A Jornalista e o Mafioso - Valeria Veiga - Cleaned

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Contents

Prólogo
Capítulo 01
Capítulo 02
Capítulo 03
Capítulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48
Capítulo 49
Capítulo 50
Capítulo 51
Capítulo 52
Capítulo 53
Capítulo 54
Capítulo 55
Capítulo 56
Capitulo 57
Capitulo 58
Capitulo 59
Capitulo 60
Copyright © 2023 Valéria Veiga

Capa designer gráfico: Lana Tyler


Ilustrador: Júlio Cesar Draw Arts

Ilustração feita especialmente para o livro A Jornalista e o Mafioso

Proibida a reprodução total ou parcial da ILUSTRAÇÃO, de qualquer forma


ou por qualquer meio, mecânico ou eletrônico, incluindo fotocópia e
gravação, sem a expressa permissão da autora.

Diagramação: Valéria Veiga


Beta: Camila Canteiro
Revisão: Larissa Lago

Texto em conformidade com as normas do NOVO ACORDO


ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA (Decreto Legislativo Nº 54
de 1995).

Todos os direitos reservados.

Proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por


qualquer meio, mecânico ou eletrônico, incluindo fotocópia e gravação, sem
a expressa permissão da autora. A violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei nº 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
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Olá!
Bem-vindos de volta ao caos da minha mente acelerada, que escreve
sem roteiro, conhecendo cada personagem à medida que eles vão se
apresentando e me ajudando a contar suas histórias.
Não esperem por personagens perfeitos.
Eu não sou perfeita.
Você que está lendo também não é… todos erramos num dia,
acertamos no outro, e erramos de novo.
Não sei escrever personagens perfeitos, que não erram nunca, acima
do bem e do mal, virtuosos em qualquer situação, compreensivos o tempo
todo, que sempre têm o discurso e atitude correta na hora certa.
Escrevo pessoas que se apaixonam, que odeiam, que pulam de
alegria e choram de raiva. Que são fortes e inseguras dependendo da
ocasião.
Escrevo mocinhas que são românticas, empoderadas, donas de si,
infantis, maduras…eu por exemplo sou tudo isso daí. Sou tão doce quanto
sou barraqueira. Então, escrevo mocinhas assim, com várias nuances
dependendo do dia e do que acontece dentro das suas vinte e quatro horas.
E os mocinhos, não vou mentir, prefiro os badboys aos nerds. Me
julguem! Na vida real eu fujo dos que causam problemas, mas nos romance
corro de encontro a eles.
Sentiu o caos da minha mente?
Eu amei escrever esse livro. Amei retornar a esse universo que já
conheço tão bem que parece que faz parte do meu dia a dia.
Como é bom rever meus mafiosos e minha mocinhas superpoderosas.
Mas não foi fácil, e foi a base de muito energético para ficar
acordada, alguns quilos na balança porque não paro de comer enquanto
escrevo, lugares que deixei de ir, noites sem dormir direito…, mas quer
saber? Valeu muito a pena e espero que vocês gostem do livro, porque cada
linha escrita aqui foi pensando em entregar o melhor para vocês.
Divirtam-se com Enzo e Raissa! Eles vão fazer vocês rirem, passar
raiva, chorar, sonhar, se apaixonar… tudo junto e misturado da forma que
vocês já sabem que eu amo escrever.
​Beijos, Val
AVISO NÚMERO 01:
Esse livro é um spin-off da série Sweet Risk.
Ele pode ser lido de forma completamente independente e fora de ordem por
se tratar de uma nova história, mas, caso você não queira pegar spoilers,
você pode ler os outros livros da série que estão disponíveis aqui no Kindle
Unlimited

AVISO NÚMERO 02:


Os personagens desse livro são mafiosos.
Eles são assim e ninguém irá mudar isso.
Apesar dos personagens dos meus romances de máfia serem cadelinhas, eles
também são assassinos, quebrados, matam sem sentir remorso, têm prazer
em torturar os seus inimigos, seguem regras e respiram caos e adrenalina.
As mulheres da máfia desse livro são assim também, ou seja, elas podem
estar dando um beijo de boa noite nos seus filhos, ou apertando o gatilho e
matando seus desafetos.

AVISO NÚMERO 03:


Esse livro NÃO É DARK.
Você NÃO VAI ENCONTRAR neste livro arco de redenção para quem
abusa ou agride uma mulher.

AVISO NÚMERO 04:


Se você gostar de um romance onde tudo pode acontecer, cheio de plots,
muita emoção, hot de milhões e um casal apocalíptico então esse livro é para
você.
APESAR DE NÃO SER UM LIVRO DARK PODE CONTER
GATILHOS NORMAIS DE UM LIVRO DE MÁFIA, COMO:
VIOLÊNCIA, TORTURA, ABUSO, SEQUESTRO, CONSUMO DE
ÁLCOOL E DROGAS ILÍCITAS.
Prólogo

Muito antes da Lei Sarah Cooper que foi criada para proteger as mulheres
da máfia, elas sofriam caladas dentro dos seus lares. Elas não tinham o
direito de falar, de expressar os seus desejos, eram tratadas como
reprodutoras, como enfeites nas festas e como objetos dentro de casa.

A violência fazia parte de suas vidas, elas aguentavam todo tipo de


abuso e humilhação, a maioria delas achava que isso era normal, já que
cresciam dentro das muralhas de uma sociedade secreta, machista, criminosa
e que tinha suas próprias leis.

Porém, um ditado conhecido dentro desta Instituição nunca falha:


Quem nasce na máfia, morre na máfia.
Capítulo 01
Raissa
San Francisco – Estados Unidos

O dia amanheceu cinzento em San Francisco, e uma névoa cobria as ruas


da cidade. Passei no Peet's Coffee e comprei um café e um bolinho de
banana integral como eu fazia todas as manhãs e fui para casa mergulhar nas
minhas anotações e pesquisas sobre a máfia.

Se a minha editora pensava que eu passaria a vida inteira fazendo


matérias sobre moda ou encontros perfeitos, ela estava muito enganada!

Eu quero, sim! Falar sobre mulheres, mas com o tema


empoderamento! Não aqueles sobre os quais todo mundo escreve em
revistas e redes sociais; na verdade, quero abordar um que cause muito
falatório — a Máfia das Mulheres, criada por Sarah Cooper.

Liguei meu computador e comi um pedaço do bolinho de banana,


suspirando por ele estar delicioso e desfrutando do silêncio da minha casa.

Há quinze dias eu tinha me mudado para esse estúdio e estava feliz


por finalmente morar sozinha. Eu amava as minhas amigas, mas não
conseguia focar no meu futuro como jornalista por viver em um apartamento
com quatro amigas que entravam e saíam o tempo todo, falavam alto e
sempre queriam me levar para a balada.

Tudo bem que eu ainda saio com elas quase todas as noites, mas,
pelo menos, eu tenho as manhãs livres e silenciosas para escrever, à tarde,
vou bater meu ponto na revista onde eu trabalho há dois anos.

Eu abri as minhas anotações na mesa e li a minha pesquisa sobre


Sarah Cooper.

​ arah Cooper se casou com o CEO Ryan Cooper quando tinha vinte e três
S
anos.

No dia do casamento, o Senhor Cooper sofreu um atentado que o


deixou em coma por alguns meses, e sua esposa assumiu a empresa da
família.

Ao mesmo tempo, de forma inédita, Sarah Cooper também tomou a


frente da parte ilícita da família e passou a chefiar a Máfia Americana e a
enfrentar os homens dessa sociedade secreta, machista e criminosa.

Com o passar dos anos, sua amiga Nina se tornou a Senhora Cosa
Nostra ao se casar com Lorenzo Cosa Nostra, da Máfia Siciliana.

O exemplo de Sarah começou a virar uma espécie de lenda na


máfia, e mulheres como a do Capo da Cosa Nostra, Isabella Cosa Nostra,
e a do Chefe da Bratva, Irya Mikhailova, passaram a se rebelar.

Juntas, elas fundaram a Máfia das Mulheres e criaram a Lei


Sarah Cooper, que visava impedir a violência sofrida pelas mulheres da
Instituição.

I​ nvestiguei tudo sobre crimes e lavagem de dinheiro, temas que, mesmo


depois de alguns julgamentos ao longo dos anos, sempre foram arquivados
por falta de provas.

Eu não queria falar desse lado da máfia, que todos conheciam e


passavam pano, e sim da Máfia das Mulheres, que nunca nenhum homem
citou nos artigos dos grandes jornais.

Ninguém da revista acreditava que eu conseguiria uma matéria


diferente de tantas outras feitas por vários jornalistas, sobre a máfia, que
abordava sempre tráfico de armas, drogas ou lavagem de dinheiro.

Na verdade, a minha editora deu uma gargalhada quando eu disse


que queria escrever sobre esse assunto e ameaçou me demitir, dizendo que
não tinha tempo para colunistas que sonhavam com pautas que não tinham
sido solicitadas.

Esse artigo, com certeza, mudaria a minha vida. Eu tinha o sonho de


ser respeitada entre os jornalistas, de trabalhar em uma grande revista, e, ser
quem sabe, chefe de redação, ou escrever um artigo que fosse lido e
discutido pela sociedade.

Eu não seria mais aquela que ninguém percebia na editora, que ficava
sozinha em sua mesa escrevendo artigos sobre relacionamento, enquanto as
pessoas passavam correndo em busca de novas notícias.

Queria muito mais e tinha certeza de que estava pronta para


conquistar o meu lugar no mundo.

∞∞∞

— Meu Deus! Olha esse site de celebridades! A Senhora Stanford


está em San Francisco para o lançamento da nova coleção de lingeries da
Mademoiselle, o evento que eu vou cobrir esta noite! — falei para Luanne,
que era minha amiga desde a faculdade e com quem eu dividia o meu
apartamento antigo e trabalhava na revista.

— Até onde sei, essa coleção é da cunhada dela, Bella Stanford, irmã
do seu marido, Noah Stanford; logo, não vejo novidade nenhuma nisso —
Luanne respondeu com certo desdém, e, apesar da nossa amizade, eu sabia
que em termos de trabalho ela era bem competitiva, mas não me dar força
em algo importante, sendo que éramos amigas, já era demais para mim.

— Você não tem visão das coisas! Pensa comigo: eu não quero ser
uma jornalista que cobre eventos de moda, e sim que escreve artigos
polêmicos, que geram questionamentos e que me levem a concorrer ao
Pulitzer Awards.

— E o que a Senhora Stanford tem de tão importante que te levaria a


ganhar esse prêmio?

— Anne Cooper Stanford, a CEO da Cooper Enterprise, é filha de


Ryan e Sarah Cooper, que todos sabem que são da máfia. A Senhora Cooper
fundou a Máfia das Mulheres e acabou com a violência que existia contra
elas nos clãs das famílias da Instituição.

— Você só pode estar ficando louca, Raissa! Anne Stanford é a CEO


da empresa da família por um motivo: ela não se envolve com esses assuntos
dos quais, na verdade, ninguém tem prova.

— Não se envolve, mas comanda uma empresa que é usada para


lavar dinheiro da facção criminosa da família, que fica encoberta devido aos
agrados que oferecem aos políticos e empresários!

— E qual o grande plano? Você vai chegar perto da CEO e falar:


“Olá, será que você me concederia algumas palavras sobre a Máfia das
Mulheres para uma matéria sobre o empoderamento das mafiosas?”.

— Hummm… gostei da ideia!

— Raissa, você vai ser expulsa do evento e perder o seu emprego!


Por favor, nem pense em se aproximar dessa mulher hoje à noite!
— É a minha chance! Ela tem esse casamento moderno com o
marido, que fica aqui cuidando da empresa Stanford, enquanto ela fica em
Los Angeles cuidando da Cooper. Ela e o Senhor Stanford se encontram nos
fins de semana e raramente vão a algum evento. É hoje ou nunca! — falei e
entrei no banheiro para tomar um banho e me preparar para a noite do
evento, que, com certeza, mudaria a minha vida.

​ Tudo bem, “Senhora eu faço o que me vem à cabeça”! Estou indo para

casa e nos vemos mais tarde no evento — Luanne disse e saiu; já eu fiquei
pensando em como me aproximar de Anne Stanford.

∞∞∞

Meu coração estava disparado devido à minha ansiedade com o


evento. Para ir a ele, escolhi um vestido lindo e elegante, justo, azul-escuro,
que ficava na altura dos meus joelhos. Passei uma maquiagem leve e com
tons pastéis e, por último, coloquei uma sandália nude com salto. Peguei
então a minha bolsa, o meu celular, a chave do meu carro e um casaco, já
que as noites em San Francisco eram geladas nessa época do ano, e em
seguida fui para o desfile da nova coleção da Mademoiselle.

O evento aconteceria no Palácio de Artes, do outro lado da cidade, e


eu precisaria me apressar para não chegar atrasada por conta do trânsito
pesado.

— Onde você está, Raissa? — o fotógrafo da revista me perguntou


assim que atendi à sua chamada no meu celular.

— Estou chegando. Em dez minutos, conforme o GPS está


marcando. E não se preocupe que eu chamei um Uber, porque de carro eu
perderia muito tempo procurando alguma vaga para estacionar, o que a gente
sabe que é o maior problema de San Francisco, além do trânsito, é claro.

— Tudo bem! Eu vou fazer umas fotos do local até você conseguir
chegar. Não demora!
— Não depende de mim! — falei enquanto olhava pela janela a fila
de carros parados no sinal e respirei fundo, sabendo que os dez minutos só
aumentariam com o tráfego parado.

Eu estava de olhos fechados, tentando me desligar de tudo para não


me estressar, quando o motorista me informou que já estávamos no Palácio
das Artes. Saí correndo do carro, apressando-me em pegar a minha
credencial e mostrando-a para o segurança que estava na porta.

— Até que enfim, Raissa! — Theo, o fotógrafo da revista, falou


assim que me viu, fazendo sinal para que eu me juntasse a ele e a Luanne,
que já estavam sentados esperando o desfile começar.

— Eu pensei que fosse ter que deixar de escrever para o meu blog e
te substituir no artigo da revista — Luanne disse, referindo-se ao meu atraso.

Além de trabalhar comigo na revista, Luanne tinha um blog de moda


e era constantemente convidada como influencer para os eventos.

— Amiga, eu posso estar atrasada, mas não perderia por nada esse
evento!

— Sei bem por que você está tão animada, Raissa, mas não se
esqueça de escrever sobre o desfile porque a revista te enviou para isso —
ela falou, chamando minha atenção. — Você pode sonhar com um artigo
bombástico, mas não esqueça o que paga as suas contas, “Senhorita eu quero
morar sozinha”!

Luanne não se conformava com o fato de eu ter me mudado e de elas


terem que procurar outra pessoa para dividir as despesas. Logo, ficava me
lembrando o tempo todo de que, a partir de então, eu tinha aluguel para
pagar sozinha.

— Eu não vou esquecer, até porque você me lembra disso todos os


dias...

Luanne me olhou como se eu fosse uma mal-agradecida, sendo que


ela não ficava falando isso para me ajudar, e, sim para me alfinetar. Então
dei de ombros, porque Luanne era minha amiga e apesar desse seu jeito que
às vezes me irritava, eu gostava muito dela.

Nesse momento, as luzes se apagaram, e as modelos vestindo saias


de tule neon contrastando com as lingeries de cores pastéis subiram na
passarela. As peças da nova coleção da Mademoiselle estavam lindíssimas, e
eu queria comprar todas.

Theo, por sua vez, não parava de fotografar, enquanto eu e Luanne


contemplávamos as modelos e ficávamos deslumbradas com tanta
delicadeza e perfeição.

O desfile levou cerca de trinta minutos, que contou com o show de


uma banda formada só por mulheres, deixando o evento com um tom de
empoderamento.

A Mademoiselle pertencia a uma mulher que criava peças íntimas


femininas lindíssimas. O diferencial, com certeza, foi o fato de dar espaço
em um evento desse porte para uma banda até então desconhecida, formada
por jovens que estavam mandando muito bem no palco e que certamente
ganhariam espaço na mídia.

No coquetel servido após o encerramento do desfile, todos os


convidados ganharam brindes. Também tinha um painel para fotos, e todos
estavam postando suas imagens nas redes sociais. Aproveitei para falar sobre
o desfile no Instagram da revista, fiz muitos stories e, no dia seguinte
postaria com detalhes tudo sobre o evento.

Por um momento, comecei a circular entre os convidados e vi Anne


Cooper Stanford, ao lado da sogra, Aby Stanford, que estava sorrindo
orgulhosa com a nova coleção apresentada por sua filha, Bella. Nesse
instante, eu me enchi de coragem e me aproximei das duas, apresentando-me
e falando o que eu queria antes de ser enxotada pelos seguranças.

— Boa noite! Eu me chamo Raissa e sou da Revista Women Style


que veio cobrir o evento da nova coleção da Mademoiselle. Estou
escrevendo um artigo sobre mulheres. Na verdade, vou ser sincera: quero
escrever algo diferente, uma linha de artigo que não seja relacionada à moda,
mas juntando mulher, empoderamento e ousadia. Pensei em uma matéria
sobre a Máfia das Mulheres e queria saber se a senhora aceitaria conversar
comigo — sugeri, e Anne olhou para a sogra e depois para mim.

— Estou em um evento com a minha família e não vim dar


entrevistas, principalmente sobre um assunto que a mídia insiste em falar e
que já se provou na justiça ser um equívoco — Anne disse, e sua voz era
doce e, ao mesmo tempo, firme. — A minha mãe é uma mulher forte, que
não abaixa a cabeça para homem dizer qual o seu lugar. É isso o que eu
posso te falar sobre ela. Quanto à máfia, você encontra informações no
Google; eu não tenho nada a ver com esse tema.

— Eu não estou julgando, só quero falar sobre a máfia de outro


ângulo. Não quero falar de tiros, de extorsão, e sim da vida das mulheres na
máfia, que…

— Raissa... é esse o seu nome?

— Sim!

— Não existe outro lado da máfia! Seja a máfia dos homens, seja a
das mulheres, tudo vai ser sempre sobre tiros, explosões, extorsões e
alianças. A vida das mulheres da máfia pode mudar em relação à violência
doméstica, mas nem por isso a máfia vai deixar de ser a máfia. Se você quer
escrever sobre essa sociedade, não faça isso deixando parecer que ela é
glamourosa, como nos filmes e nos romances. Também não queira nunca
conhecer toda a verdade ou saber como ela pode ser sombria,
independentemente da Máfia das Mulheres, que, segundo falam por aí
começou com a minha mãe, Sarah Cooper. Se você quer escrever sobre a
máfia, fale dela como ela realmente é: sombria, criminosa, cruel e letal.

Após falar isso, Anne saiu caminhando ao lado da sogra e me deixou


sozinha com o ar preso nos pulmões. Talvez ela não soubesse, mas seu tom
de voz nos paralisava e nos deixava com medo de respirar mais alto perto
dela.

“Sombria, criminosa, cruel e letal” foi a forma como ela se referiu à


máfia, inclusive à das mulheres, deixando-me ainda mais curiosa pela
realidade dessa sociedade do submundo.

Nessa hora, Luanne me chamou e eu despertei dos meus


pensamentos sobre a máfia e contei a ela sobre minha conversa com Anne
Cooper, ressaltando que ela não quis falar comigo. Sabia que não despertaria
a curiosidade de Luanne para um artigo que eu queria escrever, mas não
sabia mais por onde começar.

Anne disse que, se eu fosse falar sobre a máfia, não deveria ser com
glamour, deixando claro que violência doméstica não era tudo que a mulher
sofria na máfia, assim como a Máfia das Mulheres não era apenas sobre
como defender as mulheres.

Por fim, voltei para casa pensando na vida na máfia enquanto o


motorista do Uber dirigia pelas ruas silenciosas do meu bairro em San
Francisco. Ali, fora do horário do rush podia se ouvir até o som de uma folha
caindo da árvore.

À noite, meu sono foi agitado, e sonhei que estava ao lado de Sarah
Cooper atirando em alguns homens. Porém, no lugar de acordar assustada,
eu me dei conta de que parecia tudo normal para mim.

Sempre achei que eu era um pouco sangue-frio, mas sonhar que


estava na máfia e acordar como quem havia sonhado que estava passeando
em um jardim existia uma grande diferença.

“Quem é você, Raissa O’Brien?”, eu me perguntei enquanto fazia


minha higiene matinal.

Meus pais eram advogados e supertranquilos. Meus avós paternos


faleceram quando meu pai ainda era criança, e eu não os conheci, mas os
maternos, meu Deus, eles eram uns fofos e apesar da minha avó ser muito
calada e reservada, graças ao meus conselhos hoje ela tem um canal de
culinária russa no YouTube.

Eu não sabia a quem tinha puxado para ser tão destemida,


independente e sangue-frio, como dizia a minha mãe, que era sempre
repreendida pela minha avó por não gostar que ela falasse que eu tinha essas
características na minha personalidade.
Capítulo 02
Raissa

​Cheguei à revista do mesmo modo como em todos os outros dias, com meu
artigo pronto e desanimada por ele não ser aquilo que eu realmente queria
escrever. Mesmo assim, eu me enchi de coragem e fui procurar minha
editora para expor novamente a ela as minhas ideias sobre um artigo com
mais conteúdo.

​ Exatamente sobre o que você quer escrever, Raissa? Você fala em máfia,

empoderamento, mas não fecha um artigo que realmente te leve a esse
prêmio que você tanto quer conquistar. Não adianta você falar sobre a Máfia
das Mulheres, porque isso será uma especulação, uma vez que você não vai
ter como provar nada. Então, por mais interessante que seja, continuará
sendo apenas uma história como outras tantas que temos por aí nos livros de
romance.

​— Eu não tinha pensado por esse ângulo.

​ Claro que não! Você foi tentar entrevistar Anne Cooper Stanford,

querendo dela não algo para um artigo, mas a confissão de um crime! Sim,
porque confirmar a Máfia das Mulheres é assumir que sua família faz parte
de uma facção criminosa. Se você quer falar sobre um tema secreto,
perigoso, bombástico, tem que vivenciar isso, pesquisar, mergulhar de
cabeça.

​— Você está sugerindo que eu entre para a máfia?

​ Eu não acho que seja algo tão simples se tornar mafiosa em uma

sociedade fechada e secreta — minha chefe falou, rindo. — O que eu sugiro
é que você pense no que quer para a sua vida como jornalista e busque por
isso, senão vai passar a vida escrevendo artigos dos quais não gosta e
reclamando todos os dias.

​ Posso tirar uns dias para descansar e pensar nisso tudo, reciclar minhas

ideias e decidir o que eu quero fazer?

​ Você tem duas semanas para isso, Raissa. Aproveite esse tempo e busque

por algo que você realmente tenha vontade de escrever, porque aqui na
revista o espaço que temos para você é esse de moda e assuntos que sejam
de interesse das mulheres, como algo que possa ajudá-las a ganhar espaço no
mercado de trabalho, se protegerem de alguma coisa que seja perigosa, se
defenderem de assédio... E o resto é realmente moda e beleza, que toda
mulher gosta, você sabe, é o foco da nossa revista.

​ pós essa conversa, deixei a revista e fui caminhando para casa, decidida a
A
encontrar algo que eu pudesse escrever, ou então já poderia me considerar
desempregada. Na minha mente, as palavras “sombria e letal” iam e vinham,
e eu sentia que elas me seriam úteis de alguma forma.

​ omo meu aniversário de vinte e três anos seria em três dias, resolvi fazer
C
uma surpresa: visitar a minha família na Filadélfia e ficar hospedada na casa
dos meus avós. Lá eu teria tranquilidade para pensar em algo que se tornaria
o meu próximo artigo.

∞∞∞

Acordei cedo, com o meu celular vibrando, e, quando atendi à


ligação, eram os meus avós cantando parabéns para mim em russo como eles
faziam todos os anos, e reclamando pelo fato de eu nunca ligar para eles ou
aparecer na Filadélfia para visitá-los.

Quando desligaram, voltei a dormir, mas o celular vibrou de novo;


dessa vez, eram os meus pais me dando parabéns e reclamando, dizendo que
eu era uma filha que se um dia desaparecesse eles não ficariam sabendo,
porque seria algo normal eu não atender o celular ou responder as suas
mensagens.
Depois de uma rodada dupla de parabéns e queixas pelo meu jeito
distante de ser, cobri o meu rosto com o edredom e voltei a dormir, mas só
por cinco minutos porque alguém tocou a campainha da minha casa e bateu
à porta como se estivesse fugindo e precisasse entrar logo para se esconder.

​ Parabéns, amiga! — Luanne desejou e me entregou flores, vários balões e



um cupcake com uma vela acesa. — Você achou que se mudando estaria
livre de mim na manhã do seu aniversário?

​ u dividia o apartamento com Lia, Luanne, Clara e Thalia antes de me


E
mudar, e, nas manhãs dos nossos aniversários, era justamente Luanne quem
sempre nos acordava cheia de balões coloridos e cantando parabéns.

​ De verdade, achei que você não atravessaria a cidade tão cedo para me

dar parabéns! Obrigada! — agradeci, abraçando a minha amiga.

​ Você não dá notícias, demora dois dias para responder às mensagens, não

atende ao celular, mas eu te amo, sua metida!

​ Nossa! Meus avós, meus pais, minha amiga... todo mundo reclamando

que eu não dou a mínima para ninguém! É que eu…

​ Está focada no seu trabalho. Todo mundo sabe disso! Só que hoje nós

vamos sair para comemorar o seu aniversário!

​ Você enlouqueceu! Perdi praticamente o meu emprego, e tudo que eu



quero é ficar aqui deitada com a minha sofrência.

— Vamos, Raissa! Não é o fim do mundo ficar desempregada! Com


o seu talento, não demora, e você já estará em outra revista! Hoje não é dia
de pensar nisso! Vamos comemorar o seu aniversário!

— Luanne, eu não estou no clima de ir para um clube dançar.

— Amiga, estamos te chamando para comemorar seu aniversário em


um lugar super maneiro, badalado, e você nem se anima? Pode saber que as
meninas vão ficar tristes porque todo mundo confirmou presença. E,
também, está na hora de você conhecer alguém, transar, porque deve ter um
ano que você não faz sexo e já deve até ser virgem de novo!
Eu não estava nem um pouco a fim de sair, mas dei um suspiro
derrotado e parei de argumentar com ela. Por fim, aceitei o convite para
comemorar o meu aniversário com as minhas amigas.

— Tudo bem! Vamos a esse clube, mas é bom que seja muito bem
frequentado e que eu arrume alguém para transar! — falei, brincando, e ela
balançou a cabeça concordando e sorrindo para mim.

Eu não queria conhecer ninguém ou me envolver, porque o meu foco


era conseguir escrever um artigo que me projetasse e me fizesse progredir na
minha carreira. Então qualquer relacionamento, mesmo que não fosse sério,
sempre acabava me distraindo de alguma forma.
Capítulo 03
Raissa

Faltava uma hora para as meninas me buscarem, e eu ainda ia começar a me


arrumar. Fiz, na verdade, tudo no modo automático: tomei banho, sequei o
cabelo, finalizei a maquiagem com um batom vermelho, coloquei meu
vestido preto que tinha uns brilhos e era super justo marcando as minhas
curvas, calcei um salto nude, peguei minha bolsa, meu celular e desci na
hora exata em que o carro com as minhas amigas parou em frente à minha
casa.

— Você está linda! — as quatro falaram ao mesmo tempo, dando


gritinhos e cantando parabéns para mim.

Depois seguimos para o clube, e, quando chegamos, Luanne foi falar


com o segurança que nos deixou entrar sem precisar ficar na fila.

— O que você disse para ele? — perguntei, desconfiada.

— Nada demais, só que é o seu aniversário, que você pediu de


presente encontrar um gato para transar e que, se demorar para entrar na
boate os mais hots podem não estar mais disponíveis.

— Sua doida! — falei, rindo, e, quando entrei não acreditei que


tinham homens sarados dançando no palco e mulheres fazendo pole dance
no meio da boate.

— Que lugar é esse? Amei! — eu falei enquanto caminhava em


direção ao bar.
Nossas outras amigas já estavam lá nos esperando, então passamos a
ser um grupo de dez mulheres solteiras comemorando o meu aniversário.

— Olha só! Nossa aniversariante finalmente chegou! — Thalia


anunciou, e todas bateram palmas, chamando atenção das pessoas à nossa
volta.

— Os shots que me pediram! — o barman apareceu com uma


bandeja contendo vinte e uma doses de tequila e colocando-a sobre o balcão
do bar.

— Dois para cada e três para você — uma delas falou, e olhei para as
malucas das minhas amigas e levantei o meu copo.

— No três, começamos a virar! — Thalia sugeriu, e a contagem


começou.

Juntas, tomamos os nossos shots, que desceram rasgando goela


abaixo; no meu último, elas começaram a cantar parabéns.

Em seguida, fomos para a pista de dança e ficamos dançando por


algum tempo até que voltamos para o bar e repetimos a rodada de vinte e um
shots de tequila.

Dessa vez, quando tomei o meu último shot, elas começaram a cantar
parabéns de novo, e Luanne estava segurando um bolo de aniversário em
formato de pênis, com velas acesas.

Ao ver isso, ri alto, sem me importar se estava chamando atenção ou


não, e soprei as velas, fazendo um pedido: que eu conseguisse a matéria que
me daria o Prêmio Pulitzer.

Por um momento, olhei para o balcão do bar e vi um homem sentado,


tomando um copo de whisky e me observando com um brilho diferente nos
olhos. Ele sorriu para mim, e, talvez pelo álcool e pelas brincadeiras as quais
sugeriam que eu precisava transar um fogo se acendeu no meu corpo.

— O primeiro pedaço do bolo é seu, Raissa! — Luanne falou, rindo,


e eu coloquei minha boca no bolo e arranquei um pedaço, enquanto o
homem me olhava e minhas amigas riam horrores.

— Vamos dançar! — Thalia sugeriu e começou a abrir caminho entre


as pessoas para chegarmos à pista de dança, que estava lotada.

Nesse momento, fechei os meus olhos, e foi como se eu estivesse


sozinha ali, movendo sensualmente os meus quadris de um lado para outro,
enquanto balançava os meus braços para o alto, seguindo o ritmo da música.
Eu ignorei o fato de a pista estar lotada e com todos se esbarrando porque
estava me sentindo plena e feliz.

Em seguida, senti braços fortes envolverem a minha cintura, mas


continuei a movimentar o meu quadril independentemente do atrito que eu
sentia entre a minha bunda e algo duro que eu bem sabia do que se tratava.

Com certeza, os vários shots, associados aos drinks que bebemos


antes de entrar na boate, quando paramos em um bar que ficava na esquina,
deixaram-me ainda mais desinibida. Sendo assim, não me importei com mais
nada e me entreguei ao momento.

O desconhecido esfregava sua ereção nas minhas costas e deslizava


até a minha bunda, deixando-me louca. Então, do nada, ele me virou de
frente para si, e percebi que era o mesmo homem que estava me olhando
quando comi o primeiro pedaço do bolo.

Logo depois, ele começou a beijar o meu pescoço e a dar leves


mordidas, até alcançar a minha boca e começar a me beijar e me segurar de
forma possessiva.

— Você é linda e capaz de enlouquecer qualquer homem! — ele


falou e me chamou para ir até o bar, oferecendo-me uma bebida.

Eu aceitei, é claro, mas primeiro disse que precisava ir ao banheiro


mencionando que ele poderia me surpreender escolhendo o meu drink.

Nessa hora, eu me lembrei da minha mãe dizendo para eu nunca


aceitar bebida de estranhos e ri sozinha enquanto caminhava até o banheiro.
Sabia que Luanne viria atrás de mim para saber das novidades e
avisei que provavelmente eu teria companhia na volta para casa, ignorando
os avisos da minha mente pelo fato de o homem ser um total desconhecido.

Quando voltei para o bar, minha bebida esperava por mim, e amei o
que ele pediu: uma marguerita!

Depois o puxei novamente para a pista de dança. Para me sentir


menos doida, eu me apresentei dizendo que o meu nome era Raissa. Ele
então falou que se chamava Johnny. Após as apresentações, tive a sensação
de flutuar na pista e, do nada, fiquei pulando como se estivesse num show de
rock.

​ Amiga, para de beber, porque você está dançando que nem doida! —

Thalia falou, e comecei a rir, sentindo-me estranha, como se a voz dela
estivesse em outra frequência.

Johnny falou que seria bom eu comer alguma coisa e que podíamos
sair para procurar algo aberto. Nesse momento, não saberia dizer por que
simplesmente saí caminhando e puxando-o pelo braço. Eu me despedi
acenando para as minhas amigas que já estavam acompanhadas na pista de
dança, e fui embora com o meu date desconhecido.

​ u não sabia o que estava acontecendo, porque não era fraca para bebida,
E
mas estava me sentindo bem tonta. Falei para Johnny que eu queria ir
embora e que ia pedir um Uber, mas ele falou que me levaria e depois iria
para a casa dele porque tinha que dormir cedo.

​ Juro que eu sei beber e não dou vexame! Hoje é a primeira vez que fico

assim tão tonta com algumas doses de tequila.

​ Acontece! Toma um pouco de água com esse comprimido que eu tenho



que é bom para enjoo — ele sugeriu.

Eu estava me sentindo tão mal que aceitei. Depois disso, só me


lembro de fechar os olhos e apagar.
Capítulo 04
Pietro Cooper

Eu estava dirigindo em alta velocidade, ultrapassando os veículos no


trânsito agitado das ruas de Las Vegas e sendo seguido de perto pelo carro
dos meus seguranças. Uma coisa que aprendi com o meu pai, Ryan Cooper,
era que dirigir em alta velocidade e ser Chefe da máfia eram coisas
equivalentes, em que qualquer distração acabaria comigo e qualquer vacilo
poria fim à minha vida e à das pessoas que estavam sob o meu comando.

Assumi a máfia ao lado dos meus pais há sete anos, no meu


aniversário de vinte e um anos, e estava dando tudo de mim para deixá-los
orgulhosos.

Sendo filho de dois Chefes, a expectativa quanto ao meu comando


era muito maior. Além disso, a minha mãe era muito famosa na Instituição,
já que havia se tornado uma lenda e dado nome à lei que mudou a vida das
mulheres da máfia, a Lei Sarah Cooper. Isso, por acaso, abriu caminho para
a pirralha da Luna se tornar Chefe e achar que poderia me dar ordens, como
fez na última mensagem que me enviou.

Luna: Um senador da nossa lista de pagamentos disse que o


Departamento de Segurança de Vegas está investigando uma droga que vem
sendo vendida e que tem matado muitas pessoas e chamando atenção.
Precisamos descobrir quem está comercializando essa porcaria no nosso
território. Descubra o nome desse infeliz que acha que pode simplesmente
invadir um território aliado da Cosa Nostra e da Bratva. Me mantenha
informada!

Pietro: Você não precisa me dizer como trabalhar sua pirralha!


Luna: Eu sou a sua Chefe!

Pietro: Ainda assim, é uma pirralha! Chefe Pirralha!

​ pesar de a nossa diferença de idade ser só de quatro anos, sempre vi Luna


A
como uma criança e não gostava muito da ideia de ela assumir a Cosa Nostra
sendo tão nova.

Na verdade, não gostava de receber ordens de mulher, e isso incluía a


minha mãe.

Dante resolveu dividir o comando da Cosa Nostra com Luna quando


ela completou vinte e dois anos, deixando-a cuidar de tudo ao lado de Enzo,
que assumiu o seu lugar ao lado do tio Lorenzo. Eles praticamente cuidam
sozinhos da Cosa Nostra. Na semana anterior, foi a vez de Matteo iniciar ao
lado de seu pai, Giancarlo.

Na Bratva, Alya também havia começado recentemente a dividir o


poder com Mikhailov, e uma nova geração estava se formando na máfia.
Infelizmente uma geração com duas mulheres no comando achando que vão
me dar ordens.

Cheguei perto de um terreno abandonado e escuro, iluminado apenas


pelo farol do meu carro, e estacionei próximo a um sedan preto que me
aguardava. A porta do outro automóvel se abriu, e os meus homens saltaram
dos seus veículos e ficaram observando o Senador Lewis, que caminhou
lentamente até onde eu estava, abriu a porta do meu carro, entrou e se sentou
ao meu lado.

— Pietro Cooper.

— Senador Lewis — falei com um tom de voz que não deixou


dúvidas de que eu respondia pela Máfia Americana.

— É um prazer revê-lo. Seus pais como estão?

— Estão bem, Senador! Em que posso ajudá-lo? — perguntei e já


sabia do que se tratava, porque Luna me avisou; mesmo assim, deixei que
ele me contasse.

— Essa droga está sendo comercializada, e temo que o departamento


de segurança não consiga esconder por muito tempo da imprensa algo tão
letal — ele falou e me mostrou um caixa com vários comprimidos coloridos
em formato de coração.

— Onde vocês conseguiram isso?

— Um dos meus informantes conseguiu nos clubes e cassinos. A


droga tem o efeito, a princípio, de um energético, e depois a pessoa fica
chapada. Ela é extremamente forte e viciante, ataca o coração,
enfraquecendo o órgão e levando a pessoa a óbito.

— Essa droga não é nossa, e garanto que vou descobrir quem está
fazendo isso no meu território.

— Seja rápido, porque não sei por quanto tempo vou conseguir
controlar a mídia. Sua mãe nunca deu espaço para ninguém no nosso estado,
nem em qualquer cidade do país, e espero poder contar com você.

— O Senador não precisa se preocupar, porque eu também não vou


permitir que ninguém se crie em nenhuma cidade dos Estados Unidos. Nossa
parceria será mantida, e o senhor continuará na nossa generosa folha de
pagamento. Segure o departamento de segurança e a imprensa, porque eu
vou descobrir e acabar com esse traficante de balinhas de coração!

O Senador então desceu do carro, e meu olhar escureceu de ódio pelo


miserável ousar insinuar que eu não tinha o mesmo pulso firme da minha
mãe.

Depois segui em alta velocidade rumo aos becos mais escuros da


cidade, determinado a prender alguém que pudesse me dar uma pista sobre
esse traficante de merda que eu esmagaria com as minhas mãos.

— Senhor Cooper, acabamos de receber informações de um sujeito


repassando a droga do outro lado da cidade, próximo a um clube — um dos
meus homens falou, e seguimos o mais rápido que pudemos para o local.
A rua indicada era movimentada. Nela tinha muitos jovens andando
de um lado para outro, enquanto outros aguardavam na fila de um clube.

— O sujeito está ali, Senhor Cooper, naquela esquina — o meu


segurança disse, e não demorou para que o localizasse com os meus olhos.

O homem vestindo um jeans e um casaco vermelho, estava encostado


em uma parede e fumando um cigarro. Nessa hora, uma jovem se
aproximou, abriu a bolsa, deu um dinheiro para o sujeito, e ele retirou algo
do bolso e entregou a ela.

De forma estratégica, meus homens foram caminhando na sua


direção, e, assim que o sujeito os viu, jogou o cigarro no chão e começou a
caminhar apressadamente no meio das pessoas que estavam na rua. Ele
olhou para trás para ver se tinha despistado os meus homens, e arregalou os
olhos assim que me viu e começou a correr.

— Eu o quero vivo! — ordenei, e os meus homens saíram correndo


atrás do infeliz pelas ruas de Vegas.

Eu tinha paciência, e ele poderia correr a noite inteira, porque nem eu


nem meus homens descansaríamos até colocar nossas mãos nele.

Corremos por ruas escuras, becos e vielas, pisando em poças d'água e


pulando muros, até que o encurralamos em uma rua sem saída. Então
caminhei lentamente até segurá-lo pelo pescoço e sorri por ter conseguido
prender o rato na minha ratoeira. Ele até tentou sacar uma arma, mas tudo
que conseguiu foi levar um tiro nas mãos que foi disparado por um dos meus
soldados, e gritar de dor.

— Passou mesmo pela sua cabeça que um merda como você pudesse
acabar com o subchefe da Máfia Americana? Levem-no! — ordenei, e os
meus homens o arrastaram até a rua principal; não demorou para que o meu
carro chegasse com um dos meus seguranças na direção.

— Joguem esse rato na mala e vamos embora!

A noite estava quente. As luzes dos cassinos iluminavam a cidade


enquanto nos dirigíamos para o fundo de uma das nossas boates, levando o
nosso convidado para o subsolo onde ele seria interrogado. O lugar era
abafado e cheio de poeira, e um dos meus soldados amarrou o verme na
cadeira e depois o chutou para que ele pudesse se deitar para descansar.

— É melhor você não perder o seu tempo e me matar logo, porque eu


não tenho nada para te contar. Vocês acham que mandam em tudo aqui na
América, mas estão errados! Tem gente grande e com muito dinheiro
querendo reinar nessa área!

Depois de ouvir isso, joguei um balde com água fria na cara dele,
levantei a cadeira num único golpe e o sufoquei com um saco plástico. O
infeliz era um peixe pequeno, mas eu precisava saber quem estava por trás
daquela droga.

— Vou perguntar uma única vez: quem te passou a droga?

— Não conheço o sujeito. Ele só me disse que eu poderia ficar rico e


trabalhar futuramente para o novo rei de Vegas. As drogas vendem que nem
água, e isso é tudo que sei…

— Se isso é tudo que você sabe, então não tenho por que te manter
vivo!

— Por favor, não! — o sujeito falou, ajeitando-se na cadeira. — Eu


falei o que sei!

— Por que será que eu acho que você está mentindo?

Nesse momento, o infeliz começou a rir e logo depois a convulsionar


na minha frente. Ordenei então que o desamarrassem porque precisava dele
vivo para me dar mais informações.

— Se eu soubesse que ia ser interrogado por você, não teria buscado


a morte, mas achei que seria a Senhora Cooper, e não o bostinha do seu
filho.

O infeliz devia ter ingerido alguma substância quando foi


encurralado para morrer logo e só me deixou saber que tinha alguém com
dinheiro querendo dominar Vegas.
Porém, nada disso me importava no momento, a não ser seu deboche
dizendo que se soubesse que me enfrentaria, continuaria vivo.

Maldito! Cego de ódio, chutei o seu corpo por ele ousar achar que a
minha mãe era mais forte do que eu, sendo ela uma mulher.

Depois voltei para Los Angeles de jatinho e, assim que entrei em


casa fui recebido pelo meu pai, que queria saber o que eu tinha descoberto
sobre as pílulas de coração.

— E então, Pietro, o que você descobriu? O homem não falou nada


de útil antes de morrer?

— Não, pai, ele só me insultou insinuando que eu era mais fraco que
a minha mãe. O sujeito não me comparou a você, mas a uma mulher para me
humilhar.

— Por que te comparar a uma mulher te diminui tanto, Pietro


Cooper? — minha mãe perguntou, intrometendo-se na minha conversa com
o meu pai.

— Eu sou homem, e você... uma mulher. Isso já não diz tudo?

— Diz que o meu filho é um babaca e que não aprendeu nada do que
eu ensinei.

— Eu já sou um homem, e você não pode falar assim comigo. Serei o


Chefe de tudo…

— Você pode ser o Chefe que eu não me importo! — ela falou e me


segurou pelas orelhas arriando-me até o chão e colocando uma arma que
sacou sei lá de onde na minha testa. — Chefe ou não, em você mando eu,
Pietro Cooper!

Em seguida, ela saiu e me deixou sozinho com o meu pai, que me


olhou com raiva.

— Eu não aceito que ninguém ofenda a minha mulher. Saiba que, da


próxima vez, você vai ser rebaixado a soldado. E quanto a insinuação que o
rato fez... entenda de uma vez, ninguém é mais forte que Sarah Cooper, a
lendária Rainha da Máfia. Aceite ou passe a vida reclamando como os outros
homens, e no final se curvando a ela.

Diante disso, só pensava que um dia seria o único chefe da Máfia


Americana e que nenhuma mulher mandaria em mim, muito menos a
pirralha da Luna Cosa Nostra.

Eu não era como Dante e Aleksey, que aceitaram a Lei Sarah Cooper
porque pensaram com os seus paus e quiseram agradar suas esposas. Eu
sempre pensaria usando o meu cérebro.

​ s duas semanas seguintes foram de muitas viagens, reuniões com os capos


A
de cada estado e inúmeros interrogatórios. Perdi a conta de quantos
morreram depois de horas de tortura até que finalmente tínhamos um nome:
Salvatrucha.

​ máfia formada por gangues de Los Angeles, estava sendo patrocinada por
A
um CEO que cedeu uma boate no subsolo de um cassino em Vegas para ser
usada como local de prostituição; em troca, a Salvatrucha distribuía a droga
criada por esse infeliz, que era do ramo farmacêutico.

​ u voltei para Los Angeles, com data e hora marcada para invadir a boate de
E
Las Vegas.

​ Você vai invadir sozinho, Pietro? — minha mãe perguntou assim que

passei para ela e para o meu pai, durante o jantar, o resultado das
investigações.

​ Não, tia Sarah, com a Cosa Nostra e a Bratva — Enzo falou ao entrar na

sala, acompanhado de Luna e Alya.

​ nzo me abraçou e fiquei feliz em rever o meu melhor amigo; só não


E
imaginei que Luna e Alya viriam com ele.

​ Eu não sabia que você vinha, pirralha! Na verdade, não sabia quem

vinham duas pirralhas.
​ E você achou que eu e Alya deixaríamos passar esse momento de destruir

uma boate onde, com certeza, muitas mulheres devem ser obrigadas a se
prostituir e de sentir o gosto de ver a dor dos tarados tendo os seus paus
cortados fora?

​ ue ótimo! Depois de todo o trabalho que eu tive, Luna e Alya


Q
comandariam toda a invasão na boate e exterminariam a Salvatrucha da
nossa área!

​ Não se estresse, Cooper! Você sabe que elas são as futuras Chefes —

Enzo falou, dando um tapa nas minhas costas. — É a Lei Sarah Cooper, meu
amigo!

​ nfim, nós nos reunimos para discutir a operação, e foi inevitável conter as
E
muitas farpas que eu e Luna soltamos um no outro durante a conversa.

​ Vocês dois vão acabar se casando! — Alya disse, e Enzo deu uma

gargalhada.

​ Nunca! — falei, irritado, e Luna jogou um beijo para mim. Aquela



pirralha o que tinha de linda tinha na mesma medida de mandona e
insuportável.

​ oras depois, fomos dormir, porque, no dia seguinte, seguiríamos de jatinho


H
para Vegas, e a noite seria o fim das pílulas de coração e do esquema da
Salvatrucha e do CEO Miller no nosso território.
Capítulo 05
Raissa

​Minha cabeça não parava de girar, e imagens desconexas foram surgindo


enquanto eu tentava despertar e movimentar o meu corpo, que estava
dolorido.

Eu escutava alguém chamando por mim, dizendo para eu acordar,


mas me sentia enjoada e perdida, sem ter noção de quanto tempo dormi e do
que estava acontecendo.

​ s imagens embaralhadas vinham como flashes e, aos poucos, foram


A
ficando menos distorcidas, e me vi caminhando por um corredor enorme,
escuro, com mulheres desconhecidas andando apressadas. Algumas estavam
com lingeries, e outras, nuas, sendo arrastadas por homens que riam ao me
ver e passavam a mão no meu corpo.

​ m homem apertava o meu braço e me arrastava, e eu fiquei desesperada


U
quando o reconheci: era Johnny, o homem da boate. Ele abriu a porta de um
cômodo e me atirou lá dentro. Comecei a recordar das suas palavras e senti o
meu estômago embrulhado e ânsia de vômito.

​ Bem-vinda, sua puta! Como você gosta de beber e de se exibir para os



homens, agora vai poder fazer isso todos os dias e render um bom dinheiro
para a Instituição! Os clientes vão amar saber que tem uma cadela nova,
doida para ser o brinquedinho deles!

​ ue ódio! Uma mulher não pode dançar, beber e se divertir, sem que os
Q
homens pensem que ela está fazendo isso para chamar a atenção deles?
Foi com esse pensamento que abri os meus olhos e tentei entender o
que estava acontecendo. Eu não conhecia aquele quarto e nem a mulher que
estava sentada na cama segurando a minha mão.

​ Graças a Deus você acordou! Eu achei que você dormiria para sempre!

Ele deve ter feito você ingerir várias doses do calmante. Acho melhor você
se sentar devagar, porque ainda deve estar um pouco tonta.

​— Quem é você? Que lugar é esse?

​— Eu me chamo Rebecca, e esse lugar é o inferno!

​ u me sentei na cama e precisei me encostar na parede, porque tudo


E
começou a girar mais rápido.

Rebecca era morena, tinha os olhos cor de amêndoa, aparentava ter


uns vinte anos e estava vestida apenas com uma lingerie. Por um momento,
olhei para o meu corpo e, percebendo que estava sem a minha roupa,
agarrei-me às cobertas da cama e me cobri.

​ Eu precisei tirar as suas roupas e entregar para eles. Tudo que você vai

vestir está nessa sacola que deixaram aqui no quarto. Eu sinto muito por…

​ Onde eu estou? O que está acontecendo? Eu estava na boate com as



minhas amigas, comemorando o meu aniversário... depois me senti um
pouco mal e fui comer alguma coisa com o homem que conheci.... Meu
Deus! Johnny! Eu achei que era um sonho, mas me lembro dele me jogando
aqui e me chamando de… puta!

​ Ah… foi assim que ele te trouxe para cá? Comigo foi diferente. Eu ainda

era adolescente, tinha quinze anos, estava voltando da escola quando um
carro preto começou a me seguir. Apertei o passo, tentei correr, mas eles
estavam armados quando me pegaram na calçada e depois disso… — ela
respirou fundo, e lágrimas escorreram pelos seus olhos enquanto falava —
eu vim servir aos seus clientes. Já estou há seis anos nesse inferno, indo de
uma boate para outra sempre que eles acham que não sou mais interessante e
que o lucro comigo diminui. É assim com todas as moças que estão aqui.
Nossa vida acaba no dia em que somos escolhidas por esses monstros.
​ Escolhidas? — perguntei assustada, com um lado meu querendo tapar os

ouvidos para não escutar mais nada e o outro com a curiosidade aguçada de
uma jornalista. — Você foi sequestrada e trazida para cá? Quem te
sequestrou? Isso é um pesadelo!

​— A máfia! Já escutou falar na Salvatrucha?

​ u sabia muito bem o que era a Máfia Salvatrucha, formada pelas gangues
E
latinas das ruas de Los Angeles, inimiga da Cosa Nostra e da Bratva, e que
sempre tentava ganhar espaço no território americano, que pertencia à Máfia
Cooper.

​— Salvatrucha! Por favor, você pode me explicar tudo com calma?

​ ebecca me olhou com pena, percebendo que eu estava confusa, como ela
R
um dia deve ter se sentido também. Mas a jovem não teve tempo de me falar
nada porque um homem asqueroso abriu a porta e começou a gritar com ela,
que levantou apressada e foi se arrumar em frente a um espelho enorme que
tinha no quarto.

​ Você ainda está assim, sua putinha gostosa? — o homem perguntou e



passou a mão na bunda da Rebecca assim que ela se levantou. — O
movimento está grande no salão, e o chefe já perguntou pela cadelinha dele.
Trate de colocar a coleira e o rabo como ele gosta, porque o homem hoje
está soltando fogo pelas narinas.

​ enti meu estômago embrulhar quando escutei a forma como ele falou com
S
Rebecca, e não demorou para ele notar a minha presença.

​ E você, sua vadia, por que ainda não tomou banho e se arrumou? Vista as

roupas que estão na sacola e trate de aproveitar seu dia de folga, porque
amanhã você vai para o salão!

​ homem então saiu batendo a porta, e eu me levantei com tanta pressa que
O
acabei vomitando.

​ Minha nossa! Se eles virem isso vão te bater! Eu vou limpar tudo! Não

tenho tempo de explicar nada, mas acho que você já entendeu que foi
sequestrada e está numa boate de prostituição da máfia.
​ o saber disso, senti um arrepio e uma vontade imensa de chorar, mas não
A
podia fazer isso e precisaria ser forte para sair desse lugar.

Depois que Rebecca limpou o chão, ela borrifou perfume no ar e


disse que precisava ir senão sofreria uma punição. A coleira e o plug anal
com um rabo enorme que ela usava evidenciavam a preferência
sadomasoquista do tal chefe que exigia a sua presença.

​ Eu já me acostumei com a dor e a humilhação de viver desta forma — ela



falou e sorriu para mim. — Não saia deste quarto para nada, e, quando eu
voltar, conversaremos. Tome um banho e coloque uma dessas roupas, que
não cobrem muito, mas é melhor do que estar assim, nua.

​ ebecca saiu e fechou a porta do quarto, deixando-me sozinha. Logo depois,


R
eu desabei em lágrimas. Queria entender como fui me meter nessa confusão,
e me lembrei dos conselhos da minha mãe para não confiar em estranhos e
dos da minha avó, que sempre me dizia que o mundo era perigoso e que
deveríamos ter cuidado.

Até um dia atrás, ou sei lá quantos dias, pois estava sem noção de
tempo, sonhava em escrever uma matéria sobre a máfia. Inclusive, acho que
meu pedido quando soprei as velas foi atendido, não exatamente como eu
imaginei que seria, já que fui sequestrada e colocada dentro de uma das suas
boates de prostituição.

Eu tinha o tema para escrever o artigo da minha vida e só precisava


sair daqui; para isso, precisava parar de chorar. Nunca tinha me dado por
vencida e não seria nessa hora que faria isso.

​A porta do quarto não trancava por dentro nem a do banheiro. Os miseráveis


tinham acesso aos quartos quando bem entendessem. Isso, porém, fez com o
que o medo me deixasse arrepiada, mas tratei de expulsar esse sentimento da
minha mente e tomei um banho, porque precisava melhorar do mal-estar e
tentar raciocinar sobre tudo o que estava acontecendo.

​ u olhei as bolsas com as roupas que deixaram para mim, e eram


E
basicamente lingeries e shorts de lycra, que ficariam bem justos no meu
corpo. Eu os xinguei mentalmente e vesti aquilo, que era melhor do que ficar
nua como disse Rebecca e me enfiei novamente embaixo das cobertas.

Era estranho estar ali, mas, apesar de não ser minha culpa ter parado
naquele lugar foi inevitável pensar na roupa que eu estava usando e no bolo
em formato de pênis. Eu estava me sentindo suja e envergonhada com
aqueles minúsculos pedaços de pano cobrindo o meu corpo, e com raiva por
ter sido tão descuidada a ponto de cair num golpe antigo e conhecido... o
famoso “Boa Noite Cinderela!”

Sinceramente, queria dormir e acordar longe daqui e descobrir que


tudo não passava de um grande pesadelo.

​ Muito bem! Estou vendo que valeu a pena o investimento! — um homem



que eu nunca tinha visto antes falou, puxando a coberta que me cobria e me
fazendo despertar novamente daquele pesadelo, que não restava dúvidas, era
real.

​ Eu nunca erro! — Johnny, que eu conhecia e que havia me trazido para



esse inferno, falou, vangloriando-se. — Essa daí vai dar muito lucro com
esse corpo cheio de curvas. E rebola gostoso a putinha, que eu bem senti a
pressão da sua bunda no meu pau quando se esfregou em mim lá na boate.
Se com roupa já me deixou com tesão, imagina com o meu pau no seu rabo!

​ Seu filho da puta! — gritei e me levantei da cama, mas senti o peso da



sua mão atingindo com força o meu rosto e me fazendo cair no chão.

​ Aqui, neste lugar, puta só abre a boca para gemer alto! Eu só não vou te

foder agora porque você vai ser presente pro cliente com quem o chefe quer
fechar negócio amanhã à noite, e você não vai poder ter nenhuma marca de
outro macho nesse seu corpo para valer mais dinheiro! — ele falou e
segurou meu rosto com força. — Johnny disse e apertou a minha entrada
com a sua mão, deixando-me cheia de nojo.

​ Vamos embora antes que eu também coma o rabo gostoso dessa



vagabunda e o chefe me mate — o outro homem falou, rindo, e saiu do
quarto.
​ o ouvir isso, um ódio enorme cresceu dentro de mim, e cuspi com força na
A
cara daquele porco, sem me importar se ele me mataria ou não. Porém, tudo
que consegui foi outro tapa forte que, com certeza, me deixaria toda roxa, e
que com certeza eu revidaria mais cedo ou mais tarde.

​ u me levantei assim que ele saiu e me deitei novamente. Apesar da dor que
E
eu estava sentindo no meu rosto e da minha dignidade ferida, eu não me
curvaria a esse Johnny, e, a nenhum mafioso ou seus clientes.

Eu não tinha nascido para receber ordens de ninguém, muito menos


de macho escroto. Às vezes, me perguntava a quem eu havia puxado para ter
uma coragem que me fazia ter certeza de que aguentaria firme tudo que
viesse pela frente, e que sairia de algum jeito viva desse lugar que era uma
sucursal do inferno na terra.

Prêmio Pullitzer Awards de jornalismo me aguarde que de algum


jeito eu chegarei pra recebê-lo em minhas mãos com essa matéria
bombástica sobre a rede de prostituição da máfia.
Capítulo 06
Raissa

​Eu não sabia dizer quantas horas tinham se passado desde que aquele
homem nojento e asqueroso do Johnny tinha ido embora depois de me dizer
tanta imundície. Então, meu pensamento foi cortado quando Rebecca entrou
no quarto praticamente se arrastando e foi direto para o banheiro sem olhar
para mim.

​ la estava destruída física e emocionalmente, e isso era visível pelo seu jeito
E
de caminhar devagar e de cabeça baixa. Eu queria ir atrás dela, mas
continuei sentada na minha cama, observando-a e compreendendo que
aquele momento era só dela.

Provavelmente, aquele banho serviria para limpar a sujeira que ela


tentava tirar à força do seu corpo conforme se esfregava. Rebecca então
voltou para o quarto, deitou-se na cama, e o silêncio entre nós foi quebrado
pelo seu choro sentido embaixo das cobertas.

Eu me levantei devagar, fui até a sua cama, sentei-me ao seu lado e a


abracei. Só conhecia aquela moça há algumas horas, mas meu instinto
protetor me fez querer cuidar dela, que estava tão frágil naquele momento.
Resolvi então me apresentar, o que não fiz antes, como uma forma de
mostrar que eu estava me abrindo e que ela poderia fazer o mesmo se tivesse
vontade, porque eu estava pronta para escutá-la.

​ Meu nome é Raissa. Eu estava comemorando meu aniversário de vinte e



três anos numa boate com as minhas amigas. Eu dançava e bebia livremente
me sentindo muito feliz. De repente, um homem se aproximou para dançar
comigo, e me permiti sentir prazer quando ele seguia sensualmente os meus
movimentos. Não quero acreditar que fiz algo errado, porque não fiz! Fui
vítima de um abusador, sequestrador, mafioso, ou seja, lá o que ele for. Vim
parar aqui, porque, assim como você, eu nasci mulher, e por algum motivo
isso faz alguns homens acreditarem que são nossos donos. Muitos acham
que não temos vontades próprias e que podem nos submeter aos seus
fetiches doentios. Eu não sei onde estou, mas sei que vou sair deste lugar!

​ Nós estamos em uma boate privada da Salvatrucha em algum lugar de



Vegas. Eu não sei a localização, porque geralmente sou transferida, jogada
em uma van e entregue ao meu novo destino. As meninas do local sempre
falam para as que chegam em que cidade estamos, informações que obtemos
escutando as conversas no salão. Aqui tem uma porta por onde entram as
mercadorias e nós, mulheres, e outra por onde os clientes entram. As duas
são vigiadas por soldados fortemente armados que matam sem piedade.

​ Vegas? Estamos em Las Vegas? Minha nossa! Isso fica a umas nove

horas de carro de San Francisco, onde eu moro! Viajei esse tempo todo e não
me dei conta!

​ Quem te trouxe foi o Johnny, um dos piores soldados que tem aqui na

boate. Sempre sai para trazer “carne fresca”, como eles chamam as novatas.
Algumas ele pega à força na rua, outras ele usa o fato de ser muito bonito
para seduzir e trazer para cá. Com certeza, ele colocou algo na sua bebida
que te fez apagar.

​ Eu tenho uma vaga lembrança ainda confusa de tudo que aconteceu, mas

lembro que o deixei escolher uma bebida para mim na boate e que depois ele
me deu um comprimido para dor de cabeça ou enjoo.

​ Ele deve ter colocado algo na sua bebida, e esse comprimido é um



calmante usado para nos dopar enquanto trocamos de boate. Você desmaiou,
e ele então te passou para a van, te deu mais remédios, mas você nem
percebeu.

​— Eu me lembro do carro dele; não era uma van.

​ Ele deveria estar com outro carro e depois te colocou na van; assim,

transitou normalmente com você desmaiada na parte de trás.
​ quilo tudo era um absurdo, e eu não conseguia acreditar que estava
A
acontecendo comigo.

​— Todas que estão aqui são mulheres traficadas?

​ Sim, a maioria. Algumas são pagamento de dívidas ou foram largadas



pelos maridos da Instituição. Cada uma tem uma história, mas nenhuma está
aqui por vontade própria ou ganha qualquer coisa por isso. Somos escravas e
eles deixam isso bem claro!

​— E o que acontece quando chegamos aqui?

​ Você, pelo que escutei enquanto servia ao Chefe, vai ser oferecida a um

cliente que vem fechar um negócio amanhã. O “Velho”, como eles falaram
enquanto se divertiam comigo, é exigente e gosta de novidades. Foi por isso
que não te jogaram esta noite no salão. Estão te guardando para ele!

​ eu estômago doeu quando a escutei falar isso sobre eu ser usada como um
M
objeto com tanta naturalidade. Honestamente, não conseguia imaginar o que
ela tinha passado nesses anos como escrava para ficar assim, fria nas
palavras e frágil depois de ser usada por eles.

​ Quando eu cheguei, era muito jovem e fui jogada em um quarto escuro,



onde fiquei durante alguns dias. Certa vez, o Chefe chegou, e me levaram até
ele, dizendo que eu era virgem e recém-chegada — Rebecca começou a falar
e eu senti um aperto no peito me preparando para o seu relato — Eu vivia
em uma pequena cidade do Colorado. Fui criada pela minha avó desde que
os meus pais se separaram, e cada um foi para um lado, sem se importar
comigo. O carinho da minha avó era tão grande que me bastava, até que ela
se foi quando eu tinha doze anos, e com isso, comecei a migrar de lar em lar
para adoção.

​ u podia sentir toda a mágoa, dor e frustação de Rebecca, e pensei quantas


E
meninas não se sentem assim, sozinhas e largadas a própria sorte.

— Quando completei quinze anos, já sabia que seria impossível


conseguir alguém que me adotasse, já que os casais tinham preferência por
crianças pequenas. Por isso, passei a me dedicar aos estudos na esperança de
ser alguém no futuro — Ela parou de falar, respirou fundo e continuou —
Um dia quando eu estava voltando da escola um carro preto começou a me
seguir. Tentei correr, mas o veículo parou, e dois homens armados saíram de
dentro dele e me agarraram com muita força. Só me lembro de um deles
dizer que eu era muito gostosinha e depois colocar um pano molhado com
um cheiro muito forte no meu rosto, o que me fez desmaiar.

Um ódio cresceu dentro de mim, e precisei ser forte para entender


que eu precisava escutar o seu desabafo e não de surtar com a sua história.

— Acordei em um cômodo escuro, com as mãos amarradas para trás.


Tudo em que eu pensava era sair dali, mas em vão, tentei afrouxar as cordas
que estavam bem amarradas, quase fiquei cega com a claridade que invadiu
o cômodo quando alguns homens abriram a porta, falando e rindo alto,
dizendo que o Chefe tinha chegado e iriam mostrar a mercadoria nova pra
ele — Rebecca parou de falar e começou a esfregar uma mão na outra — Eu
fui então arrastada até uma sala e colocada de joelhos na frente de um
homem que aparentava ter uns cinquenta anos, com uma barba escura e
fumando charuto. Eu aprendi da pior forma possível que a vida pode ser
muito ruim para pessoas que não são ninguém como eu, que não tem família
ou alguém que se preocupe. Eu sabia que tinha que fazer o que ele mandava,
e, que ficaria sendo dele para sempre, já que nunca ninguém sentiria a minha
falta ou procuraria por mim.

Eu me levantei e peguei uma garrafa de água para Rebecca que


estava tremendo e a abracei.

​ E assim os anos foram se passando, indo de boate em boate, e toda vez,



até hoje, que o maldito Chefe aparece, passo pela mesma humilhação que
você viu hoje, de colocar coleira e rabo para ser sua cadelinha. Eu já passei
por quatro boates, antes desta aqui de Vegas. Ontem à noite esse monstro
chegou de viagem e estava nervoso e irritado por conta de problemas com
uma droga nova, pelo que entendi, parece que um dos homens foi preso pela
Máfia Cooper. Essa máfia tem uma mulher no comando, e, ele a odeia, e
muitas vezes sou espancada com seus gritos dizendo que era o que ele queria
poder fazer com a tal Sarah Cooper.

​— Ele é o Chefe da Salvatrucha?


​ O Chefe da região e que dá as ordens por aqui. Mas tem um acima dele,

mas nunca vi e nem quero porque dizem que é muito pior do que esse a
quem sou obrigada a servir.

​ essa hora, abraçada a Rebecca, eu deixei que as lágrimas escorressem


N
livremente pelo meu rosto. Eu senti a dor dela e daquelas meninas
queimando o meu peito, e não tinha dúvidas que sairia dali e denunciaria de
alguma forma a Salvatrucha. Não importava como, eu só sabia que tinha que
sair dali e falar sobre esse esquema de tráfico de mulheres, que, com certeza,
era encoberto com muita propina.

Os clientes eram exclusivos e vips, ou seja, peixes grandes que


deveriam pregar a moral e os bons costumes para a sociedade, enquanto se
aproveitavam no submundo de jovens traficadas.

Eu me lembrei das palavras de Anne Cooper sobre a máfia ser


sombria e letal. Ela tinha razão, porque eu estava vendo e vivenciando na
pele a crueldade dessa Instituição criminosa.

​ ebecca passou o dia me contando várias histórias de outras meninas que


R
chegaram às boates nesses anos que ela estava ali. Eu tentava guardar tudo
na minha mente para escrever sobre isso depois, já que morrer ou ficar ali
para sempre não fazia parte das minhas convicções futuras.

​ or fim, depois de escutar inúmeras histórias de abuso e violência, entrei no


P
banheiro e, enquanto Rebecca descansava, sentei-me no chão e me permiti
chorar e deixar que a água limpasse o meu corpo, que parecia sujo daquele
ambiente que cheirava a dor e morte.

Quantos sonhos de meninas se perderam naqueles quartos da boate


ou no salão onde as mulheres eram submetidas a todo tipo de humilhação!

​ Trinta minutos! — um homem gritou no corredor, e Rebecca deu um



salto da cama e começou a se arrumar.

​ Vem, Raissa, deixa eu te ajudar! — ela pegou uma lingerie e um short



mais apertado que aquele que eu usei e me entregou, junto a um salto agulha
de uns vinte centímetros.
​ Eu não vou usar isso e nem vou a lugar nenhum! — falei e cruzei os

meus braços, surpresa por ela acreditar que eu me submeteria ao esquema de
prostituição da máfia.

— Se você não vestir isso, eles vão te jogar no salão à força e nua!
Os clientes vão amar, e o Chefe ainda vai cobrar mais caro informando que
você precisa ser domada.

— Nojentos! Eu vou capar o homem que encostar em mim! —


exclamei e vesti a roupa, decidida a não permitir que me tocassem, mas
curiosa em ver o ambiente sobre o qual eu escreveria o meu artigo.

Rebecca então tentou me convencer de que eu deveria colocar uma


maquiagem, mas eu me recusei.

​ Você é surda, porra? — Johnny entrou no quarto gritando, enquanto



Rebecca me mostrava o balcão com maquiagens.

​— Eu não vou colocar maquiagem nenhuma, seu filho da…

​ ão terminei de falar, e o desgraçado saiu e voltou com uma jovem de


N
cabelos ruivos que estava passando pelo corredor. Ele colocou uma arma na
cabeça da moça e pegou uma faca, deixando bem claro que cada item da
maquiagem que eu me recusasse a usar custaria um dedo da mulher.

​— Ele não está brincando! — Rebecca me alertou, baixinho.

​ Cala a boca e arruma essa vadia para o trabalho! E fique feliz por ser a

cadelinha do Chefe, senão eram os seus dedos que seriam cortados fora por
não ter ensinado nada para a sua companheira de quarto! Você teve o dia
todo e fez o quê? Dormiu?

​ ebecca tremia e olhava para a outra moça. Já o infeliz ficava falando com
R
detalhes sobre o espetáculo proporcionado pelo seu Chefe a todos enquanto
a abusava na noite anterior. Eu conseguia sentir a sua vergonha e, por isso,
fechei os olhos e deixei que ela fizesse a maquiagem como o cretino havia
ordenado.
— Vem comigo! — Johnny falou, soltando a ruiva e me arrastando
com força para fora do quarto. Enquanto eu era arrastada fazia uma nota na
minha mente de tudo que eu via pelo caminho, e jurava ao mesmo tempo
para mim mesma que um dia me vingaria.
Capítulo 07
Raissa

Quando cheguei ao salão, levei um susto. O lugar era enorme, escuro, com
luzes piscando. Parecia uma casa noturna normal, até que olhei para uma das
mesas e vi uma mulher sendo usada por vários homens. Do outro lado,
algumas mulheres andavam de quatro, usando coleiras. Então, em segundos,
a ficha caiu: era uma boate de prostituição BDSM.

— Mudança de planos! — um homem chegou, falando com Johnny.


— O Chefe ofereceu essa daí para o cliente novo, mas o Senador, que já é
cliente antigo da casa, pagou três vezes mais quando soube que era
fresquinha, sem treinamento e que precisaria ser domada.

Johnny então me entregou para esse homem, que parecia ser duas
vezes mais forte do que ele, e se retirou do salão.

O Senador, de quem eu jamais esqueceria o rosto, parou na minha


frente e me analisou como uma mercadoria. Tentei me afastar, mas o infeliz
do soldado tinha colocado minhas mãos para trás do meu corpo e segurava
com força os meus braços, impedindo-me de sair do lugar. Vendo meu
desespero, o miserável do velho babão deu uma gargalhada e segurou os
meus peitos por cima da lingerie, dizendo que cabiam perfeitamente em suas
mãos.

— Estou vendo que ela não foi mesmo treinada, que é arisca, e vou
ter muito prazer em domar essa fera. Não demora, ela vai estar cavalgando
no meu pau e me pedindo para eu mamar nesses peitinhos!

— Velho nojento! Senador de merda! Eu vou arrancar esse pau mole


que com certeza você deve ter entre as pernas!
— Eu paguei caro por você e não adianta tentar fugir, porque hoje
vou te mostrar como é ter um homem, minha belezinha! — o velho nojento
falou, esfregando sua boca fedorenta de álcool no meu pescoço e me fazendo
ter ânsia de vômito.

Foram segundos entre o momento em que o homem, que antes me


segurava com os braços para trás sorriu com desprezo para mim enquanto
me via ser arrastada pelo Senador, e o instante em que seu peito se encheu de
sangue. Ele ficou caído no chão, e eu passei por cima dele, sendo levada
como se a minha vontade não tivesse valor algum.

Aquela situação de ser arrastada me deixou em pânico e com ódio de


ver como os homens pensam que somos objetos que eles podem comprar e
fazer o que bem entenderem.

Eu morreria lutando se fosse preciso, e enquanto buscava um jeito de


me livrar do senador, eu pude ver o momento exato em que duas mulheres
lindíssimas entraram naquele inferno disfarçado de boate.

Ambas exalavam poder e sensualidade. A mais loira usava um


vestido preto e brilhante, que desenhava sua silhueta, e a outra, um vestido
vermelho-escarlate, que parecia ser de seda, pois flutuava pelo seu corpo
com o vento das saídas de ar que existiam na entrada da boate.

Consegui ver o momento exato em que as duas se entreolharam. Em


seguida, suas mãos deslizaram pelas suas pernas, entrando em suas botas de
cano longo, que iam até a altura dos seus vestidos curtíssimos, e sacando
rapidamente as suas armas. Os disparos foram precisamente no peito do
homem que parecia ser o chefe daquele lugar e que provavelmente me
vendeu para o velho tarado. O senador segurou o meu braço com mais força
quando mais tiros se espalharam por todo o local, sendo disparados por
homens de ternos pretos que invadiram a boate.

— Não pense que você vai me escapar, belezinha! Vou dar um jeito
de sair daqui, e você vem comigo!

Queria me soltar dos seus braços, mas, como o velho era mais forte
do que eu, ele me segurou com força pela cintura, fazendo com que meu
corpo colasse no seu, deixando-me com nojo e desejando que uma daquelas
balas perdidas me atingissem e acabassem de vez com aquilo tudo.

Foi então que me lembrei das meninas escravas, de tudo que elas
sofreram por anos, lembrei por que não entregaria os pontos, e tentei lutar
com o Senador que infelizmente estava ganhando a batalha. Foi impossível
não lembrar das minhas amigas dizendo que era importante aprender defesa
pessoal, enquanto eu dizia que não tinha tempo para isso, porque precisava
escrever os meus artigos.

Nessa hora, um homem de terno, com o olhar assustado, aproximou-


se de nós dois e começou a falar em um tom desesperado com o senador
nojento.

— Que porra está acontecendo aqui? Não tem como sair desse
inferno?

— Claro que tem! Eles vão matar os grandes e desaparecer. Deve ser
um acerto de contas. Só se esconda, espere ele acabarem e pronto.

— Acerto de contas? Essas duas mulheres que entraram atirando são


Luna Cosa Nostra e Alya Mikhailova, as futuras Chefes da Cosa Nostra e da
Bratva! Essa porra toda é uma tomada de território da máfia e todos nós
vamos morrer!

Quando escutou isso, o velho me jogou no chão com força e


começou a abrir as calças. Ao ver o que ele faria, comecei a gritar
desesperadamente por socorro, mesmo sabendo que ninguém me escutaria.

— Não vou perder meu dinheiro e vou te foder aqui mesmo, sua
vadiazinha!

O miserável estava armado e deu com a pistola na minha cabeça me


deixando tonta, mas ainda assim não desisti de lutar quando senti as suas
mãos rasgando com força o short que eu usava.

Respirei fundo como se fosse meu último suspiro de vida quando do


nada eu vi o seu corpo sendo chutado e indo parar ao meu lado.
— Quebrem o corpo desse infeliz para que ele sinta muita dor antes
de morrer! — o homem que chutou o corpo do velho falou calmamente
como se tudo ali não estivesse desmoronando.

Nessa hora seu olhar se encontrou com o meu, e ele me estendeu a


mão levantando-me do chão de uma vez só como se eu fosse uma pluma.

Tentei cobrir o meu corpo com as mãos, já que o sutiã minúsculo e


apertado que eu usava estava destruído, além do meu short ter sido todo
rasgado.

— Vista isto para cobrir o seu corpo — o desconhecido ordenou com


um tom de voz intimidador enquanto me entregava o seu paletó.

— Enzo, vamos embora! — um homem gritou, e, quando me virei,


pude ver as duas mulheres, que chegaram atirando, andando lentamente até a
saída e passando por cima dos corpos sem vida no chão, com a leveza de
quem caminhava por um jardim florido.

— Porta le donne al capanno di Cooper e prenditi cura dei feriti. Per


quanto riguarda gli uomini, assicurati che quelli che sopravvivono abbiano il
cazzo tagliato e infilato in bocca. A loro non piacciono i pompini? Quindi
lascia che si divertano e lo facciano da soli! (Levem as mulheres para o
galpão da Cooper e cuidem das que estão feridas. Quanto aos homens,
certifiquem-se de que os que sobreviveram tenham os seus paus cortados e
enfiados em suas bocas. Não gostam de boquete? Então que aproveitem e
façam em si mesmos.) — Luna Cosa Nostra ordenou.

— Você vem comigo! — o homem ordenou e passou seus braços em


volta da minha cintura enquanto me levava com ele, mostrando-se
indiferente ao sangue derramado por todo o local, assim como as duas
mulheres que me deixaram tão impressionada.

Por fim, todos saíram, e o homem que estava comigo, cujo nome era
Enzo, continuou mais um pouco no local dando as últimas ordens.

Ele disse friamente que não limpassem nada, porque era um recado
para que a Salvatrucha entendesse que não poderia ter negócios em nenhuma
parte de Vegas que era domínio da Máfia Cooper, ou seja, território da Cosa
Nostra e da Bratva.

Não pude acreditar que depois de passar pelo inferno, eu estava


diante da máfia que tanto pesquisei antes de me afastar do meu emprego no
jornal e, ainda por cima, vestia o paletó de Enzo Cosa Nostra.

— Vamos? — ele falou, e eu respirei fundo, sabendo que o meu pior


pesadelo poderia estar começando.

— E as outras moças que trabalhavam aqui? Onde estão? — Eu


perguntei.

— Algumas que estavam no salão aproveitaram para tentar fugir,


mas ficaram encurraladas nos fundos da boate, e as Chefes vão providenciar
para que fiquem seguras, e as outras que estão feridas já foram retiradas
pela…

Ele parou de falar, mas eu sabia a continuação da frase: pela famosa


Máfia das Mulheres, criada pela CEO Sarah Cooper, mãe de Pietro Cooper,
subchefe da Máfia Americana e que tinha falado com Enzo agora pouco.

É claro que tudo relacionado a máfia eram notícias não confirmadas,


mas que todos sabiam que eram verídicas. A máfia, na verdade, era muito
bem protegida por grandes empresários e políticos que viviam dos seus
agrados financeiros.

Então comecei a caminhar ao lado do homem que me salvou e que eu


não sabia o que faria comigo, mas que, por algum motivo, me fez confiar
nele, mesmo eu sabendo que se tratava de um mafioso.

Eu estava confinada naquela boate há dois dias e não conhecia o


local, já que só fiquei no alojamento dos fundos e aquela seria minha
primeira noite servindo no salão. Por isso, eu me assustei quando
atravessamos um longo corredor com vários homens armados, que nos
acompanhavam, e entramos em um elevador barulhento onde a tensão no ar
era nítida, visto que eu não sabia como lidar com a sensação dominadora que
os olhos de Enzo causavam em mim.
“Ele é um assassino”, minha mente dizia. “Ele é um homem lindo e
gostoso”, meu corpo rebatia. Eu estava ali, entre o certo e o errado, sabendo
que deveria estar desmaiada de medo depois de tudo, e não pensando
naquele homem.

Tinha que focar na minha chance de escrever uma história real que
vivi na máfia se eu conseguisse sobreviver ao jugo do mafioso. Se é que
tinha algum jugo, eu pensei rindo e um sorriso bobo se formou no meu rosto.
Só eu mesma para no lugar de querer sair correndo estou aqui fantasiando
um hot dos meus romances como Enzo Cosa Nostra.

Minutos depois, a porta do elevador se abriu, e seguimos por outro


corredor escuro, que nos levou até um luxuoso cassino. Eu estava em Vegas,
e a boate, na verdade, era um local clandestino que ficava no subsolo de um
lugar frequentado por milionários, artistas e turistas, livre de qualquer
suspeita para pessoas normais.

Enzo caminhou tranquilamente pelo cassino, com suas mãos firmes


em volta da minha cintura, indiferente ao fato de eu estar vestindo apenas o
seu paletó. As mulheres suspiravam quando ele passava por elas e me
olhavam com desprezo, enquanto ele sequer parecia notar a presença delas.
Capítulo 08
Raissa

Assim que chegamos ao lado de fora, Enzo caminhou até a frente de um


carro preto e só então soltou a minha cintura. Ele olhou para os lados, como
se estivesse procurando alguém, e só então foi pegar o seu celular, notando
que o seu paletó estava comigo.

— Eu preciso do meu celular!

— Está aqui! — falei, tirando o aparelho do bolso e entregando-o


para ele.

— Eu vou me informar sobre o local para onde levaram as suas


amigas e os meus seguranças vão te acompanhar.

— Que amigas? Por acaso, você acha que eu trabalhava nesse lugar?
Na verdade, nenhuma delas trabalhava nessa boate, eram todas traficadas, e
eu só vim parar aqui porque um infeliz que conheci em um clube no meu
aniversário me dopou...

— Você não é…

— Não! Eu não sou uma prostituta, e tudo que preciso é que você me
leve para casa.

— Não me admira que você tenha sido dopada por um desconhecido,


uma vez que segurança parece não ser o seu forte já que está pedindo para
um estranho te levar para casa.
— Você não é nenhum estranho, é o homem que salvou a minha
vida. Além disso, eu sei que você é Enzo Cosa Nostra, da Máfia Siciliana.

Enzo então me segurou com força, e, quando senti os seus dedos na


minha nuca me trazendo para junto de si, no lugar de ficar com medo, tudo
que senti foi um arrepio atravessando o meu corpo. Logo, foi inevitável
morder os meus lábios quando me vi tão próxima ao ponto de sentir a sua
respiração.

— Você fala demais e parece não saber onde mora o perigo.

— Eu não tenho medo de você. Só quero que me leve para casa e


acho que poderíamos entrar no seu carro, porque não deve ser muito seguro
você ficar parado em frente ao local que você acabou de invadir.

— Você com certeza, é maluca, e eu sou mais ainda porque vou te


dar uma carona!

Por fim, ele avisou ao seu motorista que iria dirigir e mandou que os
seguranças o seguissem.

— Tudo bem. Onde você mora? — Enzo perguntou assim que


coloquei o cinto de segurança.

— Em San Francisco.

— Você é maluca? San Francisco? Você sabia que são quase nove
horas de carro até a sua casa?

— Eu sei, já que estamos em Vegas. Você não tem um jatinho ou um


helicóptero? Eu pensei que mafiosos fossem ricos.

— Quem é você, sua doida? — ele perguntou, acelerando o carro e


deixando o cassino para trás.

— Raissa O'Brien, vinte e três anos, jornalista…

Enzo freou o carro quando eu disse que era jornalista e eu só não


acertei o rosto no painel porque o cinto de segurança me segurou.
— Desempregada. Eu não queria mais escrever matérias idiotas
sobre como conquistar o homem perfeito, essas coisas que eles acham que
mulher nasceu para escrever e fui meio que demitida.

— Você sempre fala sem parar?

— Sim, minha mãe sempre disse que eu tinha que desacelerar, mas
não consigo! Quando começo a falar, não consigo mais parar!

Enzo voltou a dirigir e me pediu para colocar o meu endereço no


GPS.

— Antes, preciso parar em alguma loja para comprar uma roupa,


porque, não sei se você notou, mas estou nua embaixo do seu paletó.

Ele finalmente pareceu ter me notado e me olhou da cabeça aos pés,


respirando fundo. Eu não era indiferente para ele, e isso me deixou excitada.
Sabia que o certo era eu estar apavorada, encolhida em um canto, chorando,
afinal de contas, tinha sido sequestrada, quase sido violentada, visto várias
pessoas mortas e estava no carro de um mafioso. Porém, tudo que eu
conseguia sentir era tesão por aquele homem gostoso.

Eu realmente não sabia a quem puxei para ser tão fria e ousada, sem
medo de nada. Não me importei com os corpos no chão da boate, até porque,
para mim, aqueles homens podres que se faziam valer da força com aquelas
mulheres treinadas para lhes servir como submissas, mereciam mesmo um
fim sangrento.

— É impressão minha ou você está me provocando, Bella Mia?

— Eu só disse que preciso comprar roupas — respondi e virei, rindo


na direção da janela e olhando as luzes da cidade.

​ nzo então parou em frente a uma loja que vendia roupas para turistas e
E
disse que àquela hora da noite era tudo que conseguiria comprar para eu
vestir.

​ Eu preciso que você venha comigo para pagar as minhas compras, porque

estou sem documento, cartões e celular.
​ Você sabe que não é nada minha para eu ter que ficar bancando a sua

babá?

​ Juro que a última coisa que eu imaginaria olhando para você é uma babá

— respondi e dei uma gargalhada, entrando na loja em seguida.

​ nzo parecia estar se divertindo com a minha cara quando fui escolher umas
E
calcinhas e só tinha com estampas e frases: “O que acontece em Vegas fica
em Vegas”.

​ ingi que não me importei, comprei aquela calcinha ridícula, uma calça de
F
moletom e uma camisa com os dizeres: “Eu amo Vegas”.

​ Eu particularmente preferia você só com o meu paletó — Enzo falou



quando entramos no carro, exibindo um sorriso cínico.

​ essa hora, criei mil fantasias para as nossas oito horas de viagem, mas a
N
verdade era que o cansaço de todos aqueles dias acabou me fazendo dormir.
Logo, acordei horas depois, quando Enzo perguntou se eu queria comer
alguma coisa.

​— Já está amanhecendo. Você quer tomar um café?

​— Por quanto tempo eu dormi? Sou uma péssima copiloto!

​ Não se preocupe! Eu não me distraio ou durmo ainda que fique dirigindo



durante horas.

​ É verdade! Eu tinha esquecido que você é um mafioso e tem que ficar



ligado caso algum inimigo apareça querendo te matar. Acho que dormi que
nem uma pedra porque sei que ninguém pode me fazer mal do seu lado.

​ Você é doida! — Enzo falou e começou a rir. — Mas o que te deixa tão

confiante que eu te protegeria se estivesse sendo atacado?

​ Você me salvou ontem à noite quando aquele velho nojento tentou me



violentar, e ainda nem éramos amigos.
​ Nós não somos amigos! — Enzo ressaltou e voltou a dirigir, e eu só

conseguia pensar em como ele podia ser tão fofo e mafioso ao mesmo
tempo.

Enfim, paramos em um restaurante, e eu já estava saindo do veículo


quando Enzo segurou o meu braço e me pediu para esperar. Os seus
seguranças saíram do carro e fizeram uma varredura no local antes de
emitirem um sinal de que ele poderia sair do automóvel.

Enzo então saiu do carro e caminhou ao meu lado, e eu senti falta dos
seus braços protetores envolvendo a minha cintura, como no cassino.

Ele tinha a aparência de um homem frio, mas seus olhos azuis


emanavam luz. Além disso, algo nele parecia ser muito doce ao mesmo
tempo em que ele era um assassino como qualquer outro mafioso.

No restaurante, sentamo-nos à mesa, e, quando olhei o cardápio, meu


estômago deu sinal de vida. Enzo até se assustou com o tanto de comida que
eu pedi.

— Você sabe que não tenho dinheiro para pagar nada que eu pedi,
sendo assim, espero que eu seja sua convidada, ou vou ter que ficar aqui
lavando pratos para pagar a minha dívida.

— Você é engraçada e lembra muito a minha tia Alice. Ela também


fala demais e tem resposta para tudo.

— Um dia, vou querer conhecer essa sua tia Alice.

​ Quem sabe! — ele falou e ficou em silêncio quando o garçom começou a



servir o nosso café da manhã.

​ le olhava para mim e ria ao me ver perdida entre muffins, panquecas,


E
frutas, iogurtes e a mimosa que pedi, além da minha xícara de café.

​ Então, Raissa, você é uma jornalista desempregada porque não gosta de



escrever futilidades e mora em San Francisco. Você vive com a sua família?
​ Não, minha família é da Filadélfia. Eu me mudei para San Francisco para

estudar e trabalhar porque é uma cidade com um mercado muito bom na área
de jornalismo.

​— Seu nome é de origem russa? Algum parente por lá?

​ Meus avós maternos são russos e se mudaram para cá ainda muito jovens,

quando a minha avó estava grávida, e a minha mãe nasceu aqui na América.
Você está me interrogando para saber se sou alguma espiã russa?

​ A Bratva é aliada da Cosa Nostra. Não precisamos nos preocupar com os



espiões russos.

​ É verdade, eu vi Luna Cosa Nostra e Alya Mikhailova na boate. Fiquei



impressionada com a altivez das duas e a leveza com que deixaram o local
parecendo que deslizavam sobre os corpos sangrentos.

​ Confesso que, enquanto deixava a boate pensei o mesmo sobre você, mas

achei que estava em choque por tudo que aconteceu, só que vejo que me
enganei. Você passou pelos corpos sangrentos, como você descreveu, com a
mesma altivez de Luna e Alya. Quem é você, Bella Mia?

​ Quem sabe, uma mafiosa misteriosa? — brinquei e dei uma gargalhada,



engasgando-me com a panqueca.

​ No momento, você está mais parecendo uma mulher esfomeada. Por Dio!

Você já comeu umas dez panquecas!

​ Que deselegante, Enzo Cosa Nostra! Você não sabe que é feio contar

quantas panquecas uma mulher come durante o café da manhã? — indaguei,
enfiando um muffin na boca e fazendo Enzo rir.

​ epois de comer, deixamos o restaurante, e, assim que entramos no carro,


D
aproveitei que não estava mais com sono para conhecer melhor esse mafioso
hot e fofo.

​— Eu posso te perguntar uma coisa? Como vocês foram parar lá na boate?


​ A Salvatrucha invadiu nosso território e espalhou uma droga letal.

Descobrimos que ela era negociada nessa boate, que ficava no subsolo de
um cassino que pertencia a um CEO do ramo farmacêutico.

​— Pertencia?

​ Sim, enquanto invadiam a boate, que não tinha permissão para funcionar

em nosso território, a casa do CEO explodiu. Coitado! Problemas no
encanamento do gás.

​ Entendi! — falei, querendo entender por que no lugar de ficar chocada,



eu simplesmente achei normal o filho da puta ir pelos ares. Ah, lembrei!
Esse CEO não passava de um bandido que, para vender suas drogas, usava
uma boate que explorava mulheres traficadas.

​ Você parece não se chocar com nada! Estou começando a considerar a



hipótese de você ser uma mafiosa!

​ Enzo, quando você disse que eles invadiram o seu território, isso significa

que vocês também atuam no tráfico humano de mulheres?

​ Não, Bella Mia, a Cosa Nostra e a Bratva não fazem esse tipo de negócio

e nem os nossos aliados. No passado, sim, na época do meu avó, mas o meu
pai e os meus tios eram contra o tráfico, e todas as mulheres das nossas
boates quando eles assumiram eram prostitutas que queriam ganhar a vida, e
outras…

​— E outras?

