Você está na página 1de 8

AO SENHOR SUPERINTENDENTE DO DEPARTAMENTO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO

CONSUMIDOR DA COMARCA DE FRANCISCO BELTRÃO – PARANÁ.

PROCESSO Nº 112/2010

BV FINANCEIRA S/A., pessoa jurídica de direito privado, com sede social localizada na
Avenida das Nações Unidas, nº 14.171, Torre A, 8º andar, conjunto 82, inscrita no CNPJ/MF sob o nº
01.149.953/0001-89 (documento 01) vem, respeitosamente, à presença de Vossa Senhoria, apresentar o
competente

RECURSO ADMINISTRATIVO

face à notificação em epígrafe, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas.

Termos em que,
Pede deferimento.
Francisco Beltrão, 14 de novembro de 2018.

MILTON FLÁVIO DE A. C. LAUTENSCHLÄGER


OAB/SP 162.676
I. DA DEMANDA ADMINISTRATIVA.

Trata-se de demanda administrativa ajuizada por ALISSON SIDNEI BUENO, em face de


BV FINANCEIRA, ora RECORRENTE, em que alegou, em síntese, que recebia cobranças de taxas abusivas
em seu contrato de financiamento, das quais não concorda.

Contudo, em que pese às alegações do RECORRIDO, conforme se passará a demonstrar, este


não assiste razão, motivo pelo qual deve ser julgado improcedente de pronto, bem como ser devidamente
arquivado.

I         PRELIMINARMENTE

I.1    DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO.

Trata-se de reclamação efetuada no ano de 2010, ocasião em que a RECORRENTE


apresentou defesa, contudo, apenas no ano de 2017 o RECORRIDO apresentou impugnação, bem como apenas
agora, em novembro de 2018, a RECORRENTE foi notificada sobre a concessão de prazo para interposição de
recurso, restando clara a inércia da administração pública por mais de 03 (três) anos.

Com a inegável inércia por mais de 03 (três) anos, há a ocorrência da prescrição intercorrente
no processo administrativo. Assim estabelece o art. 1º, § 1º da Lei nº 9.873 de 23 de novembro de 1999:

Art. 1º. (...)

§ 1º. Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por


mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão
arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem
prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da
paralisação, se for o caso.

É entendimento da jurisprudência nesse sentido:

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. PARALISAÇÃO


DO PROCESSO ADMINISTRATIVO POR PRAZO SUPERIOR A 3
ANOS. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA CONFIGURADA.
INTELIGÊNCIA DO ART. 1º, § 1º DA LEI Nº 9.873/99. RECURSO
PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Havendo permanecido o feito
administrativo paralisado por período superior ao triênio de que trata o art.
1º, § 1º da Lei nº 9.873/99, mister o reconhecimento da prescrição
administrativa intercorrente na espécie, contaminando a multa imposta pelo
PROCON. 2. Sentença reformada para, reconhecendo a prescrição, anular a
penalidade imposta pela Administração.”
(TJBA; APL: 00566088820098050001/BA; Relatora: Cynthia Maria Pina
Resende; Quarta Câmara Cível; Data de Publicação: 22/01/2014)

Destarte, tendo em vista a incontestável prescrição intercorrente, clara está a inequívoca


necessidade do processo ser arquivado, o que ora se requer.

II. DA REALIDADE DOS FATOS

Primeiramente, necessário aduzir que o RECORRIDO firmou um contrato de financiamento


de veículo com a RECORRENTE com pagamento previsto expressamente.

Entretanto, o RECORRIDO aduz serem abusivos os valores discriminados em seu contrato


com relação aos Serviços de Terceiro, TAC, TEC e custos com registro, diluídos e incidentes nas parcelas
devidas à RECORRENTE.

Salienta-se que em que pese os argumentos postos pelo RECORRIDO, necessário esclarecer
que o RECORRIDO sempre teve exata ciência dos valores contratados, haja vista a fixação anterior do valor da
parcela, em que embutidos os juros e encargos oriundos do negocio firmado, não existindo qualquer vicio capaz
de invalidar o ato da contratação, eis que todos os valores e encargos foram de modo expresso, colacionados no
pacto firmado.

Impende ressaltar que, conforme as Resoluções 3517 e 3518 que regulamentam a


cobrança de serviços financeiros prestados, a requerida foi autorizada a inserir a cobrança em todas as
transações financeiras realizadas a partir de 03.03.2008 até março do ano de 2011, dos custos referentes à
operação pactuada.

