Você está na página 1de 10

Tomelin

relato KN et al.
de experiência

Educação inclusiva no ensino superior:


desafios e experiências de um
núcleo de apoio discente e docente
Karina Nones Tomelin; Ana Paula L. Dias; Cintia Nazaré Madeira Sanchez; Juliana Peres; Silvia Carvalho

RESUMO - No Ensino Superior, a prática inclusiva é recente, e este


panorama novo exige das instituições o desenvolvimento de políticas de
apoio e acompanhamento com ações que vão além da disponibilidade de
vaga. Somado a isto, os requisitos legais de avaliação e reconhecimento de
cursos também exigem as evidências de práticas inclusivas no ambiente
universitário. O objetivo deste trabalho é descrever a atuação de um núcleo
de apoio ao discente e docente (NADD) de dois Centros Universitários
do município de São Paulo. O Núcleo foi criado em 2015 e, deste então,
desenvolve ações de inclusão no contexto universitário a partir de um
programa intitulado “Atenção Especial”. O foco de atuação do programa
é o acolhimento e apoio aos estudantes com deficiência, dificuldades
de aprendizagem e outros transtornos por meio da sua identificação,
estratégias de intervenção, encaminhamento e orientação. Atualmente,
o programa acompanha 193 estudantes orientados por um protocolo de
atendimento, que contempla diversas ações para favorecer a inclusão destes
estudantes a partir da sua entrevista inicial: monitorias de reforço entre
pares, nivelamento, cursos de apoio ao estudante, encaminhamento para

Karina Nones Tomelin – Mestre em Educação, coorde­ Juliana Peres – Graduada em Letras - Português/Inglês,
nadora do Núcleo de Apoio Discente e Docente do Cen­ com especialização em Psicopedagogia, professora
tro Universitário Faculdades Metropolitanas Unidas. da educação básica na Prefeitura de São Paulo, atuou
Atualmente desenvolve projetos de formação Docente com Projetos de Educação Inclusiva no Ensino Superior
e apoio discente na Universidade Positivo, Curitiba, no Centro Universitário Faculdades Metropolitanas
PR, Brasil. Unidas, São Paulo, SP, Brasil.
Ana Paula L. Dias – Doutora em Biodiversidade Vegetal Silvia Carvalho – Mestre em Arquitetura e Urbanismo -
e Meio Ambiente, atuou com Projetos de Educação In­ Pro­fessora do FIAM-FAAM Centro Universitário, atuou
clusiva no Ensino Superior no Centro Universitário Fa­ no projeto de formação docente e apoio ao discente no
culdades Metropolitanas Unidas, São Paulo, SP, Brasil. FIAM-FAAM Centro Universitário, São Paulo, SP, Brasil.
Cintia Nazaré Madeira Sanchez – Doutora em Psi­
Correspondência
cologia, Pro­fessora da disciplina de Educação Inclusiva
Karina Nones Tomelin
no curso de Psicologia. Atua no projeto de Atenção
R. Prof. Pedro Viriato Parigot de Souza, 5300 – Cidade
Especial no atendimento a alunos com deficiência
Industrial – Curitiba, PR, Brasil – CEP 81280-330
no Centro Universitário Faculdades Metropolitanas
E-mail: karinant@terra.com.br
Unidas, São Paulo, SP, Brasil.

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

94
Apoio psicopedagógico no ensino superior

clínicas de saúde, parceria com profissionais de saúde, acessibilidade física,


tecnologia assistiva, orientação aos professores, atividades de sensibilização
com estudantes e palestras a toda comunidade acadêmica. Os resultados
do programa têm promovido, além da conscientização ampla de toda
comunidade acadêmica, o favorecimento da inclusão e da permanência
destes estudantes em um ambiente receptivo, inclusivo e legítimo.

UNITERMOS: Educação Inclusiva. Apoio Psicopedagógico. Ensino


Superior.

