L ENU S

MAGISTRATURA
ESTADUAL
SEMANA 7

SELEÇÃO DE
JURISPRUDÊNCIAS
DO STF
MAGISTRATURA
ESTADUAL

1) DIREITO PENAL

1.1) Inexigibilidade de licitação e tipicidade da conduta do Art. 89 da lei 8.666/93:

Preliminarmente, para melhor elucidação do julgado em tela, cum-


pre relembrar alguns conceitos sobre licitação.

O primeiro deles é o de Licitação Inexigível: De acordo com o art. 25


da Lei 8.666/93, a inexigibilidade de licitação deriva da inviabilidade de compe-
tição pelo Poder Público:

Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabili-


dade de competição, em especial:
I - Para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêne-
ros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa
ou representante comercial exclusivo, vedada a prefe-
rência de marca, devendo a comprovação de exclusivi-
dade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão
de registro do comércio do local em que se realizaria a
licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federa-
ção ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entida-
des equivalentes;
II - Para a contratação de serviços técnicos enumerados
no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissio-
nais ou empresas de notória especialização, vedada a
inexigibilidade para serviços de publicidade e divulga-
ção;
III - para contratação de profissional de qualquer setor
artístico, diretamente ou através de empresário exclusi-
vo, desde que consagrado pela crítica especializada ou
pela opinião pública.
(...)

Atente-se que a palavra “Em especial” no Caput do Art.25 deixa claro


que estamos diante de um rol meramente exemplificativo de modo que sem-
pre que houver inviabilidade de competição, a licitação será considerada ine-
xigível.

O segundo conceito necessário é a Dispensa de Licitação. Segundo


Matheus Carvalho:

# o u s e m a g i s 2
MAGISTRATURA
ESTADUAL

Nas situações de dispensa, o Poder Público encontra-


-se diante de situação em que é plenamente possível a
realização do procedimento licitatório mediante a com-
petição, no entanto, a lei dispõe que é desnecessária a
execução do certame. Somente a Lei de Licitações pode
definir as hipóteses de dispensa, não podendo haver de-
finição de novas hipóteses por atos administrativos es-
pecíficos ou decretos. (CARVALHO. Matheus. Manual de
Direito administrativo. 4ª Edição. 2017. Editora JusPodi-
vm. Pág. 496).

Justamente por ser plenamente possível a realização do procedi-


mento licitatório, a conclusão lógica é que as hipóteses de dispensa de licitação
estão previstas em um rol taxativo, não admitindo interpretação analógica.

Segundo a melhor doutrina, a dispensa de licitação se divide em


duas:

 Art.17: Hipóteses de licitação dispensada: Não há


qualquer juízo de valor por parte do Administrador pú-
blico. Seria um ato vinculado, em que administrador pú-
blico estaria obrigado a dispensar a licitação.

 Art.24: Hipóteses de licitação dispensável: Nesses


casos, há uma atuação discricionária do administrador
público. De modo que cabe a este decidir se irá fazer ou
não o procedimento licitatório.

Mas o que acontece se o Administrador público resolve dispensar a


licitação fora das hipóteses previstas em lei? Ele poderá cometer o Crime do
Art. 89 da Lei 8.666/93:

Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóte-


ses previstas em lei, ou deixar de observar as formalida-
des pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que

# o u s e m a g i s 3
MAGISTRATURA
ESTADUAL

tendo comprovadamente concorrido para a consuma-


ção da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou ine-
xigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder
Público.

Superada essa síntese inicial, imagine a Seguinte situação Hipotética:

Juan, prefeito da cidade “A” resolveu fazer um anúncio publicitário.


Dessa forma, solicitou parecer técnico e jurídico da procuradoria do município.
Esta, entendeu que o prefeito poderia fazer contratação direta com a agência
de publicidade sem necessidade de prévio procedimento licitatório. Acreditan-
do estar amparado legalmente o prefeito contrata diretamente a agência publi-
citária, não acarretando qualquer ônus para administração pública.
O MP entendeu que houve fraude na licitação e que o art. 89 não exi-
ge dolo específico, não sendo necessário, portanto, que o prefeito tenha agido
com consciência de causar um dano administração pública.

O STF Concordou com o entendimento do MP? NÃO!

