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MODALIDADE DE EXISTÊNCIA DO DIREITO

A modalidade de existência do direito é a vigência. O direito é vigente quando é válido


e eficaz, ou seja, quando funciona como instância reguladora dos problemas juridicamente
relevantes de um determinado espaço e tempo.
Reconhecemos assim duas faces ao direito, uma face ideal, que invoca a axiologia e
validade e uma face empírica, que invoca a factualidade e eficácia. Dizemos portanto, que o
direito é válido quando reflete uma base axiológica e eficaz, quando se mostra capaz de
tutelar as situações juridicamente relevantes que o rodeiam.

SISTEMA JURÍDICO
O sistema jurídico é uma unidade composta por uma multiplicidade de elementos
articulados, de acordo com uma certa ideia ou princípio, é, por isso, um modo de objetivação
da normatividade jurídica. O sistema jurídico constituíra o modo como o direito se relaciona
com a realidade, este estabelece critérios para ação enquanto dialoga com a mesma.
O sistema jurídico caracteriza-se por ser aberto, à realidade e evolução histórico
cultural; material, mobilizador de critérios fundamentados axiologicamente; de
reconstituição à posteriori, reconstitui-se retroativamente através dos problemas que vai
resolvendo, ou seja, através da experiência (é também constituendo, está em permanente
constituição; não pleno, incapaz de resolver todos os problemas juridicamente relevantes
recorrendo apenas aos critérios e fundamentos que consagra; não-autossuficiente, incapaz
de resolver todos os problemas juridicamente relevantes se, recorrer à realidade).
O sistema jurídico não se limita à lei. É um sistema pluridimensional com diversidade
de estratos nos quais encontramos: fundamentos, racionalizações de inteligibilidade de
certos domínios, que são base axiológica de fundamentação; e critérios, operadores práticos
diretamente mobilizáveis para a resolução de problemas. Entre estes dois conceitos existe
uma relação de fundamentação, os critérios encontram nos fundamentos a sua sustentação
material, são os fundamentos que conferem sentido aos critérios.
Os princípios normativos são manifestações de fundamentação da juridicidade
vigente. Neles radica toda a validade do sistema jurídico enquanto exigência axiológico-
normativa. Os princípios normativos não são normas, nem se confundem com as normas, isto
é, são uma (mera) referência axiológica e ao contrário das normas que são critérios
formalmente acabados e mobilizáveis, os princípios são meras orientações para a resolução
de problemas. Os princípios em si não oferecem respostas aos problemas práticos, porque
não preveem o tipo de problemas a que seriam aplicáveis, a sua intervenção é mediata,
fundamentam as normas e critérios vigentes que oferecem essa resposta. É relevante
distinguirmos os tipos de princípios, de acordo com diversos critérios, (interessa para o
enunciado em apreço fazer a distinção) segundo o critério de posição no sistema jurídico
existem: princípios suprapositivos, que fundamentam e emanam a ideia de direito, são
uma manifestação imediata e mais próxima dessa ideia, graças à sua fundamentação são
superiores aos demais princípios e considerados os pilares do sistema jurídico; princípios
transpositivos, são concretizações de princípios suprapositivos, apresentados como pilares
fundamentais de uma área dogmática, são condição normativo-transcental do sistema
jurídico; princípios positivos, são princípios consagrados nas próprias normas e, que
portanto, já estão positivados, não representam pilares essenciais. Aos princípios está
associada uma presunção de validade, que se concentra na dimensão axiológica do direito,
presume-se que os referentes de fundamentação são materialmente válidos, assim como os
valores que o direito apresenta e filtra para o sistema jurídico, consequentemente presume-se
que também os princípios (que nesses valores e referentes se fundamentam) serão válidos.