INTRODUÇÃO dificuldade de aprendizagem ou deficiência, têm


O objetivo deste trabalho é relatar as expe­ direito à educação inclusiva.
riências de um programa de educação inclusiva O Brasil afirmou esse compromisso ao se
no ensino superior intitulado “Atenção Especial”, tornar signatário da Declaração de Salamanca e
que está inserido em um Núcleo de apoio psico­ iniciou um diálogo no âmbito pedagógico refe­
pedagógico de duas instituições universitárias rente às questões relativas à inclusão e exclusão
na cidade de São Paulo. na educação1-3. Já no que concerne especifica­
Em 2017, o programa atendeu aproximada­ mente ao Ensino Superior, somente no ano de
mente 193 estudantes com diferentes neces­ 2003 foi sancionada a portaria número 3.284, que
sidades especiais e ofereceu uma diversidade de dispõe sobre os requisitos de acessibilidade de
possibilidades de intervenção. O foco do projeto pessoas com deficiência, cujo objetivo é instruir
era compreender o estudante em sua neces­ os processos de autorização e de reconhecimento
sidade e desenhar processos personalizados de de cursos e de credenciamento de instituições4.
intervenções. Estas intervenções são ampliadas Na educação inclusiva, é responsabilidade das
e renovadas conforme as necessidades e deman­ escolas reconhecer e atender às necessidades
das levantadas pelos estudantes atendidos. individuais de seus estudantes, adaptando-se aos
O projeto conta com ações que envolvem a vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo
par­ticipação de toda comunidade acadêmica: a garantir uma educação de qualidade para todos
gestores, técnicos administrativos, professores por meio de currículos adaptados e adequados,
e estudantes. Algumas ações contam ainda com de boa organização escolar, de estratégias pe­
a participação da família e de profissionais de dagógicas, de utilização de recursos e de coo­
saúde, que acompanham o estudante, além de peração com as respectivas comunidades1. As
entidades que são referência no atendimento ou es­tratégias de intervenção são desenhadas pelas
em ações para pessoas com deficiência. próprias escolas, porém o combate à discrimina­
ção no espaço escolar só é possível por meio de
EDUCAÇÃO INCLUSIVA E ENSINO SU- ações pedagógicas participativas que coloquem
PERIOR no centro o estudante que a vivencia e que per­
O marco histórico para Educação Inclusiva mitam a participação de todos os envolvidos2.
foi em 1994, com a Declaração de Salamanca, Muitos alunos com deficiência e necessidades
na Espanha, durante a Conferência Mundial de especiais estão, hoje, matriculados em classes
Educação Especial da UNESCO. A Declaração comuns de escolas públicas em todo país. Isto
tem como princípio que os alunos com deficiên­ de­nota que houve uma mudança de perspectiva
cia devem estar no ensino regular e defende que da crença anterior de que o atendimento ideal à
todos os estudantes, independentemente da pessoa com deficiência deveria ocorrer em locais

