Você está na página 1de 257

Copyright 2024 ©

1° edição – ABRIL 2024

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS A ALINE PÁDUA


Edição: AAA Design
Ilustração: L.A. Design
Revisão: Sônia Carvalho
Para o Deus que eu acredito
Para todos os deuses que possam escutar
Pela chance de continuar
Pela honra de poder escrever
SUMÁRIO
NOTA I
PLAYLIST
SINOPSE
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
CAPÍTULO 40
CAPÍTULO 41
EPÍLOGO
BÔNUS
NOTA II
UMA FILHA PARA O MAFIOSO QUE NÃO ME AMA
UM FILHO SURPRESA PARA O CEO
REJEITADA & CASADA COM O MAFIOSO QUE NÃO ME AMA
USADA & NOIVA COM O MAFIOSO QUE NÃO ME AMA
Torres-Reis-Kang-Esteves
UMA GRAVIDEZ INESPERADA
CEO INESPERADO – meu ex-melhor amigo
O BEBÊ INESPERADO DO COWBOY
FELIZ NATAL, TORRES
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O VIÚVO
GRÁVIDA DO CEO QUE NÃO ME AMA
O CASAMENTO DO CEO POR UM BEBÊ
A FILHA DO VIÚVO QUE ME ODEIA
GRÁVIDA EM UM CASAMENTO POR CONTRATO
UM CASAMENTO DE MENTIRA PARA O CEO
GRÁVIDA DO COWBOY QUE NÃO ME AMA
UMA FILHA INESPERADA PARA O CEO
UMA FILHA INESPERADA NA MÁFIA
GRÁVIDA DO MAFIOSO QUE NÃO ME AMA
REJEITADA POR UM MAFIOSO
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O MAFIOSO
UMA GRAVIDEZ INESPERADA PARA O MAFIOSO
Junqueira-Dias
UM NAMORO DE MENTIRINHA COM O CEO
UMA FAMÍLIA DE MENTIRINHA COM O COWBOY
UMA GRAVIDEZ DE MENTIRINHA COM O VIÚVO
UM CASAMENTO DE MENTIRINHA COM O COWBOY
REJEITADA & GRÁVIDA DO VIÚVO QUE NÃO ME AMA
NOTA I

Oi!
E chegamos em mais um deles – os Hansen. Completando
5/8.
Uma família mafiosa com origem escandinava, que cada
irmão leva o nome de um dos deuses nórdicos. Espero que
estejam ansiosas para conhecer Tyr – o nosso misterioso e muito
amado, deus da guerra!
Não sei o que dizer, mas o que posso adiantar é que ele é
especialista em evitar guerras e um verdadeiro diplomata, mas
não pensa duas vezes antes de ameaçar uma por conta dela...
Obrigada por estar aqui, e espero que a terça-feira nunca
mais seja a mesma para você (logo vão entender).

Boa leitura,
Aline
PLAYLIST

Posicione a câmera do seu celular para ler o QR Code e conheça um


pouquinho das músicas que inspiraram este livro. Caso não consiga ter acesso,
clique aqui
SINOPSE

Ela, a caçula da máfia egípcia.


Ele, o herdeiro da máfia escandinava.
Ela, já vendida para um casamento.
Ele, vê nela alguém que precisa de ajuda.
Ela, vê nele a chance de ser deserdada.
Então ela consegue o que tanto precisa: uma gravidez. Só não
imaginou que ficaria grávida de Tyr Hansen, e que seria obrigada a
se casar como mafioso que não a ama.
CAPÍTULO 1

TYR
Eu devia parar de pensar com o meu pau.
Era um fato, de que Vidar tinha total razão sobre aquilo. Meu
irmão era a pessoa mais quieta que eu conhecia, mas quando abria
a boca para opinar, sempre estava certo.
— Eu disse que noites egípcias podem ser solitárias? —
indaguei sozinho, caminhando por uma grande praça cheia de
árvores, e sem sinal de uma alma viva.
Vidar apenas bufou no ponto que eu tinha no ouvido, e eu
sabia que ele se segurava para não dizer: eu avisei.
— Eu acho que não deveria ter bebido aquele uísque ruim
depois de uma foda também ruim — comentei, e ouvia apenas sua
respiração no ponto.
Vidar e minhas interpretações implícitas do que uma
respiração dele poderia significar.
— Ou então...
Parei de falar, no momento que me aproximei do que parecia
uma fonte desativada, e bancos quebrados no canto direito da
praça. Vi apenas um vulto, que parecia uma pessoa, ajoelhando-se e
falando sozinha. Parei meus passos, colocando-me atrás de uma
árvore, e tentei escutar.
— Não é muito, mas... vou tentar trazer mais amanhã.
A voz era feminina. E ela falava egípcio. A realidade voltou em
minha mente, e permaneci parado ali, puxando o ar com cuidado, e
notando o cheiro forte de canela que se espalhava ao meu redor.
Seria dela? Do perfume dela?
— Tenta dormir aqui embaixo, com essa parte da minha
roupa.
Segurei-me para não olhar e ver o que ela fazia, e fiquei ainda
mais curioso, de como tinha simplesmente parado em uma situação
como aquelas. Depois de uma noite péssima, para quem só queria
transar e beber, não me imaginei escondido atrás de uma árvore, e
ouvindo a voz de uma completa desconhecida.
— Boa noite, pequenininha.
Escutei os passos dela se afastando, e contei mentalmente,
quinze segundos, até olhar ao redor, e sair de onde me escondi.
Notei então, que ela deveria estar a cerca de vinte passos dali, perto
dos bancos de madeira amontoados, e eu via de relance, pela pouca
luz que vinha dos postes, o formato de um gatinho, parecendo
comer algo.
Dei passos para perto, apenas o suficiente para ver melhor e
não assustar o bichinho. Foi então que percebi que ela havia deixado
seu casaco ali, como uma cama para o gatinho que ainda comia
como se faminto, o que ela havia deixado, em um potinho
claramente improvisado. Assim como, outro com água, que estava
ao lado.
— Acho que isso não vai ser o bastante para você, não é? —
perguntei, sem saber por que usava minha língua natal com o
gatinho à minha frente.
Olhinhos amarelos encontraram os meus, e não sabia dizer
como, mas tive certeza de que era uma fêmea, encarando-me como
se curiosa. Pensei que ela teria medo, ou qualquer coisa parecido,
contudo, ali estava ela, apenas me encarando desconfiada.
— Eu sou Tyr — falei, e me agachei, mas não ousei levar
uma das mãos até ela. — Você deve ter um nome?
Foi quando ela miou, baixinho e um pouco rouca, e um sorriso
se abriu no meu rosto.
— Hoje é... — olhei rapidamente meu relógio e confirmei o dia
da semana. — Terça-feira, seria um nome legal, não?
Ela miou novamente, e meu coração se derreteu.
— Vou conseguir mais comida e dar um jeito nessas madeiras
para que fique mais confortável — avisei. — Pode esperar aqui, sim?
Ela miou, e eu sorri ainda mais.
— O que está fazendo, T?
A pergunta veio direto no meu ponto, e sequer me lembrava
de que Vidar estava me ouvindo ainda.
— Acho que acabei de adotar uma gatinha.
— Mas eu ouvi a voz de outra pessoa...
— Talvez seja uma guarda compartilhada de uma gatinha da
rua... — admiti, e conseguia imaginar o olhar incrédulo de meu
irmão. — Vou ver se consigo achar algo aberto para comprar tudo
para gatos.
— Só falta escrever um bilhete e avisar a outra dona de que
esteve aí.
Foi quando me deu tal estalo.
— Alguém já disse o quão genial você é, V?
Ele apenas bufou, enquanto eu procurava o caderninho que
sempre carregava no bolso de dentro da jaqueta, e o retirava de lá.
Peguei o lápis que já quase desaparecia, mas sempre estava no
bolso da minha calça. Comecei a escrever, e rabisquei no segundo
seguinte, ao perceber que estava escrevendo na minha língua natal.
Como eu esperava que a pessoa me respondesse, se eu colocasse
em nórdico antigo? Ri de mim mesmo, e então escrevi em egípcio.

“É bonito ver que ainda existe bondade nas pessoas


Essa gatinha aqui, com certeza, está feliz por ter encontrado a
sua”

— T, sai já daí!
— Ache um lugar aberto para mim, que tenha comida para
gatos.
— T...
— V...
Ele sabia muito bem, que quando eu colocava algo na cabeça,
não sairia tão fácil. Ainda mais, quando se tratava de admirar
alguém por um ato de pura bondade. Era algo que eu admirava,
mais do que tudo. Depois de presenciar tanta crueldade em todo
mundo, ver o raro oposto dela, acontecendo, enchia-me de
esperança.
De que o amanhã seria melhor, se soubéssemos mediar o
hoje.
— Vai ter que vir até o carro.
— Estou indo, irmãozinho do meu coração.
Vidar bufou, e eu ri sozinho, fazendo um último carinho na
cabeça da gatinha, a quem já tinha dado um nome, mesmo que
talvez não o aceitasse ou não o tivesse.
— Eu volto, prometo.
Ela deu outro miadinho, e partiu para beber algo.
Afastei-me, seguindo o meu caminho, em direção ao que
deveria já estar – o carro de meu irmão. Não demorou muito, depois
de duas quadras, para encontrá-lo. Abri a porta do motorista, e me
sentei, um simples vazio no peito, que eu não reconhecia.
Colocaria a culpa na foda ruim e na bebida terrível.
— Podemos só focar no que viemos falar?
— Estamos falantes hoje, não? — provoquei, e Vidar sequer
me encarava, enquanto parecia concentrado em limpar sua arma
favorita. — Onde fica a loja?
— Duas horas daqui, na cidade do lado — avisou, e eu
assenti, colocando o cinto de segurança. — T...
— Sabe que não adianta ir contra mim.
— Devo lembrar do que estamos fazendo aqui?
— Estudando a venda das mulheres da família e pertencentes
à máfia Ramesses — repeti, ligando o carro e saindo com o veículo.
— E fizemos o máximo que podíamos desde o momento que
chegamos aqui. O que vamos fazer na madrugada?
— Você que é o esperto de nós, já deveria ter um plano —
rebateu.
— A mulher no bar disse algumas coisas interessantes... —
comecei soltando o ar com força. — Eu sempre te disse que o sexo é
ótimo para fazer as pessoas falarem.
— Pensei que a foda tivesse sido ruim.
— E foi, para o meu prazer, não para o dela. — Pisquei um
olho, e encarei o caminho que ele já tinha deixado na tela de
multimídia do carro. — Então, como nós já sabemos, eles são
divididos em salões, e segundo ela, ela viveu no salão secundário,
de um dos vários filhos homens de Seti, que batia na esposa, e a
traía com qualquer pessoa que quisesse... — comentei, e tentei
recordar mais do que ela disse. — E que o viu interagir poucas vezes
com as irmãs... Pelo jeito, irmãs que nunca duram muito.
Geralmente desaparecem e ninguém mais fala delas.
— Seria o tráfico que imaginamos?
— Usar o próprio sangue para traficar? — indaguei para o
nada, assim como para Vidar. — Seria mais caro vender alguém do
próprio sangue... — concluí, e meu irmão assentiu com a cabeça. —
Ainda assim...
— E?
— E, bom, ela disse que o pai deles não para de engravidar
várias mulheres diferentes, tudo para continuar vendendo as filhas e
continuar o legado com os homens...
— E como essa mulher que dormiu escapou?
— Ela é estéril — falei, o que ela tinha me contado. —
Quando Seti descobre algo assim, ele apenas as descarta, se não
pior...
— Bom, ainda parece um conto de fadas perto do que Ymir
seria.
— Por isso, pode ser ainda mais real — admiti, e ele assentiu.
Sabíamos que Ymir, nosso doador de esperma, era um dos
retratos mais assustadores e doentes do que um chefe da máfia
poderia representar. Seti Ramesses era um cordeirinho, se eu
conseguisse comprovar que fazia tudo o que me foi falado. Contudo,
se fosse real, ele teria que pagar, e parar.
— Hella não daria uma pista falsa — comentei, sabendo que
foi ela que praticamente encomendou aquela missão. — Odin
demorou demais para se envolver com isso.
— Os dois seriam perfeitos, juntos, como chefes. — Vidar
falou, e eu concordei com a cabeça.
O fato era que nossos irmãos mais velhos tinham um
equilíbrio perfeito, quando se tratava de tomarem decisões para a
máfia. O que já não valia tanto, quando se referia a eles mesmos.
— Então vamos fazer essa primeira missão de Hella, um
sucesso, para que não haja nenhuma dúvida de que ela tem uma
visão diferenciada...
— Diz o cara que está dirigindo na madrugada para comprar
comida para um gato.
— Gata — corrigi-o, e sabia que Vidar julgava até minha alma.
— O nome dela é Terça-feira.
— Você é tão clichê...
— O melhor dos Hansen, eu sei.
— Não foi um elogio, irmão.
Bati o seu ombro com o meu, e ele apenas ficou encarando a
paisagem pela janela, enquanto eu me concentrava em dirigir.
Suspirei fundo, e fiquei ainda mais perplexo, pela forma como senti
falta do cheiro de canela, que tinha acabado de conhecer.
Aquilo parecia mais clichê do que eu mesmo era.
CAPÍTULO 2

TYR
Mulheres Ramesses são deserdadas se não forem virgens...
Li e reli o papel meio queimado e quase se desfazendo em
minhas mãos. Nunca imaginei que encontraria regras de uma máfia,
em uma velha biblioteca da cidade que eles deveriam proteger. Que
deveria ser a cidade deles. Pelo jeito, além do lado do lugar que eles
viviam, todo o resto, parecia perto de colapsar.
— É tudo o que tem aqui? — perguntei para a adolescente de
uns quatorze anos, que estava à frente da biblioteca. Era aquele, o
nível de organização que eles tinham para uma estrutura que
deveria protegê-los.
Um dos grandes erros de máfias: esquecer que conhecimento
é poder.
— Pode levar a pasta, se quiser — ela falou, e deu de ombros.
— Ninguém procura nada sobre os Ramesses, então, não fará falta.
Olhei-a surpreso.
— Ninguém?
— A não ser uma mulher, que apareceu meses atrás, mas
apenas chegou, leu, roubou um papel que eu fingi não ver que fez,
e nunca mais voltou... — considerou. — Minha avó toca esse lugar
há anos, e nunca, ninguém além de você e aquela moça apareceram
aqui para saber dessa família.
— Por que não procurariam mais sobre eles?
— Bom, eles são uma família poderosa, que manda nessa
cidade, assim como em outras ao redor, mas não têm mais tanta
fama...
Eu amava o fato de adolescentes simplesmente não pensarem
muito antes de apenas contarem algo.
— Com o que eles trabalham?
Foi quando ela arregalou os olhos, e eu quase ri.
— T... — Vidar chamou minha atenção no ponto.
— O senhor é da polícia internacional?
— Se eu fosse, acha que eu poderia usar palavras de uma
adolescente como provas? — rebati, e ela arregalou ainda mais os
olhos. — A resposta é não. — Pisquei um olho para ela. — Mas fique
tranquila, que eu sou apenas um curioso, nada demais.
— Não parece apenas um curioso, usando roupas chiques
assim...
— Eu te disse para se disfarçar melhor, porra! — Vidar ficava
ainda mais falante quando estava puto.
— Bom, não se pode ser rico e curioso?
— Pode, mas...
— O fato é que eu nunca estive aqui — falei para ela,
amontoando os papéis que eram o que restava da história dos
Ramesses ali. — E você, nunca me viu.
— Se não é da polícia... então é de outra máfia?
— A adolescente é esperta. — Vidar falou no ponto e eu sorri.
— Veio matar eles... a gente?
— Não — respondi, vendo a clara aflição em seu rosto. — Por
que eu faria isso?
— Então é mesmo de outra máfia? — ela indagou, e arregalou
os olhos novamente. — Acho melhor sair daqui e...
— Eu nunca estive aqui, lembre-se disso.
Ela assentiu várias vezes, enquanto eu apenas tirava várias
notas da moeda deles, e colocava sobre uma das estantes de livros.
— Nunca, certo?
— Certo.
Vi-a assentir, conforme pegava o dinheiro e contava-o, e tive
certeza de que seus olhos sairiam do rosto. Saí dali, e segui para o
carro, onde Vidar me esperava, e sabia que ele me julgaria até a
nossa última geração.
— Que merda, T!
— Consegui retalhos deles, e nada mais. — Dei de ombros. —
Estamos um pouco complicados em descobrir as leis assim.
— Não há câmeras e nada parecido nesse lado da cidade... —
avisou, e eu suspirei fundo, tentando seguir sua linha de raciocínio.
— Já o outro, é totalmente vigiado, como te disse.
— Por que abandonar metade da cidade que a máfia nasceu,
e a outra não?
— Nada está fazendo muito sentido aqui.
— Bom, se não conseguirmos nada, vou tentar nas máfias ao
redor, até chegar no que queremos.
— Por enquanto, seria melhor, ficarmos por aqui — sugeriu. —
A outra parte é muito vigiada, e não demorará para nos notarem.
— É melhor espião do que isso, V.
— Estou falando isso por sua causa, não por mim.
— Ok ok.
Eu ri e saí com o carro, notando a diferença absurda dentre as
ruas daquela parte da cidade, que parecia esquecida no tempo.
Segui, procurando um lugar em que pudéssemos passar a noite,
diferente da anterior, que ficamos no que parecia a parte privilegiada
dali.
— Tem uma pousada, não longe daqui — Vidar falou,
mexendo na tela da multimídia e colocando o endereço.
— Isso aqui me cheira a abandono forçado — comentei,
sabendo de todas as situações que já tínhamos visto acontecer, em
máfias de diferentes lugares do mundo.
O objetivo de cada um dos Hansen era bem diferente. Eu,
como levava o nome do deus da guerra, não era de simplesmente
iniciar uma, na realidade, era de fazer o possível para que elas
fossem evitadas. E era o meu trabalho e minha vida, desde que
tinha meus dezesseis anos.
— Não me surpreenderia se fossem apenas mulheres
trabalhando por aqui — falei, tentando montar o meu raciocínio.
— Qual sua teoria?
— Baseado no quase nada que temos, de que foi uma disputa
de território, que Ramesses ganhou, contra mulheres, e para puni-
las, as obriga a viver na parte pobre e debilitada daqui... Para que
nunca se esqueçam do que perderam, por irem contra ele.
— É por isso que você leva o nome do deus da guerra.
— É uma teoria, V.
— Parece uma realidade.
Foi quando ele indicou com a cabeça, e eu notei que logo à
frente do endereço que ele tinha marcado, havia uma mulher parada
do lado de fora, como se fosse uma segurança.
— Depois de tantas experiências, pode ser que eu acerte
aqui.
— Acertou nas suas teorias em 99% dos lugares que fomos —
Vidar rebateu.
— Bom, sempre há chance de eu estar um por cento
enganado.
Estacionei o carro, e baixei o vidro, para perguntar a mulher
que encarava o carro curiosa.
— É uma pousada?
— Depende de quem pergunta.
— Dois historiadores — respondi, e ela semicerrou o olhar. —
Ricos e curiosos.
Ela pareceu convencida quando falei a parte financeira.
Enquanto terminava de estacionar o caminho que ela indicou,
para assim nos acomodar, eu só pensava, que logo que a
madrugada chegasse, eu tinha um encontro marcado. Tinha
comprado ração e sachê para gato filhote que daria para meses, e
os levaria.
Não sabia se pela esperança de ver outro ato de bondade. Ou
se simplesmente, por poder sentir-me parte do mesmo. Contudo,
era algo, que não conseguia evitar, por mais arriscado que fosse.
CAPÍTULO 3

TYR
Eram quase duas da manhã quando voltei para o outro lado
da cidade, e mesmo que Vidar fosse totalmente contra, acabou
ficando no carro me esperando. O cheiro de canela que estava perto
de onde a gatinha ficava era inconfundível, ainda mais, deixando
claro, que a outra pessoa esteve ali.
Suspirei fundo, adorando o cheiro, e antes mesmo que
precisasse procurar por Terça-Feira, ela já estava se esfregando nas
minhas pernas.
— Aí está você — falei baixo, e me agachei, passando a mão
por sua cabeça, e ela se jogou no chão, como se pedindo por mais.
Eu sempre temi animais, de todos os tipos, e principalmente,
os selvagens. Não sabia explicar o porquê de ter ficado com o
coração tão abalado com o de olhinhos amarelados que ronronava à
minha frente.
— Sua outra dona já deve ter te enchido de comida, não é?
Fui até onde estavam os bancos quebrados e que agora
parecia mais organizado, e o sobretudo dela, com o cheiro de canela
ainda forte, como um cobertor improvisado, em que Terça-Feira logo
se enrolou e se deitou sobre.
Porém, o que me chamou mais atenção foi o fato de que o
papel que eu havia deixado, debaixo do cobertor, não estava mais
ali, mas sim, um outro, com um fundo amarelado na folha.
Admirei a letra um pouco confusa, e me forcei a entender o
que ela escreveu.

“Parece uma guarda compartilhada e gosto disso


Uma hora não virei mais, espero que possa ser a parte boa da
vida para uma vida que vale a pena”

Foi o que consegui entender e interpretar em partes. Parecia


que a pessoa não sabia escrever direito, o que não era um real
problema, mas me intrigou um pouco. O que eu sabia sobre a
desconhecida: um: ela cheirava a canela; dois: ela cuidava daquela
gatinha; três: deveria morar na parte privilegiada da cidade; quatro:
tinha bondade em si.
Não era muito para conseguir descobrir de quem realmente se
tratava, contudo, aquele também não era meu objetivo. Eu tinha
seis meses para ter um relatório completo feito e pronto nas mãos
do chefe da minha máfia, vulgo, meu irmão mais velho, dando-lhe
todo o parecer das leis da máfia egípcia, que segundo Hella, se
mostrou mais uma máfia sem leis do que qualquer outra coisa.
Era para aquilo que eu estava ali, com a suspeita de tráfico de
mulheres do próprio sangue da máfia, que era apenas o final da
cadeia de abusos que vinham antes. Suspirei fundo, e foquei no
agora, colocando um pouco de sachê no potinho de ração que eu
tinha trocado para Terça, e que a mulher deveria ter usado antes de
eu chegar ali.
Enquanto a pequenina comia, permaneci agachado ao seu
lado, e retirei o bloquinho e lápis da minha jaqueta, para deixar
outro recado para a mulher que vinha ali.
“Ela está comendo duas vezes por nossa causa, mas é pelo
seu bem.
Por que pararia de vir cuidar dela?”

Não pude deixar de perguntar, e troquei os papéis. Guardando


o que tinha sua letra no meu bolso, e deixando o meu sobre o que
se tornou a cama de Terça. Não saberia por que, mas algo me
intrigava naquela história. Algo que eu não conseguia, de fato,
explicar em como acendia um pequeno alerta no meu estômago.
— Tem alguém se aproximando, cinquenta metros de você.
O aviso veio em meu ponto, me afastei a contragosto da
gatinha, e dei passos largos até ficar atrás do que era uma caçamba
de entulhos, colocada ali, talvez, para a finalização daquela praça,
que parecia sem qualquer movimentação trabalhadora nos dois dias
que a analisei.
— Ela vem até aqui?
Ouvi a pergunta e era de um homem, que não deveria estar
muito próximo, já que soava como um sussurro.
— Vinte metros, T.
— Ela vem e depois volta para casa — outro homem falou, e
eu sabia, de alguma maneira, que era sobre a mulher que cuidava
da gatinha.
— Bom, já é uma falha e grande — o primeiro falou e pareceu
suspirar fundo. — Deixe-a vir mais alguns dias, até que possamos
puni-la adequadamente.
— Sim, senhor Ramesses.
Foi aí que o negócio todo meu pegou. Ouvi Vidar prender a
própria respiração do outro lado do ponto, e permaneci escondido.
Como ele mesmo diria, se não estivesse ocupado colocando alvos
direto nos peitos dos homens que estavam há alguns metros de
mim, você gosta de viver e resolver tudo perigosamente.
É o meu charme, era o que sempre respondia.
— Fez um ótimo trabalho, agora vamos voltar para o salão.
— Cinquenta metros novamente, e se afastando... — a voz de
Vidar soou mais baixa do que ele sempre fazia, e eu soltei o ar com
força. — Eu falei que era uma ideia de merda, porra!
— Conseguimos algo sobre os Ramesses.
— O quê?
— Não ouviu no ponto? — rebati, ainda escondido.
— Estava ocupado pensando em como matar dois homens
estando há cem metros de você — xingou e eu ri baixinho.
— Um dos homens chamou o outro de “senhor Ramesses” —
expliquei, e Vidar ficou em silêncio. — Te conto melhor quando
voltar para o carro.
— Volte já para o carro, T.
— Vou ver como Terça está.
— T...
Apenas ignorei as reclamações dele, e fui até a gatinha, que
tinha se escondido no fundo dos bancos quebrados, e era quase que
imperceptível ali, já que se camuflava à quase total escuridão
daquele lugar, se não fosse pela fraca luz do poste.
— Eles já foram, pequena.
Ela deu um miadinho, e veio até mim a passos vagarosos.
— Mas você é esperta e se escondeu. — Toquei sua cabeça.
— Não se esqueça de fazer isso ou correr, se for preciso.
Ela miou de novo, como se me respondendo, e eu sorri.
O sentimento que se instalou em meu peito agora, era o
mesmo que tinha encontrado em meu estômago. Algo naquela
situação em si não estava, de fato, certo, e eu começava a tentar
juntar as peças do quebra-cabeça.
CAPÍTULO 4

ISIS
Era para ser um ponto apenas de distração para o homem
que sempre me perseguia durante as minhas escapadas. Eu sabia
que ele já havia me delatado, e sabia também, que tinha poucas
oportunidades até não poder mais quebrar as regras. Eles me
permitiriam quebrá-las até que pudessem me punir da forma mais
cruel.
Suspirei fundo, conforme ajeitava meu vestido de cor branca,
e jogava o sobretudo preto sobre o corpo, que além de tudo, tinha
uma grande touca que escondia meu rosto de desavisados. Por mais
que eu soubesse que estava sendo seguida, eu o usava a meu favor.
Deixava-os saber que estava indo até um lugar, enquanto eu
desaparecia para outro, mesmo que fossem poucos minutos.
Em alguma noite, quando eu tomasse coragem, não seriam
apenas alguns minutos – seria a virada toda. E era o momento pelo
qual eu tanto aguardava. O problema era que por mais que eu
procurasse, em rostos desconhecidos e corpos diferentes algo que
me fizesse ter uma vontade além, da própria sobrevivência, de estar
com eles, eu nada encontrava.
Não parecia existir nada, em nenhum dos lugares que eu
buscava pela minha chance de me livrar daquele fardo. Da vida que
me aguardava dali a três semanas.
Repeti, as palavras que tinham se tornado um mantra para o
meu dia a dia: Mulheres Ramesses são deserdadas se não forem
virgens e estiverem grávidas.
Apeguei-me àquela parte final e específica das antigas leis
encontradas na antiga biblioteca. Sabia que quase nada mais existia,
para ser seguido à risca na máfia, contudo, as antigas leis não
poderiam ser ignoradas, nem mesmo, pelo meu pai – o chefe da
Família Ramesses.
Era no que eu me agarrava, enquanto fazia e refazia planos
que pareciam perfeitos demais em minha mente, e quando tentava
executar, saía totalmente do meu controle. Em vez de eu ter
conseguido estar com qualquer homem que fosse e engravidado, eu
tinha acabado por entrar em uma guarda compartilhada, que sequer
fazia sentido, com um desconhecido, por conta de uma gatinha de
rua.
Só queria conseguir dar o meu passo principal, e levá-la
comigo, para a minha nova vida.
Eu tinha mais três chances, durante as próximas três
semanas, e não poderiam desperdiçá-las. Sabia que um dos meus
irmãos só estava me esperando cometer a quinta infração para
poder anunciar minhas punições, à frente do nosso pai.
Era um jogo tão antigo e arcaico quanto o próprio tempo.
Homens pertencentes à máfia e família Ramesses, oprimindo
e punindo mulheres apenas por serem mulheres.
Sem escolhas, direitos, vontades, momentos e oportunidades.
As mulheres nascidas aqui, só tinham direito a uma coisa: serem
vendidas no ano mais fértil. Sabia que não existia qualquer estudo
por trás, a não ser, as próprias leis antigas, de que o ano mais fértil
de uma mulher com o sangue Ramesses era aos vinte.
Suspeitava eu, que alguma mulher tinha conseguido
convencer quem fazia as leias naquela época, de que essa era a
verdade. O fato era que se não fosse esse detalhe, todas, sem
exceção, seriam vendidas ainda menores de idade. O que não era
um descarte, já que aconteceu algumas vezes.
Quanto mais dinheiro era oferecido, mais a lei parecia menos
poderosa para meu pai. Pai? Um homem que eu não conhecia e
muito menos chamei de tal maneira algum dia. Eu o fazia na minha
mente, e me via corrigindo segundos depois, como nesse exato
segundo.
Medi meus passos e meu horário, sabendo que já deveria sair.
Segui então pela parte que tinha uma trepadeira presa ao muro de
trás da casa. O portão dos fundos raramente sendo usado, e assim,
tendo menos vigilância. Contudo, era a única passagem que eu
conhecia daquela enorme propriedade separada em salões e o
mundo real.
Subi pelo muro, na parte mais escura, e que sabia que uma
das câmeras não deveria estar funcionando. Se estivesse, eu já teria
sido penalizada antes por ter descoberto um ponto cego e não
comunicado. Passei para o outro lado do muro, que nem era de fato
muito alto. Talvez tivesse o dobro do meu tamanho, o que não
significava muito.
Assim que me sentei no alto do muro, pulei rapidamente
sobre o canteiro de areia que tinha ali perto, que sempre ajudava a
amenizar o impacto contra meus pés. Por mais que eu sempre
necessitasse de bons cinco minutos para voltar a sentir minhas
pernas normalmente. Era um ritual com o qual eu já estava
acostumada.
O horário para fugir. A trepadeira de um lado e o canteiro do
outro. O bar que ficava há vinte quadras dali. Os minutos que eu
perdia lá e que tinham que ser mais. E então, a volta, parando na
praça em revitalização, que simplesmente foi abandonada.
Fiz meu caminho, tampando meu rosto e pescoço com um
lenço preto. Tudo o que eu necessitava era que alguém pudesse me
reconhecer. Achava improvável, mas das poucas vezes que eu tinha
estado do lado de fora da mansão Ramesses, foi justamente para a
máfia se gabar da beleza das suas mulheres. Não duvidava que
algumas pessoas se lembrariam daquilo. Da beleza que lhes traria
riqueza.
Quando cheguei à porta do bar, entreguei o dinheiro enrolado
e guardado entre meus dedos ao segurança que ficava ali, e que
parecia nem um pouco preocupado com quem entrava ou saía.
Sabia que era um lugar sem leis, bem ali. Ouvi sobre aquele
lugar, justamente porque meus irmãos sempre comentavam sobre
ele. Era o lugar que eles mais encontravam novas amantes e
adoravam se gabar a respeito. Quase fiquei surda pela surra que
levei ao ser pega ouvindo atrás da porta, mas tinha valido a pena,
porque era um lugar onde eu encontrava absolutamente todo tipo
de pessoa.
E era o que eu precisava.
Quanto mais diferente melhor, para tentar me fazer ter a
coragem necessária, em meio à minha própria necessidade. Tirei a
touca, e abri meu sobretudo, caminhando até o bar, e me sentando
em uma das banquetas.
— O de sempre? — a mulher perguntou, já acostumada com
a minha presença nos últimos dias, e eu assenti.
Ela logo deixou uma garrafa de água com gás à minha frente.
— Obrigada — falei, e novamente me dei o tempo suficiente
para terminar aquela garrafa, para finalmente escolher ou então,
voltar para casa.
Casa... parecia até um insulto chamar aquele lugar de tal
maneira.
— Quem vem a um bar, onde tudo parece à meia luz, tem
pessoas se beijando pelos cantos, e pede apenas água?
A pergunta veio do meu lado direito, e mais próximo ao final
do balcão do bar. Foi quando o homem se levantou, deu passos em
minha direção, e fez um sinal com a cabeça em direção à banqueta
ao meu lado. Um sinal que eu não entendi.
Ele então deu um passo à frente, puxou a banqueta vazia
para si, ao meu lado, e se sentou.
— Gosto de água — foi tudo o que consegui responder.
Tentei manter o olhar no dele, mas não consegui, apenas
focando em tomar a minha água. Eu deveria ser melhor do que
aquilo, se o meu objetivo era sair grávida daquele lugar.
— Água sempre é bom — falou, e encarei a bebida de cor
marrom em seu copo. — Sendo honesto, não gostei de nenhuma
bebida alcoólica daqui até o momento.
— São ruins?
— Perto da minha favorita, são terríveis — admitiu, e tentei
encará-lo.
De relance, notei que ele usava roupas escuras, tanto uma
calça, quanto a camisa e a jaqueta por cima dela. Assim como botas
que pareciam de couro em seus pés. Tinha cabelos próximos à nuca,
meio ondulados e que pareciam extremamente bem-cuidados.
Forcei-me a olhá-lo de verdade, em seu rosto, e então o
encarei com afinco. Ele tinha sobrancelhas grossas, e estavam
arqueadas, como se curiosas. Os olhos eram tão escuros, que eu
conseguia ver alguns pontinhos diferentes em sua íris, se
destacando. A barba bem-feita, destacando a boca que parecia
totalmente hidratada, e eu não sabia dizer, porque o estava
analisando como se fosse um tutorial de beleza.
O que eu estava fazendo, afinal?
Eu estava perto de terminar minha água, e parei, sentindo a
ansiedade me tomando. Novamente, eu não tinha escolhido ou dado
algum passo. Por que não poderia ser simples: oi, tudo bem? eu
tenho camisinha, quer transar comigo?
O fato era que tudo o que eu sabia sobre sexo, me assustava
e me aterrorizava. Ter aquela como minha única saída direta dos
Ramesses, tornava tudo ainda pior. Eu precisava ter a coragem de
descobrir como fosse, o que era se deitar com outra pessoa.
— Quer outra água?
O homem perguntou, e eu pisquei algumas vezes, vendo que
tinha saído por completo dali por alguns segundos. Minha água já no
final, e eu neguei com a cabeça, terminando de tomar.
— Não, obrigada.
Direcionei o dinheiro para a bartender, e fechei meu
sobretudo, pronta para ir embora. Já tinha dado o tempo para
decidir ficar ou não. Ir ou finalmente me libertar. Eu ainda tinha duas
chances, e contava com elas. Talvez sob pressão, eu conseguisse o
fazer.
— Aliás, pode me chamar de T — o homem falou de repente,
enquanto eu terminava de ajeitar minha touca. — Você é?
Ele me deu as iniciais dele.
— I — foi tudo o que saiu da minha boca.
Ele então estendeu uma das mãos em minha direção, o que
me deixou totalmente surpresa. Tomando uma coragem que não
sabia de onde vinha, levei a minha até a dele. Senti a forma leve e
cuidadosa com que ele segurou a minha, o calor vindo de sua pele,
e como ele parecia apenas ser normal.
Tudo o que eu gostaria de ser.
— Te vejo algum dia desses, I?
Talvez fosse a minha chance – minha mente gritava. Separei a
minha mão da dele e respirei fundo, pensando ser o destino me
dando aquela oportunidade.
Ele parecia, no mínimo, decente. E não poderia negar, era o
homem mais bonito que eu já tinha visto. O fato era que eu
precisava não só admirá-lo, mas sim, ir para a cama com ele. Então,
eu tinha que falar com ele, de algum jeito. Encontrá-lo novamente, o
mais rápido possível.
— Daqui a uma semana — avisei, sabendo que era uma
cartada, para saber se ele teria algum interesse em mim.
— Até a próxima semana então, I.
Ele fez um leve aceno com a cabeça, e eu me vi saindo
rapidamente do bar. Eu tinha feito o que precisava? Não. Eu tinha,
finalmente, encontrado alguma luz? Sim. E era naquilo, que eu me
apegava, enquanto seguia em direção à praça, dali a algumas
quadras.
Eu contaria cada detalhe para Hathor. A minha confidente e
que gostaria tanto que fosse minha companheira. Se eu
conseguisse, na próxima semana, estar com T, talvez eu pudesse
levá-la comigo.
T, ele se apresentou como T. Poderia ser a inicial de tantos
nomes, que eu me vi procurando cada um deles, e lembrando-me do
seu rosto, tentando fazer ornar.
Mas nada batia de fato. Nada parecia combinar com ele.
Contudo, o que eu realmente me questionava não era apenas
sobre o seu real nome, mas sim, o fato de como seria, seduzir um
homem como ele. Eu conseguiria? Eu saberia o que fazer?
E a pergunta que me atormentou, mesmo tentando evitar: eu
combinaria com ele?
CAPÍTULO 5

TYR
Terminei o uísque, e segui meu caminho, contando meus
passos para sair dali. Sabia que ela era seguida, então ir direto para
a praça não era uma opção. Fui para o carro com Vidar, que me
esperava lá dentro, claramente entediado.
— Tem os registros dos Ramesses aí?
— Incrivelmente, só se tem acesso aos registros dos homens
nascidos na máfia.
— Tá brincando comigo? — indaguei, perplexo.
— Sabe que eu não brinco, irmão.
Peguei o Ipad que Vidar me entregou, e fiquei ainda mais
incomodado, lendo todos os nomes, datas de nascimentos, os
registros em ordem alfabética, e nada dos nomes de mulheres.
— Como ele vende as filhas se elas não têm registro? —
indaguei para o nada, e a resposta, como sempre, parecia se formar
assim que deixava a questão em voz alta. — A não ser que o
registro já fique com a futura máfia em que a filha fará parte.
— Isso é bizarro no nível de Ymir.
— Mas não nos surpreende.
Ele assentiu, e eu fiquei apenas sentado ali, indagando-me de
como tudo aquilo funcionava. Talvez, a mulher que eu tinha
conhecido pelo mais puro acaso, tivesse cada uma das respostas
que precisávamos.
— Vou me encontrar com ela novamente, daqui a uma
semana — contei a Vidar, que mal me encarava.
Não o culpava, deveria estar puto por eu não ter aceitado
usar o ponto durante aquela noite. Se eu morresse, ele me mataria,
eu sabia.
— E acho que posso descobrir o que ela realmente quer... — e
novamente, a resposta caiu no meu colo. A teoria de uma, pelo
menos. — Ela parece procurar alguma coisa, mas pode ser alguém.
— O que quer dizer, Tyr?
— A biblioteca, a mulher que apareceu lá antes, o resto que
ficou de alguns documentos... Dizia sobre as mulheres da máfia
daqui terem que ser virgens, se não, serão deserdadas.
— Ela quer ser deserdada? Essa é a sua teoria?
— Ela é esperta... — falei, olhando para o nada, e
recalculando minha rota. — Ela pode ter conversado comigo,
justamente por isso.
— Para perder a virgindade, T?
— Para ter algum alvo em mente — admiti. — Ela parecia
totalmente perdida, e não sabendo nem se portar em um bar... —
dei de ombros. — Posso ter me colocado como seu alvo para isso.
— Torço para que não seja real.
— Por quê? — rebati, encarando-o.
— Porque se envolver sexualmente com a herdeira de uma
família mafiosa que estamos investigando não é algo que deveria
fazer. — Sua resposta parecia na ponta da língua. — Tyr... Não está
pensando em...
— Em ceder ao que ela quiser? — Dei de ombros. — Se for
para que ela faça, que seja com alguém que não vai machucá-la.
— Que nobre da sua parte, irmão.
— Nunca disse que sou o mocinho da história, V.
— Odeio quando fica obcecado por algo, e isso não é o real
objetivo da nossa missão.
— Não estou obcecado por ela — falei, olhando-o com toda a
certeza que tinha.
Eu não estava.
Não tinha o porquê estar.
— Você fica obcecado por tudo que é um mistério — rebateu.
Fiquei apenas calado, sem saber como argumentar.
Dirigi com o carro, em direção ao lugar que Vidar marcou no
mapa como salvo, para poder esperar que ela tivesse passado, assim
como o cara que a seguia.
Enquanto isso, a minha mente brigava consigo mesma. Ela
era um mistério, não tinha como negar aquilo. Contudo, não era
algo que me manteria tão interessado a ponto de ficar obcecado. Ou
era?
— Vai visitar a gatinha ou não?
A pergunta de Vidar me tirou de meus pensamentos, e eu
assenti, enquanto ele apenas abria a porta do carro e praticamente
me mandava para fora.
— Eles já foram, faz cinco minutos.
— Por que não disse logo?
— Parecia mais interessado em remoer sua não obsessão.
O pior de tudo era que ele realmente não brincava, o que
deixava suas palavras ainda mais pesadas. Pelos deuses, eu era um
homem de mais de trinta anos. Tinha que manter o foco. Perdendo-
o, apenas para poder alimentar a bolinha de pelos que ficava há
poucos passos de mim.
— E como estamos nessa madrugada?
Ela miou, como se me respondendo, e eu não pude evitar de
colocar o sachê, e enquanto ela comia e eu acariciava seus pelos,
pegar o papel escondido debaixo da caminha de Terça.

“Não vou parar por minha vontade, mas talvez, a leve comigo
Caso eu a leve, te aviso.
Se não, seja a bondade que ela precisa”

Li aquele recado, e notei os erros que ela tentou corrigir,


mesmo com a caneta, e como sua letra era bem difícil de decifrar.
Guardei o papel e dobrei, colocando-o no meu bolso, e peguei meu
bloquinho, para responder. Um ronronar me fez parar e sorrir, e
então dar mais carinho para a pequenininha à minha frente.
— Sua mãe é meio misteriosa, não é?
Ela apenas subiu em meu colo e ficou esparramando-se, e eu
foquei em escrever meu recado de volta. Parecia uma rotina nova,
que eu não imaginava estar gostando. Por mais que sempre tivesse
detestado algo monótono, gostava daquilo. Trocar bilhetinhos
secretos no meio da noite, com uma completa desconhecida... Eu
realmente era um clichê, e mais uma vez, Vidar estava certo.