​ Outras porque eram jogadas lá pelas suas famílias. A Lei da Máfia não

tinha espaço nenhum para as mulheres, e elas eram posse dos seus pais e,
depois dos seus maridos. Hoje não aceitamos mais essa agressão das
mulheres sendo descartadas nos bordéis da Famiglia. Isso acabou com uma
nova lei que foi implantada nas máfias Cosa Nostra e Bratva e nas suas
aliadas, mas que não mudou nas outras que são nossas rivais.

​ A Lei Sarah Cooper é famosa, embora não confirmada, até porque,



supostamente os Coopers são apenas CEOs. Mas todos sabem que na
verdade, eles são os Chefes da Máfia Americana e têm muito dinheiro. Há,
aliás, políticos e empresários milionários envolvidos para que seus negócios
continuem.

​ essa hora, Enzo parou o carro de forma brusca no acostamento, e os


N
veículos que faziam sua escolta pararam atrás. Em um minuto, homens
fortemente armados nos cercaram.

​ Quem é você? — Enzo perguntou com um tom de voz sombrio, e seus



olhos azuis ficaram escuros e sem o brilho de antes; ao mesmo tempo que
ele falou, sacou sua arma, que estava no coldre.

​— Uma jornalista. Eu já te falei isso, lembra?

​— Eu não estou brincando! Quem é você?

​ Eu odeio as colunas de fofoca, ou aquelas que abordam temas como



agarrar um homem ou ter um encontro perfeito. Quero ser famosa e ganhar
prêmios; por isso, investiguei tudo sobre a máfia para uma reportagem.
Pensa uma mulher falando sobre o crime organizado! Pensou? Não, em vez
disso, você me apontou uma arma. Minha editora, apesar de ser mulher, tem
ideias machistas e não acredita no meu potencial. Ela disse que isso não é
para mulher e inventou um afastamento, mas, na verdade, me demitiu. Por
esse motivo, sou muito fã da Máfia das Mulheres e acho que toda forma de
empoderamento é válida. Tentei falar com Anne Cooper Stanford num
evento na semana passada, mas ela não quis me dar uma entrevista. Só que
agora eu mudei completamente a minha matéria: vou escrever sobre o tráfico
humano de mulheres com base em todos os relatos que escutei. Há muitas
histórias sobre aquelas pobres jovens que eram obrigadas a servir àqueles
velhos nojentos, que devem posar como homens de bem da sociedade. Eu
não tenho medo. Vou contar o que eu vivi e ganhar meu prêmio…

​ pós ouvir isso, Enzo abaixou a arma e segurou firmemente meu rosto
A
calando-me com um beijo. Sua boca parecia devorar a minha, e eu
correspondi, sentindo que todo o meu corpo parecia estar em ebulição. O seu
gosto era delicioso, e eu acompanhei o movimento dos seus lábios com
sofreguidão. Depois ele afastou um pouco a sua boca, e senti os meus lábios
inchados, arrepiando-me assim que percebi o seu olhar brilhando de tesão.
​— Por que você me beijou?

​— Você fala demais, e eu não sei como fazer você parar…

​ Melhor tentar novamente, porque eu ainda estou com vontade de falar um



pouco mais — falei e beijei rapidamente os seus lábios.

— Não podemos fazer isso! — ele disse, afastando-me.

​— Por quê? Você não quer?

​ Eu não devo! — Enzo respondeu, fazendo sinal para que os seus homens

voltassem para os seus carros e retornando para a estrada. — Eu vou te
deixar em casa e voltar para a Cosa Nostra.

​ uas palavras me trouxeram de volta à realidade e me dei conta de que o


S
havia beijado tão intensamente que teria sido capaz de transar com ele ali
mesmo, ignorando os soldados que estavam cercando o carro. Nós éramos
de mundos diferentes, e, com certeza, foi por isso que ele se afastou de
mim.

​— Por que você disse que não deveria me beijar?

​ Porque você tem a sua vida em San Francisco, e eu, a minha na Cosa

Nostra. Vou te deixar em casa, e nunca mais vamos nos ver.

​— Não podemos ser amigos? Pode ser sem beijo.

​— Eu não tenho amigas e nem amigos, só aliados.

​— Ótimo! Podemos ser aliados!

​— Que tipo de aliança você tem para me oferecer?

​ Eu não cito a Cosa Nostra no meu artigo, e você me conta mais sobre a

Máfia Salvatrucha para a minha matéria sobre o tráfico de mulheres.

​ Bela tentativa, mas isso não é aliança, uma vez que só você sai ganhando

se eu te contar sobre a Salvatrucha. Eu vou te dar um conselho: não cite o
nome dessa máfia no seu artigo, porque eles virão atrás de você, e eu posso
não estar perto novamente para te proteger. Se quiser escrever sobre o tráfico
de mulheres e a sua experiência nessa semana em que ficou sequestrada e
que poderia ter acabado da pior maneira, escreva, mas não cite o nome da
máfia responsável por isso!

​ m seguida, Enzo ligou o som do seu carro bem alto e começou a cantar,
E
“Enemie” do Imagine Dragons, ignorando a minha presença. Ele se
preocupou comigo e pareceu que isso o deixou constrangido, como se ele
não quisesse demonstrar que tinha sentimentos, e eu respeitei o seu silêncio.

— Posso te pedir um favor? Você pode verificar se entre as meninas


que foram resgatadas na boate há uma que se chama Rebecca? Pode ver se
ela está bem? Essa jovem dividiu o quarto comigo e me ajudou. Eu queria
poder ter notícias dela.

— Sim! — ele respondeu sem olhar para mim e continuou em


silêncio.

​ ssim que chegamos a San Francisco, respirei fundo, sentindo-me em casa


A
novamente. Enzo parou o carro em frente ao meu prédio de dois andares e
observou o local que não era um dos mais ricos da cidade.

​ O bairro é simples, mas o meu apartamento é bem legal! Você não quer

subir para conhecer? Não deve ter nada para comer, mas a gente pode pedir
uma pizza, e eu pago, porque em casa eu tenho dinheiro! Pede para os seus
homens irem na frente e verem que está tudo limpo. Não vou te fazer
nenhum mal! Prometo!

​ E quem disse que eu estou com medo de você, Senhorita Raissa? Vem

que eu vou te acompanhar até a sua casa e te deixar em segurança. A pizza
fica para outro dia, porque realmente preciso resolver alguns assuntos em
Los Angeles, antes de retornar para a Cosa Nostra.

​— Então teremos outro dia?

​— Foi modo de falar... eu tentei ser educado.


​ ntão subimos as escadas do meu prédio, e, quando entrei em casa meu
E
corpo ficou meio mole, o que me levou a me ajoelhar no chão da sala e a
chorar. Voltar para casa me fez perceber tudo que eu poderia ter perdido.

Assim, eu me dei conta de que a vida era uma caixinha de surpresas.


Eu não costumava procurar os meus pais, estava sempre ocupada com os
meus artigos e querendo vencer na minha carreira, amava os meus avós, mas
não me lembrava de ligar para eles.

Até as minhas amigas eu não via com tanta frequência desde que
havia me mudado. Com isso, percebi que ninguém sentiu a minha falta,
dando-me como desaparecida; e um dia quando notassem, já seria tarde
demais.

​ Vem, Raissa! Eu sabia que uma hora você se daria conta de tudo que

passou. Você precisa tomar um banho e descansar!

Após sugerir isso, Enzo foi até a cozinha pegar água para mim. Nesse
instante, abri a gaveta da mesinha de cabeceira e peguei um comprimido
antiestresse que eu costumava tomar quando estava muito agitada e não
conseguia me concentrar para escrever calmamente.

Em seguida, entrei no banheiro e tomei um banho, tentando me


limpar de todas as lembranças das mãos daquele velho nojento tocando no
meu corpo. Pensei em tudo que escutei das meninas, nos tapas que levei na
cara, no quarto em que fiquei trancada e, por fim, relaxei, lembrando-me do
beijo de Enzo.

Saí do banho e, quando cheguei à sala não vi ninguém. Fui até o


quarto procurar por Enzo, mas ele também não estava lá. Voltei para a sala e
vi que tinha um bilhete em cima da mesa. Quando o peguei, comecei a me
sentir triste, porque já sabia que era de despedida e que eu não veria mais o
meu mafioso.

“Raissa, precisei ir embora porque tenho assuntos importantes para


resolver. Vou deixar o número do meu celular, e, se você precisar de alguma
coisa, pode me ligar. Por favor, tome cuidado e me prometa que não vai
citar nomes no seu artigo, pois, só pelo conteúdo, já vai ser com certeza bem
polêmico. Se cuida e procure um terapeuta, porque você certamente tem
problema de fala compulsiva, Bella Mia! Enzo Cosa Nostra”

Ao terminar de ler, resolvi perdoá-lo por me mandar procurar uma


terapeuta, porque no bilhete ele me chamou de Bella Mia. Sem dúvida, eu
ligaria para ele assim que comprasse um aparelho novo de celular. No
entanto, primeiro eu dormiria e só depois pensaria em tudo que tinha para
fazer.

“Prêmio Pulitzer, estou a caminho!”


Capítulo 09
Raissa

​Eu não poderia perder tempo, nem ficar sentada no meu quarto pensando no
que aconteceu, porque tudo muda muito rápido e uma notícia pode se tornar
ultrapassada um segundo depois de acontecer.

Os sentimentos também costumam mudar e tendem a se harmonizar


com o passar dos dias. Logo, eu precisava escrever tudo que estava na minha
mente e falar sobre os horrores do tráfico de mulheres.

Também queria contar tudo o que suportei quando estive em poder


da Salvatrucha, a sensação de impotência e a vergonha que passei ao me
sentir como um objeto, mesmo sabendo que não era culpa minha estar
naquele situação.

Outra coisa que decidi depois de refletir muito foi não dar queixa
sobre o fato na polícia e colocar no artigo que não me senti segura, uma vez
que o cliente que pagou para me violentar era um político. Eu sabia que
gente grande estava por trás das máfias, mas nada disso me intimidaria, e eu
contaria tudo.

​ or um momento, fui à rua resolver tudo que precisava antes de mergulhar


P
por completo no artigo que escreveria. Aproveitei e comprei um aparelho de
celular e pedi um número novo. Não queria mais usar aquele que ficou nas
mãos da Salvatrucha.

Em seguida, mandei mensagens para a minha família e para as


minhas amigas, avisando sobre o número novo. Para evitar muitas perguntas,
disse apenas que estava em uma nova fase da minha vida e, como tinha me
mudado e saído da revista, decidi mudar o número do celular também.
Sinceramente, foi a desculpa mais esfarrapada que eu poderia ter
inventado, mas foi a única que me veio à cabeça.

​ odos salvaram o número novo sem fazer perguntas, e, minha mãe e minha
T
avó me desejaram tudo de melhor nessa nova fase da minha vida. Por um
lado, eu me senti mal por não contar a verdade para elas, mas, por outro, não
poderia perder tempo relatando tudo e ainda deixando as duas preocupadas:
primeiro, pelo sequestro, segundo, porque denunciaria a máfia à imprensa.

​ u estava no mercado comprando sucos, frutas e saladas para consumir nas


E
horas em que eu ficaria em casa, imersa e isolada de todos para escrever,
quando Luanne me enviou uma mensagem.

Luanne: Estou salvando o número novo! O que aconteceu? Você


saiu da boate com aquele homem lindo, não deu notícias por dois dias e
agora troca de número. Tá fugindo do cara?

​ aissa: Isso o tempo vai mostrar. Eu estou indo passar uns dias com a minha
R
família na Filadélfia, e conversamos melhor quando eu voltar.

Eu conhecia Luanne e sabia que, se não inventasse isso, ela bateria à


minha porta e só iria embora quando eu contasse tudo que aconteceu nesses
dias, o que, na imaginação dela, teria a ver com momentos de muito sexo
com o bandido do Johnny.

​ ssim que entrei em casa, arrumei todas as compras, tomei banho, coloquei
A
uma roupa confortável e abri o meu computador. Fiquei tamborilando os
meus dedos no teclado e olhando para o meu celular. Sabia que faltava fazer
uma coisa e não aguentei a ansiedade.

Raissa: Como vai o meu mafioso favorito?

​ espirei fundo depois que enviei a mensagem e lembrei que ele,


R
provavelmente, nem responderia, já que não tinha o meu número salvo, e
essa mensagem poderia ser qualquer pessoa. Sabia que tinha sido muito
burra por não ter assinado a mensagem.

Enzo: Por aí, tentando extrair informações de um inimigo!


​ eu coração disparou quando vi que ele respondeu, mas a resposta vaga me
M
deixou na dúvida se ele sabia ou não quem tinha enviado a mensagem. Será
que muitas mulheres escreviam para ele? Por que eu estava com ciúmes de
um homem que, com certeza, nunca mais encontraria?

Enzo: Ficou com medo de mim, minha jornalista favorita? Ou será


que você fala muito e escreve pouco?

Meu Deus! Ele sabia que a mensagem era minha!

Raissa: Como eu poderia ter medo do meu herói?

Enzo: As pessoas não costumam me ver como herói!

Raissa: Bom saber que você só salvou a minha vida, e que eu tenho
um herói exclusivo!

Enzo: Você está brincando com fogo, Senhorita O’Brien!

Raissa: Talvez eu queira me queimar, Senhor Cosa Nostra!

Enzo: Isso não é assunto para eu conversar enquanto estou


torturando alguém.

Raissa: Então termine de matar seu inimigo, que eu vou trabalhar


também.

Enzo: Vejo que tomou juízo e voltou para a revista. Vai escrever
sobre relacionamentos a distância?

Raissa: Não, meu mafioso, vou escrever um artigo sobre a maldita


Salvatrucha e o que vivenciei durante dois dias em que estive nas mãos
deles. Depois vou oferecer o artigo para um jornal.

Enzo: Droga, Raissa, eu mal te conheci e já não tenho paz! Se você


fizer isso, vou ter que ir para a América te proteger.

Raissa: Então vem logo meu herói!


Enzo não respondeu, e eu fiquei com o meu coração acelerado, ou
melhor, com o meu corpo em chamas.

Ele disse que, se eu publicasse, teria que me proteger. Meu mafioso


era um fofo, mas eu precisava parar de pensar nele.

Também me lembrei das palavras de Anne, dizendo que, na máfia,


não existia glamour! Como eu poderia punir assassinos frios e cruéis ao
considerar que um deles era o meu herói?

Gostaria de saber por que nós seres humanos somos tão complexos.

Por fim, afastei os pensamentos nada virtuosos e totalmente


pecaminosos com Enzo e comecei a dar vida ao meu artigo: TRÁFICO DE
MULHERES GERA MILHÕES DE DÓLARES À RECEITA DA
MÁFIA.

Vocês estão preparados para falar da verdadeira máfia?

Não com base em reportagens rasas, mas, sim, a partir de um


depoimento verdadeiro de quem já sofreu na pele o que é ser sequestrada
por essa facção criminosa?

Estão preparados psicologicamente para saber dos abusos que


esses homens cometem contra mulheres, como eu ou como você que está
lendo este artigo, as quais eles simplesmente olham na rua e decidem levar
para trabalhar como prostitutas em suas boates?

E foi com essa chamada que comecei a escrever cada linha, contando
os meus sonhos interrompidos temporariamente pela maldita Salvatrucha no
dia em que eu comemorava o meu aniversário em uma boate.

Fiz referência sobre o que me aconteceu com essa cultura machista


que nos cerca, e que vê em tudo que a mulher faz uma espécie de oferenda
para os homens.

Contei o drama que vivi quando acordei dentro de uma boate de


prostituição e a forma promíscua com que os homens se dirigiam a mim e às
outras mulheres.
Não romantizei o fato, e nem busquei palavras que levassem a
entender o contexto do que eles falavam, mas descrevi as suas falas com a
mesma vulgaridade que as escutei.

Usando um nome fictício, pois não tinha o contato de Rebecca para


pegar a sua autorização e expor a sua narrativa, contei tudo que ela viveu
desde que foi sequestrada e teve a sua inocência e sua vida roubadas, aos
quinze anos. Também falei de outros casos que ela me relatou no dia em que
estive naquele inferno antes de ser salva, contraditoriamente, por outra
máfia.

Eu sabia que não deveria usar dois pesos e duas medidas, nem citar a
Cosa Nostra e entregar os nomes daqueles que me salvaram, tampouco
arriscar a única chance que todas essas escravas teriam de ser salvas pela
Máfia das Mulheres, a qual compreendi que não era ficção, e que existia sim,
fazendo a diferença na vida das mulheres que pertenciam a facção.

Eu não tinha esperança de que meu artigo fizesse com que as


autoridades se mexessem e prendessem os culpados, ou que investigassem
cada boate de prostituição ou os subsolos dos cassinos, porque todo esse
esquema envolvia muitos poderosos.

Porém, queria que a sociedade soubesse que esse submundo existia,


que falasse sobre isso e que discutisse sobre esse fato.

Quem sabe assim, no futuro, essa situação imoral que era o tráfico de
mulheres, acabasse.

Passei mais de vinte e quatro horas sentada em frente ao computador.


Escrevi uma matéria que poderia ocupar tranquilamente uma página inteira
ou até duas de um jornal.

Denunciei a Salvatrucha, falei que tinha um CEO patrocinando o


local para que financiassem droga, dei o nome do cassino onde a boate
ficava, mencionei que fui oferecida para um Senador, e que não fui até a
polícia por medo, porque sabia que muitos estavam na folha de pagamento
da máfia.
Quando terminei de escrever, pensei em Enzo e no seu pedido para
que eu não citasse nomes, mas não pude atendê-lo pois precisava contar
tudo.

No entanto, poupei a Cosa Nostra, relatando apenas que homens de


preto invadiram o local e libertaram as mulheres. Frisei que aproveitei para
fugir e que não revelaria quem me ajudou a voltar para casa, porque não
tinha autorização para isso e porque tal informação seria irrelevante perto de
tudo que eu estava expondo nessa matéria.

Por fim, decidi levá-la pessoalmente ao editor de um dos maiores


jornais de San Francisco.

Eu não queria dormir ou descansar. Apenas fechei o computador,


tomei um banho, me arrumei, fiz um pequeno lanche e fui até o jornal.

Por sorte, o editor se lembrou do convite que me fez uma vez para
escrever artigos como freelancer para o jornal e aceitou me receber quando
eu disse que era urgente e tinha uma matéria bombástica para lhe mostrar.

Em minha presença, ele leu várias vezes tudo que eu escrevi, sempre
colocando as mãos na cabeça, respirando fundo e parando para beber água.
Eu estava ansiosa querendo saber o que ele tinha achado, mas não poderia
interromper os seus pensamentos.

​— Isso é nitroglicerina pura, Raissa!

​ Eu sei, mas não é maior que a dor e o pânico que senti ao ser presa

naquele inferno, ou o tormento das mulheres que estavam lá há anos e de
tantas outras espalhadas pelo mundo.

​— Você tem certeza de que quer publicar isso?

​— Tenho!

​ Então vamos assinar o contrato! Se você estiver de acordo com o que eu



tenho a oferecer por essa matéria, publicaremos amanhã mesmo e na
primeira página!
​ eu coração disparou ao ouvir isso, porque pensei que seria apenas uma
M
matéria para o jornal, sem cogitar que ela ganharia destaque na primeira
página, para que todos os que passassem pelas ruas vissem, e que ficaria
estampada em um dos sites mais visitados pelos leitores em busca de
notícias.
Capítulo 10
Raissa

Saí do jornal e fui direto para casa. No caminho, não queria pensar em nada
que me levasse a temer pelo que fiz. Queria publicar a matéria sobre a máfia,
e isso já estava feito. Dessa vez, precisaria ser forte para enfrentar a minha
família que não sabia de nada. Então resolvi ligar para os meus pais que
atenderam rapidamente à minha chamada de vídeo.

— Oi, filha! — minha mãe atendeu, sorrindo.

— Oi, mãe! Eu pretendia passar uns dias com vocês depois do meu
aniversário, mas aconteceram tantas coisas.

— Eu e seu pai já estamos acostumados com a sua falta de tempo


para a família.

— Não foi por isso dessa vez! Eu preciso ter uma conversa muito
séria com vocês, mas, antes de tudo, olhem bem para mim e vejam que estou
muito bem!

Precisava tranquilizar os meus pais, já que sabia que o meu relato


cairia como uma bomba sobre as suas cabeças.

Assim que comecei a falar da noite na boate, percebi que minha mãe
ficou agitada, mas nem de longe ela imaginava tudo que viria pela frente.

Quando relatei a parte em que acordei em um lugar estranho, minha


mãe começou a chorar abraçada ao meu pai, que estava sem cor e parecendo
que desmaiaria.
À medida que fui avançando na história, os dois só choravam, e meu
coração disparou quando contei que fui salva pela Cosa Nostra e pela
Bratva. Nesse instante, escutei o grito de dor da minha mãe.

— Raissa, você tinha que ter nos avisado! Minha filha, você precisa
voltar para casa, ficar perto da gente, deixar essa cidade!

— O problema não é a cidade, e, sim a máfia, eles estão em todos os


lugares!

— Raissa, volta para casa, minha filha! Você não conhece essa gente!
Vem para casa, por favor!

— Não fica assim! Eu sei o que estou fazendo e não posso viajar
agora, porque amanhã minha matéria sobre tudo que aconteceu vai sair na
primeira página do jornal aqui de San Francisco e ganhar o mundo.
Denunciei esse esquema, contei tudo que passei. Por esse motivo, liguei para
contar isso para vocês. Sei que deveria ir pessoalmente, mas foi tudo muito
rápido, e, eu não queria que vocês soubessem pelos jornais. Vocês precisam
contar para os meus avós, porque, mãe, você sabe que a avó é atenta a todas
as notícias da internet.

— Você ficou maluca? Perdeu a noção de tudo com essa mania de


ganhar prêmios jornalísticos? Você denunciou a máfia? — meu pai gritou.
— E liga para nos contar isso como se estivesse falando que foi ao cinema e
denunciou o funcionário que te serviu pipoca doce no lugar da salgada?

— Não foi uma denúncia, foi um depoimento sobre tudo que me


aconteceu como vítima dessa maldita Salvatrucha!

— Sabe quantas pessoas são vítimas dessa gente e nunca denunciam


nada? Sabe por que isso acontece?

— Porque elas morrem antes de contar meu pai, mas eu sobrevivi e


quero que todos se danem!

— A quem essa menina puxou para ser desse jeito? — meu pai
indagou. — Você faz as coisas sem pensar e parece que não tem medo das
consequências! Sempre foi assim!
Meus pais sempre me confrontaram dizendo que eu não tinha medo
de nada e que sempre queria resolver tudo da minha maneira.

Os dois eram pessoas supertranquilas, enquanto eu tinha um gênio


difícil e era muito teimosa.

Eu não me considerava nada disso; apenas era prática e corria atrás


daquilo que eu queria. Porém, dessa vez, eu talvez tivesse sido fria mesmo,
porque, de verdade, não tive medo, somente fiz o que eu queria e achei certo.
No entanto, contar tudo para os meus pais dessa forma pode ter sido errado.

Após falar com eles, eu me lembrei de Enzo me dizendo que eu tinha


a mesma frieza que descrevi em Luna Cosa Nostra e Alya Mikhailova.

De repente, este era o meu problema: eu nasci no lugar errado. Eu


deveria ter nascido mafiosa! Ri desse meu pensamento idiota e fui me deitar,
mesmo sabendo que seria impossível dormir.

∞∞∞

Mal amanheceu, e eu já segurava eufórica o jornal com a minha


matéria na primeira página.

Quase morri de emoção, uma vez que o meu talento havia sido
reconhecido. A matéria estava toda ali, exatamente como eu escrevi, e o
editor do jornal enviou umas dez mensagens me parabenizando, avisando
que a edição impressa tinha esgotado e que o servidor do site estava quase
caindo de tantos acessos na plataforma.

Tudo isso me deixou em êxtase, e o meu celular não parava de tocar


com as minhas amigas me ligando, mas eu não queria falar com ninguém;
desejava apenas aproveitar o meu momento.

Meus pais não se manifestaram, e, não me ligaram nem para brigar


comigo por ter realmente escrito a matéria.
​ u sabia que eles estavam preocupados e se sentiram excluídos quando
E
coloquei minha carreira antes deles.

Talvez eu tivesse sido egoísta, mas batalhei muito por esse dia, que
finalmente chegou. Então abracei o jornal como se fosse o meu filho e
depois o coloquei próximo do meu rosto, para vê-lo bem de perto. Na
verdade, foi impossível ler com as letras se embaralhando, e isso me fez rir.

​Nesse momento, meu celular tocou; dessa vez, era a minha avó, e eu atendi.

— Minha Raissa, sua mãe nos contou tudo ontem à noite, e eu e seu
avô nem dormimos. Eu tinha esperança de que nada disso fosse verdade. Por
que você não veio ficar conosco depois desse pesadelo? Por favor, não se
envolva com a máfia! Você não tem ideia de como eles são perigosos! Essa
matéria assinada por você, filha... Vem embora! Por favor!

​ Estou bem, minha avó! Fique calma, por favor! Prometo que vou visitar

vocês, mas primeiro tenho que resolver tudo aqui, como esclarecer esses
fatos com a polícia. Eles vão querer que eu conte o que aconteceu, depois do
que eu escrevi no jornal. Depois disso, prometo que vou até a Filadélfia para
a senhora ver que estou bem!

​ Polícia? Essa gente vai nos investigar, vão querer saber tudo sobre a

nossa família... Por que você fez isso, Raissa?

​ Não fiz nada! Qual o problema de vocês? Eu não sou a errada, sou a

vítima. Por que, do nada, a minha família decidiu que não posso falar da
maldita máfia?

​ Sei que você foi vítima, Raissa, mas deveria ter nos contado tudo antes e

ficar longe dessa gente.

​ Eu não vou me esconder! Os errados e bandidos são eles! Por que a



senhora e os meus pais não conseguem entender isso?

​— Oh, Raissa, eu temo por todos nós a partir de agora.

​ inha avó encerrou a ligação, e eu fiquei preocupada, porque ela era uma
M
pessoa reservada, que costumava sorrir com as minhas brincadeiras, mas,
sempre que podia, ela se recolhia para um mundinho que parecia só seu
quando se sentava na sua cadeira de balanço perto da lareira. Eu perguntava
se ela estava se lembrando da Rússia, e ela sempre respondia que não tinha
lembranças de lá.

Sua distração era seu blog de culinária, que, com muita dificuldade,
eu a incentivei a transformar em um canal do YouTube. Nos vídeos, ela
estava sempre sorrindo, mas, no dia a dia, era completamente diferente.

Eu me senti triste por deixá-la nervosa com o que aconteceu, mas


escreveria tudo de novo só para sair novamente na primeira página do jornal
e ser reconhecida como jornalista.

​ essa hora, meu celular vibrou, e eram mensagens do meu editor, falando
N
que estávamos em primeiro lugar entre os jornais de notícia e avisando que,
no dia seguinte, teria uma festa e que o diretor do jornal tinha me incluído na
lista dos homenageados.

​ epois meu celular vibrou novamente, e eu corri para ver se era outra
D
mensagem do meu editor, mas era do advogado que o jornal tinha contratado
para me acompanhar na delegacia.

​ om isso, meu coração disparou, e minhas pernas começaram a bater uma


C
na outra. Eu não pretendia ir à delegacia prestar queixa, mas infelizmente o
delegado queria escutar de mim o que tinha acontecido.

Não havia pensado muito nisso e não queria que ele ficasse
investigando nada e chegassem a Enzo, mas o advogado me disse que eu só
precisava confirmar o que escrevi no jornal e não era obrigada a revelar
quem me tirou de lá naquela noite.

​ or fim, tomei um banho e me arrumei. Na hora marcada, estava na


P
delegacia conforme o combinado. O delegado me fez um monte de
perguntas, e contei tudo que sabia. Ele disse que, se eu precisasse, poderia
disponibilizar um policial para fazer a minha segurança.

​— Não será necessário! Eu não preciso de segurança.

— Você tem realmente ideia do que é a máfia?


Com essa indagação, eu me lembrei de Anne Cooper, que também
me fez uma pergunta parecida. Então, pela primeira vez, a ficha por meio da
qual eu romantizava a Máfia das Mulheres e subestimava a máfia começou a
cair.

— Nós precisamos de alguma pista que nos leve a essas mulheres


que estavam presas nesse lugar. Você sabe se elas também conseguiram sair
da boate, e se também conseguiram fugir? Você pode descrever como eram
esses homens que chegaram atirando?

— Não!

​ Eu mandei analisarem as câmeras de segurança da rua onde ficava a



boate, mas todas foram destruídas justamente naquela noite. Quem te ajudou
depois do que aconteceu foi alguém do cassino? Ou você não quer citar
outras máfias envolvidas?

​ Eu não conheço as máfias, só sei que era um esquema de tráfico humano



da Salvatrucha, porque as meninas falaram. Quero que as pessoas saibam
que mulheres são traficadas e que elas têm que tomar cuidado. Também
desejo que se sensibilizem com a dor dessas mulheres, que, com certeza,
teriam dificuldades de recomeçar uma vida em sociedade sem serem
julgadas por algo do qual elas não têm culpa. Agora, se o senhor quer
prender alguém da máfia, não conte comigo, porque eu, provavelmente, já
estou com o meu pescoço a prêmio por ter escrito sobre a Salvatrucha e não
preciso de outra máfia com raiva de mim.

​— Então você admite que outra máfia invadiu a boate?

​ Eu não admito nada, nem vim dar queixa do que me aconteceu, porque,

como escrevi, não senti e não sinto segurança na polícia! Não quero ofendê-
lo, mas passei por momentos desagradáveis e estou aqui há quase uma hora,
e o senhor não me perguntou pelo Senador infeliz que queria pagar por mim
na boate!

​ Voltaremos a conversar. Qualquer ameaça, nos comunique. Se precisar,



eu envio dois policiais para cuidarem da sua segurança.
​ or fim, dispensei a escolta da polícia e, sinceramente, não gostei do
P
delegado. Entendi que ele cumpriu o seu papel, mas vontade mesmo de fazer
alguma coisa ele não tinha ou não podia. Vai saber!

Nesse meio, tudo era possível, e eu queria apenas voltar para casa e
ir, no dia seguinte, à festa onde eu receberia uma homenagem e analisaria
uma proposta de trabalho que o editor do jornal disse que teria para mim.

​ ntrei em casa exausta e liguei para os meus pais, que estavam irredutíveis
E
quanto à minha ida para a Filadélfia.

​ Se isso vai deixar vocês mais tranquilos, amanhã eu tenho uma festa do

jornal e, depois de amanhã, vou passar uma semana com vocês. Assim vocês
vão ver que estou bem e que sou dura na queda!

— Faça isso, Raissa, porque você é independente. Eu admiro a sua


atitude, mas, ainda assim, você é a nossa filha, e estamos preocupados.

Então nos despedimos, e passei o resto do dia conversando por


chamada de vídeo com as minhas amigas e marcando de conversarmos
pessoalmente quando eu voltasse da Filadélfia. Elas ficaram desesperadas
com tudo que aconteceu, imaginando que poderia ter ocorrido com qualquer
uma delas. Foi difícil convencê-las de que eu queria ficar sozinha e estava
cansada; por fim, elas entenderam.

​ esde que o meu sequestro aconteceu, eu ainda não tinha parado para
D
descansar, respirar ou pensar direito em tudo. Só depois que eu me deitei,
coloquei a cabeça no travesseiro e relembrei cada segundo desde o meu
aniversário até esse momento, foi que me dei conta de que havia feito tudo
na base da emoção, sem pensar se haveria consequências.

Assim como um mantra, eu repeti mentalmente que ficaria tudo bem


e que eu não precisaria me preocupar com nada.

​ u já estava pegando no sono quando meu celular vibrou, fazendo-me sorrir


E
ao ver que era uma mensagem de Enzo.

​ nzo: Você não fez o que eu te pedi! Você escreveu uma matéria e citou o
E
nome da máfia.
​ aissa: Eu pensei que você estivesse me escrevendo para me dar parabéns
R
por ter a minha matéria na primeira página do jornal.

​ nzo: Você é muito teimosa! Estou indo para San Francisco. Não saia de
E
casa até eu chegar.
Capítulo 11
Enzo Cosa Nostra

​— Vocês, traidores, serão julgados de acordo com a lei da Cosa Nostra,


aquela que na iniciação cujo domínio está sob a Instituição, vocês juraram
jamais descumprir! Na máfia, a lei é cumprida à risca, e vocês, seus vermes,
deveriam saber disso! Portanto, não fiquem pedindo perdão, que isso me
revolta ainda mais do que a traição! — Luna falou enquanto eu cortava com
uma faca o peito dos traidores.

Os cortes lentos e rasos faziam a carne deles sangrar, levando-os a


sentir uma dor intensa em vários pontos, já que, por não serem profundos,
permitiam que a tortura durasse mais tempo.

— Por acaso, vocês não sabem que, na máfia, ninguém deve pegar
aquilo que pertence ao outro? Vocês achavam que ao serem pegos ajudando
a Salvatrucha a espalhar droga no território americano, isso passaria
despercebido? Quatro soldados da Cosa Nostra, oito da Bratva e dez da
Máfia Cooper! Vinte e dois soldados aliados, burros e iludidos que achavam
que estavam fundando uma nova sociedade contra os seus Chefes. — Luna
continuou falando com seu tom de voz suave e, ao mesmo tempo, maligno.
— Acharam que não seriam trazidos para a Sicília para serem julgados e que
ficariam em Vegas como se nada tivesse acontecido? Que não
descobriríamos o nome de um por um de vocês?

Eu podia sentir o cheiro do medo dos covardes que facilitaram a


entrada daquela porcaria de droga letal no nosso território. Quanto maior era
o medo que eles sentiam, menos vontade eu tinha de precipitar as suas
mortes.

O silêncio então foi interrompido pelos gritos de um infeliz que


passou a se debater, como se fosse possível escapar. O homem começou a
pedir perdão e a dizer que não resistiu quando soube que o pagamento eram
noites vips com as mulheres da boate, afirmando que trabalhavam demais
para a Instituição e viviam na seca.

O soldado, além de traidor, era um completo idiota, porque disse que


se vendeu pelo motivo que minha prima e futura Chefe da Cosa Nostra mais
abominava: abuso contra a mulher!

Luna seguia à risca a Lei Sarah Cooper e, para ela, qualquer homem
que violasse uma mulher tinha a sua sentença de morte decretada.

Meu tio Dante havia tirado o poder que os homens tinham como
donos das suas esposas e ordenou que fosse dado um corretivo inesquecível
em quem não cumprisse a lei.

Porém, com Luna, não existia segunda chance; ela era inflexível e
implacável quanto aos direitos das mulheres.

Minha prima não hesitou um segundo e, assim que escutou as


palavras imundas do soldado, pegou uma das facas que estavam em cima da
mesa e cortou fora a língua do porco machista, como ela o chamou. Depois
ordenou que fossem cortadas as demais partes do seu corpo e as dos outros
infelizes, até que acabassem as suas vidas miseráveis.

— Vocês nunca mais vão roubar o que não lhes pertence, nem usar os
seus paus em mulheres indefesas! Seus porcos nojentos! — Luna falou,
cuspindo nos soldados, e foi se sentar para esperar que a sentença deles fosse
cumprida.

Já era noite, e dois soldados ainda resistiam à tortura. Os miseráveis


não morriam e insistiam para serem perdoados. Nesse momento, meu celular
vibrou em meio aos gritos daqueles homens, e eu espontaneamente sorri ao
ler a mensagem.

Raissa tinha um jeito de falar inconfundível, e eu sabia que aquela


mensagem de número desconhecido era dela.

Qual mulher, tirando a minha jornalista tagarela e sem noção, além


de esfomeada, enviaria uma mensagem se referindo a um homem como eu
como “meu mafioso preferido”?

Trocamos algumas mensagens, e foi impossível não sentir certa


tensão entre nós. Por alguns minutos, foi como se eu estivesse longe da Cosa
Nostra e ao seu lado na América.

— Já está tarde! Deixe nossos homens terminarem o serviço e vamos


voltar para a mansão — Luna falou, trazendo-me de volta à realidade.

Então guardei o meu celular e mandei que nossos homens acabassem


logo com os infelizes e limpassem tudo.

A noite estava fria e Luna me abraçou enquanto caminhávamos até o


carro para se proteger do frio. Eu era o primo mais velho e tinha um
sentimento de proteção por Luna, Matteo e Antonella, filhos dos meus tios
Dante e Giancarlo.

— Eu vi o seu sorriso quando recebeu uma mensagem agora há


pouco — Luna falou enquanto eu dirigia. — Quem era? Posso saber?

— Ninguém importante, e eu não estava sorrindo!

— Esse ninguém que te fez sorrir é a americana que você levou


embora depois que estouramos o cassino em Vegas?

— Eu apenas dei uma carona para a moça porque ela precisava de


ajuda.

— Sim, coisa supernormal para homens como você! — ela


exclamou, rindo.

— Eu posso ser um assassino e não ser um exemplo de bom


samaritano, mas não me custa ajudar quem precisa de vez em quando.

— No caso, é a primeira vez que eu te vejo ajudando alguém


desconhecido, e foi logo dando uma carona de nove horas entre uma cidade
e outra, sem necessidade porque resgatamos as moças da boate e a repórter
foi a única que não foi na van. Você nem participou da reunião com os
Coopers depois da operação, e eu cheguei a cogitar que retornaria sozinha
para a Cosa Nostra sem a sua companhia.

​ Eu não deveria ter falado sobre ela com você, porque agora nessa sua

cabecinha já estão se criando várias fantasias.

​ Só me preocupo porque nunca te vi passando o seu número para nenhuma



mulher e com ela foi diferente. Você sabe que muitas mudanças aconteceram
na Instituição, mas uma que não acabou foi o casamento arranjado e em
troca de alianças. Já discuti sobre isso com o meu pai, e Alya já esgotou os
argumentos com Mikhailov, mas eles deixaram claro que, para a Lei Sarah
Cooper ser aceita, foi preciso intervir nos lares da máfia. As mulheres
sempre pertenceram aos seus maridos, e eles podiam fazer o que bem
entendessem e não eram cobrados por isso. Por um lado, a intervenção veio,
as mulheres deixaram de ser espancadas, e qualquer denúncia passou a ser
averiguada. Por outro, para não perder o controle da nossa sociedade, ela se
fechou ainda mais, e o casamento entre filhos da máfia virou uma lei
absoluta. Eles criam suas filhas para ser esposas dos homens da Instituição, e
essa moeda de troca, casamento por aliança, continua.

​ Eu sei disso! Quando Anne se casou com Noah quase houve uma guerra,

mas a verdade é que por ser no fundo uma filha bastarda da máfia não deram
tanta importância. Mesmo assim, para evitar que isso virasse exemplo,
nossos pais e tio Giancarlo decidiram que os costumes agora seriam
cobrados com a expulsão da Instituição, que significa ficar vulnerável aos
seus ex-aliados e inimigos.

​ a máfia, só se conquistava a liberdade com a morte. Ser expulso era o


N
mesmo que assinar sua sentença fatal. Era como quebrar um código que já
nascia com a pessoa no berço da Instituição, que a desmoralizava, a destruía,
a marginalizava e, por fim, ceifava a sua vida.

​ u sabia que toda essa conversa no carro era porque meu pai e meu tio
E
Dante estavam querendo que eu me casasse. Já tinha noção de que estavam
buscando uma noiva que interessasse à Cosa Nostra. Antes, não me
importava com isso; primeiro porque achava que esse dia demoraria a
chegar; segundo porque sabia que funcionava assim e nunca tive motivos
para contestar uma ordem do meu pai e do meu tio, que era o meu Chefe.
​ Não se preocupe. Raissa foi só uma carona. Eu vou cumprir o destino que

meu pai escolher para mim.

​ una então deitou a cabeça no meu ombro e respirou fundo, enquanto olhava
L
a névoa que cobria a estrada que ligava a casa de tortura à Cosa Nostra.

​ Eu não quero te ver sofrer e juro meu primo, que por você eu declaro

guerra a todos e mudo essa porra de lei.

​ una era impulsiva como a mãe, mas, no fundo, ela sabia que medir forças
L
com seu pai não era nada fácil. Em alguns anos, meu tio pretendia passar o
poder para ela, e eu previa que esse reinado de Luna à frente da Cosa Nostra
seria bem turbulento.

​ u deixei Luna na casa principal da Cosa Nostra e segui para a minha, e


E
quando cheguei, encontrei os meus pais na sala tomando um vinho.

​ Você demorou! Foi difícil o julgamento dos vermes? — meu pai



perguntou.

​ Como sempre foi um muro de lamentações e pedidos de perdão. Eu vou



tomar um banho e dormir porque estou exausto.

​— Tome um banho e desça porque preciso conversar com você.

​ Sim, senhor! — falei contrariado, mas, se a minha mãe não se meteu e



mandou meu pai esperar para conversar comigo, o assunto deveria ser sério
e não poderia ficar para depois.

​ egui para o meu quarto e tomei um banho demorado. Lembrei-me das


S
mensagens que troquei com Raissa, e minha mente me levou direto às
recordações dos nossos poucos momentos juntos e do nosso beijo.

A repórter tagarela tinha um beijo tão bom que só de pensar meu pau
já dava sinais de vida. Por fim, deixei a água cair sobre o meu corpo e decidi
que não dormiria, e sim sairia com alguma das tantas mulheres que faziam
fila para estar na minha cama.
​ epois do banho, eu me arrumei e mandei uma mensagem para Matteo,
D
avisando que iria à boate e chamando-o para ir comigo. Em seguida, desci
para conversar com o meu pai e saber qual assunto tão sério e urgente ele
tinha para tratar comigo.

​— Então meu pai, qual é o assunto tão importante?

— Eu e seu tio já escolhemos a sua noiva! Amanhã, no casamento da


filha de Bellucci, ela vai estar presente já que sua família veio da Rússia para
o evento com o propósito de vocês se conhecerem.

— Amanhã? Você me fala que eu vou conhecer a minha noiva que


vocês escolheram para mim, e me diz simplesmente que vai ser amanhã? Eu
não vou nem ter tempo para pensar…

— Você não tem o que pensar! Está decidido, e pronto! — meu pai
falou e colocou sua taça de vinho na mesa, dando um beijo na minha mãe e
dizendo que estava esperando por ela no quarto.

— O que aconteceu, Enzo? Você sempre soube que esse dia


chegaria? O que mudou?

— Nada mudou, minha mãe, só não queria saber que ficaria noivo na
véspera.

​— Você não vai ficar noivo; vai apenas conhecer a moça.

​ Nem você acredita nisso, minha mãe. E eu sei que você não aceita nada

disso, tanto que é uma das fundadoras da Lei Sarah Cooper.

​ Eu não aceito, mas nem tudo conseguimos mudar. Se a Instituição abre



para qualquer pessoa entrar, fica vulnerável, e, por isso, essa regra medieval
é mantida: casamento somente entre os filhos da máfia!

​ u não discutiria com a minha mãe, porque, se tinha alguém que sempre
E
lutou a favor de mudanças na máfia, essa pessoa foi ela. Não poderia cobrar
nada dela, porque havia coisas que eu aceitava e que pareciam estar no meu
sangue, com as quais ela não concordava.
​ meu treinamento começou aos dezesseis anos e contra a sua vontade.
O
Cresci na máfia, então, tudo que acontecia na nossa sociedade era normal
para mim. Apesar de não ter sido torturado pelo meu pai desde criança, eu
sabia que o dia de me tornar seu sucessor chegaria. Nunca hesitei ou quis
algo diferente disso. Sempre desejei ser o seu substituto, comandar tudo ao
lado de Luna, Matteo e Antonella.

Nós quatro crescemos sabendo que esse dia chegaria e nunca


pensamos em fugir do nosso destino que era manter viva a Máfia Cosa
Nostra.

​ a primeira vez que torturei um homem ao lado do meu pai, levei muito
N
tempo no banho, esfregando cada parte do meu corpo onde o sangue dos
nossos inimigos tinha respingado.

Ao longo dos anos, isso se tornou uma rotina. Nossos antepassados


torturavam seus filhos desde o nascimento, para que se transformassem em
demônios sanguinários, mas eu achava que isso já vinha gravado no nosso
código genético de mafioso.

Independentemente de quando começávamos, criança ou adulto, o


mal despertava e nos tornava esses homens frios e impiedosos em busca do
poder absoluto.

Enfim, dei um beijo na minha mãe e fui buscar Matteo para me


acompanhar até a boate. Tudo que eu precisava naquela noite era de muita
bebida e uma mulher que me fizesse esquecer que eu conheceria minha
noiva no dia seguinte.
Capítulo 12
Enzo Cosa Nostra

​Entrei na sala de reuniões da Cosa Nostra e encontrei meu pai e meus tios
reunidos. Os três olharam na minha direção, e era visível que estavam
irritados por conta de um ataque em nossos depósitos, e a suspeita era de que
a Israelli estivesse por trás disso.

​ Israelli vinha tentando nos intimidar e ganhar mais espaço na Europa. Eles
A
tinham mudado a liderança recentemente e isso sempre era motivo de
preocupação, já que, quando um novo chefe assumia queria mostrar serviço.

— Bom dia! — cumprimentei friamente os três e me sentei junto


deles.

​ Você está atrasado, Enzo! — meu tio Dante falou com sua voz autoritária

de Chefe, deixando claro que, naquele momento, não estava em reunião com
o seu sobrinho.

​ O senhor me desculpe, Chefe, é que eu cheguei agora há pouco em casa



e, por isso, me atrasei.

​ Eu vou fingir que não percebi o seu sarcasmo e deixar passar, mas não

me importo com quantas horas você gasta trepando com as suas mulheres,
nem se você vai passar em casa ou vir direto para cá. Só não admito que
você chegue atrasado. Ficou claro isso para você ou não, meu querido
sobrinho?

​— Isso não vai se repetir!


​ eu tio Giancarlo se levantou e serviu whisky para todos nós. Depois disso,
M
os três continuaram a reunião como se eu não estivesse ali. Tio Dante estava
deixando claro que, como me atrasei teria que esperar a reunião encerrar
para conversarem comigo.

​ Não me importa como, mas precisamos conter a Israelli. Não vou



permitir que eles se aproximem do nosso território.

​ Não se preocupe, Dante! Matteo está neste momento organizando nossos



soldados e vamos contra-atacar, mandando um recado claro para que eles
fiquem longe da Sicília.

​ Eu não acho inteligente entrarmos numa guerra quando estamos tendo



tantos lucros na nossa região — meu pai falou. — Mande um recado que
seja eficiente para não ficarmos perdendo tempo.

​— Será feito isso, Lorenzo, não tenha dúvidas.

​ Com guerra ou sem guerra, o que me interessa é não perder espaço, nem

para a Israelli, nem para outra máfia. Agora precisamos acertar o casamento
do Enzo e depois resolver outro assunto com Luna.

​ Eu não sei se gostaria de me casar tão cedo — Eu falei mesmo sem ser

questionado.

​ Você já tem trinta e um anos, passa a noite em orgias e se atrasa para os



seus compromissos; logo, já está mais do que na hora de se casar! O
casamento da filha do Bellucci será às quatro da tarde; portanto, vá para casa
e se arrume que seus pais vão acompanhá-lo. E eu nem preciso ressaltar que
não quero minha doce cunhada dando palpites, porque ela vai querer que o
filho escolha com o coração. Isso é um negócio, e não uma agência de
matrimônios em busca de um final feliz.

​ Nunca é tarde para lembrar que minha esposa, sua doce cunhada, foi

escolha sua, meu irmão — meu pai retrucou.

​ Eu nunca vou esquecer isso, até porque você revidou, encontrando



alguém mais teimosa que minha doce cunhada para se casar comigo.
​ Parem com isso! — Giancarlo pediu. — Já tem mais de trinta anos, e

vocês ainda não aceitaram que o destino dos irmãos Cosa Nostra era se casar
com três mulheres mandonas?

​ Daqui a cem anos, ainda estarei acusando De Lucca por ter começado

com essa revolução quando se casou com sua adorável Sarah Cooper.

​ ra sempre assim, o tempo passava, e eles ainda se mostravam


E
inconformados por terem que aceitar minha mãe e minhas tias no comando.
No dia em que passassem o poder para Luna, no lugar de descansar,
apreciariam a velhice reclamando de ter uma mulher no comando da Cosa
Nostra, e, acusando minha madrinha Sarah por isso.

​ Você está dispensado, Enzo! Pode ir se arrumar para conhecer a sua



futura esposa, pois seu pai tem em mente que seja essa jovem associada à
Bratva.

​— E se eu não gostar da noiva que vocês escolheram?

​ Você vai se casar do mesmo jeito! Tem que ser uma filha da máfia. Isso

faz parte das nossas leis, e não vou abrir mão. Já cedemos em muita coisa,
mas permitir pessoas de fora nos deixa vulneráveis. Portanto, é primordial
que haja o casamento entre os que tenham o sangue da Instituição correndo
em suas veias.

​ u me retirei sem dar uma palavra e visivelmente contrariado. Nunca faltei


E
com respeito à Cosa Nostra e às suas leis, e não seria diferente, mas me
permitiria sentir raiva; primeiro por não querer me casar; segundo por não
ter o direito de escolher minha futura esposa.

​ m seguida, encontrei Luna na porta da sala de reuniões, e ela me olhou com


E
um ar de preocupação. Senti que ela queria me falar algo, mas demonstrou
não ter tempo, porque estavam esperando-a para uma reunião. Apenas dei
um sorriso frio para ela e me retirei.

∞∞∞
Tomei um banho gelado para tentar esfriar a minha cabeça e ainda
mais a minha alma, porque, pela primeira vez, estava fazendo algo
contrariado na Cosa Nostra.

Eu sempre soube que esse dia chegaria, e nunca havia me importado


com o fato de me casar com uma filha da máfia. No entanto, dessa vez,
como o momento havia chegado, estava ansioso e sem vontade nenhuma de
passar o resto da minha vida com alguém que não escolhi para estar ao meu
lado.

​ epois vesti minha camisa social preta, coloquei o coldre com as minhas
D
armas, fechei o colete e o terno, respirei fundo e desci as escadas para
encontrar os meus pais, que estavam discutindo.

​ Eu não sinto que o meu filho está animado com essa história de você

escolher a sua esposa.

​ Acontece que o “nosso” filho é um Cosa Nostra e vai seguir os nossos



costumes. Não nos casamos com pessoas que não têm o sangue da
Instituição. Você, meu amor, e suas amigas são as três exceções, e acredite: a
máfia pagou um preço alto por isso, incluindo uma lei nova.

​ Pois eu acho que a máfia ficou muito melhor com a “nossa chegada” e

que a Lei Sarah Cooper só fez corrigir os erros que a Instituição cometia
com as mulheres.

​ Acontece que os associados temeram que com isso suas filhas ficassem

sem casamento, que todos se casassem com quem quisessem, que a
Instituição se perdesse, e, para manter o controle, tivemos que ser rígidos
com o casamento entre os filhos da máfia e isso não está aberto a discussões.

​ Não precisam discutir por isso. Estou pronto para me sacrificar em nome

da Cosa Nostra — falei assim que cheguei à sala e recebi o olhar frio do meu
pai.

​ inha mãe saiu caminhando na nossa frente, deixando claro que estava
M
contrariada com esse noivado arranjado. Ela tinha um gênio difícil e poderia
até se curvar às leis da máfia, mas nunca sem discutir ou enlouquecer o meu
pai.
​ or fim, seguimos em carros separados até a casa do nosso associado, onde
P
se realizaria o casamento. Fui em silêncio, pensando em como seria a minha
vida dali para frente. Nessa hora, meu celular vibrou, e era uma mensagem
de Luna.

​Luna: Já foi para a festa?

​Enzo: Estou chegando agora. Nos falamos mais tarde.

​ m seguida, guardei o celular e me juntei aos meus pais, que me


E
aguardavam ao lado de fora do carro. Foi inevitável perceber o olhar de
pânico dos convidados quando viram o meu pai que não costumava
comparecer às festas da Famiglia em casa de associados.

Ele era o mais temido dos irmãos Cosa Nostra, e muitos o


comparavam com o demônio; por isso, evitavam olhar para ele com medo.
Sempre que meu pai aparecia de repente, era porque algo tinha acontecido, e
ele iria interrogar alguém, o que deixava todos assustados.

​ Que honra receber o senhor na minha casa! — Bellucci falou, quase



fazendo uma reverência para o meu pai, enquanto minha mãe só observava,
como sempre, e, achava todo aquele tratamento especial um exagero.

​ festa tinha uns quinhentos convidados circulando pelo jardim, e a


A
cerimônia começou alguns minutos depois que nós chegamos.

Inevitavelmente, todos os olhares estavam voltados na minha


direção. Foi impossível não perceber que as pessoas cochichavam e que as
moças suspiravam, como se quisessem ser escolhidas por mim. Porém,
naquele momento, eu me lembrei de Raissa, que era tão diferente das minhas
pretendentes, com sua irreverência e seu jeito de falar sem parar.

​ uando a cerimônia acabou e os noivos foram receber os cumprimentos,


Q
todos começaram a conversar, ou melhor, a negociar, que era na realidade o
que os homens da máfia faziam nesses eventos.

​ m casal então se aproximou acompanhado da sua filha, e, quando


U
cumprimentou o meu pai com um sotaque russo, entendi que aquela moça
era minha futura esposa.
Ela era morena, tinha um cabelo liso que ia até a cintura, usava um
vestido vermelho-escarlate até a altura do joelho e um sapato com saltos
enormes. Mesmo assim, continuava baixa em relação à minha altura. Os
olhos dela eram cor de amêndoa. Quando seu pai me chamou, eu me
assustei, porque estava distraído, tentando analisar rapidamente aquela
desconhecida com quem queriam que eu me casasse.

​ Essa é minha filha Natalya — Rurik falou, apresentando-me sua filha,



que sorriu para mim.

​— Muito prazer, Enzo Cosa Nostra — apresentei-me friamente.

​ Vocês vão ficar por quantos dias aqui na Sicília? — minha mãe

perguntou, tentando quebrar o gelo daquela situação embaraçosa.

​ Vamos ficar mais cinco dias, porque tenho algumas reuniões nesta

semana com alguns associados — Rurik respondeu. — Inclusive,
poderíamos aproveitar e marcar uma reunião. O que você me diz, Cosa
Nostra?

​— Vou entrar em contato! — foi tudo que meu pai respondeu.

​ Você gostaria de dar uma volta pela festa? — perguntei a Natalya numa

tentativa de conhecê-la um pouco melhor.

​— Eu posso dar uma volta com Enzo, meu pai?

— Claro que sim! — Rurik respondeu, mostrando que estava


contente com a possibilidade de uma união entre a sua família e a minha.

Eu e Natalya nos afastamos dos nossos pais e nos misturamos aos


convidados.

— Você conhece a Rússia? — Natalya perguntou, puxando assunto


comigo. — Tirando a mansão Bratva e os aniversários da Alya...

​— Sempre que vou à Rússia só fico na mansão Bratva e depois retorno.


— Ainda não conheço a Sicília. Quero ver se consigo sair nestes dias
em que vou estar aqui.

— Infelizmente não vou poder te mostrar a cidade porque estou


viajando para Dubai nesta semana para algumas reuniões, mas tenho certeza
de que você vai gostar muito da Sicília.

— Que pena!

Nesse momento, percebi que ela ficou triste com a minha resposta,
enquanto eu me senti aliviado porque não queria tanta aproximação por
enquanto.

De repente, meu celular tocou, e eu atendi, porque era uma ligação


do meu pai avisando que ele e minha mãe já estavam indo embora.

Lorenzo Cosa Nostra definitivamente não gostava de festas e só


havia ido àquela para me enforcar com uma aliança de casamento. Eu já ia
guardar o celular quando vi que tinha uma mensagem de Luna.

Luna: Você já olhou a internet? Sua jornalista escreveu uma matéria


que ocupou a primeira página do jornal falando sobre tráfico de mulheres.
Ela contou que viveu essa experiência na própria pele quando foi
sequestrada pela Salvatrucha.

Ao ler isso, pedi licença para Natalya enquanto clicava no link que
Luna me enviou e lia a matéria que Raissa escreveu. Ela só poderia ser louca
para fazer uma coisa dessas e denunciar uma máfia no jornal como se não
fosse nada demais.

Eu não pensei em mais nada e comecei a trocar algumas mensagens


com Raissa e só depois me lembrei da Natalya, que estava ali na minha
frente querendo a minha atenção enquanto meu pensamento estava na
América.

Logo depois, a orquestra começou a tocar a valsa dos noivos, e


Natalya ficou olhando para mim. Enfim, acabei convidando-a para dançar.
Ela era agradável, e talvez, se eu não estivesse preocupado com a minha
jornalista até aproveitaria mais da sua companhia, mas meu pensamento
estava longe. Por isso, precisei me despedir e deixar a festa apressado.

Voltei para casa e deixei uma mensagem avisando que estava indo
para os Estados Unidos e de lá seguiria para Dubai. Quando cheguei ao
aeroporto, o jatinho já estava pronto, e, assim que embarquei, meu celular
vibrou com uma mensagem do meu pai.

Lorenzo: Estou atento e sei que você se encantou por uma


americana, só não se esqueça dos seus compromissos. Boa viagem, e não se
atrase para a reunião com os investidores em Dubai.

Enzo: Eu sei que nasci um Cosa Nostra e com as responsabilidades


que esse nome carrega. Até a volta, meu pai.
Capítulo 13
Raissa

​Ainda nem havia amanhecido quando dei um pulo da cama, animada com a
festa em que eu seria uma das homenageadas. Não poderia mentir: dormi
muito melhor depois que recebi as mensagens do meu mafioso preferido,
que, com certeza, eu não veria nunca mais na minha vida.

​ u estava na cozinha preparando um café, mesmo sendo quatro horas da


E
madrugada, quando a campainha tocou e me assustei.

Achei estranho, mas logo imaginei que se tratava de Luanne, que


estava sem dormir e madrugou na minha porta como tinha feito outras vezes,
para saber de tudo que estava acontecendo. Sua visita se daria pelo fato de
eu não ter tido tempo de parar para conversar com as minhas amigas, já que
o meu dia tinha sido extremamente agitado.

​ nquanto caminhava até a porta, fiquei pensando que era até bom ser
E
Luanne, porque era sinal de que minhas amigas não estavam magoadas
comigo achando que eu tinha ficado metida por estar na primeira página do
jornal, mesmo que isso quase tivesse custado a minha vida.

​ uando abri a porta, tinha um buquê de rosas-vermelhas no chão com um


Q
cartão, e sorri, pegando-o ansiosa para saber quem tinha me enviado flores
tão cedo.

Assim que comecei a ler o cartão, minhas pernas ficaram trêmulas, e


respirei fundo, sabendo que precisava ser forte e entendendo que isso já era
esperado. Porém, eu não me intimidaria com nenhuma ameaça.
“Senhorita O'Brien, parabéns pela excelente matéria que você
escreveu. Realmente você é uma jornalista muito talentosa, e espero
sinceramente, que você já tenha conquistado todas as suas ambições
profissionais, que tenha aproveitado bastante e realizado todos os seus
sonhos nesta sua curta jornada de vinte e três anos.”

Como eu não era nenhuma idiota para não entender que estava sendo
ameaçada pela Salvatrucha, liguei imediatamente para o meu advogado, que
mandou que eu ficasse calma e não abrisse a porta para ninguém. Isso nem
seria preciso, já que eles enviaram flores, e se quisessem teriam vindo até a
minha casa, arrombariam tudo e me matariam. Mesmo assim, ele disse que
em meia hora estaria comigo para irmos juntos até a delegacia.

​ esse meio-tempo, tomei um banho rápido e me arrumei. Quando vi o meu


N
celular vibrando eu corri para atender à ligação, achando que era o advogado
avisando que tinha chegado para me buscar, mas na verdade, era uma
mensagem de um número desconhecido perguntando se eu tinha gostado das
rosas que tinham sido deixadas na minha porta.

Malditos!

Eles estavam tentando me assustar antes de acabar com a minha vida.


Contudo, eu não tinha medo deles e não me arrependia de ter contado sobre
eles na mídia. Se as pessoas preferiam morrer caladas, eu preferia morrer
lutando e falando o que pensava.

​ uando o advogado chegou, desci apressada para me encontrar com ele, no


Q
caminho até a delegacia enviei uma mensagem para Enzo, mostrando uma
foto do cartão que eu tinha recebido, mas ele não respondeu. Então entendi
que o seu silêncio era algo como: “Eu te avisei, azar o seu”.

​ a delegacia, fui recebida por todos com uma expressão que parecia dizer
N
“quem procura acha”.

Eu poderia até ter sido suicida ao escrever a matéria, mas era melhor
do que me acovardar e não denunciar, mesmo que ninguém se importasse.

Infelizmente, mulheres eram traficadas na cara da nossa sociedade


que fingia que nada disso acontecia.
​ ui embora para minha casa com a brilhante conclusão do delegado de que,
F
na minha profissão, se colecionava inimigos.

Inimigos! Como assim?

Eu nunca tinha escrito nada contra ninguém, a não ser que sites de
relacionamentos me odiassem por eu escrever matérias dizendo que eram a
maior furada.

Havia denunciado uma agressão que eu e mulheres sofremos por


conta da máfia e, quando disse que eles sabiam muito bem disso,
praticamente escutei que não poderiam fazer muito por mim, mas que
deixariam um policial de plantão me acompanhando. Além disso,
mencionaram que, se eu quisesse, poderia tentar ser incluída no serviço de
proteção, ou seja, mudar de identidade e deixar a minha vida atual para viver
me escondendo.

​ u estava com raiva por me sentir impotente diante de uma Instituição que
E
nunca seria punida e pelo fato de o delegado ainda querer que eu
confirmasse que me salvei durante uma guerra entre máfias.

​ O que o delegado queria era jogar tudo que aconteceu naquela boate,

incluindo a morte dos figurões da alta sociedade, numa guerra entre máfias e
ainda me deixar contra a Cosa Nostra e a Bratva. Seria muita burrice minha
ajudar essa polícia, que não me estendeu a mão, para jogar a culpa em quem,
não me importam os motivos, acabou me salvando daquele lugar.

​— Você é uma jovem corajosa, Senhorita O'Brien.

​ Se eu tivesse nascido na máfia, seria como Sarah Cooper — falei, rindo.



— Mas, como não nasci, vou ter que usar minha força de cidadã comum,
comparecer ao jantar de hoje à noite e fingir que não estou nem aí para a
ameaça que recebi.

​— Não seria melhor ter pedido o serviço de proteção?

​ Eu vou ao jantar hoje à noite e de lá vou direto visitar a minha família e



pensar no que fazer, mas uma coisa é certa: está para nascer quem vai calar
Raissa O'Brien!
∞∞∞

Eu estava deitada na minha cama com o celular desligado porque eu


não queria falar com ninguém, muito menos receber mensagens anônimas.

Respirei fundo e senti meu corpo tremendo de ansiedade por conta de


tudo que estava acontecendo.

Eu havia sido sequestrada pela Salvatrucha, apanhado, fui


humilhada, exposta, vendida para um filho da puta, e salva por máfias rivais
da que me colocou em cativeiro. Depois disso voltei para casa, escrevi um
artigo contando tudo, minha matéria foi primeira página de um jornal
impresso e a mais lida na internet, e por fim, fui ameaçada de morte.

Sabia que, para muitos, o certo era ter deixado tudo para lá; afinal, eu
era uma mulher que morava sozinha em San Francisco, a qual, por não ter
mantido a boca fechada, poderia ter colocado a própria vida, a da família e a
dos amigos em risco.

Eu enfiei o rosto embaixo das cobertas, como se isso fosse me


proteger do mundo, sentindo ódio da Salvatrucha, da polícia, dos homens
machistas e de todos os que achavam que eu deveria ter me calado.

Lembrei-me da minha família, que também julgou a minha matéria


como errada, ou seja, era eu contra todos, e ninguém estava ao meu lado me
apoiando.

Com isso, eu me senti sozinha, sem ninguém. Então me levantei, fui


tomar um banho e me arrumar para o jantar. Aquela noite, a homenagem e o
reconhecimento pelo meu trabalho, que foi tão esperado por mim enquanto
estudava e sonhava em ser uma grande jornalista, tornaram-se um grande
pesadelo.

Enfim, coloquei um vestido longo vermelho, com um decote em V e


as costas nuas. Quando me olhei no espelho, eu me achei linda e poderosa.
Depois prendi o cabelo com um coque e fiz uma maquiagem leve para
realçar o meu batom vermelho. Em seguida, coloquei meus saltos nude e fui
até o evento sozinha no meu carro, escutando “False Alarm” do The Weeknd
e cantando alto para espantar os meus próprios pensamentos.

Assim que cheguei ao salão do hotel onde estava acontecendo o


evento, fiquei encantada com a decoração, com a banda tocando e com os
convidados, que eram pessoas famosas no meio jornalístico.

Meu editor, assim que me viu, veio logo me abraçar com um sorriso
largo no rosto. Ele estava feliz com os números alcançados com a minha
matéria do dia anterior, os quais fizeram com que o seu jornal fosse líder nas
tiragens impressas e visualizações na internet, em todo os Estados Unidos.

​ Senhores, conheçam Raissa O’Brien, a jornalista destemida que enfrentou



o alto crime organizado para contar as agressões sofridas por ela nos últimos
dias — meu editor falou, apresentando-me para uma roda de jornalistas e
empresários.

​— Seu artigo foi muito bem escrito e muito audacioso.

​ Você nos mostrou um lado da máfia sombrio tão pouco falado pela

imprensa e pelas autoridades.

​ nfim, passei uma hora antes de o jantar ser servido escutando elogios ao
E
meu artigo e recebendo parabéns pela minha coragem, mas não ouvi nenhum
apoio pelo que passei ou comoção pelas mulheres traficadas.

​ uando o apresentador do evento subiu ao palco, ele começou


Q
homenageando jornalistas de vários segmentos, como esporte e política, e
todos os convidados aplaudiram entusiasmados cada nome citado, até que
ele disse que queria chamar uma jovem jornalista, audaciosa e corajosa, que
calou o país e fez todos pensarem até quando a sociedade se calaria e se
curvaria às atrocidades cometidas contra as mulheres. Notei que ele não
mencionou a máfia, mas não me importei, porque sabia que ninguém queria
se comprometer. Então subi ao palco com o coração disparado.

​ Muito obrigada a todos por essa homenagem! Eu quero dedicar este



prêmio a todas as mulheres do mundo que já sofreram violência e, em
especial, as que estavam presas comigo naquela boate, vítimas da Máfia
Salvatrucha. Que vocês estejam seguras onde estiverem e que tenham a
chance de recomeçar! Boa noite!

​ essa hora, sorri emocionada quando vi que todos estavam aplaudindo de pé


N
o meu discurso. Depois voltei para a minha mesa, recebendo cumprimentos
por todo o caminho.

Meu editor me disse que sabia que eu precisava descansar durante


alguns dias e que depois, se eu quisesse, ele ficaria honrado em me ter como
parte da sua equipe.

​ Eu vou viajar por alguns dias e, em breve, estarei de volta para trabalhar.

Tenho muitas reportagens para escrever; afinal, só tenho vinte e três anos —
falei, e ele sorriu, sabendo que eu estava falando do bilhete que recebi com
uma ameaçava.

​ epois fui dar uma volta pelo salão e, quando vi uma varanda, resolvi ir até
D
lá para respirar um pouco de ar fresco. Então me encostei na sacada e fiquei
admirando a vista, enquanto a brisa gelada nas minhas costas nuas me
deixava arrepiada.

​ Sempre linda! — alguém falou, e senti um arrepio quando escutei aquela



voz que eu conhecia muito bem, fazendo o chão sair de debaixo dos meus
pés. — Você vem comigo! — ele disse, colando o seu corpo no meu
enquanto encostava algo gelado nas minhas costas.

​ Johnny! — falei sem me virar e sabendo muito bem que ele tinha uma

arma nas minhas costas.

​ Eu sei que você não sabe se grita, se me chuta ou se me dá um soco —



ele falou, esfregando o nariz no meu pescoço e, logo depois, passando a
língua na minha orelha. — Só que você não vai querer que mais ninguém
aqui nesta festa morra além de você, não é verdade? E, acredite, eu posso te
matar agora e mais quem estiver no meu caminho, ir embora
tranquilamente, ou até morrer depois de levar alguns comigo, ou...

​— Fala logo qual a outra opção, seu nojento!

​— Você não me engana, e eu posso sentir o cheiro do seu medo.


​ Seu olfato deve ser muito ruim, porque eu não tenho medo de você! —

falei, virando-me e ficando de frente para ele, que tinha o olhar frio e uma
arma encostada, dessa vez, na minha barriga.

​ Você comigo sem chamar atenção se quiser poupar a vida dos



convidados.

​— E o que te faz pensar que eu me importo com alguém nesta festa?

​ Quer pagar para ver? — Johnny perguntou, guardou a arma e, em fração



de segundos, tirou uma faca de dentro do seu terno e a enfiou várias vezes
em um homem que estava fumando do outro lado da varanda.

​ Eu vou com você, seu monstro maldito! — afirmei, sabendo que, se



gritasse, morreria e ainda levaria mais gente inocente comigo.

​ Boa garota! Você nunca me decepciona! — ele disse, guardou a faca e



saiu caminhando comigo, deixando o corpo do homem caído ali mesmo.

​ pós ver a cena, fiquei impressionada com a frieza com que ele matou o
A
homem e guardou a faca suja dentro do seu terno.

Eu respirava fundo enquanto caminhava rapidamente com ele no


meio dos convidados, que estavam atentos ao show de uma nova banda que
se apresentava.

​ ssim que chegamos ao lado de fora do hotel, fomos caminhando até o


A
estacionamento. Eu tentava parecer forte, mesmo sabendo que o meu fim
estava muito próximo.

​ Não se preocupe, que você ainda vai se divertir muito comigo antes de

deixar este mundo.

​ u não tive tempo de responder e só escutei um barulho. De repente, os


E
braços de Johnny me soltaram, e gritei quando vi uma enxurrada de sangue
vindo na minha direção e cobrindo todo o meu corpo, sangue este que veio
da sua cabeça, que explodiu.
​ Pensavi che avrei lasciato che qualcuno ti portasse, Bella Mia? (Você

achou que eu deixaria alguém te levar, Bella Mia?)
Capítulo 14
Raissa

​Eu estava sentada, chorando na minha banheira e tentando em vão me


limpar de toda aquela sujeira que estava no meu corpo. A água escorria e
lavava tudo. No entanto, por mais que Enzo esfregasse a minha cabeça, o
cheiro do sangue e a gosma no meu cabelo não desapareciam.

Estava literalmente em choque!

Foi tudo muito rápido. Em minha cabeça, vinham flashes de Enzo


mandando seus homens limparem tudo antes que alguém chegasse depois
que ele atirou em Johnny. Além disso, recordava-me do momento em que
seus braços fortes me carregavam até o seu carro e depois até o meu
apartamento, lembrando-me do meu corpo tremendo enquanto ele me
colocava na banheira. Tudo que presenciei pareciam cenas de um filme de
terror.

​ Você me salvou! — foi tudo que eu consegui falar depois do que



aconteceu.

​ Eu sou um mafioso sanguinário, mas parece que, com você, tenho sempre

que bancar o super-herói!

​ Você é um excelente super-herói fora da lei, Enzo Cosa Nostra! — falei e



tentei sorrir, mas estava com tanto nojo daquele sangue todo que tudo que eu
queria era ficar limpa novamente.

Em seguida, Enzo me deixou sozinha para que eu terminasse o meu


banho. Fiquei pensando em como alguém tão letal poderia ser tão carinhoso
ao mesmo tempo. Ele se fazia de frio, mas foi terno ao lavar os meus
cabelos, talvez por imaginar que eu teria nojo de tocar no sangue podre do
traste que ele havia mandado para o inferno.

​ uando saí do banheiro enrolada em uma toalha, foi impossível não notar
Q
que Enzo respirou fundo ao me ver com os cabelos molhados, praticamente
nua, e, sentando ao seu lado na minha cama.

— Obrigada! — Agradeci e deitei a cabeça no seu ombro. — Agora


preciso arrumar as minhas coisas, pois fiquei de visitar os meus pais e quero
pegar um voo para a Filadélfia assim que amanhecer.

​ Raissa, eu não sei se você é muito corajosa, inconsequente ou doida! —



ele falou, levantando-se e me olhando furioso.

​ Enzo Cosa Nostra, quem você pensa que é para falar assim comigo? —

perguntei, colocando-me de pé na sua frente, e, quando ele tocou os meus
ombros de um jeito firme antes de começar a falar, senti um arrepio tomando
conta do meu corpo.

​ Eu peguei um jatinho e matei alguém que provavelmente achou que



poderia tocar no que é… eu matei alguém que poderia ter te matado ou feito
coisa pior antes disso. Você acha mesmo que a morte do Johnny zera tudo
que você escreveu? Eles vão querer que alguém pague pelo prejuízo deles e
como são uns merdas para a Cosa Nostra e a Bratva, vão se vingar de quem
expôs o fracasso deles ao mundo. Se para você e o resto da sociedade seu
artigo foi uma denúncia, para o mundo da máfia, foi a exposição de uma
retomada vitoriosa de território, já que invadimos a boate clandestina e
varremos os ratos daqui.

​ E o que você quer que eu faça? Que eu me esconda pelo resto da minha

vida?

​ Não, Bella Mia! Primeiro eu quero que você coloque uma roupa, depois

que você arrume as suas coisas e venha comigo para Dubai por alguns dias.

​ Dubai? Eu não posso ir com você para Dubai assim do nada. Prometi que

visitaria os meus pais hoje! Já falhei com eles quando escondi tudo que
aconteceu e só contei depois que vendi a reportagem para o jornal.
​ Eu ainda tenho dois dias até viajar para Dubai. Nós vamos até a

Filadélfia, você avisa que vamos viajar juntos, e, sem que eles saibam,
deixarei seguranças cuidando deles.

​— Também tenho avós que estão me esperando.

​ Vou deixar seguranças cuidando deles também, não se preocupe, agora



vamos logo com isso, Raissa!

​— Eu comprei passagem para amanhã cedo, e ainda está de noite.

​ Vamos no meu jatinho até a Filadélfia, ficamos em um hotel e amanhã



resolvemos tudo por lá.

​ Você me convenceu porque nunca andei de jatinho! — falei, dando as



costas para ele que começou a rir. — Porém, só vou com você para a
Filadélfia, e não para Dubai.

​ Você é teimosa, Raissa, mas acredite que ir comigo para Dubai e ficar um

tempo longe de tudo vai ser a melhor solução. Depois te devolvo para a sua
vida normal, com seguranças, é claro, porque não vou arriscar já que você é
descuidada e costuma aceitar bebidas de estranhos, além de escrever
matérias contra a máfia.

— Você vai me vigiar, Senhor Cosa Nostra?

— Não, eu vou cuidar de você, Senhorita O'Brien!

Dei de ombros, fingindo não me importar com o que ele falou, mas a
verdade era que até o seu tom de voz me deixava arrepiada.

Eu deveria estar deitada numa cama, chorando, afinal, tinha sido


ameaçada de morte, quase fui sequestrada novamente, vi um homem morrer
esfaqueado, presenciei o bandido do Johnny ser morto e vi seu sangue podre
cobrir o meu corpo, mas, no lugar disso, eu estava ali, tendo pensamentos
pecaminosos com meu salvador mafioso e herói fora da lei.

Definitivamente, não nasci para ser aquelas mocinhas submissas e


fracas que me cansavam dos livros de romance.
Enzo foi para a sala fazer uma ligação enquanto eu me arrumava, e,
como eu era curiosa, como qualquer jornalista, foi impossível não escutar o
que ele falou, ainda mais porque italianos não costumavam falar baixo.

​ Eu sei o que estou fazendo, Pietro! Quero que a Salvatrucha saiba que a

jornalista é minha protegida, e, que se fizerem algo contra ela, vai ser como
se fizessem a mim! Mande o recado! Temos um acordo?

Nesse momento, senti o ar ficando preso nos meus pulmões com a


intensidade das suas palavras. Enzo estava querendo me defender com a sua
vida? Mas por que ele faria isso por alguém que ele nem conhecia direito?
Alguém que não pertencia ao mundo dele! Enfim, esperei-o encerrar a
ligação e entrei na sala, fingindo não ter escutado nada e disse que estava
pronta.

Enzo então avisou aos seguranças que estávamos saindo e eles


fizeram uma varredura na área antes que deixássemos o prédio para seguir
até o aeroporto. Fomos em silêncio, perdidos em nossos pensamentos e
evitando trocar olhares, porque era nítida a tensão entre nós.

Assim que entramos no jatinho da Cosa Nostra, respirei fundo,


porque algo me dizia que minha vida mudaria dali para frente.

​ Resolvi ir com você para Dubai! — foi tudo que eu falei, antes de colocar

o cinto de segurança e fechar os meus olhos.

Eu estava entrando em um caminho perigoso, ao lado de um homem


desconhecido, que cuidava de mim, mas que também era um bandido.
Porém, ele me atraía e, ao mesmo tempo, me fazia sentir que eu poderia me
machucar.

Mas a verdade era que eu era viciada em adrenalina e estava disposta


a pagar para ver o que aconteceria a partir do instante em que decidi ficar
sob a proteção do mafioso.
Capítulo 15
Raissa

​Assim que desembarcamos, seguimos direto para o Four Season, um dos


hotéis mais luxuosos da Filadélfia.

Fiquei impressionada com a forma como a máfia era organizada,


porque eles chegavam em qualquer lugar e já tinha um carro à sua espera,
esquema de segurança, tudo sincronizado, sem que esperassem um minuto
para se deslocar de um lugar para outro.

​ Posso ir direto para a casa dos meus pais. Acho desnecessário ficar em

um hotel.

​— Pensei em esperar amanhecer, e então eu deixo você lá.

— Tudo bem. Se eu chegar de madrugada e depois contar que vou


viajar, eles vão achar que estou fugindo de alguma coisa.

— Vou fingir que não escutei isso — Enzo falou rindo e eu fiz uma
careta para ele.

Enfim, chegamos ao hotel, e nosso check-in já estava pronto. Fomos


direto para os nossos quartos, que tinham uma porta em comum, que ligava a
minha suíte à de Enzo.

Fiquei pensando em como a vida dava voltas, pois, há pouco tempo,


eu queria escrever sobre as mulheres na máfia, e, no momento, estava
vivendo como se fosse uma delas, quase dividindo o quarto com um Cosa
Nostra.
Em seguida, resolvi tomar outro banho, porque ainda achava que
estava fedendo a sangue podre. Depois sequei o cabelo, coloquei uma
lingerie e me enfiei embaixo das cobertas para tentar dormir um pouco.
Quando acordei, senti um peso sobre o meu corpo de alguém que estava ao
meu lado na cama; eram os braços de Enzo.

Continuei embaixo das cobertas, enquanto Enzo estava por cima


delas. Logo, eu me virei devagar, fazendo com que nossos olhos se
encontrassem.

— Você estava agitada e falando alto sozinha, então abri a porta, e,


quando me aproximei, você se acalmou. Acabei não conseguindo te deixar
sozinha, porque depois disso você dormiu como uma pedra e chegou até a
roncar e babar.

​ Vai pro inferno, seu sapo! Eu me derreto toda com a sua atitude, e, logo

depois vem a derrota. Eu não ronco e muito menos fico babando, Enzo Cosa
Nostra!

​— Eu não sabia que a senhorita se derretia por mim!

​ Pois saiba que me derreti apenas por alguns segundos antes de ficar

congelada. E trate de colocar uma camisa, porque você não precisa ficar
exibindo esse seu corpo gostoso para mim.

​ Bom saber que você me acha gostoso, além de se derreter todinha por

mim.

​ Eu já acordei, estou ótima, e você já pode se dirigir com o seu ego inflado

para a sua suíte.

​ Tudo bem! — ele falou, espreguiçando-se e me fazendo olhar cada



gominho do seu abdômen definido.

​ Vou me arrumar e trate de se arrumar também porque você vai comigo à



casa dos meus pais.

​— O que eu vou fazer lá?


​ Você não quer me levar para Dubai? Então, vamos juntos contar isso para

os meus pais. Quero que eles pensem que estou viajando para me divertir e
não como uma fugitiva da máfia.

​ E você vai me apresentar do nada, dizendo que sou seu amigo e vamos

para Dubai?

​ Sim, eles vão pensar que somos um casal, e, eu acho melhor, porque daí

não ficam questionando.

​ Vamos fingir que somos um casal? Eu estou te salvando e ainda tenho



que fingir que sou seu namorado?

​ Meu mafioso preferido, aproveite que não é sempre que você vai poder

fingir que namora alguém tão gostosa assim como eu! — falei e saí de
debaixo das cobertas, só de lingerie, peguei algumas roupas na minha mala e
fui para o banheiro me arrumar, escutando a respiração ofegante de Enzo
quebrando o silêncio do quarto.

​ Você está me provocando, Senhorita O'Brien! — ele falou com o rosto



próximo à porta do banheiro.

​ Como você é esperto, Senhor Cosa Nostra! Agora vai se arrumar para ser

o meu namorado mafioso de mentirinha.

​ Cuidado com essa sua mania de me dar ordens, porque eu não sou bom

em obedecer e você pode ter problemas com isso.

​ Ainda bem que você é assim, porque eu detesto homens previsíveis! Me



surpreenda Senhor Cosa Nostra e eu te conto se gostei ou não!

​ nzo deu uma gargalhada, e, eu escutei os seus passos indo em direção à sua
E
suíte. Ele era ao mesmo tempo sombrio, hot, e na medida certa para a minha
perdição.

∞∞∞
Fiquei um tempo olhando a manhã fria na Filadélfia pela janela do
hotel e só depois fui me arrumar. Coloquei um jeans preto, botas de cano
longo da mesma tonalidade, uma camisa de gola alta branca e um sobretudo
vermelho-escarlate, da mesma cor do meu batom.

Enzo e eu nos encontramos no corredor e foi difícil medir quem


estava mais impressionado com o outro. Ele estava lindo, com um coturno
preto, um jeans escuro, uma camisa de gola rolê grafite e um sobretudo
preto.

​— Você é um perfeito mafioso com essa roupa.

​ E você, Raissa, está linda! Se fosse uma mafiosa, eu diria que era da

Bratva por causa desse sobretudo com a cor da elite vermelha.

​ E nós então seriamos o casal perfeito para formar uma aliança sólida

entre as duas maiores máfias.

​— Você realmente parece saber tudo sobre a nossa Instituição.

​— Eu sou uma jornalista, senhor torturador.

​— Então você sabe que nosso romance seria impossível.

​ Sim, pois não sou uma filha da máfia. Mas quem disse que além dessa

encenação para os meus pais, eu quero alguma coisa com você, Senhor Cosa
Nostra? — perguntei com o meu rosto tão próximo ao dele que pude sentir a
sua respiração.

​ essa hora, o elevador chegou, e entramos em silêncio, desafiando-nos por


N
meio dos nossos olhares e sentindo uma tensão quase palpável entre nós, que
nos deixava com a sensação de que, a qualquer momento, um pularia em
cima do outro e não seria apenas para trocar um beijo.

​ travessamos o lobby do hotel com Enzo segurando firmemente a minha


A
cintura e minha vontade era de que suas mãos firmes estivessem em outro
lugar do meu corpo.
Ele caminhava de um jeito poderoso, sem olhar para os lados,
parecendo indiferente a todos os que circulavam pelo local, como se só eu e
ele existíssemos no mundo.

​ uando entramos no carro, enviei uma mensagem para a minha mãe,


Q
avisando que estava indo para a sua casa e levando um amigo comigo.
Fiquei tamborilando com os meus dedos no celular enquanto seguíamos em
silêncio pelas ruas da Filadélfia.

​ lguns minutos depois, meu celular vibrou, e era uma mensagem da minha
A
mãe.

​ elena: Oi, minha filha! Estamos na casa dos seus avós, porque hoje é
Y
aniversário de 44 anos do casamento deles, e viemos almoçar para
comemorar. Vem para cá e traga o seu amigo.

​Raissa: Tudo bem! Estamos indo almoçar com vocês.

​ Mudança de planos. Os meus pais foram almoçar com os meus avós, que

estão fazendo 44 anos de casados. Vou te falar o endereço para o motorista
mudar no GPS.

​ Agora eu também vou conhecer os seus avós? Sabia que proteger você

está dando muito trabalho, Senhorita O'Brien?

​— E quando foi que você imaginou que seria fácil, Senhor Cosa Nostra?

​ Só quero saber o que vou ganhar em troca ao fingir que sou seu amigo

para a sua família!

​ Por enquanto, um almoço com pratos típicos da Rússia, e, depois, só o



tempo dirá!

​ eguimos o resto do caminho em silêncio, com Enzo colocando sua máscara


S
de frieza para esconder seus sentimentos. Eu percebia que ele tinha tanto um
lado humano, doce, quanto outro que deveria ter herdado do seu pai,
conhecido por ser o Demônio da Cosa Nostra.
​ u sabia muito pouco sobre ele, sua infância e criação. Nas minhas
E
pesquisas sobre a Cosa Nostra, li que o filho de Lorenzo, que tinha o seu
nome e era conhecido por Enzo, quase morreu aos cinco anos por causa de
uma leucemia e foi salvo pelo seu pai. Eu não poderia dizer se ele adquiriu
algum problema decorrente disso, mas, se tinha, era bem escondido, porque,
olhando para Enzo, só notava que ele esbanjava saúde. E que saúde!

​ inalmente, depois de quase cinquenta minutos, nosso carro parou em frente


F
à casa dos meus avós. Por algum motivo, senti um aperto no peito, como se
levar Enzo a essa casa fosse um erro. Pensei que essa sensação era por ele
ser da máfia, e, então, sacudi minha cabeça, tentando espantar meus
pensamentos.
Capítulo 16
Enzo Cosa Nostra

​Quem olhasse para Raissa, seguindo tranquilamente ao meu lado para a


casa dos seus avós, custaria a acreditar que não tinha nem vinte e quatro
horas que ela havia visto dois homens morrendo, e com o sangue derramado
de um deles sobre o seu corpo.

​ o dia anterior, quando cheguei a San Francisco, dei ordem a três


N
seguranças que fossem até o endereço da Raissa e checassem se o lugar
estava limpo. Os outros me acompanharam até o local onde ela seria
homenageada.

​ u não conseguia acreditar que a maluca da jornalista tinha recebido uma


E
ameaça de morte e, ainda assim, revolvido ir toda linda e plena para o
evento. Linda demais, por sinal! Foi no site do jornal que vi sua foto
estampada com destaque ao lado do seu editor, já que a matéria que ela havia
escrito rendeu recordes de leituras.

​ ssim que cheguei ao local, meus homens saíram do carro para fazer uma
A
varredura no mesmo momento em que vi Raissa deixando o prédio ao lado
de um homem que eu conhecia muito bem, já que sua ficha fora levantada na
investigação das drogas letais que estouramos no esquema em Vegas.

Era Johnny Martinez, americano, filho de latinos que fizeram parte


da alta cúpula da Máfia Latina e um dos braços direitos de Ruan Garcez,
atual chefe da Máfia Salvatrucha. O infeliz foi quem sequestrou Raissa e a
levou para ser uma das suas prostitutas; pelo visto, tinha ido acertar as contas
pessoalmente com a minha… protegida!
​ aí do carro lentamente e fiz sinal para os meus homens ficarem atrás de
S
mim. Segui os dois sem ser notado, já que andar sorrateiramente e
camuflado pela noite era algo que eu sabia fazer muito bem, uma vez que fui
treinado pelo melhor de todos, o meu pai, Lorenzo Cosa Nostra.

Eu me aproximei o suficiente para escutar a hora em que Johnny


ousou dizer que se divertiria com Raissa. Então mirei em sua cabeça,
sabendo que nunca tinha errado um tiro e que aquela não seria a primeira
vez. Assim, estourei os seus miolos para ter certeza de que ele nunca mais
encostaria um dedo na minha jornalista encrenqueira.

J​ amais vou esquecer seu corpo trêmulo, seus olhos arregalados e suas mãos
que não conseguiam tocar em si mesma, com todo o sangue do verme
escorrendo pela sua cabeça em direção ao seu corpo. Naquele momento,
minha parte letal deu lugar ao meu lado humano. Logo, tomei Raissa em
meus braços e a coloquei no meu carro, que, nesse instante, já estava no
estacionamento. Mandei que limpassem tudo e decidi dirigir levando Raissa
sozinha comigo, sendo seguido pelos demais seguranças.

Eu olhava para a estrada enquanto seguíamos até a residência dos


avós dela, pensando em como minha vida tinha virado de cabeça para baixo
nesses poucos dias desde que resolvi dar uma carona para a doida que
resgatei da boate.

Seus olhos pareciam ter invadido a minha alma assim que nossos
olhares se cruzaram pela primeira vez. Eu sabia quanto era errado me
envolver com alguém dessa forma, ainda mais sabendo dos meus
compromissos com a Cosa Nostra. Tinha plena consciência de que só
poderia ajudá-la a se livrar da encrenca em que se meteu e depois
desaparecer da sua vida.

A droga era que a química entre nós era inegável. A diaba parecia me
enfeitiçar com sua beleza, e, nossa troca de farpas, tornava tudo mais
irresistível. Com isso, meu pau doía de vontade de entrar naquela boceta
linda que a porra da calça justa que ela estava usando marcava, despertando
um tesão enorme dentro de mim. Queria afastar os pensamentos, mas tudo
em que eu pensava quando ela me olhava de canto de olho, achando que eu
não estava percebendo como ela ficava me secando, era em tirar sua roupa e
sentá-la no meu colo para cavalgar em mim.

— Você sabe que, se continuar me olhando assim, vai acabar


babando? — a diaba perguntou, colocando a mão nas suas coxas, bem perto
da sua virilha.

​— Nunca fui homem de ficar babando por mulher nenhuma.