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

95
Tomelin KN et al.

específicos, isolados ou excluídos dos demais. “A Além disto, as diretrizes e parâmetros exigidos
legislação brasileira vigente estabelece a não pelo Ministério da Educação, principalmente do
exclusão do aluno do sistema educacional geral processo avaliativo externo de cursos e institui­
sob alegação de deficiência, privilegia a matrícu­ ções de Ensino Superior, preconiza a existência
la desses alunos em escolas comuns públicas”5. de políticas de apoio ao docente e discente nas
A partir da década de 90, é nítido que o sis­ Instituições Públicas e Privadas. Para atender
tema educacional está legalmente ampa­ estas exigências, muitas instituições criaram em
rado no discurso inclusivo, nos princípios suas estruturas Núcleos de Apoio Psicopedagó­
democráticos de igualdade, equidade e gico. Em pesquisa exploratória, com objetivo de
diversidade. No entanto, apesar da impor­ compreender como se estruturam tais núcleos
tância dos instrumentos legais, estes por no Brasil9, observaram-se 52 instituições que
si só não garantem práticas inclusivas na desenvolviam diferentes atividades:
educação, muitas vezes demonstrando A maioria dos núcleos está estruturada
distanciamento das proposições teóricas para atender somente a discentes (46%),
e legais6. enquanto 29% para atender a discentes e
A inclusão é um processo complexo e que ne­ docentes [...]. Com relação ao profissional
cessita de ações transformadoras e realistas que que trabalha ou coordena, 23% são profes­
promovam a conscientização do direito de todos sores da instituição, 23% são psicólogos,
à educação. O movimento de incluir estudantes
17% pertencem à equipe multidisci­pli­
com necessidades especiais na escola “é uma
nar, 12% são psicopedagogos e 25% não
forma de tornar a sociedade mais democrática,
indicaram o responsável. Sobre as ativi­
sendo papel de todos os cidadãos transformar
dades apresentadas, a maioria (33%)
as instituições de ensino em espaços legítimos
realiza atendimentos individuais, 13%
de inclusão” 7.
aten­dimentos em grupos, 13% trabalham
No Ensino Superior, a prática inclusiva é mais
com a formação continuada docente, 10%
recente. Isto porque, com a ampliação do acesso
realizam ações de educação inclusiva, 9%
dos alunos na educação básica e sua conse­
têm atividades de recepção aos calouros,
quente progressão para o ensino superior, mais
alunos têm chegado às universidades. Os dados 5% ofertam cursos de nivelamento, 5%
do Censo Escolar, divulgados pelo Instituto Na­ ati­vidades diagnósticas e preventivas,
cional de Estudos e Pesquisas (INEP) de 2017, 3% ofertam monitoria, 4% ocupam-se com
apontam um crescente número de ingresso de ati­vidades organizacionais, 5% auxiliam
alunos com deficiência entre os anos de 2003 a nas atividades de pesquisa e extensão.
2013 com aumento de 600% - passou de 5.078 es­ Com esta pesquisa foi possível identificar que,
tudantes para 29.221 em dez anos8. apesar do incentivo à criação de políticas de
O ingresso do aluno com deficiência é um apoio ao discente e docente e o avanço dos estu­
avanço no ensino superior, porém é necessário dantes com deficiência ao ensino superior, as
observar que o fato de o aluno estar na sala de ins­tituições apresentam um panorama muito va­
aula não significa, necessariamente, a participa­ riado, tanto no público atendido e nos profissio­
ção plena desse estudante no ambiente universi­ nais que realizam as atividades, bem como nas
tário e a absorção dos conteúdos propostos. Para ações desenvolvidas.
tanto, é necessário que a universidade realize As necessidades das instituições em criar
adaptações para que a inclusão seja efetiva, já que es­tra­tégias efetivas de inclusão vão além do
algumas instituições não possuem um mapea­ âmbito teórico. Na prática, assim como na teoria,
mento do ingresso e permanência desse aluno e estudos sobre a inclusão no Ensino Superior
não oferecem serviço de apoio, tornando-se assim se fazem cada vez mais necessários. Políticas
um processo de exclusão6. públicas e conhecimento técnico são requisitos,