Voltamos para a pousada, do outro lado da cidade, e Vidar


simplesmente se jogou na cama ao lado e dormiu. Nunca entenderia
como ele conseguia apenas se desligar da realidade e sequer ficar
pensando sobre o que fosse, antes de realmente adormecer. Suspirei
fundo, encarando os documentos que eu tinha acesso, olhando as
fotos de família dos Ramesses. Os registros de mulheres, todos eles,
apenas das esposas dos respectivos filhos dele. Nada além.
Olhando para a foto que tinha, e passando a mão pelos traços
de cada um, tentava buscar na memória, algum que eu tivesse
esbarrado. Parei sobre um, e procurei pelo registro dele: Rael. A
observação feita era sobre Thor quase ter quebrado a mão dele na
própria festa de casamento.
Peguei meu celular e disquei o número do meu irmão,
esperando que tivesse alguma informação que pudesse me tirar
daquela névoa cinzenta.
— T, sabe que horas são?
— A hora perfeita para me dizer tudo o que sabe sobre os
Ramesses — respondi, e ouvi-o bufar.
— Só conheci Rael pessoalmente, um bêbado aproveitador —
falou, eu anotei ao lado da foto do tal Rael, e me questionei
internamente, se o mau-caratismo era genético. — Já o ouvi falar
sobre uma irmã mais nova, mas sempre soltou o nome e nunca a
vi...
Foi quando parei e apenas o escutei de fato.
— Acho que era Isis o nome, e ele falava como se fazendo
propaganda, mas só quando estava muito bêbado mesmo...
— Thor, já disse que é o melhor irmão mais velho?
— É o que diz para Odin e Baldur?
— Talvez, mas... nesse momento, você é o melhor — rebati,
ouvi-o bufar e apenas desligar na minha cara no segundo seguinte.
Thor “sem paciência” como sempre.
— Isis...
Abri uma nova página no documento e escrevi o nome dela:
Isis Ramesses. Fiquei ali, um tempo, apenas escrevendo os detalhes
que eu tinha sobre ela, em respeito do que teorizava, mas parecia
tudo muito vago. Por mais que eu fosse bom em adivinhar, sabia que
eu queria as certezas.
Por que ela ia àquele bar?
Por que quem a seguia a delatava?
Por que um dos irmãos estava esperando para puni-la?
Por quê? Por quê? Por quê?
Resolvi então abrir o arquivo que fiz durante todos aqueles
anos sobre diversas máfias e cartéis ao redor do mundo. O problema
seria se não tivesse nada no que já foi digitalizado, o que era cerca
de 5% de tudo o que conseguimos nos últimos dez anos. Mas a
quem poderíamos destinar uma tarefa como aquela, de tamanha
confiança?
Suspirei fundo, sabendo que apenas eu e Vidar o fazíamos, e
por aquilo, poderia não encontrar nada no nosso arquivo que
remetesse a Isis.
— Isis... — testei seu nome em minha boca, e olhei de
relance para meu irmão que dormia, que parecia conseguir me
julgar até mesmo inconsciente.
Suspirei fundo e digitei o nome dela, apenas o primeiro, e o
número de resultados, apenas treze, me deixou desanimado. Como
de treze resultados algum deles poderiam ser sobre ela? Sobre a Isis
que eu estava tentando encontrar?
Contudo, apenas cliquei em “ir”. No momento que a página se
abriu, soltei um palavrão, e senti meu corpo cair para trás na cama.
Ouvi a arma de Vidar sendo desengatilhada, e logo o vi pairar
sobre mim e me encarar perplexo. Guardou a arma novamente, e
apenas me ignorou, jogando-se novamente na sua cama.
Isis R. – Futura esposa do mais jovem herdeiro da máfia
chinesa. Levei a mão ao rosto, incrédulo que tínhamos conseguido
aquela informação, cerca de cinco anos atrás. Olhando-a
pessoalmente, chutaria que tinha apenas vinte anos, e pelo jeito, já
estava prometida desde muito antes a outra máfia, que pagaria em
barras de ouro por ela.
Por aquilo, os registros bancários dos Ramesses não batiam.
Eles faziam a troca em ouro. Bendita fosse a enciclopédia que eu e
Vidar estávamos construindo sobre as máfias. Salvei aquelas
informações em mente, e deixei o aparelho de lado. Precisava
dormir e entender o que Isis estava tramando.
Claramente, não era algo que conseguiríamos desvendar tão
fácil. Seria ótimo apenas chegar e dizer: oi, tudo bem? quer
denunciar sua própria máfia e família?
Porém, sabia que não era daquele jeito que as coisas
funcionavam. Nem de perto.
CAPÍTULO 6

TYR

A estaca zero e visitas noturnas a Terça-Feira fizeram a minha


semana. O último recado que deixei para Isis, não tinha obtido
resposta e sabia que pela maneira que Terça me esperava, ela
sequer apareceu para alimentá-la. Ela me disse que viria em uma
semana – e era exatamente naquela noite.
— Acho que sua mãe vem te ver hoje, acho... — falei,
enquanto ela comia, e eu colocava outro recado abaixo do deixado
ao decorrer dos dias. — Prometo vir te ver na madrugada também.
Terça miou e eu me derretia sempre que ela o fazia. Suspirei
fundo e fui em direção ao carro, parado há poucos metros dali, e fiz
meu caminho em direção ao bar, tirando a escuta de Vidar, que
deveria estar me maldizendo, de onde estivesse me observando.
Eu sabia que ele sempre estava lá observando e cuidando.
Entrei no bar, e me surpreendi no segundo em que vi Isis
sentada à frente do balcão, e tomando algo diferente de água. Ela
não usava um sobretudo por cima do vestido branco de mangas
compridas e costas abertas, que deixava a pele à mostra. Seu
semblante era diferente do anterior. Ela parecia ter tomado alguma
decisão, para estar ali, parecendo pronta para atacar.
Contudo, seu olhar buscava por alguma coisa, como se
precisasse encontrar algum semblante que já conhecia. E algo me
dizia, que ela estava procurando pelo meu.
Notei quando passei por ela, a maneira como sua cabeça
virou e pareceu me procurar. O cheiro dela, de canela, deixando
claro que eu não a estava confundindo com ninguém.
— Disse que voltaria em uma semana, e voltou — falei,
parando ao seu lado, e sem me sentar. — Me procurando por acaso?
— Na verdade, sim. — Sua voz soou um pouco trêmula, mas
ela a firmou no final. — Eu queria te pagar uma bebida.
Os cabelos dela eram longos e espessos, mas notei a marca
que parecia de um recente machucado, que os fios pareciam tentar
cobrir propositalmente.
— Acabou caindo? — perguntei, apontando com o dedo para
a marca roxa em sua clavícula, e ela sorriu sem graça.
— Sim, eu sou um pouco desastrada.
Assenti, e tentei não pensar sobre, porque se o fizesse
acabaria saindo do meu racional.
— Uma bebida, então? — indaguei, e neguei com a cabeça. —
Acho que uma água, estaria bom.
Ela me encarou surpreso.
— Tem certeza? — indagou.
— Tem certeza de que vai beber esse mojito?
Ela olhou da bebida para mim, e assentiu, virando-o.
— Ei... foi só uma pergunta — falei, enquanto ela fazia uma
careta pela bebida, e seus olhos castanhos pararam nos meus. —
Por que está bebendo?
— Para ter coragem.
— Do que, I?
— Disso.
Então, surpreendendo-me por completo, senti os lábios dela
sobre os meus. Um simples selar, mas que me deixou totalmente
espantado. Ela tinha vindo pronta para fazer o que precisava, e eu
era, como imaginei, o seu alvo. Correspondi com cuidado o beijo,
sem aprofundá-lo, e agradeci à meia luz que tinha naquela parte do
bar.
Minhas mãos paradas ao lado da sua cintura, enquanto as
dela estavam no meu rosto.
— Eu pensei que poderia querer isso.
— O que, exatamente?
Vi-a desviar o olhar e me encarar.
— Eu. — Olhei-a ainda mais surpreso. — Desde que te vi, só
penso em como seria perder minha virgindade com você.
Ok, ela tinha sido honesta! Pontos para ela. Se tinha algo que
eu sempre admirava, além da bondade, era a honestidade das
pessoas. Se ela queria me usar para algo, pelo menos, que fosse
claro como água.
E pelo jeito, eu era o carro de fuga que ela tanto esperou.
— Ok, vamos com calma... — falei, levando uma das minhas
mãos às suas, ainda em meu rosto. — Quantos anos tem?
— Vinte, praticamente — comentou, e fiz uma nota mental.
Eu era mais de uma década mais velho que ela. — Faço aniversário
em poucas semanas.
— Não precisa se explicar tanto, apenas...
Suspirei fundo, e levei a mão até sua cintura, olhando suas
reações, e aproveitando a música que tocava no fundo.
— Apenas sinta um pouco.
Ela pareceu surpresa, mas não me afastou. Seu corpo que
antes parecia totalmente duro, começou a se soltar, e sua respiração
mudou. Ela parecia estar mais à vontade.
— Sei que pode ser uma necessidade... o sexo — falei, a
encarando, e balançando seu corpo com o meu. — Mas não precisa
ser tão frio.
— Eu não sei como isso pode ser.
Novamente, a honestidade dela.
— Pode ser lento, quente, e o mais importante, prazeroso. —
Vi as bochechas dela ficarem coradas, e sorri para deixá-la tranquila.
— Eu só queria que acontecesse, nada mais.
A sua admissão quase me deixou de joelhos.
A mulher não tinha ideia de que eu sabia exatamente do
porquê ela estar tentando perder a virgindade comigo, e muito
menos, quem eu era, mas ainda assim, era honesta.
— Bom, nós podemos, mas...
— Mas... — ela pareceu ligeiramente ansiosa. — Eu tenho
camisinha, se é o que precisa.
Eu quase ri do seu desespero.
— Fico feliz que tenha vindo preparada, mas não é sobre isso.
— Seu semblante mudou, enquanto eu ainda a balançava em um
ritmo lento, diferente da música que começou a tocar. — Mas precisa
querer isso, de verdade.
— O que quer dizer?
— Que eu posso tirar sua virgindade, mas só vou fazer isso,
se realmente me quiser.
Ela arregalou os olhos e assentiu.
— Eu quero.
Sabia que ela não mentia, mas uma coisa era o que sua boca
dizia, outra, o que seu corpo mostraria.
— Não suas palavras, mitt spyd — falei e ela claramente não
entendeu o apelido, mas apenas continuei. — O seu corpo vai me
dizer.
Parei a dança e afastei-me um passo, oferecendo-lhe minha
mão. Ela pareceu sequer pensar e a aceitou. Foi quando a levei
comigo para uma saída alternativa do bar, que daria diretamente
para onde meu carro nos esperava, e quem a perseguia, nunca nos
encontraria.
No momento que eu entrei no carro e a vi ali, no banco do
carona, olhando-me como se sua vida dependesse daquilo, soube
que eu estava realmente fodido. Ou de fato, obcecado.
Levei uma de minhas mãos até sua boca e a contornei,
vendo-a acompanhar com o olhar, o que eu fazia.
— Posso te beijar?
Ela assentiu, e fechou os olhos.
Suspirei fundo, considerando se deveria ou não seguir com
aquilo, mas a realidade me bateu, no momento que ela encostou
nossos lábios novamente. Ela não me dava tempo algum para
considerar outra coisa. E a realidade era, que eu não queria.
Seus lábios eram quentes e claramente expectadores, quando
eu mordi o seu inferior, e invadi sua boca com minha língua. Ouvi-a
arfar surpresa, mas ela não me afastou, pelo contrário, me puxou
ainda mais. Sorri em meio ao beijo, enquanto ela parecia me seguir,
tentando aprender, e tirando meu juízo com apenas aquela amostra.
Quando foi preciso respirar, tudo o que eu conseguia ver e
pensar era ela – seus lábios inchados pelas mordidas, o seu cabelo
bagunçado, os olhos dilatados e a respiração entrecortada. E nada
mais me importou naquele momento que não fosse: cuidar dela, do
jeito que ela merecia.
CAPÍTULO 7

ISIS

Eu nunca pensei que um beijo pudesse ser assim. Nunca


imaginei, que estaria sentindo meu corpo formigar por inteiro e
necessitado de mais do que ele poderia me entregar.
Talvez a espera, pelo certo, tivesse valido a pena. Talvez, por
aquilo, eu tivesse relutado tanto em apenas chegar em um cara e
pedir uma transa. Suspirei fundo, quando sua mão veio para o meu
rosto, e fechei os olhos, tamanho o poder que sentia me rondar.
— Posso te levar para um lugar melhor que esse?
— O que...
— Se é sua primeira vez, não seria justo ser em um carro no
meio da rua, certo? — indagou, e eu não tinha resposta.
A verdade era que eu não tinha qualquer noção de como
seria. Eu estava disposta a aceitar qualquer coisa, contanto que
conseguisse aquela noite.
— Eu não tenho um lugar para te levar — admiti.
— Mas eu tenho — sugeriu, e eu suspirei fundo.
A realidade me bateu, logo após eu assentir, e um leve beijo
ser depositado ao lado dos meus lábios – eu não estava com medo
dele. Eu tinha pavor da situação em si, mas dele, eu não tinha medo
algum. O que me deixou em alerta. Por que não sentir medo de um
desconhecido?
Para quem passou a vida temendo tudo o que conhecia,
parecia apenas muito longe de qualquer realidade, sentir-me de uma
forma diferente para um estranho. Talvez aquela fosse a questão.
Ele não era da máfia em que eu nasci. Ele não era sangue do meu
sangue.
Talvez aquela fosse a resposta.
Ele não era nenhum deles.
E a verdade era, que eu não tinha nada a perder. Eu nunca
tive nada que pudesse controlar, e fazendo aquilo sob as minhas
condições, já era um ato de liberdade. Nem que fosse o último que
tivesse.
— Vamos até um hotel na cidade ao lado.
— Vamos sair daqui?
Ele assentiu, os olhos presos na estrada, enquanto levava
uma mão ao cinto, passava-o à minha frente, e o prendia ao meu
lado.
— Não gosta da cidade ao lado?
— Eu nunca estive lá.
A resposta saiu tão fácil, que sequer consegui pensar antes de
o fazer. Era apenas um fato: eu nunca tinha ido tão longe. Olhei para
a paisagem de uma estrada que parecia pouco movimentada, e
fiquei presa a cada detalhe.
— Você pode colocar uma música, se preferir — sugeriu, e eu
olhei para ele, sem entender de fato. — Aqui... — ele clicou em algo
na tela à minha frente, que parecia como a de um celular, e eu fiquei
embasbacada. — Tem uma playlist da minha irmã mais nova, talvez
possa gostar ou conhecer algo.
— Pode ser.
Foi tudo o que consegui falar, enquanto ele clicava em algo, e
uma música começava. O fato era que eu sabia que a música era em
inglês, e talvez já até tivesse escutado, mas não tinha ideia do que
falava. Apenas fiquei concentrada na paisagem, e mexia minha
cabeça, à medida que respirava devagar.
Parecia tão surreal pensar, que estaria ali, no meio de uma
estrada, com um desconhecido, ouvindo música em inglês e prestes
a perder minha virgindade, e se tudo corresse bem, eu teria um filho
dele.
Olhei de relance para ele, e pensei em como seria, se tudo
corresse como eu esperava, nunca mais o ver. E o fato que eu teria
para sempre, uma lembrança de quem ele era.
T.
T era o nome do homem que estava me apresentando mais
do que qualquer outro o fez. E de alguma forma, eu sentia lá no
fundo, que ficaria cravado em mim, por mais que eu não quisesse
que algo assim me ocorresse. Se fosse para aquele plano todo ser
uma lembrança boa, eu não iria me opor.
E já o era.
Mesmo que eu não soubesse o final.
A forma como eu conhecia lugares novos, ouvia músicas
novas, e ele cantava baixinho algumas delas, me fez apenas pensar
em como deveria ser, uma vida ao lado de alguém como ele.
Uma vida que não fosse medida de acordo com o seu próprio
sobrenome. Gostava de pensar em como o cotidiano poderia ser
mágico, perto de quem nunca o conheceu de fato.
CAPÍTULO 8

ISIS

Eu conhecia salões bonitos. Paredes e estátuas em mármore,


prata, ouro e diamante. Era o mais perto da riqueza que eu tinha
chegado, mas me surpreendia o lugar que eu acabava de entrar,
parecer tão simples, apenas por ser um quarto comum, mesmo que
no último andar de um hotel.
— Quer beber algo?
— Coragem?
Meu pensamento saiu em voz alta, e só percebi que o fiz,
quando ouvi a risada masculina logo atrás de mim.
— Não precisa fazer nada que não queira — ele falou, seu
tom era sério, e eu suspirei fundo, encarando a minha realidade.
Não era sobre o que eu queria, era sobre o que eu precisava.
Eu já tinha dado um passo para fora dali, então, eu precisava passar
aquela noite. A punição que viesse, seria minha. Mas eu tinha como
reverter tudo dali a algumas semanas, se o resultado do teste fosse
positivo.
— Eu acho que deve ser normal, estar nervosa...
Falei, e suspirei fundo, virando meu corpo para ele, que mexia
em uma garrafa que estava dentro de um balde de gelo, colocada ao
lado da cama.
— Se eu te contar da minha primeira vez, será que ajuda?
Olhei-o surpresa, e ele sorriu de lado.
— Foi bem frustrante, para a mulher que estava comigo —
admitiu, e o vi se sentar na cama, enquanto abria a garrafa, do que
parecia champanhe. — Não durei mais do que um minuto? — eu não
entendia ao certo o que ele queria dizer com aquilo, mas assenti.
Vi-me curiosa, e me sentei na ponta da cama, do mesmo lado
que ele.
— Fiz ela me ensinar em como dar prazer a uma mulher, além
de claro, o sexo com penetração. — Eu estava um pouco estática,
pensando sobre o que ele deveria estar esperando de mim.
Eu não sabia o que esperar do sexo, mas eu já tive aulas de
como dar prazer a um homem na cama. E saber de tudo aquilo,
decorado em algum lugar do meu cérebro, me assombrava.
— Pelo menos, posso dizer que sempre dei prazer às minhas
parceiras — falou, tirou a tampa da garrafa, e vi-o pegar uma taça
sobre a mesa que estava ali ao lado, que só agora notava que era
móvel. — Esse champanhe tem pouco teor de álcool, mas pode
querer estar totalmente sóbria, tirando o seu mojito de mais cedo...
— Como deu prazer a ela? — perguntei, talvez uma das
únicas oportunidades que teria, de simplesmente questionar o que
me vinha em mente, para alguém que não me conhecia.
Ele arqueou uma sobrancelha, como se surpreso.
— Com a boca e dedos — falou, e eu franzi o cenho. — É um
longo caminho de recompensa.
— E o que vai fazer comigo? — indaguei, sentindo-me
corajosa, e aceitando a taça que ele me entregou.
— O que você quiser, e claro, se seu corpo me disser que
também quer isso.
— Eu não entendo — assumi, e ele abriu um sorriso leve, sem
julgamento algum. Ele parecia apenas tão curioso quanto eu.
Só não entendia o porquê de ele estar fazendo tudo aquilo.
E não me importava, de fato.
Uma música começou a tocar, baixa, enquanto ele virou o
líquido de sua taça de uma vez, e eu terminei a minha, que não
tinha quase nada. Ele esticou uma das mãos para mim, e eu sabia
que podia escolher. Ele estava me dando a chance de o fazer, a cada
segundo. E a cada um deles, parecendo precisar que eu me
reafirmasse.
Aceitei seu toque e apreciei a maneira como uma de suas
mãos ficou na minha, e a outra se acomodou na minha cintura.
— Com quantas mulheres já esteve? — perguntei baixo, sem
saber de onde me vinha tamanha coragem.
— Nunca contei — falou honesto. — Eu viajo muito, por todo
o mundo, e sempre apreciei uma boa companhia.
Então ele já tinha estado com muitas, que até perdeu as
contas. Não sabia explicar, o fogo que cresceu lá no fundo do meu
âmago, como um alerta.
— Deve ser bom, conhecer o mundo e pessoas diferentes...
— Sim. — Ele me embalava com seu corpo, e logo me senti
mais próxima do seu peito. — Mas é sempre bom voltar para casa.
E eu não sabia nada daquilo. Não tinha ideia do que era poder
ir, e muito menos, do sentimento de querer voltar. Tudo o que eu
fazia, naquele momento, era pensar em como poderia fugir e nunca
mais ter em vista aquele lugar.
Contudo, quando o olhar dele parou no meu, senti minha
boca secar, e tive que molhar meus lábios, soube que estava presa a
um sentimento que eu não conseguia definir.
Era diferente da necessidade que eu tinha de me libertar. Era
uma necessidade quase que palpável, de ficar ainda mais próxima a
ele.
E como se lesse meus pensamentos, os lábios dele vieram
para os meus, e não saberia dizer como, mais um gemido escapou
da minha boca para a dele, pela forma como ele simplesmente
aprofundou o beijo, sem me dar qualquer fôlego. Derreti-me por
completo, agarrando-me ao seu pescoço, enquanto ele me segurava
firmemente com um dos braços, e o outro em minha nuca.
Não sabia como, mas as mãos dele pareciam em todo lugar,
deslizando por extremidades do meu corpo, e nunca parecendo o
suficiente.
— T, eu...
— Tyr. — corrigiu-me, e seus lábios ficaram há um fio de
cabelo de distância dos meus. — É o meu nome.
— Bonito e diferente — falei, e ele sorriu de lado, seus lábios
tão perto, que eu gostaria de me pendurar.
— Não como você.
E então, seus lábios tomaram os meus novamente. Senti meu
corpo ganhar vida própria, aproximando-me o quanto podia dele,
quase subindo sobre seu corpo, e percebi que era um instinto
correto, quando ele me levantou com uma das mãos, e cruzei
minhas pernas ao redor da sua cintura.
Senti o quanto ele estava duro para mim e gemi em sua boca,
enquanto seus beijos passaram para o meu pescoço e colo, fazendo-
me perder a noção da realidade.
— Onde dói, mitt spyd?
Sentia a vergonha em cada canto do meu corpo, mas ela era
tão pequena perto da dor que eu realmente sentia, pulsando em
uma parte de mim, que nunca imaginei que teria tal reação.
Levei sua mão livre até o meio das minhas pernas, vi-o arfar,
e perdi por completo o controle do meu corpo.
Não demorou para que eu sentisse algo confortável às minhas
costas, e então, antes que eu chegasse ao nexo de que estava sobre
a cama, uma de suas mãos chegou ao meu íntimo, e tocou
exatamente no lugar que eu necessitava. Vi-o soltar algo em uma
língua que eu desconhecia, e em seguida, seus dedos em uma parte
de mim, que eu nunca tinha tocado. Que ninguém o tinha feito.
Só notei que estava de olhos fechados, quando ele afastou os
dedos, e quando os abri, vi que os seus estavam sobre mim, como
se analisando cada uma das minhas reações.
— Tão molhada... — falou, e me mostrou seus dedos,
fazendo-me quase gemer, sem entender por que aquilo parecia tão
bom. — Seu corpo me quer, mas eu preciso que saiba que eu posso
parar, a qualquer segundo. Não me importa, você pode me pedir
para parar, a qualquer segundo.
Eu assenti, e ele negou com a cabeça.
— Você entendeu?
— Sim, eu... eu posso pedir para que pare, a qualquer
momento — falei, e ele sorriu de lado, seus lábios vindo para os
meus.
Senti meu corpo todo tensionar, imaginando que agora ele se
afastaria, tiraria as calças e me tomaria. Suspirei fundo, e minha
respiração travou. Diferente do que imaginei, ele apenas levou os
dedos molhados de mim até sua boca e eu fiquei boquiaberta.
Então, seus lábios desceram para o meu pescoço, e todo meu
corpo começou a relaxar. Ele não parecia com pressa para
absolutamente nada, e ficou ainda mais claro, quando se demorou
para beijar o meu colo, sem chegar aos meus seios, mas seus olhos
nos meus, como se pedindo permissão.
Tomando uma coragem que nem sabia que tinha, vi-me
puxando como conseguia, o vestido para baixo, e o olhar dele
acompanhou cada passo.
Ele xingou em outra língua, enquanto eu terminava de
praticamente destruir o vestido ao tirá-lo daquela maneira, e então,
eu estava totalmente nua, e ele estava completamente vestido, me
encarando.
— Não vou deixar que se arrependa nunca disso, mitt spid.
Então sua boca tomou a minha, e antes que eu pudesse
raciocinar após o fôlego que me foi tomado, senti a boca dele em
meio aos meus seios, e descendo pela minha barriga, até que sua
boca simplesmente me devorou. Nunca pensei que estaria assim,
totalmente aberta, e gemendo, implorando por algo que não sabia,
no mesmo instante em que a boca de um desconhecido tomava meu
racional por completo.
Não totalmente desconhecido.
Era Tyr – o homem que eu escolhi para ser o meu primeiro.
CAPÍTULO 9

ISIS
Nunca imaginei que sentiria todo meu corpo dolorido,
enquanto eu me esticava, e tentava acordar. Lutando contra um
sono que não imaginei ser possível. Olhei rapidamente para o relógio
que estava na mesa de cabeceira, e entrei em pânico ao ver que já
eram cinco da manhã.
Eu tinha passado a noite.
Eu tinha... eu tinha passado a noite com o homem que
escolhi.
Levei a mão até minha barriga como se procurando uma
resposta, ao mesmo tempo que sentia meu corpo reclamar por estar
me movendo.
— Precisa ir?
A voz veio ao fundo, e eu então levantei o olhar, encontrando-
o do lado oposto, vestido com um roupão felpudo, e encarando a
vista da janela do canto do quarto. O sol ainda não tinha nascido por
completo. Talvez fosse o tempo suficiente para eu chegar na cidade,
e então me descobrirem.
O soldado que me seguia, com toda certeza, já deveria ter
dado minha fuga. Todos os lugares ao redor da cidade deveriam
estar em alerta, para qualquer passo que fosse meu ou não.
— Eu...
— Vou pedir um carro para te deixar lá, não se preocupe.
Olhei-o sem entender, e ele então se virou.
— Não sabe quem eu sou, e talvez nunca saiba, mas espero
que tenha te ajudado, de algum jeito. — Olhei-o confusa. — Sei que
já fez o que precisava. — Franzi o cenho confusa, enquanto me
levantava e sabia que usava apenas a camisa dele em meu corpo. —
Tem roupas novas, que devem te servir, bem ali.
Ele indicou uma sacola de papelão e corri até ela, a pegando,
e apenas fui direto para a primeira porta que vi e acreditei ser o
banheiro.
Joguei água em meu rosto, e encarei os roxos deixados perto
de meus seios. Diferente de todos os outros roxos que eu já tive,
aqueles ali, tinham a melhor dor que eu poderia imaginar. Talvez
fossem uma lembrança daquela noite.
Tentei não pensar muito, e então terminei de vestir a roupa
que era uma calça e camiseta, no que parecia seda ou linho, e saí
para o quarto.
— Como sabe do que eu preciso? — indaguei, no momento
que passaria por ele.
— Sei quem é, Isis.
Eu mal sabia como respirar naquele instante.
— Não acho que devo te chamar pelo seu sobrenome, por
tudo o que está fazendo — comentou, e eu engoli em seco.
— Quem é você, realmente? — indaguei, e ele negou com a
cabeça.
— Ninguém que você deveria ter conhecido, acredito — falou,
e deu um passo à frente, ficando bem próximo. — Espero que dê
certo, o que pretende.
— Mas... mas como sabe...
— Não posso te dar todas as respostas.
— Por que dessa noite? Por que me ajudar? — indaguei ainda
mais confusa.
— Porque todos merecemos ter escolha, mesmo na máfia. —
falou, ignorando a rela questão. — Se puder, me escolha como uma
lembrança bonita.
Dei um passo atrás e respirei fundo.
— Vai ter um carro te esperando lá embaixo, e vai ter uma
parada e depois te levar direto para a Mansão. — Olhei-o incrédula.
— Se eu pudesse ajudar mais, eu o faria. Mas ainda é cedo para
isso.
— Por que me ajudaria, ainda mais? — indaguei, e ele abriu
um sorriso de lado.
— Apenas vá em segurança. — Suas mãos pararam sobre
meu rosto, em um leve carinho, e as lembranças da noite e
madrugada me embargaram.
Por que estava sendo tão intenso dizer adeus a ele? Por que
eu continuava a fazer perguntas?
— Alguém dos Ramesses te obrigou a fazer isso? — perguntei,
levando minhas mãos às dele, e encarando seus olhos.
— Ninguém pode me obrigar a nada, mitt spid.
Ele parecia sincero.
— Vá, antes que o sol nasça.
Afastei minhas mãos das dele, sem entender absolutamente
nada. E então, parando para me indagar que homem se sujeitaria a
algo assim, com uma herdeira da máfia, prometida a outra, sem
receber nada em troca.
Contudo, eu não tinha mais tempo, e ele claramente, não me
daria qualquer outra resposta.
— Obrigada.
Foi tudo o que consegui dizer, antes de me afastar por
completo, e colocar meus sapatos de qualquer jeito, seguindo para
fora do quarto. Soltei o ar com força, o que nem sabia que segurava,
e rumei direto até o elevador. Não me surpreenderia, se todos os
Ramesses estivessem me esperando lá embaixo, para me punir.
Contudo, eu sentia uma confiança que não tinha como
explicar, com um homem que tinha acabado de conhecer, e me
entregado por completo. Um homem que pelo jeito, já sabia de
mim, muito antes de eu sequer saber o seu nome. Aquele seria
mesmo o seu nome?
Quando pisei no hall, a recepcionista me deu bom dia e me
levou diretamente para o carro que me deixaria no endereço pedido.
Assim que adentrei o veículo, o homem não disse nada, e apenas
dirigiu. Consegui ler um pouco na tela do carro, de que o destino
parecia mesmo o da minha casa.
Uma casa que não era um lar.
E que eu estava voltando, para pôr um fim em tudo aquilo.
Levei os dois braços até a barriga, e a protegi, sabendo o que
deveria fazer, enquanto o caminho se tornava ainda mais próximo.
Eu tinha que proteger aquela chance, porque minha vida dependia
dela. No momento que adentramos a cidade, eu me lembrei de que
não fui ver Hathor.
— Tem uma parada.
Foi tudo o que o homem que dirigia disse, e então reparei
melhor nele. Ele não parecia dali, assim como Tyr. Só que existia um
sotaque pesado em sua fala, mesmo que fosse a minha língua.
Então, antes que eu pudesse questionar, ele subiu um painel que me
separava do mesmo, e eu fiquei tentada, a pensar se deveria me
jogar no meio da rua da cidade que chegávamos, ou simplesmente
aceitar o destino que fosse.
Porém, minutos depois, ele parou próximo à praça em que eu
cuidava de Hathor. Desci, sem entender muito, e não tinha como
indagar. Corri até onde ela deveria estar, e vi-a dormindo sobre o
meu sobretudo, e tinha vários recados acumulados, deixados abaixo
dele.
— Boa menina — falei, fazendo um carinho em seu pelo, e
pelas suas vasilhas ainda com ração e água, a pessoa que me
deixava os bilhetes, deveria ter passado ali.
E se...
Foi quando encarei os papéis, e minha ficha pareceu cair.
— Tyr?
O sol estava nascendo, e eu me vi fazendo um último carinho
em Hathor, antes de correr de volta para o carro que me esperava.
— Era ele, esse tempo todo?
Indaguei para o nada, e então parei para ler, cada recado que
ele tinha deixado. Era algo que me custava muito, porque tive que
aprender a ler e escrever praticamente sozinha, mas eu me sentia
realizada quando o conseguia.
Sabia que não teria como voltar com eles daquela vez, uma
revista deveria me aguardar. Vi-me usando o verso de um deles,
pegando uma caneta que estava em um dos compartimentos do
banco traseiro, e escrevendo meu adeus. Agradecendo por tudo.
Agradecendo por ter me dado aquela chance.
Deixei o recado junto à caneta e os outros recados que ele me
deixou, e então prendi meu cabelo no alto da cabeça. Sabia que
seria o primeiro alvo deles. Respirei fundo, assim que o carro se
aproximou dos grandes portões que separavam a mansão do resto
da cidade. O painel que me separava do motorista desceu, e eu só
soube respirar fundo e negar com a cabeça.
— Não sei quem são ou o que querem, mas... obrigada.
Desci do carro, e então, no momento que um dos guardas me
avistou, o carro simplesmente se afastou, e eu senti meu corpo ser
puxado para dentro, por mãos de qualquer soldado que fosse,
levando-me direto para onde tudo começaria.
Uma revista.
Uma confissão.
Uma humilhação.
Uma penitência.
O caminho para ser curado pela máfia da minha família.
Fui jogada no meio do salão principal, e eu apenas cerrei os
lábios.
— O seu guarda disse que passou a noite naquela praça
estúpida que sempre visita... — meu pai falou, e eu permaneci com
o olhar baixo, como era instruído. — Mas estou sabendo das suas
outras saídas, para aquela praça, para um bar... O que pensa que
está fazendo?
Apenas permaneci calada, encarando o chão e sem saber o
que responder. Procurei pelo soldado que me seguia todas as noites
e eu sabia que delatava absolutamente tudo para meu irmão mais
velho, o que logo chegaria ao meu pai. Por que a história que ele
contou era aquela?
— Ele disse que alimenta um bicho da rua na praça, e
acredito que se o matar, vai ser o bastante para não sair escondida
novamente?
— Não! — falei de relance, imaginando o que poderiam fazer
com Hathor. — Não, por favor! — pedi, em um tom mais baixo e
levando as mãos ao chão, como se implorando.
— Levem-na daqui e a prendam na pior das solitárias, para
aprender que se ela quer tanto dar de comer para um bicho da rua,
deveria ser capaz de prover a própria comida.
Senti mãos em meus braços, levantando-me, e me levando
para o corredor onde todas as mulheres Ramesses já tinham sido
jogadas. Todas nós, sem qualquer exceção, já tínhamos sido
reduzidas a prisioneiras em uma daquela celas simplesmente com
uma saída de ar mínima, e jejum pelo tempo que fosse ordenado.
As histórias contavam de mulheres que morreram naquelas
punições, e em como eram fracas, e, portanto, era o melhor método
para avaliar se seriam realmente boas mercadorias.
Não entendi absolutamente nada, quando fui jogada na
minha, um quadrado que mal me cabia, e eu puxei o ar com força,
antes de fecharem a porta. Eu já tinha estado ali antes. Eu já tinha
sobrevivido àquilo.
Porém, e se... e se eu tivesse engravidado e estar ali
prejudicasse?
Respirei fundo uma, duas, até dez vezes, até ritmá-las, e
tentando me acalmar. Eu não esperava por aquela recepção, a
realidade era que nada corria como eu tinha planejado. Tudo o que
se passava por minha mente, não estava acontecendo. E eu só
torcia para que, no fim daquela punição, eu conseguisse um teste
positivo para gravidez.
Mulheres Ramesses são deserdadas se não forem mais
virgens e estiverem grávidas.
Repeti mentalmente, como um mantra. E de repente, minha
mente se nublou. Eu e o bebê poderíamos sobreviver, mas e Hathor?
Eles fariam mal a ela? Eles a matariam e jogariam ali, para me
mostrar o que causei?
Senti a vontade de chorar quase massacrante, mas sabia das
câmeras colocadas nas caixas de punição, e em como deveria ser
divertido para cada um dos meus irmãos assistir àquilo. Se eu
sofresse como eles queriam, seria para o seu bel prazer.
Neguei, abraçando as pernas, e pedindo aos deuses que
protegessem Hathor. Que me protegessem. E que me dessem a
chance, de ter conseguido engravidar.
CAPÍTULO 10

TYR
— Foi muito fácil — Vidar falou, assim que adentrou o quarto.
— O soldado sequer pensou quando mostrei as fotos que tenho dos
filhos dele, e quando lhe entreguei o dinheiro.
— Ótimo — falei, e suspirei fundo. — Dá a chance a ela, de
contar ou não sobre o que fez.
— Vou sair e tentar descobrir o que consigo ao redor daqui.
Assenti e apenas escutei Vidar se afastar e bater à porta atrás
de si. Joguei-me contra a cama, e fiquei encarando o teto da velha
casa. Minha mente se tornando uma bagunça, apenas por
lembranças da noite anterior me cercando. Nada parecendo tão
importante do que ficar revivendo cada um daqueles momentos. Por
que eles pareciam tão vivos, mesmo depois de já tendo se tornado
apenas uma parte da minha história?
Sentei-me, e respirei fundo. Encarei meu próprio braço, que
carregava algumas marcas das unhas dela, assim como, da sua
boca. O aperto no meu peito diferente de todos os que eu já tive,
dando-me o sinal vermelho sobre o que fazer. Não me lembrava de
me sentir de tal maneira depois de ter algo que tanto queria. Ou de
simplesmente, permitir-me ser usado por alguém de outra máfia.
Por que eu me sentia diferente?
Por que tudo parecia tão diferente?
Gostaria que fosse simples. E apenas ir até a Mansão
Ramesses e verificar como ela estava. Contudo, não era como tudo
funcionava. Sequer estávamos autorizados naquele país, e se
fôssemos descobertos, rapidamente, tudo o que fosse ilícito seria
escondido. Não era o que queríamos,
Se eu me colocasse à frente de algo por Isis, com toda
certeza, haveria uma retaliação ainda pior para ela.
Por que eu me colocaria à frente de algo por ela? A grande
questão que me assombrava.
Era para ter sido apenas uma noite e simplesmente superar
aquilo. Porém, a minha mente rodava e rodava, e sempre parava no
mesmo lugar – nela. Naquela noite.
Vi-me levantando, e caminhando para fora do quarto, indo em
direção às ruas que geralmente estavam desertas. Notei que Vidar
deixou o carro estacionado na garagem improvisada que existia ali, e
me veio a melhor ideia para tirar aquela sensação esmagadora e
sem sentido de minha mente. Do meu peito.
— O senhor precisa de algo?
Virei-me ao som da voz feminina, da segurança do lugar, que
também era a proprietária e que claramente, fazia tudo sozinha. Eu
via a maneira desconfiada que ela sempre nos encarava, mas o
dinheiro sendo pago todos os dias, não a deixavam questionar ainda
mais. E acreditava que pelo fato de Vidar e eu conversarmos em
nossa língua em alguns momentos, a deixava mais tranquila.
O mais estranho: temer menos alguém quando se sabe que é
de outro lugar. Parecia o oposto de um lugar que cuidasse dos seus.
Os pequenos detalhes de aconteciam no dia a dia, sendo notados e
anotados. Pareciam levar em algum lugar, mesmo que aos poucos.
— Pode avisar meu irmão que dei uma saída? — indaguei, e
ela assentiu, parada atrás de seu balcão. — Obrigado.
Como sempre, o olhar surpreso estava em seu rosto, quando
apenas éramos educados. Fui em direção ao carro, e abri o porta-
malas, notando todo o meu estoque de comida para Terça, assim
como alguns brinquedos que eu tinha comprado. Não conseguia
pensar em como aquela gatinha havia conseguido se infiltrar em
seus ossos, mas me negava a pensar, que a pessoa que
compartilhava aquela guarda comigo, também o faria.
Entrei no carro e segui pelas ruas, em direção à praça
abandonada do outro lado da cidade. O contraste das duas partes
era gritante. Saindo de uma parte claramente parada no tempo, e
entrando em outra com prédios imponentes e construções ao redor
dos mesmos. Estacionei onde Vidar tinha indicado ser o melhor, com
ponto cego de câmeras, e peguei um sachê no porta-malas, indo em
direção à praça.
A praça não parecia de agrado das pessoas que passavam por
ali. Notava-se que mesmo sendo de tarde, ninguém parecia querer
caminhar por ela, seguindo por ruas ao redor ou qualquer outro
lugar. Não entendia o porquê, mas não me vi questionando. Na
verdade, estava pronto para levar meus questionamentos à Terça.
No momento em que pisei na mais antiga árvore que ficava
perto dos bancos quebrados, ouvi um miado alto, e me vi correndo.
Foi quando percebi dois homens, que deveriam ser adolescentes,
que tentavam enfiar a mão debaixo dos restos de madeira, e um
deles já tinha um vergão enorme de unha.
— Bicho desgraçado!
— Por que estão mexendo com um bichinho de rua? —
indaguei, guardando o sachê no bolso da minha calça.
Os rapazes me encararam como se não entendendo, e eu
apenas cruzei os braços.
— Ela fez mal a algum de vocês?
— O que quer aqui? — um deles rebateu, e eu quase ri. Eles
estufaram o peito, como se pudessem me intimidar. O que eles não
sabiam era que ninguém podia.
— Estava conhecendo o lugar. — Dei de ombros, — E vocês?
— Acho melhor sair daqui cara, antes que...
— Que o quê? — insisti, e vi o olhar que trocaram. — Acho
melhor saírem antes que tenham algo mais além de vergões de
unha de uma gatinha que está se sentindo acuada.
Meu olhar passou pelas pulseiras e relógios em seus pulsos, e
eu tive certeza de que não era um ataque qualquer. Pulseiras
cravejadas em diamante – o clássico da máfia egípcia.
— Está nos ameaçando?
Apenas sorri de lado e me coloquei entre os bancos
quebrados e eles.
— Melhor avisar nosso pai que...
— Deveríamos matar ele — um deles rebateu, e eu segurei a
risada. — Por que está se intrometendo em um assunto dos
Ramesses?
— Ramesses? — indaguei, fingindo-me de confuso.
— Ele é um turista, irmão — o outro falou baixo, mas eu
conseguia ouvir perfeitamente. — Voltamos depois e terminamos o
serviço.
— Merda de turista — o revoltado falou e saiu sendo puxado
pelo outro, que parecia mais novo que ele.
— Patéticos — falei, assim que se afastaram, e então me virei
e me agachei, procurando pela bolinha de pelos preta. — Terça,
pequena... Eles já foram.
Ela soltou um miadinho fraco, e percebi que estava encolhida
bem no fundo e claramente com medo. Olhei ao redor, e sabia que
não tinha mais como deixá-la ali. Poderia ser uma retaliação contra
Isis. Se haviam mandado pessoas da elite dos Ramesses até aquela
gatinha. Eu me indagava, o que eles faziam, naquele instante,
contra Isis.
— Eu sei que não foi o que planejamos, mas... Que tal ir para
casa comigo? — indaguei para Terça, que aos poucos foi diminuindo
seu medo, e se aproximou da minha mão, cheirando e parecendo se
lembrar de mim. — Prometo que te consigo até irmãozinhos, da
quarta até a segunda.
Ela soltou um miadinho, como se adorando a ideia, e então
veio até minha mão, permitindo-me tirá-la dali. Junto a ela, peguei o
sobretudo de Isis que estava jogado ali como sua caminha, e levei
comigo. Olhei ao redor, para ter certeza de que não era seguido ou
observado, e então chegamos ao carro. Coloquei-a no banco do
carona, ao meu lado, com o sobretudo à sua frente, para ajudá-la a
não se mexer muito.
Ao contrário do que imaginei, ela sequer se moveu, se
enrolando contra o tecido e logo adormecendo.
— Que merda você está fazendo, Tyr? — perguntei para o
nada, enquanto dirigia de volta para onde estávamos hospedados, e
minha mente se perdia.
Eu não era conhecido por pensar muito antes de agir, mas a
questão era que eu sempre pensava. Onde tinha ido parar o meu
modus operandi? O que eu tinha na mente, ao simplesmente, não
parar de pensar em alguém que nunca mais veria, e agora,
adotando a gatinha que nós dividíamos a guarda?
CAPÍTULO 11

