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Os direitos reais, tal como o direito das obrigações, direito da família e o direito das sucessões,
constitui um ramo do direito civil! – Direito privado!
Juntamente do direito das obrigações, forma aquele que é conhecido como o direito civil
patrimonial, sendo que:
Mas como se chegou à esta inserção sistemática dos direitos reais? E ainda mais, como surgiu
a categoria dos direitos reais?3
O entendimento do direito das coisas como uma matéria autónoma, como uma das subdivisões
do direito civil, remonta aos tempos do jurisconsulto romano GAIUS (do séc. 2 pós Cristo).
1
De acordo com os vários tipos dos direitos reais estes encontram-se regulados também em leis avulsas ou em
legislação especial como, por exemplo, o economicamente importante direito real de habitação periódica
2
Sem prejuízo dos direitos reais limitados de garantia! Regulados não no livro dos direitos reais, mas no direito das
obrigações!
3
Como não poderia deixar de ser, muita influência Romana! Não só por estarmos em Portugal, um país cujo
sistema jurídico foi desde muito cedo marcado pelo direito romano, como também, pelo facto de estamos no
âmbito de uma subdivisão do direito civil, direito privado, onde os romanos deixaram mais trabalhos!
O sistema de GAIUS diferenciou entre:
(1) o direito das pessoas e da família;
(2) o direito das coisas e das sucessões;
(3) o direito das obrigações e as ações
Este sistema, muitos séculos depois, foi modificado na Alemanha – que tinha adotado o direito
romano como o direito comum que se sobrepunha aos vários direitos territoriais, tendo sido
feitas as seguintes alterações:
Introdução de uma parte geral;
Separação do direito das pessoas do direito da família;
Separação do direito das coisas do direito das sucessões;
Separação do direito das obrigações.
Desta divisão acabou por surgir o chamado sistema de HEISE que subjaz ao Código Civil
alemão (o BGB) que, por sua vez, serviu de modelo sistemático ao Código Civil português!
Isto dito de uma forma muito sumária, no entanto, de forma mais desenvolvida e
aprofundada, é possível esboçar a origem histórica da categoria dos direitos reais da forma
seguinte:
Raízes históricas num dos elementos – sistema de Gaius – das Institutiones contidos no
“Corpus Iuris Civilis” (publicado entre 530-533/534) que é dividido em duas partes4:
4
*Ver: Corpus Iuris Civilis, Editio stereotypa (KRUEGER-MOMMSEN), Berlin 1911 (I, 1.º e 2.º), 1915 (I, 3.º), 1912
(II); Sebastião CRUZ, Direito Romano, Coimbra 1973
I. A Codificação composto por:
(1.º) as Institutiones [(Institutas) = uma pequena introdução à ordem jurídica, com força de
lei, principalmente com base no sistema do jurisconsulto Gaius (2.º séc. p. Chr.): personae
(situação pessoal e familiar) res (direito das coisas e sucessões) actiones (direito das
obrigações e acções)] divididas em 4 livros, ao todo com 56 páginas;
(2.º) o Digesta ou Pandectae [Digesto ou Pandectas = extractos de obras de juristas romanos
distribuídos por 50 livros com 926 páginas];
(3.º) o Codex Iustinianus [= as Constituições], dividido em 12 livros com 488 páginas, que
reúne uma compilação de leis do imperador. Estas três obras constituem uma unidade
legislativa.
+
II. As Novelas (Novellae), 803 páginas, não pertencem à própria codificação, respeitam a leis
imperiais publicadas depois (±535-575) e já são redigidas predominantemente em língua grega
O sistema de Gaius que inicialmente mal teve seguidores começou por impor-se muito mais
tarde (a partir de Bolonha), sendo então seguido pelas codificações modernas em França
(1804) e na Áustria (1809).
Na Alemanha, com o direito das pandectas – sob a influência do direito natural racionalista e o
domínio da “escola histórica do direito” – o sistema de Gaius foi precedido por uma parte geral,
o direito das pessoas e da família foi dividido e o direito das coisas foi autonomizado e
separado do direito das sucessões (assim o sistema esboçado por G. A. HEISE, Grundriss
eines Systems des gemeinen Civilrechts, 3.ª edição, Heidelberg 1819 [216 páginas]) ficando o
direito patrimonial dividido entre o direito das obrigações e o direito das coisas.
O sistema de HEISE (Introdução e 5 Livros Regras gerais, direitos reais, das obrigações,
direitos reais-pessoais, direito sucessório e ainda um 6.º livro sobre restituições) veio a ser
seguido primeiro pelo Código Civil da Saxónia (1863 disposições gerais, direito das coisas,
direito dos créditos, direito da família e tutela, direito sucessório) e depois pelo BGB (1900) em
que, porém, o direito das obrigações antecede o direito das coisas, pelo Código Civil Suíço
(1907), embora com fortes modificações, e ainda pelo Código Civil Português, de 1966, que
manteve a ordem dos cinco livros adotada pelo BGB, sendo os conteúdos dos livros apenas
parcialmente coincidentes (por exemplo, os direitos reais de garantia, regulados no BGB no
livro III, constam no CCiv do livro II, das obrigações em geral, e o conteúdo do Livro I do CCiv
não coincide com o do Livro I, a parte geral, do BGB).
[F. REGELSBERGER, Pandekten, Erster Band, Leipzig 1893, organizou a matéria da parte
geral da seguinte maneira: as leis, sua vigência e aplicação, o direito internacional privado a
relação jurídica com os seus elementos externos. Quer dizer, encontramos aqui uma
sistematização quase idêntica à do Livro I do Código Civil de 1966 (e totalmente ao contrário da
Parte geral do BGB, que tem como figura central o negócio jurídico). REGELSBERGER
distingue entre os objectos de direito em geral e, entre os objectos, autonomiza as coisas cuja
característica essencial é serem corpóreas. Também para o BGB coisas são apenas objetos
corpóreos.
O Código Civil português de 1867, pelo contrário, não seguiu o exemplo romano (o
sistema de GAIUS) e adoptou uma sistematização perfeitamente autónoma, antropocêntrica, e
seu modelo do homo iuridicus foi o proprietário na sua luta pela aquisição, fruição e defesa dos
seus bens.]
Em termos processuais, ou seja, para fazer valer direitos vigorava antigamente, em Roma, o
sistema da TIPICIDADE DA TUTELA JUDICIAL, já muito ultrapassado nos direitos
modernos! Foi através deste, e de pouco em pouco, que a categoria dos direitos reais foi se
autonomizando como legítimos direitos subjetivos!
E no que se traduzia este sistema? Quais a suas
Implicações imediatas?
-As primeiras visavam formular pretensões contra uma pessoa – a qual deveria ser
individualmente determinada! Não podendo a pretensão extravasar a relação obrigacional
existente!
-As segundas destinavam a formular pretensões contra alguma coisa – de modo a
estabelecer sua defesa contra qualquer pessoa que perturbasse seu aproveitamento pelo
titular, podendo o titular perseguir a coisa, onde quer que ela se encontrasse.
Esta construção romana está na base de outra, esta outra, já em relação a direitos, que foi
estabelecida muito tempo depois, já no período medieval, a partir do momento em que se
abandonou a base processual em que se assentava o direito romano!
A construção romana sobre as “ações-tipo” deu lugar, muito tempo depois, a duas categorias
de direitos subjetivos, falando-se assim, nos “iura in personan” e “iura in ren”, os quais, por sua
vez, viriam a dar lugar aos atuais direitos subjetivos de crédito e de domínio =reais=coisas.
5
Ações aqui no sentido: Meio processual pelo qual se reclama um direito ou se demanda a punição de um infrator!
-Em direitos de crédito dirigidos contra determinadas pessoas!
B) Conceito de direitos reais?6
É uma questão alvo de muitas discussões doutrinais, cujo debate tem se repetido de forma
cíclica!
Duma forma geral, os debates tem assentado em centrar o conceito de direito real, ou na
relação com a coisa, que é o seu objeto, ou antes na sua eficácia “erga omnes”!
Existem diversas teorias...
6
Independentemente das várias doutrinas, é preciso ter em conta que o significado a ser atribuído aos direitos
reais depende muito do entendimento que um dado sistema político (de cariz ± individualista ou ± socialista) tiver
em relação à apropriação (individual ou coletiva) dos bens, dos meios de produção e dos solos. Como
consequência da consagração do princípio da liberdade contratual e do papel reservado à propriedade privada o
Código Civil está orientado basicamente no sentido de uma economia de mercado de cariz individualista.
b.1.1 Teoria do poder direto e imediato sobre uma coisa?
Conforme esta teoria, o que caracteriza o direito real, é a circunstância de ele recair direta e
imediatamente sobre uma coisa corpórea!
Os direitos reais não carecem, como sucede com os direitos de crédito, da colaboração de
outrem para serem exercidos!
Nos direitos reais, seu titular teria um conjunto de poderes, que iria exercer de forma direta
e imediata sobre a coisa, dispensando a colaboração de qualquer outro sujeito para o fazer!
Foi uma teoria defendida, ainda durante a pandectística, por autores como Watcher e Puchta!
Esteve na base do BGB, sendo expressamente adotada em seus trabalhos preparatórios!
CRÍTICA: O argumento mais forte tecido, refere que esta teoria é excessivamente empírica! –
E isto na medida em que, baseando-se apenas na relação estabelecida com a coisa, não se
explica a forma como são juridicamente atribuídos ao titular os poderes que sobre ela tem!
b.1.2 Teoria do poder Absoluto?
Esta teoria já considera algo diferente. Defende que o que caracteriza o direito real não é a
relação com seu objeto – a coisa – mas sim a relação com os outros sujeitos da ordem
jurídica, através da qual o titular do próprio direito teria a faculdade de exigir dos outros
sujeitos que se abstenham de, por alguma forma, perturbar o exercício de poderes sobre a
coisa!
