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Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Pessoas Coletivas

Públicas

Quer a doutrina, quer a jurisprudência, têm vindo a decidir, pacificamente, que a


responsabilidade civil extracontratual do Estado e pessoas coletivas públicas por factos
ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes assenta nos pressupostos da idêntica
responsabilidade prevista na lei civil, com as especialidades resultantes das normas
próprias relativas à responsabilidade dos entes públicos.
São esses pressupostos:
– o facto, que é um ato de conteúdo positivo ou negativo, consubstanciado por uma
conduta de um órgão ou seu agente, no exercício das suas funções e por causa delas;
– a ilicitude, traduzida na violação por esse facto de normas legais e regulamentares
ou dos princípios gerais aplicáveis e os atos materiais que infrinjam estas normas e
princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser
tidas em consideração (artº 6º do DL 48051, de 21/11/1967);
– a culpa, como nexo de imputação ético-jurídico que liga o facto ao agente, não
sendo necessária uma culpa personalizável no próprio autor do ato, bastando uma
culpa do serviço, globalmente considerado;
– o dano, lesão ou prejuízo de ordem patrimonial ou não patrimonial, produzido na
esfera jurídica de terceiros; e
– o nexo causal entre o facto e o dano
A norma que estabelece o regime do nexo de causalidade em matéria de obrigações
de indemnização é o artº 563º do Código Civil, que preceitua que «a obrigação de
indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria
sofrido se não fosse a lesão».

1) Facto
Na raíz da responsabilidade por factos ilícitos está necessariamente uma conduta da
pessoa obrigada a indemnizar – um facto voluntário. Esta qualificação pretende excluir
os factos naturais produtores de danos, ou seja, os que não dependem da vontade
humana e se apresentam por ela objetivamente incontroláveis.

2) Ilicitude
A ilicitude consiste na infração de um dever jurídico. Sendo assim, só havendo ilicitude
é que o facto voluntário que lesa interesses alheios conduz à obrigação de reparação.
(Causas de Exclusão da Ilicitude Ação Direta - A ação direta consiste no recurso à força
com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito e está regulada no artigo 336º do
Código Civil, ex. defesa da posse/ Legítima Defesa é realizada pelo próprio titular de
um direito, ou por terceiro, contra uma agressão atual e ilícita a esse direito, quando
não for possível, em tempo útil, o recurso à autoridade pública. O artigo 337º do
Código Civil trata esta matéria e estabelece alguns requisitos/ Estado de Necessidade
conforme é estipulado pelo artigo 339º/1, é lícita a ação daquele que destruir ou
danificar coisa alheia com fim de remover o perigo atual de um dano manifestamente
superior.

3) Culpa - Imputação do facto ao lesante


Não basta que se verifique uma violação ilícita de um direito ou interesse
juridicamente protegido de outrem. Impõe-se que se tenha procedido com culpa ou
mera culpa. Isto vem estabelecido no artigo 483º, acrescendo que só existe
responsabilidade independentemente de culpa quando a lei o especifica.

Distinção entre ilicitude e culpa


A ilicitude encara o comportamento do autor do facto sob um ângulo objetivo,
enquanto violação de valores defendidos pela ordem jurídica. Há um juízo de censura
sobre o próprio facto. A culpa, por sua vez, pondera o lado subjetivo desse
comportamento, ou seja, as circunstâncias individuais concretas que o envolveram –
juízo de censura sobre o agente em concreto.

Modalidades da culpa

 Mera culpa – consiste no simples desleixo, imprudência ou inaptidão. O


resultado ilícito deve-se somente à falta de cuidado, imprevidência ou
imperícia;
 Dolo – o agente tem a representação do resultado danoso, sendo o ato
praticado com a intenção malévola de produzi-lo, ou apenas aceitando-se
reflexamente esse efeito.

Categorias do dolo
Dolo direto – o autor do facto age com o intuito de produzir o resultado ilícito
da
sua conduta, que de antemão representou e quis (A, consciente e
premeditadamente, publica um escrito atentatório contra o bom nome e
reputação de B);
Dolo necessário – o agente não tem intenção de causar o resultado ilícito, mas
sabe que este constituirá uma consequência necessária e inevitável do efeito
imediato que a sua conduta visa (A pretende tão-só incendiar a garagem de B,
embora tenha consciência de que para isso destruirá forçosamente o
automóvel de C. Caso leve por diante o seu propósito, haverá dolo direto em
relação à garagem de B e dolo indireto quanto ao automóvel de C);

Dolo eventual – o agente representa o resultado ilícito, mas o dano surge


apenas como consequência meramente possível da sua conduta, atuando ele
sem confiar que o mesmo não se produza. Há uma relação causal entre a
conduta do agente e o evento danoso (A, empreiteiro, constrói um edifício,
conhecendo a possibilidade, ainda que tecnicamente tão-só provável, de a
obra vir a afetar a solidez de um prédio vizinho, propriedade de B).

Os efeitos entre o dolo e a mera culpa são os mesmos: aquele que viola
ilicitamente direito ou interesse alheio fica constituído na obrigação de reparar
os danos causados, quer tenha agido com dolo ou mera culpa (artigo 483º/1).

4) Dano
Requisito da existência de responsabilidade civil é a verificação de um dano ou
prejuízo a ressarcir. Apenas em função do dano o instituto realiza a sua
finalidade essencialmente reparadora ou reintegrativa.

Danos Patrimoniais e Danos Não Patrimoniais


Dano emergente e Lucro cessante
Dano emergente («damnum emergens») compreende a perda ou diminuição
de valores já existentes no património do lesado;
Lucro cessante («lucrum cessans») refere-se aos benefícios que ele deixou de
obter
em consequência da lesão – ao acréscimo patrimonial frustrado (artigo
564º/1).

Danos diretos e Danos indiretos


Os danos diretos resultam imediatamente do ato ilícito, os indiretos são os
restantes. Figure-se a seguinte hipótese: A agride B, que tem de ser longo
tempo hospitalizado e, em consequência disso, sofre prejuízos profissionais. A
lesão corporal de B constitui um dano direto e os reflexos daí decorrentes para
a sua profissão representam dano indireto.

Em princípio, tanto os danos emergentes como os lucros cessantes são


indemnizáveis, no entanto, não é uma regra absoluta.
5) Nexo de causalidade

Além do facto e do dano, exige-se que entre os dois elementos exista uma
ligação: que o facto constitua causa do dano.

Respeita a uma relação de causa e efeito. É um conceito lógico, segundo o qual


uma ação gera uma consequência.

Não há que ressarcir todos e quaisquer danos que sobrevenham ao facto


ilícito, mas apenas os que ele tenha na realidade ocasionado.

O nexo de causalidade desempenha a dupla função de pressuposto da


responsabilidade civil e de medida da obrigação de indemnizar.

Prescrição
O artigo 498º/1 determina dois prazos prescricionais para o direito de
indemnização:

Três anos, a contar da data em que o lesado tenha conhecimento do seu


direito (ou seja, da verificação dos pressupostos de que este depende), embora
com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos
danos.

Prazo ordinário de vinte anos, a contar do facto danoso (artigo 309º). Se o


facto ilícito constituir crime para que a lei penal consagre um prazo mais longo,
será este o prazo aplicável – artigo 498º/3).

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