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Universidade Federal de Minas Gerais

Programa de Pós Graduação em Direito

Handout
Hart’s Critical Positivism
Arthur Lopes Campos Cordeiro
Professores: Prof. Dr. Thomas da Rosa Bustamante e Prof. Dr. Thiago Lopes Decat

7.3- Social Rules

➔ Regras jurídicas são válidas e têm um status e força propriamente normativa em


virtude de sua participação em um sistema jurídico, como determinado pelos critérios
presentes, em última instância, na regra de reconhecimento do sistema (POSTEMA,
p. 285).
◆ Regra de Reconhecimento: não é regra jurídica ou pressuposição
transcendental, mas uma regra social aceita e posta em prática pelos oficiais
do direito (Ibidem, pp. 285-286).
➔ A chave para entender as questões iniciais de O Conceito de Direito está na sua
explicação da natureza e do caráter normativo das regras sociais (Ibidem, p. 286)

7.3.1- Social Rules

➔ A Falha Metodológica dos Positivistas Anteriores:


◆ Aspecto Externo e Interno: os positivistas anteriores olhavam as práticas dos
oficiais do direito e dos cidadãos completamente “de fora”, sem se atentar para
o aspecto interno (Ibidem, p. 286);
● A conduta dos participantes apresenta algumas regularidades;
● Mas, o essencial, é o fato dos participantes olharem o comportamento
como exigido, como estabelecendo um padrão para eles seguirem -
eles têm uma atitude crítica reflexiva em relação a esses padrões.
○ Não se pode explicar a significância normativa dessas práticas
sem dar um papel central a esse ponto de vista externo.
◆ Metodologia Naturalista: nós não precisamos nos prostrar perante os
métodos das ciências naturais.
● Um novo método: Interpretação - “o que é necessário é um método
‘hermenêutico’ que envolve retratar o comportamento governado por
regras como ele aparece para seus participantes, que o vêem em
conformidade ou não com certos padrões compartilhados” (HART)
➔ Regras Sociais têm um aspecto interno e externo:
◆ Ponto de Vista Interno (IPOV):
◆ Ponto de Vista Externo (EPOV):
● EPOV Extremo: considera apenas as regularidades comportamentais
sem reconhecer a significância normativa do comportamento para os
participantes (POSTEMA, pp. 286-287);
● EPOV Moderado (dos observadores que adotam o método
hermenêutico de Hart): reconhecem o aspecto interno das regras e se
referem a esse aspecto - reconhecem, mas não adotam o IPOV
(POSTEMA, p. 287);
● EPOV Alienado: adotado pelos que têm um interesse prático intenso
pela norma, mas que não a reconhecem como fornecendo a eles
padrões para guiar ou avaliar seu comportamento;
○ “Bad man”, Vítimas de Regimes Opressivos, etc.
○ A norma, para eles, não é um padrão compartilhado;
○ A existência do EPOV alienado prova que não podemos
meramente dividir o IPOV como o ponto de vista de alguém
que tem interesses práticos e o EPOV como o ponto de vista de
alguém que tem interesses teóricos;
○ Hart assumiu que esse ponto de vista poderia ser assimilado ao
EPOV Externo. Postema considera isso um erro, porque esse
ponto de vista pode levar a sério o papel que as regras assumem
nas vidas e no raciocínio práticos de outros e fazerem previsões
com base nelas.
◆ O que distingue o EPOV Alienado dos outros dois é que
ele é praticamente orientado;
◆ O que distingue o EPOV Alienado do IPOV é que os
agentes alienados não tomam as regras como guias para
suas decisões e ações (POSTEMA, pp. 287-288).
➔ A distinção de Holton:
◆ Tese Metodológica (Hermenêutica) de Hart: que requer que ao aspecto
interno das regras seja dado papel central em toda explicação da significância
normativa das regras sociais (POSTEMA, p. 288);
