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PODER JUDICIÁRIO

5 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

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Vistos, relatados e discutidos estes autos de


Apelação n° 9155586-04.2005.8.26.0000, da Comarca de
Guarulhos, em que é apelante CLEIDINEIA ALMEIDA COSTA
LOPES sendo apelado BALEIA INDUSTRIA E COMERCIO DE
BRINQUEDOS LTDA.

ACORDAM, em I a Câmara de Direito Privado do


Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: "DERAM PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO,
PREJUDICADA A APELAÇÃO, V. U. ACÓRDÃO O REVISOR".

O julgamento teve a participação dos


Desembargadores LUIZ ANTÔNIO DE GODOY (Presidente sem
voto), PAULO EDUARDO RAZUK, (Relator sorteado) e DE
SANTI RIBEIRO.

São Paulo, 15 de fevereiro de 2011.

RUI CASCALDI
RELATOR DESIGNADO
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO N°: 17698


APEL.N": 994.05.086872-0
COMARCA: GUARULHOS
APTE. CLEIDINEIA ALMEIDA COSTA LOPES (AJ)
APDO. BALEIA INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE BRINQUEDOS LTDA

*PROVA - Gravação de conversa telefônica realizada por um dos


interlocutores - Validade - Ausência de consentimento e conhecimento
da parte contrária - Irrelevância - Ausente causa legal de sigilo -
Sentença anulada - Agravo retido provido prejudicada a apelação.*

Trata-se de apelação de sentença, cujo


relatório se adota, que julgou improcedente ação de
indenização por danos moral fundada em responsabilidade
civil por ato ilícito.
Apela a autora, reiterando as razões do
agravo retido. No apelo, argúi a nulidade da sentença e
sustenta a procedência do pedido.
Recurso processado e respondido.

É o relatório.

O agravo retido interposto pela autora


merece provimento, pois restou configurado o alegado
cerceamento de defesa.
A sentença apelada desconsiderou a
utilização da fita magnética onde consta gravação de
conversa telefônica tida pela autora com preposto da parte
contrária, em que este admite ter passado informações
desabonadoras sobre a pessoa daquela, com a intenção de que
não conseguisse outro emprego.
Tal prova, no entanto, em conformidade com o
disposto na Constituição Federal e segundo orientação do
Supremo Tribunal Federal, não pode ser considerada prova
ilícita.
Quanto a isso, esclarecedor os fundamentos
utilizados pelo Min. Sydney Sanches no Recurso
Extraordinário n° 271.707/RJ, da relatoria do Min., julgado
em 20/11/2000, parcialmente transcritos:

"3. Com efeito, não merece prosperar a


tese formulada pelo recorrente de que a gravação J

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telefônica teria ocorrido de forma clandestina e


ilegal, violando o direito à intimidade previsto
pela Carta Magna. Igualmente improcedente a tese
de que constituiria prova ilícita a contaminar
todo o processo, inclusive a prova testemunhai
posteriormente colhida.
4. Em primeiro plano, cumpre tecer
algumas considerações acerca das gravações
clandestinas. Nestes casos, a captação ou
gravação da conversa pessoal, ambiental ou
telefônica se dá no exato momento em que a
conversa se realiza; ê feita por um dos
interlocutores, ou por terceira pessoa com o seu
consentimento, sem que haja conhecimento ou
autorização dos demais interlocutores.
5. Ada Pelegrini e outros em As
Nulidades no Processo Penal - Malheiros Editores
- 3 o edição - página 153, assim define tais
gravações: "Não se enquadra, igualmente, na
garantia do art. 5°, inciso XII, CF a gravação
clandestina de uma conversa, feita por um dos
interlocutores, quer se trate de comunicação
telefônica, quer se trate de comunicação entre
presentes. Aqui, como visto, não se pode falar em
interceptações (...), nem está em jogo o sigilo
das comunicações."
6. É a hipótese presente. A denúncia
revela que o Diretor-Geral da Air France no
Brasil, Sr. Gerard Mareei, reuniu-se com dois
fiscais da Previdência para que estes
esclarecessem sobre os trabalhos de fiscalização
realizados na companhia. Em tal conversação,
gravada em fita cassete pelo Diretor da empresa,
os réus atestaram a existência de irregularidades
contábeis e de um débito grandioso com o INSS. Na
ocasião, propuseram que a empresa lhes pagasse
somente a quarta parte do valor devido para que
dessem por encerrada a fiscalização.
7. A gravação realizada nos moldes do
caso concreto não constitui hipótese de ofensa a
Constituição Federal nem de prova obtida
ilicitamente. Conforme esclarece Ada Pelegrini e
outros na obra supracitada, a "gravação em si,

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quando realizada por um dos interlocutores que


queira documentar a conversa tida com terceiro,
não configura nenhum ilícito, ainda que o
interlocutor não tenha conhecimento de sua
ocorrência."
8. Como bem salientou o Ministério
Público ãs fls. 482/488, os réus impugnam a
licitude da gravação porque não foram consultados
sobre a conveniência ou não de se gravar a
conversa. É certo que condicionar a gravação de
uma conversa ao prévio consentimento dos
envolvidos significa, em última análise, afastar
qualquer possibilidade de obtê-la.

11. Luiz Francisco Torquato Avolio


também tem estudo sobre o tema, tendo destacado,
verbis: "Observa-se que a jurisprudência, de modo
geral, ainda não assimilou bem o conceito de
gravação clandestina. A clandestinidade, nesse
caso, não se confunde com a ilicitude. Qualquer
pessoa te/n o direito de gravar a sua própria
conversa, haja ou não conhecimento da parte de
seu interlocutor. 0 que a lei penal veda,
tornando ilícita a prova decorrente, ê a
divulgação da conversa sigilosa, sem justa causa.
A "justa causa" é exatamente a chave para se
perquirir a licitude da gravação clandestina. E,
dentro das excludentes possíveis, é de se afastar
- frise-se - o direito à prova. Os interesses
remanescentes devem ser suficientemente
relevantes para ensejar o sacrifício da privacy.
Assim, por exemplo, a vida, a integridade física,
a liberdade, o próprio direito à intimidade e,
sobretudo, o direito de defesa, que se insere
entre as garantias fundamentais. Ocorrendo, pois,
conflito de valores dessa ordem, a gravação
clandestina é de se reputar lícita, tanto no
processo criminal como no civil,
independentemente do fato de a exceção a regra da
inviolabilidade das comunicações haver sido
regulamentada." (Provas Ilícitas, São Paulo, RT,
1995, p. 148/149).

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No caso dos autos, a conversa gravada entre


a autora e o preposto da ré está, notadamente, em
conformidade com o disposto na Constituição Federal e,
segundo orientação do Supremo Tribunal Federal, não podem
ser considerada prova ilícita.
Destarte, a decisão proferida pelo juízo de
primeiro grau que não a admitiu como meio de prova,
impedindo a autora de comprovar suas alegações, importou em
cerceamento de defesa, já que a falta dessa prova foi
justamente o fundamento do indeferimento de seu pedido.
Daí a razão de se dar provimento ao agravo
retido por ela interposto e, em conseqüência, anular a
sentença impugnada.
Diante do exposto, DÁ-SE PROVIMENTO ao
agravo retido para anular a sentença apelada, restando
PREJUDICADA a apelação.

RUI CASCALDI
RELATOR DESIGNADO

APEL.N" 994.05.086872-0 - GUARULHOS - VOTO 17698 - Maria Alice

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