ISIS

Sobrevivi.
Depois de cinco dias presa aquela caixa, e mais uma semana,
presa no meu quarto, eu tinha conseguido. Não conseguia
compreender, quase nada sobre o que tinha, de fato, acontecido.
Contudo, os detalhes de toda a situação me entregavam que
ninguém ali tinha ideia do que realmente aconteceu.
Eles não sabiam que eu estava tentando me alimentar melhor
com o pouco que me davam, criando em minha mente, o tempo
preciso para fazer um teste. Tudo o que eu tinha de direção era o
que ouvi pelos corredores, e o que Maia me orientou de forma
indireta. Não sabia muito sobre quando era o exato dia, mas
esperava ansiosamente pela falta da minha menstruação.
Era um sinal bom? Era o que me indagava internamente,
enquanto estava andando de um lado para o outro no meu quarto.
Não conseguia encontrar nenhuma paz interior durante aquele
tempo. Sempre em alerta, e sempre com medo.
E se não tivesse dado certo?
E se foi tudo pelo mais absoluto nada?
O meu aniversário de vinte já era no dia seguinte. E junto
com ele, vinha a apresentação ao meu futuro marido. Não sabia se
era o tempo bastante para um teste de gravidez, porém, a questão
era que eu não tinha o tempo que fosse. Eu só tinha aquela
oportunidade para torcer que eu realmente estivesse grávida, e que
não pudessem fazer nada contra mim.
Batidas na porta.
Cinco.
O que me dizia que era Maia – minha cunhada, e única que
tentava falar comigo, mesmo que fosse por poucos minutos no dia.
Ela sempre conseguia driblar o sistema que me era colocado, e
mesmo sabendo que éramos vigiadas 24 horas por câmeras, ela não
se importava.
— Fico feliz que está de volta — falou, assim que fechou a
porta atrás de si.
Ela se casou com Akhmu com apenas dezesseis anos, já
tinham se passado dez, e olhando-a dali, eu notava o seu cansaço.
Toda vez que nos víamos, eu só pensava que não queria aquela vida
para mim. A maquiagem pesada cobrindo os seus roxos, e o quanto
ela parecia cada vez mais sem vida.
— Acho que só você. — Fui honesta, e ela me abriu um
sorriso se lado.
— Tentei falar com Akhmu, para diminuir os dias, mas... — vi-
a suspirar fundo. — O importante é que está bem agora.
— Sabe sobre a minha cerimônia de apresentação? —
indaguei, enquanto ela se sentava na ponta da minha cama, e eu
permanecia em pé, a encarando.
— Era pra ser amanhã, mas pelo que ouvi, foi adiada já que
houve problemas com seu pretendente. — Aquela revelação me fez
quase dar um pulo de felicidade. — Por isso, eu vim.
— Obrigada, Maia.
Ela apenas me dava o seu sorriso sem dentes, como se nunca
tivesse o porquê de me entregar um completo.
— E também, sobre aquele papel que a gente viu, bem
antigo... — ela falou, claramente em entrelinhas, porque não
sabíamos quem estaria vendo as câmeras do meu quarto naquele
momento, e muito menos, escutando o que era dito ali.
Ela era a pessoa que tinha encontrado aqueles papéis para
mim, se arriscando ao tentar me ajudar, mesmo que não tivesse
nada em troca.
— Então?
Eu suspirei fundo, e apenas assenti.
— Quanto tempo desde que chegou em casa? — indagou,
como se pudesse estar dentro da minha mente, e eu engoli em
seco.
Nunca sabia se realmente podia confiar em alguém. Contudo,
ela era a razão de eu possuir alguma esperança de ter aquela
escolha. Se ela estivesse planejando tudo aquilo para me prejudicar,
não fazia sentido, porque o fato era que não deveria nem ter
começado.
— Treze dias amanhã.
— Bom... para ter alguma certeza do seu prometido, temos
mais alguns dias necessários.
Falou, e eu sabia que ela já tinha feito vários testes de
gravidez durante o casamento com meu irmão. E de alguma forma,
todos eles, sem exceção, foram negativos. O que frustrou Akhmu ao
máximo, mas não o impediu de apresentar filhos dos dois, que
sequer levavam o sangue de Maia, ao longo dos anos. Maia parecia
aliviada por aquilo.
— Acho que muito mais?
— Não, mas será o suficiente — assenti, e sabia que ela
contava mentalmente o tempo que podia ficar ali, no quarto,
comigo. — Te trarei frutas e vitaminas, acho que será bom, para se
preparar para ele.
Ela mudava sua expressão quando falava “ele” ou “prometido”
deixando claro que não era sobre o parecia. Era sobre a gravidez. E
sobre tentar me ajudar a mantê-la, se fosse possível.
— Dormir faz bem, e deveria tentar se acalmar... — foi então
que percebi que continuei andando de um lado para o outro durante
todo aquele tempo. — Faz bem, tentar não ficar nervosa ou ansiosa,
para que tudo corra bem.
— Obrigada, Maia.
Ela então se levantou e caminhou até a porta, saindo dali.
Vi-me respirando fundo e fazendo o que ela orientou. Deitei-
me na cama, e encarei o teto, pensando em como os dias tinham
passado, e como gostaria que o suficiente se passasse, o mais
rápido possível, para que tivesse o que queria.
Fechei os olhos, puxando o cobertor sobre meu corpo, e então
olhos escuros estavam em minha mente. Lembrando-me de cada
detalhe dele, da sua voz, da maneira como ele me tocou... Tentando
guardar o que podia, em minha mente, sem permitir me esquecer,
porque ele me pediu para ser uma lembrança bonita.
Sorri sozinha, ainda de olhos fechados.
Não só por ele ter pedido, mas pelo fato, de ele realmente ser.
CAPÍTULO 12

TYR
Eu estava tentando me prender aos registros que Vidar tinha
encontrado em suas buscas pela área, mas minha mente se perdia,
ou na verdade, se encontrava, no que realmente importava – Isis.
Ler sobre a história, mesmo que quase apagada, da família
mafiosa em que ela nasceu, não me ajudava nada em conseguir
apagá-la de meu sistema. Além do silêncio absoluto que existia
sobre as mulheres pertencentes aos Ramesses. Sequer uma fofoca
ou algum cochicho do outro lado da cidade.
O que eles faziam ou deixavam de fazer era um completo
mistério. Talvez por aquilo, que conseguiam tão facilmente ter
estabelecido um esquema de tráfico de mulheres sem ser
desmembrado ou acusado durante tantos anos. A falta de registro
das mulheres que nasciam na máfia com o sangue da família,
começou logo após Seti Ramesses assumir o comando.
Um chefe ruim, sempre torna tudo ainda pior.
Era algo que eu tinha aprendido, depois de tanto tempo
estudando sobre cada máfia e cartel existentes. O histórico de um
chefe ruim marcava o seu povo, e da pior maneira. E o final de cada
um deles sempre parecia o mesmo – fanatismo e alívio.
O miadinho alto de Terça, me fez virar na cadeira da madeira,
e a encarar.
— O que precisa, princesa da minha vida?
De onde eu tinha ido de mafioso responsável por não ter
guerras com a minha família, para simplesmente, pai de pet?
Ela miou e eu encarei o minilugar que Vidar simplesmente
tinha arrumado para ela.
— Seu tio colocou comida antes de sair que eu sei... — falei, e
ela então se aproximou, pulando no meu colo, com aqueles olhinhos
amarelos maiores do que nunca, tentando me convencer. — Comeu
tudo e agora quer mais?
Fiquei perdido alguns segundos, apenas lhe dando carinho,
enquanto ela ronronava e me colocava em volta das suas patinhas.
A porta do quarto foi aberta de repente, e ela deu um pulo do
meu colo, indo até Vidar, que parecia ter perdido a cor.
— Achou a fonte elétrica para gatos? — indaguei, tentando
aliviar a tensão, e vi-o negar com a cabeça.
Antes de qualquer coisa, ele olhou para Terça, que começou a
passar por sua perna, pedindo carinho. Ele nunca dava, ou melhor,
não na minha frente. Mal sabia ele que já o tinha visto deixando-a
dormir com ele na cama.
— Tyr...
Quando ele falava meu nome todo, era que algo estava muito
errado. E eu só conseguia relacionar a uma pessoa – Isis.
— Achamos um antigo livro, quase deteriorado na biblioteca
e...
— Vidar, o que realmente te deixou assim?
Eu estava mais preocupado pelo fato de que meu irmão, que
só vi estar daquela maneira duas vezes na vida – primeira: quando
Hella “morreu”, segunda: quando tivemos que isolar Freya; parecia
pronto a me dar uma sentença terrível.
— Tem uma continuação na escritura, sobre as Mulheres
Ramesses...
— Mulheres Ramesses são deserdadas se não forem virgens...
e o que, irmão?
— E estiverem grávidas — complementou, e eu quase perdi a
lógica. — Me diz que não tem chance de isso ser real?

— Eu trouxe proteção — ela insistiu, mostrando-me o


sobretudo caído no chão, e eu sorri, imaginando que era o seu jeito
de tentar ter controle de alguma coisa. E tentando deixa-la ainda
mais confortável, peguei o pacotinho que ela indicou.

— Tyr...
— Preciso ir até o salão dos Ramesses — falei, levantando-
me, e sabendo que era tudo ou nada.
— Tem ainda mais...
— O quê? — paralisei e o encarei.
— Um adendo, que diz que o chefe pode decidir por matar a
mulher, julgando-a como traidora.
— Se ela não tiver morta, ela vai desejar...

ISIS
Era agora ou agora.
Não existiam mais opções.
O futuro pretendente chegaria em poucos dias, mas o seu
adiamento de duas semanas parecia ser o suficiente. Maia disse que
me traria algo hoje à tarde, e eu estava ali, parada na cama, apenas
esperando, tentando acalmar meu peito.
Cinco batidas na porta.
E ela se abriu, enquanto eu pulava da cama.
— Sabe que estou tentando engravidar há anos e bom... já
tem se tornado cansativo o resultado negativo. Será que... que pode
fazer o teste comigo? Para tentar me ajudar a não pensar demais à
medida que espero os três minutos que parecem infinitos?
— Maia...
— Eu te instruo a fazer o seu, e faço o meu — insistiu, e eu
sabia que poderia ter consequências a ela, mesmo com toda a
narrativa de precisar de apoio. — Por favor, Isis?
Assenti, conforme ela me seguia até o banheiro, ela leu todas
as instruções, e então fez primeiro, mostrando como deveria realizar.
Eu me tremia toda, enquanto realizava o mesmo processo que ela.
Pensando que minha vida dependia dos três minutos que viriam a
seguir daquele.
— Agora...
Ela fechou o meu teste e colocou-o do lado esquerdo da pia,
claramente os diferenciando.
— Vamos contar os três minutos e olhamos...
Eu apenas assenti, sentando-me sobre a tampa do vaso, e
parecendo perto de parar de respirar.
— Cento e setenta e nove, cento e... oitenta — ela contou, e
eu pisquei algumas vezes, a encarando. — Pode olhar para mim?
Levantei-me, e então encarei o lado direito da pia primeiro. O
teste ali, escrito “Não Grávida”, e eu soltei o ar com força. Foi
quando virei minha cabeça para o lado esquerdo, e então, meu
mundo todo paralisou “Grávida”.
Olhei para Maia, e um sorriso começou a se abrir no meu
rosto. Porém, antes mesmo que eu pudesse raciocinar, a porta do
banheiro foi aberta, e Maia foi batida contra a parede pela madeira.
Tentei ir até ela, mas antes que eu pudesse, apenas senti o
tapa no meu rosto, Maia sendo tirada dali de qualquer jeito, e então
minha cabeça bateu contra o vidro do boxe. Tudo zumbiu, e senti
meu corpo ser puxado, até que a minha boca foi aberta e senti o
teste ser empurrado nela, e em seguida ele me obrigou a fechá-la.
— Sua puta inútil! — Bateu-o contra meus dentes. — Coma
isso!
A voz do meu pai era distante, e mal o escutava, ainda
tentando respirar e não me engasgar com o que ele me forçava a ter
na boca.
— Coma esse teste de gravidez positivo... Onde foi que errei
com você?
Eu esperei o soco, sem encolher meu corpo, sabendo que era
ainda pior, quando o fazia. De um jeito ou de outro, e minha ficha
parecia cair, que ou ele me mataria ali ou me deserdaria. Eu só
podia torcer e rezar pela segunda opção. Porém, enquanto ainda
tentava escutar, ouvi a voz do seu conselheiro, mesmo que distante,
e o soco não veio.
Tive o tempo para tirar o teste da minha boca, no instante em
que sentia meu rosto doer, mas nada diferente do que já estava
acostumada. Usei a força que restava para me levantar, e sentia o
sangue descendo por minha testa, no momento que ficava
totalmente de pé, e ainda um pouco tonta.
Quando pisei próximo à porta do banheiro, os meus olhos não
acreditavam no que viam. Tyr estava ali.
CAPÍTULO 13

ISIS
— Tem duas opções, Ramesses. — Ouvi-o falar, o seu egípcio
sem qualquer sotaque exterior. — Me entregar sua filha em
casamento ou morrer por ter tocado na mulher que carrega um filho
meu.
— Seu...
Mas como?
Como ele sabia?
Como ele tinha ido parar ali?
Quem era ele?
Como ele tinha se colocado ali?
Como ele conseguia ameaçar os Ramesses?
— Como ousa...
— Eu não precisava te dar qualquer opção, depois de ter
tocado nela... — foi quando o vi parar à frente do meu pai, e o
encarar. — Mas veja só, não quero começar uma guerra, enquanto
meu filho é gerado.
— O que está ameaçando, Hansen?
Hansen?
De onde eu tinha ouvido aquele nome?
Sobrenome, talvez? Ou o verdadeiro nome dele?
Eu então vi Tyr quase rir, como se zombando do homem mais
velho no meio do quarto. Como ele conseguia fazer algo assim e não
estar morto?
— Se não sair desse quarto em cinco segundos, considere-se
em guerra com os Hansen.
Os Hansen?
Então era uma família?
— O que...
— Cinco....
— Não pode entrar na minha casa...
— Quatro...
— Chamem meus filhos, agora!
— Três...
— É apenas Isis, senhor... Não quer uma guerra pela filha
mais distante e...
— Dois...
Então, eu vi meu pai correr, pela primeira vez na vida, para
fora do meu quarto, junto ao seu conselheiro.
A cena me deixou totalmente incrédula, assistindo-a como se
estivesse em um sonho. Vi-me beliscando meu braço, ainda
duvidando da realidade, mas ela caiu, quando ele falou o meu nome
novamente.
— Olá, Isis.
— Tyr. — Fiz um sinal com a cabeça, e então senti suas mãos
sobre meu rosto, segurando-o, e tentei me afastar, mas ele não
permitiu. — O que...
— Deveria ter deixado ele te matar? E o meu filho? — sua voz
estava diferente do que eu lembrava.
Existia uma nota tão pesada nas suas palavras, que não
conseguia passar despercebida.
— Como sabe desse filho? — indaguei, enquanto sentia seus
olhos presos ao corte em minha cabeça.
— Sei do que me interessa, Isis.
— Como sabe que esse filho é seu? — insisti, dando um passo
atrás e tentando me afastar, mas ele não permitiu.
No fundo, tudo o que eu queria perguntar, não tinha a ver
com aquilo.
— Porque eu tirei sua virgindade.
Ele então se afastou, e eu fiquei parada ali, sem ter como
rebater. Suspirei fundo uma, duas e até três vezes, o riso sem
vontade saindo de minha boca.
— Quem é você? — indaguei, finalmente deixando as palavras
saírem. — Disse que sabia quem eu era, me ajudou, e agora... O
que veio fazer aqui?
— Começar uma guerra, se preciso.
Falou, e eu franzi o cenho, sem entender realmente. Vi-o
então puxar um pedaço da própria camisa, na barra, e voltar
novamente até minha testa, passando o pano macio bem ali.
Deveria ser seda? Algo parecido com aquilo?
Só sabia que era macio, e ele deveria estar sujando o branco
da peça que acabou de rasgar.
— Eu posso fazer o meu próprio curativo e...
— Apenas me deixe — falou, no momento em que levei minha
mão a dele, e afastei a minha.
O meu olhar preso ao dele, enquanto ele terminava de fazer o
que quisesse em meu rosto, e eu apenas tentava me lembrar da
noite que me trouxe para aquele exato momento.
— Como vai começar uma guerra contra os Ramesses?
Indaguei, assim que ele se afastou, dobrando o tecido
rasgado e colocando-o dentro do bolso da calça clara que também
usava.
— Vamos?
— O que...
— Vamos encontrar Seti — falou, e era a primeira vez que
ouvia alguém falar o primeiro nome do meu pai.
— Por quê? — perguntei, mesmo que me movendo atrás dele,
e saindo para o corredor.
— Porque temos o que conversar, não acha? — indagou, e
antes que desse outro passo longe, levei minha mão até o seu braço
e tentei segurá-lo. Desesperada, de forma que, levei as duas, e o fiz
parar, de fato. — Qual o problema, Isis?
— Eu vou ser deserdada — falei, como se tentando explicar.
— Não sabe das leis daqui, mas... É isso que vai me acontecer, não
precisa conversar com ele ou qualquer coisa...
— Era isso que estava buscando? — questionou, virando-se
completamente para mim, medindo-me com o olhar. — Engravidar e
daí ser deserdada?
Engoli em seco, mas assenti. Era a mais pura verdade.
— Palavras, Isis.
— Sim, é isso o que quero. — Fui honesta, e ele me encarou,
com um quase sorriso em seu rosto.
— Então engravidou propositalmente de um filho meu?
— Sim.
— E achou que eu não fosse saber?
— Não me importava quem fosse o pai — falei, suspirando
fundo. — Mas você me disse que estava me ajudando, que sabia o
eu queria e... — parei de falar, enquanto ele dava um passo para
perto, e eu soltei minhas mãos de seu braço.
— Mas eu me importo. — Olhou-me profundamente. — Eu me
importo que sou o pai dessa criança.
Ele então deu as costas, e seguiu pelo corredor.
Eu o segui, quase tropeçando nos meus passos, não demorou
para chegar até o salão principal, e encontrei meu pai, assim como
meus outros vários irmãos, mais velhos, que estavam claramente
exaltados. Pela primeira vez, não coloquei meus joelhos no chão,
mostrando minha resistência. Ao mesmo tempo que tentando ficar
como apoio ao homem que estava ali, à frente de todos os meus
irmãos mais velhos e o maior poder da máfia naquele lugar.
Fosse o que fosse.
Eu sairia dali, e não voltaria.
Eles jamais permitiriam que eu continuasse com o seu
sobrenome.
— Hansen.
A voz veio do meu pai, como um estrondo por todo o salão.
Os empregados curvados, assim como todas as mulheres da família,
e apenas, eu, Tyr, e meus irmãos mais velhos, de pé, o encarando.
— Ramesses — falou, e passou uma das mãos pelos cabelos
escuros compridos. — Só vim avisar que estarei me casando com
sua filha e a partir do momento que isso acontecer, ela será
propriedade dos Hansen, não mais dessa máfia.
Casar?
Ele ia se casar comigo?
CAPÍTULO 14

ISIS
— Propriedade... Ela é a propriedade de quem eu quiser que
seja — ele gritou de volta, se levantando do trono que era seu lugar
adorado, e vi um dos meus irmãos sussurrar algo seu ouvido. — A
não ser que os Hansen tenham um acordo digno.
— Eu conheço as regras e leis daqui, Ramesses. — Tyr parecia
querer rir. — Não vou pagar um dote pela mulher que mataria se eu
não tivesse chegado a tempo. — O silêncio se tornou sepulcral.
Mataria? Meu pai iria, realmente, me matar? — Agradeça-me por
não matar você e começar uma guerra agora.
— Ela não é sua propriedade, Hansen. Não tem direitos de...
— Ainda não, mas ela carrega um filho meu, o que a torna
uma Hansen de um jeito ou de outro, pelos próximos nove meses, e
antes deles, ela terá o meu sobrenome, então...
Ninguém nunca tinha cortado a fala do meu pai, e aquilo me
deixou abismada. O poder que o homem que eu tinha escolhido era
aquele? Tão grande assim?
— Então, se estamos certos, vou me retirar com Isis e...
— Não vai. — A voz do mais velho dos meus irmãos – Akhmu,
que desceu os degraus até Tyr e parou bem à sua frente. — Ela
ainda não tem o seu sobrenome, e não sabemos se esse filho é seu,
já que temos uma puta bem diante de nós.
Vi Tyr sorrir, enquanto eu que era humilhada. O que eu já
estava acostumada, depois de tantos anos, apenas sendo
subjugada. Assim que Akhmu tentou tocar em mim, dei um passo
atrás, como sempre fazia. E sabia que viria uma surra, em seguida.
Encarei-o, desafiando-o ao fazer, como sempre, e esperei pela
pancada. O que me surpreendeu, foi o fato de que de relance, vi Tyr
retirar o pingente do colar que usava, e cravá-lo nos lábios do meu
irmão, que gritou, enquanto o sangue espirrava, e parecia
desesperado.
Armas foram engatilhadas, e eu não pensei direito, quando
me vi ficando à frente do soldado mais próximo a Tyr, que apontava
a arma para o meu peito agora, em vez de as costas dele.
— Se alguém pensar em ofender minha futura esposa
novamente, tenham certeza de que, um machucado no lábio será
uma bênção. — Ele então tirou o que parecia uma pequena lança
afiada dos lábios do meu irmão, que sangrava, e eu nunca imaginei
ver uma cena assim. — Vidar?
De repente, ele apenas falou sozinho, e eu não entendia
nada.
— Um recado, senhores — ele falou, e então se colocou à
minha frente, impedindo de a arma ser apontada para o meu peito,
e agora, estava para o seu. — Vidar está com todos vocês na mira,
então se pensarem... — foi quando eu percebi os alvos de cor
vermelha, bem pequenos, no peito de cada homem armado naquele
salão. — Pense bem, Ramesses.
— Seu...
— Isis vale todo o seu esforço para uma guerra contra os
Hansen? — indagou, parecendo nem se importar com a arma
apontada para si.
— Ela vale o que está fazendo, Hansen?
— Não é por ela, sejamos honestos — admitiu, e então a
minha ficha caía. — Ela carrega um filho meu, o meu sangue... Sabe
como isso é importante para os Hansen, ou já se esqueceu de quem
somos?
Eu apenas encarava toda a situação, sem saber o que pensar
ou no que raciocinar. Meu irmão mais velho, que nunca deveria ter
levado um “não” na vida, simplesmente com a boca sangrando caído
no meio do salão que cometia as maiores atrocidades. Meu pai
parecendo acuado, pela primeira vez em minha vida.
— Leve-a.
A ordem de meu pai foi dada, e então as armas baixadas, mas
os alvos continuavam, em cada soldado.
— Vidar. — Foi tudo o que Tyr disse, antes de eu dar um
passo atrás, e senti uma de suas mão em minha cintura. — Um
prazer não começar uma guerra com vocês, senhores.
— Vai pagar caro por isso, Hansen.
— É uma ameaça? — o tom de voz de Tyr mudou e sua mão
se tornou mais firme em minha cintura.
— Está levando a pior do meu sangue, que vai sujar o sangue
da sua família!
— Bom, ela não é mais um problema seu, certo?
— Falarei com Odin — meu pai insistiu, e apenas ouvi a risada
de Tyr.
— Boa sorte em conseguir um horário com ele.
Tyr então se virou comigo, a mão em minha cintura, e eu mal
sabia como se respirava. Contando meus passos para fora dali, e
sem acreditar, que pela primeira vez, eu estava saindo pelo portão
da frente.
— Vidar...
Foi tudo o que entendi do que ele dizia, um língua totalmente
diferente de tudo que eu já tinha escutado saindo pela sua boca.
Não demorou para chegar próximo a um carro preto e grande,
a porta do passageiro ser aberta, e ele me ajudar a subir, parecendo
ouvir algo de algum lugar.
— Coloque o cinto e se deite no banco. — Deu o que parecia
uma ordem e eu o vi entrar pela porta do motorista, e não pensei
muito, antes de apenas o fazer.
Vi-o sair rapidamente como o carro, e não demorou para
chegarmos a um hotel, que ficava na região central da cidade, e eu
permaneci deitada, até que ele parou, desceu do veículo, e me
mandou sair. Eu o fiz, segui-o para dentro do hotel e comecei a
questionar tudo o que estava acontecendo.
Ele apertou o botão da cobertura assim que entramos no
elevador, e eu comecei a sentir uma dor de cabeça muito forte.
Suspirei fundo, tentando me manter firme, e quando chegamos no
andar, percebi que existia apenas uma porta ali.
— Ótimo, tem roupas no pequeno closet que fica ao lado do
banheiro, e tudo que precisa para um banho no banheiro — falou, e
vi-o puxar a camisa rasgada e dobrá-la com cuidado, colocando-a
sobre a cama. — A comida vai chegar em breve.
— Por que... por que está fazendo tudo isso? — indaguei,
totalmente perdida e acuada. — Quem é você? O que são os
Hansen?
— Está dizendo que não sabe nada sobre a máfia mais rica do
mundo?
Fiquei apenas parada em choque.
Ele era um mafioso.
Ele era um mafioso que conseguiu subjugar meu pai.
Ele era um mafioso da máfia mais rica do mundo?
— Está carregando o meu filho e vai se casar comigo, é isso o
que precisa saber.
— Eu... eu fiz tudo isso para ter uma escolha, não para
apenas mudar de dono. — Fui honesta, e o encarei, esperando que
ele me acertasse ou tivesse qualquer reação próxima das únicas que
eu conhecia, quando resolvia dar alguma resposta.
— Não sou e nem quero ser o seu dono, e honestamente, não
me importo com você — falou, e sequer se moveu ou me encarou.
Ele não ia me bater? Ele não ia tentar me machucar além de
palavras? — Eu só me importo com o meu filho.
— Não precisa se casar comigo para ser pai dele.
— Preciso — falou, e eu não entendia, não mesmo. — Porque
você me usou, não é? Não fez o que queria e depois desaparecia
pelo mundo, com um filho meu no ventre?
Era a verdade.
Era o meu real plano.
— Sua punição vai ser esse casamento, Isis.
— Eu pensei...
Tentei complementar a fala, mas ela se dissipou, com minha
dor de cabeça.
Não era a primeira ameaça que eu recebia na vida. Contudo,
era a primeira que vinha de alguém que não carregava o mesmo
sangue que o meu. Respirei fundo, sem saber o que fazer. Minha
cabeça doendo ainda mais, e eu procurei pela primeira coisa onde
poderia me sentar – uma cadeira no canto do quarto.
Tentei chegar até ela, e então, meu corpo ficou pesado, tão
pesado, que eu sabia que desmaiaria. Suspirei fundo, e não sabia
por que, mas chamei pelo nome dele, antes de apenas sentir o
impacto de algo contra o meu corpo, e tudo desligar.
CAPÍTULO 15

TYR
— Merda!
Eu consegui me jogar no chão a tempo para impedir ela
despencasse sobre o mesmo. Sentei-me, ajeitando-a em meu colo, e
senti seus sinais vitais. Pareciam normais, mesmo com ela
desmaiada em meu colo.
Levantei-me, trazendo-a comigo até a cama, e a colocando
ali. Vidar já deveria ter terminado de recolher tudo o que deixava
nosso rastro do outro lado da cidade, e deveria estar a caminho em
poucos minutos.
Olhei para a mulher desmaiada na cama, e senti ainda mais
forte, aquele aperto no fundo do peito, quase que se contorcendo.
Suspirei pausadamente e fui até o banheiro, pegando uma toalha, e
molhando-a um pouco. Levei-a até a testa de Isis, e vi-a respirar
fundo, como se quase acordando.
Por que eu sentia como se meu peito estivesse aberto e
totalmente estraçalhado bem ali?
Desci meu olhar para sua barriga ainda sem qualquer
contorno, e respirei fundo algumas vezes. Aquele teste estava certo?
Ela realmente estava esperando um filho meu? Ela realmente estava
grávida?
Para um homem que sempre era o mais inteligente da sala, e
que nunca se surpreendia, ela se tornou a primeira vez. Eu tinha
certeza do que ela queria e precisava, por mais que não fizesse total
sentido. No final, se eu não tivesse pensado tão vagamente, e agido
como era, teria notado a falta de um complemento naquela lei. Eu
teria desconfiado.
Parecia tão óbvio agora.
E tudo o que sempre foi tão óbvio para mim, não o foi. Não
quando se tratou dela. Parecia que eu tinha deixado meu racional
simplesmente se desfazer e entreguei uma parte desconhecida por
uma aventura. Era para ser apenas a porra de uma aventura. Assim
como todas as outras, nada a mais.
E agora, ela estava desmaiada na cama de um hotel,
enquanto eu, quase comecei uma guerra contra outra máfia.
— Odin quer falar com você.
— O que disse a ele, V?
Apenas ouvi o barulho do ponto mudando, e sabia que Vidar
tinha dito o suficiente. Para Odin já estar me ligando, e ser
exatamente no ponto que apenas eu e Vidar costumávamos utilizar.
— Me dê uma boa razão para não ir ao Egito nesse segundo.
— Está tudo sobre controle, O.
— Ameaçou uma guerra se não tivesse um casamento, Tyr.
— Eu não sei o que Vidar disse, mas...
— Vidar não me disse nada — Odin me cortou, e eu engoli em
seco. — Hella estava lá, ela... Preciso que venha para casa, agora.
— Não posso sair do país com ela até que ela tenha o meu
sobrenome, irmão — respondi de uma vez. — Ela é prometida a
outra máfia, e mesmo sendo um processo ilegal, pode ser
problemático se não firmarmos a união perante a família dela.
— Eu estou indo para o Egito.
Foi tudo o que ele disse, e eu soltei o ar com força.
— Merda! — reclamei baixinho, e só então notei que minha
mão foi institivamente para a dela, e a estava segurando. Soltei-me
rapidamente, e vi-a piscar os olhos algumas vezes, como se voltando
da sua inconsciência.
Ouvi o barulho da porta do hotel sendo aberta, e com ela,
apareceu Vidar, carregando uma mochila, que deveria ter Terça-Feira
dentro. E foi o que constatei, quando ele se virou, e vi a parte
transparente e com furos para a respiração dela.
— Oi, Terça.
— Podemos embarcar em uma hora — falou, e eu assenti,
vendo-o suspirar fundo. — Não pensei que usaríamos esse abrigo,
mas é o melhor agora, T.
— O que...
Foi quando me virei e notei que Isis estava acordando.
— As poções de Freya estão aí? — indaguei, e Vidar assentiu.
— Vou ter de ligar para ela primeiro.
Vi-me levantando da cama, e pegando meu telefone já quase
esquecido no bolso da calça. Torcia então, para que minha caçula,
mesmo que distante por tanto tempo, me atendesse naquele
momento.
— Oi, T.
— F, desculpe ligar tão de repente.
— Você sempre liga de repente, irmão — rebateu, o seu tom
sereno, e sendo tão boa, que eu nunca me perdoaria pelo que
fizemos com ela, mesmo sendo necessário. — Qual das poções está
te deixando inquieto?
— Como sabe disso?
— Conheço meus irmãos mais velhos — respondeu
simplesmente. — Então?
— Posso usar alguma para sedar uma grávida? — indaguei de
uma vez. — Suspeita de gravidez, na verdade — corrigi, como se
tentando me convencer.
— Bom, a número 003. — respondeu. — Mas como uma
grávida está envolvida em algum assunto seu?
— É... — soltei o ar com força.
— Ah, meu Deus! — ela gritou do outro lado. — Eu vou ser
tia? É isso? Bjorn vai ganhar outro primo?
— Eu não sei, F — respondi simplesmente, e meu olhar parou
na mulher que ainda parecia confusa, enquanto se ajeitava nos
travesseiros. — Obrigado por isso.
Desfiz a ligação, antes que Freya pudesse tentar me
interrogar, e pedi a poção na numeração que ela indicou. Peguei o
frasco e coloquei apenas as três gostas recomendadas na toalha
molhada que ainda estava sobre a testa de Isis.
Trouxe a toalha para perto do seu pescoço, e ela respirou
fundo. Uma, duas, três vezes... Seus olhos pareceram pesar, um
sussurro saiu de sua boca, mas não consegui decifrar. Ela fechou os
olhos e rapidamente sua respiração se estabilizou.
— Trouxe o que foi necessário — Vidar falou, parado ao lado
da porta sem nos olhar. — E a comida está no carro.
— Obrigado, irmão — falei, e suspirei fundo. — Hella está
infiltrada nos Ramesses, o que quer dizer que precisa ficar aqui.
— Mas Tyr...
— É uma ordem. — Olhei-o com aquela certeza. — Vou para o
abrigo e você continua de onde estava, coletando o que precisamos.
Eu vou... vou me entender com Isis, e ter uma solução para isso.
Ele me encarou, com pesar de quem sabia o que tudo aquilo
realmente significava para mim. Ele nunca me ouviu falar, mas com
certeza, notou a minha lança fincada ao lado do castelo.
Se fosse verdade, eu seria pai.
Se fosse verdade, eu teria a minha linhagem continuada.
O que eu nunca quis. O que eu não podia querer.
O que eu nunca desejei. O que eu não podia desejar.
E era a dor que me assombrava, lá no fundo. Traído – era
como eu me sentia. Ser traído não era uma novidade para um
mafioso, mas a dor trazida por ela, era o que me aterrorizava.
CAPÍTULO 16

ISIS
Eu estava sobre as trepadeiras, quase do outro lado do muro.
Se eu conseguisse, eu estava livre – eu sabia. Então, eu continuei, e
quando finalmente meus pés chegaram ao chão, o que me esperava
era Tyr, de pé, encarando-me com olhos vazios e um sorriso
quebrado.
— Não tem como fugir.
— Seria o mais fácil — falei, e senti a dor forte em minha
barriga. Levei a mão a ela, e a notei grande, e pesada, o que me fez
cair de joelhos à sua frente. — Sei que me odeia, Tyr.
— Eu não te odeio, Isis. — Encarou-me profundamente, mas
era como se o próprio diabo o fizesse. — Eu te desprezo.
E foi quando senti algo molhado em minhas pernas. O
sangue. Eu gritei, pedi por ajuda, e ele gargalhou, enquanto eu me
sentia cair ainda mais.
— Não!
O grito veio acompanhado do meu corpo sendo arremessado
para a frente. Foi quando percebi que eu estava sentada, e era em
uma cama, meu corpo todo suava, e eu respirava
descompassadamente. O quê? Aquilo tinha sido um pesadelo?
Levei as mãos a barriga, totalmente desesperada. Um
sentimento que eu não entendia, mas que me fez conferir cada
parte do meu corpo, procurando por algum machucado. Contudo,
não havia nada lá. Minha barriga ainda não tinha crescido. Eu não
estava sangrando pelas pernas, e minha cabeça doía.
Joguei o edredom longe, e corri até um espelho que vi no
meio do que parecia um quarto. Minha última lembrança era de algo
molhado sobre meu peito, e então, o sono se tornou ainda mais
pesado, e não consegui formular uma frase.
Olhei para o meu reflexo, e eu tinha um curativo bem-feito
sobre o local que doía. Foi quando senti algo na minha perna e dei
um pulo, assustando-me e quase soltando um grito. Quando me
virei, dei de cara com a bolinha de pelos preta, e olhinhos amarelos,
que eu reconheceria em qualquer lugar do mundo.
— Hathor?
Ela miou, e veio até mim, esfregando-se contra minha perna,
e eu me agachei, sem acreditar que ela estava ali. Ela estava ali
comigo.
Mas... Onde era ali? Onde eu estava?
Peguei-a no meu colo, e ela se aconchegou ali, ronronando, e
notei a coleira em seu pescoço, de cor dourada, que carregava uma
placa de identificação.
— T. H.? — li o que estava escrito em voz alta.
Tyr Hansen? — indaguei-me internamente. Ele tinha colocado
as iniciais dele nela? Ele a tinha adotado? Quando ele a tinha
conhecido? Ele era mesmo o cara dos bilhetes?
Caminhei até as grandes cortinas que estavam do lado
esquerdo, e quando puxei uma delas, dei de cara com um mar de
areia, que me deixou totalmente embasbacada. O que era aquele
lugar? Como estávamos no meio de um deserto?
Hathor miou e deu um pulo do meu colo, e vi-a ir até a porta,
e arranhar levemente, como se pedindo para sair. Meu coração um
pouco mais leve, por saber que ela estava a salvo e bem-cuidada, ao
mesmo tempo que temia, que de alguma forma, ela ainda pudesse
ser usada contra mim.
Eu estava em um lugar desconhecido.
E a última lembrança em minha mente era que o homem até
então totalmente desconhecido, conseguiu subjugar a máfia que eu
temia desde o dia que nasci.
O desconhecido que tinha apenas um nome Tyr. Com o qual
eu tinha feito sexo pela primeira vez e, de fato, engravidado. Soltei o
ar com força, tudo se tornando mais do que eu conseguia gerenciar.
O desconhecido que agora tinha nome e sobrenome. E de
alguma forma, aquele sobrenome me apavorava. Não sabia como
administrar a sensação de que eu tinha fugido do meu cativeiro,
para ser colocada em outro. Era exatamente a maneira como me
sentia naquele segundo.
Abri a porta para Hathor, ela correu pelo grande corredor, o
que me fez chamá-la baixinho, e então, segui-la no momento
seguinte. Cheguei no que parecia o final do corredor, e vi-a nem se
importar em me esperar mais, apenas desaparecendo para dentro
de algum cômodo.
— Hathor... — sussurrei, mas sequer conseguia a ver.
E foi nesse momento que ouvi vozes masculinas, um pouco
bagunçadas e diferentes, eu quis forçar minhas pernas a se
mexerem e simplesmente andar para trás. Voltar para o quarto e
esperar que alguém aparecesse, e talvez, me explicasse o que
estava acontecendo.
Contudo, não foi o que eu consegui fazer. Fiquei apenas
parada no fim do corredor, com meu corpo encostado perto da
parede, e tentando ouvir realmente.
— Não tenho muito o que dizer sobre isso, O.
— Tem que me dizer alguma coisa, Tyr. — A voz me era
totalmente desconhecida. — Não fazemos acordos algum de
casamento com outras máfias, a não ser o que Baldur quebrou e
Thor assumiu... Não podemos simplesmente decidir isso do nada.
— Se ela estiver realmente grávida... — a voz dele, eu
reconhecia, mesmo sem conseguir enxergá-los dali. — Eu sei que o
filho é meu.
— Então, não devia ter certeza de que ela está grávida, antes
de simplesmente deixar o herdeiro principal de Seti pronto para uma
cirurgia de reconstrução dos lábios, e ameaçar cada um no salão
principal dos Ramesses?
O silêncio simplesmente se estendeu, deixando cada parte do
local tenso, e vi-me encostando a cabeça contra a parede, e
suspirando.
— Eu sei que agi errado por ter me intrometido, mas...
— Não estou aqui para te julgar, Tyr — o homem falou, em
um tom de entendimento, que me era totalmente desconhecido. —
Eu só quero entender, irmão.
Vi-me encarando a parede do corredor à minha frente, e soltei
o ar com força. Não sabia por onde aquela conversa ia, mas o fato
era que sentia estar no lugar errado e na hora ainda pior.
— Fuxiqueira? É algo que gosto!
Ouvi a pergunta vindo do lado oposto do corredor,
praticamente me levantei em um pulo, e segurei o grito no fundo da
garganta. No momento que me virei, dei de cara com um homem
que parecia pouco mais novo que Tyr, usava roupas todas pretas, e
tinha tatuagens cobrindo grande parte dos braços expostos.
— O calor daqui é meio que infernal, né? — ele indagou, e eu
notava o sotaque gritante no seu egípcio.
— Seus modos, porra!
Foi quando pisquei algumas vezes, e notei a mulher ruiva
atrás dele, que bateu contra seu braço, e passou à frente, vindo até
mim.
— Sou Freya — apresentou-se, e me esticou sua mão, com
um sorriso ameno no rosto. — E o que fala antes de ter educação, é
Loki.
— Um prazer, cunhadinha.
— Eu... — não sabia o que dizer, e apenas me vi aceitando a
mão de Freya e apertando-a levemente. — Eu sou Isis.
— O nome do caos dos Hansen no momento — o homem que
eu sabia que se chamava Loki, agora falou, e Freya ameaçou bater
nele novamente.
— Não há um dia que não me envergonhe de ser sua irmã,
honestamente — Freya falou, e eu fiquei incrédula.
Eles eram irmãos? Eles eram Hansen? Então, seriam, irmãos
de Tyr?
— Parece que vai sair fumaça da sua cabeça a qualquer
momento — ela falou e sorriu levemente de lado. — Que tal
comermos alguma coisa e posso tentar alinhar as suas dúvidas.
— Tyr arranca o nosso couro se falarmos algo antes dele...
Senti o arrepio percorrer todo meu corpo, temendo que eles
pudessem estar em perigo, apenas por estarem falando comigo e
me oferecendo comida. Vi a expressão do homem à minha frente
mudar, e um olhar rápido que ele cruzou com a irmã.
— É apenas jeito de falar, Isis — ele explicou rapidamente. —
Tyr não faz mal a uma mosca. E honestamente, é uma surpresa
maior, que ele seja o deus de guerra, que pela primeira vez, tenha
ameaçado começar uma.
Eu apenas fiquei em silêncio e assenti, enquanto Freya me
guiava pelo corredor, na direção oposta, e eu tentava juntar os
pedaços que simplesmente caíram no meu colo. Contudo, quanto
mais tentava fazer algo ter sentido, menos o tinha.
E por um segundo, eu indaguei internamente: o que viria a
seguir?
CAPÍTULO 17

