Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
relato KN et al.
de experiência
Karina Nones Tomelin – Mestre em Educação, coorde Juliana Peres – Graduada em Letras - Português/Inglês,
nadora do Núcleo de Apoio Discente e Docente do Cen com especialização em Psicopedagogia, professora
tro Universitário Faculdades Metropolitanas Unidas. da educação básica na Prefeitura de São Paulo, atuou
Atualmente desenvolve projetos de formação Docente com Projetos de Educação Inclusiva no Ensino Superior
e apoio discente na Universidade Positivo, Curitiba, no Centro Universitário Faculdades Metropolitanas
PR, Brasil. Unidas, São Paulo, SP, Brasil.
Ana Paula L. Dias – Doutora em Biodiversidade Vegetal Silvia Carvalho – Mestre em Arquitetura e Urbanismo -
e Meio Ambiente, atuou com Projetos de Educação In Professora do FIAM-FAAM Centro Universitário, atuou
clusiva no Ensino Superior no Centro Universitário Fa no projeto de formação docente e apoio ao discente no
culdades Metropolitanas Unidas, São Paulo, SP, Brasil. FIAM-FAAM Centro Universitário, São Paulo, SP, Brasil.
Cintia Nazaré Madeira Sanchez – Doutora em Psi
Correspondência
cologia, Professora da disciplina de Educação Inclusiva
Karina Nones Tomelin
no curso de Psicologia. Atua no projeto de Atenção
R. Prof. Pedro Viriato Parigot de Souza, 5300 – Cidade
Especial no atendimento a alunos com deficiência
Industrial – Curitiba, PR, Brasil – CEP 81280-330
no Centro Universitário Faculdades Metropolitanas
E-mail: karinant@terra.com.br
Unidas, São Paulo, SP, Brasil.
94
Apoio psicopedagógico no ensino superior
95
Tomelin KN et al.
específicos, isolados ou excluídos dos demais. “A Além disto, as diretrizes e parâmetros exigidos
legislação brasileira vigente estabelece a não pelo Ministério da Educação, principalmente do
exclusão do aluno do sistema educacional geral processo avaliativo externo de cursos e institui
sob alegação de deficiência, privilegia a matrícu ções de Ensino Superior, preconiza a existência
la desses alunos em escolas comuns públicas”5. de políticas de apoio ao docente e discente nas
A partir da década de 90, é nítido que o sis Instituições Públicas e Privadas. Para atender
tema educacional está legalmente ampa estas exigências, muitas instituições criaram em
rado no discurso inclusivo, nos princípios suas estruturas Núcleos de Apoio Psicopedagó
democráticos de igualdade, equidade e gico. Em pesquisa exploratória, com objetivo de
diversidade. No entanto, apesar da impor compreender como se estruturam tais núcleos
tância dos instrumentos legais, estes por no Brasil9, observaram-se 52 instituições que
si só não garantem práticas inclusivas na desenvolviam diferentes atividades:
educação, muitas vezes demonstrando A maioria dos núcleos está estruturada
distanciamento das proposições teóricas para atender somente a discentes (46%),
e legais6. enquanto 29% para atender a discentes e
A inclusão é um processo complexo e que ne docentes [...]. Com relação ao profissional
cessita de ações transformadoras e realistas que que trabalha ou coordena, 23% são profes
promovam a conscientização do direito de todos sores da instituição, 23% são psicólogos,
à educação. O movimento de incluir estudantes
17% pertencem à equipe multidiscipli
com necessidades especiais na escola “é uma
nar, 12% são psicopedagogos e 25% não
forma de tornar a sociedade mais democrática,
indicaram o responsável. Sobre as ativi
sendo papel de todos os cidadãos transformar
dades apresentadas, a maioria (33%)
as instituições de ensino em espaços legítimos
realiza atendimentos individuais, 13%
de inclusão” 7.
atendimentos em grupos, 13% trabalham
No Ensino Superior, a prática inclusiva é mais
com a formação continuada docente, 10%
recente. Isto porque, com a ampliação do acesso
realizam ações de educação inclusiva, 9%
dos alunos na educação básica e sua conse
têm atividades de recepção aos calouros,
quente progressão para o ensino superior, mais
alunos têm chegado às universidades. Os dados 5% ofertam cursos de nivelamento, 5%
do Censo Escolar, divulgados pelo Instituto Na atividades diagnósticas e preventivas,
cional de Estudos e Pesquisas (INEP) de 2017, 3% ofertam monitoria, 4% ocupam-se com
apontam um crescente número de ingresso de atividades organizacionais, 5% auxiliam
alunos com deficiência entre os anos de 2003 a nas atividades de pesquisa e extensão.
