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Karl Poper – A sociedade aberta e seus inimigos

a civilização ainda não se recuperou de todo do choque de seu nascimento, da transição da


sociedade tribal, ou “sociedade fechada”, com sua submissão às forças mágica, para a sociedade
aberta, que põe em liberdade as faculdades críticas do homem. p. 8

o choque dessa transição é um dos fatores que tornaram possível o surgimento daqueles
movimentos reacionários que tentaram, e ainda tentam, derrubar a civilização e retornar ao
tribalismo. p. 8

Foi Heráclito o filósofo quem descobriu a ideia de mudança. Até então, os filósofos gregos,
influenciados por ideias orientais, encaravam o mundo como um vasto edifício, de que as coisas
materiais constituiam o material de construção […] O aspecto que ele introduziu foi o de que não
havia tal edificio, não havia estrutura estável, nenhum cosmos. “O cosmos, no melhor dos casos, é
como uma pilha de entulhos reunidos ao acaso”, eis um de seus ditos […] “tudo está em fluxo e
nada está em repouso”, eis o lema de sua filosofia. p. 13

Platão acreditava que a lei da degeneração envolvia a degeneração moral. A degeneração política
depende, a seu ver, principalmente da degeneração moral (e de falta de conhecimento); e a
degeneração moral, por seu turno, deve-se principalmente à degeneração racial. p. 18

Platão bem pode ter acreditado que também o advento do ponto cósmico da reviravolta poderia
manifestar-se na vinda de um grande legislador, cujos dotes de raciocínio e cuja vontade moral
fossem capazes de encerrar esse período de decadência política. De qualquer modo, ele certamente
acreditava na possibilidade que temos de paralisar mais ampla corrupção no campo político,
detendo qualquer mudança política. p. 18

Platão encara a história, que para ele é uma história de decadência social [aristocracia – oligarquia –
democracia – tirania], como se fosse a história de uma doença: o paciente é a sociedade; e o
estadista deveria ser um médico – um curador, um salvador. p. 28

A transição para a tirania, diz Platão, é mais facilmente produzida por um líder popular que saiba
explorar o antagonismo de classe entre ricos e pobres dentro do estado democrático e que consiga
organizar um corpo de guarda ou exército privado, seu. O povo, que o saudou a princípio como o
campeão da liberdade, é logo escravizado; e a seguir deve lutar por ele, “em uma guerra após outra,
que ele deve provocar… porque precisa fazer o povo sentir a necessidade de um general”. p. 29

descobrirá ele [Platão] a lei sociológica de que a desunião interna [da elite], a guerra de classes
fomentada pelo antagonismo dos interesses econômicos de classe, é a força impulsionadora de todas
as revoluções políticas. p. 30

insiste ele que só a sedição interna dentro da própria classe governante pode enfraquecê-la tanto que
seja possível a derrubada de seu regime. p. 30

Criação e educação [na pólis aristocrática de Platão] não são símbolos vazios, mas, como as armas,
instrumentos do regime de classe, necessários para assegurar a estabilidade desse regime. p. 33

são tratadas por Platão exclusivamente sob esse aspecto, a saber, como poderosas armas políticas,
como meios úteis para arrebanhar o gado humano e unificar a classe dirigente. p. 33

uma das características da atitude mágica de uma sociedade tribal primitiva, ou “fechada”, é a de
que ela vive num círculo encantado de tabus imutáveis, de leis e costumes considerados inevitáveis
como o nascer do sol, ou o ciclo das estações, ou similares e evidentes acontecimentos regulares da
natureza. p. 36

o ponto de partida do “monismo ingênuo” é a etapa em que a distinção entre as leis naturais e
normativas ainda não foi feita. p. 37

o dualismo crítico assevera que as normas e leis normativas podem ser feitas e alteradas pelo
homem, e mais especialmente por uma decisão ou convenção no sentido de observá-las ou alterá-
las, sendo portanto o homem moralmente responsável por elas. p. 38

o naturalismo biológico tem sido usado não só para defender o igualitarismo, como também para
sustentar a doutrina anti-igualitária do domínio dos fortes. p. 42

