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MEDICINA LEGAL

1) ORGANIZAÇÃO MÉDICO-LEGAL

DL 146/2000, de 18 de Julho: criou o Instituto Nacional de ML.

- 3 Delegações (Porto, Coimbra e Lisboa)

- 27 Gabinetes médico-legais

Atribuições: qualquer entidade pública ou privada pode pedir exames ao Instituto, depois
trata-se de saber se tem ou não legitimidade (por exemplo, o individuo em causa tem de dar
consentimento).

Órgãos:

1. Conselho Directivo
2. Conselho Médico-Legal
3. Fiscal Único
4. Comissão de Ética

Conselho Médico-Legal: é o órgão máximo do ponto de vista pericial da ML, que resolve os
casos mais complexos e que suscitem mais dúvidas. Pode chamar um perito de determinada
área.

• Composição:
o Presidente, Vice-Presidente e vogais
o Representante de cada um dos conselhos regionais da Ordem dos
Médicos
o Dois docentes de cirurgia cirúrgica, médica, obstetrícia e direito
o Um docente de anatomia patológica, direito médico, ortopedia,
neurologia /psiquiatria
• Funções:
o Exercer funções de consultadoria técnico-científicas
o Emitir pareceres sobre questões técnico-científicas

Os magistrados não podem pedir pareceres directamente, mas quando tal sucede não se
rejeita (principalmente em casos de negligência médica, 95% dos casos). O parecer é
insusceptível de revisão.

A consulta pode ser pedida por:

✓ Membro do Governo responsável pela justiça


✓ Conselho Superior da Magistratura
✓ Procuradoria-Geral
✓ Presidente do Conselho Directivo INML

DELEGAÇÕES:

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Principais áreas:

1. Patologia forense
2. Clínica forense
3. Toxicologia forense
4. Genética e biologia forense

Serviços técnicos:

1. Clínica e patologia forense: funcionam nas delegações e gabinetes


a. Clínica: perícias direito civil, penal e trabalho; perícias psiquiátricas.
b. Patologia: autópsias médico-legais; exames anatomia patológica; perícias de
identificação; embalsamentos; colheita de amostras.

2. Química e Toxicologia forense: funcionam apenas nas delegações.


3. Genética e Biologia forenses: funcionam apenas nas delegações.
4. Tecnologias forenses e criminalística: funcionam apenas nas delegações.

Patologia: funciona não apenas nas delegações, mas também nos gabinetes médico-legais.

Toxicologia forense: funciona nas delegações.

Genética e Biologia forense: na criminalística biológica, também a polícia judiciária faz


exames, o magistrado pode optar pelo INML ou a PJ.

Clínica forense: faz exames nos vivos, também se realizam nos gabinetes. Ex.: exames sexuais,
psiquiatria forense (diploma). Em Coimbra só há um psiquiatra, permite-se a distribuição dos
exames a instituições esporádicas.

Não se pode concluir um relatório sem ter todas as informações clínicas, a lei exige que sejam
enviados no prazo de 30 dias, mas não há qualquer sanção. A única hipótese é o Instituto
recorrer ao Tribunal para que este aplique uma multa à instituição que devia ter as
informações clínicas atempadamente.

Competências dos GABINETES:

O INML dispõe ainda de Gabinetes Médico-Legais, dependentes dele. Não fazem exames
toxicológicos.

Competências:

1. Realização de autópsias, identificação, embalsamento


2. Realização de perícias em pessoas no direito civil, penal e trabalho e psiquiatria e
psicologia
3. Colheita de amostras para exames complementares

Requisição de perícias: Por vezes, as perícias são pedidas ao INML e não a médicos
individualmente. O INML é que pode ter a iniciativa de contratar terceiros ou estabelecer
protocolos com outras entidades. As perícias ML são realizadas no INML; excepcionalmente,
podem ser realizadas por entidades terceiras.

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Sempre que há a requisição de perícias, é obrigatório ver o máximo de informação clínica
possível. Antes entendia-se que o perito devia ter o menos possível para ser imparcial; agora
entende-se que deva ter toda a informação e confrontar resultados.

O perito só pode confirmar no seu relatório aquilo que objectivamente conseguir comprovar.
Atenção que o facto de não estar confirmado não significa que não tinha acontecido (pode
acontecer nos casos de abusos sexuais).

Denúncias de crimes: contactar logo o MP permite que a pessoa não tenha de se dirigir a dois
locais, vindo logo ao INML. Mas mesmo sem queixa o INML pode fazer, por exemplo, colheita
de vestígios.

Responsabilidades pelas perícias: cada perito tem autonomia, sendo responsável pelas suas
perícias e relatórios. Ninguém pode mandar alterar as conclusões do relatório. Pode haver dois
peritos com opiniões divergentes (ex.: avaliação do dano corporal no estabelecimento do grau
da incapacidade, caso em que um estabelece 5% e o outro 30%, isto já não se compreende).
Mas cada um é obrigado a observar determinadas regras, por exemplo, a autópsia tem de
estar completa → ou seja, gozam de autonomia técnico-científica, com obrigatoriedade de
seguir regras e formulários do INML.

Obrigatoriedade de sujeição a exames: o Código Deontológico proíbe os médicos de fazerem


exames contra a vontade das pessoas. Porém, a lei vai em sentido contrário. Com o novo CPP,
é aceite o recurso à força para recolher amostras, etc.

Antes, o magistrado era obrigado a assistir aos exames; mas raramente tal era cumprido. Hoje,
apenas pode assistir, se assim o entender necessário.

Custos dos exames e perícias: Na última revisão legislativa, acrescentou-se que, no caso de
arquivamento do processo, as despesas com exames têm de ser pagas na mesma (dinheiro do
Estado).

Remuneração dos peritos: o perito é pago depois da entrega de relatório.

No INML há um sistema de videoconferência e os peritos podem pedir aos magistrados para


este meio ser usado, para rentabilizar tempo.

As amostras ficam no INML por dois anos, depois o INML pode destruí-los. Antes, a lei dizia
que tinham de ficar até os magistrados ordenarem a destruição. Se o magistrado achar que
deve ficar por mais tempo para dado processo, tem de o comunicar.

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2) AUTÓPSIAS MÉDICO-LEGAIS

São apenas 5% a 8% da actividade do Instituto de ML.

O que se espera do perito é que este faça ver a realidade tal como ela é, sendo estes os óculos
do juiz, para que este tome a melhor decisão possível, porque está melhor fundada.

Temos dois tipos de autópsias:

A) Médico-legais ou forenses Podem sobrepor-se, mas têm objectivos, regras, práticas


B) Anátomo-clínicas e filosofias diferentes

• ANÁTOMO-CLÍNICAS:

Faz-se em ambiente hospitalar quando um doente morre, para que o médico perceba o
porquê de tal ter acontecido, podendo no futuro agir de forma diferente.

*Centrada no exame interno e na correlação dos elementos observados com os elementos


clínicos.

*Necessário o consentimento dos familiares.

Objectivos:

a) Causa de morte
b) Estudo da causa, natureza e desenvolvimento da doença
c) Avaliação da eficácia do tratamento
d) Controlo de qualidade das entidades médicas
e) Informação à família, sociedade e médicos
f) Educação e formação médicas

• MÉDICO-LEGAIS OU FORENSES:

Ocorre em casos com interesse judicial, para esclarecimento das circunstâncias que
envolveram a morte e da causa da morte. Eventual apuramento da intervenção de terceiros. O
cadáver deve ser levado para o laboratório para exame pericial no mesmo estado em que é
encontrado.

Objectivos:

a) Causa de morte
b) Ajudar na interpretação e correlação dos factos que envolveram a morte
c) Identificação dos cadáveres
d) Estimativa do tempo de morte (cronotanatognose)
e) Colheita e preservação de evidências

Pode haver objectivos mais específicos, dependendo dos casos:

1) Identificação dos agressores

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2) Tempo de sobrevida após a produção das lesões
3) Cronologia faz lesões
4) Ferimentos vitais e post-mortem
5) Influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas
6) Distância de disparo
7) Etc.

Nota: através de analise ao cabelo conseguimos saber o hisotiral de toxicodependência das


pessoas, por norma, o cabelo cresce 1cm ou seja em 10 centimetros em 10 meses

Fases da autópsia médico-legal: cada uma terá uma importância diferença tendo em conta do
caso

1) Exame do local
2) Exame da documentação/autopsia psicológica (para ajudar no perfil da pessoa)
3) Exame de vestuário (
Deve-se fazer sempre um exame completo de todo
4) Exame externo do cadáver
o corpo, não parando se se encontrar uma lesão
5) Exame interno do cadáver
num dado órgão
6) Exames complementares

Regime jurídico das perícias médico-legais (Lei 45/2004) art.18.º:

- N.1.º: é obrigatória em situações de morte violenta ou de causa ignorada, salvo se existirem


informações clínicas suficientes → a dispensa não é possível em caso de acidente de
trabalho/viação de que resulte morte violenta.

- N.3.º: pode ser dispensada em casos de risco (exemplo, doença das vacas loucas).

- N.5.º: pode ser realizada após a constatação de sinais de certeza de morte. Antes, só podiam
ser realizadas 24h após a morte.

Art. 19.º: é realizado por um médico perito, salvo se houver suspeita de crime doloso → aí, é
realizada por dois médicos peritos.

A autópsia é requerida pelo MP e é realizada nas delegações e gabinetes médico-legais


(serviços de patologia forense).

Autópsias médico-legais → diagnóstico diferencial entre:

-morte natural/violenta

-homicídio, suicídio ou acidente

-natureza do instrumento causador das lesões

-lesões de causa adequada ou ocasional de morte

necessária – causa inevitavelmente a morte;

Causa adequada: adequada – pode levar à morte, mas sobreviveria se tratada a


tempo.

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Causa ocasional: per si só não é responsável pela morte, mas circunstancialmente
externos fazem com que produza a morte daquele concreto indivíduo.

Regra dos 6 W’s (objectivos gerais):

✓ Who: saber quem morreu, quando a vítima não está identificada.


✓ When: saber quando a pessoa morreu. Pode ter relevância para: sucessão (sequência
de mortes na mesma família); seguros; e hipóteses de homicídio (alibi).
✓ Where: nem sempre morre no mesmo local onde foi encontrado.
✓ Why: saber de que é que morreu. Em 5-10% das autópsias, não se chega a uma certeza
quanto à causa de morte (autópsia negativa).
✓ How: estabelecer a etiologia da morte. A morte pode ser natural ou violenta, e dentro
desta pode ser homicídio, suicídio ou acidental (diagnóstico diferencial). Faz-se
conjugando o exame do local, a autópsia e a informação. A pessoa mais indicada para
este diagnóstico é o agente da informação e não o perito médico.

Autópsia

A autópsia só por si, não permite saber

Exame local Informação

✓ What: determinar as circunstâncias que envolveram a morte. Pode-se encontrar


provas daquilo que acontecem e que limitem aquilo que pode ter acontecido.

3) EXAME DO LOCAL E REMOÇÃO DO CADÁVER

Importância do exame do local no âmbito da ML.

Objectivos da autópsia médico-legal:

-diagnóstico diferencial

-outros diagnósticos

Art.16.º da Lei 45/2004 – casos de morte violenta ou de causa ignorada, com óbito fora de
instituições de saúde. Alínea c): providenciar comparência de perito médico – há nos gabinetes
e delegações, em serviço 24h/dia todos os dias.

Colaboração com o perito forense:

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✓ Isolamento da área: não é necessariamente só à volta do cadáver, pode ser até uma
distância mais abrangente.
✓ Não deixar vestígios
✓ Não introduzir dados que já tenham sido alterados: se a polícia retirar de ao pé do
corpo uma arma, não a devemos colocar só para tirar uma fotografia – isto não cria a
situação inicial, pelo que não tem qualquer valor.

Exame do corpo:

✓ Posição: é importante, para ver se é compatível com os vestígios encontrados (saber


se o cadáver foi deslocado)
✓ Condições: deve-se procurar as condições para tentar descobrir o intervalo de tempo
no qual a morte terá ocorrido.
Chegando à sala de autópsias depois de um intervalo mais ou menos longo de tempo,
pode o corpo por acção dos fenómenos cadavéricos já estar diferente → deve-se
proceder a um exame preliminar.

Identificação do cadáver:

Se não for possível a identificação visual, não vamos logo para os exames de perfil genético,
que são caros e necessitam do ADN de alguém com o qual comparar. Daí ser importante
recolher o máximo de informação que auxilie na identificação.

Se não existir uma ficha dentária para comparação, fazer o registo total da dentição não é
muito útil, a não ser que se trate de características muito visíveis e particulares.

Se a cadeia de custódias não for preservada, toda a investigação pode ser prejudicada: se um
vestígio for recolhido, tem de se saber quem é que o recolheu, quem é que o enviou para
análise, etc. → evitar adulterações.

Elaboração de uma hipótese sobre a causa e etiologia médico-legal:

a) Suicídio
b) Homicídio
c) Acidente →o diagnóstico de acidente, normalmente, é por exclusão.

Enforcamento: não se deve retirar o meio de suspensão, ou pelo menos, deve ser enviado
sempre para análise. A suspensão incompleta é a mais comum.

Toxicodependência: a agulha não serve para nada e é um risco para se transportar; já a seringa
pode ser muito importante. Pode dar informações sobre substâncias que estivessem
misturadas na droga, podendo indicar qual o país ou o traficante através do qual a droga
chegou ao indivíduo.

Varizes esofágicas: causadas pelo abuso de álcool, fazem com que o sangue seja expelido pela
boca.

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Carboxihemaglobina: para saber se houve morte por inalação de monóxido de carbono; não
faz parte das análises normais e só é pedido se existir informações sobre as circunstâncias da
morte que indiciem a sua relevância.

A lei diz que, quando a autópsia é ordenada, deve ser enviada toda a informação relevante
juntamente com o ofício que a ordena.

4) PATOFISIOLOGIA DA MORTE/VERIFICAÇÃO E CERTIDÃO DO ÓBITO

A verificação e certificação do óbito só podem ser feitas por um médico inscrito na Ordem.
Mas quando é que alguém está morto (point of no return)?

Conceito biológico: processo que leva a unidade biológica a deixar de funcionar. É contínuo, os
órgãos e tecidos não se tornam inviáveis todos ao mesmo tempo (daí que na colheita de
órgãos haja uma ordem a seguir).

Antes, falava-se em 4 fases da morte; hoje, em dois conceitos:

a) Morte somática: permite que a função respiratória e circulatória se mantenham, mas


durante pouco tempo. O sistema nervoso central vai acabar por deixar de funcionar.
b) Morte celular: deterioração das células, anóxia (falta de oxigénio).

Conceito de morte clínica:

a) Morte cardio-vasculatória ou cardíaca


b) Morte tronco-encefálica ou cerebral

Durante muito tempo era pela falta de bater do coração que se aferia a morte; depois
passamos para outras artérias – o artigo 2.º da Lei 141/99 refere-se à morte cerebral.

VERIFICAÇÃO DO ÓBITO

Lei 141/99 – no artigo 2.º, já fala de morte cerebral. Não sendo uma situação da Lei 25/2009,
devia ser o delegado de saúde a fazer a verificação (problema de quando a pessoa é
encontrada morta).