As normas são critérios jurídicos, gerais e abstratos que se apresentam como critério
de resolução para problemas juridicamente relevantes. Não operam isoladamente, uma vez
que, no momento de resolução/aplicação da norma, são tidos em conta os princípios
normativos, de forma a impedir contradições e evitar situações em que a lei possa ser
aplicada de forma injusta. Assim como os princípios as normas são classificadas, de acordo
com determinados critérios (tendo em conta o enunciados vamos focar na distinção), da
especialidade material, sendo que as normas estabelecem vínculos com a ação, esses
vínculos precisam de ser entendidos tendo em conta a autonomia privada, a vontade dos
destinatários, assim distinguimos: normas imperativas, normas que não dependem da
vontade dos destinatários e se impõe independentemente desta, podem ser de caráter
proibitivo (se proibirem determinado comportamento/conduta), preceptivas (se exigirem uma
conduta); de normas permissivas, normas cuja aplicação depende da vontade dos sujeitos,
estas podem ser de cariz facultativo (se permitirem um comportamento), interpretativas strictu
sensu (se determinarem o alcance e sentidos de expressões suscetíveis de dúvida), ou
supletivas (quando estabelecem uma solução vigente, caso não haja manifestação da
vontade por parte do destinatário). As normas gozam para além da presunção de vinculação
e vigência com que vigoram na OJ, de uma presunção de autoridade no sistema jurídico,
assegurada pela conjugação entre a validade jurídica e legitimação política de que
beneficiam.
A Jurisprudência corresponde ao momento de realização judicativo-concreta da
normatividade jurídica, isto é, ao momento em que o direito é diretamente convocado para a
resolução de problemas concretos. Encontramos aqui as decisões judiciais, quer no momento
da sua constituição, quer depois enquanto precedentes. À jurisprudência está associada uma
presunção de justeza, isto é, tendo em conta que a decisão judicial tem um valor
normativamente constituído, a jurisprudência pode ser mobilizada como critério em futuros
casos concretos, enquanto se mostrar adequada ao problema e ao sistema.
A Dogmática é o direito dos juristas, descreve o direito vigente. Neste estrato,
encontramos o conjunto de reflexões dos especialistas de direito sobre o direito vigente, mas
também a constituição do direito ex novo. A atual dogmática é constitutiva e integrante, o
pensamento jurídico é criador de direito. À dogmática cabem cinco funções: estabilizadora,
compensa as falhas dos outros estratos; dinamizadora, propõe soluções ex novo;
desoneradora; técnica, confere aos juristas instrumentos técnicos de fixação de sentido; e de
controlo, forma estruturas de pensamento. À dogmática dirige-se uma presunção de
racionalidade, uma racionalidade de fundamentação, sustentada por argumentação.

FONTES DE DIREITO
Qualquer conceção das fontes de direito depende do pressuposto que se assume
sobre o direito em si. Neste sentido, é possível distinguir duas perspetivas relativas a este
tema.
A perspetiva político-constitucional defende que as fontes de direito serão aquelas
que forem determinadas como tal, pelo poder legitimado para as definir, ou seja, aquelas que
o poder legislativo/legislador definir como tal. Esta é uma perspetiva polarizada no poder
político, em que a validade do direito advém do facto de ser criado por instâncias com
legitimidade para criar normas jurídicas obrigatórias. Caracteriza-se por ser uma perspetiva
estatalista, dogmática e formalista, dependente de um corpus iuris pré-vigente.
Apresentam-se como críticas a esta teoria, a dependência de um direito já constituído
que afasta as fontes de direito da realidade; a redução do direito à lei; e o incentivo que fazia
para que os juristas fossem meros aplicadores da lei, sem capacidade de reflexão crítica.
A perspetiva fenomenológico-normativa destaca não as instâncias criadoras de
direitos, mas os modos da sua constituição e a forma como o direito se constitui e manifesta.
Esta perspetiva reflete um sentido em que o direito surge como um dever-ser que é. É uma
perspetiva focada na experiência jurídica de determinação da normatividade. Esta caracteriza
três tipos fundamentais de experiências jurídicas.