● Nós precisamos colocar no centro da explicação a perspectiva daqueles
que agem dentro ou, ao menos, nas sombras da prática e em cujos
raciocínios práticos as regras figuram.
◆ Tese Substantiva: tese que ele adotou em relação à natureza do IPOV nesse
aspecto;
● Os relevantes para o IPOV são aqueles que internalizam as regras:
aqueles que tomam o ponto de vista interno aceitam as regras e as
usam como guia para sua ação e avaliam a sua própria conduta e a de
outros por este padrão comum.
◆ O observador que adota o EPOV Moderado reconhece não só as regularidades
dos comportamentos de um grupo, mas também reconhece (e interpreta) o fato
de um número significante de membros do grupo aceitam as regras como
padrões e as aplicam a sua própria conduta.
◆ Crítica de Postema: é uma distinção enganosa, porque Hart pensava que o
método hermenêutico requer que nós tomemos a perspectiva dos que estão de
dentro em relação ao aspecto interno das regras;
● Hart não reconhecia um processo de dois níveis: os que adotam uma
visão prática, mas alienada, das regras não são participantes da prática;
○ As regras, na visão destes, não figuram em seus raciocínio
como regras (como padrões ou guias de ações).
● Não é suficiente dizer que o ponto de vista do participante é o ponto de
vista prático;
● Toda versão do EPOV alienado que leva as regras da prática a sério é
parasitário em relação à ação dos participantes (POSTEMA, p. 289).
➔ Diferentes Tipos de Afirmação: inicialmente, Hart defendia que correspondendo ao
ponto de vista interno e externo estão tipos distintivos de afirmações;
◆ Interno: obrigação, direito, dever;
◆ Externo: modo indireto.
◆ Problema: teóricos usam vocabulário normativo sem endossar as reclamações
(claims) normativas que fazem;
◆ Hart abandonou essa posição.
➔ Julgamentos Normativos “Comprometidos” e “Desvinculado”: julgamentos
desvinculados usam o vocabulário de julgamentos comprometidos e são feitos a partir
do IPOV, mas eles não expressam aceitação das regras por parte daqueles que os
enunciam;
◆ Ateu e Teologia Prática Católica/Restrições Alimentares Judaicas;
◆ Como é possível usar a linguagem normativa de uma maneira desvinculada,
não é possível identificar um ponto de vista com a linguagem utilizada
(POSTEMA, p . 290).
➔ A Empreitada Jurídica como Fundamentalmente Interpretativa: essa visão tem
dominado a Filosofia do Direito Anglo-Saxã desde O Conceito do Direito;
◆ Defendendo este Posição:
● Via Negativa:
○ O Direito é um fenômeno social: a metodologia das ciências
naturais não é adequada;
◆ Problema: isso ainda não significa que devemos olhar
para a interpretação.
○ Por que o aspecto interno das regras precisa ser capturado
tomando a perspectiva do participante? Por que não localizar os
conceitos relevantes no domínio dos conceitos normativos
gerais e trabalhar com as linhas de interação e interdependência
nesse campo?
◆ Hart parece compartilhar a posição de Kelsen de que o
domínio normativo é radicalmente separado do
empírico;
● A prática atual deve ancorar a reflexão acerca do
aspecto interno das regras.
◆ Qualquer tentativa de lidar diretamente com conceitos
normativos práticos convida inflação das pretensões
normativas de direito e confunde o projeto de “uma
teoria do direito descritiva moralmente neutra” com
projeto de buscar justificar o direito em bases morais.
● Via Positiva:
○ “Diferentemente de conceitos como ‘massa’ ou ‘electron’, ‘o
direito’ é um conceito usado por pessoas para se entenderem
[...]. É uma tarefa crucial da teoria jurídica avançar nosso
entendimento da sociedade ao nos ajudar a entender como as
pessoas se entendem” (RAZ In POSTEMA, p. 291).