Cessando as duas funções vitais (circulatória e respiratória), surgem os sinais positivos de


morte ou negativos de vida, que não se confundem com os sinais de certeza de morte.
Excluem-se destes sinais certas situações que reduzem as funções vitais ao mínimo:

✓ Hipotermia
✓ Intoxicação por fármacos ou qualquer outro tóxico que diminua o SNC
✓ Alterações endócrinas ou metabólicas.

Sinais Positivos de Morte:

✓ Ausência de movimentos inspiratórios


✓ Ausência de batimento cardíaco
✓ Ausência de resposta a estímulos dolorosos

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✓ Ausência de movimentos
✓ Ausência de reflexos
✓ EEG isoeléctrico

Lei 141/99 – certificação do óbito:

-Artigo 2.º: o conceito de morte é o de morte cerebral

-Artigo 3.º e 4.º: quem verifica a morte é o médico; ou aquele a quem estiver cometido a
responsabilidade do doente; ou o que chegar em 1.º lugar

→ se o indivíduo não estava morto e foi accionado o INEM – médicos das emergências

→ se o indivíduo for encontrado cadáver, dependerá de autoridade policial.

- O óbito deve ser verificado com base em critérios médicos → estes critérios não existem
(apenas para a morte cerebral), logo é de acordo com as práticas médicas

- Não existe impresso próprio para a verificação do óbito.

No caso de morte cerebral, existem critérios próprios:

✓ Requer a demonstração da cessação das funções do tronco cerebral e da sua


irreversibilidade.
✓ É necessária a realização de, no mínimo, 2 conjuntos de prova; e por 2 médicos
especialistas.

Morte cerebral: conceito que já tem umas décadas, tendo surgido pela evolução das
tecnologias que permitem manter um individuo ventilado (meios de suporte artificial de
sustentação). Também o transporte dos doentes era muito mais difícil e as ambulâncias não
tinham material; hoje, o transporte é mais rápido e temos equipamento de manutenção da
pessoa.

É uma situação de coma profundo devido a uma lesão irreparável, sem função do SNC. É
necessário a sua demonstração.

A prova da apneia: um dos meios desencadeadores do processo de respiração é a subida da


concentração de dióxido de carbono. Confirma-se a ausência de respiração espontânea.

A verificação da morte cerebral ocorre em ambiente hospitalar, pois implica que o indivíduo
esteja “ligado às máquinas”.

Registo Nacional de Não Dadores: temos um sistema de opting-out, somos todos dadores até
expressarmos declaração em contrário.

CERTIFICAÇÃO DO ÓBITO

O certificado é assinado pelo médico e deve ser inteiramente preenchido por ele (é comum o
médico colocar só o seu nome e rúbrica e o restante ser preenchido pelo agente funerário).
Vincula profissional e legalmente o médico.

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Causa da morte: (deve ser expressamente referida) – OMS recomenda distinção

✓ Directa (instrumento que produziu a lesão): lesão traumática ou doença.


✓ Básica (na ML, circunstância que originou lesões – etiologia): está na génese, levou ao
acontecimento.
✓ Intermédia: conexiona os outros dois (pode não existir).

Deve ser expressamente referido:

✓ Identidade completa do falecido


✓ Causa de morte
✓ Distinguir mecanismo de morte de causa de morte.

Causa directa → instrumento

Causa básica → etiologia

Em Portugal, as estatísticas são feitas com base nas causas básicas.

Data e hora do óbito: deveria ser a data e hora da verificação do óbito (e não do óbito), pois
assim seria mais correcto – na data do óbito haverá falta de rigor, com possíveis implicações a
nível sucessório.

Na verificação do óbito, constata-se que a pessoa está morta; já a certificação é um papel no


qual se indica a causa de morte. Estas podem constituir um acto único:

- A morte ocorre no domicílio, com assistência médica, e é possível estabelecer com segurança
a causa. Exame hábito externo sempre obrigatório, e em caso de dúvidas, autópsia médico-
legal.

-A morte ocorre em estabelecimento de saúde e o médico assistente chega a um diagnóstico.


Se não houver diagnóstico seguro deve ser pedida autópsia.

Será um acto distinto quando…

- XXX das autópsias médico-legais;

- mortes súbitas, ignoradas ou violentas;

- um médico verificou o óbito e houve lugar a autópsia médico-legal

> o perito passa a certidão depois da autópsia;

> se já tiverem passado certificado e a autópsia revelar elementos para a causa de


morte, deve ser passado novo certificado (salvo se o T já foi entregue no registo civil).

O certificado de óbito deve ser emitido após a realização da autópsia ML (ou da decisão da sua
dispensa).

Dispensando-se a autópsia, a causa da morte deve ser indicada como desconhecida, o que
pode levantar problemas a nível de seguros.

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Há conservatórias que, já tendo um certificado antes da autópsia, querem que lhes passem
outro no fim – isto não é permitido, não se passam segundos certificados.

Começou a pensar-se, já em 2008, no âmbito das medidas simplex, em desmaterializar-se os


certificados de óbito (SICO). A entidade requisitante da autópsia é a detentora do processo, é
ela que deve indicar a causa da morte.

Lei 15/2012 – instituiu o SICO.

5) SINAIS DE MORTE/FENÓMENOS CADAVÉRICOS

Os sinais de certeza de morte ou fenómenos cadavéricos levam a manifestações a observar no


cadáver, que levam à degradação do corpo.

Dividem-se em:

a) Imediatos
b) Tardios

A) Imediatos:

- Arrefecimento

- Desidratação

- Rigidez

- Livores

1. Arrefecimento cadavérico: maior utilidade nas primeiras 24h para determinar o


intervalo post-mortem (tempo que decorre desde a morte até começar a ser observado).
Utilizável nos climas temperados.
✓ Início pela cara, mãos e pés
✓ Pode acontecer que aqueça em vez de arrefecer – hipotermia post-mortem.
Exemplo: bactérias, perturbações da regulação térmica.
✓ Diferentes formas: condução, convecção, irradiação.
✓ Há uma grande variabilidade nos tempos considerados:
o Planalto inicial: mantém a temperatura que tinha na altura da morte
o Depois vai até à temperatura ambiente

A lei de Newton não se pode aplicar totalmente ao corpo humano.

✓ Dois principais problemas:


o Desconhecimento da temperatura do corpo no momento da morte
o Desconhecimento do planalto post-mortem

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✓ Tacto e termómetro: nomograma de Henssge: permite fazer uma estimativa do
intervalo post-mortem através da temperatura ambiente e do peso do cadáver. Há
factores de correcção consoante o indivíduo está vestido ou não.
✓ Há factores que vão influenciar o arrefecimento do cadáver: causa da morte; factores
individuais; ambientais.

2. Rigidez: A evolução é

-Período de fluidez primária

-Período de estado – rigidez → o corpo fica completamente hirto e há necessidade de


desfazer a rigidez na sala das autópsias.

-Período de flacidez secundária

Influência: múltiplos factores → intrínsecos; extrínsecos.

O calor leva a que a putrefacção se inicie mais rapidamente, pelo que, embora acelere a
rigidez, também faz com que ela passe mais depressa.

Evolução:

✓ 2-4h: início
✓ 6-12h: completa
✓ 13-24h: intensidade máxima
✓ 36h: desaparece

- Inicia-se nos músculos da face

- Factores de variação da rigidez cadavérica

- Espasmo cadavérico: formação da rigidez sem haver passagem pelo fenómeno de flacidez
primária (ex: disparo por arma de fogo). Pode ser localizado ou generalizado (raríssimo).

3. Desidratação cadavérica: Leva a uma série de fenómenos a observar no cadáver.

✓ Perda de peso: não significativa num indivíduo adulto, mas num recém-nascido ou
criança de pouca idade é um fenómeno apreciável.
✓ Apergaminhamento cutâneo: áreas escoriadas, de pele fina. Não tem nada a ver com
lesões traumáticas, mas estas podem ficar mais visíveis.
✓ Desidratação das mucosas: sobretudo nos lábios do recém-nascidos e na vulva de
crianças de pouca idade.
✓ Fenómenos a nível ocular:
o Opacificação da córnea: pode até dificultar a determinação da cor;
o Mancha esclerótica de Sommer-Lancher: começam a ver-se as camadas mais
profundas, geralmente quando o indivíduo morre com os olhos abertos;
o Afundamento do globo ocular, devido à diminuição da tensão ocular.

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4.Livores (matéria de exame): Quando um indivíduo morre, o sangue não é bombeado e vai
depositar-se nas zonas de declive, em que vão aparecer manchas com tonalidades variadas. O
seu aspecto e a sua intensidade estão condicionadas pela causa da morte e pela posição:

✓ Cor: dá pistas sobre o que pode estar na origem da morte (exemplo: intoxicação por
monóxido de carbono → vermelho forte)
✓ Intensidade
✓ Localização

✓ Formam-se nas zonas de declive, mas que não estejam sujeitas a pressão
✓ Evolução: começam a formar-se entre 15 a 30 min depois da morte.
o Nas primeiras horas temos os livores móveis (sangue ainda muda de sítio). Até
6h. Ponto o dedo, deixa marca branca.
o Livores semi-móveis.
o Livores fixos: até 12h. Significa que já passou tempo suficiente para a sua
fixação. Pode dar pistas quanto à etiologia daquela morte e indica eventual
mudança de posição no cadáver.
✓ Nem sempre podem ser fáceis de ver. Ex.: cor da pele (raça negra); indivíduo
queimado; com grande perda de sangue; afogado numa zona de grande turbulência (o
sangue está sempre a movimentar-se, não se depositando na zona de declive).
Hemorragia interna/externa → sangue não está nos vasos.

Livores paradoxais: não concordantes com a posição de cadáver, mas não devidas à acção de
terceiro. Ex.: morte súbita e asfixias.

Hipostases viscerais: designação que se dá a este fenómeno nos órgãos.

Púrpura hipostática: frequentes nos enforcados que ficam muito tempo dependurados, em
que o sangue nas extremidades leva ao rebentamento dos vasos devido à pressão (fica com
pintinhas na pele).

Cronotanatodiagnose: tempo que passou depois da morte, possibilidade de fazer estimativas.

o Corpo quente e flácido <3h


o Corpo quente e rijo 3-8h
o Corpo frio e rijo 8-36h
o Corpo frio e flácido >36h

B)Tardios

o Destrutivos:
o Autólise
o Putrefacção
o Conservadores:

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o Mumificação
o Saponificação Não são os únicos, temos também a congelação, por exemplo

FENÓMENOS DESTRUTIVOS:

Autólise: Aquando da morte, vai haver uma série de fenómenos de fermentação no interior
das células e que vão levar à sua destruição. Verifica-se em todas as células do organismo, mas
não evolui à mesma velocidade em todas elas.

✓ Sangue
✓ Bílis
✓ Pâncreas (tem muitas enzimas, entrando em autólise rapidamente)
✓ Esófago
✓ Estômago
✓ Encéfalo

Putrefacção: é um processo de fermentação pútrida de origem bacteriana, é consequência da


actividade bacteriana e enzimática. Aparece no seguimento do fim da autólise por atracção
das enzimas sobre si próprias. Evolui em 4 fases:

✓ Há a libertação de substâncias
o Gases
o Ácidos
o Sais de amónio
o Ácidos aminados
o Corpos cromáticos sem nitrogénio
o Ptomaínas: pode dar resultados cruzados com a determinação da taxa de
alcoolémia

✓ Evolução normal:
o Período colorativo ou cromático (horas) Estes tempos não são
o Período enfisematoso (dias) taxativos, depende
o Período coliquativo ou de liquefacção (meses) das condições da
o Período esquelético (anos) morte.

1) Período cromático: mais ou menos 24h depois da morte (se não for posto a refrigerar).
Aparece uma mancha verde:
a. Pode não ser verde
b. Começa a formar-se na zona da apendicite, zona abdominal muito rica em
bactérias → fossa ilíaca direita
c. Começa a espalhar-se até o corpo ficar com uma tonalidade toda alterada
d. Variações topográficas e cronológicas

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2) Período enfisematoso: causado por gases que vão invadir os tecidos e vão da
profundidade para a superfície.
a. Incha a cabeça
b. Exoftalmia
c. Projecção exterior da língua
d. Distensão do tórax e abdómen
e. Distensão dos genitais masculinos
f. Prolapso rectal e vaginal, expulsão do feto em grávida.
3) Período coliquativo: pode durar vários meses, geralmente 8 a 10.
a. Epiderme separa-se da derme
b. Unhas saltam e cabelos soltam-se
c. Formam-se umas bolhas no corpo, com líquido escuro
d. Começam a escorrer líquidos do corpo
e. Gases vão começar a sair e corpo começa a perder volume
4) Período esquelético:
a. As partes moles do corpo vão, progressivamente, desaparecendo
b. Conjunto de órgãos e vísceras vai-se destruindo ao mesmo tempo, mas com
variações em função da resistência que a sua estrutura lhes confere
i. Elementos mais resistentes: tecido fibroso, ligamentos e cartilagens (o
esqueleto pode permanecer unido); nos órgãos: coração, traqueia e
brônquios; aparelho digestivo, próstata e útero.

Antes de se pedir a exumação do corpo, deve-se ver se o corpo foi autopsiado, pois aquando
da autópsia guardam-se manchas de sangue (amostras em arquivo).

Evolução da putrefacção:

a) Influências individuais:
a. Constitucionais (constituição física, idade)
b. Patológicas (causa da morte, processos patológicos)
b) Influências ambientais: humidade, frio, calor, arejamento e fauna.
a. Ao ar livre, a putrefacção evolui muito rapidamente.
b. Em iguais condições de tempo, uma semana de putrefacção ao ar livre
equivale a duas semanas na água e oito semanas em terra.
c. Secura → mumificação
Arejamento abundante → mumificação Corpo desidrata
Humidade considerável → saponificação rapidamente
d. O calor leva à aceleração da putrefacção

Auxiliares da putrefacção (fauna): entomologia forense.

✓ Consoante a fase de putrefacção, aparecem determinados elementos


✓ Colonização cadavérica por fungos
✓ Quanto à flora cadavérica, não parece haver uma cronologia típica (apenas nos
cadáveres exumados)

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A possibilidade de reconhecer lesões traumáticas pode ser dificultado devido à putrefacção:

✓ Alteração da coloração
✓ Torna difícil identificar as equimoses
✓ Pode haver lesões post-mortem, causados por animais – dificuldade em
perceber se são ante-mortem ou post-mortem

FENÓMENOS CONSERVADORES:

Naturais:

✓ Mumificação (pele seca)


✓ Saponificação (pele gordurosa) → as gorduras do corpo transformam-se parecendo
sabão
✓ Congelação

Artificiais:

✓ Embalsamento
✓ Refrigeração
✓ Congelação

6) FERIMENTOS: DESCRIÇÃO, DOCUMENTAÇÃO E MECANISMOS DE PRODUÇÃO

Agentes externos: é toda a fonte de energia física ou química externo capaz de produzir no
corpo humano lesões anatómicas e/ou funcionais – lesões traumáticas. A morte violenta
resulta de um agente externo.