A experiência jurídica constituinte consuetudinária, que formaliza o costume como
fonte de direito. O costume jurídico concentra-se na observância reiterada, estabilizada e
uniforme de comportamentos, que pelo seu conteúdo e fundamentação se tornam
vinculantes, este é entendido como uma prática com força vinculante e, por isso, observado
como norma jurídica de comportamento e, não legal. Enquanto fonte, o costume implica um
corpus, um comportamento reiterado e um animus, convicção de obrigatoriedade.
A experiência jurídica constituinte legislativa, é uma experiência de índole estatal,
com remissão para o poder político, politicamente legislado para criar direito sob a forma de
legislação. A constituição do direito apresenta-se como um conjunto pré-determinado de
regras com vista aplicação futura.
A experiência jurídica constituinte judicial, este tipo de experiência concentra-se
no juízo decisório. O direito é criado no momento em que se concretiza para solucionar um
caso concreto.

O Processo Constitutivo do Direito Vigente assenta na perspetiva fenomenológico-


normativa das fontes de direito, pressupõe um sentido do direito que determina essa
compreensão e assume que o problema das fontes é p problema do processo constitutivo
das mesmas. Este implica para cada fonte, quatro momentos que determinarão a sua
validade e eficácia. São eles:
O momento material, também conhecido como momento axiológico, que diz respeito
à matéria-prima do direito. O direito não regulamenta ad liberum, porque nem todos os
domínios intersubjetivos são juridicamente relevantes e por, isso surge, a necessidade de
determinar o conteúdo da juridicidade, ou seja, determinar aquilo que é juridicamente
relevante. Essa seleção do conteúdo da juridicidade é feita neste momento, sendo o direito
um projeto de realização que determinada comunidade quer ver em construção, é direito o
que a comunidade determinar como juridicamente relevante e quer que seja direito.
Em seguida o momento de validade, este é o momento em que o direito se afirma
como instância normativo-regulativa e reconhece que certos problemas são, de facto,
juridicamente relevantes e qual o seu sentido de orientação. O direito afirma-se no seu
sentido de dever-ser, a intencionalidade normativa que fundamenta a resposta que o direito
dá à realidade social.
O modo como os dois primeiros momentos se articulam, vai gerar um modo de
constituição vigente, podendo gerar-se costume, legislação ou jurisprudência – este é o
momento constituinte. A dialética entre os momentos material de validade necessita de
uma entidade que forme essas experiências constituintes.
É neste momento que a lei, apresenta justificações ao facto de ser a fonte de direito
mais mobilizada. Contudo é, também assim, que percebemos que a lei está limitada nas suas
funções e limites normativos.
Funcionalmente a lei exerce, uma função político-social e reformado de definição do
programa social, da determinação programática das opções da ordem, cumpre também uma
função instituinte e planificadora de criação de órgãos e demarcação de competências.
Juridicamente cabe à lei, ser um meio de integração e construção de convivência pacífica.
No que toca aos limites da lei, estes podem ser: funcionais, ser um limite negativo de
tudo o quanto a lei deve ser chamada a fazer, há situações e matérias que a lei não regula e,
por isso, quem criar direito nestas matérias, não cria lei; normativos, que são limites que a lei
por sei lei apresenta (limites inerentes ao seu sentido e estrutura); normativos objetivos,
dizem respeito à relação entre as normas e a realidade a que se dirigem, consciência de que
a realidade é maior e mais ampla que a quantidade de normas pré-disponíveis capazes de
ser mobilizadas – problema das lacunas (a própria constituição das normas apresenta-se
como um limite ao delimitar o âmbito da sua relevância e o seu ponto de vista objetivo);
normativos intencionais, mesmo que uma interioriza a intenção normativa de um caso, por
esta ser geral e abstrata sofrerá sempre de insuficiência intencional (o abstrato empobrece a
complexidade da realidade e a generalidade desconsidera as especificidade do sujeito), cabe
ao jurista constituir uma ligação entre a intencionalidade problemática do caso e a
intencionalidade normativa; normativos temporais, limites que decorrem da passagem do
tempo e se referem a normas em vigor, tratam a influencia do tempo nas normas legais, a
ponto de constituírem um limite – apesar de abstratas e tendencialmente intemporais, as
normas estão sujeitas à passagem do tempo e alteração da dinâmica histórica, quando são
limitas pela realidade ou pelo horizonte de fundamentação, perdem validade e tornam-se
caducas (deixam de ser a concretização adequada de um princípio normativo) ou perdem
eficácia e tornam-se obsoletas (a realidade altera-se a ponto de a norma deixar de
intencionar a realidade a que se apresenta); normativos de validade, são limites inerentes
ao início da norma, a norma que sofrer deste limite, não está, nem nunca este em
consonância com os princípios normativos, não é, portanto, válida.