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

96
Apoio psicopedagógico no ensino superior

porém o envolvimento de todas as pessoas que atendidos nas suas individualidades e principais
compõem o espaço universitário é fundamental necessidades no espaço universitário.
para concretizar a inclusão na sua totalidade. O programa integra parte das ações de um Nú­
Caso contrário, ela ocorre apenas em grau micro, cleo de Apoio ao Discente e Docente (NADD) de
em espaços com práticas isoladas. dois centros universitários do município de São
A sensibilização de todos os envolvidos e a for­ Paulo, que possuem cerca de 50 mil alunos de
mação de sujeitos inclusivos, capazes de traba­ cursos de graduação presencial.
lhar em equipe, numa atitude interdisciplinar Inicialmente, o programa objetivou conhecer
é, portanto, primordial para buscar a efetiva quem eram os estudantes e identificar quais eram
in­clusão destes estudantes. Pensar numa univer­ suas principais necessidades buscando atendê­
sidade inclusiva requer que os profissionais de -las. Sabe-se que o ingresso de estudantes com
educação estejam mais próximos dos estudantes necessidades especiais nos cursos superiores
a serem incluídos, que saibam como agir, como nem sempre se dá de modo explícito. Isto ocorre
ensinar, como lidar com a diversidade e como porque poucos estudantes, ou mesmo suas famí­
ter dimensão técnica. lias, procuram a coordenação pedagógica das
Para uma inclusão efetiva na educação em to­ uni­versidades. Outro fator são os “casos em que
dos os graus, além das leis que garantem a perma­ o próprio aluno desconhece sua condição ou não
nência do aluno no ensino regular, é necessária a tem consciência das suas dificuldades”2. É o caso
mudança de comportamento de toda comunidade de estudantes com dislexia, TDAH ou outros
acadêmica e a convivência na diversidade, que transtornos de aprendizagem.
contribui para o aprendizado individual e para O programa de “Atenção Especial” também
uma concepção de respeito às diferenças. precisou divulgar suas ações para que pudesse
As instituições de ensino consideradas inclu­ ser conhecido pelos professores, coordenadores
sivas são as que aceitam todas as pessoas, inde­ de curso, estudantes e ingressantes. Na medida
pendentemente das características individuais, e em que passou a ser acessado pela comunidade
adapta as estratégias de ensino para que as neces­ acadêmica, exigiu não somente a ampliação de
sidades educacionais individuais sejam atendidas, sua equipe, como também a definição de suas
considerando a singularidade do indivíduo10. principais ações. Dessa forma, passou a atender
Um conhecimento mais a fundo atrelado a uma alunos com deficiência física, intelectual, visual
metodologia inclusiva pode propiciar o desenvolvi­ e auditiva. Além destes, alunos com dificuldades
mento de atitudes e habilidades para desenvolver de aprendizagem como dislexia, discalculia,
estratégias pedagógicas que favoreçam a inclu­ transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
são em sala de aula. Dessa forma, os educadores e transtorno do espectro autista também foram
e os demais indivíduos que compõem a comuni­ incorporados ao projeto. Em seguida, outro grupo
dade escolar devem agir de maneira a permitir a de estudantes que também precisavam de uma
construção e a socialização do conhecimento – o atenção especial foi inserido no programa. Eram
que contribui significativamente para a autono­ estudantes considerados minoria como idosos,
mia dos alunos. transgêneros e com transtornos psiquiátricos
como esquizofrenia, bipolaridade, depressão e
“ATENÇÃO ESPECIAL”: UM PROGRAMA, ansiedade (Tabela 1).
MUITAS AÇÕES Diante da diversidade das pessoas atendidas
O programa de Atenção Especial iniciou suas pelo programa, viu-se a necessidade de criar um
atividades em meados de 2015 com o objetivo protocolo de atendimento com objetivo de organi­
de promover o acolhimento e, principalmente, zar as ações realizadas e demonstrar ao estudante
fornecer subsídios para que os alunos com defi­ e a toda comunidade acadêmica as possibilidades
ciência pudessem ser incluídos efetivamente e de intervenção.