7.3.2- The Internal Point of View

➔ É essencial ao nosso entendimento da existência e normatividade das regras sociais e


jurídicas o reconhecimento de seu aspecto interno que é manifesto nas atividades de
pessoas que adotam o ponto de vista interno;
➔ Análise em Três Estágios:
◆ Explicação (account) das Normas Sociais;
◆ Explicação da Obrigação Social;
◆ Explicação da Normatividade das Regras e Obrigações Jurídicas.
➔ Começaremos com a explicação das normas sociais: deve-se ter em mente que ele não
estava interessado em explicar a normatividade em geral; seu foco era exclusivamente
as dimensões normativas de regras praticadas em e por grupos sociais.

7.3.2.1- Accept and Use as Guides

➔ A discussão de Hart acerca do IPOV foi fundamental na filosofia do direito analítica.


Mas, a discussão desse tema em O Conceito do Direito é imprecisa, ambígua e, em
alguns pontos, enganosa (POSTEMA, p. 292).
➔ Hart introduziu o IPOV em contraste com hábitos sociais:
◆ Regras Sociais são como Hábitos em um aspecto: há uma convergência
observável de comportamento na maioria dos membros do grupo que o
pratica;
◆ Mas, diferentemente dos hábitos, normas sociais têm um aspecto interno:
alguém que adota o IPOV nesse aspecto interno se preocupa com regras como
um membro do grupo que as aceita e usa como guias para a conduta;
● Ele apresenta uma atitude normativa distinta - uma atitude reflexiva
crítica que é expressa em seu uso de linguagem normativa clara como
“dever”.
➔ Cuidado:
◆ É tentador pensar que Hart distinguiu três componentes distintos das regras
sociais: (i) comportamento convergente, (ii) atitude distintiva e a (iii)
ocorrência de ambos juntos nas vidas da maioria dos membros do grupo. É
como se pudéssemos juntar (i) e (ii) para termos uma regra que, se achada em
muitas outras pessoas, seria uma regra social. Isso distorce a proposta de
Hart.
◆ Hart não via esses elementos como componentes discretos das regras
sociais, mas como aspectos integralmente relacionados delas.
● O comportamento é convergente em parte porque os que adotam o
IPOV se vêem como membros de um grupo;
○ Eles não vêm as regras como um mero guia, mas como um guia
para os membros do grupo em geral;
● A dimensão social é interna à atitude normativa distintiva: não é
possível captar o comportamento da maneira correta separado de sua
relação à atitude reflexiva crítica (POSTEMA, pp. 292-293).
○ Para que a regra social funcione como um padrão no grupo
deve haver não só convergência de comportamento em um
padrão, mas também convergência entre os membros do grupo
nesse padrão. O padrão externo comportamento correspondente
à regra não está disponível para inspeção sem um entendimento
do padrão (ou convergência de padrões) visto do IPOV
(POSTEMA, pp. 293).
➔ Parece que o aspecto interno, especialmente o IPOV, desempenha o papel central
em explicar o caráter normativo das normas sociais em Hart:
◆ A atitude normativa distintiva é a atitude de aceitação e uso da regra
como um padrão e guia para a ação.
● O que é importante no IPOV é a atitude normativa, não as razões para
adotá-la.
○ Só há uma qualificação: as regras devem ser aceitas como
padrões públicos comuns e consideradas como vinculantes em
parte porque (ou talvez na condição de) são geralmente
praticadas pelos outros.
➔ Duas Importantes Perguntas:
◆ Como entender as noções de “aceitação” ou “atitude normativa distinta”?
◆ As regras sociais que Hart visou analisar são melhor concebidas como
regras convencionais?

7.3.2.2- Interior vs. Insider

➔ Primeira Interpretação: IPOV como o Posto de Vista Interior (POSTEMA, p.