2013 com aumento de 600% - passou de 5.078 es Com esta pesquisa foi possível identificar que,
tudantes para 29.221 em dez anos8. apesar do incentivo à criação de políticas de
O ingresso do aluno com deficiência é um apoio ao discente e docente e o avanço dos estu
avanço no ensino superior, porém é necessário dantes com deficiência ao ensino superior, as
observar que o fato de o aluno estar na sala de instituições apresentam um panorama muito va
aula não significa, necessariamente, a participa riado, tanto no público atendido e nos profissio
ção plena desse estudante no ambiente universi nais que realizam as atividades, bem como nas
tário e a absorção dos conteúdos propostos. Para ações desenvolvidas.
tanto, é necessário que a universidade realize As necessidades das instituições em criar
adaptações para que a inclusão seja efetiva, já que estratégias efetivas de inclusão vão além do
algumas instituições não possuem um mapea âmbito teórico. Na prática, assim como na teoria,
mento do ingresso e permanência desse aluno e estudos sobre a inclusão no Ensino Superior
não oferecem serviço de apoio, tornando-se assim se fazem cada vez mais necessários. Políticas
um processo de exclusão6. públicas e conhecimento técnico são requisitos,
96
Apoio psicopedagógico no ensino superior
porém o envolvimento de todas as pessoas que atendidos nas suas individualidades e principais
compõem o espaço universitário é fundamental necessidades no espaço universitário.
para concretizar a inclusão na sua totalidade. O programa integra parte das ações de um Nú
Caso contrário, ela ocorre apenas em grau micro, cleo de Apoio ao Discente e Docente (NADD) de
em espaços com práticas isoladas. dois centros universitários do município de São
A sensibilização de todos os envolvidos e a for Paulo, que possuem cerca de 50 mil alunos de
mação de sujeitos inclusivos, capazes de traba cursos de graduação presencial.
lhar em equipe, numa atitude interdisciplinar Inicialmente, o programa objetivou conhecer
é, portanto, primordial para buscar a efetiva quem eram os estudantes e identificar quais eram
inclusão destes estudantes. Pensar numa univer suas principais necessidades buscando atendê
sidade inclusiva requer que os profissionais de -las. Sabe-se que o ingresso de estudantes com
educação estejam mais próximos dos estudantes necessidades especiais nos cursos superiores
a serem incluídos, que saibam como agir, como nem sempre se dá de modo explícito. Isto ocorre
ensinar, como lidar com a diversidade e como porque poucos estudantes, ou mesmo suas famí
ter dimensão técnica. lias, procuram a coordenação pedagógica das
Para uma inclusão efetiva na educação em to universidades. Outro fator são os “casos em que
dos os graus, além das leis que garantem a perma o próprio aluno desconhece sua condição ou não
nência do aluno no ensino regular, é necessária a tem consciência das suas dificuldades”2. É o caso
mudança de comportamento de toda comunidade de estudantes com dislexia, TDAH ou outros
acadêmica e a convivência na diversidade, que transtornos de aprendizagem.
contribui para o aprendizado individual e para O programa de “Atenção Especial” também
uma concepção de respeito às diferenças. precisou divulgar suas ações para que pudesse
As instituições de ensino consideradas inclu ser conhecido pelos professores, coordenadores
sivas são as que aceitam todas as pessoas, inde de curso, estudantes e ingressantes. Na medida
pendentemente das características individuais, e em que passou a ser acessado pela comunidade
adapta as estratégias de ensino para que as neces acadêmica, exigiu não somente a ampliação de
sidades educacionais individuais sejam atendidas, sua equipe, como também a definição de suas
considerando a singularidade do indivíduo10. principais ações. Dessa forma, passou a atender
Um conhecimento mais a fundo atrelado a uma alunos com deficiência física, intelectual, visual
metodologia inclusiva pode propiciar o desenvolvi e auditiva. Além destes, alunos com dificuldades
mento de atitudes e habilidades para desenvolver de aprendizagem como dislexia, discalculia,
estratégias pedagógicas que favoreçam a inclu transtorno do déficit de atenção e hiperatividade
são em sala de aula. Dessa forma, os educadores e transtorno do espectro autista também foram
e os demais indivíduos que compõem a comuni incorporados ao projeto. Em seguida, outro grupo
dade escolar devem agir de maneira a permitir a de estudantes que também precisavam de uma
construção e a socialização do conhecimento – o atenção especial foi inserido no programa. Eram
que contribui significativamente para a autono estudantes considerados minoria como idosos,
mia dos alunos. transgêneros e com transtornos psiquiátricos
como esquizofrenia, bipolaridade, depressão e
“ATENÇÃO ESPECIAL”: UM PROGRAMA, ansiedade (Tabela 1).
MUITAS AÇÕES Diante da diversidade das pessoas atendidas
O programa de Atenção Especial iniciou suas pelo programa, viu-se a necessidade de criar um
atividades em meados de 2015 com o objetivo protocolo de atendimento com objetivo de organi
de promover o acolhimento e, principalmente, zar as ações realizadas e demonstrar ao estudante
fornecer subsídios para que os alunos com defi e a toda comunidade acadêmica as possibilidades
ciência pudessem ser incluídos efetivamente e de intervenção.
97
Tomelin KN et al.
98
Apoio psicopedagógico no ensino superior
99
Tomelin KN et al.
