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ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

13) FARMACOS ANTIEPILEPTICOS


transaminase (vigabatrina) ou uso de drogas com
O evento característico da epilepsia é a convulsão, que propriedades diretas GABA-agonistas; e
está associada à descarga episódica de alta freqüência de
b) inibição da função dos canais de sódio, reduzindo a
impulsos por um grupo de neurônios no cérebro. O local da
excitabilidade elétrica das membranas celulares, possivelmente
descarga primária e a extensão de sua propagação é que
através do bloqueio uso-dependente dos canais de sódio
determinam os sintomas, que vão desde um breve lapso de
(fenitoína, carbamazepina, valproato e lamotrigina).
atenção até uma crise convulsiva completa, que dura vários
minutos. Os sintomas particulares produzidos dependem da Mais recentemente foi observada a importância de fármacos
função da região cerebral que está afetada. que inibem os canais de cálcio tipo T e HVA no tratamento da
epilepsia.
A classificação clínica aceita da epilepsia reconhece
duas categorias: as crises convulsivas parciais e as
convulsões generalizadas, embora haja alguma superposição
e muitas variedades em cada uma.
As convulsões parciais são crises em que a descarga
começa localmente e, com freqüência, permanece localizada.
As convulsões generalizadas envolvem todo o cérebro,
incluindo o sistema reticular, produzindo, assim, uma
atividade elétrica anormal em ambos os hemisférios. A
perda imediata da consciência é característica das
convulsões generalizadas. As principais categorias são as
convulsões tônico-clônicas e as ausências. A convulsão
tônico-clônica consiste numa vigorosa contração inicial de
toda a musculatura, causando espasmo extensor rígido. A
respiração é interrompida, e, com freqüência, ocorrem
defecção, micção e salivação. Essa fase tônica tem duração
de cerca de um minuto e é acompanhada de uma série de
espasmos sincrônicos violentos, que desaparecem
gradualmente em 2 – 4 minutos. O paciente permanece
inconsciente durante alguns minutos e, a seguir, recupera-se
Locais de ação de alguns fármacos antiepilépticos, e
gradualmente, sentindo-se mal e confuso.
aumento da transmissão sináptica do GABA:
As crises de ausência ocorrem em crianças; são muito
menos dramáticas, mas podem ocorrer mais freqüentemente
do que as crises tônico-clônicas. O paciente interrompe
bruscamente o que quer que esteja fazendo, parando
algumas vezes de falar no meio de uma frase, e demonstra
um olhar fixo e vazio por alguns segundos, com pouco ou
nenhum distúrbio motor. O paciente não tem consciência
daquilo que o cerca e recupera-se subitamente, sem nenhum
pós-efeito.
A descarga epiléptica repetida pode causar morte
neuronal (excitotoxicidade).
Do ponto de vista farmacológico, existe uma distinção
clara entre os fármacos que são eficazes nas crises de
ausência e os que são eficazes em outro tipo de epilepsia,
apesar de a maioria exibir pouca seletividade com relação às
outras subdivisões clínicas.
Com a terapia farmacológica ótima, a epilepsia é
totalmente controlada em cerca de 75% dos pacientes.
Dois mecanismos principais parecem ser importantes na
ação das drogas anticonvulsivantes:
a) potencialização da ação do GABA
(neurotransmissor inibitório). Isto pode ser obtido por uma
potencialização da ação pós-sináptica do GABA
(fenobarbital e benzodiazepínicos), inibição da GABA