Podem ser:

✓ Físicos: exemplo, calor (fogo, vapor); frio (localizado ou generalizado); electricidade e


determinados tipos de radiações → lesões traumáticas: queimaduras.
✓ Químicos: podem ser de várias naturezas (ácidos, bases, sais – ex.: lixivia). Podem ser
localizados → lesões traumáticas: queimaduras químicas.
✓ Biológicas: não temos em Portugal muitos agentes biológicos, mas temos alguns
(insectos, medusas) → lesões traumáticas: queimaduras.
✓ Mecânicas: exercem acção de natureza contundente, cortante ou perfurante (ou ainda
mista). Nem sempre provoca dano, este só surge quando a intensidade da força
aplicada ultrapassa a capacidade de resistência dos tecidos.
o Temos vários factores de variação da força em jogo, como:
▪ Massa do corpo actuante
▪ Velocidade do impacto
▪ Área de aplicação da força
▪ Natureza dos órgãos alvo → o 1.º órgão a ser atingido é a pele

Agentes mecânicas:

16
❖ Acção de natureza contundente: contacto de um objecto duro, de superfície plana ou
romba, que vai atingir determinada superfície corporal e vai provocar determinado
dano com força e extensão variáveis.

Exemplo: pedras, martelos, tijolos, partes do corpo humano (cabeça, mãos, unhas, pés
e dentes), superfícies de embate (solo, paredes, embate na superfície aquática,
automóveis, árvores).

❖ Acção de natureza cortante: um instrumento entra em contacto com a superfície


corporal e na lesão que daí resulta vai predominar o cumprimento.

Exemplo: instrumentos que tem um ou mais grumes (lâminas, facas, arestas de vidro
ou cerâmica), etc.

O mesmo instrumento pode actuar de diferentes formas – exemplo da garrafa:


✓ Interna: bate na cabeça de alguém – contundente
✓ Partida: contra a pessoa – cortante

Classificamos em função das lesões que daí resultem.

❖ Acção de natureza perfurante: causado por objectos compridos e finos. Caracteriza-se


por um contacto punctiforme ou circular do objecto com o corpo humano em que
predomina a profundidade.

Exemplo: injecção, alfinetes, agulhas, varetas dos chapéus de chuva.

❖ Acção de natureza mista: conjugação da forma de actuar das 3 anteriores formas.

Exemplo: acção cortante + perfurante → faca, punhal, canivete, navalha, etc.

Instrumentos corto-perfurantes

Exemplo: acção cortante + contundente → machado, sabre, enxada

Instrumentos corto-contundentes

Exemplo: acção perfurante + contundente → Projécteis de armas de fogo

Instrumentos perfuro-contundentes

Tipos de lesões consoante os instrumentos: (lesões com que actuam)

o Lesões por instrumentos contundentes: quando utilizados em agressões, geralmente


são ocasionais, não revelando intensão prévia (estão no local e são usadas).
▪ Lesões traumáticas externas Não tem grande importância clínica,
• (1)Contusão superficial mas tem uma grande importância
• (2)Abrasão médico-legal, pois é com base nestas
que se vai determinar o que resultou
do evento traumático e daí vai
elaborar-se o relatório → dão uma 17
informação importante sobre vários
aspectos (direcção e sentido do
traumatismo, se houve luta, etc.)
• (3)Ferida contusa

▪ Lesões traumáticas internas


• (4) Contusão profunda
• (5) Fracturas ósseas
• (6) Laceração/esfacelo de órgãos

Externas:

(1) Contusão superficial: resulta quando há uma acção de natureza contundente exercida
sobre a superfície corporal, mas não há alteração do nível de pele, não há nenhuma
solução de continuidade a nível da epiderme. Nestas lesões temos rotura de vasos
com extravasamento de sangue que infiltra os tecidos (equimose); ou ainda colecção
de sangue em cavidade neoformada (hematoma).
Exemplo: murro (corpo humano a actuar como instrumento contundente). Não é
necessária a intervenção de terceiro, como no choque de automóvel em que os órgãos
chocam nos ossos. Pode estar associado a escoriações (ex.: murro com anel).

(perante uma contusão, temos de fazer alguns diagnósticos diferenciais, nomeadamente com
equimoses resultantes de processos patológicos e com livores).

A coloração das equimoses vai variando (não visíveis → vermelho violáceo → azulada →
esverdeada → amarelada → desaparece), mas a evolução da coloração depende de vários
factores, como a quantidade de sangue que saiu ou o local da equimose. Não é possível o
médico-legista datar a equimose, mas o facto de encontrar equimoses com várias colorações
pode ser importante, nomeadamente em casos de maus-tratos (permite afirmar que as lesões
se deram em vários dias). Outro exemplo: equimoses em caso de homicídio podem revelar
necessidade de imobilização da vítima – logo, estava consciente.

Pode não ser equimose, mas sim infiltração sanguínea → o sangue vai-se infiltrando nos
tecidos, e vai descendo por força da gravidade para zonas que não são das lesões.

(2) Abrasão: a acção é exercida de forma oblíqua. Aqui já há alguma coisa que se vê na
pele, já há uma solução de continuidade (ferida).
a. Escoriação (resulta muitas vezes de deslizamento sobre o solo – exemplo,
acidente de mota) ou lesões de arrastamento.
b. Esfoliação: é só na pele, não há sangue.

(3) Ferida contusa: produção de lesões em todas as camadas da pele (às vezes o agente
actua de dentro para fora, como o caso de fractura que fura a pele).

Para além destas lesões temos ainda:

✓ Lesões modeladas: permitem a identificação do instrumento que a produziu. Ex:


forma da mão, marca de pneu.

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✓ Estigmas ungueais: resultam da acção das unhas na pele (podem ser lesões auto-
infligidas).
✓ Mordeduras: podem deixar marcas na pele de equimoses ou escoriações. Ex.: casos de
agressões sexuais para apanhar matéria genético.

Internas:

(4) Contusão profunda: produzida por um traumatismo de grande intensidade, que dá


origem a uma infiltração hemorrágica. Pode associar-se ou não a escoriações
/contusões na pele → é preciso investigar a existência de lesões profundas.

(5) Laceração/esfacelo de órgãos: laceração → ainda se pode ver o órgão; esfacelo → o


órgão está completamente destruído.

(6) Fracturas ósseas: lesões contusas que provocam uma solução de continuidade do
osso.

o Lesões por instrumentos cortantes e perfurantes: temos aqui as chamadas armas


brancas (+7cm) e lesam a superfície corporal por meio de um gume, ponta ou ambos.
▪ Tipos de Lesões:
• Ferida incisa, causada por instrumentos cortantes (bisturi)
o Cauda de rato (extremos) – inicial/de ataque (ferida
mais superficial) e terminal/de saída (mais comprida
→ permite saber a direcção e sentido da agressão)
o Morfologia variada

Uma agressão com arma cortante é uma agressão dinâmica, pois a pessoa vai-se tentar
defender, logo as feridas são irregulares. Às vezes é possível tirar algumas informações dos
ferimentos.

• Ferida perfurante, lesão em túnel ou em canal para a


profundidade.

Importância da capacidade elástica da pele (se o instrumento for suficientemente grosso para
ultrapassar a capacidade elástica, torna-se um orifício com orla de contusão em forma de casa
de botão):

✓ Feridas corto-perfurantes: ferida incisa + lesão modelada ou figurada


✓ Feridas corto-contundentes: ferida incisa + contusa. Não tem cauda de rato que surge
nas feridas incisas.

o Lesões por instrumentos perfuro-contundentes: tem sempre ferida de entrada, podem


ter ou não lesão de saída. Habitualmente tem uma orla de contusão, através da qual
se consegue determinar a direcção em que o projéctil embateu na vítima (orifício de
entrada; o de saída em regra não tem orla de contusão).

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Problemas Médico-Legais:

1) Lesões produzidas em vida ou em morte?


Ex.: produzidas em vida – infiltração sanguínea dos tecidos, retracção dos
tecidos, formação de crosta, supuração (características vitais) → caso
subsistam dúvidas, emprego de métodos histológicos e/ou bioquímicos.
Ex.: produzidas depois da morte: “placas apergaminhadas” (fenómeno de
desidratação)

2) As lesões podem ajudar a determinar a etiologia médico-legal:


Homicídio Necessário conciliar as características das feridas com outras
Suicídio informações (exemplo, exame do local)
Acidente

➔ Acidente: normalmente, é um diagnóstico de exclusão.


➔ Suicídio: vai atingir locais que se sabe que são potencialmente mortais. Normalmente
os ferimentos são compatíveis com os gestos das vítimas e muitas vezes há as feridas
de ensaio (feridas pouco profundas na proximidade da ferida principal). Vestuário é
poupado (exemplo, puxa a camisola antes de cortar o pulso).
➔ Homicídio: muitas vezes as lesões são múltiplas, podendo haver lesões de defesa da
própria vítima (activa, ex: tenta agarrar a faca; passiva, ex.: tenta-se proteger).
Geralmente as feridas são mais extensas e profundas; e o vestuário é danificado.

3) Identificação da arma:
✓ Determinar a natureza do instrumento: em regra, apenas se pode determinar
a natureza
✓ Havendo um instrumento suspeito, o perito pode pronunciar-se sobre se ele
pode ou não ter produzido as lesões
✓ Só num número restrito de caos é que é possível determinar um instrumento
específico → caso das lesões modeladas.

4) Ordem de produção dos ferimentos.


5) Posição relativa entre agressor e vítima (ex.: estigmas ungueais) – por vezes, é possível
determinar atendendo a alguns elementos como local e direcção da ferida e estatura
de ambas.
6) Violência das lesões – número e profundidade das lesões, assim como grau de
destruição tecidular

Classificação dos instrumentos

o Etiologia médico-legal acidental: nos acidentes de trabalho e aviação, os instrumentos


geralmente são contundentes; há acidentes domésticos/trabalho nos quais estão
envolvidos instrumentos cortantes ou corto-perfurantes; acidentes de casa,
instrumento perfuro-contundente.

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o Etiologia médico-legal suicida: podem ser contundentes (exemplo, queda de local
elevado); corto-perfurantes ou cortante (degolação); ou perfuro-contundente (arma
de fogo).
o Etiologia médico-legal homicida: contundente (objectos actuando sobre a cabeça);
cortante ou corto-perfurante (facas/punhais actuando sobre o pescoço ou tórax);
perfuro-contundente (armas de fogo).

Lesões auto-infligidas: frequentemente não fatais. O diagnóstico baseia-se em: características


e localização da lesão; acessibilidade da zona; fisiopatologia e mecanismo lesivo, etc.

➔ Lesões auto-infligidas sem ser suicidas:


- Elementos que sugerem
- Importância de conjugar o vestuário com as lesões
- Autópsias, importância da toxicologia e de etiologia
- Poupam os lábios, olhos e mamilos

Características das feridas incisas auto-infligidas:

- Cortes superficiais

- Em áreas não sensíveis

- Incisões regulares, com profundidade, igual na origem e no término

- Cortes múltiplos e paralelas

➔ Lesões auto-infligidas com o propósito de fraude de seguro:

-Mutilações, geralmente de dedos das mãos (polegar e indicador), corte direito.

7) ASFIXIAS MECÂNICAS/QUEIMADURAS

Asfixias Mecânicas

Conceito: “falta de ar”; “falta de oxigénio”. Etimologicamente: falta de pulso. Houve uma fase
em que se considerava que, perante um quadro de sinais gerais, havia sempre um caso de
asfixia.

Sinais gerais:

✓ Petéquias: extravasamento de sangue a nível da conjuntiva ocular e da mucosa oral.


✓ Congestão: aumento da pressão venosa, que leva ao aglomerar do sangue.
✓ Cianose: a hemoglobina junta-se ao dióxido de carbono, ficando com uma cor
arroxeada.
✓ Engorgitamento do coração direito
✓ Fluidez sanguínea

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Chama-se a este conjunto “obsolete quintet” porque, se antes se achava que perante este
quadro teríamos sempre um caso de asfixia, hoje sabe-se que não são específicos desta causa
de morte.

Classificação:

➔ Compressão externa do pescoço:


o Enforcamento
o Estrangulamento por laço
o Esganadura
➔ Sufocação:
o Decréscimo de afluxo de oxigénio aos tecidos
o Oclusão extrínseca (engasgar-se com comida)
o Oclusão intrínseca
o Compressão toraco-abdominal (multidão)
o Confinamento ou carência de ar respirável
➔ Afogamento

Compressão externa do pescoço:

o Enforcamento:
✓ Típico (nó do enforcado em execução) ou atípico (mais frequente, o nó encontra-
se à frente ou de lado)
✓ Estando de pé, os livores vão-se depositar nas zonas de declive (membros
Hábito Externo

superiores e inferiores – em “luvas” e “meias”). Se já estiverem fixos, não é


possível simular a morte pendurando-o .
✓ Máscara equimótica – cor arroxeada; língua fica escurecida.
✓ Há contracções até à morte, que podem causar escoriações, o que não significa
necessariamente a intervenção de terceiro.
✓ Duplo nó que trilha a pele – sulco duplo (raro)
✓ Para haver lesões a níveis das vértebras, teria de haver mais violência como os
H. Interno

caos em que todo o peso do corpo causa maiores lesões.


✓ Linha argêntea: corresponde na parte da dentro onde está a lesão fora
✓ Equimose retrofaríngea: infiltração sanguínea.

o Estrangulamento por laço: Difere do enforcamento por ser devido a acção


independente do peso do corpo. Implica ajuda de alguém ou um artifício complexo
(basta o sujeito perder a consciência).

✓ Hábito externo:

- Congestão ou palidez: depende de como for feita a compressão.

- Sulco horizontal

o Esganaduras: a etiologia médico-legal é de homicídio, e não de suicídio. Caracteriza-se


pela constrição do pescoço por meio das mãos. A maior diferença de pressão leva a
lesões mais fortes e visíveis.

✓ Hábito externo:

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-Escoriações

-Exoftalmia: profusão dos globos oculares para fora.

o Sufocação:
✓ Oclusão (extrínseca) – exemplo: plástico, fita adesiva
✓ Obstrução (intrínseca) – exemplo: bolo alimentar, objectos vários
✓ Compressão – hábito externo + exuberante (petéquios abundantes; máscara
equimótica; hemorragia nos ouvidos e nariz)
✓ Confinamento – espaço reduzido, com quantidade de oxigénio limitada.

o Afogamento: intromissão de mais líquido, normalmente água, no interior das vias


aéreas. Não é preciso que a água chegue aos pulmões – afogamento seco, em que a
água toca a laringe e esta reage (espasmo da laringe). O cadáver flutua em virtude de
fenómenos putrefactivos (libertação de gases).

A morte por afogamento é um diagnóstico de exclusão – água e fogo são muitas vezes são
usados para esconder outras situações.

Exame histológico – tira-se fragmentos do pulmão para serem processados e depois


observados ao microscópio. No exame toxicológico, o material mais importante é o sangue.

Queimaduras

Temos 3 graus para os vivos, mas 1 para os cadáveres:

✓ 1.º grau: formação de bolhas, por líquido que entra no espaço entre a epiderme e
derme e que a destaca (raros)
Diferente: no 3.º grau o vivo já não sente
✓ 2.º grau
✓ 3.º grau: pode chegar à hipoderme dor pela afectação das terminações
✓ 4.º grau: para os cadáveres nervosas

Grau:

- 1.º Grau:

o Limitadas à camada superficial


o Eritema e edema (inflamação cutânea)
o Bolhas (flictenas) por descolamento da epiderme (raras)

- 2.º Grau:

o Destruição da espessura total da epiderme e parte da derme


o Formação de flictenas
o Tendem a respeitar anexos cutâneos (pêlos)

- 3.º Grau

o Necrose de pele com formação de escara


o Destruição dos tecidos cutâneos
o Ausência de flictenas
o Aspecto apergaminhado, esbranquiçado, amarelada e acastanhada.