Haveria assim, nestes termos, uma espécie de relação, entre o titular do direito subjetivo de
domínio e todos as outras pessoas do ordenamento jurídico7, ou, pelo menos, entre aquele
primeiro e todas as pessoas suscetíveis de lesar seu gozo sobre a coisa!
Estas conceções, já buscam fazer como que uma junção das duas anteriores conceções.
Assim, seus defensores consideram que os direitos reais possuem um lado interno – que
traduz-se no poder direto e imediato sobre a coisa – e um lado externo – que consiste na
relação com todos os outros sujeitos da ordem jurídica.
CRÍTICA: Muitos autores apontam para o facto de que, juntando as duas conceções, ainda
assim, esta poderia ser sujeita as críticas de qualquer uma das teorias anteriores!
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Neste ponto mesmo reside uma das críticas a esta teoria, referindo a sua excessiva abstração! Muitos são os
autores que consideram fantasioso pretender a existência de uma relação entre um sujeito e todos os demais da
ordem jurídica!
C) Características dos direitos Reais – Enquanto direitos subjetivos!
A doutrina nesta parte tem sido unânime, apontando como características dos direitos reais
quatro:
-Caráter Absoluto
-Exclusão de todos os outros – dever geral de abstenção/obrigação passiva universal
-Inerência
-Sequela
-Prevalência*
Há direitos reais como os direitos reais de garantia e os direitos reais de aquisição não
possuem todas estas caraterísticas! Deste modo, todos os direitos reais de gozo são direitos de
domínio, mas não todos os direitos reais são direitos de gozo e de domínio.
A maioria da doutrina aceita que os direitos reais possuem caráter absoluto, em virtude de
serem oponíveis “erga omnes” (A tal eficácia erga omnes) – São oponíveis a terceiros –
Todo o ordenamento jurídico ou pelo menos a todas as pessoas suscetíveis de por em causa o
gozo sobre a coisa.
*Desde logo já se contrapõe aos direitos de crédito – que tem caráter relativo! Apenas
oponíveis, em regra, a uma pessoa – devedor!
Os direitos reais são direitos absolutos – quer se observe de uma perspetiva estrutural quer
pela perspetiva da oponibilidade8!
Não será tão correta a exposição de Oliveira de Ascensão, pois a verdade é que os direitos
reais assentam/estruturam-se sim numa determinada relação, embora não seja qualquer tipo
de relação – tal como as relações que encontramos na base dos direitos de crédito!
E poderia ser questionado – Qual a consequência do caráter absoluto dos direitos reais? A
resposta a esta questão, traz-nos mais um traço caracterizador!
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Autores como Oliveira Ascensão, consideram que o direito real possui sim caráter absoluto, em virtude de não se
estruturar em nenhuma relação! Outros, como Menezes Cordeiro, partindo da consideração de que a
oponibilidade dos direitos de crédito e direitos reais é idêntica, defendem que a absolutidade nunca poderia
constituir uma característica dos direitos reais.
Em consequência dos efeitos “erga omnes” dos direitos reais, resulta imediatamente o facto de
existir um dever genérico de abstenção, de respeito ao direito do titular, por parte de todas as
outras pessoas do ordenamento jurídico, as quais o titular poderá sempre que necessário opor
eficazmente seu direito.
Esta característica quer dizer que os direitos reais estão de tal forma ligados ao seu objeto –
coisa - que não podem ser dela desligados!
Nesta aceção, é preciso para poder ser objeto dos direitos reais, que a coisa respeite os
requisitos do objeto negocial! O objeto dos direitos reais – coisa - carecerá necessariamente de
ser:
-Fisicamente possível
-Legalmente possível
EVENTUAIS VISCITUDES NO OBJETO
-Determinável IMPLICARÃO MODIFICAÇÕES NO
-Não contrário a lei CONTEÚDO DO DIREITO! PARA ALÉM
DO FACTO QUE QUAIQUER
-Não Ofensivo aos bons costumes TRANSMISSÕES DO DIREITO PARA
UMA OUTRA COISA TORNAREM-SE
IMPOSSÍVEIS
C.4 Sequela
Esta característica, única e exclusiva dos direitos reais, e de todos eles, significa que os direitos
reais “perseguem a coisa” (ou melhor, habilitam seu titular a persegui-la!), onde quer que ela se
encontre, ainda que tenha sido transmitida para outra pessoa!
Pode-se dizer que a sequela, é assim uma manifestação dinâmica do princípio da inerência,
significando que o titular do direito real, pode ir buscar a coisa, independentemente de qual o
seu atual possuidor ou detentor, mesmo que ela venha a ser objeto de uma cadeia de
transmissões.
Exemplos:
São mecanismos sempre possíveis, independendo da quantia de vezes que o bem tenha sido
transmitido (mesmo para terceiro de boa-fé!).
C.5 Prevalência*
Esta característica/ou princípio (tal como compreende o prof. Horster) significa que os direitos
reais que primeiro se constituírem, prevalecem sobre todos os outros – direitos reais de
constituição/ou de registo posteriores – bem como sobre todos os direitos de crédito que se
venham a constituir!
Trata-se assim de uma espécie de “força maior” dos direitos reais, sobre os direitos de crédito
(e sobre os direitos reais posteriormente constituídos)!
Exemplos:
D) Princípios Gerais dos direitos Reais – Princípios gerais enquanto ramo – direito das
coisas! Que correspondem aos seus fundamentos dogmáticos específicos! É algo de
exógeno!
O que são? – São um agrupado sistemático de ideias gerais, subjacentes as normas deste
ramo de direito!
Importância prática? Estes princípios podem, na veste de critérios lógicos e teleológicos, servir
como auxiliares na interpretação das disposições do direito das coisas.
NOTA: Neste ponto, há uma grande divergência doutrinal! Não há um consenso quanto a
um possível elencado de princípios! Cada autor considera o seu.
Considerando a opinião do prof. Doutor Menezes Leitão, são os princípios:
Nos termos do artigo: “Não é permitida a constituição, com carácter real, de restrições ao
direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito (=direitos reais limitados de gozo)
senão nos casos previstos na lei; toda a restrição resultante de negócio jurídico, que não esteja
nestas condições, tem natureza obrigacional.
É uma formulação infeliz para o verdadeiro significado do princípio da tipicidade!
No entanto, a ideia que deve ser retirada desta disposição, é a proibição da existência de
direitos reais que não se encontrem expressamente previstos na lei.
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Do número de realidades que podem ser qualificadas como direitos reais! É preciso ser sempre a lei a criar os
vários direitos inseridos nesta categoria!
*A este propósito, se eventualmente as partes, ao abrigo de sua autonomia privada, quiserem
criar novos direitos reais, a lei vai lhes negar eficácia real (“erga omnes”), atribuindo apenas
natureza obrigacional!
NOTA: Além do “numerus clausus”, os direitos reais – ainda nesta mesma ideia de limitação -
têm regularmente um conteúdo determinado ou fechado. Deste modo, o artigo 1305.º define
o conteúdo do direito da propriedade e todos os regimes dos direitos reais limitados começam
por fornecer-nos uma “noção” que define o seu respetivo conteúdo (ver, por exemplo, o artigo
1439.º que define o usufruto).
Sabido o que é o princípio da tipicidade e o que ele implica, é importante também compreender
o que ele não implica! Assim sendo:
-Por um lado, a tipicidade se restringe apenas a uma proibição relativa a criação de direitos
reais.
-Por outro lado, a tipicidade dos direitos reais não vai implicar que um intérprete (note-se,
intérprete) apenas reconheça caráter real aos direitos que a lei considere expressamente como
direitos reais. A tipicidade restringe-se a criação legal dos direitos, não abrangendo a
qualificação. Por isto, poderá o intérprete qualificar como reais direitos que a lei não reconhece
expressamente como tais.
E quais as razões que fundamentam o princípio da tipicidade taxativa, reforçado pela fixação
do conteúdo dos direitos reais?
Nos direitos reais, está em causa a atribuição ou a pertença de bens, e não uma simples
obrigação no sentido de os transferir ou de efetuar uma prestação!
(1) Representando os direitos reais a ordenação jurídica dos bens, parece ser mais correto
que seja o estado a instituí-la, ao invés e deixar ao livre critério dos particulares ou de
outros critérios!
(2) O caráter absoluto dos direitos reais – imaginar se a lei admitisse criação de direitos
reais diferentes dos tipificados na lei e atribuísse efeitos absolutos - poderia constituir
um grande entrave á circulação de bens – na medida em que permite ao titular opor de
forma eficaz a qualquer adquirente de boa-fé
(3) Como consequência daquele último aspeto do 2 ponto, temos o 3 ponto: Não seria nada
adequado situações de sobreposição de direitos sobre a mesma coisa, o que poderia
dar origem aos mais diversos litígios, que são desfavoráveis ao tráfico jurídico negocial!
Este princípio exige que se possa individualizar concretamente, a coisa que constitui o objeto
do direito real!
Portanto, da exigência deste princípio temos que, para a constituição de um direito real, o seu
objeto deverá necessariamente se encontrar:
(1) Determinado
(2) Ter existência presente
(3) Ser autónomo de outras coisas
Assim, tomando e consideração de forma separada estas três exigências, é possível dividir
este princípio em 3 outros sub-princípios:
-Sub-princípio da Determinação
- Sub-princípio da Atualidade
- Sub-princípio da Autonomização/totalidade
Exige que para a constituição de um direito real, seu objeto – coisa - esteja determinado!
Exp: Se o titular tiver o direito a receber coisa genérica, não vai possuir um direito real, mas sim
um direito de crédito (539º) apenas se constituindo o direito real a partir do momento em que as
coisas estejam determinadas! (408º n 2)
1.2 Sub-princípio da atualidade
Exige que a coisa tenha existência presente para poder ser objeto de direitos reais10
Exp: As prestações dos direitos de crédito, podem ser relativas a coisas futuras (399º). As
coisas, por sua vez, precisam ter existência presente para poder ser objeto dos direitos reais.
