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Direito Penal

CONCEITO MATERIAL DE CRIME, PRINCÍPIOS E FUNDAMENTOS


➢ Definição do Direito Penal
O Direito Penal constitui um conjunto de normas que se atribuem a certos
factos descritos – os crimes – consequências jurídicas graves – as penas e as medidas
de segurança. Assim, as normas penais identificam-se através do crime, da pena e da
medida de segurança: o crime é o conteúdo de previsão da norma e as penas e as
medidas de segurança são a sua estatuição.
Há, assim, três elementos constantes das normas penais:
a) Previsão – crimes;
b) Estatuição – penas e medidas de segurança.
Note-se que não basta que o legislador designe certos factos como crimes e
designe certas consequências como penas para que estes efectivamente o sejam – o
crime e a pena têm um conteúdo pré-legislativo indisponível. Estes, antes de serem
descritas pelo legislador nos termos legais, já resultam das próprias instâncias sociais.
Não chega que uma conduta seja punida para que possa ser constituída como crime – este
pensamento deve ser substituído pela ideia de que só é criminoso o comportamento que
mereça uma pena.
O direito penal é um ramo do direito público ao qual a lesão dos bens jurídicos
essenciais para a vida em sociedade são atribuídas as sanções mais graves do ordenamento
jurídico. Então, para que nos seja possível definir o Direito Penal, temos antes de recorrer
às ciências que estudam o comportamento humano, nomeadamente à Criminologia.
Note-se ainda que podemos falar de Direito Penal em sentido objectivo e de Direito Penal
em sentido subjectivo:
• Direito penal em sentido objectivo - conjunto de normas jurídicas que ligam a
certos comportamentos humanos, os crimes, determinadas consequências
jurídicas privativas deste ramo do direito;
• Direito penal em sentido subjectivo – é o ius punendi. É o poder punitivo do
Estado, resultante da sua competência e soberania, para considerar como crimes
certos comportamentos humanos e associar-lhes determinadas consequências
jurídicas.

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


O que é o Direito Penal?
A definição de crime encontra-se numa área de confluência entre a Ética, a Moral
e o Direito, mas há um certo consenso no facto de ser um comportamento antisocial
(Mannheim).
O crime não pode ser estático, mas, como facto sociológico, ele será o resultado
da seleção social que inclui legislador, polícia, tribunais e grupos sociais. Maria
Fernanda Palma critica esta noção como muito relativista.
Conjunto de normas que num sistema jurídico tem como finalidade articular
comportamentos com certas consequências jurídicas. Não são quaisquer consequências
jurídicas, são de 2 tipos: as penas (a mais expressiva é a prisão; e as medidas de
segurança (carater preventivo – mais aplicáveis aos inimputáveis – aqueles que não tem
capacidade de exercício. Podem ser multas, apreensão de cartas, etc.)
O Direito Penal é caraterizado por serem restrições muito graves da liberdade, em
ambos os tipos. Esta é a marca distintiva do Direito Penal.

Coima ≠ Pena
O que torna distintiva uma coima da pena é que enquanto a multa penal é convertida em
pena de prisão, a coima não é.
O ex-libris do Direito Penal é a gravidade das suas sanções em termos de privação ou
restrição de direitos, porque embora diferentes, em ultima análise afetam sempre a
liberdade.
Caso de uma sanção que não é penal, mas sim disciplinar é a questão da prisão disciplinar
voluntária. Artigo 27º CRP.

O facto de o legislador ter elencado determinado facto como crime e ter


atribuído a esse facto uma pena, é legitimo? Está sujeito a discussão? Devemos fazê-
lo porque o ponto de partida de que o Direito Penal lida com os comportamentos mais
graves do ordenamento jurídico, como é que se ultrapassará a legitimidade de atribuir a
um determinado facto uma pena? Como aponta Maria Fernanda Palma, encontramo-nos
agora perante um problema: a identificação anterior parece indicar que, sempre que o
legislador designa os factos como crimes e as sanções como penais, será que elas são
realmente crimes e sanções? Não, pois o crime e a pena têm um conteúdo pré-
legislativo indisponível, sendo entidades produzidas por instâncias sociais antes da
sua modelação legislativa, havendo uma relação entre a definição social e legal. Assim,
as representações sociais sobre o crime, pré-jurídicas, são pontos de referência para o
legislador.
Temos muitas respostas:
• É obvio que por exemplo o estacionamento proibido, se fosse uma visita do Papa
e são atribuídas por um determinado período do tempo, proibições de
estacionamento e num determinado sitio e criminalizado até. Segundo uma visão

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formal do direito penal, o legislador atribuiu uma lei, estabeleceu uma sanção e
está tudo dito. Há aqui um problema, qual? Falta de proporcionalidade, é
excessivo porque o perigo é evitável, não é iminente, como os hábitos sociais
não o justificam. Se fosse criminalizado copiar num exame, não só anular exame,
consequências criminais mesmo, não se justifica, não é proporcional.
• Há um conjunto de comportamentos que não justificam que sejam criminalizados
por falta de proporcionalidade e não só, também por violar normas
constitucionais. Há um conjunto de situações em que o Direito Penal tem uma
fronteira, isto obedece a uma lógica que é uma lógica muito antiga, não se pode
dizer que seja assim só porque a CRP permite. É uma racionalidade ancestral –
Pufendorf.
O Direito Penal não se justifica que seja aplicado às situações em que os
cidadãos põe no Estado a sua confiança. O poder punitivo do Estado é um dos
principais poderes do Estado, é um poder fundamental, só pode legitimamente ser
utilizado quando as razões que justifiquem esta gravidade. É uma lógica de contrato
social que está aqui em análise. Prescindir da liberdade para que se cumpram as regras
de transito, não faz sentido, não há ninguém que em troca da boa ordenação dos
automóveis no estacionamento, prescindam da sua liberdade. Quando se justifica
quando estão em causa bens importantes das pessoas.
O que está em causa é a proteção da liberdade, da vida, da integridade física, etc.
Isto não significa que haja uma lógica de contrato social no DP. É uma ideia
absolutamente normativa, que justifica a organização em sociedades, o que é verdade é
que esta racionalidade no contrato social é normativa, que se justifica para melhorar o
poder do Estado, era isto que Hobbes, Rousseau queriam, era para estabelecer como o
Estado se deveria comportar e não basear a atuação do Estado em contratos. A
perspetiva destes filósofos era normativa única e exclusivamente.
Vamos basear o DP nestes contratos sociais para que o Direito Penal respeite
mais a liberdade dos cidadãos e menos repressivo. Estas duas ideias não são
contraditórias.
As normas penais deixam de ter justificação quando entram no território da
ética, quando são proporcionais, etc.

O direito penal requer um conteúdo normativo válido?

Esta pergunta é ilustrada com a obra de arte que representa um julgamento celebre do
Galileu.
A inquisição naquela altura detinha poder de natureza estatal e podia considerar crime
as descobertas científicas, nomeadamente a teoria. Eram considerados crimes contra a
fé, no entanto, o Galileu sendo uma pessoa de uma certa idade renegou as suas teses
científicas.
Não pode a validade penal depender do poder, nem que seja do poder democrático ou
aparentemente democrático.

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DIREITO PENAL:
• Conjunto de normas que descrevem certos factos – os crimes – e estatuem certas
consequências – as sanções criminais.
• Estrutura da norma jurídica: previsão e estatuição;

Definição material de Direito Penal: que factos podem ser caracterizados como
crimes?

Possíveis respostas:
1. Todos os que são objeto de uma sanção criminal – é circular, numa perspetiva de
fundamentação, pois não caracteriza os factos que uma norma deve caracterizar
como crimes. Mais correto seria afirmar que só é criminoso o comportamento
que mereça uma pena;
2. Todos os que têm uma certa gravidade moral – contudo, este critério não é
suficiente. Até porque muitos casos que envolvem gravidade moral estão
relacionados com problemas de consciência e não com a relação com outros.
Fundamenta, mas pressupõe que a moral é um critério de Direito ou com que
confunde com o Direito;
3. Todos os que revelam perigosidade do agente – também não parece ser um
critério suficiente, pelo menos sem que haja demonstração de algum ato lesivo.
Desloca a caracterização do facto para a personalidade ou qualidades do agente.
Há factos irrelevantes que podem revelar perigosidade e factos habitualmente
considerados crimes que não revelam perigosidade por serem esporádicos ou
revelarem uma situação-limite vivida pelo agente;
4. Todos os que são danosos numa certa medida para a sociedade – requer que haja
uma densificação do conceito de dano, para além de que há muitos factos
danosos que são acidentais.

O que é necessário para definir o crime, de modo satisfatório?


1. Uma fundamentação normativa aceitável pelo Direito da seleção dos factos e
não uma mera descrição formal, isto é uma razão universalizável pelo menos no
âmbito do sistema jurídico. Há quem que diga que não é possível universalizar
critérios, no entanto, a Prof. restringe a universalização de tais critérios no
âmbito do sistema jurídico.
2. Uma razão normativa que abarque o plano objetivo do facto e o seu plano
subjetivo.
3. Um método:
a) Alcançar uma resposta a partir das caraterísticas das especificas
consequências – as sanções criminais.
b) Quais os factos que podem de acordo com os critérios do sistema jurídico
justificar as sanções criminais? Se calhar esta pergunta não se pode
responder pela positiva, mas pela negativa. É mais fácil saber aquilo que não
pode ser direito penal. A pergunta devia ser, portanto quais os factos que não
podem (…)?
c) A gravidade das sanções criminais relativamente às restrições dos direitos
fundamentais só é justificável por factos proporcionadamente danosos desses
direitos ou bens de grande valia constitucional?

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d) A gravidade das sanções criminais relativamente às restrições dos direitos
fundamentais só é justificável por factos proporcionadamente danosos desses
direitos ou bens de grande valia constitucional.
e) Há uma relação de gravidade da sanção de gravidade da sanção com o facto
estabelecido através da Constituição – lógica do Estado de Direito, princípio
da necessidade da pena (art. 18º/2).

Há uma relação de gravidade da sanção com o facto estabelecida através da CRP-logica


do Estado de Direito, princípio da necessidade da pena (art. 18/2 CRP).

A definição do crime e os primórdios do Estado de Direito:


• A qualificação de um facto como crime depende do que se entende como
restrição legitima pelo Estado de direitos fundamentais através das penas.
• Essa questão foi e tem sido objeto da Teoria do Estado e da Filosofia política
através da tradição das teorias do contrato social.
• Segundo essas teorias, a legitimidade da restrição de direitos depende das
vantagens racionais decorrentes da proteção de bens indispensáveis pelo Estado

• Quando é que o estado pode intervir a liberdade das pessoas restringindo a


sua liberdade?
- Há uma relação de gravidade de sanção com o facto estabelecida através da
Constituição lógica do Estado de Direito, principio da necessidade da pena (artigo
18º/2 da Constituição); só poderão ser restringidas pelo estado as liberdades quando
estiverem em causa outras liberdades ou bens essenciais para a preservação da
sociedade.
- A definição do que pode ser crime é uma questão de valores constitucionais e da
relação entre o Estado e os cidadãos

Os filósofos do contrato social:


• A tradição liberal individualista de Locke – domina nos países anglo-saxónicos;
• O estado como guardião dos direitos individuais.
• O fundamento do poder é a própria proteção de direitos.
O que estava no horizonte lockeano era a preservação de direitos naturais. Pelo
contrario, o foco principal de Rousseau é antes a igualdade, através da associação dos
indivíduos num Estado, numa pessoa coletiva, sendo para ele o coletivo condição de
realização dos indivíduos.

As teorias contratualistas e o Direito Penal


Interessante é o estudo do Direito Penal com base nas teorias contratualistas. O
contratualismo representa um conjunto de correntes filosóficas que tentam explicar
a origem e a importância da construção das sociedades e das ordens sociais para o
ser humano. A ideia base, depois aflorada pelas considerações de cada autor, é a de que
há um acordo firmado entre os diferentes membros de uma sociedade, que se unem
com o intuito de obterem as vantagens garantidas a partir da ordem social. Cabe
analisar sumariamente o pensamento de alguns dos mais relevantes autores nesta matéria.

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✓ John Locke
Para este, o homem é um ser racional, que deve viver num sistema democrático – um
sistema de homens livres –, onde estes possam escolher os seus representantes e participar
na tomada de decisões que lhes dizem respeito. Para Locke, a liberdade não se pode
separar da felicidade, pelo que não existem felicidade sem garantias políticas e toda a
política deve ter como objectivo espalhar a felicidade racional.
Na sua concepção, o estado de natureza – o momento inicial – é um estado
relativamente pacífico, que apenas necessita de aperfeiçoamento. A propriedade privada
já existe, mas os homens têm de passar do estado de natureza para o estado civil para a
conseguir garantir. Ao estado de natureza apenas faltam a lei, os juízes e uma política,
pelo que é isso que os homens ganham quando passam para o estado de sociedade.
Fazendo uma ligação com o poder punitivo do Estado, John Locke afirma que do
Estado de natureza para o Estado civil se dá uma transferência do poder punitivo
dos indivíduos para o Estado. Esta transferência é dada ao Estado de tal forma que
Locke parece admitir que o poder punitivo não sofre qualquer tipo de mutação. Este ponto
é particularmente ilustrativo na pena de morte: o estado de natureza cada particular
poderia tirar a vida a outro; com a transferência do poder punitivo, o Estado poderia
nomeadamente tirar a vida àqueles que escolhessem injustificadamente tirar a vida a
alguém.
Estado como guardião dos direitos individuais.
A associação dos indivíduos no Estado permite desenvolvimento pela vontade coletiva,
a realização da igualdade. O coletivo é condição de realização dos indivíduos.
No estado de natureza se um desrespeitar o plano de igualdade, tem direito a reaver,
restituir? Sim, tem todo o direito, e até tem direito a matar para que o possa reaver. Para
resistir a isso, pode no limite matar essa pessoa, não precisamos de sair do estado de
natureza para ter os direitos.
No estado de natureza, só o mais forte é que consegue tutelar os seus direitos mas isso
nem garante que é o direito correto que está a ser usado, não há um autoridade
independente que diga o que é correto naquela situação.
Porque é que é necessário entre numa sociedade politica?
- Garantir o máximo de objetividade da lei, não é cada um a decidir em causa própria
- Não só garantir objetividade, que é entidade independente a dizer direito do caso
concreto mas que há uma autoridade que tutela o cumprimento desse direito, há um poder
executivo a aferir que o direito está a ser cumprido.
Locke não acredita na tirania pois um tirano teria a concentração de todos os poderes e
estaria a decidir em causa própria e isso não cumpre os requisitos para se sair do estado
de guerra.

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A luz deste modelo parece justificar-se somente o direito penal liberal, que é o essencial
que garanta que as pessoas não criem a guerra.
Entende o Estado como guardião dos direitos individuais, mas não como o seu criador. O
fundamento do poder é então a própria proteção de direitos. Associa a justificação do
Direito Penal à sanção de comportamentos que afetam os direitos individuais.
O crime é uma ofensa a direitos que justifica pela sua gravidade a restrição de direitos
fundamentais.
Para LOCKE, os indivíduos, no seu estado de natureza, estão todos em pé de igualdade,
sendo que, se o seu direito natural é atacado, cada indivíduo pode defendê-lo.
Ou seja, o poder punitivo será legítimo se servir para defender e garantir o exercício dos
direitos naturais.

✓ Jean-Jacques Rosseau
Diferentemente do que pensava Locke, Rosseau defende que o estado de natureza
não é um estado onde o homem vive em dispersão, isolado e feliz. O homem é aqui
um ser bom, mas é num estado intermédio – entre o estado de natureza e a sociedade
estabelecida – que o homem é verdadeiramente feliz. Para o Autor, o homem é
essencialmente bom, mas é depois corrompido pela própria sociedade. O povo deve
escolher seus representantes para governar, devendo essas ser pessoas que exercem o
poder em nome dos interesses gerais da população. Neste contexto, os cidadãos livres
renunciam à vontade própria em prol da vontade comum – o fundamento do Estado
reside na vontade geral, e não no somatório de todas as vontades individuais.
Com essa vontade geral, existe a garantia de que o soberano não age erradamente – o
homem a nada está obrigado, mas é impossível que este tenha interesses diferentes dos
particulares que o compõem, pois, o interesse do soberano é o interesse dos particulares.
Assim, o desrespeito pela vontade da maioria é o desrespeito pelo que é melhor para
o homem. Neste caso, a punição, ou o poder punitivo, reside na vontade maioritária.
Acredita que o homem no estado de natureza é feliz, até que se começam a organizar em
família e em sociedade, quando começa a haver desenvolvimento nas técnicas de
produção começa a haver mais tempo disponível e mais lazer e com mais tempo para se
distrair e começam a ter inveja, cobiça, etc. e isto agrava-se com o surgimento da
propriedade privada, quando aparece a propriedade privada começa a criar-se mais
desigualdades, são cada vez mais as pessoas a terem mais, num estado desses é previsível
que a maior parte da população comece a desejar ter aquilo que os outros tem, e estes
pequenos grupos para proteger a sua propriedade, vão ser tentados a criar direitos para
protegerem a sua propriedade privada fomentando a desigualdade.
Desse modo ele diz que se deve assegurar que o direito corresponde á vontade de todos,
logo não é um grupo pequeno a decidir, mas sim todos, mesmo aqueles que não queiram.
Tudo o que corresponda á vontade coletiva desde que tenha sido assegurada a participação
dos procedimentos a partir daí parece que não haverá razão para criticar o que seja
decidido, parece favorecer o direito penal mais abrangente.

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A vivência dos direitos só é possível num Estado. A associação dos indivíduos no Estado
permite o seu desenvolvimento pelo desenvolvimento da vontade coletiva, a realização
da igualdade. O coletivo é condição de realização dos indivíduos. As pessoas cedem a
sua liberdade, uma vez que aquilo que cedem é aquilo que recebem.
Um aspeto importante em ROUSSEAU é que o contrato social não leva à perda dos
direitos individuais, pelo contrário; através do Estado, os indivíduos podem desenvolver
as suas qualidades individuais.
O crime é uma ofensa à vontade coletiva da qual depende a igualdade dos direitos e o
desenvolvimento individual.
Para ROUSSEAU, ao contrário do que pensa LOCKE, existem desigualdades, a nível
económico e outros, o que leva a que haja conflitos. E será nessa medida que existirá o
Estado.
O Tratado Social tem por fim a conservação dos contraentes. Quem quer o fim, quer
também os meios, e estes meios são também inseparáveis de alguns riscos e até mesmo
de algumas perdas.
O cidadão deixa de ser o juiz das circunstâncias de perigo a que a lei o obriga a expôr-se
e, quando o soberano lhe diz que é razão de Estado que ele morra, ele deve morrer, porque
não foi senão com essa condição que ele viveu em segurança até então, e porque a sua
vida já não é apenas um dom da natureza, mas um direito condicionado pelo Estado.
A pena de morte que se inflinge aos criminosos pode ser encarada mais ou menos do
mesmo ponto de vista: é para não sermos vítimas de um assassino que consentimos
morrer se um dia viéssemos a sê-lo.

✓ Immanuel Kant
É na doutrina de Kant facilmente encontrada uma forte influência do pensamento de
Rousseau. Para Kant, o direito representa todo o conjunto de condições que permitem a
articulação da liberdade segundo uma lei geral – o Autor percepciona a liberdade do ponto
de vista racional, sendo esta fundamentada pelo próprio direito. O direito é, em si
mesmo, coerção. É esse o factor que permite que o livre arbítrio de cada um se articule
com o livre arbítrio dos demais.
Assim sendo, a coerção e o poder punitivo do Estado são racionalmente justificados
pelo possibilitar e garantir da liberdade. O fundamento desse poder é precisamente
uma lei universal. Sempre que alguém apresenta obstáculos à vida de outrem,
nomeadamente não permitindo a articulação da liberdade segundo uma lei geral, o direito
encarrega-se de punir. Quanto à problemática da pena de morte, Kant admite-a – “matar
uma pessoa é matar-se a si próprio”.

Kant e a racionalidade do contrato social


• Para Kant a restrição do livre arbítrio de cada um justifica-se na medida da
articulação da liberdade de cada um com a liberdade dos outros (A Metafísica
dos Costumes).

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• É a racionalidade do ser humano como ser moral, o seu interesse racional que
legitima qualquer restrição da liberdade e nunca a realização dos seus interesses
naturais ou a produção de felicidade.
• No contrato social concebido como conjugação de interesses particulares
nunca se poderia justificar a pena de morte relativamente a crimes graves.
Ele tenta demonstrar que não é essa vontade associada ao homem empírico de
que fala. Quando se formula uma lei penal contra si mesmo é o homo noumenon
que esta em causa, isto é a razão pura juridicamente legisladora em mim.
• O contrato social não é um negócio atual entre os cidadãos e o governo.
• A vontade, por outro lado, não é a escolha arbitrária é a razão prática e esta
inclui a subordinação à lei e ao estado.
• Não é o interesse individual que justifica a subordinação ao estado, mas o
direito.

Regra que devemos seguir se queremos um imperativo categórico, seria a regra da


universalidade, não tratar a pessoa somente como um meio pois ela tem também de ser
um fim em si mesma. Nunca pode ser colocada como um meio para alcançar um fim.
O mundo do fenómeno é o dos sentidos e isto distingue-se do numénico, por trás das
aparências há coisa em si e verdadeira, mas os nossos sentidos colocam um filtro na coisa
em si.
A liberdade para Kant é o único direito inato, pois a liberdade para ele é a autonomia em
relação aos nossos sentidos, não sermos escravos nos nossos impulsos e desejos,
decidimos somente com base na razão, e é com base nela que nos podemos ver livres e
decidir com base nas (?) O direito tem sempre de garantir que há um mínimo de restrições
a nossa liberdade, no mínimo necessário para garantir o mínimo de possibilidade do outro
realizar a sua liberdade também, para essa garantir instituímos uma autoridade politica, o
estado autoridade, para garantir que cada um tem um máximo de liberdades possível.
O máximo que conseguimos é a forma do imperativo categórico, mas nunca podemos ter
a certeza de lá termos chegado, com base nessas formulações, sempre pensando nessa
máxima, se achar que sim, então temos um direito que possa valer.
Ele diz que aquele que rouba, rouba a si mesmo, esta e ir contra o seu interesse racional.
Para KANT, a restrição do livre arbítrio de cada um justifica-se na medida da articulação
da liberdade de cada um com a liberdade dos outros (Metafísica dos Costumes). É a
racionalidade do ser humano como ser moral, é o seu interesse racional que legitima
qualquer restrição da liberdade e nunca a realização dos seus interesses naturais ou a
produção de felicidade.
KANT desenvolve então muito a ideia de interesse racional, que é o que legitima qualquer
restrição da liberdade. Procura então aproximar a racionalidade da aceitabilidade de um
interesse racional.
No contrato social, concebido como conjugação de interesses particulares, nunca se
poderia justificar a pena de morte relativamente a crimes graves. KANT tenta demonstrar
que não é essa a vontade associada ao homo phaenomenon de que fala. Quando se formula
uma lei penal contra si mesma é o homo noumenon que está em causa, isto é, “a razão

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pura juridicamente legisladora em mim”. O que KANT defende é que quando alguém
pratica um crime está a agir contra o seu interesse.
O contrato social não é portanto um negócio atual entre os cidadãos e o governo. A
vontade, por outro lado, não é a escolha arbitrária, mas sim a razão prática, e esta inclui
a subordinação à lei e ao Estado. Não é o interesse individual que justifica a subordinação
ao Estado, mas o Direito justificado como a liberdade para todos (relação com a vontade
geral de Rousseau).
KANT é o filósofo que, apesar do seu contexto religioso, procura fundamentos para além
da religião. Contudo, afirma que existe um dever moral de obediência à lei.

Conceções contemporâneas do contrato social

✓ John Rawls
Para Rawls, o estado de natureza equivale a uma situação de ignorância, no qual
é possível aos homens escolher valores e ideias (no fundo, princípios de justiça)
benéficas para todos. Para o Autor, a cada um deve ser garantido um leque alargado de
liberdades e direitos, desde que estes não conflituem com os dos demais. Num estado em
que os homens estão cobertos por um véu de ignorância, estes estão em pleno estado de
igualdade – nenhum deles sabe se depois do véu da ignorância será rico, pobre, homem,
mulher...
Transpondo para o Direito Penal, as penas são admissíveis porque promovem a
protecção das liberdades. Há em John Rawls uma rejeição do contratualismo – a sua
teoria não assenta num pacto social, mas antes em princípios de justiça. Quanto à
questão da pena de morte, a mesma não parece ser aceitável para o Autor.
Em Rawls não se prescinde totalmente de uma visão utilitarista do interesse, mas a
justificação da subordinação ao Estado está numa escolha racional dos princípios de
Justiça. Verifica-se um modelo de pensamento semelhante ao do contrato social.
Não se prescinde totalmente de uma visão utilitarista do interesse, mas a justificação da
subordinação ao Estado está uma escolha racional dos princípios de Justiça. Apela a
uma racionalidade de interesses que justificaria em que cada pessoa decida coberto por
um véu de ignorância, escolha dos princípios de justiça.
Véu de ignorância para a escolha dos princípios de justiça. É o equivalente á posição
em que Hobbes e Locke quanto ao seu estado de justiça. Se dissermos que estas
pessoas vão decidir sem saber que lugar vão ocupar na sociedade, para se decidir
das leis, diz que é a única maneira de garantir que não se vão beneficiar a si
próprias mas sim para o bem de todos.
Nesta posição, quais seriam os princípios que as pessoas iriam decidir tendo esse veu de
ignorância: primeiro principio de igualdade e principio de diferença.
Cada um tem direito a um esquema de liberdades o mais amplo possível que será
compatível com um igual espectro que seja compatível com outro espectro do próximo.

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Sub-principios do segundo principio: vai haver desigualdades, diferenças no que
respeita a nível social e económico e devemos aceitar essas diferenças pois são
necessárias para a sociedade avanção, tem de haver diferenças sociais económicas
associadas a cargos profissionais mas tem de se garantir a igual oportunidade de lhes
aceder, o segundo subprincípio é, essas diferenças pode existir desde que essas
desigualdades redundem também em beneficio dos mais desfavorecidos.
Principio da liberdade e igualdade – este principio é o primeiro principio em todos os
sentidos, diz que as pessoas escolherão o sistema de liberdades mais extenso possível
compatível com a liberdade dos outros, sistema igualitário de igualdades, um pouco a
ideia kantiana.
Princípio de igualdade de oportunidades – é preciso que as desigualdades
pressuponham o acesso de todos em igualdade de oportunidades ao acesso a cargos
públicos.

Se no contrato social há uma ideia de racionalidade = interessa racional e a aceitação de


algo em troca, no pensamento de RAWLS, que procura uma teoria da justiça não
utilitarista, procura-se uma conceção de racionalidade desligada de uma ideia de interesse
imediato, associando a ideia de que o interesse racional conduz a que haja instituições
justas numa sociedade. Assim, o primeiro grande interesse racional é que as instituições
estejam organizadas e orientadas por princípios de justiça, estabelecer como conseguimos
alcançar racionalmente os princípios de justiça à volta dos quais funciona a sociedade.
Apela a uma racionalidade de interesses que justificaria na posição original, em que cada
pessoa decidiria coberto por um véu de ignorância, a escolha dos princípios de justiça.
Nesta posição original coloca-se a questão de saber o que é que uma pessoa, que não sabe
que lugar vai ocupar na sociedade futuramente, na distribuição dos bens, dos cargos
públicos etc, escolheria como os princípios de justiça dessa sociedade. Assim, a escolha
dos princípios de uma sociedade está associada a uma ideia de imparcialidade.
Em RAWLS não se prescinde totalmente de uma visão utilitarista do interesse, mas a
justificação da subordinação ao Estado está numa escolha racional dos princípios de
justiça.
Chega-se então aos grandes princípios da justiça, associado à maior proteção das
liberdades individuais; ao princípio da igualdade, mas associado à diferença; e ao
princípio da distribuição social equitativa.

✓ Martha Nussbaum
Na sua concepção pode identificar-se uma forte influência aristotélica. A autora
começa por criticar as teorias do contratualismo, afirmando que o “estado de
natureza” associado ao contrato social ignora determinados membros da sociedade
– mulheres, velhos ou inválidos – que não têm poder decisório. É também a ideia de
que a própria nacionalidade condiciona a situação dos homens, na medida em que nem

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todos os países se desenvolvem de maneira a proporcionar aos seus cidadãos um igual
nível de vida.
Para Nussbaum, o Estado deve promover as capacidades humanas, fazendo com
que as pessoas tenham uma vida digna e que valha a pena ser vivida. Para que tal seja
possível, a Autora defende que o Estado deve reconhecer as diferentes capacidades
das pessoas, bem como incentivá-las. Estas representam uma fonte de princípios políticos
para uma sociedade pura e liberal, pelo que cada pessoa deve prosseguir as suas
capacidades – o homem é tratado como um fim em si mesmo e não como m mero
instrumento.
Critica o facto de os outros autores adotarem uma visão meramente procedimental, tal
como Rawls. Para Nussbaum não podemos simplesmente admitir que um processo é
justo e daí depois aceitar qualquer que seja o resultado.
Defende que se deve dar as potencialidades a uma pessoa para que ela viva uma vida
feliz.
Para autores como Nussbaum, os liberais quando fazem estas experiências embora elas
tenham resultados universais, estamos a despir todas as pessoas das suas características
etc, mas em bom rigor, mesmo assim, os autores estão a pensar em grupos de pessoas
mais especificas “o homem branco adulto”, não para mulheres, com outras etnias, ou
com deficiência. Uma coisa é estas pessoas terem tratamento por parte das politicas
outra é elas serem mesmo o legislador.
Há uma terceira critica que ela faz, ela tem uma diferença de abordagem,
essencialmente face a Rawls, estão os outros autores preocupados em primeiro saber que
tipos de recursos as pessoas têm e depois com isso o que podem fazer. Nussbaum diz que
se deve focar nas capacidades das pessoas e com essas capacidades garantir que as
mesmas irão poder ter uma vida digna e fazer o que as faz feliz. Ela elabora uma lista de
capacidades, e é na garantia de que as pessoas têm oportunidade de desenvolver essas
capacidades que nos devemos focar, e não somente na busca de coisas através do processo
desprovido de proximidade com a vivência de cada um dos cidadãos.
Se no contrato social há uma ideia de racionalidade = interessa racional e a aceitação
de algo em troca, no pensamento de RAWLS, que procura uma teoria da justiça não
utilitarista, procura-se uma conceção de racionalidade desligada de uma ideia de interesse
imediato, associando a ideia de que o interesse racional conduz a que haja instituições
justas numa sociedade. Assim, o primeiro grande interesse racional é que as instituições
estejam organizadas e orientadas por princípios de justiça, estabelecer como conseguimos
alcançar racionalmente os princípios de justiça à volta dos quais funciona a sociedade.
Apela a uma racionalidade de interesses que justificaria na posição original, em que
cada pessoa decidiria coberto por um véu de ignorância, a escolha dos princípios de
justiça. Nesta posição original coloca-se a questão de saber o que é que uma pessoa, que
não sabe que lugar vai ocupar na sociedade futuramente, na distribuição dos bens, dos
cargos públicos etc, escolheria como os princípios de justiça dessa sociedade. Assim, a
escolha dos princípios de uma sociedade está associada a uma ideia de imparcialidade.

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Em RAWLS não se prescinde totalmente de uma visão utilitarista do interesse, mas a
justificação da subordinação ao Estado está numa escolha racional dos princípios de
justiça.
Chega-se então aos grandes princípios da justiça, associado à maior proteção das
liberdades individuais; ao princípio da igualdade, mas associado à diferença; e ao
princípio da distribuição social equitativa.

São capacidades humanas:


• Vida – ser capaz de viver a vida na sua plenitude (e consequentemente de duração
natural);
• Saúde – ser capaz de viver de boa saúde (incluindo reprodutiva), com uma
alimentação adequada;
• Integridade corporal – implica o poder de nos movimentarmos e deslocarmos
livremente, tendo oportunidade para disfrutar dessa liberdade. Tal exige uma
vivência segura, à margem de situações de assaltos (incluindo violência sexual,
violência de género, etc);
• Sentidos, imaginação e pensamento – ser capaz de utilizar os sentidos, de
imaginar, de pensar, de decidir... tudo isto deve ser fomentado por uma educação
adequada. Fala-se da capacidade de usar a mente das variadas maneiras protegidas
pelas garantias da liberdade de expressão, com o devido respeito pela expressão
política, artística e religiosa.
• Emoções – poder estabelecer vínculos afetivos e amar quem nos ama;
• Razão prática – ser capaz de iniciar uma reflexão crítica, pressupondo-se uma
liberdade de consciência garantida;
• Afiliação – capacidade de viver com outras pessoas, de mostrar interesse pelos
outros e de nos comprometermos a nível social
• Outras espécies – ser capaz de viver em harmonia com outros seres vivos;
• Capacidade para julgar – capacidade de reagir, julgar e disfrutar das situações
• Controlo sobre o que nos rodeia
o A situação politica – por exemplo escolhendo lideres;
o Controlo material – possibilidade de ter o direito à propriedade privada,
procurar emprego entre outros…

Na Tradição liberal:
O crime é uma ofensa a direitos que justifica pela sua gravidade a restrinção de direitos
fundamentais

Na Tradição democrática:
O crime é uma ofensa à vontade coletiva da qual depende a igualdade dos direitos e o
desenvolvimento individual.

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Principio da liberdade e igualdade – este principio é o primeiro principio em todos os
sentidos, diz que as pessoas escolherão o sistema de liberdades mais extenso possível
compatível com a liberdade dos outros, sistema igualitário de igualdades, um pouco a
ideia kantiana.
Princípio de igualdade de oportunidades – é preciso que as desigualdades
pressuponham o acesso de todos em igualdade de oportunidades ao acesso a cargos
públicos.

Problema da definição pré-jurídica de crime - Criminologia


Os estudos científicos não jurídicos sobre o crime como fenómeno social ou psicosocial
podem ser genericamente definidos como Criminologia. Quando se procura uma
definição operatória de crime, recusa-se uma formulação jurídico-formal e apela-se às
“forças não jurídicas do controlo social do comportamento humano”, definindo-se, por
exemplo, o crime como comportamento “anti-social” (Mannheim), através da confluência
da Ética, da Moral e do próprio Direito.
A característica da anti-socialidade ou da irregularidade social, porém, é sempre referida
às valorações sociais dominantes. Tradicionalmente, a Criminologia é uma ciência de
base descritiva e não normativa, isto é, não pretende mostrar nem o que deve ser
crime nem como se deve responder com justiça ao crime, mas pretende apenas
compreendê-lo e explicá-lo.
A criminologia baseia-se no estudo do crime como fenómeno social ou psico-social. Este
estudo tem por objectivo atingir uma definição de crime, tentando-se perceber o que
move um criminoso para a prática desse acto. Através da Criminologia pretende-se
não definir o que deve e o que não deve ser constituído crime, mas antes compreender e
explicar o fenómeno.

Qual é então o interesse da Criminologia para o Direito Penal? A resposta passa por uma
análise prévia do conceito material de crime conduzida no pensamento penal sobretudo
no quadro dos princípios constitucionais e considerando várias discussões de filosofia
penal ao longo dos séculos. O que deva ser considerado crime legitimamente não pode
ser um tema que abstraia das condicionantes socio-psicológicas, em que se produz a
definição socialmente vigente.

A Criminologia vai-nos dar dados empíricos suficientes para se densificar quais os


valores que na sociedade são tidos como algo a proteger, o que não quer dizer que os
interesses das minorias não sejam protegidos. A Criminologia vai-nos ajudar a
compreender a adequação das penas, se as normas têm dignidade punitiva, se existe
nesse caso um determinado bem jurídico-penal que carece de tutela penal, se a medida é
adequada e se existe ou não alguma alternativa.

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Ou seja, o princípio da necessidade da pena diz-nos que:
1. Tem de haver um bem jurídico-penal;
2. Esse bem tem de carecer de tutela penal;
3. A norma tem de ter dignidade punitiva;
4. A medida tem de ser adequada;
5. Não pode haver outra alternativa para assegurar esse bem.

São várias as teorias que surgem numa tentativa de explicar então o conceito de crime.
De acordo com a orientação de Hassemer, temos:
• Concepções que justificam o crime com uma deficiência do agente
o Biológicas
o Psicológicas
• Concepções que assinalam deficiências da socialização ou da estrutura social
• Concepções que destacam a natureza social e até funcional do crime,
rejeitando vê-lo como uma deficiência ou um fenómeno puramente objectivo
Esta sistematização tem de ser articulada com três perspetivas metodológicas distintas:
• A perspectiva do crime como acontecimento individual
o Concepções bio-psicológicas tradicionais
o Teses cognitivistas da psicologia contemporânea
• A perspectiva do crime como acontecimento social, baseado em padrões sociais
de acção (lógica psico-sociológica);
• A perspectiva do crime como fenómeno significativo e comunicacional, na linha
das teses interacionistas
Nas duas primeiras, o crime é visto como uma realidade objectivamente identificável;
na terceira, o foco concentra-se nos próprios sujeitos, nas instituições de controle e nos
processos de interacção social.

✓ O CRIME COMO UM FENÓMENO IDENTIFICÁVEL


OBJECTIVAMENTE
➢ Teorias biológicas

Para estas teorias, o crime é sempre uma alteração de um padrão comportamental


dito normal, seja como fenómeno individual seja como fenómeno social. Aqui se

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enquadram as teorias que vêem o crime como o resultado de uma deficiência do
agente, procurando estas encontrar causas biológicas que justifiquem a prática.
O estudo é, então, feito com base na pessoa isoladamente considerada, descartando o
que a rodeia. Destaca-se nestas teorias a obra de CESARE LOMBROSO, autor que
acredita que os criminosos são delinquentes natos, pelo que estão destinados à prática
de crimes independentemente do meio social em que se inserem. Este procura traços
específicos que possam ser vistos como característicos dos criminosos, distinguindo-os
dos demais. As teorias que se concentram na deficiência do agente procuram identificar
causas biológicas de uma diferença, colocando no centro da investigação a pessoa isolada
do meio. Assim, no princípio do séc. XX, algumas teorias criminológicas tal como consta
da obra de LOMBROSO, propondo que os criminosos seriam delinquentes natos,
próximos dos primitivos que, independentemente do meio social, não poderiam deixar
de cometer crimes, ou seja, estariam predispostos à prática de crimes – determinismo
biológico. Os criminosos poderiam ser reconhecidos através de certos traços biológicos,
sendo que um dos traços caracterizadores dos criminosos seriam as tatuagens.