Frisa-se que o CET (Custo Efetivo Total) reflete todos os custos relacionados á operação de
credito pactuada, de forma que possibilita aos consumidores a comparação entre os custos das várias Instituições
Financeiras, que poderá no momento da proposta, decidir pela melhor solução para ele.
Neste passo, nos termos da Resolução 3.517, poderão ser no CET os seguintes custos e
serviços tarifados: Tributos (IOF - Imposto sobre Operação Financeira); tarifa de cadastro; tarifa de avaliação do
bem; registros, englobando serviços de cartório com registros contratuais ou outros documentos referentes à
operação de crédito e serviços do Sistema Nacional de Gravames; despesas com comissão para originação do
contrato; bem ainda, outras despesas relativas ao contrato de serviço financeiro.

A Resolução 3.518 assim dispõe em no art. 1º:

“Art. 1º A cobrança de tarifas pela prestação de serviços por parte das


instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar
pelo Banco Central do Brasil deve estar previstas no contrato firmado
entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço
previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.”

Ademais, necessário esclarecer que a cobrança da tarifa em questão configura-se legitima, haja
vista que esta pode ser realizada, tanto no início do relacionamento de uma operação de crédito, como nas
operações de arrendamento mercantil, sendo que no presente caso ...

Sendo assim, ressalta-se que o valor contestado foi devidamente autorizado pelo
RECORRIDO, conforme contrato em anexo, sendo totalmente legal a sua cobrança e diluição nas parcelas.

Nesta mesma esteira, impende salientar que os serviços de terceiros foram autorizados
expressamente pela parte RECORRIDO, que optou por financiar os valores referentes à negociação, razão pela
qual denominados de “serviços de terceiros”.

Desta feita, tem-se que tal valor foi emprestado pelo consumidor, sendo devida a sua
contraprestação e inequívoca sua ciência.

Ora, diante de tal situação podemos concluir que o RECORRIDO concordou com os termos
do contrato firmado, não havendo que se falar em abusividade nas cobranças das referidas tarifas.

III. DA BOA FÉ CONTRATUAL

Nos exatos termos do já mencionado, a BV FINANCEIRA somente poderá ser


responsabilizada por aquilo que contratualmente lhe couber.
É a chamada autonomia da vontade das partes, princípio norteador das relações civis, a qual,
restando presentes os requisitos legais, faz do contrato um ato jurídico perfeito.

Verifica-se, portanto, tratar-se do princípio da pacta sunt servanda, o qual estabelece a força
dos contratos entre as partes que o firmaram.

Note que o contrato celebrado foi firmado nos moldes da legislação pátria, a teor do citado
artigo 104 do Código Civil, in verbis:

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:


I - agente capaz;
II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Ademais, fica evidente que não se infringiu qualquer artigo do Código de Defesa do
Consumidor – Lei 8.078/90, como a contrário sensu, se pode depreender:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão


os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar
conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos
forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e
alcance.

De outra banda, infere-se que contrato sub judice não possui vício algum que pudesse ensejar
a condenação da BV FINANCEIRA nos termos requeridos no processo de abertura da reclamação, visto que as
razões apresentadas pelo consumidor são totalmente descabidas de embasamento jurídico hábil para este fim.

Verifica-se, assim, que as responsabilidades assumidas são oriundas de contrato com cláusulas
embasadas na boa fé contratual e na probidade, preservadas pela Legislação sobre o assunto e contidas nos
artigos 421 e 422 do Código Civil, in verbis:

“Artigo 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da


função social do contrato.”

“Artigo 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do


contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa fé.”
Diante disso, resta evidente de que não pode ser imputada culpa da BV FINANCEIRA.

Nesses termos, em sendo as cláusulas contratuais lícitas, e embasadas na melhor legislação


pátria, e invocando a terminologia do princípio da pacta sunt servanda, o qual estabelece a força dos
contratos entre as partes que o firmaram, estamos diante de “lei” que disciplina as relações inter pars, e
por assim deverá ser respeitada por ambos os contratantes.

IV. DA FORÇA VINCULANTE DOS CONTRATOS

Ato contínuo ao anteriormente exposto, frise-se que o princípio da autonomia de vontades,


bem como o de que o contrato faz lei entre as partes, é lembrado pelo mestre Sílvio Rodrigues in “Direito
Civil”, Vol. 3 - Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade - Ed. Saraiva, 1986, pág. 18:

“O princípio da força vinculante das convenções consagra a ideia de que o


contrato, uma vez obedecidos os requisitos legais, se torna obrigatório entre
as partes, que dele não se podem desligar por outra avença, em tal sentido.
Isto é, o contrato vai constituir uma espécie de lei privada entre as partes,
adquirindo força vinculante igual à do preceito legislativo, pois vem munido
de uma sanção que decorre da norma legal, representada pela possibilidade
de execução patrimonial do devedor. Pacta sunt servanda.”