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

97
Tomelin KN et al.

Tabela 1. Número de alunos atendidos pelo b. Monitoria de psicopedagogia: moni­


“Programa Atenção Especial” classificados toria ligada ao curso de Pós-Graduação
por atendimentos. em Psi­copedagogia da instituição. Os
Atendimentos Número de alunos alunos participam de edital de seleção
para realizar monitoria voluntária,
Autismo 7
fornecendo apoio ao aluno com defi­
Câncer 3
ciência e dificuldade de aprendiza­
Deficiência auditiva 22
gem. A supervisão é realizada por um
Deficiência física 20
psicopedagogo do NADD.
Deficiência visual 18 c. Monitoria entre pares: monitoria vo­
Déficit de atenção 11 luntária de colegas da turma do aluno
Dificuldade de aprendizagem 23 com defi­ciência ou dificuldade de
Dislexia 15 aprendizagem com foco na roteiriza­
Epilepsia 4 ção do estudo.
Paralisia cerebral 4 II. Cursos: os cursos indicados aos estudantes
Transtornos psiquiátricos* 30 são on-line e ficam disponíveis na platafor­
Transgênero 2 ma do ambiente virtual de aprendizagem:
Outros 34 a. Cursos de Nivelamento: os cursos dis­
Total 193 poníveis são de Matemática, Língua
*incluem estudantes com transtornos de ansiedade, depres- Portuguesa, Novo Acordo Ortográfico
são, transtorno obsessivo compulsivo, transtorno do pânico e Comunicação Digital.
e/ou transtorno bipolar. b. Programa de Apoio ao estudante -
PAES: os cursos do Programa de Apoio
ao Estudante objetivam desenvolver
O documento indica como o aluno chega até o habilidades de estudo por meio das
NADD e quais as possibilidades de intervenção a seguintes temáticas: Gestão do Tempo,
partir de seis eixos: monitorias, cursos, orientação, Gestão do Estudo, Sou Universitário
acessibilidade, contato e clínica escola (Figura 1). e Agora? e Prepare-se para provas e
Na entrevista inicial, realizada por um profis­ avaliações.
sional psicólogo com habilitação em psicopeda­ III. Orientações:
gogia, identificam-se as principais necessidades a. Palestras: as palestras têm como fo­co
do estudante. A partir de então, são planejadas pro­­­duzir orientação aos professo­res,
as atividades de apoio a partir do protocolo de estu­dantes e colaboradores sobre temas
atendimento: rela­cionados à inclusão, tornando-se
I. Monitorias: conforme a necessidade do es­ uma ação periódica do NADD. Men­
tudante, ele poderia indicar o desejo de salmente, são aborda­dos para toda
participar de alguma das modalidades de comunidade acadêmica temas como
monitoria oferecidas pelo NADD. deficiência visual, auditiva, autismo,
a. Monitoria de reforço: monitorias li­ síndrome de Down, entre outros.
ga­das às principais áreas de conhe­ b. Bombeiros: em alguns casos, os bom­
cimento da instituição. Por meio de beiros que atuam na instituição são
encontros semanais, a monitoria é alertados sobre a condição do estu­
cons­tituída por alunos interessados dante para que possam intervir de
em aprofundar os estudos em deter­ maneira mais assertiva diante de uma
minada área. É organizada por um situação de crise
estudante de série mais avançada que c. Sensibilização da turma: são realiza­
recebe supervisão de um professor. dos encontros com a turma que possui

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

98
Apoio psicopedagógico no ensino superior

Figura 1. Protocolo de Atendimento Atenção Especial.

estudante participante do projeto de importante nestas instituições. Assim,


atenção especial para tratar sobre in­ são muitas vezes orientados para que
clusão, direitos humanos e deficiên­cia. possam apoiar e atuar como agentes
Objetiva-se, também, orientar a turma inclusivos na sala de aula.
sobre como interagir com o colega. g. Comunidade Acadêmica: orientações
Esta atividade é acordada com o es­ gerais e/ou específicas para conduta
tudante acompanhado para que possa perante o aluno.
participar ativamente do processo. IV. Clínica Escola: a instituição possui clíni­
d. Professores: após a entrevista inicial, cas na área da saúde que recebem en­
os pro­fessores são orientados sobre a caminhamentos. Assim, quando um estu­
metodologia de ensino, processos de dante não é acompanhado por nenhum
avaliação e procedimentos diários da profissional pode ser encaminhado a uma
conduta docente com o estudante. ou mais das seguintes clínicas:
e. Coordenadores: os coordenadores são a. Clínica de Psicologia: realiza atendi­
orien­tados sobre a conduta indicada aos mento psicoterápico; psicodiagnós­
docentes e, em alguns casos, acompa­ tico e atendimento de pessoas com
nham as entrevistas com familiares. deficiência.
f. Representante de turma: o represen­ b. Clínica de Fonoaudiologia: realiza ava­
tante da sala possui um papel muito liação e reabilitação fonoaudiológica

