Você está na página 1de 9

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2020.0000074728

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº


2074064-83.2019.8.26.0000, da Comarca de Votuporanga, em que é agravante FABIO
PASTORE, é agravado ALVORADA FLEX AUTO POSTO DE VOTUPORANGA
LTDA.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 12ª Câmara de Direito


Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:Negaram
provimento ao recurso. Por maioria de votos.Vencido o 3º Juiz, Des. Tasso Duate de
Melo com declaração. , de conformidade com o voto do relator, que integra este
acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JACOB VALENTE


(Presidente) e TASSO DUARTE DE MELO.

São Paulo, 7 de fevereiro de 2020.

CERQUEIRA LEITE
relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO Nº: 34.944


AGRV.Nº:.2074064-83.2019.8.26.0000
COMARCA: Votuporanga
AGTE. : Fábio Pastore
AGDO. : Alvorada Flex Auto Posto de Votuporanga Ltda.

Cumprimento de sentença Penhora sobre imóvel Arguição


de impenhorabilidade sob a égide da Lei n. 8.009/90 Imóvel
urbano que é a residência do devedor e da unidade familiar
Imóvel, no entanto, muito superior às necessidades essenciais e
ao endividamento do devedor Casa de alto padrão, com mais
de 670,00m² de área construída em terreno de mais de
1.460,00m², avaliado em R$ 2,84 milhões Impenhorabilidade
da Lei do Bem de Família cujo fim social é garantir a moradia
e não o conforto, o luxo e a suntuosidade ao devedor contumaz
Impenhorabilidade que recai sobre o que sobejar da venda do
imóvel, a ser empregado na compra, a critério do executado, de
outra moradia mais modesta Recurso do devedor desprovido,
com ressalva.

Em andamento a fase de cumprimento de


sentença nos autos de ação monitória, o juízo de primeiro
grau rejeitou arguição de impenhorabilidade do imóvel que
o réu afirma ser tutelado pela Lei n. 8.009/90, em se
tratando da moradia da família.

Inconformado, o réu objeta, expondo que o


imóvel é a sua residência e nele foi citado para a ação
monitória, tratando-se de moradia habitual há mais de 8
anos. Aduz que os demais imóveis são terras rurais em
cidade distante do Mato Grosso do Sul e também penhorados,
garantindo com suficiência a execução. Intenta a reforma
da r. decisão e a impenhorabilidade da Lei n. 8.009/90 em
relação ao imóvel residencial matriculado sob n. 14.576 no
Registro de Imóveis da Comarca de Votuporanga.

Negado efeito suspensivo ao recurso, a


executada contraminutou.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Em diligência, foi expedido mandado de


constatação e o réu juntou documento (acórdão).

Trazendo a autora o traslado do laudo de


avaliação, veio o mandado de constatação.

É o relatório.

Dúvida não há de que o imóvel penhorado é a


residência habitual do recorrente e sua unidade familiar.

Em diligência determinada pelo relator


sorteado, oficial de justiça lavrou certidão em 28 de
junho de 2019 que patenteia o imóvel como a moradia do
executado e sua família, mulher, filhos e netos.

A certidão corrobora outra, de 14 de outubro


de 2016, em que o imóvel também era apontado como
residência do executado e sua unidade familiar, tratando-
se de caso de alto padrão com área construída de 679,40
ms² em terreno com 1.465,13ms² de área.

A exequente cuidou de trazer laudo de


avaliação recente, de maio de 2019, no qual a área de
1.465,13ms² do terreno é confirmada e a casa tem área
construída, pouco menor, de 676,10ms², de alto padrão,
linhas arquitetônicas modernas e arrojadas, acabamento
meticuloso e de luxo. Entre outros requintes, o laudo
detalha que a casa é em três níveis e no segundo deles há
sala de jogos, sala de cinema, sala de música, sala de
descanso e brinquedoteca, ampla área de lazer, sauna
completa e sala de academia.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

A avaliação é de R$ 2.841.473,82 no mês de


maio de 2019.