100
Apoio psicopedagógico no ensino superior
preconceitos e colocando o sujeito além da sua Além disto, o Programa de Apoio ao Estudante,
dificuldade ou diferença, reconhecendo-o como cujo foco é o desenvolvimento de habilidades
pessoa com desejos, expectativas e sonhos. A de estudo, ofereceu 5.465 cursos e 7.284 nivela
sensibilização é marcada por uma emoção que mentos com 5 horas de duração cada a todos os
contagia os estudantes, os professores e a equipe estudantes interessados.
do NADD que realiza a vivência. Os resultados
da sensibilização têm revelado um caminho para CONSIDERAÇÕES FINAIS
a inclusão atitudinal, derrubando muros e apro Os desafios da educação inclusiva nas diver
ximando os estudantes. Isto é possível perceber sas modalidades de ensino exigem intervenções
por meio dos relatos dos alunos com deficiência diferenciadas. No ensino superior estas ações têm
que passam pela vivência: sido construídas a partir das necessidades de uma
Eu estava naturalmente um pouco nervoso, demanda cada vez mais crescente, do acesso da
pois nunca havia contado minha expe pessoa com deficiência e outras necessidades.
riência como deficiente a um grupo. Mas, O projeto “Atenção Especial” retrata esta cons
creio que a sensibilidade notada teve um trução coletiva adaptada aos diferentes atores
retorno muito positivo, porque logo após a envolvidos. Durante os dois primeiros anos do
aula, a maioria dos alunos vieram conver- projeto, uma significativa evolução da sua atuação
sar comigo, se apresentando gentilmente foi se desenhando de forma a atingir o formato
e se predispondo a ajudar. [...] agora eu atual e provavelmente ainda em transformação.
conheço praticamente toda a sala e inte O impacto das ações de educação inclusiva é
rajo com todos sem dificuldades. (eles mensurado além da quantidade de seus atendi
inclusive fizeram um grupo para gravar mentos, sensibilizações ou horas de palestras. O
os livros que eu não tenho). MUITO impacto reflete a transversalidade da formação
OBRIGADO!” (J.L.D.). humana, da prática inclusiva, dos direitos huma
Outro exemplo revela a mudança de comporta nos, das ações sociais e da cidadania, praticados
mento dos colegas diante do estudante com defi todos os dias com toda a comunidade acadêmica.
ciência após a vivência. É comum as pessoas não O projeto tem garantido a permanência e de
interagirem com a pessoa com deficiência por senvolvimento acadêmico dos alunos atendidos e
medo de serem inadequados. Diante do não sa a participação efetiva do professor neste processo.
ber, elas preferem se afastar, construindo muros O reconhecimento, por sua vez, não é finan
imaginários na própria sala de aula: ceiro, tampouco em forma de prêmio ou mesmo
Bom, após o término da aula algumas boas notas. O reconhecimento vem da realização
pessoas vieram conversar comigo, e outras pessoal destes estudantes. Da alegria de cada
apenas se despediram, mas se despedir conquista, dos amigos que são cativados, dos
é uma atitude que não tinham antes. professores que os acolhem e, principalmente,
(W.B.A.). de identificar que é possível realizar a Educação
Mensalmente, o núcleo promove palestras Inclusiva no Ensino Superior no Brasil.
sobre diversos temas como: dislexia, surdez, sín A experiência neste projeto, que está em cons
drome de Down, autismo e outros relacionados à trução, avaliado e modificado a cada semestre,
educação inclusiva. Foram ao todo dez palestras demonstra que é possível, na universidade, práti
com a participação de 1.880 pessoas. cas inclusivas positivas.
101
Tomelin KN et al.
SUMMARY
Inclusive approach on higher education: challenges and
experiences of a nucleus for faculty and student support
102
Apoio psicopedagógico no ensino superior
php?script=sci_arttext&pid=S0104-406020 portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
11000300009&lng=pt&nrm=iso. DOI: docman&view=download&alias=16759-
10.1590/S0104-40602011000300009 principais-indicadores-da-educacao-de-
7. Castanho DM, Freitas SN. Inclusão e prática pessoas-com-deficiencia&Itemid=30192
docente no ensino superior. Rev Educ Esp. 9. Tomelin KN. Núcleos de apoio psicopedagó
gicos no brasil: panorama de 52 núcleos ati
2006;27:93-99.
vos em 2015. Rev Psicopedag [Internet]. 2015;
8. Brasil. Ministério da Educação. Instituto Na
32(98):208-81 [acesso 2017 Maio 6]. Dispo
cional de Estudos e Pesquisas Educacionais nível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.
Anísio Teixeira (INEP). Censo Escolar MEC/ php?script=sci_arttext&pid=S0103-8486
INEP. Principais Indicadores da Educação de 2015000200012&lng=pt&nrm=iso
Pessoas com Deficiência. Brasília: MEC/INEP; 10. Stainback S, Stainback W. Inclusão: um guia
2014 [acesso 2017 Abr 29]. Disponível em: http:// para educadores. Porto Alegre: Artmed, 1999.
ERRATA:
No campo de autoria deste artigo onde se lia Juliana Perez leia-se Juliana Peres.
103