​ Então sou a primeira que provoca essa reação em você? Bom saber que

sou tão gostosa assim!

​ Para mim, você não passa de uma encrenca que eu não sei onde estava

com a cabeça quando tentei ajudar.

​ Relaxa! Eu também acho você a coisa mais fofa do mundo, ainda mais

com essa carinha de mafioso mal-humorado.

​ Continue me provocando e você vai ver que não tenho nada de fofo,

muito pelo contrário!

​ aissa então mordeu os lábios, olhando na direção do meu pau, virou a


R
cabeça para o lado e ficou em silêncio, observando a paisagem.

Que raio de lugar longe era esse em que a família dela resolveu
morar, fazendo com que nossa permanência juntos no carro se tornasse uma
prova de resistência?

​ essa hora, meu celular vibrou, e era uma mensagem do meu tio Dante.
N
Algo me dizia que suas palavras não seriam para me desejar uma boa
viagem para Dubai.

​ ante: Soube que você resolveu defender a vida da jornalista americana


D
resgatada na boate em Vegas, se colocando na frente dela e virando alvo dos
nossos inimigos.

​ nzo: Eu não virei alvo da Salvatrucha, porque sou um Cosa Nostra, e eles
E
não são porra nenhuma! Apenas defendi a jornalista que estava sendo
sequestrada.
​ ante: Eu sei muito bem o que você fez, e é claro que apesar de ter matado
D
o verme do braço direito de Ruan Garcez, ninguém vai ousar tocar no meu
sobrinho. Faça o que tiver que ser feito, coloque essa garota em segurança já
que você começou essa merda, e, na volta de Dubai, saiba que você ficará
noivo na mesma semana e se casará logo depois.

​Enzo: Por que essa pressa? Eu não sei se quero casar com Natalya.

​ ante: Eu já decidi que você vai se casar. E a pressa é porque você deixou
D
de usar seu cérebro e está pensando com a porra do seu pau, ou não teria dito
que encostar nessa jornalista é o mesmo que encostar em você, ou seja, na
Cosa Nostra. Enquanto você escolhia suas bocetas sem envolver a Cosa
Nostra, eu não falava nada, mas, no momento em que você perdeu a cabeça
por causa disso, é sinal de que está na hora de se casar, antes que você ache
que pode escolher qualquer uma para fazer parte da Famiglia.

Ao ler isso, minha vontade era de responder para o meu tio que ele
não mandava na minha vida, mas em que merda eu estava pensando? É claro
que ele tinha o poder de decidir tudo, afinal era o Chefe e tinha o apoio do
meu pai e do meu tio nesse casamento que tinha arranjado para mim.

Pensei em Natalya e em como ela era bonita, delicada e agradável.


Tirando o fato de que não estava interessado nela, não encontrava argumento
algum para contestar a escolha. Ela, inclusive, deu a entender que estava
satisfeita com o nosso compromisso pela forma como me olhava, e, eu não
tive como não notar que ela suspirou várias vezes olhando para mim
enquanto caminhávamos e que seu corpo estava quente e trêmulo quando
dançamos juntos.

​ u tinha uma noiva linda, e, no final, nem seria um sacrifício ficar com ela.
E
Decidi que não tinha motivos para reclamar, que me casaria com Natalya e
cumpriria meu dever com a Cosa Nostra.

​ Algum problema? Você parece que ficou preocupado depois que recebeu

uma mensagem.

​— Está tudo bem! Era só o meu tio avisando que…


​ aissa ficou me olhando enquanto me mantive parado, olhando para ela,
R
sem completar a frase.

​ Avisando que está tudo certo para a viagem até Dubai e me passando

algumas recomendações.

​ u não sabia o que me impediu de contar a verdade para Raissa, afinal, não
E
éramos nada um do outro, e nossa relação era de protetor e protegida.

Nada poderia acontecer entre nós, e eu estava ciente disso. O


problema era uma parte do meu corpo que insistia em dar sinal de vida só de
olhar para a dona encrenca sentada ao meu lado.

​ inalmente, depois de um caminho que parecia sem fim, paramos em frente


F
à casa da família de Raissa. Assim que saímos do carro, ela me segurou pelo
braço e antes de abrir o portão disse que precisávamos combinar o que
falaríamos para a sua família.

​— Você tem um segundo nome? Tipo, nome do meio, por parte da sua mãe?

​— Claro que sim! Meu nome é Lorenzo Coleman Cosa Nostra.

​ Tudo bem então! Vou te apresentar como Enzo Coleman para a minha

família. Não vou mentir, apenas usar outro sobrenome seu que não remeta à
máfia. Você não é muito conhecido, não sai tanto na mídia, não vão te ligar
ao sucessor do demônio torturador da Cosa Nostra. Você faz outra coisa
além de torturar pessoas? Algo que a gente possa dizer que você faz e que
saiba falar se te fizerem alguma pergunta?

​ em respondi, peguei Raissa pelo braço e mandei que ela entrasse no carro,
N
dando ordem para o motorista dar uma volta pelo local enquanto
conversávamos.

​ Em primeiro lugar, sua mal-agradecida, gostaria de lembrar a senhorita de



que estou te fazendo um favor em proteger você e sua família das encrencas
em que você se enfia. Em segundo lugar, sou CEO dos vinhedos da minha
família e estou indo para Dubai justamente por conta disso. Vamos exportar
para um grupo novo de lá. Sim, eu torturo nossos inimigos, mas, para sua
informação, senhora jornalista desatualizada, hoje, a máfia atua muito mais
como colarinho branco, lavando altas quantias de políticos corruptos e
empresas fraudadoras de impostos. Aquela época em que os mafiosos se
reuniam em cantinas italianas, quando tudo era sobre droga e tráfico de
armas, está ultrapassada. Agora atuamos em novas frentes, na nata da alta
sociedade, e somos a Instituição que mais lucra em todos os tempos.

​ Muito interessante, mas acredito que essa parte moderna da máfia



podemos ocultar e focar a parte em que você é CEO, que tem um vinhedo e
que vou viajar para escrever artigos sobre a empresa, tipo uma assessora de
imprensa.

​— Você é sempre assim, tão intensa?

​— Sim, sempre intensa em tudo que eu faço.

​ essa hora, engoli seco com a sua resposta e mandei que o motorista
N
voltasse para o endereço, já que estávamos acertados quanto ao teatrinho que
a senhora encrenqueira armou para mim, como se ela estivesse me fazendo
um favor em viajar comigo, e por isso, eu precisasse mentir para a sua
família.

​ aramos novamente em frente à casa dos seus avós e, dessa vez, cruzamos o
P
portão e atravessamos um pequeno jardim até a varanda da casa, na qual
tinha um sofá de balanço amarelo que ocupava quase todo o espaço. Um
senhor abriu a porta, e Raissa o abraçou toda carinhosa, surpreendendo-me
quando falou em russo com ele.

​— (Как хорошо быть здесь с тобой!) Que bom estar aqui com vocês!

​ (Елена, доченька, пойди, посмотри! Раиса приехала!) Yelena, minha



filha, venha ver! Raissa chegou!

​ aissa entrou correndo para abraçar a mãe, enquanto eu fiquei na porta


R
esperando ser convidado para entrar.

— Você deve ser o amigo da Raissa! Seja bem-vindo ao nosso lar!


Eu sou Nikolay Pavlov, o avô da Raissa.
​ (Приятно познакомиться, мистер Павлов!) Muito prazer, Senhor

Pavlov!

​ le me olhou surpreso por eu falar russo, e senti que isso o deixou um pouco
E
assustado. Eu sabia ler as expressões das pessoas e podia sentir o cheiro de
medo nelas. Por algum motivo, o fato de eu saber o seu idioma fez até com
que a respiração do avô da Raissa mudasse, denunciando que tinha algo
errado. Com certeza, eles haviam fugido do regime russo e se refugiaram na
América, onde se acostumaram a viver escondidos.

​ aissa então me apresentou aos seus pais, e o que mais me chamou atenção
R
foi sua avó, que deveria ter por volta de setenta anos e parecia ser uma
mulher tímida, com um olhar triste e desconfiado. Foi impossível não notar
que tanto ela quanto o seu marido tinham cabelos escuros e olhos castanhos,
enquanto Yelena e Raissa eram loiras e tinham olhos claros.

Raissa deveria ter herdado a cor dos olhos do pai, já sua mãe, a dos
seus bisavós, já que seus traços não batiam com o dos seus pais.

Eu não conseguia parar de observar a todos, e, enquanto conversa


sobre assuntos aleatórios com o pai da Raissa, notava os olhares receosos
dos seus avós sobre mim.
Capítulo 17
Raissa

​Eu estava feliz na casa dos meus avós e não imaginei que abraçar os meus
pais me confortaria tanto depois dos últimos dias. Fiquei tão eufórica que
esqueci os problemas — que, com certeza, seriam tema das nossas conversas
de família — quando abracei o meu pai e percebi que Enzo estava
conversando e cumprimentando em russo o meu avô.

​ oi impossível não notar que ele não se apresentou falando o seu nome,
F
certamente por achar estranho o sobrenome Coleman. Então resolvi sair da
formalidade e apresentá-lo apenas como Enzo.

— Estou vendo que meu avô e Enzo já se conheceram. Agora quero


que você conheça os meus pais.

​— Muito prazer!

— O prazer é nosso, Enzo. Eu sou o Mark, e essa é minha esposa


Yelena.

Enzo se sentou, e eu falei que nós nos conhecemos recentemente, que


ele tinha uma empresa para a qual eu havia enviado um currículo, e
explicando que viajaria com ele e sua equipe para fazer sua assessoria de
imprensa.

​ Você vai viajar? — meu pai perguntou. — Eu pensei que tínhamos



combinado de você passar uns dias conosco.

​ O senhor me desculpe, a culpa é minha. Fiquei impressionado com o



texto de apresentação da sua filha e a contatei algumas semanas atrás,
oferecendo o trabalho. Quando eu falei que precisava que ela fosse comigo e
a minha equipe para Dubai em dois dias, ela disse que tinha um
compromisso com a família e eu fiz questão de trazê-la aqui antes da nossa
viagem de negócios.

​ Dubai? Por um lado, fico apreensiva, porque é do outro lado do mundo,



mas, por outro, me sinto feliz, pois espero que esse emprego deixe você
longe dos holofotes — minha mãe falou e me senti mal, porque na verdade
era tudo mentira, e, assim que eu voltasse de viagem, retomaria o trabalho no
jornal.

​ eu pai achou estranho ser tudo tão rápido, mas não teve tempo de falar
M
nada, pois nessa hora, a pessoa mais especial da família veio até a sala.
Minha avó era uma senhora muito reservada e visitas era algo que ela
sempre evitava. Nunca entendi o motivo de ela ser assim tão fechada. Era
sorridente apenas no seu canal de receitas no YouTube, no qual não tinha
contato direto com as pessoas e ainda usava um pseudônimo.

​ Enzo, agora você vai conhecer o amor da minha vida, a matriarca da



família Pavlov, minha avó Polina!

​ (Приятно познакомиться, миссис Павлова!) Muito prazer, Senhora



Pavlova! — Enzo a cumprimentou em russo, e senti que ele parecia analisar
a reação da minha avó por saber o seu idioma.

​ almoço foi servido, e todos ficaram impressionados por Enzo não só


O
dominar o idioma russo, como também conhecer a culinária típica do país.

​— Vocês são de qual parte da Rússia? — Enzo perguntou aos meus avós.

​— San Petersburgo, você conhece?

​— Já estive lá algumas vezes.

​ Enzo é um homem viajado — eu falei, rindo. — Ainda não conheço a



Rússia, mas tenho muita curiosidade por ser a terra dos meus avós e quase a
da minha mãe.

​— Quase?
​ Minha avó veio grávida, então minha mãe é americana com um pé na

Rússia.

— A Rússia não tem nada demais para que você queira ir até lá —
minha avó afirmou e notei que ela estava olhando quase que fixamente para
Enzo.

​ A Rússia tem seus encantos! — minha mãe disse. — Eu também, se



pudesse, gostaria de conhecer. Quem sabe um dia vamos todos juntos!

​ Com licença, vou buscar a sobremesa — minha avó falou e se levantou,



deixando-nos à mesa.

​— Minha avó não gosta de falar sobre a Rússia.

— Me desculpe, a culpa foi minha, que comecei o assunto — Enzo


disse e pediu licença, porque seu celular estava tocando e era uma ligação
importante.

Enzo foi para o jardim falar sei lá com quem e retornou alguns
minutos depois, desculpando-se por precisar ir embora.

​ Eu peço desculpas, mas tenho alguns assuntos para resolver e são



urgentes. Amanhã eu devo te buscar aqui ou na casa dos seus pais?

​ Na casa dos meus pais — respondi, levantando-me para acompanhá-lo



até a porta.

​ Combinado! Realmente preciso ir — Enzo falou e me deu um beijo na



bochecha, surpreendendo-me, já que estava sempre tão distante. — Foi um
prazer conhecê-los! Peça desculpas a sua avó se causei algum desconforto
para ela.

​ u o acompanhei até o lado de fora da casa, porque queria entender o que


E
estava acontecendo e saber se era algum problema comigo e a Salvatrucha.

​ O que aconteceu? Você vai ter que sair para matar alguém de última

hora?
​ Eu nem vou me dar ao trabalho de responder a essa sua pergunta, porque

ao contrário do que você pensa, não passo o meu dia matando pessoas. Só de
vez em quando! — ele falou rindo, e me deu um abraço. — O que eu faço
com você, Senhorita Encrenqueira? — Enzo perguntou e deu um beijo na
minha cabeça antes de entrar no carro.

​ Tenho algumas ideias, mas nenhuma delas termina com você dando um

beijo na minha cabeça.

​ Eu te vejo amanhã, Bella Mia! E cuidado com essas provocações, porque



estou tentando me controlar, mas a senhorita não está ajudando. Saiba que
não sou de ferro! — Enzo falou e subiu o vidro do carro, deixando-me
sozinha em frente à casa da minha avó.

Nesse instante, o carro preto que o seguia com dois seguranças parou
na esquina, e me dei conta de que aquele talvez fosse o primeiro de muitos
dias em que não ficaria mais sozinha, já que teria seguranças cuidando de
mim.

​ m seguida, entrei em casa com um sorriso bobo no rosto que tinha um


E
nome: Enzo Cosa Nostra. Ele mexia comigo de uma forma que era novidade
para mim, algo que me fazia querer ser ousada, como aquelas mulheres que,
na hora do tesão, transavam com o homem até em um banheiro público,
como nos filmes de romance.

​— Nossa! Que caras são essas? Aconteceu alguma coisa?

​ Quando você ia nos contar que está tendo um relacionamento com



alguém da Cosa Nostra? — meu pai perguntou. — Você ficou louca,
trazendo um homem desses para dentro da casa dos seus avós? Perdeu
completamente o juízo?

​ Ele está te obrigando a viajar com ele? — meu avô perguntou com os

olhos cheios d'água. — Ele te obrigou a mentir? Nos ameaçou de alguma
forma? O que ele falou sobre nós?

​ Por favor, vamos por partes! — pedi, sentando-me à mesa e notando que

minha avó estava próxima à lareira, na sua cadeira de balanço, em silêncio,
alheia à nossa conversa. — Enzo não queria mentir; fui eu que não quis falar
o sobrenome dele para evitar justamente todo esse drama.

​— Drama? — meu pai indagou, levantando-se com raiva.

​ Enzo não está me sequestrando, pelo contrário, está cuidando de mim por

conta da matéria lá do jornal. Eu meio que provoquei uma máfia, e ele quer
cuidar para que nada de mau me aconteça. Vamos viajar, e, nesse tempo em
que vou ficar lá, tudo vai se resolver.

​ Essa menina ficou louca ou será que ela nasceu assim irresponsável?

Porque somos pessoas de bem, e eu tenho certeza de que não te ensinamos a
se relacionar com bandidos.

​ eu pai estava nervoso, e, no fundo, eu sabia que ele tinha motivos para se
M
preocupar. Acabei fazendo tudo errado, agindo por impulso e querendo
mudar o mundo, mas não pensei nas consequências. Só tinha vinte e três
anos, e, acabado de me formar depois de fazer todas as matérias que pude
para me graduar mais rápido.

​ inha mãe não dava uma palavra eu sabia que ela ficava triste quando meu
M
pai e eu discutíamos. Eu deveria imaginar que como advogados, meus pais
eram antenados e já teriam visto fotos do Enzo em eventos sociais.

​ Continuando a responder ao interrogatório, eu não estou tendo um



relacionamento com Enzo; somos apenas amigos.

​ inceramente, não entendi a reação exagerada do meu avô, que chegou a


S
pensar que eu estava sendo chantageada por Enzo, e, não deixei passar
despercebida a sua preocupação com o que ele teria perguntado a respeito da
minha família.

​ meu pai não conseguia entender que eu precisava viajar e que essa era
O
uma forma de garantir segurança para eles também, mas não quis piorar a
situação. Sabia que, por um lado, eles estavam certos em se preocupar, mas
por outro, eu era independente e dona do meu nariz.

​ Ligue para esse homem e diga que você não está indo para Dubai — meu

pai ordenou. — Se ele é tão bom quanto você fala e só quer o seu bem, vai
se afastar, porque ele não serve para você.

​ eu coração disparou quando meu pai falou isso, porque eu não queria
M
brigar com ele e desejava entender sua preocupação comigo, mas não me
afastaria de Enzo de jeito nenhum, mesmo que eu não estivesse correndo
risco de vida.

​ Desculpa, meu pai, mas não vou fazer isso. Acho melhor eu ir embora,

viajar, e, na volta, com calma, conversamos. Sei o que estou fazendo. Confia
em mim!

​ Minha querida, como vamos confiar em você? Uma jovem brilhante,



estudiosa, que tem vinte e três anos e já está graduada graças ao seu
empenho, mas que simplesmente parece que brinca com a sorte. Você foi
sequestrada e não nos contou nada. Raissa, eu repito, você foi sequestrada!
Em vez de pedir ajuda à polícia, você escreveu um artigo e mirou na Máfia
Salvatrucha. Agora você aparece, dizendo que vai para Dubai com um
mafioso da Cosa Nostra! Você perdeu completamente a sua razão!

​ or mais que eu quisesse pedir desculpas, também queria consertar a


P
confusão em que os envolvi e para isso, precisava da Cosa Nostra e de seus
seguranças.

Discutimos por mais algum tempo, mas nada me fez mudar de ideia.
Eu preferia que me odiassem a ter que contar que eles seriam vigiados a
distância e que, só na volta, tudo ficaria bem outra vez.

Enzo, com certeza, queria ganhar tempo para que seu recado
chegasse até Ruan Garcez, que certamente não iniciaria uma guerra por
alguém que havia escrito um artigo há dois dias, o qual já seria uma notícia
velha, com o mundo girando tão rápido e trazendo sempre novas pautas.

​ Então dei um beijo na minha mãe e encostei a cabeça nos braços do meu
pai, que estavam cruzados. Eu não queria brigar, mas eles falavam de Enzo
como se suas atitudes não tivessem valor, tampouco o que ele estava fazendo
por mim. Eu queria voltar para o jornal, para a minha vida, e não poderia
fazer isso sem a ajuda da Cosa Nostra.

Que ironia! Denunciei uma máfia e acabei protegida por outra!


​ or fim, decidimos que continuar brigando não nos levaria a lugar algum e
P
minha mãe me convenceu a ir com eles para casa, esperar os ânimos
esfriarem, e então voltaríamos a conversar. Concordei, mas a única certeza
que eu tinha era de que não mudaria de ideia e viajaria com Enzo para
Dubai.

​ esse instante, aproximei-me da minha avó, que estava no cantinho dela,


N
olhando para o lado de fora da janela, e dei um beijo em suas mãos.

​ A máfia é a pior raça que tem no mundo. São monstros frios e letais, e

você trouxe isso para o seio da nossa família.

​ Enzo não é assim… quero dizer, deve ser com os outros, mas não

comigo.

​— Você não conhece a máfia.

— Eu conheço Enzo e juro que ele só quer me ajudar. Depois dessa


viagem, provavelmente nunca mais vou vê-lo de novo.

​ A máfia é como uma erva daninha, que só cresce se tocarmos nela. Uma

vez na máfia, só a morte nos separa dela.

​ Isso é para quem nasce na máfia, mas não temos o sangue deles, nem

temos nada a ver com essa Instituição; portanto, tudo voltará ao normal.

​ Nada volta ao normal quando cruzamos nossos caminhos com os da



máfia.

​ inha avó então fechou os olhos, e lágrimas caíram livremente pelo seu
M
rosto. Nunca entendi de onde vinham sua dor e seu silêncio, muito menos
compreendi por que a máfia a afetava tanto.
Capítulo 18
Raissa

​O dia amanheceu cinzento na Filadélfia e um vento gelado entrava pela


pequena fresta da janela do meu quarto. Eu não gostava de manter a casa
toda trancada, então mesmo com o aquecedor ligado, deixava um pouco de
ar fresco invadir o ambiente.

​ minha visita aos meus pais acabou não sendo nada agradável e depois de
A
muita discussão, eles entenderam que não adiantaria continuar
argumentando, porque eu estava decidida a viajar com Enzo Cosa Nostra.

​ abia que para muitos isso soaria como irresponsabilidade, mas esta era eu:
S
uma jovem de vinte e três anos, que não colocava limites em sua vida. Eu
não me arrependi de ter escrito a matéria para o jornal, mas fiquei triste por
saber que isso havia afetado negativamente a minha família e a colocado em
risco.

Eu era grata por ter conhecido Enzo e por ele ter se disponibilizado a
cuidar da minha segurança e daqueles que eu amava. Sabia que, se não fosse
por ele, nem estaria mais viva. Por motivos óbvios, foi uma pena eu não ter
contado nada disso para os meus pais, que, com certeza, me trancariam
dentro do quarto, achando que, assim, me livrariam da maldade da máfia.

Só Enzo poderia cuidar de mim nesse momento, e, se ele havia dito


que precisava desse tempo em Dubai para que tudo se resolvesse, eu
confiava nele.

Eu estava acabando de pranchar o meu cabelo quando Enzo avisou


que estava na frente da casa dos meus pais. Para viajar, escolhi uma calça
Off-White da mesma cor da minha bolsa, uma blusa de gola alta, uma bota
preta e um sobretudo preto com um abotoamento duplo.

Quando cheguei à sala, achei que o clima estava pesado por conta da
minha decisão de viajar, mas minha mãe apenas me abraçou com lágrimas
nos olhos.

— Cuidado para você não se machucar! Você é corajosa e


extremamente madura para sua idade. É impulsiva e independente, mas,
ainda assim, é uma jovem que vai viajar com um rapaz por quem está
visivelmente encantada.

— Não é nada disso! Somos amigos. Enzo me ajudou e depois da


matéria do jornal, acha que vai ser bom eu ficar um tempo fora daqui. Eu já
expliquei isso para vocês e vou aproveitar a oportunidade para conhecer
Dubai.

— Acredito nos motivos da viagem, menos que você esteja indo só


para conhecer Dubai. Não esqueça que ele pertence a um mundo que não é o
seu.

— Eu não sou romântica e nunca me apaixonei por ninguém.

— Para tudo na vida existe uma primeira vez, e ontem eu vi como


você o defendeu de acusações que são reais, porque, querendo ou não, ele é
um mafioso, um fora da lei, um bandido. Por mais que se romantize a máfia
em filmes e romances, é isso que eles são, assassinos frios, que matam quem
ousa atravessar o caminho deles.

— Tudo bem, Doutora Yelena, eu sei que as acusações procedem,


mas prefiro julgá-lo com base nos fatos que me dizem respeito e, para mim,
ele é… ele é só um homem como outro qualquer.

​ Se cuida, minha filha, e por favor, não faça como sempre; desta vez, eu

quero notícias diárias.

​ inha mãe sabia que era inútil tentar me convencer do contrário ela no
M
fundo entendia, que devido às circunstâncias, eu estava mais segura ao lado
de Enzo do que sozinha em San Francisco. Nesse instante, olhei em volta,
procurando o meu pai, quando o vi entrando em casa, acompanhado de
Enzo.

​ Acabei de conversar com ele, que me explicou o real motivo dessa



viagem. Você nunca deveria ter escrito aquele artigo, mas sei que você
sempre foi destemida, e, que se tiver que lutar pelo direito das mulheres, não
vai se intimidar. Sempre foi assim, desde a escola, sempre militando de
alguma forma. Não vou dizer que você errou em denunciar uma barbaridade
dessas, porque sei que foi um grito de socorro em nome das outras moças e
por tudo que você passou. Só que esse seu jeito independente não nos
permitiu nem te abraçar e cuidar de você depois de tudo que aconteceu. Sou
advogado, defendo inúmeras pessoas, mas não tenho o direito de cuidar da
minha filha, porque ela não permite.

​— Pensei que você estivesse com raiva de mim.

​ Não estou satisfeito com essa viagem, nem vou dizer que ele é o que eu

sonho para minha filha. Não sou hipócrita, mas ele deixou claro que está
fazendo isso apenas para te proteger, e, sei que nesse momento se afastar é o
mais sensato. Só acho que você não tem dimensão da sua nova realidade e
que você vai ser para sempre inimiga da Salvatrucha.

​ Vai ficar tudo bem, não vai, Enzo? —perguntei, olhando para ele, porque

as palavras do meu pai queriam dizer que eu estava ferrada para sempre.

— Vou cuidar para que tudo fique bem! Ninguém vai se aproximar
nunca mais de você; eu não vou deixar.

Minha mãe então demonstrou estar preocupada não só com a minha


segurança, mas também com o jeito como Enzo falou, como se fosse estar
sempre perto de mim, o que nós dois, eu e ele, sabíamos que não
aconteceria. Ele mesmo havia deixado claro que seu compromisso seria
sempre com a Cosa Nostra e que eu não fazia parte da sua sociedade
fechada. Por isso, acreditava que não mais o veria depois dessa viagem.

— Sei que sou teimosa e que sempre quis resolver tudo sozinha, mas
isso não quer dizer que eu não precise de você ou não te ame — falei para o
meu pai, que me deu um beijo e foi para o escritório, porque para ele,
admitir que sua filha viajaria ao lado de alguém como Enzo era demais para
um advogado criminalista.

∞∞∞

Enzo e eu seguimos calados até o aeroporto, cada um pensando nos


seus problemas. Quando o carro parou em frente ao jatinho, respirei fundo e
saltei do veículo, prestes a embarcar numa viagem louca ao lado de um
mafioso da Cosa Nostra.

Sentia que, de alguma forma, no final, isso mudaria a minha vida,


porque, com certeza, eu voltaria diferente depois de tudo que aconteceu. A
ficha de que a minha vida valia mais que um artigo na primeira página já
estava caindo como um rocha na minha cabeça, embora eu fosse teimosa
para admitir uma coisa dessas.

​ empre me preocupei muito em ser livre, em escrever para um jornal, nunca


S
tive tempo para amores, como as meninas da escola. Por isso, não me
envolvia muito com ninguém. Tive meus casinhos, mas nada que me fizesse
perder a cabeça ou me apaixonar, como as minhas amigas.

Eu lembro que na escola, com dezesseis anos, tinha algumas amigas


que haviam jurado morrer de amor pelo menos umas dez vezes, enquanto eu,
que tenho vinte e três anos, nunca havia suspirado mais forte por ninguém.

Nos meus relacionamentos sem compromisso, o sexo sempre foi


bom, mas não arrebatador, como os descritos nos livros, e, quando eu olhava
para Enzo, sentia que com ele seria exatamente assim, porque minha
calcinha ficava úmida só em ter pensamentos proibidos e deliciosos com
ele.

​— Você está pronta, Raissa? Vamos decolar em alguns instantes.

​ eu nome na voz firme de Enzo ficava extremamente sedutor, e eu tentava


M
controlar as batidas do meu coração, que se mantinham descompassadas,
bem como o meu ventre, que ficava contraído, além da minha boceta, que
pulsava desejando coisas loucas que eu não poderia ter com ele.
​ Estou pronta! — respondi quase suspirando, e o seu olhar intenso sobre

mim, que parecia analisar cada parte do meu corpo, não ajudava em nada a
diminuir o meu constrangimento por estar quase babando por ele.

​ ormi e sonhei com várias coisas ao mesmo tempo; depois acordei com dor
D
de cabeça e com dificuldade em abrir os olhos, sentindo as minhas pálpebras
pesadas. Tanta coisa tinha acontecido em tão pouco tempo que era
absolutamente normal eu estar estressada.

​— Você está agitada. Não seria melhor tomar uma bebida para relaxar?

​— O que você está bebendo?

​— Whisky, mas posso pedir para prepararem um coquetel para você.

​ Não, eu prefiro bebidas fortes — frisei e peguei o copo que Enzo estava

segurando, tomando um pouco da sua bebida enquanto olhava para ele.

​— Você é única!

​— Por beber whisky?

​— Não, por seu jeito, sua forma de agir, sua beleza... Tudo é único!

​— Meu beijo também? Nos beijamos. Você se lembra disso?

​ Tudo em você é único, mas essa viagem é de negócios, e, eu trouxe você



porque neste momento não é seguro te deixar sozinha, pois nunca se sabe
qual a próxima encrenca na qual você vai se meter, e, acho que a última já
foi suficiente.

​ Tudo bem, vamos para Dubai: você, para suas reuniões, e eu, para esperar

as coisas se acalmarem. Pode pedir um whisky duplo para mim, por favor?
Só por curiosidade, não tem uma cabine, tipo um quarto, neste jatinho, não?

​ nzo preparou um whisky para mim e me mostrou a cabine. Entrei nela e


E
fechei a porta, mas não sem antes provocar o Senhor de Negócios.
​ Não me perturbe, pois agora vou me divertir com meu brinquedinho e

depois dormir. Nos vemos em Dubai, quando o avião pousar! — falei, abri a
minha bolsa e mostrei meu vibrador para ele, que me olhou com os olhos
semicerrados, o rosto vermelho e a respiração ofegante.

​ e ele queria bancar o difícil, era bom que soubesse que havia encontrado
S
uma parceira à sua altura.
Capítulo 19
Enzo Cosa Nostra

​Eu queria muito que Raissa entendesse que me envolver com ela seria um
erro, já que éramos de mundos diferentes. Ela me provocava de todas as
formas, eu tentava resistir, mas sua boca carnuda, seus seios empinados, seu
corpo gostoso, sua bunda, que dava vontade de apertar, e sua boceta, que me
dava água na boca, pareciam sob medida para a minha perdição.

​ ssim que chegamos a Dubai, fomos direto para o One & Only Royal
A
Mirage Resort, porque, como eu teria várias reuniões durante o dia, troquei a
reserva para um lugar onde Raissa pudesse aproveitar e relaxar. O local era
paradisíaco, e o sorriso dela quando chegamos foi de quem aprovou a minha
escolha.

​— Vamos ficar neste hotel?

​ Sim. Você gostou? Reservei pensando no que você poderia fazer



enquanto eu estivesse trabalhando.

​ omo resposta, Raissa envolveu seus braços no meu pescoço e sorriu,


C
dizendo que tinha amado. Nossas bocas ficaram tão próximas que senti os
seus lábios macios quando eles tocaram os meus. Então simplesmente a
beijei com fúria, com um tesão acumulado de horas dentro de um jatinho
onde tudo que eu queria era entrar na cabine em que ela estava deitada,
lançar fora a porra do seu brinquedinho e mostrar a ela como era ter um pau
de verdade dentro dela.

​ ossas respirações irregulares, suas mãos bagunçando o meu cabelo e


N
nossas línguas serpenteando uma na outra foram interrompidas pela
funcionária do hotel, que nos pediu licença e nos entregou as chaves dos
nossos quartos.

Seguimos caminhando um ao lado do outro, e, assim como na


Filadélfia, nossos quartos eram conectados. No entanto, dessa vez, eu já não
tinha tanta certeza se isso havia sido uma boa ideia.

​ Qualquer coisa que você precisar, basta chamar o segurança. Eu vou



tomar banho, porque tenho uma videoconferência com alguns investidores.

​ aissa deu um sorriso que parecia forçado e entrou em seu quarto, batendo a
R
porta. Já eu fui para o meu quarto me arrumar para a reunião.

Em seguida, mandei um e-mail para a minha secretária, pedindo para


me enviar o último gráfico de desempenho de vendas do vinho Cosa Nostra.
Queria impressionar o grupo de empresários e fechar negócio com eles, para
depois cuidar de outros assuntos referentes aos nossos lucros em dois
cassinos em Dubai. Nunca costumava viajar só para resolver questões da
empresa, mas também para lidar com assuntos da Instituição, que estavam
interligados, já que uma lavava o dinheiro da outra.

​ stava saindo do banho quando escutei algumas batidas na porta que ligava
E
o meu quarto ao da Raissa. Então me enrolei em uma toalha e abri a porta
para saber o que tinha acontecido.

​ Eu… — ela começou a falar, mas parou, olhando-me de cima a baixo —



não trouxe roupa para ir à praia e vou precisar comprar. Talvez eu tenha que
ir a algum shopping…

​— Compre na loja que tem aqui no hotel.

​ Enzo Cosa Nostra, você acha que eu sou milionária? Se, no shopping, já

vou ter que ver se posso comprar estourando o limite do meu cartão, imagina
no hotel!

​ Espere um momento! — falei e peguei o meu cartão na carteira. —



Compre o que você precisar.

— Eu não quero que você pague as minhas roupas.


— Se estou pagando o hotel, qual a diferença?

— Não vou comprar roupa com o seu dinheiro.

Nesse momento, o meu segurança bateu à porta do meu quarto,


avisando que a Senhorita Cavalieri me aguardava. Ela era uma secretária
bilíngue que eu tinha contratado para me acompanhar na reunião.

— Preciso ir agora. Tenho um compromisso.

​ Deu para perceber! — Raissa disse, olhando para a minha toalha e depois

para a porta. — Vai pro seu compromisso e me dê esse cartão porque mudei
de ideia — ela falou e bateu à porta com tanta força que pensei que poderia
ter abalado a estrutura do hotel.

​ ão sei o que ela pensou que eu faria com a Senhorita Cavalieri, mas ri só
N
de imaginar pela sua cara de brava. Ao contrário do que a dona encrenca que
eu trouxe comigo nessa viagem pensou, primeiro troquei de roupa e só
depois mandei que a secretária contratada entrasse para começarmos a
reunião, que levou mais de três horas.

​ erminada a reunião, perguntei ao segurança por Raissa, e ele respondeu que


T
ela estava na praia e que os seguranças a acompanharam o tempo todo, como
ordenei.

Então fui até a praia do resort procurá-la e engoli em seco quando a


vi deitada de costas, em uma cadeira branca, com um biquíni pink que
deixava a sua bunda à mostra. Eu me aproximei e me sentei na cadeira,
empurrando seu corpo para o lado e tentando ganhar sua atenção.

— Se fosse um estranho, teria te atacado facilmente.

— Se fosse um estranho, ele jamais teria se sentado ao meu lado,


porque os seus seguranças teriam atirado nele antes — Raissa falou, virando-
se e esfregando sua bunda no meu corpo.

— A loja não tinha um biquíni menor que esse para vender?


— Não, infelizmente, era o menor de todos — ela falou, fazendo
biquinho.

— Não sei se gosto dos meus seguranças te olhando. Vou furar os


olhos de todos eles se continuarem babando por você.

— Você deveria se preocupar com a sua namoradinha que foi te


visitar no seu quarto, e não comigo, que não sou nada sua.

— Você é linda com ciúmes, mas devo lhe informar que a Senhorita
Cavalieri é uma secretária bilíngue que eu contratei para me acompanhar nas
negociações. Ah, e hoje, à noite tenho um jantar e quero que você me
acompanhe.

— Por que você não leva sua secretária?

— Porque falaremos sobre negócios da Instituição, e não da empresa.

— Você quer me levar num jantar da máfia? Eu vou ser tipo a Sarah
Cooper?

Eu dei uma gargalhada, coisa que raramente fazia, porque achava


linda e um tanto ingênua essa admiração que ela tinha pela minha madrinha.

— Vamos entrar, porque não estou gostando dessa sua exibição aqui
na praia.

— E quem disse que eu me importo com o que você pensa, Senhor


Cosa Nostra? — ela indagou e tornou a se deitar de costas, exibindo sua
bunda gostosa para mim.

— Você está me provocando! Estou me controlando, porque não


quero te machucar ou te iludir. Não sou homem de me apaixonar ou de me
envolver seriamente com ninguém, porque sou leal à Cosa Nostra e, no final,
vai ser sempre ela que vou ter que escolher.

— Quem disse que eu quero me envolver com você? Sei muito bem
separar sexo de sentimento.
— Tem certeza disso?

— Só sexo.

— Vou pensar!

Então me levantei e fui para o meu quarto, sentindo-me preocupado


com a minha relação com Raissa. Ela disse que só queria sexo e mais nada,
mas até que ponto isso seria verdade? Eu estava praticamente noivo e seria
obrigado me casar quando voltasse de Dubai, logo quando conheci a
jornalista, a primeira mulher que estava me tirando o sono.

No quarto, fiquei andando de um lado para outro, tentando controlar


os meus instintos, mas, pela primeira vez, não estava conseguindo. Escutei
quando Raissa entrou no quarto dela; na verdade, o hotel todo ouviu, porque
ela fazia questão de bater à porta com força, como se quisesse esfolar
alguém.

Em seguida, resolvi bater à porta que ligava os nossos quartos, e ela


gritou, dizendo que eu podia entrar.

— Estou no banheiro escovando os dentes! — ela falou, e eu fui até


lá, onde a encontrei de calcinha e sutiã.

Nessa hora, nossos olhares se cruzaram pelo espelho, e eu me


aproximei devagar, como um predador prestes a dar o bote na sua presa,
esmagando o seu corpo no mármore da pia e aproveitando que os seus
cabelos estavam presos em um coque alto para beijar o seu pescoço.

Senti quando sua respiração começou a ficar irregular e comecei a


passar as mãos na lateral do seu corpo. Raissa colocou a escova de dentes na
pia e me olhou intensamente pelo espelho. Quando segurei seus quadris, ela
empinou sua bunda e a esfregou no meu pau.

— Gostosa! — exclamei, e ela sorriu para mim, tocando em sua


boceta e mostrando quanto estava excitada e precisava de alívio, deixando-
me louco.
Desci minha mão cuidadosamente pela sua barriga até chegar à sua
calcinha e poder tocar na sua boceta, que estava encharcada. Ela mordeu os
lábios e deu um sorrisinho safado, sabendo que eu tinha percebido que ela
estava pronta para mim. Coloquei dois dedos dentro dela e os girei, fazendo-
a gemer e jogar a cabeça para trás, apoiando-se no meu ombro.

Depois tirei os meus dedos de dentro dela e os chupei, sentindo o seu


gosto, enquanto ela friccionava uma perna na outra. Fui subindo minhas
mãos pela lateral do seu corpo até chegar à altura do seu sutiã. Então
empurrei suas costas para frente, o que fez com que sua bunda se encaixasse
perfeitamente no meu pau, e abri o seu sutiã e o joguei no chão.

Em seguida, comecei a brincar com seus mamilos durinhos, fazendo


com que ela gemesse alto, tendo uma visão privilegiada pelo espelho da
minha… de Raissa se derretendo toda à medida que eu apertava e soltava
seus mamilos e esmagava seus seios, que eram redondos e lisinhos, com a
minha mão.

Com isso, meu pau cresceu e ganhou vida dentro da minha calça,
querendo entrar naquela perdição. Foi então que ela colocou sua mão dentro
da calcinha e começou a se tocar.

— Meu clitóris está latejando. Eu preciso me tocar...

Fiquei com uma das mãos trabalhando nos seus mamilos e, com a
outra, enfiei primeiro dois e depois três dedos dentro dela, aumentando a
pressão nos dois lugares ao mesmo tempo e sentindo suas costas ondulando
sobre o meu corpo.

— Eu vou gozar! — ela gritou e se desmanchou nas minhas mãos,


olhando para mim pelo espelho. — Me fode com força! Agora!

Eu a virei de frente para mim e a coloquei sentada na pia, derrubando


tudo que estava ali e rasgando a sua calcinha. Depois coloquei suas pernas
nos meus ombros e tive uma ampla visão da sua boceta, que estava toda
melada. Quando ela sentiu minha boca a chupando, gritou para que eu não
parasse.
Eu estava possuído de desejo por aquela mulher, e, à medida que
lambia seu clitóris, ela gemia, dizendo que estava gostando. Então a chupei
com fome, desejo, pressa e tesão, sentindo sua lubrificação escorrendo da
vagina para sua bunda conforme a minha língua a penetrava. Em seguida,
intensifiquei e alternei as chupadas no seu clitóris, com a minha língua
penetrando nela, e senti quando seu corpo estremeceu até atingir um
orgasmo que a fez gritar.

Raissa estava quente e vibrante, e, seus olhos me pediam mais,


enquanto seu corpo ainda se contorcia e ela tentava alcançar a minha calça
com as suas mãos. Nessa hora, comecei a lamber suas partes que estavam
mais sensíveis, e senti sua boceta apertando os dois dedos que eu havia
enfiado dentro dela.

Ela enlouqueceu e começou a gemer e a respirar ofegante; seu corpo


estava sedento. Sua boceta pulsava quando ela atingiu mais um orgasmo que
a fez se contorcer toda enquanto tentava se deitar no mármore gelado da pia.

Seus olhos então se fixaram no meu pau assim que abaixei as calças,
e ele pulou para fora, com as veias marcadas e a cabeça melada. Em seguida,
encostei-o na sua entrada, mas, antes, coloquei dois dedos dentro dela e os
girei contra o seu ponto mais sensível. Quando senti seu orgasmo chegando,
eu os arranquei dali e entrei nela com o meu pau, alargando a sua boceta.

— Eu vou te foder muito! Você quer?

— Quero!

— Quer o quê?

— Que você me foda com força, Senhor Cosa Nostra!

— Até aqui? — perguntei, colocando a mão no seu cuzinho.

— Com você, eu quero tudo! Só que, nesse lugar, tem que ser
devagar, porque nunca fiz.

Raissa realmente queria me enlouquecer. Ela estava toda lubrificada


depois de vários orgasmos, antes de receber minha porra dentro dela.
Então a tomei nos braços, enquanto nossas línguas se duelavam num
beijo faminto e a levei para o quarto. Depois me sentei na cama e a coloquei
no meu colo, fazendo com que ela se encaixasse no meu pau e cavalgasse.
Nesse instante, ela envolveu seus braços no meu pescoço, enquanto eu a
fazia subir e descer, enterrando tudo dentro dela.

O som do nosso sexo ecoava pelo quarto, misturando-se com o


barulho dos nossos gemidos e da nossa respiração cada vez mais ofegante.
Ela esmagava o meu pau com a sua boceta conforme eu descia o seu corpo,
levando-me à loucura. Por um momento, senti que ela estava segurando o
orgasmo quando a sentei no meu colo, forçando meu pau para dentro dela e
mordendo seus mamilos durinhos ao mesmo tempo.

— Como um homem pode ser tão gostoso? Céus!

— Gostoso é foder essa bocetinha apertada!

Raissa então apertou o meu pau, e eu a segurei quando seu orgasmo


chegou com força, fazendo-a sacudir o seu corpo contra o meu. Sem que ela
descansasse, comecei novamente a estocar dentro dela, deixando-a quicar
gostoso no meu colo. Meu pau entrava com força dentro dela — até quase as
bolas —, e, ainda assim, a diaba me apertava gostoso.

— Quero sentir você me preenchendo gostoso e me aquecendo com a


sua porra.

“Que mulher é essa?”, eu me perguntei quando a tirei do meu colo,


deitando-a na cama, e, com os joelhos no meu ombro, comecei a enterrar
dentro dela, com força, provocando um atrito na sua área mais sensível.

— Goza de novo para mim. Agora!

Seu corpo obedeceu ao meu comando ao mesmo tempo em que me


enterrei dentro dela, preenchendo-a todinha com a minha porra, em jatos
grossos e quentes, deitando-me, em seguida, sobre Raissa.

— Daqui a pouco, temos um jantar, e, na volta, vou querer te foder


de novo, de todas as formas possíveis.
— Além de mafioso, lindo e sedutor, você ainda fode gostoso. Tem
como ser mais perfeito que isso? — Raissa falou e me beijou com força.

A partir desse momento, eu soube que estava perdido, porque tudo


em que conseguia pensar era no fato de que desejaria transar com ela todos
os dias da minha vida.
Capítulo 20
Raissa

​Liguei o chuveiro e deixei a água fria escorrer para acalmar o meu corpo,
que estava pegando fogo depois de transar loucamente e sem pudor algum
com Enzo Cosa Nostra. Eu havia me sentido livre nos seus braços, e pensar
nele dentro de mim já fazia minha boceta latejar.

“​ Raissa O’Brien, se controle, mulher!”, eu repetia enquanto me enxugava e


pensava em qual vestido usar no jantar. Fiquei imaginando que tipo de
negócios eles tinham em Dubai, já que jogos de azar eram proibidos no
Estado Islâmico, por ser considerado pecado. Se bem que isso não importava
para esses homens da máfia, que provavelmente mantinham cassinos ilegais
na cidade sem medo das suas leis severas.

Nessa hora, escutei uma batida na porta do meu quarto. Então


coloquei um roupão e fui ver quem era, já que Enzo usava a porta que
conectava os dois ambientes.

Um dos seguranças que estava em pé do lado de fora me entregou


uma caixa dourada, com um laço de fita preto, e uma sacola da mesma cor,
dizendo que o Senhor Cosa Nostra havia pedido para que me entregassem.
Agradeci e me apressei para ver os presentes: era um vestido longo Off-
White, com um decote que, com certeza, iria até o meu umbigo e uma fenda
que certamente ficaria próxima da minha virilha. Na sacola tinha uma
sandália transparente, com um salto quinze, e uma bolsa da nova coleção da
Chanel, que deveria custar uns quinze mil dólares.

Respirei fundo e me sentei para fazer a minha maquiagem, com olhos


esfumados e boca nude. O cabelo eu pranchei e deixei solto, para que
cobrisse as costas, que ficariam nuas no vestido. Depois calcei as sandálias e
peguei minha bolsa, que dava para pagar uns quatro meses do meu aluguel.
Já estava indo chamar Enzo quando meu celular vibrou, avisando que tinha
uma nova mensagem.

Enzo: Você está pronta?

Raissa: Sim! Por que está me mandando mensagem em vez de vir


até aqui?

Enzo: Precisei resolver uns assuntos e estou explicando antes que


você fique com ciúmes. Ah, e sei como as mulheres demoram para se
arrumar, porque minha mãe sempre se atrasa.

Raissa: Eu não tenho ciúmes de você.

Enzo: Bom saber que estou livre, porque, neste exato momento tem
uma morena me encarando aqui no saguão do hotel.

Raissa: Eu disse que não tenho ciúmes, não que divido o que é meu!

Enzo: E por acaso, eu sou seu?

Raissa: Só para sexo, e gosto de exclusividade! Até porque você já


passou dos trinta e não deve dar conta de comer mais de uma mulher. Está
velho!

Enzo: Estou te esperando no saguão do hotel. Venha logo!

Peguei o elevador e desci rindo, imaginando a carinha de bravo de


Enzo por eu tê-lo chamado de velho. Os seguranças, com certeza, deveriam
pensar que eu era doida por estar dando gargalhadas sozinha.

Assim que a porta do elevador se abriu, caminhei lentamente pelo


saguão e vi que Enzo me esperava com olhos de predadores fixados no meu
corpo.

— Você está linda neste vestido! — ele elogiou e colocou seus


braços firmes em volta da minha cintura enquanto caminhávamos até o
carro.
​ Estou praticamente nua com esse decote e essa fenda até a virilha, ah, e

sem calcinha — falei assim que entrei na limousine e, antes que eu pudesse
dizer mais alguma coisa, senti seus dedos alcançando meu clitóris.

​— Sem calcinha e toda molhadinha pra mim.

​ ssim que o carro começou a se movimentar, Enzo me deitou no banco e


A
sugou meu clitóris, fazendo-me gemer alto.

​— Você acha que sou velho?

​ Muito velho! — respondi com a respiração ofegante, sentindo a língua de



Enzo próxima da minha entrada, que se contraía, querendo-o dentro de mim.

​— Vou te mostrar do que esse velho é capaz e vou te comer antes do jantar!

​ ensei que me chuparia gostoso, mas, em vez disso, mandou que eu tirasse o
P
vestido, enquanto ele colocou seu pau para fora, sem me dar tempo de
pensar. Enzo me sentou no seu colo, com minha bunda encostada na sua
barriga, e eu abri as minhas pernas e desci de costas sobre ele. Comecei
então a subir e a descer devagar, sentindo que minha boceta estava quente,
enquanto engolia Enzo até as bolas e o apertava por inteiro. Quanto mais ele
batia com força dentro de mim, mais eu gemia. Enlouqueci quando senti
suas mãos apertando os meus seios.

​ nzo começou a gemer no meu ouvido e a dizer que o fato de me dar prazer
E
era fodidamente gostoso, bem como me sentir engolindo seu pau, enquanto
metia com mais força dentro de mim.

​— Essa sua boceta apertada é só minha!

​— Vai sonhando!

​ le então segurou meu cabelo e me fez quicar sobre o seu pau, enterrando-o
E
até o limite. Quando eu estava prestes a gozar, Enzo parou e beijou as
minhas costas.

​ Vai falar que é só minha? O motorista está indo devagar, mas já estamos

chegando ao restaurante.
​— Eu não sou sua!

​— Pro inferno que não!

​ nzo começou a estocar forte novamente, e comecei a sentir o orgasmo


E
vindo e choraminguei, sentindo que seria forte. Nessa hora, ele resolveu
estimular o meu clitóris com suas mãos enquanto se enterrava o mais que
podia dentro de mim.

​ Fala o que eu quero escutar! — Enzo pediu, sentindo meu orgasmo



escorrendo no seu pau enquanto ele gozava com força dentro de mim.

​— Sou sua enquanto estivermos aqui e a máfia não nos separar.

​Enzo ficou em silêncio e beijou as minhas costas.

​— Não quero que a máfia nos separe.

​— Mas isso vai acontecer, não vai?

​ ntão senti sua testa encostando nas minhas costas, fazendo pressão. Seu
E
silêncio foi uma resposta.

​ epois nos arrumamos rapidamente antes que o carro parasse, com nossa
D
respiração ainda ofegante, suados, melados, com o nosso cheiro na pele do
outro. Foi então que nos olhamos sabendo que nosso acordo de sexo sem
envolvimento não tinha durado nem duas transas, e, que dali para frente,
poderíamos nos machucar. Mas, como duas pessoas teimosas, de
personalidade forte, nenhum dos dois queria demonstrar fraqueza, e, ficou
claro que seguiríamos com nossa proposta inicial, como se fosse possível
mentir para nós mesmos.
Capítulo 21
Enzo Cosa Nostra

​Entrei no restaurante segurando firme a cintura da mulher mais linda do


mundo, que tinha o meu cheiro em sua pele. Transamos como se fosse a
última vez, mesmo sabendo que isso se repetiria. Contudo, pela primeira
vez, eu estava sendo descuidado e não usando preservativos, mas Raissa me
levava à loucura, com suas provocações e seu sexo sem nenhum pingo de
pudor.

​— Você usa algum método contraceptivo?

​ Você acha que eu seria idiota de transar com você sem camisinha se não

me cuidasse? Nem pense, bonitinho, que você vai me prender ao seu lado
tentando me engravidar.

​ omecei a rir, porque seu jeito de falar era muito igual ao da minha tia
C
Alice, e imaginei a cara do meu pai se a conhecesse. Com certeza, ele me
casaria amanhã com a tal da Natalya, com medo de ter uma nora exatamente
como a mulher que a Cosa Nostra considerava um grande pesadelo.

​ ora? Raissa nunca poderia ser nora do meu pai, nem que eu quisesse,
N
porque infelizmente ela não pertencia à Instituição e talvez se pertencesse
não seria essa mulher livre, despudorada, empoderada e perfeita.

Sim, Raissa era perfeita em todos os sentidos, inclusive no de me


deixar possesso de ciúme ao notar que todos os olhares masculinos do
restaurante estavam nela.

​— Eu já me arrependi de ter comprado esse vestido para você.

​ Não se preocupe, velhote, porque até agora você está indo bem e não

pretendo trocá-lo por outro.
​— Bom saber que você gosta do meu pau dentro da sua boceta.

​ aissa ficou em silêncio e, assim que fomos até a mesa em que os homens
R
da Instituição me esperavam ela se aproximou do meu ouvido.

​— Se continuar falando assim vai ter que me foder no banheiro.

Ela era uma diaba me provocando e ao ouvir isso, respirei fundo,


assumindo minha postura de herdeiro da Cosa Nostra quando cumprimentei
os chefes locais.

​ É sempre uma honra recebermos em nosso território um membro da Cosa



Nostra!

​ Boa noite, senhores! Esta é Raissa O'Brien, e, como na máfia tudo que

diz respeito a qualquer um de nós corre como o vento, acredito que os
senhores já saibam de quem se trata.

​ A jornalista que escreveu um artigo denunciando a Salvatrucha! Espero



que não tenha vindo fazer nenhuma matéria conosco neste jantar — Khan
Al-Abadi, um dos homens mais poderosos dos Emirados Árabes, falou,
olhando fixo para Raissa.

​ Se os senhores não resolverem me sequestrar, com certeza não terei nada



para falar.

​ Se ela fosse da Instituição, eu diria que estaríamos diante de uma nova



Sarah Cooper! — Youssef, um dos subchefes, disse e todos riram.

​ Falando nas mulheres, quando teremos Luna Cosa Nostra à frente da



Instituição Siciliana?

​ Senhores, eu imagino que meu tio Dante não pensa em abdicar do poder

tão cedo, mas, quando minha prima assumir, podem se preparar, porque ela
vai abalar as estruturas da Instituição.

— Não temos dúvidas disso, pois a Cosa Nostra e a Bratva ousaram


ao dar tantos poderes às mulheres. Aqui, isso nunca acontecerá, pois acredito
que a Instituição tem que ser comandada pelos homens, muito embora, que
ela nunca saiba disso, a Senhora Cooper supere muitos chefes daqui e do
mundo.

A conversa seguiu com os árabes falando da Máfia das Mulheres e


colocando, nas entrelinhas, suas posições machistas a respeito do assunto.
Sua cultura não reconhecia nenhum direito feminino, e, para eles, o fato de
ter uma mulher sentada à mesa com eles nesse jantar de negócios já era algo
que eles consideravam errado.

No entanto, como eu era um Cosa Nostra, não criticaram isso


diretamente, além do mais eram homens viajados, que conheciam bem os
costumes diferentes da sua sociedade. Esta, para mim, era bastante machista
e ultrapassada, embora eu não falasse isso diretamente, mas demonstrasse,
tendo uma mulher ao meu lado em uma mesa só de homens.

Aquele jantar foi importante, pois por trás da confraternização, portas


estavam sendo abertas para futuras negociações. Por fim, deixamos o
restaurante e seguimos para um dos hotéis de luxo de Khan Al-Abadi.

À medida que o elevador privado descia para o subsolo, senti a mão


de Raissa suando e me dei conta de que ela estava se lembrando de Vegas.
Logo, apertei sua mão para que ela sentisse a confiança de que, ao meu lado,
nada de ruim aconteceria. Assim que as portas do elevador abriram, seus
olhos brilharam ao ver as mesas de jogos, os homens apostando e as
mulheres lindíssimas no salão.

— Fiquem à vontade! — Youssef falou. — Aproveitem a noite!

Fomos até o bar e escolhemos nossas bebidas. Pedi um whisky, e


Raissa escolheu um drink com gin tônica, moscow mule e mojito, e ficou
encantada quando foi adicionada à bebida uma espécie de chai de hibisco,
servida numa lâmpada como a de Aladim.

— Esse lugar é incrível! É impressionante como os homens da máfia


conseguem tudo, até cassinos ilegais em pleno Emirados Árabes!

— Sabendo vir ao lugar certo, você encontra de tudo, até cassinos


ilegais em Dubai — falei próximo ao seu ouvido. — Esses homens são
empresários de toda parte do mundo que quando se hospedam em Dubai,
aproveitam para jogar. Todos são convidados vips, que sabem ser discretos;
afinal, se forem descobertos, serão julgados pelas leis locais, coisa que
ninguém quer. E essas mulheres são suas esposas, outras amantes e algumas
estão aqui para ganhar dinheiro, não como prostitutas como naquela boate,
mas contratadas pelos catálogos de luxo.

— Vamos jogar? — ela perguntou, animada.

— Eu não jogo, só gosto de lucrar com as apostas.

— Posso jogar sozinha.

— Você já jogou?

— Só naquelas máquinas em que colocamos moedas e temos que


acertar as figurinhas iguais.

— Aquilo é para turistas que não têm dinheiro para apostas altas.

— Exatamente, mas hoje posso apostar alto na roleta. Compra as


fichas que eu quero jogar! — ela pediu, encaminhando-se para a roleta.

— Você quer jogar, e eu que tenho que comprar as fichas?

— Meu amor, quem é o milionário aqui?

Ao falar isso, Raissa bebeu um gole do seu drink e puxou um banco


para se sentar e jogar.

— Vai jogar? — Youssef perguntou, aproximando-se de mim.

— O que um homem não faz por uma mulher.

— Jogos e mulheres, a perdição da humanidade, meu caro! A


senhorita que está acompanhando Cosa Nostra vai apostar! — Youssef
exclamou, e o funcionário do cassino, assim como os outros empresários,
olharam para mim.
​ Escolha os números e coloque as fichas sobre eles ou no meio para

apostar em dois números.

​ essa hora, Youssef coçou o queixo e ficou observando Raissa colocar


N
apenas uma ficha em cada número. Depois sorriu quando me viu cobrindo as
suas apostas com pilhas de moeda.

​— Qual o valor dessas fichas todas que você apostou?

​— Pouca coisa, não se preocupe, são duzentos mil.

​ O quê? Não quero mais apostar! Prefiro que você me dê esse dinheiro que

eu volto para casa rica!

​— Se você ganhar, vai ser três vezes esse valor!

— E se eu perder?

​— Vou ter que pensar em um castigo por me dar prejuízo.

​ o ouvir isso, Raissa me olhou e mordeu os lábios. Em seguida, observou


A
atentamente as fichas que estavam dispostas na mesa.

​— Você já quer perder, não é, sua diaba?

​ Se você prometer me dar o prêmio que eu escolher, posso torcer para



acertar os números.

​— E qual seria o prêmio?

​ aissa apontou para o segundo andar, onde alguns casais estavam entrando,
R
e eu sacudi a cabeça, rindo. Ela realmente era uma mulher atenta aos
detalhes e não deixou passar despercebido o local que era um clube privado,
onde as pessoas podiam fazer sexo em grupo ou sozinhas em cabines
reservadas.

​— Você sabe o que acontece lá em cima?

​— Não, mas você pode me mostrar.


​ roleta girou, e Youssef ficou descontente quando viu que perdeu dinheiro
A
para a sorte de principiante de Raissa, que pulou eufórica no meu pescoço ao
perceber que ganhou o triplo de fichas.

​ Parabéns, Senhorita O'Brien! Parece que desbancar a máfia é sua



especialidade. Aproveitem o restante da noite!

​ aissa me acompanhou para trocar as fichas, e fomos até o bar pegar uma
R
bebida.

— Eu penso que ganhei e que podemos conhecer o segundo andar


deste local.

​ Não vou dividir você com ninguém, Raissa! Se a gente subir e alguém

ousar te desejar, vou ter que matar a pessoa.

​— Lá em cima, é um clube privado de swing?

​— Sim, e você… você não é mulher para esse tipo de lugar.

​— Você já foi lá?

​ Sim, com putas, mas não irei com você. Vamos embora, e eu vou saber te

recompensar, mas só nós dois.

​ la respirou fundo e deixou claro que me cobraria com juros por eu ter me
E
negado a ir com ela ao clube privado, embora eu tivesse certeza de que, no
fundo, ela havia ficado aliviada.

Raissa era corajosa e impulsiva, mas eu sabia que ela ficou com
traumas do que aconteceu em Vegas. Ela tinha o sono agitado e ficava
falando para a soltarem e a deixarem em paz enquanto dormia. Por isso, eu
jamais faria com que seus gatilhos fossem despertados ao levá-la a um lugar
que lembraria a boate de Vegas, porque mesmo que ali fosse tudo
consensual, com certeza as cenas de sexo a remeteriam ao seu sequestro.

​— Obrigada por cuidar de mim!


​ Sempre vou cuidar! — frisei quando ela deitou a cabeça no meu ombro

enquanto nosso carro percorria as ruas de Dubai, levando-nos de volta ao
Resort.

​ Eu sei disso! — ela afirmou e deu um beijo no meu rosto. — Mas,



mesmo assim, quero ser recompensada por não ter ido conhecer o tal clube
privado.

​ Não tenha dúvidas de que você será mais do que recompensada — falei e

a puxei para o meu colo, e nosso beijo incendiou os nossos corpos. Porém, já
que eu não queria fazer nada com pressa como na ida para o restaurante,
precisei me esforçar para esperar até chegarmos ao resort.
Capítulo 22
Enzo Cosa Nostra

​Acordei com o meu celular tocando e atendi rapidamente para não acordar
Raissa, que estava dormindo ao meu lado. Eu sabia que o motivo da ligação
do meu pai não era boa coisa e que aquela mulher na minha cama significava
o fim da minha paz.

​— Bom dia, meu pai!

​ Eu imagino que o seu dia está melhor do que o meu, que ontem dei a

minha palavra confirmando o seu noivado e hoje acordo com uma ligação de
Dante me falando que recebeu uma ligação de Youssef dizendo que estava
satisfeito, porque, como sempre, estamos renovando nossas alianças, e
mencionando que sua acompanhante ganhou uma pequena fortuna no
cassino.

​— É verdade, sorte de principiante.

​ E você acha mesmo que eu me importo com o que ela ganhe ou perca na

vida? Você levou essa jornalista para Dubai e a enfiou no meio de um jantar
da Instituição. Está querendo que a Cosa Nostra saia na primeira página do
jornal também?

​ Ela nunca faria isso! Você não a conhece, e, se ela escreveu aquele

artigo…

​ Resolva tudo em Dubai e retorne para o seu noivado. Termine seja lá o



que for que você iniciou com essa garota e a envie de volta para casa.

​— Eu não posso fazer isso!

​— Não me lembro de ter feito um pedido. É uma ordem, Enzo Cosa Nostra!
​— Que eu não vou poder obedecer, meu pai.

​ ntão desliguei o celular, tendo plena consciência de que o havia desafiado,


E
e de que ninguém me faria mandar Raissa embora. Eu tinha dado a minha
palavra ao meu tio e cumpriria, mas faria isso quando acabassem as reuniões
e eu deixasse Dubai.

​ inha cabeça estava doendo, e fui até o banheiro, porque precisava mijar e
M
também tomar um banho. Eu já estava atrasado para o meu compromisso e
não poderia aparecer com cara de quem estava com uma puta ressaca. Só
lembrei que estava no banheiro dela quando não encontrei o meu sabonete, e
sim uma esponja de banho pink, vários sabonetes líquidos e diferentes
frascos de shampoo.

​ aí do banho enrolado em uma toalha, e a visão de Raissa pelada, com o


S
rosto enfiado no travesseiro, era uma tentação. Mas, como passavam das
nove da manhã e eu já estava fodido com o meu pai por me recusar a mandar
minha linda acompanhante embora, tudo que eu não precisava era perder
uma reunião.

O meu celular estava cheio de mensagens do meu pai, mas resolvi


não ler nenhuma. Então corri para o meu quarto para colocar uma roupa e
descer apressado, a fim de encontrar a Senhorita Cavalieri e seguir para o
meu compromisso. No caminho, meu celular tocou, e, como era a minha
mãe, não pude deixar de atender.

— Você está envolvido em que nível com a jornalista? — minha mãe


perguntou, sem me dar a chance de falar nem um oi para ela.

​— Eu não vou despachar Raissa para os Estados Unidos.

​— Enzo, você está apaixonado?

​ Eu não nasci para paixões, e a senhora sabe muito bem disso! Essa não é

a nossa vida, e eu tenho meus deveres com a Cosa Nostra e vou cumprir. A
Instituição e tudo que ela implica, como os negócios e a Família, vêm em
primeiro lugar. Eu só preciso de um tempo!

​— Quanto tempo?
​ Essas duas semanas em que estou em Dubai. Depois retorno e me caso.

Meu pai não quis me escutar, mas tudo que eu quero é que, na volta, ele me
garanta que vai manter um soldado fazendo a segurança de Raissa. Assim,
volto tranquilo para seguir o meu destino.

​ Você não precisa se casar com a Natalya. Eu movo o mundo, faço uma

guerra, mas, se você não quiser se casar…

​ Eu vou me casar! A Instituição tem deveres e obrigações, e os membros



dependem de nós, do cumprimento das leis, do rigor nas negociações, e não
pretendo passar o nosso legado para ninguém.

​— Você é tão igual ao seu pai!

​ Mas tenho uma parte enorme sua dentro de mim, e é justamente essa

parte que faz essa escolha ser tão difícil, mas, ainda assim, eu a farei, até
porque quem nasce na máfia morre na máfia, e isso não é só um simples
ditado. Eu, fora da Instituição, sou alvo fácil e, no final, não viveria amor
algum.

​ Eu vou falar com o seu pai que depois da viagem, você vai voltar e

assumir a palavra dele, se casando com Natalya. Quanto a Raissa, não
precisamos da Cosa Nostra para protegê-la. Vou ligar para Sarah e acionar a
Máfia das Mulheres. Ela terá a nossa proteção, e ninguém vai tocar nela!

​ Acredite que ela jamais aceitaria a minha proteção eterna, mas, sendo a

da sua ídola Sarah Cooper — falei, rindo —, é diferente. Ela chegou a
procurar Anne em um evento para tentar fazer uma matéria com a tia Sarah
sobre a Máfia das Mulheres, você acredita nisso?

​ Já estou gostando cada vez mais dessa jornalista e até pensando que essa,

sim, seria a nora dos meus sonhos.

​ Eu tenho uma reunião agora, minha mãe. Proteja Raissa, mas não sonhe

com o impossível, porque infelizmente ela nunca será a minha esposa.

​ esliguei o celular e entrei no prédio onde eu teria a reunião com os


D
empresários árabes, que estavam interessados em comprar uma grande safra
do vinho Cosa Nostra para sua rede de hotéis. Eles não eram da Instituição e
seria uma negociação lícita, por meio da qual sempre tinha como tirarmos
proveito para lavagem de dinheiro.

​ assei boa parte da reunião distraído, pensando em Raissa, e só despertava


P
quando a Senhorita Cavalieri me fazia alguma pergunta para saber se eu
estava conseguindo acompanhar tudo, ou se precisava que ela traduzisse
mais detalhadamente para mim.

Eu estava com o pensamento longe, mas não por não estar


entendendo o que os árabes falavam, e sim porque fiquei imaginando Raissa
envolvendo seus braços no meu pescoço, como ela adorava fazer, deixando-
me sentir o cheiro da sua pele, enquanto eu segurava com força os seus
cabelos macios. Nunca me senti pertencendo a nada que não tivesse a ver
com os meus deveres com a Cosa Nostra, até conhecer Raissa e me sentir tão
ligado a uma pessoa.

​ reunião foi encerrada, e eu estava orgulhoso porque, mesmo pensando na


A
minha jornalista que eu deixei dormindo nua no quarto do hotel, consegui
uma proposta melhor do que a esperada e deixamos outra reunião agendada
para acertarmos os últimos detalhes e fecharmos o contrato na semana
seguinte.

Os árabes tinham o costume de pensar, meditar e consultar seus


mentores antes de assinar qualquer contrato, por isso já fui para Dubai
programado para ficar ali por, pelo menos, duas semanas.

​ stava distraído, como na maior parte da manhã, andando tranquilamente


E
pela rua a caminho do carro quando meus seguranças seguraram o meu
braço e me puxaram para trás. Com o susto, só vi quando um veículo passou
em alta velocidade, atirando.

​— Que porra foi essa!? — gritei e entrei rapidamente no meu carro.

​ O senhor está bem? Foi muito de repente, e não esperávamos um ataque



aqui em Dubai.

​ Infelizmente, não existe um lugar livre sem ataques para homens como

nós — respondi para o meu segurança enquanto ligava para Youssef.
​— Cosa Nostra, em que posso ajudá-lo?

​ Acabei de sofrer um atentado enquanto saía do centro de convenções



onde vim fechar negócios com um grupo de empresários. Vou colocar os
meus homens em alerta!

​ Espero que você não esteja pensando que temos algo a ver com isso,

porque não atacamos nossos aliados.

​ Eu sei que não. Quero saber se posso contar com vocês para investigar

quem poderia me atacar aqui em Dubai?

​ Vou mandar checar cada beco, e, seja quem for que ousou vir fazer

bagunça no nosso território, não vai sair vivo para contar história. E a sua
namorada?

​— Amiga — fiz questão de frisar. — Ela está no hotel me aguardando.

​ Vou mandar reforçar a segurança em torno do resort. Algo me diz que



isso que aconteceu pode ter a ver com ela.

​ ntão mandei que o motorista fosse o mais rápido possível para o hotel e
E
enviei uma mensagem para Raissa, a fim de saber se ela estava bem.

​Enzo: Onde você está?

​ aissa: Na piscina, tomando um drink sozinha depois que você me


R
abandonou dormindo no meu quarto.

​Enzo: Eu quero que você vá para o quarto e me espere lá.

​ aissa: E você quer também que eu esteja nua e de joelhos te esperando? Se


R
enxerga, que eu não nasci para ser submissa de macho!

​ aissa tornava tudo mais difícil com esse seu jeito de falar antes de pensar.
R
Quando foi que eu tratei essa doida como submissa para ela pensar isso de
mim? Enfim, liguei para o meu segurança e mandei que ele redobrasse a
vigilância de Raissa, afirmando que eu já estava chegando ao resort.
​ uando saí do carro, fui direto para a área da piscina. Em instantes, de
Q
longe, vi aquela bunda arrebitada que chamava atenção e acelerei os meus
passos, aproximando-me da sua cadeira e fazendo uma sombra enorme com
o meu corpo.

​— Custava ter atendido o meu pedido e ido para o quarto me esperar?

​— Custava me deixar ficar aqui na piscina até a hora em que você chegasse?

​ ntão estendi a mão, morrendo de medo de ela não segurar de volta e eu


E
passar vergonha na frente dos meus seguranças. Porém, Raissa não só pegou
a minha mão, como também se levantou e colocou um vestido por cima do
biquíni caminhando ao meu lado até o quarto.

​ Eu preciso tomar um banho! — ela falou, tirou o seu vestido e foi



desamarrando a parte de cima do biquíni enquanto caminhava, jogando-o no
chão. Depois parou na porta do banheiro, tirou a calcinha e a jogou para
mim.

​— Você não vem?


Capítulo 23
Raissa

​Os dias em Dubai estavam sendo perfeitos, ainda mais que Enzo havia
conseguido três dias livres, e, ficamos o tempo todo juntos no quarto. Ele era
perfeito em todos os sentidos, e eu tentava não pensar no que viria depois, ou
seja, quando fôssemos embora.

​ Enzo apertava a minha bunda com a sua mão e depois ia subindo


lentamente, fazendo uma trilha de beijos nas minhas costas até chegar ao
meu pescoço. Depois recomeçava o movimento.

​ No que você está pensando? — ele perguntou, vendo que eu estava com o

rosto enfiado no travesseiro.

​ Em nós dois! — respondi e me sentei na cama de frente para ele, que me



puxou e me colocou no seu colo.

​ Eu não posso prometer um romance com final feliz, porque tenho uma

vida complicada, mas quero você de todas as maneiras possíveis enquanto
estivermos juntos.

​ Sexo como combinamos! Vamos foder muito e depois voltamos para casa

e não nos vemos nunca mais.

​— Sei que é egoísmo da minha parte…

​ Nós fomos honestos um com o outro desde o início e sempre soubemos



que seria assim. Eu aceito, e, se em algum momento um dos dois achar que
não vai dar para continuar é só avisar.
​ pós dizer isso, seus lábios tomaram os meus, e seu beijo era o melhor que
A
eu já tinha provado. Então ele me deitou na cama e começou a beijar o meu
corpo, fazendo-me gemer e querer mais, principalmente quando sua língua
começou a brincar com os meus mamilos.

​ Calma, que primeiro vou te dar muito prazer e só depois te foder com

força. Quero escutar você gritando o meu nome bem alto quando eu enterrar
o meu pau nessa sua boceta apertada.

​ s palavras sujas de Enzo faziam meu corpo incendiar e aumentavam a


A
umidade entre as minhas pernas.

​— Já está molhadinha para mim?

​— Eu sempre estou!

​— Vou te aliviar!

​Enzo me deitou de costas na cama e abriu bem as minhas pernas.

​ Sua bunda é linda demais! — ele disse e deu um tapa nela, fazendo com

que o atrito entre as minhas pernas aumentasse.

— Você gosta quando eu bato na sua bunda, não gosta, sua gostosa?

Enzo começou a sugar o meu clitóris, deixando-me enlouquecida de


prazer. Quando sua língua entrou em mim, ao mesmo tempo em que ele
tocou com a ponta do seu dedo meu bico intumescido, foi como se o meu
corpo sofresse uma descarga elétrica e minha boceta começou a pulsar em
um nível insuportável até que eu consegui me desmanchar por inteiro em sua
boca.

​ m seguida, eu me levantei e toquei no peito de Enzo, pedindo que ele


E
ficasse de pé. Então me ajoelhei aos seus pés e fiquei encarando o seu pau,
tocando nele com meus lábios. Depois comecei a chupá-lo com gosto e o
engoli até a metade, olhando para cima, pois queria ver o prazer que eu
provocava nele.
​ Sua língua é macia e quente! Vou gozar muito na sua boca e quero ver

você engolir toda a minha porra.

​ u não me assustava com a sua boca suja; na verdade, amava o seu jeito
E
direto de dizer o que queria e estava sentindo. Seus olhos estavam fechados e
sua cabeça, levemente inclinada para trás, o que me fazia ter a certeza de que
eu estava no caminho certo, dando prazer a ele.

​ Sua boca é uma delícia! — ele exclamou, segurando o meu cabelo. —



Mais rápido, sua gostosa!

​ essa hora, retirei a minha boca do seu órgão, olhei para ele e lambi
N
lentamente a cabeça do seu pau, sentindo as veias cada vez mais grossas.
Então o engoli de uma só vez e o senti latejar quando o suguei por inteiro.
Em seguida, apertei suas coxas e aumentei o ritmo com que o chupava e
fazia pressões com os meus lábios, apertando-o e sentindo que ele estava
prestes a gozar.

​ ua respiração acelerou, seus músculos tencionaram e o orgasmo foi


S
liberado, com Enzo gemendo de prazer enquanto eu engolia todo o líquido
quente que era disparado na minha garganta.

​ epois ele me levantou e se deitou sobre mim na cama, apertando os meus


D
seios e chupando um de cada vez. Também ficou passando seu polegar na
minha fenda e vendo quanto eu estava excitada, e depois tocou o meu clitóris
com o seu pau, fazendo-me abrir as pernas para recebê-lo.

​— Você é perfeita, quente e feita sob medida para mim.

Enzo colocou rapidamente o preservativo e penetrou com força, bem


fundo, causando-me várias sensações que me deixavam louca enquanto me
fodia gostoso. Às vezes, ele diminuía as estocadas, e então eu esmagava o
seu pau, fazendo com que ele gemesse alto e voltasse a meter fundo e com
força.

​— Fica de quatro e empina esse rabo gostoso para mim!

​ le esfregou seu pau na minha boceta e entrou de uma só vez, fazendo


E
minha bunda se chocar com o seu quadril. Com isso, o barulho alto do nosso
sexo ecoou por todo o quarto. Quando senti que ele estava me alargando,
empinei mais a minha bunda, mostrando que eu estava gostando e desejando
mais dele.

​— Você quer mais, gostosa?

​— Quero com força!

​ ozei e gritei o seu nome, ao mesmo tempo em que apertava o seu pau
G
dentro de mim, sentindo-o inchar. Em seguida, ele se levantou e me deitou
na cama, voltando a estocar firme dentro de mim.

​— Eu amo você me apertando com sua boceta quente.

​ s suas mãos apertavam os meus pulsos, prendendo-me na cama, enquanto


A
eu empurrava minha bunda contra ele, tentando senti-lo mais ainda. Então,
quando o seu corpo começou a estremecer, sua estocada ficou mais firme, e
Enzo alcançou o orgasmo, jogando o peso do seu corpo sobre o meu e
beijando-me com força. Nessa hora, com o seu pau ainda dentro de mim,
tentávamos recuperar nossos batimentos cardíacos.

∞∞∞

Estava tomando um banho pesando que estaria acabada, mas, tirando


a assadura, devido a Enzo ser muito bem-dotado, eu me sentia ótima! Se
fosse ficar com ele a vida toda, compraria litros de lubrificante, mas, como
eram só duas semanas, não me preocuparia com nada e aproveitaria cada
minuto com ele dentro de mim.

​ omo sairíamos para jantar, escolhi um terninho vermelho e uma blusa Off-
C
White, com um decote que ficava um pouco abaixo da altura dos meus seios,
completando o look com um salto bem alto e minha bolsa Chanel, que havia
sido presente de Enzo.

​ umprimentei os seguranças que estavam no corredor e que me


C
acompanhariam até o restaurante onde Enzo me esperava com alguns
empresários amigos dele. Achava incrível a naturalidade com que ele levava
a vida, tendo jantares com amigos normais ou com amigos fora da lei.

​ ssim que entrei no local, todos os olhares se voltaram para mim. Então
A
percebi que meu look dava a impressão de que eu estava nua. Logo, assim
que vi Enzo, sorri para ele, que veio caminhando na minha direção,
segurando possessivamente nos meus braços, dando-me um beijo e
mostrando a todos que eu estava acompanhada.

​— Agora só falta você mijar em mim para marcar território.

​— Até que não seria má ideia.

​— Experimente! E eu arranco o seu pau!

​— Como você é doce, meu amor!

​ nzo então me apresentou para os seus amigos, que ficaram me secando, o


E
que realmente começou a me incomodar, principalmente quando eles
sugeriram uma festinha em um clube próximo ao hotel.

​— Dessa vez, vou passar o convite!

​ Por que não podemos ir ao clube? — perguntei o desafiando. — Eu amo



dançar! Onde seria esse clube?

— Em um hotel próximo daqui! — o amigo dele me respondeu com


um sorriso sacana. — Vamos?

​ Um caralho que ela vai a algum lugar com vocês! — Enzo falou, dando

um soco na mesa e fazendo os outros se lembrarem bem de que ele era um
Cosa Nostra.

​ Eu quero ir ao clube. Não aguento mais ficar somente neste resort, por

mais que ele seja maravilhoso.

​ nzo concordou, mesmo contrariado. Então, quando terminamos de jantar,


E
deixamos o restaurante e seguimos a caminho do clube, que parecia ser bem
mais distante do que os amigos dele falaram.
Assim que saímos do carro, percebi que estávamos na marina, e Enzo
me deu a mão e me levou até um iate.

​— O clube não era em um hotel?

​ Eu só fui jantar com os meus amigos CEOs porque já tínhamos



combinado e não quis desmarcar. Só que eu havia programado uma surpresa
para depois do jantar, que são dois dias com você em alto-mar. Mas, se você
preferir ir ao clube…

​ Só se eu fosse burra! Tenho a vida toda para ir a clubes dançar, mas dois

dias no mar de Dubai ao seu lado só vou poder viver uma vez! — Falei e
embarquei no iate, indo direto para a parte mais alta. Ali me sentei, olhando
para o céu estrelado.

As minhas palavras me fizeram perceber que tudo que eu estava


vivendo era o tal conto de fadas que Enzo disse que não poderia me dar.
Entretanto, o que ele quis dizer, na verdade, era que não poderia me dar para
sempre, apenas nesses dias. Mesmo assim, subestimei a minha capacidade
de não me envolver com ninguém, porque ele estava começando a mexer
com os meus sentimentos.
Capítulo 24
Raissa

O barulho das ondas do mar quebrando no iate, a brisa gelada em contraste


com nossos corpos quentes e o céu estrelado eram o cenário perfeito para
uma noite romântica. Pela primeira vez, soube que estava envolvida e resolvi
deixar me levar pelo momento, sem pensar no futuro, que, com certeza, seria
sem o meu mafioso.

Estávamos deitados no deck superior quando Enzo começou a beijar


delicadamente a minha testa, a ponta do meu nariz, os meus lábios, descendo
para o meu pescoço e depois para os meus seios, que ele alternava com
beijos e mordiscadas leves. Depois ele abriu as minhas pernas com as suas
mãos, ajoelhou-se e soprou o meu clitóris, despertando todos os meus
sentidos e me fazendo gemer em resposta.

— Seu cheiro é delicioso, Raissa! Eu amo essa sua boceta, que está
sempre pronta para mim.

Enzo então deslizou a língua na minha fenda e sugou faminto o meu


clitóris, fazendo-me perder o controle do meu corpo, que entrou em ebulição
assim que ele girou dois dedos dentro de mim, no ponto certo. A seguir,
começou a me comer com a sua língua dura. Eu ainda estava delirando de
prazer quando ele me penetrou fortemente com o seu pau, dando estocadas
precisas, que me fizeram chegar a outro orgasmo, antes mesmo de me
recuperar do anterior.

​— Enzo!

​ Grita, acorda Dubai e mostra o que o seu homem é capaz de fazer com o

seu corpo enquanto fode essa sua boceta gostosa!
​— Porra, eu vou gozar de novo!

​ nzo começou a beijar meus mamilos endurecidos, que acertavam o seu


E
rosto por conta do movimento do meu corpo, que arqueava o tempo todo de
tanto prazer, e isso me deixava com mais tesão. Quando ele tocou o meu
clitóris, não aguentei e achei que fosse morrer de tanto gozar.

​ Goza mais para mim! Me deixa te ver assim tão linda, se desmanchando

toda por mim!

​ nzo então começou a me foder com mais força e enlouqueceu quando me


E
viu apertando os bicos dos meus seios. Ao seu comando, joguei minha
cabeça para trás e permiti que mais um orgasmo poderoso tomasse conta do
meu corpo. Nessa hora, senti quando ele me agarrou firme, se deitando sobre
o meu corpo e chegando ao clímax comigo. Por fim, caímos num abismo de
luxúria, sem a certeza de que conseguiríamos sair dele separados.

∞∞∞

Acordei no quarto do iate e procurei Enzo, que não estava na cama.


Então me sentei, tentando relembrar cada momento da noite anterior e
querendo guardar para sempre essas memórias.

​ ntrei no banheiro e não me cansava de ficar impressionada com tanto luxo.


E
Tomei um banho, coloquei um biquíni e subi para procurá-lo novamente.
Então o achei. Ele estava lindo, nu e com o seu corpo escultural olhando o
mar.

​ Se existe uma visão mais linda do que essa logo de manhã, eu



desconheço! — brinquei e o abracei pelas costas, envolvendo sua cintura
com os meus braços.

​ nzo se virou de frente para mim e me abraçou, desamarrando o meu biquíni


E
e jogando a parte de cima para longe.
​ Já estamos há uma semana em Dubai, e, dentro de dois dias, vou assinar o

contrato com a rede de hotéis e retornar para a Sicília... e você, para San
Francisco — ele falou e se curvou, beijando delicadamente cada um dos
meus seios e deslizando suas mãos pela lateral do meu corpo, desmanchando
os laços que mantinham firme a parte de baixo do meu biquíni.

​— Vou sentir saudades, mas sei que nossas vidas têm que seguir separadas.

​ Eu não quero te iludir! Não posso fazer isso! Não com você, Raissa! Se

for só sexo, eu quero te foder de todas as formas possíveis e te proporcionar
os melhores orgasmos da tua vida. Mas não posso te iludir! Eu tenho
compromissos na máfia que não me permitem estar para sempre com você.

​ nzo estava sendo sincero e deixando claro que não era homem de fugir de
E
uma boa transa. Mas, ao mesmo tempo, estava preocupado comigo, achando
que poderia estar me usando para descartar depois, sendo que eu mesma lhe
disse que poderíamos ficar juntos dessa forma, apesar de já não ter mais
tanta certeza disso.

​ E você está pronto para me deixar e encarar isso como uma transa

qualquer em Dubai?

​ nzo respirou fundo e me afastou, indo se sentar em uma das poltronas que
E
tinha no deck. Seu silêncio era mais que uma resposta. Ele também estava se
envolvendo e sem saber como lidar com a nossa situação fadada ao fim por
causa das leis de uma sociedade que ficava à margem da minha.

​ ntão me sentei no seu colo e segurei com força o seu pescoço, enquanto
E
minha língua brincava com a sua em um beijo leve e cheio de malícia. Enzo
gemeu e jogou a cabeça para trás quando rebolei no seu colo, e ele sentiu o
atrito da minha boceta com o seu pau.

— Não sei se estou pronto para te deixar, mas sei que terei que fazer
isso.

​ Vamos pensar nisso depois; agora só quero você pelo tempo que eu ainda

tenho.
​ partir daí, montei nele, ofegante, rebolando e ansiosa pelo melhor sexo do
A
mundo.

​— Não sei se posso te deixar...

​ Eu também não sou tão desapegada quanto pareço, ou, pelo menos, nunca

tinha sido antes.

​ essa hora, Enzo segurou meu cabelo com força, e eu me apoiei firme nos
N
seus ombros quando ele enterrou tudo em mim, apertando meus quadris e
me fazendo quicar no seu colo, com meus seios balançando livremente. Em
seguida, suas mãos foram para a minha bunda, que ele apertava e na qual
dava alguns tapas, e eu pude escutar os seus gemidos misturados com os
meus.

​ le estocava com pressa, como se, a qualquer momento, fôssemos ser


E
arrebatados um para longe do outro. Eu espremia cada pedacinho do seu pau
dentro de mim, como se isso fosse prendê-lo eternamente.

E foi assim, em um sexo intenso com sentimento de última vez, que


chegamos juntos a um orgasmo que quase nos fez perder os sentidos. Por
fim, ficamos ali abraçados, suados e melados, como se mais nada existisse
no mundo além de nós dois.

∞∞∞

De volta ao resort e próxima da realidade de que tudo que eu estava


vivendo acabaria em breve, eu me sentia como um trem que saiu do trilho, e
com isso não encontrava desculpas para estar na cama de Enzo, sabendo que
seria só sexo entre nós. Estaria tudo bem se eu não tivesse me envolvido tão
fortemente nesse romance.

​ m nossa história não existiam culpados, porque ele sempre deixou claro
E
que era perigoso um envolvimento entre nós. Até achei que fosse capaz de
transar com ele e depois seguir em frente, como já tinha feito outras vezes,
mas o que eu estava sentindo era algo novo para mim e forte demais.
​ ossa história começou de uma forma muito louca, intensa, no meio de um
N
tiroteio, e terminou em Dubai, em cima de uma cama, com dois corpos se
encaixando perfeitamente um no outro e sentindo todo o prazer do mundo.

​ epois de deixar de lado meus pensamentos, eu me levantei devagar


D
enquanto Enzo dormia e fui para o meu quarto tomar um banho e tentar
recuperar a minha sanidade mental.

​— Vai me deixar aqui sozinho?

​ Eu não queria te acordar, mas, pelo visto, a história de que mafiosos



nunca dormem é verdadeira.

​ Nós dormimos, sim! — ele falou, segurando a minha mão e me fazendo



deitar com a cabeça no seu peito. — Quando confiamos na pessoa que está
dormindo ao nosso lado, conseguimos relaxar, mas nosso sono é leve, por
uma questão de sobrevivência.

​ Isso quer dizer que você confia em mim? Que lindo! — eu falei, dando

um selinho em sua boca e me levantando. — Ao meu lado, você pode dormir
tranquilo que, eu nunca vou matar você, a não ser de prazer — falei e joguei
um beijo para Enzo enquanto fechava a porta do meu quarto.

Nesse dia, ele participaria de uma reunião com os empresários da


rede de hotéis e finalmente assinaria o contrato que o havia trazido a Dubai.
Depois disso, voltaríamos às nossas vidas.

​ proveitei que estava sozinha e fiz uma chamada de vídeo para a minha
A
mãe, como eu fazia todos os dias conforme combinamos, porém, dessa vez,
ela me perguntou sobre o futuro; logo, não consegui esconder que estava
triste.

​— Como vai ser quando vocês voltarem?

​ Vou para casa continuar trabalhando, e Enzo vai voltar para a Sicília e

continuar matando gente por lá e, de vez em quando, ele vai fechar alguns
contratos brincando de CEO, como nessa viagem.

​— E você fala isso com essa calma?


​ Esse é o Enzo, e quer saber? Eu não mudaria nada nele! Ele é perfeito

desse jeito, e eu seria feliz para sempre ao seu lado.

​— Raissa, você se apaixonou por ele?

​ Claro que não! Só falei porque você sabe que não ficamos bem como

amigos por aqui, então…

​ Filha, eu não sou ingênua de achar que não existe nada entre vocês; sou

vivida o bastante para saber que não é só sexo. Há sentimento também, e
seus olhos brilham quando você fala nele.

​ Eu não posso admitir isso, minha mãe, porque, se eu falar, vou ter que

escutar, e então esse amor se tornará uma verdade.

​— Filha, não quero que você sofra, mas esse rapaz não serve para você.

​ Claro que serve! Sarah Cooper era uma publicitária quando se casou com

Ryan Cooper, e a mãe do Enzo, Nina Cosa Nostra, era uma advogada, e
todas duas se casaram com homens da Instituição!

​— Você quer se casar com Enzo Cosa Nostra?

​ Casar eu não sei, mas, sim, se eu pudesse, ficaria com ele. Mas não

precisa preocupar a família com isso. Estou falando só com você e depois
vou esquecer, até porque eles só se casam entre si na máfia, e, Sarah e Nina
foram um caso à parte. Por causa da lei criada por elas em defesa das
mulheres, essa regra de união entre filhos da máfia se tornou uma espécie de
lei absoluta.