Em sua festejada obra, “Contratos”, Ed. Forense, 1987, 12ª ed., pág. 38, Orlando Gomes,
sobre o princípio da força obrigatória dos contratos, ensina:

“O princípio da força obrigatória consubstancia-se na regra de que o


contrato é lei entre as partes. Celebrado que seja, com observância de
todos os pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser
executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais
imperativos. O contrato obriga os contratantes, sejam  quais forem as
circunstâncias em que tenha de ser cumprido. Estipulado validamente
seu conteúdo, vale dizer definidos os direitos e obrigações de cada parte,
as respectivas cláusulas têm, para os contratantes, força obrigatória.
Diz-se que é intangível, para significar-se a irretratabilidade do acordo
de vontades. Nenhuma consideração de equidade justificaria a
revogação unilateral do contrato ou a alteração de suas cláusulas, que
somente se permitem mediante novo concurso de vontades. O contrato
importa restrição voluntária da liberdade; cria vínculo do qual
nenhuma das partes pode desligar-se sob o fundamento de que a
execução a arruinará ou de que não o teria estabelecido se houvesse
previsto a alteração radical das circunstâncias. Essa força obrigatória
atribuída pela lei aos contratos é a pedra angular da segurança do
comércio jurídico.”

Desta forma, salienta-se que a responsabilidade assumida pelo consumidor quando da


celebração de contrato de financiamento com a BV FINANCEIRA é ônus cujo qual não pode ser
desconsiderado por este Órgão de Defesa do Consumidor, por consistir norma contra legem.

V. DA EXISTÊNCIA DE ATO JURÍDICO PERFEITO, DA FORÇA VINCULANTE DOS


CONTRATOS E DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM AS RELAÇÕES CONTRATUAIS

Corolário já pacificado pela doutrina e jurisprudência, o pacta sunt servanda protege a


liberdade de contratar e dá maior efetividade à força vinculante dos contratos, tornando-o lei entre as partes.

Seguindo tal posicionamento, as partes celebraram contrato de financiamento, contendo


cláusulas amplamente especificadas e esclarecidas ao autor no momento da contratação, em atenção à legislação
vigente, não havendo que se falar em ocultação de dados ou mesmo favorecimento indevido de qualquer das
partes.

Assim que o autor alegou desconhecer o contrato, prontamente a RECORRENTE se dispôs a


cancelar o contrato, sem qualquer ônus ao consumidor.

Desta forma, resta patente a ausência de ilegalidade por parte da RECORRENTE.

Verifica-se que a RECORRENTE anuiu com todas as disposições contratuais e, ao


contrário do que quer fazer crer o RECORRIDO, ele tinha conhecimento do contrato celebrado.

Por outro lado, ao agir desta forma, o RECORRIDO incide em verdadeiro venire contra
factum proprio, pois assumiu a obrigação contratual, beneficiou-se dos serviços prestados pela RECORRENTE
e, em momento posterior a isso, vem tentar afastar as disposições do contrato, em atitude evidentemente
contraditória e desleal.
Devem ser considerados tais fatos para extrair-se o verdadeiro quadro fático do caso e evitar-
se qualquer prejuízo desmedido a RECORRENTE, devendo, portanto, o presente recurso administrativo ser
provido, anulando a multa aplicada por este D. Órgão.

VI. CONCLUSÃO

Diante de tudo o quanto acima exposto, resta claro que não há qualquer sentido na aplicação
da referida penalidade. Portanto, seja qual for o ângulo de análise tomado para a solução do presente processo,
emerge claro o equívoco cometido por esta Administração e os motivos pelos quais a RECORRENTE requer:

a) Seja acolhida a preliminar de prescrição intercorrente, devendo o processo ser


arquivado;

b) Com as devidas informações prestadas, caso seja pelo entendimento pela


aplicação de eventual multa, o que não se espera, sejam aplicados os princípios da
razoabilidade e proporcionalidade, inerentes ao exercício da função pública.

Outrossim, requer que todas as publicações e demais intimações sejam feitas diretamente à
empresa BV FINANCEIRA, situada na Avenida das Nações Unidas, nº 14.171, Torre A, 8º andar, conjunto 82,
inscrita no CNPJ/MF sob o nº 01.149.953/0001-89, na Capital do Estado de São Paulo, e, se possível, que todas
as comunicações sejam feitas via Correio.

Termos em que,
Pede deferimento.
Francisco Beltrão, 14 de novembro de 2018.

MILTON FLÁVIO DE A. C. LAUTENSCHLÄGER


OAB/SP 162.676

Você também pode gostar