Uma das críticas feitas a esta teoria decorre do facto de os estudos feitos com base nos
condenados não serem devidamente confrontados com outros grupos da população. Para
além disso, não são considerados quaisquer factores sociais. É deste tipo de
perspectivas que resultou depois a identificação do chamado cromossoma da
violência, em meados dos anos sessenta do século XX. A comparação dos crânios não
incluía os não criminosos, partindo dos condenados; Repercutia os preconceitos da sua
época e sociedade relativamente a certas pessoas como as prostitutas;

Críticas metodológicas:
1- A comparação dos crânios não incluía os não criminosos, partindo dos
condenados;
2- Repercutia os preconceitos da sua época e sociedade relativamente a certas
pessoas como as prostitutas;
3- Esta teoria baseava-se numa interpretação deficiente dos dados empíricos, dado
que não confrontava devidamente a população dos condenados com os outros
grupos da sociedade, bastando-se a análise de pessoas vivendo no meio isolado
das prisões sem considerar fatores sociais que poderão ter conduzido ao crime,
embora posteriormente viesse a considerar o papel da educação na prevenção da
criminalidade.

Criticas empíricas:
1- Goring, um médico inglês, estudou 3000 condenados, tal como Lombroso, alguns
anos após a morte de Lombroso e não chegou aos mesmos resultados.

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Ainda assim, estas teorias correspondem à procura de uma base biológica do
comportamento criminoso, que tem tido continuidade em certas indagações, como as que
levaram à identificação do cromossoma da violência, a duplicação do cromossoma y,
em meados dos anos 70 e, mais recentemente, às conexões que o estudo do cérebro pela
neurociência pode sugerir quanto a certos tipos de comportamento.
As conexões entre o funcionamento do cérebro e o comportamento humano pela sua
complexidade não permitem, no entanto, concluir que haja uma causalidade linear entre
fenómenos registados no cérebro e os concretos comportamentos, pelo menos sem a
presença de outros fatores relacionados com o meio e a cultura.
Não é possível estabelecer uma ligação directa entre o funcionamento do cérebro e o
comportamento humano, não podendo assim ser retirada uma causalidade linear entre
esses dois factores (isto ainda que se possam detetar certas disfunções causadas por lesões
pré-frontais com implicações na impulsividade, p.e.). Factores sociais e culturais terão
sempre de ser chamados à colação para a explicação do crime. Mais, esta tentativa de
associar uma determinada característica biológica a certos comportamentos implica desde
logo uma concepção jurídica ou ética desses mesmos: para se dizer que certa característica
se associa a pessoas tidas como mentirosas ou violentas, exige-se que tenhamos
conceitos de mentira e de violência pré-estabelecidos. Estes, como se sabe, são
influenciados por critérios éticos e sociais.
É de referir também que estas teorias levantam também questões éticas, associadas ao
estudo do cérebro – fale-se por exemplo da utilização de técnicas como a lobotomia para
erradicar a agressividade.
- exclusão da responsabilidade, aumento do âmbito da inimputabilidade
- eugenismo
➢ Teorias Psicológicas
Centram-se também no indivíduo, começando numa primeira fase por estarem próximas
das teorias neurobiológicas – procura-se a explicação do crime no funcionamento
psíquico individual. É neste contexto que encontramos a teoria de EYSENCK, segundo
a qual a herança genética condicionaria diferenças no funcionamento do sistema
nervoso, responsáveis pela incapacidade de aprender com os estímulos exteriores. Assim,
o comportamento anti-social resultaria de uma articulação entre factores de extroversão,
neurotismo e psicotismo, da qual resultava a falta de capacidade para lidar com estímulos
exteriores. A crítica feita a este Autor passou por esta ser uma concepção determinista
(como, aliás, são todas as que têm vindo a ser tratadas).

Papel de LOMBROSO
a) Fundou a antropologia criminal e o método empírico no estudo do crime;
b) Pôs em causa a escola clássica segundo a qual o crime era um produto do livre-arbítrio;
c) Procurou a identificação de causas do crime para a prevenção.

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Surgem ainda outras teorias que tentam explicar a prática de crimes no psiquismo
individual de uma pessoa:
1) Teorias psicodinâmicas: problemas de infância – defendidas por FREUD. O crime
estaria relacionado com a fraqueza do ego. Há um sentimento de culpa anterior ao crime
e que motiva o próprio crime.
2) Teorias comportamentais: modelação social do comportamento – pretende
compreender os esquemas comportamentais. O objeto da investigação é, em função de
determinado estímulo, saber os comportamentos que estão associados.
3) Teorias cognitivas - seguem duas vias: o desenvolvimento moral (PIAGET,
KHOLBERG) e o processo informacional. KOHLBERG defende que todos temos um
desenvolvimento que passa por várias fases (fase pré-convencional, fase convencional e
fase pós-convencional). A teoria de KOHLBERG baseia-se no desenvolvimento moral
com abstração do comportamento e da interação social.
4) Teorias da personalidade.
5) Teorias focadas na inteligência.
Já numa fase mais avançada, as concepções psicológicas abordam o crime com foco na
personalidade do delinquente – a análise deixa de ser estritamente comportamental,
passando a incidir também na relação do crime com o processo cognitivo. Associa-se o
crime a uma situação de falta de autocontrole, a somar a uma impulsividade
acentuada. Deste tipo de pensamento decorrem as teorias de GOTTFREDSON e de
HIRSCHI. Para Hirschi, o crime era para o criminoso uma satisfação instantânea de
um impulso, sem que este concebesse as consequências do seu acto.
Similares são as doutrinas de PIAGET e de KOHLBERG, afirmando estes Autores que
o crime se associa à questão do desenvolvimento moral no processo social. Este
segundo defende a existência de vários estádios no desenvolvimento dos juízos morais:
o Pré-moralidade – agentes apenas se motivam pela punição e obediência;
o Conformidade convencional – verificam-se raciocínios de proveito pessoal e
aceitação do Direito por razões egoístas;
o Fase dos princípios – atinge-se a perspectiva do contrato social e adoptam-se as
ideias de justiça, respeito e confiança
Assim, os comportamentos anti-sociais estariam relacionados com a incapacidade do
individuo percorrer todos estes estádios de desenvolvimento.
Parecida também é a visão de HOLIN, que nos fala da conceção das distorções
cognitivas – estas distorcem o reconhecimento da autoria ou desvalorizam a
responsabilidade pelo próprio comportamento, suportando o baixo nível de
desenvolvimento sociomoral. Há ainda quem defenda que os indivíduos desenvolvem
perceções limitadas das situações e que, por isso, nos conflitos que lhes são colocados
não conseguem arranjar uma alternativa sem ser com recurso à violência.
Numa perspetiva contrária, algumas teorias reconhecem no crime uma escolha
racional, sendo o benefício pessoal a motivação determinante. Esta perspetiva torna
ainda mais central a necessidade de ajudar o indivíduo a desenvolver a sua capacidade de

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escolha. Com isto, desenvolve-se no centro da psicologia uma cognitive behavioural
theory, através da qual se desenham técnicas de intervenção que efectivamente
funcionam, “salvando” a Criminologia do dead end a que tinha chegado. Falamos, por
exemplo, de tratamento da motivação em programas com fases delineadas, ou em teorias
da mentalização.

✓ O CRIME COMO RESULTADO DA DEFICIÊCIA DA SOCIALIZAÇÃO


DOS HOMENS
Aqui destaca-se desde logo o pensamento de DURKHEIM, para o qual o crime seria
uma expressão do funcionamento normal de todas as sociedades – atribui ao crime
uma característica de funcionalidade e de utilidade, defendendo que o crime serve
para sinalizar as regras dominantes e necessárias, permitindo assinalar e reforçar as
concepções éticas dominantes. Aqui, o crime é visto como um puro facto social,
independente da subjectividade do agente. Durkheim refere ainda a verificação de um
estado de anomia social, em que o Estado sofre de falta de objectivos e de perda de
identidade – algo na sociedade não funciona de forma harmoniosa; há uma patologia. Este
é um conceito que vai depois ser retomado por Merton.
A tradição de DURKHEIM na análise do crime acentuou os fenómenos de indiferença às
normas (anomia) suscitadas pela organização das sociedades, nomeadamente pela divisão
do trabalho social, e a raiz dos comportamentos anti-sociais na natureza das estruturas
sociais.

Ou seja, para DURKHEIM, o crime era:


1. Normal;
2. Necessário;
3. Funcional:
a) Permitindo afirmar as regras;
b) Exprimindo inovações comportamentais, inerentes à evolução social.

Fulcral é também o pensamento de G. H. MEAD (escola de Chicago). Para este, os


comportamentos sociais são o resultado da interacção entre a sociedade e o
indivíduo. Também aqui há uma objetivação dos comportamentos: crime é uma resposta
ou uma solução para certos conflitos ou problemas de interação entre o agente e o meio.
Com Mead, a Sociologia segue para a compreensão dos fenómenos de interação do
indivíduo com o meio, abrindo caminhos às possibilidades de reconstrução do agente,
como havia sido já proposto pelas teorias da psicologia cognitiva-comportamental.
A influência do pensamento de MEAD orientou a Sociologia para a compreensão dos
fenómenos de interação e de resposta do indivíduo ao meio, que estão subjacentes a
teorias da aprendizagem dos comportamentos criminosos e à construção de si e da

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personalidade delinquente. E, igualmente, abriu caminho às possibilidades de
reconstrução de si mesmo como são propostas pelas teorias da psicologia cognitiva-
comportamental.

Para EDWIN SUTHERLAND, o crime não se explica pela expressão de necessidade ou


de valores, nem pelo meio social ou até mesmo por deficiências do individuo. Explica-
se, sim, pela intensidade, frequência ou precocidade de certos contactos sociais. Com
isso, o Autor estabelece uma teoria da determinação do comportamento:
o O comportamento criminoso é aprendido por interação com outras pessoas
num processo de comunicação;
o A aprendizagem faz-se por contacto dentro de um grupo intimo e pessoal;
o A aprendizagem inclui técnicas, motivos e atitudes;
o Uma pessoa torna-se delinquente devido ao prevalecimento de posições
favoráveis às infrações;
o As associações diferenciadas variam de frequência, intensidade e duração;
o O comportamento criminoso envolve todos os comportamentos de uma
aprendizagem, não sendo por isso uma mera imitação;
o As necessidades e valores gerais não explicam o comportamento criminoso.
Sutherland inclui nesta teoria os chamados white collar crimes – o comportamento anti-
social não afecta apenas as classes baixas ou afectadas pela pobreza, relacionando-se sim
com padrões comportamentais definidos por grupos sociais. O Autor, com a sua teoria da
associação diferencial, defende que a criminalidade representa uma aprendizagem de
modelos de conduta.
Este explicaria o crime pelo desfasamento entre as metas sociais gerais e as vias para
as alcançar. Para Merton, o factor determinante é o vício da estrutura social, pelo que
o agente criminoso é uma mera vítima da estrutura socio-cultural. O comportamento
criminoso justifica-se pela distorção entre a promoção de valores – como a ascensão
social – e a efectiva escassez dos meios legítimos para a atingir. Tal desfasamento geraria
indiferença ao valores e mecanismos de adaptação individual. Merton identificava cinco:
o Conformação: congruência entre as metas culturais e os meios institucionais;
o Inovação: em que as metas institucionais seriam prosseguidas por meios não
institucionais;
o Ritualismo: faltam metas culturais, mas formalmente se segue os meios
institucionais.
o Apatia: faltam metas culturais e a própria utilização de ação institucional;
o Rebelião: em que os agentes não se conformam com as metas culturais e
obviamente também não pautam o seu comportamento pelos meios institucionais.
O crime não é assim um problema de escolha individual, mas antes um problema
social que deve ser combatido através de politicas públicas. Este é um verdadeiro produto
social, mas ainda assim susceptível de ser prevenido se se actuar sobre os seus
pressupostos estruturais, corrigindo as tais condições sociais.

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✓ O CRIME COMO PROCESSO SOCIAL DE CRIMINALIZAÇÃO DE
CONDUTA
Chegados ao terceiro grupo de concepções, aqui destacam-se a natureza social e até
funcional do crime, rejeitando-se a visão deste como uma deficiência ou um fenómeno
puramente objectivo.
Aqui é central a teoria de labeling approach, que conduz à lógica interacionista da escola
de Chicago – há uma alteração metodológica no estudo do crime. Assim, o crime e a
criminalidade como factos sociológicos seriam um resultado de um processo de seleção
social, segundo o qual o legislador, a policia, os tribunais, e todas as chamadas instancias
formais de controle elegeriam algumas condutas e não outras como criminosas ou
apenas certas pessoas como delinquentes - criminalidade não é uma propriedade
inerente a um sujeito, mas uma “etiqueta” atribuída a certos indivíduos que a sociedade
entende como delinquentes. Na prática, o comportamento desviante é aquele rotulado
como tal. Assim, a Sociologia Criminal passou a focar-se nos processos de selecção social
e na respectiva arbitrariedade. Esta conceção veio retirar ao conceito estático de crime
qualquer função de objeto científico, para em seu lugar colocar os processos sociais de
criminalização de condutas. O crime e a criminalidade como fatos sociológicos seriam o
resultado de um processo de seleção social. Também os grupos sociais (família, vizinhos,
colegas), como instâncias não formais de controlo, etiquetariam certas pessoas como
potenciais ou efetivas autoras de crimes.
Através desta última perspetiva, a tese de DURKHEIM, segundo a qual os crimes são
“parte integrante da sociedade sã”, determinados pela própria estrutura social (e variáveis
segundo ela), tornar-se-ia menos interessante para as ciências do crime.
Esta conceção veio retirar ao conceito estático de crime qualquer função de objeto
científico, para em seu lugar colocar os processos sociais de criminalização de
condutas. O crime e a criminalidade como fatos sociológicos seriam o resultado de
um processo de seleção social, segundo o qual o legislador, a polícia, os tribunais, e
todas as chamadas instâncias formais de controlo elegeriam algumas condutas e não
outras como criminosas ou apenas certas pessoas como delinquentes. Também os
grupos sociais (família, vizinhos, colegas), como instâncias não formais de controlo,
etiquetariam certas pessoas como potenciais ou efetivas autoras de crimes.
Encetando esta via, a Sociologia Criminal admitiria, contudo, o total relativismo quanto
ao que é designado socialmente como crime e renunciaria de certo modo à explicação
do sentido e função social do comportamento delinquente e da sua génese – deixaria
de pretender explicar por que motivo certos comportamentos são designados ou eleitos
como crimes segundo as representações sociais dominantes, para se preocupar
fundamentalmente com os processos de seleção social e a arbitrariedade dos mesmos.
Na verdade, a teoria do labeling approach não dá total relevância à tese de que um certo
modo de organização social gera “necessariamente” certos crimes e, em suma, à função
social do crime (como defende DURKHEIM), condensando antes nos processos de
seleção dos criminosos toda a problemática sociológica da criminalidade.
Mas a herança de MEAD conduziu a perspetivas metodológicas mais profundas, em que
os comportamentos sociais seriam o produto de configuração por uma interação simbólica

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dos significados sociais e da construção da realidade, incluindo, porém, o mundo interior
dos indivíduos. Diferentemente, a perspetiva do funcionalismo estruturalista reduziu o
objeto de estudo às relações entre elementos do sistema social, às disfunções e aos
mecanismos de adaptação, relativizando a relevância dos padrões subjetivos de
comportamento.
Seguindo esta linha, HOWARD BECKER vem defender que déviance não é uma
qualidade interna dos factos sociais, mas antes o produto dos grupos sociais que criam
as regras cuja violação leva a que o agente seja então sim considerado déviant. HOWARD
BECKER, no seu livro Outsiders, dizia mesmo que a déviance não é uma qualidade
interna dos factos sociais, mas antes o produto dos grupos sociais que criam as regras
cuja violação a suscita e que aplicam com sucesso (estigmatização) a qualificação de
déviant aos que violam as normas. É, assim, uma pura criação social.
Por outro lado, o estudo dos processos de etiquetagem conduz a ideias-chave desta
corrente de pensamento como a déviance secundária, a que se referia LEMERT. Esta
corresponderia aos papéis desencadeados pela atribuição primária do
comportamento criminoso, como uma resposta ou modo de lidar com a própria
estigmatização.
Em suma, haverá que retirar da criminologia uma primeira interpretação epistemológica,
isto é, relacionada com as condições criticas da definição social do crime como objeto do
pensamento. O que deve ser legitimamente considerado como crime não pode ser um
tema que se abstraia das condicionantes socio-psicológicas, em que se produz a
definição socialmente vigente.

Fins das Penas


As respostas dadas ao longo de muitos séculos ao problema dos fins da pena reconduzem-se a

duas ( ou três ) teorias fundamentais :

1. as teorias absolutas : de um lado, ligadas essencialmente às doutrinas da retribuição ou


da expiação
2. as teorias relativas : de outro lado, que se analisam em dois grupos de doutrinas : as
doutrinas da prevenção geral, de uma parte, as doutrinas de prevenção especial ou
individual, de outra parte

A problemática dos fins das penas é uma das grandes questões do Direito Penal. A questão
surge devido à controvérsia sobre o sentido das penas – quer sobre o sentido que lhes é
atribuído como sobre o sentido que devia ser. Historicamente, a pena é desde sempre
vista como a imposição de um mal para o criminoso e para a sua honra. A questão
em apreço deu aso à criação de três teorias – teoria da retribuição, teoria da prevenção
geral e teoria da prevenção especial. As teorias retributivas são tidas como teorias

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absolutas, enquanto as teorias de prevenção são vistas como teorias relativas. Mais tarde
surgem teses ditas teses mistas.
O tema dos fins das penas relaciona-se com a temática da legitimação, do fundamento
e da função da intervenção penal estatal.
Para estabelecermos critérios de argumentação sobre a validade da eleição de certos
comportamentos como crimes, teremos de pensar no próprio sentido da pena, que é
indissociável do crime.
A pena tem uma conotação sagrada que lhe foi conferida pelo processo histórico e que
ainda hoje persiste, revelando-se sempre como imposição de um mal para a pessoa do
criminoso e para a sua honra (e não apenas para o seu património).
Três grande conceções surgiram neste domínio: a retribuição, a prevenção geral e a
prevenção especial.

➢ Teorias Absolutas/Retributivas: a pena como instrumento de


retribuição
Para este grupo de teorias a essência da pena criminal reside na retribuição,
expiação, reparação ou compensação do mal do crime e nesta essência se esgota. Se
a pena pode assumir efeitos reflexos ou laterais socialmente relevantes (de intimidação
da generalidade das pessoas, de neutralização dos delinquentes, de ressocialização),
nenhum deles contende com a sua essência e natureza, nem se revela suscetível de a
modificar: uma tal essência e natureza é função exclusiva do facto que se cometeu no
passado, é a justa paga do mal que com o crime se realizou, é o justo equivalente do
dano do facto e da culpa do agente.
Por isso a medida concreta da pena com que deve ser punido um certo agente por
um determinado facto não pode ser encontrada em função de outros pontos de vista que
não sejam o da correspondência entre a pena e o facto.
A discussão acerca do fundamento das teorias absolutas da retribuição centrou-se durante
longo tempo sobre a forma como deveria ser determinada a “compensação” ou igualação a operar
entre o “mal do crime” e o “mal da pena”. Acabou por reconhecer-se que a pretendida igualação
não podia ser fáctica, mas tinha forçosamente de ser normativa. Restava um largo campo para
dúvidas e controvérsias, para saber se a retribuição assumia o caracter de uma reparação do dano
real, do dano ideal ou de qualquer outra grandeza, se ela ocorria em função do desvalor do facto
ou antes da culpa do agente. A controvérsia pode hoje dizer-se terminada : a “compensação” de
que a retribuição se nutre só pode ser função da ilicitude do facto e da culpa do agente.

Isso conduz directamente ao princípio da culpa como máxima de todo o direito penal
humano, democrático e civilizado; ao princípio segundo o qual não pode haver pena sem culpa e
a medida da pena não pode em caso algum ultrapassar a medida da culpa. E aqui reside
justamente o mérito das doutrinas absolutas : qualquer que seja o seu valor ou desvalor como

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teorização dos fins das penas, a concepção retributiva teve o mérito irrecusável de ter erigido o
princípio da culpa em princípio absoluto de toda a aplicação da pena.

Qualquer outra teoria dos fins das penas (entendendo por estes os efeitos
socialmente uteis que com elas se pretenda alcançar) torna o facto em mero ensejo de
aplicação da pena e falha completamente a sua vera essência e natureza: pune-se
porque se “pecou”. Só deste modo se corresponderia à dignidade histórica que a pena
desde tempos imemorias assumiu; como só deste modo se estaria em sintonia com o
sentimento cultural comunitário generalizado que desde sempre entendeu a pena como
um castigo e uma expiação do mal do crime.

Kant qualificava a pena como um imperativo categórico por isso que quando a
justiça desaparece, não tem mais valor que os homens vivam na terra, e concluía
afirmando que, ainda quando o Estado e a Sociedade devessem desaparecer, teria o ultimo
assassino que se encontrasse na prisão de ser previamente enforcado, para que assim cada
um sinta aquilo de que são dignos os seus atos e o sangue derramado não caia sobre o
povo que se não decidiu pela punição, porque ele poderia então ser considerado como
comparticipante nesta violação pública de justiça. Kant vê o crime como a expressão de
uma negação de si mesmo e dos próprios direitos do criminoso – “matar alguém é
matar-se a si mesmo”, pois que “qualquer mal imerecido que causas a um outro no povo
causa-lo a ti próprio”. Assim sendo, só a lei da retribuição, na condição de se efectuar no
tribunal (e não a título privado), pode indicar de maneira precisa a qualidade e a
quantidade da pena.
“Aquele que rouba torna insegura a propriedade de todos os demais, portanto priva-se
a si mesmo da segurança de toda a possível propriedade”

Já para HEGEL, o crime é a negação do Direito, pelo que a pena é a negação do


crime. Mantém a lógica retributiva de Kant, mas parte de premissas diferentes.
Continuamos, ainda assim, numa lógica de “porquê” e não de “para quê”, na medida
em que não se explica a verdadeira utilidade da pena, mas apenas o seu fundamento. No
caso de Hegel, a justificação da pena é puramente lógico-racional. Hegel afirmava que
inquinar esta consideração absoluta da pena com quaisquer fins de prevenção seria
como “levantar um pau contra um cão e tratar o ser humano não segundo a sua
honra e liberdade, mas como um cão”. Para HEGEL, para que a pena supere o plano
da vingança e, por isso, o do próprio crime, é necessária uma transformação da vontade
de particular e subjetiva em universal, em princípio universal. A pena conduz, assim,
necessariamente à moralidade objetiva, própria das comunidades históricas e do Estado.
Só no Estado se superaria o particularismo e a subjetividade de uma perspetiva
moral e a moralidade se situaria num plano meramente objetivo.
De um ponto de vista moral, só o perdão resolveria bem o conflito gerado pelo crime e
elevaria a consciência de quem julga a uma libertação do crime. Não há, assim, para
HEGEL, lugar à moralização da pena, a qual deve pertencer exclusivamente à
racionalidade do Estado

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


A discussão acerca do fundamento das teorias absolutas da retribuição centrou-se durante
longo tempo sobre a forma como deveria ser determinada a “compensação” ou igualação
a operar entre o “mal do crime” e o “mal da pena”. Ultrapassando o período do talião
acabou generalizadamente por reconhecer-se que a pretendida igualação não podia ser
fáctica, mas tinha forçosamente que ser normativa.
Depois e coerentemente, porque se o que está em causa é o tratar o homem segundo a sua
liberdade e a sua dignidade pessoais, então isso conduz diretamente ao principio da
culpa como máxima de todo o direito penal; ao principio segundo o qual não pode
haver pena sem culpa e a medida da pena não pode em caso algum ultrapassar a
medida da culpa – AQUI RESIDE O MÉRITO DAS DOUTRINAS ABSOLUTAS – o
mérito de ter erigido o principio da culpa em principio absoluto de toda a aplicação da
pena, e deste modo, ter levantado um vero incondicional à aplicação de uma pena
criminal que viole a eminente dignidade humana.
Deve em todo o caso notar-se que a obrigatória correspetividade entre pena e culpa não é
biunivoca. Com isto quer-se significar que se toda a pena supõe a culpa, nem toda a
culpa supõe a pena, mas só aquela culpa que simultaneamente acarrete a
necessidade ou carência de pena. Neste plano se pode afirmar que a culpa é pressuposto
e limite mas não fundamento da pena.

Como críticos à concepção retributiva, temos:


- Figueiredo Dias – a teoria retributiva não é, verdadeiramente, uma teoria dos fins
da pena, pois que ela considera a pena como uma entidade independente dos seus
fins. Mais, esta teoria mostra-se inadequada à legitimação, à fundamentação e ao
sentido da intervenção penal. Ao Estado democrático compete a produção dos
bens jurídicos, não podendo o mesmo ser visto como uma instância destinada à
“realização terrena da ideia pura de justiça”. O Professor afirma ainda que estas
teses retributivas impedem qualquer tentativa de socialização do delinquente e de
restauração da paz jurídica da comunidade; Como teoria dos fins da pena a
doutrina da retribuição deve ser recusada – pois ela não é uma teoria dos FINS da
pena. Ela visa justamente o contrário, ou seja, a consideração da pena como
entidade independente de fins. Uma pena retributiva esgota o seu sentido no mal
que faz sofrer ao delinquente como compensação ou expiação do mal do crime.
- Maria Fernanda Palma – começa por apontar a indemonstrabilidade dos
pressupostos desta teoria, na medida em que parte de uma ideia de
responsabilidade individual assente num livre arbítrio total (o que a ciência não
consegue demonstrar). Para além disso, a retribuição exige a verificação de uma
culpa ética, sendo a pena a sua consequência necessária. No entanto, a intervenção
do poder punitivo do Estado não pode servir para sancionar automaticamente esta
culpa, até porque não cabe ao Estado a promoção de uma ética ou de uma
moral em si mesmas. O art 18º/2 CRP consagra o princípio da necessidade da
pena, do qual resulta que a pena só pode ser aplicada quando for necessária para
a preservação da sociedade. Mais, pode acontecer que a reafirmação do Direito
seja possível através da dispensa de pena (p.e. art 74º CP). Há nestas teorias, diz
a Professora, uma confusão conceptual entre retribuição e reafirmação do Direito.

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


Como teoria dos fins da pena, porém a doutrina da retribuição deve ser recusada.

A doutrina da retribuição deve ser recusada ainda pela sua inadequação à legitimação, à
fundamentação e ao sentido da intervenção penal. Estas podem apenas resultar da necessidade,
que ao Estado incumbe satisfazer, de proporcionar as condições de existência comunitária,
assegurando a cada pessoa o espaço possível de realização livre da sua personalidade.

➢ Teorias relativas/Preventivas: a pena como instrumento de prevenção


Contrariamente às teorias absolutas, as teorias relativas são teorias de FINS. Também elas
reconhecem que segundo a sua essência, a pena se traduz num mal para quem a sofre.
Mas como instrumento politico-criminal destinado a atuar no mundo, não pode a pena
bastar-se com essa característica – para como tal se justificar tem de usar esse mal para
alcançar a finalidade precípua de toda a politica criminal, a prevenção ou a profilaxia
criminal.
A critica geral proveniente dos adeptos das teorias absolutas é a de que
aplicando-se as penas a seres humanos em nome de fins utilitários ou pragmáticos
que pretendem alcançar no contexto social, elas transformariam a pessoa humana em
objeto, dela se serviriam para a realização de finalidades heterónomas e violariam a sua
eminente dignidade.
Nesta medida acabando a razão por pertencer a Kant, ao definir a lei penal como
imperativo categórico, bem como a Hegel, ao sustentar que uma pena finalista é como
um pau com que se bate num cão e não como um mal com que se castiga o mal feito
por um homem livre.
Na prática, esta teoria justifica a pena pela intimidação dos cidadãos relativamente à
violação da lei penal. Esta é a ideia base da concepção de Feuerbach, para o qual a pena
serviria para impedir (psicologicamente) quem tivesse tendências contrárias ao Direito de
se determinar por elas.

• Teorias relativas/Preventivas - A pena como instrumento de prevenção geral


Nas teorias preventivas há que começar por distinguir o sentido entre as doutrinas da
prevenção geral e as doutrinas da prevenção especial ou individual. O denominador
comum das doutrinas da prevenção geral radica na conceção da pena como
instrumento politico-criminal destinado a atuar sobre a generalidade dos membros da
comunidade, afastando-os da prática de crimes através da ameaça penal estatuída
pela lei, da realidade da sua aplicação e da efetividade da sua execução.
A pena pode ser concebida por uma parte, como forma estatalmente acolhida de
intimidação das outras através do sofrimento que com ela se inflige ao delinquente e
cujo receio as conduzirá a não cometerem factos puníveis: fala-se a este propósito de
prevenção geral negativa ou de intimidação.

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Mas a pena pode ser concebida por outra parte, como forma de que o Estado se serve
para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de
vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico
penal – neste sentido se fala hoje de uma prevenção geral positiva ou de integração. Nela
se tornou comum distinguir diversos efeitos nomeadamente o aludido “efeito de
confiança”, o de “aprendizagem” e o de “integração verdadeira e própria”.
Do ponto de vista desta teoria bem se compreende que se exija da pena uma atuação
preventiva sobre a generalidade dos membros da comunidade, seja no momento da
sua ameaça abstrata, seja no da sua concreta aplicação, seja no da sua efetiva execução.
Os índices da criminalidade por toda a parte crescente (em todo o caso: não da
criminalidade que continua uma grandeza desconhecida, mas da criminalidade registada
ou conhecida pela policia) mostram a inefetividade de se aposentar à pena uma finalidade
de prevenção geral.
O grande argumento que sempre se repete contra as doutrinas de prevenção geral é aquele
que já deixamos apontado – o de que, comandadas apenas por considerações pragmáticas
e eficientistas, elas fazem da pena um instrumento que viola a eminente dignidade da
pessoa humana. Mas ele aponta uma indiscutível fragilidade exclusivamente no seu
cariz negativo, como formas de intimidação da generalidade dos cidadãos. Quer
porque não se torna possível determinar empiricamente o quantum de pena necessário
para alcançar tal efeito. Quer porque, não logrando a erradicação do crime, fica
próxima a tendência para se usarem para o efeito penas cada vez mais severas e
desumanas; a ponto de o direito penal poder tornar-se absolutamente desproporcional.
O argumento já não será procedente se a prevenção geral se perspetivar na sua vertente
positiva, como prevenção de integração, de tutela da confiança geral na validade das
normas do ordenamento jurídico, ligada á proteção dos bens jurídicos e visando a
restauração da paz jurídica. Este critério permite que à sua luz se encontre uma pena que
em principio se revelará também uma pena justa e adequada à culpa do delinquente. Em
segundo lugar, já ficou dito que a medida concreta da pena a aplicar a um delinquente,
sendo embora fruto de considerações de prevenção geral positiva, deve ter limites
inultrapassáveis ditados pela culpa, que se inscrevem na vertente liberal do Estado de
Direito e se erguem justamente em nome da dignidade pessoal.
Na prática, esta teoria justifica a pena pela intimidação dos cidadãos relativamente à
violação da lei penal. Esta é a ideia base da concepção de Feuerbach, para o qual a pena
serviria para impedir (psicologicamente) quem tivesse tendências contrárias ao Direito de
se determinar por elas.
- Prevenção geral negativa – a pena é concebida como forma estatalmente
acolhida de intimidação das outras pessoas através do sofrimento que com ela se
inflige ao delinquente e cujo receito as conduzirá a não cometerem factos
puníveis;
- Prevenção geral positiva – pena é concebida como a forma de que o Estado se
serve para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força da
vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos. Há um fortalecimento das
expectativas sobre a eficácia da justiça penal.

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O ponto de partida das doutrinas da prevenção geral é prezável logo porque ele se liga
directa e imediatamente à função do direito penal de tutela subsidiária de bens jurídicos.

O grande argumento que sempre se repete contra as doutrinas da prevenção geral é o de que,
comandadas apenas por considerações pragmáticas e eficientistas, elas fazem da pena um
instrumento que viola, de forma inadmissível, a eminente dignidade da pessoa humana à
qual se aplica.

O argumento já não será procedente, porém, se a prevenção geral se perspectivar na sua


vertente positiva, como prevenção de integração, de tutela da confiança geral na validade e
vigência das normas do ordenamento jurídico, ligada à protecção dos bens jurídicos. Em
primeiro lugar, este critério permite que à sua luz se encontre uma pena que, em princípio, se
revelará também uma pena justa e adequada à culpa do delinquente. Em segundo lugar, a
medida concreta da pena a aplicar a um delinquente, sendo embora fruto de considerações
de prevenção geral positiva, deve ter limites inultrapassáveis ditados pela culpa, que se
inscrevem na vertente liberal do Estado de Direito.

Como principais críticas a esta concepção, assinalam-se:


- Maria Fernanda Palma – o interesse público não justifica que se inflija ao
agente qualquer pena, pois que a pessoa não pode ser vista como um meio ao
serviço dos fins sociais. Para além disso, esta perspectiva não justifica a
atribuição da pena ao criminoso por algo que ele tenha feito e com base na
medida da gravidade do facto (a pena deixa de poder ser vista como
consequência do crime).
- Figueiredo Dias – a teoria é dotada de uma certa fragilidade, colocando o
criminoso numa posição instrumental. Defende que a vertente positiva da teoria
de prevenção geral já não coloca esse problema, visto que está em causa, em
última instância, a restauração da paz jurídica. Esta vertente permite que se
encontre uma pena que, em princípio, será uma pena justa e adequada à culpa do
delinquente.

• Teorias relativas/Preventivas - A pena como instrumento de prevenção


especial ou individual
Aqui, a pena surge como um instrumento de actuação dirigido ao indivíduo, pelo que
o escopo central é o de evitar a reincidência. O fim das penas é a intervenção sobre o
cidadão delinquente, através da coacção psicológica, inibindo-o da prática de crimes ou
eliminando nele a disposição para os praticar. Sendo isto pacífico entre todas as
concepções, é já discutível a maneira como isso será feito. LISZT distingue, conforme
a personalidade do agente, três funções preventivas especiais da pena – a intimidação,
o melhoramento e a eliminação do criminoso. Também nesta há uma dimensão negativa
– necessidade de retirar a perigosidade ao agente e exigir a sua reforma moral – e

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uma dimensão positiva – pretende-se a reinserção social do agente. No fundo, para uns,
a correcção do delinquente é uma mera utopia, pelo que o máximo que se conseguirá é a
intimidação individual do agente. Assim, a pena visaria atemorizar o delinquente até que
ele não repetisse a prática de crimes. Já para outros, a prevenção especial possibilitaria
o alcançar de um efeito de defesa social, através da separação do delinquente do meio e
da seguinte neutralização da sua perigosidade
As doutrinas da prevenção especial ou individual têm por denominador comum a
ideia de que a pena é um instrumento de atuação preventiva sobre a pessoa do delinquente
com o fim de evitar que no futuro ele cometa mais crimes. Neste sentido se deve falar de
uma finalidade de prevenção de reincidência.
Para uns, a correção dos delinquentes seria uma utopia pelo que a prevenção
especial só poderia dirigir-se à sua intimidação individual: a pena visaria atemorizar o
delinquente até um ponto em que ele não repetiria no futuro a prática de crimes. Enquanto
para outros a prevenção especial lograria alcançar um efeito de defesa social através da
separação ou segregação do delinquente, assim procurando-se atingir a neutralização da
sua perigosidade social – podendo falar-se em qualquer destas hipóteses, de uma
prevenção especial negativa ou de neutralização.
No outro extremo se situam os que pretendem dar á prevenção individual a finalidade de
alcançar a reforma interior do delinquente, uma emenda do criminoso, funcionaria como
um verdadeiro tratamento das tendências individuais que conduzem ao crime.
Em definitivo, do que deve tratar-se no efeito de prevenção especial é criar as condições
necessárias para que ele possa no futuro, continuar a viver a sua vida sem cometer
crimes. Neste ultimo sentido se podendo afirmar com justeza que a finalidade preventivo-
especial de pena se traduz na “prevenção da reincidência”. Todas estas doutrinas se
irmanam, todavia, no propósito de lograr a reinserção social, a ressocialização do
delinquente e merecem que elas se considerem como doutrinas da prevenção
especial positiva ou de socialização.
O pensamento da prevenção individual positiva depara com dificuldades naqueles casos
em que uma socialização se mostra desnecessária, em que o agente se não revela carente
de socialização. Também concluimos que o pensamento da prevenção especial positiva
não pode valer, só por si como solução integral do problema dos fins da pena. Nos casos
em que aquela desnecessidade realmente se verifique só há lugar para uma prevenção
negativa de pura defesa social.
Tais casos de desnecessidade de socialização serão menos frequentes do que aquilo que
certa doutrina supõe, nos temas do crime económico, e em especial, naqueles que a
ciência criminológica chama, na esteira de Sutherland “crimes de colarinho branco”.
O pensamento da prevenção especial – nomeadamente quando se assume como prevenção
especial positiva ou de socialização – é decerto, a muitos títulos, tão prezável, quanto
indispensável. Tal como se viu suceder com o pensamento da prevenção geral, ele revela desde
logo uma particular sintonia com a função do direito penal como direito de tutela subsidiária de
bens jurídicos.
O Estado tem o dever de auxiliar os membros da comunidade colocados em situação de maior
necessidade e carência social a eles oferecendo os meios necessários à sua (re)inserção social.

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Nem por isso, todavia, o pensamento da prevenção especial deixa de se debater com dificuldades
sensíveis e que, quando não correctamente ultrapassadas, podem conduzir à sua condenação.
É hoje seguramente de recusar uma acepção da prevenção especial no sentido da correcção ou
emenda moral do delinquente.
De recusar será igualmente o paradigma médico ou clínico da prevenção especial, sempre que ele
se tome como tratamento coactivo das inclinações e tendências do delinquente para o crime.
Por fim, o pensamento da prevenção individual positiva depara com dificuldades naqueles casos
em que uma socialização se mostra desnecessária, em que o agente se não revela carente de
socialização.

Também aqui se pode falar em:


- Prevenção especial negativa – a prevenção especial só poderá dirigir-se à
intimidação individual do delinquente, uma vez que a sua “correção” é uma
utopia. O que se pretende é a neutralização do agente infrator
- Prevenção especial positiva – pretende dar à prevenção individual a finalidade
de alcançar a reforma interior (moral) do delinquente ou de tratamento das
tendências individuais que conduzem ao crime, exatamente no mesmo plano em
que se trata um doente.

Quanto às críticas feitas a esta concepção:


- Maria Fernanda Palma – também esta vertente, isoladamente considerada, é
inaceitável como fim exclusivo das penas. Esta conduz a consequências difíceis
de aceitar, dado que crimes muito graves poderiam ficar impunes se não
houvesse risco de reincidência, assim como crimes menos graves poderiam dar
origem a prisão perpétua ou morte. Para além disso, a concepção em apreço
tende a menosprezar o princípio da necessidade da pena (art 18º, nº 2 CRP).
Nenhuma das teorias dos fins das penas logra, pelas suas forças exclusivas, dar
uma resposta satisfatória ao problema da legitimidade da pena. As teorias sobre
os fins das penas pretendem resolver um problema mal colocado – o dos fins
“ideais” das penas.
O ponto de partida da discussão, deve pois ser a realidade da pena e não aquilo
que ela idealmente deveria ser. A Prof. FERNANDA PALMA afirma então que
não terá cabimento proclamar que a pena não deve ser retributiva onde a
primeira necessidade humana que a pena pública satisfaz é a da substituição
psicológica da vingança privada. O problema fundamental será então saber se a
pena poderá cumprir aquele destino racionalmente e de forma juridicamente
aceitável e ser instrumento de efeitos sociais úteis, para além das razões ancestrais
da sua instituição.
É certo que a existência da comunidade social tem uma sedimentação mais
profunda do que a tradicional lógica contratualista (que proclamava a necessidade
da pena: só a pena necessária é legítima) supõe. As necessidades que justificam a
comunidade estatal não se reconduzem à liberdade individual enão são livre e

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renovadamente discutíveis por cada indivíduo sempre e a todo o tempo,
dependendo antes de consensos temporários ou de maiorias contingentes.