​— Eu não sei o que te falar, minha filha.

​ Nós estamos conversando como amigas pela primeira vez, e isso para

mim já é algo imenso que você está fazendo por mim.

​— Eu te amo tanto, minha filha! Queria muito fazer algo para te ajudar.

​ Só o que me ajudaria era ter nascido na máfia! — afirmei, dando de



ombros. — Tem alguma chance de você e do meu pai serem um casal de
mafiosos disfarçados de advogados?

​— Não filha, somos só advogados.

​ Então não tem nada que possa mudar o final dessa história, e eu e Enzo

vamos mesmo seguir nossas vidas separados.

​ pós abordamos esse tema, conversamos mais um pouco sobre assuntos


A
aleatórios. Depois eu tomei um banho e me deitei para ler um livro no meu
Kindle. Escolhi então um romance com mafiosos, porque apenas a vida real
parecia não ser suficiente para Raissa O'Brien.
Capítulo 25
Enzo Cosa Nostra

​A reunião começou pontualmente ao meio-dia, e eu ainda estava com as


imagens de Raissa nua e linda se levantando devagar pela manhã e tentando
não fazer barulho para que eu pudesse continuar dormindo. Ela foi a mulher
mais sensual que tive nos meus braços e a menos discreta, porque, por mais
que ela quisesse ser silenciosa, fazia mais barulho que uma manada de
elefantes. Ela era tudo, menos quieta, bem longe de uma esposa troféu e
totalmente perfeita para mim.

Ao pensar nisso, lembrei que ela não seria minha e que outro homem
a teria em seus braços e passaria a ser o dono dos seus gemidos. Sem me dar
conta, forcei tanto os nós da minha mão que as pessoas ficaram me olhando
e pensando que eu fosse dar um soco na cara de um dos empresários que
estavam reunidos para assinar o contrato comigo.

​ Senhorita Cavalieri se apressou em conduzir a reunião, lendo


A
fluentemente os termos do contrato em voz alta e tentando fazer de conta
que o meu comportamento estranho tinha passado despercebido.

Sempre fui um homem focado e disciplinado, mas Raissa bagunçou a


minha rotina, e tudo que eu conseguia fazer o dia todo era pensar nela, no
seu corpo quente, no seu gosto delicioso, no seu cheiro único, na sua língua
afiada e na sua personalidade difícil de domar.

Ela representava a liberdade, o fogo, e sua impulsividade, ao mesmo


tempo em que me enlouquecia, também me seduzia. Com isso, sabia que
estava rendido por uma mulher que infelizmente teria que esquecer.
​ o lerem o contrato, os empresários confirmaram que estavam todos de
A
acordo com os termos, e passamos então para a fase de assinatura dos
documentos e conferência da quantia que estava sendo transferida para os
cofres da Cosa Nostra. Consegui bem mais do que meu tio Dante tinha
estipulado, e ele, com certeza, ficaria muito orgulhoso e satisfeito.

Logo, eu contava com isso para que ele não me perturbasse pelo fato
de ter apresentado Raissa aos membros da Instituição, mostrando que era
minha acompanhante, quando estava de casamento marcado com Natalya. O
receio não era propriamente pelo noivado, mas pelo medo de eu jogar tudo
para o alto, coisa que eu nunca faria.

​ epois que estava tudo oficializado, agradeci a Senhorita Cavalieri pelo seu
D
excelente trabalho, enviei uma mensagem para a Cosa Nostra, avisando que
o contrato tinha sido assinado com sucesso, e fui buscar Raissa para
jantarmos juntos e comemorarmos o sucesso da minha ida a Dubai, que, em
contrapartida, significava o fim da nossa história junto.

​ ssim que cheguei à frente do resort, meu pau ficou duro só de olhar o
A
monumento que estava me esperando na recepção e que vinha caminhando
com os cabelos balançando com o vento. Era impossível não admirar seu
vestido, como sempre, extremamente decotado e coberto por um véu, que ela
usou durante esse tempo em Dubai, vindo na minha direção. Eu estava
encostado no carro, esperando Raissa, que chegou e me deu um beijo
intenso, fazendo questão de colar o seu corpo no meu. Quando passei as
mãos na lateral do seu corpo e cheguei ao quadril, olhei para ela, que meu
deu o sorriso sacana de sempre.

​— Você nunca usa calcinha?

​ Com você, não, porque eu não comprei calcinhas para serem rasgadas e

você as destrói com um simples toque!

— Você faz isso para me provocar, que eu sei!

​— Se você sabe, por que perdeu seu tempo perguntando?

​ aissa era escandalosamente linda e sensual, além de estar sempre querendo


R
me provocar. Por fim, entramos no carro e seguimos com nossas mãos
unidas e nossos olhares perdidos um no outro. A tensão entre nós era
palpável, assim como a sensação inexplicável de pertencimento.

​ osso carro seguia devagar pelas ruas de Dubai, sendo acompanhado por
N
outro veículo com os meus seguranças. Estávamos em um local mais
deserto, indo para outro resort, onde eu queria jantar e passar provavelmente
a minha última noite com Raissa.

De repente, um veículo surgiu do nada, batendo fortemente na lateral


do nosso carro e nos tirando da estrada. Pude escutar o barulho dos tiros
sendo trocados, enquanto o nosso veículo capotou, deixando-nos de cabeça
para baixo. Eu não tinha noção do que estava acontecendo do lado de fora,
nem tempo para ver se havia me ferido; só precisava me certificar de que
Raissa estava viva e sair rapidamente dali.

​— Você está bem?

​— Nós capotamos, seu idiota! Eu pareço bem?

​— Pela porra da língua afiada para me responder, já vi que está ótima!

​ ntão mandei que ela firmasse o corpo e soltei o seu cinto e depois o meu. O
E
carro, por ser blindado, tinha mais rigidez e se manteve intacto. Logo,
precisei retirar os airbags laterais para sair de dentro dele e saber o que
estava acontecendo do lado de fora.

​ Senhor, está tudo bem? Um carro vinha normalmente do outro lado



quando acertou propositalmente o seu. Trocamos tiros com eles, mas não os
seguimos para socorrê-lo.

— Fizeram bem!

— Como você sabe que eles não estão mentindo e que os bandidos
não estão com eles? — Raissa perguntou.

— Primeiro, porque eles morreriam antes de me entregar para os


inimigos; segundo, não posso ficar aqui para sempre. Esse é um risco que se
corre quando se tem uma vida como a minha.
O trabalho para nos tirar do carro demorou um pouco, e, quando
conseguimos sair, os homens de Youssef já estavam no local.

​— Que porra foi essa? É o segundo atentado que sofro em Dubai!

​ Temos fortes suspeitas de que isso é coisa da Yakuza, Senhor Cosa Nostra

— o braço direito de Youssef falou. — Temos informações de que alguns
dos seus homens estão no nosso território, e pode ter certeza de que, em
poucas horas, eles estarão nas nossas mãos.

​— Como assim segundo atentado? — Raissa me perguntou.

​— Depois conversamos; agora precisamos sair daqui.

​ esse momento, segurei firme na mão de Raissa enquanto caminhávamos


N
até o carro dos meus seguranças. Alguns homens de Youssef nos escoltaram
de volta ao resort, e outros limparam o local do acidente, como sempre
fazíamos para não deixar rastro da nossa existência.

​ Você vai me explicar ou não o que aconteceu? Nós sofremos um acidente,



capotamos, sei lá como estamos vivos, e você não me explica nada.

​ essa hora, meu celular tocou, e precisei atender porque era uma chamada
N
de vídeo do meu pai.

​ Você está bem? Se feriu? Foi um atentado armado pela Yakuza,



simultaneamente com você e Pietro, em Los Angeles.

​— Pietro está bem?

​ Sim, eles só queriam dar um susto e nos intimidar, o que nunca vai

acontecer, porque vamos explodir esses infelizes! Nunca que esses japoneses
vão crescer para cima da Máfia Siciliana!

​— Qual o motivo? Território americano?

​ Os desgraçados estavam por trás da droga em Vegas, e a Salvatrucha era



só uma espécie de testa de ferro. Como estouramos o esquema deles e a sua
amiguinha denunciou o tráfico de mulheres, estamos em guerra. Mas
Mikhailov já acionou um grupo enorme de soldados da Bratva para mostrar
a eles quem manda em tudo; afinal, quando as duas maiores máfias são
aliadas, o melhor que as outras fazem é se curvar e se colocar nos seus
devidos lugares.

​ Vou me encontrar com Youssef e arrancar a cabeça dos miseráveis que



me jogaram fora da estrada, porque, se conheço os árabes, a essa hora, os
ratos já são seus prisioneiros.

​ Você está no território deles, e eles provavelmente serão punidos pela lei

de Khan Al-Abadi, mas pode ser que ele deixe você torturar um deles.
Resolva tudo e volte imediatamente para a Cosa Nostra.

​— Sim, senhor!

​ Eu queria agradecer a sua preocupação perguntando se estou bem depois



de quase morrer por estar ao lado do seu filho — disse Raissa.

​ Para uma jornalista cuja vida depende da segurança da Cosa Nostra, você

é bem ousada. Por mim, se tivesse morrido, daria menos trabalho!

​— Por favor, meu pai, Raissa está fragilizada pelo acidente.

​— Fragilizada? Eu sou muito mais dura na queda que você!

​ recisei desligar o celular antes que Raissa se tornasse inimiga oficial da


P
Cosa Nostra.

​ Você perdeu a noção de tudo? Claro que não! Você nunca soube o que é

isso! Tem noção de que o meu pai e eu somos completamente diferentes, e
que eu te… que eu te entendo, mas ele não?

Raissa era tão maluca e me tirava tanto do sério que quase me fez
falar, sem querer, que sentia algo por ela, sentimento este que eu nunca disse
a nenhuma mulher, e nem diria.

— O meu pai é temido por ser um assassino. Não pense que, por ser
casado com a minha mãe e por tudo que você pesquisou sobre a Máfia das
Mulheres, ele ou qualquer um de nós deixou de ser letal. Sei que você está
nervosa, que sofremos um acidente, mas nunca mais se dirija ao meu pai ou
a qualquer membro da Cosa Nostra dessa forma. Você entendeu, Raissa
O'Brien?

​ Minha vida era tão normal, e minha única preocupação no mundo era se

eu conseguiria ser uma grande jornalista. Sei que vocês são letais, não sou
imbecil, mas sou impulsiva demais, e realmente o seu pai, você, esses árabes
mafiosos, a Salvatrucha e todos do inferno de onde vocês saíram são iguais.
Eu não deveria falar com o seu pai, nem estar neste carro com você, porque
são todos uns monstros que só mudam de Instituição. Eu estava numa boate,
comemorando meu aniversário, quando vim parar contra a minha vontade no
mundo de vocês. Tudo que eu quero é minha vida de volta. Não desejo nada
dessa porcaria de máfia para mim, e isso inclui você!

​ aissa estava coberta de razão, e eu nunca deveria ter me envolvido com ela,
R
porque, no final, ela corria ainda mais risco ao meu lado do que longe de
mim.

Suas palavras duras foram diretas ao meu coração, que até então era
blindado.

Eu fui criado com muito amor desde que cheguei à casa do meu pai
quando tinha cinco anos, porém, o ambiente na Cosa Nostra sempre foi
tenso, cheio de reuniões, tiros, pessoas chegando sujas de sangue, soldados
que falavam com a gente num momento, saíam e não voltavam nunca mais.

Os assuntos eram sempre sobre disputa de poder, obediência ao


chefe, dinheiro e sobrevivência em uma sociedade onde qualquer aliado
poderia se tornar seu inimigo no minuto seguinte.

​ empre considerei Pietro o meu melhor amigo e irmão, e costumava temer


S
que nossas famílias se tornassem rivais e, com isso, a gente tivesse que se
tornar inimigos, mesmo que nossas mães continuassem amigas, porque
máfia nenhuma separaria Sarah Cooper e Nina Cosa Nostra. Contudo, eu e
Pietro éramos diferentes delas, tínhamos compromisso de sangue, éramos
herdeiros legítimos e crescemos com o desejo de assumir nosso legado.
​ o entanto, meu coração se abriu para Raissa. Com isso, passei a me
N
lembrar das histórias que meu pai contava sobre o meu avô e do porquê de
ele querer me criar diferente. No fundo, o monstro do seu pai não estava
errado ao dizer que o amor enfraquecia o homem da máfia. Tínhamos
compromissos, e eu estava ali, no meio de mais uma guerra, pensando nas
palavras da Raissa, e não no meu inimigo que tentou me matar.

​ u não era mesmo homem para ela, e, no mais tardar, em dois dias,
E
voltaríamos para nossas vidas. Então, eu seria só a lembrança de uma fase
ruim em que ela se envolveu com a máfia. Toda vez que ela saísse de casa
protegida por um soldado da Máfia das Mulheres, odiaria o que eu
representava, que seria sua falta de liberdade por um dia ter tido o seu
caminho cruzado com o nosso.

​ epois de refletir nisso tudo, respirei fundo, vesti minha máscara de


D
sobrevivência e assumi a postura fria e rígida de um verdadeiro filho da
máfia.
Capítulo 26
Enzo Cosa Nostra

​Assim que chegamos ao resort, fui direto para o meu quarto e Raissa para o
dela. Não trocamos uma palavra e caminhamos separados e em silêncio. Ela
estava certa em me querer longe, e eu respeitaria a sua vontade.

​ omei um banho e me arrumei. Em seguida, fui me encontrar com Youssef,


T
que me enviou uma mensagem, avisando que já estava com os japoneses, e o
meu ódio só aumentava durante o caminho até o galpão dos árabes.

​ queles filhos da puta, além de tentarem me matar, estavam por trás do


A
sequestro da minha Raissa, já que financiavam as boates de prostituição e
usavam a Salvatrucha como bucha de canhão.

​ heguei ao local, que era distante do resort e ficava no interior de uma casa
C
que parecia normal, mas era usada pela máfia. Meus homens entraram
comigo, e fomos conduzidos por uma escada que nos levava a uma espécie
de abrigo subterrâneo que eles usavam para interrogar e eliminar seus
desafetos.

​ crueldade deles era enorme, e seus homens se vangloriavam por isso, mas
A
diziam que ninguém se igualava ao Demônio da Cosa Nostra, ou seja, meu
pai.

​ Nosso convidado acabou de chegar! — Youssef falou assim que me viu.



— Vocês sabiam que, no nosso território, atentar contra um convidado é
como atentar contra o comando local?

Os japoneses estavam amarrados de cabeça para baixo e sangrando


como porcos. A lei deles era rígida, e eu sabia que eles seriam julgados e
mortos pelos árabes. Então me aproximei dos presos, querendo saber quem
eles pensavam que eram para ousar contra dois membros da Cosa Nostra.
Um dos miseráveis sacudiu o corpo, tentando me atingir, mesmo ferido, e
me sujou com o seu sangue podre. Nessa hora, só não cortei sua cabeça fora
como eu desejava porque aquela não era a minha sala de tortura.

Fiquei mais de oito horas escutando-os agonizar e sem dar uma


palavra. Dois deles desapareceram quando mergulharam num tonel de ácido,
e só por isso um deles disse que a ordem era matar o herdeiro da Cosa
Nostra, ressaltando que eles falharam duas vezes e que não faria diferença
morrer ali ou pelas mãos do seu chefe.

Lembrei então que Raissa quase morreu por estar comigo enquanto
eu pensava que a protegia. Eu era realmente um erro na vida dela e tinha que
voltar a ser quem sempre fui. Precisava conviver com os meus, no lugar de
achar que era algum super-herói que salvava donzelas, quando era o vilão
que ceifava vidas.

Do nada, meu celular vibrou, e era Raissa querendo saber onde eu


estava. Entendi que ela estava preocupada comigo, mas precisei ser distante
e respondi com frieza, para que ela entendesse que estava certa quando me
disse no carro que não queria essa vida para si.

Antes de ir embora, eles colocaram um dos japoneses sentados numa


cadeira e me entregaram um facão afiado, olhando, em seguida, para mim.
Uma coisa era torturar e matar; outra era ter que atender às expectativas por
ser herdeiro de Lorenzo Cosa Nostra. Sendo assim, simplesmente agi para
impressionar os outros. Não fiz perguntas, não pude interferir nas sessões de
tortura e precisei fazer uma participação especial para agradar os árabes e
garantir o legado da Cosa Nostra.

Eles me olhavam como seu eu fosse incapaz de ser como o meu pai.
Então abaixei a cabeça e sorri, caminhei até a cadeira e, com um único
golpe, fiz a cabeça do verme que tentou me matar voar pelos ares. Minutos
depois, estava me retirando dali, sendo seguido pelos meus homens, quando
Youssef veio atrás de mim.

​ Você realmente é o filho de Lorenzo Cosa Nostra! O mesmo sorriso antes



de matar, a mesma frieza, o mesmo estilo. Seu pai deve ter muito orgulho de
você!
​— E eu de ser o filho do Demônio da Cosa Nostra e continuar o seu legado.

​ ntão fui embora irritado, porque, com certeza, nas minhas mãos, aqueles
E
idiotas teriam sofrido muito mais. Talvez, por ser filho de quem eu era ou
por ter problemas maiores me aguardando quando eu chegasse ao resort e
tivesse que dar adeus a Raissa, achei a sessão de tortura deles fraca e
entediante.
Capítulo 27
Raissa

​Por mais que uma força que eu não sabia de onde vinha me fizesse ficar
sempre de pé, pela primeira vez, eu me senti desmoronando. Não foi pelo
sequestro, pelo atentado no dia da festa ou pelo automóvel capotando, mas
por olhar para Enzo no carro e sentir que havia romantizado nossa história,
nossos dias no resort, esquecendo-me de toda a sua trajetória de vida.

​ s palavras de Anne Stanford nunca fizeram tanto sentido como nesse


A
momento. Seu discurso era sobre o que vivi nesses dias. No final de tudo,
em outras palavras, eles eram pessoas que, por poder, passavam por cima de
tudo, e não existia glamour nessa vida.

​ ntretanto, nos livros, tudo parecia lindo, mas, quando nos deparávamos
E
com a realidade era bem diferente. Nessas poucas semanas, estive com o pé
no outro lado por três vezes, e, por milagre, havia sobrevivido. Um milagre
que eu achava que se chamava Enzo Cosa Nostra, com quem eu quase morri
recentemente em um atentado.

​ or um lado, eu não sabia por que respondi a Lorenzo Cosa Nostra na


P
chamada de vídeo que não era para mim, sabendo que ele era um homem
perigoso. Por outro, talvez soubesse sim: tinha me acostumado com Enzo a
ponto de esquecer que ele e sua família eram pessoas extremamente ruins.

​ uando escutei o estrondo no carro, estava tão distraída, olhando para Enzo
Q
e pensando que não queria que esses dias, até então encantados,
terminassem, que custei a entender que o veículo tinha sido atingido e
capotado.

Por ser blindado, a parte interna ficou inteira, e o airbag tomou conta
das laterais do automóvel. Levei alguns segundos para entender que tinha
sobrevivido e, quando me sentei no teto do carro, percebi que a adrenalina
das últimas semanas havia se transformado em pânico, seguido de um
choque de realidade.

​ omo estava no fogo cruzado da máfia, compreendi que minha vida nunca
C
mais seria como antes, porque, de uma forma ou de outra, teria que ter por
tempo indeterminado, ou para sempre, seguranças andando comigo por onde
eu fosse. Contudo, percebi que isso não impediria os inimigos de tentarem
contra a minha vida.

​ or fim, Enzo e eu voltamos para o hotel em silêncio depois que eu disse que
P
não o queria mais na minha vida. Eu estava nervosa, acabei me
descontrolando, e, após isso, ele não deu mais nenhuma palavra. Enzo,
então, foi direto para o seu quarto, e eu, para o meu. Ali, fiquei sentada na
cama pensando se deveria conversar com ele, até que, depois de um tempo,
escutei um barulho de porta se fechando e entendi que ele tinha saído.

​ essa hora, lembrei que ele tinha um encontro com o tal do Youssef e que
N
falou, como se fosse a coisa mais normal do mundo, que tiraria a cabeça de
uma pessoa.

Em seguida, resolvi tomar um banho e depois tentei dormir, mas tudo


que eu consegui foi ficar rolando na cama. Eu olhava para o relógio, e já era
de madrugada, e não tinha nem sinal de Enzo no hotel. Por isso, acabei lhe
mandando uma mensagem já que estava preocupada com ele na rua depois
do que aconteceu.

​ aissa: Está tudo bem? Estou preocupada, porque você saiu e ainda não
R
voltou.

​ em uma resposta imediata, acabei pegando no sono, com o celular na


S
minha mão, esperando-o responder. Acordei assustada quando senti o
aparelho vibrando e vi que já eram quatro horas da madrugada.

Enzo: Eu sei quando saio, mas, como você viu hoje, nunca sei se vou
conseguir voltar. Não se preocupe. Qualquer coisa, meus soldados sabem
que devem te levar de volta até San Francisco e sua segurança está garantida.

Raissa: Que droga de resposta foi essa? Eu não estou preocupada


comigo e sim com você, que saiu para cortar a cabeça de um homem e não
voltou para o hotel.

​Enzo: Vai dormir e não se preocupe comigo. Não vale a pena!

​Raissa: Isso quem decide sou eu!

​ nzo: Na verdade, você já decidiu. Agora eu preciso ir, pois tenho alguns
E
assuntos para resolver.

​Raissa: Às quatro da manhã?

​ nzo não respondeu, e tentei dormir, já que ele estava vivo. Eu tinha que
E
admitir que o medo que senti de não o ver nunca mais e de ele não voltar por
terem feito alguma coisa me deixou com um buraco no peito. Logo, eu sabia
que isso só tinha um nome: AMOR!

∞∞∞

Já passava do meio-dia quando escutei um barulho no quarto de Enzo


e resolvi ir até lá conversar com ele, e quando toquei na maçaneta e a girei
devagar, vi que estava destrancada e que isso era um sinal de que ele
continuava confiando em mim, o que eu sabia que era algo muito valioso,
principalmente por se tratar de alguém que aprendeu a dormir de olhos
abertos para não ser atacado.

​ ntrei no quarto e vi o coldre dele com suas armas em cima da cama e sua
E
roupa jogada no chão. Sua camisa branca tinha marcas de sangue, e meu
coração disparou por não saber se eram dele ou do homem de quem ele foi
arrancar a cabeça.

Minha frieza em pensar que Enzo tinha acabado de matar alguém e


só me importar em saber se ele estava bem ou ferido me assustava.
Entretanto, eu tinha a sensação de que seria capaz de fazer a mesma coisa se
fosse para defender a mim ou aqueles que amo.

​— Enzo, você está ferido? Eu vi sangue na sua camisa.


​ Não, o sangue é do infeliz que matei. Esqueceu que sou um assassino de

quem você quer distância?

​ o ouvir isso, não me importei com as suas palavras e abri a porta do box,
A
vendo Enzo com as mãos espalmadas na parede e com o corpo embaixo da
água, deixando que ela fizesse sozinha o trabalho de limpar toda a sujeira
que ele sentia que tinha em seu corpo. Pude sentir como esse era um
momento pesado e percebi que levar a vida dessa forma era mais um fardo
do que qualquer outra coisa.

​ em me preocupar com a água que fez a minha camisola grudar no meu


S
corpo, peguei a esponja, enchi-a de sabonete líquido e comecei a passar
levemente nas suas costas.

​ Sai daqui, Raissa! Eu vou tomar um banho, organizar tudo, e depois



vamos voltar para as nossas vidas.

​ ão me importei com as suas palavras e continuei ensaboando as suas


N
costas. Com calma, fui contornando o seu corpo e ficando entre ele e a
parede. Enzo abriu os olhos devagar, enquanto eu passava a esponja em seu
peito, e ficou me encarando com uma expressão vazia.

​ Sei que você se machucou com as minhas palavras no carro, mas



acredite: eu estava nervosa e acho de verdade que você é uma tremenda
furada. Mas, ainda assim, eu me apaixonei por você, o que prova que não
sou tão esperta quanto pensei, já que abri meu coração para um mafioso
velhote que sai para cortar cabeças e agora não há mais nada que eu possa
fazer.

​ nzo ficou em silêncio, e eu o beijei, jogando a esponja no chão e


E
envolvendo o seu pescoço com os meus braços. Suas mãos deslizaram pela
lateral do meu corpo, e ele foi tirando minha camisola molhada, deixando
que ela caísse no chão.

​ or mais que tudo aquilo parecesse uma grande loucura, estar com Enzo era
P
o que eu queria. Além disso, estava disposta a enfrentar o que fosse preciso
para ficar ao seu lado.
Enzo então me abraçou com força, como se pudesse me prender ali
para sempre. Porém, do nada, ele me soltou, desligou o chuveiro e saiu do
box, jogando-me uma toalha e enrolando outra em sua cintura.

​ Eu não posso, Raissa, eu não posso mais ficar com você. Não podemos

continuar com isso, e você tinha razão em cada palavra: não somos do
mesmo mundo, não pertencemos à mesma sociedade e nunca vamos ter a
chance de ficar juntos! Acabou! Vai ser melhor assim, porque eu também
me…

​ nzo não terminou de falar o que ele queria dizer, e eu o segui até o seu
E
quarto.

​ Eu sei que você vai dizer que sou impulsiva, mas não tenho medo da

máfia e eu quero ficar com você.

​— Raissa, eu vou me casar!

​— O quê?

​ Minha família escolheu uma noiva para mim, uma filha da máfia como

nossa lei exige, e eu preciso voltar para a Sicília, para oficializar o
compromisso e me casar.

— Você tem uma pessoa na sua vida e não me contou?

​ Eu não tenho ninguém, quem decidiu tudo e escolheu a minha esposa foi

o meu pai; eu apenas vou me casar. É assim que funciona na máfia: nos
casamos por alianças, e não por sentimentos.

— Sua família decidiu que você vai se casar e daí você me trouxe
para uma espécie de despedida de solteiro?

​ Eu não precisaria vir tão longe se fosse apenas uma despedida de solteiro,

eu me…

​— Você o quê?
​ Eu não quero te machucar. Você disse que seria só sexo, sem

envolvimento, só que hoje você falou que está apaixonada por mim, e eu não
posso corresponder, porque tenho compromissos que não posso largar,
porque custariam a honra da minha família e a minha vida.

— Eu nunca mais quero te ver! Por favor, compre uma passagem de


avião para mim, porque não vou voltar no jatinho com você!

— Vou providenciar, mas um soldado da Cosa Nostra vai te


acompanhar. Sua segurança ficará por conta de Sarah Cooper, que vai enviar
alguém para te esperar no desembarque. Não diga que você não precisa de
nada disso, porque acho que você já entendeu onde se meteu, mesmo que
contra a sua vontade.

— Vai se foder, Enzo Cosa Nostra!

​ or fim, saí do quarto dele sem olhar para trás, sem lhe dar a chance de
P
retrucar ou me permitir fraquejar.
Capítulo 28
Enzo Cosa Nostra

​Cheguei ao hotel e tudo que eu queria era tomar um banho e me limpar mais
uma vez do sangue do inimigo que estava grudado na minha pele. Entrei no
box, liguei a água quente e deixei que ela escorresse livremente pelo meu
corpo, na tentativa de aliviar um pouco a tensão dos últimos dias, que era
provocada, na verdade, muito mais pelos sentimentos por Raissa que
estavam crescendo dentro de mim, do que por qualquer outro problema da
máfia.

​ nossa conexão era tão forte que senti a sua presença assim que ela entrou
A
no meu quarto. O cheiro inconfundível da sua pele foi sentido por mim
quando ela se aproximou do box, e, com isso, o meu corpo reagiu na mesma
hora desejando-a mais do que tudo.

​ aissa se despojou de sua armadura e começou a limpar o meu corpo de


R
todo o fardo que ela sentiu que eu carregava. Ao contrário dela, eu
trabalhava a minha mente para ficar vazia, desprovida de sentimentos, e
blindava meu coração para que eu pudesse tomar decisões baseadas somente
na razão.

​ la estava linda e transparente. Pela primeira vez sem ironias, sem farpas,
E
somente uma mulher olhando com amor para o seu homem. O seu beijo
intenso me dominou por completo, e tudo que eu queria era fazê-la ser
minha.

Eu a abracei fortemente, sentindo nossos sexos roçarem um no outro,


separados apenas pela renda molhada da sua calcinha minúscula, e ao
mesmo tempo que um fogo incendiava o meu corpo, eu me despedia para
sempre da minha mulher.
Se ela soubesse que eu era tão dela quanto ela era minha, seria
impossível nos separar. Porém, eu precisaria ser o vilão, título que havia
nascido comigo por ser um Cosa Nostra. Eu não poderia deixar ela saber que
o quanto eu a amava.

​ ntão a afastei do meu corpo e a deixei sozinha no box. Depois fui para o
E
meu quarto, sabendo que ela viria atrás de mim. Fiquei de costas para ela
enquanto me vestia, porque se eu a olhasse seria impossível dizer adeus.

​ aissa estava disposta a ficar ao meu lado, mas eu tinha que me casar com
R
uma filha da máfia e continuar o nosso legado. Por mais que achasse isso
injusto, por estar amando uma mulher que não tinha nosso sangue, eu
entendia que, se abríssemos nossa intimidade para o mundo, ficaríamos
vulneráveis e enfraquecidos. Por isso, precisávamos nos manter assim, à
margem da sociedade comum, vivendo em nosso mundo, com nossas leis e
sobrevivendo, pois, sem proteção, nenhum de nós ficaria vivo para um dia
contar história.

​ la entendeu tudo errado e achou que eu brinquei com seus sentimentos e a


E
usei para uma despedida de solteiro. Eu realmente era culpado por sua dor,
porque isso de sexo sem envolvimento nunca terminaria bem. Todas as
mulheres sempre me diziam a mesma coisa e no final, elas me cobravam um
retorno. A grande diferença das outras vezes era que eu também tinha me
envolvido e me apaixonado por Raissa.

​ la me xingou e foi para o seu quarto, batendo e trancando a porta como se


E
eu não tivesse a chave e pudesse entrar lá a qualquer momento. Tudo que eu
queria era tomá-la em meus braços, gritar um foda-se bem alto e viver com
ela, mas eu seria egoísta ao arrastá-la comigo para o fim.

Por isso, eu precisava a partir de então virar essa página. Tinha


simplesmente que voltar a ser o herdeiro de Lorenzo Cosa Nostra, assumir a
palavra do meu pai, fortalecer nossa aliança com a Bratva ao me casar com a
filha de um dos principais associados de Aleksey Mikhailov e aumentar o
poder da nossa família perante as outras máfias.

​ rovidenciei tudo para que Raissa retornasse de primeira classe


P
acompanhada por dois dos meus soldados, e minha mãe me garantiu que
Matthew estaria esperando por ela no desembarque em San Francisco.

​ eixei tudo acertado no resort e reservei um carro para levá-la até o


D
aeroporto na hora do seu voo. Depois voltei para a Sicília no meu jatinho,
lutando com as lembranças da mulher da minha vida a qual eu não conseguia
deletar da minha mente.

​ om os olhos fechados, eu me lembrava de dois dias atrás, quando cheguei


C
ao quarto dela depois de um encontro com Youssef no restaurante do resort,
onde ele me disse que tinham uma pista de quem havia tentado contra a
minha vida, mas que preferia manter sigilo.

​ aissa estava linda deitada em sua cama. Quando me deitei também, ela, na
R
mesma hora, montou no meu rosto mostrando-me como estava pronta para
mim. Sua boceta deliciosa me melou todo, enquanto o seu corpo estremecia
em minha boca. Eu adorava o seu jeito despudorado e livre de se entregar
para mim. Então chupei a pontinha do seu clitóris, e ela gemeu alto quando
sentiu minha língua provando o gosto delicioso do seu orgasmo. Sua boceta
era quente e macia, e piscava, querendo-me dentro dela.

​ omo eu tinha que descansar, respirei fundo, tentando não pensar mais nela
C
e aceitar que minha noiva era Natalya. Precisava entender que Raissa nunca
mais seria minha. Entretanto, só de pensar nisso, senti minhas mãos se
fechando e vi quando os nós dos meus dedos ficaram brancos de tanta raiva
que eu estava sentindo.

Então me levantei, peguei uma garrafa de whisky e virei o líquido


quente na minha garganta, deixando que ele me queimasse e se misturasse à
dor que eu estava sentindo por ter que tirar Raissa de dentro de mim.

∞∞∞

​ esembarquei na Sicília e segui direto para a Cosa Nostra. Assim que entrei
D
na sala de reuniões, meu tio me parabenizou pelo sucesso das negociações
em Dubai, e meu pai me deu um abraço. A seguir, começamos a conversar
sobre as investidas que estavam sendo feitas contra a Yakuza.
​ rocurei o tempo todo focar a reunião, mas percebia o olhar inquieto que
P
Luna dirigia a mim e tentava não pensar nisso e me inteirar de todas as
ações.

​ Os japoneses precisam ser contidos, porque, de forma alguma, eles



podiam sequer ter pensado em nos afrontar dessa maneira — Dante falou
com seu tom de voz que não deixava dúvidas de que ele queria um embate
direto.

​ Estamos fazendo isso, meu irmão. As retaliações estão acontecendo, e



nossos soldados têm se preparado para atacar várias de suas bases —
Giancarlo disse, enquanto Matteo apresentava os relatórios.

​ — É um péssimo momento para uma guerra, uma vez que temos um


casamento em duas semanas na Rússia. Mas, por outro lado, também é
conveniente, porque podemos atacar enquanto os japoneses pensam que
estamos distraídos, organizando uma festa — meu pai falou, e, na mesma
hora, percebi a expressão contrariada de Luna que não aguentava mais ficar
calada.

​ Não bastasse esse casamento arranjado, ele ainda vai servir como pano de

fundo para uma guerra entre máfias? Alguém se deu ao trabalho de
perguntar se o meu primo concorda com isso?

​ Luna, minha filha, as coisas não funcionam assim, e o seu primo, com

certeza, sabe dos seus deveres com a Cosa Nostra. Por favor, se concentre na
nossa guerra com a Yakuza, que é o motivo da nossa reunião.

​ Não faz diferença se será uma festa com ou sem pano de fundo para uma

guerra; é só mais um casamento por alianças, como os que acontecem quase
toda semana na nossa sociedade. A diferença é que esse tem status por ser de
um herdeiro da Cosa Nostra — falei com um tom de voz sarcástico. — E,
sim, meu tio, eu sei muito bem quais são os meus deveres com a Cosa
Nostra.

​ Ótimo! Porque, nesta semana daremos um jantar de noivado aqui na Cosa



Nostra e, em duas semanas, embarcaremos para a Rússia onde será realizado
o casamento. Então retornaremos todos para a Sicília, e você segue para a
sua lua de mel. Precisamos decidir onde vocês vão morar, se aqui ou em
alguma de nossas casas na Sicília.

​ Eu vou decidir isso depois se o senhor me permitir. Agora, se a reunião



acabou, eu gostaria de ir para casa tomar um banho e descansar da viagem.

​ Claro que sim! Você está dispensado. E não pense que não notei seu

sarcasmo ao me responder — Dante falou visivelmente contrariado.

​ Que bom que o senhor notou o sarcasmo no tom de voz do Enzo, meu

pai! Sinal de que continua perfeito para ocupar sua cadeira e de que a idade
não afetou os seus sentidos.

​ Luna Cosa Nostra, não pense que por ser minha filha e minha herdeira,

você pode me responder da forma como quiser! Nesta sala, eu sou o Chefe, e
você me deve respeito!

​ E aprenda isso, porque, quando você comandar, vai precisar que te



respeitem, se quiser ficar à frente da Cosa Nostra.

​ Eu sei disso, tio Lorenzo, não preciso que nenhum de vocês me ensine o

que fazer, mas fiquem sabendo que sempre vou ficar do lado do Enzo. Não
gosto de ver que ele está sendo obrigado a fazer algo que não quer. Sinto
muito, mas sempre vou defender o meu primo, assim como a Matteo e
Antonella antes de qualquer coisa.

​ Nossas leis são claras, e o casamento do Enzo não tem nada de errado,

mas fico feliz em ver sua lealdade com os seus primos. Vocês são o futuro, e
essa união fortalece a nossa família — meu pai falou, e eu sorri para Luna
deixando a sala de reuniões.

​ eu pai sempre foi diplomático. Ele entendeu que Luna quis dizer que se
M
precisasse, enfrentaria todos caso eu não aceitasse o casamento. Mesmo
assim, ele transformou suas palavras em algo lindo para o futuro da Cosa
Nostra.

​ u fui direto para casa, e tudo que eu queria era tomar um banho e me
E
afundar nos assuntos da empresa e da Instituição, sem pensar em mais nada
durante essas duas semanas até o casamento. À noite, fui com meu pai até a
boate, acompanhei o recebimento de cargas durante a madrugada e, pela
manhã, fiz o balanço do movimento da noite.

​ uando voltamos para casa, minha mãe estava tomando café, e nos
Q
sentamos com ela, e o assunto girou em torno da Instituição. Assim que meu
pai terminou sua refeição, ela disse que subiria depois para encontrá-lo no
quarto, mas que primeiro precisava discutir alguns detalhes a respeito da
festa de noivado.

​ Boa sorte! — meu pai falou para mim e subiu a escada, rindo. — E não

perca seu tempo dizendo que não quer festa ou que pode ser algo simples,
porque sua mãe desconhece eventos pequenos.

​ Eu realmente não estou interessado nesse assunto, minha mãe. A senhora



faça tudo do seu gosto e me informe apenas o dia e o horário em que tenho
que colocar a aliança na mão da minha noiva.

​ Enzo! — minha mãe falou, segurando a minha mão. — Sente-se! Eu



esperei seu pai terminar o café porque quero conversar com você!

​— Não estou interessado nesse assunto.

​ Tem certeza? — ela indagou, abrindo a galeria de fotos do seu celular e



fazendo meu coração disparar. Então a droga de um sorriso bobo apareceu
no meu rosto quando vi as fotos de Raissa ao lado de Matthew no aeroporto
em San Francisco.

​— Ela chegou bem? Aceitou a segurança sem reclamar?

​ Sim, você sabe que o Matthew tem certa habilidade em despertar a



confiança nas mulheres da máfia.

​— Raissa não é uma mulher da máfia, minha mãe!

​ Fale isso para ela! — minha mãe disse, rindo. — Matthew me disse que,

assim que ele falou que treinou Sarah, eu e Alice, a primeira coisa que
Raissa perguntou é se ele poderia treiná-la também.
​ Por favor! Raissa já é um perigo ambulante! Tudo que nós não

precisamos é dela pronta para matar!

​ Até que enfim, vejo um sorriso no seu rosto, meu filho! Você gosta dela,

porque…

​ Fico tranquilo em saber que Raissa está bem e protegida. Mesmo que eu

não visse as fotos, saberia disso, porque a senhora me deu a sua palavra.

— Eu disse e repito que a Máfia das Mulheres vai cuidar e proteger a


Raissa. Eu sei que você teme pela vida dela, e que se largar tudo serão os
dois sem proteção, mas isso...

— Não quero mais tocar nesse assunto. Delete essas fotos e deixe
que Sarah cuide de tudo. Sua nora será a Natalya, não se esqueça disso.

​— Seria melhor que você lembrasse quem vai ser a sua esposa.

​ pós dizer isso, minha mãe se levantou e me deixou sentado sozinho à mesa
A
sem esperar uma resposta. Com essa atitude, deixou claro que eu poderia
falar o que quisesse, porém dela eu nunca seria capaz de esconder os meus
verdadeiros sentimentos.
Capítulo 29
Raissa

​Deixei o resort sozinha, acompanhada por dois seguranças, que me


informaram que Enzo havia partido mais cedo para a Sicília. Embarcamos, e
durante o voo pude sentir os olhos dos seus soldados me vigiando. Com isso,
fiquei pensando se alguém poderia tentar me matar dentro do avião.

​ inha mente estava longe, fixa nos dias em que passei junto a Enzo. Logo,
M
meu peito doía de dor e saudade. Eu tinha que esquecer aquele homem que
simplesmente escolheu a máfia e me despachou para a América.

​ u precisava retomar a minha vida e vencer essa ferida. Assim que


E
desembarquei em San Francisco, um senhor alto, aparentando ser muito
forte, com um terno preto, tendo por volta dos setenta anos, aproximou-se de
mim. Quando ele se apresentou, respirei fundo com a certeza de que nunca
mais nada seria como antes e que minha vida estava para sempre atrelada à
máfia.

​ Senhorita O’Brien, espero que tenha feito uma boa viagem! O meu nome

é Matthew, e eu venho por parte da Senhora Cooper.

​— Muito prazer!

​ Eu vou acompanhá-la até a sua casa, vamos conversar e montar um



esquema para que a senhorita possa ter a sua rotina normal com segurança
— ele falou, ressaltando que os seguranças que me acompanharam estavam
dispensados e entregando uma passagem para cada um poder retornar para a
Sicília.

​ Tchau, vão com Deus, tenham uma ótima vida! Espero que não morram

tão cedo em alguma emboscada! Ah, e obrigada por me desejarem tudo de
bom, seus dois mal-educados! — falei para os seguranças que me
acompanharam todos esses dias em Dubai e na viagem de volta, que
simplesmente foram embora sem se despedir.

​ Não os culpe por isso! — Matthew falou, rindo. — Eles têm ordem para

fazer a sua segurança e morreriam por você se fosse preciso, e nada mais do
que isso.

​ Não sei por que eu esperava algo diferente desses dois seguranças se o

chefe deles é outro mal-educado, que me largou em Dubai sem dizer um
adeus e agora conseguiu novos seguranças para mim, ou seja, se livrou da
otária aqui para sempre!

​— Eu não diria isso, afinal, estou aqui para cuidar de você, não estou?

​ Sim, ele me passou para a Máfia das Mulheres. Até acho bom, porque

sou fã da Sarah Cooper. Eu vou conhecê-la?

​ Por que a senhorita quer conhecê-la? Não desistiu da entrevista que



queria fazer com ela?

— Como você sabe disso?

— Anne nos contou sobre o seu interesse na Máfia das Mulheres —


ele falou baixo — quando leu seu artigo no jornal. Foi ousado, arriscado,
mas uma excelente matéria e que agradou muito a Senhora Cooper que é
contra esses abusos.

​ Já ganhei o meu dia sabendo que ela leu meu artigo! — exclamei,

sorrindo, enquanto caminhávamos até o estacionamento do aeroporto. —
Quanto à outra pergunta, não pretendo escrever mais nada sobre a máfia;
preferia, inclusive, esquecer que ela existe, mas infelizmente acho que não
tem como já que sou alvo de uma delas.

​ Vai ficar tudo bem, só que vai ser tudo um pouco diferente, mas você

pode fazer de conta que tem segurança porque ficou milionária.

​ esse instante, entramos no carro, e realmente a máfia sempre sabia de tudo,


N
porque ele colocou meu endereço no GPS como se fosse normal saber onde
eu morava sem me perguntar.
​ Você é uma pessoa legal! Como pode ser mafioso e gente boa ao mesmo

tempo? Você parece normal!

​— Por que os outros não parecem normais?

​ Minha experiência até hoje não foi muito boa com os mafiosos. Um me

sequestrou, me levou para uma boate de prostituição e depois tentou me
matar; outro também tentou me matar em Dubai; e o que eu achava que era o
meu herói não passa de um idiota que deve estar com a noiva agora e rindo
de mim que me declarei para ele! Que raiva!

​ Enzo me disse que você lembrava Alice, mas agora, te conhecendo



pessoalmente, acho que você tem a força de Sarah, a língua afiada de Alice,
me parece decidida como Nina, e eu diria que é sonhadora como Louise.

​— Você conhece todas elas? Eu pensei que fosse só a Senhora Cooper!

​ Eu treinei Sarah Cooper, Alice Jordan e Nina Cosa Nostra, quando elas

decidiram assumir a máfia enquanto Ryan Cooper estava em coma. Fui
sequestrado pela Corsa junto a Sarah e testemunhei a força dessa mulher.
Fiquei ao lado de Nina quando ela deixou a Cosa Nostra e vi quando Enzo
nasceu. Eu estava com ele quando se sentiu mal e descobrimos que ele
estava entre a vida e a morte. Inclusive, sou seu padrinho! Estive presente
em todas as ações da Máfia das Mulheres, vi o seu nascimento e me orgulho
da lei que leva o nome de Sarah Cooper uma pessoa admirável. E agora
estou aqui, para garantir que você também tenha uma vida longa e que a
Salvatrucha e a Yakuza nunca cheguem perto de você.

​— Você vai me treinar?

​ Não! — ele respondeu, rindo e me deixando decepcionada. — Você não



tem motivos para querer ser treinada. Vamos fazer a sua segurança e vai ficar
tudo bem.

​ É porque não sou uma filha da máfia, não é? Se eu fosse, poderia me



casar com Enzo, não é verdade?

​— Você quer se casar com Enzo?


​— Não, na verdade, eu quero que ele morra!

​ Vou te dar o conselho de um homem que, em setenta e cinco anos, já



viveu tanta coisa. Eu estive de frente para a morte, ceifei vidas e tive a honra
de aprender muito, convivendo com duas mulheres extraordinárias, Sarah e
Nina, nos momentos mais difíceis da vida delas. Você está exausta, passou
por um monte de coisas e agora deve recomeçar tudo no seu tempo. Precisa
seguir a sua vida, escolher suas batalhas e ter sempre em mente que sempre
pode virar o jogo. Não é porque você vai ter seguranças e que alguém quer te
matar que sua vida acabou. Sempre vivi sendo alvo e estou aqui na sua
frente!

​ atthew estava certo, e eu precisava reorganizar a minha vida de onde parei


M
no dia do meu aniversário de vinte e três anos. Procuraria as minhas amigas,
voltaria ao meu trabalho e administraria isso tudo com meu novo status de
perseguida pela máfia.

Nessa hora, fui subindo cada degrau do edifício onde eu morava até
chegar ao segundo andar, tentando deixar tudo para trás. Matthew me seguia,
acompanhado por quatro homens. Olhando para eles, ninguém nunca diria
que eram soldados da máfia. Assim que entramos no meu apartamento, senti
um enorme vazio, e tudo parecia diferente, naturalmente porque eu havia
mudado e não era mais a Raissa de antes.

​ epois das apresentações, ficaram definidos os turnos dos seguranças, que


D
contariam sempre com dois ao meu lado. Estava acostumada a morar
sozinha, ir e voltar dos lugares sem avisar a ninguém, mas passaria, então, a
ser seguida o tempo todo.

​ Agora que está tudo certo, preciso ir! Estarei em San Francisco até

amanhã e então retornarei para Los Angeles. Qualquer coisa, você tem o
meu número e pode me ligar. No início, você vai achar estranho, mas depois
vai se acostumar e nem vai se lembrar dos seguranças.

​— Posso te fazer uma pergunta?

​— Claro que sim!


— Ele vai acompanhar o que acontece comigo, minha segurança, se
estou bem…

​ Não, Senhorita O'Brien, ele nos confiou essa missão e disse que não quer

relatórios.

​ Tudo bem. Também não vou mais querer saber nada sobre ele. Eu só

queria entender, porque uma coisa é pesquisar como jornalista e saber que
vocês têm leis, regras e devoção à Instituição; outra coisa é viver essa
realidade. Você, por exemplo, parece ser um homem tão bom, no entanto...
Eu falo demais! Esquece!

​ No entanto, sou um assassino, um fora da lei, um mafioso. Suas dúvidas e



seus sentimentos confusos são normais; por isso, existe a regra de haver
laços apenas entre nós.

​— Mas Sarah Cooper não era da Instituição, e nem Nina.

​— A senhorita tem a curiosidade e a perspicácia aguçada de uma jornalista.

​ Aqui só tem uma jovem de vinte e três anos que quer entender por que

levou um pé na bunda.

​ Vamos lá então! Vou te explicar como funciona e por que Enzo tomou a

decisão certa em se afastar e não atrapalhar mais ainda a sua vida. Acredite,
não está sendo nada fácil para ele.
Capítulo 30
Raissa

​Já tinham se passado três dias desde que voltei para San Francisco, e havia
chegado o momento de retornar ao jornal e finalmente voltar a trabalhar. Os
últimos dias foram de reflexão e de muitas horas no FaceTime com os meus
pais e com as minhas amigas, que queriam saber de tudo que tinha
acontecido, mas tiveram que se contentar com o pouco que pude contar. Para
elas, disse que precisei de um tempo, fiquei com a minha família, estava de
volta, porém não queria mais falar do passado.

​ inhas amigas, assim como o meu editor, não precisavam saber de Enzo e
M
nem de Dubai; apenas que tirei uns dias para descansar depois de tudo que
passei e que retornaria à minha vida.

​ ui muito bem-recebida pelo meu editor e pela minha equipe no jornal, e


F
todos me elogiaram e disseram que eu era bem-vinda. Eles tinham o meu
currículo, e, antes de meu artigo sair na primeira capa, eu sempre escrevia
textos de qualidade na revista onde trabalhava; por isso, já tinha sido
sondada algumas vezes para trabalhar com eles.

Eu sempre quis trabalhar com jornalismo investigativo, mas não


conseguia emprego por não ter experiência. A oportunidade surgiu quando
ganhei destaque com uma matéria por ser uma das vítimas; caso contrário,
ainda estaria batendo de porta em porta. Enfim, tomei um gole de café e
suspirei frustrada, sentada a uma das mesas da redação, de frente para o
notebook pensando em qual seria o tema do meu novo artigo.

Como eu teria um espaço semanal no site, poderia escrever de casa e


enviar a matéria, vantagens do home office, mas queria discutir o assunto
com o editor e sair do jornal com o tema planejado.

— Raissa, eu poderia conversar com você?


​— Claro que sim! — respondi para Josh, que era um dos editores.

​ Primeiro, parabéns pelo excelente artigo! Também quero que saiba que eu

sinto muito por tudo que você passou!

​— Obrigada pelo reconhecimento ao meu trabalho e por sua solidariedade.

​ Eu penso que você foi gigante no tema sobre o tráfico de mulheres, e



sobre a violência que elas sofrem. Estive pensando em quanto isso é
romantizado na ficção e que seria um tema interessante a ser discutido.

​ Que ideia maravilhosa! Posso conversar com escritores, roteiristas e



terapeutas para levantarmos diversas opiniões sobre o tema.

​— Então está certo? Você aceita?

​— Vou começar agora! Qual o prazo?

​— Dez dias!

​— Fechado.

​ ui para casa e, no caminho, comecei a pesquisar sobre os profissionais


F
citados e a enviar e-mails para eles, a fim de falarem sobre o tema. Com isso,
pela primeira vez, achei bom ter dois seguranças, já que um deles dirigia e
eu podia trabalhar. O carro que me transportava era blindado, e, por mais que
eu gostasse do meu, Matthew insistiu que o novo era presente de Sarah
Cooper, pela minha coragem em defender as mulheres vítimas da máfia.

J​ á em casa, vesti uma roupa confortável, coloquei minha playlist com


músicas do The Weekend e mergulhei animada no trabalho, desligando-me
pela primeira vez das lembranças de Dubai. No dia seguinte, fui ansiosa para
a reunião com meu editor, na qual discutimos as minhas ideias, escutei suas
sugestões, e decidimos como abordaríamos o tema.

​ partir dali, comecei a remexer nas minhas anotações, a checar os e-mails


A
com as respostas de quem tinha aceitado conversar comigo, a marcar pontos
importantes que deveriam estar no artigo, e, com o passar dos dias, fui
montando a matéria que, no final do prazo, ficou perfeita. Quando a enviei
para o meu editor, ele fez uma chamada de vídeo para me parabenizar e dizer
que ela seria um sucesso.

​ epois fui olhar os meus arquivos e renomear a pasta com o meu último
D
trabalho, colocando “concluído” ao lado do título e a deixando exatamente
acima da pasta que se chamava Sarah Cooper.

​ m seguida, peguei uma garrafa de vinho, servi-me de uma taça, sentei-me


E
na minha cama, com o notebook no meu colo, e abri o arquivo com as
minhas pesquisas sobre a máfia. Sarah tinha a minha idade quando conheceu
Ryan Cooper e se tornou a Rainha da Máfia. Ela não tinha ligação com a
Instituição, e sua chegada causou uma grande revolução.

​ essa vez, eu sabia o que tinha acontecido de verdade, porque Matthew me


D
contou. Não foi como eu imaginava, e Sarah sofreu muito para se impor
entre os homens e não permitir que a diminuíssem. Nunca imaginei que, em
meio à dor de ter o seu marido entre a vida e a morte, ela e suas amigas, que
nunca largaram a sua mão, tinham se submetido a um treinamento rigoroso
como o dos homens da máfia para suportar a dor, ser frias, e principalmente
letais, não só para sobreviver no mundo do crime, mas também para se
impor perante os homens de uma sociedade extremamente machista.

​ ina se casou com Lorenzo praticamente como a garantia de que a Cosa


N
Nostra não teria gastos à toa em uma operação para salvar Sarah Cooper.
Dante Cosa Nostra não se importou dela não ter o sangue da máfia e
considerou Nina uma irmã de Sarah, que caiu de paraquedas na Instituição e
garantiu que Cooper fosse sempre seu aliado.

J​ ustamente por Sarah, que não tinha sido criada nos moldes da Instituição ter
se tornado uma lenda, com direito a uma lei com o seu nome, a Cosa Nostra
e a Bratva, agora aliadas, assim como as rivais, que tremiam só de escutar o
nome dessa mulher, não aceitavam de forma alguma renunciar à lei de
sangue para formar alianças por meio dos casamentos.

​ ma parte que eu não sabia era que Nina tinha ficado cinco anos afastada da
U
Cosa Nostra e que Enzo só conheceu o pai com essa idade. Eu sabia pelas
minhas pesquisas que Enzo teve leucemia e teria feito um transplante.
Porém, tempos depois, descobri que era verdade e que seu pai tinha salvado
a sua vida. Segundo Matthew, Lorenzo conheceu o filho já a caminho do
hospital e, sem questionar nada, disse que daria a sua vida por Enzo. Por
isso, além de todo o comprometimento com a família, com o seu legado, ele
jamais falharia com o seu pai.

​ o lembrar disso, meu coração ficou apertado e lágrimas rolaram pelo meu
A
rosto, lembrando-me dele. Matthew me contou que ele se casaria e que o
melhor para mim era esquecê-lo, porque nosso amor era impossível.

​ chava tão injusto isso tudo, mas não sabia se Enzo sentiu, algum dia,
A
qualquer coisa por mim. Afinal, eu me declarei, mas ele ficou em silêncio e
foi embora sem dizer adeus.

​ atthew me explicou que ele queria que eu vivesse e fosse feliz, e por isso
M
disse que aceitaria o casamento e tudo que decidissem em troca da minha
segurança.

Por mais que tivéssemos discutido e que eu tivesse dito com raiva
que nunca mais queria vê-lo, pelo menos uma mensagem de que estava
deixando o hotel ele poderia ter enviado. Eu sei que aproveitaria o momento
para mandá-lo tomar no cu novamente, mas pelo menos eu saberia que ele
quis se despedir, pensou em mim ou qualquer outra coisa que nos fizesse ter
um último contato.

Raissa: Oi, mãe, tudo bem? Acho que estou ficando velha, porque
estou te dando razão e vendo que mãe está sempre certa. Preciso de colo!
Terminei um trabalho hoje e ainda bem que fechei como freelancer para ter
mais liberdade de trabalhar de casa. Me aguardem, que amanhã estou
chegando.

Yelena: Mãe está sempre certa, já dizia sua avó! Eu estou na casa
dela, por falar nisso, porque seu avô não passou muito bem esses dias, nada
grave, e acho que sua presença vai alegrar essa casa.

Raissa: Eu amo vocês!

Yelena: Nossa! Você está ficando velha e amorosa!


Eu ri quando li a mensagem, porque minha mãe sempre reclamou do
meu jeito distante e frio, afirmando que eu não era uma filha que ficava
dizendo que a amava. Possivelmente toda a genética fria dos russos tinha
vindo para mim e pulado a minha mãe.

Meus avós eram doces, mas pareciam pessoas sofridas, que já


lutaram muito na vida. Eles não falavam quase nada do passado, da Rússia
ou da família que deixaram lá. Uma vez, perguntei, e eles disseram que não
tinham ninguém lá e que todos já tinham morrido.

Por fim, tomei um banho, arrumei a minha mala e mandei uma


mensagem para Matthew, avisando que eu viajaria e que precisaria combinar
alguns detalhes com ele por causa da segurança. Estava esperando-o me
responder quando a campainha tocou. Estranhei, porque não estava
esperando ninguém, mas deveria ser uma das minhas amigas; caso contrário,
o segurança nem deixaria se aproximar da minha casa.

Fui abrir a porta, prendendo o meu cabelo e olhando o celular à


espera de uma resposta de Matthew, e meu coração disparou quando vi que
era Enzo Cosa Nostra.
Capítulo 31
Enzo Cosa Nostra

​O dia do meu jantar de noivado chegou, e, por conta disso, acordei mal-
humorado e sem paciência para ficar jogando conversa fora. Então me
arrumei e pensei em ir para a casa de tortura, já que tinha alguns
interrogatórios pendentes, mas encontrei Luna, que estava me aguardando na
sala da minha casa.

​— Vai sair?

​ O que você acha? A Cosa Nostra não vai parar só porque vou ficar noivo,

e temos assuntos pendentes. Estou indo interrogar…

​ Escuta aqui, Enzo Cosa Nostra, eu fui a primeira pessoa a se colocar ao



seu lado contra esse noivado, e você, todo metido, disse que a Cosa Nostra
vinha em primeiro lugar. Se agora não segura a barra de se casar com quem
você não quer, não desconte em mim! E não precisa sair para interrogar
ninguém, porque tio Lorenzo já foi fazer isso com o meu pai. Logo,
priminho, curta o seu dia!

​ E qual era o seu grande plano, Luna? Que eu largasse a Cosa Nostra,

tomasse Raissa para mim, e nós dois nos transformássemos em alvos fáceis
dos nossos inimigos? Ou você acha que romper os laços com a Cosa Nostra
me faria continuar sendo parte da família? Raissa é alvo da Salvatrucha e da
Yakuza. Como vou protegê-la abandonando tudo?

​ Eu não sei, mas, de hoje até esse casamento, muita coisa pode acontecer,

e não vou ficar parada vendo você ser infeliz.

​ Pensei que você ficaria ao lado da noiva escolhida para o nosso primo —

Antonella surgiu do nada, defendendo a minha futura esposa.
​ Chegou à sonhadora que fica lendo romances e achando que a vida é cor-

de-rosa, além, é claro, de achar supernormal ser uma esposa troféu. Sugiro,
priminha, que você converse com sua mãe. Talvez tia Louise te faça
enxergar que romances e séries românticas estão bem longe da nossa
realidade.

​ Eu sei muito bem a história das minhas avós, porque minha mãe já me

contou, só que as coisas mudaram depois da Lei Sarah Cooper.

​ O que mudou é que agora podemos interferir dentro dos lares e impedir a

violência física, Antonella, e isso é uma grande vitória. Mas ainda temos
nossos futuros decididos por nossos pais, que escolhem nossos maridos. Até
eu, que vou liderar a Cosa Nostra, não sei se conseguirei me livrar de me
casar com quem meu pai escolher para mim.

— Eu não me importo em me casar com um chefe e ter uma vida


dentro de casa, cuidando dos meus filhos. Não quero ser como você e Alya,
que ficam chefiando missões. Só pretendo me casar e ter os meus filhos,
assim como deve ser o sonho da noiva do Enzo.

— Acontece que o certo seria que esse fosse o sonho dos dois! Você
não entende isso, Antonella? Nossos pais se casaram assim e deu certo, mas
a maioria dos casamentos não termina bem ou é de aparência. E esse do
Enzo vai ser um desastre, porque seu coração já tem dona, e sua noiva não
tem a menor chance de ser feliz.

​— Nós somos da máfia, e essa é nossa vida!

​ Tudo bem, quando for o seu jantar de noivado, seja com quem for, até um

velho barrigudo, viúvo e que fume muito charuto, vou comemorar, já que,
para você, está tudo certo, mas agora estou falando com Enzo e não vou
perder meu tempo com você!

​ una então me puxou pelo braço, e deixamos Antonella sozinha na sala e


L
fomos para o jardim. Eu e Luna crescemos juntos dentro dessa fortaleza, e
nossos laços eram indestrutíveis. Eu sabia que também enfrentaria o mundo
por ela, porém Luna queria comprar uma guerra perdida já que eu não
deixaria a Cosa Nostra.
​ Você sabe que as nossas vidas significam a proteção de várias famílias e

que não podemos virar as costas para isso, Luna. Eu tenho um compromisso
com a Cosa Nostra e vou me casar conforme as nossas leis.

​— Se eu te fizer uma pergunta, você me responde sinceramente?

​— Faça a pergunta.

​ Você está fazendo isso para garantir a proteção de Raissa, como você

falou lá na sala?

​— Sim, eu não quero que mal nenhum aconteça com ela.

​ Entendo. Então é por amor que você está embarcando nesse casamento

arranjado. Eu queria ser a Chefe para impedir isso!

​ Quando você for a Chefe, ainda assim, teremos que manter essa lei, senão

perderemos o controle. É como você falou para Antonella: muita coisa
melhorou, mas algumas coisas nunca vão mudar! E agora vai lá na sala e
conversa a com nossa caçula, porque ela não está errada em querer seguir os
costumes.

​ Vou conversar com Antonella. Seria mais fácil se Raissa fosse uma de

nós, porque daí a gente desfazia esse compromisso e vocês se casavam.

​ m seguida, Luna entrou na minha casa para conversar com Antonella, e


E
fiquei pensando em como as duas eram diferentes, apesar de terem sido
criadas da mesma forma. Nessa casa, todas as mulheres tinham voz de
comando; no entanto, Antonella só queria ser uma esposa da máfia, talvez
com a ilusão de que os casamentos eram felizes como o dos seus pais.

​ inutos depois, liguei para Matteo e o convidei para beber comigo numa
M
espécie de despedida de solteiro antecipada.

Meu jantar seria pequeno, só entre os Cosa Nostras e a família da


Natalya, pois os Coppers e os Mikhailovs só estariam presentes na cerimônia
de casamento. Seria apenas uma formalidade e uma reunião de negócios
entre meu pai, meus tios e meu futuro sogro, em que eu colocaria um anel de
brilhantes no dedo de Natalya, como quem estivesse assinando um contrato
pré-nupcial.

∞∞∞

Tomei um banho, aparei a barba, que estava há dias por fazer, peguei
meu perfume e, assim que o coloquei, eu me lembrei de Raissa falando que
amava o meu cheiro. Respirei fundo, vesti meu terno e desci as escadas,
escutando as vozes dos convidados. Todos os olhares se voltaram para mim,
e me senti a noiva chegando atrasada ao casamento.

​ inha expressão séria e minha cara de poucos amigos passaram


M
despercebidas, já que, na nossa sociedade, os homens não costumavam ficar
sorrindo. Cumprimentei os meus tios e o meu futuro sogro, que parecia o
mais feliz do jantar, visto que uniria sua única filha a um legítimo Cosa
Nostra.

​ Boa noite! É um prazer ser recebido em sua casa para um acontecimento



tão importante!

​ Boa noite, Rurik — respondi formalmente enquanto esticava o braço para



apertar a sua mão.

​ eu pai se aproximou, e a conversa passou a ser sobre a Yakuza, aliada da


M
Salvatrucha, que ficava à frente de tudo, enquanto a outra financiava os
custos.

​ edi licença e estava caminhando até o escritório quando escutei a voz de


P
Natalya chamando por mim.

​— Boa noite, Enzo!

​— Boa noite! Estou indo até o escritório, e, mais tarde, conversamos.

​— Posso te fazer companhia?


​— Prefiro ficar sozinho, com licença.

​ abia que não era certo descontar minhas frustrações em Natalya, e, de


S
verdade, minha intenção era aceitar esse casamento e tentar fazer com que
desse certo. No entanto, talvez por ter sido criado por Nina Cosa Nostra,
tivesse vontade de querer ser livre para fazer minhas escolhas, e esse lado
estava em guerra com o que mandava eu seguir as leis rígidas da Cosa
Nostra.

​ Surpresa! — a porta do escritório se abriu, e Alice Jordan entrou como



um furacão, rindo e falando alto. — Você achou que sua tia favorita no
mundo não viria à sua festa de noivado?

​— Boa noite, tia Alice. Achei que você só fosse ao casamento.

​ Eu perturbei tanto Jordan que ele resolveu me trazer, e chegamos agora



de surpresa. Seu pai adorou! — ela disse enquanto provava um pouco do
meu whisky — Agora vamos aos fatos, porque não sou mulher de dar voltas
para entrar num assunto — Alice falou quando preparava um drink para si.
— O que você faz trancado sozinho no escritório, com essa cara de quem vai
ser torturado pelo inimigo, em plena festa de noivado?

​— Eu só vim tomar um whisky e já estou voltando para a sala.

​ Você não está indo a lugar algum — ela disse, segurando o meu braço e

me impedindo de deixar o escritório. — Eu sei que você conheceu uma
americana, que, segundo Matthew, se parece comigo no jeito de falar, o que
já me fez amar a tal Raissa. Agora você me responde: por que está aqui
ficando noivo no lugar de estar com a mulher da sua vida?

​ Porque, independentemente do tempo que passe, anos, décadas, você



ainda não conseguiu entender que quem decide esses assuntos sou eu! —
respondeu meu tio Dante, que tinha acabado de entrar no escritório.

​ Dante Cosa Nostra! Como eu poderia me esquecer disso se você faz



questão de me lembrar sempre dessa parte medieval da Instituição?

​— Eu não sabia que você viria para o noivado!


​ Resolvi fazer uma surpresa, chefinho! Desculpe, melhor dizendo, Dante

Cosa Nostra, Capo di tutti capi!

​ Vocês dois vão ficar trocando elogios a noite toda? — perguntei. —



Sugiro que me acompanhem, porque já deve estar na hora do jantar e da
entrega do anel de noivado.

​ Então vamos para o jantar de enforcamento! — Alice falou e saiu com



um drink que era uma mistura de várias bebidas, e seu jeito nada
convencional na nossa sociedade me lembrou a alegria da Raissa.

Era disso que eu sentia falta, de sorrir! Raissa me fazia rir, algo
simples, mas que não era um costume na nossa sociedade. Por vivermos em
guerra, um refúgio que nos permitia respirar aliviados fazia muito bem, e
esse lugar eu só encontrei junto da minha jornalista encrenqueira.

​ ssim que chegamos à sala, minha mãe estava acompanhando os


A
convidados até a mesa de jantar. Nesse momento, eu me despi das emoções e
me sentei ao lado dela, e de frente para a minha futura esposa, que sorria
para mim.

O jantar foi silencioso, com os diálogos tradicionais: as mulheres da


máfia elogiando a comida, a decoração da festa e dando os parabéns para a
minha mãe. Enquanto isso, tia Alice revirava os olhos, e minha mãe sorria,
tentando representar um papel que não combinava nada com ela: o de esposa
troféu.

​ jantar se encerrou, e, assim que passamos para a outra sala, meu pai subiu
O
dois degraus da escada e iniciou um discurso, que falava de união e honra.
Por fim, disse que naquela noite estavam selando mais uma aliança entre
famílias da Instituição.

​ essa hora, caminhei até Natalya, segurei a mão dela e coloquei em seu
N
dedo um anel de noivado, selando-o com um beijo. Todos à nossa volta
bateram palmas, e a seguir tudo voltou ao cenário normal, com uma rodinha
de mulheres e outra de homens. Ao contrário do que imaginei, vários
associados estavam presentes com as suas famílias e filhas em idade para se
casar.
​ eu pai, meus tios e meus futuros sogros seguiram para o escritório, para
M
falar dos termos do casamento e de quanto isso renderia para eles, enquanto
eu convidei minha noiva para dar uma volta do lado de fora da casa.

— Aqui é tão grande, parece um reino, com o castelo e as casas em


volta dele.

​ O reino Cosa Nostra, cercado por muros altos que escondem a verdadeira

identidade dos CEOs do vinho.

​— Nós vamos morar aqui?

​ Não, nós vamos morar em uma das casas que temos na Sicília — inventei

isso porque, na verdade, ainda não tinha decidido nada sobre o assunto.

​ Eu nunca tinha saído da Rússia, a não ser para a festa de casamento em



que nos conhecemos e agora para o nosso noivado.

​— Você vai gostar da Itália!

— Eu tenho certeza que sim!

Natalya era uma jovem muito bonita, e eu tinha a obrigação de cuidar


dela a partir desse momento e me esforçar para que nosso casamento desse
certo.

​— Eu gostei muito do nosso jantar de noivado, e você?

​ Achei tudo perfeito! Vamos voltar para a festa! — falei, e caminhamos



em silêncio de volta para casa.

​ s convidados ficaram até tarde com suas conversas intermináveis, e dei


O
graças a Deus quando todos foram embora. Então dei boa noite para Jordan,
Alice e os meus pais, e fui para o meu quarto, porque precisava ficar sozinho
e pensar, mas meu sossego não durou cinco minutos.

​— Eu quero ficar sozinho!


​ Você vai ficar depois da nossa conversa! — minha mãe falou, entrando

no meu quarto com Alice.

​— Podemos conversar amanhã? Eu já fiz tudo que todos queriam!

​ Enzo, você é um homem, tem trinta e um anos e sabe bem das suas

responsabilidades. Não estou falando das leis ou das regras da Instituição,
mas do compromisso que você assumiu hoje, quando aceitou esse noivado.

​— Você também se casou assim com o meu pai, e são felizes!

​ Acontece que o seu pai não estava apaixonado por outra mulher. Eu

sugiro que você pense bem, porque ainda tem duas semanas até esse
casamento acontecer.

​ E, se você se casar com Natalya, se realmente fizer isso, vamos estar de



olho em você — Alice falou. — Somos a Máfia das Mulheres e vamos
cuidar da sua esposa.

​— Eu não sou um covarde! Jamais levantaria um dedo contra Natalya!

​ Não estamos falando de violência física, porque sei que não criei um filho

para agredir sua esposa — minha mãe disse e segurou o meu rosto. — Você
tem exatamente duas semanas para se entregar de verdade a esse casamento,
que você mesmo aceitou, e fazer sua esposa feliz depois que disser sim para
ela.

​ Agora, se algo acontecer e mudar tudo até lá, estaremos do seu lado! —

Alice afirmou antes de fechar a porta e deixar o meu quarto.

​ ão tinha mais nada para acontecer, porque o compromisso estava selado, e


N
não havia como argumentar, já que Raissa não era uma filha da máfia.

Durante a semana que se seguiu, eu me empenhei em escolher uma


das residências da Cosa Nostra para morar depois do casamento e dei carta
branca à minha mãe para cuidar da decoração. Trabalhei como antes, na
empresa e na Instituição, saí dois dias em uma missão com Luna e Matteo, e,
na volta, foram quase trinta e seis horas interrogando nossos inimigos.
​ oltei para casa exausto, e minha mãe veio até o meu quarto me entregar a
V
chave da minha nova residência e avisar que estava tudo pronto para receber
a minha esposa. Fiquei olhando para o objeto nas minhas mãos e para o meu
celular, indicando que, em uma semana, embarcaríamos para a Rússia. Sem
avisar ninguém, peguei o meu carro e, no caminho, enviei uma mensagem
para meus soldados, mandando prepararem o meu jatinho.
Capítulo 32
Raissa

​Eu olhava para Enzo, e o ar parecia estar sumindo dos meus pulmões. Só
havia duas semanas que nos separamos, mas parecia que fazia uma
eternidade. Eu já não era nem de longe a jovem que ele deixou no hotel em
Dubai e que pensava viver um conto de fadas, porque tinha sido esmagada
por um choque de realidade.

​— Posso entrar? Eu sei que vim sem avisar, mas nós precisamos conversar.

​— Entra! Você veio fazer o que aqui? Trazer seu convite de casamento?

​ Não, eu vim te dizer que, para mim, você nunca foi uma foda qualquer de

uma despedida de solteiro.

​ E agora é o momento que eu devo chorar emocionada com a sua



declaração?

​ Sei que mereço você me tratar assim, mas eu não podia… não podia me

casar sem te dizer…

​ nzo ficou em silêncio e parecia lutar com algo escondido no seu interior.
E
No entanto, aquela Raissa que atropelava tudo, por alguma razão resolveu se
calar e aguardar até que ele estivesse pronto para falar.

Depois de muito tempo, ele simplesmente caminhou até a porta e,


quando ia abri-la, pronto para sair, e ir embora novamente sem se despedir,
Enzo parou e, ainda de costas, começou a falar quase sem respirar e
atropelando as palavras, como se tivesse medo de desistir no meio do seu
discurso.
​ Eu não podia seguir em frente sem dizer que tudo que fiz foi por querer te

proteger desde o primeiro instante em que nossos olhares se cruzaram
naquela boate onde você estava presa. O seu olhar despertou algo em mim
que não se apagou mais, e, em Dubai, tudo ficou intenso. Para não te fazer
sofrer, precisei ser duro e fingir que não me importava, mas a verdade é… a
verdade é que, se eu pudesse, ficaria para sempre com você. Era isso que eu
precisava te falar, porque não quero que você se lembre de mim como
alguém que te usou.

​ ntão abracei Enzo pelas costas e deslizei minhas mãos pelos seus braços,
E
sentindo-o estremecer com o meu toque.

​ Quando te conheci, eu era só uma jovem que queria ganhar um prêmio



jornalístico acima de qualquer coisa. Não dava atenção a ninguém, não
respondia às mensagens da minha família e consegui ser sequestrada, quase
morta. Ainda assim, só me importei com uma matéria de primeira página. E
então, no meio disso tudo, com um turbilhão de emoções misturadas, eu
conheci o homem que mudou tudo dentro de mim, que me fez ir do céu ao
inferno, e, mesmo assim, se eu também pudesse escolher, ficaria com ele
para sempre.

​ essa hora, Enzo se virou, e nosso beijo foi intenso, demorado, como quem
N
estava se reencontrando e se despedindo do seu amor ao mesmo tempo.

O mundo real nos separava, mas, dentro das paredes do meu


apartamento, ninguém poderia impedir o nosso amor. Sim, nosso amor era
real e palpável, ainda que não fosse nomeado… ainda que fosse proibido.

​ le me prendeu com força contra o seu corpo, enquanto mordia os meus


E
lábios e invadia a minha boca com sua língua quente. Eu estava com
saudades dele e o agarrava com força, sentindo suas mãos fortes subindo o
meu vestido até a cintura e segurando firme a minha bunda.

​ volume dentro da sua calça roçava na minha intimidade, e eu me


O
esfregava nele sem o menor pudor. Eu queria aquele homem, e meu corpo
todo gritava por um contato maior com ele. Enzo me tirou do chão, e eu
entrelacei minhas pernas na sua cintura. Quando ele se sentou na minha
cama comigo no seu colo, senti seu pênis contra a minha vagina, e meu
corpo estremeceu de tanto tesão.

​— Preciso do seu pau dentro de mim!

​ Eu estava com saudade do seu jeito romântico — ele falou, e eu comecei



a rir. — E o meu pau está com saudades de entrar nessa sua boceta quente e
apertada.

Enzo me colocou de pé em sua frente e ficou me olhando com


desejo. Então senti que ele queria esvaziar sua mente e ficar ali, apenas
comigo e pude sentir que nosso sexo seria intenso.

— Ajoelha! Eu quero ver você me engolindo e me fazendo só seu.

Eu obedeci e, quando me ajoelhei, vi o seu pau grosso, cheio de veias


marcantes, que eu amava na minha frente. Fechei minha mão em torno dele
antes de colocá-lo com vontade em minha boca. Enzo segurou o meu cabelo
e começou a se mover enquanto empurrava minha cabeça. Sentindo as suas
estocadas fortes contra mim, fiquei sem fôlego, ao mesmo tempo em que
precisei me tocar, querendo gozar. Em seguida, ele tirou o seu pau da minha
boca e bateu com ele no meu rosto. Quando voltei a chupá-lo com força,
alternei as lambidas com a minha mão, masturbando-o. Enzo voltou a tentar
controlar as suas estocadas, mas eu determinei o ritmo, até que o vi jogando
sua cabeça para trás e seu corpo estremecendo.

​— Porra! Você tem uma boca muito gostosa!

​ nzo gozou forte na minha boca, e eu senti o seu sabor único, marcando a
E
minha garganta enquanto ele me olhava com os olhos semicerrados e cheios
de desejo. Ele me levantou do chão e me jogou na cama, e com as suas
mãos, abriu as minhas pernas e as jogou para cima. Depois começou a me
chupar sem delicadeza, enquanto minha boceta piscava, querendo mais dele.

​ eu olhar estava cheio de tesão. Quando ele se levantou e apalpou a minha


S
boceta e depois o meu clitóris, fez minhas pernas tremerem e o meu corpo
estremecer, enquanto um orgasmo intenso tomava conta de mim.
​ Você quer que eu te foda e que eu te faça gozar até sua boceta não

aguentar mais de tanta dor por causa das minhas estocadas?

​ Me fode como só você sabe fazer meu mafioso! — falei, excitada com as

suas palavras.

​ nzo entrou de uma vez só dentro de mim, e eu senti seu pau enorme e duro
E
me dominando. Quanto mais rápido e fundo ele ia, mais eu me contorcia
embaixo dele.

​ m seguida, arranhei as suas costas, fazendo-o gemer e estocar mais forte,


E
enquanto o apertava da forma como eu sabia que ele gostava. Senti no centro
das minhas pernas que eu explodiria em mais um orgasmo, enquanto seu
corpo batia com força contra o meu. Então, quando gozei forte, Enzo chupou
meus mamilos, levando-me à loucura.

​— Você gosta de ser fodida com força, não é, Raissa?

​— Por você, sempre!

​ om as minhas palavras, Enzo voltou a estocar forte e gozou dentro de mim,


C
gemendo alto e deixando o seu corpo pesado cair sobre o meu, enquanto
nossa respiração ofegante parecia que nunca mais voltaria ao normal.

​ Eu te amo, Raissa! Te amo muito, mas não posso deixar de ser quem eu

sou.

​ Também te amo, Enzo, e jamais iria querer que você deixasse de ser esse

mafioso sombrio e gostoso — falei e o beijei. — Eu te amo assim, do seu
jeito, e, se você largar tudo para ficar comigo, não vai ser mais o meu Enzo
Cosa Nostra, velhote e cortador de cabeças, e sim uma sombra dele.

​ Além disso, vamos ficar sem proteção, e você é tão encrenqueira que não

duraríamos vinte e quatro horas vivos. Não tenho como te proteger fora da
máfia, e, também não sobreviverei aos meus inimigos.

​ E tem também toda a responsabilidade com a sua família, os associados.



Você representa a nova geração da Cosa Nostra. Eu, quando voltei de Dubai,
te achava um covarde, mas a convivência com Matthew me fez enxergar
você de uma forma diferente. Ele me contou tudo sobre Sarah Cooper, Alice
Jordan e Nina Cosa Nostra, e eu entendi que não teve nenhum conto de fadas
na vida delas na máfia. Acho que pensei que seria uma nova Sarah Cooper,
mas não tinha entendido de verdade, com todas as letras, o que isso
significava.

— Matthew contou para uma jornalista tudo sobre a Máfia das


Mulheres? Meu padrinho deve estar ficando caduco com a idade!

— Cuidado como você fala do Matthew na minha frente, Senhor


Enzo Cosa Nostra, porque, para o seu governo, ele se tornou meu segundo
mafioso favorito do mundo!

​— O segundo? Isso significa que eu continuo sendo o seu preferido?

​ Por enquanto, porque eu ainda não conheço muitos mafiosos e os que



conheci até hoje tentaram me matar.

​ nzo então me calou com um beijo, e, por um momento, foi como se os


E
problemas não existissem mais lá fora, só porque estávamos juntos por um
tempo. Perdemos a noção da hora e, quando meu celular vibrou com uma
mensagem de Matthew avisando que tinha feito reservas em um voo para a
Filadélfia para mim e os seguranças, nós nos demos conta de que a realidade
nos chamava de volta.

​ u não tinha o direito de pedir que ele largasse a sua vida e suas
E
responsabilidades para fugir comigo e vivermos escondidos, exilados do
mundo.

Por que, com tantos homens no mundo, eu tinha que me apaixonar


por alguém impossível para mim?

​ or fim, Enzo se foi, e eu sabia que seria para sempre. Então arrumei as
P
minhas coisas e segui para o aeroporto. Entrei no avião e me afundei na
poltrona, sentindo todo o meu corpo doer, enquanto lágrimas rolavam pelo
meu rosto.

Eu sempre fui dura, fria, mas, de uns tempos para cá, passei a me
sentir totalmente quebrada por dentro, por não poder ter o direito de ficar
com o homem da minha vida, por uma regra da máfia que não poderia ser
quebrada.

​ uando cheguei à Filadélfia, fui direto para a casa dos meus avós e, no
Q
caminho, recebi uma mensagem de Matthew.

​Matthew: Você está bem?

​ aissa: Não. Isso tudo é muito injusto, Matthew! Eu e Enzo nos amamos!
R
Senti que se eu pedisse para ele largar tudo, ele faria isso, só que eu não tive
coragem. Não achei justo, principalmente porque também teria que esquecer
a minha família e sumir no mundo com ele. Não posso abandonar meus pais
para sempre, nem os meus avós que já têm idade avançada. Como eu poderia
pedir isso para ele largar tudo, se não posso fazer isso também?

​ atthew: Você mudou muito, porque a Raissa que eu conheci há duas


M
semanas jogaria tudo para o alto sem se importar com ninguém.

​Raissa: Então eu acho que cresci, porque agora me importo!

​ inceramente, nem tinha me dado conta de que havia amadurecido tanto


S
nesse pouco tempo.

Cheguei finalmente à casa dos meus avós e, quando minha avó abriu
a porta e me abraçou, comecei a chorar e não consegui segurar a tristeza que
estava guardando dentro de mim.

​— O que fizeram com você, minha menina?

​— Me roubaram o direito de ser feliz!


PARA FALARMOS DO PRESENTE,
MUITAS VEZES É NECESSÁRIO
RESGATAR VELHAS MEMÓRIAS.
O CHEFE DA SOLNTSEVSKAYA BRATVA ERA
ALEKSANDR MIKHAILOV, UM HOMEM
TEMIDO POR TODOS, E CONHECIDO COMO O
DEMÔNIO DA MÁFIA VERMELHA.
Capítulo 33
Polina

San Petersburg – Sede da Máfia Tambovskaya

​O inverno rigoroso fazia com que o meu corpo tremesse parecendo que
congelaria, mesmo estando próximo à pequena lareira da minha casa, que
ficava na área mais pobre de San Petersburg, onde eu morava com os meus
pais e meus dois irmãos mais novos, Anton e Vadim.

Meu pai sempre foi um homem rude, de poucas palavras, que não
tinha gestos de carinho com a esposa e os filhos. Por estar desempregado,
ficava cada vez mais endividado, ao mesmo tempo em que se entregava à
bebida e ao vício dos jogos em cassinos clandestinos que pertenciam à
Tambovskaya, a máfia de San Petersburg, um dos grupos da Solntsevskaya
Bratva, o maior crime organizado da Rússia.

​ u estava completando dezoito anos, tinha muitos sonhos e, entre eles, me


E
casar com Nikolay Pavlov, um jovem de vinte e um anos, que morava no
meu bairro. Eu o namorava escondida da minha família, que gostaria que eu
ficasse para sempre trancada em casa, ajudando minha mãe nos afazeres
domésticos e cuidando dos meus irmãos.

​ Polina... — Nikolay sussurrou, chamando-me bem próximo à janela do



meu quarto.

​ Vai para o lugar de sempre, que eu vou até lá encontrar você — respondi

bem baixinho, com medo de que minha mãe escutasse.

​ ikolay sempre se encontrava comigo um pouco antes do amanhecer,


N
quando todos ainda dormiam na minha casa e eu podia sair escondida.
Porém, nos últimos meses, isso estava se tornando impossível, já que meu
pai passava a noite jogando e só retornava pela manhã.

​ u inventei uma desculpa para sair, alegando que queria respirar um pouco
E
de ar puro, e deixando claro que os meus irmãos estavam dormindo, que a
casa estava toda limpa, e o jantar que era sempre sopa rala de batata e
cenoura, estava pronto para ser servido.

Minha mãe, no entanto, não queria que eu saísse e disse — como


sempre costumava dizer — que faltava arrumar ou limpar alguma coisa, ou
que os meus irmãos poderiam acordar. Mas eu argumentei, falando que
gostaria de ver a neve que caía e me distrair um pouco, já que estava sempre
trancada em casa.

Eu saí de casa sabendo que minha mãe arrumaria um jeito de dizer


que faltou alguma coisa para fazer, meu pai ficaria bravo comigo e como
sempre eu seria castigada, mas pouco me importei com isso, já que estava
indo me encontrar com o meu amor.

​ ui caminhando com os meus dentes rangendo devido à baixa temperatura e


F
aos flocos de neve que caíam no meu rosto. Fiz o percurso até um jardim que
ficava próximo à minha casa e, assim que cheguei, pude ver o sorriso de
Nikolay e ser aquecida pelos seus braços fortes, que me envolveram em um
abraço caloroso.

​ Desculpa por ter aparecido na sua janela em plena luz do dia, mas eu não

aguentava mais de vontade de te ver.

​ Eu sei, meu amor, também estava com saudades, mas infelizmente o vício

do meu pai está cada vez maior. Com isso, ele só chega pela manhã, e temo
encontrá-lo ao sair de casa. Estou preocupada porque suas dívidas estão
aumentando, e eu escuto suas queixas todos os dias e as lamentações da
minha mãe com medo de ele estar devendo à Tambovskaya.

​ Eu tenho escutado comentários no bairro sobre essas dívidas do seu pai.



Ele tem pedido dinheiro emprestado aos vizinhos para jogar. Não demora, a
cobrança vai bater à porta dele.

​ Isso que me assusta, já que a porta dele é também a minha, a dos meus

irmãos e a da minha mãe, de quem, mesmo me colocando para cuidar o
tempo todo dos filhos que ela teve como se fossem meus, não consigo ter
raiva.

​ Seu coração é doce, e, por isso, você cuida de tudo e de todos da sua casa

com amor. Você é especial, Polina! Eu me sinto um homem de sorte, porque
vamos nos casar, ter filhos, ser muito felizes, e ficar velhinhos juntos e
sentados abraçados no sofá velho da nossa casa. Em breve eu vou tirar você
dessa vida de escravidão. Eu sei que você nunca reclama, mas não é certo
que os seus pais deixem todas as obrigações da casa nas suas costas.

​ u e Nikolay ficamos abraçados por um longo tempo e depois caminhamos


E
um pouco enquanto fazíamos planos para o futuro. Ele tinha intenções de
procurar o meu pai para pedir permissão para que nós namorássemos e falar
sobre os seus planos de se casar comigo.

​ ikolay trabalhava como assistente em um escritório de advocacia e


N
guardava tudo que ganhava para nos casarmos o mais rápido possível. Nós
nos conhecíamos desde crianças e sempre fomos amigos, até que um dia nos
beijamos e começamos a namorar escondidos.
Eu sonhava em me casar pura e ser somente do meu marido para
todo o sempre, como nos romances, e Nikolay respeitava isso e dizia que
tudo seria sempre do meu jeito.

Seu amor e seu companheirismo eram as únicas alegrias da minha


vida, já que fui obrigada a parar de estudar, coisa que eu amava, porque
minha mãe estava sempre doente e meu pai decidiu que eu teria que cuidar
dela, da casa e dos meus irmãos, ignorando a minha vida, os meus sonhos e a
educação que deixei de receber quando saí da escola.

​ Dentro de três meses, vou receber uma promoção e substituir o assistente-



geral que vai ser transferido para outra sede. Então poderei pedir permissão
ao seu pai para namorarmos e mostrar que ganho o suficiente para alugarmos
um pequeno apartamento e nos casarmos.

​ Eu estou tão feliz porque finalmente vamos poder nos ver sem ser às

escondidas! Eu te amo! Por favor, nunca se esqueça que você será para
sempre o amor da minha vida!

​— Nunca, nada e ninguém vai nos separar, minha Polina!

​ oltei feliz para casa, ignorando o frio e os meus pés que estavam
V
congelando na neve devido ao solado gasto da minha velha bota.

Três meses!

Esse era o tempo para eu começar a ser feliz. Logo, um sorriso bobo
deu vida ao meu rosto, mostrando ao mundo a minha felicidade.

​ ssim que avistei minha casa, notei a presença de dois carros pretos
A
estacionados em frente ao portão. Entrei apressada, com medo de que tivesse
acontecido algo com o meu pai que estava há dois dias perdido pelos
cassinos do submundo de San Petersburg.

​ Até que enfim você chegou! — meu pai gritou. — Leve os seus irmãos

para o quarto que eu estou com visitas!

​ Sim, senhor! — obedeci e notei os olhos cheios de lágrimas e pavor da



minha mãe.
​ Espere! — um dos homens que era o mais alto de todos e usava um terno

que, pelo corte, deveria ser bem caro falou, olhando para mim com um tom
de voz grave e intimidador. — Quantos anos você tem?

​ Dezoito, senhor! — respondi e deixei rapidamente a sala com os meus



irmãos.

​ ntrei no meu quarto com as pernas trêmulas e fechei a porta. Alguma coisa
E
no tom de voz daquele homem me deixou em alerta, e por isso eu me sentei
encolhida na minha cama, abraçada aos meus irmãos.

​ O homem bravo falou que vai matar o papai — Anton, que tinha seis

anos, disse, assustado. — Eu tenho medo dele!

​— Fica calmo, que você deve ter escutado errado!

​ meu coração disparou por causa das palavras do meu irmão. Aqueles
O
homens de preto, com um jeito intimidador, só poderiam ser os credores do
meu pai, em outras palavras, a máfia.