Um direito a coisas futuras, não constituirá um direito real, mas antes um direito de crédito,
apenas podendo se transmitir o direito quando a coisa é adquirida pelo alienante (408º nº2)
Para que possa existir um direito real, o mesmo – em regra - não poderá incidir apenas sobre
parcelas de uma coisa, tendo que incidir sobre coisas autónomas!11
Assim, não constituirão direitos reais, nem se poderá constituir um direito real, relativamente a
coisas que estão materialmente/substancialmente ligadas a outras – exigindo-se em casos
destes, sua prévia separação (Art. 408º nº 2)
No mesmo sentido, se temos uma coisa separada, que porventura vem a ser unida e
incorporada numa outra, verificar-se-á a extinção do direito e a sua aquisição “ex novo” por
acessão (1325º e ss).
NOTA: Deste princípio da individualização que resulta/ assenta outro princípio, o do “nemo plus
iuris
Este princípio exprime duas ideias relativas ao conteúdo dos direitos reais:
10
Neste sentido, não é possível também existir direitos reais sobre coisas passadas, implicando a perda da coisa a
extinção do direito que sobre ela incidiu.
11
Há também exceções aqui! Em certos casos, admite-se a constituição de direitos reais autónomos sobre partes
de coisas! Na propriedade horizontal – direitos que incidem sobre frações autónomas de um prédio 1414º – na
superfície – Alguém é titular de um implante em prédio alheio 1524º.
-Por outro lado, possibilidade da sua expansão, em caso de extinção posterior daquele
direito real limitado!
Isto dito, compreende-se que o conteúdo dos direitos reais não é imutável, antes varia muito
conforme vão se constituindo e extinguindo os direitos reais que incidem sobre a coisa!
EXEMPLOS:
Temos, por um lado, o direito de propriedade (direito real máximo – comporta todas as
faculdades – uso, disposição – fruição) e, por outro lado, os vários direitos reais limitados.
Os direitos reais limitados restringem de acordo e na medida do seu conteúdo, o conteúdo do
direito da propriedade, que pertence a outrem, como vemos com facilidade com as servidões
prediais ou com o usufruto que restringem o gozo pleno da propriedade!
12
Doutrinalmente discutido! Prof. Menezes leitão compreende que não faz sentido admitir um princípio com estas
características – Não é possível constituir sucessivamente dois direitos, de mesmo conteúdo, sobre a mesma coisa
– sim – mas tal não resultaria da falta de compatibilidade entre eles e sim de uma falta de legitimidade!
Usuário, só usa e frui na medida das suas necessidade e das de sua família. Estes direitos são
intransmissíveis mortis causa. Constituem-se e extinguem-se pelos mesmos modos que o
usufruto (1485º). 1488 – reforça a ideia de que não são transmissíveis mesmo entre vivos – o
único direito real verdadeiramente intransmissível.
Sobre este princípio, importa detalhar desde logo que não é específico dos direitos reais!
*Nos direitos de crédito, a regra é a de que eles são transmissíveis – Quer por vida quer por
morte!
A transmissibilidade, no âmbito dos direitos reais, implica:
-Por um lado que os direitos reais possam ser objeto de sucessão “Mortis Causa” (2024º)
NOTA: Há exceções – Direitos reais aos quais se exclui a hereditabilidade (usufruto, uso,
habitação – não excedem a vida do titular /1443º)
-Por outro, que o direito real possa ser transmitido por ato “inter vivos”.
NOTA: Há exceções – Existência de direitos reais inalienáveis, tal como o uso e habitação (Art.
1448º)
IMPORTANTE: O regime da transmissibilidade negocial dos direitos reais encontra-se regulado
no Art. 408º do código civil!
-Transmissão negocial de direitos reais – Segundo o Art. 408º - Vale os princípios da (1)
CONSENSUALIDADE e (2) CAUSALIDADE13!
(1) Constituição/transmissão de direitos reais dá-se por mero efeito do contrato – acordo
comum das partes. Celebração do contrato – independentemente do cumprimento –
acarreta logo a transferência do direito real! (408º /1317º alínea a) código civil). A
transferência ou constituição é, portanto, imediata e instantânea!
(2) Está diretamente ligado ao primeiro princípio! Este refere que a existência de uma justa
causa de aquisição é sempre necessária para que o direito real se constitua ou se
transmita.
Exp: Existência de título é imprescindível para a constituição ou transmissão do direito real
13
Menezes Leitão fazendo referência a explicação do Art. 408º pelo sistema de título, como a escola de Coimbra!
14
No entendimento da escola de Coimbra, apenas existiriam exceções ao Art. 408 nº1, quando para além de um
título, a lei exigisse para a produção dos efeitos reais, também um modo de aquisição!
Exige quem todos os factos jurídicos de que advenham direitos reais, devem ser dados a
conhecer ao público em geral!
Deve haver transparência, notoriedade ou publicidade, sendo acessível ao conhecimento de
quem participar no tráfico jurídico privado e precisar de informações relativas à situação
jurídica dos bens.
É um princípio inserido na lógica subjacente aos princípios da tipicidade taxativa (inclusive na
fixação do conteúdo dos direitos reais) e da especialidade
Mas de que forma? Como deve ser assegurada esta publicidade?
(1) POSSE – É a forma mais comum! Principalmente no caso das coisas móveis não
sujeitas a registo!
(2) INSTITUTO DO REGISTO – Forma mais perfeita! Sujeitos à inscrição neste instituto,
estão os bens imóveis e alguns bens móveis – sujeitos a registo (aviões, navios, carros)
É um princípio que resulta, para a grande massa dos bens – Os bens móveis não sujeitos a
registo - através da POSSE (artigo 1268.º CCiv).
Para os bens imóveis, a publicidade é feita por meio do registo (artigo 7.º CRegPred, e outros
códigos registais), sucedendo o mesmo com os bens móveis sujeitos a registo, referidos no
artigo 205.º, n.º 2, CCiv e aos quais se aplicam subsidiariamente as regras do registo predial
com as necessárias adaptações.
De acordo com o disposto nos artigos 1268.º CCiv e 7.º CRegPred, o registo vai presumir a
existência do direito, mas não se garantir totalmente a sua existência e a idoneidade de sua
aquisição.
O registo predial português está a cargo das chamadas conservatórias (no brasil, os cartórios),
as quais, por sua vez, constituem serviços do instituto dos registos e do Notariado (Em direito
administrativo, um instituto público).
b) Depois, artigo 1.º não deixa dúvidas: o registo dá publicidade, à situação jurídica de
um prédio, já constituída; Não é o registo que cria ou constitui a situação jurídica, o
que ele faz é dar conhecimento dela! O registo não é constitutivo de direitos!
Primeiro se constituem os direitos com base no direito material (substantivo) fora e antes do
registo; depois, e uma vez constituídos, ao existirem, o registo dá-lhes a devida publicidade
cumprindo desta maneira o seu fim essencial. (Primeiro o título aquisitivo, depois o modo).
Isto não exclui, porém, que atendendo aos fins não essenciais do registo, o acto do registo
possa interferir ao mesmo tempo na moldura/ configuração exata do direito que acabou de ser
registado! Ou seja:
Um direito entra para ser registado, mas no ato do registo, na efetivação do registo, isto pode
acabar por moldar os direitos, ou precisá-los (por exemplo, ao alterar a sua prioridade), tendo
15
O seu desenvolvimento se dará na cadeira de registos e notariado 4º ano
o registo deste modo efeitos constitutivos secundários ou complementares. Contudo, mesmo
estes efeitos, pressupõe necessariamente que o direito levado a registo exista, já está
constituído!
Onde não há direitos constituídos com base no direito material (substantivo) o registo não os
atribui! O registo é um mecanismo meramente declarativo, de direitos existentes! Nunca é
constitutivo de direitos na sua raiz; a raiz do direito temos de encontrar no direito material
(substantivo).
Quer dizer, o registo não dá/não constitui direitos, apenas os conserva. O registo não pode
assegurar a existência definitiva do direito da pessoa a favor de quem esteja registado um
prédio, mas só que, a ter ele existido, ainda se conservou – ainda não foi transmitido a outra
pessoa
Nesta presunção do artigo 7.º CRegPred, CONSISTE A FÉ PÚBLICA DO REGISTO: Registo
cria uma aparência jurídica em que o tráfico jurídico imobiliário pode confiar. Os registos
públicos estão instituídos para dar a conhecer. A sua existência justifica-se pela necessidade
de proteger a confiança de terceiros, isto é, do público em geral (…) e a sua finalidade primária
é proteger o tráfego, as transações imobiliárias (Alberto GONZÁLEZ).
Não sendo constitutivo e estabelecendo apenas uma presunção iuris tantum o registo é um
instituto relativamente fraco. Por outro lado, quem o consultar e os dados nele publicitados a
respeito da situação jurídica dos prédios não tem a mínima obrigação de os pôr em dúvida ou
de fazer quaisquer diligências a seu respeito. E este facto significa uma grande vantagem para
quem participa no tráfego jurídico imobiliário.
Estão aliás, obrigatoriamente16 sujeitos a registo: (1) os factos referidos no artigo 2.º, n.º
1, alíneas a) – z), e (2) as ações, decisões, etc. que constam do artigo 3.º
16
Por força do princípio da obrigatoriedade – instituído pelo decreto lei 116/2008, de 4 julho que aditou ao
código do registo predial os artigos 8-A a 8º-D, que alteraram o anterior sistema de registo facultativo.
Neste contexto devemos distinguir, com cuidado:
(1) Uma coisa são os factos sujeitos a registo, constituídos com base no direito material
(substantivo) donde nasceram (por exemplo, a compra de um prédio)
(2) Uma outra são os atos do registo, efetuados com base no direito registal (adjetivo), que
dão a publicidade aqueles factos (por exemplo, o registar desta compra).
Os diversos atos do registo, poderão ser agrupados conforme em dois critérios: Seu conteúdo
(1) e eficácia (2)
Sua finalidade, é a identificação física, económica e fiscal dos prédios (nos termos do Art.