Para o Supremo, o Crime do Art.89 da lei 8.666/93 exige um dolo es-


pecífico de causar dano ao erário ou de gerar o enriquecimento ilícito, além do
dolo geral que consiste na vontade consciente de dispensar ou inexigir licitação
fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as devidas formali-
dades.

A corte entendeu que o tipo penal em questão não criminaliza o


mero descumprimento de formalidades e que irregularidades pontuais são
inerentes à burocracia estatal e não devem, por si só, gerar criminalização de
condutas se não projetam ofensa consistente ao bem jurídico tutelado.

Portanto, o STF entendeu que: “O delito em questão exige, além do


dolo genérico — representado pela vontade consciente de dispensar ou ine-
xigir licitação com descumprimento das formalidades —, a configuração do
especial fim de agir, que consiste no dolo específico de causar dano ao erário
ou de gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos na empreitada
criminosa”. (Inq 3962/DF, rel. Min Rosa Weber, julgamento em 20.2.2018)

# o u s e m a g i s 4
MAGISTRATURA
ESTADUAL

1.2) Gestantes e mães presas preventivamente: Habeas Corpus Coletivo:

Em decisão Histórica, o STF concedeu ordem de Habeas Corpus co-


letivo movida por advogados do “Coletivo de Advogados em Direitos Huma-
nos” e pela Defensoria Pública da União em favor de todas as mulheres presas
preventivamente que ostentem a condição de Gestante, de Puérperas, de mãe
de crianças (até 12 anos) ou de deficiente sob sua responsabilidade, esten-
dendo seus efeitos para às adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas
em idêntica situação.

Assim, o supremo determinou a substituição da prisão preventiva


pela prisão domiciliar, sem prejuízo da aplicação em conjunto com as cautela-
res diversas da prisão sempre que necessário. Ex: Prisão Domiciliar + Monitora-
mento eletrônico (Art. 319, IX do CPP).

Nesse ponto, cumpre fazer uma breve revisão sobre prisão domici-
liar. É mister ressaltar que existem dois tipos de prisão domiciliar: Cautelar e a
da Execução (LEP), vejamos o quadro abaixo para melhor elucidação:

PRISÃO DOMICILIAR – ART.318 DO PRISÃO DOMICILIAR – ART. 117 DA


CPP LEP
O Art.318 do CPP tem natureza de Tem índole de pena, portanto reco-
cautelar, de cunho processual, capaz nhecimento de condenação ( no mí-
de substituir a preventiva. nimo execução provisória da pena).
Ressalta-se que só cabe falar em pri-
são domiciliar quando se tem presen-
te os requisitos da preventiva, caso
contrário o caso é de liberdade provi-
sória.

Então virou um direito subjetivo da gestante presa provisória em


ter sua prisão preventiva substituída por prisão domiciliar? Calma, amigos do
Ouse, não é bem assim. O STF decidiu que a liberdade de deve ser REGRA, con-
trariando entendimento anterior do Superior Tribunal de Justiça, que entendia
que o magistrado deveria analisar, caso a caso, a adequação da prisão domici-
liar. Deste modo, conforme a Corte Suprema, a prisão não deve ser concedidas
apenas em algumas hipóteses excepcionais e devidamente justificadas, quais
sejam:

# o u s e m a g i s 5
MAGISTRATURA
ESTADUAL

• Crimes praticados com violência ou grave ameaça;


• Crime contra seus descendentes
• Situações Excepcionalíssimas as quais deverão ser fundamentadas
pelos juízes que denegarem o benefício. (Cláusula Aberta)

É de clareza meridiana que o STF deu ao juiz de piso o poder de ave-


riguar a manutenção da prisão preventiva, desde que fundamentadamente.

O próprio STF trouxe o exemplo da reincidência em que o juiz deverá


proceder em atenção as circunstâncias do caso concreto, mas deve-se sempre
ter o norte que a prisão é medida Excepcional. Deste modo, a reincidência, por
si só, não é motivo idôneo para afastar a prisão domiciliar, devendo o afasta-
mento ser excepcional e fundamentado.

Outra situação mencionada pelo Supremo é a suspensão ou desti-


tuição do poder familiar, hipótese que a ordem aqui não irá se aplicar, pois a
pessoa não seria essencial para os cuidados do menor.

Certo, mas é cabível HC coletivo? Qual a previsão legal disso?