TYR
— Eu sei que quer me entender, irmão — falei para Odin,
encostando-me contra um dos pilares próximos à sala de estar. — Só
que nem eu consigo me entender. — Fui honesto. — O que eu posso
te dizer, afinal?
— Não preciso dos detalhes, mas tem que haver um ótimo
motivo para ter dormido com ela, mesmo sabendo que era uma
Ramesses.
— Não é a primeira vez que durmo com alguém de outra
máfia, O — rebati. — É só... só que tudo começou diferente. Nós
nos conhecemos por acaso, e eu... eu não consegui apenas deixar ir.
O meu instinto me fez querer entender o que diabos acontecia...
Mas até agora, não sei o que aconteceu comigo.
— Sei que as suas responsabilidades estão tão próximas das
minhas mais do que qualquer outro nos Hansen — falou de repente,
e o encarei. — Sei que é muito, ter que ser aquele impede os
conflitos mínimos e até guerras desnecessárias, que poderíamos ter
enfrentado...
— Eu gosto do que faço, O — cortei-o, e sorri, mesmo que
ainda estivesse confuso com muitas coisas, o que eu fazia, nunca foi
uma questão. Era o que eu era, simples assim.
— Só que sempre foi tão cuidadoso, e de repente, te ver agir
assim, me faz pensar no quanto não sabia que uma família poderia
te assustar de tal forma. — Engoli em seco, e desviei o olhar. —
Nenhum de nós pensou em ter uma nova família, e as coisas
simplesmente aconteceram para alguns, como Baldur, Freya, agora
Thor se casando... E Loki tem Malena, por mais que seja indefinido...
Se quiser falar disso, eu estou aqui.
— Ter uma família é uma fraqueza, O — falei, e neguei com a
cabeça. — Nós já somos a fraqueza um do outro, só que crescemos
assim, sabendo a quem proteger. Só que ter uma extensão nossa?
— indaguei, como se para o nada. — Não é algo que posso parar de
pensar no quanto usariam contra mim.
Meu próprio juramente a destruiria. E naquele momento, só
conseguia pensar sobre aquilo.
— Você é mais inteligente que qualquer que um que ousasse
tentar fazer algo contra quem você protege.
Eu quase ri do que ele disse, porque eu me sentia totalmente
ridículo por não chegar nem perto daquilo – não quando se tratou
de Isis.
— Acabei de levar um golpe da barriga, irmão — rebati, e
levantei meu olhar para ele, que parecia apenas impassível, como
sempre. — Não posso sequer confiar na inteligência que achei que
tinha.
— E o que vai fazer, Tyr?
— Descobrir se ela está mesmo grávida, e... — o meu estado
de negação ainda me acompanhando.
— Sabe que isso agora é o que menos importa, certo? —
assenti, sabendo de como tinha lidado da pior maneira possível com
a situação.
— Eu sei, mas... mas se eu não tivesse perdido a cabeça e
feito, de repente, não teria nem a chance de saber se ela está
realmente grávida ou não.
Colocar aquilo em voz alta, me fazia lembrar da cena, vendo-a
sangrar por toda sua testa, e a maneira como simplesmente parecia
fraca demais para se manter em pé.
Ouvi a respiração funda de Odin, e o encarei.
— Vou fazer uma visitinha a Seti — apenas avisou, e eu franzi
o cenho. — Antes que ele tente me encontrar.
— Ele disse que o faria — comentei. — E eu ri da cara dele.
— Apenas saiba, que independentemente do que tenha se
passado e ainda vá acontecer, estamos com você... Não há chance
de enfrentar nada disso, sem que todos nós nos envolvamos.
— Bom, eu esperava mesmo que todos fossem ao meu
casamento, mas...
— Tyr...
— Só pra dizer que ninguém foi ao meu casamento. — A voz
veio de um pouco mais longe, e então me levantei, encontrando
Baldur vindo em nossa direção.
— Nem sabíamos que estava se casando, B.
Falei, rebatendo sua provocação dramática, e fui até ele, que
me deu um leve abraço, e pareceu procurar qualquer evidência em
meu rosto. A preocupação totalmente nítida em cada parte dele.
— Detalhes, T... Detalhes...
— O que houve? — a pergunta veio de Odin.
— Digamos que Loki e Freya estão enchendo a futura Hansen
com histórias sobre a mitologia nórdica, e ela parece tão branca,
mesmo comendo, que acho que vai desmaiar.
— Ela desmaiou mais cedo.
Falei, e me vi afastando-me do meu irmão, e sequer pensei,
antes de apenas sair da sala de estar, e passar a procurá-los pela
grande casa.
— Cozinha!
O grito de Baldur me deu a resposta para a pergunta que foi
desnecessária, porque eles me conheciam muito bem. Mais do que
qualquer outro. E naquele momento, sentia-me ainda mais exposto
a cada um deles. E por mais que detestasse estar assim, a única
coisa em minha mente, era a preocupação de encontrar Isis
desacordada novamente, e que, de alguma forma, se machucasse.
Tudo dentro de mim, encontrava-se em um conflito interno
que parecia pronto para se estender, para o meu exterior, e culpá-la
por ter nos colocado naquela situação. Culpá-la por conseguir se
infiltrar e escancarar o pior de mim.
Quando cheguei próximo à cozinha, consegui escutar a
risadinha baixa dos meus irmãos, e antes de realmente entrar no
cômodo, vi que Isis estava comendo o que parecia o lanche natural
que Freya sempre fazia quando ainda morávamos juntos, e mesmo
sua cor ainda um pouco apagada, ela tinha um sorriso no rosto.
Um sorriso que eu só me lembrava de ter visto uma vez. E era
exatamente, no momento em que ela apenas se deitou sobre meu
peito, e me encarou como se eu fosse a única coisa que ela gostaria
de ver. E, de fato, eu deveria ter sido, naquele momento.
Então, por que mesmo sabendo que eu estava sendo usado,
algo dentro de mim estalava, como um incômodo, de que ela tinha
sorrido daquela maneira antes, justamente, por que ela me usou?
Por que isso me incomodava, afinal?
Por que eu não conseguia separar o fato de que ela foi mais
esperta e conseguiu o que gostaria, e agora, eu estava tentando
recuperar a minha própria mente, depois de tê-la perdido pelos
minutos subsequentes, que a levariam a ser minha esposa?
— E chegamos a Tyr, finalmente, originário do deus da guerra
da mitologia nórdica, que era amado e cultuado por muitas
pessoas... As histórias contam que...
Vi-me respirando fundo e adentrando a cozinha.
No momento que o fiz, o olhar de Isis parou no meu, e o
sorriso em seu rosto apenas desapareceu, e percebi que eu tinha me
tornado uma preocupação para ela. Era claro que ela me temia. Mas
quem em sã consciência não o faria?
Eu tinha dito tantas coisas, ameaçado tantas outras... Seria
estranho se ela agisse como se não se importasse com aquelas
palavras. As quais, eu ainda tentava reorganizar, justificar e
compreender, na minha própria mente.
— Acho que consigo contar a história do deus de quem
carrego o nome...
— Me surpreende ainda não ter feito — Freya falou, se
levantando. — Vou ver onde Baldur se meteu, e tentar ligar para
Bjorn.
— E então...
Loki simplesmente nos ignorou e iria continuar, mas vi Freya o
puxou pelo braço, obrigando-a a se levantar, e eu não sabia se me
enterrava diante da cena óbvia, ou se simplesmente fingia que nada
aconteceu. Optei pela segunda opção, quando os dois finalmente
saíram dali, deixando-nos a sós.
— Termine o seu lanche, e vamos conversar.
Meu tom apenas saiu mais rude do que eu medi. A verdade,
era que eu sabia que não poderia simplesmente agir com
cordialidade. Algo em meu âmago, me dizia que o melhor para os
dois, era que fôssemos indiferentes.
Porém, eu sabia que tinha muitas coisas dentro de mim sobre
ela, mas nenhuma poderia ser definida como indiferença.
CAPÍTULO 18

ISIS
Apenas o encarei, enquanto terminava de comer e tomar o
refrigerante que me ofereceram. Vi-o de relance, se recostar contra
um dos armários, ao passo que eu enrolava o máximo que podia,
degustando a comida, porque tudo o que eu não gostaria naquele
momento, era de enfrentar a realidade.
Tinha como não o fazer? Não.
Eu tinha como adiá-la por alguns segundos? Sim.
Ele apenas aguardou, encarando o chão à sua frente, e
claramente sem pressa alguma. Suspirei fundo, conforme o tempo
passava, e meu pão já tinha acabado, assim como, estava no fim da
latinha.
Antes que eu dissesse que terminei, ouvi um miadinho
adentrando a cozinha, e Hathor foi primeiro até Tyr, esfregando-se
nele, para depois vir até mim. Ela pulou na banqueta vazia ao meu
lado, e se deitou, claramente pedindo para que lhe desse carinho.
E foi o que fiz.
— Ela é sempre tão carente...
A fala de Tyr me fez encará-lo, enquanto ainda esfregava os
pelos pretos dela.
— Ela é uma boa garota.
— Ela é — ele respondeu, e então desviei o olhar, vendo-o
parado no lugar, apenas me esperando. — O que meus irmãos te
disseram?
— Que os Hansen são a máfia escandinava, a mais rica e
segunda mais poderosa no mundo — respondi, tentando repetir
cada palavra que Loki iniciou. — Disse que levam os nomes dos
deuses nórdicos, e começaram dos mais novos aos mais velhos, para
falar sobre os deuses — comentei, ainda acariciando Hathor, que
ronronava.
— Bom, e pararam no meu nome?
— Tinham dito os dele, e depois... Vi... Vida? — me senti
confusa, sabendo que confundiria muitas das informações.
— Vidar — corrigiu-me, e eu apenas assenti, sem encará-lo.
— Vou te dar uma introdução melhor sobre isso, mas antes,
precisamos fazer algo, Isis.
Afastei minha mão de Hathor e o encarei, vendo-o fazer o
mesmo.
— Posso fazer outro teste de gravidez, quando quiser —
admiti. — E se precisar de um teste de DNA, eu não sei como
funciona, mas pode pedir. Eu faço o que precisar.
— Como sabe que eu...
Senti meu rosto queimar, mas não o desviei.
— Eu estava no corredor, seguindo Hathor, quando o ouvi
falar com alguém e deixar a gravidez como suspeita... — confessei,
já que não tinha realmente como esconder. — Pode ver nas câmeras
depois, se for preciso.
— Hathor?
— Ah, o nome que dei a ela — falei, e levei minha mão
novamente para a cabeça da gatinha.
— Vou atualizar na coleira dela, então — comentou, e de
repente, o encarei surpresa. — Eu coloquei o nome de “Terça-
feira”... — fez aspas com as mãos, e fiquei ainda mais perdida sobre
o que queria dizer, mas entendi as iniciais idênticas as dele.
— Por isso T. e H. na coleira?
Ele assentiu.
— E de que câmeras está falando, Isis? — perguntou, e foi
minha vez de o encarar como se ele estivesse perdido.
— As que vigiam a casa ou a parte em que estou...
— Eles vigiavam tudo na mansão Ramesses? — indagou, e eu
engoli em seco, percebendo que tinha falado demais.
— Pensei que fosse comum, nas máfias...
— Não há nada de comum em ter câmeras dentro do seu
próprio lar.
— Aquilo não é um lar — rebati. — Aquilo é uma prisão, para
a maioria de nós... — admiti, lembrando-me de Maia, e torcendo
para que ela estivesse bem.
— Bom, aqui não é uma prisão.
— Mas estou presa a esse casamento, certo? — indaguei, e
ele pareceu surpreso com as palavras.
— Vou adiantar tudo para o teste de gravidez — apenas
assenti, sem saber o que dizer. — Tem medo de agulhas?
Pisquei algumas vezes, um pouco confusa.
— As de costurar? — indaguei, vendo-o parecer ainda mais
perdido.
— Nunca levou uma injeção, tomou vacina ou tirou sangue?
— Não que eu me lembre — admiti. — Tem como tirar o
sangue de dentro da gente? — Eu estava abismada.
— Acho que temos coisas mais importantes do que entender
os Hansen de fato, nesse momento — falou, e ouvi-o suspirar
profundamente. — Pode andar por onde quiser na casa, até o jardim
de inverno... Só não vá para o lado de fora, totalmente exposta.
— Estamos mesmo no meio do deserto?
— É um abrigo dos Hansen — explicou, e se afastou dos
armários. — Estamos relativamente longe da cidade que a máfia
reside, mas todo cuidado é necessário.
— Obrigada, eu acho.
Foi tudo o que consegui dizer, enquanto ele apenas se virava
e saía pelo corredor que apareceu. Foi quando levei a mão ao meu
peito, bem do lado esquerdo, e senti meu coração bater
freneticamente. Como eu conseguiria fazê-lo parar de estar assim?
Por que ele batia como se dependesse de cada palavra dita pelo
homem que saiu de minha vista?
Fechei os olhos por alguns segundos e me culpei por aquilo.
Eu também queria que ele fosse uma lembrança bonita, como
realmente era. Talvez por isso, eu estivesse tão elétrica, pelo fato de
que ele não tinha se tornado algo, ele ainda era o presente.
Hathor miou, e percebi que parei de tocar em seu pelo. Ela
pulou em meu colo, e a trouxe para os meus braços.
— Como foi que você parou no meio disso, hein? — indaguei
baixinho, e ela ronronava, como uma resposta clara de que sua
inocência era tamanha, que ela sequer poderia considerar a bagunça
que existia ao seu redor.
A minha bagunça.
A bagunça dele.
E então levei uma das mãos livres até minha barriga, como se
procurando uma resposta para tudo aquilo. Ou quem sabe, uma
forma de organizar cada canto que se tornava cada vez mais sem
sentido.
A conclusão era que não existia uma reposta, apenas uma
bagunça de nós.
TYR
No momento que pisei no corredor, dei de cara com Loki e
Freya, simplesmente fingindo que estavam encarando quadros
inexistentes na parede.
— Honestamente?
Zombei, e passei por eles, que correram atrás de mim pelo
corredor. O que me remetia a dias de quando ainda éramos jovens,
e todos estávamos sob o mesmo teto. Não existia um dia em que
Loki e Freya não estivessem tirando a paciência de algum irmão
mais velho. Parecia simplesmente a função nata dos dois.
— Ela não sabe o que é uma agulha?
Ouvi o barulho do tapa que Freya deveria ter acertado em
Loki, e parei. De repente, apenas senti os dois se chocarem contra
mim, e me virei.
— Peço que não façam mais isso, tudo bem?
Vi-os claramente sem graça, mas assentiram, como se
realmente fossem honrar aquele pedido.
— Ela parece inocente demais... — Freya falou, e trocou um
olhar com Loki.
— Como foi que ela transou com você, é a dúvida que fica
passando na nossa mente — Loki falou, e eu bufei, sabendo que
eles estavam realmente curiosos sobre tudo, mas eu não iria lhes
dar o que queriam. — T...
Segui pelo corredor, e cheguei à sala de estar, onde encontrei
o lugar vazio. Odin e Baldur já deveriam ter partido em direção aos
Ramesses.
As vozes de Loki e Freya se misturavam, e eu me joguei em
uma poltrona, fechando os olhos, e fingindo que não era comigo.
Uma tática antiga, mas que funcionava muito bem, principalmente,
quando me sentia tão cansado.
Não seria uma surpresa se eu adormecesse ali mesmo – e era
o que realmente necessitava. Meu corpo precisava demais disso do
que ficar alimentando meus próprios demônios em um lar que não
merecia. Então, mesmo ouvindo as vozes de meus irmãos, fazendo
perguntas, e às vezes até mesmo arriscando as respostas, tudo o
que as palavras me fizeram foi me embalar no sono que já me
rondava.
E a última coisa que eu tinha em mente, antes de apagar,
eram olhos castanhos curiosos e assustados. E de alguma forma, eu
sabia que os adorava, mesmo que tudo o que devesse, fosse
desprezá-los.
CAPÍTULO 19

ISIS
— Nós vamos ficar no quarto de hóspedes hoje.
Dei um pulo no lugar, terminando de enxaguar minha louça.
Virei-me para encontrar Freya, parada perto da ilha da cozinha, e
um fraco sorriso no rosto.
— Desculpe pelo susto — ela falou, e eu apenas me vi
assentindo, enquanto deixava o prato e talheres usados, lavados
sobre a pia. — Nosso quarto fica mais perto da cozinha, e longe do
seu, mas qualquer coisa, pode nos chamar.
— Vamos passar a noite fazendo fofoca mesmo, por isso...
Dei outro pulo no lugar e notei Loki parado ao lado dos
armários, o que me fez perceber o quão silenciosos eles conseguiam
ser.
— Loki... — ela parecia ter xingado, mas tudo o que entendi
foi o nome dele. — Boa noite, Isis. Tente descansar, e espero poder
conversar com você amanhã sobre a gravidez.
Assenti, e via a bondade clara em suas palavras. O que me
fazia pensar sobre Maia, e sobre o que poderia estar acontecendo.
Eu poderia pedir algo assim? Eu poderia pedir para saber sobre ela?
— Aliás, cunhadinha... Tyr está dormindo na sala.
Freya falou alguma outra coisa, que eu não entendi, enquanto
o empurrava para fora da cozinha, e eu suspirei fundo. Eu deveria
apenas sair dali e seguir pelo corredor, em direção ao quarto em que
eu tinha acordado. Foi o que coloquei em mente, mas não realizei.
Vi-me seguindo até o final, do outro lado do corredor, e adentrando
a sala.
Foi quando notei Tyr sentado em uma poltrona, Hathor em
seu colo, e ele claramente apagado bem ali. Aproximei-me, com a
desculpa em minha cabeça, de levar a gatinha para o meu quarto,
mas não poderia mentir que fiquei alguns segundos, talvez minutos,
encarando o homem que sequer sabia que eu o observava.
Por que eu não conseguia parar de olhar para ele? Por que eu
gostava, de simplesmente, parar e o fazer?
Enquanto o fazia, me vi lembrando da nossa noite, da maneira
como nunca tinha me sentido tão segura, e de repente, eu estava
confiando todas as partes de mim a um desconhecido. Pensei que
seria apenas o meu corpo, mas o fato era que para ele acessá-lo,
tinha conseguido conquistar minha mente e paz, tomando-as para
si.
Ele era tão bonito, que poderia chegar a doer. A maneira
como tudo nele parecia tão em harmonia. E eu me lembrava daquele
pesadelo, com um medo assustador, de que poderia ser a realidade.
Que os seus olhos se abririam para serem tão vagos e frios, que
tirariam o pior de tudo. O pior de si. O pior de mim.
— Preciso fingir por mais tempo?
Eu soltei um grito baixo, meu corpo se desequilibrou, e sabia
que ia encontrar o chão, devido ao susto que eu tinha levado.
Contudo, senti uma mão agarrar meu braço e impedir que meu
corpo caísse. Meu corpo sendo puxado para a frente, para o dele, e
meu olhar assustado se tornou ainda mais, quando percebi nossa
proximidade.
— Desculpe pelo susto.
Ele falou, e eu assenti, ainda sentindo sua mão em meu
braço, e não conseguindo formular uma frase correta.
— Eu... — suspirei fundo, dei um passo para trás, e os dedos
dele se afastaram da minha pele. Talvez eu conseguisse pensar
agora. — Desculpe ficar te olhando, eu só vim... — não sabia como
mentir para ele. — Desculpe.
Ficamos nos encarando, e eu não sabia por quanto tempo,
mas parecia cada vez mais difícil, simplesmente me virar e sair dali.
Por que não era simples assim?
— Precisa de algo?
Sua pergunta me fez olhar diretamente para o seu colo, e foi
quando percebi que Hathor já não estava ali.
— Hathor estava aqui, mas...
— Ela deve ter saído quando me mexi — assenti, como se
soubesse tanto quanto ele. — Mas então, precisa de algo, Isis?
Foi quando me veio em mente o semblante de Maia.
— Eu posso pedir por algo? — indaguei, testando o terreno, e
vendo-o passar as mãos levemente pelos cabelos, como se os
arrumando.
Eu nunca tive autorização para pedir algo a alguém. Nunca. E
sequer sabia como o faria. Porém, se ele me concedesse, eu o faria,
por ela.
— Não sou o seu carcereiro. — Olhei-o, engolindo em seco. —
Apenas me diga do que precisa.
— Maia — falei por fim. — Ela é a esposa de Akhmu, e a única
pessoa que me ajudou, eu só... só tenho medo de que estejam
tentando tirar algo dela.
— Ela é esposa do irmão que eu rasguei a boca? — indagou,
como se não fosse grande coisa, e eu assenti. — Um minuto.
Ele se levantou, vi-o apertar algo perto da orelha, e eu apenas
fiquei parada no lufar, sem saber o que estava acontecendo. Ele
falava outra língua, que eu ainda não sabia qual era, mesmo
descobrindo que eram escandinavos, o fato era que não tinha ideia
alguma sobre muitas culturas, e a dele, estava inclusa.
— Obrigado, irmão.
Ele finalmente falou em egípcio, e seu olhar parou no meu.
— Parece que ela apenas foi mandada para o quarto, e nada
mais — assenti, pensando sobre como ele tinha conseguido alguma
coisa. — Vidar vai tentar descobrir mais, e me avisa assim que tiver
algo.
Fiquei apenas o encarando, tentando acreditar em suas
palavras. Uma realidade era que eu não tinha ideia do que ele tinha
falado, e muito menos, se havia realmente falado com alguém.
Como aquilo era possível? Como ele conseguia se comunicar assim?
— Por que não parece convencida?
Ele me leu perfeitamente, e eu engoli em seco.
— Não entendo sobre tecnologia, e não entendi nada do que
falou... — assumi. — Como vou saber se não está zombando de
mim?
— Por que eu o faria, Isis?
Eu apenas neguei com a cabeça. Nós éramos de realidades
claramente muito diferentes.
— Foi o que fizeram comigo, a vida toda — admiti. — Não tive
uma relação como você tem com seus irmãos, claramente, sendo
uma família... Se o meu próprio sangue me enganaria assim, por
que você não o faria?
— Sangue pode ser uma maldição.
Pisquei algumas vezes, sem entender. Porém, quando seu
olhar se abaixou para minha barriga, senti o peso de suas palavras.
Esperei por alguns segundos, para que ele desenvolvesse ou
voltasse atrás, o que não aconteceu.
Não saberia explicar o porquê, mas eu apenas me vi com a
mão no seu rosto, sem pensar novamente.
Por que eu estava defendendo a vida que crescia em mim, se
todo o objetivo daquela gravidez era para eu fugir? Não entendia,
mas simplesmente o fiz. Como se todo meu corpo pudesse falar por
mim.
— Não esse. — Foi tudo o que consegui dizer. — Boa noite,
Tyr.
Virei-me e apenas saí dali, sentindo meus olhos queimarem, e
encarando a mão que tinha atingido a face dele. Ele estava dizendo
que o filho que eu esperava era uma maldição? Fechei-me no
quarto, e levei a mão à barriga, parando na frente do espelho.
Não era mais uma necessidade, mas nunca chegou a ser uma
maldição. Por que ele considerava assim? Por que aquilo me doía
demais?
Vi-me respirando fundo, ouvi um miadinho, vindo da cama, e
fui até ela. Deitei-me ao lado de Hathor, e ela se deitou sobre minha
barriga, o que me fez deixar algumas lágrimas descerem.
O que diabos estava acontecendo comigo?
CAPÍTULO 20

TYR
Bebi um longo gole de hidromel, enquanto encarava a
fotografia que tinha, de todos meus irmãos, pendurada em uma das
paredes do quarto que era meu. Eu as tinha em todos os abrigos
dos Hansen ao redor do mundo. Gostava de parar e olhar, e pensar
o quão orgulhoso estávamos de ter construído algo maior do que
nós.
Maior do que realmente éramos.
Maior do que o sangue que corria nas nossas veias.
Maior do que a maldição que Ymir começou e tentou
perpetuar.
Batidas na porta me fizeram desviar o olhar da foto, e apenas
dizer “entre”. Pensei, por um segundo, que poderia ser Isis.
Contudo, o que ela faria ali? Depois de ter dado um tapa na minha
cara, por chamar o nosso filho de maldição, como ela me olharia?
Ou melhor, como eu a olharia?
Independentemente do que fosse, eu não tinha tal direito. Eu
não tinha direito de deixar que os meus demônios fossem levados a
ela. Muito menos, fossem levados ao filho que ela esperava. Se ela o
esperasse, de fato.
Quando a porta se abriu, percebi Freya, com o desbotado do
seu ruivo, e os seus cabelos quase brancos já voltando a aparecer.
— Pensei que teria o melhor hidromel, então...
Ofereci-lhe a garrafa, enquanto ela se jogou no tapete ao meu
lado, e a aceitou.
— Sei que Isis está assustada, mas eu não parei de pensar o
quanto você está assustado — falou, logo após beber um gole e
fazer uma careta. — Bebida ruim de todo jeito.
Eu ri, e aceitei a garrafa de volta.
— E você, F? Não estava assustada também? Tendo todos os
seus irmãos te aprisionando e não te deixando viver?
Vi-a suspirar fundo, e seus olhos pararam na imagem que eu
encarava.
— Eu não consigo dizer que não estava, mas a palavra que
me definia de verdade era: traição. — Soltou o ar com força. —
Senti que todos me traíram, e que eu era descartável.
— F...
— Sei que Odin não permitiu que ninguém contasse sobre o
porquê daquilo, mas eu sei que ele ainda vai ter que me falar. —
Senti sua cabeça se deitar no meu ombro. — Sei que todos estão
tentando me compensar, até ele... daquele jeito durão e
inalcançável, mas que não para de mandar presentes pra Bjorn, eu e
Rique... — ela riu e eu fiz o mesmo.
— Ele realmente os manda?
— E para ajudar, através de Hella...
— Esses dois... — neguei com a cabeça. — Tem algo ali que
não faz sentido.
— Bom, Loki e eu temos até medo de levantar uma teoria...
deixo nas mãos deles.
— Melhor não pensar tanto sobre — assumi. — Odin cuida de
nós, do jeito dele. Hella cuida de nós, do jeito dela.
— E bom, uma hora, vamos ter que cuidar deles, concorda?
— Pelo menos seremos seis para dois, acho que será o
suficiente — argumentei e ela sorriu.
— E como está sendo? Pensando sobre cuidar de um serzinho
que leva uma parte de você? — perguntou, e eu a encarei, sem
poder perguntar quando foi que ela tinha crescido, porque, na
verdade, eu sabia quando e por que tinha acontecido.
— Tento não pensar sobre isso — admiti. — Se eu penso
muito, acabo pensando em Ymir, e já pode imaginar onde isso vai
parar...
— Bom, Ymir está no inferno, e você aqui... Acho que tem
uma grande diferença?
— Ainda temos o sangue dele, Freya. — Soltei o ar com força.
— Sei do poder que temos por isso, e do quanto isso pesa.
— Seu sangue não define sua alma, e muito menos, como
será como pai. — Sua observação foi como o tapa na cara de Isis, só
que direto no meu estômago. — Não deixe isso te fazer pensar
demais.
Eu apenas sorri para ela, e beijei sua testa. Existia muito mais
por trás disso, que eu não gostaria de compartilhar com ela. O que
eu carregava naquilo, era algo que não compartilharia. Não com ela.
Já era demais, deixar que ela tentasse aliviar meu fardo.
Não demorou para a porta do meu quarto ser aberta e Loki
entrar. Já era de praxe, que ele, de fato, nunca batia, e eu não
estava surpreso com aquilo.
— Noite do pijama e ninguém me chamou?
— Deita logo — Freya apenas falou, enquanto ele se ajeitava
no colo dela, e com o olhar diretamente em mim.
— Que foi, L? — indaguei, e ele parecia querer me analisar
por completo.
— De todos nós, você era o último que imaginava ter filhos —
comentou, sua sinceridade sendo dura, mesmo que a sua maior
habilidade fosse mentir.
— Nem Vidar ou Odin? — rebati, bebendo mais da garrafa, e
ele negou.
— Nunca se sabe o que está acontecendo com Vidar, pode
estar acontecendo de tudo... E Odin é chefe da máfia, só estou
esperando o tempo de ele aparecer casado — Freya assentiu, como
se concordando, e tinha que dizer, que ele tinha total razão. — Já
você sempre foi livre demais, irmão. Acho que é o mais cafajeste de
todos nós, isso, sem saber de todas suas histórias...
— Devia parar de ouvir o que sussurram sobre por aí... —
rebati.
— Você sempre deixa alguém com o coração quebrado ou
encantado para trás — provocou. — Não pode culpar um homem
por saber da fofoca.
— Pode só calar a boca e beber um pouco? — rebati,
oferecendo-lhe a garrafa.
— Se eu beber hoje, Malena come meu rim. — Fez uma
careta. Sabia que ele falava da melhor amiga dele, que nasceu em
uma família que servia a máfia, a qual o pai, salvou a minha vida. —
Ela pode ser assustadora quando quer.
Freya me deu um olhar, como quem sabia o mesmo que eu,
mas que Loki parecia cego. Era uma verdade para qualquer um dos
Hansen, de que algum dia Loki nos contaria que estava envolvido
romanticamente com Malena. Não existia outra possibilidade. A
verdade era que ele parecia não notar o que sentia por ela. Como se
cego por outro sentimento que existia em si, com medo de acreditar.
Foi aí que minha ficha caiu, do quanto sempre foi fácil
identificar os sentimentos ao meu redor, mas nunca, de forma
alguma, me vi questionando os meus. Algo que me fez virar outro
longo gole, tentando não pensar muito. Tudo o que eu não desejava
era a sensação de não compreender o que estava sob a minha pele.
E eu tinha quase começado uma guerra por aquilo.
E teria que travar outra comigo mesmo, para conseguir parar.
CAPÍTULO 21

ISIS
Eu pensei que demoraria a dormir, porém, o mais estranho era
que tinha simplesmente apagado. Tentava me localizar novamente,
enquanto sentia Hathor sobre minha perna, e a luz do sol adentrar
por uma das janelas. Levantei-me, e então resolvi que deveria olhar
ao redor.
Com atenção, encarei cada pequeno canto dos tetos, e não vi
sinal de alguma câmera. Fiz o mesmo, adentrando o banheiro, e foi
o momento que procurei, em cada pequeno objeto, se existia
alguma câmera. Parecia não ter nada, mesmo assim, eu não podia
confiar.
Vi-me encarando as toalhas penduradas, e caminhei até o
lado de fora do banheiro, encontrando um armário, no qual
encontrei roupas masculinas, mas todas com etiqueta. Vi-me
pensando em como faria, se molharia a lingerie que usava, e não
teria como usá-la novamente.
Procurei mais, e então encontrei nas gavetas, cuecas lacradas.
Peguei-as, e teriam que servir, enquanto escolhi uma calça de
moletom, e duas camisetas que ficariam grandes, mas era o melhor
que consegui pensar.
Voltei para o banheiro, e tirei a roupa que usava. De cabeça
baixa, fiquei apenas com a lingerie, e segui para debaixo do
chuveiro. Tomei meu banho rapidamente, como estava acostumada,
e soltei meus cabelos, deixando-os cobrir até perto da minha bunda.
Tê-los longos era uma vantagem, para quem precisava se esconder.
Lavei-os rapidamente, e desliguei o chuveiro, pegando a toalha, e
me envolvendo com ela.
Felizmente, tinha mais de uma, então uma coloquei nos
cabelos, a outra enrolei no meu corpo, conforme usava a terceira
para secar-me ao redor. Ainda debaixo da toalha, tirei a lingerie, e as
torci, para sair a água, e teria que perguntar, onde poderia lavá-las.
Coloquei primeiro a cueca, e em seguida a calça. Para só então
vestir a camiseta larga, que ficou sobre a toalha, e pude retirá-la.
Assim, coloquei a outra camiseta por cima, e encarei meu reflexo no
espelho.
Ali também existia uma escova de dentes, que eu tinha aberto
quando acordei no meio da noite, e precisei ocupar minha mente.
Peguei-a, escovei meus dentes, ao mesmo tempo que deixava
apenas uma toalha em meus cabelos, e pensava em como as coisas
seriam durante aquele dia.
Agulhas?
O que ele queria dizer com aquilo?
Por que usaria agulhas comigo?
Terminei de escovar os dentes, e tirei a toalha dos cabelos,
passando os dedos entre os fios, deixando-os parte na frente do
corpo, e o resto atrás. Ainda continuei com a toalha, secando as
pontas. Saí em seguida, e fui em direção a Hathor, que já começava
a miar e arranhar a porta do quarto.
— Você é mimada, não?
Indaguei, enquanto abria a porta para ela, e foi o momento
que encontrei Tyr do outro lado, parado e parecia prestes a bater, a
mão fechada, parada no ar.
— Ei, pequena.
Vi Hathor passar pela perna dele, e então se arrastar por cada
uma delas, antes de seguir pelo corredor.
— Vim ver se tinha acordado — falou de repente, sua voz me
trazendo para a realidade em que estávamos.
O acontecimento do dia anterior, me remoendo. Foi quando
percebi que eu tinha uma das mãos sobre minha barriga, de forma
totalmente inconsciente. Eu não sabia dizer o que aquilo significava.
Nada fazia muito sentido, de verdade. E vendo o olhar dele,
claramente culpado, sentia-me ainda pior.
Era como se fôssemos a soma de culpa um do outro.
— Para as agulhas?
— É... —respondeu simplesmente. Seu olhar estava fixo ao
meu. — Todos nós temos um curso na área, para casos extremos. E
mesmo que tenhamos pessoas de confiança, prefiro que Freya faça
para que seja ainda melhor.
— Certo. — foi tudo o que consegui dizer, e ele apenas me
deu espaço para passar. — Onde devo ir?
— Seria melhor comer primeiro, e... — ele apenas se calou e
eu o encarei confusa. — O almoço já está na mesa, e estava te
esperando.
— Almoço? — indaguei confusa. — Que horas são?
— Quase meio-dia.
Arregalei os olhos, totalmente incrédula.
— Desculpe demorar, eu não costumo dormir tanto e...
— Eu que devo desculpas a você, Isis.
Fui pega totalmente desprevenida.
— Eu realmente sinto muito pelo que disse, e não existe uma
justificativa para isso. — Pisquei algumas vezes, e meu corpo
totalmente inerte. Ele estava realmente se desculpando? — Gostaria
que soubesse disso.
Assenti, sem ter muito o que dizer.
Ele apenas ficou parado, e eu não sabia o que fazer ou dizer,
mas depois de alguns minutos, que pareceram durar mais do que
deveriam, ele apenas abriu espaço para que eu passasse.
— Na mesa de jantar — ele falou, e apontou para o lado que
ficava a sala em que o encontrei dormindo na noite anterior.
Segui pelo corredor, e me surpreendi quando passei pela sala
de estar. Logo à direita dela ficava uma enorme sala de jantar, com
uma mesa para mais de vinte pessoas. O que me surpreendeu ainda
mais, era que existiam apenas dois pratos ali, e a comida distribuída
em outras partes no meio da mesa.
— Seus irmãos? — perguntei, como se pudesse, de alguma
forma, me apegar a eles para ter alguma companhia além da dele.
— Loki teve que voltar para um trabalho e Freya disse que iria
à cidade e voltaria antes de anoitecer — assenti, e antes que
pudesse me sentar, ele puxou a cadeira para mim, oferecendo-a.
Franzi o cenho, sem entender muito o gesto, e acreditei que ele
estava escolhendo aquele lugar.
— Desculpe.
Afastei-me, fui para a cadeira do outro lado da mesa, e
quando me sentei, levantei o olhar, e notei seu olhar no meu, como
se me inspecionando.
— Eu fiz algo? — indaguei, sentindo que ele tentava
compreender qualquer coisa sobre mim, que nem eu questionava.
— Às vezes parece que seria mais fácil entender o que você
sabe da vida, do que o que não sabe — respondeu, se sentou na
cadeira que havia puxado, e eu não poderia ir contra suas palavras.
— Sei o que me permitiram ser ensinado — admiti. — Sou
simplesmente burra perto da maioria das pessoas, se é algo que se
pergunta.
— Burra não é um adjetivo que seria dado a você. — Olhei-o
sem entender. — Ignorante, definiria melhor. E sei que ignorante não
por sua vontade.
Eu ia responder algo, mas minha barriga roncou alto, apenas
senti meu rosto esquentar, e tentei baixá-lo, escondendo-o.
— Eu não sei o que gosta de comer, então pedi um pouco de
tudo que é típico aqui — falou, e vi-o abrir as tampas das várias
panelas colocadas ali, e o cheiro me atingiu em cheio.
Tão bom, mas ao mesmo tempo, tão forte. Contudo, minha
fome parecia maior do que a leve dor em meu estômago.
— Obrigada.
Apressei-me a servir, e coloquei um pouquinho de tudo que
existia ali. Senti o olhar dele em cada passo meu, mas não me
permiti encará-lo novamente. Um fato era, que de tudo o que já
tinha me acontecido, Tyr Hansen era a única incógnita que
realmente me fazia querer desvendá-la.