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-4.º Grau:

o Destruição dos tecidos profundos incluindo gordura, músculo e osso.

Como produzimos queimaduras?

➔ Agentes biológicos
➔ Agentes químicos: são corrosivos, produzindo a destruição das células. Os ácidos
levam à corrosão das proteínas, mas a estrutura mantém-se; as bases alteram a
estrutura celular.
➔ Agentes físicos:
o Gases: ao absorvê-los, faz com que o contacto com a pele seja maior
o O frio leva à constrição dos vasos e morte dos tecidos.
o Electricidade: ponto de entrada seco e amarelado
o Radiações ultravioleta

Muitas vezes é preferível uma queimadura de 2.º grau pouco extensa, do que uma de 1.º grau
muito extensa – pode causar alterações na pele a nível das defesas. As proteínas começam a
esvaziar-se, impedindo que o plasma passe para fora das células – pessoas inchadas, maior
risco de infecção.

Identificação do cadáver:

✓ Dentição – principal (se houver factores de diferenciação)


✓ Impressões digitais
✓ Material genético – pode ser retirado através dos dentes ou das unhas

Para o diagnóstico diferencial, pode ser importante fazer antes da autópsia uma radiografia
completa. O halo inflamatório pode indicar um espaço temporal de vida em contacto com o
fogo.

Posição de pugilista: contracção dos músculos dos membros superiores. Pensava-se indicar
uma posição de defesa, mas na verdade é resultante desta contracção das fibras musculares.

8) LESÕES POR ARMAS BRANCAS/POR ARMAS DE FOGO

Lesões por armas brancas

Definição: todo o instrumento lesivo possuidor de uma ou mais lâminas. O artigo 2.º da Lei
5/2006 dá uma definição jurídica. Também o Acórdão da Relação Porto 13/12/2006. Existe
uma grande panóplia de armas brancas.

Tipos de instrumentos/ferimentos:

1. Cortantes: lesões incisas ou cortantes - actuam por deslizamento


2. Perfurantes: lesões perfurantes – a dimensão principal é a profundidade
3. Corto-perfurantes: exercem pressão sobre a pele; tem uma lâmina ou duas. Ex.: faca.
A pele é o órgão que mais resiste a seguir ao osso.

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Linhas de Langer: se o corte for no mesmo sentido, a ferida será menor. Se for em
sentido oposto, transversal ou longitudinal, a ferida abrirá mais.
4. Corto-contundentes: implicam uma dimensão de peso (guilhotina).

A arma em contacto com o osso pode, por vezes, partir-se, sendo importante fazer uma
radiografia. A toxicologia forense também é relevante para saber se há determinadas
substâncias no organismo que podem ter sido por força das feridas.

Etiologia médico-legal:

✓ Homicídio
✓ Suicídio
✓ Acidente

Lesões de defesa: implicam que a vítima esteja inconsciente e não imobilizada. Instintivamente
tendemos a defender-nos de modo a deixar livre a mão com a qual conseguimos fazer outra
coisa (daí a maioria das lesões seja no braço esquerdo).

➔ Classicamente localizadas nos antebraços e mãos.


➔ Equimoses/fracturas/feridas incisas.
➔ Defesa activa ou passiva.

Lesões auto-infligidas:

➔ Normalmente do lado contrário da mão dominante (lateralidade)


➔ Pouco profundas
➔ Paralelas mas sem relação com as outras

Lesões por armas de fogo:

Tecnologicamente criados a partir de uma pedra, tem-se tornado cada vez mais pequenas,
resistentes e velozes.

Classificação das armas de fogo

1. Tipo de cano
a. Cano curto
i. Revólveres
ii. Pistolas
b. Cano longo
2. Tipo de carga
a. Projécteis únicos
b. Projécteis múltiplos
3. Constituição
a. Típicas: produzidas por fábricas
b. Atípicas: improvisadas
4. Mecanismo de disparo
a. Disparo único

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b. Semi-automática: parte da energia impulsiona a munição e outra parte
recarrega; depois é necessário pressionar o gatilho novamente
c. Automática

Trata-se aqui de energia cinética; o dano é criado pela transferência dessa energia para o
corpo atingido, havendo tanto mais energia quanto mais pólvora e velocidade.

Elementos que integram o disparo

✓ Pólvora
✓ Bucha (pode provocar queimaduras)
✓ Projéctil:
o Único (bola)
o Múltiplos (grãos de chumbo)

Dentro da pólvora, temos vários componentes: (resultam da explosão da pólvora)

✓ Gases explosivos
✓ Chama
✓ Grãos de pólvora (podem funcionar como um projéctil)
✓ Negro de fumo

Mecanismos lesionais: dependem da acção conjugado de:

➔ Interacção mecânica entre os tecidos e os projécteis


➔ Efeitos da cavidade temporária

Ao embater no corpo, a energia vai ter de dispersar. Há um elemento de alargamento, tanto


maior quanto mais elevada a velocidade, seguido de um fecho dos tecidos, que são elásticos
→identifica lesões a grandes distâncias.

Qual a distância do disparo? Dependerá do tipo de arma, pelo que é necessário exames de
balística.

Feridas por armas de cano curto:

➔ Contacto: com o contacto com o corpo, tudo o que sai do disparo vai para a derme do
corpo. O orifício de entrada no abdómen, sem osso, será diferente de um disparo no
crânio, onde se forma um padrão estrelado.
o Firme
o Sem pressão
➔ Curta distância: vemos pólvora à volta da entrada.
➔ Média distância: há negro de fumo, mas apenas até 30cm.
➔ Longa distância: morfologicamente, há apenas um orifício e uma orla de contusão.
Mas é possível um disparo a média distância aparentar ser feito a longa distância –
embatendo na roupa, o negro de fumo fica aqui, devendo o vestuário ser analisado
(sem ele, haverá dúvida)

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Orifício
Tatuagem:

-falsa (negro de fumo)

-verdadeira (queimadura) Orla de contusão

Os trajectos podem ser rectilíneos ou com desvios.

Há um desnivelamento entre o orifício de entrada (menor diâmetro por fora) e o orifício de


saída (menor diâmetro por dentro), ainda que tenha o mesmo padrão.

O que distingue o orifício de entrada do de saída? Haverá orla de contusão no de entrada; mas
nem todos os de saída têm tal orla, o que causa dificuldades interpretativas ao médico-legista.

A longa distância, as feridas são maiores – o orifício de entrada está em proporção com a
distância.

9) ANTROPOLOGIA FORENSE

Quando o cadáver não está fresco, saltamos para a parte da antropologia forense, que resolve
os problemas de identificação quando a identificação visual não é possível.

O esqueleto é um conjunto intacto, devido a fibroses, ligamentos que permitem os


movimentos nas articulações (ligação dos ossos). Com a putrefacção, os ligamentos destroem-
se e os ossos desarticulam-se. Relativamente à cabeça, os ligamentos são muito fracos, por
isso é natural que ela se desprenda, principalmente em zonas de declive.

Podemos ter casos em que os cadáveres não estão em decomposição, mas estão de tal forma
deformados que é impossível identificar. Também se estiverem carbonizados (posição de
pugilista).

A identificação positiva só é possível através dos elementos comparativos.

O perfil morfológico é a descrição das características do corpo, podendo levar a uma


identificação de presunção (não há comprovação científica de um perito), pode haver mais do
que um sujeito com possibilidade de correspondência aquele corpo.

Objectivos do exame de antropologia forense:

✓ Identidade do sujeito

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✓ Circunstâncias de morte
✓ Factos ocorridos antes e depois da morte

Metodologia:

✓ Determinar se os restos são humanos → os ossos podem estar fragmentados ou


queimados, pelo que se recorrem a técnicas especiais. São técnicas especiais:
o Peso dos ossos;
o Densidade óssea;
o Radiologia;
o Determinação do índice medular;
o Imunologia.
✓ Estabelecer o número mínimo de indivíduos
✓ Determinar os factores genéricos de identificação:
o Afinidade populacional
o Sexo
o Idade
o Estatura
✓ Determinar factores de individualização
✓ Determinar a data da morte
✓ Concluir sobre as circunstâncias da morte

Factores genéricos de identificação:

1) Determinação das afinidades populacionais: antes, pensava-se que as diferentes


manifestações morfológicas nos humanos correspondiam a espécies diferentes; o que
há são grupos raciais. Com o advento da biologia molecular e do ADN, entendeu-se
melhor a ideia de afinidades populacionais. Hoje em dia, as variações são cada vez
menos perceptíveis pela mistura de etnias → é a tarefa mais difícil e menos precisa de
qualquer análise forense.

Em termos ósseos, o crânio é a melhor parte para determinar as afinidades populacionais. É a


face que nos permite dar características raciais (estas não têm tradução a nível genético,
apenas morfológico).

2) Determinação do sexo: baseada na morfologia óssea depois da puberdade:


a. Robustez física: o esqueleto masculino é mais robusto, pelo que os ossos são
mais rugosos (devido à produção de hormonas sexuais).
b. Dimorfismo sexual: também se deve às hormonas. Os ossos da bacia são os
ossos mais dimórficos, por motivos da função reprodutora. Também os dentes
(mandíbula e sistema dentário).
3) Determinação da estatura: é feita através do método anatómico ou do método
matemático
a. Método anatómico (mede o esqueleto)
b. Método matemático (com base na correlação entre a estatura e o tamanho
dos ossos) → a correlação entre a estatura e o comprimento dos ossos é 0,8.

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A estatura é também uma manifestação de dimorfismo sexual → deve ser calculada depois da
determinação do sexo.

4) Determinação da Idade: até aos 20-25 anos, é fácil a determinação da idade porque as
alterações ósseas seguem uma cronologia óssea e diferenciada. A partir daí é
complicado, temos apenas os indicadores de degeneração óssea e dentária (dão
intervalos alargados). Em crianças e adolescentes recorre-se a:
a. Desenvolvimento dentário
b. Ossificação do crânio → desuso
c. Comprimento das diáfises e união das epífises às diáfises

Factores de individualização: através da aplicação de métodos comparativos permitem a


identificação positiva. Deve dar-se prioridade à morfologia sobre o perfil genético (através
destas raramente chegamos à identificação positiva):

✓ Traumatismos
✓ Patologias
✓ Lado dominante
✓ Sinais particulares
✓ Comparação fotográfica/radiográfica
✓ Reconstrução facial
✓ Marcadores genéticos

O acesso às doenças que afectaram o indivíduo é limitado, apenas podemos aceder às


patologias que afectaram o osso → a presença de lesões patológicas no esqueleto são uma
mais-valia para a identificação.

É preciso comparar os dados da perícia antropológica com os dados do desaparecido.

Determinação da causa e circunstância da morte:

➢ Os traumatismos, de acordo com o objecto que produziu a lesão, podem ser:


o Contundentes:
▪ Podem levar a dobragem óssea
▪ A lesão pode reflectir por vezes a forma e tamanho do objecto do
agressor
▪ Fracturas radiais e concêntricas
o Perfurantes
▪ Fracturas por irradiação
▪ Fracturas concêntricas
o Incisivas ou cortantes
▪ Tendem a ser mais longas que profundas
▪ À medida que a faca penetra vai cortando e dividindo o osso, ao
contrário do que acontece nas contundentes, em que o osso é
esmagado.

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Apresentam padrões diferentes, concordantes com o instrumento respectivo. No
entanto, “diferentes causas podem produzir as mesmas lesões, e diferentes lesões
podem ser produzidas pela mesma arma e/ou mecanismo”.

É preciso diferenciar entre lesões traumáticas peri-mortem, ante-mortem, e post-mortem:

✓ Ante-mortem: há regeneração óssea


✓ Peri-mortem: o osso está ainda elástico
✓ Post-mortem: xxx traumatismo tendem a ser irregulares porque não houve
regeneração.

Datação do esqueleto. É importante para:

✓ Âmbito civil: problemas de sucessão, seguros, etc.


✓ Âmbito penal: prescrição dos crimes (15 anos, 117.º a 120.º CP)..

Métodos:

✓ Morfológico
✓ Biológicos (entomologia forense)
✓ Físicos e químicos

A entomologia forense é o modo mais científico de fixar a datação. É a biologia que se dedica a
estudar insectos; há um tropismo das moscas para a matéria em decomposição, deixando nos
corpos larvas – havendo um círculo de metamorfose que nos pode indicar o intervalo pós-
morte. Tem de estar morto há x tempo, mas pode ter morrido há mais.

Circunstâncias da morte e causa da morte: na antropologia forense, é difícil atingir com


precisão a causa de morte, sendo mais seguro falar nas circunstâncias no âmbito da
antropologia forense.

A genética é reservada para os casos em que a morfologia é escassa e insuficiente. O ADN


pode ser:

1) Nuclear: está no centro das células, cada um com metade da informação do pai e
outra metade da mãe → é frágil, sendo difícil de extrair
2) Mitocondrial: está nas mitocôndrias que estão no citoplasma das células, herdando-se
da mãe – o citoplasma do óvulo não é interferido com informação genética de
espermatozóide →isto faz com que haja muitos poucos tipos deste ADN.

Com ADN temos de fazer estudos indirectos, na maior parte dos casos. É excelente para
diagnósticos de exclusão.

10) GENÉTICA FORENSE I

A genética forense foi a área que mais evoluiu nos últimos anos. É a única das ciências forenses
que consegue quantificar a força dos seus resultados. Nunca é possível chegar aos 100%, tal
implicaria estudar toda a população mundial. Na criminologia forense, temos a ideia “in dúbio

30
pro reu” – na falta de 100%, não se pode condenar ninguém. Porém, aqui 99,99% de certeza já
é muito mais fiável que 10 testemunhas. É muito importante quantificar, mas tal pode suscitar
duplas interpretações.

Quanto mais raro for o perfil encontrado na amostra, mais provável é que ele pertença a dada
pessoa.

Laboratório de polícia científica + institutos → os magistrados podem enviar a amostra para


qualquer um deles; quem tem a amostra ficará a estudar o caso.

Genética Forense → são três as suas áreas:

✓ Investigações de parentesco
✓ Criminalística biológica
✓ Identificação genética individual

Bases citogénicas:

Núcleo → 22 pares autossomas + 1 par de cromossoma sexual (46XX/


46XY)

Célula

Num cabelo, contudo, as células não têm núcleo, temos apenas ADN mitocondrial

Características dos marcadores genéticos: vamos procurar os marcadores que tenham alelos
mais distintos.

➔ Único “locus”: ao estudar uma característica, ela está em um único local dos nossos
cromossomas, sabendo previamente onde está a informação que queremos.
➔ Independentemente das condições ambientais
➔ Antes do nascimento: através da colheita do líquido amniótico, é possível fazer teste
de paternidade antes do nascimento.
➔ Polimorfismo
➔ Invariáveis durante toda a vida: pode não ser verdade em células genorais (?)

Antes da genética já havia testes de paternidade, através de outros marcadores (enzimas, etc).
1985: 1.ª vez que a genética foi usada com fins forenses, substituindo os marcadores clássicos.
A genética tem mais vantagens.

Perfil genético: provém da união de duas metades de 1 célula (23 pares cromossómicos
emparelhados). Só no par XY é que sabemos qual veio do pai e qual veio da mãe; nos
restantes, só depois de comparar é que sabemos.