∞∞∞

As horas pareciam ter congelado no velho relógio do meu quarto, e o


silêncio da minha casa foi quebrado pelo grito de pânico da minha mãe.
Respirei fundo, preparando-me para o pior, e temi que a porta se abrisse e
que eu tivesse de enfrentar não só a perda do meu pai, mas também a nossa
condenação à morte.

As histórias que escutávamos sobre a Tambovskaya eram horríveis, e


todos sabiam que, quando alguém os traía ou lhes devia alguma quantia e
não lhes pagava, toda a família morria, vítima de chacinas que costumavam
ser impiedosas e cruéis.

​ s meus irmãos, que acabaram dormindo nos meus braços, acordaram


O
assustados com o grito da minha mãe e começaram a chorar. Eu, porém, não
sabia como acalmá-los, já que também estava com muito medo.
​ Polina, arrume as suas coisas, porque você vai deixar esta casa! — meu

pai falou e abaixou a cabeça. — Sinto muito, mas é a única chance que
temos de ficar todos vivos!

​ u não sabia o que dizer e fiquei desnorteada com as palavras do meu pai,
E
que não pareciam fazer sentido. Por que teria que deixar a minha casa para
que eles sobrevivessem? Que mal eu fiz para merecer esse castigo? Sempre
fui uma boa filha e estava sendo expulsa da minha casa!

​ Anda com isso, Polina, senão você vai só com a roupa do corpo! — meu

pai falou, interrompendo os meus pensamentos. — Os homens estão com
pressa e eles não têm paciência para esperar por ninguém!

​ Como assim? Que homens? O senhor não pode chegar e me mandar



embora de casa sem me explicar o motivo! Eu sempre fui uma boa filha e…

​ Estou velho e ninguém quer me dar trabalho... e eu... eu precisava trazer



dinheiro para casa — meu pai falou de cabeça baixa, como se não pudesse
me encarar. — Acontece que não tive sorte e acabei perdendo tudo que eu
tinha, inclusive esta casa. Agora o dono do cassino quer o dinheiro dele e a
casa, ou nos matará.

​— E por que o senhor está me mandando embora se vamos todos morrer?

​ Não vamos morrer. Ele aceitou você como um adiantamento de



pagamento.

​ s palavras do meu pai foram como uma bofetada na minha alma, e eu


A
precisei me sentar na minha cama para não cair no chão. O meu pai me usou
como moeda para pagar suas dívidas, e eu nunca o perdoaria por isso!

Logo depois, minha mãe entrou no meu quarto com uma pequena
mala nas mãos, chorando e me pedindo perdão. Ela disse que não tinha
como fazer nada para mudar o meu destino, e em seguida, começou a
colocar minhas poucas roupas na mala e, depois de tudo pronto, me entregou
para que eu a carregasse até a sala e fosse embora cumprir o preço pela
irresponsabilidade do meu pai.
​ E se eu não quiser ir? — perguntei, olhando para o meu pai, que insistia

em não me encarar.

​ Você não tem escolha, porque já decidiram que você vai com eles. Agora,

se você fizer alguma besteira ou tentar fugir, eles matam a mim, a sua mãe e
aos seus irmãos — ele falou, olhando finalmente nos meus olhos.

​ ntão olhei para os meus irmãos e percebi que não poderia ser responsável
E
pelas suas mortes. A minha mãe, apesar do grito que deu na sala,
conformou-se rápido com a minha situação. Quanto ao meu pai, com certeza
continuaria jogando até levar um tiro e ir para o inferno por ter vendido a
própria filha.

​ or fim, caminhei até a sala, carregando a minha mala, e os homens me


P
olharam como seu eu fosse um pedaço de carne que eles queriam devorar.

Meu coração apertou por saber que não seria mais a esposa de
Nikolay e por perceber que, naquele momento, todos os meus sonhos
estavam sendo desfeitos para sempre. Eu sabia que morreria depois de servir,
com o meu corpo, a esses homens de terno que estavam me escoltando até o
carro.

​ ão olhei para trás e, com o coração sangrando, deixei a casa onde nasci e
N
vivi por dezoito anos para seguir um destino que, com certeza, seria triste e
doloroso.

​ ntrei no carro e me assustei quando vi o motorista e o segurança sentados


E
no banco da frente, fortemente armados. O homem mais alto, que deveria ser
o chefe deles, entrou no veículo e me disse que estávamos indo para
Moscou, onde ele teria uma reunião com o Chefe da Bratva, mencionando
que só depois voltaríamos para San Petersburg, onde eu conheceria a minha
nova casa. Na mesma hora, senti repulsa pelas palavras dele, que me tratava
como se eu fosse um objeto, e não um ser humano, e nojo quando ele
colocou uma das suas mãos nas minhas coxas e a apertou firmemente,
marcando a sua posse.

— Você é muito linda! Apesar de tão maltratada, com esse cabelo


bagunçado e essas roupas velhas — ele falou como se estivesse analisando a
sua mercadoria — tenho certeza de que, depois de um banho e roupas novas,
você vai parecer uma rainha.
Capítulo 34
Polina

Moscou, Mansão Bratva

​A viagem até Moscou foi silenciosa e, por causa da neve, levou mais ou
menos dez horas, três a mais que o normal, como o motorista explicou para
aquele homem que me comprou como se eu fosse um objeto e de quem eu
nem sabia o nome.

— Você é virgem mesmo como seu pai me falou? — Ele falou


apertando minha entrada por cima da minha calcinha — Responda sua
infeliz!

​— Sou.

​ Sou, sim senhor. Sempre me chame de senhor. Eu sou teu dono e



você me deve obediência.

​ Sou, sim senhor — Eu falei tremendo enquanto lágrimas



escorriam pelo meu rosto.

​ le parou de falar e mandou que eu tirasse o meu casaco, e como eu


E
hesitei, levei um tapa muito forte no meu rosto.

​ ão me dei conta de que tinham se passado dez horas, e que


N
estávamos chegando no nosso destino. Eu estava com medo de respirar,
temendo pela minha vida e pensando no meu amor, que, com certeza, eu não
veria nunca mais.

O meu fim, depois de servir a esse homem, seria certamente as ruas


ou numa vala onde ele jogaria o meu corpo sem vida.

​ Chegamos, senhor! — o motorista falou, e eu despertei dos meus



pensamentos. Então olhei para frente e vi portões imensos de ferro sendo
abertos por homens fortemente armados.

​ eus olhos nunca tinham visto nada tão lindo como o jardim imenso coberto
M
de neve e fontes com águas congeladas.

O Chefe da Bratva, o famoso e temido Aleksandr Mikhailov, de


quem eu já tinha escutado histórias assustadoras nos pátios da escola onde
estudei, morava em um castelo, onde diversos homens caminhavam
armados, e eu me assustei com a quantidade de carros pretos estacionados na
frente da casa.

​ homem que me trouxe como uma escrava saiu do automóvel sem dizer
O
uma palavra, seguido por seu segurança, que estava no banco da frente e que
passou dez horas sem dizer nada, deixando-me com o motorista, que parecia
ser tão apático quanto os outros dois.
​ noite estava fria, e o casaco que eu usava de nada servia, pois eu estava
A
congelando. O frio me fez ter vontade de ir ao banheiro, mas, com certeza,
eu não poderia usar nenhum daquele castelo. Sendo assim, teria que
aguardar a reunião acabar e torcer para que o miserável, que se julgava meu
dono, parasse em algum lugar. Porém, o medo de que ele fosse me obrigar a
ser dele, me fez engolir em seco e esquecer a vontade de fazer xixi, que já
estava me deixando com cólica.

​ u estava distraída, tentando dormir e esquecer aquele pesadelo que só


E
estava começando, quando escutei um grito e vi um menino pequeno rolando
pela escada do castelo, e sem pensar, abri a porta do carro e corri para
socorrê-lo.

​ Está tudo bem! — falei, pegando-o no colo e abraçando-o como eu fazia



com os meus irmãos. — Foi só um tombo bem grande. Como você é um
menino forte, nem se machucou! Qual o seu nome?

​ Aleksey! — ele respondeu orgulhoso, porque eu disse que ele era forte,

enquanto enxugava as lágrimas que escorriam pelo seu rosto.

​ O que aconteceu? — um homem alto, aparentando ter uns quarenta anos



ou mais, e com um rosto sombrio, perguntou aos berros, descendo as escadas
e me olhando dos pés à cabeça. — Quem é essa mulher? O que você fez com
o meu herdeiro, sua maldita? — ele indagou, arrancando a criança dos meus
braços, colocando-a no chão e ignorando os seus gemidos de dor quando o
seu corpinho foi tocado por ele. Certamente, o menino estava todo dolorido
e, por sorte, não se quebrou por inteiro.

​ Ela saiu de um dos carros quando o menino rolou escada abaixo, senhor,

e o socorreu. Me desculpe, senhor, ele foi mais rápido que eu… — uma
moça, que deveria ter por volta dos vinte anos, explicou, aproximando-se,
sendo interrompida pelo homem que gritava comigo e levando um forte tapa
no seu rosto que a jogou para longe.

​ Quando eu te dei liberdade para se dirigir a mim sem ser chamada? Você

só serve para ser comida por mim sua vagabunda, e tirando seus gemidos,
não aturo a sua voz! Soldados, levem essa mulher que não me serve para
mais nada e a joguem na rua para morrer congelada já que ela não tem mais
utilidade! — ele falou enquanto me olhava dos pés à cabeça.

​ s homens armados a seguraram pelo braço e saíram arrastando a


O
coitadinha, que, sem dúvida, morreria congelada nas ruas de Moscou.
Aquela situação me deixou em choque, porque nunca tinha presenciado
cenas violentas. Nesse instante, senti as mãos do homem que me trouxe
apertarem o meu braço com muita força e me sacudirem.

​ Sua cadela vira-lata, quem mandou você sair do carro? — ele gritou

ferozmente, com o rosto quase colado no meu. — Chefe, me desculpe por
isso! Eu sei que foi uma falha grave, mas não a treinei ainda. Acabei de
recebê-la como pagamento de uma dívida e vim direto para a reunião.

​— Eu vi o menino caindo…

​ ão consegui terminar a frase e caí no chão, nos pés da criança que socorri,
N
com o forte tapa que levei no meu rosto. O menino me olhou como se fosse
normal ver pessoas sendo agredidas, enquanto esfregava seus bracinhos que
deveriam estar doendo.

​ Você, Aleksey, saiba que eu vi lágrimas nos seus olhos quando desci as

escadas, e o futuro Chefe da Bratva nunca chora — o homem, que eu não
tinha a menor dúvida de que se tratava de Aleksandr Mikhailov, falou,
segurando com força os bracinhos do filho e ignorando a sua dor. — Talvez
você precise de uns dias no inferno para recordar o seu lugar no mundo.
Suba agora essas escadas e me espere no seu quarto para conversarmos.

— Sim, senhor, meu pai — a criança respondeu como se fosse um


robô e subiu as escadas em silêncio e de cabeça baixa, ao mesmo tempo em
que o segurança do homem que havia me trazido começou a me arrastar pelo
chão gelado em direção ao carro.

— Eu dei ordens para que ela fosse retirada da minha presença? — o


Chefe Mikhailov gritou com ódio, referindo-se a mim. — Você disse que ela
foi pagamento de uma dívida? Não há prostitutas suficientes nas boates para
te satisfazer, seu imprestável? Desde quando uma mulher vale dinheiro?
Você não serve para estar à frente da Tambovskaya já que troca dinheiro por
mulher — Mikhailov falou e deu um tiro na testa do homem que me trouxe.
Diante disso, segurei o meu grito de pavor, mas acabei soltando ali no chão
congelado e coberto por neve, a urina que estava presa.

Os outros homens presentes não deram uma palavra durante a


confusão, talvez por medo de terem o mesmo destino que o infeliz que
morreu.

— Senhores, vamos entrar, pois nossa reunião ainda não terminou.


Petrov — ele chamou, dirigindo-se a um dos soldados — conduza essa
mulher para dentro e mande que uma das empregadas a leve para tomar um
banho e colocar o uniforme dos serviçais da casa. Se ela o socorreu o meu
filho e o estava segurando no colo, deve saber cuidar de crianças e vai ficar
no lugar da vagabunda que mandei embora.

Sinceramente, eu não conseguia mais raciocinar. Quando o soldado


me levantou do chão, caminhei sem forças até a parte de trás do castelo,
onde fui entregue a uma mulher que trabalhava na cozinha daquele lugar.

— Quem é a moça? — a senhora perguntou, largando as panelas.

​ Peça que ela te conte a sua história se quiser saber alguma coisa porque

eu não estou interessado. O Chefe mandou que ela tomasse um banho e
colocasse as roupas de serviçais porque vai trabalhar na casa cuidando do
menino, o nosso futuro Chefe da Bratva — o tal Petrov falou e soltou o meu
braço, deixando a cozinha. — Ah, deem um banho urgente nela que está
fedendo a xixi! — ele disse, rindo. — Se a coitada se mijou toda com o que
viu lá fora, imagina com o que a espera nesta casa!

​ Qual o seu nome? — a mulher perguntou com um tom de voz que era um

misto de pena com carinho.

​— Polina! Eu me chamo Polina, senhora!

​ Eu me chamo Anna! Agora venha comigo, que eu vou te mostrar o seu



quarto e preparar tudo para que você possa tomar um banho e se arrumar
como o Chefe ordenou.

​— Ele é mesmo o Chefe Mikhailov, da Bratva?


​ Sim, criança, e aqui é o covil do Demônio! Este castelo é o coração da

Bratva, e eu não sei como você veio parar aqui, mas vai precisar ser muito
forte se quiser sobreviver.

∞∞∞

Liguei o chuveiro e, quando a água começou a cair, tudo que


consegui fazer foi me sentar no chão gelado e chorar. Minha vida havia
mudado de uma hora para outra: pela manhã, eu estava caminhando de mãos
dadas com o meu amor, Nikolay; logo depois, fui vendida para o antigo
Chefe da Tambovskaya, que foi assassinado na minha frente; e agora durante
a madrugada, estava tomando banho na mansão Bratva, onde viveria e
trabalharia para o Chefe.

Foram tantos acontecimentos em um único dia, e o que eu queria


mesmo era poder dormir e acordar no meu quarto com a certeza de que tudo
não passava de um pesadelo.

​ Polina, eu trouxe o seu uniforme e um casaco novo para você. Estou



deixando tudo aqui na sua cama. O motorista do carro que a trouxe deixou a
sua mala com um dos soldados. A reunião ainda não acabou, mas sugiro que
esteja pronta, porque não sei se o Senhor Mikhailov ainda vai precisar de
alguma coisa.

I​ nfelizmente, a voz de Anna me fez sair do estado de delírio, no qual


imaginava que poderia estar sonhando, sem deixar dúvidas de que a minha
vida não pertenceria mais a mim, e sim aos horários de serviço do castelo e
dos caprichos de um homem sádico, segundo o que escutei sobre ele e sobre
a forma como usava as mulheres e matava os seus desafetos.

​ aí do banho e encontrei um uniforme preto igual ao que Anna e a moça que


S
vi ser jogada na rua usavam. Lembrei-me da coitada, que estava aquecida
dentro da casa e teve que sair sem nenhum agasalho, sem poder se explicar,
sendo jogada fora como se fosse lixo.
​ lhei em volta e notei que o meu quarto tinha uma cama e uma cômoda de
O
madeira escura, e um tapete vermelho com uma caveira, símbolo da Bratva.
Peguei o uniforme, um vestido preto com uma faixa amarrada na cintura,
uma meia fina e sapatilha preta, e o vesti conforme Anna havia dito.

Nesse momento, lembrei que precisava arrumar o cabelo e, quando


me olhei no espelho, levei um susto, pois o meu rosto estava inchado por
causa do tapa que levei daquele infeliz que deveria estar sendo recebido no
inferno.

​ oltei para o quarto e me sentei na cama, chorando pelo meu triste fim,
V
enclausurada em um mausoléu. Era inevitável não pensar em Nikolay e no
que ele faria quando soubesse que fui vendida.

No início, ele pensaria em me salvar, mas depois cairia em si e se


daria conta de que eu estava servindo aos homens da máfia; logo, teria nojo
de mim. Como o tinha perdido para sempre, seria melhor não pensar mais
nele e orar para que me esquecesse e conseguisse ser feliz novamente com
alguma mulher que o merecesse.

​— Polina, posso entrar? — Anna perguntou, batendo delicadamente à porta.

​— Claro que sim!

— O Senhor Mikhailov está esperando a senhorita.

​ o ouvir isso, meu coração disparou, e minhas mãos não paravam de tremer.
A
Então olhei assustada para Anna, pedindo ajuda em silêncio, mesmo sabendo
que ela não poderia me proteger daquele homem.

​ Vamos logo, porque ele vai sair com o seu amigo, o Senhor Koslov, e

esses dois, quando saem em missão ou para jogar, levam dias para voltar.

​ nfim, acompanhei Anna e fiquei aliviada por saber que o monstro ficaria
E
alguns dias fora da mansão. Aquele homem me dava medo, e eu ainda não
sabia como fazer para viver na mesma casa em que ele e seus homens, todos
assassinos frios e cruéis.
​ ssim que entrei na sala com Anna, o Senhor Mikhailov já estava na porta e
A
se virou para falar comigo. Seu olhar frio e seu tom de voz intimidador me
deixaram com as pernas trêmulas. Tive medo de desmaiar e acabar
apanhando por isso, porque, se tinha uma coisa que aprendi rápido ali, era
que as mulheres eram os sacos de pancada dos homens da máfia.

​ Odeio pessoas que não vêm imediatamente à minha presença quando são

solicitadas. A partir de agora, você vai trabalhar nesta casa e servir à Bratva,
da forma e quando eu determinar. Sua função será tomar conta do meu filho
Aleksey sem fazer as suas vontades. Por enquanto, ele não está na casa,
viajou e vai ficar três dias de castigo. Depois desse tempo, os soldados vão
trazê-lo de volta. Anna, oriente essa moça para que apenas verifique os
horários de alimentação e higiene do meu filho, e que não fique contando
histórias ou cantando canções idiotas para ele.

​ pós fazer suas recomendações, o Senhor Mikhailov saiu, sendo seguido


A
pelo seu amigo e por outros homens da máfia como se fosse um rei. Olhei
para Anna, que fez sinal para que eu a seguisse, e fomos para a cozinha, que
estava vazia. Ela então me indicou um lugar para sentar começou a abrir as
panelas para me servir o que sobrou do jantar.

​ Eu imagino que você esteja com fome. Coma tudo e depois descanse,

porque amanhã é um novo dia!

​ lhei para o prato de comida e lembrei que a minha última refeição tinha
O
sido um copo de leite com alguns biscoitos que dividi com o meu irmão.
Fazia muito tempo que eu não me alimentava direito, e aquela comida, bem
diferente da sopa rala da minha casa, parecia deliciosa. Mesmo assim, eu não
tinha vontade de me alimentar.

​ Não adianta você ficar sem comer, porque isso não vai mudar o fato de

que você só vai sair desta casa se o Senhor Mikhailov assim decidir.

​— Sou uma prisioneira, mas ele fala como se eu fosse uma empregada.

​ Você não conhece a máfia, por isso fala assim. Todos os que nascem ou

entram de alguma forma para a Instituição se tornam prisioneiros.
​ Ou são jogados fora como a moça que trabalhava aqui e cuidava do

menino antes de mim.

​ Sim, mas, ainda assim, o receio por ter vivido nesta casa e de algum dia

cruzar novamente com o Chefe te faz prisioneira do seu medo para sempre.

​— Você trabalha aqui ou é prisioneira como eu?

​ Meu pai era um soldado da época do pai do Senhor Mikhailov. Eu vim



para ser cozinheira ainda muito nova. Depois da morte do pai dele, o Senhor
Mikhailov assumiu o comando e me manteve como empregada.

​— Ele não é casado?

​ Sim, mas sua esposa nunca sai do quarto. Ela ficou estéril depois do

nascimento de Aleksey, e ele a odeia por isso. Mas te aconselho a não querer
saber demais. Aqui, o melhor é trabalhar em silêncio.

​— Ele insinuou lá fora que aquela moça…

​ Alena é o nome dela. Não me faça perguntas, nem busque respostas ou



explicações. Só saiba que, na máfia e talvez no mundo em geral, as mulheres
são muito injustiçadas e oprimidas pelos homens. O Senhor Mikhailov a
jogou na rua, e isso foi melhor do que o fim de outras mulheres que
passaram por aqui.

Anna se calou depois disso, e eu respeitei o seu silêncio, entendendo


que falar demais na máfia poderia custar a sua vida. Fui para o meu quarto
após o jantar e não consegui dormir, pois fiquei pensando em tudo que tinha
acontecido naquele dia e chorando baixinho, com medo de alguém me
escutar.

Não havia amanhecido direito, e Anna me chamou, avisando que o


trabalho na mansão começava bem cedo. Ela já estava iniciando os
preparativos na cozinha e disse que eu seria responsável pela limpeza e pela
arrumação do quarto de Aleksey, assim como por sua higiene, alimentação e
horário de estudo.
​ u me levantei, fiz minha higiene pessoal e arrastei o meu corpo para dentro
E
da mansão, tentando me convencer de uma vez por todas que aquela seria a
minha vida dali para a frente.

​ i outras serviçais e alguns soldados conversando na cozinha enquanto


V
tomavam seus cafés da manhã. Percebi que, para eles, tudo que acontecia
dentro daquela casa e consequentemente na máfia eram coisas normais.

Anna então me indicou um lugar à mesa, e me sentei em silêncio. As


mulheres que estavam sentadas perguntaram o meu nome e se apresentaram,
falando sobre suas funções.

— Polina será responsável por cuidar de Aleksey, então, quando


seguirem para as suas funções, mostrem o quarto do menino e ensinem o
serviço para ela — Anna falou, e me dei conta de que ela era uma espécie de
governanta.

Acabei de tomar café e segui os outros serviçais, que foram me


mostrando a casa. Subimos por uma enorme escadaria, e elas me indicaram a
ala à esquerda do andar em que estávamos, que era do pequeno Mikhailov.
Eu me assustei por ele ter um andar só para si, com vários cômodos
diferentes: um para lutas marciais, outro para estudos, um todo preto e vazio
para aprender a se concentrar e, finalmente, o seu quarto de dormir. Este eu
pensava que seria como um sonho, cheio de brinquedos caros, mas, na
verdade, só tinha uma cama, duas mesas de cabeceira e uma mesa para
refeições.

​ Me desculpem por perguntar, mas vocês sabem para onde ele viajou? —

indaguei às duas mulheres que estavam me ensinando a tirar o pó dos
móveis do jeito certo, a arrumar as camas e a limpar o banheiro, que era
cheio de azulejos de caveira.

​ Ele não viajou; foi enviado para o Inferno Bratva — uma delas, chamada

Pietra, respondeu e abaixou a cabeça.

​— Inferno Bratva? O que é isso?

​ Fica no subsolo da casa de tortura, no jardim da mansão. Um lugar que



dizem ser horrível, com cheiro de enxofre, cheio de ratos, e onde os inimigos
são jogados para esperar pela morte.

​ E o que a criança está fazendo lá? — perguntei assustada e com os olhos



já se enchendo d'água.

​ Toda vez que ele desobedece ao Senhor Mikhailov, ou chora, ou faz



qualquer coisa que o desagrade, o menino é jogado lá para aprender a
obedecer ao pai e se preparar para um dia, no futuro, assumir o seu lugar no
comando da Elite Vermelha.

​ u senti uma brisa gelada entrando pela janela e tocando as minhas costas, e
E
uma sensação de pavor tomou conta do meu corpo.

O senhor Mikhailov era um monstro impiedoso, e eu pertencia a ele.


Infelizmente, não tinha como fugir desse destino.

∞∞∞

Os dias passavam lentamente na mansão Bratva, e, quanto mais eu


conhecia as outras arrumadeiras, mais ficava sabendo sobre tudo que
acontecia no mausoléu.

​ terceiro andar da casa pertencia ao Senhor Mikhailov, que tinha um quarto


O
separado para ele e outro para a esposa, a quem ele não visitava desde o
nascimento de Aleksey, cinco anos atrás. A esse andar eu não tinha
permissão para ir, e as mulheres que ele mandava chamar para satisfazê-lo
subiam e desciam escoltadas de lá.

​ ua esposa, a matriarca da Bratva, segundo me contaram, raramente saía do


S
seu quarto, mas, quando havia eventos da Instituição, era obrigada a
acompanhar o marido. Ela também organizava e recebia os convidados nos
eventos da mansão. O filho tinha pouquíssimo contato com a mãe, porque o
pai não permitia, sendo ele o único responsável pela educação do menino.

​ u estava sozinha no quarto de Aleksey, que não tinha nada para arrumar, já
E
que o menino estava fora e ali não tinha livros ou brinquedos para organizar.
De repente, o garoto entrou acompanhado por dois soldados que o
entregaram a mim e saíram sem dizer nenhuma palavra.

​ Sou a Polina. Você se lembra de mim? — perguntei, e ele me olhou e não



respondeu, apenas consentiu com a cabeça. Seu olhar era gelado, distante e
muito diferente do que tinha lágrimas nos olhos quando caiu da escada. —
Você quer tomar um banho?

​ ais uma vez, Aleksey não me respondeu e caminhou em direção ao


M
banheiro. O menino tinha um odor insuportável de fezes, urina e algo como
se ele estivesse podre. Com muito cuidado, tirei suas roupinhas e sorri para
ele, como se não estivesse sentindo o cheiro ruim que vinha do seu corpinho.
Abri o chuveiro e o lavei cuidadosamente, com o mesmo carinho que eu
tinha ao cuidar dos meus irmãos. Foi difícil segurar as lágrimas quando me
lembrei de Anton e Vadim.

​ m seguida, arrumei Aleksey, que teria aula de inglês naquela tarde, e fui
E
buscar o seu almoço, para que ele não fosse estudar de estômago vazio.
Assim que voltei para o quarto, servi-lhe, e ele comeu tudo com muita
rapidez, como se não se alimentasse há dias. Depois tomou quase duas jarras
de água. Então me dei conta de que ninguém deveria levar comida ou água
ao Inferno Bratva.

Que crueldade fazer isso com uma criança!

​ urante as três semanas seguintes, a minha rotina ficou toda por conta de
D
Aleksey e suas inúmeras aulas de inglês, francês, espanhol e italiano. Ele
tinha também um professor que o ensinava a ler e a escrever, além dos
instrutores de luta. A criança nunca brincava, só ficava, como eles diziam,
preparando-se para ser o Chefe da Bratva.

​ leksey era uma criança calada e com um semblante triste, que estava sendo
A
moldado para ser um Chefe frio e sanguinário no futuro, mas para mim ele
era só um menino solitário, e talvez por saudade dos meus irmãos, eu acabei
me afeiçoando a ele que não demonstrava nenhum sentimento por mim.

​ om isso, quando ele ia dormir, eu cantava para ele que ficava me olhando
C
parecendo perdido sem entender que estava recebendo uma coisa chamada
carinho.

https://youtu.be/T8lefqmdYSk

Колыбельная (Тили-тили-бом)

Тили-тили-бом
Tili - tili - bom
Закрой глаза скорее,
Feche os seus olhos imediatamente
Кто-то ходит за окном,
Alguém está caminhando lá fora
И стучится в двери.
E esse alguém bate na porta

Тили-тили-бом.
Tili - tili - bom
Кричит ночная птица.
Os pássaros noturnos estão cantando
Он уже пробрался в дом.
Ele está dentro da casa
К тем, кому не спится.
Daqueles que não conseguem dormir

Он идет…
Ele está vindo…
Он уже
Ele está chegando…
близко…
Perto…

Тили-тили-бом.
Tili - tili - bom
Ты слышишь, кто-то рядом?
Tá ouvindo ele se aproximando?
Притаился за углом,
Escondido no canto
И пронзает взглядом.
Olhando direto pra você

Тили-тили-бом.
Tili - tili - bom
Все скроет ночь немая.
A noite silenciosa esconde tudo
За тобой крадется он,
Ele se esgueira atrás de ti
И вот-вот поймает.
E vai pegar você.
Он идет…
Ele caminha…
Он уже
Ele está chegando…
близко…Тили-тили-бом.
Tili - tili - bom
Ты слышишь, кто-то рядом?
Tá ouvindo ele se aproximando?
Притаился за углом,
Escondido no canto
И пронзает взглядом.
Olhando direto pra você
Perto.
Capítulo 35
Polina

Em uma manhã que parecia normal como todas as outras, e


enquanto eu estava servindo o café a Aleksey, sem querer, lembrei-me de
uma canção que os meus irmãos adoravam e comecei a cantá-la baixinho,
ganhando a atenção do menino.

Infelizmente, o seu pai entrou no quarto, retornando de viagem


depois de um mês, e o meu coração disparou de medo por causa da forma
como ele me olhou.

— Sua vagabunda, você está querendo estragar a educação rígida do


meu filho com essa canção idiota? Eu te dei uma ordem antes de viajar!
Você não sabe obedecer?
Eu quis pedir desculpas, dizer que tinha sido a primeira vez e que
isso não se repetiria, mas ele me segurou com força, deu um tapa forte no
meu rosto, jogou-me no chão e começou a rasgar a minha roupa.

O monstro não se importou com a presença do filho, que continuou a


tomar seu café como se não escutasse os meus gritos.

Quando eu entendi que não adiantava pedir perdão para que aquele
homem parasse de me agredir, fechei os meus olhos, e as lágrimas rolaram
silenciosamente pelo meu rosto.

Ele arrancou a minha calcinha com violência e deu um tapa forte no


meu rosto. Foi tudo rápido demais, e eu não conseguia raciocinar tamanho o
meu medo e desespero.

O monstro se despiu e minha visão parecia turva, vendo aquele ser


asqueroso se jogando em cima de mim, abrindo as minhas pernas com força
e entrando dentro de mim, me fazendo sentir uma dor insuportável, além de
uma vergonha por ser uma ninguém que ele se achava no direito de violentar
como bem entendesse.

Ele estava matando de vez os meus sonhos de uma noite de amor, na


qual eu me entregaria a Nikolay, e me fazia sentir uma dor da qual eu
certamente jamais esqueceria.

Ele me usava de uma forma suja, me machucando fisicamente e


emocionalmente, e eu me sentia como um objeto sem valor, usado para dar
prazer e alívio ao Chefe da Bratva.

Suas palavras eram de ódio enquanto dizia que eu pertencia a ele e


que seria sua toda vez que ele ordenasse.

O meu corpo parecia estar dormente. De repente, ele me virou de


costas e tudo que fiz foi fechar os meus olhos e pedir para morrer, porque eu
não queria ter que passar por tudo isso outra vez.

Eu não tinha palavras para descrever a monstruosidade que aquele


homem estava fazendo comigo, e senti ódio do meu pai, que tinha me
trocado por suas dívidas e me jogado nas garras desse demônio.
Eu podia ver o ódio nos seus olhos e sua maldade parecia refletida no
seu olhar.

— Eu odeio ser desafiado. Eu odeio que não cumpram as minhas


ordens. Eu sou a lei, e não admito que não se curvem para mim. Nunca mais
ouse cantar para o meu filho sua infeliz.

Quando o monstro saiu de dentro de mim, depois de me machucar


profundamente com a força bruta com a qual invadiu o meu corpo e de
deixar a sua marca, ele segurou o meu rosto dolorido por causa dos tapas e
me ameaçou falando de forma que eu conseguisse escutar o seu ódio em
cada sílaba pronunciada.

​ Nunca mais me desobedeça e jamais engravide, ou eu mato você e o



bastardo!

​ m seguida, o monstro saiu, puxando o filho pelo braço e avisando que mais
E
tarde conferiria o seu aprendizado das semanas em que esteve ausente. Ele
não olhou para trás, não se importou com o meu sangue no chão do quarto,
muito menos com o fato de ter me destruído para sempre.

​ lgum tempo depois, Anna entrou no cômodo e me olhou com pena, mas
A
não disse uma palavra. Ela apenas se aproximou, ajudou-me a me levantar e
me vestiu com um novo uniforme, para que eu pudesse atravessar o casarão
e chegar ao meu quarto. Com cuidado, ela encheu a banheira, colocou
algumas gotas de um óleo que tirou do bolso do seu avental e me disse para
relaxar que tudo ficaria bem.

​ unca mais nada ficaria bem, e Anna sabia disso, mas foram as palavras que
N
ela tinha naquele momento para me confortar. Fechei os meus olhos e chorei
em silêncio, enquanto a água quente da banheira me aquecia por fora, já que,
por dentro, eu seria gelada para sempre.

​ esde aquela manhã, perdi as contas de quantas vezes fui usada por aquele
D
monstro. O inverno se foi e levou a neve, deixando cicatrizes incuráveis no
meu corpo e na minha alma.

Então a primavera chegou, deixando o jardim cheio de flores como


se aquele lugar horrível combinasse com elas. Mesmo assim, eu me
aproximava das rosas para admirá-las e tentar esquecer um pouco os meus
dias miseráveis naquela mansão. Eu estava no jardim, quando escutei os
soldados avisando que o Chefe estava me chamando em seu escritório.

Assim que entrei no escritório, como em todas as outras vezes, o


monstro estava bêbado, fedendo a charuto e com ódio de alguma máfia rival.

Ele se alimentava do meu desespero, sentindo prazer em me ver


ficar nua na sua frente com o corpo tremendo de medo.

Sua força bruta me partindo ao meio passou a fazer parte da minha


rotina, assim como da vida de várias serviçais, que, às vezes, ele escolhia
para satisfazê-lo.

Era comum a presença de prostitutas na mansão, e eu sentia pena da


sua esposa, que só deixava o quarto quando tinha algum evento e era
obrigada a acompanhá-lo em silêncio.

A Senhora Mikhailova, assim como eu e tantas outras mulheres,


éramos suas vítimas. Ninguém falava nada a respeito disso, afinal, ele era o
Chefe da Bratva.
Capítulo 36
Polina

​O verão chegou, marcando mais uma estação em que eu viveria sob o jugo
de Aleksandr Mikhailov. Eu já não sentia mais dor física com suas investidas
e inúmeras agressões, pois tudo dentro de mim havia morrido. O que eu
queria era que o meu fim chegasse, e orava para que isso acontecesse em
breve, pois não suportava mais viver.

​ s meus dias naquela mansão só eram um pouco mais brandos quando o


O
Chefe viajava, mas, sempre que ele regressava, exigia muito de mim, e eu
sentia nojo do seu corpo, que fedia a sangue e morte.

Aquele monstro parecia invencível, e, por mais que seus inimigos


tentassem destruí-lo, o Demônio sempre levava a melhor e voltava vivo para
casa.
​ aquela semana, em especial, aconteceria uma festa da Bratva no salão de
N
um hotel que pertencia ao seu braço direito, Andrei Koslov, um homem tão
frio quanto Mikhailov e que nem sabia ainda o sexo do bebê que sua esposa
esperava, e já tinha fechado um acordo entre ambos, selando o destino da
criança.

Se fosse menino, seria o consiglieri de Aleksey; sendo menina, sua


esposa.

Que sociedade machista e cruel predominava na máfia, pois uma


criança que nem havia nascido ainda, se fosse mulher, não teria o direito de
escolher com quem se casar!

​ Nesta semana, vou a uma festa acompanhado da minha esposa e do meu



filho. Ah, e vou levar você para tomar conta do Aleksey — o velho nojento
falou enquanto me usava como se eu fosse um objeto para ele despojar as
suas necessidades. — Quero você usando roupa de gente, e não esses
uniformes que veste nesta casa. Mande Anna providenciar uma roupa
decente para você nos acompanhar. Nem pense em conversar com qualquer
convidado, ou eu te mostro na frente de todos quem é o seu dono e a quem
você deve total obediência!

∞∞∞

Hotel Cassino – Festa da Máfia

Eu me sentia constantemente humilhada e envergonhada, e por isso,


andava sempre de cabeça baixa pela casa, e meu comportamento não foi
diferente no hotel, que estava repleto de convidados e pessoas elegantes.

Nesse dia, eu usava um vestido verde-escuro, que ia até a altura dos


meus joelhos, meia-calça e sapatilhas pretas.

Eu caminhava atrás de Aleksey, atenta para alguma coisa de que ele


viesse a precisar, e vários seguranças nos cercavam.
Enquanto isso, o monstro era bajulado pelos convidados como se
fosse um rei, e sua esposa parecia uma estátua ao seu lado, sorrindo quando
lhe dirigiam um cumprimento e voltando logo depois ao seu silêncio e olhar
perdido.

A música tocava alto no salão, onde alguns casais dançavam e várias


pessoas andavam de um lado para outro. Os homens fumavam charutos e
bebiam whisky, champagne e outras bebidas que eu não conhecia.

A única criança no local era Aleksey, que substituiria seu pai no


futuro. Por isso, o menino era o centro da atenção de todos os convidados,
embora ele só soubesse dizer “sim, senhor” e “não, senhor” para o pai, como
aprendia todos os dias, religiosamente.

Os garçons passavam servindo bebida e comida, mas eu não aceitava


nada, pois não era convidada, e sim uma escrava do Chefe da Bratva. Aliás,
fome era algo que nunca sentia; apenas me alimentava porque Anna me
obrigava a comer todos os dias, e eu não gostava de desagradar a única
pessoa que me tratava com carinho.

Eu estava me sentindo mal naquela festa, e com medo de ser abusada


a qualquer momento, e os nós dos meus dedos chegavam a estar vermelhos,
de tanto que eu apertava as alças de uma bolsa preta que Anna me emprestou
e me fez levar para a festa, dizendo que era elegante, como se isso fizesse
diferença para mim.

Anna ainda colocou um dinheiro dentro em um compartimento que


tinha no fundo da bolsa, dizendo que uma mulher sempre deveria sair com
alguns trocados, porque, na máfia, imprevistos poderiam acontecer, como
precisar pagar algum transporte para voltar para casa em caso de um tiroteio.

Eu ri pensando nisso, pois nunca voltaria para aquele inferno se me


visse livre, o que nunca aconteceria, a não ser que um milagre…

Nessa hora, um estrondo enorme seguido de uma bola de fogo e


depois de um apagão, que deixou todo o salão às escuras, fizeram com que
as pessoas corressem desorientadas. As luzes se acenderam e começaram a
piscar, enquanto uma sirene tocou e água começou a cair do teto.
Eu estava segurando firme a mão de Aleksey quando mulheres
passaram gritando entre nós e me jogaram no chão.

— Proteja o meu herdeiro! O hotel está pegando fogo! — o velho


gritou com um soldado. — Com certeza, esse acidente é proposital, e vou
descobrir quem fez isso e eliminar da face da terra, mas, por enquanto,
precisamos sair daqui!

Eu vi quando o Senhor Andrei Koslov corria com a sua esposa e


fazia sinal para que Mikhailov fosse com ele. O Chefe então pegou seu filho
no colo, puxou sua esposa e começou a caminhar apressado, olhando para os
lados.

— Levante de uma vez! — o soldado gritou, olhando para mim, mas


eu não conseguia me mover de tão assustada que estava e pensava que seria
melhor morrer ali do que ir com eles.

— Eu não tenho tempo para socorrer vadia nenhuma! — o velho


gritou. — Deixe-a no chão para morrer, porque igual a ela tenho várias para
me servir!

Aquela então foi a última vez que vi o Chefe da Bratva, Aleksandr


Mikhailov, um velho nojento que abusava de mim, que viu o salão do hotel
pegando fogo e desceu as escadas com a sua família, sem se importar com a
minha vida.

Eu queria ficar ali, mas as pessoas praticamente me arrastaram com


elas pelas escadas. Porém, quando me dei conta de que poderia ser livre,
comecei a correr, mesmo sem saber para onde, até que cheguei à calçada e
olhei para cima, vendo a fumaça no último andar.

Em seguida, caminhei pelas ruas sem saber que rumo tomar, pois não
conhecia Moscou. De repente, eu me lembrei do dinheiro que havia na
minha bolsa e pedi informações às pessoas sobre onde haveria alguma
pensão. Com base no que me disseram, fui a três diferentes até encontrar
uma que poderia pagar por três noites.

Assim que entrei no quarto, percebi que estava sozinha e, felizmente,


livre da Bratva. Logo, comecei a chorar e a tremer, com medo de que eles
me encontrassem e me arrastassem novamente para aquele inferno.

Eu estava desejando um milagre quando tudo aconteceu e não sabia


se havia sido um atentado ou acidente o motivo do alvoroço, mas, com
certeza, foi um milagre eu estar ali justamente naquela noite em que
acompanhei a família Mikhailov a um evento. Portanto, seria eternamente
grata a Deus pela chance de poder dormir e acordar sem medo de ser
violada.

No dia seguinte, não tive coragem de sair do quarto por medo de


encontrar os soldados do monstro. Quando anoiteceu, precisei descer para
jantar, pois não tinha comido nada durante o dia e meu estômago estava
roncando alto. Acho que que passar tantas horas longe daquele castelo dos
horrores trouxe de volta o meu apetite.

Eu desci timidamente e me sentei em silêncio à mesa, servindo-me


de sopa, que era a refeição que a pensão oferecia. Depois fiquei olhando em
volta e não vi nenhum rosto conhecido. Foi então que escutei dois homens
falando do incêndio no hotel.

— Para mim, o que aconteceu no hotel foi algum atentado de uma


máfia rival da Bratva, porque festa dessa gente sempre acaba em sangue
derramado.

Ao ouvir isso, acabei de tomar a minha sopa rapidamente, peguei um


pedaço de pão e voltei para o meu quarto.

No outro dia, desci e procurei a senhora que tinha me recebido na


noite em que cheguei ali, a qual era a dona da pensão.

Eu disse que era sozinha, que tinha saído da casa dos meus pais e ido
para Moscou com uma família que me deixou na rua; por isso, precisava de
emprego. Perguntei se, por acaso, ela sabia de algum lugar que precisasse de
alguém para limpar ou cozinhar. Por sorte, ela respondeu que eu lembrava
muito sua filha que tinha fugido da Rússia e que, se eu soubesse cozinhar
bem, poderia ficar lá em troca do meu trabalho. Inclusive, falou que, se
sobrasse tempo para arrumar os quartos, poderia me pagar por isso.
Eu aceitei a oferta e trabalhei duro por um mês, guardando o meu
dinheiro para ir embora de Moscou, porque ali eu vivia com medo de
esbarrar com algum soldado da mansão, embora nunca colocasse os meus
pés do lado de fora da pensão.

∞∞∞

Já estava me acostumando com a rotina pesada de trabalho, que


sempre aumentava nos fins de semana. Como eu trabalhava na cozinha,
quase não tinha contato com os hóspedes. Os quartos eu costumava arrumar
quando estavam vazios, e sempre procurava caminhar de cabeça baixa pelos
corredores e com um lenço que cobria todo o meu cabelo.

Certo dia, estava limpando um dos quartos quando o cheiro da


colônia que o hóspede deixou impregnado no ar me fez vomitar. Passei o
resto do dia me sentindo mal, e, na hora do jantar, assim que coloquei uma
colher de sopa na boca, o enjoo voltou. Como precisava do meu trabalho,
não falei para ninguém que estava me sentindo mal.

Continuei trabalhando por toda a semana, até ver um casal passando


por mim no corredor e olhar para a barriga de grávida da senhora. Na mesma
hora, senti um mal-estar e uma sensação que o mundo estava desabando de
novo na minha cabeça.

Passei o resto do dia e a noite toda relembrando o último mês e me


dei conta de que estava com a menstruação atrasada. Só não tinha percebido
isso porque estava muito focada no trabalho, o que não me permitia ter
tempo para pensar na minha vida.

Assim que amanheceu, pela primeira vez, saí do hotel entre o horário
do café da manhã e o almoço e fui até uma farmácia comprar um teste de
gravidez.

Voltei para a pensão e não consegui esperar até a noite; fiz o teste
assim que cheguei. Minha reação com o resultado foi como ser arrastada
novamente para o pior pesadelo da minha vida.
Constatei que carregava dentro de mim um bastardo do Chefe da
Bratva, que ele, com certeza, mataria se soubesse da existência.

Se por segundos cheguei a pensar que essa criança seria uma semente
do mal que sofri, no mesmo instante, entendi que ela era tudo que eu tinha e
que precisava protegê-la de todos os perigos do mundo, ao contrário do que
os meus pais fizeram comigo.

Eu não tinha tempo para chorar de medo pelo que viria, nem de sorrir
por não estar mais sozinha no mundo. Então, desci para trabalhar, como
fazia todos os dias, e me apressei para deixar tudo em ordem e não notarem
que, pela primeira vez, precisei me ausentar e não deixei o almoço
adiantado.
Capítulo 37
Polina

Uma semana depois de fazer o teste, eu me olhei no espelho e


fechei os olhos, imaginando que seria uma questão de tempo até notarem a
minha gravidez. Por isso, enchi-me de coragem e decidi enfrentar a vergonha
e a humilhação de ser quem eu achava que tinha me tornado.

No meu dia de folga, o qual costumava passar dentro do meu quarto,


fui até a cabine telefônica próxima à pensão e telefonei para a única pessoa
no mundo que, mesmo eu não merecendo, poderia me ajudar — se
continuasse com a alma caridosa e o enorme coração nos quais sempre
acreditei.

— Bom dia! Escritório de Advocacia Demidov!


— Bom dia! Estou procurando uma pessoa, Nikolay Pavlov. Ele
ainda trabalha nesse escritório?

— Trabalha, sim. Vou ver se ele está aqui ou se foi fazer algum
serviço para o Senhor Demidov.

Meu coração disparou enquanto a pessoa que atendeu foi procurar


Nikolay, e agradeci mentalmente a Deus por ela não ter perguntado o meu
nome.

Nos minutos em que fiquei esperando que ele atendesse ao telefone,


pensei em desligar e desaparecer, mas não agiria como os meus pais que me
jogaram nas trevas. Não havia herdado nada deles e nem seria egoísta de não
tentar conseguir alguma ajuda para o meu bebê.

— Alô! Quem está falando? — Nikolay perguntou assim que pegou


o telefone.

— Nikolay, eu…

— Não é possível! Eu estou sonhando! Polina?

— Sim, sou eu. Nikolay, não desligue, por favor! Eu sei que não sou
digna de me dirigir a você depois de tudo que me aconteceu, mas não
conheço mais ninguém em que eu possa confiar. Por isso, mesmo sabendo
que você não quer mais me ver, e eu entendo, te peço que me escute…

— Do que você está falando, Polina? Por que eu não ia querer te ver,
meu amor? Onde você está? Deus sabe o quanto eu te procurei, mas
ninguém sabia de você, até que consegui informações com um soldado, que
disse que você tinha sido deixada na mansão Bratva. Então fui até Moscou,
mas não consegui nenhuma informação, porque tudo relacionado à máfia é
assunto proibido. Achei que tivesse acontecido o pior com você, e agora
você voltou para mim!

Eu não sabia o que falar. Tudo que fiz foi chorar de cabeça baixa para
não chamar atenção das pessoas ali perto. Como estava em um local público,
não poderia falar muito sobre o que estava passando e explicar por que
precisava de auxílio.
— Estou precisando de ajuda! Eu saí da casa em que vivia e quero
deixar Moscou, mas não sei como fazer isso. Não posso falar muito; na
verdade, nem sei por que te liguei, mas não sei a quem recorrer...

— Eu estou indo até Moscou te buscar, Polina! Me diz o local onde


você está morando.

— Estou morando e trabalhando numa pensão e não sei se posso


receber visitas. E não sei como olhar para você... Eu sou indigna…

— Nunca mais repita uma coisa dessas, Polina! Eu não sei o que te
fizeram, e você não precisa me contar se não quiser, mas você nunca vai ser
uma mulher indigna, e sim o único amor da minha vida! Estou indo te
buscar!

Eu passei o endereço da pensão para Nikolay e orei a Deus para que


eu realmente pudesse confiar nele. Eu precisava ir para alguma cidade longe
dali, mas não tinha recursos. Se ele me ajudasse, eu trabalharia até pagar
cada centavo para ele.

Meu coração estava quebrado para sempre, mas Nikolay ainda vivia
dentro de cada parte dilacerada, como a única lembrança boa da minha vida.

Eu estava ansiosa e com medo de encontrá-lo novamente, já que,


pelo que tinha acontecido, eu me sentia suja, por mais que tomasse vários
banhos ao dia.

∞∞∞

Dois dias depois de ligar para Nikolay, assim que acabei de servir o
café da manhã, saí rapidamente com a desculpa de que precisava ir à
farmácia, e corri até a praça que ficava perto da pensão para me encontrar
com ele.

Parecia que meu coração explodiria quando vi o meu grande amor


em pé, ao lado de uma árvore, assim como ele me esperava antigamente nos
nossos encontros.

Nikolay ainda era o mesmo homem de antes, já eu, uma mulher


marcada pela vida.

— Polina! — Nikolay falou assim que me viu, e, quando se


aproximou e me abraçou, todo o meu corpo enrijeceu, e eu comecei a tremer
de pânico. — O que fizeram com você, minha Polina?

Nikolay beijou a minha testa, e, no mesmo instante, senti falta de ar,


porque qualquer toque se tornava um gatilho que me fazia lembrar o
tormento que eu tinha vivido nos últimos meses.

Com muita calma, consegui contar, sem dar detalhes, o que me


aconteceu quando deixei a casa do meu pai. Logo, a vergonha me consumiu
por completo.

— Preciso voltar para a pensão, porque a senhora deve estar me


procurando, achando que aconteceu alguma coisa comigo, já que nunca saio
na rua.

— Eu vou te acompanhar e me hospedar lá. À noite, vamos


conversar com essa senhora, e você vem comigo para San Petersburg.

​ Não quero voltar para a nossa cidade! Preciso ir para algum lugar bem

longe daqui e recomeçar a minha vida. Sei que você não tem obrigação, mas
eu preciso de dinheiro. Eu te pago! Vou trabalhar, e todo o dinheiro que eu
ganhar vai servir para me manter e te pagar, mas preciso ir embora.

​ Você vem comigo e vamos nos casar! Você vai ser a minha esposa como

sempre planejamos. Ou você não me ama mais?

​ Nikolay, não sei como te falar, mas não sou mais aquela jovem que você

namorava. Eu não fui só uma babá dentro daquela mansão dos infernos. Eu
passei por muitas coisas, muita dor e… eu não consigo falar, sou quebrada,
não vivo, sobrevivo, mas te amar… eu vou te amar até o último dia da minha
vida!
​ Eu não vou te cobrar nada, só cuidar de você e colar cada pedacinho que

foi quebrado.

​— Não posso! Eu… eu preciso ir para bem longe!

​ Por quê? Pelo que você me falou, eles não estão te procurando. Polina,

essa gente é muito ocupada, e, para eles você morreu. Se eu pudesse, mataria
esse homem, mas nós sabemos que isso é impossível!

​— Me ajuda a desaparecer para sempre!

​— Confia em mim! Seja o que for que te aflige, eu vou te ajudar.

​ Descobri há uma semana que… estou grávida! Estou esperando um filho



do Chefe da Bratva, um bastardo que não pode nascer, como ele falaria se
soubesse disso. Mas é minha sementinha de vida que está crescendo aqui
dentro e que vai ser só minha!

Enquanto eu falava, lágrimas escorriam livremente pelo meu rosto,


lavando a minha dor e a vergonha que eu sentia por tudo que tinha passado,
mostrando a minha tristeza por estar com o meu amor e sem poder tê-lo em
minha vida, e pelo medo de perder a sementinha de luz que crescia dentro de
mim.

— Você não pode continuar aqui, Polina! Vamos para a pensão,


conversamos com a senhora, contamos que você está grávida, que eu vim te
buscar, e vamos embora. Eu agora moro sozinho próximo ao escritório e vou
te levar para a minha casa. Não se preocupe, que não vou tocar em você. Eu
te respeito e quero que você saiba que sempre vai poder confiar em mim.

— Eu confio em você!

​ Quanto mais tempo você passa aqui, mais perigoso fica, porque,

querendo ou não, essa criança é de Aleksandr Mikhailov, e a segurança de
vocês tem que estar em primeiro lugar. Infelizmente, não sabemos em quem
confiar, e esse monstro nunca pode saber disso.

​ ão tive tempo para pensar, porque Nikolay só queria me tirar o mais rápido
N
possível de Moscou. Ao contar a história para a dona da pensão, ela não
gostou de saber que me perderia, já que eu cuidava muito bem de tudo, mas,
quando soube que eu estava grávida, parecia ter ficado aliviada por Nikolay
me levar embora.

​ viagem até San Petersburgo foi silenciosa. Parecia que eu estava voltando
A
no tempo e fazendo o caminho contrário que mudou toda a minha vida.
Infelizmente, não pude ver a cidade onde nasci, pois fui direto para o
apartamento de Nikolay.

Não poderia sair de casa e correr o risco de encontrar algum


conhecido. A notícia da minha volta poderia chegar aos ouvidos da
Tambovskaya, e eu tremia de pânico só de pensar que me levariam de volta
para o Chefe, dizendo que tinham encontrado um rato fujão.
Capítulo 38
Polina

​Nikolay me tratou com respeito e atenção durante todo o mês em que fiquei
na casa dele. Enquanto isso, ele dizia que estava providenciando um lugar
onde ninguém me encontraria, e meu coração sangrava por saber que eu me
separaria dele novamente, sendo, dessa vez, para sempre.

​ u passava o dia sentada, lendo alguns romances que Nikolay havia


E
comprado para mim, já que ele sabia que eu gostava muito de ler. Romances
que antigamente me faziam suspirar, e que agora me machucavam por estar
tão longe da minha realidade.

​ paciência e a delicadeza dele, que vinham de um amor incondicional que


A
eu sentia que Nikolay tinha por mim, eram demonstradas em gestos simples,
como pedir permissão para tirar um fio de cabelo que cobria o meu rosto, ou
para fazer um carinho, com muito cuidado, no dorso da minha mão.

Qualquer toque me assustava e me remetia a momentos de dor.


Porém, o homem que eu sempre amei sabia disso e compreendia que eu não
tinha condições de corresponder às suas carícias com a mesma devoção.

​ om o passar dos dias, comecei a me soltar um pouco quando cozinhava e


C
até cantarolava enquanto buscava o condimento perfeito para dar um sabor
mágico e especial às minhas receitas.

​ Vou fotografar cada prato divino que você faz, Polina! E você vai me dar

a receita! — Nikolay falou enquanto suspirava depois de experimentar o
jantar que preparei, mostrando quanto o tinha apreciado.

​ Você quer preparar esses pratos quando eu tiver partido? — perguntei



com uma pontada de dor no coração.

​ Não, minha querida! Já estou pensando no livro de receitas da Polina!



Você é uma chef nata, meu amor!

​ Obrigada! — agradeci e, pela primeira vez, sorri sem ser de forma



mecânica.

Na verdade, fiquei feliz com as palavras de Nikolay e com a


possibilidade de um futuro que eu não teria, mas que me alegrou. Um livro
com as minhas receitas, com certeza seria um sonho que me deixaria
encantada em poder realizar.

​ foi assim, com pequenos avanços, como um sorriso e um toque que não
E
me incomodava que, um dia, do nada, adormeci com a cabeça apoiada no
ombro de Nikolay enquanto ele lia um livro para mim.

O tempo foi passando sem que eu me desse conta dessa


reaproximação.

Certa vez, para mim, era só mais um dia como outro qualquer em que
eu preparava alegremente o jantar, quando de repente Nikolay entrou em
casa contando as novidades com o entusiasmo de uma criança que havia
terminado, com louvor, o projeto escolar.

— Polina, tudo resolvido! Durante todo este tempo que você ficou
aqui em casa, estive preparando a nossa partida. O meu escritório tem
parceria com vários escritórios pelo mundo, e um deles fica na Filadélfia,
nos Estados Unidos. Fui obrigado a contar para o meu patrão que você
voltou, tudo que aconteceu, mas não contei sobre a gravidez, porque isso é
como pólvora e, quanto menos pessoas souberem, melhor. Ele acompanhou
todo o meu sofrimento desde quando você desapareceu e a minha dor todos
esses meses. Como eu disse que precisávamos ir para longe, ele propôs que
nos casássemos e fôssemos juntos para os Estados Unidos. Vamos com visto
de trabalho por um ano, depois pedimos asilo ao governo americano e não
voltamos nunca mais para a Rússia. Nosso filho, ou filha, vai nascer na
América, ser livre e nunca vai saber a sua verdadeira origem. Seremos nós
três para sempre vivendo em paz nos Estados Unidos.

​ o ouvir essa notícia, eu não sabia o que dizer e apenas chorei. Nikolay se
A
aproximou lentamente e me abraçou, mas, dessa vez, não tremi, nem fiquei
sem ar.

Eu sentia confiança no homem que sempre amei e que estava


deixando tudo para formar comigo a família com a qual sonhamos um dia,
mesmo que em uma situação completamente diferente de todos os nossos
planos.

​ Vamos partir juntos? Você quer ficar comigo, mesmo eu não sendo mais a

jovem pura que você conheceu e…

​ Você é a jovem pura que eu conheci, Polina! Ainda que tenham te



marcado de forma brutal e covarde, você continua pura, doce, bondosa... e é
a mesma mulher que eu sempre amei e quero para sempre ao meu lado. Vou
ser paciente, e você nunca fará nada que não deseje. Eu te quero por
completo, mas só no dia em que você me quiser assim também. Até lá,
seremos companheiros e unidos pelo nosso amor, que é maior que os
prazeres da carne. Eu saberei te esperar, minha Polina! Agora preciso saber
de uma coisa?
​— O quê? — perguntei com os olhos cheios d'água.

​ Você aceita se casar comigo e ser a Senhora Pavlova? — Nikolay



perguntou, prostrando-se de joelhos na minha frente e segurando uma das
minhas mãos.

​ Sim! — respondi sorrindo e o surpreendi quando me ajoelhei, abraçando-



o pela primeira vez.

∞∞∞

Uma semana depois, nós nos casamos no civil. Só tivemos o patrão


de Nikolay e sua esposa como testemunhas, e, mesmo simples, foi uma
cerimônia que aqueceu o meu coração.

— Polina, esse presente é para você! Sei que estamos nos


conhecendo agora, mas saiba que estou muito feliz em ser testemunha, ou
melhor, madrinha desse casamento. Sei que provavelmente não nos veremos
outra vez, mas espero, do fundo do meu coração, que tudo dê certo e que
vocês sejam felizes nessa nova vida. Esse presente é para você poder
extravasar os seus sentimentos. Pra mim, funciona muito bem! — a mulher
falou.

Eu sorri e abri o embrulho, encontrando um caderno com um


cadeado. Era um diário no qual eu poderia escrever o que sentia, mas que
não conseguia falar para ninguém.

— Obrigada! Eu tinha alguns desses antes de tudo… gostei muito!


— agradeci, e ela sorriu e entendeu por que interrompi a minha frase.

A mulher sabia de tudo que eu passei, segundo Nikolay, e agradeci


mentalmente por ela e seu marido serem pessoas de bom coração, que se
prontificaram a nos ajudar. Para todos os efeitos, estávamos seguindo para a
América por um ano, mas eles sabiam que nunca mais voltaríamos para a
Rússia, como tantos outros que já fugiram desse país. No meu caso, não pelo
regime de governo, mas por conta da Bratva.
​ eguimos do cartório civil direto para Moscou, onde embarcamos para os
S
Estados Unidos.

— Senhora Pavlova, saiba que eu vou te amar cada segundo da


minha vida, que eu vou amar essa criança que será nossa alegria e que vou te
respeitar e saber esperar o dia em que você vai conseguir ser minha, mesmo
que demore anos.

​ Obrigada! Eu te amo e, mesmo com tudo que aconteceu, sempre fui só



sua, porque o amor que eu sentia por você e as nossas lembranças me faziam
voar para longe na hora da dor.

​ or fim, adormeci de mãos dadas com Nikolay, meu marido, e pela primeira
P
vez não tive pesadelos.

Quando desembarcamos, depois de várias escalas, nos Estados


Unidos, respirei aliviada com o ar da liberdade.

∞∞∞

​ início foi difícil, principalmente para mim, que não falava uma palavra em
O
inglês. Logo, fui obrigada a vencer os meus medos e bloqueios e a me
aventurar em classes escolares para adultos, a fim de aprender o novo
idioma.

Nikolay trabalhava o dia todo no escritório de advocacia, à noite ia


para as aulas, e nos fins de semana cumpria mais uma jornada de trabalho, só
que em um restaurante. A princípio, lavava pratos e, com o tempo, tornou-se
garçom. Ele precisava de um trabalho para, no fim de um ano, quando seria
a época de retornarmos para a Rússia, pedir asilo político sem passarmos
necessidade por ele estar desempregado.

Seis meses depois, nossa Yelena nasceu linda e saudável. Sua


verdadeira origem seria esquecida para sempre, e ninguém nunca saberia que
ela era uma filha bastarda da linhagem de Mikhailov, já que, para mim, para
seu pai e para o resto do mundo, ela seria conhecida como Yelena Pavlova!
Capítulo 39
Polina
Muitos anos depois…
Filadélfia – Estados Unidos

Logo cedo, com a baixa temperatura e a predominância da neve, o


inverno rigoroso da Filadélfia me trouxe lembranças da Rússia.

Fechei rapidamente a cortina e respirei fundo, tentando espantar as


tristes memórias que insistiam em me acompanhar por toda a vida, mesmo já
fazendo mais de vinte anos que eu tinha abandonado o meu passado e a
mansão Bratva.

Era impossível esquecer cada minuto que vivi naquele inferno sob o
jugo de Aleksandr Mikhailov.
​ Polina, meu amor, o café já está na mesa, e hoje temos visita — Nikolay

me chamou, despertando-me dos meus pensamentos sombrios.

​ ssim que cheguei à sala, sorri ao ver minha filha Yelena e seu noivo, Mark,
A
tomando café animadamente com o meu marido, que estava sorridente com a
visita dela.

​ Que surpresa agradável logo pela manhã! Mas não é perigoso vocês

atravessarem a cidade com toda essa neve para tomarmos café da manhã
juntos?

​ Nós precisávamos vir contar a novidade! Eu e Mark resolvemos nos casar



e marcamos a data da cerimônia!

​ elena estava com vinte e dois anos e se formando em direito, para orgulho
Y
de Nikolay, que sonhava em ser advogado quando tivemos que deixar a
Rússia e ir para os Estados Unidos, onde conseguimos asilo depois do
nascimento dela na Filadélfia.

Seu noivo era advogado e trabalhava no mesmo escritório onde a


minha filha era estagiária, do qual pretendia se tornar efetiva depois de
formada.

​ Que notícia maravilhosa! — Nikolay falou, sorrindo. — Preciso rever as



minhas economias para celebrarmos esse grande dia!

​ O senhor já fez muito por mim, meu pai, pagando a minha faculdade com

todo o dinheiro que juntou a vida toda aqui na América. Estou ganhando
bem no escritório, e o Mark faz questão de dividir as despesas comigo. Além
disso, queremos uma cerimônia simples, só no civil, e uma reunião para
comemorar com a família e os amigos que torcem pela nossa felicidade.

​ entusiasmo e a felicidade de Yelena falando dos seus planos para o


O
casamento me fizeram lembrar os meus sonhos de adolescente, quando eu
planejava me casar e ter a mais romântica noite de núpcias ao lado de
Nikolay.

​ A senhora está chorando, minha mãe? — Yelena perguntou ao ver as



lágrimas que escorriam pelo meu rosto, as quais Nikolay enxugava
carinhosamente.

​ Eu fiquei emocionada enquanto escutava você contar sobre os planos



para o seu casamento. Estou muito feliz por vocês! — respondi e me servi de
uma fatia de bolo, que engoli sentindo que entalava na minha garganta,
misturada com as lembranças do meu passado sombrio.

Eu não queria estragar o momento feliz que Yelena estava vivendo e


veio compartilhar comigo e o pai; por isso, sorri com todas as minhas forças
e tentei esconder as dores que eu não queria sentir, mas que, infelizmente,
eram mais fortes do que a minha vontade. Além disso, ainda sentia o medo
de que, a qualquer momento, os soldados da Bratva entrassem na minha casa
e tirassem a vida da minha Yelena.

​ ssim que ela e Mark se foram, eu me sentei, como sempre fazia, na minha
A
cadeira de balanço que ficava na sala próxima à lareira, e me entreguei às
minhas tristes lembranças. Enquanto isso, Nikolay me acarinhava os cabelos
e dizia que estaria sempre ao meu lado.

​ O seu amor e Yelena me fizeram continuar viva! — falei enquanto



lágrimas rolavam pelo meu rosto.

​— Você e nossa filha são a minha razão de viver!

​ Eu tenho tanto medo de que tudo se acabe, que nos descubram e saibam

que me casei grávida com você.

​ Aquele monstro com certeza não se lembra mais de você e nunca vai nos

encontrar, porque ele simplesmente não está nos procurando.

​ Eu tenho pesadelos com o dia em que eu cheguei em casa e encontrei os



carros estacionados no meu portão, com aqueles homens frios e armados.
Tenho pânico de pensar que eles podem entrar aqui e levar a nossa Yelena,
dizendo que ela precisa morrer por ser uma filha bastarda do Chefe da
Bratva.

​ ikolay me deixava falar dos meus medos, até eu me acalmar, ir cuidar da


N
nossa casa e me distrair escrevendo no meu blog, no qual eu compartilhava
receitas da culinária russa.
Os meus momentos na cozinha eram os meus preferidos, pois neles
eu conseguia me transportar para um mundo mágico, cheio de condimentos e
temperos variados.

​ ma semana depois da visita de Yelena, resolvi compartilhar a novidade


U
com os leitores do meu blog e ensinar receitas de sobremesas russas, que
poderiam perfeitamente fazer parte de um jantar de casamento.

Liguei o computador para começar a escrever e me deparei com uma


manchete do site de notícias, a qual me fez ficar sem ar. Nikolay até se
assustou quando chegou à cozinha e me viu pálida, olhando assustada para
ele.

​— O que aconteceu, Polina?

​ Acabou! O pesadelo acabou! O velho Mikhailov está morto! — falei,



sorrindo e me levantando para abraçar Nikolay, dando gargalhadas de
felicidade.

“​ MORRE, NA RÚSSIA, ALEKSANDR MIKHAILOV, DONO DE


UMA DAS MAIORES FORTUNAS DO PAÍS. SEU FILHO, ALEKSEY
MIKHAILOV, DISSE QUE O PAI MORREU EM CASA, VÍTIMA DE
UM ATAQUE CARDÍACO, E QUE O VELÓRIO SERÁ FECHADO E
RESTRITO AOS FAMILIARES NA SUA PRÓPRIA RESIDÊNCIA.

​ PESAR DE SUA MORTE REPENTINA LEVANTAR SUSPEITAS,


A
AS AUTORIDADES NÃO FALARAM NADA A RESPEITO. TODOS
SABEM, MESMO QUE NÃO EXISTAM PROVAS, QUE OS
MIKHAILOVS CHEFIAM A MAIOR REDE CRIMINOSA DO
MUNDO, CONHECIDA COMO BRATVA, A MÁFIA VERMELHA.”
Capítulo 40
Polina
Dias atuais...

​Quarenta e sete anos depois de ter sido usada como moeda de troca pelos
meus pais, de ser entregue nas mãos do Chefe da Bratva e abusada de todas
as formas possíveis, ainda me sentia suja e marcada pelo Demônio. Eram
cicatrizes invisíveis, que estavam na minha alma e que nunca se apagariam.

​ ikolay foi um anjo que Deus enviou para cuidar de mim, e o seu amor, um
N
bálsamo que me fez voltar aos poucos a reaprender a viver, à medida que ele
conseguia transpor alguma barreira e se aproximar de mim.

Foi com paciência e um amor incondicional que ele me ensinou a não


ter medo do seu toque, e do seu corpo. Com isso, conseguiu, depois de muito
tempo, que eu tivesse uma vida como sonhei um dia como sua esposa.

​ o dia que soube que engravidei e senti que tinha um ser puro crescendo
N
dentro de mim, foi como renascer para a luz. Se eu carregava um bebê cheio
de pureza, então não estava condenada ao inferno por tudo que fui obrigada
a fazer para satisfazer o Demônio.

​ ecomeçar a vida tão longe de casa foi o que me deu esperança de ter paz,
R
embora eu tivesse pesadelos quase diários nos quais me encontravam e me
trancavam de novo no inferno.

Um dia, para a minha alegria, descobri que meu algoz tinha morrido
e senti alívio por saber que suas mãos imundas nunca mais tocariam em
mim, que eu nunca mais sentiria o cheiro do seu corpo que fedia a enxofre, e
que nunca mais teria que cruzar o meu olhar com o dele.
​ assim os anos se passaram. Encontrei na culinária uma válvula de escape e
E
no blog que eu criei uma forma de me conectar a distância com as pessoas.
Um dia, minha neta Raissa, que sempre foi acima da média no quesito
inteligência, disse que eu tinha que me modernizar e criar um canal no
YouTube. Ela nunca entendeu por que eu mostrava as receitas e nunca o meu
rosto.

Medo! Mesmo sabendo que o monstro estava morto, ainda tinha


medo de um dia ser reconhecida e de todos descobrirem o meu passado, que
me enchia de dor e vergonha.

​ u não deveria sentir vergonha, já que era a vítima, como Nikolay


E
costumava repetir há exatos quarenta e sete anos, mas não conseguia pensar
diferente. Eu ainda tomo banho tentando me limpar de toda aquela sujeira,
que apenas quem viveu sabe mensurar como dói só de pensar.

​ m dia, escutei de alguém na mansão Bratva que quem nascia na máfia


U
morria na máfia. Eu pensava que por não ter nascido nessa sociedade, apenas
arrastada para lá, eu não fazia parte desse ditado.

Porém, eu me esqueci de um detalhe: Yelena! Minha filha é fruto da


máfia, e, com isso, mais cedo ou mais tarde, esse ditado se tornou realidade.

Minha neta Raissa, que também tem o sangue da Instituição nas


veias, já que é neta bastarda do velho Mikhailov, foi vítima, assim como eu,
desses assassinos frios e cruéis. Entretanto, ao contrário de mim, ela
levantou sua voz contra eles e acabou atraindo o ditado mais certo da máfia
para si mesma, mesmo depois de ter se livrado do jugo deles.

Eu estava em casa cozinhando, comemorando o meu aniversário de


casamento com Nikolay, minha filha e meu genro, quando Raissa chegou,
trazendo consigo Enzo Cosa Nostra e, com ele, a máfia para o seio do meu
lar e, consequentemente, para a minha vida de novo.

Então me refugiei, como sempre, na minha cadeira de balanço,


olhando para o além, perdida nas minhas memórias mais dolorosas, só por
saber que um membro da máfia estava na minha casa, sentado à minha mesa
e ao lado da minha neta.
Hoje, quando amanheceu, Yelena acordou feliz porque Raissa viria
passar uns dias conosco, e Nikolay, que estava enfermo, até melhorou por
saber que sua neta chegaria.

Assim que a campainha tocou, eu abri a porta, e minha neta se atirou


nos meus braços, chorando.

— O que fizeram com você, minha menina?

​— Me roubaram o direito de ser feliz!

​— Vem comigo! — falei, e nos sentamos no sofá da varanda.

​— Está doendo! Doendo muito!

​— Eu disse que a máfia era uma erva daninha.

​ Enzo me ama, minha vó, e eu o amo! Eu sei que ele é um homem fora da

lei, mas, ainda assim, ele é o homem da minha vida. E agora eu o perdi para
sempre, porque pelas leis da máfia não podemos ficar juntos, e ele vai se
casar com alguém que tem o sangue deles, uma legítima filha da máfia.

​ o ouvir isso, eu a abracei e pude sentir a sua dor. Lembrei-me, pela


A
primeira vez, de como eu era antes de tudo acontecer e sonhava em me casar
com o meu primeiro amor, Nikolay.

​ O que aconteceu? — Yelena perguntou quando viu Raissa destruída,



levando-a consigo para dentro de casa.

As duas foram para o quarto conversar e passaram horas lá dentro,


até que Yelena saiu com os olhos inchados e me olhou como se estivesse
perdida, sem saber o que fazer para consolar Raissa, que sempre foi forte e,
muitas vezes, até me assustou com sua frieza e impulsividade.

Quando ela era pequena, e muito levada e esperta, por vezes, o seu
olhar me lembrava o pequeno Aleksey, atualmente o Chefe da Bratva.

À noite, jantamos, e Raissa, com muito custo, juntou-se a nós.


Quando acabou de comer, levantou-se e foi para a minha cadeira de balanço.
— Posso me sentar aqui, minha avó? Eu cresci te vendo triste, e hoje
quem está sofrendo muito sou eu.

Voltei para a mesa com os olhos cheios d'água, e Nikolay segurou


minhas mãos.

​ Por favor, Yelena, nos conte o que aconteceu entre Raissa e Enzo Cosa

Nostra.

​— Nada que o tempo não apague! — meu genro falou.

​ Quando a pessoa perde o brilho que tem no olhar, não podemos chamar

sua dor de “nada” — Nikolay falou, e meu genro respirou fundo, contrariado
com as palavras do meu marido.

​ Sim, por mais que sejam por motivos diferentes, há dores que nunca

podem ser apagadas — afirmei e abaixei a cabeça. — Por favor, eu sei que
todos vocês me têm como frágil, que tenho traumas que vocês desconhecem
e que me fazem ficar distante, presa ao meu passado, mas quero e preciso
saber tudo que se passou com Raissa.

​ A senhora nunca falou que sentia dores por conta do seu passado, minha

mãe.

​— Fale sobre a minha neta.

​ urante quase uma hora, Yelena contou tudo, desde o sequestro da Raissa,
D
passando pelo dia em que Enzo a salvou, o atentado na data da premiação,
onde mais uma vez ele a salvou, a viagem para Dubai, o rompimento entre
eles, o esquema de segurança que ele deixou para protegê-la até o fim
definitivo por conta da regra que a máfia tinha de permitir casamento
somente entre eles.

​ Como eu disse, nada que o tempo não apague! — meu genro exclamou.

— Raissa não tem o sangue dessa gente criminosa e vai chorar por um
tempo e esquecer.

​— Essa gente está protegendo a vida da nossa filha.


​ Porque ela se meteu com eles. Que inferno! Para que perder tempo com

um assunto encerrado.

​ Quem a protege não tem obrigação nenhuma de fazer isso, e nossa filha

não se meteu com eles; ela foi vítima deles — Yelena afirmou, irritada.

​ É impressão minha ou você gostaria que nossa filha estivesse com esse

sujeito?

​— Eu amo a minha filha e quero que ela seja feliz.

​— Com um mafioso? Você perdeu o juízo?

​ Nosso professor no mestrado, o Senhor Coleman, atualmente Senador da



República, é o avô desse “sujeito”, e, ao que me consta, a filha dele é feliz
no casamento.

​ Você só pode estar brincando! — meu genro falou, levantando-se. —



Graças a Deus, não temos ninguém com o sangue sujo dessa gente, e não
vou me misturar a eles. Prefiro ver a dor da Raissa a um dia ter um neto
contaminado pelo sangue desses assassinos!

​ Chega! — Nikolay gritou, e eu me levantei e fui para o meu quarto, já



que minha neta estava no meu refúgio, sentada na minha cadeira e alheia a
toda a nossa conversa e discussão.

​Nikolay então me seguiu e se sentou na nossa cama, abraçando-me.

​— Você escutou o nosso genro? Se ele soubesse de tudo, desprezaria Yelena.

​— Ele não sabe e, por isso falou aquelas coisas horríveis à mesa.

— Eu me senti suja quando ele disse aquilo e culpada pelo sangue da


nossa filha.

— Nossa Yelena é doce, bondosa, correta, independentemente do seu


sangue. Mark ficou nervoso, quis defender a filha e não soube usar as
palavras. E se algum dia ele desprezar nossa filha, por ela ser uma
Mikhailova, então ele de verdade nunca a amou.
Diante de tudo, eu precisava dormir e descansar, porque as palavras
dele, ainda que sem intenção, feriram-me e disparam todos os meus gatilhos.
A noite foi agitada, dividida entre sonhos da época em que eu era feliz e o
pesadelo que eu vivi na Bratva.

Quando acordei, fui até a sala e encontrei Raissa ainda sentada na


minha cadeira de balanço.

​— Raissa, vem se deitar!

​— Eu peguei no sono aqui no seu refúgio e nem senti.

​— Você está melhor?

​ Em cinco dias Enzo embarca para a Rússia e vai se casar. Como posso

estar bem se isso tudo é uma grande injustiça? Sabe o que me deixa pior?
Não ter armas para lutar!

​— Ele vai para a Rússia?

​— Sim, vai se casar com a filha de um associado da Bratva.

​ ntão voltei para o meu quarto e abracei Nikolay. A Bratva estava de volta,
E
como se o passado quisesse ser despertado, e tudo que eu conseguia fazer era
chorar e pensar nas palavras de Raissa, que se sentia impotente por não ter
armas para lutar por sua felicidade, sem saber que a solução corria em suas
veias.

∞∞∞

​ céu amanheceu cinzento, fazendo-me lembrar os dias em San Petersburgo.


O
Quando cheguei à sala, todos estavam tomando café da manhã, com
semblantes fechados.

Mark e Yelena haviam discutido por conta de Raissa, enquanto ela,


pela primeira vez, estava se sentindo fraca, não por estar sem forças, mas por
não ter como lutar.

​ Bom dia! — cumprimentei, e todos olharam para mim. — Raissa, ontem



você me disse que se sentia fraca por não ter como lutar pela sua felicidade...
por não ter armas para isso — falei, e Nikolay segurou a minha mão,
fazendo-me olhar para ele, que sempre esteve ao meu lado.

​— Eu não tenho o que fazer!

​— E o rapaz, Enzo Cosa Nostra? Ele quer ficar com você?

​ Se eu pedisse, tenho certeza de que mesmo doendo por ter que largar sua

família, ele faria isso por mim. Mas é justo? Pedir para ele abandonar a sua
vida por mim? Eu não seria feliz abandonando todos vocês, então não posso
exigir isso do homem que eu amo.

​ pós dizer essas palavras, Raissa se levantou, e Nikolay me olhou, sabendo


A
o que eu queria fazer e apertando a minha mão.

​— Faça o que tem que ser feito!

​ E você, nosso pacto, nosso segredo? — perguntei, com os olhos cheios



d’água.

​— Nosso amor é o que importa! Nada vai nos separar!

​ O que está acontecendo? — Yelena perguntou, achando estranho o meu



diálogo com o seu pai.

​— Raissa, volte para a mesa, por favor! — Nikolay pediu.

​ odos olhavam para mim, e eu respirei fundo várias vezes, lutando com
T
todos os meus fantasmas, mas com a certeza de que o sorriso da minha neta
era maior do que toda a minha dor.

O passado veio acertar as contas, afinal, quem nasce na máfia morre


na máfia, e o meu segredo, pelo visto, não seria diferente do ditado mais
certo da Instituição.
​ Raissa, minha neta, as armas que você disse não ter para lutar estão

dentro de você. Nas suas veias corre o sangue da Solntsevskaya Bratva, o
sangue dos Mikhailov, e você, minha neta, é uma filha da máfia!
Capítulo 41
Yelena

O dia em que toda a verdade foi revelada

​Quando amanheceu, eu achei que seria mais um dia como outro qualquer, e
me levantei, tomei um banho, preparei o café da manhã e fui checar se o
meu pai estava melhor, já que andou um pouco enfermo esses dias e por isso
vim cuidar dele antes de decidir se iria ou não para o escritório.

​ Bom dia! Seu pai parece melhor, e agora que Raissa veio passar uns dias

aqui com ele, acho que você já pode voltar para o escritório — Mark falou
enquanto eu preparava umas panquecas.

​ Eu estava pensando justamente nisso, porque meu pai já está melhor, mas

quanto a Raissa…

​ Isso que ela tem vai passar! Raissa é jovem, nunca se envolveu com

ninguém seriamente e sempre gostou de uma adrenalina. Juntou tudo num
pacote só e o resultado foi essa paixonite pelo fora da lei.

​ Não generalize assim os sentimentos da nossa filha, e nem de ninguém!



Não chame de paixonite, um sentimento que pode ser forte e verdadeiro.

​ Eu não vou perder meu tempo com essa conversa que não vai levar a

lugar nenhum. Raissa não pertence ao mesmo mundo podre e sujo daquele
tal de Enzo, nós não temos nada a ver com a máfia, e vamos continuar assim.
Se ela está triste, saiba que eu estou feliz com o fim desse relacionamento.

​ Pois eu nunca vou estar feliz, se do outro lado a minha filha estiver triste!

— Eu falei e passei por ele com as panquecas me dirigindo à mesa, e
sorrindo para o meu pai que estava sentado aguardando.

​ u e Mark nos sentamos em silêncio, e Raissa se juntou a nós com o rosto


E
inchado de tanto chorar. Minha filha estava destruída, e se eu pudesse faria
qualquer coisa para vê-la sorrindo de novo, e nos deixando aflitos com suas
ideias sempre extravagantes e seu jeito impulsivo de ser.

​ stávamos comendo em silêncio quando minha mãe chegou e iniciou uma


E
conversa, e com uma simples frase, fez todo o meu mundo desabar.

​ Raissa, minha neta, as armas que você disse não ter para lutar estão

dentro de você. Nas suas veias, corre o sangue da Bratva, e você, minha
neta, é uma filha da máfia!

​ s palavras da minha mãe não pareciam fazer o menor sentido, mas seu
A
semblante que parecia coberto por um manto de dor, e a firmeza com que
falou tudo quase sem respirar, deixavam a certeza de que ela sabia muito
bem o que estava dizendo.

​ Me desculpe Yelena, mas é visível que sua mãe não está bem! — Mark

falou cortando o silêncio olhando para mim e depois para minha mãe — A
senhora está confusa minha sogra e sugiro que vá descansar, porque é
impossível que a minha filha tenha esse sangue podre nas veias.

​ Não ouse dizer o que a minha esposa deve ou não fazer! — Meu pai se

levantou e pela primeira vez na vida o vi alterando sua voz — Nenhum
homem neste mundo, nem eu mesmo, manda Polina fazer qualquer coisa que
não seja escolha dela.

​ Você me traiu? Foi isso? — Mark falou dando um soco na mesa — Essa

preferência por mafiosos não começou com a nossa filha? Porque para
Raissa ter o sangue podre todos vocês devem saber que eu sou um corno.

​ Você ficou maluco? Essa conversa não é sobre você, é sobre Raissa, é

sobre mim, é sobre algo muito importante que só minha mãe vai saber
explicar. Nunca traí você na minha vida, mas não sei se quero continuar ao
seu lado depois desta desconfiança.
Mark estava transtornado e não parava de falar, e o seu egoísmo
começou a me irritar. Por mais que ele estivesse surpreso, em nenhum
momento deu chance a minha mãe de se explicar, e saiu despejando suas
desconfianças para cima de mim, e depois a xingar a máfia e todos que
tinham o seu sangue sujo.

​ Yelena e Raissa, eu sugiro que vocês acompanhem Polina até o quarto e



conversem sozinhas — Meu pai falou — Esse momento pertence a vocês
três, mais ninguém!

​— Eu tenho direito de saber…

​ Não meu pai, você não tem o direito de nada, a não ser de se calar e

respeitar uma mulher, uma senhora de sessenta e cinco anos, que com
certeza precisou reunir todas as suas forças para falar uma frase que pegou a
todos nós de surpresa, mas que deve ter lhe custado muito falar em voz alta.
Portanto, isso não é sobre você, mas sobre ela! Vamos minha mãe… vamos
escutar a minha avó.

​ aissa falou e se levantou, depositando um beijo na testa do meu pai e


R
estendendo suas mãos para mim e sua avó.

Nós três respiramos fundo, e seguimos de mãos dadas, até o quarto


da minha mãe, para escutar algo que com certeza seria forte e impactaria
diretamente as nossas vidas. Enquanto caminhávamos ainda escutei as
palavras do meu pai na mesa do café da manhã, conversando e acalmando
Mark.

​ Paciência é uma virtude, e você já deveria saber disso como advogado, já



que nada na justiça acontece de um dia para o outro. Não atire pedras sem
escutar todas as partes! Polina e Yelena precisam conversar, e depois com
calma ela vai lhe contar tudo. Se depois disso seu pensamento quanto ao
sangue da minha filha continuar o mesmo, então seu amor nunca foi
verdadeiro.

​ eu coração apertou, e naquele momento lágrimas começaram a escorrer


M
pelo meu rosto, porque minha verdadeira origem pelo visto começaria a ser
revelada. Um misto de medo, ansiedade, e perda de tudo que eu sempre
acreditei, tentou me dominar, mas eu sabia que só tinha duas opções:
paralisar ou ser forte!

Escolhi a segunda opção, e entrei no quarto da minha mãe, fechei a


porta, e me sentei de frente para ela na cama segurando firmemente as suas
mãos.

​— Seja o que for minha mãe, estarei sempre ao seu lado.

∞∞∞

​ s palavras da minha mãe, seu relato banhado por lágrimas, dor, e vergonha
A
mesmo sendo a vítima, me fizeram sentir que o ar tinha desaparecido dos
meus pulmões. Eu não conseguia sequer suspirar enquanto ela falava, e uma
dor misturada com ódio comprimia o meu peito.

Saber que todas as vezes em que vi minha mãe perdida em seus


pensamentos sentada em sua cadeira de balanço, na verdade eram momentos
em que ela mesmo contra vontade revivia cada violência sofrida, me destruiu
completamente por dentro.

​ uantas vezes enquanto criança senti sua falta preparando meu lanche da
Q
escola, seu beijo quando o ônibus chegava para me buscar, ou simplesmente
do seu abraço acolhedor quando eu chegava cheia de novidades e querendo
falar sobre o que eu tinha aprendido durante o dia.

​ u senti sua falta quando queria conversar sobre coisas bobas de


E
adolescente, e nunca a encontrava disponível. O meu pai cobria todas essas
lacunas, tentando se dividir entre o trabalho e cuidar de nós duas, sempre
com muito amor.

​ om o tempo, eu entendi que minha mãe tinha seus problemas, e sempre


C
achei que sofria de depressão e síndrome do pânico. Quando ela começou a
postar suas receitas em um blog eu entendi que era como uma terapia, e a
incentivava comentando e elogiando cada um dos seus posts.
​ em nas minhas piores hipóteses sobre o porquê da minha mãe ser tão
N
quieta, misteriosa, e principalmente triste, eu cogitei algo tão sombrio. E
quando eu vibrei na parte da história em que ela conseguiu se libertar da
mansão Bratva por conta de um suposto atentado na festa de um hotel, veio a
parte em que ela pela primeira vez se calou, abaixou a cabeça e respirou
fundo para continuar.

​ Eu estava limpando um dos quartos da pensão, como eu fazia todos os



dias e me senti enjoada com o cheiro forte da colônia do hóspede
impregnada nos lençóis.

​ eu coração disparou, o ar me faltou, e eu precisei me levantar, respirar


M
fundo, vencer o medo que me paralisou por completo, para poder me sentar
novamente na cama e esperar que ela contasse com todas as letras que eu
nunca fui quem eu pensava ser durante toda a minha vida.

​ uas palavras a seguir me destruíram, me machucaram, me fizeram esfregar


S
os meus braços um contra os outros, como se eu fosse suja. Sim, eu era fruto
de um estupro, e não sabia como lidar com isso! Eu fui gerada em meio a
toda a dor que eu escutei minha mãe relatando, e o nojo que eu sentia
daquele homem despejando suas necessidades a força em seu corpo, se
resultou em mim.

Era pesado demais! Eu não queria escutar mais nada! Eu não


conseguiria!

​— Me perdoa! Eu não queria ser essa lembrança da sua dor!

​ Yelena, você nunca foi dor, e sim o meu renascimento! A sua vida era o

que eu tinha de mais puro dentro de mim, e foi isso que me fez querer viver.
Eu queria ser sua mãe mais do que qualquer outra coisa no mundo.

​ u sabia que ela precisava continuar falando, e sentia que devia isso à minha
E
mãe. Ela se sentia culpada por ter escondido a verdade sobre a minha
origem, enquanto eu me culpava por ela ter que me gerar depois de tudo que
passou. Eu estava me sentindo perdida, mas queria saber de tudo, e segurei
suas mãos, reafirmando que estaria sempre ao seu lado.
​ eu pai, Nikolay Pavlov não era só um homem bom e apaixonado, mas o
M
herói de toda essa história. Seu amor incondicional por minha mãe, fez com
que ele nunca questionasse nada, só a amasse. Ele a acolheu no pior
momento, e cuidou de mim desde que soube da gravidez como um homem
feliz por saber que seria pai pela primeira vez. Seu amor e seu orgulho por
mim, nunca me deixaram duvidar que ele fosse o melhor pai do mundo, e
agora eu só tinha mais certeza de que eu estava correta em amá-lo tanto.

​ Eu sofri muito, mas também fui muito feliz com seu pai, com você,

Yelena, e com a minha neta. Eu sempre acreditei que podia fugir do meu
passado, escondendo-o do mundo, mas a verdade é que só falando que nos
libertamos. A dor de tudo que aconteceu, nunca vai passar, mas o fardo
desse segredo eu não carrego mais comigo. Você tinha o direito de saber, o
seu marido tinha o direito de se casar com quem ele imaginou, e Raissa, têm
todo o direito de ser feliz, se for essa sua vontade, com quem ela escolheu.

​ Você pensa que eu seria feliz numa sociedade que fez tudo isso com a

senhora como se fosse algo normal? — Raissa perguntou com lágrimas nos
olhos.

​ Eu não sei minha neta, isso só você pode responder, mas não baseado na

minha história e sim nos seus sentimentos. Eu conheci Anna, uma pessoa
que me acolheu no meio de todo o pesadelo, uma mulher da máfia, nascida e
criada no meio de tudo aquilo, mas com um coração muito bom. A senhora
Mikhailova, era uma mulher boa, eu tenho certeza disso, mas que não teve
escolha, e por isso era casada com o demônio.

