Você está na página 1de 15

Introdução à EPISTEMOLOGIA

CONHECER

vocabulário géneros de
conhecimento:
mínimo

por contacto
prático
proposicional

bases:
definição (condições):
C (crença) + V (verdade) + J (justificação)
razão (pensar):
conhec. a priori
experiência (sentidos):
conhec. a posteriori
contraexemplos (Gettier)

relação (cognitiva)
entre um sujeito e
um objeto racionalistas empiristas
» EPISTEMOLOGIA
• Epistemologia (filosofia [ou teoria] do conhecimento) é a área que investiga os pro-
blemas relativos à natureza, fontes e limites do conhecimento (episteme)
– O que é o conhecimento? (O termo “conhecimento” é definível?)
– Qual a origem do conhecimento? (Há limites para se conhecer algo?)
– Será o conhecimento possível? (O nosso conhecimento é genuíno ou ilusório?)

• O conhecimento é o que resulta da relação (cognitiva) entre um sujeito


(aquele [uma mente consciente] que conhece) e um objeto (aquilo [algum
aspeto ou parte do mundo] que é conhecido)
• O sujeito forma crenças (convicções na sua cabeça) acerca do que se passa no mundo
• O próprio sujeito também faz parte do mundo, por isso, somos o sujeito que conhece e
podemos ser o objeto conhecido (“sei que estou a melhorar o meu método de estudo”)
• Nem todas as relações entre nós e o mundo são de natureza cognitiva: por exemplo,
quando abro um buraco na terra para plantar uma árvore
» GÉNEROS DE CONHECIMENTO [SENTIDOS DE ‘CONHECER’]

Géneros de conhecimento O que é?

conhecimento POR CONTACTO consiste numa experiência direta dos objetos


conhecimento PRÁTICO consiste em aptidões para realizar tarefas ou ações
conhecimento PROPOSICIONAL consiste em conhecer proposições (saber que são V.)
» GÉNEROS DE CONHECIMENTO [SENTIDOS DE ‘CONHECER’]
» GÉNEROS DE CONHECIMENTO [SENTIDOS DE ‘CONHECER’]
• Exercícios [C=contacto; PRA=prático; PROP=proposicional]
– A Simone sabe executar um triplo-duplo (duplo mortal com tripla pirueta). PRA
– A Simone conhece várias canções de Billie Eilish. C
– A Simone sabe cantar várias canções de Billie Eilish. PRA
– A Simone sabe que Billie Eilish também a admira. PROP
– A Simone conhece os Açores. C
– Eu sei que Platão foi um filósofo grego. PROP
– O Rui sabe que a Simone conhece os Açores. PROP
– O Rui sabe que os seus amigos não gostam da Simone. PROP
– O Rui sabe esconder dos outros o que realmente pensa. PRA
– Muitas pessoas sabiam que Hitler era racista. PROP
– Ninguém soube impedir Hitler. PRA
– Eu sei que existem (pelo menos) três géneros de conhecimento. PROP
» DEFINIÇÃO TRADICIONAL (TRIPARTIDA)
• A definição do conhecimento (proposicional) começou a ser discutida por
Platão [c. 429 – 327 a. C.] (na obra Teeteto)
– Muitos dizem saber, mas em que condições é correto afirmar que sabemos algo?
– O que é, afinal, o conhecimento? Como se define ‘conhecimento’ (proposicional)?
• A def. ‘platónica’ é conhecida como a definição tradicional (ou tripartida)
– Diz-se que alguém conhece algo quando (3 ingredientes necessários do conhecimento):
• esse alguém acreditar nisso (nesse algo)
• isso em que acredita ser verdadeiro
• esse alguém ter boas razões (justificação) para acreditar nisso
• O conhecimento é (=def.) crença (doxa) verdadeira e justificada (com logos)
• Não se pode conhecer sem acreditar (S [mente de S.] acredita que P)
C • Não se pode conhecer sem que a crença seja verdadeira (P é verdadeira [V. no mundo])
• Não se pode conhecer sem termos boas razões para acreditar nisso (S tem justificação para P)
V Crença = estado psicológico (mental) de convicção ou adesão a uma ideia não há
conhecimento
Crença verdadeira = reflete corretamente o que se passa no mundo
J Crença justificada = sujeito possui boas razões a favor da crença
com crenças falsas
(isso é opinião,
erro ou engano)
» CRÍTICAS À DEFINIÇÃO TRIPARTIDA
• A definição tripartida de conhecimento foi aceite de forma
praticamente consensual durante vários séculos
• Num artigo de 1963, Edmund Gettier [EUA, 1927-2021] descreve situações hipotéticas em que
alguém, apesar de ter uma crença verdadeira e justificada (CVJ), não tem conhecimento
• O ponto de Gettier: ainda que as referidas três condições possam ser necessárias para o
conhecimento (são condições necessárias), elas não são (em conjunto) suficientes
– por outras palavras, a definição tradicional (tripartida) tem falhas e está incompleta (é insuficiente)
• Estas situações hipotéticas são conhecidas como casos ou contraexemplos de Gettier
• Será que tem de se acrescentar algo à definição (o que mais será necessário)? Este
problema (o que é o conhecimento? é possível defini-lo?) continua em aberto