Marcador genético: é um conjunto de bases, sendo que é a ordem em que se agregam que
nos torna diferentes (polimorfismo – de comprimento ou sequência). Está no mesmo locus, no
laboratório vamos estudar zonas específicas (todos temos a mesma localização de informação,
o seu conteúdo é que é diferente.

31
Locus: é a porção básica que um gene ocupa num cromossoma.

Alelo: é cada uma das formas alternativas com que o locus se expressa.

➔ Há um único locus: ao estudar uma característica, sabemos previamente onde está a


informação que procuramos. Variáveis são os alelos.

O alelo define-se pelo número de unidades repetitivas que tem; as amostras são separadas
pelo peso dos alelos, pois os maiores, com mais unidades, serão mais pesados. A corrente
eléctrica faz com que aí alelos se separem no gelo (electroforese).

Temos 2 tipos de ADN:

➔ ADN codificante: é uma minoria responsável pelo funcionamento do nosso corpo


(produz enzimas, proteínas, etc). É muito semelhante em todos nós, não interessando
à genética forense.
➔ ADN não codificante: é a maioria do nosso genoma; foi acumulando erros mas, como
não produz nada, foi-se mantendo com eles. É este que estudamos
o Não repetitiva
o Repetitiva
▪ Disperso
▪ Em tandem

Dentro do ADN não codificante, estudamos o ADN repetitivo em tandem, regiões do genoma
que têm áreas em que a base se repete e podemos distinguir pessoas pelo número de
repetições que há. Temos:

✓ Microssatélites: unidades repetitivas de 1-4 pares de bases 2-7 (devem ter 3-4)
✓ Minissatélites: unidades repetitivas de mais pares de bases 10-15 (foram
abandonados)

São os dois tipos de VNTR (variable number tandem repeats).

Se um alelo se repetir em 6 unidades repetitivas, é o alelo 6.

Investigações de parentesco: temos dois tipos de resultados

➔ Exclui a paternidade – A não é pai de B (exclusão de 1.ª ordem ou exclusão de 2.ª


ordem)
➔ Não se consegue excluir e A é pai de B com x% de probabilidade (cálculo de
probabilidade)

Exclusões:

a) De 1.ª ordem: ocorre quando há um alelo novo no filho que não existe na mãe nem no
pretenso pai

Pretenso pai: A+A

Exclusão de 1.ª ordem ou baseada na regra de Landstaner


32
Mãe: A+A

Filho: A+B

Aqui, as hipóteses são:

➔ O indivíduo não é o pai


➔ Forem uma mutação genética aquando da formação de espermatozóide e o alelo A
transformou-se em B → ocorre em 1/1000 espermatozóides. Podemos ultrapassar
este erro usando mais marcadores.

b) De 2.ª ordem: ocorre quando um pai não transmite um alelo que deveria
obrigatoriamente transmitir.

Pretenso pai: 1+1

Mãe:2+2

Filho: 2+2

Aqui temos duas hipóteses:

➔ Não é o pai
➔ Ocorre a transmissão de um alelo silencioso: quando o ADN está muito degradado e
não conseguimos encontra-las (alelos silenciosos são alelos que não são amplificados
na reacção de PCR). Quanto maior o marcador, maior probabilidade há-de ser
afectado pela degradação (os mais pequenos conseguem manter-se).

Estabelece-se a regra de que:

1. Quando não há exclusões, calcula-se a probabilidade de paternidade


2. Quando há apenas uma exclusão de 1.ª ordem ou até duas exclusões de 2.ª ordem,
retiramos os marcadores e calculamos a probabilidade sem ter em conta os
marcadores onde se verificam as exclusões.
3. Quando o número de exclusões é superior, ou seja, duas exclusões de 1.ª ordem ou
três de 2.ª ordem, considera-se provada a exclusão.

Nos marcadores clássicos, a regra era a de que, se tivéssemos 20 alelos em exclusão,


seguíamos para o cálculo de probabilidade. Porém com a genética actual temos mais exclusões
– podemos até ter três exclusões de 2.ª ordem, mas os restantes marcadores serem muito
próximos, e o pai ser um familiar próximo (quando o número de exclusões for elevado, mas
um marcador não der exclusão, pode ser um familiar próximo)

Cálculo de probabilidade: calcula-se com base no Teorema de Bayes, que é um teorema de


probabilidade condicionada – é a probabilidade de o indivíduo ser pai da criança, quando
comparado com qualquer homem da população.

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Equação de Essen Moller: a probabilidade de paternidade pode ser expressa em termos de
x/x+y ou como índice de paternidade x/y e será sempre acompanhada pela respectiva
tradução verbal de Hummel.

P= X/X+Y

X= probabilidade do resultado se for filho daquele homem.

Y= frequência do alelo transmitido pelo pai naquela população (isto é, probabilidade do


resultado se for filho de outro homem).

Quanto mais raro for o alelo transmitido pelo pai na população, ou seja, quanto mais baixo for
o denominador, mais alto será a probabilidade de ser pai. Porém deve-se usar sempre mais do
que um marcador: Probabilidade acumulada = X1+X2+….+Xi/ X1+X2+….+Y1+Y2

Escala de Hummel: foi estabelecida para os marcadores clássicos, exigindo-se no mínimo


99,73% → paternidade “praticamente provada”. Hoje, o mínimo exigido é 99,99% para a
paternidade se considerar provada. Não se chegando a este valor, devem estudar-se mais
marcadores. Quantos marcadores são precisos? Não sabemos – depende se são muito ou
pouco frequentes. Quanto mais raros, menos precisamos.

Porém, temos excepções, ou seja, casos em que não conseguimos 99,99%:

➔ O pretenso pai está desaparecido e a investigação tem de ser com amostras de


familiares
➔ O pretenso pai morreu, só tem ossadas, e não se consegue estudar todos os
marcadores necessários pois o ADN está degradado (só se conseguem estudar os mais
pequenos).
➔ Casos de violação – amostras intra-uterinas

O magistrado tem de questionar o laboratório sobre o porquê de não se atingir os 99,99%.

11) GENÉTICA FORENSE II – CRIMINALÍSTICA E IDENTIFICAÇÃO

Criminalística Biológica

Há um conjunto de regras para a colheita de amostras que se relacionam directamente com o


sucesso do resultado das análises. Cabe ao Procurador orientar os agentes da polícia para que
tais regras sejam cumpridas. Existem 3 principais cuidados a ter:

✓ (1) Evitar a degradação do ADN


✓ (2) Evitar a contaminação do ADN
✓ (3) Manter a cadeia de custódia

(1) Evitar a degradação do ADN: o ADN degrada-se se existirem bactérias, que destroem
as cadeias. Assim, devemos evitar a proliferação de bactérias evitando condições de
calor e humidade.

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Exemplo: mancha líquida de sangue → secá-la com secador de ar frio ou à
temperatura ambiente;
Se não enviarmos logo para o laboratório, colocar no frigorífico ou, em mais de 40h,
congelar. (a humidade e calor promovem a proliferação bacteriana)
Evitar a humidade colocando a amostra dentro de saco de papel e não de plástico!
(nunca de plástico)

(2) Evitar a contaminação do ADN: se houver mistura com outros ADN’s, isto vai alterar o
resultado. Fontes de contaminação:
a. ADN do próprio que faz a colheita → que deve evitar falar, tossir, colocar as
mãos em cima de amostra de ADN fresca, diminuindo a degradação. Ainda
usar máscaras, toucas e luvas.
b. ADN de outras amostras → usar diferentes instrumentos de colheita, mudar
luvas e colocar as amostras em recipientes separados.

(3) Manter a cadeia de custódia: é preciso garantir que, entre a colheita da amostra e o
resultado final do laboratório, a amostra não foi trocada pelo caminho, ou seja,
garantir que a amostra colhida corresponderá ao perfil genético do resultado final.
Esta é uma condição de admissibilidade da amostra como meio de prova, sendo que
basta uma possibilidade que a amostra tenha sido trocada para a invalidar. Assim:
a. Guardando a amostra, o frigorífico tem de ficar trancado ou com vigilância
b. O ideal é entregar no dia e em mão, não podem chegar por correio → o
Instituto indica no relatório o modo como a amostra foi recebida.
c. Há envelopes com uma fita que mostram se foram abertos
d. Para entrar no laboratório tem de se usar um cartão que regista as horas de
entrada e saída.

À partida, qualquer vestígio biológico pode servir para identificar uma pessoa, desde que
tenha ADN nuclear. Tipos de vestígios mais frequentes:

✓ Manchas de sangue
✓ Manchas de esperma
✓ Pêlos
✓ Saliva
✓ Dentes

Em relação às roupas:

✓ Inspeccionar
✓ Fotografar
✓ Proteger as áreas manchadas
✓ Secar as manchas (secador de ar frio ou à temperatura ambiente)
✓ Iluminar com luz ultravioleta ou laser → às vezes, há manchas que não se vêem à luz
natural (ex: mancha de sémen na pele de uma pessoa), muito importante em abusos
sexuais de criança, em que normalmente não à cópula. Isto tem um contra – essa luz
degrada o ADN

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✓ Retirar as peças ou recortar
✓ Separar as peças
✓ Usar invólucros de papel

Colheitas no cadáver:

✓ Nível da boca/dentes (ex.: crime sexual com sémen na boca)


✓ Mordeduras – são uma fonte muito importante de ADN)
✓ Mãos – zonas subunguais, pode haver fragmentos de pele do agressor debaixo das
unhas da vítima. Deve-se colocar sacos de papel com um elástico à volta das mãos
para manter os vestígios que poderiam cair no caminho.
✓ Região de períneo.

Cadáver em putrefacção: no cadáver fresco, o sangue é o meio de identificação. Caso


contrário, havendo degradação, podemos usar:

✓ Próstata/útero e ovários; músculo;


✓ Dentes, pêlos, cabelos e ossos longos (corta-se um fragmento completo de 10-15 cm e
o laboratório vai abri-lo – evitar contaminação) → se a degradação for mais avançada

Colheita de manchas:

✓ Fotografar a mancha (e marcar a sua localização)


✓ É o perito que extrai a mancha
✓ Mandar a peça inteira (não sendo possível → material absorvente (madeira) –
algodão com água destilada; não absorvente → raspar com bisturi)
✓ Usar luvas descartáveis
✓ Deixar secar as peças húmidas
✓ Embalagem de papel
✓ Baixa temperatura

(Sangue:

➔ Líquido: colher para tubo


➔ Mancha fresca ou seca: secar; guardar recipiente fechado; conservar a menos de 4
graus, ou menos de 20 graus se tempo superior a dois dias)

Colheita nos genitais femininos: geralmente feita por médicos; é importante o local de colheita
do sémen, pois o crime sexual pode ser de natureza diferente

✓ Colheita a diferentes níveis


✓ Utilização de zaragatoas
✓ Secar ao ar
✓ Colocar em recipientes separados
✓ Enviar ao laboratório (se necessário guardar a 4 graus ou -20 graus)

Nota: no caso das crianças, é muito importante o exame de toda a superfície corporal, pois
geralmente nos abusos a menores, o sémen é encontrado na pele.

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Nas agressões sexuais, há muitos erros das vítimas. Estas destroem muitos vestígios que
podiam ajudar a encontrar o agressor:

✓ Destruir/lavar peças de roupa


✓ Tomar banho
✓ Atrasar a observação médica

Possibilidades de utilização dos vestígios:

✓ Sémen na cavidade bucal/anal – horas


Isto é na teoria; na prática depende (ex.:
✓ Sémen na cavidade vaginal – horas
vítima acamada → ao fim de 7 dias ainda
✓ Manchas de sangue – anos
pode haver esperma na cavidade vaginal)
✓ Manchas de esperma - anos

Necessário assegurar mecanismos para uma célere análise.

Valorização da prova em criminalística:

➔ Exclusão: imaginamos que temos um indivíduo 7-8 e uma mancha de sangue 7-9; não
podem corresponder, temos a certeza que a mancha não pertence aquela pessoa. O
material que sai do indivíduo tem de ter coincidência nos dois alelos.
➔ Coincidência: se houver coincidência (indivíduo 7-9 e mancha 7-9), não temos a
certeza que a mancha seja daquela pessoa; quanto mais raro for aquele perfil na
população, mais provável é que tenha sido aquele indivíduo a deixar a mancha.
o Quanto mais marcadores se usar, mais segura é a conclusão; em regra utilizam-
se 15-20 marcadores (só se não houver ADN suficiente)

Equilíbrio Hardy-Weinberg: numa população grande, a entrada ou saída de indivíduos não


altera significativamente a frequência dos alelos. Ou seja, o valor das frequências alélicas
mantém-se indefinidamente de geração em geração, desde que se verifiquem os seguintes
pressupostos:

✓ Não haja mutações


✓ Não haja a selecção para um determinado locus
✓ Os indivíduos dessa população se cruzem entre si ao acaso

Imaginemos que a frequência de um dado genótipo é 1% → o sujeito tem, mas 1% da


população também. Isto suscitou uma dupla interpretação: o acusado tem 99% de
probabilidade de ser culpado (falácia da acusação) ou tem 0,1% de probabilidade e ser culpado
(falácia da defesa). Assim, arranja-se outra forma de apresentar o resultado, que hoje todos os
laboratórios usam → likelihood ratio (LR)

A LR é a razão de verossimilhança, é a comparação entre 2 resultados (do indivíduo com outro


homem qualquer da população). Quanto mais raro o genótipo na população, diminuindo o
denominador, mais probabilidade de o sujeito ser o culpado.

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LR= probabilidade do resultado se a mancha for do suspeito / probabilidade do resultado se a
mancha for de outro homem

Se a frequência do genótipo na população for 5% (0,05), então:

LR= 1/0,05 =20

Escala de Evett: escala da LR qualitativa. Não tem muito interesse, interessa mais o resultado
quantitativo.

Tipos de ADN:

✓ (1) ADN autossómico


✓ (2) ADN do cromossoma Y
✓ (3) ADN mitocondrial
✓ (4) ADN do cromossoma X

(1) ADN autossómico: é o ADN de qualquer um dos cromossomas autossómicos, ou seja,


dos cromossomas numerados (1-22) e não dos cromossomas sexuais (XX ou XY).
(2) ADN do cromossoma Y: será muito importante nos crimes sexuais. Numa colheita
vaginal, se só estudarmos o cromossoma Y só temos material do agressor (importante
para investigação paternidade em filhos do sexo masculino). Também em sequências
de repetição (microssatélites).
Porém, tem uma grande limitação → o cromossoma Y, ao contrário dos autossómicos,
vêm sempre do pai. Se não houver mutações, tal cromossoma é igual a toda a
linhagem masculina. Se houver um crime sexual e um suspeito tenha cromossoma Y
diferente ao do zaragatoa vaginal, então não é culpado; se for igual, qualquer homem
daquela família poderá ser culpado → não identifica o indivíduo, mas reforça a
conclusão por outros marcadores. Nunca entra no cálculo da LR.