​ Eu não consigo aceitar que a senhora passou por tudo isso, minha avó! Eu

sempre pesquisei tanto, sempre li sobre isso, por isso minha admiração é tão
grande pela história da Sarah Cooper e a Máfia das Mulheres.

​ Você sempre teve fixação pela máfia, sempre me falava sobre esse tema,

e eu pensando que era coisa de jornalista — Eu falei e Raissa olhou para
mim pela primeira vez depois de tudo que escutamos.

​ Eu não sei o que te dizer! Se eu não tivesse sido teimosa e conhecido



Enzo…
​ Você conheceu Enzo porque foi vítima de um sequestro. Não cabe culpa

para você e nem para minha mãe. A vítima nunca tem culpa! Eu precisava
saber a verdade, saber quem eu sou de verdade, mesmo que neste momento
eu me sinta perdida. Eu preciso pensar, organizar todas essas informações, e
os meus sentimentos.

​ Yelena, vai descansar, eu vou fazer isso também! — Minha mãe falou —

Raissa, você precisa decidir o que quer fazer, mas saiba, que se contei tudo,
se tive essa coragem, foi para te ver feliz, e sim, se sua felicidade for ao lado
do Enzo Cosa Nostra, saiba que a máfia também está aí dentro de você. Não
o julgue por sua origem, que é a sua também!

​— A senhora é uma guerreira, minha avó!

​— Eu sou uma sobrevivente, com uma família que é um presente de Deus.

​ Raissa deu um beijo em mim e na avó, e foi para o seu quarto. Eu também
deixei minha mãe descansando e pela primeira vez me sentei em sua cadeira
de balanço, e fechei os meus olhos tentando acalmar a minha mente e
diminuir a dor na minha alma.

​ u me lembrava de vários casos que atendi no escritório de mulheres vítimas


E
de violência, das manifestações contra ou a favor do aborto que sempre
ressaltavam: Salvo nos casos de estupro.

​ inha mente dava voltas enquanto tudo que eu queria é poder adormecer um
M
pouco, e enquanto a cadeira balançava me perguntava quem era eu de
verdade.

Para o mundo que não me conhece, eu sou só mais uma que não
deveria ter nascido, afinal muitos filhos do estupro são julgados e
descartados pela forma como foram concebidos. E não cabe a mim ou a
ninguém julgar a decisão de uma mulher que passa por esse tipo de situação,
porque com certeza, seja qual for a sua decisão, será sempre carregada de
dor.

Dentro de mim eu tentava me convencer que eu merecia existir, que


tinha o direito de viver, e sentia que precisava justificar isso para mim e para
todos à minha volta.
​ ark veio até a mim para se despedir porque precisava ir para o escritório
M
por conta de uma audiência, e eu me senti aliviada por não precisar
conversar, já que naquele momento não precisava de ninguém apontando o
dedo para mim.

​ A noite conversamos, o seu pai acabou me contando parte da história, e



eu acho muito errado que eles tenham escondido…

​ Eu sinto muito por você pensar assim, Mark, mas sinto ainda mais por

mim, que um dia achei que você era o companheiro ideal que estaria sempre
ao meu lado.

​— Eu não disse que vou te deixar, Yelena.

​ Você não me perguntou como eu estou depois disso tudo, apenas falou o

que você acha, o que você sente, sendo que tudo isso é sobre mim, e não
sobre você.

​— A noite conversamos.

​ Eu acho melhor você ir para casa depois da audiência. Eu quero ficar



sozinha com os meus pais, precisamos de um momento só nosso.

​ Eu não quero que você apoie Raissa neste romance com o tal Enzo Cosa

Nostra. Não vou aceitar minha filha fazendo parte da máfia!

​— Sinto muito, mas ela já nasceu fazendo parte dela. Bom trabalho!

Eu fechei os meus olhos e escutei os passos pesados de Mark


deixando a casa para ir trabalhar.
Tudo que eu precisava agora era de um pouco de paz, assimilar as ideias e
me preparar para enfrentar a nova vida que me tinha sido apresentada.
Capítulo 42
Raissa

​Eu estava sentada na minha cama, segurando o meu celular que estava
aberto na caixa de mensagens e pensando que rumo tomar da minha vida. As
palavras da minha avó ecoavam dentro da minha mente, e lágrimas pesadas
escorriam pelo meu rosto.

​ ntes tudo girava em torno do meu sentimento por Enzo, e agora tudo se
A
transformou no sentimento de uma família, na dor da minha avó, e em como
minha mãe vai digerir a verdade sobre a sua origem.

​ e um momento para o outro eu passei de um jovem que se apaixonou por


D
um mafioso da Cosa Nostra, a neta bastarda de um ex-chefe da Bratva,
sobrinha de Aleksey Mikhailov, e prima de Alya que me salvou da boate
onde eu era prisioneira.

​ ra impossível não sentir nojo dessa sociedade criminosa depois de escutar


E
os relatos da minha avó, que me ama tão incondicionalmente a ponto de
revelar seus segredos íntimos e dolorosos para me ver feliz.

Feliz? Como eu posso ser feliz entre eles depois de saber disso tudo?

​ scutei uma leve batida na porta do meu quarto, e logo depois meu avô
E
apareceu com os olhos cheios d'água pedindo licença para entrar.

​— Nós podemos conversar?

​ Claro que sim! Você é, e para sempre vai ser o meu avô, eu não quero

outro, não quero ser uma... eu quero continuar sendo uma Pavlova.
​ Você e sua mãe, são minhas para sempre, isso não vai mudar, só que o

peso desse segredo era grande demais para ser levado por mim e Polina para
o túmulo, e eu acredito que por pior que possa ser, a verdade é sempre o
melhor caminho.

​— Eu fiquei decepcionada com o meu pai, as palavras dele…

​ Seu pai agiu sem pensar, falou com medo do que vem pela frente,

assustado com uma realidade que ele não fazia ideia.

​ Meu avô, o senhor acolheu a minha avó, independente de tudo, por amor!

O senhor sim teve uma dura realidade para enfrentar, o meu pai soube de
algo que não muda nada a sua vida, e reagiu com crueldade, não tenho outra
palavra para definir o jeito como ele falou do nosso sangue, meu e da minha
mãe.

​ Eu acho que isso é um outro assunto, e o que me importa agora é saber



como você está, e o que pretende fazer agora que você sabe que é uma
Mikhailova.

​— Eu não sou uma Mikhailova! Eu não quero ser!

​— Você é uma Mikhailova, bastarda ou não, como eles falam na máfia.

— Exatamente, meu avô, sou bastarda, não tenho direitos.

​ Raissa, você chegou nessa casa dizendo que estava disposta a tudo para

ficar com Enzo Cosa Nostra, e o tempo está passando.

​ O senhor é a última pessoa que eu pensei que fosse me falar isso! — Eu



falei sorrindo.

​ Por quê? Eu achei que depois de toda a história da sua avó, eu tivesse

mais créditos como um herói romântico.

​— Foi tudo tão pesado, como o senhor aguentou?

​— Amor! Eu sempre amei a sua avó.


​ eu avô deu um beijo na minha testa e caminhou em direção a porta, e antes
M
de sair, parou por um instante e olhou para mim.

​ Você não vai passar por cima dos nossos sentimentos indo atrás da sua

felicidade. Sua avó abriu o seu coração sem se importar com as feridas,
venceu todos os seus fantasmas, porque acreditou no amor de vocês, seu e
do Enzo! Foi a sua forma de abençoar essa união.

​ u não conseguia pensar desta forma, mas o meu avô parecia ler os meus
E
pensamentos e conhecer todas as minhas dúvidas.

Eu amo Enzo, mas ficar com ele seria fazer parte de uma sociedade
que cada dia fica mais transparente aos meus olhos, e mais distante de todo o
glamour dos romances.

Tudo que eu precisava era descansar um pouco e pensar, e por isso


me deitei cobrindo a cabeça com o meu cobertor, como se isso pudesse me
proteger do que estava por vir.

∞∞∞

Não sei quantas horas se passaram, se ainda era dia ou noite, quando
minha mãe puxou delicadamente o cobertor que me cobria e me acordou
com um beijo. Eu a olhei e me sentei na cama, e quando nos abraçamos,
choramos juntas, como se nossas lágrimas pudessem lavar a nossa alma e
expurgar a nossa dor.

Eu sei que o certo era eu ter ido dar todo o apoio para a minha mãe,
e, no entanto, foi ela que como sempre veio me dar colo. No fundo eu me
sentia responsável por sua tristeza, porque se não fosse por mim, minha avó
nunca revelaria o seu passado, e minha mãe não sofreria por isso.

​— Me perdoa, por favor! Foi por minha culpa que você soube de tudo.

​ Filha, não peça perdão por algo que você não tem culpa. O que é isso?

Agora é crime alguém se apaixonar?
​ Eu devia ter ficado longe do Enzo. Eu podia ter ido embora daquela boate

com as outras meninas.

​ Raissa, tudo aconteceu da forma que deveria acontecer. Estava escrito!



Um dia de alguma forma nossas vidas se cruzariam com as da máfia.

​— Você acredita no ditado deles?

​ Sim! Quem nasce na máfia, morre na máfia! Eu nasci fruto… fruto desta

sociedade, e o sangue deles corre nas minhas veias, e um dia, mais cedo ou
mais tarde o passado bateria na minha porta.

​— Isso tudo é muito pesado!

​ Eu posso ser tranquila, sensata, mas isso não faz de mim uma pessoa

fraca. Sim, é muito pesado saber que você foi concebida num estupro, mas
eu fui gerada por nove meses com muito amor, vim ao mundo cercada de
acolhimento pelos meus pais e isso me fez crescer sendo quem eu sou. Não
vou entrar em depressão, e sim ser grata pela oportunidade de ter recebido da
vida um pai maravilhoso e que sempre me amou. Sou e serei sempre filha de
Nikolay Pavlov, meu único pai, mas ainda assim, sou também uma
Mikhailova e eu prefiro saber a verdade sobre a minha origem do que viver
uma mentira.

​— E o meu pai? Onde ele está?

​— Seu pai foi trabalhar, ele tinha um caso importante hoje na corte.

​— Ele está mais calmo?

​ Seu pai não tem que ficar nervoso ou calmo, porque isso não é sobre ele,

e sim sobre a minha mãe, eu e você. Nós três fomos atingidas diretamente, e
ele, por mais que esteja conosco, não têm esse passado correndo nas suas
veias. Esse momento é de escutar, de acolher a sua avó que teve um passado
assombroso, vítima de violências físicas e emocionais. Esse momento é meu,
de entender e digerir tudo sobre a minha origem. Esse momento é seu que
precisa decidir o que vai fazer. O seu pai não teria se casado comigo se
soubesse a minha origem? Se a resposta for não, então nosso relacionamento
foi tão falso como a história da minha vida. E hoje, só quero verdades! Não
quero mais mentiras!

​— Vocês brigando aumenta ainda mais a minha culpa.

​ Pare com isso e chega de falar essas besteiras. Você não tem culpa se lá

no passado, o seu bisavô entregou a sua avó como moeda de troca para pagar
dívidas da máfia. Nossa história começa lá na Rússia, em San Petersburg,
muito antes de chegarmos aqui nessa vida, ou seja, você não pode ser
responsável por nada disso. O que você fez foi conhecer um homem, querer
dividir a vida com ele, e aceitá-lo do jeito que ele é, com seus erros, acertos,
e sua vida na máfia.

​ Você sempre disse que eu era fria para resolver as coisas, mas agora

quem está sendo assim é você, minha mãe.

​ Russos são frios, e acredito que mafiosos russos duas vezes mais. Vai ver

que somos assim por termos correndo nas nossas veias o sangue dos
Mikhailov.

​— Você não tem medo?

​ Eu nasci uma filha bastarda da Bratva! O que mudou é que agora eu sei

disso, mas se existia algum perigo, ele sempre me rondou, só que como um
desconhecido.

​ De um minuto para o outro, você ganhou um pai conhecido por ser um



demônio, avós, dois tios, um irmão e uma sobrinha.

​— Todos mortos!

​ Os pais da minha avó, acredito que já tenham morrido, mas os seus



irmãos, no casso seus tios, podem estar vivos ainda e ter família.

— Vai saber que fim tiveram!

​ Da outra parte, você tem um irmão que é atualmente o Chefe da Bratva, e



uma sobrinha. Eu já vi a minha prima uma vez! Ela é linda! Ela chegou na
boate e todos os olhares se voltaram para ela. Altiva! Forte! Poderosa! Ela
matou todos e saiu pisando sobre os seus corpos como se estivesse
flutuando. Enzo disse que eu também era assim, que passei pelos mortos no
chão, como se eles não estivessem ali. Será que eu sou como ela? Será que
eu também pegaria uma arma e sairia matando os meus inimigos como se
eles fossem apenas alvos a serem derrubados? Te assusta me ver falando
assim?

​ Nada mais me assusta! Só que agora o que precisamos decidir é como



você vai fazer para que Enzo saiba que não existe mais impedimento para
vocês dois ficarem juntos.

​— Ficar junto com Enzo significa trazer a máfia para a nossa família.

​— Nós somos a máfia, Raissa, e se você for lutar, eu vou te apoiar.

​ u pensei que minha mãe estaria no quarto chorando e deprimida com tudo
E
que soube, e no lugar disso, ela está aqui me oferecendo apoio. Esses anos
todos, eu vi a minha mãe como uma mulher calma, realizada no casamento e
profissionalmente, mas nunca enxerguei essa fortaleza que está agora na
minha frente.

​ u precisava reagir, e me levantei para tomar um banho, e decidir com calma


E
o que eu faria da minha vida. Lutar ou esquecer de vez Enzo Cosa Nostra?
Antes de qualquer coisa, eu precisava conversar com a minha avó, e saber
como ela estava se sentindo com tudo isso, e o que ela espera que possa
acontecer caso eu revele isso a Enzo, e consequentemente a Aleksey
Mikhailov.
Capítulo 43
Raissa

Foi estranho me sentar na mesa para jantar com os meus avós e a


minha mãe depois de tudo que aconteceu de manhã cedo. Foram tantas
revelações, tantas feridas expostas, que ninguém parecia querer falar, e nos
servimos e comemos quase de forma automática.

— Qual o nome dos seus irmãos? — Eu perguntei para a minha avó


quebrando o silêncio — A senhora nunca mais teve notícias deles?

​ Anton e Vadin. Eu nunca busquei nada que se relacionasse ao meu



passado.

​ E o senhor meu avô? Nunca mais teve contato com a sua família?

Simplesmente, sumiu?

​ Eu avisei que estava vindo para os Estados Unidos a trabalho. Eles não

sabiam do meu casamento, e nem dos meus planos de não retornar. Para eles,
eu sou mais um que fugiu do regime ditatorial da Rússia e nunca mais deu
notícias.

​ Vocês foram muito corajosos, e abençoados também, porque se o seu



trabalho não fosse num escritório que tivesse filial aqui nos Estados Unidos,
vocês não teriam como recomeçar a vida em paz — Eu falei enquanto ficava
remexendo a comida do meu prato com o meu garfo.

​ Eu me sinto aliviada por vocês saberem toda a verdade, e compreenderem



que se fico ausente e perdida nos meus pensamentos, não é porque eles são
mais importantes do que vocês, e sim, porque me machucam e prefiro me
isolar.
​ Nós entendemos! — Minha mãe falou — Agora precisamos seguir nossas

vidas com todo esse passado que faz parte de nós.

​— E o meu pai?

​ Eu pedi que ele fosse para casa depois da audiência. Preciso reorganizar

minhas emoções com o que me foi apresentado, e não estou aberta para
julgamento, até porque não tem motivos para isso.

​ Eu deveria ter conversado primeiro com vocês duas, mas foi o momento

que senti coragem.

​ Minha avó, a senhora fez o que o seu coração pediu, e o meu pai foi

extremamente egoísta. E eu sinto muito que ele tenha vergonha de ter uma
esposa e filha com ligação com a máfia, porque para mim isso é o que menos
importa no meio de tanta dor que a senhora passou na sua vida.

​— E o que você vai fazer, já decidiu? — Meu avô perguntou.

​ Ainda não! Lutar por Enzo é o mesmo que expor minha avó e minha mãe,

porque todos vão saber da existência da filha bastarda do velho nojento.
Lutar por Enzo, seria como te aproximar de tudo que a senhora sempre fugiu
na sua vida, minha avó.

— Eu sempre tive medo de que eles matassem Yelena, porque era


isso que faziam com os bastardos — Minha avó falou com lágrimas que
escorriam livremente pelo seu rosto.

​ Eu preciso pensar, mas não acredito que eles matem a minha mãe porque

as coisas mudaram na Bratva por conta da Lei Sarah Cooper, que protege as
mulheres. Irya Mikhailova, é um dos pilares da criação desta lei, e isso me
deixa um pouco mais tranquila. Só que eu já enfrentei essas pessoas e o
resultado são quatro seguranças me acompanhando para todo o lado, por isso
preciso pensar melhor antes de tomar qualquer decisão.

​ Faça o que tiver que ser feito, e sua família vai estar do seu lado —

Minha mãe falou, e eu a deixei conversando com os meus avós, e fiquei feliz
por ver como os três são unidos.
Meu avô sempre será o chefe da nossa família, e ninguém vai ocupar
o seu lugar nos nossos corações, até porque seria impossível, devido ao meu
avô biológico ser um monstro.

Quando entrei no meu quarto, fiquei olhando cada detalhe da


decoração que ele fez para que eu me sentisse sempre em casa quando
estivesse aqui com eles. No começo o quarto era cor de rosa, depois virou
branco com detalhes coloridos e por fim preto e branco com quadros de
máquinas de escrever antigas, já que escolhi ser jornalista. Se isso não é
amor de avô eu desconheço o que seja!

Eu me deitei e fechei os meus olhos e tudo que eu conseguia pensar


era em Enzo, no que ele estaria fazendo agora e se eu deveria jogar tudo para
o alto e ir atrás dele.

Eu me sentei na cama, respirei fundo e me lembrei que nunca fui


uma mulher do estilo coitadinha que chora pelos cantos, e sim que vai à luta
em busca dos seus sonhos.

Raissa: Boa noite! Preciso da sua ajuda! Eu preciso falar com Sarah
Cooper. É urgente!

Matthew: O que aconteceu?

Raissa: Um fato que talvez mude tudo e possa me unir a Enzo, mas
eu preciso falar com Sarah Cooper, me ajuda, por favor. Confia em mim, e
me dê a chance que você deu a ela, Nina e Alice no passado.

Matthew: Eu confio em você! Arrume as suas coisas que vou


providenciar um jatinho para ir te buscar na Filadélfia.

Raissa: Obrigada, e se der tudo certo você vai poder me treinar.

Matthew: Não me faça mudar de ideia em te ajudar.

Matthew respondeu e eu dei uma gargalhada, jogando o celular em


cima da cama e correndo para tomar um banho. Eu precisava ser rápida, e
saber que conheceria Sarah Cooper me fez sorrir pela primeira vez desde o
café da manhã, e sim, minha avó têm razão, se eu amo Enzo, tenho que lutar
por ele.

A minha felicidade em pensar nisso, mesmo no meio de tanta


confusão, só me faz ter a certeza de que estou fazendo o certo para a minha
vida.

∞∞∞

​ nquanto eu viajava para Los Angeles, fiquei pensando em como tudo


E
mudou tão rápido na minha vida.

Minha mãe e meus avós, que antes questionavam tudo que eu queria
fazer, hoje me apoiaram a viajar e lutar pelo meu amor. Eu ainda não tinha
certeza do que eu estava fazendo, mas resolvi abandonar a razão e seguir o
meu coração, que apontava para uma única direção: Enzo Cosa Nostra.

​ ssim que desembarquei, encontrei com Matthew que estava me esperando


A
na pista, e seguimos em silêncio seguidos por um carro preto provavelmente
cheio de seguranças.

Será que algum dia eu vou me acostumar a andar sempre


acompanhada?

​ nosso carro parou em frente a um lugar que parecia com uma fábrica cheia
O
de galpões, cercada por um muro imenso e extremamente bem vigiada.

​— Que lugar é esse? Eu não sabia que os Coopers tinham uma fábrica?

​ Isso aqui não é uma fábrica, e sim galpões usados por empresas para

guardar seus materiais. No caso desse lugar, os materiais guardados são os
da Máfia Cooper.

​ Meu Deus! Aqui é o centro de operações da Máfia Cooper? Eu pensei



que me encontraria com Sarah, quero dizer, com a senhora Cooper, na
empresa.
​ A senhora Cooper raríssimas vezes aparece na empresa que agora têm

Anne, como CEO.

​ u caminhava ao lado de Matthew atenta a todos os detalhes à minha volta.


E
O galpão que nós entramos era imenso, e cheio de caixas. Subimos uma
escada e quando passamos por uma porta e chegamos do outro lado me
assustei com o número de homens que treinavam luta em um ringue
profissional, outros que malhavam em uma sofisticada academia, e num
lugar reservado alguns homens treinavam tiro ao alvo.

​ espirei fundo tentando não ficar impressionada, mas isso é impossível


R
quando você está simplesmente no centro da máfia. Um lugar sombrio, mas
ao mesmo tempo instigante, ou será que o meu lado Mikhailova que me faz
sentir atração por isso tudo?

​ ontinuamos caminhando por um corredor escuro até que Matthew parou e


C
abriu a porta de uma sala com uma mesa enorme que devia ser usada para as
reuniões da Máfia Cooper.

​ Seja bem-vinda Raissa O'Brien! Em primeiro lugar, quero que saiba que é

um prazer conhecer uma jovem destemida, que não se deixou intimidar e
escreveu uma matéria contra o tráfico de mulheres, muito comum na máfia,
e que eu abomino e luto para que termine. Em segundo lugar, eu achei que
seria melhor receber você aqui, para que não reste dúvidas do que você está
querendo escolher para o resto da sua vida, porque eu não acredito que sua
visita seja para uma entrevista, tendo em vista que você já tem assunto de
sobra para falar sobre a Instituição.

​ arah Cooper! Era ela falando comigo e meu coração disparou num misto de
S
emoção e felicidade. Pode parecer loucura para muitos, mas essa mulher foi
sempre uma espécie de ídolo para mim.

Eu lia tudo sobre a Máfia, e era simplesmente fascinada por tudo que
contavam sobre ela, que simplesmente abalou as estruturas de uma
sociedade machista e nojenta, depois de tudo que eu escutei sobre o passado
da minha avó. Eu sempre vi tudo com um glamour, que a cada dia vinha se
desmanchando e mostrando sua verdadeira face sombria para mim.
​ Sua opinião vale muito para mim, porque eu sempre me inspirei na sua

força. Eu lia tudo sobre a sua vida, e mesmo com a justiça não conseguindo
provar nada, eu sempre soube que era tudo verdade, e a sua fama de
poderosa chefona me instiga a ser destemida, e com a certeza de que nós
mulheres podemos tudo aquilo que desejarmos. Porém, a realidade não é tão
fascinante, e sim bem perigosa. Eu acabei na máfia por conta da minha
impulsividade, e minha matéria não foi só por coragem, mas porque eu
queria ser premiada e reconhecida como jornalista. Não que seja errado
sonhar, mas eu não pensei em mais nada, na segurança da minha família e
nem na minha, e a prova disso são seus homens tendo que tomar conta de
mim. Eu me envolvi com Enzo e pude sentir a morte de perto mais uma vez
quando estive ao lado dele em Dubai, e no final de tudo, ainda descobri que
estou mais no meio desta Instituição do que eu podia imaginar. E senhora
Cooper, eu não escolhi essa Instituição, a realidade é que eu nasci com o
sangue dela correndo nas minhas veias.

​ la e Matthew olharam para mim, ele confuso e ela desconfiada de que a


E
minha visita não seria para me jogar por amor na máfia.

​— O que você sabe sobre isso, Matthew?

​ Nada, senhora Cooper. Eu preferi deixar que Raissa conversasse



diretamente com a senhora.

​ Matthew, não precisa ser tão formal, até porque algo me diz que não

estamos diante apenas de uma jornalista ousada e apaixonada por alguém da
nossa sociedade, não é verdade senhorita O'Brien?

​ É uma longa história que eu soube recentemente, na verdade em menos



de quarenta e oito horas.

​ Vamos nos sentar e conversar com calma, Raissa, mas antes de tudo eu

preciso saber o que você espera que eu possa fazer por você? Acredito que
nossa conversa será longa, mas precisamos ser objetivas, porque pelo que eu
sei, ou imagino que o seu assunto nos leve, o tempo corre contra você.

​— Eu quero impedir o casamento do Enzo na Rússia.


​ Com qual argumento? Vocês se amarem não é o suficiente por conta das

leis que eles tanto prezam, e por mais que tudo tenha mudado, essa lei do
casamento entre filhos da máfia é algo que eles não abrem mão, e ainda mais
sendo um Cosa Nostra, que têm o obsoleto Dante no comando. Como diria
Alice, ele é praticamente um homem das cavernas comandando a máfia
siciliana, e ele nunca permitiria que Enzo não cumprisse a lei.

​ Eu sou uma filha da Máfia! Eu sou neta de Aleksandr Mikhailov, e não



me orgulho disso, só para deixar claro, mas tenho o seu sangue correndo em
minhas veias.

​— Como assim, neta daquele demônio? Aleksey é seu pai?

​ Não, ele é meu tio, mas ele não faz a menor ideia disso porque tudo

aconteceu quando ele tinha cinco anos, mesmo assim eu odeio ele e toda a
Bratva, mas se isso me faz ter alguma chance de ficar com Enzo…

​ Calma, vamos por partes, e se você quer entrar para a Máfia, saiba que

Aleksey é o homem mais poderoso da Instituição, e que a Cosa Nostra é hoje
sua maior aliada, ou seja, a menina dos olhos de Dante que adoraria unir os
seus herdeiros, então, engula um pouco seu ódio, e aprenda comigo que para
vencer nessa sociedade machista, você vai precisar de muita diplomacia. Só
quando alimentamos o ego dos poderosos, é que conseguimos tê-los em
nossas mãos.

​ Eu tenho muito que aprender! — Falei e me sentei numa das cadeiras da



sala de reunião — Eu sou muito impulsiva, além de muito teimosa como diz
minha mãe, e sei que preciso me controlar e ter calma porque esse assunto
todo é muito delicado, e perigoso também.

​— Matthew, você também já sabe a quem nossa Raissa puxou da família?

​ Agora sabendo quem ela é de verdade, é impossível não perceber que ela

é igual ao tio.

​ Raissa, você não sabe, mas, a principal característica de Aleksey



Mikhailov é a teimosia.
​ Minha avó só o conheceu criança, e ela só se refere a ele como o menino

triste de olhos azuis.

​— Qual o nome da sua avó?

​ Polina Pavlova. Ela nasceu em San Petersburgo, e quando tinha dezoito



anos foi entregue como moeda de troca para pagar uma dívida do pai com a
Tambovskaya. O Chefe neste dia estava a caminho da Rússia para uma
reunião e a levou junto com ele, e dizia que na volta ela seria dele. Só que
chegando na mansão Bratva, local da reunião, Aleksandr Mikhailov decidiu
manter minha avó lá, e ainda matou o homem que a levou, que tentou dizer
que ela pertencia a ele, ou algo assim. É tão nojento, que me dá repulsa
contar isso, ainda mais sabendo que o objeto de disputa, era a minha avó.

​ Essa prática ainda é muito comum na Instituição. Sempre que sabemos de



um caso nas nossas aliadas, interferimos, mas não podemos fazer isso nas
que são nossas inimigas.

​— Minha avó ficou na mansão como babá de Aleksey, até que um dia…

​ arah se levantou e trouxe um copo de água para que eu tomasse e


S
conseguisse fôlego para prosseguir. E foi assim que nossa conversa durou
horas, comigo contando tudo que aconteceu no passado com a minha avó,
sobre a fuga para os Estados Unidos, o nascimento da minha mãe e
finalmente como fiquei sabendo disso tudo.
Capítulo 44
Sarah Cooper

​Quando eu concordei em receber Raissa, achei que seria para ela me dizer
que amava Enzo e que achava injusto eles não ficarem juntos. Eu nunca
imaginei que o que ela tinha para conversar, era uma verdadeira bomba, que
como sempre cabia a mim detonar sobre a Instituição, para no final escutar:
Sempre essa Sarah Cooper se metendo onde não é chamada!

​ Raissa, eu vou ser direta e não leve como ofensa, apenas precisamos falar

nos termos da Instituição.

​ Pode falar e fazer o que for preciso! Eu vim disposta a enfrentar tudo e

todos, mas não vou me calar se eu tiver alguma chance de mudar o final
desta história.

​ O Matthew me disse que o Enzo está se casando porque em troca a Cosa



Nostra prometeu cuidar da sua segurança, e você sabe que sem isso a
Salvatrucha não te deixaria viver em paz até que conseguissem jogar seu
corpo sem vida em algum lugar desconhecido. Eu conheço muito bem Dante
e Lorenzo, e sei que se Enzo pediu isso para se afastar de você, e os dois
atenderam em vez de dizer que ele se casaria de qualquer jeito e que sua vida
não importava para eles, é porque existia um receio de que ele viesse a jogar
tudo para o alto. Você concorda comigo, Matthew?

​ Concordo e ainda digo mais, eles sabem que Enzo é fiel a Cosa Nostra,

mas que tem uma mãe leoa, que se o filho disser que vai largar tudo e
desaparecer, vai lhe dizer para fazer isso e ser feliz. Não podemos esquecer
que nossa Nina já deu a volta na Cosa Nostra uma vez e ficou desaparecida
por cinco anos, e que eles nem saberiam da existência do Enzo se ela não
tivesse voltado por conta própria. Com o apoio da mãe, Enzo poderia sim
jogar tudo para o alto, mas por outro lado, ele sabe que viveria escondido
para sempre com Raissa, e que no caso deles, seriam perseguidos não só pela
Salvatrucha, mas por todos os inimigos da Cosa Nostra, que ficariam felizes
em mandar a cabeça dele de presente para Lorenzo. Enzo está se casando por
amor, mas não a Cosa Nostra, e sim, a Raissa.

​ Raissa, é uma filha bastarda da Máfia, ou seja, não é reconhecida e nem



têm direitos, segundo os membros da Instituição. Yelena não passa de uma
consequência de algo normal para eles, que é abusar das mulheres como se
fossem objetos onde depositam suas necessidades e descontam suas raivas e
frustrações.

​— Eu não sou uma filha da Máfia por ser bastarda?

​ Sim, mas não têm valor ou dote para se casar, ou formar alianças que é o

que se visa o tempo todo na Instituição. Os bastardos são invisíveis para os
outros membros da Instituição e raramente sabemos suas verdadeiras
origens. Trazer você à tona e ainda casá-la com um membro da Cosa Nostra
pode abrir o que eles mais temem, os famosos precedentes. Além disso, para
que Dante te aceite, precisamos que Aleksey te reconheça como uma
Mikhailova.

​— Eu não quero ser uma Mikhailova!

​ Você veio aqui querendo se casar com Enzo, o que vai fazer de você uma

senhora Cosa Nostra. Máfia é máfia, e o que muda é o sobrenome, e no caso
você vai ter os dois maiores desta sociedade. Se você quer realmente Enzo
Cosa Nostra, então você quer entrar para a Máfia, e sim, você quer ser uma
Mikhailova, ou não usaria o argumento de ter o seu sangue nas veias para
conseguir isso!

​— Você está certa, eu não penso antes de falar.

​ Eu entendo você Raissa, mas não posso passar pano ou ficar



romantizando uma situação da máfia. Entre os romances dos livros e a vida
real, de igual só tem os crimes e as torturas, porque nossa vida está bem
longe de ser um conto de fadas e você já sabe bem disto!

​ Eu vim querendo ficar com Enzo e não pensei em mais nada como

sempre! — Raissa falou e abaixou a cabeça, e eu pude perceber como ela
estava exausta, destruída emocionalmente, e tentando lutar contra uma
impulsividade que eu também tinha aos vinte e três anos, quando sem pensar
nas consequências resolvi assumir o comando da Máfia Cooper.

​ Você é jovem, e tem a minha idade quando entrei para a Máfia. Você tem

a inocência e os sonhos da sua idade, e isso é normal, não se sinta mal por
isso. Quando eu me levantei e num impulso tomei o comando de uma
sociedade machista nas minhas mãos, precisei deixar a jovem Sarah para
trás, e me transformar na Senhora Cooper. Matthew foi responsável por
mostrar a mim, Nina e Alice, que não seríamos as panteras, mas sim as
criminosas. Treinamos pesado, e fomos iniciadas em um mês, igual os
homens que fazem isso desde o nascimento. Matthew nos fez uma pergunta,
e só aceitou nos ajudar depois da nossa resposta.

​— E que pergunta foi essa?

​ Você quer ser uma criminosa? Porque ser mafiosa não é vestir roupas

pretas e se casar com homens poderosos, e sim, se tornar uma fora da lei.
Não têm romantização, não têm histórias bonitas, somos uma sociedade que
protege os seus, mas que temos como base para sobreviver, dinheiro e poder.
Isso nos move e nos faz ser quem somos! Nós matamos, atropelamos,
torturamos, ou seja, fazemos o que for preciso para estar sempre no
comando, cada qual na sua hierarquia, mas chefes, ou soldados, no final de
tudo somos iguais, pois aos olhos do mundo não passamos de assassinos
frios e cruéis, e aos de Deus, seres sem alma e sem coração.

​ u senti que Raissa teve a mesma reação que nós três tivemos no passado
E
quando escutamos de forma tão fria as palavras de Matthew, ficando sem ar
e engolindo seco.

Ela fechou os olhos, e eu sei exatamente tudo que estava passando


pela sua cabeça, afinal dependendo da sua resposta, era como pular num
abismo: escuro, frio, cruel, e onde só os fortes sobrevivem.

Assim como eu, ela não cresceu educada nos moldes da máfia, e nem
estaria se casando por aliança como as outras jovens da sociedade, mas se
jogando numa relação que traz junto de si toda uma sociedade fechada, e
com regras que para nós de fora são pré-históricas e difíceis de aceitar.
E Raissa, além disso tudo traz com ela, todo um passado que foi
guardado por anos, e que vai deixar exposta sua avó e sua mãe, que não vão
escapar de ficar de frente com a máfia.

​ Eu nasci mafiosa sem saber, e sim, vou assumir o meu lugar nessa

sociedade — Raissa respondeu e confesso que não esperava nada diferente
disso vindo dela.

​ Então se considere em iniciação na Máfia! — Matthew respondeu — E



agora sim, senhorita Mikhailova, se o seu tio permitir, eu posso treinar você
assim como treinei Sarah, Alice e Nina.

​— Eu quero, não preciso da autorização dele para nada.

​ Regra número 01, senhorita Mikhailova: você vai precisar da autorização



do seu tio para qualquer coisa na Instituição, inclusive o seu casamento e
quem será o seu futuro marido— Matthew respondeu fazendo com que
Raissa engolisse seco.

— Nossa sociedade, apesar da Lei Sarah Cooper, continua sendo


uma sociedade patriarcal. Combatemos, e posso afirmar que reduzimos em
90% a violência doméstica, mas o poder de decisão continua nas mãos dos
homens, que são os chefes da família. Eles não podem agredir que
interferimos, mas continuam ditando as regras. Não se pode mudar tudo, e
precisamos sempre escolher nossas batalhas. Agora vamos ao que interessa,
que é conseguir levar você para a Rússia e tentar impedir o casamento de
Enzo, cuidando também para que Natalya não sofra as consequências disso,
afinal ela passaria a ser uma noiva largada, e não posso deixar de pensar nela
também, além de uma guerra com mortes que pode ser o fim disso tudo se
não agirmos de forma estratégica.

​ Não podemos chegar na Rússia e apresentar Raissa sem um bom plano!



— Matthew falou olhando para mim.

​ Se chegarmos com o argumento da filha da máfia bastarda vão nos



ignorar, e Dante não vai querer nem escutar, Aleksey vai dizer que é mentira,
exigir provas ou fazer coisa pior, e os membros da Instituição vão dizer que
quero passar por cima desta tradição também e no final, vamos ter muito
bate-boca, provavelmente tiros, e Enzo vai se casar com Natalya.
Entretanto…

​ u parei de falar e peguei o meu celular discando um número no facetime e


E
o conectando a sala de reuniões, sendo seguida atenta pelos olhares de
Matthew e Raissa.

​ Entretanto, podemos conquistar o apoio das novas gerações, e quando eu



falo isso, quero dizer, daquelas que vão mandar em tudo.

​— Oi, tia Sarah!

​ Oi minha futura Chefe da Cosa Nostra. Você pode falar agora? Está

sozinha?

​ Sim, estou no meu quarto, aconteceu alguma coisa?



​— Espera um minuto, que estou ligando para Alya.

​— É coisa séria?

​— Oi, tia Sarah, Luna! Videoconferência? O que aconteceu?

​— Eu preciso conversar com você e Luna, pode ser agora?

​— Pode sim, eu estou sozinha! — Alya respondeu.

​ Eu não estou ligando para Luna e Alya, mas para as duas futuras Chefes

das maiores Instituições da nossa sociedade, porque eu preciso da ajuda de
vocês para algo muito grande, que já aviso vai abalar as estruturas da máfia,
e uma famosa guerra de que vai abrir precedentes, ou seja, os obstáculos de
sempre onde a Lei Sarah Cooper esbarra há mais de vinte anos. Só que desta
vez, também vai envolver a família de vocês, e eu preciso que vocês escutem
tudo até o final, e me prometam sigilo total.

​ Eu não sei o que é, mas se têm algo que aprendi desde que nasci com a

minha mãe, é que quando Sarah Cooper pede uma reunião, nós mulheres
temos que estar prontas para lutar ao seu lado — Alya falou — Pode contar
comigo!
​— E comigo também! — Luna falou sorrindo.

​ Eu quero apresentar uma pessoa para vocês duas — Eu falei chamando



Raissa para ficar do meu lado.

​ Nós já a conhecemos, é a jornalista que nós salvamos da boate em Vegas!



— Alya respondeu — E que colocou a boca no mundo denunciando a
Salvatrucha em uma matéria que até rendeu prêmios para ela.

​ E que se envolveu com o meu primo Enzo, que vai se casar neste final de

semana. Essa ajuda tem a ver com o romance entre os dois? Se for estou
dentro, porque meu primo ama essa jornalista doidinha, como ele mesmo
fala.

​ Você quer impedir o casamento de Enzo e Natalya? Não temos tanto



poder assim. O que vamos argumentar para conseguir isso? — Alya falou
ficando agitada sem saber ainda que no final era isso mesmo que eu queria,
só que ia além disso.

​ Respirem fundo, que lá vem a bomba! Afinal, eu não chamaria vocês



duas para uma missão secreta desse porte, sem argumentos sólidos,
contestáveis... porém passíveis a uma batalha, que podemos vencer se
estivermos unidas! Essa jovem aqui, que tem a sua idade, Alya, não é só a
jornalista Raíssa O'Brien, e sim, uma Mikhailova, neta bastarda de
Aleksandr Mikhailov, e filha de Yelena, uma irmã que Aleksey desconhece a
existência.
Capítulo 45
Alya Mikhailova

​Eu precisei de um pouco mais de tempo do que Luna para absorver toda a
história da Raissa, o que era compreensível, uma vez que os relatos fortes
sobre o passado de Polina, envolviam a minha família.

​ Eu imagino como deve ser difícil para você nos contar isso tudo, e para

mim é estranho saber que todo esse horror se passou aqui na minha casa.
Quantas atrocidades como essa devem estar guardadas nas memórias deste
castelo? — Eu falei com lágrimas nos olhos — Eu olho para o meu pai e
vejo um homem amoroso comigo, e um Chefe frio e sanguinário com os
nossos inimigos, e sei que ele sofreu muito nas mãos do seu pai, mas nunca
imaginei que tivesse sido desta forma tão suja, onde ele presenciava o
demônio violentando mulheres indefesas. Eu não sei o que pensar, ou o que
dizer…

​ Não se cobre por não assimilar tudo, porque eu mesma estou tentando

fazer isso e olha que é a segunda vez que escuto essa história hoje. Eu
preciso muito da ajuda de vocês, e ainda não convoquei a máfia das
mulheres, quis conversar com vocês duas primeiro, porque acredito que com
o apoio das futuras Chefes, conseguiremos que nos escutem, e Enzo e Raissa
podem ter uma chance de ficarem juntos.

​ Eu vou ajudar, mas não sei como porque o meu pai não aceita voltar atrás

nas decisões dele, e confesso que já discutimos por conta desse casamento
do Enzo — Luna falou — Como nós duas poderemos fazer com que aceitem
isso? E ainda evitar uma tragédia, porque Rurik vai querer lavar com sangue
a honra da filha se Enzo não se casar.

​ E ainda temos que contar com a hipótese de Aleksey não acreditar em



nada disso, e ele mesmo atirar, só que na gente — Sarah falou e ela não
estava brincando porque eu mesma não sei que reação esperar do meu pai.

​ Precisamos provar que essa história toda é verídica! — Eu falei



enxugando as lágrimas e assumindo minha postura de futura Chefe da
Bratva — Temos pouco tempo para isso, já que faltam dois dias para a festa
oficial de apresentação dos noivos que vai acontecer na véspera do
casamento. Temos que encerrar esse compromisso neste evento, invadindo a
reunião dos homens que ficam bebendo e acertando o que vão ganhar com o
casamento, que é o que interessa pra eles. Raissa, preciso de todos os nomes
que você tiver para que eu possa investigar e provar a sua história. Sua avó
se chama Polina mesmo, ou ela tinha outro nome quando vivia aqui?

— O nome dela é Polina mesmo, ela não mudou quando deixou a


Rússia.

— Eu não posso pedir para Yuri nos ajudar porque temo que ele fale
com o meu pai, já que é muito fiel, então vou ter que fazer tudo sozinha.

​ Sarah, nós embarcamos amanhã para a Rússia para o casamento, e assim



que eu chegar me junto a Alya em busca de provas. Acho melhor você
convocar a Máfia das Mulheres um pouco antes da festa de apresentação dos
noivos, quando já estaremos com as provas de que Raissa é uma filha da
máfia.

​ Eu concordo, e acho que vai ser o melhor, porque assim também não

chama tanta atenção. Eu vou começar procurando por Anna, que trabalhou
nesta casa durante anos e conheceu a Polina.

​— Ela ainda está viva? Minha avó nunca mais soube notícias de ninguém.

​ Sim, ela ainda está viva. Não trabalha mais por conta da idade, e vive na

casa do neto que é um dos soldados da Bratva. Ela viveu a vida toda aqui na
mansão, trabalhando, e hoje ajuda a cuidar dos seus bisnetos. Vou localizar o
endereço dela e ir até lá! Se ela conheceu sua avó, vai se lembrar dela.

​ Mas como Anna vai provar que a história da minha avó é verdade, se ela

não sabia da gravidez quando ela fugiu?
— Uma coisa de cada vez, Raissa. Se ela conhecer e lembrar da sua
avó, já teremos a prova que Polina viveu aqui na mansão. Difícil mesmo vai
ser ela querer falar sobre esse assunto, por medo de expor minha família e
meu pai ficar bravo com ela.

​ Aleksey era pequeno na época, mas será que ele não se lembra desta

babá? Este fato dela ter socorrido ele quando caiu da escada, ou a tal festa
em que o salão pegou fogo, pode ser uma lembrança que ele tenha guardado
na sua memória.

​ Não sei, Luna, você sabe que todo o passado dos nossos pais é envolvido

por gatilhos que parece que eles não querem despertar, mesmo que
colocando para fora seja como uma libertação desses sentimentos.

​ Agora precisamos pensar em como, depois que provarmos que não somos

doidas e Raissa é uma filha da máfia, vamos convencer a todos da
Instituição, a aceitar uma bastarda — Sarah falou sabendo que
enfrentaríamos uma grande batalha.

​ Se eu provar com fatos que Raissa é minha prima, eu atiro em quem



ousar chamar uma Mikhailova de bastarda. Quando eu parar a festa e
apresentá-la como uma filha da máfia, assim será, e os membros da
Instituição que engulam o fato, ou vão conhecer a ira da futura Chefe deles.

​ E eu estarei ao seu lado, defendendo que nenhuma mulher vai ser



humilhada por ter sido vítima desses homens bárbaros da nossa sociedade —
Luna falou — Eu e Alya somos as futuras Chefes, e vamos fazer valer nossa
autoridade nessa festa.

​ Não se esqueçam que dois desses oponentes, podem ser o pai de vocês —

Sarah falou nos lembrando, que além da Instituição machista teríamos que
enfrentar os nossos pais.

​ Neste caso é bom que eles se lembrem como se tornaram Chefes tão

cedo! — Luna falou e nós duas olhamos para Sarah que deu uma
gargalhada.

​— Você escutou isso, Matthew?


​ Escutei, senhora Cooper, e devo dizer que a senhora criou um exército de

meninas superpoderosas da máfia.

​— Quando vocês vêm para a Rússia?

​ Eu embarco mais tarde com Ryan, Pietro, Noah, Anne e Lana. Matthew

iria conosco, mas vamos inventar alguma coisa que o segure aqui, e assim
ele segue amanhã, em outro jatinho com Raissa.

​ Eu vou para a Rússia? Não, eu não posso ir para lá, minha avó vai morrer

se souber disso…

​ Você pretende impedir esse casamento e ser apresentada como uma



Mikhailova por videoconferência? Nós nos encontramos aqui em dois dias,
minha prima!

​ esligamos o celular e eu precisei respirar fundo, pois não teria tempo para
D
pensar em nada, a não ser provar em quarenta e oito horas que toda essa
história aconteceu realmente aqui na mansão.

∞∞∞

​ iajei até a cidade rural de Abramtsevo, no município de Khotkovo, onde


V
Anna estava vivendo atualmente com seu neto, um soldado da Bratva. Não
foi difícil conseguir o endereço, precisei apenas dizer que queria fazer uma
visita a alguém que me viu nascer, e o soldado ficou todo orgulhoso.

​ ão pude dispensar o motorista e os seguranças, mas quando chegarmos vou


N
entrar sozinha pois preciso de privacidade, e da confiança de Anna, senão ela
não vai me contar nada.

​ cidade composta por quarenta e quatro ruas, parecia de filme, com casas
A
em estilo rústico, e quando finalmente chegamos, fechei os olhos e respirei
fundo, porque sabia que não seria uma conversa fácil, nem para Anna que
teria que contar segredos que deveriam morrer com ela, e para mim, que
confirmaria o horror que envolve o passado da minha família.
​ Senhorita Mikhailova, o que a traz até aqui? Aconteceu algo com o meu

marido? — A esposa do soldado me perguntou, como se fosse comum os
Chefes irem dar qualquer satisfação às famílias quando acontecia alguma
coisa — Nós ficamos aqui, não nos envolvemos em nada…

​ Está tudo bem com o seu marido! — Eu respondi quando entendi que a

sua preocupação é que estivéssemos indo cobrar deles algo que seu marido
tinha feito — Eu estou aqui por Anna, vim visitá-la, ela está em casa?

​ Sim, senhorita Mikhailova, entre por favor! Eu não sabia que um dia

receberia uma visita tão importante, nossa casa é simples…

​— Sua casa é muito acolhedora, e eu só vim ver e conversar com a Anna.

​ Senhorita Mikhailova? O que a traz até aqui? — Anna perguntou assim



que me viu.

​ Ela veio visitar a senhora. Eu vou levar as crianças lá para dentro para

que vocês possam conversar à vontade, mas antes disso, posso lhe oferecer
alguma coisa?

​— Não se incomode comigo, tudo que eu preciso é conversar com Anna.

​ nna fez sinal para que eu me sentasse quando ficamos só nós duas na
A
pequena sala da casa, e seu olhar era de desconfiança com a minha visita.

​ Eu não vou dar voltas, Anna, e vou direto ao assunto que me trouxe até

aqui. Eu quero que você me conte tudo que você se lembra sobre Polina,
uma jovem que foi babá do meu pai há mais de 50 anos na mansão Bratva.

​ nna ficou em silêncio, com o olhar perdido, mas eu pude sentir que sua
A
respiração ficou alterada quando eu disse o nome da pessoa sobre a qual eu
buscava informações. Ela pode pensar que me engana ficando calada, mas
eu sei que ela se lembra muito bem da Polina.

​ Eu estou esperando, Anna, e acredite, não tenho todo o tempo do mundo.



Se eu vim até aqui, é porque esse assunto é muito importante para mim e eu
quero que você me conte se lembra dela.
​— Já faz muito tempo, e muitas jovens passaram pela mansão Bratva.

​— E todas foram escravas sexuais do meu avô?

— Eu não disse isso, senhorita Mikhailova, e sim que muitas pessoas


trabalharam…

— Anna, você não precisa mentir para mim, e nem ter medo de me
contar nada, porque eu lhe garanto que nada de ruim vai lhe acontecer por
isso. Eu só preciso confirmar que uma jovem, chamada Polina, viveu na
mansão Bratva e foi babá do meu pai.

​— Eu não me lembro, já tenho idade, minha memória está muito ruim!

​ Eu vou lhe ajudar então com algumas informações que podem refrescar a

sua memória. Para essa jovem em especial, você emprestou uma bolsa e
colocou dentro dela as suas economias para que ela pudesse fugir. Ou será
que você fazia isso com todas as jovens que passaram pela mansão? Você
dava dinheiro para elas fugirem?

​ Não, senhorita Mikhailova, eu não dei dinheiro para Polina fugir, só disse

que não era prudente que ela saísse sem dinheiro porque se acontecesse
alguma coisa, não teria como voltar para casa.

​ E por que ela voltaria para o Inferno daquele castelo onde ela era vítima

de estupro?

​— Eu não sei do que a senhorita está falando.

​ Anna, eu respeito os seus cabelos brancos, acredite nisso, mas também



respeito os da Polina.

​— Ela está viva?

​— Sim, ela agora é a senhora Pavlova, e mora nos Estados Unidos.

​ Pavlova? Minha nossa, ela sempre falava no amor da vida dela, ​que tinha

esse sobrenome.
​ Nikolay Pavlov a acolheu depois de sua suposta morte num incêndio.

Eles fugiram para o outro lado do mundo, se casaram, e ele assumiu a
criança que ela estava esperando.

​— Minha nossa, não pode ser!

​ Polina estava grávida, e teve uma filha, Yelena, minha tia, que tem uma

filha da mesma idade que eu, que se chama Raissa. Eu preciso confirmar
tudo que Polina contou para sua neta, e provar que minha prima é uma
legítima Mikhailova.

​— Ela não é senhorita, bastardos não levam o sobrenome da família.

​ Se ela tem o meu sangue, é uma Mikhailova! Agora me conte tudo desde

que Polina chegou à mansão Bratva.

​— Eu não posso…

​— Por favor!

​— A senhorita vai ser a Chefe, e está me pedindo por favor?

​ Eu jamais torturaria alguém para que me contasse algo tão horrível que

nós mulheres deveríamos sempre denunciar. Mas eu entendo a sua posição, a
nossa Instituição, mas eu preciso da verdade, e lhe dou a minha palavra que
sua vida e a da sua família estarão sob a minha proteção. Não tenha medo!

​ Era uma noite muito fria, em que nevava e o jardim estava todo branco.

Tinham vários homens na mansão em uma reunião da Bratva, quando o seu
pai, que tinha apenas cinco anos resolveu brincar no jardim sem autorização
do pai. Ele desceu as escadas que estavam cobertas de gelo e caiu rolando
até a parte de baixo. Uma jovem desconhecida correu para ajudá-lo, e seu
avô no lugar de agradecer a destratou por tocar no seu herdeiro. Depois
disso, quando soube que ela era pagamento de uma dívida, resolveu ficar
com ela. Polina era uma jovem muito bonita, com olhos azuis que pareciam
o céu, e com uma tristeza por estar separada do seu amor e ter seus sonhos
destruídos. Ela cuidava do seu pai, e foi a única que teve realmente carinho
por ele. Um dia seu avô chegou muito bravo em casa, e encontrou Polina
cantando para ele e a castigou.
​— Ele não a castigou, e sim violentou. O nome é estupro e não castigo!

​— Senhorita…

​ Você a ajudou neste dia, e em todos os outros que ela contou. Você é uma

mulher boa Anna, que tinha medo e que cresceu achando que os homens têm
o direito de fazer o que querem com as mulheres, mas isso não é verdade.
Meu avô era um monstro, e eu tenho nojo dele! Você se lembra de como a
Polina estava antes da festa que todos acharam que ela morreu?

— Polina estava doente de tanta tristeza! Ela não conseguia comer,


vivia se sentindo mal…

​ Ela estava grávida, e ainda bem que conseguiu fugir, porque com certeza

meu avô a mataria se soubesse que ela estava esperando uma criança dele.
Saber que você a conheceu, e que ela realmente passou por tudo que ela
contou, era a prova que eu precisava.

​ Polina era uma jovem doce! Eu fico feliz que ela tenha sobrevivido e se

casado com o seu grande amor! Ela era muito atenciosa mesmo com todo o
sofrimento que carregava nas costas. Polina era a única que conversava com
a sua avó! A senhora Mikhailova, que não falava com ninguém e vivia no
seu quarto, falava com aquela jovem. Acho que uma sentia pena da outra, eu
não sei!

​ Minha avó conversava com a Polina! Obrigada, Anna, essa informação



vale ouro para mim.

​ oltei para a mansão Bratva, e assim que cheguei me tranquei no meu quarto
V
e liguei para o Canadá, onde a minha avó vive desde a morte do monstro
com quem ela foi casada. Eu sei que tem coisas que devem ser esquecidas,
mas eu precisava saber de toda a verdade, e depois de perguntas básicas
sobre o seu dia a dia, eu me enchi de coragem e entrei no assunto com ela.

​ Minha avó, por acaso a senhora se lembra de uma jovem que trabalhou

aqui na mansão e foi babá do meu pai, ela morreu em uma festa onde
ocorreu um incêndio.
​ Sim, o nome dela era Polina! Eu não sei se ela morreu, mas me lembro

dos seus olhos quando ficou caída no chão enquanto seu avô arrastava a mim
e seu pai como se só a vida da sua família importasse. Eu senti inveja dela
que pode ficar ali para morrer e não precisou voltar para a mansão Bratva.
Nunca esqueci do olhar daquela jovem que lembrava os meus, e por isso a
deixei ali, para que fosse livre! Por que você quer saber sobre essa moça
tantos anos depois?

​— A senhora vai saber em breve! Por favor, não…

​ Seu pai nunca me ligou minha querida, só você e sua mãe, a minha doce

Irya! Não se preocupe que não vou nem que eu quisesse falar alguma coisa
para ele.

​ ssim que desliguei o celular, Luna chegou na mansão e quando eu contei


A
para ela que já estava tudo resolvido, ela ficou muito feliz apesar de saber da
guerra que enfrentaríamos juntas.

​— Enzo sempre cuidou de mim, e agora vou poder retribuir lutando por ele.

​ u e Luna ficamos conversando sobre como faríamos para que tudo desse
E
certo, e eu aproveitei para enviar uma mensagem para Sarah.

Alya: Pode convocar a reunião da máfia das mulheres para uma hora
antes da festa de apresentação dos noivos porque eu já confirmei tudo, e a
história da Polina bate com tudo que me contaram. Ela realmente morou
nessa mansão, e ninguém vai poder dizer que é mentira, porque quem
confirmou, foi a minha avó. Raissa é minha prima, uma Mikhailova, e
vamos lutar para que ela e Enzo possam ficar juntos!
Capítulo 46
Raissa

​Faltavam 24h para o meu embarque para a Rússia, e de acordo com o plano
de Sarah, eu chego exatamente no dia da apresentação dos noivos, e sigo
com Matthew direto para o evento.

Eu estava confusa, porque eu sabia que encontraria com Enzo de uma


forma que ele nunca imaginou, interrompendo uma reunião da máfia.

Pelo que eu entendi, eles apresentam os noivos e marcam o


casamento entre um e sete dias. No caso do Enzo, será no dia seguinte da tal
reunião entre os homens, porque já aconteceu um jantar de compromisso na
Cosa Nostra.

Essa Instituição realmente é cheia de regras e eu preciso me


acostumar com elas, porque segundo Sarah, todas elas farão parte da minha
vida a partir de agora. Eu dei um passo enorme vindo até aqui conversar com
ela e pedir a sua ajuda, só não me dei conta que estava com isso iniciando
minha vida na Máfia.

​ Como assim você está indo para a Rússia, minha filha? — Minha mãe

falou assim que eu contei as novidades para ela e minha avó numa chamada
de vídeo.

​ Segundo a minha prima, Alya, eu não posso impedir o casamento do



Enzo via Facetime.

​— Sua prima?

​ Pois é, eu conversei com Alya hoje e ela ficou de checar a veracidade da



história da minha avó, para não deixar que à contra-ataquem quando ela
revelar tudo no evento onde vai acontecer o noivado.
​ Meu coração chega a bater mais forte sabendo que você está indo de

encontro a tudo que eu sempre fugi, mas estarei aqui orando por você, minha
neta. Eu sempre acompanhei as notícias da máfia, e essa Sarah Cooper é
uma mulher forte, mas será que ela conseguirá te proteger?

​ Eu vou estar protegida pela Máfia das Mulheres, então quero acreditar

que estarei segura.

​ Se não tem outro jeito, e você já decidiu, só nos resta te apoiar porque

não somos mais uma família que esconde nada dos outros. Agora nos conte
como foi tudo desde que você chegou em Los Angeles! — Minha mãe falou
e eu sei que mesmo preocupada ela queria mudar o rumo da conversa e
tentar fazer tudo parecer mais leve.

​ Em menos de um dia já aconteceu tanta coisa. Primeiro eu conheci Sarah



Cooper! Mãe, ela é o máximo! Depois contei nossa história e ela ficou em
choque! Sarah é muito prática, direta, simplesmente perfeita! Ela ligou para
Luna Cosa Nostra e Alya Mikhailova, que serão as futuras chefes dessas
Instituições, e pediu que elas me ajudassem a ser reconhecida como uma
filha da máfia. Eu sei que falando assim, parece loucura, na verdade é tudo
muito diferente da nossa realidade, mas mãe, isso é a Máfia! Eu sempre fui
fascinada pelas histórias desta sociedade secreta, e agora sabe onde eu estou?
No centro de operações da Máfia Cooper.

​ Filha, é impressão minha, ou você está gostando de ser mafiosa? Você



sabe que isso não é uma brincadeira, não é mesmo?

​ Eu preciso me distrair, e não pensar em tudo que vem pela frente senão

eu vou ficar doida. Eu sei que não é brincadeira, até porque no lugar de ir
para um hotel esperar o meu voo, eu vou ficar aqui com Matthew que vai me
ensinar a atirar.

​— Por que você vai aprender a atirar?

​ Porque nós somos da máfia, e eu não vou ser esposa troféu porque isso

não combina comigo.

​ Quando eu penso que Raissa mudou, lá vem ela de novo com as suas

maluquices — Minha mãe falou rindo.
​ Mas essa é a nossa Raissa, e eu não quero que ela perca jamais essa sua

essência irreverente e alegre, mesmo que a sua vida mude por completo. —
Meu avô falou e eu sorri feliz por saber que ele me entende — Você sempre
falou tanto nessa máfia das mulheres, que no mínimo já está tentando fazer
parte dela.

​ Esse é o meu avô que me conhece melhor do que qualquer outra pessoa

— falei rindo — Eu amo muito vocês! Fiquem daí torcendo por mim, porque
eu estarei lá do outro lado do mundo buscando minha felicidade e
conhecendo a minha verdadeira origem.

​ u me senti melhor depois que conversei com a minha família; e pela


E
primeira vez não discutimos, pelo contrário, nós nos apoiamos. Senti falta do
meu pai que sempre esteve presente nesses momentos em família, e embora
eu não aceite, respeito o fato dele achar abominável termos o sangue da
máfia.

Matthew foi bem claro quando afirmou que eles são criminosos, e o
meu pai não teria se casado com a minha mãe se soubesse da sua verdadeira
origem. Fico triste, porque seu amor nunca foi verdadeiro, porque eu quero
Enzo independente de quem ele é, e muito antes de saber quem eu realmente
sou.

​ Pronta? — Matthew perguntou me entregando um fone de ouvido e uma



arma.

​ Espero que sim, porque não quero matar nenhum soldado enquanto tento

acertar os bonecos que vocês têm como alvo.

​— Mire no alvo e não nos meus homens e vai dar tudo certo!

​ u atirei e caí sentada no chão, fazendo Matthew dar gargalhadas. Me


E
levantei, respirei fundo, e mirei nos bonecos de madeira. Eu peguei a arma
confiante e me lembrei da noite na boate, em que Alya entrou linda e
poderosa, atirando nos homens nojentos que frequentavam aquele lugar. Eu
nunca tive medo de nada, e não seria justamente agora a primeira vez.

​— Eu sou uma Mikhailova, já nasci pronta!


​ atthew ficou impressionado quando simplesmente eu atirei e acertei a
M
cabeça de cinco alvos.

​ Eu não sei o que aconteceu, me deu uma raiva quando você riu de mim,

e…

​— E seu sangue falou mais alto!

​— Isso é ruim? Nossa, eu não posso ter raiva e sair atirando nos outros.

​ Se você quiser sobreviver na máfia, é assim que você vai fazer com os

seus inimigos. Não é só responder que quer ser da máfia, é querer ser de
corpo e alma! Ou você pode ser uma esposa troféu!

​— Recarrega logo essa arma que eu vou acertar todos os alvos!

∞∞∞

​ u dormi num alojamento do centro de operações, com o meu corpo


E
dolorido e simplesmente exausta, porque além de atirar iniciei uma aula de
defesa pessoal, e ainda tive a minha cabeça enfiada várias vezes dentro de
um tonel de água até quase perder o ar, para que eu entendesse como
funcionam as sessões de tortura. Foi uma sensação horrível, e fiquei
impressionada com os relatos do que aconteceu com Sarah Cooper enquanto
esteve em poder da Corsa.

​ ssim que eu acordei, fui tomar café da manhã com Matthew num refeitório
A
gigantesco e os soldados me olhavam desconfiados, enquanto outros
cochichavam alguma coisa ao meu respeito.

​— Eu posso te fazer duas perguntas?

​ Eu acharia estranho se você como jornalista não me perguntasse nada



depois de tantas coisas que você viu e aprendeu de ontem para hoje —
Matthew falou e deu uma gargalhada, e achei engraçado ver um mafioso
todo de preto e com o semblante sério rindo alto das coisas que eu falo.
​ Primeira coisa! — Eu falei enquanto pegava mais algumas panquecas na

mesa — Você me treinou ontem para que eu desistisse, não foi?

​ O que vem pela frente na sua vida não será fácil, e nem igual a nada que

você conheça ou já viveu. Eu sei que você foi sequestrada, sofreu um
atentado com Enzo, quase morreu na festa de premiação, mas isso são as
cerejas do bolo se você se casar com um Cosa Nostra, já que vai passar a ter
inimigos em cada esquina, e no seu caso, com um agravante, de ser também
uma Mikhailova. Você tem ideia de quantas máfias dariam tudo que tem
para enviar sua cabeça para Aleksey e Dante, mostrando que conseguiram
atingir as duas maiores máfia do mundo ao mesmo tempo? Eu não quis te
assustar, apenas acho que você precisa estar pronta para enfrentar os seus
inimigos, caso precise! O que eu fiz ontem foi te dar uma pequena noção, na
verdade um exemplo, do que pode acontecer. Você faz parte da máfia, e isso
não é uma aventura, mas algo muito perigoso!

​ Eu entendo! — Falei enquanto as panquecas pareciam ter ficado



entaladas na minha garganta.

​— E a segunda pergunta?

​— Os soldados estão falando de mim ou é impressão minha?

​ Alguns devem estar se perguntando o que a jornalista que entregou a



Salvatrucha está fazendo aqui, e outros, como ela pode ser magra comendo
feito uma draga.

​ Para! Eu só estou com fome! Meu Deus, uma mulher não pode nem

comer muito em paz! — Eu falei rindo, e alcançando uma bandeja com
donuts.

​ atthew sabia exatamente como mudar o rumo da conversa pesada para


M
leve em frações de segundos, e eu estava cada dia mais me apegando mais a
esse mafioso que realmente faz jus ao nome de protetor da Máfia das
Mulheres.

​ o restante do dia até a hora do embarque repassamos o que aconteceria


N
quando chegássemos na Rússia, e apesar de não falar nada, dentro de mim
existia um certo medo de pisar nas terras que um dia fizeram tanto mal a
minha avó. Ela fugiu com o meu avô para garantir a segurança da minha
mãe, e agora eu estava indo fazer o caminho contrário nos entregando de
bandeja para a Bratva.

​ u não sabia o que esperar de Aleksey Mikhailov, afinal sendo filho do


E
demônio, quem me garante que ele não é tão ruim quanto o pai.

O que estava me esperando na Rússia era incerto, e por isso fechei os


meus olhos quando senti o jatinho decolar, e tentei pensar só em Enzo que
era a parte boa de toda essa história.
Capítulo 47
Enzo Cosa Nostra

​A viagem para a Rússia foi silenciosa, o que era difícil acontecer quando se
reúnem os membros de uma família italiana.

​ u não tinha motivos e nem vontade para conversar com ninguém, já que
E
tudo dentro de mim era uma mistura de dever a se cumprir, e ódio por ter
que ser dessa forma.

​ aissa que até outro dia estava inconformada com o meu casamento, agora
R
parecia ter aceitado e decidido que o melhor era seguirmos separados.

​ Está tudo bem? — Meu pai perguntou me vendo mais calado do que o

normal.

​ Eu estou fazendo a sua vontade, mas não queira mandar nos meus

pensamentos porque eles são só meus — Eu falei e fui me sentar distante de
todos, e meu pai sabia que eu estava me referindo a Raissa, que era a dona
dos meus sonhos.

​ ela primeira vez a Cosa Nostra me fez ter raiva de ser um filho da máfia, e
P
não poder ser dono do meu destino.

Mas quem eu estava querendo enganar? Eu sou a Cosa Nostra, e me


orgulho do sangue que carrego nas minhas veias. Eu sei das minhas
responsabilidades e jamais colocaria um desejo pessoal a frente da minha
família.

Eu sei muito bem quantas vidas dependem de nós, mas eu não podia
negar que um lado meu queria jogar tudo pro alto e ficar com Raissa, mesmo
que por pouco tempo, já que sozinhos no mundo nossos corpos iriam parecer
uma peneira de tantos furos de bala.
— Nos sempre fomos amigos meu filho e agora... — meu pai falou
se sentando ao meu lado.

— E agora eu estou aqui, fazendo a sua vontade, me casando com a


mulher que você escolheu para mim, em troca da segurança daquela com
quem eu queria poder passar o resto da minha vida.

— Ela nem é uma filha da máfia, Enzo, e você já e um homem de


trinta e um anos, que conhece as suas responsabilidades.

— Se fosse faria diferença, tio Lorenzo? — Luna perguntou se


metendo na nossa conversa — Se existisse uma chance dos dois ficarem
juntos porque a Raissa é uma filha da máfia, você ficaria ao lado do Enzo?

— Eu já dei a minha palavra, Luna.

— Mas o senhor disse meu tio, que ela “nem é uma filha da máfia”,
mas... e se ela fosse?

— Não sou um homem de suposições e vivo apenas a realidade.


Assunto encerrado.

— Se o senhor diz... — Luna falou e se levantou para nos deixar


sozinhos — Mas saiba que para mim uma guerra só termina quando não
temos mais nenhum soldado para lutar.

Meu pai não respondeu, e ficou em silêncio vendo a minha prima se


afastar, mas eu sei que ele ligou o alerta para as palavras de Luna que
soaram como uma ameaça.

Assim que desembarcamos na Rússia fomos direto para uma casa


reservada por meu tio Dante onde ficaríamos até a cerimônia de casamento.

— Eu estou indo para a mansão Bratva porque combinei com Alya e


já estou atrasada — Luna falou assim que entramos em casa e já solicitando
um motorista alegando estar com pressa.

Luna saiu apressada e eu estranhei porque ela sequer se despediu de


mim. Eu conheço minha prima e sei que ela está me escondendo alguma
coisa, porque ela só se afasta de mim quando tem medo de me falar mais do
que deve.

Infelizmente eu estava sem cabeça para os mistérios de Luna, e fui


para o meu quarto tomar um banho e trocar de roupa, já que receberíamos
alguns associados da máfia para uma reunião de negócios.

∞∞∞

Eu não estava conseguindo me concentrar em nada, por isso resolvi


ficar em silêncio enquanto os homens falavam sobre mercadorias, novas
drogas e alguns nomes de possíveis traidores.

Matteo por diversas vezes tentou chamar minha atenção para a


reunião, mas tudo que eu queria era poder mandar todos para o inferno.

Uma vontade de jogar tudo para o alto gritava dentro de mim, mas
daí me lembrava do sorriso da minha jornalista encrenqueira e sua sede por
viver, me lembrava que o meu sacrifício de ficar longe, era para que ela
tivesse uma chance de ser feliz.

Por mais que para quem estivesse de fora achasse que sumir e viver
escondido seria uma grande solução, quem é da máfia sabe que mais cedo ou
mais tarde acabam nos encontrando. O filho de um associado ficou dois anos
desaparecido, ninguém sabia ou se lembrava dele. Ele foi morar na Grécia,
longe de tudo, numa vida simples e um dia “boom” ... sua esposa ligou o
carro e foi pelos ares.

Assim que todos os associados foram embora eu pedi licença, mas


meu tio Dante achou de chamar minha atenção pelo fato de não ter
colaborado em nada na reunião.

— Sinceramente meu tio, eu acho que já estou colaborando muito


com Cosa Nostra me casando e fortalecendo laços mais estreitos com a
Bratva.
— E eu acho que você está passando do limite com a sua resistência
a algo que sempre esteve previsto na sua vida e de qualquer um da nossa
Instituição, que é o casamento onde fechamos alianças, ampliamos nosso
poder e damos continuidade a nossa linhagem com a chegada dos nossos
herdeiros.

— Vamos parar de discutir, vocês três agora vivem se estranhando.


Que tal beber com o seu tio preferido? — Giancarlo falou batendo a mão no
meu ombro.

— Você vai me aconselhar a pegar uma mochila e sair pelo mundo


para não me casar?

— Infelizmente não é uma boa ideia, e eu posso garantir isso para


você — Giancarlo falou rindo e saímos, eu, ele e Matteo para dar uma volta
de carro pela cidade e procurar um bar onde eu pudesse me embriagar, afinal
era a minha despedida de solteiro.
Capítulo 48
Luna Cosa Nostra

Os últimos dois dias foram intensos, com Alya buscando provas que
Raissa era a sua prima, e eu pensando numa solução para manter a palavra
da Cosa Nostra com Rurik. Eu precisava quebrar o acordo de casamento de
Enzo, e ao mesmo tempo evitar o início de uma guerra, além claro de
proteger Natalya para que ela não ficasse com o rótulo de noiva largada.

Eu tinha pouco tempo antes da reunião que Sarah marcou com minha
mãe, Nina, Alice e Irya que já estavam me aguardando na sala de reuniões.

Depois de quebrar a cabeça eu encontrei uma solução e agora só


dependia de uma conversa que eu precisava ter com Matheus, e por isso o
chamei para vir comigo até o escritório.

— Algum problema, Luna? Você não quis que Enzo participasse da


reunião e acho que ele não gostou disso.

— Eu sei o que eu estou fazendo e no final ele vai me agradecer. O


que eu preciso agora e saber se posso confiar e mais do que isso... se posso
contar com você, Matteo?

— Você sabe que sim! Pode contar como primo, e principalmente


como futuro general do seu exército, Chefe Luna.

​ Eu não vou dar voltas, até porque não temos tempo. A jornalista

Raissa O’Brien é sobrinha bastarda de Aleksey Mikhailov e Sarah Cooper
convocou a Máfia das Mulheres para tentar fazer valer o seu direito de filha
da máfia, e assim, ela e Enzo poderem se casar.

​ A Raissa do Enzo, é uma filha bastarda da máfia? Nosso primo



sabe disso?
​— Não, só a Máfia das Mulheres, Matthew e agora você.

— Acontece que bastardos não são reconhecidos, o seu pai nunca vai
aceitar isso. Espera, você disse sobrinha de Aleksey Mikhailov?

Eu respirei fundo e contei toda a história de Polina, a avó de Raissa


para Matteo que ficou assim como todos nós que soubemos dessa história,
sem saber o que dizer.

— Qual o plano, Luna?

— Daqui a pouco, antes da apresentação oficial dos noivos, eu e


Alya vamos marcar uma reunião com a Cosa Nostra e a Bratva, e apresentar
Raissa para todos, com o apoio e claro da Máfia das Mulheres.

— Raissa está na Rússia?

— Deve estar desembarcando agora com Matthew e vai seguir direto


para a reunião.

— E você quer o meu apoio para que aceitem Raissa como uma
legitima filha da máfia?

— Eles vão ter que aceitar porque eu e Alya não renunciaremos a


isso, e estamos dispostas a enfrentar todos os homens da Instituição se for
preciso, só que existe um acordo entre a Cosa Nostra e Rurik, e não podemos
como futuras Chefes, proteger uma e largar a outra na mão. Em outras
palavras, não podemos lutar por Raissa e deixar que Natalya fique conhecida
como a noiva abandonada, até porque vai se iniciar uma guerra já que tio
Lorenzo deu a palavra dele quanto ao casamento. Eu não posso deixar
nenhum espaço para ser contra-atacada nessa reunião, então...

— Eu já entendi, Luna.

— Eu não consegui encontrar outra solução.

— Porque não existe outra. Que seja assim!


∞∞∞

​ u entrei na sala de reuniões onde a máfia das mulheres me aguardava para


E
decidirmos as nossas estratégias para nossa ação que começaria dentro de
exatos trinta minutos.

​ Desculpem o atraso, mas estava resolvendo um último detalhe para que



meu pai não tenha como argumentar e dizer que não pensei na Cosa Nostra.

​ Minha Luna falando como uma verdadeira Chefe — Anne falou me



enchendo de beijos como ela fazia comigo desde que eu nasci.

​ Por favor alguém explica o que está acontecendo — Minha mãe



perguntou — Eu quero saber que guerra vamos declarar, porque se até Anne
veio se juntar a nós, então é porque a coisa vai ser grande.

​ Tem dois dias eu chamei Luna e Alya, as futuras Chefes para



confidenciar algo que se conseguirmos fazer acontecer, vai abalar e muito as
estruturas da Instituição — Sarah Cooper falou — Nesse momento nossos
maridos estão reunidos bebendo e falando de negócios enquanto aguardam
Rurik e os associados da Bratva para a apresentação dos noivos. Eu vou
contar tudo para vocês, e em seguida, se todas concordarem, seguimos juntas
para a reunião dos associados.

​ arah Cooper era uma mulher direta e que não dava voltas ou ficava
S
enrolando quando queria resolver alguma coisa, e era o meu modelo de
inspiração para tudo na vida. Ela contou rapidamente e sem deixar escapar
nenhum detalhe toda a história de Raissa, e deixando todas comovidos com
o drama vivido por Polina.

​ Eu não sei como Aleksey vai receber toda essa história e uma sobrinha

bastarda, mas podem ter certeza de que não ficarei calada diante das
atrocidades cometidas por aquele velho maldito. Raissa tem todo o direito de
ser reconhecida como uma Mikhailova, e estarei te apoiando minha filha
quando você disser isso para os associados.
​ Meu filho só está se casando para proteger essa jovem, mas se ela tem o

sangue da máfia nas veias, acabou o impedimento e Lorenzo que não fique
no meu caminho.

​— Só temos que pensar também em Natalya...

​ Eu já tenho a solução para o acordo entre a Cosa Nostra e Rurik, não se



preocupe com isso — Eu falei para Sarah.

​ Então chegou a hora — Alya falou — Nos vemos em breve na reunião



dos associados. Vamos Luna?

​ os duas deixamos todas conversando com Sarah e seguimos para enfrentar


N
primeiro os nossos pais, e depois os homens machistas da Instituição.
Capítulo 49
Enzo Cosa Nostra

Um homem tem que ter palavra e responsabilidade por cada um dos


seus atos. Eu aprendi isso desde cedo com o meu pai, e vendo como ele e os
meus tios cuidam de tudo e de todos da Cosa Nostra.

Não é só a parte rentável da organização, mas tudo que envolve seus


associados, que para tudo recorrem ao Capo. Seja por doença na família,
desavenças no lar ou aconselhamento, os membros buscam pelo seu Chefe
em busca de uma solução.

Os irmãos Cosa Nostra são temidos, mas também venerados, e cabe a


mim, Luna, Matteo e Antonella continuarmos o seu legado.

Eu fui tomar o meu banho, e as lembranças de Raissa passando uma


esponja com sabonete por todo o meu corpo invadiu a minha mente. Segurei
meu pau que latejava, e à medida que o estocava me lembrava dela sentada
em cima de mim, esfregando sua boceta melada na minha cara. Que porra de
mulher gostosa que eu quero mais do que tudo nesse mundo, até mais que a
Cosa Nostra.

Não pense com o pau, e sim com a sua cabeça, eu falava para mim
mesmo enquanto gozava forte pensando na minha jornalista encrenqueira.

​ ai do meu banho mais estressado do que entrei, porque vi que seria


S
impossível viver sem Raissa e uma batalha interna começou a se travar
dentro de mim.

​ caminho da reunião com os associados, eu não aguentei e liguei para


A
Raissa, porque ela precisava saber que se estivesse disposta a viver
escondida para sempre eu iria ao seu encontro, mas a ligação caiu na caixa
postal. Ansioso, mandei uma mensagem e fiquei esperando-a retornar, o que
não aconteceu. No lugar disso chegou uma resposta automática dizendo que
ela estava ocupada e que assim que pudesse entraria em contato.

​ u não sei o que deu em mim, não sou um homem impulsivo, mas naquele
E
momento se Raissa tivesse atendido eu teria me tornado um exilado da
máfia. Não pensei nos meus pais, na minha família e em mais ninguém, e
dentro de mim me sentia um egoísta, mas será que uma vez na vida eu não
tinha direito de pensar só em mim.

​ ma voz gritava dentro de mim dizendo que não. Que eu não podia pensar
U
só em mim, e outra voz gritava que sim, que eu tinha o direito como
qualquer outra pessoa de surtar.

​ u respirei fundo assim que cheguei no local onde aconteceria a reunião e


E
logo depois a apresentação dos noivos, repetindo para mim mesmo quem eu
era e quais as minhas responsabilidades.

​ or mais que eu queira nunca serei um homem comum. Eu sou um mafioso,


P
e onde quer que eu vá a máfia vai comigo.

​ gradeci por Raissa não ter atendido a minha ligação no meu momento de
A
fraqueza, onde o meu egoísmo foi tão grande que não pensei que estaria
tirando o seu direito de ser livre, para fugir ao lado de alguém marcado com
o sangue da máfia.

∞∞∞

— Boa noite a todos — Eu falei entrando na sala onde estavam


reunidos os homens da Cosa Nostra, Ryan Cooper, Jordan e Aleksey
Mikhailov, na casa onde seria realizada mais tarde a apresentação oficial dos
noivos.
​— Você está atrasado. — Meu pai falou assim que me viu.

​— O cordeiro não tem direito de se atrasar alguns minutos antes do


abate?
​ Todos nós já passamos por esse dia, mas cá estamos — Dante

falou com seu tom de voz autoritário.

— Acontece meu pai, que todos vocês tinham o coração vazio e uma
obrigação com a Instituição — Luna falou entrando na sala acompanhada de
Alya e pegando todos de surpresa — já o coração do Enzo está ocupado, ele
e Natalya não tem a menor chance de serem felizes.

​ Em primeiro lugar minha filha, essa reunião são dos homens da



máfia, em segundo lugar, felicidade não é mais importante que alianças, e
em terceiro lugar...

​ Em terceiro lugar — Aleksey Mikhailov se levantou falando e



interrompendo Dante — não me lembro de termos marcado alguma reunião
com vocês duas.

​ Vocês não marcaram meu pai, mas eu e Luna viemos e vamos



continuar aqui até resolvermos esse assunto do casamento de Enzo e Raissa
— Alya respondeu enfrentando o pai.

​ Eu sabia que era muita modernidade dar tanto espaço para as



nossas esposas, agora olha o resultado — Dante falou com um sorriso
irônico no rosto — Nem preciso dizer de quem é a culpa, porque todos
sabemos — Ele falou olhando para Ryan Cooper — Sinceramente, não
existe nada para ser discutido aqui, e peço que vocês duas, por favor, não
testem a minha paciência.

​ E se nós testarmos, o que vai acontecer? — Alya perguntou dando



dois passos à frente e encarando meu tio Dante — O que o Dom da Cosa
Nostra acha que vai fazer?

​ Alya Mikhailova — Aleksey gritou fazendo tudo estremecer —



Eu não admito que você fale assim com o Dom da Cosa Nostra.

​ Eu falo como eu quiser meu pai, com qualquer um que ousar



tentar calar a voz de uma mulher na minha frente. Sugiro, que o Dom da
Cosa Nostra e o Chefe da Bratva se sentem, porque eu e Luna somos o
futuro dessa Instituição, e não tem nada e nem ninguém que nos impeça de
falar nessa reunião o que pensamos.
​ Luna e Alya — Dante falou batendo palmas — Então as nossas

filhas, aquelas a quem um dia colocamos como nossas sucessoras hoje
acham que podem falar com os seus pais nesse tom? Acham que podem nos
desafiar?

​ Com todo o respeito meu pai — Luna falou — eu devo lembrar



que você e Mikhailov, mataram por divergência de opiniões, os pais de
vocês, enquanto eu e Alya só estamos pedindo para que vocês dois nos
escutem.

​ Vocês podem nos escutar? — Alya perguntou — Eu sei que



invadimos essa sala, mas se fizemos isso é porque não temos tempo a perder
e sabemos o que estamos fazendo. Fomos preparadas pelos melhores, para
comandar a Cosa Nostra e a Bratva, nos escutem porque se estamos aqui
temos os nossos motivos.

​Mulheres! Elas sabem como vencer uma guerra!

​ una e Alya afrontaram os seus pais, mas depois com o jeitinho delas
L
fizeram os dois leões bravos se sentarem para escutá-las.

​ Voltando ao que eu falava quando eu e Alya chegamos, nós



entendemos que se faz necessário, embora não concordemos, o famoso
casamento por alianças. Só que nesses casamentos, menos o do Ryan e da
Sarah, tanto o homem como a mulher entram sem sentimento algum e vão
construindo a relação como aconteceu com vocês, ou se suportando, como
na maioria dos casamentos.

​ Muitas filhas da máfia se casam enfadadas, se entregam por



obrigação e geram seus herdeiros. Outras, como a Louise Cosa Nostra,
sonham que vão ser felizes, ou sei lá o que esperam casando-se com
desconhecidos — Alya falou — mas Natalya, nem a chance de quebrar o
coração frio do mafioso vai ter, porque ele já está trancado, e a chave está
nas mãos de outra jovem.

​ O que está acontecendo aqui? — Aleksey perguntou — Que volta



toda é essa para chegar a lugar nenhum. Coração trancado, cordeiro pronto
para o abate, chave sei lá com quem. A Cosa Nostra fechou um acordo que
vai ser cumprido hoje e nada vai mudar isso.

​ Elas estão falando da jornalista com quem Enzo se envolveu e que



por algum motivo, Luna, e agora, Alya resolveram trazer à tona — Dante
falou.

​ Essa porra de discussão toda por causa de uma mulher que não

tem o nosso sangue? E vocês acham mesmo que estão preparadas para
assumir vindo com isso? — Aleksey falou e deu uma gargalhada.

​ Luna e Alya, eu vou me casar. Não quero provocar uma guerra, e



não vou colocar a vida de Raissa em risco, por isso não quero que vocês
duas... — Eu falei, mas Luna me interrompeu.

​ Você não precisa se casar com outra pessoa para proteger Raissa,

meu primo.

​ Já chega, Luna, essa jornalista é uma bastarda, ou seja, ninguém



— Dante falou irritado.

​ Mas Dante, e se ela fosse uma filha da máfia? — Alya perguntou



e na mesma hora o meu coração disparou. Alguma coisa estava acontecendo
para que as duas estivessem tão empenhadas nesse assunto.

​ Se ela fosse uma filha da máfia, ainda assim já eu teria um acordo



e Enzo não poderia se casar com ela.

​ Mas o que impediu Enzo de ficar com ela foi não ser uma filha da

máfia? — Alya insistiu no assunto.

​ Sim, isso foi o primeiro impedimento — Dante respondeu sem



paciência — Mas existem outros interesses por trás de um casamento.

​ Nesse em específico fortalecer as relações com a Bratva. Sendo



assim, — Alya falou — o assunto está resolvido e garanto que vai ser mais
vantajoso para Cosa Nostra, se Enzo se casar com Raissa O’Brien, ou
melhor, com Raissa Mikhailova.
Foram segundos que pareceram horas quando Alya jogou uma
bomba na sala de reuniões.

Ninguém tinha conseguido ainda piscar os olhos quando a porta da


sala se abriu, e Sarah Cooper entrou acompanhada do seu exército de
mulheres superpoderosas.