A substituição psicológica da vingança privada que a pena assegura enquanto


retribuição racionaliza-se através de dois princípios constitucionais:

o Princípio da culpa, derivado da essencial dignidade da pessoa humana (art.


1º CRP).
o Princípio da necessidade da pena (art. 18º/2 CRP).

A pena retributiva só será legítima se for necessária preventivamente.

Ou seja, na pena está sempre inerente uma ideia de reparação, de retribuição.


Contudo, trata-se hoje de uma retribuição moderna, em que a pena é entendida
como uma pena retributiva justificada preventivamente.
A prevenção geral só será, contudo, critério racional de definição dos fins das
penas se se basear num efeito objetivo constatável, de alguma forma
mensurável – a intimidação – mesmo que ele seja alcançado pelos mecanismos
psicanalíticos da crença na validade da norma violada.
A Prof. entende a culpa não só como pressuposto, mas também como
fundamento – é a culpa que nos vai dizer, no caso concreto, como é que o
agente deve ser responsabilizado. O agente só deve ser punido se se provar que
houve outras alternativas de ação, e o agente optou pela ação que gerou o dano
- Figueiredo Dias – encontra desde logo a dificuldade de ser uma teoria que, dentro
dela, aceita perspectivas muito diferentes. Quanto à prevenção especial no
sentido de correcção, esta é hoje de recusar, pois que o Estado não tem
legitimidade para corrigir a moralidade do agente. Também as concepções que
vêem o criminoso como um doente e que por isso se apoiam no seu tratamento
não fazem sentido. No momento da determinação da pena, o Prof. tenta articular
todos os tipos de prevenção. Tem de se criar uma moldura para o caso concreto
– dentro da moldura (imposta pela lei) vai-se construir o espaço que seria
aceitável em termos de prevenção geral positiva. O aplicador do direito é
chamado, em primeiro lugar, a fazer um juízo das necessidades de tutela e das
expectativas comunitárias no caso concreto. Assim, o que resulta do art. 40º/1 é
que a pena não visa retribuir a culpa, mas antes que, tendo outros fins, a prevenção
geral na forma de proteção dos bens jurídicos e a prevenção especial na forma de
reintegração do agente na sociedade, está limitada no seu máximo pela culpa.

Em primeiro lugar, conduz a consequências difíceis de aceitar, tanto no plano ético


como no plano jurídico-constitucional. Crimes muito graves poderiam ficar
impunes se não existisse perigo de reincidência e crimes menos graves poderiam
justificar a prisão perpétua ou a morte.
Em segundo lugar, a investigação empírica não permite apoiar em dados
absolutamente seguros a prognose sobre a delinquência futura. Por outro lado, a
pena é criminógena, de modo que as próprias condenações aumentam as

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probabilidades de reincidência. Consequentemente, a prevenção especial tende a
menosprezar o princípio da necessidade da pena (art. 18º/2 CRP).
Por outro lado, até é discutível que justifique a criminalização de condutas. Se a
recuperação ou intimidação do delinquente são falíveis, a legitimidade de utilizar
meios tão graves para a realização incerta desses fins pode estar efetivamente em
causa.

• A “concertação agente – vítima ”

Refere-se hoje, cada vez com maior insistência, como uma autónoma e nova finalidade
da pena o propósito de com ela se operar a possível concertação entre o agente e a vítima através
da reparação dos danos – não apenas necessariamente patrimoniais, mas também morais –
causados pelo crime.
O Direito Penal considera a reparação do dano como condição de legitimidade de
aplicação de certas “ penas de substituição” ( art. 51º-1 ) ou como condição da “dispensa de
pena” ( art. 74º - 1b), para além de admitir o lesado a pedir a reparação dos danos civis no
próprio processo penal ( art. 71º e ss e 82º-.A do CPP).
Como ideia geral, pois, a concertação agente – vítima só pode ter o sentido de contributo
para o restabelecimento da confiança e da paz jurídicas abaladas pelo crime, o qual, como vimos,
constitui o cerne mesmo da prevenção geral positiva. Enquanto, por outro lado, aquela
concertação conforma uma vertente decisiva para uma correcta avalização, no caso, das
exigências de prevenção especial positiva.

➢ TEORIAS MISTAS OU UNIFICADORAS

Existem dois grupos de teorias mistas ou unificadoras, consoante na


combinação entrem ainda a ideia retributiva ou apenas ideias preventivas.
A maioria das doutrinas sobre os fins das penas radica em tentativas, as mais variadas, de
combinar, sob diversos pontos de vista, algumas ou todas as doutrinas que atrás ficaram
referenciadas

• Teorias em que reentra ainda a ideia da retribuição


Se quiser reduzir-se a multiplicidade de pontos de vista que visam combinar a tese
fundamental da retribuição com as do pensamento preventivo, geral e especial,
reconduzindo-as a um corpo doutrinal predominante, poderá este ser definido como o de
uma pena retributiva no seio da qual procura dar-se realização a pontos de vista de
prevenção, geral e especial; ou, diferentemente no que toca à hierarquização das
perspectivas integrantes, para todavia se exprimir no fundo a mesma ideia, como o de
uma pena preventiva através de justa retribuição. Numa e noutra formulação estará
presente a concepção da pena, segundo a sua essência como retribuição da culpa e

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subsidiariamente como instrumento de intimidação da generalidade e, na medida
possível, de ressocialização do agente. Concepção esta que pode de algum modo ligar-
se a uma outra que se designa teoria diacrónica dos fins da pena; no momento da sua
ameaça abstracta a pena seria, antes de tudo, instrumento de prevenção geral; no
momento da sua aplicação ela surgiria basicamente na sua veste retributiva; na sua
execução efectiva, por fim, ela visaria predominantemente fins de prevenção especial.
Todo este grupo de concepções unificadoras é porém, enquanto, teorias dos fins
das penas inaceitável. Porque, fazendo entrar na composição desejada, como quer que ela
concretamente se estabeleça, a ideia retributiva, está a chamar para o problema das
finalidades da pena um vector que, como procurou mostrar-se, não deve ser tomado em
consideração neste contexto: a retribuição ou compensação da culpa não é nem pode
constituir uma finalidade da pena.
Haverá ainda que sublinhar, por outro lado, que quando se misturam doutrinas
absolutas com doutrinas relativas fica definitivamente sem se saber qual o ponto de
partida para se encontrar o fundamento teorético e a razão de legitimação da intervenção
penal.

• Teorias da prevenção integral


O ponto de partida destas teorias, em si correcto, é o de que a combinação ou
unificação das finalidades da pena só pode ocorrer a nível da prevenção, geral e
especial, com exclusão de qualquer ressonância retributiva expiatória ou
compensatória.
Mas também esta concepção unificadora deve ser globalmente recusada. Se o
denominador comum de todas as doutrinas cabidas nesta concepção a ideia de negar in
limite à concepção retributiva legitimidade para entrar na composição das finalidades da
pena, daí elas concluem pela recusa do pensamento da culpa e do seu princípio como
limite do problema: ou porque procuram substituí-lo pala categoria da perigosidade ;
ou, como modernamente sucede, pelo princípio jurídico – constitucional da
proporcionalidade; ou por uma manipulação da ideia de culpa como mero derivado da
prevenção.
Desta crítica não é passível uma concepção como a de Roxin. Ele conclui, em
plena consonância com o ponto de vista aqui defendido, que a pena serve exclusivamente
finalidades de prevenção geral e especial; mas nem por isso perde a clara consciência de
que recusar a intervenção da retribuição na querela sobre as finalidades da pena não
significa nem abandonar, nem minimizar o pensamento e o princípio da culpa na
construção do facto punível e na legitimação da intervenção penal, nem tão – pouco
esquecer o significado essencial que aquele princípio e pensamento assume na querela.
Roxin afirma que a medida da culpa é dada não por um ponto exacto da escala
penal, mas através de uma moldura da culpa, e que, em princípio, é dentro desta moldura
da culpa que o juiz deverá fixar a medida concreta da pena.

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OS FINS DAS PENAS – SEGUNDO APONTAMENTOS DAS AULAS
TEÓRICAS
As teorias dividem-se numa lógica de serem absolutas ou relativas, as absolutas são as da
retribuição, e nessa logica temos de olhar para o passado e o sentido da pena é uma
resposta ao que aconteceu.
Qual o fim da pena ?

Teses Retributivas - É de uma retribuição pelo mal praticado, o objetivo é o da


expiação da culpa do agente. Estas teorias recebem o seu grande impulso de Kant e de
Hegel. Para kant correspondia a um imperativo categórico e não hipotético, não para
responder no futuro mas ao que aconteceu. Temos de tratar a pessoa como ser digno
de castigo.
Imaginemos que alguém estava condenado mas o estado de medicina era tal que estava
preparar-se um medicamento que iria trazer enormes benefícios, mas para avanção era
preciso sujeitar alguém a experiencias medicas, o criminoso voluntaria-se mas que se
livrava da pena – o tribunal teria de recusar esta proposta, segundo kant, o importante é
garantir a justiça.
Hegel dizia que o importante é o que os factos significam, o crime é a negação do
direito. A pena é a negação dessa negação. Se disséssemos que com a pena o que
queremos é que o criminoso não volte a fazer, o autor afirmava que era como se
estivéssemos a tratar a pessoa como um cão. Afirma que devemos tratar o homem como
ser racional, logo devemos castiga-lo.

Como a pena é justa paga pelo que se fez, normalmente é fácil associal as leis retributiva
ás ? (olho por olho, dente por dente). Das teses retributivas ganhamos um principio muito
importante – principio da culpa – este principio tem uma derivação muito simples – na
sua formulação básica este principio diz que não há pena sem culpa e a pena não pode
ultrapassar a medida da culpa. Uma pena sem culpa ou que va para alem da medida da
culpa vai contra este principio, não expresso na nossa CRP, mas decorre do art 1º CRP
conjugado com o art 7º. Se não tiver em alguma medida culpa pelo que fez, não pode ser
julgado e penalizado.
Quando é que há censura pelo que se fez? Quando podia ter feito outra coisa mas não
fez. A culpa envolve sempre um juízo de liberdade.

Criticas as teorias retributivas


- se a pena se traduz pelo mal que praticou e juízo de censura pelo mesmo então
pressupõe que o agente era livre, logo temos de aceitar o livre arbítrio das pessoas,
mas não esta provado que seja
- é ao estado que cabe penalizar as pessoas por disporem da sua liberdade? O que
justifica que detenha esse poder?

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- pode acontecer que uma pena em termos de culpa se revele desnecessária ou não tão
grave, se impusermos ainda assim a pena, numa logica de necessidade da pena art 18
CRP não parece justificar-se constitucionalmente. Neste art retiramos o principio
material da pena, se a luz de uma tese retributiva, mesmo que seja desnecessária para
proteger bens jurídicos, isto viola o 18/2.

Teses preventivas – os fins das penas centram-se no futuro logo o objetivo é produzir
um certo efeito no futuro.
Quando o fim é de prevenção especial, os fins que se destina a produzir efeitos no
criminoso especifico, para que o mesmo não pratique mais crime. Franz Voz (??) a logica
é de corrigir a pessoa, porque se a pessoa praticou o crime é porque a vontade não é
perfeita. Quando não fosse possível corrigir a pessoa, devemos então intimidá-la, no
limite vamos neutraliza-la, prisão perpétua ou pena de morte.
Quando nos preocupamos em re-educar, aqui a logica é de prevenção especial positiva,
quando pensamos em intimidá-la neutraliza-la, a logica é de prevençao especial
negativa.
Criticas: o modelo facilmente se associal para a repressão do que é anómalo, acabamos
a punir mendigos, prostitutas, apenas por serem esse tipo de pessoas e não pelo que
fizeram, pessoas mais ostracizadas. Pode acontecer que factos muito graves sejam
praticados por pessoas que as praticou em situações de grande excecionalidade.
Na logica de prevenção especial teria uma pena muito reduzida ou inexistente. Isto a luz
do principio da culpa e principio da proporcionalidade é muito difícil de conceber.
Tem difícil consagração pratica. A pena de prisão é estigmatizante e tem efeito
crimonógeno.

Teorias da prevenção geral – nesta logica já não se busca produzir efeitos na pessoa do
condenado, os efeitos que se visam produzir são na restante comunidade/sociedade.
Teoria da coação psicológica, dizia que a mente do potencial criminoso é uma espécie
de campo de combate com luta de motivos, acha que o criminoso vai obter mais
prazer com a pratica do crime do que sem ela. Temos de dizer as pessoas que com a
pratica do crime, não vão ter efetivamente maior prazer, através da pena, acha que o
momento essencial é o da comunicação da pena, o momento da ameaça. Estas teses
desenvolvem-se em duas linhas, a da prevenção geral negativa - ameaça, intimidação;
mas há ainda a prevenção geral positiva – a logica é a do reforço da confiança da
população. Houve um crime, mas há confiança de que o direito continua a vigorar e se
vai certificar de punir através das suas penas.

Criticas: com a prevenção geral negativa, pode tender para penas muito gravosas, a
medida que o legislador ve que a ameaça não é suficiente, e isto na logica de
proporcionalidade não parece constitucional nem do sentido da culpa. É difícil comprovar
estes efeitos nas pessoas, mesmo que fosse, não aprece credível dizer que as pessoas

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deixam de praticar o crime porque as ameaçam o crime com uma pena, no máximo seria
de se acreditar que no futuro a pena seja mesmo aplicada com a pratica do crime, tem de
haver garantis de que todos os crimes são punidos. Uma pena que se destina a produzir
efeitos nas outras pessoas, desligando-se de juízos de censura, é uma pena que
instrumentaliza o individuo e o trata exclusivamente como meio e não parece respeitar a
sua dignidade.
Se o A mata o B para lhe tirar 100 euros, uma pena que arante que não vai ter
vantagem com o crime pode ser uma vantagem de 200 euros. Se A praticou crime de
difamação ate poderia apanhar crime de prisão perpetua… logo percebemos que não
joga bem com o quadro de valores que temos.

FINALIDADES E LIMITE DAS PENAS CRIMINAIS

• A natureza exclusivamente preventiva das finalidades da pena

A base da solução aqui defendida para o problema dos fins da pena reside em que estes
só podem ter natureza preventiva – seja de prevenção geral, positiva ou negativa, seja de
prevenção especial, positiva ou negativa – não natureza retributiva.
O direito penal e o seu exercício pelo Estado fundamentam-se na necessidade estatal de subtrair
à disponibilidade de cada pessoa o mínimo dos seus direitos, liberdades e garantias indispensável
ao funcionamento da sociedade, à prevenção dos seus bens jurídicos essenciais; e a permitir a
realização mais livre possível da personalidade de casa um enquanto individuo e enquanto
membro da comunidade.

• Ponto de partida : as exigências da prevenção geral positiva ou de integração

Primordialmente, a finalidade visada pela pena há-de ser a da tutela necessária dos bens
jurídico – penais no caso concreto; e esta há-de ser também por conseguinte a ideia mestra do
modelo de medida da pena. Tutela dos bens jurídicos não obviamente num sentido retrospectivo,
face a um crime já verificado, mas com um significado prospectivo, correctamente traduzido pela
necessidade de tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência
de norma violada ; sendo por isso uma razoável forma de expressão afirmar como finalidade
primária da pena o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime. Uma
finalidade que, deste modo, por inteiro se cobre com a ideia de prevenção geral positiva ou
prevenção de integração; e que dá por sua vez conteúdo ao princípio da necessidade da pena que
o art. 18º-2 da CRP consagra de forma paradigmática.

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Afirmar que a prevenção geral positiva ou de integração constitui a finalidade primordial
da pena e o ponto de partida para a resolução de eventuais conflitos entre as diferentes finalidades
preventivas traduz exactamente a convicção de que existe uma medida óptima de tutela dos
bens jurídicos e das expectativas comunitárias que a pena se deve propor alcançar; medida esta
que não pode ser excedida (principio da necessidade) por considerações de qualquer tipo,
nomeadamente por exigências de prevenção especial, derivadas de uma particular perigosidade
do delinquente. É verdade que esta medida ótima de prevenção geral positiva não fornece ao juiz
um quantum exato da pena. Abaixo do ponto ótimo ideal outros existirão em que aquela tutela é
ainda situar sem que perca a sua função primordial de tutela dos bens jurídicos. Até se alcançar
um limiar mínimo – chamado de DEFESA DO ORDENAMENTO JURIDICO – abaixo do qual
já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa
a sua função tutelar de bens juridicos

É a prevenção geral positiva que fornece uma moldura de prevenção dentro de cujos
limites podem e devem actuar considerações de prevenção especial ; e não a culpa, como
tradicional e ainda hoje maioritariamente se pensa, que fornece uma “ moldura da culpa”.
Fica por esta via esvaziada de conteúdo um das questões mais discutidas a propósito do papel da
prevenção geral na doutrina dos fins das penas: a de saber se seria lícita uma qualquer elevação
da pena em nome de exigências de prevenção geral negativa ou prevenção de intimidação da
generalidade. A intimidação da generalidade não constitui todavia por si mesma uma finalidade
autónoma da pena apenas podendo surgir como um efeito lateral da necessidade de tutela de bens
jurídicos.

• Ponto de chegada : as exigências da prevenção especial, nomeadamente da prevenção


especial positiva ou de socialização

Dentro da moldura ou dos limites consentidos pela prevenção geral positiva ou de


integração – entre o ponto óptimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida da
tutela dos bens jurídicos ( ou de “defesa do ordenamento jurídico”) – devem actuar, em toda a
medida possível, pontos de vista de prevenção especial, sendo assim eles que vão determinar,
em última instância, a medida da pena. Isto significa que releva neste contexto qualquer uma
das funções que o pensamento da prevenção especial realiza : seja a função positiva de
socialização, seja qualquer uma das funções negativas subordinadas de advertência individual ou
de segurança ou inocuização.
A medida da necessidade de socialização do agente é no entanto, em princípio, o critério
decisivo das exigências de prevenção especial, constituindo hoje o vector mais importante daquele
pensamento. Ele só entra em jogo porém se o agente se revelar carente de socialização. Se uma

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tal carência se não verificar tudo se resumirá, em termos de prevenção especial, em conferir à
pena uma função de suficiente advertência; o que permitirá que a medida da pena desça até ao
perto do limite mínimo da “moldura de prevenção” ou mesmo que com ele coincida (“defesa do
ordenamento jurídico”).

• A culpa como pressuposto e limite da pena


Se a retribuição não tem qualquer palavra a dizer em matéria de finalidades da pena, a
ela pertence o mérito indeclinável de ter posto em evidência a essencialidade do principio
da culpa e do significado deste para o problema das finalidades da pena.
Segundo o princípio da culpa “não há pena sem culpa e a medida da pena não pode em
caso algum ultrapassar a medida da culpa”. A verdadeira função da culpa no sistema punitivo
reside efectivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento da pena,
mas constitui o seu pressuposto necessário e o seu limite inultrapassável: o limite
inultrapassável por quaisquer considerações ou exigências preventivas – sejam de prevenção
geral positiva de integração ou antes de intimidação, sejam de prevenção especial positiva
de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização. A função da culpa é, por
outras palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de
preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade
nos quadros próprios de um Estado de Direito democrático.
Como insistentemente tem acentuado Roxin as razões de diminuição da culpa são, em
princípio, também comunitariamente compreensíveis e aceitáveis e determinam que, no caso
concreto, as exigências de tutela dos bens jurídicos e de estabilização das normas sejam menores.
Parece dispensável a ideia de que a legitimação da pena repousa substancialmente num
duplo fundamento : o da prevenção e o da culpa :; e isto porque a pena só seria legítima “quando
é necessária de um ponto de vista preventivo e, para além disso, é justa”, não se tratando deste
modo de uma “união ecléctica de elementos heterogéneos”, mas aliás de uma “justificação
cumulativa”.
Toda a pena que responda adequadamente às exigências preventivas e não exceda e
medida da culpa é uma pena justa.

• Conclusão

A teoria penal aqui defendida pode assim resumir-se do modo seguinte:


1) toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial;
2) a pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa;
3) dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de
prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de

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tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas
de defesa do ordenamento jurídico;
4) dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada
em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização,
excepcionalmente negativa, de intimidação ou de segurança individuais.

➢ PARA ROXIN:
Adota uma teoria preventiva.
Afirma que o Direito penal se realiza em 3 etapas:
1. O primeiro momento em que o Direito penal intervém é o da cominação penal (associar
a um determinado comportamento uma sanção), ou seja, da determinação da medida
da pena. Para tal, é necessário saber que a função do poder estatal é a de criar e garantir
a um grupo reunido, interior e exteriormente, no Estado, as condições de uma existência
que satisfaça as suas necessidades vitais. Concretamente, os pressupostos
imprescindíveis para uma existência em comum concretizam-se nos bens jurídicos,
sendo que o Direito penal tem de assegurá-los.
Contudo, o Direito penal é de natureza subsidiária, e por isso apenas se podem punir as lesões
de bens jurídicos e as contravenções contra fins de assistência social se tal for indispensável
para uma vida em comum ordenada. Neste âmbito, o que se tem em vista nas disposições
penais é a prevenção geral.
2. O segundo momento é o da aplicação e graduação da pena. Neste momento, a
aplicação da pena serve para a proteção subsidiária e preventiva, tanto geral como
individual, de bens jurídicos e de prestações estatais, através de um processo que
salvaguarde a autonomia da personalidade e que, ao impor a pena, esteja limitado pela
medida da culpa. Assim se conserva o princípio da prevenção geral, reduzido às
exigências do Estado de Direito, e completado com as componentes de prevenção
especial da sentença mas que, simultaneamente, através da função limitadora dos
conceitos de liberdade e culpa.
3. O último momento é o da execução. Servindo a pena exclusivamente fins racionais e
devendo possibilitar a vida humana em comum e sem perigos, a execução da pena
apenas se justifica se prosseguir esta meta na medida do possível, isto é, tendo como
conteúdo a reintegração do delinquente na comunidade – prevenção especial.
Contudo, a ideia de função ressocializadora não justifica por si só o Direito penal e, por
isso, não se podem descurar as etapas precedentes, nas quais pode não ser eficaz. Pelo
contrário, os esforços de ressocialização apenas são legítimos e bem sucedidos sob todos
os aspetos, dentro dos limites atrás traçados.

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Para este autor, a pena não pode ultrapassar a medida da culpa (encontra-se aqui o único resquício
da retribuição). Deste modo, a culpa serve para limitar o poder penal do Estado, e tal é possível e
necessário porque os conceitos de dignidade humana e autonomia da pessoa que presidem à Lei
fundamental e à tradição ocidental pressupõem o homem como ser capaz de culpa e
responsabilidade, que conforma a sua vida em comum com os restantes segundo projetos
conformes a um sentido, cuja justeza não se prova com recurso aos métodos científicos, mas cuja
legitimidade se deve à decisão da sociedade para criar uma ordem livre e conforme ao Estado de
Direito.
Assim enquadrado, o conceito de culpa tem a função de assegurar ao particular que o Estado não
estenda o seu poder penal, no interesse da prevenção geral ou especial, para além do
correspondente à responsabilidade de um homem concebido como livre e suscetível de culpa.
Deste modo, evita-se a má consciência que existiria que se se utilizasse a culpa para justificar
medidas retributivas, já que esta utilização do conceito de culpa para coartar o poder da autoridade
atua exclusivamente a favor do cidadão e das suas possibilidades de desenvolvimento.
Assim, a culpa constituirá um meio de manter dentro de limites aceitáveis os interesses da
coletividade face à liberdade individual.
Em relação ao instituto da suspensão da execução da pena, este poderá ser permitido e até
necessário, segundo o princípio da solidariedade, se no caso concreto se restaurar a paz jurídica
com sanções menos graves.

➢ PARA FIGUEIREDO DIAS


No momento da determinação da pena, o Prof. tenta articular todos os tipos de prevenção. Tem
de se criar uma moldura para o caso concreto – dentro da moldura (imposta pela lei) vai-se
construir o espaço que seria aceitável em termos de prevenção geral positiva.
O aplicador do direito é chamado, em primeiro lugar, a fazer um juízo das necessidades de
tutela e das expectativas comunitárias no caso concreto. Assim, o que resulta do art. 40º/1 é
que a pena não visa retribuir a culpa, mas antes que, tendo outros fins, a prevenção geral
na forma de proteção dos bens jurídicos e a prevenção especial na forma de reintegração do
agente na sociedade, está limitada no seu máximo pela culpa.
- Prevenção geral positiva/integração: logica de defesa de bens jurídicos. Isto só se
entende pela negativa. O juiz vai condenar alguém por homicídio e o juiz olha para o 131
e tem la moldura geral de 8-16 anos, o prof diz que dentro dessa moldura legal o juiz vai
determinar a que medida corresponde à confiança da comunidade, determinar uma
medida ótima, determinar o que seria ótimo, imagine-se que de determina que a medida
ótima das expectativas da comunidade seria 14. Acima de 14 seria desnecessário, abaixo
de 14 por exemplo 10, seria o limiar mínimo de satisfação, 10 é limiar mínimo de defesa
do ordenamento jurídico. O intervalo 10-14 é a moldura geral de prevenção. Dentro

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desses 10-14 o que é que o juiz vai escolher, se só se preocupasse com prevenção geral
positiva escolheria 14. Mas se a prevenção especial positiva não justificar os 14, fica-se
pelos 10.
Falta mencionar o limite da culpa, o juiz tem de olhar para o caso concreto e ver qual o
juízo de censura que o arguido merece.

➢ PARA FERNANDA PALMA


Nenhuma das teorias dos fins das penas logra, pelas suas forças exclusivas, dar uma resposta
satisfatória ao problema da legitimidade da pena. As teorias sobre os fins das penas pretendem
resolver um problema mal colocado – o dos fins “ideais” das penas.
O ponto de partida da discussão, deve pois ser a realidade da pena e não aquilo que ela
idealmente deveria ser. A Prof. FERNANDA PALMA afirma então que não terá cabimento
proclamar que a pena não deve ser retributiva onde a primeira necessidade humana que a
pena pública satisfaz é a da substituição psicológica da vingança privada. O problema
fundamental será então saber se a pena poderá cumprir aquele destino racionalmente e de forma
juridicamente aceitável e ser instrumento de efeitos sociais úteis, para além das razões ancestrais
da sua instituição.
É certo que a existência da comunidade social tem uma sedimentação mais profunda do que
a tradicional lógica contratualista (que proclamava a necessidade da pena: só a pena necessária é
legítima) supõe. As necessidades que justificam a comunidade estatal não se reconduzem à
liberdade individual enão são livre e renovadamente discutíveis por cada indivíduo sempre e a
todo o tempo, dependendo antes de consensos temporários ou de maiorias contingentes.
A substituição psicológica da vingança privada que a pena assegura enquanto retribuição
racionaliza-se através de dois princípios constitucionais:
- Princípio da culpa, derivado da essencial dignidade da pessoa humana (art. 1º CRP).
- Princípio da necessidade da pena (art. 18º/2 CRP).
A pena retributiva só será legítima se for necessária preventivamente.
Ou seja, na pena está sempre inerente uma ideia de reparação, de retribuição. Contudo, trata-
se hoje de uma retribuição moderna, em que a pena é entendida como uma pena retributiva
justificada preventivamente.
A prevenção geral só será, contudo, critério racional de definição dos fins das penas
se se basear num efeito objetivo constatável, de alguma forma mensurável – a intimidação –
mesmo que ele seja alcançado pelos mecanismos psicanalíticos da crença na validade da norma
violada.
A Prof. entende a culpa não só como pressuposto, mas também como fundamento –
é a culpa que nos vai dizer, no caso concreto, como é que o agente deve ser responsabilizado. O

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agente só deve ser punido se se provar que houve outras alternativas de ação, e o agente
optou pela ação que gerou o dano

➢ As antinomias entre os fins das penas e os modelos de politica criminal


À controvérsia clássica entre as teorias dos fins das penas sucedeu o confronto entre os
modelos de política criminal. A política criminal é o conjunto das soluções normativas ou
puramente estratégicas tendentes a uma otimização do controlo do crime (KAISER).
Entre nós, FIGUEIREDO DIAS apresenta uma história dos modelos de política criminal: a
um modelo fundamentalmente retributivo (modelo azul), em que a política criminal se ocultava
sob a linguagem ética, sucedeu um modelo preventivo-especial (modelo vermelho), e as estes
dois, sucedeu a própria descrença e a desorganização dos modelos de política criminal.
Na realidade, contestada a conceção penal retributiva, assente numa conceção metafísica da
pena, por ser inadequada aos fins legítimos da intervenção penal, e frustrada a via preventiva-
especial por ter sido simultaneamente inoperante e atentatória da dignidade da pessoa humana,
assoma na crise da política criminal o que FIGUEIREDO DIAS designa como paradigma
emergente, o modelo verde, fortemente apoiado na prevenção geral positiva, que organiza o
controlo do crime a partir de uma teia de princípios constitucionais (legalidade, culpa, necessidade
da pena) e de uma estratégia de descriminalização, desjudiciariazação, socialização e
diversificação (substituição da pena de prisão por sanções alternativas).

FUNDAMENTO, SENTIDO E FINALIDADES DA MEDIDA DE


SEGURANÇA CRIMINAL

➢ AS MEDIDAS DE SEGURANÇA CRIMINAIS NO SISTEMA SANCIONATÓRIO

• As medidas de segurança criminais nos sistema sancionatório

O sistema das sanções jurídico – criminais do direito penal português assenta em dois
pólos:
- o das penas;
- o das medidas de segurança.
Enquanto as primeiras têm a culpa por pressuposto e por limite, as segundas têm por base
a perigosidade ( individual) do delinquente . Logo neste sentido o nosso sistema é pois um sistema
dualista.

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A indispensabilidade das medidas de segurança faz-se desde logo e principalmente sentir
a um primeiro nível, ao nível do tratamento jurídico a dispensar aos chamados agentes
inimputáveis.
Um segundo nível ao qual se faz sentir a indispensabilidade da medida de segurança é o
seguinte: mesmo que o facto ilícito-típico tenha sido praticado por um imputável ( logo: capaz de
culpa), bem pode suceder que os princípios que presidem à culpa e, por via desta, ao limite
máximo de medida da pena se revelem insuficientes para ocorrer a uma especial perigosidade
resultante das particulares circunstâncias do facto e (ou) da personalidade do agente.
A existência desta segunda fonte de necessidade da medida de segurança no sistema
jurídico-penal arrasta consigo aquela que continua ainda hoje a ser a questão mais complexa: a de
saber se, de acordo com a regra do Estado de Direito, o sistema jurídico-penal sancionatório deve
assumir, relativamente a agentes imputáveis, natureza monista ou antes dualista. Uma correcta
dilucidação desta questão supõe que se ganhe previamente clareza sobre as finalidades e a
legitimação que à medida de segurança pertencem.

➢ FINALIDADES E LEGITIMAÇÃO DA MEDIDA DE SEGURANÇA

O PROBLEMA DAS FINALIDADES

● Finalidade prevalente : a prevenção especial

De acordo com a razão histórica e político-cultural do seu aparecimento as medidas de


segurança visam a finalidade genérica de prevenção do perigo de cometimento, no futuro de factos
ilícito-típicos pelo agente. Elas são por isso orientadas, ao menos prevalentemente, por uma
finalidade de prevenção especial ou individual da repetição da prática de factos ilícito-típicos.
A finalidade de prevenção especial ganha assim, também neste enquadramento, uma
dupla função: por um lado, uma função de segurança, por outro lado, uma função de
socialização. Mas já é questão complexa e discutida saber qual destas duas funções deve assumir
a primazia.
Exacto é que o propósito socializador deve, sempre que possível, prevalecer sobre a
finalidade de segurança, como é imposto pelos princípios da sociedade e da humanidade que
dominam a constituição político-criminal do Estado de Direito contemporâneo; e
consequentemente que a segurança só pode constituir finalidade autónoma da medida de
segurança se e onde a socialização não se afigure possível. Até porque através da segurança como
tal não se torna possível lograr a socialização – enquanto esta, quando tenha lugar no quadro de

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uma medida privativa de liberdade, arrasta consigo um elemento de segurança pelo tempo do
internamento respetivo.
Também as medidas de segurança, porém, como as penas, a primazia concedida à função
socializadora sobre a de segurança não deve induzir a pensar que é aquela função como tal que
justifica, por si mesma, a aplicação de uma medida. O que justifica é sempre e só a necessidade
de prevenção da prática futura de factos ilícito-típicos. A partir daqui logo se torna indispensável
a verificação da perigosidade do agente: a tentativa de operar uma socialização reputada
necessária e possível encontra-se, ainda e sempre, na dependência da prática, pelo agente, de um
facto qualificado pela lei como um ilícito-típico.
Fundamento de aplicação de qualquer medida de segurança criminal é aquela
perigosidade apenas se e quando revelada através da prática pelo agente de um facto ilícito-
típico; facto que, deste modo, vem a assumir valor constitutivo da aplicação da medida de
segurança e a conformar, ao lado da perigosidade, um dos dois fundamentos da sua aplicação.

● Finalidade secundária: a prevenção geral

A exigência da prática pelo agente de um facto ilícito-típico como pressuposto da


aplicação de uma medida de segurança, vem, deste modo, suscitar uma outra questão importante:
o papel que a finalidade de prevenção geral deve jogar aqui. A resposta largamente dominante é
a de que tal finalidade não possui qualquer autonomia no âmbito da medida de segurança: ela
só pode ser conseguida de uma forma reflexa e dependente, na medida em que a privação ou
restrição de direitos em que a aplicação e execução da medida de segurança se traduz possa servir
para afastar a generalidade das pessoas da prática de factos ilícito-típicos.
Parece incontestável que, relativamente a certas medidas de segurança, o legislador terá
tido de forma autónoma em vista, ao criá-las, também o seu efeito de prevenção geral, mesmo
sob a forma da (admissível) prevenção geral negativa. Como sublinha Roxin, uma medida de
segurança como a de cassação da licença de condução de veículo motorizado atua sobre a
generalidade de uma forma mais intimidante do eu a pena cabida ao delito de tráfego.
O juízo sobre a perigosidade é autonomo e o mais importante e difícil a formar em matéria de
aplicação das medidas de segurança.
Se a aplicação da medida de segurança se liga não apenas à perigosidade, mas sempre
também à prática de um facto ilícito-típico, então isso só pode acontecer porque ela participa
ainda da função de protecção de bens jurídicos e de consequente tutela das expectativas
comunitárias.
A conclusão não pode pois deixar de ser a de que também no âmbito das medidas de
segurança (embora não de forma prevalente, como sucede no âmbito das penas, antes meramente

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secundária) a finalidade de prevenção geral positiva cumpre a sua função e, na verdade, uma
função autónoma , se bem que no momento da aplicação se exija incondicionalmente a sua
associação à perigosidade. Com o que, de resto, ganharão nova luz exigências como as da prática
de um ilícito-típico grave e de proporcionalidade enquanto pressupostos de aplicação da medida
de segurança.

● O problema da legitimação

A legitimação decorre da sua aludida finalidade global de defesa social: de prevenção de


ilícito-típicos futuros pelo agente perigoso que cometeu já um ilícito-típico grave.
Concretamente: que uma medida de segurança só possa ser aplicada para defesa de um
interesse comunitário preponderante e em medida que se não revele desproporcional à
gravidade do ilícito-típico cometido e à perigosidade do agente.
O princípio da defesa social assume, por conseguinte, a sua função legitimadora não
quando considerado na sua veste puramente fáctica, naturalística e pragmática, antes sim quando
conjugado com o princípio da ponderação de bens conflituantes.
Fica com isto afastada uma concepção segundo a qual para legitimação da medida de
segurança criminal necessário se tornaria considerá-la dentro da categoria das medidas
puramente administrativas.
Importa então “eticizar” o fundamento da medida de segurança: o de que só estão
legitimados para participar livremente na vida externo-social aqueles que possuem liberdade e
autonomia interno-pessoal e podem por isso ser influenciados pelas normas. Dito de outra forma:
toda a liberdade externo-social se legitima só, em último termo, perante a posse da liberdade
moral interior, a qual não pertence nem aos doentes mentais, nem tão pouco àqueles que, em
virtude de más inclinações, herdadas ou adquiridas, se não encontram em condições de uma livre
decisão a favor da norma.

Esta conceção – à qual se pode imputar uma certa semelhança com a criticada defesa de
Jakobs de um direito penal do inimigo é inaceitável. Porque as suas consequências seriam
terríveis para quem, como os inimputáveis e os criminosos empedernidos ou habituais, são
plenamente pessoas. Uma conceção tal levaria no extremo, a furtar a liberdade externo-social às
pessoas não em nome dos factos ilícito-tipicos que houvessem cometidos, não em face do perigo
que revelassem da sua repetição e da consequente necessidade comunitária de deles se defender;
mas pura e simplesmente em nome da doença que ao atingi.

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O RELACIONAMENTO DA PENA COM A MEDIDA DE SEGURANÇA : A QUESTÃO
DO “MONISMO DO MANDATO” OU “DUALISMO” DO SISTEMA

● Medida de segurança e pena

A conclusão a retirar de quanto fica exposto é a de que, em matéria de finalidades das


reacções criminais, não existem diferenças fundamentais entre penas e medidas de segurança.
Diferente é apenas a forma de relacionamento entre as finalidades de prevenção geral e
especial. Na pena, a finalidade de prevenção geral positiva assume o primeiro e indisputável
lugar, enquanto finalidades de prevenção especial de qualquer espécie actuam só no interior da
moldura de prevenção constituída dentro do limite da culpa. Na medida de segurança,
diferentemente, as finalidades de prevenção especial ( de socialização e de segurança)
assumem lugar dominante, não ficando todavia excluídas considerações de prevenção geral de
integração sob a forma que, a muitos títulos, se aproxima das ( ou mesmo se identifica com as )
exigências mínimas de tutela do ordenamento jurídico.
Não é pois no quadro das finalidades, mas fora dele e exactamente, como se exprime
Roxin , na sua mútua delimitação que se suscita a diferença essencial entre as penas e as medidas
de segurança: na circunstância de ser pressuposto irrenunciável da aplicação de qualquer pena a
rigorosa observância do princípio da culpa, princípio que não exerce papel de nenhuma espécie
no âmbito das medidas de segurança; e, de , consequentemente, a medida de segurança ser
determinada, na sua gravidade e na sua duração, não pela medida da culpa , mas pela existência
da perigosidade, todavia estritamente limitada por um princípio de proporcionalidade. Daqui
resultaria, ainda segundo Roxin, uma certa aproximação ao sistema monista das sanções
criminais; no sentido de que as duas espécies de sanções todavia existentes, penas e medidas de
segurança, seriam estabelecidas, segundo as suas finalidades, num sentido único e só na sua
delimitação correriam vias distintas.