(3) ADN mitocondrial: está presente nas mitocôndrias das células, resistindo muito à
degradação – em ossadas normalmente só se encontra este ADN. Este ADN é
transmitido pela mãe, as mitocôndrias estão no ortoplasma do óvulo e o
espermatozóide só atinge o núcleo. Sequência comparada vs. Sequência de Anderson
→ identificação pelas mutações.
Tem a mesma limitação que o cromossoma Y, desta vez com a linhagem feminina.
Tem como vantagem o facto de ter pequenas dimensões, é muito resistente à
degradação → importante quando o material está muito degradado. O estudo é feito
por sequenciação, logo é muito moroso. Nos cabelos é difícil estudar microssatélites, a
não ser que tenham raiz, logo tem de ser estudadas com sequenciação do DNA
mitocondrial.
Alelo 9,3 → significa que tem 9 unidades repetitivas completas mais uma incompleta
só com 3 pares de bases.

Bases de Dados de perfil de ADN (Necessário confirmar!!)

✓ Critérios de inclusão/exclusão

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o Voluntários: consentimento livre informado escrito/ilimitado (se não revogar o
consentimento)
o Amostras-problemas para identificação civil: magistrado/ilimitado (até à
identificação)
o Amostras-referência para identificação civil:
▪ Vestígios-referência: magistrado/ilimitado (até à identificação)
▪ Amostras em pessoas (parentes desaparecidos): consentimento livre
informado escrito/até à identificação, se não revogar consentimento
o Amostras- problema para investigação criminal: magistrado/termo do
processo-crime, quando identificada com o arguido; no prazo máximo de xxx do
procedimento criminal; ou 20 anos após a recolha.
o Condenados: crime doloso com pena concreta de prisão igual ou superior a 3
anos (juiz de julgamento)/cancelamento definitivo do registo criminal
o Profissionais: consentimento livre informado escrito/20 anos após cessação
das funções.

Assim, temos de escolher o marcador de acordo com as circunstâncias e limitações.

Estudos das migrações populacionais: fizeram-se estudos em termos de migração


populacional. Tendo auxiliado a teoria de que o primeiro homem surgiu nas zonas de África.
Fez-se também um estudo sobre as influências dos portugueses nas antigas colónias. O alelo
13 não apareceu em Angola, nem na Guiné, apareceu mais no Brasil e em Portugal. Os países
africanos continentais estão num pólo, os americanos noutro, e os africanos insulares noutro –
faz sentido historicamente, com os países africanos continentais não havia grande
relacionamento. 75% do cromossoma Y do Brasil é europeu.

Nunca esquecer de fazer colheitas na própria vítima.

12) GENÉTICA FORENSE III

Identificação genética individual

Acidentes de viação: É importante sobre quem ia a conduzir, sendo que para tal se pode fazer
análise ao air-bag → quando este explode, pode ficar com vestígios do condutor.

O que deve ser feito primeiro, impressão digital ou colheita sanguínea?

Preferimos a colheita genética, preservando a impressão digital, e só depois esta (?)

A identificação genética de animais que causaram o acidente já começa a ser pedida.

Corpos não identificados – catástrofes e identificação genética: é frequente a utilização da


genética nestas situações. Aqui, as dificuldades dependem de termos um acidente fechado,
em que se têm os dados das vítimas (ex.: acidente de viação), ou aberta (tsunami). Quando se
sabe quem está desaparecido, pode-se fazer uma base de dados com os objectos pessoais.

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Se os corpos estiverem em bom estado e for possível fazer a análise das impressões digitais
(dactiloscopia), este é um óptimo método de identificação.

Temos de colocar questões sobre a actuação e tipo de investigação em menos de 48h.

A pressão é um inimigo das perícias, não se devem alterar as rotinas e regras laboratoriais,
cedendo à pressão. Deve evitar-se também a pressão para entrega imediata dos corpos – há
quem diga que o expectável será até 3 meses.

O tamanho mínimo dos fragmentos é importante decidir – variará entre 1 a 10 cm; há também
o critério do tamanho de um dedo polegar.

Tipos de comparação:

✓ Comparação directa: comparação das amostras com os objectos pessoais (escova de


cabelo, dentes, envelope e selos) → porém, temos de ter a certeza da sua
autenticidade.
✓ Comparação familiar: comparação das amostras com as de familiares. Quanto mais
próximos forem os parentes, melhor. Os problemas prendem-se aqui com a exclusão
de paternidade; mutação e ausência de familiares directos.

Podemos ter também a comparação directa com fragmentos anteriores já encontrados → 2


problemas:

o Autenticidade (dentes –> erros frequentes)


o Contaminação no seu manuseamento

Em algumas catástrofes, a comparação directa é mais importante do que a comparação


familiar. Na área da genética forense, deve-se fazer as duas comparações sempre que possível,
reforçando as conclusões.

Há alturas em que a genética deixa de ser útil na identificação do cadáver, e terá de entrar a
antropologia.

➔ Comparação directa + comparação familiar

Catástrofes e identificação genética – principais problemas:

✓ Falta de amostras para comparação


✓ Degradação do material biológico
✓ Contaminação
✓ Volume de trabalho
✓ Volume de informação

13) IDENTIFICAÇÃO MÉDICO-LEGAL

A autópsia começa com a identificação dos corpos:

1. Identificação em pessoas vivas:

40
a. Investigação de filiação
b. Estimativa da idade: pode ser pedida pelos serviços estrangeiros e fronteiras
por motivos de expatriação, sendo relevante saber se a pessoa é menor, normalmente através
dos dentes e ossos.

2. Identificação no cadáver – necroidentificação


a. Normalmente, os cadáveres chegam “frescos”, sendo recentes, de tal forma
que é fácil o seu reconhecimento.
b. Outras vezes, podem estar carbonizados, ossificados, totalmente degradados,
já não havendo semelhanças com a fisionomia normal. Aqui não faz sentido chamar potenciais
familiares, desde logo pelo choque emocional. Tem de se recorrer a técnicas científicas de
identificação; e não o reconhecimento visual.

Porque é que se identifica? Razões:

✓ Moral: o Estado tem a obrigação de assegurar se o familiar está morto ou vivo.


✓ Civil: resolvem problemas de heranças, hipotecas, pensão de viuvez, etc. que
necessitam de certidão de óbito. Se o corpo não aparecer, lança-se mão do
óbito de morte presumida.
✓ Criminal: vertentes humanitária, social e forense.

Vítimas de morte natural/ vítimas de morte violenta (suicídio, homicídio e acidente): a


diferença está no agente causador de morte, intrínseco/extrínseco ao indivíduo. Podemos ter
cadáveres:

o Abandonados: chegam ao IML e não são reclamados. Ao fim de 30 dias são


feitas certidões de óbito e funerais sociais.
o Desconhecidos: não estão identificados.
o Indocumentados: não têm consigo quando chegam, documentos
identificativos
o Desaparecidos: surgindo cadáveres desconhecidos ou indocumentados, faz-se
uma comparação com a lista destes.

Vertente morfológica: Para identificar vivos no dia-a-dia convocamos características


morfológicas. Ao ver um cadáver também o fazemos, mas a sua atura, peso, etc. não nos
permitem saber quem é, apenas nos permitem fazer a partir do indivíduo que permite excluir
indivíduos da lista dos xx desaparecidos. Esta é uma morfologia reconstrutiva → factores
genéticos de identificação → perfil do desconhecido.

Para efectivamente o identificar temos de recorrer a um método comparativo, com auxílio das
características ante-mortem e post-mortem. Só com estes factores individualizadores é que
passamos de um mero perfil para a identificação. Permite a identificação positiva, ou seja, dar
um nome, passar a ser uma pessoa. Pergunta de exame!

➔ Cruzamentos de dados AM/PM

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Pode o indivíduo estar totalmente caracterizado morfológica ou geneticamente e ainda assim
não ser identificado por falta de dados ante-mortem. Na base de dados não estão todos os
indivíduos.

Vertente genética: é mais complicado para uma identificação, identificar famílias mas não
indivíduos. Neste âmbito há comparações indirectas com estudos familiares, através de um
suposto familiar. Serve para excluir.

Cadáveres recentes:

✓ Exames gerais - técnicas não científicas ou de presença


✓ Medicina dentária forense
✓ Dactiloscopia Técnicas científicas (1.ª e 2.ª estão ao mesmo nível)
✓ Genética

A convicção judiciária de uma identificação pode bastar-se com as técnicas gerais.

Exame buco-dentário: abrange toda a boca. Os dentes são estruturas anatómicas com
características particulares, como a forte resistência a agentes externos, inclusive a
temperaturas superiores a 600ºC. Também interessa a variabilidade de dentição – a fórmula
dentária é diferente para todos, mas há grande variação em número, forma, posição, etc.

➔ A grande virtualidade é a comparação com os registos efectuados em vida.

Dactiloscopia: impressões digitais devidas à existência de sulcos. Importância:

✓ Perenidade: duram toda a vida, desde os 7 meses de gestação, de modo


inalterável, permanecendo nos cadáveres.
✓ Variabilidade
✓ Possibilidade de classificação e arquivo para comparação.

São muito objectivas como prova em tribunal e são facilmente obtidas.

Quanto à colheita de impressões:

✓ Pode ser passada ou rodada


✓ Mesmo que a mão já esteja a “desluvar” (caindo quase toda a pele), ainda restará um
bocadinho de polpa do dedo para a impressão.
o Com isto não precisamos de dentes nem ADN

Também se fazem exames radiológicos: (antropologia forense)

✓ Objectivos como método de identificação


o (1) Identificação individual
o (2) Determinação da idade

(1) Identificação individual


a. Suspeita de lesões traumáticas/intervenções cirúrgicas

42
b. Patologia óssea (osteoporose, neoplasia)
c. Corpos estranhos (projecteis de armas de fogo, fragmentos metálicos, etc.)
d. Seios frontais (morfologia variada)

(2) Determinação da idade


a. Desenvolvimento dentário (até 14 anos)
b. Pontos de ossificação

AFIS: sistemas ligados à Interpol, mas não há um registo de população geral, apenas dos
cidadãos que tiveram contacto com eles. Actualmente é usado não apenas para fins forenses
(Ex: controlo de emigração nos aeroportos).

O cadáver deve ser sempre identificado antes da autópsia.

Não faz sentido fazer exames de ADM se for um desaparecido, pois não se tem termos de
comparação. Só quando houver uma potencial identificação.

Antropologia forense: usa-se quando o cadáver está deteriorado. É a aplicação dos


conhecimentos de antropologia física às questões de direito.

Necroidentificação – Esquema:

1) Vertente morfológica: mais fácil e acessível, tem a ver com a descrição do indivíduo →
identificação positiva (dar um nome)
2) Vertente genética: mais difícil, permite mais facilmente a exclusão (comparando com
familiares)

Pode ser feita por.. (principalmente vertente morfológica)

✓ Método reconstitutivo (dados colhidos no próprio cadáver)


o Factores genéricos de identificação → desenhar partes do desconhecido

✓ Método comparativo (Compara-se o perfil do desconhecido com os elementos


conhecidos em relação a um dado suspeito)
o Factores individualizantes → identificação positiva

14) TOXICOLOGIA FORENSE

A toxicologia é a ciência que estuda as substâncias tóxicas e as alterações que estas produzem
no organismo, com o fim de prevenir, diagnosticar e tratar os seus efeitos nocivos. Mas os 50%
do trabalho nesta área é em vivos. Nota: os exames de toxicologia são pedidos, na maior parte
dos casos para exclusão da possibilidade de presença de substâncias.

As drogas de abuso (excepto as sintéticas) tiveram o seu início nas plantas; por exemplo, a
heroína já foi usada em medicamentos para a tosse→ a evolução nefasta é o homem deixar de
usar como medicamento para passar a usar como droga de consumo ilícito. Note-se, porém,
que esta utilização recreativa das substâncias sempre existiu.

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Tóxico  veneno:

➔ Tóxico é todo o agente (Químico ou físico) susceptível de gerar efeitos nocivos sobre
os seres vivos.
➔ Veneno é aquela substância tóxica empregue de um modo intencional → aqui são
consideradas as intoxicações homicidas ou suicidas, mas nunca as acidentais.

Para se poder dizer que houve um envenenamento é preciso dizer-se se a morte foi ou não
causado por uma intencional inferência de tóxico – toxicologia analítica, criminalística e depois
a parte jurídica.

Conceito analítico de toxicologia: a toxicologia analítica visa identificar substâncias tóxicas.


Várias substâncias por si só podem ser inócuas, mas a sua mistura é uma explosão.

Depois de uma autópsia, há exames complementares de matéria patológica e de toxicologia


(álcool e drogas de abuso é obrigatório).

O toxicologista faz o que lhe mandam, mas se se aperceber de algo, comunica ao médico no
sentido de poder haver outros exames importantes. Para passar à quantificação de tóxicos
temos de recorrer a padrões. Só identificamos o tóxico qualitativamente – por exemplo,
heroína – e não o tipo específico.

Intoxicação aguda e crónica:

➔ Crónica: o individuo vai estando exposto ao tóxico, a sua concentração acumula-se


progressivamente
➔ Aguda: é a mais frequente. Aqui entra a importância da toxicologia clínica.

Organização médico-legal: as delegações do INML (Porto, Coimbra e Lisboa) tem 4 tipos de


serviços técnicos:

✓ Clínica e patologia forense


✓ Genética e biologia forense
✓ Química e toxicologia forense → existe em Coimbra, Porto e Lisboa
✓ Tecnologias forense e criminalista

Assim, as perícias toxicológicas apenas são realizadas no âmbito dos serviços e nunca nos
gabinetes médico-legais → estes apenas realizam perícias no âmbito da patologia e clínica
forense, para evitar a deslocação dos cadáveres e pessoas às delegações. Ou seja, da autópsia
mandam-se as amostras para as delegações da circunscrição respectiva.

Paraceleus (autor italiano): não há substâncias atóxicas; todas as substâncias são tóxicas,
apenas a dose permite distinguir um tóxico de um medicamento. Há uma classificação dos
agentes tóxicos segundo o grau de toxicidade, há concentrações taboladas, porém são só xxxx

➔ Variabilidade intra e inter individual

O sangue é a amostra de eleição de toxicologia (colhida nas extremidades – sangue periférico)


– sangue cardíaca pode ser contaminado com os órgãos adjacentes ao estômago.

44
As substâncias + procuradas são:

✓ Álcool
✓ Drogas
✓ Medicamentos

Se há conhecimento prévio de tóxico envolvida, empregam-se métodos específicos para


identificação e quantificação; porém, a situação mais frequente é ser o tóxico desconhecido, o
que implica uma metodologia complexa.

Investigação toxicológica

Conjunto de processos analíticos com o objectivo de separar, detectar, identificar e quantificar


uma ou mais substâncias, principalmente as consideradas tóxicas.

Actualmente o campo de investigação da toxicologia é muito vasto:

✓ Cadáver
✓ Indivíduo vivo → as análises hospitalares são prioritárias
✓ Actividade laboral
✓ Meio ambiente

Dificuldades associadas às análises toxicológicas:

✓ Dificuldades associadas às implicações judiciais


✓ Limitações associadas à qualidade e quantidade de amostra
✓ Diversidade de substâncias existentes possíveis de provocarem efeitos tóxicos

Tipos de amostras:

✓ Sangue (periférico, colhido nas extremidades) porque é mais útil para identificação de
exames e especialmente para quantificar (confirmar/quantificar). No caso de
envenenamento por tóxico, pode analisar-se o sangue cardíaco e o estômago
(conteúdo gástrico), mas para quantificar/confirmar usa-se o sangue periférico.
✓ Bílis: importante quando não há urina
✓ Pulmão: suspeita de tóxico volátil
✓ Rins: intoxicações crónicas por metais
✓ Fígado: importante quando não existe sangue; biotransformação da maioria dos
tóxicos
✓ Cérebro: mortes por inalação de solventes
✓ Cabelo: informação toxicológica muito anterior à morte
✓ Humor vítreo: útil para análise de álcool etílico, resistente à contaminação bacteriana
✓ Amostras não biológicas: ajuda no esclarecimento dos acontecimentos.