Por último, o momento de objetivação é o momento em que o direito se torna objetivo,
positivo e vigente. Precipitação do direito no corpus iuris vigente.

METODONOMOLOGIA
A metodonomologia é o caminho racionalmente percorrido para atingir um
determinado objetivo – a construção da projeção prática do direito. É o estudo dos
procedimentos que um jurista deve tomar para resolver racionalmente um problema
juridicamente relevante, procurando uma perspetiva que melhor se adequa à realidade, ao
sentido do direito e ao sistema jurídico. Não é somente necessária a mobilização de critérios
e fundamentos, mas também a identificação da racionalidade em que o juízo decisório se
fundamenta e a elaboração de um modelo metódico.
ESCOLAS METÓDICAS – Retomando o positivismo do séc. XIX, podemos identificar 3
escolas do pensamento jurídico. Cada uma destas escolas apresenta um ponto de vista, uma
metodologia e ciência do direito diferente, porém partilham alguns elementos, nomeadamente
a ideia do direito como objeto cognoscível que cabe ao pensamento jurídico conhecer. Para o
positivismo, o direito é, primeiramente, criado no sistema, interpretado e conceitualizado e
posteriormente aplicado lógico-dedutivamente aos factos.
A Escola da Exegese afirmou-se em França, no séc. XIX, em consequência do
código revolucionário. Enquanto corrente normativista legalista, esta escola identificava o
direito com a lei, lei essa que era dotada de uma racionalidade universal, que lhe garantia
validade. Esta validade era, no entanto, puramente formal, uma vez que, dependia da
legitimação do poder político, mais concretamente do órgão legislativo responsável, tornando
o poder legislativo o único capaz de criar direito. Desta forma, a lei tornava-se a única fonte
de direito e o direito é exclusivamente criado sob a forma de lei.
Sendo a lei a única fonte de direito, o direito codificado era O direito. Conhecer o
direito, era conhecer os textos considerados de direito – os códigos. Os juristas procediam à
exegese – o estudo cuidadoso dos elementos filológico-gramaticais dos códigos de
legislação. E ao juiz cabia a tarefa de julgar de acordo com os mecanismos dos códigos,
julgava com base exclusiva nos textos legais.
O sistema jurídico era um dogma de plenitude lógica – era o direito que no sistema
jurídico, positivado sob a forma de lei, determinava o que era juridicamente relevante.
Qualquer alteração no sistema jurídico ou nas normas, tinha de ser introduzida pelo legislador
e não por influência da realidade ou do sistema. Era também a determinação da vontade do
legislador, a única razão que levava à interpretação das normas – subjetivismo histórico, era
necessário determinar a vontade do legislador expressa no texto da lei e no contexto da lei,
só assim as normas podiam ser aplicadas com coerência.
Caso existisse um caso omisso, a Escola da Exegese previa que esse fosse resolvido
mediante um analogia legis, isto é, se o caso não estivesse previsto na lei, mas fosse
suficientemente semelhante à hipótese de uma norma, essa norma podia ser aplicada ao
caso em questão através de uma analogia entre casos.
O sistema jurídico apresentado por esta escola era uma construção sistemática, em
que as normas estavam organizadas de forma lógica e o direito era aplicado de forma
técnica, para garantir objetividade, imparcialidade e certeza.