294)
◆ O IPOV é interno à mente ou psicologia de membros individuais de um grupo
praticando uma regra social;
◆ Atitude de Aceitação = estados mentais ou disposições para ter e agir com
base nesses estados mentais;
● Shapiro: a atitude prática de aceitação da regra;
● Pattaro: a crença que um certo tipo de ação deve ser realizado.
◆ A atitude interior se manifesta no comportamento em conformidade com a
regra, na avaliação crítica de outros, etc: os que fazem afirmações internas
comprometidas expressam o estado mental relevante (o estado interior).
➔ Segunda Interpretação: IPOV como o Ponto de Vista Insider:
◆ A atitude normativa distinta é interna à prática social, não a cada pessoa.
◆ O IPOV é o ponto de vista (ou as atividades características e competências)
dos participantes (insiders) na prática. É dentro da prática sob dois aspectos:
● A prática é localizada no domínio do raciocínio prático, de razões para
ações;
● Esse domínio é formado por (atividades características e competências
das) práticas sociais.
◆ Os participantes não consideram as regras como circunstâncias nas quais eles
devem decidir o que fazer, mas algo que os chama a agir de uma maneira. Esse
entendimento vem de participar com outros na prática; a prática forma seu
entendimento da força prática das regras (POSTEMA, p. 295)
◆ A ênfase está nas atividades e não nas atitudes: essas atitudes não são vistas
como expressão de outra coisa (na mente do participante), mas sim como
constituintes do ponto de vista - adotar o IPOV é engajar competentemente
nessas atividades que constituem a prática de regra do grupo.
◆ Adotar o IPOV é captar a força prática da regra, entender como ela estrutura
as questões sobre o que fazer;
◆ Quando o EPOV Moderado leva o IPOV a sério em certas regras sociais, ele
não fala de crenças de indivíduos específicos, mas dá uma explicação da
significância social ou convencional da regra que ele reconstrói (interpreta) a
partir das atividades competentes dos participantes.
◆ A participação competente na prática é o que é distintivo do IPOV.
➔ Por que preferir o Ponto de Vista Insider? (POSTEMA, p. 296)
◆ Hart se opunha ao que ele via como reducionismo psicológico dos realistas
escandinavos: os argumentos que ele usou contra Ross são fortes contra todas
propostas psicologistas;
● É anacrônico dizer que Hart buscava uma explicação da normatividade
que se encaixasse na semântica naturalista. Seu foco era hermenêutica,
não metafísica;
● O processo de construir o aspecto interno das regras a partir do IPOV
na visão interior é, na melhor das hipóteses, fracamente hermenêutico:
foca no que pessoas específicas querem dizer ao invés de focar no que
as regras significam para os participantes.
◆ A linguagem de Hart na discussão do IPOV foca em atividades e não em
atitudes interiores: os que adotam o IPOV usam as regras em suas
deliberações, para fazer reclamações (claims) e demandas uns contra os
outros, para avaliar sua conduta e de outros, etc.
● Na visão insider, os estados mentais relevantes são individuais. A
dimensão social aparece, na melhor das hipóteses, acidental e
contingente. Regras sociais são agregados do que são, essencialmente,
policies individuais.
◆ Hart via o IPOV como fundamentalmente envolvendo o raciocínio prático,
mas estados mentais não são um tipo de coisa que pode figurar no raciocínio
prático (POSTEMA, pp. 296-297).
● O papel das regras como razões (POSTEMA, p. 297).
7.3.2.3- Social Rules and Conventions

➔ São as regras sociais convenções?