TYR
Antes de noite cair, Freya estava de volta.
Ela trazia consigo, uma mala de coisas que eu não sabia o que
realmente eram. Mas não me vi questionando, porque precisava que
ela fizesse o exame de sangue o quanto antes, para que pudesse ter
a resposta concreta de tudo aquilo.
Por mais que, dentro de mim, era como se eu soubesse que
não era um falso positivo que Isis tinha encontrado. Algo dentro de
mim, sabia, mas eu precisava da certeza. Tanto por mim, quanto por
ela.
— Ok, então eu vou tirar o seu sangue primeiro? — Freya
indagou, e eu assenti, sentando-me na cadeira e posicionando meu
braço para ela.
Isis estava sentada em outra cadeira, apenas nos observando.
Eu seria uma cobaia para que ela conseguisse entender o que
significava tirar sangue, antes de realmente ser feito nela.
— É bem rápido e simples, Isis — falei, enquanto Freya tinha
as sobrancelhas arqueadas, e começava o processo. — Freya já está
todo paramentada, com a seringa e agulha estéreis... — minha irmã
pareceu entender e mostrou o material para Isis, que tinha os olhos
atentos a cada movimento e coisa nova que aparecia. — O que quer
dizer que ela está usando tudo o que é correto e limpo, e assim, vai
conseguir acertar uma veia minha, e tirar meu sangue.
— Precisa tirar o seu sangue para saber da gravidez também?
Sua pergunta era tão válida, que eu vi Freya me lançar um
olhar: se vira aí. Eu neguei rapidamente com a cabeça, enquanto
minha irmã procurava a veia, em seguida, fazia assepsia, e então,
colocou o garrote, para só então começar o processo.
— Na verdade, estou sendo apenas o exemplo, para você
saber que é um procedimento simples. — Ela abriu a boca, e
assentiu algumas vezes, como se compreendendo, e talvez se
lembrando do que eu disse mais cedo. — Pode fazer, Freya.
— Vai sentir uma picadinha... — minha irmã falou, e então
senti o olhar de Isis ainda mais arregalado, como se tentando ver, e
fiz um sinal com a cabeça para que ela se levantasse. Ela fez, e
rapidamente estava do lado, olhando diretamente para o braço que
retirava sangue. — E pronto... — Freya retirou o garrote, com o tubo
de coleta já cheio. — Aí, já temos sangue suficiente, e retiramos a
agulha, e colocamos um pequeno curativo. Segurando firme para
não ficar roxo, mas pode acontecer.
— Isso parece muito legal. — Sua admissão, me fez olhá-la, e
ver que os olhos brilhavam pela descoberta. — Vai fazer o mesmo
comigo, certo?
— Sim, só que daí o seu sangue vai para um outro tubo de
coleta específico para o teste, e um laboratório vai analisar e nos dar
a resposta se está grávida ou não.
Então, assim que Freya se afastou para descartar
corretamente o sangue que tinha tirado de mim, vi Isis correr para
se sentar novamente na cadeira, e posicionar o braço como o meu, e
um sorriso no seu rosto.
— Algumas pessoas passam mal, e às vezes é melhor não
olhar quando se tira o sangue, mas... Vou estar aqui do lado, caso
sua pressão baixe — avisei, e me levantei, colocando-me do lado
oposto de onde Freya agora faria o procedimento com ela.
E surpreendentemente, as suas veias não se esconderam,
como geralmente acontecia com quem tinha que tirar sangue, e ela
assistiu tudo, animada, e vendo o próprio sangue sair, um sorriso no
rosto, a cada palavra instruída por Freya, e notei sua decepção
quando tudo simplesmente acabou tão rápido quanto começou.
— Nunca pensei que agulhas poderiam ser assim — declarou,
e minha irmã sorriu para ela. Eu apenas fiquei ali, parado, sentindo
um orgulho em meu peito, que não conseguia explicar. — Demora
muito para o resultado? — perguntou de repente, e senti o clima
pesar, enquanto Freya se afastava com a ampola cheia do sangue
dela, e o identificando.
— Nada realmente demora para um Hansen — respondi, e ela
assentiu, tocando o curativo em seu braço esquerdo.
Foi quando eu realmente reparei nela, e nas roupas que
usava. Ela tinha um conjunto masculino total, e fiquei um tanto
curioso. Como eu não tinha reparado naquilo antes?
Talvez porque tínhamos almoçado, e ela logo voltou para o
quarto e ficou lá por todo o tempo, até que Freya reapareceu.
— Preferiu as roupas do armário às do closet? — indaguei,
enquanto ela se levantava, e parou, me encarando.
— Tem outras roupas? — perguntou, claramente confusa.
— Eu acho que deveria ter te mostrado tudo antes — falei,
mais para mim do que para ela. — Posso fazer isso agora?
— Claro — respondeu simplesmente. — E eu preciso saber,
onde posso colocar minha roupa suja — falou baixo, como se
envergonhada, e realmente não entendia.
— Pode colocar no cesto que fica no banheiro, sem problema.
— Até mesmo as que estão um pouco molhadas? — indagou,
e eu franzi o cenho, assentindo.
Por que as roupas dela estariam molhadas? Era algo que me
questionei internamente, mas resolvi não adentrar o assunto.
— Vou te mostrar toda a casa, e te explicar detalhadamente
sobre o seu quarto...
Ela assentiu e eu resolvi começar o tour. Pelo menos, uma
parte de mim, se sentindo miserável, por não a ter tratado de uma
maneira melhor. Ou que fosse o mínimo, para alguém que tinha
acabado de acordar no meio do nada, com desconhecidos ao redor.
E eu era um deles, certo?
Era apenas aquela colocação que me restava.
E também, dali a algumas horas, a possível confirmação, de
que talvez eu não o seria mais.
Eu poderia ser o pai do filho que ela carregava.
Ela poderia ser aquela que carregava o meu filho.
E nada entre nós dois, nunca mais, poderia ser classificado
como desconhecido. Entretanto, por que eu sentia que já era assim?
CAPÍTULO 22

ISIS
Ele me apresentou cada canto do lugar.
E de alguma forma, eu não conseguia negar a beleza do
deserto ao nosso redor. Com certeza, ele não tinha ideia, mas era
um dos pequenos sonhos que eu tinha, e de alguma forma, se
realizou. Ver o deserto tão de perto, e entender que era tão vasto
quanto na televisão.
— Bom, o seu quarto... Temos espaços específicos para cada
Hansen em nossos abrigos ou esconderijos, como queira chamar,
mas também, alguns quartos a mais, caso tragamos alguém... —
explicou, e eu assenti. — Acho que não mexeu nessa porta... —
falou e me mostrou a porta que eu só tinha notado naquele instante.
Parecia mais um quadro bonito do que uma porta, de fato. — Tem
um closet atrás dela...
Ele abriu espaço, e eu fui até ela, só então notando a
maçaneta e a virando. Foi quando percebi que realmente existia algo
lá dentro. Roupas por todos os lados, femininas. Sapatos também
expostos na parte do meio. E assim que abri uma das gavetas, vi as
lingeries novas ali colocadas, de todos os tamanhos e formatos
possíveis.
— Ah, isso faz sentido agora... — falei baixinho.
— O banheiro você já usou, certo?
Sua pergunta fez um arrepio percorrer toda minha espinha, e
apenas travei no lugar. Como ele sabia que eu tinha usado o
banheiro? Por que ele estava me perguntando aquilo?
— Eu vi que seus cabelos estavam molhados à tarde, e
reparei que está com roupas novas, além de que seu cheiro de
canela se foi, por tudo isso presumi que tomou banho. — Sua voz
soou baixa e calma, e eu apenas engoli em seco. Cheiro de canela?
O perfume que eu mesma fazia? — Foi só uma pergunta, por mais
que possa ser mais que uma pergunta para você.
— Sim, até comentei sobre a roupa molhada, não é? — tentei
agir naturalmente.
— Também — ele falou, e me encarou, seu olhar no meu. —
Bom, é isso — comentou de repente. — Já conhece toda a casa e...
— Só esperar, então?
Ele assentiu, e eu me vi apenas olhando para ele, novamente,
sem saber o que fazer. Parecia apenas ser o que fazíamos. Ficar um
olhando para o outro, sem saber o que viria a seguir.
Ouvi um miado, e meu olhar foi direto para a gatinha que
adentrava o quarto.
— Ela tem dormido com você, não é?
Ele indagou, enquanto Hathor vinha até mim, e passava por
minhas pernas, fazendo-me agachar e pegá-la no colo.
— Mimada...
— Chamei ela assim, mais cedo... — comentei, e fiz carinho
na bolinha de pelos que parecia ter qualquer outra preocupação,
menos a tensão daquele quarto. Ou talvez ela a sentisse, e viesse ao
socorro, para simplesmente eliminá-la. — Eu não sei como a
encontrou e tudo aconteceu, mas... fico feliz que também a
escolheu.
— É o primeiro animal que não tenho medo.
Sua admissão me pegou desprevenida. Nunca pensei que ele
teria algum medo, mas o olhei, e vi que tinha um sorriso no rosto,
como se lembrando de algo.
— Não imaginei que seria pai de pet, mas aqui estamos —
admitiu, ainda parecendo fazer questão de não me contar
absolutamente tudo sobre como a encontrou. — Deve se perguntar
como encontrei ela, e então, você...
— Investigando os Ramesses? — arrisquei, percebendo o
quanto ele parecia conseguir ler minhas expressões de dúvida.
— Sim e não. — Deu de ombros. — Eu tive uma noite ruim
assim que cheguei no Egito, resolvi dar uma volta, e acabei nessa
praça, onde alguém que cheirava a canela falava com algo... E
curioso, depois que ela saiu, fui ver o que era. E lá estava Terça. —
A gatinha miou em meu colo, como se confirmando a história, e eu
quase sorri. — Assim, resolvi que deveria cuidar dela também, e
deixei o primeiro recado.
— Sobre a minha bondade — falei, e ele assentiu. — Por que
isso?
— Porque é algo raro de se encontrar, genuinamente, sem
querer nada em troca... — assumiu. — E bom, resumindo, foi ao
acaso, mas aconteceu. E depois, acabei descobrindo quem você era,
e bom, era o meu trabalho ali. Eu tinha muito o que fazer sobre os
Ramesses.
— Duvido que tenha imaginado que se casaria com uma
deles. — minha boca foi mais rápida e me arrependi no segundo
seguinte, sentindo Hathor pular do meu colo e ir até ele.
— Há consequências em tudo nessa vida, ainda mais, para
pessoas como nós. — Agachou-se e fez um leve carinho na cabeça
da gata. — Pense como quiser, mas a verdade é que se não
estivesse aqui, estaria morta.
Eu sabia.
Eu sabia, pela maneira que meu pai reagiu, que aquele seria o
meu fim.
— Devo te agradecer por isso? — rebati, sentindo um
embrulho na garganta, que não tinha como identificar.
— Não me deve nada — respondeu, levantando-se. — A não
ser, esse casamento. — Olhou-me profundamente.
— Não sei o que quer dizer — admiti.
— Não precisa.
Batidas na porta o fizeram seguir até ela, e a abrir, enquanto
eu apenas o observava.
— Eu fiz o jantar, e... não deve demorar para termos o
resultado — Freya falou, e sorriu, olhando-me e depois para o
próprio irmão. — Que tal ir arrumando a mesa para eu ter uma
conversa com Isis, T?
Ele assentiu, e eu fiquei parada, vendo-a entrar no quarto e
fechar a porta atrás de si.
— Podemos ter um momento, Isis?
Eu engoli em seco, sem saber o que esperar, mas um fato era
que não sentia medo dela. E era exatamente isso que me deixava
em alerta.
CAPÍTULO 23

ISIS
— Deve estar se perguntando o porquê de eu estar aqui —
falou, e eu só permaneci de pé, olhando para os meus dedos, sem
saber o que responder. — A verdade é que me vejo em você.
Olhei-a de imediato, sem entender.
Ela também tinha buscado se entregar e engravidar para
conseguir fugir da própria máfia? Não conseguia vê-la, não da forma
como era com os irmãos, fazendo algo parecido.
— Não totalmente, mas eu era bem jovem quando engravidei
e o que veio depois me trouxe apenas dor — assumiu de repente, o
que não esperava.
— Ainda não sabemos do resultado, de verdade.
— Mas você sente, não? — indagou, o que me fez engolir em
seco. — Por mais que a gente não pense muito em ser mãe, quando
acontece, algo muda, e eu sei pela maneira como reagiu ao que Tyr
disse na noite anterior.
— Você... você ouviu tudo?
— Eu não vim defendê-lo, porque se ele foi capaz de dizer
algo assim, ele que tente consertar, mas eu sei que você não se
defendeu ali... você defendeu o seu filho.
— Eu não sei por que reagi assim — falei, mesmo que
temesse usar minhas palavras.
Contudo, o que eu tinha a perder?
Eu já estava no meio do nada, destinada a um casamento
com o irmão mais velho dela, e sem chances de outra escolha. Eu
não tinha absolutamente nada a perder com aquela conversa. Tudo
o que poderia ser usado contra mim, já tinha sido feito.
— Eu só fiz, e depois fiquei tentando entender o porquê doeu
tanto... ainda estou tentando — confessei. — Eu nunca pensei o que
seria depois, quando estivesse grávida, o que criaria com um filho...
Eu só tinha o plano de fugir, e... Só consigo sentir a culpa agora.
— Como eu já ouvi falar, “nasce uma mãe, nasce uma culpa”.
— Suas palavras eram tão certeiras, que me deixavam
completamente sem as minhas. — Quero que saiba que não está
sozinha, por mais que pareça. Você é uma Hansen agora,
independentemente desse casamento, é a mãe do meu sobrinho e
estou aqui para ser o que precisar...
— Freya...
— Eu não sou boa começando amizades, para ser honesta. —
Ela sorriu, e se levantou, vindo até mim. — Mas eu sei quando vale a
pena tentar, e eu sinto isso em você.
— Eu... eu... — suspirei fundo.
— Não precisa dizer nada, apenas... quando eu não estiver,
pode me ligar, mandar mensagem, e o que precisar. Se eu puder vir
na hora, virei assim que conseguir. — Pisquei algumas vezes,
totalmente incrédula com o carinho em sua voz.
— Eu não... — limpei a garganta, enquanto ela segurava
minhas mãos, como se tentando me dar apoio. E de fato, duvidava
que não teria desabado se não fosse pelo toque. — Eu nunca tive
um celular. — Fui honesta.
— E Tyr ainda não te deu um? — rebateu, e sua expressão
mudou por completo, como se incrédula.
— Ele não tem que...
— Ah, mas ele tem sim! — ela me cortou, claramente brava, e
eu não pude evitar o sorriso que apareceu em meu rosto. Eu só
conseguia pensar que Freya me recordava de Maia, que merecia ter
alguém assim na sua vida também. — E eu pensei que não tinha
como ficar ainda mais bonita...
Senti meu rosto queimar, e ela sorriu abertamente.
— Vou ter uma conversinha com meu irmão, mas antes...
Quer ver o meu bebê e meu marido? — indagou, e eu assenti,
deixando-me levar por ela.
Ela me puxou consigo, sentando-se na cama, e me pedindo
para fazer o mesmo. Então, tirou o celular do bolso da calça e
rapidamente o colocou na minha mão.
Olhei para a foto, e meu coração se encheu dos sorrisos entre
eles, que pareciam ultrapassar aquela tela.
— Henrique tem descendência coreana e é brasileiro, e nosso
deusinho saiu a cara dele... — comentou, o que eu tinha notado, e
era incrível como o sorriso do filho dela, se parecia com o que tinha
no seu rosto naquele momento.
Seria assim?
O meu filho teria um sorriso como o meu?
— Aliás, eu não pedi essa conversa à toa... — falou, e então
abriu algo na tela, que eu não entendi de fato, mas parecia com um
documento físico, só que ali, na tela do celular. — Recebi o resultado
do teste e queria que você fosse a primeira a ter acesso.
— Tão rápido...
— Eu juro que não li, e se descer vai conseguir ver o
resultado. — Olhei-a confusa, enquanto segurava o celular, sem
entender de fato. — Eu posso descer o documento para você, se
quiser.
— Igual se vira uma página?
— Isso, exatamente — falou animada. — Posso virar a página
no celular e você consegue ler.
— Por favor.
Ela então passou o dedo na tela, e vi que aumentou o
tamanho das letras. Não sabia como o tinha feito, mas fiquei
totalmente embasbacada com sua facilidade. Sabia que eu era a
pessoa atrasada com aquilo, mas nunca parava de me surpreender o
quanto parecia tão fácil para outras.
— Eu posso sair, se...
— Está tudo bem, eu...
Encarei a tela, e então comecei a ler. No segundo que meus
olhos leram “positivo”, eu mal sabia como voltava a respirar.
— Então?
A pergunta de Freya me fez entregar o celular a ela, e a
encarar.
— Não sou muito boa lendo, pode... pode me dar certeza do
que li?
Ela assentiu, e então rapidamente pareceu ler o que eu tinha
demorado longos minutos.
— Positivo, você está grávida, Isis! — Soltei o ar com força, e
fechei os olhos. — Não sei se alguém lhe disse isso, e se gostaria de
ouvir, mas... existe realmente uma vidinha dentro de você.
Senti meus olhos marejarem, e respirei fundo.
— Eu posso esperar que fale com Tyr, se quiser...
— Eu posso mostrar isso para ele? — indaguei, e ela assentiu
de imediato. — Depois do jantar?
— Uma mulher que sabe colocar um irmão meu no seu devido
lugar... era exatamente o que eu estava esperando. — Ela me deu
um sorriso sincero, e se levantou, fazendo um gesto para que a
acompanhasse. — Quando quiser, basta me pedir, que eu lhe dou o
celular para mostrar a ele.
— Obrigada, Freya... — falei, e ela sorriu. — Por tudo, de
verdade.
— Obrigada por me dar esse voto de confiança, Isis.
Então me levantei, e a segui para fora do quarto. No meu
peito, a sensação de alívio de que eu não tinha me enganado e que
era uma realidade. Mas percebi que o meu real medo era que na
verdade, tudo não passasse de uma mentira, e a vida que eu
imaginei estar crescendo, fosse absolutamente nada. Contudo, era
verdade. De fato, como diria Freya, tinha uma vidinha ali, dentro de
mim.
CAPÍTULO 24

TYR
— Vidar...
— Eu não tenho nada de novo, irmão.
— Ou Odin não está te deixando falar?
— Sabe muito bem que não tenho como te passar nada além
do que eu já sei.
— Ok, eu só... Só fique de olho na amiga de Isis, por favor.
— Pode deixar — falou, e ouvi seu suspirar profundo.
— Qual o problema, V?
— Estou preocupado com você.
— Não fique, eu só estou deixando as coisas acontecerem.
— O que não é nada típico seu, Tyr.
Suspirei fundo e encarei o chão.
— Espero ser melhor do que ele, e honrar quem merece, só
isso — confessei, e sabia que ele entendia. De todos nós, ele era
quem mais o fazia. — Te ligo amanhã, certo?
— Que os deuses te deem sabedoria, irmão.
— E te deem força, V.
Desfiz a ligação, e fiquei encarando meu celular por um
tempo. Eu estava no mais profundo escuro, enquanto encarava toda
a situação em que nos encontrávamos. O fato era que Odin me
deixou totalmente no escuro e me proibiu de sair do abrigo. A partir
do momento que ele não me desse permissão, eu ficaria ali.
Contudo, não era o que realmente se passava por minha
mente. Ela estava nublada de várias formas, fazendo-me pensar
sobre o resultado do teste de gravidez, do que eu tinha dito a Isis e
achava totalmente imperdoável, e de como tinha levado aquela
situação toda ao extremo.
Sentia-me fora de mim mesmo.
— A comida vai esfriar se demorarmos mais.
A voz de Freya me tirou do torpor, e vi-a segurando a mão de
Isis, e a levando consigo para a sala de jantar. Olhei-as dali, e só
consegui agradecer internamente por ter irmãos como os meus. Eles
eram o real significado de família. Por mais que cada um
demonstrasse do seu jeito, sempre pareciam encontrar o jeito certo.
— Obrigado por cozinhar para gente, F.
Falei, assim que me aproximei, e puxei a cadeira primeiro para
ela, que me lançou um olhar desconfiado, mas aceitou, sentando-se
nela. Dei um leve olhar para Isis, que pareceu entender o porquê de
eu ter feito aquilo no almoço.
— Forçando cavalheirismo comigo, irmão?
— Você sabe que sou o mais cavalheiro de todos... —
provoquei, e então puxei a cadeira para Isis, que fez exatamente o
que minha irmã fez, e senti o olhar dela em nós dois. — É um gesto
educado de um homem para uma mulher... — sussurrei para Isis,
que assentiu, como se compreendendo, de fato.
— Quando morávamos todos juntos, a realidade era que só a
cadeira de Odin não foi quebrada, de resto, era uma guerra para ver,
quem dos outros seis conseguia sentar-se mais perto do prato
principal.
Eu ri da lembrança de Freya, enquanto me sentava do outro
lado da mesa, e parecia que o tempo não tinha passado.
— Eu pensei que fossem oito — Isis falou, olhando entre mim
e Freya, mas claramente, preferindo encarar minha irmã.
Então o elefante se alojou na mesa, e eu quase ri da forma
como Isis parecia sem graça.
— Sim, como Loki contou no dia anterior... — Freya me lançou
um olhar, como se pedindo socorro. — Só não sou boa contando
histórias complexas como as de Hella.
— Nossa irmã que estava morta, mas nunca morreu —
esclareci, e o olhar de Isis parou em mim. — Gostaria de ouvir?
— Parece uma boa história.
— Bom, a verdadeira história só Hella sabe, talvez, Odin seja
o mais próximo a ter as partes detalhadas, mas o resto de nós, tem
o básico, que... — lancei um olhar cansado para Freya. — Vou servir
todos nós, então começa, T!
— Como você mandou...
Eu me vi começando a contar sobre a história de Hella
Hansen, que era engraçado o fato de uma pessoa da máfia, sentada
à mesa, nunca ter ouvido falar e não se surpreender ao saber que
estava viva. Era realmente, tudo completamente diferente, quando
se tratava de Isis. Até mesmo contar uma história familiar e tão
pessoal, não parecia errado.
Por quê?
Era a pergunta que se passava por minha mente, enquanto eu
falava, e ela acompanhava cada detalhe, como se imaginando em
sua mente. Por um segundo, só desejava que fosse apenas um
jantar, do cotidiano, e que nós dois não estivéssemos presos um ao
outro, por algo que ela escolheu, e por aquilo, que eu simplesmente
condenei.
Poderia me acostumar, em tê-la na minha mesa, sendo uma
parte – e foi o que mais me assustou, ao passo que narrava toda a
história.
Entre a história e o jantar, o tempo passou como se voasse.
Por mais que tudo devesse ser estranho, não o era, enquanto eu a
via tão leve, claramente, se sentindo confiante com Freya. Eu teria
que ser um irmão ainda melhor para ela depois daquilo, tinha
certeza.
— Bom, eu amei nosso jantar e a historinha Hansen da noite,
mas... Eu preciso ligar para o meu marido e filho, e matar a saudade
um pouco — Freya falou, e eu assenti, vendo-a se levantar.
Ela então parou ao lado de Isis, e sussurrou algo para ela,
que fez o mesmo, e de repente, meu celular vibrou na mesa.
— Sério? — Isis indagou confusa, e ela assentiu. — Obrigada,
Freya.
— T... — olhei-a sem entender, enquanto eu pegava o celular.
— Boa noite, irmão.
Ela se afastou, nos deixando a sós, e eu vi a maneira como
Isis pareceu nervosa. De repente, era como se toda a leveza tivesse
se dissipado.
— Saiu o resultado e Freya te enviou — falou de repente, e eu
fechei os olhos, sabendo do que se tratava. — Não sei como
funciona, mas eu já vi e...
— Positivo, não é?
Ela franziu o cenho, assentindo.
— Não precisa ver para ter certeza?
— No momento que me deu aquele tapa na minha cara
ontem, eu tive certeza de que não precisava de qualquer outra
confirmação.
— Mas agora tem — assumiu, e vi-a suspirar fundo. — Agora
o quê? Vem o casamento?
— Preciso ver como as coisas estão com os Ramesses, mas
sim, vamos nos casar o quanto antes.
— Ok.
Não que eu tivesse imaginado como seria. Na realidade, a
hipótese nunca passou por minha cabeça. Contudo, eu sabia que
estávamos bem longe do rumo natural das coisas, até mesmo, para
casamentos arranjados na máfia.
— Eu aguardo as instruções — falou, tão mecanicamente, que
me doeu, vê-la daquela forma. Doeu saber que ela me via como seu
carcereiro. E claramente, eu o era.
— Você pode escolher o que quiser do casamento, do enxoval
e...
— Não ligo para nada disso — respondeu, e seu olhar parou
no meu. — Estou acostumada a não poder ter escolha, e não estou
querendo ser a vítima, só não... Só que eu sei que tenho agora, pelo
menos, de dizer sim ou não para isso, e prefiro, não me envolver.
— Eu entendo, Isis.
— E sobre ontem... — olhei-a, e sabia que falava das minhas
palavras. — Nem eu estava preparada para ser mãe, mesmo que
planejando essa gravidez... Não te culpo por se sentir dessa forma,
Tyr.
— Mesmo assim, não é justificável, Isis.
— Mas explica... — deu de ombros. — E é o bastante para
mim, para não levar qualquer mágoa sobre isso.
Ela deu um leve aceno com a cabeça, e simplesmente saiu da
sala, me deixando sentado, e encarando o celular, que sequer fiz
questão de abrir o resultado.
Eu apenas adiei aquilo.
Eu apenas queria o papel para me convencer de que teria
uma volta.
Não existia.
E, de fato, eu não sabia, se realmente, a daria.
Eu seria pai.
Ou melhor, eu já era um.
E eu nunca senti tanto medo em toda minha vida.
CAPÍTULO 25

ISIS
Eu não conseguia dormir.
Fiquei girando na cama, procurando alguma posição favorável.
Contudo, nada parecia bom o bastante. Nem mesmo aquela cama
enorme e mais confortável que já estive em toda minha vida. Nem o
corpinho de Hathor perto da minha barriga, como se pudesse cuidar
de mim, e da vidinha que crescia ali.
Vidinha...
Nunca imaginei que teria um apelido para o que crescia
dentro de mim.
Levantei-me, e resolvi caminhar para fora do quarto, talvez
olhar o jardim de inverno, que deveria ser ainda mais belo à noite –
ou melhor, na madrugada. Caminhei para o corredor, e segui pelo
mesmo lugar que o tour de Tyr me indicou. Eu era boa de memória
e agradecia ao meu cérebro por não me destinar aquela limitação.
No momento que cheguei ao jardim, sorri sozinha, ao ver
como tudo era iluminado, mesmo que pouco, e as flores pareciam
ainda mais vivas. Talvez fosse o fato de o céu estar totalmente
estrelado bem acima de nós, que deixava tudo ainda mais perfeito.
Era diferente do céu que eu via na cidade, e me indagava, de
como seria o céu, do lugar em que Tyr vinha. Seria bonito? Seria
igual? Seria tão estrelado assim?
— Sem sono?
Dei um pulo no lugar, e sabia que deveria começar a me
acostumar com o fato de que não ouviria um grito pelo meu nome,
antes de alguém me encontrar.
— Vocês são realmente silenciosos — comentei, me virei para
ele, e percebi que usava uma túnica clara, assim como suas calças, e
nada nos pés.
— Fomos treinados para ser, e acaba sendo natural. — Deu de
ombros. — Mas tem como aprender a identificar, mesmo que
mínimo, alguém que se aproxima...
— Seria bom aprender — admiti, e só então notei que minha
mão estava novamente sobre a barriga.
— Mas não me respondeu, sem sono?
— É, parece que nada é bom...
— O que fazia na sua casa, quando tinha insônia? — indagou,
e eu dei de ombros.
— Ficava acordada, e acabava dormindo de algum jeito pela
manhã, e como não tinha nada a fazer em muitos dos dias, eu
dormia até que me levassem comida — respondi, sem mais querer
esconder, mesmo que devesse, algo dele.
O que eu ganharia protegendo a minha realidade enquanto
uma Ramesses? Apenas a coleção de memórias ruins que guardava.
— Televisão? Celular? Tablet?
— Eu conseguia ver tv às vezes, quando meu irmão mais
velho não estava, Maia me chamava até o quarto deles, e a gente
assistia alguma coisa, mas... Mas paramos depois que ela quase... —
soltei o ar com força. — Quase ficou sem os dentes por isso.
— Ela te protegeu e te ajudou, não?
— A única — respondi. —— Ela pertencia ao Cartel de Ottis.
— Soltei o ar com força. — Nunca saí de casa, mas por ela, eu sei
que os brasileiros são pessoas determinadas e muito fortes. E boas.
— Suspirei fundo, pensando nela.
— Vidar está acompanhando tudo, e não vai deixar que nada
aconteça com ela, fique tranquila.
— Eu sei que pode estar além do alcance de vocês, mas... Se
um dia, eu puder pedir algo, é que... que liberte ela e os filhos de lá,
Tyr.
Vi a expressão dele mudar, e me arrependi no segundo em
que deixei as palavras saírem.
— Desculpe, eu... eu não tinha que ter...
— Só estou surpreso — admitiu, cortando-me. — Por estar
realmente me pedindo algo.
— Sei que não me deve nada, mas... — soltei o ar com força.
— Eu que devo a ela, e não tenho poder para tirá-la de lá.
— Como uma Hansen, você terá. — Olhei-o sem entender. —
Vamos tirá-la de lá, assim que possível.
Por um segundo, apenas agarrei-me às suas palavras. Porque,
de fato, queria acreditar em cada uma delas.
— Mas sobre não ter acesso à tecnologia... — encarei-o
novamente. — Tenho algo para você, já volto.
Fiquei parada ali, sem entender completamente. E parecia
uma constante em todos aqueles dias – raramente compreendia o
que estava acontecendo.
Logo ele reapareceu, com uma caixa em mãos e o olhei sem
entender.
— É um celular, o mais avançado que temos e...
— É mesmo? — indaguei confusa. — Freya te falou sobre
isso?
— Na verdade, não. — Ele que parecia confuso agora. — Mas
eu notei que não tinha um, e é algo importante. Para você, para
quem quiser falar, e claro, quando eu não estiver, vou poder saber
sobre você... vocês.
Ele não estaria?
Então, ele planejava não estar ali?
Deixei minhas dúvidas de lado, e apenas aceitei a caixa, sem
saber o que fazer.
— Pode me ajudar a... a aprender o básico? — Sentia a
vergonha subir até minhas orelhas, mas estava mais com medo de
simplesmente quebrar, fazendo algo errado.
— Claro!
E de repente, vi algo em seu semblante, que eu não
encontrava desde a nossa noite – animação.
— Que tal irmos até a sala, e te mostro o passo a passo?
— Seria ótimo.
Ele se virou, seguiu pelo corredor, e antes que eu fizesse o
mesmo, vi uma estrela cadente, simplesmente passando pelo céu, e
fechei meus olhos, fazendo um pedido.
E esperava, que em algum momento, ele fosse realizado.
CAPÍTULO 26

TYR
Ela estava tão animada, que a madrugada simplesmente se
tornou dia. E em algum momento, entre eu lhe mostrar sobre como
poderia ler livros no celular, e comprar um kindle para facilitar sua
leitura, ela acabou adormecendo. Felizmente, ela estava sentada no
sofá ao meu lado, acabou se encostando contra as almofadas e se
entregando ao cansaço, sem sequer perceber.
Fiquei um tempo ali, encarando-a, enquanto as luzes do sol
adentravam a única janela sem uma cortina fechada, e não
conseguia desviar o olhar. Um sentimento incômodo, que me
prendia, ao mesmo tempo que, deveria me repelir.
Sabia muito bem o que acontecia quando deixava qualquer
um que não fossem meus irmãos entrar. Parecia, até mesmo, uma
maldição de quem levava o nome do deus da guerra. Um carma que
eu não queria que fosse perpetuado. Contudo, não conseguia
somente não me preocupar com ela deitada ali, porque por mais
confortável que o sofá fosse, não era feito para que alguém
dormisse.
Então peguei o seu celular caído ao lado do corpo, e coloquei-
o no meu bolso, enquanto a ajeitava, com todo cuidado em meu
colo, e ainda mais paciência, para não a acordar. Ela se remexeu um
pouco, mas não acordou, a sua cabeça contra o meu peito, e um
suspiro profundo em seu sono.
Caminhei com ela até o quarto, encontrando o olhar surpreso
de Freya no final do corredor. Felizmente, a porta do seu quarto
estava aberta, e Terça deitada sobre sua cama, como se a
esperando por todo aquele tempo. Ela, claramente, tinha escolhido o
seu favorito para sempre acabar dormindo.
Deitei Isis com cuidado na cama, e antes que eu puxasse um
edredom sobre ela, sua mão o fez, como se soubesse que estava
finalmente na sua cama. Parei e a olhei, totalmente adormecida, e a
maneira como Terça foi até ela, logo ao lado da barriga, e se enrolou
ali, pronta para dormir também. Tirei o celular dela do meu bolso e
deixei-o na mesa de cabeceira.
— Bom descanso.
Falei, e saí com cuidado do quarto, fechando a porta
extremamente devagar.
— Isso que eu diria sobre um casamento sem qualquer
sentimento...
A voz de Freya me fez levar um susto como os que Isis vivia
tendo. Olhei-a com raiva, mordendo minha própria mão para não
gritar. Freya riu baixinho, enquanto eu a ignorava, e seguia para o
meu quarto, precisando dormir um pouco, e não pensar sobre o que
tinha se passado.
— Vai mesmo me ignorar, T? — perguntou, no momento que
fui fechar a porta na sua cara.
— Eu não dormi — rebati, fingindo-me de inocente.
— Sua sorte é que fui eu, e não Loki — provocou. — Ele
nunca deixaria passar.
— Isso é uma ameaça de contar a ele? — indaguei, olhando-a
pela pequena abertura que deixei na porta.
— Só estou dizendo...
Ela saiu, e eu sabia que com certeza, aquilo chegaria nos
ouvidos do nosso irmão. Se não chegasse a conhecimento de
absolutamente todos. Suspirei fundo e fechei a porta, rumando até a
minha cama, e me jogando nela.
Fechei os olhos por alguns instantes, pensando que não
conseguiria dormir, mas na realidade, eu me sentia melhor do que
qualquer outro dia, desde que descobri o que realmente estava
acontecendo. Era como perceber que era possível ter uma realidade
calma e simples com a mulher que me casaria.
Ao mesmo tempo que eu sabia que não podia deixar que
passasse daquilo. Um alerta se acendendo em minha mente, como
se eu precisasse dele, sempre. Virei-me de lado, e fechei os olhos,
puxando um edredom pelo meu corpo, e pensando no que vinha a
seguir.
Era estranho para quem sempre sabia mais do que todos, não
ter a mínima ideia do que me aguardava. Contudo, eu entendia, que
por mais que fosse melhor evitar, Isis estaria no futuro. Ela e o
nosso filho. E eu tinha que aprender a lidar com aquilo, e tentar
fazer o melhor para ambos.

ISIS
Eu acordei me sentindo um pouco perdida. Talvez por ter
mudado meu horário, mas eu tinha um sorriso no meu rosto, que
raramente acontecia logo após despertar. No entanto, eu tinha
motivos para ele.
Sabia que eu não tinha vindo para o quarto, então, restava-
me apenas a opção de que Tyr se preocupou em me deixar ali.
Fosse por agora ter certeza de que esperava um filho dele, e
estivesse tentando me proteger por isso, fosse porque simplesmente
quis que eu dormisse na cama.
O fato era que eu via o pequeno cuidado dele, nos detalhes
em que sequer ele notava. A maneira como tinha uma paciência e
calma potencialmente infinitas, e me mostrou com todo cuidado
cada passo a seguir para usar o celular. Além de responder cada
dúvida que eu tinha, e me mostrar sempre mais do que eu pedia.
Eu estava feliz por me sentir bem perto dele.
Uma aura diferente da que tinha se formado desde que nos
reencontramos. Levei a mão à barriga, e me sentindo grata, pela
chance de viver algo diferente, mesmo que fosse um casamento
arranjado. Não era o fim do mundo, se eu o fizesse com uma pessoa
que me respeitava.
E ele o fazia.
Pelo menos, era o que tinha me mostrado.
Hathor me seguiu até o banheiro, enquanto eu escovava os
dentes, e calculava em minha cabeça, como tomaria banho. Olhei
novamente para pontos que poderiam ter câmeras, e pensei que
deveria indagar a ele, e a Freya, se realmente, não existia aquela
possibilidade.
Não que eu acreditasse, mas seria uma resposta para
continuar construindo a pilha de confiança que eu bravamente lutava
para manter. Para quem sempre teve de desconfiar da própria
sombra, era algo inédito. Joguei uma água no rosto, e Hathor subiu
na pia, como se me analisando.
— Bom dia, mimada.
Ela miou, e eu fiz um leve carinho em sua cabeça.
— Já deve ser boa tarde, com certeza.
Voltei para o quarto, e antes de sair, percebi que o celular
estava sobre a mesa de cabeceira. Peguei-o, sabendo que era algo
meu, que eu poderia usar para me comunicar, distrair ou
simplesmente, carregar para onde quisesse.
Saí do quarto, senti meu peito mais leve, e uma força para
que as coisas dessem certo, da maneira que fossem. Algo que eu
não sentia há muito tempo – esperança. De que as coisas seriam
melhores. De que elas nunca mais seriam como antes.
No momento que cheguei à sala de estar, encontrei Freya
sentada no sofá, e meu olhar buscou por Tyr em qualquer canto,
mas de repente, tudo parecia um pouco mais vazio.
— Viraram a noite, não?
— Ele... ele me deu um celular — contei a ela, que arregalou
os olhos, claramente surpresa e parecia feliz por mim.
— Ponto para o deus da guerra — pareceu brincar, e eu não
pude evitar um sorriso. Era verdade, que eu nunca tinha
experimentado algo tão profundo com alguém, além da noite com
ele, e agora, a nossa madrugada juntos. Era como se eu estivesse
me descobrindo também. — Alguém parece mais tranquila sobre
ele? — assumiu, e eu assenti.
— Ele?
— Teve que sair há algumas horas, provavelmente, vai aos
Ramesses — comentou, e eu senti algo dentro de mim murchar. —
Mas deve ter te mandado uma mensagem ou vai ligar mais tarde,
fique tranquila.
Foi quando encarei o celular, e me vi assentindo para o nada.
Eu tinha que ter paciência, assim como ele tinha feito comigo.
Olhei para o celular, e entrei em uma das redes sociais, que tinham
vídeos, e comecei a explorar um pouco.
— Eu acho que deveria comer e depois mexer no celular.
Levantei o olhar para Freya, que me deu um sorriso.
— Só por garantia, por estar comendo por dois... — piscou
um olho, e eu assenti, seguindo em direção à cozinha, e ela me
chamou antes que me afastasse. — Deixei tudo pronto para você, na
mesa da sala de jantar.
— Obrigada.
— Eu sou a melhor cunhada, só não deixe Hella saber disso.
— provocou, e eu sorri, vendo que se esforçava ao máximo para me
deixar confortável. — Vou te fazer companhia, e quem sabe, te
mostro algumas das pessoas que eu mais gosto de assistir vídeos,
músicas e tudo mais?
— Eu adoraria.
— Então...
Ela se levantou, foi ao meu lado até a mesa, e eu me vi
questionando internamente: onde ele estaria? E por um segundo,
percebi que gostaria de estar vivendo um dia assim, normal, ao lado
dele.
Mesmo que nada entre nós pudesse ser definido de tal
maneira.
CAPÍTULO 27

TYR
— Ele quer um dote.
Olhei para Odin, como se pudesse arrancar a cabeça da
próxima pessoa que passasse pela minha frente.
— Não é o fim do mundo, T — argumentou. — E sei que ela
deve valer um, já que engravidou a mulher.
— Não é sobre o que ela vale — rebati. — É sobre deixar que
eles ganhem algo com uma escolha que foi dela, e que eles teriam a
assassinado se eu não tivesse chegado.
— Já podemos começar a agradecer você por isso?
A voz que adentrou o ambiente pertencia a Hella, minha irmã
mais velha, que Vidar caminhava ao lado.
— Não é por isso, H.
— Não pode entrar naquele salão e novamente, agir por
impulso.
— E não posso aceitar que eles queiram que eu pague por ela
— rebati. — Ela não é a porra de uma mercadoria.
— Isso, todos nós sabemos, mas não é sobre agirmos pelo
correto, mas sim, agirmos para evitar ainda mais enrolação da parte
deles.
— Não vou pagar um centavo a eles. — Dei minha palavra
final, e vi o olhar que ela trocou com Vidar, de forma breve, mas que
sabia que respingaria em mim. — Nos mandou aqui para acabar com
as atrocidades que eles fazem, e não para concordar com a pior
delas.
— Hella não te mandou engravidar uma herdeira dos
Ramesses. — Odin se intrometeu, e eu queria apenas voltar para
casa. E o estranho, era que em minha mente, eu só conseguia
pensar sobre casa ser exatamente no meio do deserto, não muito
longe dali. — E olhe só com o que estamos tendo que lidar agora...
— Falam como se eu tivesse planejado isso...
— E não foi? — ele rebateu. — Independentemente do golpe
da barriga que sofreu, não deveria sequer ter dado a chance de que
isso acontecesse, sabendo que ela era uma Ramesses, e ainda foi
pra cama com ela!
— Fácil falar, não é? — rebati Odin, que mudou sua expressão
que era impassível. — Ninguém nessa sala age somente pela razão,
e eu tenho que sorrir e acenar para um bando de assassinos
misóginos? Não mesmo.
— Tyr, isso pode dificultar o seu casamento.
— Que seja — rebati. — Não me importo que demore, se eu
puder desmembrar essa máfia um a um até que aconteça.
— Pelo menos conseguiu tirar dela alguma coisa sobre o que
acontece com os mulheres que nascem direto na máfia? — a
pergunta veio de Hella, e eu desviei o olhar.
Eu não tinha chegado àquelas vias de fato.
Como eu contaria a eles que passei o tempo que tive com
Isis, até o momento, ou ignorando o que tinha ao redor, ou tentando
ter um momento tranquilo com ela? A verdade era que eu estava
atrasado em usar as armas que tinha para conseguir continuar meu
trabalho. Porém, como eu poderia olhar para ela apenas como um
objeto a ser estudado, se ela era uma mulher que estava dando
tudo de si para, claramente, esquecer o que passou?
— Ok, então temos nada com você — ela falou, e eu apenas
me calei. Sabia que Vidar e ela estavam fazendo o trabalho também,
e eu estava tentando evitar usar Isis, ainda mais do que já o tinha
feito.
Levantei-me, e saí daquele quarto, indo para o lado de fora da
pensão e encarando o vazio. O que mais me atormentava era o
julgamento que parecia crescer por todos os lados, em quem eu
mais confiava. Como se eu pudesse ter controlado cada passo até
ali. O fato de eles não compreenderem que eu não o conseguiria,
deixava ainda mais claro que eles não tinham como me entender.
Era frustrante se sentir tão solitário, mesmo que cercado por
quem mais amava.
— Sempre optou pelo caminho mais fácil, T.
A voz veio de Vidar, que apenas parou e me encarou da porta
aberta do quarto.
— Na verdade, sempre fui pelo caminho mais inteligente —
ele assentiu, como se concordando. — Só que ainda não
entenderam que não é uma escolha apenas de trabalho, tem a
minha vida pessoal envolvida... Não é um filho de vocês que ela está
esperando, é meu.
Então Odin e Hella saíram do quarto, e me encararam.
— Não planejei nada disso, mas não vou deixar que os
Ramesses continuem a usando, mesmo agora que está prestes a se
livrar deles — falei, e encarei cada um naquele lugar. — Eu me nego
a compactuar com a porra de uma máfia que simplesmente faz o
mesmo que Ymir queria fazer com Hella e Freya.
Ouvi o suspirar profundo do meu irmão mais velho, que
parecia ser o único a tentar realmente entender a situação em que
eu me encontrava.
— Vamos ter que ir até eles, aguentar reuniões tediosas e
sem motivo, enquanto Hella e Vidar continuam a fazer o trabalho —
falou, e eu assenti. — Mas pode compartilhar conosco, quando
puder, o que já tem sobre Isis. Porque tenho certeza de que ficou
tempo suficiente com ela para perceber o que os Ramesses
realmente fazem, e por isso, está a defendendo dessa forma.
Eu não a estava defendendo, mas acabei guardando as
palavras para mim.
— Eu posso pedir, quando ela se sentir confortável, para falar
— admiti. — Mas não vou forçá-la, se não for realmente um caso
extremo.
— Devo lembrar que tem mais mulheres sofrendo nas mãos
deles? Muitas, na realidade? — Hella rebateu, e a encarei. — Isis
está sob nossa proteção, mas e o restante, simplesmente não
importa, Tyr?
O pior que se eu realmente fosse honesto, a resposta era
simples: não. Contudo, eu sabia da preocupação dela, com a única
pessoa que a ajudou, e que vivia um inferno que ela tanto tentou se
livrar.
— Deixe-o, Hella.
Olhei surpreso para Odin, enquanto Hella trocou um olhar
silencioso com ele, que ninguém poderia desvendar. Sabia que ela
não estava satisfeita, assim como, saiu dali, sendo seguida por Vidar,
que nunca disfarçava o quanto nossa irmã poderia controlá-lo tão
facilmente. Porém, não era um problema meu para lidar.
— Obrigado, O.
— Não por isso — respondeu, veio até mim, e colocou uma
das mãos em meu ombro. — Sei como é, quando tudo o que
importa é uma pessoa, por mais que o nosso trabalho seja proteger
o nosso povo, e às vezes, outros povos. — Olhei-o, pensando em
corrigir, mas ele foi mais rápido. — Não vou dizer o que acho ou
deixo de achar da sua relação ou não relação com Isis, mas precisa
se esquecer disso, no segundo em que pisarmos no salão de Seti.
— Eu vou ser profissional, irmão.
Era uma promessa.
— Ótimo. — Ele apertou novamente meu ombro. — Descanse
um pouco, que o nosso horário com ele é apenas à noite — falou, e
eu iria negar, mas ele pareceu me ler perfeitamente. — É uma
ordem, como seu irmão.
Assenti, e ele se afastou, enquanto eu voltava para o quarto,
e tentava compreender minha própria mente. Tantos porquês
girando nela, e eu me vi pegando o celular e quase discando o
número de Isis, talvez para simplesmente ouvir sua voz, e tentar ter
alguma reposta. Contudo, poderia ser pior. Então, eu quase fiz. E me
arrependi por não ter tido coragem de clicar em “ligar” e optado por
somente tentar não pensar sobre ela.
Eu já estava pensando mais do que realmente deveria.
E por um segundo, eu só queria o meu eu de volta, que se
perdeu, a partir da noite em que a encontrei pela primeira vez.
CAPÍTULO 28

ISIS
Eu esperei uma ligação dele.
Eu esperei por uma mensagem.
Tinha chegado a cogitar perguntar a Freya, se existia algo de
errado com meu celular. Porém, me contive, quando ela mesma teve
que ir embora, e me mandava mensagens de horas em horas.
Na primeira semana que ele sumiu, considerei que deveria ter
encontrado sérios problemas com os Ramesses. E quando ele
reapareceu, com seu irmão Vidar, e nos apresentou oficialmente,
pensei que teria a oportunidade de perguntar se estava tudo bem.
Porém, eles tinham se trancado no quarto de Tyr, e saído minutos
depois que chegaram.
Outra semana se passou, e eu estava ansiosa para contar a
ele que a médica veio me ver, e que aparentemente estava tudo
bem. Porém, o seu olhar cansado e vago, me fez guardar a notícia
que ele não pediu, e não demorou para que ele voltasse a pegar
outro helicóptero do lado de fora da casa, e desaparecesse
novamente.
E não se passou outra semana, mas sim quinze dias da
próxima vez. E eu fiquei esperando como uma criança sonhadora,
que ele aparecesse, e pudesse lhe oferecer minha ajuda, mesmo
que não fosse o bastante. Porém, mal tive a chance de vê-lo. Ele
chegou, pegou algo em seu quarto, e voltou a simplesmente
desaparecer.
Os dias iam se arrastando a partir daquilo. E a cada um deles,
eu me sentia menos conectada com ele, e com o que achei que
estávamos construindo. No final das contas, era como se apenas eu
estivesse tentando colocar os blocos, e ele se negando a juntá-los.
Era tão frágil, que desmoronou, antes mesmo de realmente
tomar forma.
Olhei para ele, desaparecendo mais uma vez, após mais dias
de nenhuma interação verdadeira, e não pude evitar uma lágrima
que desceu por meu rosto. Por mais que a estivesse negando de
existir por todo aquele tempo.
Hathor miou e eu sorri fraco para ela, que subiu sobre minha
barriga, que começava a apontar, e fechei os olhos, tentando
disfarçar e esconder minha decepção. Não sabia explicar o tamanho
dela, mas era tão pertinente, que me deixava enjoada. A ponto que
tudo que conseguia pensar era em vomitar, em vez de encarar a
realidade de que Tyr Hansen era alguém que eu idealizei na minha
mente.
Meu erro.
Apenas meu.
De achar que alguém como ele, poderia querer ser além de
um desconhecido, de alguém como eu.
— Sinto muito, vidinha — falei para a minha barriga, tentando
não ficar triste, por mais que fosse inevitável. — Eu juro que estou
tentando ficar alegre.
Olhei para os cadernos espalhados sobre a escrivaninha que
se tornou minha maior aliada naqueles dias. Usava minha solidão
para ler e estudar sobre tudo o que eu não tive oportunidade.
Principalmente, tentando entender a história da mitologia nórdica, e
sobre a língua falada pelos Hansen.
Olhei para o caderninho que já deveria estar perto de acabar,
mas longe de finalizar minhas perguntas, e sem chance de qualquer
resposta. Eu o usava para testar e melhorar minha letra, escrevendo
palavras na minha língua e então, na língua antiga nórdica, que era
realmente difícil de entender. Mesmo com o dicionário que encontrei
na estante na sala de estar, eu ainda sofria em escrever o alfabeto.
Pelo menos, eu estava tentando.
E, de alguma forma, me apegava àquilo, para ter algum
conhecimento para o meu filho ou filha sobre o próprio pai, que
parecia não se lembrar, em nenhum daqueles momentos, que era.
Não o culpava por não ligar, mas seria mentira dizer que não
doía. Vê-lo não se importar com a gravidez, me machucava mais do
que poderia imaginar. Não sabia se por ser ele. Ou se por eu nunca
ter considerado o quão difícil seria, não ter um pai para o meu filho.
Eu queria que ele tivesse.
Eu queria que ele pudesse ter o que eu não tive.
Porém, a cada dia que se passava, eu entendia que eu teria
que ser o suficiente.
E o pior, era que por mais dolorido que fosse, eu não podia
culpar Tyr. Eu busquei aquilo e o usei. E aquela era uma das
consequências que nunca considerei, mas bateu na porta, e me
deixava totalmente abalada.