79º nº 1)
É efetuada uma descrição diferente para cada prédio (79º nº2). Isto até em respeito ao princípio
da especialidade dos direitos reais!
O artigo 82º do mesmo diploma refere o conteúdo exato que deve conter cada descrição
Existem dois tipos de descrições! Genéricas
Subordinadas
B) Inscrições
As inscrições, tem por função, definir a situação jurídica do prédio, mediante o extrato dos
factos a ele referente (nos termos do artigo 91º nº1 do código de registo predial)
São apenas as inscrições, uma vez que são elas que definem a situação jurídica do bem, que
gozam da tal FÉ PÚBLICA do registo!
Os seus requisitos gerais, encontram-se previstos no Artigo 93º do código de registo predial!
17
Ver a este respeito o acórdão de unificação de jurisprudência [em Anexo a este Sumário; a matéria de facto não
interessa no contexto das nossas aulas; interessa sim a fundamentação de direito com cuja conclusão
concordamos, embora ela pudesse ter sido formulada com mais clareza: Verificando-se uma dupla descrição, total
ou parcial, do mesmo prédio, ninguém poderá invocar a seu favor a presunção que resulta do artigo 7.º do Código
do Registo Predial até, com a aplicação exclusiva dos princípios e das regras do direito substantivo, ter sido
provada em relação a uma delas a existência do direito inscrito, a não ser que se demostre a má fé de quem invoca
uma das presunções.
O Artigo 94º, obriga ainda que dela constem cláusulas e convenções acessórias
O Artigo 95º estabelece menções especiais que deverão constar de certas inscrições
-No caso das inscrições, os averbamentos – previstos nos artigos 100º e ss do código do
registo predial - poderão servir para as completar, atualizar ou restringir!
Relativamente a sua eficácia, os atos de registo poderão ser definitivos ou então provisórios!
Os registos definitivos, são todos aqueles que produzem plenamente a sua eficácia, sem
qualquer limitação de vigência!
Processo de registo
B) O Pedido
O processo de registo se inicia com o pedido de registo, regulado nos artigos 41º e seguintes
do código do registo predial.
Nos termos do Artigo 41º-B do mesmo diploma, o pedido de registo poderá ser efetuado
pessoalmente, por via eletrónica ou pelo correio, devendo em qualquer um dos casos, conter
os elementos referidos no Art. 42º do código do registo predial.
Na prática negocial, e estando em causa um imóvel, o registo é pedido por via eletrónica logo a
seguir à celebração do negócio (artigos 41.º e 41.º-B), acompanhado pelo envio dos factos
titulados (artigo 42.º), pelas entidades responsáveis pela titulação (notário ou solicitador [este
no caso de um documento particular autenticado]).
Os requisitos do pedido de registo, estão previstos, conforme a sua modalidade, nos Arts. 41º-
C à 41º-E e 42º-A, estando esta matéria disciplinada conjuntamente na portaria 621/2008, de
18 de julho.
Efeitos do Registo
A) A fé Pública
Como se sabe, nos termos do Art. 1º, o registo predial é destinado, essencialmente a dar
publicidade a situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico
imobiliário.
Disto resulta a fé pública do registo: O registo feito, deverá estar em conformidade, deverá ser
correspondente à situação jurídica substantiva do bem! Permitindo assim, dar a conhecer essa
situação jurídica, permitindo que as outras pessoas, que o tráfico jurídico possa confiar!
Outro dos mais importantes efeitos do registo, é a atribuição de uma presunção da titularidade
do direito!
Esta mesma presunção materializa-se em duas premissas:
Esta presunção – e suas materializações – são ilidíveis mediante prova em contrário (ou seja,
são presunções iuris tantun”) – isto nos termos do artigo 350º nº 2º do código civil e Arts. 3ºnº1
alínea b) 8º inferindo-se “a contrario” e 13º do código do registo predial
Beneficia desta presunção não apenas o titular do direito inscrito, mas também, o sujeito que
tenha adquirido o direito por negócio de transmissão.
C) Registo consolidativo
O registo igualmente consolida uma importante posição jurídica! Uma posição do adquirente do
bem, relativamente a terceiros!
Já que – segundo o Art. 5º do código do registo predial – é determinado que os factos sujeitos
a registo, apenas produzirão efeitos erga omnes após a data do seu respetivo registo!
Ora com isto, sabe-se que efetuado o respetivo registo, o adquirente poderá opor
valida/eficazmente seu direito a terceiros – o direito ganha eficácia erga omnes! O que antes,
era-lhe certamente vedado!
Mas o que são os terceiros para efeitos do registo – a que se refere o Art. 5º do código do
registo predial? Como devemos definir?
Não é uma definição fácil. Gera bastante controvérsia na doutrina, e dum modo geral, são
adotadas duas conceções acerca: Uma conceção ampla e uma restrita.
A conceção restrita, no entanto, acabou por se adotada, estando inclusivamente consagrada no
Artigo 5º nº 4 do código do registo predial.
D) Registo Enunciativo
Há certos casos, em que o registo não atribui qualquer eficácia consolidativa ao direito
D.6 Princípio da prevalência/preferência? (Prof. Doutor Menezes Leitão considera como uma
característica! Diferentemente do Prof. Doutor Horster!)
O princípio da prevalência (regra: prior tempore potior iure) não se encontra positivado na lei,
nem mesmo de forma implícita, no direito das coisas (Livro III CCiv) que ignora a figura.
O CC regula a prevalência, mas não no direito das coisas! Regula no contexto sistemático
do direito das obrigações em geral, precisamente no artigo 407.º, que estabelece uma regra
de prevalência limitada a DIREITOS PESSOAIS DE GOZO!
A figura dos Direitos Pessoais de Gozo, aparece, por influência de um autor italiano
(Giorgianni) fora que, no Código Civil, para além da referência genérica constante dos
artigos 407.º e 574.º do CC, não se encontra qualquer outra qualificação de figuras
integrando Direitos Pessoais de Gozo!
São figuras que possibilitam ao seu titular, com vista a satisfação de seu interesse,
o gozo temporário, (Uso/fruição) autónomo e direto de determinada coisa18, o qual,
porém, diversamente do que sucede com os Direitos Reais de Gozo, têm SEMPRE por
fundamento uma relação obrigacional, de que NUNCA SE DESPRENDEM! Não é
fácil sua definição!
Os direitos pessoais de gozo são atualmente concebidos, cada vez mais, COMO UM
“TERTIUM GENUS” entre as duas categorias principais de direitos subjetivos privados
(direitos de crédito/direitos reais)
Poder de gozo, porém, tem por base ou fundamento uma relação obrigacional, da qual
nunca se desprende.
O locatário, assim como o comodatário, têm um direito que lhes permita gozar a coisa (Direito
pessoal de gozo) beneficiando de um amplo uso e, nalguns casos, também de fruição, tal qual
um titular de Direito Real de Gozo!
Em todo caso, a circunstância do locatário, do comodatário e de qualquer titular de direito
pessoal de gozo poder realizar o aproveitamento da coisa, usando-a e eventualmente
adquirindo os frutos dela, não deve gerar dúvidas quanto a natureza destes direitos (são
direitos pessoais de gozo/não são direitos reais!)!
O artigo 407.º (incompatibilidade entre direitos pessoais de gozo) determina: “Quando, por
contratos sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, mas sobre a mesma
coisa, direitos pessoais de gozo incompatíveis entre si, PREVALECE o direito mais antigo
em data (o advindo do primeiro contrato), sem prejuízo das regras do registo!”
Desta forma, a aplicação do artigo 407.º PRESSUPÕE CUMULATIVAMENTE:
(1) a celebração de contratos (negócios) sucessivos válidos de que resultam
(2) direitos obrigacionais válidos que permitem o gozo, isto é, a utilização de uma coisa
(3), com conteúdos incompatíveis entre si, e determina
(4) o princípio da prevalência do direito constituído em primeiro lugar (prior tempore potior iure),
ou seja, é a obrigação mais antiga em data que prevalece e deve ser cumprida, mas sem
prejuízo das regras próprias do registo. E, na verdade, as regras do registo estabelecem
prioridades diferentes na medida em que prevalece não o direito mais antigo em data, mas o
direito que for inscrito em primeiro lugar no registo, isto é, no registo predial (ver artigo 6.º, n.º
1, CRegPred) e este direito pode não ser o mais antigo em data!
Não tendo sido preenchidos quaisquer destes elementos, o Art. 407º do código não poderá se
aplicar! São CUMULATIVOS!20
Mas e se não estivermos perante direitos pessoais de gozo, e ainda estivermos perante
situações de prevalência?
19
No âmbito dos direitos reais temos : PROPRIEDADE (Direito real máximo) = é uso + fruição + disposição;
DIREITOS REAIS LIMITADOS, (1) superfície = uso + fruição e parte da disposição; (2) usufruto = uso + fruição;
(3) uso = apenas uso (4) habitação = mini-uso.
20
O regime do 407, é um regime especial! Há pressupostos para sua aplicação! É diferente do regime geral da
colisão de direitos do 335º.
Como se sabe, não sendo preenchidos quaisquer dos requisitos, o Art. 407º não é aplicável!
Então desde logo, a não existência de direito pessoal de gozo leva a inaplicabilidade.
Em situações destas, será mediante o cumprimento de um, entre os vários contratos
sucessivos que se acabará por estabelecer uma prevalência!
Assim, por exemplo, entre sucessivos contratos referentes a prestações infungíveis (Violinista
renomado, tem compromissos de dar um concerto de violino à mesma hora em três lugares
diferentes ou o Sr, A compromete-se a casar com duas noivas) PREVALECE O CONTRATO
QUE O DEVEDOR RESOLVER CUMPRIR!21
Ainda, noutro exemplo: Entre sucessivos contratos-promessa de vender um terreno, prevalece
o contrato-promessa que o promitente vendedor resolve cumprir em primeiro lugar ou então o
contrato promessa em que um promitente comprador perante a inércia do promitente vendedor
para celebrar o contrato de compra e venda prometido avança para a execução específica
(artigo 830.º CCiv), ficando os outros preteridos de modo que em relação a estes o vendedor
promitente responde por incumprimento!