• Caso 1. Um relógio parado indica a hora certa duas vezes por dia.
Imaginemos que a Teresa vê as horas no relógio público da estação, que é bastante
fiável, e pensa: “Nice, 8h25! Já vou chegar atrasada ao teste...”
A Teresa não percebeu que o relógio estava parado, mas, por acaso, são mesmo
8h25. A crença da Teresa (‘São 8h25’) é, pois, verdadeira e está justificada.
Ora, será que a Teresa sabe mesmo que são 8h25? (A sorte ou acaso constituem saber?)
» CRÍTICAS À DEFINIÇÃO TRIPARTIDA
• Caso 2. Os alunos do 12º J organizam um jantar de Natal e convidam o diretor de turma.
O DT tinha de sair mais cedo e, por isso, foi um dos primeiros a aparecer no restaurante, tendo chegado ao
mesmo tempo que o Edmundo.
Enquanto a turma não chegava, o DT foi conversando com o Edmundo sobre o ambiente da turma.
Uma das novidades que o Edmundo partilhou com o DT foi a de que o Paulo namorava com a Micaela.
Entretanto, chegaram mais três colegas, que também confirmaram que o Paulo e a Micaela namoravam,
acrescentando que os namorados se inibiam diante dos professores.
O jantar correu muito bem e toda a turma participou; o DT acabou mesmo por sair mais cedo e saiu
convencido de que o namorado da Micaela estava nojantar.
Na realidade, porém, a Micaela tinha acabado o namoro com o Paulo no dia anterior e, nesse mesmo dia,
tinha começado a namoriscar secretamente com o Ambrósio, que também era do 12.º J e tinha sido o último a
chegar ao jantar, já depois da saída do DT.
Os novos namorados foram muito discretos durante o jantar (não queriam magoar o Paulo).

• O DT, quando saiu do jantar, estava convencido de várias coisas (pensava que as sabia):
– 1. Tinha a crença de que o namorado da Micaela estava no jantar;
– 2. A crença do DT era verdadeira (“o namorado da Micaela foi ao jantar” é verdadeira [Ambrósio!]);
– 3. A crença do DT estava justificada (tem boas razões: tem testemunhos de várias alunos fiáveis)

• Este caso (contraexemplo) sugere que ter uma CVJ não é suficiente para ter conhecimento
– A justificação é a condição mais problemática: o que conta como boa justificação (qual é a sua natureza)?
» CONHECIMENTO A PRIORI & A POSTERIORI
• Há duas fontes ou bases principais de justificação [também há o testemunho, etc.]:
razão (pensamento) & experiência (sentidos)
– justificação da crença baseada no pensamento = conhecimento a priori
(não precisamos nem recorremos aos sentidos; basta pensar: usar somente a razão)
- todas as coisas verdes são coloridas ; os triângulos têm três lados ; 1 + 3 = 4
– justificação da crença formada por meio dos sentidos = conhecimento a posteriori
- o rio Tejo passa por Lisboa ; a relva na primavera é verde ; estou muito feliz
Bases da justificação Modos de conhecer Exemplos

razão (pensar puro, raciocinar) a priori Ou o chão é branco ou não é.

experiência (órgãos dos sentidos) a posteriori O chão é branco.

• Qual dos modos constitui a base fundamental e genuína do conhecimento?