◆ Pós-Escrito: sim;
● Debates: essa era a posição de Hart na primeira edição do Conceito?
➔ O que significa convenção?
◆ Elemento central do conceito de Convenção: a ideia que a observância geral
por parte das pessoas em uma sociedade de uma regra social é crucial não só
para sua existência como regra social, mas também para a razão para ação que
a regra fornece a qualquer um que cai dentro de seu escopo;
◆ Observância Geral da Pessoas é diferente de conformismo:
● Conformismo: o conformista toma o fato da convergência geral de
comportamento em um grupo como a sua única razão para agir;
○ Não é a regra que o fornece razões para agir;
● Regras Sociais Convencionais não são simplesmente o produto do
conformismo.
◆ A visão de Hart acerca da dimensão convencional das regras sociais não
envolve a ideia de que a observância regular da regra por outros é a única
razão para a observância por parte de alguém (POSTEMA, pp. 297-298);
● As regras sociais que Hart tinha em mente são aquelas para as quais o
comportamento dos outros é parte das razões de alguém para
observá-las (POSTEMA, p. 298)
○ Qual parte? → Ele não explica, mas parece ser fácil deduzir: se
não fosse a observância de outros, alguém teria poucas razões
ou razões menos atraentes para observar a regra.
◆ Observação: quando Hart fala de convenções, não devemos pensar em
convenções de coordenação.
◆ As convenções são um subconjunto de regras sociais para as quais a
observância geral por parte de outros é praticamente relevante (fornece parte
das razões) para a observância do próprio agente;
● Hart não adota essa visão explicitamente nas porções originais do
Conceito, mas ele tem opiniões sobre o tipo de regras que tem em
mente que naturalmente poderiam ser estendidas a essa opinião.
Lembre-se, ele sustentou que aquele que adota o IPOV considera as
regras como um membro de um grupo que as aceita e as usa como
guias de conduta, que os juízes aceitam a regra de reconhecimento
como padrões públicos comuns.
○ A visão das regras sociais como convenções que ele adota no
“Pós-escrito” não decorre dessas caracterizações, mas não é
implausivelmente vista como um esclarecimento da vaga ideia
anterior, em vez de uma rejeição dela.
➔ Hart colocou na agenda da teoria do direito questões que ocupariam os filósofos
analíticos do direito. Devido ao alto prestígio de seu trabalho e a imprecisão de suas
formulações, muitos debates tomaram forma de debates sobre a interpretação de seu
texto (POSTEMA, pp. 298-299).

7.3.3- Obligation: Social and Legal

➔ Obrigação: ideia central do Conceito (POSTEMA, p. 299);


◆ Meio-Termo entre os modelos positivistas clássicos que se focavam em
comando/sanção e as visões extremamente moralizadas dos defensores do
direito natural.
➔ Obrigação Social:
◆ Dizer que alguém tem uma obrigação para realizar uma ação pressupõe que há
uma regra que requer essa razão;
● Mas, nem toda regra social impõe obrigações aos agentes sujeitos a
ela.
◆ Há uma conexão próxima entre obrigação e sanção: mas o foco não está na
ameaça ou na probabilidade da sanção, mas na imposição legítima dela.
● O que é necessário para constituir uma regra como uma que impõe
obrigações não é somente o fato de que elas são apoiadas por uma
demanda geral por conformidade e pressão social, mas sim que essas
são respostas legítimas a desvios no sentido de que elas são permitidas,
se não requeridas pelo sistema (HART).
● Pressão Social como legítima resposta aos desvios da regra social:
componente central da obrigação social (POSTEMA, p. 300);
○ Dever: algo que pode ser propriamente demandado de outrem.
➔ Obrigação Jurídica:
◆ Pressupõe a existência de regras jurídicas que exigem uma certa ação dos
agentes sujeitos a elas - regras válidas em virtude de sua pertença a um sistema
jurídico baseado, em última instância, na regra de reconhecimento;
◆ Proximidade de Kelsen e Hart:
● Kelsen: usa “dever” como um termo que inclui “pode legitimamente”
ou “é autorizado a”;
○ Quando dizemos que quem é juridicamente obrigado a um
certo comportamento deve comportar dessa maneira, nós
somente expressamos a ideia que um ato coercitivo como
sanção deve ser executado se ele não se comporta dessa
maneira.
● Diferença: o “dever”, em Hart, se baseia em uma regra social
praticada.
○ Isso leva a uma interessante conclusão: do fato que um
indivíduo tem uma obrigação a agir de uma maneira, não se
segue que ele tem uma razão (excluindo o medo da sanção)
para assim agir.
◆ Isso é válido para regras sociais e jurídicas;
◆ O que é necessário e suficiente para o indivíduo ter uma
obrigação é a existência de uma regra (social ou
juridicamente válida) requerendo a ação e regras
relacionadas que autorizam demandas de conformidade
por parte de outros sob pena da sanção. Não é
necessário que a pessoa obrigada aceite ou reconheça a
regra vinculante ou a autoridade daqueles que
demandam observância. Como alguém tem razões para
observar só se aceita a regra e sua autoridade, não
necessariamente alguém que está sob obrigações sociais
ou legais genuínas tem razões para conformar-se
(excluindo o medo da sanção).
● “Afirmações jurídicas dos deveres legais de um
sujeito não tem nada a ver - diretamente - com
as razões para agir desse sujeito” (HART IN:
POSTEMA, pp. 300-301).