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

99
Tomelin KN et al.

da co­­municação oral e escrita; voz; c. Intérpretes de Libras: aos alunos com


fun­ções re­­lacionadas à respiração, de­ficiência auditiva, disponibilizam-se
mastigação, deglutição, expressão fa­ intér­pretes de libras para apoio diário.
cial e articulação da fala; avaliação da d. Prova assistida: os estudantes podem
audição; indicação e adaptação de pró­ rea­lizar suas provas finais no NADD
tese auditiva; habilitação e reabilitação com apoio de ledor e/ou mais tempo
auditiva; avaliação do pro­­cessamento de prova.
auditivo; treinamento auditivo em e. Tecnologia Assistiva: softwares como
cabina acústica; avaliação da função NVDA e Plustek BookReader v200
vestibular (exame otoneurológico); são disponibilizados aos estudantes
reabilitação labiríntica nos distúrbios nas bibliotecas e em laboratórios de
do equilíbrio. informática.
c. Clínica de Musicoterapia: Com a uti­ f. Mobiliário: conforme a necessidade do
lização de recursos sonoro-musicais, es­tudante, mesas e cadeiras especiais
corporais e vocais, atende pessoas com são disponibilizadas aos estudantes
deficiência, distúrbios da fala e audição, com estas necessidades.
problemas físicos, emocionais e men­ Considera-se que políticas, informações e
tais; e distúrbios da aprendizagem. orien­tações isoladas são insuficientes para provo­
V. Contato: em alguns casos, seja por procu­ car mudanças de professores e estudantes sobre
ra da própria família, profissionais que as minorias. Por isto, a multiplicidade de ações, de
acompanham o estudante ou até mesmo na forma contínua e ascendente são desenvolvidas
ne­cessidade de alinhamento das práticas pelo programa.
pedagógicas, faz-se contato com:
a. Família: que apoia a inclusão do estu­ RESULTADOS
dante sendo orientada sobre as ações O projeto de Atenção Especial realizou 654
pedagógicas institucionais. orientações a professores, favorecendo uma con­
b. Profissional de saúde: em sua maioria duta segura dos docentes durante a prática pe­
psicólogos e psiquiatras, que mantêm dagógica, de forma a garantir a permanência e o
alinhadas as intervenções clínicas com tratamento adequado ao aluno com deficiência.
as práticas pedagógicas e institucionais As duas instituições têm se tornado referência no
adotadas. atendimento e acolhimento destes alunos, sendo
VI. Acessibilidade: neste eixo apresentam­ reconhecidas pela comunidade como instituições
-se todas as intervenções de acessibili­ inclusivas e recebendo, gradativamente, cada vez
dade dis­ponibilizadas aos alunos com mais estudantes com deficiência.
deficiên­cia: Ao longo do ano de 2017, foram 56 monitores
a. Desenvolvimento Digital para Pessoas voluntários que acompanharam os alunos com
com Deficiência Visual: trata-se de um deficiência, nas modalidades entre pares e de
curso de informática que utiliza recurso apoio psicopedagógico. Esta atividade permite
de tecnologia assistiva (NVDA). O cur­ o desenvolvimento de diversas competências e
so é ministrado por uma colaboradora são percebidas pelos monitores voluntários como
do NADD com deficiência visual para muito positivas para o desenvolvimento de seu
outros alunos com a mesma deficiência. próprio aprendizado.
b. Ensalamento acessível: no início de ca­ Outro resultado importante das ações desen­
da semestre, a equipe de ensalamento volvidas pelo NADD está nas atividades de
é orientada a propiciar salas mais aces­ sen­­­sibi­lização com a turma de estudantes com
síveis para estes estudantes, evitando de­ficiência. Esta atividade visa “desmistificar”
rodízio de salas. a defi­ciência, mobilizando a desconstrução dos