Não há previsão legal expressa para concessão de HC coletivo. O STF


entendeu cabível, pois, muitas vezes, a via coletiva é um dos únicos instrumen-
tos capazes de garantir o acesso à justiça dos grupos mais vulneráveis socioe-
conomicamente.

Nesse sentido, o HC presta-se a salvaguardar a liberdade. Assim, se


o bem jurídico ofendido é o direito de ir e vir, quer pessoal, quer de um grupo
determinado de pessoas, o instrumento processual para resgatá-lo é o Habeas
Corpus, seja ele individual ou coletivo.

Para concluir pela possibilidade de HC coletivo, o STF utilizou dos


Artigos 654 §2º e do Art. 580, ambos do CPP, vejamos:

Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por


qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como
pelo Ministério Público. § 2o Os juízes e os tribunais têm
competência para expedir de ofício ordem de habeas

# o u s e m a g i s 6
MAGISTRATURA
ESTADUAL

corpus, quando no curso de processo verificarem que al-


guém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.

Art. 580. No caso de concurso de agentes (Código Pe-


nal, art. 25), a decisão do recurso interposto por um dos
réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter
exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.

Ainda, o STF asseverou que soma-se a esse fundamento o reconhe-


cimento do Estado de coisas Inconstitucional1 (Violação generalizada de Direi-
tos Fundamentais causado pela inércia estatal) e a relevância constitucional da
matéria.

Por fim, o Ministro Dias Toffoli, em feliz observação, acresceu que,


nos termos da Constituição, o mandado de segurança é cabível quando não
cabe o Habeas Corpus (art. 5º, LXIX), o que demonstra certa semelhança entre
os citados remédios constitucionais pela própria sistemática da Carta Magna.
Deste modo, por analogia, como é admissível a impetração de MS coletivo,
pode ser aplica a mesma lógica ao habeas corpus, principalmente em se tra-
tando de um remédio que busca salvaguardar a liberdade.

Impende destacar que o Superior Tribunal de Justiça não vinha ad-


mitindo a impetração de habeas corpus coletivo, por entender que não há pre-
visão legal e pela necessidade de que sejam determinados os beneficiários da
medida.

Quais as razões de mérito que levaram o STF a conceder o HC?

 Há grave deficiência estrutural no sistema carce-


rário, que faz com que as mulheres grávidas e mães de
crianças, bem como as próprias crianças, sejam subme-
tidas a situações degradantes, resultantes da privação de
cuidados pré-natal e pós-parto e da carência de berçários
e creches.

 Existe a cultura do encarceramento, que se revela


pela imposição exagerada de prisões provisórias a

# o u s e m a g i s 7
MAGISTRATURA
ESTADUAL

mulheres pobres e vulneráveis, e que resulta em situações


que ferem a dignidade de gestantes e mães, com prejuí-
zos para as respectivas crianças.

 O Brasil não tem conseguido garantir sequer o bem-


-estar de gestantes e mães que não estão inseridas no
sistema prisional, ainda que o cuidado com a saúde ma-
ternal, de acordo com a ONU, seja prioritário no que con-
cerne à promoção de desenvolvimento.

 A atuação do judiciário no sentido de coibir o des-


cumprimento sistemático de regras constitucionais e in-
fraconstitucionais referentes aos direitos das presas e de
seus filhos é condizente com os textos normativos que in-
tegram o patrimônio mundial de salvaguarda dos indiví-
duos colocados sob a custódia do Estado.

 As crianças, notadamente, sofrem as consequências


desse quadro em flagrante violação aos seus direitos fun-
damentais, o que resulta em impactos ao seu bem-estar
físico e psíquico e em danos ao seu desenvolvimento.

Portanto, o STF concluiu que: “É de se evitar a arbitrariedade judicial


e a supressão de direitos, típicas de sistemas jurídicos que não dispõem
de soluções coletivas para problemas estruturais. Nesse sentido, cabe ao
STF estabelecer os parâmetros a serem observados pelos juízes quando
se depararem com a possibilidade de substituir a prisão preventiva pela
domiciliar”. (HC 143641/SP. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em
20.2.2018).

1 http://www.conjur.com.br/2015-set-01/carlos-campos-estado-coisas-inconstitucional-litigio-estrutural

# o u s e m a g i s 8

Você também pode gostar