– empiristas = o conhecimento a posteriori é a base e o fundamento do conhecim.;
todo o conhecimento dos factos do mundo é a posteriori (modelo: ciências)
– racionalistas = o conhecimento a priori é a base do conhecimento genuíno (modelo: mat.);
algum do conhecimento sobre o mundo é a priori
» MODOS DE CONHECER
• Exercícios [ APRI=a priori; APOS=a posteriori]
– Todos os pedaços de metal dilatam sob a ação do calor. APOS
– Nem todos os cisnes são brancos. APOS
– Deus existe ou não existe. APRI
– Há muitas pessoas no mundo. APOS
– Ontem estive muito triste. APOS
– Nenhum casado é solteiro. APRI
– a + b = b + a. APRI
– Os mudos comunicam por gestos. APOS
– Os quadrados têm quatro lados. APRI
– Uma pessoa muda não fala. APRI
– Tudo aquilo que é branco tem cor. APRI
– A pólvora tem propriedades explosivas. APOS
» EMPIRISMO VS. RACIONALISMO [síntese]
• Empirismo
– Os empiristas, entre os quais se inclui David Hume, são céticos quanto ao
conhecimento a priori do mundo (ou dos factos do mundo).
– De um modo geral, não negam inteiramente a existência deste conhecimento, mas
pensam que ele se circunscreve à lógica, matemática e às verdades meramente
linguísticas.
– Os empiristas declaram que a lógica, a matemática e todas as afirmações que são
verdadeiras por definição nada nos dizem realmente sobre o mundo.
– Pensam que não existe conhecimento a priori dos factos do mundo, ou seja, que
todo o conhecimento factual (do mundo) é a posteriori ou empírico.

• Racionalismo
– Os racionalistas, entre os quais se inclui René Descartes, geralmente não negam que
exista conhecimento a posteriori, mas pensam que, recorrendo unicamente à razão
ou ao pensamento (raciocínio), podemos obter conhecimento factual ou genuíno.
– Por exemplo, muitos racionalistas pensam que podemos saber a priori que Deus existe.
– Os racionalistas supõem, frequentemente, que o conhecimento a priori, por
oposição ao conhecimento empírico, assenta em justificações certas ouinfalíveis.
» O DESAFIO CÉTICO
» CETICISMO: TESES, ARGUMENTOS E CRÍTICAS
• Segundo os céticos, nenhuma das nossas crenças está justificada
– as bases tradicionais (razão, experiência, etc.) não garantem que não nos enganemos
– em suma, nenhuma crença pode tornar-se conhecimento (“conhecimento”=ilusão)
• Se há conhecimento, algumas crenças estão justificadas A→ B
• Mas nenhuma crençaestá justificada ~B (forma válida: modus tollens)
• Logo, não há conhecimento ~A
– na prática (vida real), os céticos suspendem o juízo (V? F?) [epoché] acerca de qualquer crença
-- ceticismo = nada pode ser conhecido com certeza (no melhor dos casos, tudo é mera opinião; para
alguns céticos, a incerteza ou limitação está nas capacidades humanas, para outros, está na realidade)
• Os céticos (aqueles que apresentam razões) usam, entre outros, estes dois argumentos:
– DIVERGÊNCIA DE OPINÕES (mesmo entre especialistas, não há certezas {infalíveis})
– REGRESSÃO INFINITA DE JUSTIFICAÇÕES (A é justificada por B, e [B?] B por C, e [C?] C por D... ∞)
• Críticas à posição cética:
– O ceticismo é autorrefutante; dizer (ou assumir) “sei que o conhecimento é
impossível” é uma proposição que se refuta a si mesma: digo que sei algo (não há
conhecimento) e, ao mesmo tempo, que nada se pode saber!
– O ceticismo é insustentável devido às suas implicações impraticáveis no quotidiano
» CETICISMO: TIPOS BÁSICOS E POSIÇÃO OPOSTA
• Ceticismo radical
– põem em causa, de modo global, a possibilidade de toda e qualquer espécie de
conhecimento (certo e infalível) [cético radical: Pirro de Élis]
– dúvida (para os rad.) é um modo de vida (prática diária) e um fim em si (ataraxia)
• Ceticismo moderado
– cinge o ceticismo a certos géneros ou domínios do conhecimento
• ex. 1: ser cético acerca do conhecimento da (in)existência de Deus (nome: agnósticos)
• ex. 2: ser cético em relação à possibilidade de se conhecer o que é o bem ou o mal
(estes céticos chamam-se céticos morais)
• ex. 3: ser cético quanto ao conhecimento a priori do mundo (chamam-se empiristas)

• Dogmatismo (oposto de ceticismo)


– os céticos antigos usavam esse termo para designar as teorias não-céticas
– eles pensavam que os filósofos dogmáticos eram demasiado audazes ao pensarem
que podiam saber (e dizer) que algo era definitivamente verdadeiro
– atualmente: termo usado para designar a aderência acrítica a teses/posições; crenças
sustentadas como certezas injustificadas chamam-se “dogmas” (religião, senso-comum, etc)

Você também pode gostar