7.3.4- Challenges to Hart’s Account of Normativity

➔ Explicação Não-Redutiva da Normatividade do Direito mantendo uma


importante distinção entre a Normatividade do Direito e a Moralidade
(POSTEMA, p. 301):
◆ Explicação da Normatividade do Direito:
● 1- Regras e Padrões Jurídicos (e proposições jurídicas em geral) têm
validade normativa em virtude de sua pertença a um sistema jurídico
baseado em última instância na regra de reconhecimento;
● 2- A regra de reconhecimento é uma regra genuína, mas é uma regra
social, existindo em virtude do fato de que é praticada inter alia pelos
oficiais aplicadores do direito.
○ A explicação de Hart da normatividade do Direito se baseia em
última instância em sua explicação da normatividade das regras
sociais
◆ Distinção entre a Normatividade do Direito e a Normatividade da Moral:
só uma forma mínima de IPOV é necessária para explicar a normatividade do
Direito. Ela é mínima de duas maneiras:
● 1- A existência de uma obrigação (social ou jurídica) não implica nada
acerca das razões que um agente que é sujeito à obrigação pode ter
para se conformar a ela;
● 2- As razões pelas quais um indivíduo aceita as regras e participa em
sua prática regular são irrelevantes (POSTEMA, pp. 301-302).
➔ Críticas à distinção entre a Normatividade do Direito e a Normatividade da
Moral (POSTEMA, p. 302):
◆ A existência da obrigação depende inteiramente da existência de uma regra
que impõe obrigação aceita e praticada por um grupo que a reconhece como
legítimo exigir do indivíduo a realização da razão por meios coercitivos se
necessário.
◆ Problema: isso é difícil de entender como uma explicação da perspectiva dos
oficiais que impõem obrigações e da vítima da imposição coercitiva;
● Perspectiva dos Oficiais: é difícil de entender como o oficial pode
pensar que o indivíduo tem uma obrigação e que o oficial tem uma
base legítima para considerá-la exigível e, ao mesmo tempo,
reconhecer que nem ele nem o indivíduo tem nenhuma razão para
reconhecer essa base.
○ O apelo a uma regra para justificar a imposição de uma
demanda parece envolver ao menos a ideia de que há algo a ser
dito acerca da regra, algo que o sujeito da regra deveria
reconhecer (mesmo se ele não o faz); e o mero fato da sua
aceitação da regra não pode cumprir esse papel.
● Perspectiva da Vítima: é difícil de entender como a vítima veria a
situação como uma na qual ela tem uma obrigação e na qual o oficial
legitimamente impõe suas demandas, mas na qual ele não tem razão
para observar a regra ou tratar a imposição da coerção como legítima.
◆ Crítica (Raz): é possível manter uma teoria positivista do direito mesmo
concedendo que não há diferença fundamental de significado entre afirmações
de obrigações legais e sociais e as de obrigações morais (POSTEMA, p. 303).
◆ Resposta de Hart: isso assume que aqueles que aceitam as regras devem
fazê-lo por razões reconhecidamente morais;
◆ Resistindo a Sugestão de Hart: a questão não é se é possível para pessoas
manterem crenças inconsistentes, mas se isso poderia representar o ponto de
vista interno essencial para a existência de regras sociais e do direito;
● Nós devemos nos focar nas razões que sustentam a participação dos
oficiais na prática das regras ou, mais precisamente, nas maneiras de
pensar sobre a prática às quais eles estão comprometidos em virtude da
natureza dessa prática e das circunstâncias nas quais ela tipicamente
ocorre;
● Há restrições ao modo de aceitação das regras pelos oficiais:
○ Pelo fato da regra de reconhecimento ser necessária para
garantir a unidade característica e a continuidade de um sistema
jurídico;
◆ Deve-se aceitar a regra como padrão público comum.
○ Pelo fato de que o direito tem pretensões morais.
◆ O direito lida com matérias que são de significância
moral;
◆ O direito funciona como uma estrutura para a
justificação de ações praticadas de acordo com o direito
quando os riscos morais estão altos (POSTEMA, p.
304);
● O direito reclama (claims) fornecer alguma
medida de justificação (em um sentido não
meramente jurídico) para fazer o que faz às
pessoas (LYONS).
◆ Essas pretensões impõem uma restrição na maneira em
que oficiais podem coerentemente ver seu
comprometimento com o direito: não se pode aduzir
suas preferências ou seu interesse individual por eles
mesmos como justificação para afirmar que as pessoas
devem ou têm um dever de agir de uma certa maneira.
◆ Resposta de Hart: é um fato empírico que os oficiais têm visões que são ditas
indisponíveis;
◆ Problema: essa resposta não responde à objeção - ela aponta para a questão
acerca do que a participação na prática os compromete a aceitar;
● A tarefa de Hart era fazer a prática inteligível, o que requer que as
atitudes e convicções mantenham, ao menos, uma consistência mínima
e ausência de auto-engano; mas isso seria difícil de sustentar sem
algum senso de garantia semelhante à garantia moral para a
participação.