A Escola Histórica surgiu em reação ao jusnaturalismo racionalista do iluminismo e
repúdio à pressuposição da ideia de direito natural intemporal e universal. Esta estabelece
uma construção histórica do direito, em oposição à codificação.
Rejeitando a ideia de codificação, a Escola Histórica reforça o papel do costume,
considerando direito o que era consagrado como prática. Para Savigny, o que estava em
causa não era verificar uma determinação pré-institucional do direito, mas de o ver como uma
manifestação do orgânico desenvolvimento interno do espírito do povo. O direito surge como
direito consuetudinário e considerava-se que estava dado nas específicas obrigações
culturais que o costume tinha densificado como direito e manifestado de forma objetiva nos
institutos (conjunto de práticas intersubjetivas que se vão densificando e desenvolvendo
historicamente na ideia de direito de um povo).
Aquando a ocorrência de um caso omisso, este podia ser resolvido por meio de um
novo instituto, desde que o mesmo estivesse de acordo com a evolução do sistema.
Os maiores problemas que o sistema jurídico desta escola enfrentou foram a falta de
unidade (geravam-se contradições dentro dos institutos) e a falta de universalidade (gerava
lacunas dentro do próprio sistema).
A Jurisprudência dos Conceitos surgiu a partir da perda de produtividade da Escola
Histórica. Esta afirmou-se como uma ciência do direito através de um sistema de conceitos,
que ligava os dados do direito positivo a conceitos abstratos da realidade. O grande objetivo
passa a ser a dedução dos princípios jurídicos e posterior construção de conceitos.
Ihering afirmou que as normas eram o resultado de dados normativos históricos
(costume e lei) elaborados em proposições normativas gerais e abstratas. Esta ciência
transformava as normas em jurisprudência inferior (formação de princípios gerais de direito) e
jurisprudência superior (construção e organização sistemática de conceitos). As normas eram
progressivamente destiladas em enunciados definidores, cada vez mais gerais e abstratos,
até resultarem nas formas mais simples e puras de direito.
Para ilustrar a relação entre conceitos e a gradação da sua pureza, Putcha elaborou
uma pirâmide – Pirâmide de Putcha – que estabelece entre os conceitos relações de indução
e dedução. Através desta pirâmide, uma vez constituído o primeiro conceito, os outros seriam
obtidos de forma dedutiva ou indutiva a partir desse.
A resolução de casos concretos era feita através de operações de indução ou
dedução, baseada em construções de conceitos. A lei era aplicada através deste sistema, a
interpretação de normas e leis eram retiradas ao sistema conceitual e, a partir daí, aplicadas
segundo um silogismo subjuntivo.
ESCOLAS METODOLÓGICAS DE ORIENTAÇÃO PRÁTICA – a viragem para a realidade e
pensamento prático, levaram à evolução para as escolas de orientação prática, que postulam
que o direito não é exclusivamente a lei, o sistema não pode ser fechado e o pensamento
jurídico não é teorético. O ponto comum de todas estas escolas era a conjugação entre uma
dimensão teleológica, preocupada com a realidade prática e os seus problemas, com uma
dimensão axiológica, que afirmava a importância do direito seguir certos valores e não ser um
mero instrumento de realização de qualquer outro fim.
A Jurisprudência dos Interesses surgiu no séc. XX, em reação à Jurisprudência dos
Conceitos (positivismo alemão). Esta procurou encontrar uma superação moderada do
positivismo, através da adequação de pontos chave do Movimento de Direito Livre.
A Jurisprudência dos Interesses estabeleceu um diálogo que permitiu uma superação
parcial do positivismo, enquanto (continuava) a propor uma obediência perante a lei, no
momento de aplicação do direito, esta era, no entanto, uma obediência à intenção normativa
da lei e não ao texto – obediência pensante.