TYR
— É pegar ou pegar, Seti — falei, cansado de ter a mesma
conversa, e girar em círculos com o homem à minha frente. — Ou
aceita dessa vez, ou simplesmente vamos nos casar sem a presença
de qualquer um de vocês.
— Por que acha que algum de nós gostaria de estar nesse
casamento?
— Fui obrigado a convidá-los, não se sinta especial. — Senti o
olhar de Odin sobre mim, e apenas me mantive encarando o homem
sentado em seu trono, diante de nós. — Está nos fazendo perder
tempo, e sei que vai levar esse jogo, até conseguir algum dinheiro.
— Por que eu abriria mão do que me pertence sem nada em
troca, Tyr?
— Porque estou ordenando.
A voz de Odin fez o homem mudar a expressão e ele o
encarou como se não esperando. Meu irmão tinha se mantido
calado, em todos os jantares e almoços que tínhamos perdido
tempo, tentando negociar da melhor maneira possível sobre o
casamento. Para que fosse o mais breve possível, e assim, eu
pudesse tirar Isis do país, sem poder sofrer qualquer retaliação.
— Não me faça ter que ordenar, novamente.
— O que está tentando insinuar, Odin?
— Senhor Hansen para você.
Olhei de relance, sem entender a mudança de postura de meu
irmão. Ele era um ótimo diplomata, só não me superava. Contudo,
era raro o momento em que simplesmente deixava o seu poder tão
claro. Ele não o usava daquela maneira, porque ninguém era imbecil
o suficiente para forçá-lo. Claramente, Seti Ramesses o era.
— Apenas pare de me fazer perder tempo — Odin continuou,
e eu sabia que ele tinha aceitado aquela enrolação toda, enquanto
Hella e Vidar investigavam ainda mais a fundo sobre o que os
Ramesses faziam. — Ou pode não restar pedra sobre pedra, ou
melhor, barra de ouro sobre barra de ouro...
Vi o homem à nossa frente parecer sem fala, e ligar os pontos
de que sabíamos mais do que ele imaginava, e logo seu conselheiro
se aproximou, sussurrando algo em seu ouvido. A cena era
realmente cansativa. Então, meu olhar buscou por Maia, que como
sempre, nunca esteve em nenhum lugar à vista. Sabia que Vidar a
monitorava, de longe, mas ainda não entendia como eles
conseguiam esconder tão bem as próprias mulheres.
Sentia o olhar de Akhmu sobre mim, que se tivesse poder,
com certeza, já teria me matado. Eu só lhe lançava um sorrisinho de
canto, vendo-o sofrer simplesmente para falar, pelo estrago que fiz
em seu rosto. E faria novamente, com qualquer um deles.
— Uma condição, O... senhor Hansen — o homem falou, e me
virei para ele, vendo-o encarar meu irmão. — Um dos meus filhos
precisa verificar se Isis está bem, antes do casamento acontecer.
— Podemos marcar. — Olhei incrédulo para Odin, mas confiei
em sua decisão. — No nosso tempo agora, Seti.
— Pensei em ele ir junto e...
— Não está lidando com amadores — foi minha vez de
rebater. Era tão óbvio o que ele gostaria de fazer, que se tornava
patético. — Vou perguntar a Isis, quando fica bom para ela, e então
te passaremos a data e o lugar.
— Por que a escondem tanto, Hansen?
— Porque protegemos quem é da família — Odin falou, e o
homem o encarou incrédulo. — Não que entenda o que isso
significa.
Soltei o ar com força, só querendo sair dali, e ir direto para a
ilha de Loki, resolver o que estava planejando há dias, e até o
momento, sequer tive tempo para respirar. Pelo jeito, aquele era o
último jantar perdido com os Ramesses, e agradeci internamente,
por Odin ter dado um fim àquele martírio que parecia um ciclo
vicioso.
Saímos de dentro da mansão, e Vidar já nos esperava no
carro. No momento que entramos, soltei o ar com força, sabia o que
tinha que fazer, e estava tendo que adiar a todo custo, para poder
resolver aquilo.
— Converse com Isis e marque para o quanto antes sobre
Rael — Odin ordenou, e eu apenas assenti.
Vidar estava em silêncio, que era típico dele, quando não
estávamos apenas nós dois. Contudo, era fácil saber que ele se
tornava ainda mais fechado quando estava com Hella ao seu redor. E
realmente, eu tinha mais que me preocupar do que o que existia na
relação nada saudável entre os dois.
Eu precisava ir até a pessoa certa, e encomendar o vestido de
noiva e enxoval do meu filho.
CAPÍTULO 29

ISIS
Completava dois meses.
Eu tinha me acostumado ao silêncio daquele lugar, enquanto
aprendia cada dia mais sobre as redes sociais, aplicativos,
videogames e até mesmo um tablet com vários livros. Tinha me
aprofundado como podia na mitologia nórdica, tentando entender
um pouco mais, e quem sabe, compreender como era a família
Hansen.
Recebia algumas ligações de Freya, em que ela me mostrava
o filho, e eu conseguia me sentir parte de algo. Diferente do que
realmente me ocorria quando pensava sobre Tyr. Se não fosse
Hathor, minha fiel companheira, eu não teria qualquer troca com
algo que um dia foi dele. E claro, ver a cada dia, o meu corpo
mudar.
Sentia as mudanças aos poucos. Os seios mais pesados. Meu
quadril mais largo. Minha pele totalmente diferente. Eu tive algumas
consultas com a médica trazida até a casa, mas fora isso, não tive
contato algum com o lado externo.
Apenas o via chegar novamente.
Só que ele vinha e desaparecia. A maneira como fui instruída
por Vidar a ficar no quarto, e apenas esperei lá, enquanto
transformavam o cômodo que costumava ser mais um quarto de
hóspedes. Sabia que alguém viria, e meu coração estava aflito.
Eu tinha pedido para não estar na escolha sobre o casamento
e todo o resto, mas ainda assim, me deixava totalmente assustada,
não ter a mínima ideia do que acontecia. Pensei, que depois da
madrugada que passamos juntos, com ele me ensinando sobre
como mexer em absolutamente tudo que eu tinha dúvidas no
celular, que talvez, uma amizade pudesse nascer.
Uma ideia tola, no entanto.
Não existia o meu desenvolvimento como o de Freya, de
oferecer algo assim. E ele claramente, não estava disposto a tentar.
Porque tudo o que tive dele depois daquela manhã, foram palavras
esporádicas e nada além de suas idas e vindas.
Foi quando eu fiquei perto do jardim de inverno, tentando
acompanhar a movimentação toda. E foi quando ouvi uma voz
feminina desconhecida, que eu não reconhecia a língua. Porém,
parecia muito com a língua que Tyr falava.
Seria alguém da máfia dele?
— Pedi para que trouxessem o melhor do melhor, e o que me
disse que precisaria...
Aproximei-me, e ouvi a voz dele, agora em egípcio.
— Bom, para começo, preciso falar com a noiva e...
— E ela chegou!
Minha voz soou mais rude do que deveria, e meus olhos
caíram para a mulher ruiva, em um vestido que parecia tirado de um
filme de princesa. Ela era simplesmente perfeita. E de relance, notei
o olhar de admiração de Tyr para com ela.
Ela me fez uma reverência, e eu senti o enjoo forte, como um
soco no estômago. Por que ela me reverenciaria? Por que ela faria
algo assim? Eu não era mais nada além da mulher que carregava o
filho do homem ao lado dela. Do lado dela, não do meu.
Sequer sabia definir o sentimento que me tomou. Raiva?
Mágoa? Dor? No entanto, apenas deixei-o sair em forma de uma
risada sem qualquer vontade.
— Alguém já disse o quão ridículo é esse tipo de situação?
Foi tudo o que consegui questionar.
Olhando diretamente para Tyr, e tentando ver se ele
enxergava o óbvio – o quão ridículo era tudo aquilo. Ele
simplesmente reaparecer e ficar mais de dez minutos, com uma
mulher que nem me avisou, e ainda sendo da própria máfia.
Ele não teve tempo para aparecer e acompanhar uma
consulta com a médica. Ele não teve tempo para simplesmente fazer
uma ligação. Contudo, ele teve tempo para aparecer com ela, bem
ali, e não entender o que estava me remoendo.
— Isis...
— Se fosse trazer uma criada, deveria ter me avisado, para
não perder o meu tempo e o seu dinheiro com isso — rebati, sem
saber a quem mais eu queria ferir. Se era ele. Se era ela. A realidade
era que eu não me importava.
Era o ponto: eu não queria me importar tanto.
— Isis...
A voz de Tyr soou mais alta do que eu conhecia, no tom que
somente me entregou que ele estava na defesa dela. A qual, levou
uma das mãos ao braço dele e segurou-o, claramente o acalmando,
quando ela negou com a cabeça e sorriu.
E ali, eu me vi lembrando de suas palavras, meses atrás, de
quando falou sobre já ter se relacionado com várias pessoas. E se
ela fosse uma delas? E se ela ainda o fizesse? Vendo-os tão íntimos,
só conseguia pensar o quanto ele poderia ser como qualquer
homem que eu conheci.
E me doeu profundamente, vê-lo de tal perspectiva.
— Sou membro da máfia Hansen há mais tempo do que você
tem de vida, senhorita Ramesses — ela falou sua voz doce, e eu
queria me despedir e sair, mas ela foi mais rápida. — Tenho orgulho
de servir a eles, e não me ofendo de me chamar de criada. Na
realidade, como realmente gostaria de me ofender?
Fiz uma careta, porque, de fato, não queria ir contra ela, não
sabia o que realmente fazia. Minha mão foi até minha barriga, como
se buscando uma resposta digna, contudo, não tinha nada.
— Se não se importar, eu gostaria de fazer o meu trabalho —
insistiu, ainda mais doce, e eu só conseguia ver nela, as exatas
mulheres que meus irmãos levavam para casa. Odiei-me por estar
naquele lugar novamente. — Eu vim para cumprir ordens do senhor
Hansen, não suas.
Então seria ela? A mulher que faria o vestido do casamento?
Olhei ao redor, vendo todas as quantidades de tecido e linhas, além
de máquinas, e minha ficha pareceu começar a cair.
— Mas vai medir o meu corpo. — Foi tudo o que consegui
dizer, quase em um sussurro.
— Ou vai usar os vestidos que ela fizer, ou não vai usar
vestido algum — Tyr se intrometeu, e sentia a ferida ainda mais
aberta. — É isso ou nada, Isis.
Eu estava vencida.
O que eu poderia fazer?
Eu não tinha como escolher absolutamente nada.
Eu tinha uma vida crescendo no meu ventre, e nenhum tipo
de instrução que me daria um emprego, por isso... Era aceitar ou
aceitar, o que fosse.
— Qual o seu nome, afinal? — perguntei, cruzando os braços,
como se precisando me proteger, e olhei-a de cima abaixo, como se
pudesse adivinhar. — Não me surpreenderia se Tyr trouxesse alguma
das putas dele para...
Arrependi-me no momento que as palavras saíram. Contudo,
elas já tinham tornado forma, e eu me sentia tão horrível por deixar-
me vulnerável assim. E um sentimento novo por Tyr, por permitir
que eu fosse exposta daquela forma.
— Acho que acabou de chamar de puta a noiva do seu
cunhado — falou, e eu senti ainda mais culpa. — Malena Dahl, noiva
de Loki Hansen.
Senti outro forte enjoo, e tinha certeza de que minha cor
sumiu. O sorriso da mulher à minha frente, mostrando-me que ela
estava acima de mim, não de modo prepotente, mas sim, por saber
como lidar com as situações.
Eu não sabia lidar com nenhuma.
Não com uma desconhecida.
Não com o homem que eu queria conhecer.
Não comigo mesmo.
— Posso ter um momento a sós com minha noiva, Malena?
— Claro.
Senti a mão de Tyr em meu braço, tirando-me de lá, e quando
cheguei ao corredor, tudo o que consegui fazer foi me soltar, e correr
em direção ao meu quarto, com a esperança de chegar até a
privada. Felizmente, o consegui.
Porém, ali, gostaria de deixar mais do que o meu café da
manhã. Gostaria de deixar a mágoa, dor, frustração e raiva que me
cercavam, além de outro sentimento, sem definição, que me
consumia.
Senti meu cabelo ser segurado, e eu mal conseguia afastá-lo,
ocupada demais, sentindo-me tão impotente, que só deixei as
lágrimas descerem com força. Desesperada para que ele apenas
sumisse novamente, como antes.
Era o melhor.
Era o certo, que ele não estivesse.
Afastei-me da privada, para fechá-la, dar descarga, e me
sentei no chão, segurando minha barriga, e puxando o ar de forma
ritmada, como a médica instruiu.
— Tire as mãos de mim.
Foi tudo o que consegui pedir, ou melhor, exigir, enquanto
suas mãos estavam em meus cabelos, e seu olhar sobre mim. Tudo
o que eu era, uma tremenda bagunça. E pior, nas mãos dele.
CAPÍTULO 30

TYR
Eu não conseguia entendê-la.
Eu pensei, que ficando longe, tentando resolver tudo o mais
rápido possível, seria mais fácil para ela.
Não tendo que lidar comigo, e nem nada ao meu respeito.
Porém, de volta, percebi que não entendia nada da mulher
que estava lavando seu rosto naquele instante.
Absolutamente nada.
— O que ainda faz aqui, Tyr?
— Preciso que peça desculpas à senhorita Dahl — falei, e vi
sua expressão mudar, enquanto ela lavava novamente o rosto, que
parecia exausto.
— Eu vou fazer isso, mas não por você... — assumiu. — Mas
porque eu sei que a ataquei sem necessidade.
— Então, melhor...
— Não viu que eu estou vomitando todo a comida que
coloquei para dentro, e usando tudo de mim para me manter em
pé? — rebateu, me olhou, e percebi o brilho perdido em seu olhar.
— Você reaparece e fica mais tempo que alguns minutos, isso depois
de meses, e então me apresenta alguém que eu nunca vi, e quer
que eu simplesmente sorria e aplauda? Ou simplesmente baixe a
cabeça e aceite tudo? É isso, Tyr? É isso que espera de mim?
— Não sei... — ela me deixou sem palavras. — Não sei o que
quer dizer, Isis.
— Os Ramesses também nunca souberam.
Suas palavras foram atiradas para machucar. E ela sorriu em
seguida, como se caindo em si.
— Como se fosse importante o que eu vejo deles em você, ou
não... — pareceu rir de si mesma. — Não tem algo para fazer fora, e
me deixar sozinha novamente?
— Isis...
— Eu não recebi uma saudação — falou, com suas mãos
espalmadas na pia. — Eu não recebi uma pergunta “tudo bem,
Isis?”. Ou quem sabe, uma pergunta de como vai a saúde do nosso
filho. Ou talvez, uma ligação para saber se estava vivo ou não —
soltou, o que parecia realmente atormentá-la. — Eu tive nada de
você. E não posso culpá-lo, pelo que criei na minha cabeça após a
última vez que tivemos algum momento decente.
— Isis...
— Eu esperei muito, que eu pudesse talvez, tentar, ser sua
amiga... Como aconteceu com Freya, que pareceu tão simples, e
então, nos falamos todos os dias. Mas você... você simplesmente
sumiu, e eu demorei para perceber que eu nunca tive a chance de
tentar, nem ao menos, ser próxima.
— Isso não é...
— Verdade? — rebateu, os olhos me encarando magoados. —
O que nós somos, Tyr? — Ela riu sozinha. — Não esperava um
romance ou alguém para amar, mas pelo menos, alguém que eu
pudesse confiar. Porque foi o que você me ofereceu, desde o
momento que nos conhecemos. E eu fiz, cegamente. Até perceber
que nunca importou. Eu nunca importei. Essa gravidez não te
importa. E muito menos, o futuro desse casamento.
Apenas fiquei em choque, com cada uma de suas palavras. De
tudo o que eu esperava, elas não chegavam nem perto. Eu não
imaginei, em momento algum, que estaríamos ali, daquela forma.
— Isis, eu não...
— Eu te usei — cortou-me novamente, fazendo-me parar. —
Eu mereço ser punida. Eu tenho que ter esse casamento, e criar o
nosso filho sozinha. — Vi-a soltar o ar com força. — Eu pensei que
seria diferente, eu... eu não sei por que, mas eu realmente pensei...
— suas palavras foram sussurradas, mas consegui ouvir.
— Isis, se me escutar, podemos...
— Teve dois meses para isso. — Olhou-me, e negou com a
cabeça. — E só agora que estou colocando para fora tudo o que me
frustra, você vai tentar ser legal comigo? — Negou com a cabeça,
como se não precisando de qualquer resposta minha. — Eu nunca
quis a pena de ninguém, Tyr. E não vou permitir que tenha isso por
mim.
— Eu realmente estou perdido. — Fui honesto.
— Pelo menos nisso, nós dois estamos iguais.
Ela saiu do banheiro, e rumou para fora do quarto. Fiquei ali,
parado, e sem qualquer outra reação ou palavra. Ouvi o miado de
Terça, que me deu um olhar, que jurei ser julgamento, e sequer se
aproximou de mim, seguindo-a para fora dali.
Naquele momento eu ainda não entendia, mas conseguia
perceber, que tinha fodido com tudo. Com o que nem havia
começado. E que pelo jeito, nunca aconteceria.

ISIS
Eu já tinha pedido muitas desculpas em toda minha vida. Na
verdade, fui obrigada a na maioria delas. Suspirei fundo, seguindo
em direção ao cômodo que fui retirada, e bati levemente na porta
aberta, notando a mulher de cabelos ruivos, mexendo em algum
tecido.
— Senhorita Ramesses...
— Isis, por favor — pedi, e fiz a reverência, que ela fez
anteriormente. Sabia que era uma tradição dos Hansen, algo que
Vidar tinha me enviado, dos arquivos que existiam na rede sobre
eles, mas que eram estritamente protegidos. — Eu sinto muito por
ter te atacado com as minhas palavras, e te insultado... — fui
honesta. — Eu ainda estou tentando aprender a falar a sua língua, e
quando o fizer, vou pedir desculpas corretamente, como merecido.
— Todos nós temos dias ruins — ela respondeu simplesmente,
parecendo um sol da primavera, que iluminava tudo simplesmente
com a presença.
Como seria ser assim? Ser tão leve, que se sentia em paz, à
frente de alguém?
— E eu imagino que esteja sendo confuso e turbulento todo o
processo, engravidar, ser noiva, e então agora um casamento, e
bom, uma cultura e máfia diferente — continuou, claramente
tranquila sobre tudo. — Podemos começar quando quiser, e claro, se
sentir à vontade. Se não fizer, posso recomendar outra pessoa.
— Desculpe pela minha primeira impressão, realmente... —
soltei o ar com força. — Não queria te deixar com a sensação de que
não a queria aqui. Se Tyr a escolheu, com certeza, tem fundamento.
— Se ele entende ou não sobre vestidos de noiva, eu não sei,
mas posso te mostrar cada um que já fiz, e pode me mostrar suas
referências, e assim chegarmos em alguma ideia.
— Eu não tenho nenhuma. — Fui honesta.
— Então, vamos começar por... que tal olharmos o meu
catálogo?
Assenti, mesmo não entendendo como seria, e ela logo me
ofereceu um das poltronas que tinham ali, e se sentou na que
estava ao meu lado. Pegando o tablet, colocou-o diante de mim,
abriu um arquivo, e comecei a ver vários desenhos diferentes de
vestidos.
De repente, eu engoli minha vontade de simplesmente pedir a
ela qualquer coisa, e dei-lhe atenção, para cada detalhe que ela
falava. Era o mínimo que podia fazer, depois de tê-la ofendido de tal
maneira. E pelo menos, focaria meu pensamento em algo que não
fosse o homem que tinha deixado-me como um nervo exposto.
CAPÍTULO 31

ISIS
— E essa é?
Eu olhava os tecidos, e me virei, para perceber sobre o que
Malena falava. Era Hathor, que se sentou na poltrona que eu estava,
e logo estava deitada bem ali.
— Hathor ou Terça-feira — respondi, com um sorriso no rosto.
— É a gatinha que adotamos, antes mesmo de termos algo.
— Bom, não vou dizer que é algo inesperado, já que Loki e eu
temos uma serpente e um lobo como companheiros... — olhei-a
embasbacada, e lembrando-me da história que li.
— Fenrir e Iormungander? — perguntei, e ela me encarou
animada, assentindo. — Estou lendo bastante sobre as histórias.
— Bom, eles estavam lá antes mesmo de Loki chegar, e estão
conosco há muitos anos... — vi-a suspirar fundo. — Existe uma
magia nos Hansen, isso posso te adiantar.
— Mas eles vivem na casa de vocês, quer dizer, o castelo?
— Alguém andou lendo bastante. — Senti meu rosto queimar,
mas assenti. — Eles até poderiam, mas preferem ficar do lado de
fora. — Deu de ombros. — Eles nos protegem, e são melhores do
que muitas pessoas... uma família de verdade, sabe?
— Nunca pensei que alguém definiria o que sinto por Hathor
tão facilmente. — Fui honesta. — Eu, ela, e a vidinha...
— Vidinha?
Foi só quando percebi que falei em voz alta, e forcei um
sorriso, tentando não parecer estranha.
— É como chamo o bebê, que ainda não temos o sexo.
— Bom, espero que ele ou ela não tenha medo de Fenrir, e
possam ir nos visitar... Se bem que duvido que Tyr permita. — Olhei-
a sem entender, mesmo que duvidasse, que em algum momento, eu
saísse daquela casa.
— Por quê?
— Não chegou na parte em que Fenrir é quem arranca a mão
do deus Tyr na mitologia? — indagou, e eu arregalei os olhos. — De
algum jeito, Tyr tem pavor do lobo, talvez por medo de ser como nas
histórias...
— Por isso ele tem medo de animais... — pensei alto, e senti
o olhar de Malena sobre mim. — Eu ainda tenho muito o que ler
para entender.
— Bom, saiba que vai acontecer com o tempo. Eu nasci na
máfia Hansen, servindo ao deus Tyr, e mesmo assim, não sabemos
tudo sobre ele, até que começamos a servir o deus Loki, e bom... sei
muito mais do meu noivo, do que realmente sobre o deus.
— É algo realmente diferente, o que acontece nessa máfia. —
Fui sincera. — Não há nada assim com os Ramesses — assumi. —
Pelo menos, nunca foi compartilhado conosco.
— Eu sei pouco da mitologia egípcia, mas sei que é tão rica
quanto, só não sei se aplica à máfia, assim como nos Hansen... Pelo
nome da gatinha, posso arriscar que seja de uma deusa egípcia?
— Sim, a deusa Hathor. — Sorri, lembrando-me das poucas
aulas que tive sobre os próprios deuses do meu povo. — Guardiã
das mulheres, principalmente, as grávidas — expliquei, o pouco que
eu sabia.
— Bom, esse nome me parece ter total sentido.
— Só pensei que ficaria bonito na hora, mas... no final, parece
que era para ser.
— Bom, não te julgo porque vi uma serpente e um lobo e
gritei o nome de Fenrir e Ior... — sorriu sozinha, e eu percebi que
mesmo sendo claramente diferentes, existia uma similaridade entre
nós. — Espero que possa conhecê-los.
— Bom, veremos...
Foi tudo o que consegui dizer.
Vi como Hathor reclamou, pedindo carinho, e fiz um sinal
positivo com a cabeça, para Malena tentar. Ela fez, e logo a gatinha
começou a ronronar. Ela sabia escolher as pessoas, pelo menos, eu
confiava em sua decisão. Porém, poderia começar a duvidar, já que
ela tinha escolhido Tyr.
E de tudo, ele parecia apenas um grande erro.
Um erro que eu escolhi.
Um erro que estava me tirando a paz.

TYR
As coisas pareciam ter fluído entre Isis e Malena, enquanto eu
apenas ficava observando, vez ou outra, o que acontecia. Suspeitava
de ter ouvido uma risada de Isis, e até mesmo cogitei que estava
perdendo de vez a minha mente.
Precisava me explicar para ela.
Precisava consertar as coisas com ela.
Contudo, como eu faria algo assim?
Como eu poderia simplesmente ir até ela e dizer que não foi
minha intenção, por todo aquele tempo, realmente estar longe?
Terça passou por mim, novamente me ignorando, e arqueei
uma sobrancelha, vendo-a se sentar na poltrona vazia da sala de
estar, e não vir para o meu colo. Claramente, eu não tinha falhado
só com Isis.
— Tenho que te pedir desculpas também? — indaguei baixo, e
ela girou várias vezes no lugar, antes de se deitar de costas para
mim. — Ok, princesa da casa.
Levantei-me, e me agachei ao lado da poltrona, e toquei
levemente a cabeça dela. Terça me encarou, os caninos aparentes,
mesmo que ela tivesse a boca fechada, e só então eu percebi o
quanto ela tinha crescido em pouquíssimo tempo.
— Desculpe ter sumido. — falei, e ela então girou, e se deitou
me encarando, enquanto eu passava a mão em sua cabeça. —
Cuidou bem da sua mãe para nós?
Ela deu um miadinho, e sabia bem da resposta.
— Sei que fez isso. — suspirei fundo. — E do... do seu irmão?
— complementei, e ela apenas me analisava, os olhinhos amarelos
no fundo dos meus. — Sei que ele está bem e saudável, e crescendo
cada dia mais... Mas uma coisa é saber, e outra, com toda certeza,
deve ser sentir isso.
Ela então se esfregou na minha mão e sorri para ela.
— Acho que estou desculpado, dessa vez.
Acabei me sentando no chão a sua frente, e não sei quanto
tempo apenas fiquei ali, falando baixinho com ela, e lhe dando
carinho.
Sabia só que a sensação de lar que aquilo me trazia, era
totalmente nova. Um fato assustador, que talvez, fosse um dos
motivos de ser tão fácil não ficar durante aquele tempo.
Contudo, eu não tinha mais razão alguma para estar fora.
Porque a realidade era que eu não queria. Nunca quis. Na fim, tudo
o que me pediam, era que eu ficasse, e simplesmente usasse Isis a
nosso favor, algo que eu me negava.
Eu sabia, mesmo que pouco, que ela foi usada a vida toda. E
o que não faria com ela, era a submeter ao mesmo tratamento que
os Ramesses lhe colocaram.
Suas palavras voltaram com força em minha mente, e jamais
poderia esquecê-las. Ela me comparou com eles, e me acertou em
uma parte que não deveria, mas estava claramente, ficando mais
profundo a cada dia.
CAPÍTULO 32

ISIS
Tudo parecia um borrão.
Por mais que eu tivesse ficado um pouco interessada, com
tantas opções que Malena me mostrou. Era um fato, de que eu não
tinha ideia de quando seria o meu casamento. Não deveria ser um
fardo, mas se encaminhava, cada vez mais, para se tornar um.
Preocupava-me sobre quando seria. Onde seria. E quem
estaria nele. E ainda mais, o que viria a seguir, após estarmos
oficialmente casados, e eu carregar o sobrenome dos Hansen.
— Não é como se Loki pudesse evitar. — Malena falou,
sorrindo para Tyr, que lhe dava todo o seu interesse.
Mesmo tentando evitar aquele sentimento, que aos poucos,
eu conseguia nomear, parecia simplesmente impossível. Num
segundo, eu estava sorrindo, no outro, eu só queria arrancar o
sorrisinho da cara dele. Porque ele o estava fazendo para ela, não
para mim.
A quem eu poderia maldizer por isso?
— Ele faria qualquer coisa por você, Malena. — ele falou,
enquanto tomava o que parecia vinho, e eu me concentrei em
terminar o mais rápido possível a minha refeição, mesmo sendo
muito lerda para comer. — Achei estranho ele não ter aparecido
ainda.
— É... — ela falou, sua voz mudando, e olhei-a, para ver que
existia algo que a incomodava. — Estamos um pouco afastados,
para ser honesta. Vamos resolver, mas... foi uma ótima oportunidade
vir para cá, e poder pensar longe dele.
— Ele me parece um cara muito legal, quando o conheci. —
intervi, e seu olhar parou no meu. — Aposto que ele vai tentar
resolver, o que seja.
— Obrigada pelas palavras, Isis. — ela sorriu em minha
direção. — Não sei o que esperar, mas ainda estou esperando por
algo. Relacionamentos são assim, certo?
Eu me vi assentindo, mesmo que não tivesse uma reposta
concreta. Tinha aprendido, lendo bastante, que as vezes, quando
não se sabe o que fazer, o melhor era apenas menear a cabeça, e
deixar o assunto fluir. Sem se comprometer, por algo que não
consegue expressar.
E de fato, quem era eu para dar alguma opinião sobre como
um relacionamento seria?
Eu não tive pais. Muito menos irmãos. E bem longe disso,
qualquer relação romântica. Só poderia contar, mentalmente, com a
relação que construí com Maia e agora, também tinha com Freya.
Olhei de relance para Tyr e percebi seu olhar sobre mim.
Talvez ele estivesse se indagando mentalmente a mesma coisa: que
relacionamento? Terminei de jantar, e tomei um longo gole do suco
de uva que estava no meu copo.
— Obrigada pela companhia. — falei para Malena, e então
pedi licença, para me levantar e sair.
Não ousei olhar para Tyr. Depois de tudo o que tinha dito mais
cedo, eu mal sabia como seria realmente ter qualquer outra troca
com ele, e talvez fosse para me sentir totalmente humilhada pelos
meus próprios sentimentos, mais uma vez. E apenas fugiria daquilo.
Segui para o meu quarto, sem pensar muito porque apertei
meu passo quando pisei no corredor. Eu estava mesmo fugindo da
pessoa que tinha me evitado por todo aquele tempo? Senti-me
patética pela minha autoestima sobre ele.

TYR
Eu me vi quase levantando quando ela saiu. Pisquei algumas
vezes, e lembrei-me de que tinha uma convidada. E alguém que eu
jamais desrespeitaria.
— Eu estou quase acabando e sinto que não sou apenas Loki
e eu que estamos estranhos um com o outro...
— Desculpe por isso, Malena.
— Sei que quer ir até ela, então, por que não?
— Obrigado.
Foi tudo o que consegui dizer, antes de me levantar, e de
repente, correr pelo corredor. Peguei o exato momento em que Isis
abriria a porta do quarto, e consegui chamar seu nome, e então ela
parou, virando seu olhar em minha direção.
— Tyr?
— Ah, desculpe, eu... — respirei fundo, ofegante por ter
corrido do nada, e vi o seu olhar confuso. — Podemos ter um
momento?
— Eu não deveria ter dito tudo aquilo mais cedo, se é o que
precisa falar... — soltou, e eu franzi o cenho, confuso. — Não vai se
repetir e...
— Realmente, não vai. — cortei-a, e ela me encarou, os
olhinhos se tornando ainda mais sem brilho e percebi o quanto a
vida parecia apagada nela,
Meu olhar desceu para sua barriga, e eu por um segundo, só
gostaria de não ter deixado o tempo passar daquela forma, mesmo
que minha intenção era protegê-la. De tudo e de todos, e
principalmente, de mim.
— Eu não vou deixar, nunca mais, que pense que está
sozinha. — fui honesta, e sua expressão mudou, parecendo ainda
mais carregada. — Não por pena, Isis. — olhei-a profundamente. —
Mas porque eu não posso suportar a ideia de não cuidar direito de
você.
— Quer dizer do nosso filho? — tentou me corrigir e eu
neguei com a cabeça.
— Estou falando apenas de você agora, Isis.
— Sou eu quem não está entendendo o que quer dizer agora.
— rebateu, e cruzou os braços, me encarando. — O que realmente
precisa falar comigo?
— São muitas coisas, mas eu sei que deve estar cansada e
que foi um dia puxado, então... Se preferir descansar, eu posso te
levar para fazermos algo diferente amanhã e...
— Tenho o compromisso com Malena. — rebateu, e sabia que
sua guarda estava erguida. — Pode me dizer o que quiser agora,
não precisa deixar para depois.
Suspirei fundo e assenti.
— Sinto muito por não ter percebido o quanto me afastei,
mesmo que de forma proposital, eu nunca quis que isso te
machucasse...
— Não queremos muitas coisas, pelo que parece.
— Sei que está com raiva e magoada, mas não...
— Eu estou, mas não é sobre você, Tyr. — cortou-me, e
desviou o olhar. — Percebi, depois de falar tudo, que esses
sentimentos são por mim mesma, por me permitir estar nessa
situação.
— Isis...
— Não sei o que sinto por você. — seu olhar voltou ao meu, e
fiquei surpreso com sua honestidade. — Mas não importa o que
seja, eu vou aprender a lidar e tirar de mim. É o melhor, para os
dois.
— Por que faria algo assim? — indaguei perdido. — Disse que
me queria como seu amigo e de repente...
— De repente eu vejo como seus olhos brilham para ela, de
um jeito que nunca fizeram por mim... — vi-a engolir em seco. — Se
existe mais sentimento em você pela noiva do seu irmão, por que eu
estou me colocando como algum objetivo tolo a sua frente? — ela
riu, como se de si mesma. — Eu me sinto cada vez menor e menos
quando se trata de você, e eu não quero isso... Não quero sentir que
alguém é demais para mim, e eu sou invisível.
— Sei que pode parecer isso, mas não existe a forma como eu
olho para Malena. — assumi, e a encarei. — Eu tenho uma dívida
eterna com ela, pela família dela. Não é algo que você vai conseguir
descobrir, nem mesmo com os documentos que Vidar lhe passou.
— Como sabe que ele passou algo?
— Eu sei de tudo o que posso sobre você, Isis. — fui sincero.
— Poderia não estar aqui, mas eu fiquei a parte de cada detalhe. Se
estava se alimentando e dormindo direito. Quais foram os resultados
das suas consultas com a médica, e o que precisava ser feito. O que
você precisava para continuar estudando e pesquisando sobre o que
quisesse. O quanto parecia brilhar quando Freya aparecia, e de
repente, isso sumia, assim que ela ia embora. A necessidade de
mudar todo o seu guarda-roupa, cada vez que te via, mesmo que
rapidamente, e notava o quanto sua barriga cresceu, e já pedia
urgência para que te trouxessem todas as opções possíveis. Não é
muito e nem o bastante, mas eu me importo, de verdade.
Vi-a desviar o olhar e balançar a cabeça.
— Por que tem uma dívida com a família de Malena? —
indagou de repente, como se tentando ignorar todas minhas
palavras, e eu assenti.
Claramente, ela fugia de mim.
— Podemos ir até o jardim de inverno, é uma história um
pouco longa...
Ela assentiu, o que pareceu uma vitória para mim.
— Só vou colocar uma calça mais confortável, e te encontro
lá...
Assenti, e ela adentrou o quarto, fechando a porta atrás de si.
Um sorriso se abriu em meu rosto, mesmo que eu tentasse evitar.
CAPÍTULO 33