Em todo o caso, para dirimir um conflito entre direitos obrigacionais entre si, de acordo com o
princípio da prevalência, É SEMPRE ESSENCIAL QUE SE TRATE DE DIREITOS
VALIDAMENTE CONSTITUÍDOS!
Direitos que não existam por não terem sido validamente constituídos, não podem colidir com
outros. Por isso mesmo as regras da prevalência para direitos em conflito, estabelecidas nos
artigos 407.º CCiv e 6.º, n.º 1, CRegPred, não se podem aplicar havendo direitos obrigacionais
nulos ou anulados. Logicamente, quanto a estes (invalidamente constituídos), a questão da
prevalência não se põe.
Ao dizer qual é o direito em conflito que prevalece, a lei, por outro lado, nada diz
especificamente a respeito do direito preterido, não se pronuncia sobre o seu destino jurídico!
Aqui, é possível afirmar com alguma segurança que em todos os casos em que, por força da
prevalência, estamos perante a impossibilidade do cumprimento da obrigação, imputável ao
devedor, os direitos preteridos não se extinguem! Pelo contrário, as relações obrigacionais
ficam de fé, na medida exata em que o devedor faltoso, incorre em responsabilidade contratual
(artigo 798.º) como não pode deixar de ser.
No direito das coisas, no âmbito dos direitos reais, não existe qualquer regra de prevalência
correspondente ao artigo 407.º! Não tem qualquer sentido útil!
Isto porque, por força do princípio da compatibilidade dos direitos reais, uma eventual
constituição sucessiva e válida, de direitos reais com o mesmo conteúdo, sobre o mesmo bem,
a favor de pessoas diferentes é legalmente impossível! Lembremos:
21
incorrendo em incumprimento e responsabilidade contratual quanto aos outros!
Apenas poderá existir direito real sobre determinada coisa, que seja compatível com outro
direito que a tenha por objeto!
(1) Podem coexistir direitos reais, com conteúdos diferentes, sobre o mesmo objeto – coisa!
(Propriedade /usufruto/servidão predial)
(2) Mas não podem existir dois direitos reais, com o mesmo conteúdo, sobre o mesmo
objeto! Estas situações, são legalmente impossíveis! A constituição posterior de um
direito real com conteúdo idêntico, é nula. Este princípio encontra a sua consagração
nos artigos 892.º, 939.º e 956.º, n.º 1.
Ora, deste modo, de maneira válida, não se pode constituir posteriormente direitos que entrem
em conflito com um direito real idêntico anteriormente constituído.22/23
Dos direitos reais posteriores, resulta um “não-direito” para o “adquirente! Não há assim,
logicamente, em bom rigor, um direito real que possa prevalecer sobre outro! O que há é
tão só o primeiro direito validamente constituído!
Mas tal como o artigo 407.º fez uma ressalva a respeito das regras do registo, também no caso
dos direitos reais esta ressalva deve ser feita!
Sucede que, por força das regras do registo – predial essencialmente - em casos de direitos
reais posteriores e estando em causa um bem sujeito a registo, um direito real posteriormente
adquirido – não obstante a sua nulidade – poderá prevalecer sobre o direito anterior
validamente constituído (artigo 6.º, n.º 1, CRegPred)!
NOTA FUNDAMENTAL - Mas neste caso, o direito real preterido, o constituído anteriormente
por um contrato válido, ficará extinto devido ao princípio da compatibilidade! – Não poderem
coexistir direitos reais com mesmo conteúdo!
Prevalece o direito posterior tal como é definido pelo contrato nulo que veio a ser registado em
primeiro lugar.
NOTA: Quando os direitos reais são compatíveis entre si por terem conteúdos diferentes,
sendo sob este aspeto válidos e havendo entre eles uma coexistência, haverá uma prioridade
22
Encontramos uma situação semelhante também no caso da cessão da posição contratual (artigos 424.º
- 427.º CC), em que estamos perante uma atribuição patrimonial, mas já não nos casos da cessão de
créditos (artigos 577.º - 588.º). Quanto a estes últimos, tendo havido uma cessão de créditos a favor de
várias pessoas, o artigo 584.º estabelece um regime de prevalência.
23
Também nos contratos reais, onde o consenso não é suficiente para a sua conclusão, mas é necessária
a entrega da coisa (comodato [artigo 1129.º], mútuo [artigo 1142.º] e depósito [artigo 1185.º]), o artigo
407.º não parece aplicável porque não pode haver duplas entregas e, com isso, contratos sucessivos a
favor de pessoas diferentes.
ou uma graduação, em conformidade com a data da sua constituição o que sucede
precisamente no caso dos direitos reais de garantia regulados no direito das obrigações.
Não haverá prevalência quando sobre a mesma coisa, incidem direitos de natureza
diferente!
por exemplo: direitos obrigacionais e direitos reais! (o direito obrigacional/de crédito do
comprador de uma colheita enquanto coisa futura versus o direito real do comprador da mesma
propriedade adquirida antes da colheita; o direito obrigacional (=pessoal de gozo) do inquilino
versus o direito real de quem adquiriu a propriedade do prédio arrendado). Aqui os direitos em
causa, válidos, são de diferentes categorias/estão em diferentes níveis.
E) Objeto dos direitos Reais: Coisas corpóreas + Animais
O objeto dos direitos reais são as coisas! E desde logo saber, o que são coisas, sem sentido
jurídico?
Ora, num sentido mais corrente e amplo (1) (e de certo modo filosófico): Entende-se coisa,
tudo o que pode ser pensado, ainda que não tenha existência real.
Num sentido físico (2) (relativo a matéria em si, tangível), entende-se por coisa tudo o que tem
existência corpórea, “quod tangi potest”(que pode ser tocado), ou que pelo menos pode ser
captado pelos sentidos.
Num sentido especificadamente jurídico24 (3), é preciso ir ao artigo 202º nº1 do código civil,
onde há a definição, um tanto polêmica:
24
Sobre a noção jurídica de coisa, Pinto Monteiro considera sabida as críticas ao Art. 202ª 1, que são os “entes de
caráter estático desprovidos de personalidade e não integradores do conteúdo necessário desta, suscetíveis de
constituírem objeto de relações jurídicas. Considera ainda que estes mesmos entes, apenas serão coisas em S.J
quando puderem ser objeto de R.J, e para isto ocorrer, deverão reunir três requisitos:
-Existência autónoma/separada (uma casa é uma coisa, não o sendo um tijolo que a integra)
- Possibilidade de apropriação exclusiva por alguém (não serão coisas tudo aquilo que escapa ao domínio do ser
humano)
Como já se sabe – da própria teoria geral do direito civil – esta não é uma definição muito
adequada! Pode-se tanto criticá-la por ser uma definição muito ampla, como por ser uma
definição muito restrita. E isto com que fundamentos?
- MUITO AMPLA/VASTA, pois já é facto que, nem tudo que é suscetível de ser objeto de
relações jurídicas, são coisas! (Objeto de relações jurídicas também, as pessoas outras,
pessoas próprias, direitos subjetivos, prestações etc
-MUITO RESTRITA, uma vez que não deixam de constituir coisas, algumas realidades que
não podem ser objeto de relações jurídicas! (veja-se o artigo 202 nº 2 do código civil –
coisas fora do comércio jurídico – que não podem ser objeto de direitos privados, que estão no
domínio público (84º CRP) e as que são, por natureza, insuscetíveis de apropriação individual)
Significa isto que as coisas referidas no nº 1 do Art. 202º, apenas poderão ser as que
correspondam aos negócios do comércio (tráfico) jurídico, ou seja, aos negócios por meio
dos quais transmitem-se direitos e obrigações que incidem sobre estas coisas!
Mas e quanto as coisas fora do comércio jurídico? – todas aquelas que não podem ser
objeto de direitos privados?
25
É uma noção que expressa um certo “imobilismo legislativo” uma “arqueologia” que traduz uma visão
idilicamente ruralista”. Mesmo sendo maioritariamente criticada, este artigo ainda possui defensores – embora
com algumas pequenas reservas!
Estas são referidas no artigo 202º nº 2 do código civil – diploma que não lhes regula! Apesar de
que lhes é aplicável, de forma subsidiária o regime dos direitos reais em tudo o que não
contrarie sua natureza (1304º)
São ainda conceitualmente coisas! Embora não sejam coisas em sentido jurídico! E o
quais são afinal as coisas que não podem ser objeto de direitos privados?
(1) Bens Pertencentes ao domínio Público – Pertencem todas as coisas que são objeto de
relações jurídico-públicas – são objeto de direitos públicos! Estas coisas em específico,
são da propriedade do estado ou de outras pessoas coletivas de direito público.
NOTA: Sobre o estado e as demais P.C.Ps de direito público. Estas possuem, para além dos
bens do domínio público26, coisas de natureza privada:
Como bem se sabe, tanto o estado como as P.C.Ps de direito público podem participar, “na sua
veste civil ou particular” no tráfico jurídico privado! Ora, as coisas de que aquelas entidades se
servem para o efeito ou que adquirem na ocasião, estão sujeitas as regras do direito privado.
*Para efeitos do Inventário geral do património do estado 27 – Decreto-lei nº 477/80, de 15 de
outubro
-Realiza a distinção entre o domínio público (Artgs. 3º, 4º e 7º nº 1) domínio privado (Artigos 3º,
5º e 7º nº2 e 3) e património financeiro (Artigos 3º e 6º)
26
Para que um bem passe a pertencer ao domínio público, é necessário a prática de um ato específico: Uma
AFETAÇÃO! (Que pode revestir forma de lei (Artigo 84º da CRP), um ato administrativo, uso imemorial). No
entanto, logo que a coisa seja, de acordo com as circunstâncias, desafetada do domínio público (expressa/ou
tacitamente) poderá ingressar (ou re-ingressar, se for o caso disto) nas coisas dentro do comércio jurídico referidas
no Art. 202º nº1.