O principal fundamento desta escola é a perspetivação do direito através de
interesses, o direito surgia como um conflito de interesses. A construção de normas legais vai
ser feita a partir da consideração de interesses e a norma surge como solução valoradora
desse conflito. O modo de construção do direito implicava que o legislador estudasse o
conflito de interesses num contexto histórico e social, tornando impossível a aplicação do
direito de forma lógico-dedutiva, passando a depender da comparação entre a realidade e a
norma geral e abstrata. A interpretação torna-se essencial para a aplicação do direito e parte
da relação entre o problema e a intenção normativa da norma – é feito um juízo análogo
concreto.
Nesta compreensão, o direito identifica-se com as normas, mas numa perspetiva
diferente: é aceite a ideia de que o direito é lacunoso e incapaz de prever a riqueza e
amplitude da realidade e que os casos omissos podem ser integrados no sistema.
A Jurisprudência de Interesses foi eventualmente superada, devido a quatro
insuficiências: sociológica, não distinguia critérios de fundamentos; criteriológica, reduzia as
normas ao ponto de vista dos critérios; sistemática, a norma servia como fundamento, objeto
e critério, e filosófica.

INTERPRETAÇÃO JURÍDICA
A interpretação jurídica é a determinação do sentido normativo de uma fonte jurídica,
de modo a obter dela orientação para a realização de direito em casos concretos. É um ato
metodológico a partir do qual podemos elaborar critérios capazes de guiar o jurista para a
solução de um problema juridicamente relevante.
A Teoria Tradicional da Interpretação Jurídica está associada às perspetivas
positivistas de interpretação, que assentam no sentido vinculativo da dimensão textual. Esta
teoria assumia um sentido hermenêutico-normativo – a interpretação tinha lugar em abstrato
e independentemente da mobilização da norma para aplicação lógico-dedutiva.
Quanto ao objeto de interpretação, este tinha de ser um objeto de estudo cognoscível
que fosse possível de estudar de forma lógica e objetiva. As normas eram objetivadas num
texto com hipótese e estatuição e reduzidas a um enunciado literal. Era esta norma enquanto
texto (texto da lei) o objeto da interpretação jurídica, interpretar a lei significava determinar o
sentido do texto da norma.
A interpretação jurídica define um objetivo específico, uma finalidade que se pretende
obter com a interpretação. Dentro da teoria tradicional existem divergência quanto a esse
objetivo.
A teoria subjetivista defende que o objetivo da interpretação era a averiguação da
vontade do legislador, presente no texto da lei, acentuando assim a autoridade do criador de
direito. Surge nesta teoria, o subjetivismo histórico, que procurava averiguar a vontade do
legislador no momento de criação da norma (qual a intenção do legislador, em legislar
naquele sentido).
A teoria objetivista entendia que o objetivo da interpretação era a vontade expressa
pelo próprio texto da lei. O legislador era tido como uma entidade abstrata, permitindo ao
texto da lei expressar um sentido autónomo.
Estas duas teorias convergem numa teoria mista de interpretação. Esta teoria é
facilmente entendida, através do artigo 9º do CC português. Este artigo consagra uma série
de elementos relevantes para interpretação, permitindo que esta vá para além da
interpretação literal da lei. O nº1 deste artigo, define que o texto tem relevância fundamental,
mas opõem-se à possibilidade de uma interpretação literal exclusiva; o nº 2, continua a
vincular a interpretação com uma base literal, exigindo que essa interpretação tenha o
mínimo de correspondência verbal – presença da teoria da alusão, uma consagração mais
aberta da função negativa do elemento gramatical; o nº3, faz a pressuposição do legislador
razoável, segundo a qual ao interpretar a norma o jurista deve presumir que a solução
consagrada é a mais acertada e que a forma como legislador se exprimiu é adequada.
Para estabelecer o sentido da lei, é necessário invocar os seus elementos.
O texto da lei não se limita a identificar a lei, mas também delimita as interpretações
possíveis, essa função delimitadora é desempenhada pelo elemento gramatical, nas suas
funções negativa e positiva. Na sua função negativa, este determina que qualquer
interpretação da norma que não tivesse ligação com os sentidos literalmente admissíveis
seria excluída. Na sua função positiva, determina que os sentidos a admitir como possíveis
têm que ter essa ligação à letra e podem ser mais ou menos fora dela, desde que cabíveis.