ISIS
Sentei-me em um dos balanços que ficavam ao redor do
jardim de inverno, e apenas me lembrei de quando nós dois
estivemos ali da última vez. Da estrela cadente e do meu pedido,
que a cada dia, parecia mais impossível. Não poderia culpar a pobre
estrela, no entanto.
— Freya me disse que passava bastante tempo aqui, e acho
que os balanços foram uma boa escolha — falou, assim que se
sentou no outro, e eu assenti.
Por que, de repente, eu tinha a sensação de que ele sabia
tudo o que estava acontecendo ali? Talvez, como sempre, eu
estivesse na desvantagem.
— Sabe de tudo o que aconteceu aqui? — indaguei, sem
conseguir fingir que aquilo não me atormentava.
— O que eu consegui, através de Freya, sua médica, Vidar...
— falou, e eu engoli em seco.
— Por que não através de você, Tyr? — rebati e me arrependi
no segundo seguinte. — Na verdade, estamos aqui para falar sobre
o que, realmente?
— Sobre os Dahl, e do porquê chamei Malena para fazer o seu
vestido e o enxoval do bebê — falou, e eu assenti, querendo prestar
atenção em qualquer coisa que não fosse o tormento que rondava
minha mente. — Como já deve ter lido, e eu te falei um pouco, levo
o nome do deus da guerra nórdico – Tyr. Desde que existimos,
sabemos das ilhas e castelos existentes na região escandinava, que
pertencem aos Hansen, e cada uma já levava o nome de um deus.
Todos nós temos uma, e somos levados a ela com dezesseis anos.
Porém, ilhas como a do deus Tyr já tinham habitantes, porque ele é
um deus muito amado e cultuado pelo nosso povo, pelos que
servem à máfia juntamente. E tínhamos guerreiros, como Erik Dahl
— começou. — Eu estava eufórico a princípio, porque eu tinha que
representar o que o próprio deus era, e o histórico dele é de muita
lealdade. Um pouco mais velho, eu tinha minha própria guarda,
como alguém preparado para a guerra. Eu sabia como começá-las,
mas só passei a entender que deveria evitá-las, quando sofri uma
atentado.
Olhei-o incrédula.
— Estávamos comemorando, com muito hidromel e música,
mas nós tínhamos intimidado uma máfia rival, e tudo correu bem...
Ninguém foi machucado, até que no meio desse momento, eu
apenas vi o senhor Dahl cair sobre mim, e de repente, todos os
homens que estavam ali também para comemorar, foram para cima
de um único, da máfia rival, que tinha tentado me matar. Nunca
entendi como ele conseguiu entrar em um banquete privado, ou
como tudo aquilo aconteceu. Só percebi que em um segundo, um
homem festejava, e no outro, ele entrou à frente de uma bala por
mim. — Olhei-o sem palavras. — Eu tenho uma dívida eterna com os
Dahl, e tentei dar o que tinha para ajudar a esposa e filhos que ele
deixou... Mesmo que eles não me culpassem, eu sabia que tinha
errado. Eu tinha uma linha clara, de só fazer um banquete dias
depois que a paz foi instaurada, mas não, fiz na mesma noite... E ele
pagou com a vida.
— Tyr...
— Eles passaram, anos depois, a servir o deus Loki, que era o
deus que a mãe de Malena cultuava — falou, e eu assenti,
lembrando-me do que a própria Malena tinha contado. — Mas
depois de tudo isso, eu dispensei a guarda, e tornei a ilha do deus
Tyr um lugar de paz para quem quisesse estar lá, como deveria ser...
Foi quando Vidar se tornou meu braço direito, porque eu não aceitei
mais qualquer proteção, de quem fosse, mas não podia ir contra a
presença de um irmão. — Vi-o suspirar fundo, e a dor em seu peito.
— Eu passei a realmente usar a razão e inteligência para resolver
um conflito ou parar o que existisse... Mas eu percebi no dia que o
senhor Dahl morreu, que eu já tinha feito muitos perderem sua vida
e sangue por mim, mesmo que eu não tivesse ideia.
— Eles lutaram pelos Hansen, não só por você.
— Mas eu deveria protegê-los — rebateu. — Se eu estava
falhando, algo tinha que mudar, então... — soltou o ar com força. —
Eu tentei. É o que tenho feito, todos os dias. E eu fiz uma promessa,
quando destruí a família de um homem que apenas deveria ter
voltado para casa naquele dia, abraçado seus filhos, e dormido com
sua esposa... Eu... eu prometi nunca ter o que lhe foi tirado.
Olhei para ele, como se duvidando se era sério, mas era claro,
por sua expressão que sim.
— Ajoelhei-me e jurei ao meu deus, para que a punição caísse
sobre mim, se eu ousasse ir contra a promessa. — Engoli em seco.
— Quando soube que estava grávida, eu não pensei nisso. Eu
sequer consegui pensar, eu só sabia que precisava te proteger...
Vidar encontrou um antigo papel que carregava a lei sobre as
Mulheres Ramesses, e falava sobre a condenação de ser deserdada
ou morta.
— Foi lá para me salvar. — Levei minha mão à dele, sem
saber ao certo o que fazia, mas eu precisava. Sabia que ele também
precisava. — Eu não queria ser a causa de quebrar um juramento,
Tyr. E os deuses sabem disso. Sabem que nenhum de nós queria
isso.
— O que não diminui a minha culpa — falou, e me encarou.
— Eu nunca contei isso a ninguém — admitiu. — Eu não sabia se
deveria falar ou não, mas... tem me atormentado, pensar que pode
acontecer algo a você, ao nosso filho... — ele soltou o ar com força.
— Eu não sei se suportaria, minha lança.
Ele não sabia, mas eu tinha procurado sobre a maneira como
ele me chamava. Demorei para conseguir uma real tradução, porque
não era o nórdico antigo, mas sim, outra língua usada pelos povos
escandinavos. Contudo, agora eu sabia, que ele tinha me chamado
de sua lança, desde o começo.
Queria dizer que aquilo não tocava em um lugar certo dentro
de mim, mas o fazia. Porque eu tinha lido as histórias, e de como a
lança era um símbolo do próprio deus Tyr. Eu sabia que os Hansen
seguiam os passos de seus deuses, mas ainda não compreendia,
porque ele tinha usado aquele apelido comigo.
— Bom, o que posso dizer é sobre o hoje, e estamos bem —
falei, suspirando fundo. — Não temos como ter certeza do amanhã,
mas se tem todo esse medo, por que ficar tão longe?
— Porque eu sei que se algo acontecer, será comigo —
assumiu. — E porque eu tenho que proteger vocês, é o meu dever,
acima de tudo.
Dever.
Nós éramos um dever para ele.
— Eu não contei isso para que tivesse pena de mim, na
verdade, não era meu objetivo falar sobre tudo... Eu só queria que
soubesse da dívida que tenho com Malena. — Olhei-o e assenti. —
Vou deixar que descanse e conversamos depois.
— Não pode me dizer o que foi acertado com os Ramesses?
Vi o seu olhar mudar, e ele o fechou por um segundo.
— Tão ruim assim?
— Seti quer que encontre Rael, antes de dar seu apoio à
cerimônia. — Suspirei fundo, rindo de lado, sabendo que era típico
deles. — Eu fui contra, mas Odin votou a favor.
— Eu posso ver Rael, sem problemas.
— Não tem que fazer isso.
— Mas eu tenho que enfrentar o meu sangue, uma hora ou
outra... que seja agora, para nunca mais. — Fui honesta. — Eu não
tenho medo deles, Tyr.
— Não?
— Eu tenho nojo. — Dei de ombros. — Mas não posso evitar
isso para sempre.
— Eu vou estar lá, se preferir — ofereceu, e eu apenas
assenti. — Vamos marcar quando se sentir à vontade, e onde
escolher. Claro que não pode ser aqui, porque não revelaríamos um
ponto protegido dos Hansen.
— Certo, então...
Foi quando percebi que minha mão permanecia na dele, e me
afastei com cuidado, notando o quanto meu corpo não se
incomodava, em nada, com o seu toque.
— Boa noite, Tyr.
— Boa noite, Isis.
Saí dali, segui pelo corredor, indo até o meu quarto e
encontrei a culpada de tudo aquilo, caminhando por ali, e indo em
direção a Tyr. Pelo menos, uma parte de mim, parecia mais leve, por
saber que não era somente eu, que estava perdida em tudo aquilo.
No final, éramos só nós dois, tentando lidar com nossos próprios
demônios, enquanto uma vida formada por nós, crescia dentro de
mim.
CAPÍTULO 34

TYR
Não esperava ter uma conversa como aquela.
Eu precisava explicar sobre a dívida que tinha com os Dahl, e
não sobre um juramento firmado há anos. Era como se eu tentasse,
a todo momento, justificar minhas ações e decisões para ela.
Por que eu buscava tamanha aprovação?
Por que eu queria que ela me enxergasse?
Fiquei encarando minha mão por um tempo, onde ela tocou, e
sabia da bagunça que ficou por todo meu ser, desde o primeiro
momento que aquilo aconteceu. Uma que se estendia além de
qualquer outra que já tinha me colocado.
Senti um toque no meu ponto, e sabia que era Vidar.
Levantei-me, e percebi Terça me seguindo, e apenas não a deixei
sair, onde o deserto não era um real problema, mas ela era uma
gatinha, e poderia simplesmente querer se aventurar, passar por
alguma brecha e se perder.
Encontrei Vidar perto do heliporto, usando suas típicas roupas
fechadas e pesadas.
— Hella te dispensou?
— Sabe que não é assim, Tyr.
— Sei que é outra pessoa sempre que ela aparece... — neguei
com a cabeça. — Mas de verdade, estou cansado de andar em
círculos sobre isso. — Suspirei fundo. — O que precisa?
— Senti que precisava de mim — falou, e baixei a cabeça.
— Eu sempre preciso. — Dei de ombros.
— Estou falando sério, Tyr. — Suspirei fundo e neguei com a
cabeça.
— Chegou atrasado para a sessão de confissões de hoje —
falei, e forcei um sorriso. — Então, alguma novidade sobre a amiga
de Isis?
— Nada alarmante — assenti. — Vai entrar em algo por ela?
— Tecnicamente, será por Isis, mas... vamos encontrar o
momento certo.
— Que Odin não te ouça.
— Que você não me denuncie a Hella — provoquei, e ele
empurrou meu ombro, enquanto eu sorria. — Obrigado por
aparecer, e por favor, passe a noite.
— Eu pensei em dormir no deserto, mas já que ofereceu.
— O seu lado brincalhão pode ser encantador, irmão.
Ele apenas se calou, conforme me seguia para dentro de casa,
e no momento que atravessou a porta, Terça-feira simplesmente se
jogou nele, miando alto e anunciando para casa toda que tínhamos
o tio dela ali.
— Eu nem trouxe comida — ele falou baixo, enquanto a
segurava em seu colo, e eu quase gargalhei da cena. — Ok, ok,
carinho.
— Acho que ela já escolheu com quem vai fingir que vai
dormir hoje...
— Fingir?
— Ela sempre acaba passando a noite com Isis.
— Ah... — ele pareceu pensar. — Bom que minha roupa não
vai ficar cheia de pelos.
— Não finja que não gosta, V.
— Eu não gosto.
Ele fazia carinhos na cabeça dela, e tinha um quase sorriso,
que era raro para si, no rosto.
Ele seguiu para o seu quarto, e eu fui até o meu. Assim que
parei à frente da minha porta, pensei em como as coisas tinham
acontecido e se tornado cada vez maiores. Minha mente ainda
nublada de mais dúvidas que respostas, mas felizmente, eu tinha
conseguido ter uma conversa com a dona da maioria delas.
— T.
Virei-me ao ouvir Vidar me chamando, e o encarei sem
entender.
— Esqueci de te falar, o que encontrei no banco de trás do
carro hoje mais cedo — falou e franzi o cenho, totalmente confuso.
— O carro que usei para deixar Isis no dia seguinte...
— O que tem?
— Ela deixou os seus recados e acredito que essa letra seja
dela...
Ele então retirou um pacote de plástico do bolso frontal da
blusa, enquanto segurava Terça com a outra mão.
— Aqui.
— Obrigado.
Ele deu um leve aceno com a cabeça e se afastou, enquanto
eu adentrava o meu quarto, e me sentava na cama, retirando os
papéis de dentro do plástico. Reconhecia todos os recados que eu
tinha deixado durante aquela semana que ela não apareceu, e
então, quando olhei o verso do último, notei a sua letra.
“Não sei quem é, mas quero que saiba que foi a melhor
pessoa que eu já tive. Obrigada pela noite que mudou a minha vida.
Obrigada por ter me dado a chance de recomeçar.
Espero que saiba, que contarei ao nosso filho, do homem bom
e incrível que é o pai dele.
Adeus, Isis.”

Eu estava incrédulo, vendo que ela tinha confessado o que


tinha feito, acreditando que eu realmente sabia. Ela não tinha
perguntado sobre nada, como eu sabia de partes, mas não
compreendia tudo. Ou melhor, de como eu a julguei assim que
descobri do que realmente se tratava.
Ela era boa demais.
Ela era boa demais para qualquer um.
E principalmente, para alguém como eu.
Contudo, não poderia deixar de querê-la. E a cada momento,
eu via aquilo apenas crescer. O que nasceu na noite que senti o seu
cheiro pela primeira vez, e que eu tanto me neguei. Mesmo assim,
seguia ali, intacto, me fazendo entender, que eu não tinha controle
de absolutamente nada quando se tratava dela.
CAPÍTULO 35

ISIS
Não podia fugir para sempre.
Sabia exatamente o porquê de meu pai mandar Rael. Ele era
o menos óbvio de todos eles. Usando suas piadinhas sujas, e agindo
inconveniente, mas sempre fingindo ser um bom moço. Só quem
vivia próximo a ele, sabia o quão sujo ele também podia ser. E o
quanto influenciava os mais novos, e até os sobrinhos, a abusar de
mulheres.
Resolvi não contar aquela parte para Tyr, talvez esperando
que fosse apenas uma visita cortês. Uma demonstração de poder
dos Ramesses. Se ele quisesse realmente algo pior, teria mandado
Akhmu, que teria uma razão pessoal para me machucar.
O que eu havia me esquecido, era que diferente de Akhmu,
Rael nunca precisou de motivo algum para fazer algo parecido.
— Sim, Vidar.
Consegui entender o que Tyr falou, além do nome do irmão, e
senti uma pequena vitória em meu interior.
— Ok, obrigado.
Mais uma que eu entendia, e talvez estivesse valendo a pena,
estudar a língua deles. Sentia-me um pouco menos diferente, ao
conseguir compreendê-los.
— Vidar disse que Rael já está no elevador.
Assenti, e suspirei fundo.
Pensei em lhe contar que tinha entendido o que ele
respondeu ao irmão, mas me calei. Não era o momento para contar
alguma realização pessoal minha.
— Não precisa ficar a sós com ele, e sendo honesto, não
quero que fique. — falou, o que já tinha me orientado mais cedo. —
Mas, se quiser isso, tem esse ponto no brinco da sua orelha. —
apertou o local, e eu assenti. — Toque nele, e eu estarei aqui no
segundo seguinte.
— Tem câmeras aqui, não é? — indaguei, e Tyr assentiu. —
Se ele fizer algo, vou querer as imagens. — pedi, e mesmo
parecendo não entender, Tyr assentiu.
— Não vou monitorar o que conversam, porque é um
momento seu, mas se quiser que eu o faça, a qualquer segundo,
pode apertar bem aqui... — tocou o broche em formato de lança que
tinha colocado meu vestido, perto da minha clavícula. — A qualquer
momento, Isis.
— Obrigada. — falei, e levei a mão a barriga. — Pode me
deixar a sós com ele, vou recebê-lo e compreender o que quer.
— Isis, eu não...
— Vou ficar bem. — apontei para o ponto na orelha, em meu
brinco, e o broche. Vi seu olhar cair para minha barriga, e sabia que
sua preocupação era dobrada, assim como a minha. — Nós vamos
ficar.
— Vou estar na sala ao lado.
Assenti, e ele se afastou, enquanto eu resolvi ficar de pé, ao
lado de uma poltrona. Não demorou para a porta do apartamento
ser aberta, e Rael entrou, olhando para cada canto, e eu sei o que
ele buscava – câmeras. Se existia algo que um Ramesses poderia
encontrar, era o que eles usavam a vida toda.
— Irmãzinha...
— Rael. — falei, sem baixar minha cabeça, como era
obrigada, quando ainda vivia sob o mesmo teto que ele. — Por que
te mandaram?
Ele apenas mudou sua expressão e se aproximou. Parando
bem a minha frente, e eu deixei as mãos à frente da minha barriga,
em clara proteção. Poderia esperar de tudo dele, e qualquer um
deles.
— Parece bem cuidada, sem olheiras... — então deu uma
volta ao meu redor, e seu olhar estava em cada canto do meu corpo.
— Ganhou peso, claramente. E pelo jeito, esqueceu do respeito que
nos deve. — então ele parou a minha frente, e apenas permaneci o
encarando.
— O que quer, Rael?
— Deveria me chamar pelo nome? — indagou, ficando tão
próximo, que eu só pensei em usar uma pequena lança que estava
conectada ao anel que tinha no meu dedo anelar esquerdo, o qual
Tyr tinha me pedido para usar. — Onde está o seu respeito?
— Eu nunca te respeitei. — fui honesta. — Mas não é por isso
que está aqui...
— Bom, já que quer que seja direto... Onde esteve por todo
esse tempo? — indagou, e eu franzi o cenho.
— Bem aqui. — dei de ombros, mentindo sem me importar
em fingir de fato. — Era só isso?
— Parece bem esperta e corajosa, só porque vai se casar com
um Hansen...
— Na verdade, eu sou esperta e corajosa, e por isso vou me
casar com um. — rebati, e ele pareceu incrédulo. — Se não tem
mais nada a falar...
Ele então riu alto, e seu olhar era tão frio, que me lembrava
de quando me assustava na infância.
— Baixe o seu queixo. — ordenou, e eu apenas me mantive
na posição. — Agora, Isis!
— Senhora Hansen para você. — corrigi-o, e percebi que
gostava de como aquilo soava.
Eu sabia o que viria a seguir, então toquei meu brinco, e foi
apenas o tempo bastante para levar uma mão a minha barriga, e
usar a pequena lança que Tyr deixou comigo, e fincá-la onde
conseguia em Rael. Porém, mesmo o acertando, não pude evitar que
o soco dele chegasse ao meu rosto.
No momento em que senti o impacto, e ele pareceu perceber
que eu também o tinha machucado, eu sorri, mesmo com a dor, e
percebi que caí sentada na poltrona, como eu imaginei que seria. Eu
sabia que ele me atacaria, era só o que ele sabia fazer.
— Sua puta...
Eu o tinha acertado logo abaixo das costelas, e percebi o quão
afiada era aquela pequena lança, que parecia ter sido a mesma que
cortou a boca de Akhmu tão facilmente. Eu a puxei para mim, e
antes que ele tentasse alguma outra coisa, vi o seu corpo ser
arremessado para longe.
Tyr ficou a minha frente.
Ele se virou de repente, e tocou meu rosto, parando mais
tempo no lado direito do meu rosto, e vi sua expressão mudar.
— Fez isso com ela, não foi, Rael?
Vi meu irmão caído sentado no chão, se levantando com
dificuldade, e seu semblante mudando. Ele não parecia mais com o
ódio violento contra mim, mas sim, um animal acuado.
— Parabéns, minha lança. — ele falou em sua língua, mesmo
não sabendo que eu já compreendia um pouco, e então levou os
dedos a minha mão, pegando a pequena lança para si. — Usou que
mão, Ramesses?
Foi quando encarei minha mão manchada de sangue do meu
irmão, e meu corpo vacilou, mesmo que sentada.
— Tyr...
Minha voz apenas se perdeu, enquanto ele puxava Rael como
se não pesasse nada, e não pensou duas vezes em afundar a lança
no pulso esquerdo dele, de forma que o sangue jorrou, e eu apenas
senti uma tontura ainda mais forte me atingir.
Talvez eu não conseguisse mais olhar para sangue.
— Eu já tirei uma boca por ofendê-la, e agora, temos uma
mão a menos para machucá-la. — falou, e eu vi-o afundar ainda
mais a lança, e os gritos de Rael, misturados ao sangue que eu via,
fez meus olhos pesarem.
— Tyr... — tentei gritar, enquanto sentia minha pressão baixar,
e tentava me segurar com as mãos, na poltrona. — Eu...
— Dia de sorte, desgraçado!
Foi a última coisa que ouvi, antes de minha cabeça pesar
tanto, que eu precisei fechar os olhos, e tentar encontrar algum
alívio. Sabia que iria desmaiar, e acreditei, que de alguma forma,
fosse para o meu bem e da vidinha de nós dois.
CAPÍTULO 36

TYR
— Isis!
Minha voz soou como um grito, e me vi correndo até ela, e
vendo que tinha simplesmente desmaiado sobre a poltrona. Só de
pensar que ela tinha calculado que ele a derrubaria, e por aquilo,
ficou próxima ao estofado, deixava-me abismado. Virei-me para
Rael, que estava caído no chão e tive que segurar todo meu ódio.
Apenas acionei Vidar no ponto, que não demorou cinco
segundos para abrir a porta, e então dar de cara com Rael
sangrando no chão, e eu torcia que tivesse perdido o movimento dos
dedos pelos nervos que acertei.
— Jogue esse lixo fora daqui. — ordenei.
Meu irmão o fez, mesmo ouvindo os gritos de Rael, enquanto
eu tocava o rosto de Isis, e via a mancha vermelha aumentar, e seu
rosto ficando inchado.
Corri até a mesa ali perto, onde eu tinha deixado algumas
poções de Freya, e uma delas, era justamente, caso Isis passasse
mal e desmaiasse. Sabia que poderia acontecer novamente, ainda
mais, quando ela o fez quando estava nervosa da última vez.
Imaginava que era algo a me preparar e preocupar.
Coloquei o frasco abaixo do seu nariz, para que ela inalasse, e
contei os dez segundos que tinham nas instruções, enquanto meu
olhar caía para sua barriga, e eu procurava por algum sinal de que
Rael pudesse ter acertado ali também. Se ela a tinha machucado,
com certeza, tentaria machucar nosso filho.
Era a primeira e última vez que ela ficava exposta daquela
maneira. Vi ela tentou abrir os olhos, e me encarar, uma de suas
mãos indo para a barriga, e percebi o sangue que estava ali.
— O sangue...
— É de Rael. — falou baixo, e então fechou os olhos. — Acho
que não posso mais ver sangue.
Nem pensei quando puxei minha camisa pela cabeça e corri
ao banheiro para molhá-la, e então voltei, e passei por sua mão e
braço sujos de sangue, e suspirei um pouco aliviado, por saber que
ela estava bem.
— Só mais um pouco. — falei, terminando de tirar o sangue
entre os seus dedos.
Foi quando percebi que minha camiseta já estava uma
bagunça de sangue, assim com a mão que usei para acertar Rael.
— Preciso lavar a minha mão agora, Isis.
Avisei, correndo até o banheiro, e jogando a camisa no lixo, e
então esfregando minhas mãos, e procurando algum ponto meu que
tivesse algum resquício de sangue. Felizmente, parecia que tudo
tinha respingado na camisa também.
Ouvi o barulho da porta da frente, e voltei correndo para a
sala, e vi Isis abrindo os olhos, enquanto eu me colocava entre ela, e
Odin e Hella, que acabavam de entrar.
— Nunca mais... — falei, e apontei para os dois. — Nunca
mais vão colocá-la em um perigo assim. Se pensarem em usar a
minha mulher novamente, para a merda que seja, colocando-a em
perigo, eu mesmo vou fazer questão de desaparecer com ela e meu
filho.
— Tyr, não é que...
— Apenas parem. — olhei-os com minha mágoa. — Parem de
querer usá-la! Parem de achar que isso vai ser a solução de alguma
coisa. Não existe diplomacia com os Ramesses! — minha voz soou
mais alta do que o normal. Eu estava fora de mim. — Ou precisam
enterrar alguém que eu amo para então terem a certeza?
Vi o choque no olhar dos meus irmãos, e a forma como
ficaram sem palavras. Foi quando senti a mão de Isis em meu braço,
e ela passou a minha frente, e meu olhar se perdeu por ela.
— Senhor e senhora Hansen. — ela falou, usando a nossa
língua, e eu fiquei em completa surpresa. Então fez a reverência
única do nosso povo. — Posso passar o que desejarem sobre os
Ramesses... — seu olhar voltou para o meu. — Só não quero arriscar
a meu filho e a Tyr, novamente.
— Cometemos um erro, Isis.
Hella quem falou, e então percebi seu olhar parou no de Odin.
— Não vai voltar a acontecer.
Ela assentiu, enquanto eu respirava fundo e tentava voltar ao
meu controle normal. Parecia impossível, no entanto. Vi meus
irmãos saindo no segundo seguinte, e sequer consegui olhar nos
olhos deles.
— Você... você se machucou?
Sua pergunta me pegou desprevenido, e então seu olhar
parou no meu. Eu não conseguia mais pensar, apenas a puxando
para os meus braços. Uma de minhas mãos parando sobre sua
barriga, e eu senti a necessidade de estar assim com ela.
De tocá-la novamente.
De senti-la ali, viva, comigo.
— Peço perdão, minha lança.
Fechei os olhos, atormentado apenas pela ideia de que o pior
poderia ter acontecido. E então senti uma lágrima descer por meu
rosto, e me agarrei ainda mais a ela.
— Nós estamos bem. — falou, e eu senti suas mãos em meu
rosto, fazendo-me afastar, e limpando a lágrima que descia. —
Graças a você, todos nós estamos.
— Eu os coloquei no perigo e...
— Eu nasci na máfia, Tyr. — falou, a sinceridade em seu rosto.
— Não há como não correr perigo. E se for para o fazer, eu sei que
dessa vez, não estou mais sozinha.
Puxei-a novamente para os meus braços, e percebi o que
aquilo significava – minha paz. A que eu nem sabia que procurava, e
muito menos, que tinha perdido. Porém, ela o era. Eles eram.
CAPÍTULO 37

ISIS
Eu ainda tentava me realinhar com tudo o que aconteceu.
Porém, não me passou despercebida a maneira como Tyr não
afastou a mão da minha, nem por um segundo. Fosse para
entrarmos no carro, fosse para quando adentramos o helicóptero, ou
quando simplesmente, não me deixou andar e me carregou para
dentro de casa.
Tentei negar, mas ele foi simplesmente mais insistente do que
nunca, e só parou realmente, quando me colocou deitada sobre
minha cama.
— Vou buscar algo para comer, e se hidratar — falou, e eu via
o quanto ele sequer tinha notado, que por todo aquele tempo,
simplesmente estava sem camisa. Pensei em falar algo, mas me
calei, quando ele afastou sua mão, para pousá-la sobre minha
barriga.
Eu via que ele estava tentando.
Era claro, que a cada segundo, ele tentava lutar contra o
próprio medo.
— Eu já volto — falou, e vi-o se afastar, e parar próximo à
minha porta. — Cuide da sua mãe, sim? — ele falou, se agachou, e
não precisava de muito para saber que era Hathor adentrando o
quarto.
Ele me chamava de mãe dela? Assim como eu me referia a ele
como seu pai? Era realmente diferente, como tudo ficava mais claro
sobre ele, apenas por estar próximo e não desaparecendo a cada
minuto seguinte.
Hathor subiu na cama, e logo se acomodou no que parecia
seu lugar favorito – a minha barriga.
— Sabe que vai ficar maior e daí vai complicar pro seu lado —
provoquei, e ela miou, parecendo não se importar, e aninhando bem
ali. — É, vidinha, as coisas não mudaram com os Ramesses, mas...
mas não somos mais eles. Você não vai ser um deles e ter que
sofrer com isso, eu prometo.
Na minha memória, ficava parte da discussão que Tyr teve
com os irmãos. Não tinha entendido nem um quarto de tudo, mas a
fúria dele em cada palavra, me deixou crente do quanto aquilo tudo
o desestabilizou também. Era um tópico que gostaria de falar com
ele, e saber, porque ainda estava longe de entender tudo.
— Eu esquentei a comida de ontem, só um pouco, e trouxe
um copo enorme com suco de morango — ele falou, adentrando o
quarto, e sabia que trazia consigo tudo em uma bandeja. — Jura,
Terça?
Ela parecia realmente confortável sobre minha barriga.
— Ela consegue ser mais grudenta à minha barriga, do que eu
— admiti, e apertei a carinha dela, antes de tirá-la, e me levantar.
— Não, não precisa...
— Eu tenho uma mesa ótima aqui. — Apontei para a mesa
que ficava logo abaixo da janela, e que estava uma bagunça, mas
era só empurrar tudo, que eu conseguiria me ajeitar para comer. —
Aliás, onde está o seu prato?
Ele então parou, e percebi que equilibrou a bandeja em uma
das mãos, enquanto levava a outra ao lado direito do meu rosto, que
estava inchado, mas felizmente, não ruim o bastante para fechar
minha visão daquele olho.
— Já foi pior — admiti, tentando acalmá-lo, mas notei o
desgosto que passou por seu rosto. — Acho que não deveria ter
falado isso para te acalmar.
— Só de pensar no que faziam com você, eu... — suspirou
fundo. — Eu sei que deveria me importar com todos igualmente, é o
que um Hansen faz, mas quando é sobre você, eu simplesmente não
posso.
— Se homens ficassem grávidos, diria que são seus
hormônios — rebati, lembrando-me de muito do que li, de como a
gestação afetava as mulheres e mudava seu humor, assim como,
todo seu fisiológico.
— Como não estou... qual sua conclusão?
— Só posso me basear nas novelas, filmes e séries que tenho
visto — admiti. — E elas todas apontariam para algo que nenhum de
nós acredita.
— O que, Isis? — indagou, enquanto eu ia até a mesa,
afastava meus cadernos, e ele logo colocou a bandeja ali.
— O amor — respondi, lembrando-me de como as coisas
pareciam apenas fáceis quando se tratava de ficção. — Devo ter me
emocionado e gritado quando um casal tocou as mãos em umas três
novelas diferentes.
— Acha que isso só existe assim? Na ficção?
— Eu nunca vi na vida real, então... só tenho isso para me
basear, de que é uma mentira. — Dei de ombros. — Não quer comer
comigo? — ofereci, mostrando que havia mais espaço ao lado da
minha mesa.
— Eu estou bem, e acho que só vou sentar aqui e te olhar.
— Isso parece estranho — admiti, mas me sentei, ficando um
pouco de lado para ele, que se sentou na beira da minha cama.
— Sobre mais cedo... — falou, ao passo que eu bebia primeiro
um longo gole do suco. — Entendeu o que conversei com meus
irmãos?
— Eu tentei, mas consigo apenas o básico... Coisas como
“obrigado”, “tudo bem”... Fiz até uma lista do que gostaria de
aprender a falar, e pensei em te mostrar, mas você não ficou muito
tempo, então comecei a traduzir sozinha.

TYR
Deveria estar aliviado por ela não entender o que eu tinha
dito no auge da minha ira. Contudo, por que eu tinha uma ponta de
decepção em meu peito?
Levantei-me, e parei ao seu lado, vendo-a comer com calma,
e olhei ao redor da sua mesa bagunçada.
— É esse aqui. — Apontou para um caderno que tinha a capa
roxa, e a encarei. — Tem as minhas dúvidas sobre sua língua, e
claro, estou tentando traduzir pro inglês também.
— Sempre foi autodidata? — indaguei, pegando o caderno em
mãos, e abrindo a primeira página.
— Ou aprendia sozinha, apenas observando, ou não aprendia
nada — respondeu, dando de ombros.
Vi-a se concentrar na comida, enquanto eu me sentava
novamente na beira da cama, e me surpreendi ao ler o primeiro
conjunto de palavras: minha lança. Já estava traduzido, e ela deixou
claro que era norueguês, e não algo da língua nórdica antiga.
— Deve estar se divertindo com o dicionário que temos aqui...
— comentei.
— E com o documento que Vidar me mandou, que tem muito
mais sobre a história de vocês e consequentemente, sobre a língua
— falou, e tomou outro longo gole de suco. — A internet também é
a melhor coisa que eu já vi, consigo simplesmente de tudo e até
consegui encontrar algumas músicas que tocaram no seu carro,
quando saímos naquela noite, totalmente sem querer.
— Já está aprendendo a cantar em outras línguas?
— Eu não arriscaria assustar a minha vidinha com essa
péssima voz, mas... eu coloco para ela ouvir.
— Vidinha?
Foi quando vi o seu rosto tomar um vermelho, que eu não
encontrava desde a última vez que realmente estivemos juntos.
— É o apelido que dei para o nosso filho ou filha — admitiu,
claramente sem graça. — Segundo os livros que li, é normal querer
dar um nome, e até mesmo, apelidos cafonas.
— Me parece fofo — argumentei, e vi até a ponta das suas
orelhas ficarem vermelhas.
— Eu gosto de pensar que sim, e que o bebê vai gostar... —
falou, e percebi que já tinha comido tudo. — E você?
— Eu? — indaguei confuso.
— Acha que ele vai gostar de ser chamado assim?
— Se ele puxar a mim, vai adorar qualquer clichê... — sorri de
lado. — Se puxar a você?
— Eu acho que gosto de clichês também... quer dizer, gosto
desse — falou, suas mãos estavam na barriga, e seu olhar parou
sobre ela. — Acho que só vou tomar mais suco, e colocar gelo na
minha cara para não ter que lidar com esse lado do rosto pior.
Ela se levantou, e eu me culpei por não ter sido atencioso
naquela parte.
— Tyr, eu posso andar e estou segura aqui — falou, parando
próxima a mim, e percebi novamente a nossa diferença de altura.
Mesmo sentado, eu era praticamente todo o seu tamanho. — Eu
acho que você nem notou que está sem camisa até agora.
Foi quando olhei para baixo e percebi que, de fato, eu não
usava nada na parte de cima do corpo. E sequer notaria, se ela não
tivesse falado. Senti meu rosto arder, e percebi que foi a vez dela de
me deixar totalmente sem palavras.
Quando levantei o olhar, encontrei um sorriso no seu rosto,
que fez tudo aquilo, até minha vergonha, valer a pena. E eu tinha
certeza de que não existia nenhum clichê maior que aquele, que
combinaria comigo – eu estava me apaixonando por ela, a cada
momento mais.
CAPÍTULO 38

ISIS
— Tyr meio que proibiu todos de aparecem aí pelos próximos
dias... — Freya falou, e eu arregalei os olhos surpresa. — Quer dizer,
eu estou autorizada, mas com Bjorn doentinho, não consigo pensar
em viajar.
— Ele está bem? — perguntei em completo alerta, e levando a
mão à minha barriga, como se pudesse me colocar no seu lugar.
— Uma gripe, como sempre — falou, e notei que parecia
cansada. — Juro, quando a sua vidinha nascer, vai ver o quanto
bebês conseguem ficar doentes depois de alguns anos. A cada dia
eu acho que Henrique ou eu vai ficar sem cabelo de tanto nervoso.
— Se eu puder ajudar em algo...
— Obrigada, Isis. — Ela sorriu para mim. — Mas se eu puder
pedir algo...
— Qualquer coisa — falei, sem pensar duas vezes.
— Cuide de Tyr por nós — notei sua clara preocupação. — Ele
nunca se isolou assim, e estou realmente preocupada.
— Vou fazer isso.
— Obrigada. — Ela sorriu para mim. — E a canela que me
pediu foi entregue, né?
— Sim, e eu só estou esperando dar o tempo dela no álcool
para fazer o restante da mistura — comentei, um pouco animada. —
Posso te ensinar, quando vier aqui.
— Eu vou adorar, e mais, talvez você possa nos visitar,
conhecer o Brasil...
— Não sei como as coisas ficaram depois de hoje, mas acho
que o casamento será ainda mais rápido do que pensei... — admiti.
— Fale com ele sobre isso — aconselhou, como se lendo a
interrogação na minha cabeça. — Tyr não tem nada o que esconder
de você, até porque, o casamento não é só dele.
— Eu posso ter dito que ele deveria decidir tudo... — falei, e
ela riu do outro lado da linha.
— Você ainda não percebeu que o tem ele enrolado no seu
dedo? — rebateu, e eu fiz uma careta, confusa. — O que você
quiser, ele vai fazer.
— Não acho que seja assim...
— Por que não tenta, então?
Ouvi um choro ao fundo, e a expressão de Freya mudou de
imediato.
— Vai lá, e melhoras para o Bjorn — falei, e ela assentiu,
mandando um beijo, antes de desfazer a chamada.
Vi-me jogando o edredom longe, saindo debaixo dele, e só
percebendo o quão calor estava. Tinha criado aquela mania, de ficar
debaixo de algo, enquanto fazia uma chamada de vídeo com Freya.
Levantei-me e saí do quarto, indo em direção à cozinha, para
tomar um pouco de água. No momento que abri a geladeira, fiquei
pensando se deveria ou não perguntar a Tyr, como tudo estava.
Como seriam as coisas a seguir, com aquele encontro nada cordial
com os Ramesses.
Assim que que fechei a porta da geladeira, encontrei Tyr do
outro lado, que me fez dar um pulo no lugar, e quase derrubei a
garrafa de água nele.
— Pelos deuses, Tyr.
— Eu estava aqui o tempo todo e você nem notou —
comentou, e percebi que tinha um pote com pipoca na mão.
— Igual uma assombração? — rebati, ele riu de lado, e
percebi que parecia bem mais leve do que antes. — Estava falando
com Freya, e pelo jeito, Bjorn está gripado.
Vi sua feição mudar e ele parecer pensar em pegar o celular
de imediato.
Não sabia por que, mas levei a mão até o braço dele e o
parei.
— Ela está cuidando dele e parece bem cansada, acho que
talvez, pode ligar amanhã — sugeri, e ele parou, olhando-me com
atenção.
— A nossa dinâmica pode ser realmente assustadora.
— Em que sentido? — indaguei, soltando minha mão do seu
braço, e me encostando contra a pia, ainda bebendo minha água.
— Do jeito mais inesperado possível — admitiu.
— E ainda assim, vamos nos casar — considerei, tentando
entrar naquele assunto. — Vamos?
— Por que não iríamos mais? — indagou, e eu engoli em seco.
— Não parece que está me punindo com isso. — Fui franca.
— E não sei como estão as coisas com os Ramesses... Então, por
que vai me dar seu sobrenome?
— É a mãe da minha vidinha, Isis. — Sua justificativa me
acertou em cheio. — E eu quero protegê-la. — Olhei-o, e ele deixou
a pipoca de lado, escorando-se com as mãos na ilha à minha frente.
— Meu sobrenome pode te dar isso.
Realmente, eu não tinha resposta para aquilo.
— Quando vai ser tudo? Vai ser onde nasci? Vai ser em outro
lugar?
— Resolveu participar? — pareceu sondar, como se estivesse
se divertindo com aquilo.
— Eu estou tentando entender.
— Bom, me isolei porque se eu pisar na mansão dos
Ramesses, vou matar todos eles. E já que Odin e Hella criaram essa
cena, eles que se resolvam. — Olhei-o, assentindo. — Só quero
notícias deles se for sobre a certeza de que Rael não pode mais
mexer a mão com a qual te machucou.
— Não penso que ele vá ao casamento — debochei, sem
realmente me importar, o mínimo, com ele. Na verdade, se estivesse
morto, eu apenas acharia que demorou demais.
— Não quero nenhum deles, mas é um padrão nas máfias...
Alguém terá que representar os Ramesses.
— Maia — falei, e seu olhar parou no meu. — Ela é um
Ramesses, e mais, a esposa do herdeiro da máfia, ou seja...
— Aqui temos uma estrategista nata — ele falou, e eu me vi
sorrindo sem graça. — Vou mandar a intimação aos Ramesses, e
assim que marcarmos a data, ela vai estar.
— Posso roubá-la durante o meu casamento? — brinquei, por
mais que tivesse um fundo de verdade.
— Vai se casar comigo, pensando em roubar outra pessoa no
dia?
Eu tive que rir, sem conseguir me conter, e vi o choque em
seu rosto. Ele parecia não esperar por aquela reação minha. Porém,
eu tinha que concordar com ele, que tudo entre nós, realmente,
tornava o outro, a própria definição do inesperado.
— Nunca te vi sorrir assim.
— Bom, eu não tinha por que fazer isso antes — admiti. —
Acho que eu posso te oferecer, o que... o que Freya me ensinou. —
Sua expressão mudou e eu sabia que estava arriscando alto. — Eu
sei que nada entre nós é comum, ou como deveria ser, mas... posso
tentar ser sua amiga?
Vi sua boca abrir e fechar, como se realmente surpreso.
— O que quiser, Isis.
Foi nesse instante que percebi, que talvez, sua irmã tivesse
razão. O olhar que ele me entregava naquele momento, parecia o
mesmo de quando o conheci, mas ainda mais intenso. Algo estava
mudado.
Não sabia se nele. Se em mim. Ou se em nós. Contudo, vi-o,
me puxar para os seus braços, e aceitei o seu toque. Sorri no
abraço, e sabia que poderia me acostumar com aquilo.
Com uma relação saudável, com alguém que realmente se
importava. Contudo, quando nos afastamos, o meu olhar ficou preso
no dele, e minha respiração mudou, como se eu soubesse
exatamente o que precisava, e não pudesse ter.
Os lábios dele tão próximos, mas ainda assim, tão distantes. E
eu percebi, que talvez, quisesse lhe oferecer mais do que fiz.
CAPÍTULO 39

TYR
— Então, Malena está casada com Loki há seis anos e não
sabia? — Isis perguntou, como se não acreditasse. — Ele realmente
deu o nome como o deus da mentira...
Eu ri alto.
Ainda tentando me acostumar com o fato de que ela poderia
simplesmente soltar uma pérola do nada.
— E por isso ela não voltou para resolvermos os outros
detalhes? — indagou, e eu assenti. — Será que eles estão se
resolvendo?
— Não sei, mas sei que Freya me pediu para me encontrar
com ela na ilha dele, e depois, ela vem para cá — contei, e ela
parecia animada. — Se quiser, pode vir comigo.
Notei a surpresa em seu olhar, e ela claramente não tinha
resposta.
— Loki está miserável por ter perdido a melhor amiga e
mulher que ele ama há anos, mas nunca admitiu para ela... acho
que demorou para admitir a si mesmo — falei, e de repente, pensei
em como seria, guardar um sentimento assim, por tanto tempo,
como ele fez. — Pode ser bom, te ver um pouco...
— Eu acho... acho que prefiro ficar. — Sua resposta me
surpreendeu. — Não é que não queira conhecer lugares fora daqui,
mas... mas ainda estou envergonhada pelo que disse a ela.
— Eu vi que conseguiu reverter a situação facilmente.
— Porque Malena é uma boa pessoa.
— E você não? — rebati, e ela me encarou, parando de se
balançar na cadeira. — Acho que todos nós aqui, discordamos com
essa sua ideia.
— Nós?
— Eu... — apontei-me. — Terça... — apontei para a gatinha...
— E claro, a nossa vidinha... — apontei para sua barriga, e seu olhar
parou no meu. — Todo mundo xinga em algum momento, isso não
te faz uma pessoa ruim.
— Eu só... só gosto de como as coisas estão. — Sua admissão
me pegou desprevenido. — Penso que assim que saindo daqui, tudo
vai voltar a ser como naqueles dois meses e... — eu a vi levar as
mãos ao rosto, como se pensando sobre. — Não quero perder o que
estamos construindo.
— Se não quiser ir, tudo bem, mas eu prometo que te mando
mensagem a cada quinze minutos — falei, e ela me encarou, como
se envergonhada. — Claro, vai ter um tempo sem área, mas...
— Eu não quero que faça isso porque estou parecendo
desesperada, eu só... só não sei lidar com o fato de que tenho
alguém por quem esperar, e quero esperar por essa pessoa.
— Essa pessoa deve ser muito especial — falei, levando a mão
ao meu peito, e ela sorriu. — E burra, por ter permitido que se
sentisse tão insegura assim.
— Tyr...
— Uma coisa sobre mim, Isis. — Olhei-a profundamente. —
Não cometo o mesmo erro duas vezes. — Era a mais pura verdade.
— Eu apreciaria se voltasse logo, e pudéssemos nos casar,
roubar Maia, e nos mudarmos para sua ilha... — admitiu de repente,
e seu olhar fugiu do meu. — Soa como um plano, né?
— É a segunda vez que faz um? — indaguei, e seu olhar
parou em mim.
— Como sabe?
— Imaginei que só tinha o plano de ser deserdada, e daria um
jeito...
— Bom, sim. — Deu de ombros. — Estou tentando criar um
plano para uma vida boa para o nosso filho.
— E para você... — falei, e ela assentiu, como se lembrando
de que precisava importar – que ela importava.
Se ela soubesse, o quanto ela importava para mim. Um: ela
ficaria assustada. Dois: ela me acharia maluco. Três: facilmente me
chutaria.
— Qual o seu plano, Tyr?
Ela e suas perguntas inesperadas.
— Me casar com você, me mudar para qualquer lugar do
mundo que queira e esteja segura, adotar os seis gatinhos que
prometi a Terça, e tentar viver isso tudo sem medo... — admiti,
lembrando-me da minha lança, fincando-a ao lado do meu castelo,
que guardava o meu juramento.
— Não pensa em... em se apaixonar?
E mais uma vez, o inesperado.
— Não. — Fui honesto. Porque a realidade era: eu já estava. E
como contaria à dona daquele sentimento? Não tinha a mínima
ideia.
— É que falou sobre ser alguém que ama viver, se relacionar,
e até perdeu as contas de com quantas pessoas esteve... — falou, e
eu percebi o quanto ela guardava tudo em sua memória. — Eu sei
que vamos nos casar, mas não quero que isso seja um empecilho.
— Está me autorizando a me apaixonar, enquanto estivermos
casados? — perguntei, e ela assentiu, e percebi que tentava
transparecer a maior confiança possível. Para mim, aquilo era como
um soco no estômago.
— Eu sei que nosso casamento não vai durar para sempre,
apenas o tempo para que as coisas se assentem, e eu possa viver
segura com nosso filho, mas...
— Nós nem nos casamos e já está nos divorciando, jura? —
indaguei, e ela pareceu sem palavras. — Não pense demais nisso,
Isis. Não tenho plano ou desejo algum de me apaixonar por
alguém...
— Não é algo que se planeja... — olhei-a com cuidado. — Não
acredito no amor, mas não duvido que alguém como você possa ser
imune a ele.
— Alguém como eu?
— Alguém que as pessoas com certeza escolheriam.
— Você me escolheria? — rebati, e ela desviou o olhar,
negando. — Está pensando demais...
— É o mais tenho feito, todo o tempo — admitiu. — Não
quero machucar você, e não quero me machucar...
— E por isso está tentando se livrar de mim?
— Estou tentando não ter meu coração quebrado por você —
falou, e seus olhos pararam nos meus. — Eu tenho medo de que
você vá, e tenho que medo de que não volte. Tenho pesadelos em
que me despreza, e outros, em que simplesmente me deixa. Não
quero que isso se torne real, e que eu tenha que odiar alguém que
eu prezo tanto.
— Minha lança... — levei minha mão a dela, que entrelaçou
nossos dedos. — Obrigado por me contar e por ser sincera, mas eu
não vou a lugar algum. O meu real plano é continuar assim, com
você.
— Mas a vida, ela...
— Ela vai acontecer, e quem sabe, no meio dela, você possa
se apaixonar por mim? — rebati, e ela puxou sua mão da minha, de
imediato. — Sei que é assustador, mas por que não?
— Não nasci para amar, Tyr.
— Mas eu nasci para amar você... — falei na minha língua, e
limpei a garganta em seguida. — Quando eu fico nervoso, minha
língua natal sai — comentei, e agradeci internamente por fazer
aquilo, mesmo que sem querer. — O que disse é que...
Foi quando o som de um celular preencheu o ambiente, e era
o dela. Salvo pela chamada de algum anjo que os deuses mandaram
naquele instante, e eu não tivesse que criar histórias em volta do
que disse, e não ter que mentir para ela.
— É Freya.
Apenas assenti, e resolvi sair do jardim de inverno para lhe
dar privacidade. Ou quem sabe, tentar recobrar minha razão. Tudo o
que eu queria, era conquistá-la, não a assustar e fazê-la correr para
longe. E pelo jeito, eu estava fazendo tudo errado.
CAPÍTULO 40