7.4- Social Rules and Legal Systems

➔ Para a existência de normas sociais e um sistema social funcional, o tipo de validade


conferido pela regra de reconhecimento não é necessário: é um luxo;
◆ Tem distintas vantagens;
◆ Mas, também, tem um preço.

7.4.1 - The Luxury of Legal Validity

➔ Hart indica os benefícios que um sistema jurídico oferece à comunidade ao


contrastar uma sociedade sem um sistema jurídico (governada inteiramente por
regras primárias) com uma governada por um sistema jurídico maduro
(POSTEMA, p. 305).
➔ Sociedade Pré-Jurídica: as regras existem na comunidade em virtude de serem
amplamente praticadas → as pessoas não só geralmente agem de acordo com elas,
mas as internalizaram;
◆ Reconhecem cada uma das regras como padrões públicos comuns;
◆ Esse sistema só pode existir em uma sociedade pequena, com crenças e
sentimentos comuns e em um ambiente estável.
➔ Defeitos do Regime Informal de Regras Sociais:
◆ Estaticidade: as regras só podem ser mudadas gradualmente com a mudança
de aceitação de grande parte da população e, durante um período do tempo,
será incerto qual regra é “válida” ou se tornará;
◆ Ineficiência: disputas sobre a aplicação das regras são fadadas a acontecer e
uma parte grande ou, ao menos, indiferenciada da comunidade deve ser
mobilizada para sancionar os desvios;
◆ Incerteza e Indeterminação: desacordo provavelmente surgirá no que diz
respeito a características de novas situações e acerca da aplicação de regras a
novas situações.
➔ Remédios: direito concebido como união de normas primárias e secundárias
(POSTEMA, p. 306);
◆ Estaticidade → Normas de Alteração: dando poder a instituições
legislativas, elas permitem a sociedade criar novas regras sociais e extinguir
antigas - sendo possível responder a novas situações;
● Atraem uma fidelidade indireta às regras: não é necessário aceitar a
regra primária em si se as regras podem ser aceitas em razão de sua
origem.
◆ Ineficiência → Regras de Adjudicação: instruem instituições aplicadoras do
direito, a quem é dado poder de autoritativamente resolver disputas sobre a
aplicação e interpretação das regras e que podem mobilizar a execução
institucionalizada de suas determinações;
◆ Incerteza e Indeterminação → Regra de Reconhecimento: fornece critérios
pelos quais as outras regras (primárias e secundárias) são reunidas em um
sistema único e unificado no qual todas tem a marca autoritativa de validade e
pertença.
➔ Argumento de Hart:
◆ O objetivo não é fornecer uma história da evolução do Direito;
◆ Como outras histórias sobre a transição do estado de natureza à sociedade
civil, a discussão de Hart é melhor entendida como uma explicação do que
perderíamos ao abandonar práticas distintas do direito que como uma
explicação do que nós nos faltava quando não as tínhamos (WALDRON).