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

100
Apoio psicopedagógico no ensino superior

preconceitos e colocando o sujeito além da sua Além disto, o Programa de Apoio ao Estudante,
dificulda­de ou diferença, reconhecendo-o como cujo foco é o desenvolvimento de habilidades
pessoa com desejos, expectativas e sonhos. A de estudo, ofereceu 5.465 cursos e 7.284 nivela­
sen­sibilização é marcada por uma emoção que mentos com 5 horas de duração cada a todos os
contagia os estudantes, os professores e a equipe estudantes interessados.
do NADD que realiza a vivência. Os resultados
da sensibilização têm re­­velado um caminho para CONSIDERAÇÕES FINAIS
a inclusão atitudinal, derrubando muros e apro­ Os desafios da educação inclusiva nas diver­
ximando os estudantes. Isto é possível perceber sas modalidades de ensino exigem intervenções
por meio dos relatos dos alunos com deficiência diferenciadas. No ensino superior estas ações têm
que passam pela vivência: sido construídas a partir das necessidades de uma
Eu estava naturalmente um pouco nervoso, demanda cada vez mais crescente, do acesso da
pois nunca havia contado minha expe­ pessoa com deficiência e outras necessidades.
riência como deficiente a um grupo. Mas, O projeto “Atenção Especial” retrata esta cons­
creio que a sensibilidade notada teve um trução coletiva adaptada aos diferentes atores
retorno muito positivo, porque logo após a envolvidos. Durante os dois primeiros anos do
aula, a maioria dos alunos vieram conver- projeto, uma significativa evolução da sua atuação
sar comigo, se apresentando gentilmente foi se desenhando de forma a atingir o formato
e se predispondo a ajudar. [...] agora eu atual e provavelmente ainda em transformação.
conheço praticamente toda a sala e inte­ O impacto das ações de educação inclusiva é
rajo com todos sem dificuldades. (eles mensurado além da quantidade de seus atendi­
in­clusive fizeram um grupo para gravar mentos, sensibilizações ou horas de palestras. O
os livros que eu não tenho). MUITO impacto reflete a transversalidade da formação
OBRIGADO!” (J.L.D.). humana, da prática inclusiva, dos direitos huma­
Outro exemplo revela a mudança de comporta­ nos, das ações sociais e da cidadania, praticados
mento dos colegas diante do estudante com defi­ todos os dias com toda a comunidade acadêmica.
ciência após a vivência. É comum as pessoas não O projeto tem garantido a permanência e de­
interagirem com a pessoa com deficiência por senvolvimento acadêmico dos alunos atendidos e
medo de serem inadequados. Diante do não sa­ a participação efetiva do professor neste processo.
ber, elas preferem se afastar, construindo muros O reconhecimento, por sua vez, não é finan­
imaginários na própria sala de aula: ceiro, tampouco em forma de prêmio ou mesmo
Bom, após o término da aula algumas boas notas. O reconhecimento vem da realização
pessoas vieram conversar comigo, e outras pessoal destes estudantes. Da alegria de cada
apenas se despediram, mas se despedir conquista, dos amigos que são cativados, dos
é uma atitude que não tinham antes. professores que os acolhem e, principalmente,
(W.B.A.). de identificar que é possível realizar a Educação
Mensalmente, o núcleo promove palestras Inclusiva no Ensino Superior no Brasil.
so­bre diversos temas como: dislexia, surdez, sín­ A experiência neste projeto, que está em cons­
drome de Down, autismo e outros relacionados à trução, avaliado e modificado a cada semestre,
educação inclusiva. Foram ao todo dez palestras demonstra que é possível, na universidade, práti­
com a participação de 1.880 pessoas. cas inclusivas positivas.

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

101
Tomelin KN et al.

SUMMARY
Inclusive approach on higher education: challenges and
experiences of a nucleus for faculty and student support

In Higher Education, inclusive practice is recent, this totally new pa­


norama requires that higher education institutions develop support and
follow-up policies with actions that go beyond the availability of vacancies. In
addition to this, the legal requirements for course evaluation and recognition
also require evidences of inclusive practices in the university environment.
The objective of this paper is to describe the performance of NADD – Núcleo
de Apoio Discente e Docente (Nucleus for Faculty and Student Support)
of two University Centers of the city of São Paulo. NADD was created in
2015 and, since then, develops inclusion actions in the university context
with a program titled “Atenção Especial” (Special Attention). The focus
of this program is the reception and support of students with disabilities,
learning difficulties and other disorders through identification, intervention
strategies, referral and orientation. Currently, 193 students guided by a
service protocol that includes several actions to favor the inclusion of these
students since their initial interview accompany the program: reinforcement,
peer, leveling, student support courses, referral to health clinics, partnership
with health professionals, physical accessibility and assistive technology. The
results of the program have promoted, in addition to the broad awareness of
the entire academic community, the favoring of inclusion and permanence
of these students in a receptive, inclusive and legitimate environment.