O elemento histórico é o responsável pela comparação entre a realidade atual e a
realidade no momento de emanação da norma. O elemento sistemático considera a
unidade e coerência do sistema jurídico fazendo uma análise da própria estrutura e
construção racional da norma dentro do sistema. O elemento teleológico diz respeito à ratio
legis, objeto da norma e o seu surgimento.
Por último a interpretação produz diferentes resultados. Estes resultados eram
determinados pelo grau de correspondência entre os elementos e a amplitude dos sentidos.
A interpretação podia então ser: declarativa, se a correspondência entre todos os elementos
fosse perfeita; restritiva, se o significado gramatical fosse mais amplo que o espírito,
excluíam-se significados literalmente possíveis; extensiva, quando o sentido da letra é
menos amplo, os outros elementos ampliam-no; enunciativa, não se chega a uma conclusão
do sentido da norma através da relação entre os diferentes elementos e é necessária a
utilização de argumento lógico-jurídicos; revogatória, é impossível a conjugação entre
elementos.

O 1º passo para a superação da Teoria Tradicional da Interpretação foi dado pela


Jurisprudência dos Interesses.
A interpretação deixa de ser feita em abstrato e passa a ser feita em concreto, à luz do
problema para o qual a norma vai ser mobilizada como critério. O objeto da interpretação é,
agora, a norma enquanto problema, ou seja, a sua intencionalidade normativa. Para a
interpretação da norma, o jurista passa a ter de cumprir determinadas tarefas,
nomeadamente: a análise da norma à luz do caso em concreto, a análise histórica da lei, tem
de tentar estabelecer uma analogia entre os interesses presentes no caso concreto e a
ponderação do legislador no enunciado da norma.
A Jurisprudência dos Interesses tornava possível que houvesse uma contradição entre
o comando da norma (texto/formulação) e a sus intencionalidade normativa. Por estar sujeito
a uma obediência pensante, o jurista devia obedecer à vontade normativa. Neste sentido,
Heck propôs a interpretação corretiva – situações em que seria permitido optar pela
vontade normativa da norma, em oposição á sua letra, de forma a adaptá-la e corrigi-la tendo
em conta um caso concreto.
Os postulados da Jurisprudência dos Interesses propunham uma obediência
pensante, uma obediência não ao texto da lei, mas à sua vontade normativa e objetivo
prático. Esta vontade normativa podia estar contida no texto ou não. No momento da
interpretação, o jurista devia reconstruir a ponderação do legislador, mediante um caso
concreto. Neste sentido, podemos concluir que, o objetivo da interpretação era a análise da
intenção colocada na norma, adaptada ao caso concreto – subjetivismo teleológico. Esta
então uma teoria subjetivista teleológica, confia na razoabilidade formal e substancial do
legislador para consideram um determinado sentido problemático.
Nesta perspetiva, continuam presentes os elementos tradicionalmente considerados
da norma e ainda elementos normativos extratextuais. O elemento gramatical, não tem força
vinculativa na pré-determinação de sentidos, uma vez que, excluía antecipadamente
situações e sentidos sem ter em conta o contexto da situação. Assim, torna-se fundamental
considerar o contexto prático do problema e identificar a sua relevância jurídica. A lei é agora
uma forma de valoração, com vontade normativa própria e, por isso, não podemos deixar de
a interpretar sem ter em conta a sua vontade normativa própria, a ratio legis, mas também,
todas as interpretações já feitas dessa norma e a ratio iuris.
Para além da interpretação corretiva, este modo de interpretação produz mais dois
tipos de resultados: a extensão teleológica, convocação da norma para situações que não
estão previstas no seu âmbito, em função do seu objetivo; exclusão teleológica, são
delimitados os casos, que apesar de se inserirem no seu âmbito, não se inseriam na sua
função, pelo que não seria adequado mobilizar esta norma para os resolver.

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