● O dualismo do sistema

Pode um sistema ser considerado como dualista tão-só porque conhece, no seu arsenal
sancionatório criminal, não somente penas, mas também medidas de segurança. Não é este,
porém, o entendimento que deve estar em causa quando se afronta a questão monismo versus
dualismo do sistema. Se este conhece a existência de medidas de segurança, mas as aplica apenas
a inimputáveis, bem pode afirmar-se que nem por isso o sistema perde a sua característica
monista, para assumir cariz dualista.
A verdadeira alternativa monismo/dualismo só surge quando se pergunta se os sistema é
um tal que permite a aplicação cumulativa ao mesmo agente, pelo mesmo facto, de uma pena

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e de uma medida de segurança. Neste sentido se pode falar, para além de “sistema dualista”, de
sistema de dupla via ou de duplo binário. É aqui e só aqui que surge o problematismo específico
da alternativa e esta se torna incontornável: saber se ainda é possível, legítimo e conveniente
estender o conceito de culpa e a medida da pena até ao ponto em que a intervenção de uma medida
de segurança se torne dispensável. Se a questão receber uma resposta afirmativa, pode então
pensar-se na adopção de uM sistema monista, ao qual são imputadas claras vantagens do ponto
de vista da execução da sanção. Se, pelo contrário, a resposta for negativa, então a adopção de um
sistema dualista parece impor-se em definitivo.

CONCEITO MATERIAL DE CRIME


O pensamento jurídico tem procurado definir materialmente o crime, ou noutros termos,
o ilícito criminal, diferentemente da Criminologia, que aceita uma definição genérica
de crime que abrange a violação de regras morais, ou até, como é explícito em Becker,
acentua que nada define o crime como uma categoria específica de comportamentos
antes de alguém ser estigmatizado num processo de interação social como
delinquente.
A divergência teórica que mais se repercute é entre:
A) Aquela que define o objeto da infração criminal como violação de certos direitos
subjetivos (FEUERBACH) – trata-se da estrutura liberal-contratualista que
somente justifica a intervenção penal onde os direitos humanos básicos que o
contrato social visa assegurar foram violados. Dissolve a infração criminal na
proteção da liberdade individual.
B) Aquela que define o objeto da infração criminal como violação de determinados
bens jurídicos (BIRNBAUM) – a referência legitimadora do Direito penal é uma
estrutura estatal, a comunidade e os seus valores. Define a infração criminal
pela lesão objetiva de valores da comunidade. Segundo Birnbaum, o Direito
vincula-se a elementos objetivos, mas simultaneamente pré-positivos ou de direito
natural. Apesar de acentuar a objetividade, Birnbaum não deixa de procurar uma
fundamentação da proteção jurídica que merecem certos bens nos fins do Estado.
Quanto à definição de bem jurídico:
A) BINDING – reduz o bem jurídico aos valores ou condições de vida da
comunidade jurídica, tal como são definidos pelo legislador, numa perspetiva
de puro positivismo legalista.
B) VON LISZT – o bem jurídico é um interesse humano vital, expressão das
condições básicas da vida em comunidade. No seu entendimento, o bem
jurídico é um conceito legitimador do Direito penal (e do Direito em geral),
descomprometido com a norma legal. Para este, o conceito de bem jurídico tem
ainda, no entanto, um conteúdo individualista liberal.
C) A esta perspetiva de Von Liszt contrapor-se-á uma outra que, baseada também
numa delimitação objetivista do fundamento da infração criminal, a refere já a
bens ou valores supra-individuais. Na verdade, a consideração do bem jurídico

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pode permanecer no quadro de referência do modelo de Estado liberal, ou ser
transposta para uma conceção de Estado e de Direito supra-individualista ou
mesmo transpersonalista. Esta última conceção, representada pelo Estado
hegeliano e mais recentemente pelas ideologias totalitárias, considera que os
valores da personalidade e do indivíduo estão necessariamente ao serviço dos
valores coletivos. Os bens jurídicos são protegidos pelo interesse que representam
para a comunidade.

• Impacto do Funcionalismo Sistémico na Definição de Crime:


» O funcionalismo no pensamento penal partiu das conceções de LUHMANN sobre
a análise das sociedades humanas como sistemas sociais. A teoria dos sistemas diz que
a sociedade não é um fenómeno pura e simplesmente político; a sociedade é antes um
sistema social, isto é, a sociedade desempenha determinadas funções, cuja análise
permite caracterizá-la como um sistema.
Essas funções consistem na institucionalização da redução de complexidade, de
estabilização das expectativas: o conjunto das relações sociais organiza-se em diversos
níveis autónomos, de acordo com as respetivas funções, progressivamente diferenciadas,
como por exemplo as relações sexuais, as familiares, as ligadas à escola e à política.
Todos esses níveis (subsistemas) se interrelacionam, gerando grande complexidade nas
relações sociais.
Finalmente, a sociedade seria a última função social concebível, da qual resultaria que a
enorme complexidade da interrelação dos agentes sociais – proveniente de as condutas
humanas se processarem em diversos níveis – fosse reduzida, assegurando-se assim a
própria interação social.
Nas sociedades modernas, as formas de interajuda dos seus membros para a satisfação
das respetivas necessidades são substituídas pelo crédito financeiro, assegurado
juridicamente, através do qual novas espécies de combinações com riscos e vantagens
mais elevados são possíveis.
A função de auxílio social desvincula-se da interajuda familiar ou da vizinhança,
passando a existir um sistema diferenciado para cumprir essa função. Com uma tal
diferenciação de funções, tornam-se mais complexas as relações sociais e mais difícil a
previsão pelos agentes dos comportamentos dos outros agentes. É então necessário
reduzir esta complexidade, institucionalizando condutas que podem ser geralmente
aceites e assegurando juridicamente a sua prática. Com isto garante-se então a interação
social.
Assim, a partir de uma nova conceção de sociedade, chega-se a uma nova definição de
Direito – o Direito não é um “dever moral” ou um “imperativo político”, mas apenas
a institucionalização de expectativas de ação.
Em face disto, toda a conduta desviada em relação à norma surge como uma
frustração das expectativas de comportamento asseguradas juridicamente. Como
conduta associal, ela é uma consequência das decisões básicas variáveis do sistema social.

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


» Esta conceção da função do Direito conduz à função simbólica da pena e do Direito
Penal de JAKOBS – funcionalismo radical. O ponto de vista de que o Direito penal visa
proteger bens jurídicos é substituído pela função de estabilização contrafática das
expectativas geradas pela violação de uma norma incriminadora. A função do Direito
penal é manter padrões de ação que organizam as expectativas sociais sobre o
comportamento alheio, ou seja, o Direito penal não protege bens jurídicos, mas sim a
vigência da norma.

A aplicação da pena é vista como a oportunidade de controlar a interação social. Assim,


o funcionalismo, a versão de JAKOBS, destrói a legitimação do Direito penal num
conceito material de crime, porque refere os bens jurídicos aos fins definidos pelo
sistema e porque atribui ao Direito penal uma função ideal ou simbólica de controlo
social.
Em resumo: a visão funcionalista não anula absolutamente a função crítica interna ao
sistema do conceito material de crime, pela referência de toda a legitimidade da proteção
jurídico-penal aos fins sociais. E, na medida em que a definição destes fins não é produto
de uma arbitrária decisão normativa, mas surge apenas como efeito objetivo da ação dos
indivíduos, o funcionalismo como teoria não exclui a discussão sobre o objeto da infração
criminal, mas apenas reduz a fundamentação da validade a uma adequação das decisões
legislativas a uma ideia de funcionalidade sistémica, racionalizando através desse
parâmetro a avaliação crítica.

APONTAMENTOS DA AULA TEÓRICA (JAKOBS):


Modelo de Jakobs – costuma sempre ser citado, a sua ideia sobre o fim das penas e
costuma ser ciado como modelo de prevenção geral positiva. O que é que é a pena ? a
pena é uma resposta á infração de uma norma, e é uma resposta pela qual basicamente
estamos a dizer que a norma vigora e á custa do criminoso, isto quer dizer que, a pena
serve para estabilização contra-fáctica das expectativas da comunidade na vigência
da norma.
Dizer que a pena é um mal com que estamos a responder a outro mal, o crime – o
crime trouxe um mal para a sociedade e à vitima e realmente a pena á partida trás
sofrimento mas é muito redutor descrever a pena assim, é apenas o aspeto externo da
questão, o importante é o significado do que está a acontecer.
Importante é o que está a acontecer no plano do comunicativo/simbólico. Estão a
haver umas certas afirmações. As pessoas decidem atuar de uma maneira ou de outra,
tomam decisões sobre o modo como vão decidir sobre modo de expectativas e previsões
do que vai acontecer. Com base na previsão que fazem das consequências das previsões
que tomem, essas expectativas baseiam-se em regras, leia, padrões, como as leis da
natureza.

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Algumas das expectativas que temos face ao comportamento dos outros resultam de
normas jurídicas segundo o pressuposto de que esperamos que o outro irá respeitar
as normas. Mas as vezes as pessoas não cumprem com as normas, as expectativas em
reação ao que esperávamos das outras, serão frustradas. De modo que temos as outras
reações, quem falhou foi quem violou a norma, e a pena serve para dizer isso mesmo.
Quando alguém viola a norma, ou não faz aquilo que a norma dizia, é crime quando
tem por vista uma certa motivação. Quando a pessoa tinha condições de se motivar
pela norma, entendia o significado da norma mas não o fez, então o que está a dizer é que
“esta norma não vale”, a norma diz que não posso matar, mas mato na mesma.
Então para que serve a pena? (Segundo o modelo de Jakobs) Não é para proteger o
bem jurídico. A pena não vai ressuscitar ninguém, serve para dizer que a afirmação
tomada está errada, há uma estabilização contra o primeiro facto que vai estabilizar a
norma que havia sido questionada, é reafirmar a norma, para que os outros continuem
a esperar que os outros não vão matar.
Jakobs foi acentuando cada vez mais esta visão preocupando-se cada vez mais com o
plano comunicativo, por causa disso, os autores têm vindo a dizer que o seu modelo é
cada vez mais retributivo, a pena esgota a resposta á afirmação que foi feita por fim.
- A pessoa Fernanda palma diz que isto é inadmissível á luz da CRP – não é
compatível do 18/2 da CRP porque se desliga completamente da logica de bens
jurídicos, não há nenhuma relação de implicação das duas coisas. Jakobs afirma
mesmo que o Direito Penal não serve para proteger bens jurídicos. A prevenção
geral continua a ter problemas, em primeiro lugar, de garantir a confiança das
pessoas na vigência da norma, quando nos preocupamos com isto estamos a
criar um novo valor que também não é um bem jurídico, não é a segurança
das pessoas é somente um sentimento de segurança, estes efeitos psicológicos
não são os bens jurídicos que afirmam o direito penal. Mesmo que fossem não
cabe ao juiz preocupar-se com eles, o juiz não foi eleito, ele não esta em posição
de ser representante da comunidade não tem de estar a considerar se a comunidade
fica satisfeita ou não. Esta preocupação tende para um agravamento das penas
desligado de sentimentos de culpa. Á luz destas criticas, será que pode ter alguma
relevância ao fim das penas? Terá sim, mas no momento da legislação, terá em
conta o legislador, mas não o juiz.

➢ PRIMEIRA ETAPA NAS CONCLUSÕES SOBRE O SENTIDO, A


FUNÇÃO E A LEGITIMAÇÃO DO DIREITO PENAL: A DISCUSSÃO
SOBRE O CONCEITO E FUNÇÃO DO BEM JURIDICO
A abertura da ciência jurídico-penal a uma perspetiva especifica de legitimação foi
pelo conceito de bem jurídico. Stratenwerth refere os topoi da necessidade de proteção
do bem jurídico, do relevo ético prévio das condutas incriminadas, da não contradição
axiológica com outras soluções do sistema, do amplo consenso sobre a dignidade punitiva
e da ineficácia de outros meios para a proteção do bem jurídico.

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A discussão sobre a necessidade de proteção do bem jurídico surge a propósito da
incriminação de condutas meramente contrárias à Moral, segundo as representações
sociais dominantes.
A homossexualidade, por exemplo, não atinge qualquer bem indispensável à
preservação da sociedade, na medida em que seja praticada em privado e por
adultos. As condições fundamentais de organização da sociedade não são afetadas por
aqueles comportamentos se eles não interferirem no desenvolvimento e na maturação
sexual e o acesso às condições de livre escolha da expressão da sexualidade.
Como sustenta ROXIN, a proteção de normas éticas só se justificaria, no Estado
de Direito, para evitar efeitos danosos para a sociedade. No entanto é de notar que
esta argumentação de cariz liberal é necessariamente reformulada com a perspetiva de
que a CRP protege a livre orientação sexual (artigo 13º). Assim a questão da ausência de
bem jurídico não tende a ser o topos fundamental da ilegitimidade de certas incriminações
oriundas da moralidade sexual tradicional, mas sim a perspetiva de novos direitos
protegidos constitucionalmente.
» Há outras condutas que, embora possam afetar bens jurídicos (necessários
à preservação da sociedade), não carecem de cominação penal, uma vez que tais bens
são protegidos eficazmente (ou mais eficazmente) de outra forma. Será o caso, por
exemplo, do consumo de droga, incriminado pelo DL 15/93 de 22 de janeiro, e
descriminalizado posteriormente, se for entendido que esse consumo gera perigo para
bens alheios, mas se se concluir que existem outros meios mais eficazes para proteger a
sociedade, como veio a ser espelhado na Lei 30/2001 de 29 de novembro.
Outro exemplo pertinente é o da pornografia. A questão fundamental não é saber se as
atividades pornografias violam diretamente bens jurídicos, pois será sempre discutível
que tais bens existiam substancialmente, mas sim indagar se elas favorecen a
criminalidade contra a liberdade sexual.

Ultrapassando o crivo da necessidade de lesão do bem jurídico, a exigência de


relevo ético prévio bastante das condutas impedirá que condutas tidas como eticamente
neutras e normalmente aceites de acoro com hábitos sociais, como fumar, sejam
incriminadas, se não existir conexão com um prejuízo mais amplo com repercussões
difíceis de controlar de ordem pública, como acontecerá nos casos em que se fuma num
avião.
E ainda a necessidade de amplo consenso deverá obstar a que o DP se torne uma arma
politica da maioria e ignore as perspetivas da população, incriminando por exemplo, sem
exceções de espécie, o aborto, ou inversamente, liberalizando-o em absoluto.
Igualmente, a contradição axiológica entre a incriminação de certas condutas e outras
soluções do sistema jurídico revelar-se-á, por exemplo, na incriminação de condutas
contra a preservação das espécies animais confrontada com a eventual irrelevância penal
das condutas manipuladoras ou destrutivas da vida humana em formação numa fase pré
ou extra-uterina.

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O conceito de bem jurídico tem vários significados para a delimitação do conceito
material de crime e para a função e legitimação do DP. São em suma os seguintes:
a) A ideia de bem jurídico tem expressamente uma relação do objeto de projeção da
norma com um interesse individual ou com um interesse coletivo assumido pelo
Estado de Direito como condição essencial de incriminação;
b) A ideia de bem jurídico sugere uma necessidade intersubjetiva que carece de ser
protegida.
c) A ideia de bem jurídico convoca a ideia de lesão e de dano objetivo ou
objetivamente representado e não uma função meramente simbólica de um
interesse protegido pelas normas
d) A ideia de bem jurídico apela a uma lógica de eficácia direta na proteção e
prevenção e não se basta com efeito reflexo e antecipado das normas
incriminadoras relativamente a potenciais lesão.
e) A ideia de bem jurídico questiona normas incriminadoras que apenas preveem
violações de deveres de comportamento sem uma real conexão empírica com
eventuais danos.
Bem jurídico corresponde, assim, a um interesse essencial inter-individual, protegido com
alguma substancialidade, que corresponde a uma necessidade e que é suporte de valores
essenciais.
Bem jurídico é apresentado, não como produto de uma norma, mas sim como algo que
tem valor na vida social, correspondendo a interesses e necessidades, e que é relevante
pré-juridicamente, ou seja, apenas é reconhecido pelo Direito.
Tem que ter um peso que se impõe ao Direito, mas não quer dizer que não sejam produtos
da interação social e que sejam realidades meramente interativas.

➢ SEGUNDA ETAPA CONCLUSIVA: O PAPEL DOS PRICIPIOS NO


DIREITO PENAL NA LEGITIMAÇÃO DAS NORMAS
INCRIMINADORAS
o Principio da legalidade
Princípio de aplicabilidade direta.
A racionalidade das normas que constituem o DP e o modo da sua aplicação estão de tal
forma condicionados por este princípio que bem se poderá dizer que ele é a proposição
jurídica fundamental do sistema penal.
Segundo este principio, os tribunais estão vinculados a não aplicar sanções penais sem lei
anterior que as preveja e a não aplicar as sanções penais previstas sem que se realizem
determinados pressupostos, igualmente previstos na lei: a perpetração de uma
determinada conduta considerada crime ou, no caso das medidas de segurança, reveladora
de perigosidade criminal.
Esta subordinação do tribunal à lei significa que a solução do caso concreto está
totalmente vinculada a um modelo legal, isto é, a uma articulação já feita pelo legislador
entre um determinado caso, semelhante ao verificado em concreto e uma solução para ele

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prevista. Assim o principio da legalidade não é somente uma exigência de utilização de
padrões legais para a qualificação de um facto como merecedor de sanção e para a
aplicação de sanção mas também a exigência de vinculação total do ato de aplicação de
uma sanção no caso concreto a uma decisão já tomada, com um certo grau de
concretização.
A proibição da analogia, corolário lógico do principio da legalidade, deve ser
compreendida num sentido mais profundo do que a proibição da utilização de raciocínios
analógicos contra reo na operação de decidir. Deve ser entendida como a proibição de
que se faça uma “assimilação” do caso concreto pelo da lei, em que determinados
argumentos sejam possíveis. Por exemplo, não se poderia punir como violação qualquer
comportamento sexual como violação qualquer comportamento sexual violento praticado
contra uma pessoa porque a identificação estrita de um certo tipo de comportamento o
impede.
O princípio da legalidade pode criar, deste modo, duas situações extremas:
(a) A da fixação rígida às palavras da lei, como sucedia no crime de burla em
situações em que a vítima era levada à prestação de um serviço e não
necessariamente à entrega de dinheiro, no antigo CP;
(b) A da libertação do condicionamento das palavras e a conclusão de que cabem, na
expressão vaga e simbólica da leii, situações em que não existe verdadeira
igualdade material, como aconteceria se se entendesse que é suscetível de revelar
a especial censurabilidade ou preversidade do homicídio (art. 132º/2 CP) a
motivação por ódio familiar, analogamente à motivação por ódio racioal,
religioso,político, sem compreensão de qual o tipo de ilícito.
A conclusão relevante para a legitimação das normas incriminadoras consiste em que a
função de controlo pressupõe sobretudo que a aplicação da lei resulte de um processo
lógico “identificável”, dirigido à descoberta do sentido da lei, isto é, à delimitação dos
valores positivos e negativos que explicam a incriminação de um determinado
comportamento. Trata-se, de acordo com o art. 29º/1 CRP, da punição de ações ou
omissões com identidade reconhecível pelo intérprete e em geral pelos destinatários da
norma incriminadora.

o Principio da culpa
Esta aflorado na CRP, não está mesmo consagrado, artigo 13º, 24º, 1º da CRP, mas em
caso algum se fala de estar expressamente consagrado.
O principio da culpa não é objeto de uma formulação legal tão nítida como o da
legalidade. Ao nível da Constituição, ele é deduzido da essencial dignidade da pessoa
humana e do direito à liberdade (artigos 1º e 27º). No CP, só é expressamente indicado
como fator de determinação na medida da pena (artigos 40º/2, 71º e 72º) mas a doutrina
tem-no usado como fundamento de outras consequências mais profundas.
Atualmente, o principio da culpa costuma assumir um tríplice significado:
a) Como fundamento da pena

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b) Como fator da determinação da medida da pena
c) Como principio da responsabilidade subjetiva

Um direito penal não é legitimo porque as suas normas realizam os objetivos da sociedade
representada pelo Estado, mas porque os seus comandos e proibições, assim como o
processo que conduz à sua aplicação, realizam ideias culturais de justiça que enformam
as expectativas dominantes na sociedade. A afirmação de que o principio da culpa só pode
ser fundamento da pena no pressuposto da realização de um principio de justiça implica,
a questão óbvia da relação do principio da culpa com a ideia de justiça.
A resposta parece orientar-se em duas direções: a mera censurabilidade ético-pessoal não
torna a pessoa instrumento da sociedade ou do poder (dignidade da pessoa humana) e só
a censurabilidade ético-pessoal permite a discussão do acusado com o poder
O principio da culpa é dominantemente aceite como critério de determinação da medida
da pena. Não é o rigor quantitativo do que seja mais ou menos em matéria de culpa que
justifica a possibilidade da sua utilização como medida, mas a maior possibilidade de
chegar a comparações entre comportamentos e agentes através da referência à ideia de
culpa do que através de outros critérios, como os que são próprios da prevenção geral.

o Principio da necessidade da pena


Este principio traduziu a ideia de que a utilização pelo Estado de meios penais deve ser
limitada, ou mesmo excecional, se só justificando pela proteção de direitos fundamentais.
Tratou-se de uma reação contra a utilização discricionária das penas pelo poder politico,
ao serviço de quaisquer fins.
Então, este princípio diz-nos que a incriminação será legítima quando:
1. Esteja em causa um bem jurídico-penal;
2. Esse bem careça de tutela penal;
3. A conduta tenha dignidade punitiva – coloca-se numa dupla dimensão:
Negativa – a incriminação não pode ser, ela própria, um modo de coartar um direito
fundamental, através de uma previsão que atinja os limites imanentes desse direito.
Positiva – a incriminação tem de se dirigir à proteção de bens jurídicos essenciais,
respeitantes às condições de liberdade da pessoa e de funcionamento do Estado de direito
democrático, que legitimam o exercício do poder punitivo do Estado. Tem de haver uma
ressonância ética penal negativa.
Na discussão sobre a legitimidade da incriminação, o apelo ao principio da necessidade
surge na discussão sobre a carência de proteção penal do bem jurídico, sobre a falta de
alternativas à penalização. A primeira será contrariada quando se tratar de um mero valor
moral sem expressão num bem jurídico determinado, como a vida, a integridade física, a
liberdade, honra ou património (ex: relações homossexuais entre adultos); a segunda não
se afirmará quando os meios penais não forem absolutamente indispensáveis, existindo

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outros meios sociais capazes de evitar determinados comportamentos (planeamento
familiar em vez de perseguição penal do aborto ou a educação sexual e vez da perseguição
da pornografia); finalmente, a eficácia concreta da incriminação não se verificará quando
o DP não evita a prática de certas condutas e chega a ter um papel criminógeno (as
condutas criminosas associadas ao aborto clandestino).

A dignidade punitiva requer sempre uma demonstração empírica, a partir do


funcionamento da sociedade, da necessidade da incriminação para resolver um problema
de desproteção de direitos ou bens essenciais.
4. A medida seja adequada e proporcional ao fim que visa obter e à proteção dos
bens jurídicos que a justificam – é necessária, pelo menos uma probabilidade de
elevada de que se produza o efeito de proteção do bem jurídico e não deve haver
efeitos colaterais que neutralizem ou contrariem as vantagens da incriminação.
5. Não haja outra alternativa para assegurar esse bem – numa vertente de
necessidade, implica que não haja outros meios disponíveis menos gravosos do
que as penas públicas para assegurar a proteção do bem jurídico. A medida
alternativa até pode ser menos eficaz, mas restringir menos os direitos
fundamentais. Tem sempre de haver uma ponderação.

APONTAMENTOS DA AULA TEORICA: resulta do artigo 18º/2 segundo consenso


doutrinário. A ideia do 18º/2 so pode haver restrição de liberdade para garantir conceitos
sociais reconhecidos e bem dos outros. Tem uma origem histórica na ideia iluminista que
so são legitimas as penas necessárias, num momento onde as penas eram cruéis. Só a pena
necessária é que é legitima, uma pena pode ser necessária porque a sociedade não cria
condições politicas alternativas, como diminuir a pratica de abortos com maiores
condições á família, se não temos maneira nenhuma pois não há politicas ou condições
económicas para as desenvolver temos requesito para intervenção do direito penal
(vertente utilitarista de Beccaria). Há uma visão da necessidade da pena que não concebe
esta perspetiva nosmativa da necessidade da pena mas uma mais virada para teorias de
eficácia, o DP vem sendo o direito sancionatório para todos os outros ramos de direito.

o Principio da igualdade penal


A igualdade consagrada no artigo 13º CRP, orienta as soluções do sistema penal. É a
igualdade que subjaz à ideia de proporcionalidade entre a gravidade do ilícito e da pena
e é a igualdade que sustenta a mediação da pena pela culpa.
A proporcionalidade implica que os factos de menor danosidade social sejam
sancionados, necessariamente, com penas mais leves. Não se deverá extrais qualquer
exigência automática da parificação das penas, onde os princípios da culpa ou da
necessidade da pena recomendarem que certo facto seja punido menos gravemente apesar
de a sua danosidade ser idêntica à de outros mais severamente punidos. Assim, a
proporcionalidade justifica que um pequeno furto não possa nunca corresponder a pena
mais elevada do furto qualificado (artigo 204/1/a e nº2 a) e b) CP: se a coisa for de

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insignificante valor, não haverá lugar á qualificação. Mas já não se exige
automaticamente que a pena do aborto (artigo 140º CP)seja superior à do furto
qualificado. A proporcionalidade não é expressão da lei mas sim da garantia
constitucional de quem ninguém pode ser punido mais severamente do que outrem por
um facto menos grave.
A proporcionalidade é um principio formal, cujo conteúdo é preenchido pelos outros
princípios constitucionais de DP como a culpa e a necessidade da pena.
Assim, idêntica necessidade de punir e idêntica culpa justificarão idênticas penas – ou
pelo menos o direito a que não se seja mais gravemente punido.
A diferenciação entre as penas dos crimes contra as pessoas e dos crimes contra outros
bens jurídicos é também uma manifestação do principio da proporcionalidade na medida
em que a máxima danosidade social se articula com a máxima gravidade ética – a lesão
dos bens da pessoa do outro.
O principio da igualdade tem relevância na delimitação negativa das incriminações e
legitima em certos casos o conteúdo de normas incriminadoras e legitima em certos casos
o conteúdo de nomas incriminadoras mas não prevalece sobre o principio da necessidade
da pena.

• Principio da Humanidade
Expressão da ideia de responsabilidade social pela delinquência e disposição de
rejeitar e recuperar a pessoa do delinquente. Este princípio justificaria a rejeição de
sanções atentatórias do respeito pela pessoa humana como a pena de morte, a prisão
perpétua, a tortura e as penas cruéis e degradantes – arts. 24º/2, 25º/2 e 30º/1, 4 e 5
CRP.

• Principio da Socialidade
Explica que a lógica impiedosa e vertical do sistema punitivo ceda a soluções que a
flexibilizam por causa da noção de uma supremacia social de certos interesses
individuais, aos quais outros interesses se deveriam sacrificar.
Justificará então, por exemplo, causas de exclusão da ilicitude, como o direito de
necessidade (art. 34º CP) e uma orientação geral sobre as penas que inclua a
solidariedade social com a vítima e com o criminoso, reinserindo-o socialmente.

Fazendo um “apanhado geral”, conclui-se que a incriminação tem de ser


indispensável para promover a defesa de bens jurídicos essenciais (princípio da
necessidade), a conduta incriminada deve possuir ressonância ética negativa
(princípio da culpa) e a criminalização, sempre resultante de lei formal, deve reunir o
consenso da comunidade (princípio da legalidade).

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• Argumento criminológico
Duas perspetivas podem ser consideradas na utilização do argumento criminológico:
a) A confirmação empírica de conceções valorativas sobre a necessidade da pena e
a adequação da política criminal do Estado (argumento criminológico dependente
ou enfraquecido)
b) A interferência efetiva das ciências empíricas do crime e do comportamento
humano na compreensão e configuração jurídica do crime (argumento
criminológico em sentido restrito).
Focando neste último, e considerando o labelling approach ou, em geral, as abordagens
da Criminologia que se inserem na Escola de Chicago, em que o ponto de partida é a
definição interacionista da realidade, o argumento criminológico poderá levar a concluir
que certas configurações legais das condutas criminosas podem ser criminógenas ou
introduzirem distorções no sistema abstrato e geral de valores adequado a uma integração
social de certas pessoas ou grupos de pessoas.
Concluindo, a argumentação criminológica inserida no discurso jurídico consistiria na
procura dos modos de realização empírica ilustradores dos valores penais, na procura da
explicação criminológica da realidade que o Direito utiliza como referência e na
adequação entre o plano lógico-valorativo e os processos de geração ou definição social
do crime.
Ou seja, o argumento criminológico procura introduzir esta componente empírica na
própria análise da decisão do legislador. Não é só um comando de validade material que
está em causa, é também atender aos estudos empíricos sobre os efeitos da pena, sobre os
efeitos da criminalização em abstrato, sobre todo o significado social que tem esta
intervenção.

➢ FUNDAMENTOS DA PUNIÇÃO NO SISTEMA PENAL PORTUGUÊS:


interpretação do artigo 40º CP
A norma mais exemplar da organização do sistema é o art. 40º CP que estabelece as
finalidades da punição. Este preceito foi introduzido na reforma penal de 1995 como
norma orientadora quanto às penas, numa fase em que se pretendeu ultrapassar as rotinas
judiciais retributivas.
Tal preceito prosseguia o desígnio de estabelecer que o fundamento da punição seria a
prevenção geral na dimensão de proteção de bens jurídicos (coadjuvada pela prevenção
especial) e que a culpa-retribuição apenas conteria uma função restritiva, como resulta do
art. 40º/2.
Da leitura do art. 40º sobressai uma interpretação que parece apontar para que nunca
haverá lugar ao afastamento da pena perante a persistência das exigências mínimas de
prevenção geral, mesmo que as exigências de culpa apontassem para um limite inferior,
fixando abaixo dos mínimos de prevenção a culpabilidade do agente.

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


Assim, o se da pena dependerá sempre e exclusivamente da prevenção geral positiva e a
culpabilidade do agente apenas controlará a medida da pena, como expressão das
conceções éticas dominantes sobre a censurabilidade dos comportamentos.
A Prof. FERNANDA PALMA defende, contudo, que esta leitura tem dificuldades
sistemáticas:
- O próprio CP estabelece que a culpa do agente é critério fundamental da medida
da pena, que justifica a sua variação entre o máximo e o mínimo (art. 70º), o que
coloca logo a objeção de o critério da medida judicial da pena poder ser de
natureza diversa do fundamento legal da punição.
- Poderá ainda questionar-se como que é que a culpabilidade do agente, que é um
elemento do conceito de crime e um pressuposto essencial de toda a atribuição de
responsabilidade (nullum crimen sine culpa), bem patente na teoria geral do crime
e expressa nos arts. 17º, 3º/, 35º e 37º CP, pode ser reduzida a um critério restritivo,
acessório, de uma responsabilidade baseada na prevenção geral positiva
coadjuvada pela prevenção especial.
Ora, a tese do caráter restritivo de culpabilidade no fundamento da punição tem
debilidades. O princípio da culpa é, com efeito, expressão de uma consideração plena da
igualdade dignidade da pessoa bem como da igual consideração dos interesses de todos e
da justa oportunidade de cada pessoa de orientar o seu comportamento pelas normas
penais, deduzidas dos arts. 1º, 13º e 27º CRP.

Esta dimensão nada tem a ver com a ideia de retribuição, mas sim com a ideia de uma
relação punitiva justa a partir de comportamentos que só são verdadeiramente dignos de
tutela penal porque os seus autores tiveram as devidas condições para se reconhecerem
como responsáveis, tendo assim cabimento um juízo de censura pessoal pela prática de
tais comportamentos.
A exigibilidade ética de certos comportamentos não é algo posterior às decisões
legislativas de incriminação, mas a própria consideração da atribuilidade de uma censura
penal é condição de legitimidade constitucional da incriminação de certos
comportamentos, ou da sua negação, num plano abstrato-normativo.
Os reflexos desta análise do art. 40º implicam que sejam contraponíveis diferentes
modelos de relação entre o nº 1 e o nº 2 deste artigo, ou de relação entre a prevenção geral
positiva, a prevenção especial e a função da culpabilidade do agente na fundamentação
judicial da punição:
- No primeiro modelo, a culpabilidade não tem papel determinante na decisão sobre
o se da pena, apenas opera a posteriori na determinação da medida judicial
concreta e apenas para evitar que se ultrapasse um certo ponto-limite ainda
justificável preventivamente ou, quando muito, uma certa moldura entre um
máximo e um mínimo baseada em critérios de culpabilidade média, para evitar
excessos preventivos. Neste modelo, a culpabilidade é um princípio restritivo,
funcionando no quadro da prevenção.

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- No segundo modelo, a culpabilidade opera desde logo, à partida, condicionando
os critérios de necessidade, não a partir de uma ideia retributiva, mas a partir da
consideração do merecimento da conduta do agente. A culpabilidade não restringe
a necessidade, mas apenas a reconfigura, estabelecendo um limite inultrapassável,
não podendo a pena concreta nem a decisão de punir superar esse limite. Isto
significa que a moldura penal é fixada em função desse limite. A prevenção geral
e a especial podem determinar uma pena, mas nunca superior a esse limite. E as
razões de prevenção geral positiva ou de prevenção especial não poderão justificar
a punição se a culpabilidade for excessivamente baixa ou exígua. Neste modelo,
a prevenção é um princípio restritivo, funcionando no quadro dos limites máximo
e mínimo da culpabilidade que o comportamento justifica. No entanto, a culpa
não é alheia à prevenção.

APONTAMENTOS DAS AULAS TEÓRICAS: o prof FD concebe o artigo 40º fez a


revisão do artigo – no modelo de FD “Se” da pena e o “Como” e em que medida se pune.
Há na medida legal da pena, não é o que estamos agora a falar. Está prevista entre um
mínimo e um máximo, uma medida abstrata. Podemos dizer que o legislador que a vê tem
em vista a Prevenção Legal, prevenção especial negativa e positiva, mas a ver de
Fernanda Palma tem que ver ainda a culpa média. O que esta em causa no artigo 40º nada
tem que ver com os critérios que o legislador usa para fixar a pena tem que ver com a
medida judicial da pena – é uma moldura que o juiz concebe face ao caso concreto.
Interessa perceber que na logica mais literal do art 40º a que se fala na medida judicial da
pena o que conta do mínimo e do máximo, o que conta aqui para intervenção de FD é a
prevenção geral positiva, conta as necessidades da sociedade e a culpabilidade concreta
do agente – surge como um principio restritivo. Esta interpretação tem uma grande
convicção na base de que nunca se pode baixar do limiar mínimo da prevenção especial
positiva, a culpa do agente pode ser muito fraca, de um contexto social muito
desfavorável, por exemplo: correios de droga as “drug mules”, que transportam a droga
no corpo, o tráfico é crime grave e há uma grande justificação de prevenção geral, aqui a
culpa do agente pois se o mesmo agiu para ajudar dificuldades familiares ou porque o
meio so oferece estas alternativas, então podemos concluir que a culpa seja diminuta, a
questão é que no modelo de FD há um miliar mínimo de prevenção especial positiva
abaixo do qual nunca se pode descer, logo, numa situação destas é difícil suspender a
pena p.e. na logica de FD que explicita nas consequência jurídicas do crime, há um limiar
mínimo abaixo do qual nunca se pode baixar. Ou há uma contradição em FD mas a
professora não aca que haja, o que há é uma ideia de culpa domesticada pela prevenção
geral positiva.
A posição de FP é interpretação diferente deste artigo, não ve que possa ser em caso
algum principio externo restritivo e moldado pela prevenção geral positiva, esta
impossivilidade de passar a medida da culpa, é ela que define a medida legal da pena mas
o legislador não exprimiu inteiramente esta ideia, o que é restritivo é a própria convenção
geral positiva. Significa que possa haver uma pena abaixo do nível judicial de culpa para
FP podemos descer abaixo do limiar de culpa, há um limiar mínimo necessário mas que
será abaixo da culpa, não pode é ser acima. Ela diz que melhor se explicaria melhor o

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


artigo dizendo que há um máximo e mínimo de culpa e uma restrição através da prevenção
geral e prevenção especial.
A logica da prevebçao geral positiva sobretudo, afirma não deixar impunes estescasos,
pois poe em causa a economia e direito de propriedade, etc, mas no caso, na logica de
FD, esta solução é compatível com a lógica na medida em que é difícil não punir naquela
siuçao por força da advertência social de que não se pode furtar supermercados e por ser
uma professora primária torna-se ainda mais socialmente criticável. (ex. de uma
professora que roubou bens de valor baixo num supermercado).
O limiar mínimo de FD não permite suspender a pena, dispensar, reduzir… pois temos
de dar uma imagem de não impunidade e de que o sistema funciona, essas outras razoes
que poderiam baixar ou reduzir a pena, aqui não funiona.
No modelo da FP, o “se”, ela tem de definir esse limiar mínimo que pode levar ate ao
afastamento da pena, mas o que faz à prevenção,, funciona como um principio restritivo.
Pode haver uma irrelevância tal do facto que do ponto de vista da prevenção geral (…)

A LEI PENAL E A SUA APLICAÇÃO


➢ O Principio da Legalidade da Intervenção Penal
Não é só uma ideia orientadora, mas é também uma norma positiva e um princípio geral
(na opinião de Castanheira Neves).
Principio da legalidade – principio basilar do direito penal. Surge como norma no
artigo 38º da CRP e no artigo 1º , e certa forma do 2º do CP. Não pode haver punição
sem lei prévia, não pode haver pena sem previsão expressamente formulada
anteriormente por lei. A primeira grande pressão condensadora do principio da legalidade
consiste nisto mesmo, não se referem estritamente à pena, falam na punição em geral. Se
o principio da legalidade se refere-se exclusivamente à pena os tribunais viam-se livre
para fazer a sua própria conexão entre o crime e a pena, não era a lei, isso podia ter alguns
problemas relativos à segurança jurídica, que por sua vez só é assegurada quando lei
anterior estabelece não só as penas, mas define também os crimes. Se o principio de
legalidade é uma expressão da segurança jurídica é necessário que tanto a pena
como o crime estejam articulados e expressos na lei – caso contrário seria o tribunal
que faria essa conexão entre crime e pena, o que se traduziria numa grande insegurança,
porque apesar de a lei estabelecesse uma lista de crimes e uma lista de crimes ainda
haveria insegurança porque o tribunal poderia escolher “a la carte” a articulação entre os
dois, nunca poderíamos saber qual seria o resultado dessa escolha. As duas coisas devem
estar estabelecidas na lei anterior. Por isso, teremos que acrescentar ao princípio da
legalidade, o principio da conexão, ou seja, não basta que o principio da legalidade cubra
só o crime ou só a pena, mas também a articulação entre os dois – não pode ser escolhida
pelo poder jurisdicional, nem poder politico, deve ser escolhido em sede de parlamento
democrático, para a haver segurança democrática neste aspeto, que apenas pode ser
garantido pelo principio de separação de poderes, que nos é trazida pela revolução
francesa e alguma expressão já na Magna Carta, uma ideia de balizar o poder executivo,
que inclui por sua vez, o os tribunais numa perspetiva de afastamento destes, no âmbito
da separação d e poderes para garantir esta justiça e vontade democrática

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Este princípio, na sua origem histórica, foi-se concebendo ao longo de séculos,
procurando-se controlar ou conter o poder punitivo detido pelo poder político, até se
chegar a uma fase em que se pôde considerar como decisivo que houvesse uma redução
das fontes de Direito penal (nomeadamente, do costume e da jurisprudência), para se
atribuir à lei o papel de fonte por excelência do Direito penal (art. 29º/1 CRP). Há,
contudo, determinados casos em que o costume internacional pode ser fonte de Direito
penal, justificados pela realidade histórica do séc. XX, em que a perversão do poder
político gerou uma legalidade permissiva da perpetração de factos lesivos de direitos
humanos fundamentais: crimes lesivos de valores universais, como o genocídio, apesar
de não serem legalmente reconhecidos por certos Estados, conduziram à responsabilidade
penal dos seus autores nos tribunais internacionais de Nuremberga e Tóquio – art. 29º/2
CRP.
Uma primeira máxima que decorre deste princípio é o princípio da legalidade –
(só é crime o que estiver previsto na lei, porque se o direito penal se traduz na restituição
de um direito fundamental, que é a liberdade, este só se pode restringir se o crime e a
sanção estiverem previstos na lei). – Quem pode criar crimes (legislar) é a A.R. é um
regime, no entanto, concorrencial (com o Governo) – art.º 165º, al. c) e d) da CRP.
Contudo, o recurso a estes costumes terá de ser feito com recurso aos limites
da lei interna: valerão, em primeiro lugar, os limites gerais das penas estabelecidas no
CP (arts. 40º e 46º); e as penas concretas serão determinadas necessariamente por
raciocínios de analogia com crimes identicamente graves previstos na lei, tendo-se
sempre presente a exigência da proporcionalidade entre o crime e a pena.
O princípio geral é então o de que só a lei pode ser fonte de Direito penal, estabelecendo-
se uma reserva relativa de competência da AR no art. 165º/1 c) CRP.
Este percurso, com o objetivo de retirar da esfera do poder político o poder de sentenciar
criminalmente, culminou na conclusão de que a aplicação das penas tem de estar
subordinada à lei.
Não basta, contudo, existir uma lei anterior a prever a pena, para se poder punir o
agente; é também necessário que a própria lei anterior articule uma certa pena com um
certo comportamento que é punido – art. 29º/1 e 3 CRP. Assim, a formulação correta
do princípio da legalidade é o que se refere tanto ao crime como à pena,
articuladamente.
O objetivo último deste princípio é o de prevenir a arbitrariedade do poder de
sentenciar criminalmente. Mas este princípio tem de ser ainda mais especificamente
justificado: o que está em causa, também, é uma necessidade de assegurar a separação de
poderes e a vontade da maioria democrática.
Quando a remissão feita pela norma sancionadora principal para a norma complementar tornar
o tipo de ilícito incaracterístico, dificultar o seu conhecimento pelos destinatários para além do
que é exigível a uma pessoa média ou implicar o recurso a critérios autónomos ou critérios novos
de ilicitude, a remissão e respectiva concretização violam o princípio da legalidade (neste
sentido, de exigência de lei penal expressa e certa).