Perícia toxicológica: (as análises hospitalares são prioritárias)

o Amostras
o Procedimento laboratorial

45
Nota: o exame do corpo na autópsia (patologia forense) não permite ao perito tirar conclusões
distintivos sobre as substâncias responsáveis pela morte.

Cadeia de custódia em toxicologia forense: o princípio básico é assegurar que tudo o que
fazemos é fiável, credível e não pode ser posto em causa. Em cada ramos os cuidados são
diferentes – por exemplo, em genética há maior risco de contaminação; em toxicologia, é
muito importante rotular e etiquetar.

Passos:

o Abertura do processo;
o Selecção e divisão das vísceras de acordo com os exames a realizar;
o Extracção das substâncias a analisar
o Detecção, identificação, confirmação e quantificação por técnicas analíticas e
específicas.

Desde que se faz a recolha da amostra até ao seu processamento, temos de respeitar uma
série de passos que nos dão garantias de que não houve violação:

1) Colheita das amostras para análise: temos de saber que amostras é que se colhem, o
seu tipo e quantidade
2) Acondicionamento das amostras: hoje temos uma uniformização dos meios de
acondicionamento
3) Transporte das amostras.

Estas são etapas determinantes

Depois de tudo isto, a amostra entra no serviço e temos de verificar se as amostras estão
frescas, para depois registar. A primeira coisa a fazer no serviço de toxicologia é avaliar se a
cadeia foi cumprida.

Conclusão: a cadeia de custódia pretende que se tenha um controlo de tudo o que se fez e que
todo o resultado é obtido com confiança e certeza. É necessário:

✓ Colheita adequada a cada tipo de análise


✓ Contentores adequados a cada tipo de amostra (cheios, sem câmara de ar para
compostos voláteis)
✓ Fechados e selados
✓ Mantidos ao abrigo da luz e a baixas temperaturas
✓ Requisições devidamente preenchidas
✓ Etiquetas com identificação inequívoca, conteúdo, proveniência, data e horada
colheita

Não ser cumprida a cadeia nem sempre significa adulterações.

Medicamentos

46
Um medicamento é toda a preparação farmacêutica contendo um ou mais princípios activos,
destinada ao diagnóstico, prevenção ou tratamento de doenças ou seus sintomas, ou à
correcção de funções orgânicas.

A margem ou janela terapêutica é um intervalo de concentração de um fármaco entre as quais


é seguro e eficaz o tratamento ou uma dada situação clínica.

Pode haver uma utilização suicida ou homicida. Pode estar associada a uma tentativa de
diminuição da resistência da vítima para a execução de delitos → importante não só quando
não há lesões aparentes.

Fármacos mais detectados:

✓ Psicotrópicos
o Antipsicóticos (ex: halopenidol)
o Ansiolíticos (ex: benzodiazepinas) → tem um efeito semelhante ao álcool,
depressor do SNC → o seu consumo não faz variar a taxa de álcool no sangue,
apenas potencia os seus efeitos nefastos
o Hipnóticos não barbitúricos
o Antidepressivos
✓ Antipiréticos e analgésicos

Quando é pedido para pesquisar um medicamento, investiga-se quer o seu princípio activo,
quer os metabólicos.

Drogas de abuso

1) Depressores do SNC
a. Ópio
b. Morfina
c. Heroína

2) Estimulantes do SNC
a. Anfetaminas
b. Cocaína

3) Drogas alucinogénias
a. Carobinóide (?)
b. LSD

Nota: tem várias vias de administração, mas não é isto que nos interessa, mas sim o tipo de
substância em causa.

Serviço de urgência hospitalar → exame de rastreio INML → exame de confirmação

✓ Dependência física
✓ Dependência psíquica Triangulo que existe quer nas drogas, quer no álcool
✓ Tolerância

47
Dentro das drogas de abuso encontramos um grupo chamado “depressores” que tem
opiáceos por trás. A pior droga é a heroína, um produto derivado da morfina – a heroína entra
mais facilmente no cérebro mas actua como morfina. (a morfina pode existir isoladamente ou
como um produto de organismo)

Quando é que há overdoses? Overdose é excesso de dosagem, e pode ocorrer:

✓ Após períodos de abstinência Etiologia +


✓ Por outros adulterantes presentes na amostra frequente
✓ Quando surge no mercado heroína com grande grau de pureza acidente

Também podemos ter uma morte por falência multiorgânica motivada por um consumo
continuado ao longo dos anos.

A ML consegue apurar se o consumidor é esporádico ou habitual.

Note-se que é necessário verificar se o indivíduo foi medicado, por ex., com morfina ou ???. A
??? transforma-se muito rapidamente em morfina, assim, como a heroína – é necessário saber
a origem e a (i)licitude da morfina. Se se encontrar heroína, então o consumo foi muito
recente. É ainda muito importante o exame do local, examinando a colher e a seringa. Se
houver suspeita de intoxicação por heroína: local de morte + tudo o que estiver perto do
cadáver + características/antecedentes do indivíduo + autópsia + análise toxicológico.

Hábito externo da heroína:

o Estigmas de punção recente


o Cicatrizes xxxx
o Abcessos e úlceras
o Marcas do trajecto da agulha
o Escoriações cutâneas

Hábito interno:

o Aspectos inespecíficos de asfixia


o Edema e congestão (+ frequente)
o Gânglios linfáticos aumentados

Cocaína: o crack trouxe um aumento do consumo da cocaína, que tem várias vias de consumo

✓ Injectável
✓ Pulmonar
✓ Oral
✓ Inalatória

Há aspectos que na autópsia se podem identificar (hábito externo):

48
✓ Midríase: dilatação da pupila
✓ Lesões traumáticas provocadas pelas convulsões
✓ Sinais de punções venosas recentes
✓ queratite
✓ Erosões do esmalte
✓ Calo na última falange do polegar
✓ Queimaduras superficiais

Alucinogénios: a partir de 2004, o seu consumo em Portugal aumentou exponencialmente.


Temos várias espécies de planta cannabis, com várias concentrações. A concentração de THC
que existia anteriormente não tem nada a ver com a que existe hoje.

Há vários factores que fazem variar as propriedades psicoactivas de carabinóides, incluindo:

✓ Potência
✓ Via de administração
✓ Técnica de fumar
✓ Dose
✓ Experiência do consumidor

O THC é o princípio activo, que se transforma no organismo em OH-THC. Actua em 2 centros


receptores do cérebro.

Álcool

É uma substância lícita, mas é um depressor do SNC:

✓ Deprime todas as áreas e funções do cérebro


✓ Depressão centros inibitórios + elevadas
✓ Depressão das áreas de integração + elevadas

Altera as capacidades cognitivas e psico-motoras

Em cada pessoa a reacção é diferente → acentuada variabilidade inter-individual.

Nos acidentes de viação, estes podem ocorrer por:

✓ Factor técnico – 10-15%


✓ Factor humano – 85-90%

Sempre que um indivíduo morre na estrada tem de se colher sangue para avaliação da
alcoolemia.

Lei 18/2007: define o processo de fiscalização ou álcool e substâncias psicotrópicas. Esta


fiscalização pode ser feita por:

✓ GNR/PSP – em caso de álcool


✓ INML – em caso de drogas

GNR/PSP podem fazer:

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o Teste de ar expirado
o 1.º teste qualitativo → indica a presença
o 2.º teste quantitativo → quantifica a TAS
o Teste da saliva
o É só triagem; não basta para sanção.

Tem de haver um exame de confirmação ao sangue, que só a ML pode fazer. No caso das
drogas, há obrigatoriedade de confirmação. Apenas o INML pode fazer análises toxicológicas
para determinação do álcool.

No direito do trabalho, em caso de acidentes não há a obrigatoriedade de determinação das


substâncias no organismo → mas as boas práticas de ML determinam que tal seja obrigatório,
para que os processos não fiquem parados.

Alcoolémia cadavérica

Cálculo retrospectivo da alcoolemia. Visa determinar a concentração de álcool no sangue num


determinado momento prévio:

Co = Ct+Bt

Co: concentração de álcool na hora pretendida

Ct: concentração de álcool no sangue no momento da extracção

B: coeficiente de etiloxidação

T: período de tempo decorrido

O coeficiente de etiloxidação indica a capacidade metabólica do indivíduo → mas tem uma


grande variabilidade! Um estudo recente (2006) mostrou que varia entre 0,095 a 0,371g/l/h.

Esta fórmula pode ser usada de um ponto de vista técnico, em que o patologista queira ter
mais ideia sobre o caso. O ideal é quando a pessoa está na fase de eliminação.

Esta fórmula deve ser rejeitada para efeitos de limites legais em acidentes de trabalho ou de
aviação. É uma fórmula principalmente teórica, na prática legal e forense não deve ser usada.
(cálculo exponencial leva a erros inadmissíveis)

Local da colheita e amostra de sangue: temos diferentes tipos de sangue, as amostras não são
iguais consoante o local da colheita. Nota: no cadáver deve-se tirar sempre mais do que 1
amostra

o Sangue arterial
o Sangue venoso
o Central
o Periférico → é o que deve ser usado, a concentração é a mais representativa
de concentração existente no momento da morte

50
Existem 3 factores que influenciam a concentração:

✓ Difusão post-mortem do etanol


✓ Amostras sanguíneas não homogéneas
o Coagulação (sangue em vasos periféricos: tem menor probabilidade de ter
coágulos
o Causa de morte
✓ Absorção post-mortem do etanol (a absorção do etanol presente no tubo digestivo
XXXXXX post-mortem)

➔ Amostra de eleição: sangue venoso periférico

Se não for possível obter sangue venoso periférico, podemos recorrer a sangue central, mas só
se se verificarem determinados pressupostos:

✓ Não pode haver putrefacção


✓ Intervalo post-mortem <18h
✓ Ausência de traumatismos tóraco-abdominais severos
✓ Ausência de aspiração de vómito
✓ Ausência de etanol no conteúdo gástrico

Porém, podemos não ter nenhuma amostra de sangue → determinação indirecta de


alcoolemia – (TAS= concentração na amostra x raxa de conversão). Há outras amostras:

o Medula óssea: do ponto de vista laboratorial é muito difícil, não se usa.


o Músculo: em Coimbra, também não se usa
o Humor vítreo: é o melhor para exclusão (amostra alternativa ideal)
➔ Líquido anatomicamente muito protegido, atrás do olho, ausente de
fenómenos putrefactivos. Porém, tem um problema: tal como no ar expirado, não
tem uma correlação com a taxa, aqui com a taxa do sangue. É, no entanto, muito
importante para determinar uma negatividade (ausência de álcool); já uma
positividade é mais problemática em termos de identificação.

Mas podemos também fazer análises no humor vítreo e no sangue,


podendo concluir em que fase é que estava o indivíduo (absorção ou eliminação).

TAS/TAHV > 1 → absorção.

TAS/TAHV <1 → eliminação.

Outro problema é a formação e destruição de etanol no cadáver. A destruição não tem


problema, vai diminuir a concentração; mas a formação (síntese) é importante → temos
muitas bactérias nos intestinos que levam à putrefacção, que produzem álcool.

A síntese evita-se com a refrigeração do cadáver e das amostras:

>pode ser:

o No cadáver → microorganismos

51
o Na amostra → substratos

Há sempre uma repetição do exame: no mesmo dia ou 1/2 dias depois. A sintetização do
álcool para num certo nível pois as bactérias esgotam os substratos que estão na amostra.

Basta o início da putrefacção para a patologista negar o exame de alcoolemia. Se fizer e der
negativo, pode seguir; se der positivo, o patologista tem de indicar que não deve ser indicada
para limites legais.

Utilização de câmara de ar no acondicionamento de amostras: evita a evaporação do etanol e


as bactérias ficam aqui.

Há critérios para distinção de PM/AM:

✓ História do caso
✓ Estado de conservação da amostra
✓ Microorganismos presentes
✓ Dest. atípica do etanol
✓ Presença do etanol numa só amostra
✓ Presença de outros compostos voláteis
✓ Concentração

Regras sobre colheita, acondicionamento e envio de amostras:

✓ Colheita
o Amostras obtidas antes do início da colheita dos órgãos
o Laqueação do caso sanguíneo previamente
o Seringas esterilizadas de utilização única
o Colheita por punção directa
✓ Acondicionamento
o Frascos estéreis de tamanho apropriado e fechado hermeticamente
o Não deixar ar residual entre tampa e amostra
o Adicionar preservante
o Conservar a temperatura <4.C e enviar com maior brevidade ao laboratório
o Selar o frasco
o Etiquetagem perfeita
o Juntar protocolo.

Amostras forenses: o serviço de toxicologia forense disponibiliza tubos e contentores próprios


para colheita e acondicionamento, e casos de embalagem própria para envio.

Monóxido de Carbono e cianeto:

Monóxido de Carbono: É chamado o “assassino silencioso”, porque não o sentimos nem o


vemos. Propriedades:

✓ Incolor

52
✓ Inodoro
✓ Insépido
✓ Elevada difusibilidade

A sua fonte de produção é natural (fogos, mas sobretudo lareiras, braseiras e esquentadores);
ou industrial.

Mecanismo de toxicidade do monóxido de carbono:

✓ Diminuição de capacidade de transporte do oxigénio no sangue


✓ Diminuição de respiração celular
✓ Formação de espécies reactivos de oxigénio
✓ Ligação à mioglobina, provocando disfunção do miocárdio e músculo esquelético.

O monóxido de carbono apresenta uma grande afinidade com a hemoglobina, 200 a 300 vezes
maior que a afinidade com o oxigénio → logo, vai ligar-se à hemoglobina, diminuindo a
capacidade de transporte de oxigénio→ causa hipoxia celular (falta de oxigénio nas células).

CO + Hb → COHb (complexo caboxihemoglobina) → ligação da hemoglobina do monóxido de


carbono.

Esta ligação é reversível, sendo o tratamento a oxigenação hiperbonica (inalação de oxigénio


puro a uma pressão maior que a pressão atmosférica). Desde que haja oxigenação a tempo e a
duração à exposição não seja longa, a ligação é reversível. A morte é mais rápida na inalação
que na ingestão.

A toxicidade depende da:

✓ Concentração de CO
✓ Duração da exposição

Em termos de etiologia médico-legal:

✓ Suicídio
✓ Homicídio
✓ Acidente –> é o mais frequente

Autópsia:

o Exame do local
o Exame do hábito externo
o Externamente, a hipoxia manifesta-se por uma coloração rosada→ livores
carminados (mas também pode ter a ver com a posição)
o Nalguns casos, temos vesículas nas zonas de pressão (não muito frequente)
o Exame do hábito interno
o Coloração rosada dos tecidos, sangue e músculos (coloração rosada na
refrigeração  hipotermia)

É necessário haver um resultado positivo de carboxihemaglobina (não do gás em si) → sem


ela, não há morte por intoxicação de CO.

53
Toxicologia → sangue periférico preferencialmente → senão, sangue cardíaco de outros
tecidos (ex.: medula) → em corpos putrefactos, exames histológicos.

