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Processo Administrativo: nº 0.

485/2007
Autuada/Recorrente: Mercearia Félix e Felix (Supermercado Bom
Preço)

Julgamento do Recurso

Trata-se de recurso interposto pela Mercearia Felix e Felix, cujo


nome fantasia é Supermercado Bom Preço, em face da decisão
administrativa que julgou subsistente o auto de infração e de
apreensão e depósito que originou o presente processo
administrativo e ao final aplicou sanção pecuniária de R$12.000,00
(doze mil reais) por violação aos art. 18, §6º, I, II e III; e art. 39,
VIII, do CDC e art. 13, I, do Decreto Federal 2.181/97.

Aduz a Recorrente que embora “alguns” produtos estivessem


com a data de validade vencida ou aparentemente deteriorados, os
vencimentos eram recentes, “não apresentando condições impróprias
para o consumo humano”. Argumenta que “não restou caracterizado
que o consumo dos produtos apreendidos poderia causar dano a
quem os consumisse”. Diz que era “fácil observar se estavam
impróprios ou não para o consumo” e que “não há notícia de danos
graves causados a quem os ingerisse, senão pequenas ocorrências de
dores de barriga”.

Continua, informando que a empresa é pequena e “não possui


condições de promover diariamente a conferência de vencimentos de
produtos colocados à venda, em face de existência de poucos
empregados” e que é alertada do vencimento das mercadorias pelos
próprios consumidores.

Por fim, alega que é primária, que a multa é exagerada e que


sua confirmação poderá “quebrar” o estabelecimento, que não houve
dolo, má fé ou dano, pugnando, enfim, pelo provimento do recurso.

É o relatório, conciso.

Recurso próprio e tempestivo.

Trata-se, até agora, da maior apreensão de produtos vencidos


num estabelecimento de Uberaba pelo Procon. Conforme os
documentos probatórios, foram recolhidos 210 kilos de produtos
impróprios para o consumo, entre vencidos e deteriorados.

A defesa fala em “alguns” produtos. Não é verdade. Foram


centenas e centenas, de todos os tipos, marcas e características,
como se pode facilmente observar da leitura dos autos de apreensão
e de constatação que este acompanham. Chega ao ponto de dizer
que “alguns” estavam aparentemente deteriorados, mas era uma
deterioração recente, um apodrecimento recente, coisa à toa. Me
parece que a Recorrente consegue ver diferenças num alimento
podre de pouco tempo e um alimento podre de muito tempo. Alega
também que não restou provado que os produtos poderiam causar
dano à saúde de quem os consumisse. Essa alegação é estapafúrdia:
se não pudessem causar dano, porque então, devem ser retirados
das prateleiras? Não existe meio termo: está vencido ou não está
vencido! É próprio ou é impróprio!

A defesa traz ao processo a noticia de que não foram


registrados danos graves à saúde dos consumidores, apenas
pequenas dores de barriga! O Procon/Uberaba não sabia disso! A
Recorrente confessa em sua defesa que pessoas sofreram com dor de
barriga após consumirem o alimento vencido!

Afirma Eduardo Gabriel Saad que a venda de produtos com


prazo de validade vencido é uma infração típica do comerciante,
principalmente no comércio de produtos alimentícios. Para o
renomado autor, não resta dúvida que ao consumidor cabe a
substituição do produto ou a devolução da quantia paga e, ainda, o
pagamento de perdas e danos derivado do perigo causado pela
transgressão legal de autoria do comerciante. Como se trata de ato
intentado pela fiscalização do órgão de defesa do consumidor, a
multa é, nesse caso, simbólica e reparadora, em nome do número
impreciso de consumidores que correram o risco.

A responsabilidade do comerciante é objetiva, independe de


danos subseqüentes ao consumo dos produtos podres. Basta expor à
venda para caracterizar a infração ora repudiada. Pouco importa se o
estabelecimento é grande ou pequeno, se tem ou não funcionários, o
que importa é que quando as pessoas se lançam a exercer
determinada atividade no comércio, em tese, deveriam estar
preparadas para tal exercício. É ridículo ler a confissão da Recorrente
de que é avisada pelos consumidores quando há produtos vencidos.
Isso é transferir ao consumidor obrigação precípua do fornecedor,
que deveria zelar para que o primeiro jamais tivesse esse trabalho ou
corresse esse risco. Gerard-Jerôme Nana, em “La repartion dês
dommagens causes par lês vices d’une chose”, citado por Saad em
sua obra comentada, assinala que consoante o art. 1.641 do Código
Civil Francês, compete ao comerciante a responsabilidade pelos
defeitos da coisa que a tornem impróprias para o consumo. No Brasil,
é assim também. Se o produto está deteriorado e o comerciante tem
conhecimento disso, não resta dúvida que ele assume toda a
responsabilidade pelo que advier de sua venda ao consumidor. Se
pelo tempo decorrido entre a entrega do fabricante e a venda, o
produto deteriorou-se, de toda a evidência que o comerciante deverá
arcar com as conseqüências do ato ilícito.

No âmbito criminal, vender ou expor à venda produtos com a


validade vencida é crime contra o consumo previsto no inciso IX, do
art. 7º da Lei 8.137/90. Acertadamente, o julgado a quo solicitou
providências à Polícia Civil, pois sobejamente provado que a conduta
do comerciante amoldou-se à conduta delituosa. Sobre o assunto, já
decidiu a 13ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo:

A conduta do comerciante que expões à venda produto com prazo


de validade vencido é suficiente para caracterização do crime
previsto no art. 7º, IX, da Lei Federal 8.137/90, sendo irrelevante
que após a apreensão da mercadoria se constate, através de análise
laboratorial, que a mesma era própria para o consumo, visto que o
delito em apreço é de perigo abstrato, aperfeiçoando-se com a mera
transgressão da norma incriminadora, independentemente de
comprovação da impropriedade material ou real do produto (Ap.
986.425/8, julgada em 27/02/96).

Se o estabelecimento não possui condições de promover


diariamente a conferência dos produtos que vende, para ver se estão
poderes ou não, talvez não devesse mesmo exercer o varejo. O valor
da multa atendeu rigorosamente os critérios esculpidos nos arts. 24,
25, 26 27 e 28 do decreto regulamentador e não merece reparos.

Considerando todo o exposto, nego provimento ao recurso e


assim mantenho a decisão anterior nos seus claros e bem lançados
fundamentos. Concedo o benefício do art. 45 do Decreto Municipal
2.575/07, que dá 5% de desconto caso a multa seja recolhida em
dez dias, a contar do conhecimento desta decisão, em favor do Fundo
Municipal dos Interesses Difusos do Município de Uberaba (C/C 64/7,
operação 006, agência 3988, da Caixa Econômica Federal). O
depósito deverá ser informado nos autos. O não recolhimento da
multa acarretará a inscrição do crédito na dívida ativa do municio e
será cobrada em posterior execução fiscal.

Intime-se.

Publique-se no diário oficial.

Uberaba, 10 de março de 2007.

Rodrigo Mateus de Oliveira Signorelli


Coordenador Geral do PROCON/Uberaba

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