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A validade das normas penais em branco terá de ser averiguada, em cada caso, em função do
grau de precisão que for possível atribuir aos respectivos pressupostos de punição.

A remissão para regras técnicas, pela norma incriminadora, de parte da concretização da


previsão legal referente aos pressupostos da punibilidade coloca, antes de mais, um problema
de constitucionalidade por confronto com o princípio da tipicidade penal, que se entende estar
consagrado no artigo 29º, n.º 1, da lei Fundamental.

O princípio da tipicidade implica que a lei especifique suficientemente os factos que constituem
o tipo legal de crime (ou que constituem os seus pressupostos) e que efectue a necessária
conexão entre o crime e o tipo de pena que lhe corresponde. A tipicidade impede, por
conseguinte, que o legislador utilize fórmulas vagas na descrição dos tipos legais de crime, ou
preveja penas indefinidas ou com uma moldura penal de tal modo ampla que torne
indeterminável a pena a aplicar em concreto. É um princípio que constitui, essencialmente, uma
garantia de certeza e de segurança na determinação das condutas humanas que relevam do
direito criminal

A interpretação das leis assume aqui um papel relevante. Não obstante a interpretação
não poder ser totalmente livre, os juizes não podem ser apenas as bocas que
pronunciam as palavras da lei, estes têm de ter uma fundamentação objetiva
baseada na lei.
O que se procura, então, com o princípio da legalidade, é a subordinação da sentença
criminal à lei, enquanto a lei é emanada dos representantes da vontade democrática.
Este princípio não abrange apenas as penas, mas também, e como resulta da CRP, as
medidas de segurança (mesmo a inimputáveis), em que o fundamento da sanção é
impedir a perigosidade ou o seu desenvolvimento. Temos aqui que o fundamento do
princípio da legalidade não se basta com a culpa, nem com uma conceção retributiva da
pena.
Para ser analisado em detalhe, este princípio pode ser estudado através de uma
sistematização, consubstanciada nas suas consequências/corolários:
- Scripta: Exigência de uma restrição das fontes do Direito penal – exclusão de
outras fontes que não sejam a lei em sentido formal, sendo que existe uma reserva
relativa de lei neste âmbito da AR - art. 165º/1 c) CRP. Esta exclusão das
restantes fontes acontece quanto às normas penais positivas (incriminadoras),
mas não quanto às normas penais negativas (desincriminadoras), uma vez que
nestas já não vigora a exigência estrita de subordinação ao princípio da
legalidade, porque não são normas que venham restringir a liberdade (ainda que
o Tribunal Constitucional tenha vindo a admitir a necessidade de reserva de lei
para as normas desincriminadoras também).
- Stricta: O princípio da legalidade visa também impedir que os tribunais possam
eles criar a lei e subverter a separação de poderes, ou seja, proíbe a analogia.

- Praevia: Proibição da retroatividade das normas penais (arts. 29º/1 e 3 CRP e


1º/3 CP).

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- Certa: Comando sobretudo dirigido ao legislador – ao formular as leis
incriminadoras, deve ser exaustivo na determinação dos comportamentos
tidos como crimes e na determinação das penas – princípio da tipicidade (art.
29º/1 e 3 CRP).

➢ Corolários:
o Reserva de Lei
Existe uma reserva de lei relativa da AR quanto às normas incriminadoras
(normais penais positivas) – art. 165º/1 c) CRP. Quanto às normas desincriminadoras
(normas penais negativas), o TC tem vindo a admitir que para estas também seja
necessária uma reserva de lei da AR; mesmo que não seja por via do art. 165º/1 c),
será por via da alínea b) do mesmo artigo, uma vez que o princípio da legalidade se
integra no elenco dos direitos, liberdades e garantias fundamentais.
O objetivo de tal imposição é assegurar a separação de poderes.
Coloca-se a questão de saber se as circunstâncias que agravam a responsabilidade
(ainda normas penais positivas) ou as circunstâncias eximentes ou atenuantes
(normas penais negativas) se incluirão na previsão constitucional do art. 165º/1
c) CRP:
- As circunstâncias agravantes definem o concreto facto criminoso, sendo
abrangidas pela previsão constitucional. Isto sucede nitidamente no caso das
circunstâncias modificativas (ex: art. 132º CP) – que podem alterar a
moldura penal, no sentido de permitir que o crime deixe de ser simples e
passe a ser qualificado. Mas também no caso das circunstâncias agravantes
simples (que não alteram a medida legal, mas somente a medida concreta da
culpa), o facto criminoso, de ilicitude ou culpa agravadas, é sempre diverso
daquele em que a ilicitude ou a culpa são menos graves. Assim, as razões
justificativas da reserva de lei favorecem a aplicação da alínea c) do art. 165º/1 a
todas as circunstâncias agravantes.
Contudo, verifica-se que as circunstâncias agravantes gerais (art. 71º CP), que
funcionam para agravar a pena, mas dentro da moldura legal, estão previstas de
forma não taxativa. Tal atipicidade parece ser incompatível com a reserva de lei, por
postular a criação jurisprudencial de novas circunstâncias. Porém, a previsão daquele
preceito apenas pode significar a valoração de um aspeto do ilícito ou da culpa
de um determinado crime que revele maior intensidade.
Assim, poderá um Tribunal, ou o próprio Governo, sem autorização legislativa, vir
erigir um determinado critério de agravação? A resposta é não: ou terá de haver uma
relação da circunstância com a capacidade de motivação pela norma, ou se a agravante
quiser apenas impedir o juiz de fazer considerações no caso concreto, aí já haverá
violação da reserva de lei.

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➢ Atenuantes e Eximentes
Uma lógica simplificadora diria que as circunstâncias eximentes – excluidoras
da responsabilidade – e as atenuantes da responsabilidade criminal não estão
submetidas à reserva de lei por não afetarem as expectativas de segurança e a
liberdade individual dos destinatários das normas penais. Deste modo, por
considerarem permitidos factos que de outra forma não o seriam, ou desculpáveis os
seus agentes, aquelas circunstâncias não exigiriam um controlo direto pelos
representantes da vontade democrática.
Contra este argumento poder-se-á dizer que as circunstâncias eximentes de
responsabilidade podem alterar a delimitação dos direitos dos cidadãos entre si.
Assim, no que respeita às causas de justificação do facto ou de exclusão da ilicitude,
a liberdade criada pela permissão de certas condutas diminuirá a liberdade de
todos os que se pretenderem opor às mesmas – ex: se passar a ser permitido lesar,
ao abrigo do direito de necessidade (art. 34º CP), interesses jurídicos de valor igual
aos que se salvaguardam, o titular dos interesses lesados deixará de poder reagir em
legítima defesa à agressão, dado que a agressão passará a ser considerada lícita.

Na opinião da Prof. FERNANDA PALMA, as eximentes não estão, em regra, e


quando decorram de um princípio geral da OJ, sujeitas a reserva de lei, uma vez que
estas não são restritivas da liberdade e de direitos; pelo contrário. Contudo, admite
exceções, dado que, sendo as eximentes uma autorização excecional de exclusão
da responsabilidade, permitindo certas condutas que em geral são proibidas,
abrem uma exceção, de modo que a sua previsão pode afetar as expectativas gerais
e diminuir a liberdade e a segurança dos cidadãos, e, nestes casos, poderão estar
sujeitas a reserva de lei.
Quanto às atenuantes a Prof. FERNANDA PALMA afirma que, ainda que não
considere que as atenuantes estejam sujeitas à reserva de lei (pois não são suscetíveis
de promover uma restrição indireta dos direitos das vítimas de crimes), pode, contudo,
haver colisão entre a determinação de um determinado fator como atenuante e
a CRP, nomeadamente com o princípio da culpa. Assim, as atenuantes não podem ter
uma total liberdade para a sua definição, mas apenas quando sejam um
desenvolvimento do princípio da culpa.
É verdade que o art. 72º/2 CP estabelece uma cláusula de atipicidade quanto às
circunstâncias atenuantes, mas temos de ter em conta que o julgador não pode criar
circunstâncias atenuantes que ponham em causa os princípios latentes do sistema
(Estado de Direito democrático, princípio da culpa, entre outros).

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➢ Normas penais em branco
A reserva de lei penal origina uma especial conformação da técnica legislativa e
da interpretação, de modo a permitir que as normas penais se apliquem estritamente
de acordo com a sua definição legislativa – princípio da determinação das normas
penais incriminadoras.
Segundo este princípio, todos os pressupostos da incriminação e da
responsabilidade têm de estar descritos na lei, não sendo admitidas as leis penais
em branco. Este conteúdo das normas penais implica que estas sejam descrições de
figuras ou tipos, isto é, determinações do conteúdo de certas imagens sociais
relativamente concretas de comportamentos humanos, que prefigurem com
exatidão o âmbito do proibido e a respetiva consequência (sanção).
O mesmo princípio justifica que nenhum comportamento humano possa ser
considerado criminoso se não corresponder a um tipo legal de crime, descrito
com precisão por um preceito legal. A tipicidade é exatamente essa exigência de
adequação do facto a um tipo legal de crime.
Contudo, a violação dos princípios da tipicidade e da determinação não se dá logo
que o utilizador utilize conceitos menos precisos ou que o intérprete exceda um
sentido puramente lógico-formal das palavras. Tal violação dá-se quando a
possibilidade de compreensão e controlo do desvalor expresso no tipo legal de
crime deixa de existir. Ou seja, a violação da reserva de lei começará onde a
linguagem normativa permitir a total manipulação do conceito para fins
incontroláveis e onde for impossível uma perceção da descrição legal pelos seus
destinatários coincidente com os resultados de uma interpretação teleológica.
Uma decorrência da reserva de lei é a proibição de normas penais em branco –
normas remissivas, que transferem a definição do conteúdo da sua previsão ou
da sua estatuição para uma fonte de Direito de caráter hierarquicamente inferior
ao da lei da AR, como acontecerá nos casos de leis penais que remetam para
regulamentos (ou leis do Governo sem autorização legislativa).
Atente-se, todavia, que estas normas só violarão a reserva de lei quando o
núcleo do comportamento proibido pela norma dependa totalmente da norma
para a qual se remete, não sendo previsível para os destinatários sem essa norma o
que deles se espera.
Nestes casos, não só há uma violação da reserva de lei, como há uma violação
do princípio da culpa, dado que não orienta suficientemente os destinatários das
normas quanto às condutas efetivamente proibidas – o agente precisa de conhecer a
proibição legal para aceder à consciência da ilicitude da sua conduta, sendo que
essa consciência constitui o primeiro pilar do juízo da culpa.
Isto não se confunde com os casos em que a remissão é puramente para um critério
técnico, não estando o objeto da norma remissiva (o interesse fundamental protegido)
dependente do conteúdo concreto deste critério o que se pretende é uma regulação
mais técnica. Exemplos destes casos:

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(a) Acórdão 427/95 do TC – é um caso em que há uma norma incriminadora que
prevê a proibição de inclusão de aditivos num produto alimentar (que desvirtuem
a qualidade do alimento) e que remete para uma portaria que fixa as substâncias
que, apesar de serem aditivos, não são proibidos. O TC entendeu que não havia
aqui violação da reserva de lei, uma vez que a proibição estava contida na
primeira norma, enquanto proibição de aditivos, e a segunda meramente
excluía certas substâncias do âmbito da proibição; ou seja, tinha uma
delimitação negativa e não extensiva. Respeitou-se assim uma reserva de certeza
e de previsibilidade na norma incriminadora: esta dava informação suficiente
sobre o que era o comportamento proibido; a Portaria apenas vinha acrescentar
informações técnicas sobre o que não seriam aditivos proibidos.
Num caso (acórdão n.º 427/95), considerou -se como critério decisivo, para a verificação da
conformidade constitucional da norma penal remissiva, o carácter inovador ou meramente
concretizador da norma complementar: se esta é uma norma de concretização técnica, não
é posta em causa a segurança jurídica dos destinatários; se é uma norma complementar
inovadora fica afectado o princípio da legalidade e da tipicidade penal.

(b) Acórdão 115/2008 – questionou-se a constitucionalidade do art. 277º CP, que


remete para normas regulamentares ou técnicas, ao configurar o comportamento
típico de violação de regras de construção de que resulte perigo para a vida,
integridade física ou propriedade de terceiros. Nesse caso, também o legislador
pretendeu assegurar um efeito de regulamentação, consistente em relacionar o
perigo produzido com a violação de leges artis da construção, na medida em que
estas correspondem às boas práticas de controlo de riscos. A proibição contida na
norma remissiva refere-se ao não respeito por estes critérios.
Em suma, podemos ter normas remissivas que não violam a reserva de lei (e
consequentemente o princípio da legalidade), mas apenas quando existe na regra
incriminadora um conteúdo do ilícito suficientemente explícito, que apenas
remete para regras técnicas que apenas orientam o Tribunal na definição do
direito no caso.

Relativamente à inconstitucionalidade das normas penais em branco:


MFP – em matéria de penas, de incriminações ou de medidas de segurança, as normas
penais em branco são inconstitucionais.
FIGUEIREDO DIAS – as normas penais em branco só são inconstitucionais em
relação às penas.

NORMAS EM BRANCO AULA TEÓRICA:


Não há crime sem lei, mas a lei tem de ter certas propriedades, estrita, escrita, certa e
prévia. Lei estrita tem que ver com a ideia de que não pode ser uma lei qualquer, tem que
ver com a ideia de ser da AR ou DL-autorizado, art 165º/c), só a lei da AR ou DL pode

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definir O QUE É O CRIME. Na dimensão do escrito resulta quase diretamente do estrito
pois não conhecemos nenhuma lei da AR ou DL que não seja escrita. É possível haver
incriminações não escritas, são exceções excecionalíssimas, que vem prevista no art 29º
CRP. Certa, no sentido de discricionariedade, de se saber qual o tipo de crime que se
pune, qual o comportamento que é proibido e o que não é proibido, a lei tem de ser certa
e percetível – relaciona-se com o principio da culpa. O facto de ser prévia, será
relacionada com a aplicação da lei no tempo.
As normas penais em branco colocam problemas a nível de quase todas estas
propriedades, salvo o “prévio”.

O que é uma norma penal em branco?


É uma norma que tem dois elementos, se não os tiver é inconstitucional, tem de ter
estatuição (a estatuição é a pena, é a parte da norma onde diz “é punido com pena de 8 a
16 anos” por exemplo, depois tem uma parte da previsão) a previsão da norma penal é o
crime “quem matar alguém” é previsão do crime de homicídio) na definição do que seja
o crime a norma penal em branco apenas tem parte da definição, parte da definição
do crime, a outra parte estará noutra norma complementadora que contem essa
outra parte da descrição do comportamento criminoso, poderá ser uma portaria, uma
norma técnica, um regulamento, etc.

O artigo 277º/a) do CP, por exemplo, é uma norma penal em branco. Ao vermos este
artigo fala em “violar as regras gerais ou técnicas”, mas não sabemos quais são essas
regras, essa norma prevê a estatuição, parte da estatuição mas falta outra parte, que é a
identificação das regras cuja violação pode gerar a responsabilidade penal. Não diz que
normas técnicas podem ser violadas, as normas que estão nos manuais de
engenharia, etc.

Quais é que são os problemas que esta previsão pode colocar? Podem colocar-se em
relação a todas as normas penais em branco. Dependendo da norma penal em branco que
esteja em causa, há umas inquinadas por esses prolemas e outras que não estão
inquinadas por esses problemas.

O crime pelo qual os engenheiros foram acusado no projeto, não foi integralmente
definido pela AR ou DL autorizado, apenas parte desse crime foi definido pela AR, mas
houve outra parte definida pela comunidade dos engenheiros que produziram os manuais,
temos pessoas a ser penalizadas por lei de AR e também pela comunidade cientifica dos
engenheiros. Temos de perguntar se viola ou não o artigo 165º/c CRP?
O segundo problema tem que ver com a lei ser certa – o destinatário da norma
tem de saber qual o sentido da norma e o que é ou não proibido. A ideia de lei certa tem
especial importância para os juízes, quem vai decidir permitindo evitar o arbitrio, a ideia
de lei certa visa garantir que o juiz no momento da aplicação faz aplicação uniforme da

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lei penal, garantimos a ideia de segurança jurídica e previsibilidade do comportamento
que se visa garantir.
A ideia de lei certa pode ser colocada em causa com as normas penais em branco, porque
temos de ir buscar as normas técnicas e encaixar nas normas penais, que pode por
em causa o carater certo da lei.
Depois pode colocar em crise o princípio da culpa, podemos ter uma norma penal em
branco que seja inconstitucional por violar este principio. Porque é que o principio da
culpa pode ser afetado ? Tem que ver com o facto de a lei não ser certa, pondo em causa
o principio da culpa. Quando alguém tem culpa significa que pode ser pessoalmente
censurado pelo facto.
- Texto do DR Rui Patrício na coletânea de Casos e Matéria de Direito Penal, para
consultar pois explica bem a matéria

(a) Acórdão 427/95 do TC


Norma penal e branco que remitia para norma complementadora para tais
aditivos que não podiam ser usados, esse acórdão estabelece um critério bastante
operativo: quando ao art 165/c diz que é a AR a definir os crimes não é que a AR tem
que definir a integralidade do crime e todos os seus pormenores tenham de ser por
ela definidos. O 165/c diz que tem que ser a AR a definir o crime, então a pergunta é,
o que é que ela tem que definir para se poder continuar a dizer que ela tem que definir ?
O acórdão diz que a AR tem que definir o critério autónomo de ilicitude.
O critério que permite distinguir entre o comportamento permitido e proibido, esse
critério tem de ser a AR a criar, a norma complementadora, não vem dizer o que é ou
não crime, vem só concretizar o critério já existente na norma realizada pela AR. Esse
critério, o critério autónomo de ilicitude, tem de estar na norma penal. A norma
complementar não pode introduzir nenhuma surpresa, somente concretiza essa mesma
ideia.
Numa concepção ampla, poderá entender -se como norma penal em branco toda a
descrição incompleta de uma norma penal, independentemente da forma como a mesma é
integrada, o que levará a incluir no conceito não só as remissões de uma norma penal para
outros instrumentos normativos inferiores, criados por uma instância legislativa diferente, como
também as remissões para outras disposições do Código Penal ou outras disposições da mesma
instância legislativa.

A doutrina maioritária aponta, contudo, para uma noção mais restrita, no sentido de
considerar norma penal em branco apenas o primeiro caso, isto é, aquele em que uma norma
penal remete parte da concretização da sua previsão para fontes normativas inferiores.

As diferentes modalidades de normas penais em branco podem suscitar, em tese geral,


questões de constitucionalidade, quer no que se refere à exigência de reserva de lei na definição
dos crimes, seus pressupostos e respectivas penas (princípio da legalidade), quer quanto a saber
se há uma suficiente garantia de certeza e segurança quanto aos factos que constituem o tipo
legal de crime (princípio da tipicidade).

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Este acórdão dá algumas pistas para sabermos quando é que a norma penal cria ela
própria critério autónomo de ilicitude, esse critério temos de encontrar na norma
complementadora, se estiver, aí está tudo errado, é inconstitucional.
Esses três critérios para sabermos que a norma penal em branco não é
inconstitucional são os seguintes:
1. A identificação do bem jurídico que se pretende tutelar tem de estar na
norma penal - quando olho para a norma penal em branco tenho de saber qual o
bem jurídico em causa e não ter de recorrer á norma complementadora;
2. O desvalor da ação tem de resultar da norma penal em branco, a norma penal
pode não ter todos os pormenores do comportamento mas tem de ter a descrição
que permita dizer qual o desvalor do comportamento, aquilo que esta na
norma penal em branco tem de ser suficiente para saber aquilo que acarreta
desvalor;
3. A norma penal em branco tem que ser ela própria a revelar qual o desvalor do
resultado que se pretende evitar – traduz um juízo do desvalor que o direito faz
ao comportamento do agente, quer dizer que o comportamento dele é reprovável
pois há certos elementos (do tipo) que acarretam esse desvalor. Se A mata o B, o
comportamento é típico, mas no caso concreto pode ser permitido se for em
legitima defesa, tinha o direito de o fazer, no caso concreto é aprovado logo é
licito, logo esses indícios e elementos do desvalor naquele caso esse juízo não se
confirmou, aquele comportamento recebe uma permissão excecional. Se A mata
B em legitima defesa em geral não pode agir para matar pessoa mas em LG neste
caso concreto não há desvalor da ação e também não há desvalor do resultado,
este é um estado de coisas que o direito aprova. O estado de coisas é ele ter
morrido por força da ação de outra pessoa. Se a pessoa morre de cair um
relâmpago não há desvalor do resultado, o sujeito pereceu mas não em
consequência de nenhum comportamento desvalioso de ninguém. Se A mata em
legitima defesa mas não sabe que esta em legitima defesa temos desvalor da ação
pois ele estava agir para matar alguém sem mais, e isso o direito não aprova, mas
o resultado disso foi matar o agressor, há desvalor da ação e não do resultado.,
será penalizado por pena de tentativa de homicídio.

• Principio nullum crimen, nulla poena sine lege


O principio do Estado de direito conduz a que a proteção dos direitos, liberdades
e garantias seja levada a cabo não apenas através do direito penal, mas também
perante o direito pena.
Á possibilidade de arbítrio ou de excesso se ocorre submetendo a intervenção
penal a um rigoroso principio de legalidade, cujo conteúdo essencial se traduz em
que não pode haver crime, nem pena que não resultem de uma lei prévia, escrita,
estrita e certa.

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A norma contida no artigo 29/2 CRP confere jurisdição aos tribunais portugueses
para conhecerem de certos crimes contra o dinheiro internacional, mesmo que as
condutas visadas não sejam puníveis à luz da lei positiva interna.
O principio da legalidade da intervenção penal possui uma pluralidade de
fundamentos, uns externos (ligados à conceção fundamental do estado), outros
internos (de natureza especificamente jurídico-penal).
Entre os primeiros avultam o principio liberal, principio democrático e o
principio da separação de poderes. De acordo com o principio liberal, toda a
atividade intervencionista do Estado na esfera dos direitos, liberdades e garantias das
pessoas tem de ligar-se à existência de uma lei mesmo de uma lei GERAL,
ABSTRATA E ANTERIOR (CRP art 18º 2 e 3). De acordo com os princípios
democrático e da separação de poderes, para a intervenção penal, com o seu particular
peso e magnitude, só se encontra legitimada a instância que represente o Povo como
titular ultimo do ius puniendi.

Entre os fundamentos internos costumam apontar-se a ideia da prevenção geral


e o principio da culpa. Não pode esperar-se que a norma cumpra a sua função
motivadora do comportamento da generalidade dos cidadãos – seja na sua vertente
“negativa” de intimidação, seja sobretudo na sua vertente positiva de estabilização
das expectativas – se aqueles não puderem saber, através de lei anterior estrita e
certa, por onde passa a fronteira que separa os comportamentos criminalmente
puníveis dos não puníveis. Como não seria legitimo dirigir a alguém a censura
por ter atuado de certa maneira se uma lei com aquelas características não
considerasse o comportamento respetivo como crime.
Vale só acrescentar que também a própria função de prevenção especial positiva
ou de ressocialização, no seu entendimento atual, confirma a exigência do principio
da legalidade: o comportamento que indicia a perigosidade não é apenas sintoma ou
índice de carência de socialização e ensejo para que esta intervenha mas tem de ser
co-fundamento e limite da intervenção criminal; nesta medida ressurgindo a exigência
de legalidade estrita daquela.

• Nullum crimen sine lege


O principio segundo o qual não há crime sem lei anterior que como tal preveja
uma certa conduta significa que, por mais socialmente nocivo e reprovável que se
afigure um comportamento, tem o legislador de o considerar como crime (
descrevendo-o e impondo-lhe como consequência jurídica uma sanção criminal) para
que ele possa como tal ser punido. Esquecimentos, lacunas, deficiências de
regulamentação ou de redação funcionam sempre contra o legislador e a favor da
liberdade, por mais evidente que se revele ter sido intenção daquele abranger na
punibilidade também certos comportamentos.

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• Nulla poena sine lege
A formula “não há crime sem lei” é complementada pela formula “não há pena
(não há sanção criminal, pena ou medida de segurança) sem lei”. Na interpretação
desta formula verificam-se algumas dificuldades que devem ser consideradas. Desde
logo cumpre dizer que este segmente do principio tem expressa consagração jurídico-
constitucional e legal. Nesse sentido afirma logo o artigo 29/3 da CRP que “não
podem ser aplicadas penas ou medidas de segurança que não estejam
expressamente cominadas em lei anterior”. No que toca ás penas, esta exigência
de lex poevia corresponde á doutrina internacional dominante. Não assim já portem
no que toca ás medidas de segurança, relativamente ás quais se pensava que o seu
fundamento de estrita prevenção especial deveria conduzir a que pudesse aplicar-se a
medida de segurança vigente ao tempo da aplicação, porque isso seria apenas sinal de
um entendimento legislativo melhor para o agente.

➢ O plano do âmbito de aplicação


Neste plano cumpre assinalar que o principio da legalidade não cobre toda a
matéria penal mas apenas que se traduza em fundamentar ou agravar a
responsabilidade do agente. Sob pena, de outra forma – isto é, se abrangesse
também a matéria de exclusão ou da atenuação ou exclusão da responsabilidade – de
o principio passar a funcionar contra a sua teleologia e a sua própria rezão de
ser: a proteção dos direitos, liberdades e garantias do cidadão face á possibilidade de
arbítrio e de excesso do poder estatal.
Para se avançar apenas com um exemplo, o principio cobre toda a matéria
relativa ao tipo de ilícito ou às causas de exclusão da culpa. De tal forma é
importante a restrição do principio que ela se estende a todas as suas consequências –
seja no plano da fonte, seja no da determinabilidade, no das proibições de analogia e
de retroatividade.

➢ O plano da fonte
Neste plano o principio conduz à exigência de lei formal: só uma lei da AR ou
por ela competentemente autorizada pode definir o regime dos crimes, das penas e
das medidas de segurança e seus pressupostos. A este propósito podem todavia
suscitar-se alguns problemas que não devem deixar de ser referidos. Desde logo o de
que o conteúdo de sentido do principio da legalidade só deveria cobrir a atividade
de criminalização ou de agravação, não a descriminalização ou de atenuação.
Outro problema é o de saber se a exigência de legalidade no plano da fonte deverá
abranger só a lei penal sensu stricto ou ainda também a lei extra-penal, na medida em
que esta venha a ser chamada pela lei penal à fundamentação ou à agravação da
responsabilidade criminal. Para esta fundamentação ou agravação serve-se muitas
vezes a lei penal, com efeito, de procedimentos de reenvio para ordenamentos
jurídicos não penais – o civil, administrativo, fiscal.

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O que acaba por fazer crise nas chamadas normas penais em branco, sobretudo
abundantes no âmbito do direito penal secundário, que cominam uma pena para
comportamentos que não descrevem, mas se alcançam através de uma remissão da
norma penal para leis, regulamentos ou atos administrativos autonomamente
promulgados em outro tempo ou lugar. Pressuposto que a norma penal em branco
consta de lei formal, não se vêem razões teleológico-funcionais decisivas para
considerar em causa o respeito pelo principio da legalidade.

➢ A determinabilidade do tipo legal


No plano da determinabilidade do tipo legal ou tipo de garantia –
precisamente, o tipo formado pelo conjunto de elementos cuja fixação se torna
necessária para uma correta observância do principio da legalidade importa que a
descrição da matéria proibida e de todos os outros requisitos de que dependa em
concreto uma punição seja levada até a um ponto em que se tornem
objetivamente determináveis os comportamentos proibidos e sancionados e se
torne objetivamente motivável e dirigível a conduta dos cidadãos.
Considerar crime – para usar de exemplos que já foram assinalados – as condutas
que ofendem o “sentimento do povo” ou a “ordem dos operários e agricultores”
tornaria supérfluo um grande numero de incriminações dos códigos penais mas
não cumpriria as exigências de sentido ínsitas no principio da legalidade.
Nesta aceção se afirma que a lei penal fundamentadora ou agravadora da
responsabilidade tem de ser uma lei certa e determinada; e se chama muito
acertadamente a atenção para que é mais aqui até do que no plano da proibição da
analogia ou da retroatividade que reside o grande perigo para a consistência do
principio nullum crimen, que é neste ponto que reside o verdadeiro cerne do principio
da legalidade.

➢ A Proibição da Analogia
Toma-se neste conceito o conceito de analogia como aplicação de uma regra
jurídica a um caso concreto não regulado pela lei através de um argumento de
semelhança substancial com os casos regulados: a chamada analogia legis, não a
analogia iuris. O argumento da analogia tem em direito penal de ser proibido por
força do conteúdo de sentido do principio da legalidade, sempre que ele funcione
contra o agente e se vise servir a fundamentação ou a agravação da sua
responsabilidade.
Esta conclusão já resultaria evidente do texto do artigo 29º/1 da CRP porque
nestas hipóteses se não pode formar que a lei declara punível o ato ou a omissão.
Mas o CP entendeu reforçar a proibição estatuindo expressis verbis no art 1º/3
que “não é permitido o recurso à analogia para qualificar um facto como crime,
definir um estado de perigosidade ou determinar a pena ou a medida de segurança
que lhes corresponde”.

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Porque é que se proíbe a analogia? Segurança jurídica, principio democrático,
separação de poderes. A prof FP invoca como ideia orientadora o Estado de Direto
democrático, este estado é aquele que se autovincula ao direito do crime, é um estado
que é justo para com os seus cidadãos, e cumpre essas regras e não vai alterá-las
arbitrariamente, o estado está a auto limitar-se. Ideia de segurança, quando há uma
ideia de lei certa para os cidadãos saberem como orientar a sua vida; ideia de separação
de poderes pois é garantia de que não é o juiz que está a criar o direito penal, está a dar
cumprimento à vontade logo, isto explicaria estas exigências.
A doutrina entende – não é permitida a analogia desfavorável, como vamos
distinguir se o juiz está a fazer analogia ou ainda interpretação extensiva ou wtv? O
limite para a interpretação admissível será o sentido possível das palavras, que tem
um quadro de significados possíveis desde que a interpretação caiba nesse limite
semântico. O limite possível das palavras não é um critério de interpretação, é um
limite, um filtro, uma parede, mas não um instrumento para interpretar, mais longe
do que isto não podemos ir. A letra, mesmo para quem entenda que é o critério para
interpretar esta a ser apresentado como limite para separar as duas coisas. Se não cabe
na letra da lei então aplicar a norma ao caso será sempre analogia, se se aplicar a letra
da lei temos de fazer a interpretação propriamente dita. Por exemplo, o caso da
proibição de jogos de fortuna ou azar fora dos sítios previstos, jogar às cartas no bar da
escola, não é o que a lei pretende castigar.
Há autores que questionam esta ideia: NÃO POSSO DETERMINAR O SENTIDO DAS
PALAVRAS POIS SO O POSSO DETERMINAR INTERPRETANDO. O verdadeiro sentido das
palavras afere-se consoante o jogo de palavras, tenho de saber em que contexto està a
ser usado etc. estes autores dizem o seguinte: proibir a analogia é proibir a
interpretação, esta ideia de que podemos distinguir entre o que é interpretar e analogia
esta viciada pelo modelo conceptual do que é (?). os autores dizem que não funciona
nada assim, a norma é uma bussola, pego na norma, olho para o caso e uso-a para me
guiar na solução do caso.
Esta ideia do sentido das palavras não é pacifica – a prof FP entende que o professor
Castanheira Neves tem a sua razão mas ainda assim ela tem mais fé no papel limitador
do sentido das palavras, entende ela que é possível determinar a interpretação, o modo
como vamos pré-determinar o sentido, o sentido limite é obtido com o sentido de
linguagem social logo não é cada palavra isolada, e sempre o texto no seu conjunto e
o sentido que interessa é o sentido da linguagem social, o juiz não pode condenar o
arguido por um sentido que nunca poderia conhecer e ninguém iria interpretar
daquela maneira.
A essência da proibição – elemento teleológico da interpretação, é só critério para
restringir.
- A prof diz que é importante ainda – garantir que o juiz não toma uma opção
que caiba ao legislador, se o juiz tiver varias opções e não e possível com

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fundamentação aperfeiçoar a preferência em qualquer uma delas, então o juiz
esta a tomar uma decisão que o legislador deveria ter tomado.
As palavras são polissémicas, mas não significa que desde que corresponda á letra da lei
seja punido, é só um limite, ainda é preciso interpretar, vamos ver se está nos
significados possíveis da letra da lei e se couber vamos interpretar. Qual o problema ?
Em primeiro lugar: ideia de podermos pre definir os conceitos da letra da lei é confusa.
Imaginemos o caso 131/2, um homem adulto que tenha relação sexual com uma adulta
com doença mental que a faz ter mentalidade de uma criança. Na lei menciona menores
de 14 anos, não sei se abrange idade mental ou não pois a lei não esclarece. Abrange a
idade mental ou não? Tenho de interpretar.
Imaginando que S vai a um restaurante e pede uma dourada grelhada, fica desiludido
por não ser fresco e sai sem pagar – aqui vide artigo 220º/1 a), ele teve intenção de não
pagar mas foi depois de se fazer servir, antes de comer tinha intenção de pagar, cabe na
letra da lei. Há alguma diferença na lei entre o que entra sem querer pagar ou o que
depois de comer não quer pagar? Não! É somente relevante a questão de não ter pago
pelo serviço.

É um problema da letra da lei ou material? É de não caber na letra? Imaginemos que


somos o legislador, vamos pensar, devo tratar de modo diferente as pessoas que entram
logo com intenção de não pagar das que só depois de comer é que não querem pagar?
Numa logica como a de Castanheira Neves, se entre esse tipo de problema para o qual
a norma esta pensada em abstrato e o caso em abstrato, há correspondência mínima,
se houver então, esta norma é adequada a este caso e vou usar esta norma para
construir a solução desse caso que pode levar a que possa punir ou não essa pessoa.

• Interpretação e analogia em DP
A proibição de analogia pressupõe a resolução do problema dos limites da
interpretação admissível em direito penal. Está hoje afastada a convicção
iluminista de que o principio da separação de poderes conduziria à proibição de
qualquer processo de interpretação jurídica.
Aceita-se que praticamente todos os conceitos utilizados na lei são suscetíveis e
carentes de interpretação: não apenas os conceitos “normativos” mas mesmo aqueles
que à primeira vista se diria caracterizadamente descritivos. Deste modo se torna
inarredável a questão de saber o que pertence ainda à interpretação permitida e o que
pertence à analogia proibida em direito penal pelo principio da legalidade.
O fundamento desta proibição reside igualmente na exclusividade da elaboração
da lei penal pelo Parlamento ou do Governo com autorização. – Se os tribunais
pudessem utilizar a analogia, formulariam normas incriminadoras que deixariam de
ser objeto de controlo democrático.