KEYWORDS: Inclusive Education. Psychopedagogical Support. Higher


Education.

REFERÊNCIAS 4. Brasil. Ministério da Educação. Portaria n.


1. Conferência Mundial sobre Necessidades 3.284, de 7 de novembro de 2003. Brasília:
Educativas Especiais, 1994, Salamanca. De­ Ministério da Educação; 2003 [acesso 2017
claração de Salamanca e linha de ação sobre Maio 25]. Disponível em: http://portal.mec.
necessidades educativas especiais. Brasília: gov.br/seesp/arquivos/pdf/port3284.pdf
CORDE; 1994. 5. Kassar MCM. Educação especial no Brasil:
2. Ferrari MALD, Sekkel MC. Educação inclu­ desigualdades e desafios no reconhecimen­
siva no ensino superior: um novo desafio. Psi­ to da diversidade. Educ Soc [Internet].
col Cienc Prof [Internet]. 2007;27(4):636-47 2012; 33(120):833-49 [acesso 2017 Maio
[acesso 2017 Maio 24]. Disponível em: 24]. Disponível em: http://www.scielo.br/
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
arttext&pid=S1414-98932007000400006&ln 73302012000300010&lng=pt&nrm=iso.
g=pt&nrm=iso. DOI: 10.1590/S1414-98932 DOI: 10.1590/S0101-73302012000300010
007000400006 6. Moreira LC, Bolsanello MA, Seger RG. In­
3. Laplane A. Uma análise das condições para gresso e permanência na Universidade: alu­
a implementação de políticas de educação nos com deficiências em foco. Educ Rev [Inter­
in­clusiva no brasil e na Inglaterra. Educ Soc. net]. 2011;41:125-43 [acesso 2017 Maio 24].
2006;27(96):689-715. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

102
Apoio psicopedagógico no ensino superior

php?script=sci_arttext&pid=S0104-406020 portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
11000300009&lng=pt&nrm=iso. DOI: docman&view=download&alias=16759-
10.1590/S0104-40602011000300009 principais-indicadores-da-educacao-de-
7. Castanho DM, Freitas SN. Inclusão e prática pessoas-com-deficiencia&Itemid=30192
docente no ensino superior. Rev Educ Esp. 9. Tomelin KN. Núcleos de apoio psicopedagó­
gicos no brasil: panorama de 52 núcleos ati­
2006;27:93-99.
vos em 2015. Rev Psicopedag [Internet]. 2015;
8. Brasil. Ministério da Educação. Instituto Na­
32(98):208-81 [acesso 2017 Maio 6]. Dispo­
cional de Estudos e Pesquisas Educacionais nível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.
Anísio Teixeira (INEP). Censo Escolar MEC/ php?script=sci_arttext&pid=S0103-8486
INEP. Principais Indicadores da Educação de 2015000200012&lng=pt&nrm=iso
Pessoas com Deficiência. Brasília: MEC/INEP; 10. Stainback S, Stainback W. Inclusão: um guia
2014 [acesso 2017 Abr 29]. Disponível em: http:// para educadores. Porto Alegre: Artmed, 1999.

Trabalho realizado nas Faculdades Metropolitanas Artigo recebido: 8/1/2018


Unidas, São Paulo, SP, Brasil. Aprovado: 3/2/2018

ERRATA:
No campo de autoria deste artigo onde se lia Juliana Perez leia-se Juliana Peres.

Rev. Psicopedagogia 2018; 35(106): 94-103

103

Você também pode gostar