Ela estava com a minha mãe, Isabella, Alice, Louise, Irya e para
surpresa de todos, Anne Cooper, hoje, a senhora Stanford, que passou o seu
legado para Pietro, mas que hoje veio acompanhar uma missão da Máfia das
Mulheres.
​E quando todos pensaram que as surpresas tinham terminado, ela entrou…
linda, altiva, poderosa, perfeita… a minha Raissa.
​Foi então que levantei me questionando o que ela estava fazendo aqui na
Rússia.
​— Claro que por trás da rebelião das nossas filhas tinha que estar a
causadora do estrago na Instituição, Sarah Cooper.
​— Como sempre, Dante, não foi escolha minha, mas caiu nas minhas mãos
mais uma bomba que precisava ser detonada.
​— Anne, minha irmã, sinceramente, você deveria voltar para a empresa
porque isso aqui... — Pietro falou sendo interrompido.
​— Ou posso mudar de ideia, assumir no futuro o meu lugar de Chefe e te
colocar como meu Consiglieri — Anne falou enfrentando Pietro — Isso aqui
não é uma brincadeira. Eu posso ficar afastada da Instituição, mas se uma
mulher precisar de mim, pode saber que lutarei por ela. Foi isso o que
aprendi como a nossa mãe, e esse legado eu faço questão de honrar.
— Eu quero uma explicação para esse circo Irya? O que você está
fazendo aqui neste motim? — Aleksey começou a falar visivelmente
alterado — Você ajudou a orquestrar essa palhaçada toda? E essa jovem que
eu não sei quem é, o que está fazendo aqui? E espera... Calem todos a porra
da boca. O que você falou sobre ela, Alya?
— Depois de tantos anos juntos — Irya falou com seu tom de voz
baixo e intimidador — eu pensei que você soubesse Aleksey, que eu não
orquestro palhaçadas. Isso tudo aqui é sério demais, e se eu estou aqui é
porque mais uma mulher foi vítima das atrocidades desta Instituição, e neste
caso pelo monstro do seu pai. O que vai ser dito aqui não será fácil para você
digerir, porque envolve um passado que parecia ter sido enterrado com a
Bratva, mas que ressurgiu e precisamos resolver.
— Meu pai, por favor, sente-se — Alya pediu — Senhores, sentem-
se porque a nossa conversa vai ser um pouco longa.
​Eu queria uma explicação do porquê Raissa estava com a Máfia das
Mulheres, mas ela me pediu só movendo os lábios, sem emitir nenhum som,
que eu esperasse e sorriu.
​— Enzo, o que está acontecendo aqui? E por que você está com esse sorriso
idiota na cara? — Pietro me perguntou baixo para que ninguém escutasse.
​— Fodasse se eu estou ou não com cara de idiota. Essa mulher é tudo para
mim. Ela sabia que o único motivo para eu me casar era protegê-la e o que a
minha jornalista doidinha fez? Se juntou a Máfia das Mulheres sei lá com
que argumento, mas só te digo uma coisa: Ela é fodaaaaaa!
​— Você combinou isso com ela? — Responda Enzo Cosa Nostra, meu pai
falou me olhando com ódio.
​— Não meu pai, mas como eu disse antes de vir para o sacrifício, se
existisse uma chance de a Raissa ser minha, lutaria por ela, e parece que isso
aconteceu.
​— Será que os homens da Instituição podem deixar que nossas futuras
Chefes, Luna e Alya falem? — Sarah falou interrompendo as conversas
paralelas que ocorriam dentro da sala de reuniões.
​— Vai para o inferno, Sarah Cooper — Dante gritou — Eu fiz um acordo e
minha palavra é Lei.
​— E sua palavra será cumprida meu pai, eu lhe garanto — Luna falou —
Agora permitam que eu e Alya falemos porque viemos aqui e afirmamos que
Raissa é uma filha da máfia.
​— Uma Mikhailova — Alya completou.
​— Eu não traí a minha esposa ou engravidei qualquer mulher fora do
casamento, isso é uma calúnia e eu vou acabar com quem inventou isso —
Aleksey falou sacando a arma e antes que desse tempo de ele apontar para
Raissa, eu corri sem pensar em mais nada me colocando à sua frente, sendo
que Irya foi ainda mais rápida, e se colocou como um escudo humano na
nossa frente.
​— Você não me traiu meu amor, escute tudo, por favor. Abaixe a arma,
Aleksey, aqui estamos entre os nossos.
Irya fez sinal para minha mãe que me pediu para sentar, assim que
Aleksey fez o mesmo, eu fui para o meu lugar, mas fiquei com minha mão
na minha arma. Eu poderia morrer, mas não sem antes defender Raissa de
qualquer um que estivesse naquela sala.
— Tudo aconteceu há muitos anos, quando o senhor, meu pai, tinha
apenas cinco anos. Era uma noite fria, nevava, e você só queria brincar do
lado de fora, e como seu pai não permitia esses momentos na sua vida, do
nada o senhor saiu correndo e escorregou nas escadas da mansão Bratva,
sendo acolhido por uma jovem, que se tornou a sua babá. Seu nome era
Polina, ela tinha sido usada como moeda de troca com a Tambovskaya de
San Petersburgo, e a história dela virou uma tragédia desde então, e piorou
quando foi parar no coração da Elite Vermelha.
Eu respirei fundo e olhei para Raissa. Me lembrei dos seus avós e de
achar que eles escondiam algo. A senhora Polina tinha um olhar vazio, e
agora tudo começava a fazer sentido. Ela foi babá de Aleksey Mikhailov e
com certeza vítima do demônio do seu pai.
Durante todo o tempo em que Alya relatou com detalhes o passado
de Polina e sua ligação com a Bratva, Raissa ficou de olhos fechados, e eu
pude perceber o quanto ela estava sofrendo ao escutar cada palavra de uma
história que parecia não ter fim.
— E foi então, que Polina, que estava recém-casada com Nikolay,
fugiu para os Estados Unidos, onde teve sua filha Yelena, que para todos era
fruto de um casamento feliz. Os anos se passaram e Yelena se casou, e teve
uma filha, que está aqui nessa sala — Aya falou e caminhou até Raissa.
— Quis o destino que os dois filhos do demônio, Aleksey e Yelena,
tivessem uma filha mulher no mesmo ano. O meu sogro queria tanto um neto
homem, e ganhou duas netas de uma só vez. Eu espero que você esteja no
Inferno me vendo rir da sua cara seu velho maldito — Irya falou olhando
para o chão.
— Uma bastarda, é isso que ela é… — Rurik falou invadindo a sala
acompanhado do conselho Bratva — Nós escutamos tudo e eu não sei o
motivo desse assunto ser tratado no dia do noivado oficial da minha filha,
mas seja como for, bastardos não são nada.
— Se a sua futura Chefe diz que Raissa é uma Mikhailova, o senhor
trate de abaixar a cabeça e concordar — Alya falou colocando sua arma
colada na testa de Rurik que ficou em choque, enquanto os outros homens do
conselho ficaram em silêncio.
— Como você sabe que tudo isso é verdade, Alya? — Aleksey
perguntou sem se importar com Rurik ou o conselho Bratva. Ele comandava
tudo a ferro e fogo, e sua palavra final era a Lei, e quem não concordasse
morria e ponto final.
— O senhor acha que eu viria aqui com uma impostora, meu pai? Eu
procurei pela empregada da mansão a época em que Polina cuidou do
senhor, também conversei com a minha avó, que ainda se lembra da Polina e
do dia que ela foi deixada no hotel pegando fogo.
— Você falou com a minha mãe sobre um assunto desses?
— Sim, eu falei. Yelena é sua irmã e Raissa, sua sobrinha, meu pai.
— Uma bastarda? Bastardos não tem família — um associado falou
se intrometendo na conversa entre pai e filha — Chefe, o senhor não pode
considerar um absurdo desses porque seria um precedente.
— Cala essa sua boca de merda, porque não permiti que ninguém me
dirigisse a palavra — Aleksey gritou — E o que eu considero ou não é
decisão minha, e de mais ninguém.
— Bastardos sempre foram a escória… — Um dos associados falou
olhando para Alya.
​— Cala a boca seu verme nojento — Alya gritou — Não querem bastardos,
senhores? Simples, guardem essa merda de pau que vocês têm dentro das
calças e só usem se estiverem com as suas esposas.
​— Era só o que faltava agora na máfia — o homem falou rindo das palavras
de Alya e segundo depois foi parar no chão, gritando como um louco, sem
pau e com a calça coberta de sangue.
​Alya era fria e implacável como seu pai. Com ela não existia segunda
chance, e quando ordenou que levassem o homem sem pau da sala, os
soldados entraram correndo e limparam tudo.
​Olhei para Raissa que estava em choque, e fiquei me perguntando se ela
sabia realmente onde estava se metendo por minha causa. Será que o nosso
amor seria capaz de suportar tantas diferenças?
​— Mais alguém quer falar alguma coisa sobre bastardos não existirem? —
Alya perguntou e o conselho da Bratva se calou.
​— Então passemos ao segundo assunto da noite — Luna falou — O noivado
de Enzo.
​— O que têm o noivado do Enzo e Natalya? — Rurik perguntou.
​— O noivado deles será desfeito… — Luna falou e Rurik pegou sua arma.
Dante então apontou também uma arma para Rurik, e o caos se instalou.
— Já chega! — Sarah Cooper falou e atirou para o alto e todos se
entreolharam — Quando vocês vão aprender a não interromper uma mulher
quando ela estiver falando?
​ Continuando de onde eu parei — Luna falou — o acordo continua de pé,

apenas trocaremos o noivo.
​— O que? — Dante perguntou confuso.
​— Meu pai, eu não deixaria o senhor faltar com a sua palavra e não ajudaria
Raissa, deixando Natalya desamparada. Eu pensei nas duas, sendo assim,
Natalya vai se casar com Matteo, que também é um Cosa Nostra, e pense,
meu pai, Raissa é uma Mikhailova, então, com certeza o senhor vai querer o
casamento dela com Enzo, ou não?
​Meu tio ia responder quando Aleksey despertou dos seus pensamentos que
ele com certeza estava tentando colocar em ordem.
​— Já chega! — Ele falou com sua voz fria e autoritária — Rurik, aceite a
proposta da Cosa Nostra porque para você tanto faz casar sua filha com
qualquer um da família deles. Enzo ou Matteo não faz a menor diferença.
Essa reunião está encerrada. Apresentem os noivos, Matteo e Natalya
oficialmente na festa preparada para essa noite, e nos vemos no casamento
deles. Eu e minha família estamos indo embora — Aleksey falou e todos
ficaram em silêncio — Irya, Alya… e você também, Raissa, vamos para
casa.
​— Eu… — Foi a primeira vez que escutei a voz de Raissa desde que ela
chegou.
​— Vamos embora — Aleksey repetiu sem olhar para ela.
​— Senhor… Mikhailov… Aleksey… — Eu falei sem saber como me dirigir
a ele naquele momento — Será que eu posso falar com a Raissa?
​— Não, você não pode — Aleksey respondeu me olhando com raiva —
Lorenzo me procure com as intenções do seu filho e estudarei o assunto no
futuro. Boa noite a todos.
​— Vai com ele — Sarah falou para Raissa que me olhou perdida no meio de
tudo aquilo.
​— O senhor não pode levar uma bastarda como se fosse sua sobrinha
legítima — Um associado da Bratva falou dando adeus a esse mundo, pois
Aleksey só virou e atirou.
​— Eu não admito que questionem minhas decisões e os senhores sabem
muito bem disso — Aleksey falou, passou por cima do corpo do associado
morto e foi embora, sendo seguido por sua esposa, Alya e Raissa.
​— Muito bem, Rurik, nosso acordo então continua e sua filha vai se casar
com o meu sobrinho, Matteo, filho de Giancarlo? — Dante falou como se
nada de errado tivesse acontecido naquela sala.
​ Acordo fechado — Rurik falou apertando a mão dos meus tios Dante e

Giancarlo.
​Eu estava preocupado com Raissa que foi embora com um tio que ela não
conhecia, mas precisava falar com Matteo.
​— Meu primo, eu não queria que você se casasse no meu lugar, e não sei o
que te dizer.
​— Quando Luna me procurou eu disse a ela que estava pronto. Somos a
Cosa Nostra, e precisamos ficar unidos. Para que entrarmos numa guerra se
temos a solução, e no final nossos pais devem estar muito felizes, porque se
eles queriam uma aliança mais forte com a Bratva, conseguiram, porque
Raissa é uma Mikhailova.
​— Vai ficar tudo bem, Enzo — Luna falou me abraçando.
​— Desde quando você sabia disso tudo, Luna?
​— Eu soube tem poucos dias. Sarah nos procurou, a mim e Alya, e enquanto
ela buscava provar a história de Raissa, eu tentava resolver o acordo feito
pela Cosa Nostra e proteger Natalya de ser uma largada.
​— Muito obrigado por tudo, só que agora…
​— Agora você está preocupado com Raissa, mas acredite, ela vai ficar bem.
Enzo, ela é uma Mikhailova, e provou isso enfrentando tudo vindo até aqui
lutar pelo amor dela. A mulher não tem medo de nada não, e isso explica por
que ela entregou a Salvatrucha — Luna falou rindo — Ela é implacável
como Alya.
​Já era tarde, e na parte de baixo os convidados esperavam sem saber de nada
que tinha acontecido, para ver a apresentação dos noivos. Meu pai então deu
boa noite a todos, e disse que o melhor era que eu, ele e minha mãe fôssemos
para casa.
Ele estava certo, já que como meu primo ficaria noivo oficialmente
no meu lugar, era melhor eu não estar presente para ficarem fazendo mais
perguntas.
O clima que antes estava tão tenso agora era de calmaria. Era
impressionante como só importavam os lucros para todos se acalmarem.
Rurik não iria perder nada, Dante não deixou de cumprir a palavra
dele, o meu pai que antes não queria saber da Raissa já devia estar
preparando um acordo que interessasse a Aleksey.
Sim, isso é a máfia, o lugar onde nasci, o mundo que eu conheço,
onde no final só importa o quanto em espécie você têm a oferecer para tudo
ficar bem.
E se para todos estava tudo bem, para mim agora existia o medo de
não ter o suficiente para que Aleksey me deixasse casar com a sua sobrinha.
Capítulo 50
Raissa

​O carro seguia em alta velocidade por uma estrada escura e certamente


coberta de neve, o que me fazia pensar que aquelas pessoas da máfia eram
realmente loucas por não temerem sofrer um acidente.

— Как скоро мы доберемся черт знает куда, Юрий? (Falta muito


tempo para chegarmos sei lá onde, Yuri?)

​— Нет, мисс. (Não, senhorita.)

​ oi tudo tão rápido que eu não tive tempo para raciocinar direito sobre tudo
F
o que aconteceu na festa de casamento, e muito menos para conversar com
Enzo. Na verdade, se eu troquei duas palavras com ele foi muito, tipo, oi e
tchau.

​ u só conhecia o lado da máfia, sequestrada numa boate, e amante de


E
mafioso em Dubai, mas a festa de hoje me fez ver que eles são tão perigosos
quanto loucos. Essa sociedade é literalmente pré-histórica, com casamentos
arranjados e morte para lavar a honra.

Fiquei impressionada com Alya que soube colocar o pai da noiva


no seu devido lugar quando ele falou sobre filhos bastardos, e mais ainda
com Dante Cosa Nostra, que trocou o sobrinho que ia se casar por outro,
como quem troca de roupa.

Quando Sarah Cooper disse que eu tinha muito o que aprender sobre
a máfia, ela realmente não estava brincando.

​ velocidade do carro diminuiu me despertando dos meus pensamentos, e


A
meu coração disparou e meus olhos se encheram d'água, quando vi um
portão de ferro enorme se abrindo, e à medida que avançávamos foi
inevitável sentir um arrepio por todo o corpo, afinal, eu estava entrando na
mansão Bratva e não sabia o que esperava por mim, e apertei com força uma
mão na outra enquanto olhava pela janela a imensidão daquele lugar.

Aos poucos fomos nos aproximando da casa, que para mim era como
um castelo dos filmes de terror. Por instantes foi como se a minha avó
estivesse narrando para mim a sua história quando chegou neste lugar. Tudo
era exatamente como ela descreveu, e quando Yuri abriu a porta do carro e
eu saltei em frente as enormes escadarias daquela mansão, senti um calafrio,
lembrando que um dia minha avó Polina esteve aqui para viver a parte mais
triste e sombria da sua vida.

​ Venha comigo! — Irya falou sorrindo e se aproximando de mim, e eu



pude ver Aleksey Mikhailov subindo as escadas sem olhar para trás logo
depois de deixar o seu carro que vinha na frente do meu.

​ Não ligue para o meu pai, amanhã ele vai estar um pouco mais calmo e

vocês vão conversar — Alya falou saltando do seu carro — Nada como uma
boa conversa com a senhora Mikhailova para a fera acalmar e pensar melhor.

​ Eu não tenho nada para falar com ele, na verdade eu nem sei o que estou

fazendo nesta casa. Sinceramente, eu não quero entrar, eu preciso falar com
Enzo, foi por isso que eu vim e…

​ Infelizmente não é tão simples assim minha prima. Você é uma



Mikhailova, bastarda ou não, e o meu pai é quem vai decidir o seu futuro.

​— O que? Como assim?

​ Você veio aqui para contar que é uma filha da máfia, e não uma qualquer,

mas sobrinha do Chefe da Solntsevskaya Bratva. Assumir seu lugar nessa
sociedade não te faz noiva do Enzo, mas membro da Instituição, com suas
leis que sempre têm que ser cumpridas.

​— Bem-vinda a máfia, Raissa Mikhailova.

∞∞∞
​ u entrei no salão daquele imenso castelo, e lá dentro a decoração era
E
moderna, com tons claros contrastando com a arquitetura antiga daquele
lugar. Se do lado de fora o castelo causava calafrios, a parte de dentro
parecia acalmar quem vivia naquele local.

​— Eu imaginava esse salão bem diferente.

​ Era assustador, sombrio e com uma energia que parecia que você estava

entrando no inferno. Quando eu me mudei para cá me senti muito mal,
odiava andar pela casa, e se eu fui a cozinha uma vez foi muito — Irya falou
olhando ao seu redor como que recordando de um tempo ruim — Mas
depois que o velho infeliz morreu, eu mudei tudo aqui dentro. Quebrei
paredes, pintei todas com tons claros, comprei móveis modernos e se o lado
de fora precisa intimidar nossos inimigos, a parte interna só precisa trazer
paz aos moradores.

​ A minha avó descreve esse lugar exatamente como você. Ela disse que

quando chegou aqui foi como entrar no inferno, e mesmo com tudo
modificado, me dói saber tudo que ela sofreu neste lugar. Eu não posso ficar
aqui, preciso ir embora, odeio esse lugar, me desculpe, eu sei que é a sua
casa, mas…

​ Raissa, você precisa descansar, amanhã vamos conversar melhor e eu



garanto que vamos resolver tudo da melhor forma possível. Você não está
entrando nessa casa como a sua avó, e sim, como uma Mikhailova, e
nenhum mal vai te acontecer. Aleksey é frio e severo, mas ao mesmo tempo
doce e protetor com aqueles que ama.

​— No caso ele não me ama, então corro sérios riscos neste lugar.

​ Acredite em mim, se o meu marido enfrentou todos e disse que ninguém



tocaria em você, é porque ele sabe que você é sobrinha dele, mesmo que
internamente lute com tudo que ficou gravado na sua mente, como por
exemplo, bastardos não são filhos legítimos. Ele sabe que os tempos
mudaram, e que precisamos evoluir por mais que muitas leis precisem ser
mantidas para que a Instituição permaneça de pé. Ele não te trouxe para essa
casa como prisioneira, mas como sua sobrinha e parte da sua família. Ele
precisa digerir tudo que aconteceu, mas nunca se esqueça, que quando tudo
aconteceu, seu tio só tinha cinco anos e foi tão vítima daquele monstro como
a sua avó.

I​ rya estava certa, e eu não queria ser impulsiva falando coisas que poderia
me arrepender mais tarde. Eu aprendi que nem tudo se resolve no primeiro
minuto, mesmo que um lado meu deseje sair correndo daqui gritando que
odeia os Mikhailov.

​ lya me levou até o meu quarto e fiquei feliz quando vi a minha mala com
A
as minhas coisas.

​ Assim que você desembarcou, suas malas já foram para o carro que

trouxe você aqui para a mansão.

​— Como você sabia que eu viria para cá?

​ Minha mãe mandou preparar o seu quarto assim que soube de tudo, ou

seja, independente do que acontecesse, ela já te considerava sua sobrinha, e
quando ela decide alguma coisa, acredite, só resta ao meu pai esbravejar,
matar uns cem inimigos, e depois voltar e aceitar sua decisão.

​— E Enzo? Eu preciso falar com ele.

​ Suas coisas estão todas aqui, inclusive seu celular. Você acha que eu ia

deixar minha prima sem falar com o seu amor até que meu pai decida o
futuro de vocês? Segredo nosso! Aproveite que nós da família podemos ter
celular, os convidados têm que entregar tudo quando chegam e usar
aparelhos controlados pela Bratva dentro da mansão.

​ lya me deixou sozinha e juro que algo dentro de mim me dizia para abraçá-
A
la, mas um outro me impedia de demonstrar sentimentos. Estranho, que em
pouco tempo na Rússia, já consegui descobrir com quem eu me pareço tanto,
e me assusta saber que é justamente com o meu tio.

​ u me joguei na cama, liguei o meu celular para mandar uma mensagem


E
para Enzo e meu coração disparou quando vi que ele já tinha deixado
algumas mensagens para mim.
Enzo: Raissa, você está bem? Assim que puder me liga.

Enzo: Estou ficando preocupado, mas também não sei nem se você
está com o seu celular.

Enzo: Você é muito mais doida do que eu imaginava. Não acreditei


quando te vi chegando no meu casamento.

Enzo: Raissa, devo acreditar que agora que você é uma Mikhailova,
está me esnobando?

Raissa: Realmente Cosa Nostra, agora preciso saber o que vou


ganhar me casando com você? Não sei se você sabe, mas a minha família é
mais poderosa do que a sua!

Enzo: Um dia na Elite Vermelha e já está mostrando as garras?

Raissa: Meu amor, você vai ver as minhas garras, mas não afiadas
pela máfia.

Enzo: E onde elas vão estar?

Raissa: No seu pau é claro!

Enzo: Você é perigosa, senhorita Mikhailova!

Raissa: E você sabe bem disso, não é mesmo, senhor Cosa Nostra.

Enzo: Se eu pudesse invadia esse castelo e roubava você para mim.

Raissa: Achei que você era bem-vindo aqui?

Enzo: Isso foi antes de me deitar com a sobrinha do Chefe da Bratva.

Raissa: Eu não quero ficar aqui nessa casa. Eu vim para ficar com
você.

Enzo: Vamos resolver isso assim que o seu tio marcar uma reunião
com o meu pai e o meu tio.
Raissa: Reunião?

Enzo: Você agora é uma filha da máfia, meu amor, e para ficarmos
juntos muita coisa vai precisar acontecer. Uma aliança dessas é grande
demais para ser fechada de uma hora para outra. Afinal, eu me apaixonei por
uma jornalista doida e encrenqueira, que de um dia para o outro, se
transformou em uma das herdeiras da Solntsevskaya Bratva.

Raissa: Eu não quero esperar para ver você.

Enzo: Tenha calma, que vou fazer de tudo para que em breve você
seja Raissa Mikhailova Cosa Nostra. Eu te amo, e vou lutar para que o seu
tio me aceite como seu futuro marido.
Capítulo 51
Aleksey Mikhailov

​Eu precisava esfriar a minha cabeça que estava dando voltas depois que
deixei a reunião onde a minha filha Alya, e Luna, despejaram uma bomba
sobre a minha cabeça.
​Uma irmã bastarda.
​Uma sobrinha bastarda.
​Nada disso tem importância na nossa sociedade, mas ver minha filha, minha
herdeira, defendendo o que ela acredita com tanto empenho, me fez escutar e
mais uma vez fazer valer na força a minha decisão.
​Alya é o meu orgulho!
Ela é igual a mim quando quer que a escutem. Minha continuação
perfeita, por quem eu declaro guerra se for preciso para fazer valer a sua
vontade, ela só não pode saber disso, porque não aceito que ninguém
conheça minhas fraquezas, e minha filha, é sem dúvida alguma, a maior de
todas elas.
​Outra mudança vai acontecer na Instituição, agora com um assunto nunca
discutido, mas que certamente vai causar uma grande polêmica. Alya foi
clara que se não querem bastardos, então não os façam, deixando a entender
que por ela todos serão reconhecidos.
​Eu podia duvidar desta jornalista, a tal Raissa, mas se minha filha e minha
esposa deixaram tudo chegar tão longe, então não me restava nenhuma
dúvida que fosse tudo verdade.
​— Por que você não me contou isso antes desta reunião? — Eu perguntei
para minha esposa quebrando o silêncio dentro do carro que nos levava para
casa.
​— Eu soube pouco antes da reunião. Sarah conversou sobre isso apenas com
Luna e Alya, as futuras Chefes, e convocou a Máfia das Mulheres já quase
na hora de interrompermos a reunião.
​— Essa Sarah Cooper é uma bomba relógio que sempre explode nas nossas
cabeças e na Instituição.
​ Sarah só faz brigar por justiça para nós mulheres da máfia, a bomba que

explodiu hoje foi causada pelo seu pai que sempre foi um monstro e causou
tanto mal por onde passou.
​— Ela desenterrou algo que parecia ter sido enterrado no Inferno Bratva.
​— Mais uma vez a profecia maldita se confirmou: quem nasce na máfia,
morre na máfia. Tantos anos depois, coitada dessa senhora, Polina, teve que
expor suas dores para ver sua neta feliz. Ela escondeu a filha de tudo e de
todos, e no final seu sangue ruim falou mais alto, e moveu mundos para
revelar sua origem e levar a mafiosa de volta para o seu verdadeiro lar
criminoso.
​— Você está falando…
​— Da sua irmã, meu amor.
​— Os bastardos nunca tiveram direito a nada, e agora você quer que eu
divida o que eu tenho com alguém que eu nunca vi na minha vida.
​— Ninguém quer nada seu, Aleksey. Duvido que Yelena pense em
reivindicar algo que vem de um ato tão maldito. Ela só quer ver a filha feliz,
mais nada…
​— Irya meu amor, você falando me lembra aquela jovem ingênua com quem
eu me casei. Não existe isso de ver a filha feliz. Se eu reconheço Raissa, o
que aliás, já fiz trazendo essa jornalista para casa graças a você e Alya,
automaticamente reconheço que tenho uma irmã que a essa altura já é alvo
de todos os nossos inimigos.
​— Eu não tinha pensado nisso… foi tudo muito rápido.
​— Na máfia não podemos dormir por isso, tudo acontece em segundos, e se
piscarmos, adeus.
​— Você não se lembra da Polina?
​— Eu não me lembro de nada da minha vida antes de você. Sempre fiz
questão de não guardar lembranças, já que tudo que eu tinha que fazer
mesmo era obedecer ao meu pai até o dia que eu me tornasse Chefe.
​— E agora? O que vai acontecer?
​— Eu preciso pensar, mas de qualquer forma, amanhã, você, Alya e… a
jornalista, vão ao casamento.
​— O nome dela é Raissa.
​Eu não queria mais conversar, precisava tomar decisões urgentes, e mandei
uma mensagem para Yuri que estava acompanhando a tal Raissa no carro
que seguia também para a mansão Bratva.
​ ssim que chegamos fui direto para o escritório esperar por Yuri e decidir o
A
que eu faria a partir de agora.
​— Senhor, vou passar essa noite providenciando todos os relatórios.
— Redobre a segurança da minha família, porque amanhã vamos
viajar.
​— Posso saber para onde vamos, ou se preciso tomar alguma providência?
​— Vamos para a Filadélfia, e a seguir para Los Angeles. Localize o chefe da
Salvatrucha, porque eu quero fazer uma visita.
​— Podemos mandar nossos homens…
​— Os meus assuntos pessoais resolvo eu mesmo. Quero estar de frente com
esse merda que comanda a Salvatrucha, logo após a minha ida a Filadélfia.
​— Sim senhor, providenciarei tudo.
​Antes de ir para o meu quarto, eu resolvi ir tomar um ar porque pensei que
iria sufocar com tantos problemas novos que surgiram do nada, e assim que
abri a porta começou a nevar mais forte.
​Olhei para a escada coberta de neve e tudo que estava guardado no fundo da
minha mente parecia querer sair a força, e comecei a escutar meus gritos
dizendo que queria brincar, como se eu fosse um menino normal, e de uma
voz que dizia, por favor, não saia, você não pode brincar.
​Me aproximei da escada e escutei meu choro, e uma voz doce dizendo que
eu ficaria bem.
​INFERNO!
​Eu não queria me lembrar. Eu não gosto do passado.
​Eu só gosto de me lembrar da minha vida a partir do dia que Irya passou a
fazer parte dela quando nos casamos.
​Que vida merda que eu tive. Que criação horrível.
​Eu fui para o meu quarto tomar um banho e relaxar, mas assim que entrei o
grito de várias mulheres pareciam ecoar na minha mente.
​— O que aconteceu, Aleksey? — Irya perguntou e veio correndo me abraçar
— São os pesadelos? Você nunca mais teve nenhum com os ratos, ou com o
Inferno Bratva.
​— Minha infância não foi miserável só pelo Inferno Bratva. Eu cresci vendo
muita coisa, escutando muitos gritos. Eu desligava a minha mente e jantava
em silêncio, ou ficava olhando para o nada. Eu nunca quis ver ou escutar
nada que o monstro fazia.
​— Oh meu amor, você era uma criança, deveria ter sido protegida, amada, e
não sofrido todos os tipos de abusos.
​ Eu preciso tomar um banho e esperar amanhecer, porque amanhã o meu

dia será longo e assim que os relatórios que eu pedi para Yuri chegarem eu
vou viajar.
​— Eu posso saber para onde você vai?
​— Não, porque além de minha esposa você é da máfia das mulheres, e quero
fazer tudo sozinho e do meu jeito.
​— Sim senhor, Chefe — Ela falou indo se deitar — Eu entendo que esse é
um momento seu, e que você quer resolver da melhor maneira possível, mas
você sabe que se precisar…
— Eu tenho você.
​— Sim, eu te amo meu anjo das trevas. Por favor, faça o que for preciso para
resolver isso tudo, e vencer mais esses fantasmas que estão dentro da sua
mente.

∞∞∞

​ ssim que amanheceu, coloquei o meu coldre com as minhas armas, minha
A
camisa preta, minha gravata vermelha escarlate e meu terno preto. Na minha
mala coloquei poucas peças de roupa, já que não pretendia ficar mais de
quarenta e oito horas fora, só iria resolver tudo e retornar para decidir o
destino da minha… sobrinha.
​— Bom dia, senhor — Yuri falou assim que eu entrei no escritório — Os
relatórios que o senhor pediu estão na sua mesa.
​— Mande que chamem Raissa, eu quero falar com ela.
​— Sim, senhor.
​Eu já estava irritado porque além de não gostar de esperar, eu ainda
precisava viajar e pelo visto a minha… sobrinha… estava tentando testar a
minha paciência.
​— O senhor pediu para chamar, Raissa, meu pai — Alya falou entrando com
a jornalista no meu escritório.
​— Sim, mas por acaso ela não tem língua? Para quem segundo esse relatório
desafiou a Salvatrucha eu pensei que ela fosse mais corajosa.
— Eu não sei se sou corajosa, mas aqueles monstros me
sequestraram, me fizeram viver um inferno, e se era para morrer já que me
ameaçaram, então que tivessem dias ruins também. Mas eu já entendi que
não poderia fazer isso, que errei e…
​ Se você não tivesse feito nada, então não teria o sangue da Elite

Vermelha. Não mandamos recado. Eliminamos nossos inimigos. Eu estou
indo viajar. Alya, eu quero que você, sua mãe e Raissa compareçam ao
casamento essa tarde.
​— Casamento? Eu não vou neste casamento…
​— Isso é uma ordem! — Eu falei e Raissa ia falar algo mas vi quando Alya
pediu que ela se calasse — Você viajou para Dubai com Enzo Cosa Nostra?
​— Ele disse que seria mais seguro para mim enquanto ele cuidava da minha
segurança.
​— E então ele resolveu te proteger na cama dele? — Eu perguntei e fiz sinal
com a mão que não queria resposta — Eu preciso viajar — Eu falei deixando
o escritório e sendo seguido por Alya e Raissa.
​Senti meu celular vibrando na minha mão e quando olhei a tela respirei
fundo antes de atender.
​— Lorenzo Cosa Nostra, você demorou tanto para entrar em contato comigo
que achei que precisaria eu mesmo te procurar para te lembrar que eu
poderia reparar com sangue a desonra que seu filho causou na minha
família.
​— Mikhailov, o meu filho não sabia que…
​— E você, meu caro? — Eu falei o interrompendo — Até onde eu sei, você
não queria Raissa para esposa do seu filho, o que mudou para você estar me
ligando? Ah claro, o sangue nobre dela. Trate de abrir generosamente sua
conta bancária, e avisa a Dante que não me venha com pequenas porções da
Cosa Nostra como dote, porque seu filho ousou tocar em algo proibido e
vocês vão reparar isso.
​— Eu não sou homem de fugir das minhas responsabilidades, e desde ontem
já tinha decidido te procurar e propor um acordo de união entre o meu filho e
Raissa, uma vez que ficou claro que você a reconheceu como sua sobrinha
legítima.
​— Eu vou fazer uma viagem, e na volta nos sentaremos para conversar, mas
até lá avise o seu filho para se manter longe da minha família.
​Eu mal terminei de falar e senti meu ar saindo dos meus pulmões. A porta da
minha casa se abriu e Enzo entrou como se estivesse vindo aqui fazer uma
visita informal quando ainda era bem-vindo nessa casa.
​— Você criou muito mal o seu filho Cosa Nostra, porque ele acabou de
entrar na minha casa.
​— Enzo está aí?
​ Você por acaso tem algum outro filho sem noção alguma da nossa

Instituição para vir aqui na minha casa depois de tudo que ele fez?
​— Enzo meu querido — Irya surgiu na sala falando e o abraçando — Que
bom que Nina te deu o recado e você veio.
​— Infelizmente Cosa Nostra, nossas esposas são muito mais sem noção do
que qualquer pessoa da nossa sociedade — Eu falei desligando o celular.
​— Enzo você veio! — Raissa falou quando o viu e tentou correr até ele, mas
Alya a impediu.
​— Eu sei que eu deveria esperar o meu pai e o senhor conversarem, mas…
​— Mas eu o chamei para vir aqui — Irya falou — porque Raissa estava
muito apreensiva, o que é natural, afinal ela não nos conhece. Essa menina
cruzou o oceano por amor e achei justo que eles pudessem conversar.
​— Ele que ouse se aproximar dela novamente antes do casamento. Se
houver casamento porque o contrato vai ter que ser muito bom, ou vou lavar
a honra da minha família com sangue. Você vem comigo — Eu falei me
virando e sendo seguido por Enzo até o meu escritório.
​Entramos no meu escritório e eu tranquei a porta para não ser interrompido.
​— Senhor Mikhailov, eu quero deixar claro que tenho a intenção de me casar
com Raissa…
​— Agora que ela é minha sobrinha, é claro.
​— Não senhor. Eu amo Raissa, e só estava me casando, primeiro porque na
nossa sociedade não temos direito de escolher nossas esposas, segundo,
porque Raissa… bem, ela é uma bomba ambulante e atrai milhares de
inimigos por segundo. Ela desafiou a Salvatrucha depois do sequestro,
mesmo depois de eu ter falado que isso era perigoso demais. Ela é muito
teimosa, e sempre faz o que quer.
​— Ela é uma Mikhailova, por isso não tem medo de ninguém.
​— Eu algumas vezes cheguei a falar que se ela fosse da Máfia seria da
Bratva, porque ela sempre está usando algo vermelho escarlate. Mas
voltando ao que aconteceu, eu só queria protegê-la de todos os perigos e
deixar ela viver. Raissa é impulsiva, alegre, doida, explosiva, intensa, linda.
Ela merecia viver! E o que seria dela ao meu lado? Se eu largasse tudo, e
caísse no mundo com ela, quanto tempo demoraria até que fôssemos
sequestrados como meu tio Giancarlo? Eu preferia um casamento infeliz, do
que ser responsável pela morte da dona do sorriso mais lindo desse mundo.
​— Eu estou vendo que você ama Raissa, ou não teria tido a coragem de vir à
minha casa mesmo sendo a convite da minha esposa.
​ Ela está confusa, numa casa com estranhos. Eu nunca poderia imaginar

que o segredo da família dela fosse esse. Eu senti o medo na voz, no olhar e
na respiração dos seus avós. Eu vi dor nos olhos da senhora Pavlova. Só que
para mim eles eram russos exilados, com medo de serem mandados de volta
para cá. Nunca imaginei um passado tão sombrio ligado à nossa Instituição.
​— Você a conheceu?
​— Quem?
​— A mãe da Raissa.
​— Yelena, a senhora O`Brien? Sim, eu conheci num almoço de família que
Raissa me levou.
​— Como ela é?
​— Uma senhora elegante, muito bonita, com os cabelos no mesmo tom que
o seu, agora reparando bem, a cor dos olhos também é igual. Ela é advogada
e bem-sucedida na profissão. Eu a achei uma pessoa reservada, observadora.
Acho que a única que fala demais naquela família é Raissa.
​— Eu estou indo à Filadélfia, mas ninguém deve saber. Eu preciso resolver
esse assunto antes de decidir o destino de Raissa. E você vem comigo.
​— Eu, senhor?
​— Sim. Primeiro que não quero você perto da minha casa enquanto eu
estiver fora, segundo porque é do seu interesse eu suponho o que vai ser
decidido nessa viagem, e em terceiro porque depois iremos a Los Angeles
porque eu tenho algumas contas para acertar por lá.
​— E quando partimos?
— Agora.
​— Eu posso falar com Raissa, antes de viajarmos.
​— Não.
​— Eu não vou falar aonde estamos indo.
​— A resposta continua sendo não — Eu falei pegando o meu celular e
discando um número.
​— Sim, senhor.
​— Lorenzo Cosa Nostra — Eu falei assim que escutei ele atendendo o
celular — Eu e seu filho iremos fazer uma viagem para resolver todo esse
assunto. Prepare a sua proposta de casamento, porque depois desta viagem
decidirei o destino de Raissa.
Capítulo 52
Raissa

​O dia amanheceu na mansão Bratva depois de uma das noites mais longas
da minha vida.
Apesar de todo o cansaço, eu não consegui dormir nem por um
segundo, e passei a noite sentada próxima a janela vendo a neve cair.
​Agora eu entendo por que minha avó permanecia assim por horas no
inverno, sentada em sua cadeira de balanço olhando a paisagem pela janela.
A Filadélfia lembra a Rússia com seus flocos de neve, e com certeza a
faziam lembrar do seu maior pesadelo.
​Eu tive medo de me perder neste castelo dos horrores, só que eu estava me
sentindo sufocada e por isso me arrisquei a sair do meu quarto durante a
madrugada, mas os seguranças me seguiram e não me senti nem um pouco à
vontade.
​Quando cheguei no alto da escada, eu vi Aleksey Mikhailov entrando em
casa e ele parecia atormentado. Eu fiquei com medo de que ele me visse e
achasse que eu o estava vigiando, e voltei correndo para o meu quarto.
Infelizmente parece que eu e… o Chefe da Bratva… meu tio… tivemos a
mesma ideia de tomar um ar fresco depois de tanta confusão.
​A máfia é muito pré-histórica e quanto mais eu recordava da reunião com os
Chefes mais poderosos da Instituição, mas eu achava que tinha vivido uma
cena do filme O Poderoso Chefão.
​A máfia das mulheres, que eu tanto pesquisei a vida toda, estava reunida
para me ajudar. Como o mundo pode dar tantas voltas assim?
​EU VI SARAH COOPER A RAINHA DA MÁFIA, FAZENDO OS
HOMENS SE CALAREM.
​No meio do caos, eu pude viver esse momento, de ver uma mulher fazer toda
uma sociedade machista se curvar ao som da sua voz.
​ u ainda estava eufórica pensando em Sarah Cooper, quando liguei para
E
minha mãe, que com certeza estava preocupada comigo, e para quem eu
jurei que agora não teria mais segredos.
​Chega de segredos de família!

FLASHBACK
— Até que enfim você deu notícias. Onde você está, minha filha?
— Neste momento, na Mansão Bratva. Por isso quis ligar só para
você, não tinha como fazer essa chamada de vídeo com a minha avó junto.
Se para mim estar aqui dói forte no peito, imagina ela vendo as imagens do
seu maior trauma e pesadelo como cenário de uma chamada de vídeo.
— E por que você está aí? Filha…
— Mãe, eu estou bem. Olhe em volta de mim — Eu falei girando o
celular e deixando ela ver o meu quarto — eu não sou prisioneira, ou sou,
não sei mais. Essa Máfia parece uma grande prisão, onde você entra e não
sai nunca mais. Na verdade, Irya Mikhailova disse que eu estava em casa,
pois eles são a minha família. Minha nossa, eu não consigo ver essa gente
como uma família.
— E… o Chefe da Bratva…
— Aleksey Mikhailov é um homem muito poderoso, que exala força
e domínio até quando respira. Ele é bravo, sério e direto. Não manda recado.
Matou um homem que tentou falar sobre eu não poder ser reconhecida, deu
boa noite a todos e disse que sua família não ficaria para o noivado. E
simplesmente, sua esposa, sua filha, e pasme, eu, deixamos o local.
— Você pode me explicar isso tudo com calma, Raissa. Ele matou
um homem e você fala isso com essa calma?
— Isso é a máfia, e estou tentando me acostumar porque sinto que
isso vai passar a ser algo normal na minha vida. E mãe… você e ele são
muito parecidos.
Eu falei isso e minha mãe ficou em silêncio. Seus olhos estavam
cheios d'água. Acho que um lado seu não queria saber de nada, mas existia
um outro que estava curioso por informações.
— Parecidos?
— Sim. O cabelo e os olhos de vocês são do mesmo tom. Seu olhar
observador é igual ao dele, e juro… ele franze a sobrancelha e levanta a
direita quando está zangado igual a você.
— Me parecer com ele significa que…
— Monstro ou não, demônio como Irya se referiu a ele, um verme,
ou seja, qual for o adjetivo negativo, biologicamente vocês dois são filhos do
mesmo homem, e sim, talvez vocês tenham traços físicos em comum com o
infeliz, por isso são parecidos. Por mais que seja horrível pensar assim, o
velho asqueroso era seu pai e meu avô.
— Eu não gosto de pensar assim, mas também não acho que fugir da
realidade ajude alguma coisa.
Com calma, contei tudo que aconteceu na reunião, das brigas,
acordos desfeitos e da minha vinda para a mansão. Tentei ocupar a mente da
minha mãe com o caos da minha recente vida como mafiosa, e fazer com
que ela não ficasse pensando na sua origem.
Os meus sentimentos estavam confusos, todos fora de ordem, e eu
me sentia uma bagunça total, mas ainda assim, isso não era nada perto da dor
da minha mãe com tudo que ficou sabendo sobre o seu passado.
— E o Enzo?
— Aleksey não deixou que ele falasse comigo.
— Minha filha, você tem certeza do passo que deu?
— Sim, eu amo o Enzo. Só que eu entrei e saí da reunião, sem falar
nada. Nem deu tempo, até porque foi tudo literalmente, tiro, porrada e
bomba.
— E como vai ser agora? Quando você vem para casa?
— Não sei. Mas acredito que amanhã vou conversar com Aleksey
Mikhailov. Aqui é tudo muito diferente do nosso mundo. O que eu sei é que
agora quem decide o meu futuro é o meu tio que é o chefe da família.
— Eu sei como funciona a máfia, só não me imaginei te vendo fazer
parte dela.
— Vamos ter que nos acostumar, porque nossa vida mudou minha
mãe. E… você também faz parte da máfia.
— Eu não quero nada dessa gente.
— Eu não sei se funciona assim, porque essa gente têm o seu sangue.
E no caso, “essa gente”, é o seu irmão, o homem mais poderoso da
Instituição.
— Eu não quero pensar nisso… não consigo. Eu quero saber como
vai ficar sua vida daqui para a frente.
— Eu ainda não sei, mas só quero que seja junto com o meu mafioso
favorito.
— Raissa, você sempre escolheu coisas perigosas para sua vida, mas
se tornar mafiosa superou tudo — Minha mãe falou rindo e fiquei feliz de
ver seu sorriso depois de tanto tempo — Agora com calma vou contar tudo
para sua avó. Juramos não ter mais segredos, então tenho que ver como vou
falar para ela que você está nesta casa.
— E o meu pai?
— Ele ficou revoltado quando eu disse que você tinha viajado para a
Rússia e… bem… digamos que para ele somos a escória do mundo por
termos o sangue da máfia.
— Gente, o meu pai disse isso?
— Ele disse que foi enganado pelos seus avós que o envolveram com
a maior rede criminosa do mundo. Ficou muito claro, que o meu passado
fala mais alto do que o nosso casamento. É como se isso tivesse matado
qualquer sentimento pela nossa família. Mas o que me incomoda mais, é o
egoísmo dele, que em nenhum momento pensou na dor da minha mãe, ou
nos meus sentimentos diante de toda essa revelação sobre a forma como fui
gerada.
— Se você quer saber, para mim ele é tão monstro quanto os homens
da máfia que ele quer tanta distância. Na verdade, ele é pior, porque bem ou
mal, criminosos ou não, eles protegem os seus, enquanto meu pai só
consegue pensar nele mesmo ao invés de cuidar e proteger sua família.
— Eu ainda preciso processar isso tudo. Foi tudo muito rápido, você
viajou e tudo ficou no ar. Foi bom porque não consegui pensar, mas por
outro lado quanto mais adiamos a dor do luto, maior o sofrimento. E eu me
sinto assim, como alguém que está fingindo estar tudo bem, para não ter que
encarar a verdade. Uma verdade que ainda não sei como entender, ou
aceitar.
​— Não sei o que te dizer, porque é tudo tão pesado. Eu quando entrei nesta
casa fiquei pensando na minha avó, e…
​— E em mim. Eu fui gerada em algum lugar desta casa enquanto sua avó era
violentada de forma…
— Chega! Não faça isso. Você não merece se machucar desta forma.
Você é linda, maravilhosa, boa, amorosa, e a forma como foi gerada não
importa, e sim, a forma como você foi recebida neste mundo. Como a luz do
mundo para os meus avós.
— Eu sou filha de um monstro cruel. Como eu queria ser filha do
homem bom que sempre foi o meu pai.
— Ele é o seu pai. Foi ele quem te criou. Foi ele quem sempre te
amou. Por favor, me perdoe. Se não fosse eu…
— Por mais que esteja doendo eu prefiro saber toda a verdade. Chega
de mentiras. Não é saudável. Por pior que seja, a verdade é sempre a melhor
solução.
— Eu te amo.
— Também te amo, filha.
Eu e minha mãe conversamos por quase duas horas, e depois eu disse
que estava com sono, mas só para ela não ficar preocupada achando que eu
não dormiria.
Mas como dormir nessa casa? Depois de tanta coisa, minha mente
não conseguia desacelerar.

∞∞∞
​ u resolvi tomar um banho, colocar uma roupa limpa porque nem isso eu
E
tinha feito a noite, e estava secando o meu cabelo quando escutei alguém
batendo na porta do quarto.
​Meu coração disparou, mas fiquei calma quando escutei a voz de Alya no
corredor me chamando.
​— Bom dia, prima, como você passou a noite?
— Confesso que tive dificuldades para dormir depois de tanta coisa,
e essa casa… desculpa… ainda me sinto estranha aqui.
— Eu imagino. Eu vim te buscar porque o meu pai está te esperando
no escritório, mas pode deixar que eu vou com você.
— Eu não sei o que dizer ao seu pai.
— Não diga nada, só escute, e fale apenas se ele te fizer alguma
pergunta.
— E Enzo?
— Minha mãe ligou para Nina, e pediu para que ela dissesse a Enzo
que viesse aqui na mansão.
— E ele vem?
— Acredito que sim, porque segundo Luna ele é louco por uma certa
jornalista encrenqueira — Alya falou rindo e fiquei pensando que tirando a
hora que ela está matando alguém, parece uma jovem normal.
— Você tem outros primos?
— Não, meus pais são filhos únicos. Quer dizer, minha mãe… você
entendeu.
— Sim, eu entendi. A minha mãe tem duas irmãs, Sasha, que tem
dois filhos, e Katherine, que tem uma filha, mas eles ainda são adolescentes.
Já você e eu temos a mesma idade. Se a gente tivesse sido criadas juntas
seríamos tipo primas gêmeas.
— Isso nem existe — Eu falei rindo — primas gêmeas — falei
empurrando Alya de leve e ela se deitou na minha cama dando gargalhadas.

∞∞∞
​ lya me fez relaxar enquanto conversávamos, mas meu corpo chegava a
A
doer de tanta tensão que senti quando entrei no escritório do Chefe da
Bratva.
​Ele não me olhou nem por um minuto, apenas falava e olhava uns relatórios
que descobri que eram sobre mim.
​Foi impossível não perceber o orgulho dele quando falou que eu enfrentei a
Salvatrucha, e ele disse que eu fiz isso porque sou uma Mikhailova.
​A ficha então caiu com força e me acertando precisamente. Eu sou mesmo
uma mafiosa. Eu tenho o sangue da Elite Vermelha.
​Eu estava tão envolvida com a história do meu romance, o drama da minha
mãe, trocando mensagem com Enzo em tom de brincadeira, mas agora com
Aleksey falando e meu Deus… com ele me perguntando se eu fui para
Dubai com Enzo e revoltado porque ficamos juntos, que me dei conta que
estou oficialmente sendo tratada como alguém da Instituição.
​Escutar ele falando com o pai do Enzo, como se ele tivesse abusado de mim
e me deflorado, me fez ter vontade de rir, mas quando me lembrei que eles
levavam isso a sério, e até matam em nome da honra, o brilho sumiu dos
meus olhos.
​E juro, até o ar teve problemas em se manter no meu pulmão, quando vi
Enzo entrando no salão da mansão Bratva. Pensei que Aleksey iria matá-lo,
mas quando Irya disse que ele era seu convidado, o leão rugiu, mas não
atacou.
​Eu tentei falar com Enzo, mas Alya segurou meu braço, e me lembrei que ali
as coisas eram diferentes. Era como se eu estivesse numa novela de época,
onde é proibido namorar ou ficar sozinho com o seu pretendente.
​ Você veio — Eu falei baixinho quando Enzo passou por mim a caminho

do escritório para conversar com Aleksey.
​— Eu sempre venho quando você precisa — Ele falou baixinho e mesmo
rápido, seu olhar me fez molhar a calcinha. Que homem GOSTOSOOOO!!!

∞∞∞
​ u fiquei esperando Enzo sair da sala de reuniões, mas assim que isso
E
aconteceu a única coisa que consegui foi que ele me olhasse sem dar uma
palavra.
​— Estamos indo viajar — Aleksey falou com sua voz autoritária.
​— Tem certeza de que não quer minha companhia? — Irya falou e dava para
ver o carinho com que ela tratava o marido. Eu não sei como foi o casamento
deles, mas é certo que existe amor e cumplicidade entre eles.
​— Eu preciso fazer isso sozinho.
​— Se precisar chorar…
​— Eu não sou um homem que chora — Ele falou irritado e ela deu uma
gargalhada e o abraçou.
​— Eu te amo meu Anjo das Trevas.
​Eu queria poder me despedir de Enzo, mas sabia que não poderia ser
impulsiva. Ele estava sério, calado, um mafioso mesmo, com uma expressão
tensa, um olhar observador e passando a sensação que podia atirar em
qualquer um que respirasse mais alto.
​Assim que eles saíram fui correndo até a varanda e vi quando eles entraram
em carros separados, e foram seguidos por um forte esquema de segurança.
​Meu celular vibrou no meu bolso e meu coração disparou.
​Enzo: Quando eu voltar encrenqueira vai ser para ficarmos noivos.
​Raissa: Você é um mafioso tão fofinho. Eu aqui pensando no seu pau, e
você em se casar comigo.
​Enzo: Safada. Gostosa. Deixa-me ficar sozinho com você que vou socar
tanto meu pau nessa sua boceta que você vai implorar para eu parar de tanto
que vai gozar.
​Raissa: Vai me torturar, Enzo Cosa Nostra?
​Enzo: Você quer ser torturada, Raissa Mikhailova?
​Raissa: Até desmaiar de tanto prazer. Só que te aviso que isso não será algo
fácil, ainda mais que você já passou dos trinta, e pode infartar antes disso.
Precisamos tomar cuidado.
​ nzo: Me provoca mesmo minha futura esposa, mas depois não adianta
E
pedir clemência.
​Raissa: Expectativas estão sendo criadas. Fique ciente disso senhor
mafioso.
​Enzo: Eu vou tentar voltar o mais rápido possível. Eu te amo minha
jornalista.
​Raissa: Eu também te amo meu mafioso.
Capítulo 53
Aleksey Mikhailov

​Entrei no meu avião e me sentei em silêncio, deixando Yuri avisado que eu


não queria que ninguém me incomodasse.
​Eu precisava ficar sozinho.
​Eu estava indo desenterrar algo que se fosse pela máfia ficaria escondido
para sempre, como algo sem importância, só que tudo mudou… quando eu e
Dante permitimos que nossas filhas tivessem o direito de nos suceder já
sabíamos que muitas guerras viriam, e essa é só mais uma delas.
​Só que esse passado faz parte da minha história. Eu não sei se quero
desenterrar ele. Não sei o que pode vir junto dele.
Escondi tantos fantasmas na minha mente perturbada, e não quero
que eles se libertem.
​Eu fechei os meus olhos, mas sem perder jamais os meus reflexos e saquei
rapidamente a arma quando senti alguém se aproximando.
​— Abaixe a arma, Aleksey.
​— Irya? Mas que inferno você está fazendo aqui.
​— Eu jamais deixaria você passar por isso sozinho.
​— Você nem sabe o que estou indo fazer.
​— Você está indo procurar Polina e Yelena, na Filadélfia.
​— Yuri ou Enzo? Vou matar quem ousou falar demais.
​— Meu coração me falou, meu amor. Eu te conheço, Aleksey Mikhailov, e
não têm inferno que você vá, que eu não esteja pronta para estar ao seu lado.
​Essa mulher é a minha vida, e a cada minuto ela me faz ver isso com mais
clareza.
​Eu queria fazer tudo sozinho.
Não queria parecer fraco.
Eu não posso ser fraco.
Nunca posso falhar.
​Irya me deu a mão, e eu fechei os olhos novamente. Yuri, Enzo e os meus
soldados ficaram na outra ala do avião para nos dar privacidade.
​ u não queria relaxar. Não queria dormir. Mas Irya era como um bálsamo no
E
meio das minhas trevas, e acabei adormecendo e sendo arremessado dentro
de um baú escuro, onde memórias pesadas estavam guardadas querendo sair
para me atormentar.

FLASHBACK

— Por que eu tenho que ficar aqui? Esse lugar é escuro, e eu tenho
medo…

— Um Chefe não tem medo de nada! — meu pai gritou e bateu no


meu rosto com muita força, fechando a porta em seguida.

Eu queria chorar, mas não podia, porque tinha medo de meu pai
voltar e me bater.

Aquele lugar tinha um cheiro muito ruim, e tudo que eu queria era
sair dali e voltar para o meu quarto.

Outro dia, eu fui até a rua com o meu pai encontrar um amigo dele e
vi alguns meninos brincando.

Eu nunca podia brincar!

Eu só podia aprender a lutar e estudar!

Eu ia ser o Chefe!

O que era um Chefe?

Eu só queria ter um brinquedo!

Não queria aprender a ser esse negócio de Chefe!

Só queria brincar!

Eu não conseguia respirar naquele lugar escuro, e meu pai não


voltava para me buscar!
Ele sempre me deixava muito tempo ali dentro quando estava bravo
comigo.

Eu não podia dormir porque tinha que ficar chutando os ratos!

Eu não gostava dos ratos!

Eu tinha medo deles!

Um Chefe não podia ter medo!

Eu me lembrava das palavras do meu pai e chutava os ratos com


muita força!

Eu sentia fome, e minha barriga ficava doendo.

Ali não tinha comida!

Eu sentia sede!

Ali não tinha água para beber.

Eu escutava vozes!

Gente, gritando!

Será que eram fantasmas?

Eu tinha medo!

Um Chefe não podia ter medo!

Eu gritava e mandava as vozes calarem a boca.

Eu fechava os olhos com sono e me lembrava dos ratos!

Eu abria os olhos e chutava todos eles de novo.

Eu não queria que eles encostassem em mim!


Eu queria sair dali, mas não podia, porque a porta estava fechada.

Meu pai dizia que aquele lugar era o Inferno Bratva.

∞∞∞

Eu estava subindo as escadas com os soldados do meu pai que foram


me buscar no meu castigo.

Eu não consegui subir rápido, porque estava com fome e com sede.

Eu não podia falar isso porque senão eu voltava para o castigo.

A luz do lado de fora do Inferno Bratva machucava os meus olhos, e


eu não conseguia enxergar direito quando caminhava no jardim da minha
casa.

Eu não queria voltar para o Inferno!

Eu não queria deixar meu pai bravo!

Eu não queria mais brincar!

Eu só queria estudar, fazer o que o meu pai mandava e poder dormir


no meu quarto.

Eu queria ser o Chefe para o meu pai ficar feliz!

— Leve Aleksey para tomar um banho, que ele tem aula de inglês,
francês e italiano — meu pai falou para a minha babá e me segurou pelo
braço, gritando comigo. — Eu, quando tinha dez anos, já falava esses
idiomas e não dava desgosto para o meu pai. Comecei a estudar com três
anos e nunca reclamei, enquanto você, que já tem cinco, parece não querer
aprender nada! Você vai ser o Chefe da Bratva, o meu sucessor! Você
entendeu? Responda!

— Sim, senhor meu pai! — respondi com medo. Eu tinha medo


quando meu pai me olhava bravo.
— Você quer me deixar triste, Aleksey?

— Não, meu pai — respondi e abaixei a cabeça.

— Olha para mim quando eu estiver falando com você! Um Chefe


não abaixa a cabeça. Você vai sempre me obedecer e agradar o seu pai,
porque você me deve respeito e obediência como todos da Bratva. Um dia,
você vai ficar no meu lugar e não vai deixar ninguém te desobedecer, mas
até lá você só vai fazer o que eu mandar, ou você volta para o Inferno
Bratva.

— Sim, senhor meu pai.

Eu subi as escadas para tomar banho com Alena que cuidava de


mim.

Ela não falava comigo, só ligava o chuveiro e trazia roupas novas e


sapatos.

Eu almoçava e jantava sozinho no meu quarto, e ela só me servia sem


falar nada todos os dias.

Eu só saía do meu quarto para ter aulas de luta e para estudar. Eu


ficava olhando pela janela o jardim da minha casa e queria sair para correr e
brincar, mas eu não podia.

Eu não gostava das aulas, porque a cada hora o professor falava uma
coisa, e eu ficava confuso com good morning, buongiorno e bonjour.

Eu queria desenhar, mas tinha que estudar.

∞∞∞

Eu estava no meu quarto jantando, meu pai entrou gritando com


Alena porque eu me atrasei para uma das aulas, e o professor reclamou.
Ela pediu desculpas, meu pai disse que ela era burra e só servia para
ser comida. O meu pai rasgou a roupa dela e abaixou as suas calças.

Ela chorou e ele disse para ela calar a boca.

Meu pai ficava em cima dela, e, eu olhava para o meu prato.

Eu precisava terminar de jantar e descer com o meu pai, que ia me


tomar as lições do dia, para saber o que eu aprendi.

Eu não queria escutar os gritos de dor da Alena e pensava em outra


coisa.

∞∞∞

Meu pai sempre me segurava com força e me arrastava com ele.

— Hoje temos visita, o meu amigo Koslov — meu pai falou,


apontando para um homem de terno que eu via sempre entrando e saindo da
minha casa.

— Boa noite, Senhor Koslov — falei, como o meu pai me ensinou.

— Koslov se casou recentemente, e, assim que sua esposa ficar


grávida, vamos selar um acordo. Se o herdeiro for homem, será o seu
subchefe; se for mulher, a sua esposa.

Meu pai e o seu amigo acenderam um charuto e foram beber. Meu


pai falou que eu podia me retirar e disse que eu tinha permissão para ver a
minha mãe.

Eu quase não via a minha mãe.

Meu pai não deixava.

Ele dizia que eu ia ser o Chefe e não precisava de uma mãe, só dele,
que me ensinava tudo.
Eu subi as escadas devagar e fui para o meu quarto.

Eu não queria ver a minha mãe.

Ela não falava nada comigo.

Ela estava sempre em silêncio!

Eu entrei no meu quarto e fui dormir.

Eu tinha medo dos sonhos ruins, mas estava com sono.

Eu não podia ter medo dos sonhos ruins.

Eu ia ser o Chefe!

Um Chefe não podia ter medo de nada!

∞∞∞

Olhos azuis.

Ela tinha olhos azuis e olhava para mim.

Ela não era como Alena e as outras babás.

Ela cantava para mim.

Meu pai não gostava que ela cantasse para mim e batia nela.

Ela chorava.

O quarto estava sujo de sangue. Ela estava deitada no sangue.

Meu pai me arrastou como sempre.

∞∞∞
Tudo começou a pegar fogo.

Todo mundo começou a correr.

A minha babá ficou caída no chão.

Meu pai falou para deixá-la morrer que não fazia falta.

Eu não queria que ela morresse.

Ela cantava para mim.

Eu estiquei o braço, mas ela não pegou.

Eu acho que ela queria ficar no chão.

Seus olhos azuis.

A música.

Eu não consigo lembrar da música.

Eu não quero lembrar dela.

Ela cantava para mim.

Ela ficou para morrer.

∞∞∞

​Eu não podia chorar.

​Eu não podia ter medo.

​Eu tinha que obedecer ao meu pai.


​Eu vou ser o Chefe.

​Um Chefe não podia ter medo.

​ m dia eu vou ser o chefe e matar meu pai, porque não vou ter mais medo
U
dele.

​Um Chefe não tem medo de ninguém.

FIM DO FLAHSBACK

∞∞∞
​ esembarcamos na Filadélfia e seguimos direto para a casa da família
D
Pavlov. Eu queria resolver logo todo esse assunto, me encontrar com o chefe
da Salvatrucha e retornar para a Rússia.
​— Está tudo bem? Você ficou muito agitado.
​— Eu só quero resolver tudo e regressar para casa. Quando se têm mudanças
acontecendo, é fundamental a presença do Chefe para manter a ordem.
​— Não se preocupe, sua filha não fica nada a dever ao pai dela. Se for
preciso matar todo o conselho e começar outro para que sua vontade
prevaleça, não tenho dúvidas que Alya manda todos para o inferno num
piscar de olhos.
​— Minha filha realmente se parece muito comigo.
​— E Raissa não fica atrás. Antes eu pensava que a jornalista tinha sido
muito corajosa para sair de um cativeiro, e denunciar uma máfia sanguinária.
Hoje sei que na verdade ela fez isso porque é sua sobrinha.
​Eu não falei nada e continuei o restante do caminho em silêncio. Os meus
sonhos me deixaram perturbados, e com uma música que eu sabia que eu
conhecia na minha cabeça.
​Era como se eu escutasse a dona dos tais olhos azuis cantando, mas eu não
conseguia repetir em palavras. Isso estava me perturbando. Malditos
gatilhos, lembranças e fantasmas que insistiam em me lembrar da minha
criação miserável.
​— Chegamos, senhor Mikhailov. A casa é aquela ali — Yuri falou
apontando para uma casa pequena no meio de uma rua que parecia
tranquila.
​ ão deixei de observar dois carros pretos parados estrategicamente um em
N
cada esquina.
— Sarah antes de embarcar mandou reforçar a segurança da família
Pavlov e de Yelena. Ela sabia que depois da reunião sua… Yelena, iria virar
alvo dos seus inimigos.
— Claro, Sarah Cooper joga a bomba e defende a retaguarda.
Saí do carro com Irya e chamei Enzo que estava em outro carro para
entrarmos na casa.
— Meu amor, eles podem se assustar com a sua presença. Não seria
melhor que eu batesse na porta…
— Não, eu vim aqui resolver isso e vou fazer do meu jeito.
​Atravessei o pequeno jardim da casa que não tinha muro e fui até a porta e
fiz sinal para que me deixassem tocar a campainha sozinho. Essa não era
uma visita para acerto de contas para que os meus homens fossem na minha
frente e eu chegasse apenas no final.
​Um senhor abriu a porta e ficou paralisado quando me viu. Ele parecia estar
desfalecendo com o susto e então resolvi me apresentar.
​— Senhor Pavlov, eu suponho. Eu sou…
​— Aleksey Mikhailov, o Chefe da Bratva — Ele sussurrou como se falar
isso em voz baixa ou alta mudasse alguma coisa.
​— Quem é, Niko…
​Ela falou se aproximando da porta e ficando muda ao me ver.
​Os olhos azuis.
​Eu jamais esqueceria esses olhos azuis.
​Eles estavam no meu sonho.
​Polina.
Seu nome é Polina.
Capítulo 54
Aleksey Mikhailov

— Yuri reforce a segurança em todo o perímetro — Eu ordenei —


Verifique com os homens de Cooper se teve alguma atividade suspeita na
área e ninguém entra nessa casa sem identificação.
​— Sim, senhor.
​Eu não tinha mais dúvidas que tudo que Raissa contou era verdade.
​— Senhor, nós…
​— Não se preocupe, senhor Pavlov, eu não vim buscar vocês, ou acertar
contas. Na verdade, vocês agora são meus protegidos, não precisam ter medo
de mim.
​— Senhor Pavlov, eu sou Irya Mikhailova, esposa de Aleksey e garanto que
viemos em paz. Raissa está na nossa casa, e viemos porque soubemos de
tudo que aconteceu, e eu quero dizer que o senhor tem toda a minha
admiração e respeito. O senhor é um exemplo de homem.
​— É um prazer, senhora. Desculpe, eu e minha esposa passamos a vida nos
escondendo e…
​— Eu conheço você — Eu falei me aproximando de Polina e um novo
silêncio se fez na sala — Eu lembro dos seus olhos azuis. Você tem medo de
mim?
​— Não — Ela falou quase sussurrando — Mas eu tenho medo de tudo que
você me lembra.
​— Está tudo bem, aqui? Pai, mãe… O que aconteceu? Eu vi os carros, os
homens, e só consegui entrar porque estava com a segurança que agora me
acompanha… — Ela entrou falando assustada e parou assim que me viu.
​— Senhor, ela estava com os seguranças de Cooper, e é a mãe da senhorita
Raissa — Yuri falou e eu fiz sinal com a cabeça que ele poderia sair.
​— Enzo, onde está Raissa? — Ela perguntou pela filha assim que o viu.
​— Ela está na minha casa — Eu respondi — Eu vim porque precisava ver
toda essa história que ela contou com meus próprios olhos.
​ u falei e voltei a olhar para Polina.
E
​— Eu olhei para trás — Eu falei me dirigindo a Polina — Você disse que
ninguém se importou no dia do incêndio, mas eu olhei para trás. Eu estiquei
o braço para você. Só que eu era pequeno, fui arrastado e você não me deu a
mão. Eu achei que você queria ficar lá e tinha morrido.
​Ela não falava uma palavra. Polina parecia ter ficado muda.
​— Você cantava. Eu lembro que você cantava. Como era a música. Só você
cantou para mim na minha vida. Тили-тили-бом Tili - tili - bom Закрой
глаза скорее, (Feche os seus olhos imediatamente) Кто-то ходит за окном,
(Alguém está caminhando lá fora) И стучится в двери. (E esse alguém bate
na porta).
​A música saiu arrastada na minha voz que tentava lembrar de cada palavra.
Eu nunca cantei. Nem para a minha filha eu cantava. Música era algo que me
remetia a dor, e agora eu lembro porquê… a música, o monstro, os gritos…
o sangue.
​ — Eu cantava essa música para os meus irmãos pequenos. Eu cantava para
você. Depois daquele… depois, eu nunca mais cantei.
​— Você não tinha medo de mim. Agora você tem por que acha que vou te
fazer mal?
​— Eu não tenho medo de você… meu menino.
​Ela falou e com as mãos trêmulas tocou o meu rosto. Ninguém ousaria tocar
no rosto do Chefe da Bratva… minha mãe nunca tocou no meu rosto…, mas
ela estava fazendo isso.
​— Eu não tenho medo de você.
​— Vocês não precisavam continuar escondidos, ou com medo, o meu pai já
morreu faz mais de vinte e três anos.
​— Eu sei. Quando o monstro… quando ele morreu… eu vi a notícia.

— Eu o matei.
— O que? — Yelena se aproximou perguntando.
— Eu matei o meu pai. O nosso pai.
— Foi você?
— Sim, Polina, fui eu. Ele sempre disse que eu não devia ter medo.
Que um chefe não tinha medo de nada. Mas eu tinha medo dele quando era
criança, e acho que por muitos anos, mas depois eu só queria ser o chefe. E
como chefe eu não tinha medo de nada, nem dele, e o matei.
— Você o matou. Meu menino matou o monstro — Ela falou
sorrindo e com os olhos cheios d'água — Eu preciso descansar.
Ela falou e saiu caminhando devagar em direção a uma cadeira de
balanço e se sentou olhando para a janela. Ela começou a cantar a música
que cantava para mim e todos ficaram em silêncio.
— Polina sempre fica horas sentada em silêncio nessa cadeira de
balanço. É como um refúgio de tudo que ela viveu — Nikolay Pavlov falou
— Mas ela nunca cantou. É a primeira vez! Polina nunca teve medo de você.
Mas tinha medo da Instituição e do que poderia acontecer com Yelena, por
isso mesmo depois da morte do seu pai, ela não conseguiu se acalmar.
— Não tinha como ela saber se você não tinha ficado igual… Eu não
quero nada de você, acredite nisso por favor — Yelena falou — Só
queremos paz! Se bem que já não sei mais se isso é possível, se um dia vou
parar de andar com segurança.
— Por isso eu vim até aqui. Uma vez que eu levei Raissa para minha
casa foi como assumir para o mundo que ela é minha sobrinha.
Automaticamente, você se tornou alvo de todos os nossos inimigos.
— Nossos?
— Ola, Yelena — Irya falou — Eu sou a esposa de Aleksey. O que
ele quer dizer, é que quando ele assumiu Raissa, isso foi como assumir você
também por tabela, entendeu?
— Minha nossa. Eu, confesso que ainda estou tentando processar
isso tudo e acabei não refletindo sobre nada direito.
— Você é uma Mikhailova e meus inimigos, são seus inimigos agora
— Aleksey falou — e não é uma questão de querer ou não. Isso é um fato, e
por isso estou aqui.
— Mas eu sou uma bastarda. Eu não tenho valor para a máfia. Não é
assim que funciona?
— Era assim, mas sua filha invadiu uma reunião da máfia,
acompanhada por ninguém menos que Sarah Cooper que adora uma
revolução, e agora provavelmente bastardos surgirão de todos os lados, já
que abri um precedente com Raissa.
— Você acha que tem mais irmãos?
— Eu não, porque o velho mandava matar todas as mulheres que…
enfim, ele só não matou Polina porque achou que ela tinha morrido. As
outras ou ele jogava na rua e mandava matar, ou fazia pessoalmente. Se
engravidassem ele matava na hora.
— Mas isso não aconteceu com você, não fica assim — Nikolay
falou a abraçando.
— E o que vai acontecer agora? Enzo e Raissa vão poder ficar
juntos? Essa confusão toda pelo menos resolveu a situação deles?
— Eu espero que sim, senhora. Mas na Instituição existem alguns
caminhos a se percorrer antes, e quando voltarmos vamos resolver isso —
Enzo falou e Yelena me olhou.
— Acabamos de nos conhecer e você já vai me pedir por esses dois?
— Eu falei olhando para ela — Eu vou decidir o destino de Raissa na volta,
agora preciso saber o que vou fazer com vocês três.
O senhor Pavlov sugeriu que nos sentássemos para podermos
conversar com calma. Eram muitas questões que precisavam ser definidas,
porque não têm como ser da máfia e viver uma vida normal.
Não temos liberdade. Estamos sempre na espreita, sem piscar os
olhos para não ser atingidos, andando sempre acompanhados de um forte
esquema de segurança e não seria diferente com Yelena a partir de hoje.
Seus pais eram importantes para ela, então só por isso, passaram a ser
alvos também. Isso é a máfia, onde o glamour só existe nos romances e
séries de televisão.
Depois de horas de muita conversa, de várias aparições de Polina,
com um bolo, um café, um biscoito que ela alternava com suas idas para um
mundo paralelo quando estava na cadeira de balanço, ficou acertado que
Yelena teria um forte esquema de segurança, assim como os seus pais.
— É uma mudança muito grande. Eu tenho meu trabalho, minha vida
toda aqui, e do nada não vou ter mais liberdade, não vou poder ir à esquina
sem segurança.
​Eu entendo que para Yelena não seria nada fácil essa mudança de vida, mas
assim como Irya, que faz tudo por Alya, eu percebi que para ela só
importava saber que a filha seria feliz.
— Senhor, desculpe interromper, mas esse é o senhor O’Brien,
marido da senhora Yelena, já checamos sua identidade — Yuri estava
falando quando foi interrompido pelo sujeito arrogante e com certeza sem
nenhum amor pela sua vida.
— O que está acontecendo aqui, Yelena? Que circo todo é esse aí
fora? — Ele perguntou gritando — A escória agora dita as regras por aqui…
— Abaixe o tom de voz quando se dirigir a minha irmã seu filho da
puta — Eu falei colocando a arma na sua boca — quem você pensa que é
para levantar a voz para Yelena? — Eu falei dei com a arma na sua cara
quebrando o seu nariz — E fique feliz pelo Rei da Escória não ter dado fim a
sua vida, porque eu não costumo conversar, apenas atirar.
— O que é isso? — Ele gritou — Você vai deixar esse… Quem é
esse homem?
— Aleksey Mikhailov, e você deveria saber, porque ele está sempre
nos jornais. O Ceo da Vodka…
— O Chefe da Bratva, você quer dizer. Meu Deus, eu nunca deveria
ter me casado com você. Seus pais não tinham o direito de me envolver
nisso. Eu sou honesto…
— Eu também sou honesta, Mark. Eu não admito que você fale assim
comigo só porque não aceita que eu seja… que eu tenha nascido… —
Yelena falou e pude ver a dor no seu rosto por toda a sua história que ela
conheceu tem poucos dias.
— Ela é uma vítima disso tudo seu merda — Eu falei chutando sua
barriga com força — Ele sempre te tratou desta forma? Gritando com você?
— Não. Ele ficou assim depois que soubemos de toda a verdade. Ele
não aceita minha verdadeira origem. Eu não sou quem ele pensava, mas
acredite, ele também não é o homem que eu achei que conhecia.
— Eu quero saber onde está a minha filha, só vim aqui por isso, e
saiba que não vou permitir jamais o casamento dela com esse daí — Ele
falou apontando para Enzo — Você é o culpado disso tudo, mas não vai ficar
com ela, pode escrever isso. Raissa apesar de tudo é minha filha e eu não
aprovo esse casamento.
— E quem se importa com o que você aprova ou deixa de aprovar —
Eu falei perdendo a minha paciência — Sinto muito, Yelena, mas eu não
suporto mais escutar a voz desse infeliz. Yuri, leve esse merda daqui e tenha
certeza de deixar bem claro que ele não deve nunca mais se aproximar de
ninguém desta casa.
— Raissa, é minha filha — O infeliz falou quase sem ar por conta do
nariz quebrado.
— Ela é uma Mikhailova. Eu sou o Chefe desta família e eu que vou
decidir o futuro da minha sobrinha. Tirem esse sujeito daqui que eu não
tenho tempo a perder. Yuri, faça com que esse infeliz entenda que não
gostamos de quem fala o que não deve. Fique longe de Yelena se quiser
continuar vivo e saiba que você só não está morto porque ela falou ex-
marido, senão eu teria te matado para ela ser viúva — Eu falei apontando a
arma para ele.
O homem saiu esbravejando mostrando que precisaria realmente de
um corretivo para entender realmente onde estava se metendo. Eu só não o
matei, porque sei que Yelena está muito abalada com tudo, e Polina e o
marido são senhores de idade, que estão muito assustados com toda essa
situação.
Polina me olhou e eu me aproximei dela me abaixando em frente a
cadeira onde ela estava sentada;
— Não queria lhe causar mais dor.
— Você nunca me causou dor meu menino.
— Tudo aconteceu porque você cantou para mim.
— Não carregue essa culpa que não é sua.
— Eu também não sou perfeito. Eu mato sem remorso quem
atravessa o meu caminho.
— Essa é a máfia. Ou você mata, ou você morre. O que aconteceu
nessa sala não me assustou, porque eu sei o que é a Instituição. Eu passei a
fazer parte dela quando fui para a mansão. Eu sei que você é o Chefe agora,
e só quero te pedir para não me levar de volta.
— Claro que não. Você nunca será obrigada a voltar para a mansão,
ou para a Rússia, ou para qualquer lugar que você não queira.
— Eu tenho um pedido para te fazer — Ela falou segurando a minha
mão.
— Qual pedido?
— Que você abençoe a união da Raissa com o amor da vida dela.
— Depois desse pedido, saiba que eu provavelmente darei a mão de
Raissa em casamento para o Enzo Cosa Nostra, mas ainda preciso acertar os
detalhes com a Cosa Nostra, mas com isso ela vai ter que viver na Sicília.
— Eu não tinha pensado nisso — Yelena falou e percebi sua tristeza.
— Eu proponho que você vá comigo até a Rússia, Yelena, para
encontrar com Raissa.
— Eu não posso entrar naquela casa… desculpa…
— Você vai entrar como uma Mikhailova, minha irmã. Raissa está lá
e vai gostar de ter por perto para cuidar de tudo do seu casamento.
— Eu proponho que o casamento seja na Sicília, para que o senhor e
a senhora Pavlova possam ir, já que na Rússia isso seria impossível de
acontecer.
— Se você se casar com Raissa, providenciaremos tudo.
— Vai ser um prazer e uma alegria muito grande se você for com a
gente para a Rússia — Irya falou para Yelena — e assim podemos fazer uma
surpresa para Raissa. Saiba que você não está sozinha, porque existe na
Instituição a máfia das mulheres, e vamos te apoiar em tudo que você
precisar.
— Eu vou deixar vocês conversando sobre a máfia das mulheres —
Eu falei com um certo sarcasmo — e vou sair com Enzo para resolver uns
assuntos pendentes.
— Pode ir tranquilo que eu ficarei aqui conversando com a minha
cunhada, com o senhor Pavlov de quem eu sou fã, e comendo esse bolo
delicioso que a senhora Polina fez e que vou querer a receita.
Minha esposa nasceu para ser a matriarca da Elite Vermelha. Ela
relutou tanto, mas têm a diplomacia, a leveza e as palavras certas que fazem
todos se acalmarem na sua presença.
Capítulo 55
Natalya

​Hoje para as moças que podem fazer suas próprias escolhas seria um dia
especial, mas para uma filha da máfia, é apenas mais uma obrigação que
você terá que cumprir.
​Coloquei o meu vestido de noiva, verifiquei no espelho que a maquiagem
tinha ficado suave e discreta como eu queria, e me sentei para esperar a hora
que meu pai viria me buscar para me casar com Matteo Cosa Nostra.
​Eu e o meu futuro marido trocamos algumas palavras durante a apresentação
dos noivos, ontem à noite, e já deu para perceber que ele não entende nada
sobre os sentimentos de alguém que vai casar com o escolhido pelo seu pai.

FLASHBACK
​ festa de apresentação dos noivos estava demorando para começar e pelo
A
clima tenso já se podia imaginar que algo muito sério estava acontecendo no
andar de cima da casa escolhida como local para o evento.
​Os homens da Instituição estavam todos reunidos, e quando Sarah Cooper
chegou linda e plena, acompanhada por outras mulheres, e foram direto para
à sala de reuniões, todos sabiam que algo grande estava para acontecer.
​As horas se passavam e eu não sabia se torcia para que o casamento não
acontecesse, ou se mantinha o foco de que pelo menos casando com alguém
da Cosa Nostra eu teria mais chances de ser um pouco livre, já que sempre
passei a vida trancada dentro de casa, e frequentando eventos da máfia
sempre com as mesmas pessoas.
​Foi inevitável escutar os disparos que estavam acontecendo na sala de
reuniões, mas como isso entre nós era algo normal, só nos restava aguardar
quem não sairia vivo daquela sala.
​Se eu me preocupei porque poderia ser o meu pai? Não, porque como ele
sempre disse, pode ser que eu não volte, estejam preparadas. Então, só me
restava esperar.
​ u não sou uma pessoa ruim por não me importar com a vida do meu pai,
E
apenas aprendi a não nutrir grandes sentimentos por quem nunca escondeu o
desgosto de ter uma filha mulher, no lugar de um homem que fosse seu
companheiro e sucessor.
​— O senhor Mikhailov está descendo as escadas com a família — Minha
mãe alertou os convidados que se levantaram para saudar a família real da
Elite Vermelha, só que eles passaram por todos sem olhar para ninguém e
foram embora.
​— Quem é aquela jovem com eles? — alguém perguntou e sua voz saiu alto
demais devido ao silêncio, chamando a atenção de Yuri, o homem de
confiança do senhor Mikhailov.
​— Sugiro que vocês esperem o Chefe deixar o local para começarem a
fofoca. Mas cuidado, porque o senhor Mikhailov pode não gostar que
comentem sobre sua família — Yuri falou e todos dispersaram, indo fazer
outras coisas e fingindo desinteresse por qualquer assunto.
​Algumas horas depois, Lorenzo Cosa Nostra, Nina, e o meu noivo, Enzo,
também desceram as escadas deixando o local. Naquele momento achei que
meu casamento estava cancelado, e minha vontade era de sair dançando,
pois não teria que me casar, mas quando lembrei que seria uma largada, e
que meu pai me jogaria na rua, ou me castigaria por atrapalhar os seus
planos, a minha alegria foi desaparecendo.
​Pensando bem, esse casamento era o meu passaporte para deixar a Rússia, e
sem ele na melhor das hipóteses continuaria na casa do meu pai, o que
estava longe de ser algo que eu desejava para mim.
​Não demorou muito e o meu pai desceu as escadas, com Dante o Capo da
Cosa Nostra e o resto da família da máfia siciliana.
​— Muito bem, senhores, vamos começar a festa! — O meu pai falou e a
orquestra começou a tocar uma música qualquer, as pessoas foram se reunir
em rodinhas, e ninguém se importava mais com o que tinha acontecido no
andar de cima.
​O meu pai me chamou e nos dirigimos para próximo do palco onde tinha a
mesa da família dos noivos. Meu pai mostrou o lugar onde eu deveria sentar
porque o jantar já seria servido, e eu estava tomando um gole de água,
quando Matteo se sentou ao meu lado, e no lugar onde estava escrito “noivo”
na plaquinha.
​Eu não tive tempo de pensar e Luna Cosa Nostra me chamou dizendo que
precisava conversar comigo.
​ Eu pensei que o seu pai fosse ter a decência de conversar com você, mas

pelo visto, ele só enxerga esse casamento como um comércio.
​— E o que são os casamentos da Instituição?
​— Infelizmente é mesmo um comércio, mas eu quero mudar isso, não acho
justo que não possamos escolher nossos maridos, que tenhamos que nos
casar com quem decidem e pronto.
​— Mudar para que? Com todo o respeito, isso nunca vai terminar, a não ser
que a máfia seja extinta da face da terra.
​— Você não acredita que temos o direito de escolher com quem vamos
dividir a vida?
​— A lei Sarah Cooper reduziu em mais de cinquenta por cento a violência
doméstica, mas sabe por que ela ainda existe? Muitas mulheres se
acostumaram com essa vida de submissão e não querem mudar. Outras, têm
medo do famoso ditado: ruim com ele, pior sem ele. Muitas não querem ser
independentes, outras têm medo de ficarem perdidas sem saber o que fazer
com a liberdade que nunca vai ser real, porque sempre teremos inimigos.
​— Isso precisa mudar.
​— Eu admiro que você e Alya Mikhailova queiram mudar tudo, mas pensa,
para onde a gente for seremos alvos. Se eu escolho meu marido fora da
máfia, estou colocando um alvo na testa dele. E na minha também, porque se
deixo a Instituição não sobrevivo uma semana sem levar um tiro de algum
inimigo do meu pai.
​— É um ciclo, e realmente quebrá-lo não será fácil. Mas não vou me
acomodar e sempre tentarei ser justa, por isso quero te explicar o que
aconteceu essa noite e porque você vai se casar com Matteo.

∞∞∞
​ u estava realmente grata por Luna ter se preocupado comigo e vindo me
E
explicar a mudança de noivo, porque o meu pai não se importou em fazer
isso, já que para ele isso era um detalhe irrelevante.
​Eu não tinha sentimento algum por Enzo, e por isso não fiquei triste.
​Se fui gentil, doce, e educada, foi porque assim se comportam as filhas da
máfia diante de um pretendente… mas amor?
Como vou amar alguém que não conheço?
Não tenho esse romantismo que algumas moças da sociedade têm de
ficarem sonhando com finais felizes com alguém que nunca viram na vida.
Respirei fundo quando minha mãe chegou com a grinalda e falando
que o salão estava cheio de convidados.
Novidade!
As festas da máfia sempre ficam lotadas, porque não é como se
pudéssemos frequentar outro evento. Qualquer casamento todos vão, e tudo
sempre se repete: música alta, homens trancados numa sala fumando seus
charutos e falando de negócios, mulheres conversando futilidades, crianças
correndo de um lado para o outro, e as moças solteiras imaginando que o dia
delas de se casar iria chegar e torcendo para que o noivo não fosse um velho,
viúvo e barrigudo.
Eu dei sorte!
Matteo Cosa Nostra é lindo!
Mas tudo que eu sei sobre ele é isso: que temos a mesma idade, e que
ele é um Cosa Nostra.
Só que eu não sei se ele aceitou tão bem assim esse casamento
comigo. Ele parecia estranho e incomodado por achar que eu gostava do
primo dele, e nosso primeiro e único diálogo não foi dos melhores.

FLASHBACK
​ u voltei para a mesa onde seria servido o jantar e me sentei ao lado do meu
E
noivo.
Enquanto todos na mesa falavam alto, eu e ele estávamos em
silêncio, até que ele resolveu quebrar o gelo daquela situação e falar
comigo.
​— Essa situação toda é bem estranha, porque vamos nos casar amanhã, mas
não nos conhecemos.
​— Sim, muitos casamentos acontecem com os noivos se conhecendo a
caminho do altar. Pelo menos estamos nos vendo vinte e quatro horas antes
de dizermos sim um para o outro.
​O jantar foi servido, os homens continuaram falando de negócios, mas
ninguém tocou no assunto da sobrinha bastarda do Chefe Mikhailov, sobre a
troca de noivo, ou qualquer coisa relacionada ao meu casamento com
Matteo.
​Assim que terminamos de comer a sobremesa, meu noivo pediu licença a
todos da mesa e me convidou para dar uma volta pelo salão.
​— Eu gostaria que você usasse isso — Ele falou me entregando uma
caixinha de veludo preta — Foi tudo muito rápido, Luna conversou comigo
pouco antes da reunião e não conheço muitas joalherias aqui na Rússia.
​— Obrigada, é muito lindo — Eu falei olhando para o anel de brilhantes que
Matteo comprou para mim.
​— Eu parei no caminho vindo para cá e comprei esse anel. Não sei se vai
ficar bom, mas eu vou providenciar outro para amanhã.
​— Esse é perfeito! — Eu falei entregando a caixinha para ele e o anel antigo
— Ficou um pouco grande, mas não vou perder.
​— Eu achei que você deveria usar um anel comprado por mim.
— Muito gentil da sua parte — Eu falei sorrindo como uma boa filha
da máfia.
— Eu não gostaria que voltássemos direto para a Cosa Nostra, mas
como foi tudo muito rápido, penso que poderíamos ir para algum lugar aqui
na Europa que você queira conhecer.
​— Paris.
​— A cidade onde minha mãe nasceu. Que seja, vou providenciar tudo.
​Continuamos caminhando entre os convidados que sorriam para a gente,
como se fôssemos um casal apaixonado feliz com o casamento.
​Quanta falsidade no ar!
​Éramos dois estranhos.
​— Você estava apaixonada por Enzo? — Ele perguntou me pegando de
surpresa.
​— Não. Eu só vi o meu ex noivo duas vezes. Não tinha sentimentos por ele.
— Assim como não têm por mim.
​— Exatamente. Nós cumprimos acordos, não é isso?
​— Sim, nada além disso.