à luz da nossa análise sobre a impossibilidade de basear normas em fatos, esse resultado não é
inesperado. P. 43

deve-se admitir que certas formas de comportamento podem ser descritas como mais “naturais” do
que outras formas; por exemplo, andar nu ou comer apenas alimentos crus; e certas pessoas julgam
que isso por si mesmo justificam a escolha dessas formas. Mas, nesse sentido, não é certamente
natural interessar-se alguém por arte, pela ciência ou mesmo por argumentos em favor do
naturalismo. p. 43

a escolha da conformidade com a “natureza” como padrão supremo leva, em última análise, a
consequências que poucos estarão preparados para enfrentar; não conduz a uma forma de
civilização mais natural, mas à bestialidade. p. 43

o naturalismo espiritual pode, em problemas práticos, unificar-se com o positivismo, a despeito de


sua oposição tradicional. E essa forma de naturalismo é realmente tão ampla e tão vaga que pode ser
usada para defender qualquer coisa. Nada jamais ocorreu ao homem que não possa ser proclamada
como “natural”; pois, se não estivesse em sua natureza, como lhe poderia haver ocorrido? p. 44

baseia-se em nosso temor de admitir que a responsabilidade pelas nossas decisões éticas é
inteiramente nossa e não pode ser desviada para ninguém mais, nem Deus, nem a natureza, nem a
sociedade, nem a história. Todas essa teorias éticas [naturalismo, positivismo etc] tentam encontrar
alguém, ou talvez algum argumento, que retire de nós essa carga. p. 45

os inimigos da liberdade sempre acusaram de subversão os que a defendem. E quase sempre


conseguiram persuadir os sinceros e bem-intencionados. p. 52

eis a teoria coletivista, tribal, totalitária da moralidade: “É bom o que é do interesse de meu grupo,
ou de minha tribo, ou de meu estado”. p. 62

o totalitarismo não é simplesmente amoral. É a moralidade da sociedade fechada, do grupo, da


tribo; não é o egoísmo individual, mas é o egoísmo coletivo. p. 62

“Cuidar da virtude é função de um estado que realmente merece esse nome”, diz Aristóteles. Se
tentarmos traduzir essa crítica na linguagem das exigências políticas, veremos que esses críticos [do
protecionismo liberal] querem duas coisas. Primeiro, desejam tornar o estado um objeto de
adoração (…) A segunda exigência é política. Na prática, essa exigência significaria simplesmente
que os funcionários do estado deveriam preocupar-se com a moralidade dos cidadãos e usar seus
poderes não tanto para proteger a liberdade dos cidadãos quanto para controlar-lhes a vida moral. p.
64
em outras palavras, é a exigência de que o reino da legalidade, isto é, das normas impostas pelo
estado, seja aumentado à custa do reino da moralidade propriamente dita, vale dizer, das normas
impostas, não pelo estado, mas pelas nossas próprias decisões morais, pela nossa consciência.
Poderia arguir-se contra essa exigência o fato de aparentemente não se darem conta, aqueles que a
proclamam, de que sua adoção representaria o fim da responsabilidade moral do indivíduo,
terminando por destruir a moralidade, em vez de aprimorá-la. Com efeito, a responsabilidade
pessoal seria substituída por tabus do tipo moral e pela irresponsabilidade totalitária do indivíduo. p.
65

IMPÉRIO E PRIMEIRA REPÚBLICA. sabemos pelas teorias sociológicas de Platão que o estado,
uma vez estabelecido, continuará a ser estável enquanto não houver brecha na unidade da classe
dominante. p. 82

a educação filosófica de Platão tem uma função política definida. Assinala os governantes e ergue
uma barreira entre governantes e governados. (Isto permaneceu como uma função saliente da
educação “superior” até em nossos próprios dias.) p. 83

esteticismo, isto é, ao desejo de construir um mundo que não só seja um pouco melhor e mais
racional do que o nosso mas que seja livre de toda a feiura deste; não um estofo maluco, um velho
traje mal remendado, mas uma veste inteiramente nova, um mundo novo realmente belo. p. 91