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1. Proibição da analogia (art. 1º/3 CP):
O art. 1º/3 CP proíbe expressamente a analogia quanto às normas de que resulta
o facto como crime, a definição de um estado de perigosidade e a determinação da
pena ou medida de segurança correspondentes.
O fundamento desta proibição reside na exclusividade de competência da AR
(ou do Governo com autorização legislativa) na formulação de normas
incriminadoras. Se os tribunais pudessem utilizar a analogia, formulariam normas
incriminadoras que deixariam de ser objeto de controlo democrático, podendo
ser utilizadas para a perseguição criminal de determinadas pessoas. Por outro
lado, o caráter fragmentário do Direito penal impede que comportamentos análogos
aos expressamente previstos, na perspetiva da lesão do bem jurídico violado, tenham
o mesmo merecimento penal.
O critério de distinção teleológica é funcionalmente imposto pelo fundamento e
pelo conteúdo de sentido do principio da legalidade só pode ser o seguinte: o
legislador penal é a obrigado a exprimir-se através de palavras; as quais nem
sempre possuem só um sentido daí que por vezes o texto legal careça de
interpretação, oferecendo as palavras que o compõem, segundo o seu sentido comum
e literal, um quadro de significações dentro do qual o aplicador da lei se pode mover
e optar sem ultrapassar os limites legítimos da interpretação. Fora deste quadro,
sob não importa que argumento, o aplicador encontra-se inserido já no domínio da
analogia proibida. Um tal quadro não constitui por isso crédito ou elemento, mas
limite da interpretação admissível em direito penal.
O DIREITO PENAL não é uma caixa de onde o juiz tira a norma e aplica no caso
concreto, é mais como uma bússola que vai orientar o aplicador da norma em cada
caso concreto. (Brito Neves <3).
Uma outra concretização da reserva de lei verifica-se na própria interpretação
de lei penal: o art. 1/3.º do CP proíbe a analogia quanto às normas de que resulta
a qualificação do facto como crime.
A doutrina aqui defendida não é arbitrária nem filha de uma metodologia
positivista. É, pelo contrário, a posição teleológica e funcionalmente imposta pelo
conteúdo de sentido próprio do principio da legalidade. Fundar ou agravar a
responsabilidade do agente numa qualquer base que caia fora do quadro de
significados de significações possíveis das palavras da lei, não limita o poder do
Estado e não defende os direitos, liberdades e garantias das pessoas.
Se o caso couber num dos sentidos possíveis das palavras da lei nada há a
acrescentar ou a retirar aos critérios gerais da interpretação jurídica.
Decisivo será, por um lado, que a interpretação seja teleologicamente comandada em
definitivo determinada à luz do fim almejado pela norma; e por outro que ela seja
funcionalmente justificada, adequada à função que o conceito assume no sistema.
Nada disto veda a possibilidade de raciocínios por analogia na aplicação da lei penal.
É um raciocínio por analogia aquele em que, da semelhança entre certo facto a
considerar e outro facto previsto na lei, se deduz que valem para o primeiro as

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consequências que a lei estatui para o segundo. Ora nenhum trabalho interpretativo
teleológico, que atenda aos fins e ao sentido do preceito e que admita um progresso
no conhecimento, dos casos mais evidentemente previstos para os mais duvidosos, se
pode passar de raciocínios por analogia, baseados na semelhança entre os casos a
considerar e outros casos reconhecidamente abrangidos pelo preceito. Tais raciocínios
são apenas um meio de interpretação.
• Âmbito da proibição de analogia
Face ao fundamento, à função e ao sentido do principio da legalidade a proibição
de analogia vale relativamente a todos os elementos, qualquer que seja a natureza, que
sirvam para fundamentar a responsabilidade ou para a agravar, a proibição vale pois
contra reum ou in malem partem, não favore reum ou in bonam partem.
Concretamente, a proibição abrange antes de tudo os elementos constitutivos
dos tipos legais de crime descritos na PE ou CP ou em legislação extravagante.
Como vale relativamente ás leis penais em branco não só no que toca à parte
sancionatória da norma, mas ainda mesmo na parte em que esta remete para a
regulamentação externa. Coisa diferente só deverá dizer-se relativamente a
conceitualizações extra-penais usadas pelo legislador penal que este terá querido usar
de forma puramente acessória e com o sentido que elas possuem no ramo de direito a
que pertencem.
Também relativamente à matéria das consequências jurídicas do crime vale
a proibição de analogia em tudo quanto possa revelar-se desfavorável ao agente, em
tudo o que signifique restrição da sua liberdade no sentido mais compreensivo.
Não tem hoje razão de ser uma doutrina segundo a qual a proibição valeria em matéria
de penas mas já não de medidas de segurança, por estarem aqui em causa finalidades
estritas de prevenção especial positiva. O mesmo se diga do resto para a parte
sancionatória das leis penais em branco.
A analogia pressupõe integração de lacunas, um dos elementos da interpretação,
elemento literal não exprime suficientemente bem o pensamento do legislador, a
interpretação vai através dos outros elementos, o histórico, teleológico, sistemático,
vai completar o sentido literal de forma do resultado da interpretação seja coincidente
com o sentido da lei e o pensamento do legislador.
O elemento histórico, sistemático, teleológico, o legislador disse mais do que
queria.

• Interpretação analógica vs interpretação extensiva


A proibição da analogia não deve, porém, ser confundida com a proibição de
raciocínios analógicos na aplicação da lei penal. A delimitação entre a analogia
proibida e outras técnicas de interpretação tem sido formulada a propósito das
fronteiras entre interpretação extensiva e analogia.

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a) O que as distingue?
Interpretação extensiva – é uma forma de interpretação onde ainda há uma
fundamentação no pensamento do legislador. Assim, quando o legislador tenha
apenas exprimido imperfeitamente a intenção de regular o caso, haverá interpretação
extensiva. Nestes casos, o texto legal não acompanha plenamente o pensamento
do legislador, sendo este alcançável através de outros elementos da
interpretação, em conjugação com o elemento literal, sendo o resultado da
interpretação ampliado na interpretação extensiva ou restringido na interpretação
restritiva.

Por exemplo, quando o legislador se refere ao “veneno” como meio de perpetração


do homicídio (art. 132º/2 i) CP) pretende abranger não só as substâncias
designadas como tal, mas também aquelas que, em concreto, produzam os efeitos
tóxicos próprios do veneno – tal como o excesso de açúcar para os diabéticos.
A letra da lei: abrangerá menos do que o pensamento do legislador quis expressar:
pois a ratio do art. 132/2/i) do CP é agravar a responsabilidade penal (porque é
homicídio qualificado :o ), com o fundamento na indefensibilidade da vítima devido
à ministração de substância especialmente perigosa para a vida humana.

A interpretação extensiva baseia-se no plano teórico, na possibilidade de referir um


certo caso não expressamente considerado pela letra da lei ao seu pensamento.
Diferencia-se da analogia na medida em que o caso real é meramente semelhante aos
casos previstos pela lei, sem no entanto ter sido pensado por ela. Assim quando o
legislador se tenha apenas esquecido imperfeitamente da intenção de regular o caso:
haverá interpretação extensiva:

A interpretação extensiva é proibida?


TEM-SE DE DIVIDIR AS NORMAS PENAIS EM DOIS GRUPOS:

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→ Proíbe-se a interpretação extensiva das normas penais incriminadoras, de
outra forma estar-se-ia a violar o princípio da legalidade na sua decorrência
“nullum crimen nulla poena sine lege stricta”, ou seja, de que as normas penais
devem ser estritamente aplicadas;
→ É admissível a interpretação restritiva;
→ Proíbe-se a aplicação analógica no âmbito das normas penais incriminadoras,
quer por analogia legis, quer por analogia iuris.

Normas penais favoráveis


Proíbe-se a interpretação restritiva de normas penais favoráveis; admite-se a
interpretação extensiva; relativamente ao problema da analogia:
1) Alguns autores – TERESA BELEZA, etc., admitem a analogia, nas normas penais
favoráveis;
2) Outros autores – CAVALEIRO FERREIRA – a analogia em Direito Penal, quer
de normas favoráveis, quer de normas incriminadoras, está vedada;
3) Outros ainda – FREDERICO DA COSTA PINTO – entende que no âmbito das
normas favoráveis a analogia está de todo excluída. Em certos casos pode-se
admitir a interpretação extensiva de normas favoráveis, mas não é possível o
recurso à analogia no âmbito de normas favoráveis.
As normas favoráveis são aquelas que visam, ou que traduzem para o agente, uma
posição mais benéfica porque:
▪ Ou excluem a ilicitude de um facto típico e portanto justificam o facto e tornam-
no ilícito, tornando-o ilícito, excluem a responsabilidade penal, porque não há
responsabilidade penal por factos lícitos.
▪ Ou tornam-se mais brandos, mais suaves, os pressupostos da punibilidade e da
punição.
▪ Pode-se fazer interpretação extensiva, mas com limites.
Mas já não se aceita que se faça interpretação restritiva de normas penais favoráveis,
isto porque, a ser possível, diminuir-se-ia o campo de aplicabilidade destas normas
favoráveis, o que significa aumentar o campo de punibilidade.

Quanto à analogia:
▪ Existem várias posições. Uma (Teresa Beleza) admite-se a integração de
lacunas no âmbito de normas penais favoráveis.
▪ Outra posição é a de que se admite por princípio a integração de lacunas por
analogia no âmbito de normas penais favoráveis, desde que essa analogia não
se venha a traduzir num agravamento da posição de terceiros, por ele ter de
suportar na sua esfera jurídica efeitos lesivos ou por ter auto-limitado o seu direito
de defesa.

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Normas incriminadoras
▪ A interpretação extensiva em normas incriminadoras não é possível. Só é
possível, no âmbito de normas incriminadoras uma interpretação declarativa
lata.
▪ Tudo aquilo que a exceda e que vise harmonizar a letra da lei à sua razão
de ser, à sua “ratio”, se ultrapassar este sentido literal máximo possível
já se está a fazer interpretação extensiva. Esta não deve ser admitida em
Direito Penal, porque se entende que por força do princípio da legalidade, na
sua vertente garantia, se exige que a lei penal seja uma lei penal expressa.
▪ Assim a norma deve dizer expressamente quais são as condutas, activas ou
omissivas que, a serem ou não adoptadas, constituem objecto de incriminação
em sede de Direito Penal.
▪ No entanto admite-se a interpretação restritiva.
▪ Afirma-se rotundamente que não é possível integrar lacunas por
analogia. Isto é, perante um caso omisso que o legislador penal não tipificou,
não classificou como crime, o juiz não pode, ao contrário de que acontece no
domínio do direito civil regular esse caso omisso, nem recorrendo à analogia
legis, nem à analogia iuris, nem tão pouco criar a norma de harmonia com o
espírito do sistema. O juiz pura e simplesmente julga, absolvendo.

Interpretação extensiva e restritiva estão também proibidas pelo principio da


legalidade?
Argumento de Sousa Brito: dadas as dificuldades de distinção entre a analogia e a
interpretação extensiva…devemos incluir a interpretação extensiva porque daria
alguma liberdade ao juiz para interpretar e por isso criaria insegurança jurídica.
Argumento de Carvalho Freire: estão proibidos em direito penal os juízos de paridade
e por maioria de razão e por isso a interpretação extensiva estaria igualmente proibida
porque estes mecanismos são os que usamos quando interpretamos extensivamente –
elemento histórico de interpretação.

Mesmo as normas sob interpretação estão sujeitas ao principio da legalidade, caso


contrário teríamos uma maneira para facilmente contornar este principio e
consequentemente de contornar a proibição da interpretação extensiva.
Os juízos de paridade e maioria de razão são elementos analógicos – quando se proíbe
a analogia não podemos concluir que isso significa proibir os raciocínios analógicos
porque toda a interpretação os tem como base – raciocínios analógicos têm a ver
mesmo com a linguagem, esta é por vezes vaga e nem sempre o legislador se
estabelece de maneira certa. MONTESQUIEU e a sua negação do juiz interprete.

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Existe um tipo de competência do interprete atribuída aos tribunais que não lhe pode
caber ao legislador pela natureza das coisas.
As leis não devem ser a favor de um caso concreto mas sim gerais e abstratas.
Interpretação analógica – segundo o pensamento tradicional, o que está em
causa é comparar um conjunto de situações previstas no texto legal com situações
que não estão previstas nem no texto legal nem no pensamento do legislador.
Estas segundas situações denominam-se casos omissos/lacunas. Ou seja, existe um
défice de regulamentação de situações similares. Há, contudo, que ter em atenção que:
1. Há situações em que é compreensível que o legislador não quis efetuar nenhum
tipo de regulamentação – aí não se poderá dizer que existe uma lacuna.
2. Existem situações em que, por razões de igualdade, justiça e natureza do
problema, justifica-se a aplicação a um caso omisso de um regime previsto na lei
para outras situações.

Todavia, é uma questão controvertida, hoje em dia, o que se pode considerar que seja
analogia.
A distinção tradicional entre estes dois tipos de interpretação assenta numa perspetiva
da interpretação jurídica como subsunção, segundo a qual seriam separáveis os
momentos de pura investigação do sentido e âmbito da lei e da sua aplicação aos casos
concretos. Este modelo, contudo, é criticável, pois pressupõe que a interpretação
jurídica nunca é constitutiva ou criativa e que a própria analogia é subtraída ao
pensamento inspirador do caso legal, como se a integração de lacunas não se
socorresse afinal de um fundamento jurídico derivado da própria lei que abrange os
casos semelhantes.
Assim, torna-se necessária a interpretação jurídica da proibição legal da
analogia com todos os instrumentos do pensamento jurídico que permitam
compreender a sua ratio e a sua possibilidade. Deste modo, para interpretarmos a
lei, temos de desenvolver um conjunto de raciocínios analógicos que nos
permitam perceber se aquele comportamento em concreto se pode integrar no
comportamento que o legislador pretendeu proibir.
Quando se descobre que a razão de ser da proibição da analogia se prende com a
segurança jurídica e com o controlo democrático da aplicação da Lei penal,
consubstanciando-se num comando dirigido ao intérprete de não se substituir ao
legislador, chega-se à conclusão de que a distinção entre interpretação extensiva e
analogia não permite traçar rigorosamente as fronteiras da interpretação que não
ofende a segurança jurídica.

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É por isto que FERNANDA PALMA sustenta que, em vez de se proibir a
interpretação extensiva ou analógica, dever-se-ia antes, ao interpretar o art. 1º/3
CP, tentar perceber as situações em que tais interpretações não serão permitidas,
à luz dos princípios constitucionais do Direito penal. Isto porque, na sua opinião, há
situações de interpretação extensiva que não são proibidas, porque não são
contra legem nem praeter legem e que, por isso, não causam insegurança.

Assim, por exemplo:


- Não é de excluir que a destruição de ninhos de cegonhas ou outras aves selvagens
se inclua num plano puramente semântico (lógico e objetivo) no tipo legal que
incrimina, na lei da caça, a destruição de ninhos e ovos sem referência expressa
às espécies de aves, isto é, sem qualquer restrição literal da proteção legal
conferida às espécies cinegéticas. Todavia, essa possibilidade semântica que seria
uma interpretação extensiva ou até apenas uma interpretação declarativa lata,
não será juridicamente incontestável, na medida em que a lei da caça é, em
princípio, um instrumento de proteção de espécies cinegéticas e não
desenvolve diretamente uma política ambientalista. Assim, não corresponderá
a qualquer expectativa média que o proprietário de uma herdade que mande abater
árvores em que existem ninhos de cegonhas esteja a violar a lei da caça,
cometendo um crime de caça (como no caso em que uma senhora foi julgada por
crime de caça por ter mandado abater na sua propriedade uma árvore que tinha
um ninho de cegonhas). Neste caso, FERNANDA PALMA defende que, ainda
que o caso concreto se pudesse reconduzir ao comportamento descrito e proibido
pela lei, deveria haver uma redução da incriminação ou do sentido possível
das palavras, pela essência do ilícito.
- Diferentemente, se a lei previsse a conduta de “captura”, “comercialização”, etc.,
de um animal selvagem sem prever expressamente o “abate”, por manifesto lapso,
a interpretação que concluísse pela abrangência do abate não seria proibida,
pois manter-se-ia nos limites juridicamente controláveis da concretização do
direito penal ou do direito de mera ordenação social, também subordinado ao
princípio da legalidade.

Relativamente à analogia, a Regente defende a inclusão possível do caso concreto


no caso legal, de acordo com um sentido possível das palavras.
- Analogia das eximentes a casos não previstos – existe alguma tolerância
quanto ao seu alargamento, todavia, há um conjunto de casos que devem ser
impedidos: aqueles casos em que o alargamento da eximente vai ter um efeito
de restrição da liberdade (ex: o alargamento da permissão excecional de
interceções telefónicas e de comunicações pela internet no âmbito do processo
penal para um conjunto de crimes em que esta possibilidade não seja prevista).

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


Conclusão:
1. A proibição da analogia não permite concluir que a interpretação extensiva
seja proibida ou permitida. O que a prática jurídica permite concluir é que não
pode haver interpretação sem raciocínios analógicos, sendo que haverá situações
em que ainda se poderá falar de interpretação extensiva, mas estar-se-á a fazer
uma criação do Direito entre várias soluções possíveis, não se lesando por isso a
separação de poderes e a vontade democrática.
2. Papel do elemento literal (sentido possível das palavras) na delimitação da
interpretação proibida – divergência entre FERNANDA PALMA e
CASTANHEIRA NEVES:
- CASTANHEIRA NEVES defende que o texto legal é o produto da
interpretação; não é o ponto de partida. A ideia de interpretação como a
determinação do sentido do Direito no caso concreto impede que se faça uma
distinção tradicional entre interpretação e aplicação (uma vez que esta não é
desempenhada pelo legislador). Para este autor, o objeto da interpretação
deixa de ser o texto, para se tornar os critérios jurídicos, apreensíveis nos
textos legais, da decisão dos casos concretos. O caso concreto é que suscita
a interpretação e o produto da interpretação é a formulação de uma
norma para o caso concreto (texto legal). FERNANDA PALMA critica este
modelo, sustentando que a supressão, na interpretação, de um momento
determinante de compreensão do significado do texto normativo enfraquece o
processo lógico de fundamentação da decisão jurídica, não protegendo as
garantias dos destinatários das normas.
A interpretação permitida será não só aquela que caiba no sentido
logicamente possível das palavras da lei, mas também a que revele os
valores jurídicos que a lei pretende atingir e seja compatível com outros
valores do sistema e com a unidade do Direito definida pelas instâncias que a
devem assegurar.
- FERNANDA PALMA dá mais importância ao texto legal que
CASTANHEIRA NEVES (que considera que o elemento central da
interpretação será uma espécie de essência jurídica, que é uma ideia que
resulta do trabalho cooperante de todas estas funções, através da qual se vai
produzir o texto legal). A Prof. defende que de facto temos de recorrer a uma
ideia jurídica, mas não desvaloriza a importância do texto no Direito penal,
uma vez que é este que define os limites da comunicação e é onde se plasma
a compreensão de qualquer destinatário da norma – o texto tem assim uma
função de garantia. Terá de se atender ao sentido possível das palavras, no
contexto da comunicação estabelecida pelo legislador com os
destinatários das normas, como elas são comummente apreendidas
(seguindo a ideia de HABERMAS). Sendo importante a essência jurídica do
proibído, a Prof. só a encontra como um critério de delimitação do próprio
sentido possível das palavras, ou seja, o sentido possível do texto delimita-
se também pela adequação do texto à essência do proibido, de acordo com
as valorações do sistema que a norma diretamente exprime ou pretende
exprimir.

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É possível que o sentido normativo em que a norma revela a expressão
concretizada do sistema seja contrário às normas ou princípios constitucionais.
Nesse caso, estaremos apenas perante uma interpretação proibida com
fundamento na CRP e não perante a proibição da analogia do art. 1º CP.

b) Redução teleológica – a proibição da analogia incluirá redução teleológica


incriminadora?
A redução teleológica exclui do âmbito da lei casos que a sua letra abrangeria, por
tais casos não deverem ser abrangidos pelos fins essenciais que a lei prossegue,
embora ainda pudessem ser referidos ao pensamento do legislador. A redução
teleológica será incriminadora quando a exclusão de casos se referir a normas que
delimitam negativamente a tipicidade.
Se no art. 142º/1 CP, relativo à exclusão da punibilidade da interrupção voluntária
da gravidez, se se interpretasse a restrição da incriminação nos casos de aborto
terapêutico (art. 142º/1 b)) excluindo do conceito de grave e duradoura lesão para a
saúde psíquica uma situação de grave depressão, por exemplo, estar-se-ia a ampliar
o âmbito da incriminação prevista no art. 140º.
Se a redução teleológica não for incriminadora, não será proibida. Porém, se da
sua aplicação se levar ao alargamento da responsabilidade, por exemplo, já será
proibida. A vinculação ao texto jurídico, como fator predeterminante de interpretação,
conduzirá a uma rejeição da redução teleológica incriminadora, pois também corresponde
ao sentido possível das palavras a sua utilização no sentido comunicacional mais amplo,
isto é, englobando todas as possibilidades de entendimento.

c) Não proibição de analogia e de redução teleológica das normas permissivas


Quanto às normas permissivas, não é proibida necessariamente a analogia, na medida
em que tais normas não são descrições típicas das condutas permitidas, mas um mero
afloramento dos princípios ou critérios gerais de solução de conflitos de interesses ou
direitos. Nelas, o texto jurídico não é predeterminante como nas normas incriminadoras.
O recurso à analogia, quando justificado pela necessidade de concretizações das
legalmente previstas, a partir dos princípios reguladores dos conflitos de interesses ou
direitos, é permitido, mesmo que se ultrapasse o sentido possível das palavras.
Todavia, é fundamentalmente a analogia iuris que é admissível, pois a norma permissiva,
ao particularizar uma intenção normativa mais vasta, concretiza critérios ou condições de
permissividade não abrangentes de outras condutas que merecem ser permitidas segundo
o mesmo princípio geral.
Todavia, a analogia iuris, que envolve o apelo aos princípios fundamentadores da
justificação, não será legítima nos casos em que a norma permissiva é de direito
excecional e não de direito geral (CAVALEIRO DE FERREIRA). Assim, por
exemplo, as autorizações legais contidas no CPC destinadas a assegurar a obtenção da
prova com vista à satisfação do princípio da verdade material não são suscetíveis de

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alargamento a situações análogas, na medida em que são intervenções excecionais na
liberdade dos indivíduos.
Relativamente à redução teleológica de normas permissivas, podemos dizer que
também existe um efeito incriminador mediato derivado da redução teleológica de uma
norma permissiva. Mas esse efeito não está necessariamente subordinado às garantias que
justificam a proibição da analogia de normas incriminadoras.
Considere-se, por exemplo, uma redução teleológica do art. 32º CP que retire
do seu âmbito “as defesas necessárias elevadamente desproporcionadas à gravidade
insignificante da agressão” com fundamento no princípio geral de que a legítima defesa
implica concretizações em que a defesa do Direito é menos valiosa do que a preservação
da dignidade da pessoa do agressor. Nesse caso, o efeito incriminador não consiste num
alargamento da norma incriminadora, mas na limitação do conteúdo da norma permissiva,
cuja prevalência sobre a norma incriminadora deixa de existir no caso concreto. O
alargamento das possibilidades de incriminação, na hipótese proposta, baseia-se, contudo,
na ponderação de valores subjacente à norma permissiva e no conteúdo do direito de
defesa que o Direito penal não pode autonomamente prever, mas que resulta de
ponderações de valores do sistema. Somente a consideração das causas de justificação
reconhecidas no Direito penal como direitos impediria raciocínios deste tipo.
No entanto, as causas de justificação positivadas não conferem necessariamente, a partir
da sua configuração penal excludente da punibilidade, direitos de intervenção. Não se
poderá, por exemplo, falar materialmente de um direito ao aborto por indicação eugénica,
mas apenas na exclusão da sua punibilidade.
Questão a proibição da analogia- não podemos interpretar a proibição da analogia em
direito penal com apenas os instrumentos da teoria do direito. Toda a interpretação
pressupõe raciocínios analógicos. Tem é que se procurar definir quando é que essa
analogia atinge um nível tal que já não cabe nos poderes da função interpretativa do
tribunal e já é do domínio das competências legislativas.

Dois casos: caso que não é da jurisprudência portuguesa e é mais antiga - caso do ácido,
que era preciso saber se referindo a lei apenas armas, se nos terremos funcionalmente
uma arma como acido, no sentido mais comum das palavras o acido não é uma arma, é
apenas uma substancia químicas.
- Segundo a conceção tradicional, que fazia uma delimitação entre a analogia e a
interpretação extensiva, era difícil realmente integrar o caso do acido no conceito de
arma. A luz desta conceção tratava-se de analogia porque realmente o pensamento do
legislador estava direcionado aos casos típicos de maior intensidade de ofensa
intencional, como nos casos, da utilização de armas. Havia razões fortes (elementos
histórico e literal) para não incorporar o acido como arma. A solução tradicional não
tinha facilidade para resolver este caso porque havia conflito entre os elementos da
interpretação.

Quando temos critérios que são características fundamentais para tomar decisões, por
vezes essas características são critérios menos intensos ; apagam-se as contraditórias
menos intensas. Isto ainda para salvar a interpretação extensiva.

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No caso do acido tinha contra a possibilidade da interpretação extensiva elementos
muito fortes - tinha o elementos histórico e o conceito de armas. Existiu um certo
impasse; como podíamos conjugar todos estes elementos da interpretação? Seria de
recusar a interpretação extensiva.

Leva-nos poder alterar o nosso pensamento. Se admitirmos que raciocínios analógicos


se encontram em todos os procedimentos interpretativos, que nos permitem verificar
se seja ou não possível a interpretação ou a exclusão da analogia. No caso do veneno,
podemos dizer que a opção de incluir substancias que funcionavam como armas, talvez
ainda não desse ao julgador a função dele mesmo, porque podemos dizer que aqui é
importante o elemento sistemático. Qual o papel do julgador? Também é importante o
sentido possível das palavras. Apesar de se falar de armas, segundo as representações
comuns tem um sentido de perigosidade imenso. Talvez não tivéssemos no domínio das
opções legislativas. O legislador poderia ter querido apenas filtrar aqueles casos de
utilização de meios perigos, mais intensos no uso de armas num determinado momento
histórico- não parece ser um argumento decisivo pq já tinha existido a existência na
primeira guerra mundial. Outros autores acabam por aceitar que aqui há analogia
proibida.

Outro caso: acórdão do TC 205/99- deu oportunidade ao tribunal de duas coisas:


• de se pronunciar em termos de constitucional em termos de atribuição do
significado de analogia, porque o TC tinha se recusado a pronunciar sobre a analogia em
direito penal. Quando é suscitado o problema da analogia, este problema não era um
problema de normas, era um problema de decisão e como o TC não poderia recorrer de
decisões, o TC não conhecia das questões de analogia. Houve uma conjugação de juízes
que suscitou o problema.
Como se chega a conclusão que isto não era problema de decisão, mas sim problema de
normas? O tribunal formou a ideia de que quando for suscitada a questão da analogia,
o que submete a apreciação é a verificação da interpretação feita pelo tribunal recorrido
de uma determinada norma. O que esta em causa nestas situações? se a norma criado
pelo tribunal recorrido para a decisão se essa norma é uma norma que cabe na
competência do legislador ou se é uma norma criada pelo juiz. Caso semelhante a um
caso de inconstitucionalidade orgânica. O que é controlável pelo tribunal é a conclusão
deste raciocínio, segundo o qual aquele caso esta dentro dos casos enumerados pela lei.
O tribunal aceitou que podia conhecer. Uma norma criada pelo juiz que cria normas
incriminadores tem de ser controlada pelo tribunal. Só depois foi analisar se estamos
perante analogia ou interpretação extensiva.

Saber se podemos criar causas de justificação e causas de exclusão da culpa ou de


circunstancias atenuantes por analogia. Não estando perante normas incriminadoras,
estando perante normas que estendem a responsabilidade criminal - normas que
agravam a posição do arguido. É aqui que a analogia se impõe. O art.º1/3, excluem da
proibição da analgia das normas correspondentes de responsabilidade criminal. A
proibição da analogia refere-se somente as normas incriminadoras.

Questão de normas que excluam a responsabilidade elas são excecionais. Apesar de


estarmos perante eximentes, ou normas que restringem a tipicidade dos crimes, nos

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não podemos concluir que sejam autorizadas essas analogias. Não é possível analogia
aqui por razões de Estado de Direito. Quanto a outras causas de exclusão de ilicitude,
há que fazer algumas diferenciações.

→ Proibições da analogia nas situações de causas de exclusão da culpa


Nestes casos, a contrario, resulta que não há nenhuma proibição. O artigo 1º/3 é um
comando dirigido ao legislador e na reserva de lei vimos que a definição do crimes ed as
penas compete apenas ao legislador com autorização legislativa, e na exclusão máxima
da responsabilidade também está no âmbito de reserva – quem define os crimes
também devem estar encarregues da descriminalização (contemplação da reserva na
negativa). Ao criar não pode é violar alguns princípios constitucionais como o principio
da culpa, por exemplo. Também os tribunais pode criar causa de exclusão de ilicitude e
exclusão da culpa? Admite-se que possam criar mas não podem violar principio
constitucionais ao fazê-lo. Lá por o poderem fazer não quer dizer que o possa
livremente.
Não resulta do 1º/3 que exista a ?. Há determinadas eximentes que não podem ser
criadas por analogia em função da sua própria natureza – por exemplo, as escutas
(restrição de direitos fundamentais).
No que diz respeito às outras eximentes, as de direto geral, que são expressão do
mesmo, como por exemplo a legitima defesa – destes casos a analogia é problemática.
Não é o 1º/3 que está em causa, mas sim a violação do principio constituição que
justifica a legitima defesa.
Pensamento da legitima defesa que impões alguns limites – pode fazer-se uma
degradação do instituto para situações que nele não caibam. Não será legitima defessa
matar para proteger as maçãs de um pomar.

→ PROIBIÇÃO DE REDUÇÃO TELEOLÓGICA INCRIMINADORA DAS NORMAS QUE


LIMITAM A TIPICIDADE:
A redução teleológica exclui o Âmbito da lei casos em que a sua letra abrangeria, por
tais casos não deverem ser abrangidos pelos fins essenciais que a lei prossegue: embora
que ainda pudessem ser referidos ao pensamento do legislador:
- A redução teleológica será incriminadora quando essa exclusão de casos se
referir a normas que delimitam negativamente a tipicidade.
- A vinculação ao texto jurídico como fator pré-determinante da interpretação
conduzirá a sua rejeição da redução teleológica incriminadora, pois também
corresponde ao sentido possível das palavras a sua utilização no sentido
comunicacional mais amplo englobando todas as possibilidades de
entendimento.
- Não é proibida a redução teleológica nas normas permissivas: legítima
defesa (imaginem o caso da legítima defesa ser preventiva e não atual, não
se esqueçam que de facto a legítima defesa e um dos seus pressupostos é a
atualidade, mas há casos em que se admite esta legítima defesa preventiva,
pense-se do caso do terrorismo, quando a polícia atua antes do terrorista
explodir a bomba: portanto aqui é possível uma analogia permitida, mais
favorável)

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APLICAÇÃO DA LEI PENAL NO TEMPO
➢ Aplicação da lei penal no tempo e princípio da irretroatividade
Pode suceder que após a pratica de um facto, que ao tempo não constitua crime, uma
lei nova venha criminaliza-lo; ou, sendo o facto já crime ao tempo da sua prática, uma lei
nova venha prever para ele uma pena mais grave, ou qualitativamente (pena de prisão
quando era apenas de multa) ou quantitativamente (prisão até 8 anos quando era somente
até 5 anos).
O problema da aplicação da lei no tempo é resolvido através das normas chamadas de
direito inter-temporal. Este direito como que se reduz, no âmbito penal, ao principio que
traduz uma das consequências mais fundamentais do principio da legalidade: o da
PROIBIÇÃO DA RETROATIVAMENTE em tudo quanto funcione CONTRA REUM
ou IN MALEM PARTEM. Através dele se satisfaz a exigência constitucional e legal de
que só seja punido o facto descrito e declarado passível de pena por lei ANTERIOR AO
MOMENTO DA PRÁTICA DO FACTO. Com este conteúdo e esta extensão a
proibição de retroatividade da lei penal fundamentadora ou agravadora da punibilidade
constitui uma das traves de todo o Estado.
Artigo 29º nº2,3,4 da CRP.

➢ Determinação do tempus delicti


Pressuposto de atuação do principio da irretroatividade é a determinação do tempus
delicti, isto é, daquele que deve considerar-se o MOMENTO DA PRÁTICA DO FACTO.
Para responder a duvidas do foro de estabelecer em que momento temporal queremos
estabelecer o parâmetro de medida, quer pela ação ter tomado place num momento mas
a consequência só se verificar posteriormente, quer pelo facto de ser uma omissão ou por
não ser só uma conduta, dispõe o artigo 3º que “o facto considera-se praticado no
momento em que o agente atuou ou, no caso de omissão , deveria ter atuado,
independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido”.
A não retroatividade significa que essa norma tem de ser anterior ao facto, tem de
estar em vigor aquando da sua perpetração, não pode ser estabelecida para tornar ilícito
um facto que o não era no momento em que foi cometido.
Da referida disposição legal resulta que decisivo para determinação do momento
da prática do facto é a CONDUTA, não o resultado.

A segunda conclusão a retirar da regulamentação é a de que ela vale para todos os


comparticipantes no facto criminoso, venha a sua responsabilização a ter lugar a titulo
de autores ou apenas de cúmplices (artigos 26º e 27º). Porque tanto aqueles como estes,
obviamente, são credores da proteção e garantia que o principio da legalidade se
propõe oferecer.

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Problema especial é constituído por todos aqueles crimes em que a conduta se
prolonga no tempo, de tal modo que uma parte ocorre no domínio da lei antiga, outra
parte no da lei nova; e de que é exemplo paradigmático o dos crimes duradouros,
também chamados “permanentes” por exemplo, o crime de sequestro (artigo 158º). A
melhor doutrina parece ser aqui a de que qualquer agravação da lei ocorrida antes do
término da consumação só pode valer para aqueles elementos típicos do comportamento
verificados após o momento da modificação legislativa. E solução paralela parece
defender-se para o chamado crime continuado.

• Qual é o momento, por remissão ao qual algo será retroativo ou não?


▪ Momento da prática do facto – Em matéria de aplicação da lei
no tempo, começa-se sempre por determinar o momento da prática
do facto.
▪ Critério do art. 3º CP – diz que o momento da pratica do facto
determina-se pelo momento em que o agente atuou, não pelo
momento do resultado.
• Só há homicídio quando há morte. O homicídio consuma-
se quando há morto. Até lá só há tentativa de homicídio.
Mas em que momento se verificou o momento da pratica
do facto? Foi quando A deu o tiro a B, porque o que
interessa é a atuação, nunca é o resultado.
É assim porque:
→ Segurança jurídica;
→ Garantia do princípio da culpa.
Aquilo que consigo controlar é o comportamento; o resultado é aleatório. Não é
possível controlar o resultado. Portanto, é no momento em que se atua que se tem
condições para confrontar o comportamento criminoso com a lei no momento em
que atuam, porque o resultado não depende do criminoso. Entretanto a lei pode já ter
mudado várias vezes. Para evitar a aleatoriedade da verificação do resultado e garantir a
segurança jurídica e a garantia do principio da culpa, o que releva é sempre o momento
em que o agente atua, não o momento do resultado.

A segunda conclusão a tirar da regulamentação é a de que ela vale para todos os


comportamentos no facto criminoso, venha a sua responsabilização a ter lugar a título de
autores ou apenas de cúmplices (artigos 26.º e 27.º CP). Porque tanto aqueles como estes,
obviamente, são credores da proteção e garantia que o princípio da legalidade se propõe
oferecer. Problema especial é constituído por todos aqueles crimes em que a conduta se
prolonga no tempo, de tal modo que uma parte ocorre no domínio da lei antiga, outra
parte no da lei nova; e de que é exemplo paradigmático o dos crimes duradouros, também
chamados permanentes. A melhor doutrina parece ser aqui a de que qualquer agravação
da lei ocorrida antes do término da consumação só pode valer para aqueles elementos

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típicos do comportamento verificados após o momento da modificação legislativa. E
solução paralela parece dever defender-se pra o chamado crime continuado (artigo 30.º,
n.º2 CP).

Contudo, é complicado, porque:


→ Há crimes, embora sendo instantâneos (que se consumam num momento
especifico no tempo), não quer dizer que a atuação tenha sido num só
momento; podem ser de execução faseada (ex: envenenamento). Em que
momento é a pratica do facto – crime instantâneo em que a execução é faseada.
→ Há crimes que são permanentes (quando durante certo tempo se realiza uma
conduta criminosa), que estão permanentemente a ser executados ou
consumados, entrando várias leis em vigor durante essa conduta. São um
estado de ilicitude que permanece por decisão constante do arguido (ex:
condução sobre o efeito de álcool entre as 23h e as 2h e a lei muda às 24h). O
momento da conduta é das 23h às 2h. Em todo este momento o agente realizou
a conduta considerada criminosa. Temos um crime permanente. V. art. 119º
do CP.
→ Há crimes continuados (pluralidade de crimes que são tratados pelo Direito
como se fossem apenas um) – art. 30º/2 e 3 do CP. O direito trata vários crimes
como se fossem apenas um, porque existe um quadro de solicitação externa
que diminui sensivelmente a culpa do agente. Todos foram praticados no
mesmo contexto em que o agente estava a vivenciar uma situação em que
havia qualquer coisa na realidade externa que o puxava para a prática do
crime, que diminuía as suas resistências à pratica do crime. Mas não é um
quadro qualquer que o chama para o crime: é um tal que qualquer pessoa
olhasse para ele e dissesse que diminuía a culpa do agente.

A aplicação do critério a vários casos práticos pode revelar-se difícil. Em todos estes
casos temos de aplicar o critério do art. 3º do CP.
• O facto é de homicídio, disparou a arma dia 10 e é punido com 8 a 16 anos. No
dia 15 entra em vigor a lei 2, que aumenta o homicídio para 20 anos. No dia 20, o
juiz tem de decidir se aplica a lei um ou a lei 2. Neste caso, o que temos de dizer
é que existe um principio fundamental no nosso ordenamento: o principio da
irretroatividade desfavorável da lei penal. Qualquer lei posterior ao momento
da pratica do facto, se for desfavorável (e aqui é, porque aumenta a pena, não se
aplica retroativamente, ou seja, aplicar a lei posterior a um facto anterior).
• Nestes casos, o que se aplica é a lei do momento da prática do facto. Está previsto
no art. 1º/1 e 2º/1 CP – em principio aplica-se a lei do momento da pratica do
facto, o que significa que leis penais desfavoráveis não se podem aplicar
retroativamente. A retroatividade favorável é resgatada pelo 2º/2 e o 2º/4 CP
e 29º/4 CRP. É assim devido à segurança jurídica – para impedir que a pessoa
pudesse ser alvo de um poder arbitrário do Estado; a pessoa não pode
depender do bom ou mau humor do decisor político – e ao princípio da culpa –

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posso ser censurado por, tendo condições para conhecer a lei e puder confrontar
o meu crime com a lei, mas não posso ser censurado por um alei que só entrou em
vigor depois da prática do meu facto. conhecendo esta lei, sabendo o que esta lei
punia e proibia, ainda assim ter decidido violar essa lei.