∞∞∞
​ Vamos minha filha? Está na hora — Minha mãe falou me despertando

dos meus pensamentos.
​Eu me levantei, sorri para o meu pai como uma boa filha, segurei no seu
braço e caminhamos juntos em direção ao altar.
​Matteo estava lá, com um terno preto, uma gravata verde da cor da Cosa
Nostra e um semblante tenso.
​Meu pai me entregou para ele, apertou sua mão, e logo após a de Giancarlo
Cosa Nostra. Ele estava feliz! Meu casamento rendeu uma boa aliança para
ele com a máfia siciliana.
​Matteo me olhava e eu tentava decifrar o que se passava na sua mente.
Como será que era para ele se casar com uma estranha?
Será que assim como eu, ele pensava que isso era uma grande
loucura.
Ou para os homens tanto faz?
​Trocamos juramentos prontos.
Não fizemos votos.
Dissemos sim um para o outro e sorrimos quando gritaram: Viva os
noivos!
​Éramos só mais um casal de desconhecidos se casando na nossa sociedade.
​Ele não sorriu para mim. Eu não sorri para ele.
​Somos marido e mulher.
​Somos um casal da máfia.
​— Estamos casados, Natalya. Agora você é a nova senhora Cosa Nostra.
​— Sim, estamos casados.
​— Eu quero fazer isso dar certo. Não quero que sejamos dois estranhos para
sempre. Eu cresci numa família feliz! Quero isso para nós dois.
— Eu não sei o que é uma família feliz, mas se você quiser me
mostrar, eu vou adorar conhecer.
E foi assim que sorrimos um para o outro pela primeira vez.
Meu coração bateu num ritmo diferente.
Eu não sei o que é o amor. Não tive esse exemplo em casa.
Matteo meu deu a mão enquanto caminhávamos entre os
convidados.
Eu me senti acolhida e protegida com um gesto que parece simples,
mas que para mim era novo.
Nossas mãos entrelaçadas significavam união.
Assim que o último convidado da extensa fila de cumprimentos falou
conosco, Matteo segurou as minhas mãos e beijou nossa aliança.
Ficamos nos olhando e ele fez um carinho no meu rosto e colou as
nossas testas uma na outra.
A seguir, seus lábios tocaram os meus.
Nós nos beijamos, e eu senti como se borboletas estivessem voando
no meu estômago.
Será que estou me apaixonando pelo meu marido?
E foi assim que eu me senti viva e com vontade de ser feliz pela
primeira vez na minha vida.
Capítulo 56
Enzo Cosa Nostra

Depois de uma breve visita a Los Angeles, território da Máfia


Cooper, eu estava no jatinho a caminho de El Salvador, onde em algum
buraco vivia o rato que comandava a Salvatrucha.
A Mara Salvatrucha que significa basicamente gangue salvadora dos
malandros de rua é formada por hondurenhos, guatemaltecos, mexicanos,
centro-americanos e sul-americanos.
Sua base é formada por adolescentes recrutados cedo para o mundo
do crime. Como qualquer gangue, ela tem aliados e inimigos, e bastou trinta
minutos da presença do Chefe da Bratva nas ruas de Los Angeles, para que
as rivais Bloods e Latin Kings entregassem os pontos principais da
Salvatrucha.
Aleksey chegou pessoalmente em dois pontos de venda de drogas
dele e pessoalmente executou todos no local. Depois mandou que seus
homens estourassem mais cinco pontos e não deixassem ninguém vivo para
contar história.
​Desembarcamos e seguimos em carros separados e fortemente cercados por
seguranças da Bratva até uma casa que ficava no meio do deserto de El
Salvador e numa região cercada por vulcões.
​Quando o carro de Aleksey parou no local, seus homens saíram atirando,
jogando explosivos, e abrindo caminho, enquanto eu saia do carro, ajeitava
minha gravata e minha mente na mesma hora se desligava de tudo à minha
volta.
Agora eu era o torturador da Cosa Nostra e meu foco eram os meus
inimigos e minha sobrevivência.
Atravessei o caminho de entrada até a casa pisando nos corpos
espalhados pelo chão. Entramos na propriedade que estava cheia de fumaça
e cheiro de pólvora.
O próprio Aleksey derrubou a porta de entrada da sala de reuniões da
Mara Salvatrucha com um chute e entrou atirando nos seguranças que não
tiveram chance nenhuma de reação.
​— Aleksey Mikhailov, a que devo a honra da sua visita?
​— Ramirez, eu não costumo visitar meus inimigos. Não tenho tempo para
isso. Quando eu venho pessoalmente é para um rápido acerto, porque sou um
homem muito ocupado.
​— Não somos inimigos. Eu não me envolvo em território da Bratva.
​— Não me pareceu isso quando você usou um cassino do meu território para
prostituição e distribuição de drogas.
​— Enzo Cosa Nostra, o filho do demônio da Cosa Nostra também veio
pessoalmente até a minha residência — Ele falou assim que me viu — e eu
podia sentir o cheiro de medo na sua voz.
​Ramirez sabia que se o Chefe da Bratva matou a todos antes de entrar em
sua sala, não tinha vindo para uma reunião. Não era comum esse tipo de
ação, a não ser para tomada de território, mas ainda assim, a Bratva nunca se
interessou por gangues, furtos de carros e ações do crime organizado de rua
que ela considerava peixe pequeno.
​Ele sabia que tinha algo grande por trás disso e tentava ganhar tempo, algum
acordo, qualquer coisa que o desse uma pequena chance de continuar vivo.
​— Se tivesse avisado, meu caro Mikhailov, eu teria prazer em negociar com
a Bratva e a Cosa Nostra.
​— Eu não faço negócio com quem toca no que me pertence. Você sequestrou
a pessoa errada, seus homens tocaram em partes do seu corpo, e, se não
tivéssemos chegado a tempo teria a usado como mercadoria.
​Eu assistia a tudo tentando me manter distante.
​Essa ação pertencia a Aleksey Mikhailov. Ele era o Chefe.
Eu tirei um cigarro do maço que estava no meu paletó.
Acho que de ontem para hoje fumei uns três maços tentando aplacar
a adrenalina que me consome, mas foi tudo em vão.
Eu poderia incendiar essa porra toda eu pensei enquanto olhava a
chama do meu isqueiro que eu segurava entre os meus dedos.
Eu deixei que a chama queimasse um pouco da palma da minha mão.
A ardência da brasa precisava ocupar a minha mente para que eu não
permitisse que o demônio dentro de mim pulasse para fora.
Até no inferno temos que respeitar hierarquias.
O demônio de Mikhailov estava à frente do meu nessa ação, e eu
precisava alimentar o meu para que ele se calasse.
Coloquei o cigarro na minha boca e dei um trago profundo,
esperando que as substâncias químicas entrassem na minha corrente
sanguínea. Eu sabia que não seriam o suficiente para me acalmar, mas teriam
que servir para alimentar as minhas sombras.
​— A jornalista? Se eu soubesse que ela tinha essa boceta de ouro que fez
primeiro a Cosa Nostra, e agora o Chefe da Bratva vir defendê-la, eu teria
feito uso dela — Ele falou sacando sua arma numa tentativa inútil de se
defender, já que Aleksey o desarmou com dois tiros precisos, fazendo
inclusive que alguns dos seus dedos voassem longe.
​Nossos homens amarraram ele na mesa e Aleksey mandou que entrassem
com a caixa de ferramentas para tortura.
​— A boceta de ouro é da minha sobrinha. É claro que você já sabia disso, ou
então, é um total desinformado, porque eu sei que desde a levei para minha
casa isso se tornou o assunto principal das rodas do submundo. Além disso,
ela será a futura esposa do filho do demônio da Cosa Nostra, que tem chifres
igual ao pai. Eu vou me sentar ali no canto, esperar que ele o torture por
horas, e só então lhe darei um tiro e o mandarei para o inferno.
​Dito isso, Aleksey fez sinal e seus homens limparam uma das cadeiras da
sala de reuniões, onde calmamente ele se sentou e ficou assistindo por mais
de oito horas que eu mostrasse a Ramirez porque ele nunca deveria ter
ousado sequestrar a minha Raissa.
​Não me importa que ele não soubesse que ela era uma Mikhailova, ou que
no futuro ela seria a minha esposa, azar o dele se o seu homem de confiança,
entre tantas jovens, escolheu aquela que seria o seu fim.
​— Vai mesmo me torturar e criar uma guerra desnecessária por uma boceta.
Claro que vai, afinal é uma boceta da Bratva — Ramirez falava na tentativa
que um tiro certeiro tirasse a sua vida.
​Só que eu sou filho de Lorenzo Cosa Nostra, e aprendi que a tortura deve ser
algo grandioso.
Um espetáculo com muitos gritos, lamentos, cheiro de medo e morte
lenta.
​Eu peguei a adaga que sempre levava comigo e enfiei no braço ferido do
homem que estava amarrado, bem no local onde um projétil estava alojado.
O miserável cuspiu em mim e eu limpei o meu rosto, enquanto girava
a adaga que estava encostada no projétil, fazendo com que o seu grito
ecoasse pela casa.
​ Eu poderia cortar a sua língua, mas os seus gritos, e o cheiro do seu

medo, deixam meu demônio em êxtase.
​— Seu filho da puta — Ele gritou enquanto a adaga afundava em sua carne
podre.
​Eu peguei o alicate e ele gritou quando viu que eu arrancaria cada unha dos
dedos que sobraram em sua mão depois dos tiros que levou quando foi
desarmado.
​O sangue jorrava dos seus dedos e o aroma de ferro era como um perfume
atingindo as minhas narinas.
​Foram horas de torturar. Dedos cortados, unhas arrancadas, cortes
cauterizados com sangue, até o momento final.
​Foi então que tirei do fundo da mala um plug anal com um rabo e acenei
para ele com o objeto.
​Os olhos do infeliz se arregalaram.
​Sua boca cheia de sangue e sem dentes não conseguiam falar nada que fosse
compreensível.
​— Isso aqui que vou fazer com você é um presente de casamento que darei
para a minha futura esposa. Ela se afeiçoou a uma das moças que estavam no
cativeiro da boate. A história desta jovem causou pesadelos na minha noiva,
e acho que ela vai gostar de saber que antes de morrer você foi enrabado,
igual gostava de fazer com meninas inocentes que você sequestrava nas ruas
e levava para te servir.
​Entreguei o plug anal e mandei que os soldados introduzissem nele. Ele
gostava de exibir as jovens com coleiras e rabos para os outros, e agora
serviria de espetáculo antes de morrer.
​Ele foi virado na mesa, teve as calças arriadas e o plug com o rabo enfiado
dentro dele até o talo.
​Era assim que ele merecia morrer.
​Retirei as minhas luvas, ajeitei a minha gravata e deixei que Aleksey
mandasse o infeliz para seu destino.
​— Quando chegar no Inferno não esqueça de cumprimentar o meu pai que
eu enviei para lá há mais de vinte anos — Aleksey falou, atirou, se virou e
saiu caminhando sem olhar para trás — Avise que eu não quero nada dessa
máfia — Ele falou para Yuri — Eles que arrumem outro líder e que
aprendam a nunca mais cruzar o meu caminho.
​Entramos no carro e seguimos para o local onde o jatinho nos esperava. Eu
queria muito seguir direto para a Rússia, mas antes precisamos parar na
Filadélfia, onde Irya e para minha surpresa, Yelena nos esperavam na pista
de pouso para embarcar.
​— Eu confesso que não imaginei que a senhora Yelena fosse mesmo
conosco para a Rússia — Falei para Mikhailov enquanto o jatinho pousava.
​— Se ela não viesse não seria uma Mikhailova. Medo é para os fracos. Não
temos esse sentimento correndo em nossas veias. Eu te aconselho a andar na
linha, ou pode acordar com uma parte a menos do seu corpo quando se casar
com a minha sobrinha.
​— Eu não tenho dúvidas disso — Eu falei rindo — Eu sou o torturador, mas
minha futura esposa… bem, ela é a Raissa.
O jatinho parou e Irya e Yelena embarcaram para seguirmos para a
Rússia.
— Redobramos toda a segurança da casa dos Pavlov — Irya falou —
Eles vão ficar bem e em segurança.
​— Raissa vai ficar muito feliz quando ver a senhora. Ela foi avisada?
​— Não, e quando ficar enviando suas mensagens para ela, não diga quando
estamos chegando e muito menos quem está indo conosco — Aleksey falou
olhando sério para mim.
​— Mensagens?
​— Por favor, Enzo, não me tome por idiota, porque você sabe que eu não
sou. E cuidado com o que escreve para Raissa, ou ela não vai te querer,
porque vou arrancar o seu pau fora.
​Aleksey falou, se levantou, indo sentar-se sozinho em outra ala do avião.
​— Ele precisa ficar sozinho — Irya falou — Vamos deixar que ele descanse
porque eu agora só quero chegar e cuidar do casamento da minha sobrinha.
Vamos fazer uma festa linda e a altura desta união de peso: Bratva e Cosa
Nostra.
​— Eu estou preocupado com Matteo que se casou no meu lugar, sem ter
tempo para conhecer a noiva, ou pensar…
​— Não se preocupe com ele, porque Alya me enviou essa foto e algo me diz
que tudo aconteceu como estava escrito.
​Irya me entregou seu celular e na foto Matteo e Natalya estavam sorrindo e
de mãos dadas, cercados por Luna, Alya, Pietro, Antonella e Raissa.
​— Então terminou tudo bem?
​— Eu diria que parece que começou tudo bem para o novo casal. Natalya
merecia a chance de tentar ser feliz, e me parece que Matteo foi a escolha
certa.
​ Luna Cosa Nostra mostrou que tem a sabedoria dos grandes líderes — Eu

falei orgulhoso da minha prima, que com certeza cuidaria muito bem de
todos da Cosa Nostra.
​Enquanto Yelena olhava todo o luxo do jatinho, e provavelmente tentando
imaginar como seria sua vida daqui para frente, e Irya fazia planos para a
festa de casamento, que Aleksey só autorizaria como ele mesmo disse,
depois de um acerto com o meu pai, eu peguei o celular para enviar uma
mensagem para minha Raissa.

​ nzo: Em breve estaremos juntos minha futura esposa encrenqueira.


E
​Raissa: Acho bom você voltar logo porque ontem na festa de casamento
descobri que fui promovida de bastarda a noiva dos sonhos dos filhos dos
associados da Bratva.
​Enzo: Eu não tenho medo da concorrência. Mato qualquer um que ousar
olhar para você. Mesmo sendo uma encrenqueira, e tendo a certeza que
nunca mais terei paz na minha vida, ainda assim, quero você para sempre
comigo.
​Raissa: Essa viagem termina quando? Onde vocês estão?
​Enzo: Em breve estaremos juntos.
​Raissa: Quanto mistério!
​Enzo: Bem-vinda a máfia.

​ resto da viagem foi silenciosa e só quando estávamos nos aproximando do


O
nosso destino, a senhora Yelena se levantou e se sentou ao meu lado.
​— Eu ainda não sei o que esperar disso tudo. Nem sei por que estou falando
com você porque também não nos conhecemos, mas você vai ser meu genro.
Nem sei se na máfia isso têm importância. Não sei de mais nada.
​— A senhora é a mãe da mulher que eu amo, e isso para mim tem muita
importância.
​— Eu pensei que ele tinha mandado matar o meu marido… ex-marido. Mas
ele me ligou, disse que queria se divorciar, que não queria mais contato
comigo. Eu fiquei tão decepcionada. Construímos uma vida juntos por mais
de vinte anos, e ele me descartou por algo que não tive culpa. Como poderia
mandar na minha origem?
​— Se fosse para matá-lo, Mikhailov teria feito assim que ele gritou com a
senhora. Ele teve muita sorte, porque o seu irmão, digamos que não é
alguém que se possa chamar de misericordioso. Acho que ele não morreu
por causa da senhora Polina. Seria um trauma a mais para ela, e eu notei que
Mikhailov têm uma afeição por ela. Achei que ele só sentia algo por sua
esposa e Alya, até vê-lo com a sua mãe.
​— Eu também percebi isso, e quando vi minha mãe sorrir, tocar no seu rosto,
e depois cantar, percebi que ela sente a mesma afeição por ele. Achei que ela
odiasse todos da linhagem Mikhailov, mas a senhora Polina só me
surpreende.
​— Ele era só um menino. Acho que ela é a única pessoa que viu um lado
dele que ninguém conhece. Acho que nem a mãe dele tocou o coração dele
como Polina fez quando ele era criança. Esse carinho verdadeiro e sem
esperar nada em troca, ficou registrado em sua memória.
​— Você sabe o que ele fez com Mark? Se mandou espancarem, ou
torturarem? Isso me deixa apreensiva, não faz parte do meu dia a dia. Não
deveria ser a vida de ninguém.
​— Eu entendo. Mas essa é nossa vida, matamos ou morremos. E não, ele só
mandou que o alertassem do perigo que é irritar o Chefe da Bratva. Seu
marido… ex-marido, é advogado criminalista, e entendeu bem o recado. Ele
só teve o nariz quebrado mesmo, o resto foi só uma conversa.
​— Fico mais tranquila assim, porque vou me divorciar, mas não quero o mal
dele. Sinto pena por ele ter o coração tão duro que não conseguiu enxergar a
essência da sua família. Ele que vai perder. Mas é sua escolha, que siga em
paz. Eu agora preciso enfrentar o meu passado, fantasmas que se criaram na
minha mente e vencer todos eles para seguir em frente.
​Desembarcamos na Rússia, e seguimos para destinos diferentes.
​Enquanto Aleksey seguiu para a mansão Bratva, eu fui para a casa que
minha família estava hospedada. A estadia na Rússia seria curta, mas devido
aos últimos acontecimentos, todos da Cosa Nostra, estavam aguardando
nosso retorno.
​Pietro me enviou uma mensagem avisando que ele e sua família estavam
retornando para os Estados Unidos, porque com a Salvatrucha com mudança
de poder, poderiam causar confusão nas ruas, e eles queriam estar presente
deixando claro o lugar deles.
​Eu só queria agora chegar em casa, tomar um banho e ter um minuto de paz,
mas fui recebido por meu tio Dante que estava na sala me aguardando.
​— Enfim, o meu sobrinho que colocou fogo na Cosa Nostra, que me fez
mudar a minha palavra num acordo, trouxe uma confusão sem precedentes
com bastardos para a Instituição por conta de uma paixão, resolveu aparecer.
Fez boa viagem?
​— O senhor não faltou com a sua palavra, porque o casamento aconteceu, só
mudou o seu sobrinho que se casou.
— Essa questão dos bastardos virá como uma bomba nas nossas
cabeças.
​— Não acredito nisso meu pai. Ninguém será obrigado a reconhecer um
filho bastardo, mas se não quiserem ter esse problema em suas vidas, que
não tenham filhos fora do casamento — Luna falou se sentando ao lado do
pai.
​— Eu não pensei que Mikhailov levaria a tal jornalista com ele — meu pai
falou se juntando a reunião que começou a se formar na sala de estar.
​— Eu entendi o que ele fez — Luna falou — Ele apoiou Alya e deixou claro
que se ela tomou a frente desse assunto, se para ela isso era importante,
então isso era lei para ele, e consequentemente para todos.
​Dante ficou em silêncio. Por mais que meu tio seja uma pessoa muito difícil,
ele faria o mesmo por Luna. Eu sei que ele a apoiaria na frente do conselho
da Cosa Nostra, mesmo que depois tivesse que discutir com ela longe de
todos.
​— Agora precisamos resolver essa aliança com a Bratva — meu pai falou —
Por isso tome um banho, Enzo, e se arrume porque Mikhailov está nos
esperando.
— E ele já avisou que não vai dar dote nenhum por esse casamento,
pelo contrário, ele que vai querer receber algo em troca. E você sabe,
Lorenzo, essa fatia da Cosa Nostra vai sair da sua parte, já que é o seu filho
que avançou o sinal com a sobrinha de Mikhailov. Eu, da minha parte, disse
que aquela viagem era um erro.
Meu tio nunca aceitava se dar por vencido. Ele fingiu não se importar
com o meu casamento, mesmo sabendo que agora teria laços estreitos com a
Bratva.
A Cosa Nostra lucraria com o meu casamento, pois cada vez mais a
união das duas maiores máfias se tornava indestrutível, mas ele nunca
admitiria isso em voz alta.
Eu subi para tomar um banho, mas confesso que a ansiedade estava
tomando conta de mim. Eu não conseguia me desligar, ou ficar frio, porque
simplesmente eu estava me arrumando para definir o meu futuro com a
minha encrenqueira.
Lembrei dela caída no chão da boate, saindo ao meu lado vestindo só
o meu paletó, me mandando pagar suas roupas numa loja para turistas em
Vegas, falando sem parar enquanto comia todo o cardápio da lanchonete, e
tudo isso em menos de dez horas.
Raissa me mostrou desde o primeiro momento que com ela tudo seria
uma explosão de sentimentos e confusão, e agora, eu estava a poucas horas
de me tornar seu noivo.
Eu abri a minha mala, e tirei do fundo dela uma caixinha de veludo.
Enquanto estava em Dubai tirei a medida do seu dedo de brincadeira,
dizendo que ela precisava de um anel com chip para que eu a protegesse
sempre.
Nunca me desfiz daquela medida e mandei fazer um anel lindo para
ela. Muitas vezes pensei em jogar tudo para o alto, mas o meu amor e
instinto protetor falavam mais alto.
Coloquei a caixinha no bolso do meu terno e respirei fundo.
Finalmente esse anel teria um destino, e não seria no fundo da minha mala
como lembrança de algo que não pude viver, mas no dedo da minha futura
esposa, simbolizando a nossa união.
Capitulo 57
Raissa

Só para variar eu estava no meu quarto já que não tinha nada para fazer
dentro do mausoléu, quando meu celular vibrou e corri porque eu sabia que
era mensagem do Enzo.

​ nzo: Já estou na Rússia, e ainda hoje irei com o meu pai pedir a sua mão
E
em casamento.
​Raissa: Nossa, que romântico você me contar isso assim, por mensagem. Eu
não sei se você já escutou falar em surpresa, como por exemplo colocar o
anel em algum lugar para eu encontrar, um jantar a luz de velas.
​Enzo: Eu adoraria realizar esse seu desejo, mas na máfia o pedido é feito
para o Chefe da Família e não para a noiva.
​Raissa: Essa máfia sabe como estragar os melhores momentos. Nos vemos
mais tarde? Ou você só vai estar com o Chefe da Família, sem direito a ver a
noiva.
​Enzo: Vamos nos ver meu amor.
Raissa: Eu tenho uma pergunta?
​Enzo: Se você não tivesse, não seria jornalista.
​Raissa: Casando com você, eu vou poder ser da máfia das mulheres? Porque
eu acho que meu trabalho como jornalista investigativa de casos policiais e
misteriosos, não será mais possível porque agora eu sou uma fora da lei,
então, eu pensei que poderia ser uma mafiosa tipo Sarah Cooper.
​Enzo: Vamos ver isso depois, mas, por favor, não mencione nada disso perto
do meu pai. Escutar que você quer ser como Sarah, vai fazer ele infartar e
não quero perdê-lo tão cedo.
​Eu dei de ombros, e fui até a varanda olhar pela milésima vez o jardim,
quando vi uma movimentação maior da segurança, e logo a seguir vários
carros estacionando em frente a porta principal.
​ primeiro a sair de um dos carros foi Aleksey Mikhailov. Ele estava sério
O
como sempre, mas achei lindo ele estender a mão para Irya saltar do carro.
​Os brutos também amam, nunca fez tanto sentido para mim.
​Ele caminhou até o outro carro, e estendeu a mão para alguém. Quem era a
outra mulher que estava vindo com eles? Meu coração disparou quando vi
que era… não podia ser… esfreguei os meus olhos e sim, era a minha mãe.
​O que ela veio fazer na mansão Bratva?
​E por que ela veio com Aleksey e Irya?
​A viagem. Eles estavam todos na Filadélfia.
​Por que minha mãe não me avisou que estava vindo?
​E por que estou fazendo tantas perguntas para mim mesma feito uma estátua
nessa varanda?
​Saí correndo do meu quarto, desci as escadas apressadas e assim que cheguei
no salão vi minha mãe entrando ao lado de Aleksey.
​— Mãe! Meu Deus, mãe, o que você está fazendo aqui? Por que não me
avisou que estava vindo? Te mandei mensagem e você disse que me ligaria
mais tarde. Por que não me contou?
​— Calma, filha, eu queria te fazer uma surpresa. E isso tudo é muito difícil
para mim, então não podia ficar falando sobre isso ou não venceria os
fantasmas que estão tentando se instalar na minha mente.
Eu a abracei forte mostrando que sempre estaria ao seu lado, e se fui
uma filha que não procurava por ela, e estava sempre ocupada com a minha
vida, agora seria mais presente e companheira.
​Que mulher forte é a minha mãe.
Irya disse que minha mãe ficaria num quarto ao lado do meu, e
subimos para que ela pudesse descansar. Assim que ficamos sozinhas nos
deitamos juntas na cama e ficamos nos olhando.
​Que loucura foi essa dos últimos dias que mudou tanto as nossas vidas?
​— Sabia que estar aqui por mais que pareça uma grande loucura na verdade
é libertador? — Minha mãe falou.
​— Libertador no sentido de expurgo?
​— Sim, estou expurgando minha dor, meus demônios que me fizeram sentir
ódio, meus medos que me paralisaram, meus sentimentos confusos, meu
coração totalmente quebrado.
​— Como você veio parar aqui?
​Minha mãe me contou sobre a visita de Aleksey e de como foi emocionante
o reencontro dele com a minha avó. Ela me falou do meu pai e do corretivo
que ele levou, e não senti a menor pena.
​— O meu pai para mim é uma grande decepção. Aleksey nunca tinha te
visto e te defendeu, acolheu, protegeu, enquanto o homem com quem você
dividiu mais da metade da sua vida, te virou as costas.
​— Seu pai me virou as costas, e o meu… Aleksey Mikhailov com toda a sua
frieza de um Chefe da Máfia, me acolheu. Eu não sei como e nem porque,
mas ele tem afeição pela sua avó. Ele disse que estendeu a mão para ela no
hotel no dia que ela ficou para trás e fugiu do monstro.
​— Ele fez isso?
​— Ele disse que sim, mas que ela não pegou a mão dele. Irya me disse que
Aleksey é um homem atormentado por pesadelos, que ele sofreu muito para
ser o Chefe, e quando conseguiu parou de escutar o pai, que o dominava, e
por fim, o matou.
​— Isso tudo é muito forte. São relatos cruéis, e para eles não passa de mais
uma história como tantas outras.
​— Só que agora tudo mudou. Por isso eu precisava vir, e viver tudo isso de
perto. Nunca mais nada será como antes na minha vida.
​— E o que você vai fazer? Continuar trabalhando e…
​— Raissa, eu não posso continuar a ter a mesma vida depois disso tudo. Eu
não sou só o fruto de um estupro. Se fosse esse o caso, eu surtaria, choraria,
teria ódio do mundo, faria terapia e seguiria em frente. Só que do nada passei
a fazer parte de uma organização criminosa. E logo dá maior de todas, o que
me faz ter mais inimigos que os segundos de um dia.
​— Eu também não posso mais ser a jornalista que eu sonhava. Eu sou
mafiosa. Mãe, nós somos da máfia.
​— Eu não posso ser advogada como antes, pegando casos que possam gerar
conflitos com a organização, ou ficando exposta na rua e tomar um tiro do
nada. Eu não sei mais se eu consigo ser como antes.
​— E os meus avós?
​— Eu conversei muito com Irya enquanto vínhamos para cá, e estou tendo
algumas ideias, mas o que eu decidi fazer meus pais estarão comigo. Eu
deixei eles cercados de segurança na Filadélfia, e quando eu voltar vou
conversar com eles.
​— Posso saber que ideias são essas?
​— Por enquanto não. Deixa que eu amadureça tudo, pense bastante, e daí
você vai saber. Agora me conte como foi o casamento que você foi ontem, e
me dê mais detalhes sobre o que nos espera na nossa nova vida no
submundo.
​Eu dei uma gargalhada escutando minha mãe falar com tanta calma que
agora éramos entre outras palavras mafiosas.
​ — Minha filha, eu sou realista. Tudo mudou, e eu não vou ficar sentada
chorando, pelo contrário, vou dar um novo sentido a minha vida. Só não
quero contar nada sobre isso agora, mas você me aguarde.
​Eu não sabia o que a minha mãe estava pensando em fazer, mas com certeza
era algo que parecia ter feito ela ter vontade de viver novamente. Ela estava
forte, fazendo planos, e eu só me sinto cada vez mais orgulhosa e grata por
ser filha desta mulher.
​— Vamos lá que eu vou te contar sobre o casamento de Matteo Cosa Nostra
e Natalya Rurik.
​Eu contei sobre as pessoas, como estavam vestidas, sobre o que falavam,
seus costumes, e como elas vivem realmente num mundo paralelo.
​— O que mais me chamou atenção, é que na nossa sociedade eu seria a
destruidora do casamento de Natalya e uma pessoa não desejada no mesmo
ambiente que ela. Mas lá, eu era a convidada de um casamento que parecia
estar programado a meses, e não decidido na véspera.
​— Onde não existe sentimento, não existe rancor ou mágoa.
​— Foi isso que eu senti quando cheguei e ela me cumprimentou como se
nada tivesse acontecido. Alya me contou sobre uma conversa que a Natalya
teve com Luna, e fiquei impressionada com essa coisa toda de casamento
arranjado, e como elas aceitam algo tão medieval como sendo o certo para as
suas vidas.
​Eu expliquei que Natalya falou sobre escolher alguém de fora e colocar um
alvo na sua testa, o que me lembrou o motivo pelo qual Enzo ia se casar com
ela. Ele não queria que eu fosse alvo dos seus inimigos.
​Para mim era difícil admitir que no final de tudo essa lei deles não estava de
toda errada, porque longe dos muros que os cercam ficam muito vulneráveis.
Não vejo como mudar isso sem que a máfia termine, então essa tradição está
longe de mudar.
​— Outra coisa que me impressionou, é como eles agem apenas por interesse.
Não tinha vinte e quatro horas que queriam me jogar no lixo como uma
bastarda imunda, e lá estava eu, alvo dos olhares dos homens da máfia e
sendo cobiçada pelos seus herdeiros.
​ u e minha mãe tínhamos muito o que conversar, compartilhar, pesquisar,
E
fofocar, mas fomos interrompidas por uma batida na porta e a entrada da
minha prima, Alya, que estava chegando de um interrogatório, sabe lá com
que requintes de tortura, como se estivesse chegando do shopping.
​— Eu sou Alya Mikhailova — Ela falou sorrindo para a minha mãe — Eu
vim para conhecer a senhora, mas se estiver interrompendo algo eu posso
voltar outra hora.
​— Muito prazer, e você não está nos interrompendo.
Minha mãe ficou olhando para Alya e só então me dei conta que ela
era sua sobrinha. Não falei nada, embora não seja o meu estilo, mas deixei
que as duas se conhecessem sem pressão, e que o tempo ajeitasse tudo.

∞∞∞
J​ á estava anoitecendo, e eu tinha acabado de tomar um banho e resolvi me
arrumar, já que Enzo disse que viria me ver e pelo visto eu ficaria noiva essa
noite.
​Eu ri sozinha pensando nisso?
​Eu não ficaria noiva com um pedido de casamento, e sim, através de um
acordo entre o pai do Enzo e o meu tio.
​Para mim ainda era surreal ter um tio, quanto mais imaginar ele acertando o
meu casamento.
Em uma situação normal jamais me casaria tão rápido. Na verdade,
se eu pudesse iria namorar, curtir muito com Enzo e só depois me casar, mas
minha mãe me fez prometer que eu ficaria quieta, aceitaria as regras da
Instituição e não criaria mais confusão com meus devaneios.
​Eu não faria isso! A Raissa de algumas semanas atrás iria tentar convencer
todo mundo que isso de se casar de um dia para o outro é surreal, mas a que
está aqui na Bratva já entendeu que pertence a esse mundo, e o melhor que
tem a fazer é se adaptar a ele.
​Uma batalha de cada vez, como disse a minha musa inspiradora, Sarah
Cooper. Ela com certeza não chegou aonde está sendo impulsiva.
​Minhas amigas vão dizer, mas e os seus sonhos e projetos? Vai jogar tudo
pro alto por amor?
​Ah, se fosse só por isso. Mas a verdade é que me tornei alvo de pessoas
perigosas, e mesmo se eu não me casasse com Enzo, não poderia mais fazer
reportagens que me colocassem em mais perigo do que eu já corria.
​Mas tudo bem se pensarem que foi por amor, porque que o meu mafioso não
desconfie disso nunca, mas eu jogaria sim tudo pro alto para ficar com ele.
Eu teria feito isso em Dubai, se ele tivesse dito adeus à máfia.
​Mas se ele tivesse feito isso já teríamos morrido em alguma emboscada,
então, que bom que ele disse não e que o destino se encarregou de nos unir
da forma correta.
​Me olhei no espelho e amei o look que eu escolhi e que achei perfeito para
esse momento tão importante da minha vida. Eu gostava de me arrumar e
esse vestido vermelho escarlate que eu comprei antes de saber que era da
elite vermelha estava perfeito para a ocasião.
​Eu mesma passei um esmalte vermelho nas unhas, esperei secar e só então
finalizei minha make com um batom nude.
​Respirei fundo enquanto aguardava e me assustei quando minha mãe bateu
na porta do meu quarto.
​— Filha, você está linda!
​— Eu acho que vou ficar noiva hoje e mesmo não sendo num jantar à luz de
velas, e sim numa reunião da máfia, quero estar linda para esse evento.
​— Eu vou descer porque parece que a família do seu futuro noivo chegou, e
seu… Aleksey Mikhailov mandou me chamar.
​— Eu vou com você.
​— Nada disso, minha prima — Alya entrou falando no meu quarto — Você
vai ficar aqui no seu quarto, e só vai descer quando o meu pai te chamar.
​— Que coisa pré-histórica.
​— Raissa, por favor.
​— Não se preocupe, acho que todas as moças da máfia agem assim neste
dia. Só que minha prima, você ao contrário das outras, teve a chance de
escolher o seu noivo, e o melhor de tudo, de ser escolhida por ele não por
convenção, mas por amor.
​Eu comecei a respirar e expirar repetidamente na tentativa de me acalmar,
ganhei um abraço da minha mãe e me preocupei vendo-a descer sozinha para
uma reunião onde eu não sei quantos gatilhos seriam disparados contra ela
na sua mente ainda em construção nessa nova vida.
​— Não se preocupe porque minha mãe e Nina vão estar ao lado dela.
​— E agora? Ficamos aqui aguardando?
​— Sim, quando eles acertarem tudo meu pai manda te chamar.
Capitulo 58
Enzo Cosa Nostra

A mansão Bratva nunca me pareceu tão longe quanto hoje. Eu e


meus pais seguimos no mesmo carro, já que não tivemos tempo para
conversar sobre tudo que aconteceu.

— Eu espero que você esteja satisfeito com toda a confusão que


criou, sem contar com o que vou ter que abrir mão para essa união. No lugar
de receber um dote, terei que abrir mão, afinal de contas a Cosa Nostra tem
mais interesse nessa aliança do que a Bratva.

— Eu estou feliz, meu pai, e não posso negar. O senhor sabe que eu
respeitei a Cosa Nostra e sua decisão, mas se o destino…

​ Por favor, não me venha com essa conversa de destino. Isso tudo, Nina, é

culpa sua, que inventou de criar o nosso filho cheio de vontades.

​ Eu? Não seja ridículo, marido. Ele é meu herdeiro. Ele pode ter um

cavalo. Ele pode ter um cachorro. Ele pode tudo que ele quiser. Essas frases
são suas, e não minhas — Minha mãe falou e o meu pai contrariado ficou em
silêncio.

​ uando já estávamos nos aproximando da mansão, meu pai voltou a falar,


Q
mas desta vez sobre valores, sobre o que iria propor a Aleksey e deixou claro
que não queria interferência na negociação.

​ u concordei, porque para mim só interessava colocar o anel no dedo de


E
Raissa e marcar nosso casamento, o resto poderia ser dentro da tradição que
eu não me importava.

​ uando nosso carro atravessou o jardim da Bratva e paramos em frente a


Q
escada, ajeitei a minha gravata e saí do carro depois do meu pai e da minha
mãe que sorriu para mim.

​ omos recebidos por Yuri e levados até a sala de reuniões da Bratva. Assim
F
que entramos Irya veio abraçar minha mãe e Aleksey apertou a mão do meu
pai, depois a minha, nos ofereceu um whiskey e ficamos todos em silêncio.

​ u estava ansioso, sem entender por que ninguém falava nada, até que a
E
porta da sala se abriu e a senhora Yelena entrou, visivelmente deslocada e
sendo recebida por Irya.

​ As nossas esposas que não entendem que isso é assunto entre homens —

Aleksey falou olhando para Lorenzo que assentiu com a cabeça — além de
participarem da reunião, acharam que Yelena deveria estar presente
também.

​ Muito prazer, eu sou a Nina, mãe do Enzo — minha mãe falou sorrindo

— Eu também sou americana.

​ Sim, eu a conheço de nome, o seu pai foi meu professor e orientador em



um dos meus estágios.

​— Você também é advogada?

​— Sim.

​ Eu parei de exercer… bem, você pode imaginar o motivo. E você, atua



em que área?

​— Atualmente estou mais na vara de família, mas o meu escritório tem mais
clientes na área criminal.

​ Muito bem, se quiserem continuar conversando — Aleksey falou —



Podem continuar na outra sala, e aproveitem e peçam o chá.

​ Não se assuste com a falta de educação do seu irmão — Irya falou e as



três se sentaram.

​ urante mais de duas horas meu pai e Aleksey ficaram falando sobre
D
territórios, cassinos, boates e tudo mais que tivesse algum valor financeiro, e
depois de muito discutirem chegaram a um acordo que favorecia os dois
lados.

​ ntão, quando pensei que estava tudo certo começaram a falar sobre o local
E
da cerimônia e a data, sendo interrompidos por Yelena, que até então
escutava tudo em silêncio.

​ Desculpe eu interromper, mas a questão do local do casamento eu vou ter



que me intrometer porque quero que os meus pais assistam esse dia tão
importante na vida da neta deles. Se para os senhores tudo não passa de um
negócio, para mim e a minha família, isso é um passo muito importante e
especial que a minha filha vai dar na vida dela.

​ la argumentou como uma advogada e seu tom de voz firme era digno de
E
uma Mikhailova.

​ O casamento de Raissa vai se realizar ou na Filadélfia, na Sicília, ou em



qualquer outro lugar do mundo, menos aqui na Rússia, onde de forma
alguma a minha mãe viria. E eu também gostaria que o pedido de casamento
fosse feito diretamente para ela, porque vocês podem ter suas regras, mas até
ontem, eu e minha filha tínhamos as nossas, e ainda estamos tentando nos
adaptar a todo esse mundo que eu sei que fazemos parte.

​ Você sabe que se ela disser não e eu sim, ela vai se casar do mesmo jeito?

— Aleksey falou olhando sério para Yelena.

​ Raissa não moveu céus e terra para dizer não para o Enzo, por isso acho

que não devemos criar uma guerra de quem pode mais com algo totalmente
fora de cogitação.

​ Mande chamar Raissa — Aleksey falou e eu percebi que se ele pudesse



quebraria todo o escritório. Era visível o seu descontentamento com mais
uma mulher querendo ditar regras na máfia.

​ tempo parecia congelado no relógio até que Raissa entrou no escritório,


O
linda como sempre e vestida como uma verdadeira herdeira da Bratva, com
um vestido vermelho escarlate.
​ u não sabia o que fazer, já que na máfia não era assim que as coisas
E
funcionavam e por alguns segundos todos ficamos em silêncio.

​ inha mãe me olhou como se fosse se levantar e me jogar de joelhos no


M
chão da sala de reunião da Bratva, e então eu pedi licença a Mikhailov que
fez uma cara de quem queria que aquilo terminasse logo, e me levantei
caminhando até Raissa que estava de pé me olhando sem entender nada.

​— Raissa O’Brien…

​— Mikhailova — Aleksey falou.

​ Raissa Mikhailova — Eu falei me ajoelhando na sua frente e ela me



olhou como se estivesse se acostumando a ser chamada assim — Você aceita
se casar comigo? — Eu falei tirando a caixinha de veludo do bolso com o
anel que eu comprei para ela.

​ Sim, mas eu acho que a minha resposta eu dei antes desse pedido quando

desembarquei aqui na Rússia.

​ u coloquei o anel no dedo de Raissa e quando me levantei ela me abraçou,


E
e antes que alguém falasse alguma coisa, Luna e Alya entraram na sala de
reuniões.

​ Eu chamei Luna para esperar o fim da reunião comigo — Ela falou



puxando Luna para ver o anel.

​— E para quando vai ser o casamento?

​ Eu penso que trinta dias seria tempo suficiente para organizarmos tudo

com calma — Irya falou e Yelena concordou.

​ Dentro de trinta dias na Cosa Nostra — Lorenzo falou e Mikhailov



apertou sua mão selando o acordo.

​ Raissa, saiba que eu estou muito feliz em ter você como nora — Minha

mãe falou — Eu escolhi você desde que Enzo me falou a seu respeito, e torci
para que vocês ficassem juntos.
​ elena abraçou Raissa e eu pude perceber que existia medo e ansiedade no
Y
olhar que trocaram, o que era normal no meio de tudo que estavam vivendo.

​ Agora que está tudo certo vamos sair e comemorar? — Alya falou —

Normalmente os noivados na máfia não são motivos de verdadeira
comemoração, pois são formais e obrigados, mas como esse é por amor
então vamos para a boate festejar.

​ u achei a ideia perfeita porque queria poder falar com Raissa longe de
E
todos, e como Luna e Alya não deram chances de ninguém falar nada, nós
saímos, deixando todos na sala de reunião e indo fazer algo inusitado na
máfia, como Alya falou, que era comemorar de verdade um noivado.

​ omos todos numa limusine blindada e decorada para uma festa. Não sei que
F
horas Luna e Alya planejaram isso tudo, mas elas estavam felizes e eu grato
porque elas foram as responsáveis por esse momento.

​ iquei olhando como Raissa se dava bem com as duas, e fiquei feliz por ver
F
que talvez não fosse tão difícil ela se adaptar ao meu mundo, que agora eu
sei sempre foi o dela também.

O problema é que ela não iria aceitar ficar em casa, e eu vendo as três
juntas já sabia que ia ficar louco com a minha esposa querendo sair em
missão com a máfia das mulheres.

Assim que chegamos na boate da Bratva que Alya era responsável,


fomos direto para o seu camarote que ficava afastado de todos os outros da
casa noturna.

​ Eu e Luna vamos dar uma circulada, e depois vamos no meu escritório,



porque você sabe sempre é bom conferir o funcionamento de tudo. Os
seguranças estão na entrada da escada e vocês podem ficar tranquilos que
nenhum inimigo vai entrar aqui.

​ s duas desceram e um garçom chegou com uma garrafa e duas taças de


A
champanhe, nos serviram e foram embora.

​— É impressão minha ou estamos sozinhos, meu noivo mafioso.


​ Se você olhar bem — Eu falei mostrando a pista de dança — têm muita

gente lá embaixo eu falei indo me sentar e admirando a minha noiva que
veio andando na minha direção.

​ Então eu espero que eles não possam ver nada aqui em cima — Ela falou

dando a volta na mesa até parar atrás de mim, se curvando e mordendo a
minha orelha.

​ Eu senti algo gelado resfriando a minha pele quente, e me dei conta que
Raissa tinha derramado champanhe no meu pescoço e estava me lambendo
para saborear a bebida.

— Você está delicioso, meu mafioso.

Ela deu a volta, afastou uma perna da outra fazendo o seu vestido
subir e se sentou no meu colo esfregando sua boceta no meu pau que já
estava duro só por estar perto dela.

— Você está me provocando minha noiva, e vou acabar te fodendo


aqui no meio desta boate.

Ela se levantou e caminhou e colocou suas mãos na bancada olhando


para baixo. A seguir ela virou a sua cabeça e olhou para mim enquanto
empinava sua bunda para mim.

Eu me levantei e caminhei até ela, e abracei esfregando meu pau na


sua bunda.

— Safada, você quer que eu te coma aqui com todo mundo lá


embaixo.

— Você me deve uma foda no segundo andar desde Dubai.

Ela falou se referindo ao cassino clandestino onde tinha um segundo


andar de putaria compartilhada que eu nunca levaria Raissa.

Eu puxei com força sua calcinha, fazendo com que ela rasgasse e
ficasse nas minhas mãos, e a seguir a guardei no meu bolso enquanto Raissa
respirava ofegante olhando o povo na pista de dança.
Eu pressionei o seu corpo contra a bancada, e afastei suas pernas
colocando minha mão entre elas, e Raissa gemeu e rebolou gostoso enquanto
eu podia sentir sua boceta gulosa pronta para mim.

— Preocupada que alguém veja a gente? — Perguntei quando a vi


olhando as pessoas que estavam no camarote do outro lado.

— Eu não me importo com as outras pessoas — Ela falou virando o


rosto e se aproximando e colando sua boca no meu ouvido — Eu quero é o
seu pau enterrado dentro de mim. Eu amo a adrenalina que sinto sempre que
estou com você.

Eu estava com saudades daquela boca suja que ele tinha, e mais
ainda de estar dentro dela. Sem avisar, e sem preliminares, eu entrei forte
dentro dela, fazendo seu corpo bater na bancada e ela gemeu alto tendo a
visão de toda a boate aos seus pés.

— Você acha que eles podem nos ver do outro camarote?

— Ver tudo eles não podem, mas imaginar que eu estou te comendo,
e enfiando meu pau na sua boceta melada com certeza.

Eu dei um tapa forte na sua bunda e ela rebolou gostoso apertando e


esmagando o meu pau dentro dela.

— Me faz gozar forte.

Para Raissa a multidão lá embaixo não importava e seu pedido era


uma ordem.

— Vou te fazer sair daqui com a minha porra escorrendo pelas suas
pernas — Eu falei estocando forte dentro dela que gemia e sorria olhando
para baixo como se nada estivesse acontecendo de diferente no nosso
camarote.

​ u comecei a massagear seu clitóris enquanto enterrava dentro dela, e não


E
demorou muito para sentir todo o seu corpo convulsionando.

​— As pessoas pensam que estou dançando.


​— E você está, só que no meu pau.

​— Porra, eu vou gozar. Nunca gozei no meio de tanta gente.

​ aissa realmente gostava de desafios, e transar numa boate, deixando livre a


R
imaginação das pessoas que nos viam a distância, já que nosso camarote era
isolado fez com que o seu tesão aumentasse e ela gozou forte, esmagando o
meu pau e com o som alto da boate abafando os seus gemidos.

— Eu quero te foder de verdade, vamos sair daqui.

Eu saí de dentro dela e Raissa resmungou, mas gostou quando eu


disse que tinha reservado uma suíte no hotel enquanto vínhamos para cá e
ela se divertia com suas mais novas amigas na limusine.

Raissa deixou a boate junto comigo, com os seguranças nos


seguindo, sem se importar com as suas pernas meladas pela minha porra.

— O espetáculo de ver esses seus peitinhos durinhos e essa bocetinha


gostosa é só para mim que sou seu noivo — Eu falei enquanto entrávamos
na suíte e eu tirava o seu vestido — Deite-se de costas para mim! — Eu
ordenei e ela obedeceu.

Eu tirei minha gravata, cruzei os seus braços para trás e amarrei os


seus pulsos.

— Eu quero escutar você gritando o meu nome toda vez que eu te der
uma palmada. Você entendeu?

Ela fez que sim com a cabeça e ganhou o primeiro tapa em sua
bunda.

— Eu não escutei! — Falei e dei o segundo tapa ainda mais forte e


senti seu corpo estremecendo.

— Enzo — Ela gritou — Minha boceta está pegando fogo.

— E vai pegar mais ainda — Eu falei dando outro tapa forte e vendo
as marcas do meu dedo na sua bunda — e não quero que você goze até eu
ordenar mesmo que sua boceta fique latejando sem parar.

— Safado!

— E você gosta, não é verdade?

— Enzo, eu preciso gozar.

Eu ergui seu quadril para o alto e fiquei com uma visão linda da sua
boceta piscando toda melada querendo gozar.

— Vou comer essa bocetinha. Você quer?

— Quero tudo, mas me deixa gozar primeiro.

— Não se atreva! — Eu falei e dei outro tapa em sua bunda antes de


enterrar tudo dentro dela.

— Porra, assim eu não vou aguentar.

— Vai sim, ou vou sair de dentro de você, e te dar tantas palmadas


que sua bunda vai ficar muito vermelha de tanto apanhar.

— Se eu tentar gozar você vai me torturar?

Eu saí de dentro dela e Raissa se contorceu desesperada sentindo o


vazio que meu pau deixou.

— Você quer ser torturada?

— Quero meu mafioso torturador e cortador de cabeças.

— Você é louca.

— Me fode, Enzo Cosa Nostra. Eu quero seu pau… eu quero ser


torturada... eu quero gozar caralhooooo

Raissa falava frases soltas, me xingava, gemia alto e a diaba era tão
gostosa, que pela primeira vez o torturador se sentiu torturado.
Ela era tão linda tentando controlar o seu orgasmo, e gritando feito
louca, que ao mesmo tempo que eu queria continuar assistindo esse seu
espetáculo de luxúria, eu queria sentir o meu pau lambuzado por ela.

Ela pressionou o rosto no travesseiro, enquanto eu me enterrava


dentro dela e espancava a sua bunda deliciosa, e mesmo gritando que não
aguentava mais e precisava gozar, ela ainda empinava a bunda pedindo para
eu ir mais fundo.

— Agora você vai admitir que é minha.

— Só depois do casamento.

— Você não presta.

— E nem você, meu herói fora da lei.

— Eu vou te ensinar a me respeitar.

— Eu já vou te avisando que eu demoro a aprender e que você vai ter


que me torturar muito.

Eu comecei a estimular o seu clitóris enquanto estocava forte e


finalmente deixei que ela se libertasse, mas continuei a tocando, entrando e
saindo dentro dela de forma ritmada, fazendo com que ela se tivesse um
orgasmo múltiplo.

— Enzo — Ela falou com seu corpo ardendo em brasas e tendo


orgasmos seguidos com diferença de segundos entre um e outro.

Eu soltei seus braços, pensando que ela iria se deitar, mas ela me
empurrou, sentou-se entre as minhas pernas e abocanhou o meu pau, com
seus lábios carnudos e perfeitos, enquanto me olhava mostrando o quanto
sentia prazer em me chupar gostoso.

Raissa me chupava, lambia, mordiscava, até que segurei com força


os seus cabelos entre os meus dedos, estocando bem forte em sua boca e
quando eu gozei ela só parou de me lamber quando não tinha mais nenhuma
gota do meu sêmen para ela chupar.
Só então nos deitamos abraçados e com nossas pernas entrelaçadas
uma na outra, esperando nossa respiração voltar ao normal.

— Podemos passar essa noite juntos?

— Eu quero me casar com você, senhorita Mikhailova, e por isso


vamos encontrar com as promoters desse nosso encontro e voltar cada um
para suas casas.

— E depois…

— Eu vou voltar para a Cosa Nostra, e você e sua mãe devem voltar
para a Filadélfia dentro de alguns dias. Depois nos encontraremos na Sicília,
onde eu te esperarei no altar.

​— Eu te amo.

​— Eu também te amo muito minha jornalista encrenqueira.


Capitulo 59
Yelena Mikhailova

Acordei cedo, fui até a janela e fiquei admirando o jardim da minha


nova casa. É incrível como que bastaram alguns segundos para eu ter várias
ideias do que poderia ser feito ali, como um jardim com rosas, um espaço
para horta, um ateliê de pinturas e aulas de ioga ao ar livre.
Fui tomar um banho com a minha mente fervilhando de novas ideias
para a casa nova, e eu tinha mil planos para que ficasse tudo perfeito.
Eu escolhi para o meu primeiro dia de trabalho, uma blusa gola alta
vermelho escarlate que ganhei de presente da minha cunhada Irya, vesti o
meu terninho off white, calcei uma sapatilha bico fino também off white, fiz
uma make básica finalizada com um batom nude e me senti pronta para o
primeiro dia de funcionamento da casa de reabilitação da Instituição.
Respirei fundo, sorri para o meu reflexo no espelho e me senti pronta
para recomeçar uma nova fase da minha vida, agora na Sicília, próxima da
minha Raissa que se casa dentro de uma semana com Enzo.
Eu desci as escadas sentindo o aroma delicioso do café e do
medovik, uma sobremesa russa que minha mãe sempre fazia e eu amava.
— Bom dia para todos — Eu falei vendo Raissa e o meu pai sentados
tomando o seu café da manhã e minha mãe cozinhando — o cheirinho desse
bolo de mel invadiu a casa.
— Eu fiz esse medovik especialmente para comemorarmos o nosso
primeiro dia de trabalho nessa casa — Minha mãe falou sorrindo e eu pude
ver que ela estava feliz com a nova vida que estávamos começando.
— Eu vou comer rápido porque tenho uma videoconferência daqui a
pouco com Sarah para alinharmos tudo para a chegada das jovens resgatadas
na última semana numa boate da Colômbia e as que são vítimas de violência
doméstica, tiveram coragem de denunciar, mas ficaram sem lugar para
recomeçar a vida.
— Você já sabe quantas são? — Raissa perguntou.
— Cinco desta boate, duas vindo da Rússia, três aqui da Sicília e
quatro dos Estados Unidos.
— Esse trabalho da máfia das mulheres é muito lindo e eu estou tão
orgulhosa vendo você à frente dele — Raissa falou sorrindo e vindo me
abraçar — Sempre admirei tanto Sarah Cooper, e, agora, minha mãe é uma
mulher que luta ao seu lado na máfia das mulheres.

FLASHBACK
​ ssim que desembarquei depois de quase uma semana na Rússia, fui direto
A
para a casa dos meus pais saber como eles estavam e conversar com eles
sobre o nosso futuro.
​Durante a viagem para a Rússia, uma semana antes, Irya me contou tudo
sobre o trabalho que Sarah Cooper realizava à frente da máfia das
mulheres.
​Ela tinha ao todo três centros de reabilitação, podemos chamar assim, que
funcionam como se fossem as nossas Ongs, com a finalidade de ajudar as
vítimas de violência da Instituição.
​Seus planos era de expandir esse projeto, mas precisava de pessoas à frente
dos novos centros, e desde que eu escutei sobre isso, senti vontade de cuidar
e acolher essas mulheres.
​E foi assim, que ao longo da semana na Rússia, eu tive várias reuniões com
Sarah e as outras mulheres da máfia, para conhecer mais como tudo
funcionava e tomei a decisão que para mim era a mais certa de todas: fundar
e dirigir um desses centros de reabilitação.
​Eu decidi que o melhor lugar seria na Sicília, porque uma vez que Raissa iria
viver lá, eu e meus pais poderíamos ficar próximos dela.
​Aleksey não gostou, porque ele queria que fosse na Rússia, mas por fim se
deu por vencido já que minha mãe nunca aceitaria morar lá.
​Eu e o meu irmão tivemos várias discussões ao longo da semana,
principalmente porque eu não estava acostumada a receber tantas ordens, e
ele se tornou uma sombra querendo me proteger de tudo e de todos.
​No final eu entendi que essa era sua forma de demonstrar amor. Cuidando
das pessoas que ele gosta, sem dizer que gosta, porque ele não é um homem
que gosta de ninguém, como ele vive repetindo.
​Eu comecei a rir sozinha lembrando de como Aleksey era ranzinza e chato,
mas ao mesmo tempo, protetor e acolhedor. Sim, ele me acolheu quando
para a máfia eu nem deveria ter nascido. Ele assumiu a mim e a minha filha,
como legítimas Mikhailovas e estava disposta a matar cada um que se
levantasse contra a sua decisão.
​Meu olhar perdeu o brilho quando me lembrei de Mark. As ruas da Filadélfia
me fizeram lembrar dele e dos mais de vinte e cinco anos que ficamos juntos
entre namoro, noivado e casamento.
​Como ele pode me virar as costas? Como ele pode renegar a filha que dizia
amar tanto?
​Eu sacudi a cabeça e joguei as lembranças para longe e sorri quando o
motorista avisou que estávamos chegando na casa dos meus pais.
​— Já estamos chegando Senhora Mikhailova — ele falou e eu precisava me
acostumar com esse sobrenome que não parecia ser meu e ainda me
despertava mil gatilhos, mas que o meu irmão dizia ser importante para
mostrar a todos quem eu era e do risco de tentarem algo contra mim.
​— Obrigada. Você pode parar em frente à casa, fazer a varredura de sempre
e se juntar aos outros seguranças.
​— Sim, senhora.
​Quando o carro parou em frente à casa dos meus pais eu respirei fundo
sabendo que além da saudade teríamos muito o que decidir sobre o nosso
futuro.
​— Minha filha, até que enfim você voltou — Meu pai falou assim que me
viu — Onde está Raissa?
​— Raissa foi direto para San Francisco. Ela tem que organizar a mudança
para a Sicília e passar no jornal para ver com eles se pode continuar como
free lancer e enviando artigos.
​— Como ela vai fazer agora? Sim, porque ela não tem como ficar fazendo
certas matérias com o sobrenome que vai ter agora.
​— Ela sabe disso, mas quer continuar fazendo artigos sobre a violência
contra as mulheres, conscientizando da importância de certos cuidados, da
necessidade de saber dizer não, e combatendo o tráfico que leva todas para
uma vida cruel de prostituição.
​— Então nada vai mudar — meu pai falou sacudindo a cabeça — Essa é a
nossa Raissa que não desiste nunca do que ela quer.
​— Vai mudar sim, meu pai. Porque agora sua neta quer ir para a linha de
frente com a máfia das mulheres.
​— Raissa sempre foi fascinada por Sarah Cooper e não me admira ela querer
ser como ela agora que está na máfia — Minha mãe falou e eu às vezes me
assustava com a naturalidade que ela falava sobre a Instituição que antes ela
não mencionava.
​— Eu vou tomar um banho porque estou muito cansada, foi uma semana
intensa e depois precisamos conversar — Eu falei e meu pai me abraçou
dizendo que eles já sabiam que depois disso tudo viriam mudanças, mas que
o importante era continuarmos sempre juntos.
​Senti um alívio enorme com as suas palavras, e ganhei confiança para a
conversa que teríamos mais tarde.
​Já estava anoitecendo quando eu acordei e fui até a sala onde meus pais
estavam sentados assistindo televisão. Eu amava ver os dois juntos, e agora
sabendo da verdadeira história deles, senti uma admiração enorme pelo meu
pai, um homem lindo, com um coração puro e bondoso, que cuidou de mim
e da minha mãe com tanto amor.
​Como eu amo e sou grata a Nikolay Pavlov por tudo!
Como eu me sinto honrada em poder chamá-lo de pai.
Me sentei com eles e comecei a contar tudo que a máfia das mulheres
fazia para ajudar vítimas como minha mãe oferecida como moeda de troca,
Raissa que foi sequestrada, e eu, uma bastarda fruto de um estupro.
— Nossa vida não têm como ser mais como antes, e nós sabemos
disso. Não vou ficar fantasiando que vou voltar para a minha casa, sair
dirigindo pela manhã, comprar um café na rua e passar o dia trabalhando no
meu escritório.
Nada disso seria possível, porque agora teria que estar sempre
cercada de seguranças, com motorista me levando para qualquer lugar que
eu quisesse ir sendo que esses locais precisariam ser vistoriados antes,
enfim… a liberdade de ir e vir se foi por conta de inimigos que nem sei
quem são.
— Eu pensei muito e não conseguiria mais ser a Yelena de antes, até
porque ela não existe mais, então como seguir adiante? Foi então que eu
senti que faria todo o sentido do mundo ajudar pessoas que passam hoje pelo
que passamos um dia.
— Você quer trabalhar com a máfia? É isso? — meu pai perguntou.
— Eu quero fundar e administrar um desses centros de reabilitação.
— Eu gosto desta ideia — minha mãe falou e meu pai me olhou com
cara de surpreso porque ela geralmente não fazia parte das nossas conversas
dando sua opinião.
— Como Raissa vai se casar e morar na Sicília, eu pensei que lá seria
o local ideal, porque ficaríamos todos juntos. Nossa casa seria no próprio
centro de reabilitação, onde teria um anexo no jardim, como se fosse uma
pousada, com suítes confortáveis, e uma infraestrutura para que todas se
sentissem acolhidas. Elas teriam lá mesmo em outro anexo, sessões de
terapia, aulas de artesanato, uma biblioteca, atividades físicas, e as que
quiserem, apoio para retomarem suas vidas em sociedade.
— Eu poderia dar aula de culinária para as que quisessem aprender a
cozinhar e ocupar suas mentes — minha mãe falou e eu vi que os olhos do
meu pai se encheram d'água, porque pela primeira vez ela demonstrou
querer viver fora da bolha que construiu dentro desta casa.
— Isso é um sim, minha Polina? — meu pai perguntou — Você quer
se mudar para a Itália?
— Sim, eu quero me mudar, quero ajudar Yelena neste projeto e
acolher quem tem dor. Eu quero ser útil. É a primeira vez que escuto algo
que eu realmente tenho vontade de fazer.
— Então está decidido — meu pai falou — A família Pavlov vai se
mudar para a Sicília.
— Só têm um problema — Eu falei — Temos duas semanas para
organizarmos tudo, porque assim chegaríamos antes do casamento e não
ficaríamos na correria para a cerimônia.
— E a casa? Você vai conseguir uma tão rápido? E quanto isso vai
custar?
— Quanto a isso meu pai, não precisamos nos preocupar porque a
casa será um presente de Aleksey, e a fundação e manutenção do centro de
reabilitação por conta da máfia das mulheres.
— Que seja assim — minha mãe falou — A máfia me destruiu, mas
está fazendo Raissa sorrir, nos dando a chance de combater a violência
dentro dela. Então no lugar de reclamar, eu quero aproveitar essa
oportunidade de poder trazer o sorriso para o rosto de alguém, como um dia
Nikolay trouxe para o meu quando me acolheu com todo o seu amor. Eu sei
que o que elas mais vão precisar quando chegar é de amor.

∞∞∞
E foi assim que depois de toda a correria das duas últimas semanas
nós chegamos na Sicília para recomeçar as nossas vidas.
— Eu estou indo para a videoconferência — Eu falei animada
enquanto me levantava — e minha mãe, daqui a pouco chegam as moças que
vão trabalhar na limpeza e na cozinha.
— Pode deixar que eu vou recebê-las com carinho e deixar claro que
aqui elas serão bem tratadas e respeitadas — Minha mãe falou e eu sei que
ela faria de tudo para que essas jovens da Instituição que viriam trabalhar
aqui fossem tratadas com carinho e respeito, com o qual ela gostaria de ter
sido tratada um dia.
— Vamos deixar tudo organizado, porque além do trabalho dentro de
alguns dias, Aleksey, Irya e Alya vão chegar para o casamento e ficarão
todos aqui em casa.
— Eu estou saindo agora porque vou com Luna comprar algumas
coisas para o meu enxoval — Raissa falou, deu um beijo nos seus avós,
pegou mais uma fatia de medovik e saiu apressada como sempre.
Eu entrei no meu escritório, liguei o computador e dei bom dia para
Sarah, Alice, Nina, Isabella, Louise e Irya, um time de mulheres que estava
escrevendo a cada dia um novo capítulo para a máfia.
Eu tenho orgulho de poder dizer que faço parte desse time
empoderado, e feliz, porque se é para ser da máfia, então que seja, na máfia
das mulheres superpoderosas da Instituição.
— Bom dia a todas — Sarah Cooper falou — É com muito orgulho
que iniciamos hoje mais um centro de reabilitação da máfia, um projeto da
nossa máfia das mulheres, que chega hoje a Europa, mais precisamente na
Sicília e que será administrado pela nossa nova mulher superpoderosa
Yelena Mikhailova.
— Eu estou muito feliz e orgulhosa por fazer parte desse projeto.
— Pauta do dia: as meninas que estão chegando essa noite na Sicília
— Sarah falou — e uma surpresa para Raissa no dia do seu casamento.
— Ela vai ficar muito feliz com essa surpresa, e eu também com a
minha futura assistente que eu sei que tem muito a contribuir com esse
projeto.
Capitulo 60
Raissa Mikhailova Cosa Nostra

​O grande dia chegou e eu acordei fazendo um verdadeiro remake da minha


vida.
​Eu me lembrei da menina curiosa que não tinha medo de nada que cresceu
nas ruas da Filadélfia.
​Da adolescente teimosa que queria que tudo fosse do seu jeito e que o pai
dizia que não tinha puxado a ninguém da família. Ele estava enganado, eu
sou a cópia do meu tio Aleksey, que sempre quer as coisas do seu jeito.
​Eu recordei dos meus dias na universidade de jornalismo, dos meus sonhos
de ser repórter investigativa, da decepção de só conseguir escrever sobre
perfumes e encontros amorosos, e do meu sonho de ganhar o Pulitzer de
jornalismo.
​Abri o meu computador e lá estava meu arquivo com as minhas pesquisas
sobre as máfias das mulheres, atualizado agora com o nome da minha mãe,
que quem diria se juntaria um dia a esse time de superpoderosas que eu tanto
admirava.
​Todos me taxaram de doida, porque elas eram criminosas, mas para mim,
elas só eram mulheres tentando fazer o melhor dentro da vida que
escolheram.
​Eu me recordei da jovem corajosa e impulsiva que foi sequestrada pela
máfia e no lugar de ficar calada denunciou a todos num jornal.
​Mas isso custou um preço alto. Eu perdi a minha liberdade. Perdi meu
direito de ir e vir, e a única coisa que a polícia podia fazer por mim era me
colocar no serviço de proteção, ou seja, desaparecer comigo e dar vida a uma
nova pessoa, longe de tudo e de todos que eu conhecia, com nova identidade
e uma vida de refugiada.
​Por isso as pessoas se calam. Mas isso é injusto. Em silêncio prestei minha
homenagem silenciosa a cada repórter que teve que se esconder, ou que
perdeu a vida, por denunciar esquemas criminosos.
​No meio de tudo isso ainda acabei desenterrando um segredo escondido do
passado da Bratva, e descobrindo minha verdadeira origem de filha bastarda
da máfia.
​Mas o melhor de tudo isso ficou para o final do meu remake.
​Enzo Cosa Nostra.
​Mafioso, velhote, herói, gostoso, vilão, cortador de cabeças, meu amor e
futuro marido.
​Se valeu a pena toda a loucura e confusão dos últimos meses? COM
CERTEZA!!!
​A porta do quarto se abriu e minhas madrinhas de casamento, Alya, Luna e
Antonella entraram animadas e falando alto.
​— Chegou o grande dia — Luna falou — Eu estou tão feliz porque agora
você vai ser minha prima também — Ela disse fazendo careta para Alya.
​— Você está linda! — Minha mãe falou entrando no quarto e ficando de pé
atrás de mim e me admirando pelo reflexo do espelho.
​O meu vestido não tinha nada de luxuoso, na verdade era simples e
confortável como eu sonhei. Ele era sem manga, longo, branco e todo de
renda. Eu prendi um cabelo fazendo um coque alto, coloquei uma guirlanda
de rosas vermelhas que combinava com o meu buquê.
​— Já está na hora — Sarah Cooper entrou acompanhada da máfia das
mulheres e me entregou um buque de rosas vermelhas — Esse buque é uma
tradição nossa com um convite para aquelas que convidamos para ser do
nosso time.
​— Meu Deussss, eu vou ser da máfia das mulheres? O melhor presente do
mundo — Eu falei abraçando Sarah — Muito obrigada por tudo. Você me
recebeu, me escutou e lutou por mim. Eu prometo que vou retribuir lutando
por outras mulheres ao seu lado.
​— Eu me atrasei, mas espero que ainda dê tempo de dar um beijo na noiva
antes dela descer — Natalya entrou com um vestido vermelho igual ao de
Luna e Raissa, porque claro que ela também seria minha madrinha de
casamento.
​— Eu sei que a gente se conheceu de uma forma meio doida, mas…
​— Mas agora vamos ser da mesma família — Natalya falou me abraçando
— e quer saber, eu amei a troca de noivos.
​Elas agora eram minha nova família e best friends da vida: Alya, Natalya,
Luna e até Antonella, que era um amor, só que ficava mais afastada por não
querer fazer parte da máfia das mulheres.
​Eu tinha amigas na Filadélfia, mas elas ficariam no meu passado e nas
minhas lembranças. Eu não quero envolver ninguém na minha vida nova, e
por isso falei para elas que tinha encontrado o homem da minha vida, que
me mudaria para a Sicília e continuaria escrevendo matérias como freelancer
para o jornal.
​A vida é tão corrida em San Francisco, e eu sempre fui tão impulsiva e
distante que elas só disseram que eu era doida, foram no meu apartamento
para uma festa de despedida, e não falaram nada, provavelmente só pelas
minhas costas, por eu casar com um Cosa Nostra.
​— Está na hora! — Alya falou — Vamos descer porque suas madrinhas
ainda querem te dar um presente antes do casamento.
​— Mais presentes? Hummm… amooooo
​Descemos as escadas da casa de Dante e Isabella onde eu me arrumei para a
cerimônia e quando cheguei no salão meus olhos se encheram d'água e já
gritei para trazerem os lencinhos e minha make porque teria que retocar
tudo.
​Ela estava na minha sala.
​Linda.
​Com um vestido vermelho igual aos das minhas madrinhas de casamento.
​— Meu Deus, eu penso em você todos os dias — Eu corri e abracei Rebecca
que com certeza era o presente mais lindo que eu poderia ganhar das minhas
madrinhas de casamento.
​— Obrigada por tudo, minha amiga. Eu vi sua matéria no jornal. Você deu
voz a mim e a todas as outras meninas que um dia foram sequestradas como
eu.
​— Eu sempre pergunto por você, e só escutava que você estava sobre a
proteção da máfia das mulheres, se recuperando, e que estava bem.
​— E agora Rebecca veio para ficar conosco aqui na Sicília — Minha mãe
falou — Ela será minha assistente e braço direito na administração do centro
de reabilitação.
​— Ou seja, vamos ter muito tempo para conversar, porque agora vou morar
na casa da sua mãe aqui na Sicília.
​— Meu Deus, que surpresa maravilhosa. Você está linda e merece ser muito
feliz.
​— É ela vai ser. Todas nós, de uma certa forma, já fomos vítimas da máfia.
Umas de forma mais violenta, outras com situações veladas, mas o
importante é que sempre teremos umas às outras — Minha avó Polina falou
e todos ficaram sem palavras, e Sarah então a abraçou, dizendo que era pelo
fim de histórias como a dela que a Máfia das Mulheres existia.
​Os minutos seguintes foram de correria, com Nina retocando minha
maquiagem, e depois todas correndo para o jardim para assistir à cerimônia.
​As minhas madrinhas me abraçaram e em fila, uma atrás da outra ao lado e
em seguida os dois padrinhos de Enzo, Pietro e Matteo, que eram também
seus melhores amigos entraram se juntando a elas. Todo mundo falou que
tínhamos que ter casais de padrinhos, mas eu disse que seria todo mundo
junto e misturado, e sem ficar colocando pessoas que não tinham a ver com a
nossa história.
​Eu olhei pela fresta da janela, e o jardim estava lotado de convidados que eu
não conhecia. Eu sabia que esse casamento era importante para a Instituição
por ser entre o sobrinho do Capo da Cosa Nostra, e a sobrinha, do Chefe da
Bratva.
​Eu escutei vários comentários ao longo dos preparativos para o casamento
sobre o nosso herdeiro. Eu nem me casei e já falavam de um filho, ou filha,
que seria o primeiro a ter o sangue das duas maiores máfias correndo em
suas veias.
​— Eu vou para o meu lugar esperar a sua entrada, ao lado dos seus avós —
Minha mãe falou tocando o meu rosto.
— Ele não veio mesmo… ele não quis vir me levar até o altar — Eu
falei me referindo ao meu pai para quem enviei um convite de casamento e
várias mensagens de texto que ele nunca respondeu.
— Você vai mesmo entrar sozinha?
— Nunca — Aleksey Mikhailov falou se aproximando e me estendo
o braço — Ela vai entrar com o tio dela.
Eu sorri emocionada e mesmo sabendo que ele era uma geleira o
abracei e me surpreendi quando ele retribuiu me envolvendo em seus
braços.
— Obrigada por isso, Aleksey — Minha mãe falou com os olhos
cheios d'água — É muito importante para mim saber que temos você sempre
nos protegendo do mundo.
Ela falou e foi se juntar aos convidados.
Eu respirei fundo e segurei firme o braço do meu tio.
E quando a música começou a tocar nós entramos e todos os olhares
se voltaram para nós dois. Significava muito essa minha entrada sendo
levada até o altar pelo meu tio, porque ficava claro que eu não era só uma
sobrinha que ele acolheu, mas que ele me considerava mesmo da sua família,
que ele me protegia, me queria bem, a ponto de fazer o papel que seria do
meu pai na cerimônia.
Eu não queria mais pensar no meu pai e na sua atitude em me
renegar.
Meu tio estava comigo.
Eu caminhava para o altar onde o meu futuro marido me aguardava e
olhava os convidados desconhecidos que ficavam cumprimentando o meu
tio que ignorava a todos.
Então, eu vi os meus avós.
Eu sei que não é o convencional, mas precisava abraçar os dois.
Meu tio entendeu por que eu parei e foi até ele comigo.
Minha avó linda que se expôs para me ver feliz.
— Obrigada minha avó. Eu não estaria aqui se não fosse a sua
coragem.
— Obrigada meu avô. Se lá atrás o senhor não tivesse acolhido a
minha avó com o seu amor eu não estaria aqui hoje.
— Vai minha neta realizar o sonho que um dia foi da sua avó de se
casar assim, toda de branco, com o seu avô me esperando no altar. Eu desejo
de todo o meu coração, que o seu amado Enzo, seja como Nikolay na minha
vida, presente, amigo, companheiro…
— E um eterno apaixonado — Meu avô falou e eu os abracei com
todo o meu amor.
— Leva ela, meu menino — Minha avó falou sorrindo para Aleksey
— Leve a sua sobrinha para ser feliz com o amor da vida dela.
Era incrível como no meio de tanta dor, a minha avó ainda assim se
afeiçoou ao filho do seu carrasco. Mesmo ele sendo uma criança inocente,
outras no lugar dela o amaldiçoariam, mas a minha avó, ela é só amor.
Nikolay e Polina Pavlov são o exemplo do amor verdadeiro.
Continuei caminhando rumo a uma nova vida que estava começando
para mim.
Meu tio parou em frente a Enzo e o cumprimentou.
— Cuide da minha sobrinha, faça ela feliz, seja fiel e a respeite ou te
mato.
— Eu amo a sua sobrinha, senhor Mikhailov, e, vou fazer de tudo
para que ela seja feliz todos os dias de sua vida. Obrigada pela sua confiança
e permissão para que eu me casasse com Raissa.
Meu tio deu um beijo na minha testa, e saiu para cumprimentar os
irmãos Cosa Nostra, Dante, o Capo, Lorenzo, meu sogro, e, Giancarlo. Os
quatro representavam o que existia de mais poderoso na máfia, e agora seus
sobrinhos estavam se casando e fortalecendo a união deles.
— Eu, Raissa, te recebo meu mafioso favorito, como meu marido, e
prometo te amar e te respeitar todos os dias da minha vida. Obrigada por ter
chegado quando eu mais precisava e salvado a minha vida. Se para o mundo
você é um vilão, para mim você vai ser sempre um herói. Eu te amo e estou
muito feliz por estar começando uma vida nova ao seu lado.
— Eu, Enzo, te recebo minha encrenqueira como minha esposa, e
prometo te amar e te respeitar todos os dias da minha vida. Obrigada por
nunca ter desistido de mim, e por tornar esse dia possível. Eu sei que você
vai me deixar louco, e que não terei mais um dia de paz a partir de hoje, mas
é com muito orgulho que eu digo alto e claro, que eu te amo minha esposa,
Raissa Mikhailova Cosa Nostra.
​O padre que devia estar doido para sair desta casa que com certeza ele só
veio por amor a sua vida, falou uma meia dúzia de palavras e nos declarou
marido e mulher.
​Enzo então segurou o meu rosto, sorriu para mim e me beijou.
​Todos aplaudiram o novo casal, e uma extensa fila de cumprimentos se
formou e Enzo riu porque sabia que eu não teria paciência para falar com
tantos desconhecidos.
​Perdi a noção do tempo sorrindo para aquele bando de estranhos, e quando
terminou eu fui arrastada por Alya para jogar o buquê. Ela disse que todas as
moças ficavam esperando esse momento, e Luna disse que nunca entendia o
motivo delas quererem se casar com desconhecidos.
​— Antonella, por exemplo, é capaz de matar alguém para pegar esse buquê
— Luna falou rindo.
​Quando vi o bando de moças da máfia reunidas, saí correndo rindo e todas
vieram atrás de mim, e do nada, então eu parei, e comecei a contar… 3, 2,
1… e joguei o buquê que caiu nos braços justamente de quem não queria
pegar, Luna Cosa Nostra.
​Foi uma gritaria e Luna só sacudiu a cabeça, enquanto Antonella reclamava
que o mundo era injusto.
​— Nossa, Raissa, você se casa e roga uma praga dessas para algum infeliz
— Pietro falou rindo quando eu e minhas madrinhas de casamento nos
aproximamos da mesa que ele estava sentado com Enzo e Matteo — Você
jogar o buquê e deixar a pirralha pegar foi uma ameaça contra qualquer
homem da máfia. Não consigo nem pensar na falta de sorte do coitado que
se casar com ela.
​— Raissa, quanto você ama esse buquê e quer guardá-lo de recordação? —
Ela me perguntou fuzilando Pietro com o olhar.
​— Não, pelo amor de Deus — Antonella falou tirando o buquê das mãos de
Luna — Você pode matar Pietro com qualquer outra coisa que não seja o
buquê da noiva.
​— Você quer me matar pirralha. Desculpa, como eu pude esquecer, Chefe
Pirralha.
​— Espere o dia que eu assumir tudo porque vou te fazer entrar de joelhos na
minha sala quando quiser falar comigo.
​— Vai esperando.
​— Não se assuste — Enzo falou me abraçando — Desde criança que eles
brigam. Ele odiava quando Luna nem sabia falar direito e dizia que quem
mandava era ela. Pietro já quis afogar ela várias vezes no lago da Cosa
Nostra.
​— Chegou a hora da valsa dos noivos — Rebecca falou e Enzo me pegou no
colo e me levou até o centro do jardim decorado.
Dançamos olhando um nos olhos do outro, e substituindo nossas
farpas por juras de amor.
Não demorou muito e estávamos cercados pelos outros casais da
máfia que eu conhecia, e outros, que eu não reconheceria se visse novamente
em algum lugar.
— Vamos deixar todos dançando e ir embora?
— Tem um jatinho nos esperando? Porque agora eu me acostumei
com isso de avião particular para todo lado.
— Claro que têm meu amor — Ele falou rindo — E desta vez eu vou
te levar comigo para a suíte.
— E por que você não falou isso antes? Eu aqui perdendo tempo
quando poderia estar fodendo com o meu marido nas alturas.
Saímos apressados sem dizer adeus para ninguém e entramos no
carro que estava pronto para nos levar para a pista de onde estava o jatinho
da Cosa Nostra.
Olhei para todos que estavam dançando felizes na pista de dança, e
sorri com a certeza de que faria tudo de novo só para viver esse momento
com o meu mafioso cortador de cabeças que eu amo tanto.

∞∞∞

Eu e Enzo estávamos num jatinho a caminho de algum lugar do


mundo para a nossa lua de mel que ele não queria que eu soubesse onde
seria para ser uma surpresa.

Até a minha mala quem arrumou foi a minha mãe e Luna, que não
quiseram me contar o lugar escolhido pelo meu marido, mas pela quantidade
de roupas de verão, eu já imaginava que seria num lugar quente, mas
existiam tantas possibilidades e cada hora eu pensava num lugar diferente.

​— Não vai mesmo me contar para onde nós estamos indo?

​ Não. Eu quero que você chegue sem saber onde está indo, que descubra

cada local com os seus próprios olhos sem consultar tudo antes na internet.

​ Meu amor, eu sou uma mulher moderna. Se eu vou em algum lugar, faço

pesquisas, analiso reviews e faço um roteiro para poder conhecer tudo.

​— E qual a graça disso?

​ Você nasceu rico, sempre pode se dar ao luxo de chegar num lugar e ir

embora porque não gostou, ou de voltar no mesmo local umas cem vezes,
por isso nunca vai entender o que é planejar uma viagem, ficar anos
endividado por causa disso, e, saber que aquela é uma oportunidade única na
vida.

​ Mas agora você também é rica, então pode por favor curtir a viagem sem

pensar na internet.

​ Sim, vou tentar, mas já aviso que isso vai te custar ter que me manter

ocupada cada segundo da viagem.

​— Isso vai ser um prazer senhora Cosa Nostra.


Eu me levantei e me sentei no seu colo, agradeci mentalmente pelo
assento do avião ser espaçoso, e o beijei.

​ nzo suspendeu o meu corpo pela bunda, enquanto nossas bocas duelavam
E
para ver quem chuparia o outro mais forte.

​— Me come, por favor — eu pedi roçando meus lábios na sua orelha.

— Eu amo esse seu fogo delicioso e esse seu jeito safado quando
toma a iniciativa.

Ele segurou a barra da minha camiseta, e a puxou para cima


deixando os meus seios livres, e começou a chupá-los olhando para cima
para não perdermos nosso contato visual.

Enzo me ajudou a tirar o resto da minha roupa, e eu podia sentir o


seu pau endurecendo dentro da cueca enquanto ele chupava os biquinhos
duros dos meus seios.

Ele me levantou e ficou me olhando nua enquanto tirava sua roupa


me puxou para o seu colo me sentado de costas para ele. Eu comecei a
gemer quando ele tocou minha boceta melada sem delicadeza, esfregando os
grandes lábios e me deixando louca, antes de deslizar seus dedos para dentro
de mim.

Eu queria me tocar, porque estava com muito tesão, mas ele deu um
tapa em meu clitóris e ainda dobrou os meus joelhos, de um jeito que fiquei
desesperada para gozar.

— Você não vai gozar agora — Ele falou enfiando um dedo dentro
da minha boceta — Eu gosto desta sua boceta apertadinha e vou te foder
bem devagar.

— Isso é tortura. Eu quero gozar.

Enzo foi me fodendo lentamente, e depois aumentou a velocidade


introduzindo um segundo dedo e me fazendo gemer mais alto.

— Por favor… eu não vou aguentar…


Ele soltou as minhas pernas e eu comecei a rebolar no seu colo, me
esfregando no seu pau, quando ele tocou com o seu polegar o meu clitóris.

Eu queria gritar, mas ele disse que eu ficasse calada, porque se algum
segurança viesse achando que estava acontecendo alguma coisa ele teria que
cortar sua cabeça por me ver pelada.

A adrenalina de não poder gritar para não ser vista e causar uma
morte me deixou mais alucinada.

Eu sentia seu pau latejando e sabia que ele queria me foder gostoso,
mas preferia me torturar primeiro, sabendo que eu enlouquecia quando ele
fazia isso.

Ele me tirou do seu colo e me levou para a suíte do jatinho.

​ Agora pode gritar à vontade enquanto eu mordo esses biquinhos duros, e



esfrego meu dedos nessa sua boceta que está pegando fogo — Ele falou me
deitando na cama.

— Você sabe que vai me matar, não sabe?

Ele abriu bem as minhas pernas me deixando toda exposta para ele,
começou a lamber o meu clitóris inchado, enquanto fodia com seus dedos a
minha boceta.

Eu escutei um barulho na sua mão, e quando ele ordenou para eu


gozar, senti quando ele introduziu um plug anal dentro de mim.

Eu gozei gritando, me debatendo sobre o colchão, e não conseguia


controlar o meu corpo, porque a porra do plug anal tinha um vibrador que
me deixava louca.

— Chega, Enzo! — Eu choraminguei tremendo.

Ele me deitou de bruços e bateu forte na minha bunda me deixando


louca.
— Eu sei que você gosta que eu te coma com força — Ele falou
entrando com o seu pau duro dentro de mim e sendo engolido pela minha
boceta.

Eu empinei a minha bunda o provocando enquanto ele estocava forte,


e a cada tapa que eu ganhava, mas eu sentia vontade de gozar.

Enzo era forte e eu sabia que ele podia fazer isso por horas,
prolongando o meu desespero e me fazendo ter orgasmos quando ele
ordenava.

— Eu vou te encher com a minha porra quente, você quer?

— Em todos os lugares.

— Porra, Raissa você me deixa louco.

Ele disparou jatos quentes dentro de mim e eu gozei junto com ele,
fazendo tudo ficar mais intenso.

— Aliviada? — Ele falou tirando o plug anal de dentro de mim.

— Sim, mas esperando você me preencher com a sua porra em todos


os lugares.

— Você está falando sério?

— E eu sou mulher de brincar com sexo, meu mafioso gostoso.

O que eu amava no meu relacionamento com Enzo era a liberdade de


poder falar o que eu quisesse, expor minhas vontades e o respeito que ele
tinha com qualquer limite que eu colocasse.

∞∞∞

​ Chegamos meu amor — Enzo falou me acordando e me levando para a



cabine para que eu me acomodasse e colocasse o cinto para pousarmos sei lá
onde.

​ u ainda estava sonolenta quando resolvi olhar o lugar onde iríamos pousar
E
e não acreditei quando vi as altas formações rochosas em forma de cone.

​— Enzo, eu não acredito, você me trouxe para a Capadócia.

​ Digamos que eu também tenho um lado de jornalista investigativo, e



andei pesquisando algumas coisas sobre você.

​— Meu Deus, quem te contou isso?

​ — Seu avô. Ele me disse que uma vez pintou a parede do seu quarto com
balões, porque você era fascinada por eles.

​ Sim, eu acho que deve ser incrível voar num deles. Deve ser mágica a

sensação de liberdade.

​ Não vai ser algo fácil de realizar, por uma questão de segurança, mas eu

estou providenciando para que você veja o mundo lá de cima.

​— Eu já disse o quanto você é perfeito?

​ esembarcamos e fiquei encantada quando chegamos no Cappadocia Cave


D
Resort & Spa e me senti dentro de uma caverna por conta das paredes de
pedra.

​ decoração da nossa suíte era rústica e minimalista, para dar mesmo a


A
impressão que estávamos dentro de uma caverna, o que me deixou
fascinada.

​ omo já estava anoitecendo, tomamos um banho e fomos explorar o hotel,


C
que Enzo falou que tinha bar, restaurante e um local com música ao vivo.

​ udo lá dentro era desalinhado, para parecer que você estava andando dentro
T
das montanhas, e do nada você tinha que abaixar para entrar num ambiente,
ou tomar cuidado para não bater numa parede de pedra que surgia do nada
enquanto você caminhava.
​ Eu sei que não vou poder te oferecer uma vida normal, como a que você

estava acostumada, indo a lugares comuns, como cinema ou lanchar num
shopping.

​ Não se preocupe com isso, porque podemos ter nosso próprio cinema em

casa, fazer fast food que eu amo e fazer compras online.

​ Você é muito importante para mim, e quero que esses dias sejam só

nossos, sem problemas da máfia, ou de família. Só eu e você!

​ Espero que isso aconteça e nenhum inimigo nos encontre — Eu falei



rindo, mas vi que isso deixou Enzo preocupado — mas se encontrarem não é
como se eu já não tivesse capotado de carro com você quando sofremos um
atentado. Eu te amo Enzo do jeito que você é, e com toda a bagagem que
você traz. Até porque eu sou uma filha da máfia também, e você não sabe
como isso me deixa feliz, afinal isso foi o meu passaporte com visto
aprovado para casar com você.

​ u e Enzo bebemos, jantamos, bebemos mais, dançamos, rimos alto,


E
cantamos no karaokê do hotel, e confesso que foi bom ter uma noite, que ele
chamava de normal, com o meu marido.

​ as ao contrário do que ele pensa, eu não sou uma pessoa que fico olhando
M
para trás. Quando escolhi ficar com ele, foi para viver a vida que eu sei que
ele leva ao lado dele, e, não uma de faz de conta, onde somos pessoas
comuns que trabalham e pagam suas contas no final do mês.

​ u acho que tudo isso que eu passei nos últimos meses me deixou mais
E
madura, e eu estou gostando muito da Raissa que eu venho me tornando.

​ hegamos no quarto, tomamos um banho e nos deitamos olhando um para o


C
outro, na primeira noite juntos do resto das nossas vidas.

​— Eu sei que não é o momento, mas queria conversar com você.

— No dia que você souber a hora e o lugar de cada coisa, vai deixar
de ser a minha encrenqueira.
— Eu sei que na máfia as pessoas se casam para ter herdeiros, e que
devem estar esperando que eu engravide na lua de mel. Não conversamos
sobre isso e eu quero que você saiba que eu ainda faço uso de contraceptivo
para não engravidar.

— Meu amor, nós vamos ter um filho quando acharmos que chegou a
hora. Não quero ter herdeiros da máfia, e sim, uma família com você. Mas
tudo têm seu tempo, e eu acho que ainda temos muita coisa para curtir juntos
antes de pensar em dar esse passo. Essa criança vai ter o sangue das duas
maiores máfias, e com certeza, isso vai gerar muita expectativa, mas tudo vai
acontecer quando nós dois em comum acordo decidirmos que queremos ter
um filho.

Eu virei de costas para Enzo e me deitei agarrada nele, com as


minhas costas tocando o seu peito e ondulando conforme a sua respiração.
Ele começou a brincar com os meus mamilos durinhos, me arrancando
gemidos e quando eu quis virar de frente de novo ele não deixou.

Eu senti que seu pau ganhou vida e a cada movimento meu podia
sentir ele roçando na minha bunda.

Eu comecei a me tocar em busca de prazer porque o meu clitóris


estava latejando e implorando por um toque, e senti que a respiração do meu
marido acelerou.

— Você vai mesmo se tocar e fazer isso sozinha?

— Depende.

— Você gosta de me provocar não é sua safada gostosa?

Eu amava provocar o meu mafioso, e sempre conseguia que ele se


transformasse num predador disposto a me devorar.

— Enzo — Eu falei num gemido baixinho colocando meu dedo todo


melado nos seus lábios.

Enzo empurrou meu cabelo para o lado, enterrou a cabeça no meu


pescoço, e puxou com os meus cabelos, me virando de frente para ele e me
colocou sentada, encostada na parede, com a boceta virada para o alto e as
pernas abertas apoiadas no seu ombro.

Ele desceu a boca até o meu clitóris, e gritei quando ele o beijou e
depois começou a lamber a entrada da minha vagina. Ele me chupava, com o
meu quadril no ar sustentado pelas suas mãos, o que me deixava sem
equilíbrio. Eu não sabia se me debatia de prazer ou tentava não tombar para
o lado e perder o seu toque.

— Porra, que delícia de boceta.

Ele me chupava com fome, e eu podia sentir sua saliva escorrendo


pela minha bunda, enquanto sua língua endurecida me penetrava com força.

— Meu sabor preferido — ele falou mostrando sua língua melada,


me fazendo engolir seco, enquanto meu corpo estremecia.

Quando ele voltou a me chupar sem parar, um orgasmo forte me


atingiu, me deixando quente e faminta.

Eu conseguia sentir minha boceta o apertando cada vez que sua


língua e seu dedos me invadiam, me deixando desesperada por mais do meu
torturador.

Enzo parou assim que eu atingi mais um orgasmo e se ajoelhou na


cama, fazendo minhas pernas ficarem ainda mais no alto, e começou a se
masturbar me fazendo lamber os lábios vendo o seu pau grande e largo, com
as veias marcadas e a cabeça que brilhava melada.

— Eu vou te foder muito, e se eu passar do ponto me avise.

— Ah por favor, só me fode de uma vez.

— Corajosa a minha esposa.

— E faminta.

Enzo me penetrou sem dó, e eu amei sentir ele me rasgando ao meio.


Eu gemi alto sentindo seu o pau volumoso me alargando e forçando a
passagem dentro de mim.

— Sua boceta está toda gozadinha, melada e ainda nem recebeu


minha porra. Eu vou querer te comer assim todos os dias, minha esposa linda
— Ele falou tirando o seu pau de dentro de mim e o deixando deslizar para
dentro de mim de novo.

Eu segurei o seu pescoço para trazê-lo para perto de mim, e travamos


uma guerra com nossas línguas, enquanto ele enterrava o pau em mim.

Eu fechei os olhos, para escutar o som do nosso sexo ecoando pelas


paredes de pedra do nosso quarto. Os gemidos de Enzo estavam mais altos, e
eu aproveitei para esmagar o seu pau grosso dentro da minha boceta,
deixando a fera enlouquecida.

— Minha encrenqueira por acaso está tentando torturar o torturador?

— Estou aprendendo com o melhor.

O seu corpo começou a se chocar contra o meu à medida que suas


estocadas ficaram mais fortes e rápidas. Eu comecei a gemer muito alto,
inebriada, quente, e Enzo me olhou buscando consentimento para continuar.

— Não se preocupe torturador que estou viva.

Ele começou a me comer mais rápido, e o atrito com o meu clitóris


inchado me levou a mais um orgasmo, e Enzo gemeu ao me sentir
esmagando o seu pau, e então ele gozou junto comigo.

— Caralho... Que esposa gostosa que eu tenho.

— Acho que você vai acabar comigo, porque estou ficando viciada
em ser fodida pelo torturador.

— E eu viciado em te torturar na cama fazendo essa bocetinha


implorar pelo meu pau.

Enzo me abraçou forte, e eu me senti protegida por ele.


Meu vilão, meu herói, meu torturador, meu mafioso, meu cortador de
cabeças, meu amor… meu MARIDO.

∞∞∞

O dia mal amanheceu e Enzo já estava de pé me apressando para


sairmos.

— Meu Deus, onde vamos tão cedo. Que disposição é essa que você
tem que mal dormiu e já está de pé como se não tivéssemos feito nenhum
esforço durante a noite.

— Eu sempre durmo muito tarde e acordo antes do sol nascer. E meu


sono não é profundo, porque preciso ficar sempre alerta.

— Pois eu amo dormir até tarde, então se puder me chamar daqui


umas seis horas eu agradeço.

Eu juro que queria dormir mais, só que a carinha dele de ansioso para
ir sei lá onde me comoveu e arrastei o meu corpo para fora da cama, já
imaginando que iria enlouquecer se ele me acordasse tão cedo todos os dias
da nossa lua de mel.

Entramos no carro e tinha uma bandeja de café da manhã, cheia de


comidas típicas que pareciam uma delícia. O meu marido me conhecia bem
e tentou me comprar me dando comida, e, claro que conseguiu, porque
depois de comer tudo que tinha na bandeja eu fiquei de bom humor
novamente.

Assim que o carro parou e nós saltamos não acreditei quando vi um


mar de balões.

— Desculpa ter te acordado tão cedo, mas eu não sabia se seria


seguro andarmos de balão e ficar tão expostos, mas nessa hora meus
soldados conseguiram fazer uma varredura.
Enzo falou me puxando para um balão e confesso que na hora que o
gás explodiu fazendo um barulho e começando a subir me deu um frio na
barriga, que desapareceu quando Enzo me envolveu nos seus braços e
ficamos juntos admirando a vista da Capadócia.

— Isso aqui é muito lindo! Obrigada meu amor, eu nunca vou


esquecer esse momento.

— Eu quero poder te proporcionar muitos momentos inesquecíveis.

— Eu te amo muito meu mafioso favorito.

— Eu também te amo muito minha jornalista encrenqueira e mafiosa.

Enzo me abraçou mais forte, depois segurou o meu rosto e nos


beijamos, enquanto o balão nos fazia voar livremente pelos céus, como se no
mundo todo só existíssemos nós dois.
Fim
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Beijos, Valéria Veiga.

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