27
O Cadastro e Inventario Geral dos Bens do Património do Estado compreende os bens direitos e obrigações de
que o Estado é titular como pessoa coletiva de direito público qualquer que seja a sua natureza dominial ou
patrimonial, a forma de aquisição ou o organismo que a haja realizado, tendo como objetivos:
-Possibilitar o conhecimento da composição dos bens do domínio público e do domínio privado do Estado quanto a
sua natureza consistência valor e afetação;
-Contribuir para a administração eficiente dos bens do Estado possibilitando a racionalização da sua utilização e
fiscalização sistemática;
-Compilar os elementos necessários a definição de políticas de investimento mediante a efetivação de uma correta
amortização dos bens duradouros e dos bens de capital do estado e possibilitar a respetiva reavaliação;
-Apoiar a estatística nacional;
-Possibilitar a elaboração da conta geral de variações patrimoniais e do balanço do Estado.
O inventário geral compreende o domínio público, o domínio privado e o património financeiro do Estado.
(2) Terrenos Baldios (“Terrenos com suas partes e equipamentos integrantes, possuídos e
geridos por comunidades locais) – tal como resulta do Art. 6º, nº 3 e 4 da lei nº 75/2017
de 17 de agosto
(3) Coisas que pela sua própria natureza, são insuscetíveis de apropriação individual – tal
como as nuvens, gotas de chuva, o cadáver de uma pessoa. Estas mantém seu caráter
conceitual de coisa, embora não tenha o significado jurídico! São diferentes também
dos fenómenos, que nem se quer são coisas em sentido conceitual!
NOTA: As coisas fora do comércio jurídico, referidas no Art. 202º nº 2 do código civil, não vem
reguladas neste mesmo diploma, quer seja pelo fato de pertencerem ao domínio público, quer
por existir legislação especial – como no caso dos terrenos baldios. Legislação especial
existirá também, no caso específico das coisas incorpóreas (Art. 1303º nº1) e ainda sobre os
animais!
E.1 Classificação das várias coisas? “In commerciun” - Art. 202 nº1/ 203 e ss
Se temos, por um lado, a noção jurídica de coisa no Art. 202º, a classificação destas resulta
dos artigos seguintes: 203º a 211º, sendo respetivamente:
-Corpóreas/Incorpóreas*
-Fora do comércio/dentro dele*
-Coisas imóveis /móveis
-Simples /Compostas
-Fungíveis/ou não fungíveis
-Consumíveis/Não consumíveis
-Divisíveis/ Indivisíveis
-Principais/Acessórias
-Presentes/Futuras
Em toda a classificação das coisas, a mais importante que nos aparece, respeita a distinção de
coisas corpóreas e incorpóreas!28. O código civil inclui, ainda que de forma implícita, esta
classificação – coisas corpóreas/incorpóreas – incluindo também as prestações e os direitos
que podem ser objeto de direitos subjetivos, desde que, seja logicamente possível!
-CORPÓREAS, são todas as coisas que existem no mundo natural, tendo por
consequência, existência física, independentemente de revestirem a natureza de matéria
(terrenos, edifícios, objetos etc) de energia! (São todas suas variações previstas no Art. 203º)
-INCORPÓREAS, são todas aquelas que possuem mera existência social, entre elas se
incluindo os bens do intelecto humano (obras de arte, literárias, invenções, marcas).
“nº1 – Somente as coisas corpóreas, móveis ou imóveis, podem ser objeto do direito de
propriedade regulado no código civil!
28
Classificação que deve-se a Gaius, que se socorreu do critério de serem ou não apreensíveis pelos sentidos. Mais
atualmente, este critério não deve ser adotado, já que existem muitas coisas, tal como a eletricidade e os gases
por exemplo, que ainda que não apreensíveis pelos sentidos, possuem existência física!
Nº2 - Aplica-se a aquelas – coisas incorpóreas – o regime do direito das coisas em tudo que se
harmonize com a sua natureza. Direito das reais é objeto de aplicação subsidiária
relativamente as coisas incorpóreas
Muito limitado! Grande parte dos institutos relativos aos direitos reais, tal como a posse, a
ocupação, a acessão, usucapião, a tradição e a aquisição tabular, são de aplicação quase
inconcebível fora do âmbito das coisas corpóreas!
Resulta do exposto que – Somente as coisas corpóreas/mais os animais, como se verá, podem
ser objeto de direitos reais, sendo os outros bens objetos de direitos de natureza diferente.
Ao longo dos séculos a doutrina tem elaborado várias classificações de coisas corpóreas! No
Art. 202º nº 2, como mesmo já se viu, encontra-se outra classificação – analisada da perspetiva
do comércio jurídico – coisas do comércio e coisas fora dele.
Em seguida dos Arts. 203 até o 211, são realizadas as restantes classificações das coisas
corpóreas!
Dentro da classificação de coisas corpóreas, esta reveste especial importância, talvez seja a de
maior relevância!
Relevância Genérica?
-Para delimitação da competência dos órgãos de sociedades (Artº 246º n2 do código das
sociedades comerciais)
-Existem muitos direitos reais que apenas tem por objeto coisas imóveis como é o caso da
propriedade horizontal (Art. 1414º), direito de habitação (Art. 1484º nº2), superfície (Art. 1524º),
as servidões prediais (Art. 1543º) etc
Outros direitos reais que apenas tem por objeto coisas móveis, como o penhor de coisas (Art.
666º nº 1)
Outros, apenas podem ter por objeto as coisas imóveis, ou as coisas móveis sujeitas a registo,
como sucede na consignação de rendimentos (656º n1), na hipoteca (Art. 686º n1) na
promessa real (Art. 413º) e na preferência real (Art. 421)
29
Ainda que existam direitos reais que possam habitualmente abranger indistintamente móveis e imóveis!
Alguns regimes de aquisição, como o da ocupação, apenas vigora para as coisas móveis (Art.
1318º e 1345º), enquanto que outros, como o da acessão natural, é privativo das coisas
imóveis.
Na usucapião! Os prazos de aquisição são bem mais extensos nas coisas imóveis (Art.1293º)
do que nas coisas móveis (Art. 1298º e ss)
O regime da acessão industrial, distingue-se também conforme estamos diante de uma coisa
móvel (Art. 1333) ou imóvel! (1339)
c) Publicidade
Os direitos reais sobre a mais importante categoria de coisas imóveis – prédios – são sujeitos a
publicidade registal (Art. 1º do Código do registo predial), que somente em alguns casos, vigora
para as coisas móveis (Art. 205 nº2)
1.1) Enumeração Legal
Dos termos do Art. 204º do código civil, temos por coisas imóveis:
No Art. 205º, analisando-se por exclusão o Artigo 204º, refere-se que são móveis, todas as
coisas não compreendidas na enumeração.
*O prof. Doutor Menezes Leitão/e prof. Horster, compreendem que, é manifesto o caráter
taxativo da enumeração em causa! Esta não vai abranger coisas fora do comércio e nem
prejudicar a existência de direitos autónomos sobre partes dos prédios.
*A classificação de coisas móveis/Imóveis do artigo 204º/205º, refere-se apenas a categorias
de “res in commercium”- coisas dentro do comércio jurídico
Relativamente a estas, a classificação do 204º não exclui a possibilidade de partes de
prédios, serem objeto autónomo de direitos (Em regra as partes de prédios são
integrantes, não tem autonomia!), sem que tal implique as mesmas sejam aditadas à
enumeração das coisas imóveis, sendo, no entanto, sua natureza imobiliária manifesta,
dado que constituem partes destas. (É o caso das estradas, frações autónomas de prédios
urbanos, minas etc)
O art. 204º nº 2 dispõe: Entende-se por prédio rústico (1) uma parte delimitada do solo e as
construções nele existentes que não tenham autonomia económica, e por prédio urbano (2)
qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro.
30
Para qualificar uma coisa como imóvel, é sempre decisiva a sua incorporação no solo!
31
Atenção! Prédios a partir de agora, nunca mais pode ser considerado somente como a construção que
conhecemos!
32
E ainda teríamos aqui os prédios mistos – não muito relevantes aqui neste contexto, mais importantes para
efeitos do IMI
E retirar o desnecessário...
-Construções que não constituam edifícios, como cercas, muros, colunas etc, não
correspondem a prédios urbanos!
-Exigência de incorporação no solo! Face a ela não parece constituir prédios urbanos os
edifícios e casas desmontáveis.
Sendo de notar….
Os terrenos que servem de logradouro 33, jardim, pátio etc, a um prédio urbano, fazem parte do
mesmo, uma vez que, colaboram em sua função!
Da mesma forma, eventuais construções existentes num prédio rústico, que estejam
subordinadas a sua finalidade económica, tal como os abrigos, adegas, celeiros ou
armazéns, destinados a recolher trabalhadores, bem como o gado, alfaias ou produtos
agrícolas, tem igualmente natureza rústica!
-PARTES COMPONENTES/INTEGRANTES DOS PRÉDIOS RÚSTICOS E URBANOS 34
O Artigo 204º nº 3 nos fornece uma definição (definição legal) – É parte integrante toda coisa
móvel, ligada materialmente ao prédio, com caráter de permanência!
São assim, coisas móveis que acabaram perdendo a sua autonomia, em virtude da
incorporação numa coisa imóvel! Partilham o mesmo destino jurídico!
Incorporação esta que, tendo caráter permanente e não meramente transitório, levará a coisa a
perder sua individualidade, passando a fazer parte do imóvel, e adquirindo, por consequência,
a natureza imobiliária!