ISIS
Eu mal consegui falar com Freya, tamanho o meu torpor.
Ele tinha mesmo dito o que eu ouvi? Eu realmente tinha
compreendido aquilo?
Eu me vi tentando entender o que tinha acontecido, mas nada
fazia qualquer sentido. Tyr tinha dito que nasceu para me amar? Eu
só podia ter confundido as palavras e me precipitado.
Era aquilo.
Eu tinha confundido tudo.
Fiquei um tempo apenas parada, encarando o lado de fora da
minha janela, e pensando se deveria digitar ou não no google o que
eu tinha escutado. Tomei coragem, e fui até minha mesa bagunçada.
Abri a última folha que restava no meu caderno, e escrevi a frase em
minha língua. Então, abri o dicionário da antiga língua deles, e fui
traduzindo palavra por palavra.
— Mas eu nasci para amar você...
Minha memória era assustadoramente boa, e, se fosse aquilo,
eu iria conseguir ler e ouvir exatamente o que ele disse, mais uma
vez. Porém, algumas palavras eram novas, e eu não tinha ideia da
pronúncia correta, por mais que tivesse uma ideia.
— Ok, eu só to confundindo tudo e...
Batidas na porta me fizeram dar um pulo no lugar, e fechei
rapidamente o caderno, pelo menos, pensei que o tinha feito.
Levantei-me e fui até ela, a abrindo. Encontrei Tyr do outro lado,
com um leve sorriso no rosto.
— Quer assistir um filme?
Sua pergunta me pegou desprevenida, e eu tentava agir
normalmente. Porém, eu estava presa às suas palavras, de horas
atrás, sem conseguir simplesmente seguir em frente e ignorar o
desespero em meu peito.
Eu não acreditava no amor, não porque ele não existia, mas
porque eu nunca tinha o visto acontecer. Contudo, e se, de alguma
forma, estivesse acontecendo à minha frente e eu não percebi? E se
eu estivesse me negando, por todo aquele tempo, a nomear os
meus próprios sentimentos pelo homem diante de mim?
— Você parece preocupada.
Não demorou para sentir o dorso da sua mão em minha testa,
como se estivesse vendo se eu tinha febre.
— Acho melhor chamar sua médica e...
— Não estou doente, eu só... — vi-me soltando o ar com
força. — Só queria que lesse algo para mim, na sua língua.
— Por que parece tão nervosa, Isis?
— Eu...
Soltei o ar com força.
— Por favor, Tyr.
Abri a porta do quarto, e me afastei, apontando-lhe a mesa,
fui até ela, abrindo o caderno, e seu olhar parou no meu.
— A última folha — instruí.
Ele então abriu onde pedi, vi seu corpo tensionar, e em
seguida, ele me encarou.
— Você entendeu o que eu disse, não foi? — indagou, e
percebi que eu estava segurando uma respiração. — Sua tradução
está correta, e... quer dizer exatamente isso, Isis.
— Que nasceu para me amar? — insisti, e ele assentiu.
— Eu quis dizer isso, mesmo que tenha saído sem querer —
admitiu. — Desculpe por... por te deixar ainda mais confusa,
envolvendo meus sentimentos, só que não posso mentir para mim e
muito menos para...
Vi-me levantando, indo até ele, e levei um dedo até a sua
boca, o calando.
— Pensei que tinha dito, que não se apaixonaria...
— Não pretendo me apaixonar, se já estou apaixonado por
você — falou, o seu olhar sendo desviado do meu. — Só não queria
te assustar ainda mais.
— Eu não estou assustada, Tyr. — Fui honesta. — Não me
lembro de em algum momento, sentir qualquer medo de você...
— Mas tem medo do que sente, e eu deveria ter sido mais
cuidadoso, e não me deixado ser tão claro, e...
— Como você sabe? — perguntei, em minha pura ignorância.
— Como sabe que pode me amar?
— Eu não posso, minha lança. — Olhou-me novamente. — Eu
já sinto isso.
— Mas... Eu não entendo.
— Acho que a gente não sabe que é amor, até estar bêbado
dele — falou, suas mãos segurando as minhas, e deixando-me ainda
mais perto. — Eu nunca me senti curioso sobre um cheiro. E nunca
arrisquei tão alto, uma missão que tinha, apenas para ajudar
alguém. Eu tenho medo de animais, mas não do que você escolheu
como nosso. E por isso, eu não pensei duas vezes em declarar uma
guerra, se fosse preciso, para te proteger. Eu sei das desculpas que
usei e da raiva que senti, mas o fato é que eu me agarrei à
oportunidade que tive, de poder ter você. — Eu estava totalmente
inerte. — Eu te contei segredos que ninguém mais sabe. Eu te dei
uma parte minha, que nem sabia que existia. Eu pedi para o meu
próprio deus que me desse a chance de viver isso, nem que por um
curto tempo, mesmo sem merecer... como um bom bêbado pelo
sentimento, só percebi que estava assim, quando já era tarde
demais, e não me importava a ressaca ou qualquer outra
consequência. Me importa estar perto de você, como um amigo que
pediu. Me importa poder olhar para você, e ver o seu sorriso
iluminar cada canto do meu peito. Me importa que eu nunca me vi
digno de construir uma família, mas faria tudo de novo, apenas para
ter isso com você.
— Eu não pensei que fosse possível — falei, senti meus olhos
marejados, e uma lágrima descer. E me lembrei do meu pedido à
estrela que caiu naquela noite, e senti os dedos dele no meu rosto,
limpando a bagunça que eu me tornava. — Eu pedi à estrela, que eu
tivesse a sorte de que fosse real... que eu pudesse ter um amor de
verdade, com você. Só não pensei que ela atenderia.
— Quando isso?
— Quando conversamos pela primeira vez, no jardim...
— Bom, devo dizer que desperdiçou esse pedido, porque eu já
te amava antes disso, mesmo não conseguindo reconhecer... — suas
mãos pararam em meu rosto, e levei as minhas ao dele. — E eu sei
que não temos a história mais normal ou natural para nos sentirmos
assim, mas tenho todo o tempo do mundo para que...
Eu sorri, prevendo que ele diria que me esperaria. Que ele
iria, com toda certeza, ser o que eu quisesse. E foi no instante em
que percebi que eu não queria oferecer aquela amizade a ele, ao
menos, não só ela. Eu queria, oferecer-lhe tudo. Cada parte minha
que ele já tinha tocado. Cada parte minha que ele ainda poderia
descobrir.
Meus lábios foram para os dele, e percebi seu choque inicial,
quando demorou para me corresponder, mas o fez, no segundo
seguinte. Senti o seu sorriso contra os meus lábios, e seus braços
me puxaram para ainda mais perto, em um beijo que me lembrava
do porquê toda aquela história começou, e da razão pela que eu
desejava que fosse verdade.
CAPÍTULO 41

TYR
Eu mataria para ter aqueles lábios como meus, só por mais
uma vez, e percebi o quão desesperado eu estava, quando ela se
afastou, puxando o ar com força, e sorriu contra meu peito.
— Eu acho que me empolguei... — admiti, sentindo meu rosto
queimar.
E ali estava mais um dos motivos que eu sabia que tinha
caído, ou melhor, simplesmente despencado por ela. Ela conseguia
fazer-me corar, sem sequer dizer uma palavra.
— Estamos mesmo fazendo isso? — perguntou, suas mãos em
meu pescoço, uma das minhas na sua barriga e outra em seu
quadril. — Estamos nos amando?
— Não posso responder por você, minha lança — falei, e
beijei sua testa com carinho. — Mas eu não tenho pressa alguma
para que tenha uma resposta sobre isso.
— E se eu disser que não sei como é o amor, mas que quero
me deixar senti-lo com você?
— Então, eu estarei aqui. — Afastei-me um pouco para olhá-
la. — A verdade é que isso é totalmente novo para mim também.
— E se eu disser que não posso fazer isso, porque tenho
medo de que estejamos confundindo as coisas?
— Então, eu continuarei aqui, e vou te provar, que da minha
parte, não há confusão alguma... — subi uma das mãos para o seu
rosto.
— E se eu disser que também sinto que amo, mas não faço
ideia de como fazer dar certo?
— Então, podemos descobrir isso, juntos. — Seu olhar estava
preso ao meu. — Não há nada que eu queira fazer, mais do que
explorar o que for que deseje.
— Devia ter feito outro pedido à estrela — falou, e eu a
encarei intrigado. — De não ter tanto medo em estragar tudo...
— Por que apenas não dança comigo e vamos deixar que as
coisas aconteçam?
— Da última vez, perdi a virgindade, acabei grávida, ganhei
um casamento, e me livrei da máfia em que nasci... — pontuou, e
eu amava o quanto ela conseguia ter uma língua tão esperta. — O
que acha que pode ser agora?
— Bom, arriscando que eu tenho uma péssima análise do que
é óbvio quando se trata de você... Acho que vamos dançar, nos
beijar, e se me permitir, eu vou me deitar ao seu lado da cama, e
ficar te olhando dormir por uma noite inteira...
— Só isso?
Sua pergunta veio seguida do seu rosto todo vermelho, e eu ri
alto. Somente ela, dentre tudo o que eu já conheci, conseguia me
tirar tais reações.
— Se quiser, posso ficar pelado também e...
Ela levou um dedo à minha boca, claramente sem graça, e eu
beijei a sua pele ali.
— Qual a sua aposta para o que vem a seguir, se aceitar essa
dança?
— De que vai me fazer amar você, para sempre.
Suas palavras tocaram no mais fundo do meu peito, e
encostei nossas testas, fechando os olhos, tamanha a sensação de
certeza que aquilo me trazia.
— Dance comigo, minha lança?
Pedi, afastando-me um pouco, e ela assentiu, os seus olhos
ainda fechados e eu fiz o mesmo, apenas a embalando comigo.
Solicitei uma música à inteligência artificial, que logo começou a
tocar. Porém, por mais que eu soubesse que me senti semelhante na
primeira vez que fizemos isso, eu tinha certeza de que agora era
muito maior.
Uma crescente, sem qualquer perspectiva de platô. Eu não
dançava apenas com a mulher que tinha me intrigado. Não. Eu
dançava com a mulher que eu amava, que carregava o meu filho no
seu ventre, e com quem eu me casaria.
O pequeno antigo eu, nunca estaria preparado para sentir o
medo que se alastrava por cada pequena fibra do meu ser, por estar
se dando aquela chance, de viver.
Senti algo se arrastar pelas minhas pernas, e o sorriso de Isis
contra o meu peito.
— Ela estava lá, quando tudo começou... — Isis falou, e eu
assenti, afastando-me para pegar a gatinha que miava e colocá-la
no meu ombro, onde ela facilmente se alojou.
— E acho que sabia o que estava fazendo, quando nos
juntou... — falei, e Isis levou uma das mãos à bolinha de pelos em
meu ombro.
— Obrigada por ser a nossa sorte, Terça-feira.
Sorri, ao ver que ela chamou a gatinha pelo nome que eu
tinha dado.
— Terça-feira, o dia que nos conhecemos, mesmo que não
soubesse... — falei, e sorri para ela. — Terça-feira, o nome da
gatinha, totalmente culpada por isso...
— Terça-feira, o dia da semana nomeado em homenagem ao
deus Tyr... — ela complementou, e como sempre, me surpreenderia.
— Eu acho que deveríamos nos casar em uma terça, só para não
perdermos a nossa tradição.
— Está escolhendo a data do nosso casamento, mesmo?
— Não pode correr agora, se é o que está pensando — falou,
e levou uma das mãos ao meu rosto. — Não quando temos muitas
terças para viver juntos, daqui para a frente.
— As minhas, pertencem todas a você, minha lança.
Ela sorriu, e eu desci meus lábios para os seus, como o selar
de uma promessa, que nenhum de nós imaginou que faria, mas era
a realidade. Porém, ela se afastou de repente, e vi-a arregalar os
olhos.
— Alexa, qual dia da semana é hoje?
— Boa noite, hoje é terça-feira...
Ela deu uma alta gargalhada, e jurava que nunca a tinha visto
de tal maneira. Eu era apenas o reflexo dela, enquanto admirava
cada traço do seu ser.
O fato era que não me importava em que dia estivéssemos,
nem mesmo quanto tempo se passasse, a única coisa que eu queria,
era poder estar ali, vivendo, ao lado dela. Ao lado deles.
O que eu nunca quis. O que eu não podia querer. No entanto,
se tornou tudo o que eu mais queria.
O que eu nunca desejei. O que eu não podia desejar. E no
fim, era, o real desejo para toda minha vida.
EPÍLOGO

ISIS
Eu tinha completado cinco meses, quando tudo ficou pronto e
a cerimônia seria realizada. Em uma terça-feira, de céu
aparentemente limpo por toda a tarde, e na praça em que tudo
começou. De todos os lugares do mundo, por mais que fosse
próximo ao que mais me destruiu, sabia que ali, foi onde eu tinha
me reconstruído.
Era o lugar certo, para então, firmar outro recomeço.
Olhei ao redor, todos os Hansen sentados nos bancos não
mais quebrados, e a fonte que tinha voltado a funcionar. Cortesia de
Tyr, que não fiz questão de perguntar como, mas tinha resolvido
aquilo rapidamente. Eu estava apenas estupefata, vendo Maia
parada, como minha madrinha, ao lado de Vidar. Ela tinha vindo. Ela
era a representante dos Ramesses ali. E eu sabia, que nunca mais,
deixaria que ela se afastasse.
Eu devia tudo aquilo a ela. A bondade que ela me entregou, e
me fez enxergar o mundo de uma forma que nunca pensei poder.
Foi então que meu olhar voltou para a cena que eu guardaria
viva na minha memória. Terça-feira Hathor Hansen, caminhando em
nossa direção, e trazendo consigo, as nossas alianças. Ou o que eu
pensava que eram, presas ao seu pescoço.
Tyr foi até ela, se abaixou, e fez um leve carinho, antes de
tirar o que estava preso ao pescoço dela, e voltar até mim. Vidar
tomou a frente, e foi até ela, pegando-a no colo, e eu jurava que
todos os outros Hansen estavam em completo choque com a cena.
Enquanto Maia, parecia estar adorando conhecer a gatinha
que adotamos. Na realidade, uma das. Tyr tinha cumprido sua
promessa, e antes de marcarmos a data, tínhamos feito da nossa
missão, encontrar os seis irmãos que faltavam para completarmos a
semana.
Eles estavam ali, em suas casinhas transparentes, mas
fechados, porque o fato era, que a maioria delas, não gostava de
absolutamente ninguém e muito menos, pessoas ao redor. Porém,
como queríamos que eles participassem, demos um jeito para que
fosse confortável para todos.
Minha mente vagava, enquanto Tyr segurava minha mão, e
meu coração batia freneticamente. A realidade, era que eu mal
conseguia prestar atenção na cerimônia em si, ansiosa para falar a
ele, sobre o que escondia há alguns dias.
Era quase impossível, esconder algo da pessoa que conseguiu
ver o mais cru do seu ser. Da pessoa, que tornou os meus banhos
rápidos e assustados, em um momento para relaxar, e permitir-me
sentir. A confiança de estar dentro de um lugar, fechado e não ter
medo de nada. Por mais que os meus demônios viessem, em
pesadelos no meio da noite, os braços de Tyr também estavam lá,
para afugentá-los, e me fazer lembrar de que nós lutávamos um
pelo outro.
Nós escolhemos aquilo.
— Eu não sou de discursos bonitos, porque guardo todos
apenas para você... — ele falou, abriu a caixinha com as alianças, e
então vi apenas uma, que era detalhada como uma lança, mas
parecia grossa demais para o meu dedo. — Essa é a minha, porque
a sua, esteve aqui, o tempo todo, te esperando...
Foi então que ele me entregou a caixinha, levou a mão ao
colar em seu pescoço e o tirou. Fez um sinal com a mão para que eu
me virasse, quando senti o contato da prata contra o meu pescoço,
e o pingente de lança bem ali, que eu sabia, pelo que ele mesmo me
contou, que foi a primeira coisa que encontrou em sua ilha, no
castelo, e desde os dezesseis nunca o tinha tirado.
Agora, ele me entregava.
Virei-me para ele, e simplesmente não me importei com
qualquer outra formalidade. Meus lábios foram para os seus, e ele
sorriu no beijo, enquanto eu deslizava a aliança pelo seu dedo anelar
esquerdo.
— Acho que já podem nos declarar casados... — ele falou
alto, logo ouvimos palmas ao redor, e o pobre do cerimonialista
parecia ter desistido. — Oi, minha esposa.
— Oi... — falei, e levei minha mão à sua, que estava sobre
minha barriga. — Eu não escrevi votos bonitos, mas tenho uma
surpresa... — seu olhar parou no meu, intrigado. — É um menino...
Erik Hansen. — Ele perdeu totalmente a compostura, e vi-o cair de
joelhos à minha frente. — Eu pensei que a nossa vidinha pudesse
levar o nome daquele que permitiu, que toda a nossa vida
acontecesse...
De repente, eu estava uma bagunça de lágrimas, ouvia os
gritos de Freya, assim como os de Loki e Malena. Sorri sozinha,
enquanto Tyr beijava minha barriga, e eu sabia, que aquele não era
a primeira terça-feira das nossas vidas, mas eram com certeza, umas
das que jamais esqueceriam.
Como uma lembrança bonita que eu olhava emocionada, após
me casar com o pai do meu filho, e descobrir que a liberdade
poderia ser sinônimo de amor. E como ele, nunca, jamais, poderia
ter sido apenas uma lembrança.
BÔNUS

VIDAR
De tanto julgar a obsessão do meu irmão, eu estava fazendo
o trabalho dobrado para acompanhar um pedido da obsessão dele.
Olhei de relance, novamente, vendo que a situação parecia pior do
que a última vez. Eu não podia me intrometer. Eu estava ali apenas
pela segurança dela, uma ordem direta.
Contudo, a cada vez que eu via o mal que o homem à frente
da mulher indefesa diante dele fazia, mais ódio eu acumulava para
descontar nele.
— Pode apenas me deixar e às crianças, nós...
— Cale a boca. — A voz de Akhmu Ramesses reverberou pelo
salão. Enquanto eu apenas o via humilhar a esposa, novamente, na
frente das amantes e dos próprios filhos. — Não serviu para gerar
nenhum deles e ainda acha que vai me deixar só porque colocaram
a porra de um segurança para você.
Eu não me mexi, parado ao lado dela, que estava de joelhos
diante do marido.
— Isis vai pagar o que quiser, em barras de ouro e...
— E onde estão as barras? — ele rebateu, rindo alto. — Não
se pode confiar em um Hansen... — seu olhar parou em mim, mas
eu estava mais ocupado, encarando a mulher caída ao meu lado. —
O cachorro de guarda da minha irmãzinha não morde? — ele
provocou, e parei meu olhar no dele. — Vem aqui e fica protegendo
a amiguinha dela, que quase destruiu os Ramesses, e agora...
— Seria inteligente, aceitar o ouro que eu trouxe — falei,
cansado de toda aquela situação. — Antes que tudo esteja perdido
para vocês, Ramesses...
— Está me ameaçando?
— Não, estou comprando sua esposa e cada um dos seus
filhos, e espero nunca mais ter que ver a sua cara.
— Pensei que não falasse tanto.
— Não aja como se me conhecesse — rebati. — É a oferta
final, ou pega o ouro agora e os livra, ou eu vou levá-los, sem que
receba nada...
Só não imaginei que perante a minha fala, depois de semanas
acompanhando aquele caos, ele simplesmente cederia. Venderia a
esposa e os cinco filhos, por algumas barras de ouro. E de repente,
eu passava de segurança pessoal de uma desconhecida, para aquele
que teria que escondê-la em minha ilha.

Continua...
NOTA II

E aqui estamos!!!
Eu nunca me cansaria de falar mais e mais sobre eles e
todas as terças-feiras que partilharão. Porém, ainda temos três
Hansen para dar as caras e acredito que ficou óbvio quem será o
próximo... De toda a bagunça que a máfia egípcia podia trazer,
quem diria que Vidar se envolveria justamente com a esposa do
herdeiro dela, e mais... a compraria.
Mas isso fica para maio...
Agora, quero dizer a vocês que SIM, quero muito trazer os
bônus dos Hansen, retratando tudo o que vem depois que eles se
acertam. Acho que é uma extensão que deveria existir sempre rs.
Então, se estiver animada como eu, pelos outros deles, e por eles,
não se esqueça de deixar sua avaliação aqui na Amazon e me
acompanhar nas redes sociais.
Obrigada de todo coração por dar uma chance a eles
Obrigada por acompanharem Tyr, Isis, Terça-feira e a sua
vidinha!
Obrigada por dar uma chance ao meu trabalho e sonhos,
que eles levaram consigo...
Espero que até o próximo Hansen, e quem sabe, uma
brasileira para derreter o coração que Vidar entregou há muito
tempo a outra pessoa...

Com amor,
Aline
UMA FILHA PARA O MAFIOSO QUE NÃO ME AMA

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Um ditado que caiu com dor em seu colo: Baldur que amava Hari
que amava Kalel que amava Lea que amava Baldur.
Ele, um dos primeiros no comando da máfia escandinava.
Ela, uma traidora que condenou um homem de uma máfia rival.
Ele, precisa dela para descobrir o que aconteceu.
Ela, se torna uma prisioneira, dentro de um castelo em uma ilha.
Ele, acaba se envolvendo com Lea.
Ela, acaba tendo uma filha com o mafioso que não a ama.
UM FILHO SURPRESA PARA O CEO

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Ela, uma das herdeiras da máfia escandinava.
Ele, um homem comum, CEO de uma empresa no Brasil.
Eles se conheceram em uma praia.
Eles se apaixonaram nesse mesmo lugar.
Ela, simplesmente desapareceu.
Ele, descobre que ela pertence a máfia.
Ela, foi embora da vida dele, grávida.
Ele, depois de dois anos, tem uma surpresa ainda maior: o próprio filho.
REJEITADA & CASADA COM O MAFIOSO QUE NÃO ME AMA

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Anastasia que se apaixonou por Thor que se apaixonou por Irina que é a
irmã gêmea de Anastasia.
Ele, o terceiro no comando da máfia escandinava.
Ela, a gêmea substituta e escondida da herdeira da máfia russa.
Ele, se apaixona pela irmã gêmea dela.
Ela, tem o seu coração totalmente quebrado por ele.
Anos depois, Thor assume o lugar do irmão mais velho, em um casamento
por contrato com a herdeira da máfia russa.
Já Anastasia, assume o lugar da sua gêmea, em um casamento por
contrato com o homem que a rejeitou no passado.
Tudo o que menos esperava, aconteceu: ela foi rejeitada e agora está
casada com o mafioso que não a ama.
USADA & NOIVA COM O MAFIOSO QUE NÃO ME AMA

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Malena que se apaixonou por Loki que se apaixonou por Irina que estava
grávida.
Ele, oito anos mais velho.
Ela, a irmã mais nova do seu melhor amigo.
Ele, o herdeiro da máfia escandinava.
Ela, a mais nova de uma família que serve a máfia.
Ele, a vê como uma irmã mais nova.
Ela, apaixonada por ele desde os dezesseis anos.
Ele, apaixonado pela herdeira da máfia russa.
Tudo o que menos esperava, aconteceu: ela teve que calar seus
sentimentos e ainda ser usada para assumir um noivado de mentira com o
mafioso que não a ama.
Torres-Reis-Kang-Esteves

UMA GRAVIDEZ INESPERADA


Família Torres – Livro 1

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma pedra, no
meio do caminho de Maria Beatriz, sempre teve Inácio. O herdeiro da
fazenda que fica ao lado das antigas terras de sua família, tornou-se um homem
bruto e fechado, que quando aparece na sua frente, ela já sabe que só pode ser
problema ou alguma proposta indecorosa. Maldito peão velho!
Inácio Torres é um homem de poucas palavras, mas que vê em uma
mulher tagarela, a oportunidade perfeita. Mabi precisa de dinheiro, ele o tem. Ele
precisa de um casamento falso, e ela é a escolha perfeita. Porém, a única coisa
que recebe de Mabi, como sempre, é uma negativa. Maldita criança sonhadora!
No meio das voltas que a vida dá, uma noite de prazer os marca. E a
consequência será muito maior que o arrependimento: UMA GRAVIDEZ
INESPERADA.
CEO INESPERADO – meu ex-melhor amigo
Família Torres – Livro 2

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Se nem tudo que reluz é ouro, Júlio é apenas a melhor imitação de
pedra preciosa em que Babi colocou os olhos.
O seu ex-melhor amigo, a abandonou e quebrou seu coração quando eram
adolescentes. Bárbara Ferraz jurou a si mesma que nunca mais o deixaria ficar
perto. Maldito CEO engomadinho!
Júlio Torres sabe que deixou uma parte de si para trás. Sua ex-melhor
amiga o odeia e ele, muitas vezes, teve o mesmo sentimento por si. Maldita
sombra!
Júlio sabe que não pode mais ignorar, porque ele não quer apenas a sua
melhor amiga de volta, ele a quer como sua.
Babi foge dele como o diabo foge da cruz. Entretanto, como fugir se
depois do reencontro e finalmente os pratos limpos, ela se descobre
grávida do seu ex-melhor amigo?
O BEBÊ INESPERADO DO COWBOY
Família Torres – Livro 3

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Se existe amor à primeira vista, Abigail Alencar e Bruno Torres
compartilham o completo oposto. Abi o detestou desde o primeiro momento,
e com o passar dos anos, o sentimento permaneceu. Bruno é o típico cowboy
cafajeste, arrogante e popular, de quem ela não suporta a presença um segundo.
A cidade pequena sabe de seu desgosto e desinteresse no mais novo dos
Torres, porém, ele sempre pareceu ficar ainda mais animado em confrontá-la. Se
existe algo sobre Bruno que ela conhece bem, é que ele não foge de um desafio.
Assim, quando Abi o encontra como babá da sua filha de apenas um ano,
ela só consegue pensar que ele quer algo. Bruno jura que está ali apenas para
tirá-la do sério, como sempre, mas tudo acaba por mudar, naquele exato instante.
Existe uma linha tênue entre o amor e o ódio... eles estarão
dispostos a cruzá-la?
FELIZ NATAL, TORRES
Família Torres – Livro Extra

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
O Natal parou de ser uma data festiva, e tornou-se dolorosa, assim que
Maria Beatriz perdeu os pais. No entanto, nesse ano, tudo mudou e ela vai lutar
para que essa data seja ressignificada. Que ela possa sorrir, o tanto quanto, um
dia fez, no passado. Assim, ela precisa que tudo saia PERFEITO.
Uma árvore de Natal destruída, enfeites perdidos pela casa, a ceia que não
vai chegar a tempo, um desmaio...
Será que ela terá o seu Feliz Natal ao lado dos Torres?
Esse é um conto natalino, narrado na visão de Mabi e Inácio (do livro Uma
Gravidez Inesperada), onde você poderá passar essa data tão especial ao lado da
Família Torres.
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O VIÚVO
Família Torres – Livro 4

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Olívia Torres sempre teve em mente que para bom entendedor
meia palavra bastava. Assim, quando se apaixonou perdidamente e descobriu
que o homem com o qual se envolveu era casado, o seu mundo perdeu o chão.
Ela apenas foi embora, sem olhar para trás.
Contudo, com Murilo, ela nunca pôde parar de olhar. Ainda mais, quando
descobriu que estava grávida.
Murilo Reis perdeu tudo. Nunca pensou, que em algum momento,
poderia voltar a sentir algo. Entretanto, bastou um olhar para Olívia, para ele
compreender que ainda existia uma chance. Chance essa, que se perdeu por
completo, quando ela o deixou.
Anos depois e uma coincidência do destino, Murilo descobre que não
apenas as lembranças daquele amor de verão permaneceram, mas sim, que ele
tem uma filha.
Um amor de verão pode ser o amor para a sua vida?
GRÁVIDA DO CEO QUE NÃO ME AMA
Família Reis – Livro 1

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
O triste é que aquele velho ditado se tornou real em sua vida:
Valéria que amava Tadeu, que amava Bianca, que amava Murilo, que não
amava ninguém. Desde que seus olhos pousaram em Tadeu Reis, Valéria se
apaixonou. Não sabia dizer se era pelo olhar escuro enigmático, o sorriso que ela
queria tirar daqueles lábios cerrados ou o fato de ele ser tão atencioso com quem
amava.
Porém, Tadeu apenas tinha olhos para outra mulher, e Valéria escondeu
aquele sentimento no fundo de sua alma, tentando matá-lo durante os anos que
se passaram. Uma coincidência do destino, os coloca frente a frente. Ela sabe que
ele é errado, mais do que isso, uma grande mentira, porém, seu corpo não resiste.
E uma noite com o homem errado não é o fim do mundo, certo?
Para ela, tornou-se um outro começo, já que terá uma parte dele consigo,
para sempre. Valéria está grávida do homem que não a ama. E não pretende
deixá-lo descobrir.
O CASAMENTO DO CEO POR UM BEBÊ
Família Reis – Livro 2

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Águas passadas não movem moinhos – era o que Lisa repetia a
si mesma. Contudo, estar sempre tão próxima do único homem que realmente
se apaixonou, fazia com que ela quisesse voltar, e na verdade, se afogar com
ele. Igor Reis era um erro, e ela sempre soube.
Ainda assim, não podia evitá-lo para sempre, já que seus círculos de
amizades eram tão próximos. Então, era apenas isso: Igor era um amigo. Um
ótimo fofoqueiro e uma pessoa para perder horas conversando – mesmo que
quisesse perder muito mais.
Todavia, quando ele bate na sua porta no meio da madrugada com um
bebê a tiracolo, ela não sabe o que de fato está acontecendo. Porém, nada é
tão ruim que não possa piorar, e ele a pede em casamento.
Nas voltas que a vida dá, Lisa se vê com o sobrenome Reis, um bebê
para chamar de seu e um contrato de casamento por um ano com o homem
que ama.
Até onde o casamento do CEO por um bebê será uma mentira?
A FILHA DO VIÚVO QUE ME ODEIA
Família Reis – Livro 3

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Os opostos se atraem.
Carolina Reis queria jurar que isso estava errado, mas não pôde evitar a
forma como seu corpo reagiu ao cowboy bruto e grosso que, literalmente,
atravessou o seu caminho. Franco era uma incógnita, com um chapéu de cowboy
escuro e uma expressão tão dura, que lhe fazia indagar se ele em algum momento
sorria. Bruto insensível!
Franco Esteves não tinha tempo para perder, muito menos, com uma
patricinha mimada que encontrou sozinha no meio da estrada. Porém, não
conseguia evitar ajudar alguém, mesmo que este parecesse ser no mínimo uma
década mais novo, com olhos claros penetrantes e um sorriso zombeteiro. Diacho
de madame!
O que era para ser apenas um esbarrão no meio do nada, torna-se uma
verdadeira tortura, quando Carolina assume, por coincidência a função de tutora
da filha do cowboy. Ele só quer evitá-la. Ela só quer irritá-lo. No meio do ódio e
atração que lhes permeiam, uma adolescente se torna um vínculo que eles não
podem evitar.
Mas até onde ela será a única a uni-los?
GRÁVIDA EM UM CASAMENTO POR CONTRATO
Família Reis – Livro 4

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma
pedra, no meio do caminho de Nero, sempre teve Verônica. A
matriarca dos Reis era uma mulher que intimidava a qualquer um, e
ele nunca conseguiu entender uma reação dela. Quando ela estava à
sua frente, ele sabe que tudo o que deve fazer é correr para a
direção oposta.
Verônica Reis é uma mulher que nunca demonstra o que
sente. Sendo assim, praticamente impossível desvendar o que se
passa em sua cabeça, e muito menos, em seu coração. Contudo,
sempre lhe intrigou o fato de que Alfredo Lopes – ou apenas Nero
para os demais – parecia querer enfrentá-la em uma simples troca
de olhares, e nunca a temer.
No meio das voltas que a vida dá, um contrato de casamento
é o que os une. O que ela e muito menos eles esperavam, era que
no único momento que deixassem a guarda baixar, teriam algo
maior do que o arrependimento para lidar: UMA GRAVIDEZ EM
UM CASAMENTO POR CONTRATO.
UM CASAMENTO DE MENTIRA PARA O CEO
Família Fontes – Livro 1

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Nas voltas que a vida dá, Talita e Gael se encontram dizendo “sim”
no altar.
A rejeição à frente de várias pessoas foi o que Talita Kang vivenciou aos
dezessete anos, quando Gael Fontes a recusou e humilhou abertamente sobre o
possível noivado dos dois.
Porém, como o carma nunca falha, tudo o que o herdeiro dos Fontes
necessita quinze anos depois, quando retorna para recuperar a empresa da
família, é justamente um casamento por contrato.
O que ele não esperava era que justamente a mulher que quebrou seu
coração seria a candidata perfeita, e mais, que ela o escolheria novamente.
Ele a humilhou por um casamento por contrato.
Ele precisa dela agora, pelo mesmo motivo.
Talita se apegou a esse contrato pela sua família, e por uma promessa que
apenas ela pode cumprir. Mas nada lhe impede de se divertir com a infelicidade do
homem que estará preso nessa mentira com ela. Entre o carma, uma rede de
mentiras e corações partidos, até que ponto um casamento por contrato
significará apenas isso?
GRÁVIDA DO COWBOY QUE NÃO ME AMA
Família Esteves – Livro 1

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Ter um ditado como aquele sendo uma realidade, depois de tanto
tempo, apenas fazia Guta duvidar se realmente queria tal casamento.
Augusta que amava Juan, que amava Pâmela, que amava Franco, que
amava Carolina, que felizmente, o amava de volta.
Deixada sozinha em casa, após finalmente ter o homem que amava da
forma que sempre desejou, Guta parou de se questionar do que era necessário
para que aquele casamento fosse real, e aceitou que o amor de Juan Esteves
nunca seria seu.
Ela então o deixa para trás, e com ele, todo o sonho do primeiro amor que
agora ela jurou que esqueceria. Contudo, o que ela não esperava, depois de tanto
tempo, era que criaria algum laço real com ele.
Guta apenas quer os papéis do divórcio e distância, mas se
descobre grávida do cowboy que não a ama.
UMA FILHA INESPERADA PARA O CEO
Família Esteves – Livro 2

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Júlia Medeiros sempre pensou que para bom entendedor, meia
palavra bastava. Entretanto, ela não sabia o que entender, quando o homem
para o qual se declarou, a abandonou na cama, na companhia de um chapéu. Ela
só não tinha ideia do que mais acabou ficando para si.
Oscar Esteves sempre lutou por sua família, e seus irmãos eram seu
mundo, contudo, os olhos bonitos da mulher que o encantou desde que a encarou
pela primeira vez, sempre vagavam em suas memórias.
Anos depois e uma coincidência do destino, Oscar descobre que aquele
amor não resultou em apenas lembranças que ele não conseguia tirar da mente,
mas também, em uma filha.
UMA FILHA INESPERADA NA MÁFIA
Família Esteves – Livro 3

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma pedra, no
meio do caminho de Flávio, sempre teve Dove Kang.
Ele, um cowboy de sorriso fácil e cheio de piadinhas.
Ela, uma mafiosa que sorri apenas de forma calculada.
Ele, não pode evitar a atração que sente.
Ela, adora ver a forma como o homem mais novo a teme.
O que nenhum deles imaginou é que no meio desse caminho que os une,
surgiria uma filha inesperada.
GRÁVIDA DO MAFIOSO QUE NÃO ME AMA
Família Kang – Livro 1

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
O ditado que ela não queria ter como uma realidade, mas era:
Hari que amava Kalel que amava Lea que não amava ninguém.
Ele, conhecido com o diabo da máfia Kang.
Ela, a mulher apaixonada por ele desde os dezoito anos.
Ele, se apaixona por outra, mas acaba na cama dela no fim da noite.
Ela, acorda sozinha na cama, com a notícia de que ele abandonou a
máfia.
Hari apenas quer seguir em frente após ser usada, porém se descobre grávida
do mafioso que não a ama.
REJEITADA POR UM MAFIOSO
Família Kang – Livro 2

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
E quando você se apaixona por um mafioso?
Ele, o segundo no comando da máfia Kang.
Ela, dez anos mais nova e que não confia em ninguém.
Ele, tenta ajudá-la de todas as maneiras a se abrir.
Ela, tenta vê-lo apenas como um irmão, mas acaba falhando.
Hinata se apaixona por um mafioso, só não esperava que seria rejeitada por ele.
UMA FAMÍLIA INESPERADA PARA O MAFIOSO
Família Kang – Livro 3

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Sara Hernández ficou viúva aos vinte e dois anos, com uma filha de
quatro anos, e fará de tudo para protegê-la. Até mesmo, se casar por contrato
com um homem estrangeiro, que pertence à máfia mais respeitada e temida.
Chae Kang está no México por uma razão: se responsabilizar pela máfia
da sua família e fazer o Cartel se reerguer. Ele só não esperava encontrar algo
além do seu objetivo e trabalho: uma família inesperada.
UMA GRAVIDEZ INESPERADA PARA O MAFIOSO
Família Kang – Livro 4

adquira o seu clicando aqui

SINOPSE
Se no meio do caminho de algumas pessoas tem uma pedra, no meio do
caminho de Paola, sempre teve Vincenzo Kang.
Ele, o chefe da máfia mais temida e respeitada.
Ela, à venda para um contrato de casamento desde que nasceu.
Ele, um homem que vive apenas para os irmãos e pelo seu legado.
Ela, uma mulher que tenta se livrar do fardo do seu sobrenome.
Nas brincadeiras que o destino lhes prega, os dois sempre se encontram.
Porém, o que nenhum deles imaginava era que em algum momento seriam de
fato unidos, e ainda mais, que seria por UMA GRAVIDEZ INESPERADA.
Junqueira-Dias

UM NAMORO DE MENTIRINHA COM O CEO

Clique aqui para acessar o livro


Sinopse
Iara Junqueira acreditou ter encontrado o cara certo. Porém, tudo
muda de figura, quando ela descobre que na verdade, não passou de uma aposta
para ele. O que ela menos imaginava era que naquele exato o momento, Caio
Vieira, o homem que ela mais evitava e que era seu inimigo número um, faria a
proposta mais descabida possível para ajudá-la a se vingar: um namoro de
mentirinha.
UMA FAMÍLIA DE MENTIRINHA COM O COWBOY

Clique aqui para acessar o livro


Sinopse

Helena Junqueira apenas aceitou que nunca encontraria o cara certo.


Porém, tudo muda de figura, quando ela viaja a trabalho para o interior e acaba
sendo literalmente atropelada por um garotinho em uma bicicleta. O que ela
menos imaginava era que em algum momento, se autointitularia a madrasta dele
e a falsa namorada do seu pai, e eles formariam uma família de mentirinha.
UMA GRAVIDEZ DE MENTIRINHA COM O VIÚVO

Clique aqui para acessar o livro


Sinopse

Sabrina Junqueira tinha apenas um objetivo: cuidar e proteger suas


irmãs. O que ela menos imaginava era que em algum momento, estaria de frente
com o único homem que conseguiu chegar até o seu coração a ponto de quebrá-
lo, e que após uma mentirinha de nada, ela se descobriria grávida dele.
UM CASAMENTO DE MENTIRINHA COM O COWBOY

Clique aqui para acessar o livro


Sinopse

O que todo casamento de verdade tem que ter?


Os noivos, claro. Quem se importa e amamos, para se celebrar. Surpresas
especiais, com toda certeza. E uma pequena confusão, para jamais ser esquecido.
Mas, é possível um casamento de mentirinha ter tudo isso?
REJEITADA & GRÁVIDA DO VIÚVO QUE NÃO ME AMA

Clique aqui para acessar o livro


Sinopse

Quando uma noite com o cara que sempre sonhou se torna um pesadelo?
Eliana não acreditou, quando teve a chance de ter o homem que sempre
desejou, literalmente em suas mãos, mesmo que por poucas horas. Contudo, ela
ficou ainda mais incrédula, quando se descobriu grávida dele.
O que ela não esperava era que aquela história terminaria muito antes de
qualquer começo: com ela grávida e rejeitada pelo viúvo que não a ama.

Você também pode gostar