O imóvel é a moradia do recorrente, mas


trata-se de moradia suntuosa, de padrão muito superior às
necessidades da família.

No Col. STJ já foi julgado que: “A Lei


8.009/90 foi concebida para garantia a dignidade e
funcionalidade do lar. Não foi propósito do legislador
permitir que o pródigo e o devedor contumaz se locupletem,
tripudiando sobre seus credores. Na interpretação da Lei
8.009/90 não se pode perder de vista seu fim social” (1ª
T., REsp 060.993-SP, rel. Min. Humberto Gomes de Barros,
DJ 05.06.95, pág. 16.642).

O intuito do bem de família há de ser


estudado em conformidade com princípios contidos na
Constituição Federal, como os da dignidade do homem, da
garantia à moradia e da função social da propriedade.

Não é o fim do instituo garantir o conforto,


o luxo a suntuosidade e cobrir de impenhorabilidade o
imóvel que é mantido pelo devedor em padrão muito acima ao
da sua capacidade de endividamento razoável.

Constatado, em concreto, que o imóvel


residencial do recorrente excede às necessidades de abrigo
da família, conforme um conceito de família de padrões
médios, como excede o débito que somava R$ 38.106,51 em
fevereiro de 2018, tornando incompreensível o
inadimplemento contumaz, é possível a alienação judicial
forçada do referido imóvel, mesmo que o único residencial,
porque estará resguardado um excedente para que outro seja
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

comprado e sirva de abrigo familiar mais modesto, sem


deixar de ser digno a quem se endividou acima da
capacidade de honrar obrigações.

Em hipótese semelhante, de insolvência do


devedor, o Col. STJ, através da 4ª Turma, julgando o REsp
30.259-0-SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 08.02.93,
DJU 29.03.93, pág. 5.260, decidiu que: “(...) promovida,
em processo de insolvência, a arrecadação de imóvel
residencial, impõe-se, sobrevindo a Lei 8.009/90, seja
desconstituída, subsistindo tão-somente em relação ao
credor hipotecário, não alcançado pela disciplina no
referido diploma legal, por expressa ressalva que nele
próprio se contém (art. 3º, V)” E concluiu: “O que sobejar
como diferença entre o preço obtido com a alienação
forçada do bem e o pagamento do crédito privilegiado deve
reverter em favor do insolvente, para aquisição, em prazo
razoável, de outro imóvel residencial”.

Diante do exposto, nega-se provimento ao


recurso, com a ressalva de que o que sobejar da alienação
judicial do imóvel sirva à compra de outro imóvel
residencial, a critério do executado, de menor valor.

CERQUEIRA LEITE

Relator
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2074064-83.2019.8.26.0000


COMARCA: VOTUPORANGA 3ª VARA CÍVEL
AGRAVANTE: FABIO PASTORE
AGRAVADA: ALVORADA FLEX AUTO POSTO DE VOTUPORANGA LTDA.

VOTO Nº 30714

DIVERGÊNCIA VOTO Nº 34944 do e. Relator


Sorteado Des. Cerqueira Leite

O e. Relator Sorteado vota por negar provimento ao


recurso, mantida a r. decisão agravada que rejeitou o pedido deduzido de
proteção do bem de família.

Ouso divergir.

Sempre com o devido respeito ao entendimento do e.


Relator Sorteado, sua atenção na verificação dos fatos e o apuro técnico que
caracteriza o seu trabalho, pelo meu voto, dava provimento ao recurso.
Isso porque, em que pese, na espécie, se cuidar “de
moradia suntuosa, de padrão muito superior às necessidades
da família”, adota-se o entendimento consagrado no C. STJ, que não
distingue o valor do bem para a proteção do bem de família.
É dizer, a Lei n.º 8.009/90 não estabelece distinção entre
os imóveis sujeitos à proteção do bem de família, sendo irrelevante se o bem é
de alto padrão, de modo que basta sua utilização como residência da entidade
familiar parasse afigurar a necessidade da proteção legal.
Nesse sentido, os precedentes deste Relator, Ag
2023705-32.2019.8.26.0000, maioria, j. 11.06.19, e do C. STJ:
“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO
DECLARATÓRIA DE IMPENHORABILIDADE DE BEM DE
FAMÍLIA. (...) IMÓVEL CONSIDERADO DE ALTO PADRÃO.
IRRELEVÂNCIA. (...)
4. A jurisprudência desta Corte assegura a
prevalência da proteção legal ao bem de família,
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