33
Logradouro significa aquilo que pode ser logrado, usufruído ou desfrutado por alguém
34
FUNDAMENTAL SABER A DIFERENÇA! Não confundem-se com as coisas acessórias (ligação económica/funcional
– não partilham mesmo destino jurídico da coisa principal) - 210º nem com as coisas componentes (Aquando
inseridas na coisa, constituída por elas, deixam de ter qualquer individualização)
Embora habitualmente elas sejam partes componentes/integrantes de prédios rústicos,
assim como a terra e as pedras, a verdade é que, ela poderá ser desintegrada da propriedade
destes, adquirindo autonomia enquanto objeto de direitos reais! (Caso em que, por mais que
ainda constituíssem bens imóveis, não seriam mais prédios, e por isto, a lei sentiu-se na
necessidade de inclui-las expressamente na categoria dos bens imóveis).
Relativamente as águas, a lei uma grande distinção: Águas públicas (1) e Águas particulares
(2)
E AINDA:
DECRETO-LEI 97/2008, de 11 de junho (já fora alterado), que fixa o regime económico e
financeiro dos recursos hídricos
POR FIM:
35
Que já foi muitas vezes alterada!
DECRETO-LEI 100/2008, de 16 de junho, que definiu os regimes de utilização e reafectação do
domínio público hídrico e de certos bens do domínio público marítimo.
Por força do Artigo 1386º nº 1, acrescido do Artigo 1387º nº1, temos sabido quais situações
compreendem águas particulares!
1386º
Nº 1. São particulares:
a) As águas que nascerem em prédio particular e as pluviais que nele caírem, enquanto não
transpuserem, abandonadas, os limites do mesmo prédio ou daquele para onde o dono dele as
tiver conduzido, e ainda as que, ultrapassando esses limites e correndo por prédios
particulares, forem consumidas antes de se lançarem no mar ou em outra água pública;
b) As águas subterrâneas existentes em prédios particulares;
c) Os lagos e lagoas existentes dentro de um prédio particular, quando não sejam alimentados
por corrente pública;
d) As águas originariamente públicas que tenham entrado no domínio privado até 21 de março
de 1868, por preocupação, doação régia ou concessão;
e) As águas públicas concedidas perpetuamente para regas ou melhoramentos agrícolas;
f) As águas subterrâneas existentes em terrenos públicos, municipais ou de freguesia,
exploradas mediante licença e destinadas a regas ou melhoramentos agrícolas.
Nº 2. Não estando fixado o volume das águas referidas nas alíneas d), e) e f) do número
anterior, entender-se-á que há direito apenas ao caudal necessário para o fim a que as
mesmas se destinam.
Nestas alíneas, D); E) e F), tratam-se de águas originalmente públicas que constituíram objeto
de atos de concessão ou licença a privados.
Segundo o nº 2 deste mesmo artigo, se o ato referido não fixar o volume de água, deverá se
entender que há apenas o direito ao caudal36 necessário para o fim a que elas se destinam.
Além disto, estas mesmas águas são inseparáveis dos prédios a que se destinam e o direito
sobre elas caduca, revertendo-as em águas do domínio público, no caso de serem
abandonadas ou de não se fizer com elas um uso proveitoso correspondente ao fim a que
eram destinadas ou para que foram concedidas (Como refere o artigo 1397º).
1387
Nº 1. São ainda particulares:
a) Os poços, galerias, canais, levadas, aquedutos, reservatórios, albufeiras e demais obras
destinadas à captação, derivação ou armazenamento de águas públicas ou particulares;
b) O leito ou álveo das correntes não navegáveis nem flutuáveis que atravessam terrenos
particulares.
Nº 2. Entende-se por leito ou álveo a porção do terreno que a água cobre sem transbordar para
o solo natural, habitualmente enxuto.
Nº 3. Quando a corrente passa entre dois prédios, pertence a cada proprietário o trato
compreendido entre a linha marginal e a linha média do leito ou álveo, sem prejuízo do disposto
nos artigos 1328.º e seguintes.
Nº 4. As faces ou rampas e os capelos dos cômoros, valados, tapadas, muros de terra,
alvenaria ou enrocamentos erguidos sobre a superfície natural do solo marginal não pertencem
ao leito ou álveo da corrente, mas fazem parte da margem.
São ainda consideradas coisas imóveis, nos termos da alínea c) do artigo 204º, as árvores,
arbustos e frutos naturais enquanto estiverem ligados ao solo. A natureza imobiliária destas
coisas vai depender, obviamente, da sua ligação material ao solo! A partir do momento em que
cessa a ligação, serão coisas móveis!
O Artº 204º faz referência ainda aos direitos inerentes aos imóveis!37
36
volume de água que passa durante uma unidade de tempo numa dada secção de um rio e que se mede em
metros cúbicos por segundo
37
Menezes Leitão considera uma formulação manifestamente errada, já que direitos inerentes aos imóveis dá a
entender que os direitos são objeto dos imóveis! Mas é o contrário.
A sua qualificação, enquanto uma coisa imóvel, deriva do conceito extremamente amplo de
coisa fixado no Art. 202º!
Desta norma resulta apenas a sujeição ao regime das coisas imóveis, de todos os direitos reais
menores, respeitantes aos imóveis (Direitos reais de gozo/limitados – temos o usufruto, o uso,
a habitação, enfiteuse (já abolida) superfície, as servidões etc)
Por exclusão, o art. 205º do código civil nos diz que constituem coisas móveis, todas as que
não se encontrem compreendidas na enumeração taxativa do Art. 204º.
38
Referência ao Decreto-lei 277/95, de 25 de outubro – Aprovou o código do registo de bens móveis! Atualmente
não está mais em vigor! É difícil reunir num só diploma, o regime de registo de todos os bens móveis, que possuem
-Finalmente também possui natureza mobiliária as coisas representativas de valor, como por
exemplo, o dinheiro40, os títulos de crédito, os cartões de débito ou crédito etc
Nosso legislador no âmbito das coisas móveis, ainda teve a cautela de especificar no código
que as coisas móveis sujeitas a registo público são sujeitas ao regime das coisas móveis em
tudo o que não esteja especialmente regulado!
*Assim, as coisas móveis sujeitas a registo apenas afastar-se-ão das móveis ditas “comuns”,
relativamente a questão da publicidade: Em vez de dada pela posse é regulamentada pelo
registo!
suas particularidades!
39
O registo de bens móveis tem por fim dar publicidade à situação jurídica desses bens, com vista à segurança do
comércio jurídico!
40
A qualificação do dinheiro (Equivalente a um meio de pagamento) como coisa móvel, é muito duvidosa; notas e
moedas são coisas fungíveis;
41
Deixaram de existir
42
Deixaram de existir
43
Existem ainda
Idade média?
-Esta categoria – coisas compostas “EX DISTANTIBUS” - veio a ser alterada pelo conceito de
UNIVERSALIDADE! (“universitas”)
-COISAS SIMPLES45: Todas as coisas que não se podem decompor em outras, sob pena de
perderem sua identidade!
-COISAS COMPOSTAS: Coisas que resultam da união/junção de outras coisas simples (que
possuem identidade própria) mas que em virtude desta junção passam a ser consideradas
PARTES COMPONENTES!
Exemplos: Carros ou aviões! Incluem na sua estrutura, portas, vidros, motores, pneus, etc.
a) Coisas Fungíveis (Art. 207 letra) - São fungíveis as coisas que se determinam pelo seu
GÉNERO QUALIDADE46 E QUANTIDADE, quando constituam objeto de relações
jurídicas.
As coisas fungíveis são aquelas que se determinam de acordo com um critério genérico,
numérico, de conta, peso, medida etc, X quilos de batatas; tantos euros... são coisas fungíveis,
não são determinadas individualmente. Determinam-se pelo seu género, quantia e qualidade.
45
Coisas simples que podem ainda ter partes acessórias! Art. 210º nº1
46
Qualidade em relação a produtos e/ou serviços, há várias definições para qualidade, como o produto estar em
conformidade com as exigências dos clientes, ter valor agregado, algo que produtos similares não possuem,
relação custo/benefício etc.
Ainda relativamente a qualidade. Muitos dizem colocam-na como as características de um produto ou serviço que
satisfazem necessidades declaradas ou implícitas [Juran - Adequação ao uso];
b) Coisas infungíveis, por seu turno, são todas aquelas que estão
individualmente/especialmente determinadas.
Coisas infungíveis são aquelas que pelo contrário se determinam pelas suas características
específicas, vg um quadro é "daquele" pintor e não de "outro".
Por exemplo: tantos lotes de terreno no sítio X; num concurso em que os candidatos se
candidatam a um apartamento num bloco de apartamento, sem saber qual lhes vai calhar
NOTA++: É uma distinção que em hipótese alguma poderá ser confundida com outra
contraposição semelhante, feita no âmbito do direito das obrigações: Prestações fungíveis e
infungíveis! (oque não impede o seu relacionamento!)
Classificação constante do Art. 208º (Na letra) - SÃO CONSUMÍVEIS47 as coisas CUJO USO
REGULAR (critério fundamental!) importa a sua destruição ou a sua alienação.
Todas as outras coisas que não venha a revestir estas características, dão-se por NÃO
CONSUMÍVEIS!
NOTA: Deve-se atender nesta classificação, à sua relatividade: aquela garrafa de vinho da
coleção é um bem consumível, mas para aquele colecionador não é.
Classificação constante do Art. 209º do código civil (na letra) - São divisíveis as coisas que
podem ser fracionadas sem alteração da sua substância (critério substancial), diminuição de
valor (Critério económico) ou prejuízo para o uso a que se destinam (Critério funcional).
Interpretando “A contrario” esta mesma disposição, tem-se concluído que todas as outras
coisas que não podem ser fracionadas, sem que isto acarrete uma alteração da substância,
diminuição no seu valor ou prejuízo para o uso a que se destinam, são dadas por coisas
indivisíveis.
Importante é salientar que em casos de dúvida, o critério mais relevante é o critério do
valor! Se uma coisa perde o seu valor quando é dividida, não deve ser considerada uma coisa
divisível;
as bibliotecas por exemplo, que são também uma universalidade de facto, é
materialmente/substancialmente divisível: se lhe retirar 10 livros ela permanece tal qual e
contínua a ser considerada uma biblioteca. Todavia, isso implica a um desvalor em termos
jurídicos. Ela perderá valor, então não poderá ser divisível.