7.4.2 - The Sobering Truth about Law

➔ Com o Direito, vêm a institucionalização e centralização do governo ou exercício


do poder político (POSTEMA, p. 307):
◆ Certas pessoas são designadas como oficiais e a elas são dadas uma
responsabilidade especial para a manutenção do sistema de regras;
● Suas ações e decisões têm um status ou autoridade especial;
● Eles são capazes (de uma maneira que ninguém mais é) de dar um grau
de finalidade a suas resoluções;
◆ O Direito cria e visa controlar práticas sociais ao invés de ser inteiramente
dependente delas;
➔ Em um sistema jurídico, as regras primárias não são complementadas por uma
estrutura secundária que cria instituições, mas, em grande medida, as regras
jurídicas suplantam as práticas e costumes primários, substituindo-os com
normas legais feitas pelo próprio sistema jurídico (POSTEMA, p. 308);
◆ Há uma distância entre as pessoas comuns e as regras de direito:
● O ponto de vista interno é alterado: não mais é necessário aceitar cada
regra com base em seus próprios méritos, mas aceitar o sistema como
um todo e aceitar as regras em virtude de sua pertença ao sistema;
● A aceitação é, em grande parte, assunto dos oficiais - isso (mais a
observância generalizada do direito pela sociedade) é tudo que é
necessário para a existência e funcionamento efetivo de um sistema
jurídico.
○ A regra de reconhecimento é constituída pela prática de oficiais
aplicadores do direito e somente raramente cidadãos comuns
irão participar dessa prática.
◆ As regras primárias, provavelmente, irão perder sua conexão com práticas
sociais anteriores: elas irão aparecer distantes e formais;
● O restante da sociedade pode, até mesmo, não adotar o ponto de vista
interno: adotando uma perspectiva prática, mas externa, acerca do
direito.
○ Não foi um erro Holmes e Austin atribuírem o ponto de
vista externo aos cidadãos, mas somente falhar em
reconhecer a importância dos oficiais adotarem o ponto de
vista interno (POSTEMA, p. 309).
● Assim, em um caso extremo, somente oficiais adotam o ponto de vista
interno e o restante se submete como ovelhas (sheep like) e “a ovelha
pode terminar no matadouro” (HART);
● Ganhos e Custo: “a transição da forma simples de sociedade, onde
regras primárias de obrigação são os únicos meios de controle social,
ao mundo jurídico com sua legislatura, cortes, oficiais e sanções
centralmente organizados traz seus ganhos sólidos com um certo preço.
Os ganhos são aqueles da adaptabilidade à mudança, certeza e
eficiência, e esses são imensos; o custo é o risco de que o poder
centralmente organizado pode ser usado para a omissão dos números
cujo apoio pode dispensar de uma maneira que um sistema mais
simples de normas primárias não pode” (HART)
○ A alienação de uma parcela grande da população não interfere
necessariamente com o funcionamento efetivo do direito. A
centralização e institucionalização do controle social
característico do direito torna a opressão coercitiva do total da
população mais fácil e mais eficiente.
◆ Hart: a existência do direito “é compatível com
iniquidade muito grande”.

REFERÊNCIAS

POSTEMA, G. A Treatise of Legal Philosophy and General Jurisprudence


(Volume 11): Legal Philosophy in the Twentieth Century: The Commmon Law
World. New York: Springer, 2011

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