1 Marcelo A. Cabral
ANOTAÇÕES EM FARMACOLOGIA E FARMÁCIA CLÍNICA

Fármacos antiepilépticos:
Talvez em virtude de seus numerosos locais potenciais
Fenitoína e Carbamazepina
de ação, o ácido valpróico é um dos agentes antiepilépticos
A fenitoina atua diretamente sobre os canais de Na+, mais efetivos no tratamento de pacientes com síndromes de
diminuindo a velocidade de recuperação do canal de seu epilepsia generalizada com tipos mistos de convulsão.
estado inativado para o estado fechado. O canal de sódio
Gabapentina
existe em três conformações – fechada, aberta e inativada, e
a probabilidade de um canal existir em cada um desses A gabapentina é um análogo estrutural do GABA, e visa
estados depende do potencial de membrana. Ao diminuir a aumentar a inibição mediada pelo GABA. Todavia, o
velocidade de recuperação do estado inativado para o estado principal efeito anticonvulsivante da gabapentina parece
fechado, a fenitoína aumenta o limiar dos potenciais de ação ocorrer através da inibição dos canais de cálcio HVA,
e impede a descarga repetitiva. O efeito resultante é a resultando em diminuição da liberação de
estabilização do foco da convulsão ao impedir o desvio neurotransmissores (glutamato e aspartato).
despolarizante paroxístico que inicia a convulsão parcial.
A gabapentina não parece ser um agente antiepiléptico
Além disso, a fenitoína impede a rápida propagação da
particularmente efetivo para a maioria dos pacientes.
atividade convulsiva para outros neurônios, respondendo
pela sua eficácia nas convulsões secundariamente
generalizadas.
Benzodiazepínicos: Diazepam, Lorazepam,
A fenitoina atua sobre os canais de sódio de uma Midazolam e Clonazepam
maneira dependente do uso, por conseguinte, apenas os
Os benzodiazepínicos aumentam a afinidade do GABA
canais que estão abertos e fechados em alta freqüência têm
pelo receptor GABAa e intensificam a regulação do canal de
probabilidade de serem inibidos. Essa dependência diminui
GABAa na presença de GABA, aumentando, assim, o
os efeitos da fenitoína sobre a atividade neuronal espontânea
influxo de Cl- através do canal . Essa ação tem o duplo
e evita muito dos efeitos adversos observados com os
efeito de suprimir o foco Ada convulsão (através da
potencializadores do GABAa (que não são dependentes do
elevação do limiar do potencial de ação) e de fortalecer a
uso).
inibição circundante.
Esse fármaco é utilizado no tratamento das convulsões
Esses fármacos são apropriados para o tratamento das
parciais e tônico-clônicas. Não é utilizada nas crises de
convulsões parciais e tônico-clônicas, porém devido aos seus
ausência.
efeitos colaterais são empregados tipicamente apenas para
A carbamazepina atua de maneira semelhante à interrupção aguda das convulsões.
fenitoína, sendo utilizada nas convulsões parciais devido a
O diazepam, administrado por via intravenosa, é
sua ação dupla na supressão dos focos convulsivos e
utilizado no tratamento do estado de mal epiléptico, uma
prevenção da propagação da atividade.
condição potencialmente fatal, em que ocorrem crises
Etossuximida epilépticas quase sem interrupção. Sua vantagem nessa
situação reside na sua ação muito rápida em comparação
A etossuximida reduz as correntes dos canais de cálcio
com outros agentes antiepilépticos. A maioria dos
tipo T de baixo limiar de maneira dependente da voltagem.
benzodiazepínicos possui efeito sedativo demasiado e efeito
O canal de cálcio do tipo T é despolarizado e inativado
antipsicótico muito curto, o que inviabiliza o seu emprego na
durante o estado de vigília. Nas crises de ausência, acredita-
terapia antiepiléptica de manutenção.
se que a hiperpolarização paroxística ativa o canal no estado
de vigília, iniciando as descargas que caracterizam esse tipo
de convulsão. Barbitúricos: Fenobarbital
A etossuximida é utilizada nas crises de ausências não
O fenobarbital liga-se a um sítio alostérico no receptor de
complicadas, não sendo efetiva para o tratamento das
GABAa e, portanto, potencializa a ação do GABA endógeno ao
convulsões parciais ou generalizadas secundárias.
aumentar acentuadamente a duração de abertura dos canais de
Ácido Valpróico Cl-. Esse aumento da inibição mediada pelo GABA, semelhante
ao dos benzodiazepínicos, pode explicar a eficiência do
O ácido valpróico diminui a velocidade de recuperação
fenobarbital no tratamento das convulsões parciais e tônico-
dos canais de Na+ do estado inativado. Em concentrações
clônicas.
ligeiramente mais altas, limita a atividade do canal de cálcio
Esse fármaco é utilizado primariamente como fármaco
do tipo T de baixo limiar.
alternativo no tratamento das convulsões parciais e tônico-
Outro mecanismo de ação proposto ocorre em nível do clônicas. Entretanto, devido a seus efeitos sedativos
metabolismo do GABA. Ele aumenta a atividade da ácido pronunciados, o uso clínico de fenobarbital diminui com a
glutâmico descarboxilase, a enzima responsável pela síntese disponibilidade de medicações antiepilépticas mais efetivas.
do GABA, enquanto inibe a atividade das enzimas que
degradam o GABA. Acredita-se que esses efeitos em Inibidor dos receptores de glutamato: Felbamato
conjunto, aumentam a disponibilidade de GABA na sinápse
e, portanto, aumentam a inibição mediada pelo GABA. Os receptores de glutamato ionotrópicos medeiam os efeitos do
glutamato, o principal neurotransmissor excitatório do SNC. A
ativação excessiva das sinapses excitatórias constitui um
2 Marcelo A. Cabral
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componente essencial da maioria das formas de atividade


convulsiva. Desta forma, estudos demonstram que a inibição felbamato esteve associado a certo número de casos de anemia
dos subtipos NMDA e AMPA de receptores de glutamato pode aplásica fatal e insuficiência hepática, de modo que, hoje em
inibir a geração de atividade convulsiva e proteger os neurônios dia, seu uso está essencialmente restrito a pacientes com
da lesão induzida pela convulsão. Entretanto, nenhum dos epilepsia extremamente refratária.
antagonistas específicos e potentes dos receptores de glutamato Duas drogas foram recentemente introduzidas no
tem sido utilizado clinicamente de modo rotineiro para o tratamento da epilepsia:
tratamento das convulsões, devido a seus efeitos adversos A vigabatrina, que atua ao inibir a enzima GABA
inaceitáveis sobre o comportamento. transaminase, que é a responsável pela inativação do GABA; e a
O felbamato possui uma variedade de ações, incluindo tiagabina, que inibe a recaptação do GABA.
a inibição seletiva dos receptores NMDA que possuem Por conseguinte, ambas potencializam a ação do
subunidades NR2B. Como essa subunidade particular do GABA como transmissor inibitório. Esses fármacos são
receptor não é expressa de maneira ubíqua no cérebro, o utilizados para o tratamento das crises parciais (com ou sem
antagonismo dos receptores NMDA pelo felbamato não é tão generalização secundária) não controladas satisfatoriamente
disseminado quanto aquele observado com outros antagonistas com outros medicamentos antiepilépticos.
NMDA. Essa seletividade relativa pode explicar por que o
felbamato carece dos efeitos adversos comportamentais
observados com o uso dos outros agentes. ЖЖЖЖЖЖ
O felbamato é um agente antiepiléptico extremamente
potente e também possui o benefício adicional de não apresentar
os efeitos sedativos comuns a muitos outros fármacos utilizados
no tratamento da epilepsia. Entretanto, foi constatado que o

Referências Bibliográficas

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3 Marcelo A. Cabral

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