NOTA: Para que uma coisa seja divisível é preciso o preenchimento de todos os requisitos.
Para que seja considerada indivisível, basta apenas um!
Exemplos:
Coisas divisíveis: Terrenos, edifícios – suscetíveis de divisão em frações autónomas! (1414º e
ss)
Coisas indivisíveis: Árvores, plantas – já que sua divisão importa alteração de substância.
Livros e quadros, por importar diminuição de valor. Automóveis, televisões pelo facto da divisão
prejudicar seu uso
Artigo 210º nº 1º do código civil (na letra) - SÃO COISAS ACESSÓRIAS, OU PERTENÇAS, as
coisas móveis que, não constituindo partes integrantes48, estão afetadas/destinadas por forma
duradoura ao serviço ou ornamentação de uma outra coisa principal.
Classificação constante do Art. 211 do código civil - São coisas futuras as que não estão em
poder do disponente, ou a que este não tem direito, ao tempo da declaração negocial.
Assim conclui-se:
-COISAS FUTURAS – Todas aquelas que ainda não existem ao tempo do negócio
(Objetivamente futuras) ou que ainda não pertencem ao disponente (Subjetivamente futuras)!
*Dado a princípio da especialidade – e subprincípio da atualidade – para poder se constituir um
direito real, é necessário que a coisa – seu objeto – tenha existência presente! Daí que coisas
futuras, diferentemente do que sucede no direito das obrigações, não possam se objeto de
direitos reais.
-Coisas presentes – Todas aquelas que existam, ao tempo da declaração negocial e que
pertençam a um determinado titular!
Nossa lei estabelece, relativamente aos FRUTOS, como que um regime jurídico específico! A
saber:
Art. 213 nº1 /nº 2 Art. 214º Art. 215º nº 1 /nº2
Ainda realiza distinções entre diferentes categorias de FRUTOS. Art. 212º nº2 refere sobre os
frutos naturais e frutos civis:
-NATURAIS – todos aqueles que são provenientes diretamente da coisa, (212º nº2)
compreendendo:
a) Frutos orgânicos da coisa – Frutos das árvores, a erva, os ramos, as matas, e as próprias
árvores de corte,
b) Também os frutos inorgânicos, como minérios retirados de pedreiras e minas49
-CIVIS – Relativamente a estes, estão em causa as rendas e demais interesses que a coisa
produz, em virtude de uma relação jurídica. (212º nº2) abrangendo:
49
Em que neste último caso, até ocorre a destruição da substância, mas de forma lenta e em longos períodos, não
se podendo assim considerar que a mesma fique prejudicada.
É preciso ainda realizar a distinção entre FRUTOS A PRODUZIR (1), FRUTOS PENDENTES
(2), FRUTOS SEPARADOS (3), FRUTOS PERCEBIDOS (4) e FRUTOS PERCIPIENDOS (5).
-FRUTOS A PRODUZIR – Todos aqueles que podem ser produzidos pela coisa, num certo
lapso de tempo, correspondendo assim a coisas futuras!
-FRUTOS PENDENTES50 – Já foram produzidos pela coisa, mas não foram separados dela,
pelo que nela se integram. (204º alínea c))
-FRUTOS SEPARADOS – Todos aqueles que já se autonomizaram da coisa, quer por ação
humana quer por factos naturais.
-FRUTOS PERCEBIDOS – Todos os que foram separados da coisa, por ação humana,
subdividindo-se ainda aqui entre:
-FRUTOS PERCIPIENDOS – Todos aqueles que poderiam ter sido percebidos, mas não o
foram!
Todas estas distinções são importantes, porque é bem diferente vender um pomar sem maçãs
e outro com maças e, vendido um pomar tendo este maças, não se pode colher as maças no
dia antes da venda...
Nos termos do Artigo 216º nº2, ainda podem ser distinguidas benfeitorias necessárias,
benfeitorias úteis e benfeitorias voluntárias.
-Necessárias – As que tem por finalidade evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa
(como sejam, por exemplo, as obras de conservação ou de reparação, pagamento de encargos
a ela relativos – impostos/taxas etc)
-Úteis -Todas as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam,
todavia, o valor! (É o caso das obras de beneficiação, destinadas a valorizar o objeto ou a
aumentar seu rendimento)
-Voluntárias – Todas as que, não sendo indispensáveis para sua conservação e nem lhe
aumentando o valor, servem apenas para o recreio do benfeitorizante (Como sejam os
melhoramentos de luxo, pinturas, decorações, realizadas por motivos meramente estéticos!)
Além das coisas, que sem qualquer dúvida, constituem a maior e mais importante categoria de
objeto de direitos reais, podem ser objeto ainda os ANIMAIS!
No entanto, muitos foram os movimentos de proteção dos animais, que procuraram alterar este
estatuto seu estatuto no direito civil!
A este propósito, foram os Alemães percursores!51 Trouxeram um diploma que alterou o BGB,
autonomizando os animais relativamente às coisas e limitando os poderes do proprietário de
animais.
Posteriormente – Cerca de 27 anos depois – mas por clara influência Alemã, Austríaca e Suíça,
surgiu em nosso país a LEI 8/2017 DE 3 DE MARÇO, que veio alterar o código civil,
procedendo igualmente a autonomização dos animais relativamente as coisas!
51
gesetz zur verbesserung rechtsstellung des tieres im bürgerlichen recht - lei para melhorar o estatuto jurídico dos
animais no direito civil
Com esta lei…
- Foi aditado ao código civil, um subtítulo I-A para a parte geral– DOS ANIMAIS - Ao título II.
Fica entre o subtítulo I – DAS PESSOAS – E o subtítulo II – DAS COISAS.52
Preciso é referir que a regulamentação trazida, é em muito parca! Abrange os artigos 201.º-B a
201.º-D, o que simplesmente corresponde a uma definição legal, uma disposição remissiva, e a
determinação da aplicação subsidiária do regime do direito das coisas!
Em todo caso, resulta desta inovação que os animais deixaram de ser meras coisas!
Autonomizaram-se! Agora e, tal como qualifica a lei – Art. 201º - B – Este são considerados
seres vivos, dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica, em virtude de sua natureza!
Sua autonomização resulta da proteção específica de que beneficiam, seja no código civil,
seja em legislação especial, em função de sua natureza! – Art. 201º -C/1305º-A e ss (Ainda
que estes estejam sujeitos, subsidiariamente ao regime do direito das coisas em tudo que não
for contrário à sua natureza) – 201º- D
Os animais, por força do Art. 1302º nº 2 do código civil, na redação da lei 8/2017 de 3 de
março, podem ainda ser objeto do direito de propriedade, nos termos regulados no código civil
ou em legislação especial.
Assim, são consagrados os ANIMAIS como um objeto possível – autónomo/distinto das coisas
– de direitos reais!
52
Legislador deu a entender os animais como um “Tertium Genus” - terceira possibilidade diferente das duas
ordinárias ou comuns – no caso entre as pessoas (subtítulo I) e as coisas (Subtítulo II). Sobre esta alteração ainda,
prof. Horster a considerar que, “a alteração da estrutura da relação jurídica que coloca os animais, como objetos
do direito da propriedade, ao mesmo nível sistemático que as pessoas, visadas no subtítulo I do título II, e que são
sujeitos, é por isso mais do que questionável e, de resto, também não encontra correspondência nos exemplos
legislativos referidos. Poderia ter sido mais adequado diferenciar no subtítulo II (Das coisas) entre os animais,
como coisas sui generis e objeto de proteção, e entre as restantes coisas, em geral. Não se querendo fazer isso, em
alternativa devia ter sido criado o novo subtítulo II-A com a designação “Dos animais”.
NOTA: Como referido – Por força do Art. 201º - C – O regime do direito das coisas vai se
aplicar de forma subsidiária aos ANIMAIS em tudo que não for incompatível com a natureza
daqueles. Disto temos logo dois regimes, que eventualmente, poderão se aplicar de forma
subsidiária:
Neste caso, há uma particularidade quando relacionamos aos animais, que traduz-se no
seguinte:
É que no caso dos animais, para além dos frutos como a lã o leite etc, o fruto principal,
essencial, são de facto, as crias!
Estando em causa, no entanto, uma universalidade de animais, o conceito de fruto altera-se,
passando a abranger apenas as crias novas que excedam o número dos animais
eventualmente falecidos, uma vez que a não substituição dos animais que pereceram, afeta a
substância da coisa!
São ainda frutos, destas mesmas universalidades de animais, os despojos (restos) e todos os
proventos (=lucros/rendimentos/ganhos) auferidos, ainda que a título eventual
Artigo 212º nº 3º
F) A POSSE
Art. 1251 do código civil – É o poder que se manifesta quando alguém atua por forma
correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.
O livro III do código civil, pelo próprio título, é o cofre-mor dos direitos reais. Sem nenhuma
dúvida que é neste livro, deste diploma específico – código civil - que se encontram a maioria e
as mais importantes disposições relativas aos direitos reais!
Não obstante, esta subdivisão do direito civil não se esgota apenas no livro III. É preciso ter
sempre atenção que existem disposições dela contidas noutros livros e noutros
diplomas/legislações!
Na parte III – do artigo 1251 até ao 1575 – apenas estão disciplinados a posse e os vários
direitos reais de gozo! Esta parte não regula os chamados direitos reais de garantia e nem os
direitos reais de aquisição! E porque isto?
-Ora no primeiro caso, nos direitos reais de garantia – consignação de rendimentos; penhor;
hipoteca; privilégios creditórios; direito de retenção -, basta observar sua função de garantia
das obrigações! – por isto, sendo regulados no livro II, direito das obrigações!
-No segundo caso, direitos reais de aquisição, encontrar-se-ão dispersos, quer pelo livro II
quer pelo livro III do código civil! (Arts. 413; 421; 1409 e 1535)