independentemente de seu padrão. A legislação é


bastante razoável e prevê inúmeras exceções à
garantia legal, de modo que o julgador não deve
fazer uma releitura da lei, alegando que sua
interpretação atende melhor ao escopo do diploma
legal. (...)”
(STJ, 4ª Turma, AgInt no REsp 1.669.123-RS, Rel.
Des. Conv. Lázaro Guimarães, unânime, j. 15.03.18,
destacou-se)

“CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. (...)


PENHORA DE IMÓVEL. BEM DE FAMÍLIA. PLURALIDADE DE
IMÓVEIS RESIDENCIAIS. ART. 5º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA
LEI Nº 8.009/90. MENOR VALOR. INEXIGIBILIDADE. NA
AUSÊNCIA DE OUTROS IMÓVEIS UTILIZADOS COMO
RESIDÊNCIA DA FAMÍLIA A IMPENHORABILIDADE DEVE SER
RECONHECIDA INDEPENDENTE DO VALOR DO IMÓVEL.
PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (...)
2. A Lei nº 8.009/90, ao instituir a
impenhorabilidade do bem de família, buscou
proteger a família ou da entidade familiar, de modo
a tutelar o direito constitucional fundamental da
moradia e assegurar um mínimo para uma vida com
dignidade dos seus componentes. (...)
4. Os imóveis residenciais de alto padrão ou de
luxo não estão excluídos, em razão do seu valor
econômico, da proteção conferida aos bens de
família consoante os ditames da Lei nº 8.009/90.
(...)”
(STJ, 3ª Turma, REsp 1.482.724-SP, Rel. Min. Moura
Ribeiro, unânime, j. 14.11.17, destacou-se)

“PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL.


LEI N. 8009/1990. IMPENHORABILIDADE DE BEM IMÓVEL
DE LUXO.
1. A Lei nº 8.009/90 não estabelece qualquer
restrição à garantia do imóvel como bem de família
no que toca a seu valor nem prevê regimes jurídicos
diversos em relação à impenhorabilidade, descabendo
ao intérprete fazer distinção onde a lei não o fez.
Precedentes. (...)”
(STJ, 4ª Turma, AgRg no REsp 1.397.552-SP, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, unânime, j. 20.11.14,
destacou-se)

“AGRAVO REGIMENTAL - RECURSO ESPECIAL - DIREITO


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - BEM DE FAMÍLIA - IMÓVEL


DE LUXO.
1.- Os imóveis residenciais de alto padrão ou de
luxo não estão excluídos, em razão do seu valor
econômico, da proteção conferida pela Lei 8.0009/90
aos bens de família. Precedentes. (...)”
(STJ, 3ª Turma, AgRg no REsp 1.294.441-SP, Rel.
Min. Sidnei Beneti, unânime, j. 19.06.12, destacou-
se)

Assim, renovado o respeito ao entendimento diverso, pelo


meu voto, a prova dos autos era suficiente para concluir que o imóvel é
utilizado para a residência da entidade familiar e, portanto, merecedor da
proteção legal, por ser bem de família.
Recurso provido.

Diante do exposto, pelo meu voto, dava provimento


ao recurso para reformar a r. decisão agravada e levantar a penhora.

TASSO DUARTE DE MELO


3º Desembargador
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:

Pg. inicial Pg. final Categoria Nome do assinante Confirmação


1 5 Acórdãos LUIZ ANTONIO CERQUEIRA LEITE FC307DD
Eletrônicos
6 8 Declarações de TASSO DUARTE DE MELO FE3D146
Votos

Para conferir o original acesse o site:


https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informando o processo
2074064-83.2019.8.26.0000 e o código de confirmação da tabela acima.

Você também pode gostar