No entanto, pode acontecer que a pena posterior diminua. Neste caso, aplica-se a lei 2,
porque existe um principio de retroação de lei posterior mais favorável. O que se aplica é
a lei 2. MENTIRA
→ Há um erro muito comum que é o de dizer que se aplica a lei 2 porque é a lei
mais favorável. É absurdo dizer que se aplica uma lei porque ela é a mais
favorável. O que existe é o principio da aplicação retroativa da lei penal posterior
mais favorável. Quando uma lei posterior for mais favorável, ela aplica-se
retroativamente. Mas não basta ser mais favorável (art. 2º/2 – situação de
descriminalização - e 2º/4 – o crime continua a existir, mas é atenuado).
→ Qual é o fundamento? O fundamento aqui é principio da necessidade e da
igualdade. Da necessidade, a partir de hoje 5 anos é suficiente para proteger
aquela situação. A partir deste momento, mais nenhum tribunal pode aplicar uma
pena que seja superior a 5 anos, devido ao art. 18º/2 CRP. Estes 5 anos passam a
valer para todos os factos posteriores e, retroativamente, aplicam-se aos factos
anteriores. O principio da igualdade, porque, no caso em que a lei 2
descriminalizava o que antes era crime, se a lei 2 não se aplicasse retroativamente
e o senhor x não fosse libertado, ele, atras das grades, ia estar a ver as outras
pessoas a fazer aquilo que ele fez e a não serem punidas. Isto em termos de
igualdade introduzia uma perturbação inaceitável no sistema.

➢ Âmbito de aplicação da proibição


Tal como vimos suceder com a proibição de analogia – e pelas mesmas razões
substanciais – também a proibição de retroatividade funciona apenas a favor do agente,
não contra ele. Por isso a proibição vale relativamente a todos os elementos da
punibilidade, à limitação de causas de justificação, de exclusão ou de diminuição da culpa
e às consequências jurídicas, qualquer que seja o crime, qualquer que seja a espécie.

O princípio geral da não retroatividade das leis assume no Direito Penal a natureza
de uma proibição constitucional de retroatividade das normas penais que criem ou
agravem a responsabilidade penal.
Os fundamentos de tal proibição são:
→ Quanto às normas incriminadoras, os princípios da:
o Culpa – a possibilidade de uma conduta ser retroativamente
incriminada contradiria uma responsabilidade penal fundamentada
na livre determinação do agente pela norma jurídica;

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o Segurança jurídica – tal possibilidade levaria ainda a destruir a
garantia das expectativas dos cidadãos quanto ao que é proibido.
→ Quanto às sanções criminais, a retroatividade afetará sobretudo a
segurança, permitindo abusos de poder, pela alteração a todo o tempo
possível das espécies e limites das sanções.

A proibição de retroatividade corresponde, assim, à garantia de que o exercício do


poder punitivo seja exercido de acordo com critérios e limites conhecidos
antecipadamente e não alteráveis por força de um interesse particular ou para
resolver um caso concreto antes não previsto.

Desta fundamentação da proibição da retroatividade resulta o seu âmbito no Direito Penal.


São, deste modo, contempladas com a proibição da retroatividade:
→ As incriminações
→ As agravações da responsabilidade criminal
→ As penas
→ Os pressupostos das medidas de segurança
→ As medidas de segurança
→ Todas as normas processuais que afetem diretamente direitos, liberdades e
garantias
Figueiredo Dias: A proibição de retroatividade funciona apenas a favor do agente, não
contra ele. Por isso, a proibição vale relativamente a todos os elementos de punibilidade,
à limitação de causas de justificação, de exclusão ou de diminuição da culpa e às
consequências jurídicas do crime (penas, medidas de segurança, consequências penais).

Pressupostos da retroatividade: a interpretação jurídica e o problema do conceito


de retroatividade
A retroatividade só existe se o regime previsto numa lei se puder referir a um determinado
tipo de situação anterior à sua vigência. Cf. o art. 3º CP, tal situação é referida ao
momento da prática da ação criminosa ou, no caso de omissão, no momento em que
agente devia ter atuado.
→ Assim, se a lei em causa for anterior à produção do resultado típico, mas posterior
à prática da ação prevista, já haverá retroatividade.
→ A retroatividade pressupõe que a lei penal se pretende referir, segundo a
interpretação jurídica, a certos factos anteriores.
PEDRO CAEIRO: Irretroatividade da lei penal não é um princípio geral: é um regime
particular a que estão sujeitas as normas de certo conteúdo (desfavoráveis ao agente).
→ A eficácia de qualquer lei está sujeita ao princípio segundo o qual uma lei não
pode aplicar-se a factos que com ela não se acham em contacto.

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→ Princípio da não-transconexão – apreciação de factos de acordo com as
regras que valiam no momento da produção dos mesmos – é princípio geral
de direito e só cede perante casos excecionais, em homenagem a outros valores
que o legislador constitucional decidiu sobrepor-lhe.
o Isto leva a que no Direito Penal haja uma proibição da retroatividade in
pejus e imposição de retroatividade in melius.
→ A este princípio geral, acresce o princípio da legalidade, que proíbe a aplicação
retroativa de lei penal desfavorável.

Proibição da retroatividade in pejus coincide com o princípio da não-transconexão


e dá dignidade constitucional à proibição da aplicação retroativa da lei nova
(desfavorável) a factos que não estiveram em contacto com ela.
→ Mas, esta proibição, em certos casos, pode funcionar como regra de conflito e
implicar desvios ao princípio da não-transconexão, conferindo eficácia ultra-ativa
imprópria à lei antiga para regular factos que se produzem parcialmente após a
cessação da sua vigência.

Terceiro princípio que regula a eficácia temporal da lei penal é o princípio do


tratamento mais favorável do agente, que tem como corolário principal a imposição
de aplicação retroativa da lei mais favorável – art. 29º/4 CRP e 2º/2 e 4 CP – é pedra
angular de todo o sistema
→ Tem uma génese e fundamento especificamente político-criminal de ausência de
exigências de prevenção que justifiquem a persistência da aplicação ao cado da
lei mais severa que vigorava no momento da prática do facto, que em nada se
relaciona com o princípio da proibição da retroatividade in pejus, cuja génese e
fundamento é políticojurídico de defesa da liberdade dos cidadãos contra o
arbítrio do Estado.

▪ MEDIDAS DE SEGURANÇA
Art. 29º/1 e 3 CRP + art. 2º CP – não traz dificuldades nenhumas quanto à conclusão
que tanto as medidas de segurança como os seus pressupostos (factos típicos de que
decorre o indício da perigosidade do agente) também estão sujeitas à proibição da
retroatividade.
O fundamento da proibição de retroatividade não é essencialmente a culpa, mas sim a
segurança dos destinatários do Direito, própria de um Estado de Direito democrático.
Quer a alteração agravante de uma medida de segurança, quer a sua criação, afetam a
segurança, na medida em que permitam uma intervenção sem controlo do poder punitivo
na liberdade dos cidadãos.
→ Prof. Fernanda Palma: a ausência de limites à intervenção do Estado, mesmo
que em nome da prevenção e da política criminal, contendem com a segurança,

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que é fundamento da proibição de retroatividade das medidas de segurança.
Também a tese defendida na doutrina portuguesa por Maria João Antunes (e
apoiada pelo Prof. Figueiredo Dias), segundo a qual a proibição de retroatividade
nas medidas de segurança seria excetuada no momento da formulação pelo
Tribunal do juízo de perigosidade “aplicando-se a lei vigente no momento da
formulação do juízo de perigosidade” é uma redução teleológica do art. 2º/1 CP,
contra o arguido.
o Com efeito, a chamada tese diferenciadora excluiria, na prática, da
proibição de retroatividade os factos reveladores da perigosidade que
justificam a medida de segurança, com o argumento de que os referidos
pressupostos são essenciais para escolher a medida adequada à
perigosidade do agente no momento em que é condenado – proibição da
retroatividade apenas referente à medida em si e não aos pressupostos.
▪ Crítica: quebrar-se-ia a conexão dos indícios de perigosidade como
pressuposto que é a prática de um facto típico e ilícito, admitindo-
se, desse modo, uma medida de segurança para uma perigosidade
desligada do facto típico e ilícito.

Taipa de Carvalho:
O princípio da aplicação da lei mais favorável vale igualmente para as medidas de
segurança:
Proibição da retroatividade da lei criminalizadora do facto-pressuposto da
declaração de perigosidade do delinquente e da lei que estabeleça uma medida de
segurança mais grave, e imposição da retroatividade da lei descriminalizadora do facto-
pressuposto e da lei que estabeleça uma medida de segurança mais favorável.

Processo Penal:
FD: princípio jurídico-constitucional da legalidade estende-se a toda a repressão penal e
abrange, nesta medida, o próprio direito processual penal
 Princípios reguladores da aplicação da lei penal no tempo e as formas da sua
articulação valem para toda a lei penal, independentemente da sua natureza
substantiva ou processual.

Mas,
Do art. 5º/1 CPP, resulta a aplicabilidade imediata da nova lei processual nova.
O art.5º/2 limita a aplicabilidade imediata, relativamente “aos processos iniciados
anteriormente à sua vigência”, nos casos de “agravamento sensível da situação
processual do arguido” e de “quebra de harmonia e unidade de vários atos do processo”.

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Há, assim, limites à aplicabilidade imediata resultantes diretamente do princípio
constitucional da proibição da retroatividade e do próprio subprincípio contido no art.
5º/2.
→ Limites à aplicabilidade imediata resultantes do próprio subprincípio contido
no art. 5º/2 CPP
Os limites previstos no art. 5º/2 referem-se nitidamente a normas processuais das
quais derive um efeito essencial para a posição processual do arguido na relação jurídica
punitiva, na sua fase processual. São normas que, embora não afetando a existência da
relação jurídica punitiva nem a modificando substancialmente, atingem a possibilidade
de o comportamento do arguido realizar os direitos que lhe são reconhecidas no
processo penal, como por exemplo o direito de defesa.

→ Limites à aplicabilidade imediata resultantes diretamente do princípio


constitucional da proibição da retroatividade
O primeiro tipo de limites exclui a aplicabilidade imediata de todas as normas do Processo
Penal que não se possam caraterizar como puras normas processuais, mas que sejam de
natureza substantiva penal numa conexão fundamentadora da responsabilidade do
arguido.
• Aplicabilidade imediata justifica-se, apenas, relativamente a normas que regulem o
modo de proceder dos tribunais na definição concreta do Direito Penal e não já
relativamente a normas que se refiram às condições de procedibilidade ou causas de
extinção do procedimento criminal, como acontece com as normas que regulam os prazos
prescricionais, na medida em que estas delimitem direta e exclusivamente a relação
jurídica punitiva.

Em muitas ordens vigora hoje a ideia de que a proibição não vale relativamente ás
medidas de segurança; na base mais uma vez, de que se trata aí de medidas de prevenção
especial positiva comandadas pelo “verdadeiro bem” do agente. E a ideia teve curso entre
nós até à CRP atual. Hoje, porém existem injunções legais, constitucionais e ordinárias,
que terminantemente afastam uma tal doutrina. Também relativamente ás medidas de
segurança se fazem sentir exigências de proteção dos direitos, liberdades e garantias das
pessoas atingidas que substancialmente se identificam com as que se fazem sentir ao nível
das penas.
De considerar é agora todavia a doutrina diferenciadora proposta por Maria Joao
Antunes: “Se no tocante ao pressuposto ‘prática de facto ilícito tipico’ vale a lei vigente
no momento da prática do facto, já quanto ao pressuposto ‘fundado receio de que o
agente venha a cometer outros factos ilícitos tipicos’ poderá valer a lei vigente no
momento da formulação deste juízo de perigosidade”. Por isso “a medida de segurança
só é aplicável se o facto for descrito e declarado passivel de pena por lei anterior ao
momento da sua prática; a medida de segurança não é aplicável se o facto punível
segundo a lei vigente no momento da sua prática deixar de o ser, por uma lei nova o
eliminar do numero das infrações, ainda que haja decisão transitada em julgado; a

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medida de segurança a aplicar, em concreto, determina-se pela lei vigente no momento
da decisão (o momento do preenchimento pressuposto da perigosidade criminal do
agente), excluindo-se a lei vigente no momento da execução; a medida de segurança a
aplicar determina-se pela lei vigente no momento da decisão, ainda que a lei vigente no
momento da prática do facto ilícito típico não determinasse a mesma medida.”

Questão interessante é a de saber se submetida à proibição de retroatividade está só a lei


ou também a jurisprudência. Deverá admitir-se que uma corrente de aplicação
jurisprudencial definida e estabilizada possa ser alterada – mesmo sem alteração da lei –
contra o agente?
A aplicação da nova corrente jurisprudencial que determina a punição do facto
praticado ao tempo da jurisprudência anterior, que o considerava criminalmente
irrelevante, não constitui propriamente uma violação do princípio da legalidade; mas –
como conclui também Nuno Brandão – não deixa de pôr em causa valores que lhe estão
associados, pela frustração das expectativas quanto à irrelevância penal da conduta,
formadas com base numa interpretação judicial, entre nós eventualmente publicada no
DR, quando se trate de entendimento definido em recurso ordinário para fixação de
jurisprudência (artigo 444.º, n.º1 CPP).
Questão muito discutida é, por fim, a de saber se a proibição de retroatividade se estende
aos pressupostos da punição, positivos e negativos, e aos pressupostos processuais. O
problema concretamente mais relevante situa-se em matéria de prazos de prescrição. Urge
considerar, por outro lado, que em matéria processual o nosso ordenamento jurídico
dispõe, no CPP, de uma norma especificamente dirigida à questão: a do artigo 5.º, que
contém o princípio da aplicação imediata da lei nova, mas lhe introduz decisivas
limitações quando dele derive – no que ao presente enquadramento interessa – um
agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente
uma limitação do seu direito de defesa.

Apesar da sua aparente simplicidade, esta regulamentação deu já entre nós origem
a uma série de duvidas. Um primeiro grupo de casos é formulado pelas situações em que
determinada conduta deixa de ser crime e passa a constituir contra-ordenação. Há quem
defenda que nesses casos o facto deixa de ter relevância jurídica, não podendo ser objeto
de punição penal, nem contra-ordenacional. E isto porque, atendendo à autonomia
material do direito contra-ordenaciona face ao direito penal, se argumenta que dada a
descriminalização, não poderá o facto ser punido criminalmente mas também não poderá
ser sancionado a titulo contra-ordenacional uma vez que no momento da sua prática não
existia ainda uma norma legal que para ele cominasse uma coima.
O que deve perguntar-se é se a proteção do cidadão perante o poder punitivo estadual e a
tutela das suas expectativas, que conferem também razão de ser ao principio da legalidade
contra-ordenacional, são substancialmente postas em causa com uma eventual punição
contra-ordenacional nestas circunstâncias. E a resposta parece não deixar de ser negativa,
pois no momento da prática do facto não existiam razões para que o agente pudesse
esperar ficar impune; acabando com a aplicação da sanção contra-ordenacional, por

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beneficiar de um regime que lhe é concretamente mais favorável. O ponto de vista em
critica pode dar origem a soluções injustas e incompreensíveis para a sociedade.
Pense-se, por exemplo, na hipótese, de para efeitos do crime de condução de
veículo em estado de embriaguez, num primeiro momento o legisladosr decidir baixar o
limite de 1,2 g/l para 0,8 g/l; e num segundo momento, face à pressão da opinião pública,
voltar a colocar esse limite em 1,2 g/l. PERGUNTA-SE: seria razoável que o
comportamento daquele que, entre o primeiro momento e o segundo, conduziu com 1 g/l
se transformasse em juridicamente irrelevante, subsistindo a punibilidade contra-
ordenacional de todos aqueles que na mesma data conduziram com uns meros 0,6? A
resposta é obviamente negativa, e o exemplo demonstra por si só que o ponto de vista é
o de que o facto que deixou de ser crime e passou a constituir contra-ordenação deve
continuar a merecer sanção contra-ordenacional.
Encontra-se hoje este pensamento acabado de explanar na regulamentação constante da
L 25/2006 e da L 30/2006. Atendendo a que condutas que aí consideradas deixam de
ser contravenções e passam a contra-ordenações, estatui-se que as condutas
praticadas antes da entrada em vigor do novo regime são já sancionadas como
contra-ordenações, sem prejuízo da aplicação do regime mais favorável,
nomeadamente quanto á medida da sanção. Os processos que se encontrarem já
pendentes nos tribunais continuam aí a sua tramitação, mas a sanção aplicada será a
coima.

➢ As hipóteses de atenuação da consequência juridica


O mesmo que se expôs para as hipótese de descriminalização deve defender-se para
o caso em que a nova lei atenua as consequências jurídicas que ao facto se ligam,
nomeadamente a pena, a medida de segurança ou os efeitos penais do facto. Também
neste caso a lex mellior deve ser retroativamente aplicada, todavia, de acordo com o
disposto no artigo 2º/4, com ressalva dos casos julgados. Tem-se pretendido que a
diferença aqui existente relativamente à lei descriminalizadora – a de que nos casos agora
em estudo o principio já não atua perante uma sentença transitada em julgado – seria
inconstitucional por a restrição não conssual penal (artigo 445º e 446º do CPP).

➢ O principio da aplicação da lei mais favorável


A consequência teórica e praticamente mais importante do principio segundo o qual a
proibição de retroatividade só vale contra o agente, não a favor dele, consubstancia-se no
principio da aplicação da lei ou do regime mais favorável (lex mellior).
Artigo 2º/4 CP – “Quando as disposições penais vigentes no momento da prática do facto
punível forem diferentes das estabelecidas em leis posteriores, é sempre aplicado o regime
que concretamente se mostrar mais favorável ao agente, salvo se este já tiver sido
condenado por sentença transitada em julgado”,
Artigo 29/4 2ª parte – manda aplicar “retroativamente as leis penais de conteúdo mais
favorável ao arguido”.

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▪ As hipóteses de descriminalização
A primeira situação será aquela em que uma lei posterior à pratica do facto deixe de
considerar este como crime (descriminalização em sentido técnico).
Uma tal situação cabe em rigor dentro do principio de aplicação da lei mais favorável e
não exigiria a sua consagração expressa; ou porque se diga que a lei mais favorável é aqui
a lei revogatória da criminalização, ou porque à conclusão se chegaria através de um
argumento de analogia (permitida).
Todavia o CP contempla diretamente o caso no artigo 2º/2 nos termos seguintes: “O facto
punível segundo a lei vigente no momento da sua prática deixa de o ser se uma nova lei
o eliminar do numero das infrações; neste caso, e se tiver havido condenação, ainda que
transitada em julgado, cessam a execução e os seus efeitos penais.”
A primeira parte do preceito não seria indispensável; mas já não assim a segunda
parte, que traduz a ideia de a eficácia do principio de aplicação da lex mellior ser tão forte
que, quando se analise numa descriminalização direta do facto, ela se impõe no que toca
à execução e aos seus efeitos penais, ainda no caso de a sentença condenatória ter já
transitado em julgado – o que se compreende considerando que, se a conceção do
legislador se alterou até ao ponto de deixar de reputar jurídico-penalmente relevante um
comportamento, não tem qualquer sentido politico-criminal manter os efeitos de uma
conceção ultrapassada.
A conformidade com o artigo 29º/4 da CRP de ressalva de casos julgados prevista no
artigo 2º/4 do CP, não significa que a mesma não possa ser eliminada ou restringida, fruto
de uma nova opção legislativa. – SE TIVER HAVIDO CONDENAÇÃO, AINDA QUE
TRANSITADA EM JULGADO, CESSAM A EXECUÇÃO E OS SEUS EFEITOS
PENAIS LOGO QUE A PARTE DA PENA QUE SE ENCONTRAR CUMPRIDA
ATINJA O LIMITE MÁXIMO DA PENA PREVISTA NA LEI POSTERIOR” –
desta proposta não resulta uma imposição de reabertura do processo para nova
determinação da pena concreta no quadro da nova moldura penal aplicável, mas
somente um limite à execução da pena concreta aplicada na condenação transitada
em julgado, que coincide com o limite máximo da pena aplicável pela lei nova mais
favorável. Em todo o caso, “O CONDENADO PODE REQUERER A REABERTURA
DA AUDIÊNCIA PARA QUE LHE SEJA APLICADO O NOVO REGIME”. Da nova
redação proposta para o artigo 2º/4, resulta que a ressalva dos casos julgados só é afastada
em caso de execução de uma pena principal e já não de uma substituição, uma vez que só
é possível avaliar se o tempo de execução corresponde à pena máxima aplicável pela lei
posterior se ambas forem da mesma espécie.

▪ As leis intermédias
O principio da aplicação da lei mais favorável vale ainda mesmo relativamente ao que
na doutrina se chama leis intermédias, isto é, leis que entram em vigor posteriormente à

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prática do facto, mas já não vigoravam ao tempo da apreciação judicial deste (por
exemplo, a punição vigente no momento do delito foi substituída por uma menos grave,
mas esta foi, antes da sentença, revogada por entretanto se ter considerado que era
demasiado leve e reposta a punição anterior). Esta solução é completamente coberta pela
letra tanto do artigo 29º/4, 2ª parte CRP como pelo artigo 2º/4 1ª parte do CP. E justifica-
se teleológica e funcionalmente porque com a vigência da lei mais favorável (intermédia)
o agente ganhou uma posição jurídica que deva ficar a coberto da proibição da
retroatividade da lei mais grave posterior.

▪ As Leis Temporárias
Uma exceção ao principio da aplicação da lei mais favorável está consagrada no artigo
2º/3, para as chamadas leis temporárias: “Quando a lei valer para um determinado
período de tempo, continua a ser punível o facto praticado durante esse período”. Leis
temporárias devem considerar-se apenas aquelas que são editadas pelo legislador para um
tempo determinado: seja porque este período é desde logo apontado pelo legislador em
termos de calendário ou em função da verificação ou cessação de um certo evento, por
exemplo a duração de um estado de sitio ou de um estado de guerra – as chamadas leis
temporárias em sentido estrito – seja porque aquele período se torna reconhecível em
função de certas circunstâncias temporais – as chamadas leis temporárias em sentido
amplo. Comum é a circunstância de a lei cessar automaticamente a sua vigência uma vez
decorrido o período de tempo para o qual foi editada. A razão que justifica o afastamento
da aplicação da lei mais favorável reside em que a modificação legal se operou em função
não de uma alteração da conceção legislativa mas unicamente de uma alteração das
circunstancias fácticas (pense-se nomeadamente em termos de direito penal económico)
que deram base á lei.
Não existem aqui expectativas que mereçam ser tuteladas enquanto, por outro lado, razões
de prevenção geral positiva persistem.

LECIONADO NA AULA TEÓRICA NA MATÉRIA SOBRE PROIBIÇÃO DA


RETROATIVIDADE:
Nullum crimem, nulla poena sine legem previa
Art. 29º/3 da CRP – proibição da retroatividade. E atigo 1º e 2º do CP – ambos tratam
da aplicação da lei penal no tempo.
A proibição da retroatividade é o mais incisivo dos subprincípios do principio da
legalidade. A ideia fundamental é da segurança jurídica – as pessoas não podem ser
censuradas por coisa que não eram crimes aquando da conduta (mera presença do
principio da culpa).

Porque é que a proibição da retroatividade não se pode basear no principio da


culpa?

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Distinção entre pena e medidas de segurança: para que se aplique que se aplique
uma medida de segurança é preciso que se aplica o um crime ou não? Não. Então o que
é preciso acontecer para que se aplica uma medida de segurança? É preciso que haja
um facto típico e ilícito, e porque é que este não é crime? Porque o agente é inimputável,
não pode ser suscetível de culpa. Falta ser um ato culposo. Um crime é um facto ilícito,
típico e culposo. Para que se aplique uma medida de segurança tem que existe a
perigosidade do agente. A distinção tradicional é apresentada nestes termos, o
fundamento da pena é o crime, e da medida de segurança é a perigosidade do agente
(contudo à divergências quanto a isto).
O facto das medias de segurança tenham esta configuração leva-nos a concluir que estas
não se podem explicar pela culpa – porque não há culpa. A aplicação de retroatividade
de medidas de segurança é proibida e não é por causa da culpa. Arts. 1º e 2º do CPC.

A CRP e CP portugueses são bastantes inovadores, porque naquele tempo, a experiencia


alemã era a de subtrair as medidas de segurança à proibição da retroatividade. A visão
era a de que havia muita flexibilidade quanto às medidas de segurança.

A questão que ainda se coloca é a de saber como é que determinamos a retroatividade?


Falamos do momento do julgamento e do facto – critério do art. 3º do CP. Não pode ser
do resultado: se uma pessoa fizer de tudo para matar uma pessoa e é condenado de
tentativa de homicídio, e a pessoa passado um mês não se pode alterar a condenação
para homicídio qualificado. O momento da pratica do facto pode tornar-se difícil de
interpretar em crimes que perduram no tempo – por exemplo o rapto (consuma-se no
momento em que perder o direito à liberdade e termina quando cessa a violação do
bem jurídico). O crimes está em consumação permanente até a vitima ser libertada. A
lei pode mudar a meio, para agravar a responsabilidade. Há retroatividade no momento
do julgamento se aplicar a lei nova? É obvio que quando são julgados um ano depois
aplica-se a lei nova, porque quando a lei mudou o crime ainda não estava esgotada a
consumação da prática do crime.
Situações de crime continuado – art. 30º (30º/2 em específico – tipificação de crime
continuado) e 79º do CP. A mais recente atualização do livro das lições foca muito bem
a evolução do tema. Exemplo: no séc. XIX havia nos hotéis o habito de deixar os sapatos
para engraxar à porta – um ladrão repetidamente e consequentemente vai lá roubar
sapatos toadas as noites (energia criminosa é menos forte porque houve um fator
exógeno que facilita a continuação do crime – houve uma oportunidade repetida) – ver
EDUARDO CORREIRA, em resposta a este caso. Ou o caso de um buraco no armazém do
supermercado que facilita o roubo de mercadorias todas as noites, repetidamente.
Soluções: a da reforma. Uma acabar com o crime continuado, aplicar as duas leis – faz-
se um concurso de crimes; outra hipótese é partir do princípio que há uma unidade
criminosa especifica que nos permite aplica a lei nova da lei mais grave (é aceitável para
a regente, mas pode haver casos em que faça sentido separar). Há ainda outras
intermédias – por exemplo, aplicar sempre a anterior (para a regente não é aplicável).

➢ As hipóteses de atenuação da consequência jurídica


O mesmo que se expôs para as hipóteses de descriminalização deve defender-se para o
caso em que a nova lei atenua as consequências jurídicas ao facto que se ligam,

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nomeadamente, a pena, a medida de segurança ou os efeitos penais do facto. Também
neste casso a lex mellior deve ser retroativamente aplicada, todavia, de acordo com o
disposto no art 2º/4, com ressalva dos casos julgados. A diferença aqui existe
relativamente à lei descriminalizadora – a de que nos casos agora em estudo o principio
já não atua perante uma sentença transitada em julgado – seria inconstitucional por a
restrição não conssual penal /arts 445º e 446º do CPP).

➢ As hipóteses de descriminalização
A primeira situação e mais radical, será aquela em que uma lei posterior à pratica do facto
deixe de ser crime (descriminalização em sentido técnico). Uma tal situação cabe em rigor
dentro do principio de aplicação da lei mais favorável e não exigiria portanto a sua
consagração expressa; ou porque se diga que a lei mais favorável é aqui a lei revogatória
da criminalização, ou porque á conclusão se chegaria através de um argumento de
analogia (permitida).
Todavia o CP contempla diretamente o caso no art. 2º/2 nos termos seguintes: “O facto
punível segundo a lei vigente no momento da sua prática deixa de o ser se uma lei nova
o eliminar do numero das infrações; neste caso, e se tiver havido condenação, ainda
que transitada em julgado, cessam a execução e os seus efeitos penais”.

De acordo com o que acaba de dizer-se, a primeira parte do preceito não seria
indispensável; mas já não assim a segunda parte que traduz a ideia de a eficácia do
principio de aplicação da lex mellior ser tão forte que, quando se analise em
descriminalização direta do facto, ela se impõe, no que toca à execução e aos seus efeitos
penais; ainda no caso de a sentença condenatória ter já transitado em julgado. O que tudo
se compreende considerando que se a conceção do legislador se alterou até ao ponto de
deixar de reputar jurídico-penalmente relevante um comportamento, não tem qualquer
sentido politico-criminal manter os efeitos de uma conceção ultrapassada.

AMBITO DE VALIDADE ESPACIAL DA LEI PENAL


➢ Aplicação da lei penal no espaço e os seus princípios constitutivos
O conjunto dessas disposições é vulgarmente chamado direito penal internacional,
analisando-se o seu conteúdo em regras ou critérios de aplicação da lei penal no espaço.
Tradicionalmente, a expressão direito penal internacional, com o sentido dado era
utilizada para contra-distinguir este conjunto de regras, vigente na ordem jurídica
nacional, do direito internacional penal enquanto ramo do direito internacional público
que tem por objeto a matéria penal.

A conformação do sistema estadual de aplicação da lei penal no espaço baseia-se em


diversos princípios e num certo modelo da sua combinação. Estes princípios não
assumem, todos eles, igual hierarquia, antes existindo um principio-base e princípios

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acessórios ou complementares. O principio-base do nosso sistema é o principio da
TERRITORIALIDADE, segundo o qual o Estado aplica o seu direito penal a todos os
factos penalmente relevantes que tenham ocorrido no seu território, com indiferença por
quem ou contra quem foram tais factos cometidos. Um principio acessório é o principio
da NACIONALIDADE, segundo o qual o Estado pune todos os factos penalmente
relevantes praticados pelos seus nacionais, com indiferença pelo lugar onde eles foram
praticados e por aquelas pessoas contra quem o foram. Outro principio complementar é o
principio da DEFESA DOS INTERESSES NACIONAIS, segundo o qual o Estado exerce
o seu poder punitivo relativamente a factos dirigidos contra os seus interesses nacionais
específicos, sem consideração do autor que os cometeu ou do lugar em que foram
cometidos. Depois, o principio complementar da APLICAÇÃO UNIVERSAL ou da
UNIVERSALIDADE, manda o Estado punir todos os factos contra os quais se deva lutar
a nível mundial ou que internacionalmente ele tenha assumido a obrigação de punir, com
indiferença pelo lugar da comissão, pela nacionalidade do agente ou pela pessoa da
vitima.

Finalmente, a revisão do CP de 1998 introduziu na al. E) do art 5º-1 o principio da


ADMINISTRAÇÃO SUPLETIVA DA JUSTIÇA PENAL, pondo termo a uma lacuna
para a qual havíamos alertado. Assim, de acordo com aquela norma, a lei portuguesa
passa a ter competência para conhecer os factos que não se encontrando sujeito ás regras
anteriores, foram praticados no estrangeiro por estrangeiros que se encontram em
Portugal e cuja extradição, tendo sido requerida, não pode ser concedida.

➢ Conteúdo e sistema de combinação dos princípios aplicáveis


o O principio básico da territorialidade
A generalidade dos sistemas legislativos penais dos nossos dias assume como principio
basilar de aplicação da sua lei penal no espaço o principio da territorialidade, não o da
nacionalidade. E é esta a posição tradicional do direito português.

As razões jurídico-internacionais e de politica estadual – a assunção do principio da


territorialidade como base do sistema de aplicação da lei penal no espaço é a via que
facilitará em maior medida a harmonia internacional, o respeito pela não ingerência em
assuntos de um Estado estrangeiro. Se a aplicação espacial da lei nacional é rigorosamente
demarcada por sobre as fronteiras de cada Estado.

Quanto ás razões jurídico-penais e de politica criminal que aqui desempenham o seu


penal, deve antes de tudo dar-se ênfase à circunstancia de ser na sede de delito que mais
vivamente se fazem sentir as necessidades de punição e de cumprimento das suas
finalidades, nomeadamente de prevenção geral positiva. É a comunidade onde o facto
teve lugar que viu a sua paz jurídica por ele perturbada e que exige por isso a sua confiança
no ordenamento jurídico e as suas expectativas na vigência da norma sejam estabilizadas
através da punição. A estas razões acresce que o lugar do facto é também aquele onde

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melhor se pode investiga-lo e fazer a sua prova e onde existem mais fundadas expectativas
de que possa obter-se uma decisão judicial justa.

O PRINCIPIO GERAL DA TERRITORIALIDADE encontra-se entre nós consagrado no


art 4º/a) segundo o qual “… a lei penal portuguesa é aplicável a factos praticados em
território português, seja qual for a nacionalidade do agente”. Torna-se assim
indispensável determinar o que é “território português” e por outro é dizer, qual o lugar
onde um facto é praticado.

➢ O problema da “sede do delito”


Para determinação do locus ou sedis delicti – do lugar ou sede do delito – rege o artigo
7º nos termos do qual “o facto considera-se praticado tanto no lugar em que, total ou
parcialmente, e sob qualquer forma de comparticipação, o agente atuou, ou no caso de
omissão, devia ter atuado, como naquele em que o resultado típico ou o resultado não
compreendido no tipo de crime se tiver produzido “ (nº1); dispondo ainda que “no caso
de tentativa, o facto considera-se igualmente praticado no lugar em que, de acordo com a
representação do agente, o resultado se deveria ter produzido” (nº2). Diferentemente do
que vimos suceder com a determinação do tempus delicti, em que o legislador optou pelo
critério da conduta em desvalor do resultado, aqui ele cumulou os dois critérios no sentido
daquilo que doutrinalmente corre como solução mista ou plurilateral.
Para tanto, bastando que o país onde a conduta teve lugar seguisse o critério do
resultado típico, enquanto o outro país onde o resultado se verificou aceitasse o critério
da conduta (por exemplo, A é ofendido corporalmente em Portugal mas vem a falecer em
Espanha; se Portugal aceitasse o critério do resultado e a Espanha o da conduta A não
poderia ser punido por homicídio, por nenhuma das leis concorrentes poder ser aplicada
em nome da territorialidade.)
A revisão do CP de 1998 veio aditar ao art.7º duas conexões que já não seriam
exigidas pela referida solução plurilateral: o local onde se produziu “o resultado não
compreendido no tipo de crime” e em caso de tentativa o local onde o resultado se deveria
ter produzido “de acordo com a representação do agente”.

A primeira conexão – o local onde se produziu o “resultado não compreendido no tipo


do crime” – diz respeito, desde logo, aos chamados “crimes tipicamente formais mas
substancialmente materiais que tingem a consumação típica sem que todavia se tenha
verificado ainda a lesão que a lei quer evitar, proporcionando assim uma tutela antecipada
do bem jurídico (como sucede no crime de fraude na obtenção de credito). Em segundo
lugar ela abrange os crimes de atentado, ou de empreendimento que embora
pressuponham um resultado que transcende a factualidade típica se consumam no estádio
da tentativa. Enfim, aquela conexão vale também para os resultados ou eventos
agravantes nos denominados crimes agravados pelo resultado. Em todos estes casos, a
ocorrência em território português do resultado não compreendido no crime fundamenta
a competência da lei portuguesa.

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


➢ Problemas particulares
Apesar da aparente clareza da solução plurilateral, alguns problemas ficam ainda em
aberto. Desde logo, o dos chamados crimes continuados (art. 30º/2) em que uma
pluralidade real de factos (que podem ser cometidos em países diferentes) é juridicamente
considerada uma unidade normativa. Na linha da teleologia e da funcionalidade da
solução plurilateral está a solução de que deve nestes casos considerar-se que um dos
factos de encontre abrangido pelo principio da territorialidade.
Expressamente coberto pelas razões apontadas encontra-se o caso da comparticipação
– que tenha lugar em Portugal sob qualquer forma e portanto também sob a da mera
cumplicidade – num facto praticado no estrangeiro; bem como a hipótese inversa de o
facto se verificar em Portugal, mas a comparticipação ter lugar no estrangeiro. A qualquer
destas hipóteses é aplicável a lei penal portuguesa em nome do principio da
territorialidade. Como igualmente coberto se encontra o caso da omissão relativamente à
qual vale como lugar do delito aquele em que deveria ter tido lugar a ação esperada ou
em que teve lugar o resultado típico.
Duvidosa é a solução que por vezes se aponta para o caso dos chamados delitos
itinerantes ou de trânsito; factos que pelo seu modo especifico de execução se põem em
contacto com diversas ordens jurídicas nacionais (exs.: uma missiva injuriosa é escrita
em Portugal, expedida de Espanha e anda perdida em França antes de chegar ao seu
destinatário na Bélgica; um pacote contendo droga é enviado por navio na Colômbia
descarregado em Portugal, onde parte de comboio para o seu destino, a Holanda).

➢ O chamado “critério do pavilhão”


O chamado critério da territorialidade sofre um alargamento que se contém no art 4º/b) e
parifica com os factos cometidos em território português os que tenham lugar a bordo de
navios ou aeronaves portugueses. Fala-se a este propósito de um critério do pavilhão,
justificado pela consideração tradicional (e que na verdade o direito marítimo e aéreo em
principio aceita) de que aqueles navios e aeronaves são ainda se não facticamente, ao
menos para efeitos normativamente “território português”. Parece todavia dever entender-
se que sempre que o navio ou aeronave estejam surtos em porto ou aeroporto de país
diferente do pavilhão, isso não retira competência á lei do lugar em nome do principio
base da territorialidade; o que só favorecerá a necessidade eventualmente imperiosa, de
intervenção imediata de autoridades policiais ou mesmo judiciárias. Quando tal suceda
dar-se-á no máximo um conflito de competências.

➢ O principio complementar da nacionalidade


o Justificação e conteúdo
A complementaridade do principio da nacionalidade relativamente ao principio da
territorialidade logo significa que se não pretende por meio dele obviar a todo e qualquer

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


crime que possa ser cometido por um português fora do seu país. Apenas se reconhece
existirem casos perante os quais se tudo repousasse no principio português da
territorialidade, poderiam abrir-se lacunas de punibilidade indesejáveis para uma politica
criminal internacional concertada e eficiente. E isto poque existe uma máxima aceite pelo
direito internacional comummente seguida, atinente de forma imediata a toda a matéria
da aplicação da lei penal de um país a factos cometidos por um seu nacional no
estrangeiro: a máxima da não-extradição de cidadãos nacionais.
O que fica dito corresponde ao conteúdo tradicional do principio da nacionalidade
que de acordo com o fundamento e a teleologia que lhe foram apontados, surge como
principio da personalidade ativa: o agente é um português. Fala-se todavia de um
principio da personalidade passiva, para efeito de aplicação d alei penal portuguesa a
factos cometidos no estrangeiro por estrangeiro contra portugueses. É obvio que este
principio da personalidade passiva radica num fundamento e numa teleologia que, pode
afirmar-se sem exagero. Com efeito, a máxima da não-extradição de nacionais não
desempenha aqui qualquer papel, uma vez que relevante é a nacionalidade da vitima, não
a do agente. O que oferece fundamento ao principio da personalidade passiva é a
necessidade sentida pelo Estado português, de proteger os cidadãos nacionais perante
factos contra eles cometidos por estrangeiros no estrageiro e neste sentido, a proteção de
interesses nacionais. O principio da personalidade passiva possui por isso um fundamento
e uma teleologia que o identificam com o principio da defesa de interesses nacionais
concretamente sob a forma de proteção pessoal daqueles interesses.
O principio da nacionalidade encontra-se consagrado na forma normal do seu
aparecimento e na verdade tanto na vertente ativa como na passiva – no art 5º/1/c. de
acordo com ele a lei penal é aplicável a factos cometidos fora do território nacional por
portugueses (principio da personalidade ativa) ou por estrangeiros contra portugueses
(principio da personalidade passiva), sob uma tríplice condição: a de os agentes serem
encontrados em Portugal; a de tais factos serem puníveis pels legislação do lugar em que
tiverem sido praticados salvo quando nesse lugar se não exercer poder punitivo.