esse entusiasmo estético só se torna valioso quando refreado pela razão, por um sentimento de
responsabilidade, por um impulso humanitário a prestar ajuda. De outro modo, será um entusiasmo
perigoso, passível de desenvolver-se em alguma forma de neurose ou histeria. p. 91

essa atitude irracional, que nasce de uma embriaguez de sonhos de um mundo belo, é o que chamo
de Romantismo. Pode procurar sua cidade celeste no passado ou no futuro, pode pregar a “volta à
natureza”, ou a “marcha para um mundo de amor e beleza”; mas apela antes para as nossas emoções
do que para a razão. p. 92

“ele nos restituirá nossa natureza original, curar-nos-á e tornar-nos-á felizes e abençoados”
PLATÃO.

A força dos movimentos totalitários, o antigo como o novo, repousa no fato de que eles tentavam
dar resposta a uma necessidade muito real, não importa quão mal concebida possa ter sido essa
tentativa. p. 94

esta tensão, esta inquietação é uma consequência do desmoronamento da sociedade fechada [tribal].
É ainda sentida mesmo em nossos dias ['mal estar da civilização'], especialmente em tempos de
mudança social. É a tensão criada pelo esforço que a vida em uma sociedade aberta e parcialmente
abstrata continuamente exige de nós, - pelo afã de ser racionais, de superar pelo menos algumas de
nossas necessidades sociais emocionais, de cuidar de nós mesmos e de aceitar responsabilidades. p.
97

do lema desse movimento [espartano, contra a democracia ateniense]: “voltemos ao estado de


nossos antepassados”, ou “voltemos ao nosso antigo estado paterno”, deriva-se o termo “patriota”.
p. 100

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LIVRO 2
*

Merleau Ponty - Signos

A história tira ainda mais daqueles que tudo perderam, e dá ainda mais àqueles que tudo tomaram.
Pois a prescrição, que tudo envolve, inocenta o injusto e indefere as vítimas. A história nunca
confessa. p. 5

o sensível e precisamente aquilo que, sem sair de seu lugar, pode assediar mais de um corpo. p. 11

a milagrosa multiplicação do sensível faz com que as mesmas coisas tenham a força de ser coisas
para mais de um, e que algumas delas - os corpos humanos e animais - nao tenham somente faces
ocultas, que seu "outro lado" seja um outro sentir avaliado a partir de meu sensível. p. 11

Ditas por quem? Dltas a quem? Nao por urn espirito a urn espirito, mas por urn ser que tern corpo
linguagem a urn ser que tern corpo e linguagem, cada urn dos dots puxando 0 outro por fios
invislveis Como aqueles que sustentam as marionetes, fazendo 0 outro falar, fazendo-o pensar,
fazendo-o tornar-se aquilo,que e, e que 'nunca teria sido sozinho. p. 13

Dlz-se que ha urn muro entre nos e os outros mas é um muro que fazemos juntos: cada qual coloca
a sua pedra no vao deixado pelo outro. p. 13

0 Mundo comunicativo nao e urn feixe de consciencias paralelas. as tra~os se confundem e passam
urn pelo outro formando uma unica esteira de "dura~ao publica" p. 13

Caisa alguma, lado algurn da coisa nao se mostra senao ocultando ativamente as outras,
denunciando-as no ato de encobri-Ias. Ver e, por princIpio, ver rnais do que se ve, e ter acesso a urn
ser de latencia. p. 14

A LINGUAGEM REAÇA “só é compreendida mediante a interação dos signos, que considerados à
parte são equívocos ou banais, e apenas reunidos adquirem sentido” p. 25

DEFESA METODOLÓGICA. a vaivem dos fatos as ideias e das ideias aos fatos e desacreditado
como urn processo bastardo - nem ciencia nem filosofia - que retira dos cientistas a interpretac;ao
final dos fatos que contudo eles mesmos coletaram, e compromete a filosofia com os resultados,
sempre provisorios, da pesquisa cientffica... p. 57

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parei na 58

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