➢ Condições de aplicação
o Que o agente seja encontrado em Portugal
A primeira condição – a de o agente ser encontrado em Portugal, explica-se quanto ao
principio da personalidade ativa, por ser nela que se concretiza a razão que lhe dá
fundamento: a não-extradição de nacionais; e quanto ao principio da personalidade
passiva por nele se tratar de uma extensão do principio da nacionalidade justificada por
razões de índole muito especial. Tem-se muitas vezes apontado esta condição na nossa
doutrina, como exemplo de uma condição objetiva de punibilidade. Tomada esta
expressão no seu teor literal a afirmação é correta. Dogmaticamente porém ela nada
possui de comum com o fundamento e a teleologia das verdadeiras condições objetivas
de punibilidade antes constitui uma condição de aplicação no espaço da lei penal
portuguesa.

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o Que o facto seja também punível pela legislação do lugar em que tiver
sido praticado
A exigência de que o facto seja também punível pela legislação do lugar em que tiver sido
praticado é a condição materialmente mais importante de aplicação do principio da
nacionalidade e que mais claramente o converte em principio subsidiário.

o Que o facto constitua crime que admita extradição e esta não possa
ser concedida
O inciso III do art 5º nº1/c põe como ultima condição de aplicação do principio da
personalidade ativa ou passiva, que o facto constitua crime que admita extradição e esta
não possa ser concedida. Trata-se aqui de uma reafirmaº
Ao da conceção do legislador segundo a qual o principio da territorialidade deve não
apenas no conspecto nacional, mas internacional constituir o principio-base e o principio
da nacionalidade o complemento.

9.10.19

Artigo 40 CP – foi o professor figueiredo dias que propôs esta redação, mas diz que o
objetivo não é resolver qualquer disputa doutrinaria e há quem diga que continuamos na
escuridão em que estávamos em ’82, pois não temos nenhuma indicação precisa. Não tem
muita orientação pratica, temos fins de prevenção especial no nº1 na medida em que
entendamos que tem em conta teses de prevenção geral e depois no nº2 o principio da
culpa, o que podemos dizer é que a norma parece sugerir que a culpa realmente intervem

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com o mero limite ou barreira, como pressuposto mas não como fundamento da pena. A
verdade é que esta não é a única leitura possível, e não temos nenhuma hierarquia dos
fins das penas estabelecidas, que deve preterir um face a outro, na verdade, continuamos
com o campo relativamente aberto.

O que é que é importante para a prof no fim das penas?


- esta ideia do que é o fim da pena ou os fins das penas é uma questão mal colocada,
a pena é uma realidade com factos inegáveis a ela, quando punimos alguém estamos
a realizar anseios da comunidade de castigo ou satsfaçao retributiva da comunidade
ao ver a pena ser aplicada. Temos de reconhecer que assim é mas racionalizar de
modo a tornar aceitável os factos, garantindo que o juiz observa certos parâmetros
constitucionais quando prratica os fins das penas, dignidade humana, principio da
necessidade da pena, culpa.
Há certas indicações a ter em conta.
Artigo 71º - olhando para o n2 temos critérios que são eminentemente de culpa,
quando se diz que o juiz deve atender soa motivos, fins, culpa, estes critérios serve
para medir a censura que o facto merece. São critérios de culpa que o critério deve
atender para determinar a medida da pena.. não deve atender somente á culpa, também
critérios de prevenção especial positivos, artigo 42º, é imposta constitucionalmente –
não esta expressamente na CRP, esta por exemplo na proibição da pena perpetua,
liberdade individual, dignidade humana, obriga a que se integre o condenado na
sociedade, nunca pode ser um tirar a pessoa da sociedade, neutralizar por completo, é
um modelo na sociedade, possibilitar que a mesma volte a integrar-se, logo modelo
de prevenção especial positiva.
É mais um modelo de culpa limitado pela prevenção especial positiva do que o
modelo geral do prof figueiredo dias limitado pela culpa.

1º - o modelo de pensamento do prof figueiredo dias tende para critérios de pessoa


media, se a pessoa seria censurada ou não tendo em conta a posição se a pessoa media
teria praticado um comportamento semelhante.
2º - autores como a Fernanda palma não podemos usar o modelo de pessoa media,
cada pessoa tem modelos de vida diferentes, valores diferentes, dificuldades
diferentes, temos de ter em consideração os termos sob os quais atuaram.

Há quem dia que o modelo do prof FD é um conceito mais social por ser pouco
jurídico, é mais de ilicitude do que culpa, tende-se a aferir a gravidade pelo acentuar
dos atos cometidos.
Uma pessoa pode praticar um homicídio, é um facto grave, lesou o bem vida, mas não
significa que não pode ser desculpada pelo que fez, no plano diferente, o da culpa, em

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circunstancias tao extremas que realmente não deveria ser alvo de culpa, qualquer
outra pessoa nas mesmas circunstâncias tê-lo-ia feito.

Conceito social de culpa – o juízo de culpa, na categoria de culpa, olhamos para o


agente, seus motivos, e se merece ser censurado pelo que fez. Não é verificar se é
proibido. É questionar se a pessoa merece ou não ser censurada.
Autores como a prof palma temos de atender as particularidades da pessoa, o seu
passado, a sua posição afetiva, a sua família, não é colocar todas no mesmo plano de
pessoa média.

O professor Faria costa refere que: as pessoas são seres incompletos e inacabados e
numa relação de cuidarem umas das outras, uma relação de cuidado perigo, cuidam
umas das outras e cuidam em si mesmo, cuidando umas das outras. Quando alguém
pratica um crime, agride outra pessoa, ela rompe essa relação de cuidado perigo, o
que a pena vai fazer é repor essa relação, para o professor faria costa, dizer que a pena
é um mal que se reconduz a outro mal, ele defende que a pena é um bem. O direito
penal radica desta reposição. Ele defende a logica retributiva pelos princípios da
igualdade.. não punimos para um certo efeito no futuro, punimos para responsabilizar
o agente pelo seu facto tendo em conta princípios da culpa não há uma
responsabilidade objetiva no DP, não há resp pelo risco, a pessoa só é
responsabilizada criminalmente pela censura do ato. O cerne da responsabilização
esta no passado não no futuro, pois é uma responsabilização pelo que fez antes e
limitado pela liberdade que ela tinha de ter tomado outra atitude. Todas as pessoas
tem direito a uma pena justa materialmente idêntica aos outros criminosos, uma pena
medida pelo mesmo padrão de censurabilidade.

- Justiça restaurativa
Tem sido proposta como possível terceira via em relação as penas e medidas de
segurança. A ideia basicamente é a de obter uma reparação pelos danos que sofreu
com o crime, que será obtida através de uma concertação ente o agente e a vitima. O
agente e a vitima vão-se encontrar para decidir o que fazer com as consequências do
crime.
No Processo Penal, como é que a vitima pode intervir? Ou enquanto lesado ou então
como testemunha se o ministério achar útil que faça depoimento ou então como
assistente.
Neste modelo a ideia é um encontro entre o agente e a vitima através da mediação
penal. Lei 21/2007 de 21 de junho. Só existe mediação para certos crimes, não para
todos, estão lá elencados os permitidos. Remete-se processo para mediação, têm
ambos de concordar, é nomeado mediador, auxiliando o agente criminoso e a vitima,
agilizando no diálogo para que haja uma cordo, pelo qual se espera que se supere o
conflito

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O professor FD diz que não é nada de novo.

13.11.19
Interpretação extensiva
Interessa perceber a ideia de que toda a interpretação contém raciocínios analógicos. Há
textos importantes em ptg nomeadamente o pensamento de Castanheira Neves.
Há uma preocupação que imediatamente se coloca, chegou-se na matéria do principio
da legalidade e proibição da anaogia a um estado problemático, se toda a interpretação é
analogia e se no DP se proíbe a analogia, o que é que o Direito Penal proíbe? Pelo
seguimento do pensamento, estaria a proibir a própria interpretação.
Quando se proíbe a analogia, está-se a querer proibir uma certa interpretação ou uma
certa analogia. Para chegar aí temos de ir atrás e tentar perceber que toda a interpretação
é analogia, o texto tem sempre qualquer coisa extra.
Toda a interpretação se resumiria a um silogismo interpretativo.
Para castanheira neves o texto real é ais um pretexto, condição da interpretação que
deriva de um principio de crimen, mas tem que ver com reservas da fonte de direito,
mas não fundamento, nem ponto de partida da interpreação jurídica, o texto é o produto
da interpretação, ele diz isto no sentido de desvalorizar a condição textual de partida, o
que se procura é uma ideia, o dever ser que o legislador impõe e essa ideia jurídica do
que é proibido que se persegue na interpretação esta para alem do texto, apoia-se no
elemento sistemático da interpretação, na pesquisa dos valores perseguidos pela norma
subjacente ao texto, bem como condições institucionais. O que Castanheira Neves diz é
que há uma ideia normativa, é produto da investigação e ela forma o texto ideal da
interpetação

20.11.19
361 CPC
Leis temporárias – regime geral art. 2º/2 principio da necessidade da pena e da
igualdade.
Regime especifico – so podemos apicar o 2/3 para situações de emergência quando
não viola o principio de igualdade e principio de igualdade da pena. Não basta o
legislador disser que a lei so se aplica para um determinado perioro de tempo, tem
de justificar que se adequa a um período especifico de tempo por contexto
especialmente gravoso e por situações de calamidade.
Leis de emergência

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Para ser aplicada medida de segurança, precisa de haver facto típico e ilícito mas
não precisa de haver culpa, ao contrário do que acontece com a pena. As medidas de
segurança são reações criminais tal como a pena.
O que Eduardo correia diz é que ao contrario das penas as medidas tendem a
acautelar a conduta, se foi perigoso no passado não há razão para aplicar a medida
de segurança, o prof diz que o momento decisivo é o da decisão de aplicação da
medida e não da pratica do facto, o regime que se aplica é o regime em vigor da
decisão da pratica do facto, em relação ás penas aplica-se o regime do momento da
pratica do facto.

Muita doutrina alemã critica:


A doutrina portuguesa critica isto até pois é inconstitucional – não se pode aplicar
medida de segurança se o facto não for criminavelmente punível e critico no
momento da pratica do crime, logo o entendimento do prof Eduardo correia não
pode valer. A professora maria joao Antunes diz que (e tem divergência com a
regente) imaginemos que o facto não era considerável corrupção no momento da
pratica do facto, a previsão da L! não incluía o comportamento do agente na
vigência da L” mas a L2 alterou o tipo e passou a tipificar corrupção, o que acontece
é que ao facto passa a ser plicavel uma pena mas também uma medida de segurança
de interdição de exercicio de profissão por exemplo, e ele agora vai ser julgado,
posso aplicar a pena por crime de corrupção? Não posso aplicar a ppena pois á luz
da pena no momento da pratica do facto não era crime, logo era absolvido, posso
aplicar a medida de segurança? Posso aplicar a medida de segurança se aplicar o
código penal alemão, mas não posso segundo a lei portuguesa, não posso aplicar não
só as penas como as medidas de segurança.
Se já é crime quando o praticou, já se aplica medida de segurança,
A medida de segurança visa atuar sobre a perigosidade, a que há já na pratica do
facto, vou agrsegundo o regime em vigor no momento da decisão, para saber se
devo aplicar medida de segurança tenho de aplicar para o momento da pratica do
facto para saber qual a que vou aplicar, o regime é a lei que esta em vigor no
momento da pratica do facto pois a perigosidade considerada é a do momento da
pratica do facto.

Eduardo correia dizia que o momento decisivo para a aplicação da medida de


segurança não é o da pratica do facto ma ssim o momendo da decisão; logo o regime
que se ira aplicar e o regime em vigor no momento da decisão; sendo irrelevante o
regime em vigor no momento da pratica do facto. Entretanto, houve evolução no
caso português, alem da doutrina criticar, seria hoje inconstitucional ( art 29º/4 CRP
etc). este entendimento do professor não pode hoje ser válido. A por maria Antunes
tem uma doutrina divergente, vem dizer o seguinte (divergência da REGENTE): : o
que a CRP proíbe é que aplique a medida de segurança quando o agente pratique o
facto quando não é crime, mas se ele tiver praticado no momento que já era crime e

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


mais tarde continua a ser crime podrem a medida de segurança é agravada, a prof
diz que pode ser aplicada. Para decidir se posso aplicar uma medida de segurança,
tenho que olhar para o momento da pratica do facto e ver se já era crime, para decidr
qual (presumento que foi praticado um facto criminoso) medida de segurança devo
aplicar, vou olhat para medida de segurança em vigor no momento do julgamento
(seja mais favorável ou menos favorável)
Contra ordenações: são infrações de natureza administrativa, sem prejuízo de
algumas terem dignidade oenal, são tratadas como contra ordenações porque o
legislador considera que sejam suficiente para prevenir. Para as contra-ordenações
também vale o prncipio da legalidade, ou seja, não se pode aplicar uma coima po
exemplo, se o comportamento não era punido com contra ordenação no momento da
prática do facto.

25.11.19
▪ Matéria da prescrição, e aplicação da lei penal inconstitucional no tempo e
conversão de crimes de perigo em crimes de dano

Prescrição: saber se normas que alterem os prazos prescricionais se são de aplicação


imediata ou se estão previstos pela aplicação da retroatividade. Tradicionalmente
entendiam-se que não eram de direito penal, e não faziam parte do art 1/3 da CRP,
pois regulavam como o estado devia seguir a execução das penas.

Aplicação da lei inconstitucional no tempo: há uma lei, a lei posterior é uma lei
descriminalizadora ou atenuante mas ela é inconstitucional sendo declarada
inconstitucional pelo tribunal, artigo 282º CRP. Também pode ser situação de
declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, tem efeitos desde a entrada
em vigor e determina a repristinaça das normas que haja revogado. Das normas mais
formais, é que nesses casos sendo a lei penal posterior mais favorável mesmo
desciminalizadora sendo inconstitucional, sucede a repristinação das normas da lei
anterior, mas a lei anterior é a lei menos favorável.
Ressalva dos casos julgados, nº3 do 282º, imaginemos que há lei descriminalizada
posterior e por força do 2º2 do CP já cessaram os efeitos da descriminalização ou
por força do 2º/4 aplicado a medida melhor e já há caso julgado, sentença firma,
nessa situação temos de aplicar o 282/3 pois o caso julgado não é afetado. A
ressalva do caso julgado so não prevalece quando a lei for de conteúdo menos
favorável ao arguido.
Os problemas começam quando não há caso julgado, a lei posterior mais favorável
ainda não foi aplicada, não houve transito em caso julgado, e nesse caso não eé
situação diretamente preista, nesse caso a doutrina e a jurisprudência tem definido
duas posições: supremo e TC – quando há consideração de norma inconstitucional,
essa nora não tem validade, não pode produzir efeitos pois ela é invalida e tem de se

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represtinar as normas que haja revogado – o que disse o TC, o supremo, é que nem
se pode falar numa verdadeira sucessão de leis no tempo para se aplicar o 29/4, há
uma lei que terá de ser represtinada e uma lei que lhe sucede que não é valida, no art
29º quando trata do assunto ele esta a prever que ambas as leis são validas. O TC
veio estabelecer uma espécie de norma transitória, aplica-se a lei menos favorável
que é a única valida, mas como houve uma lei mais favorável que pode ter orientado
o comportamento dos agentes e revela nova perspetiva do legislador sobre a questão
e porque se cria uma confiança dos destinatários nas leis e não há presunção de
inconstitucionalidade das leis antes de serem declaradas inconstitucionais, então o
que se poderá fazer é aplicar a lei antiga mas nos quadros punitivos da lei nova, a lei
que se aplica é a lei antiga represtinada mas dita-se dentro de parâmetros mais
atenuantes da lei nova
Dr. Rui Pereira tem um artigo sobre esta matéria e propõe uma solução
complementar: usar essa lei da norma inconst invalida, tem de ser a lei antiga a ser
usada mas ao destinatários não podem ser penalizados pela inconst da nova lei, dar
beneficio da exclusão da culpabilidade se houve realmente uma crença dessa lei
quando atuada, logica de aplicação do 17º do CP. Os tribunais não devem em caso
algum aplicar normas inconstitucionais, em oposição á professor Fernanda palma
A regente tem posição diferente: onde há manifesto conflito entre o 29º/4 e o 282º o
principio do caso julgado como da validade const das leis com ao principio da
aplicavçao retroativa da lei mais favorável, fazendo analogia com o 282/3, da
repristinação das leis (…….) nos casos prevstos no 282/3 considera prevalecente o
29/4, repristinando leis de conteúdo mais favorável, quando a lei é de conteúdo menos
favorável deve-se abrir o caso julgado. Aqui também se deve aplicar o 29/4 e o seu
principio, não tanto por ele, pois é principio da igualdade e necessidade da pena, mas
enquanto ele se adeque com o pirncipio do estado de dreito, da imparcialidade bla bla
bla… gerou-se uma confiança nos cidadãos de que houve alteração mais benéfica para
o arguido no sistema penal, essa confiança justificam que o principio do 29/4 possa
ter a sua pertinência, não so por razoes de necessidade e igualdade mas por razoes
aplicáveis a vinculadao do estado ao direito que cria, principio d aobjetividade, as leis
apesar de inconst chegaram a vigorar, confiança da modificação do legislador penal
sobre problema e deve aqui onde não há ainda caso julgado, mesmo assim em vez do
estratagema do TC de punir pela lei antiga nos quadros da lei nova, admitir a lei nova
na medida em que na realidade ela estabelece problemas de igualdade necessidade da
pena, e objetividade e confiança, é um valor mais importante do que a propria
estabilidade das leis e ate com a anulação em detrimento da anulação do valor das
leis.o artigo 282 diz que nos casos onde a lei inconst é menos favorável, não ficam
ressalvados os casos julgados se a lei é mensof favorável não há ressalva do caso
julgado e pode o TC decidir reabrir o caso julgado para aplicar a lei repristinada de
conteúdo mais favorável, pode, a CRP apenas faculta ao TC através de uma decisão
essa faculdade.
27.11.19
Crimes de mera atividade ou omissão pura e crimes de resultado – a maioria dos crimes
são de resultado. O que é que significa crimes de resultado, para que se preencha o

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


comportamento típico, tem de se preencher (…) a ideia mais comum é o crime de
homicídio ou de ofensas corporais. No crime de homicídio, qual o evento spacio
contraponente? É o evento morte. Tem base legalista determinada.
Crimes de mera atividade são os que para se verificarem são por exemplo intromissão
de domicilio, não há nenhum evento contraponivel à ação. Ele entrou mas do ponto de
vista naturalístico, há um comportamento que preenche a tipicidade. Ou a omissão de
dever de auxilio. Não tem de acontecer nada a vitima, não tem de estar preenchido
nenhum resultdl tem o comportamento omissivo de se ter verificado.
Crime de perigo: basta-se com o perigo para os bens jurídicos, o mesmo opõe-se a
crimes de resultado, onde é necessário um resultado fáctico para um bem jurídico. Os
crimes de perigo são aqueles como exposição ou abandono, como o exemplo do bebé
deixado no caixote do lixo.
Se tiveros crime de perigo concreto de incendio florestal, um crime de imagem dos
incêndios urbanos coo crime de perigo concreto e passa antes do julgamento mas apos
pratica do facto, nova lei antecipando crime de perigo abstrato, antecipa a
incriminaçaoa, mesmo que não haja perigo nenhum mesmo que o incendio somente
destrua mato, estes crimes antecipam a incriminação, nuna situação anterior havia crime
concreto e numa situação posterior passa a ahvaver crime abstrato, alargando-se e
antecipando-se a incriminação, não se pode aplicar retroativamente o crime de perigo
abstrato a crimes não oponíveis antes e já eram correpsondentes ao perigo sem
demonstração de possibilidade imediata do dano.

• Lei Penal no Espaço


O primeiro critério seja o principio da territorialidade – artigo 4º CP embora
ressalvando tratado ou convenção em sentido contrato a lei penal ptg em territoro
português seja qual for a nacionalidade do agente, não se pode falar do facto de não
serem ptg para não serem abrangidos pela lei ptg. Pressupõe que saibamos qual é o
território ptg, artigo 5º da CRP.
como é que se considera que facto foi praticado em território ptg. – local da pratica do
facto será o local da ação mas não é so isso, art 7º CP diz que o local da pratica do facto
é mais amplo não so o que se raciona com a ação.
Principio da nacionalidade

DIREITO PENAL 2019/2020 | Adriana Lourenço Martins


Aula da lei penal no Tempo pelo Mafarrico – dia 20.11.19
Imaginemos que à luz da L1 já era crime mas tinha pena máxima de 5 anos de prisão,
á luz da L2 a pena passa para 2 anos e 6 meses. O juiz vai aplicar a L2 pela mesma razão
mas agora á luz do art 2º/4, já não é um caso de descriminalização caso em que se aplicava
o 2º/2, é um caso de verdadeira sucessão de leis penais, continua a ser crime, mas a lei
posterior à pratica do facto concretamente mais favorável limite de moldura penal mais
baixo. Em principio aplico a lei penal á luz no momento da pratica do facto mas a L2 vem
prever um regime de punição que é concretamente mais favorável por ter limite máximo
mais baixo, por ter uma moldura com limite mais baixo, então o que é que o juiz vai
aplicar? A L2 mais uma vez só que agora por aplicação do art 2º/4 CP por já não ser caso
de descriminalização é caso de lei posterior que prevê um regime de punição
concretamente mais favorável art 2º/4 primeira parte.
Agora vamos imaginar que tudo igual mas o facto da L2 que passa para máximo de
2 anos e 6 meses mas entra em vigor um dia depois á leitura da sentença condenatória. E
o arguido tinha acabado de ser condenado em 4 anos de prisão efetiva. No dia a seguir o
limite máximo havia sido reduzido, o que é que o arguido vai fazer? Abrir o processo?
Não pois o processo já está aberto. Vai RECORRER para tribunal superior.
Agora vamos imaginar que a nova lei entrou em vigor quando já cumpriu 3 anos.
Ele já está preso há três anos, o que é que acontece ao arguido? Cessa a execução da
pena e ele é libertado porque o tempo que ele cumpriu já ultrapassa o tempo da lei que
lhe tem de ser aplicada.
Agora vamos imaginar que ele esta preso há dois anos, o que é que lhe acontece?
Cumpre mais 6 meses? Não. É aberto o processo novamente, ele já ao tem de usar
recurso pois já transitou em julgado a decisão, precisa de recurso ordinário art 361-A
CPP vai ser determinada nova medida da pena á luz da nova pena, não tem de ficar mais
os 6 meses, ele pode requerer reabertura da audiência agora á luz da lei 2.
Se a lei nova entra em vigor do julgamento, aplicamos o novo regime, se a lei nova
entra em vigor quando já cumpriu o máximo da lei nova, ele é libertado, não é preciso
determinar nada. Se entra em vigor quando não cumpriu tudo o que tinha para cumprir
da sua pena, nem á luz da lei antiga nem á luz da lei antiga, esta no 361-A vai requerer
reabertura da audiência para ser determinada nova medida da pena. Não tem de ficar la
mais dos 6 meses, pode requerer reabertura da audiência á luz da lei nova.

Vamos imaginar que a carne de vaca passava a ter uma doença super perigosa, de
modo que o legislador resolvia dizer que tendo em conta este vírus, até se resolver a
doença é perigoso, durante os próximos meses é punido quem vender carne de vaca,
servir, partilhar de qualquer forma de partilha carne de vaca. Á luz da L1 não é crime mas
depois surge a epidemia, e passa a ser criminalizada até Setembro, em setembro confirma-
se que o vírus está resolvido e já se pode partilhar carne de vaca, então volta o regime
anterior. Imaginado que o agente praticou o facto em agosto, ele é apanhado a vender
carne de vaca. E agora vai ser julgado em outubro quando esta reposta a normalidade e
em vigor o regime de sempre, o que lhe vai ser aplicado? Antes de irmos ao regime
especifico, pelo regime geral aplicamos em principio a L2 pois é a lei em vigor no

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momento da pratica do facto mas há um facto para não se plicar, por á luz da L1 não ser
crime, aplicava-se retroativamente, art 2º/2. Princípios da necessidade da pena. Mas
temos um regime especifico no art (??) a lei volta num período de tempo, e continua a
plicar-se o 2º/3 vai ser punido á luz da L2. Tem algum sentido? Não é inconstitucional?
Imaginemos que o A foi condenado e o B também vendeu carne mas vendeu em
novembro - vão ser ambos julgados – se eu condenar o A, á luz do 2º/3 e absolver o B á
luz do 2º/1 viola-se o principio da igualdade? estou a tratar de forma diferente? Eles
fizeram a mesma coisa ma so contexto em que o fizeram foi diferente, era crime quando
o A o fez pois vender nessa altura significava um perigo, quando o B o fez não significava
o mesmo, quando se absolve o B são situações diferentes, têm significado diferente. Só
podemos usar o art 2º/3 para leis de emergência, que se apliquem em situações de
emergência que expliquem que não esta a ser violado nem o principio da igualdade nem
o da necessidade da pena. Não basta o legislador dizer que ra para esse período de tempo,
temos sempre de justificar que se aplica em situações de emergência que se expliquem
esse regime mais gravoso, em justificação dessa calamidade, quando acaba o período de
vigência, vamos voltar ao regime normal.
Agora imaginando que temos a L1 que não criminalizava, no mesmo contexto de
calamidade, e depois vem a L2 que criminaliza nesse período de tempo, mas o legislador
entende que a L2 é demasiado severa e então passa a haver a L3 que é mais leve, aplica-
se então pelo art 2º/4 pois o legislador continua a entender que se deve criminalizar mas
mesmo assim que a pena deveria ser mais leve, a consideração pela gravidade do
comportamento mudou e deve ser essa a levada a cabo.
Distinção entre penas e medidas de segurança – pode haver pena sem crime
anterior? Não devido ao principio da legalidade. Pode haver medida de segurança sem ter
sido praticado o crime? Sim – tem de haver facto ilícito. para ser aplicada medida de
segurança é preciso facto típico e ilícito mas não tem de haver culpa. É preciso o facto
típico e ilícito tal como para a pena, mas na pena necessita de culpa. Eduardo correia dizia
que as medidas de segurança visam reagir perante a perigosidade, o momento em que
interessa averiguar a perigosidade é o da aplicação da pena, se foi no passado mas agora
já não é, não precisa de aplicação de medida de segurança. O momento decisivo não é o
da pratica do facto é o da decisão de aplicação da medida o que vai vigorar é o que esta
em vigor no momento da decisão independentemente do que estava em vigor no momento
da pratica do facto. Em relação ás penas é o do momento da pratica do facto.
A maior parte critica e não so a doutrina critica como hoje seria inconstitucional
pois se virmos o 29º 1,2,3, referencia as medidas de segurança e não podemos aplicar só
como perigoso no momento em que foi praticado é também preciso lei anterior. Esta tese
de Eduardo Correia já não pode vale, a crp proíbe. Mas, a prof Maria João Antunes diz
que – vamos imaginar que o facto não era crime quando foi praticado e não era
considerado corrupção no momento em que foi praticado, quem praticou ato bla bla, a
presião da L1 não cobria um certo comportamento do agente na sua vigência, mas a L2
alterou o tipo e passou a ser corrupção. O que é que acontece ? passa a ser aplicável não
só uma pena mas também medida de segurança, a L2 previa não so pena mas medida de
segurança de interdição de profissão e agora vai ser julgado. Pode ser aplicada pena do
crime de corrupção ? Na L1 não era crime, na L2 passou a ser crime, posso aplicar ? não,
não era a lei em vigor da pratica do facto logo seria absolvido. Posso aplicar a medida de

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segurança? Posso se aplicar o código penal alemão mas se aplicar a CRP não posso pois
se o facto não é previsto como crime no momento da pratica do facto não posso aplicar
não só as penas como também as medidas de segurança.
Agora imaginamos que a L3 vem agravar, limite máximo da pena e limite máximo
da medida de segurança, passou de interdição da profissão de 5 para 7 nos, o juiz pode
aplicar a pena da L3, não por proibir a retroatividade desfavorável, pode aplicar a medida
de segurança da L3? A CRP proíbe que aplique a medida de segurança quando não é
crime mas se já é crime quando a praticou aplico a L3, outra coisa é decidir qual a medida
de segurança que aplico, esta visa reagir contra a perigosidade e a perigosidade que conta
é que esta no momento da decisão logo vou aplicar a lei em vigor no momento da decisão
– segundo Maria João – para decidir se aplico medida de segurança temos de olhar para
a lei em vigor no momento da pratica do facto, para decidir qual é que vou aplicar se se
puder admitir que posso e que era crime, para depois decidr qual é que vou aplicar, das
medidas de segurança então olo para o momento do julgamento, pois o que se verifica é
a perigosidade neste momento. O professor figueiredo dias parece concordar, mas a
professor Fernanda Palma desvia-se um pouco – vem argumentar que não é legitimo partir
assim a segurança vai ser colocada em causa, é também especificado qual a sanção em
resposta a esse facto. porque é que a CRP obriga a que as medidas de segurança não se
possa aplicar se não (…)? Estava a tratar os sujeitos como meros destinatários das
normas, os inimputáveis também tem de ser alvo destas normas, tem de valer quanto ao
pressuposto mas também quanto ao fundamento, tem de estar presente no momento em
que o agente atuou, a ideia de conexão entre o crime e a pena, não posso partir as duas
coias como se estivessem separadas uma da outra.

Vamos imaginar que o A foi apanhado a conduzir certo dia com 0.7 e o B foi apanhado a
conduzir com 0.9. o que é que vai acontecer ao A. vao ser ambos julgados no mesmo dia.
Á luz da L1 era contra ordenação, á luz da L2 continua a ser contra ordenação. Vai ser
punido com coima. E o B, no momento da pratica do facto o facto era contra ordenação,
na L2 passou a ser crime, ultrapassa o limite pois o limite baixou para 0.8 com a nova lei.
No entendimento do Taveira de carvalho, o B vai ser absolvido – como B bebeu mais vai
ser absolvido e ganha o premio, o A é condenado . mas o prof Taveira de carvalho refere
que isso é problema do legislador. Ou eu altero o regime das contra ordenações e prevejo
outra situação, ele diz que o problema resolve-se indo ao regime das contra ordenações e
alterando-se ou então quando o legislador faz a L2 prevê um regime transitório para todos
os que haviam sido praticados anteriormente. Isto não é muito coerente, e precisamos
desse regime transitório para que não se possa absolver um crime deste caso, se realmente
haver problema de legalidade, e so passou a ser contra ordenação posteriormente se não
posso punir por problemas de legalidade e não retroatividade , Taveira diz que o legislador
pode resolver todos os problemas colocando uma norma transitória.
Em bom rigor não há problema – esta visão quase radical do prof Taveira do principio da
legalidade quando o que interessa é ver se estão ou não a ser cumpridos os fundamentos
materiais. Quando digo que n posso aplicar retroativamente e eu digo que era crime
quando praticou e passou a sr contra ordenação, eu pergnto posso aplicar a pena? Não pis
aplico a pena que entretanto o legislador acha desnecessário, o legislador so quer agora a

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punir com coima e violaria o principio da necessidade da pena e da igualdade. e não posso
aplicar a coima da lei nova? Quais os princípios que implicam a não retroatividade
desfavorável ? principio da culpa e eu ao aplicar uma sanção mais favorável do que a que
estava em vigor do que quando praticou vou estar a violar a segurança, não. É preciso
proteger a segurança? Não. O que estou a fazer é aplicar um regime sancionatório que é
menos gravoso do que aquele com que ele tinha de contar quando praticou o facto que
previa o facto como crime. Viola algum pincipio continuar a punir com a coima ? não
porque estou a aplicar um regime que já estava em vigor nesse momento, ele já podia
contar com ele. Tenho dois regimes sancionatórios, dois regimes de restrição de diretos,
e resolvem-se a luz do 18º/2 CRP e do principio da igualdade e dos da sucessão de leis
penais no tempo , nestes casos em que passa de crime a contra ordenação ou contra
ordenação a crime o mais correto parece ser sempre punível com a coima, com a contra
ordenação e não há lesão de princípios constitucionais.

• Aula de revisões 11.12.19


Lei penal no tempo quando de crime passa a contra ordenação
Taveira de Carvalho: saber se há diferença qualitativa de natureza entre os dois ilícitos.
Por exemplo, condução em estado de embriaguez, ate 0,5 tudo bem, a partir de 0,5
contra ordenação, a partir de 0.8 crime. Saber se há crime de natureza entre os dois,
entre o ilícito criminal ou se a diferença é meramente quantitativa entre gravidade. Pode
haver comportamentos com naturezas completamente distinta
1. Íamos ao artigo 152º e ver se corresponde a uma hipótese que lá esteja, pode ser
praticada por uma multiplicidade de atos, correspondia à privação da liberdade,
depois também violência física e especifica, essa parte suscita mais duvidas, mas
a violência domestica não é so privar da liberdade é entre outras coisas, a vitima
do crime, as possíveis vitimas estão nas alíneas do 152º/1, a primeira refere o
cônjuge ou ex cônjuge não era o caso, a alínea b) já vamos ver, e as alíneas c) e
d) não se aplicam. Vamos ver a alínea b) o enunciado não refere namoro, o
António tinha relações sexuais com Beatriz a troco de dinheiro, e isto não parece
ser namoro e será de violência domestica para ser punido. O juiz tem de fazer um
caso de interpretação, proibição da analogia e art 29º CRP. E parâmetros
metodológicos, como o que a doutrina recorre do limite possível do sentido das
palavras mesmo que não o adotemos, temos de o mencionar e dizer se o aplicamos
ou se for de rejeitar. Quanto ao privar a liberdade é claro, mas quanto ao tipo de
vitima temos de ver para que tipo de situação está pensada a norma, se há analogia
problemática suficiente entre o caso e o caso que a norma trás pressuposto, o tipo
de problema para o qual o caso aponta e o tipo de problema que a norma visa
proteger. Tendo em vista esta alínea, temos de pensar o contexto físico
problemático que tendo em conta a proximidade dos intervenientes e que essa
proximidade se traduzir-se a num contexto não so de intimidade mas de especial
fragilidade que se traduz nela ficar sujeita ao poderio do agressor, e dependência,
tendo tudo isso em conta é para esse tipo de situação que s quer dar uma proteção
acrescida, temos de ver se o caso trazia esses pontos problemáticos. Podiamor
arguir que era proximidade para eventos sociais e a troco de dinheiro, ainda assim

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há distanciamento que obsta a que não se verifique contexto de violência
doméstica, logo também iria admitir a violência domestica dizendo que o pagar
não significa que prostituição não seja pensada neste tipo de situações normativas,
tendo em conta que o contacto era frequente, gerava a proximidade e
acompanhava também nas férias, nas isto pode sugerir que esta formulado esse
contexto que o diferencia dos outros tipos e justifica uma punição acrescida, vai
ser pensada para essa situação, temos de mostrar que sabemos argumentar e fazer
este tipo de argumentação.
2. Beatriz poderia invocar a não punibilidade do aborto que praticou, tendo em conta
o artigo 142º do CP e os princípios que regem a interpretação da lei penal?
O que podia estar em causa era a alínea d), foi na 11 semanas e a questão era saber
se podíamos aplicar essa alínea. O enunciado não é mais uma vez, claro. Essa
violência física não é dita que ocorreu no momento do ato sexual. Havendo o
contexto de violência psíquica e física e sequestro, mas podemos arguir que como
não foi no momento do ato sexual podemos admitir que no momento concreto da
relação não foi praticado crime contra liberdade e autodeterminação sexual da
vitima o consentimento foi feito num contexto de subjugação tudo isso faz ver que
havendo consentimento que esse mesmo não tenha tido liberdade suficiente para
afastar a liberdade suficiente para admitir a atipicidade e há contexto problemático
suficiente que não se verificou. Era muito mais difícil de dizer que não se aplicava.
3. Pressupondo que António cometeu o crime de violência doméstica passasse de c
Temos aqui crime de execução permanente ou duradoura (NÃO É CRIME DE
DURAÇÃO CONTINUADA). Quando é que o facto foi praticado? Qual o
momento da pratica do facto, é 11, 12 e 13 pois foi nesses dias que sequestrou.
Em principio aplicou a lei em vigor na pratica do facto art 2ºnº1. Eram as duas
leis em vigor no momento da pratica do facto, qual é a que vou aplicar ? aplico a
lei nome pois revoga a lei anterior, se temos duas leis, a lei nova revoga a nterior
os pressupostos verificam-se na sua vigência por isso aplica-se a lei nova.
4. Para Taveira de Carvalho srria aplicael o Codigo penal – aplica-se a le em vigor
na pratica do facto e o crime seria publico mas posteriormente a lei transforma o
crime em semi publico pois esta sera mais favorável por presumir queixa. Quer
dizer que vai ter de se arquivar o rpocesso por n ter havido queixa? Para TC não
porque o ministério publico nesse momento de abertura do processo o ministério
tinha de ter aberto o crime e então esse momento prolonga-se e (…) para FP
também defende que se aplica retroativamente a nova lei que tranforma cirme
publico em semi publico mas como não e so relevante para o arguido esta também
em causa o direito de queixa da vitima temos de dar novo prazo ao titular do
direito de queixa para saber se quer apresentar queixa ou não.
5. A questão de lei no espaço, a primeira coisa a ver é o lugar na pratica do facto e
se foi em Portugal ou se considere território português pois o critério principal é
o da territorialidade. A lei portuguesa tem aplicação se for praticado em Portugal
art 4º + art7. Como foi praticado no dubai não se aplica o art 4º, logo, passsamos
para o art 5º, temos de ir aquelas em relaçãoes ás quais seria mais problemaático,
a vitima é portuguesa, o agressor é português, logo, alínea b) mas não se aplica a
alínea b) porque o agente não vivia habitualmente em Portugal por isso não se
aplica, não era possível punir antónio por este crime, porque no dubai não era
criinalizado

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Quanto a beatriz, fazer o mesmo raciocínio, 4º não se aplica, vamos para o 5º ver
se não aplica uma analogia proibida pois mesmo já admitindo que o feto é pessoa
ainda não é nacional nem é português, admitindo que seria esta a resposta não é
crime da alínea c, nem e, não era possível também punir a beatriz.
6. Aplicar as teses que achamos mais relevantes quanto aos fins das penas,
concentrarmo-nos em explicar processos de atração simbólica ele no fundo
através de certos fenomeno de aprendizagem este tipo de agressividade, este tipo
de mulheres sujeitas a um agente dominador, que as trata como objeto, vêm como
legitimo tratar como objeto a vitima feminina bem como o facto de pagar e ela lhe
prestar um serviço e ter aprendido perante o enquadramento do machismo e seria
importante para determinar medidas de prevenção especial positiva ??? usar as
teorias que estudamos aplicáveis ao caso.

IMPRIMIR DEPOIS DA PÁGINA 86

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