A investigação toxicológico tem como objectivo detectar carbocihemaglobina.

Morte em foco de incêndio: problema de saber se o indivíduo estava morto antes da


carbonização. A existência de regra de fumo nas vias aéreas significa que estava vivo no local
de incêndio e inspirou. Pode ser difícil visualização dos livores carminados.

Cianeto:

Propriedades físico-químicas:

✓ Líquido muito volátil


✓ Densidade reduzida
✓ Elevada tensão de vapor
✓ Muito solúvel em água e álcool
✓ Incolor
✓ Odor a amêndoas amargas

Aqui, a etiologia é quase 100% suicídio.

A morte é mais rápida numa intoxicação por inalação do que por ingestão.

Mecanismo de acção: o cianeto também se liga à hemoglobina; porém, não impede a ligação
com o oxigénio ao contrário do monóxido de carbono → mas vai é impedir que as células
utilizem o oxigénio, bloqueando a respiração celular → hipoxia.

No hábito interno, tudo é igual ao monóxido de carbono, excepto o odor do encéfalo. No


externo, também temos a coloração vermelha. O crânio deve ser logo aberto se houver
suspeita de intoxicação.

O exame local é fundamental.

Amostras utilizadas para análise das drogas de abuso:

✓ Urina
✓ Sangue
✓ Órgãos
✓ Utensilio
✓ Cabelo

(1) Urina

➔ Ausência de correlação entre as concentrações sanguíneas e as concentrações


determinadas na urina: dificuldade na avaliação do efeito tóxico
➔ Disponibilidade reduzida em cadáveres
➔ Utilização em testes de triagem sem processo extractivo
➔ Confirmação do consumo

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➔ Avaliação tempo decorrido entre consumo e colheita da amostra ou a morte
➔ Presença de metabolitos
➔ Degrada-se mais lentamente que sangue
➔ Maior parte dos estupefacientes podem ser detectadas passados 48-72h

(2) Sangue: periférico, cardíaco pode ser contaminado pelos órgãos adjacentes ao
estômago

➔ Correlação entre concentração sanguínea e efeito tóxico


➔ Procedimentos extractivos morosos
➔ Publicações científicas

(3) Órgãos

➔ Amostras extremamente complexas


➔ Procedimentos extractivos morosos
➔ Dificuldade na obtenção de extractos limpos
➔ Utilização reduzida a quando não há sangue disponível

(4) Cabelo

➔ Prioridade na investigação actual das drogas de abuso


➔ Ampla utilização em toxicologia forense
o Caracterização do perfil do consumidor
o Controlo programa desintoxicação
o Controlo na actividade laboral
➔ Pode fixar-se algumas drogas, permitindo a sua detecção muitos anos depois –
passado toxicómano.

55
DL 24/98

Analisador qualitativo
<0,5g/L
Analisador
Negativo Positivo
quantitativo
>0,5 g/L

aceita Requer
sanções contraprova
legais

Análise de
sangue

Exame médico Declaração de Análise de


para confirmação impossibilidades sangue

Impossibilidade
- +
de colheita

Analisador Exame médico para


quantitativo ou determinação de estado
análise de sangue de influência pelo álcool

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GNR e PSP:

➔ Teste do ar expirado
o 1.º teste qualitativo
o 2.º teste quantitativo
➔ Teste da saliva (apenas para triagem)

INML:

➔ Exame de controlo de sangue (obrigatório nas drogas de abuso): as análises


toxicológicas para quantificação de taxa de álcool no sangue apenas podem ser
realizados pelo INML

15) AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO PENAL

A clínica forense tem 3 grandes áreas:

✓ Penal
✓ Civil
✓ Trabalho

Perícias no âmbito do direito penal:

Em DP, os exames visam avaliar as consequências das ofensas corporais, sendo um auxílio para
os magistrados para a tipificação do crime.

➔ Violência doméstica/maus tratos


➔ Crimes contra a integridade física: a esmagadora maioria dos exames em DP são
crimes contra a integridade física, que tem 3 componentes:
o Agressões físicas
o Acidentes de viação
o Agressões provocadas por animais (instigadas)

Prova pericial: tem uma grande importância, principalmente nos crimes em que não há
testemunhas.

A prova pericial visa dar indicações ao juiz, para que este integre com atenção ou no art. 143.º
ou no art. 144.º:

- 143.º: ofensa à integridade física simples, esmagadora maioria das ofensas no dia-a-
dia → é um diagnóstico de exclusão.

- 144.º: ofensa à integridade física grave

57
Necessidade de equilíbrio entre vários conceitos:

✓ Saúde
✓ Doença (ex.: uma nódoa negra não vai ter efeitos no trabalho, mas mesmo assim ainda
é uma doença)
✓ Lesão: tradução da ofensa na pessoa
✓ Ofensa: é uma actuação ilícita, caracterizada por lesão + doença. É necessário avaliar a
intensidade ou gravidade da ofensa.

A ofensa avalia-se desde o momento traumático até ao momento da cura ou da morte.

Morte

Evento traumático danos traumáticos danos permanentes (sequelas)

Até à produção da Cura/Consolidação Cicatriz


cicatriz, temos danos
temporários

O tempo de doença é o período de tempo que decorre desde a produção de lesões até à cura
consolidação. A cura e consolidação são conceitos diferentes:

✓ Cura: reparação integral, fica igual ao que era antes.


✓ Consolidação: há recuperação das lesões até a um momento onde, a partir daí, não se
espera evolução.

Artigo 144.º/a CP: privação de importante órgão ou membro.. (total ou parcial; temporária ou
definitiva)

➔ Conceito funcional de órgão (conceito médico-legal): entendido como parte


componente de um aparelho que contribui de modo especial para as funções desse
aparelho, funções essas necessárias ao normal funcionamento ou equilíbrio do
organismo. Órgãos funcionalmente relevantes.
➔ A privação engloba não apenas a privação anatómica, mas também privação/afectação
grave da função do órgão… ou desfiguração grave e permanente (2.ª parte do artigo
144.º/a)
➔ Alteração, em grau elevado do aspecto da figura do ofendido
➔ É preciso dizer ao tribunal se a pessoa pode fazer algum tratamento para evolucionar
ou minimizar
➔ O dano não deve ser somente considerado do ponto de vista estático, mas também
dinâmico. Ex.: manco, só se nota a andar; paralisias faciais; escalpe (não se pode fazer
nada).
➔ Não é por se poder esconder debaixo da roupa que deixa de ser grave ou se torna
menos grave (a desfiguração não se limita a zonas descobertas).

Artigo 144.º/b CP: tirar ou afectar, de maneira grave a sua capacidade de trabalho…

58
➔ Pode ser um dano temporário (deve-se indicar o número de dias para
cura/consolidação) ou definitivo, desde que grave (tirar-lhe – carácter definitivo;
afectar-lhe – dano temporário).
➔ O emprego é o que tinha no momento da agressão, mesmo que agora tenha outra
➔ O trabalho profissional e geral (ex.: de actividade não profissional)

… capacidades intelectuais…
➔ Alteração da inteligência e vontade
➔ Deve recorrer-se a exames complementares no âmbito da psicologia e psiquiatria: a
avaliação das “anomalias psíquicas” justifica sempre uma avaliação psiquiátrica,
desejavelmente por um especialista com formação na área forense.

… de procriação ou de fruição sexual…


➔ Ablação dos órgãos sexuais (castração), esterilização ou afectação do prazer sexual
➔ Deve-se recorrer a consultas complementares

… possibilidade de usar o corpo, os sentidos ou a linguagem


➔ Alteração da capacidade funcional geral, da visão, audição, gosto, olfacto e tacto, e dos
processos de expressão e comunicação.

Artigo 144.º/c CP: “provocar-lhe doença particularmente dolorosa ou permanente … situação


clinicamente identificada como causadora de sofrimento físico, temporário ou definitivo.

Exemplo: amputação (dores fantasmas); queimaduras

… ou anomalia psíquica grave ou insanável..

➔ Deve-se recorrer a exames complementares de psiquiatria


➔ Estabelecimento do nexo de causalidade difícil

Art. 144.º/d CP: provocar-lhe perigo para a vida.

➔ Possibilidade concreta e presente do resultado letal: a avaliação é habitualmente


baseada na história da emergência hospitalar
➔ Perigo concreto  risco (perigo potencial)
o Corresponde a um “prognóstico reservado”, advém da lesão
▪ Se o indivíduo não for tratado, morre → hemodinamicamente instável

Há sítios em que, com outra gravidade, se pode matar – ex.:


tórax (tem órgãos vitais) e pescoço (passagens aéreas e estruturas vasculares importantes)

Dados a fornecer ao juiz: locais atingidos, quantas lesões tinha e se o objecto era adequado a
produzir aquele tipo de lesões (características das lesões e violência que denotam); a natureza
do instrumento.

A referência à intenção de matar não compete ao perito médico. Sendo confrontado com um
quesito sobre este problema, deve responder não ser da sua competência. Apenas fornece à
justiça os elementos objectivos colhidos na perícia e que possam ser relevantes para o juiz.

59
Cabe a este a responsabilidade de decisão nesta matéria. Elementos relevantes: qual a região
atingida; adequação entre o instrumento utilizado e a região atingida; sinais de violência (não
é tipo de lesões). No caso de ferimentos por armas de fogo, se existem sinais de disparo a
curta distância.

Nota: se o tribunal solicitar uma avaliação do grau de afectação da integridade físico-psíquica,


como isto não integra o elenco de danos avaliáveis no âmbito do direito penal, deve ser
recomendada a realização de uma perícia de direito civil (princípio da reparação integral dos
danos).

Também é importante o nexo de causalidade → relação de imputabilidade entre um


traumatismo e um dano, tendo em conta a adequação entre o tipo de lesões e a sua etiologia;
o tipo de traumatismo e o tipo de lesões; a sede do traumatismo e a sede das lesões; a
existência de continuidade sintomatológica; a adequação temporal entre o traumatismo, as
lesões e as sequelas; e a exclusão da pré-existência de dano ou de uma causa estranha
relativamente ao traumatismo.

O perito tem de dizer ao juiz se as lesões apresentadas podem ter sido consequência da
agressão.

São assim 7 os pressupostos do nexo de causalidade:

1. Adequação entre o tipo de lesões e a sua etiologia


2. Adequação entre o tipo de traumatismo e o tipo de lesões
3. Adequação entre a sede do traumatismo e a da lesão
4. Existência de continuidade sintomatológica
5. Adequação temporal entre traumatismo, lesões e sequelas
6. Exclusão da pré-existência do dano
7. Exclusão de uma causa estranha do traumatismo

O dano não se valoriza em termos de dano futuro (em direito penal).

Existem diferenças no relatório pericial, especialmente no direito civil e no direito penal.

Tipos de exames:

✓ Presencial
✓ Documental (depois de ter visto a pessoa)

Tipos de relatórios:

✓ Preliminar: vê a pessoa e não consegue tirar conclusões


✓ Intercalar: muito raro
✓ Final
Interessam-nos estes
✓ Único e concluído

Relatório pericial: identificação completa da pessoa, entidade que requereu o exame e que o
fez. Quatro capítulos:

✓ (1) Informação É preciso a descrição do dano + a sua


informação e valoração no contexto das
60
regras de direito penal (não basta avaliação)
✓ (2) Estado actual
✓ (3) Discussão
✓ (4) Conclusões

(1) Informação:
a. História do evento: não é vinculativa, a pessoa pode mentir
b. Dados documentais: exemplo, a que hospital foi
c. Antecedentes

(2) Estado actual: parte mais importante do exame


a. Queixas: deve-se registar todos, mesmo que se ache que não vai relevar
b. Exame objectivo: caber se a lesão foi decorrente de evento traumático ou não.

(3) Discussão:
a. Nexo de causalidade: dizer se aquilo que nos é relatado e aquilo que a pessoa
está a contar é compatível ou não
b. Nem sempre se faz no âmbito do direito penal (no direito civil, no qual é
obrigatório)
i. No DP deverá haver uma fundamentação dos danos sempre que uma
eventual complexidade dos mesmos o justifique, nomeadamente
quando estiverem em causa.

(4) Conclusões:
a. Natureza do traumatismo: lesões referidas e observadas. Se não for
compatível paramos por aqui.
b. Consequências temporárias
c. Consequências permanentes (não enquadradas no artigo 144.º)
d. Medidas psico-sociais (ex.: caso de abusos sexuais ou violência doméstica)

➔ Data de cura/consolidação
➔ Tipo de doença e instrumento
➔ Tempo de doença e consequências temporárias (dias)
➔ consequências permanentes
➔ Perigo para a vida
➔ Adopção de medidas processuais

Nota: a intenção de matar não faz parte das conclusões

É necessário haver uma posição crítica em relação a algumas lesões, dando as várias hipóteses
de compatibilidade.

16) AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL NO ÂMBITO DO DIREITO DO TRABALHO

61
Conceito de acidente de trabalho: Acidente que se verifica no local e tempo de trabalho e
produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que
decorra a morte ou a redução de capacidade de trabalho/ganho da vítima (art. 9.º Lei
98/2009). Para além disto, há que considerar também os seguintes lugares:

✓ Entre a residência e o local de trabalho


✓ Entre a residência/posto de trabalho e o local de pagamento
✓ Entre a residência/posto de trabalho e o local onde deva ser prestado assistência por
virtude de anterior acidente
✓ Entre o local do trabalho e local da refeição
✓ Entre o local do trabalho e o local onde deva prestar trabalho determinado pela
entidade patronal

Abrange ainda (artigo 9.º): exercício de direito de reunião; actividade de procura de emprego;
curso de formação profissional; execução de serviços.

No âmbito do conceito de AT, considera-se:

➔ Local de trabalho: todo o lugar em que o trabalhador se encontra ou deva dirigir-se em


virtude de um trabalho e em que esteja, directa ou indirectamente, sujeito ao controlo
do empregador.
➔ Tempo de trabalho: para além do período normal de laboração, o que precede o seu
início ou que se lhe segue, em actos com esta relacionados, e ainda as interrupções
normais ou forçosas.

Acidentes de trabalho na Europa:

✓ Número muito grande de perda de dias de trabalho


✓ O problema põe-se quanto mais pequenas forem as empresas
✓ Portugal tem a taxa mais elevada, apesar de ter havido uma redução do número de
acidentes de trabalho

Acidentes de trabalho em Portugal:

✓ Esmagadora maioria ocorre em homens, idade média 25-55 anos


✓ Maior predominância em profissões muito manuais
✓ A maioria são lesões superficiais, nas extremidades superiores, e não resulta em dias
de ausência (mortos)
✓ Situações mais graves são as menos preponderantes
✓ Grande preponderância de acidentes de trabalho por quedas de altura

Depois de um acidente de trabalho…

➔ 12% das empresas achavam que evitavam o AT se alterassem as condições de


segurança
➔ 58% dos trabalhadores --> aumento do empenho na prevenção

Possibilidade de o acidente ser evitado → métodos arcaicos de actuação.

62
Descaracterização dos acidentes (Artigo 14.º da Lei 98/2009):

o Dolosamente provocado pelo sinistrado


o O que provém exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado
o O que provem do acto ou omissão que importe violação, sem causa justificativa das
condições de segurança
o O que provier de caso de força maior
o O que provier da privação permanente ou acidentes da sua razão (álcool e drogas de
abuso)

Avaliação do dano corporal: cooperação entre a medicina legal e a justiça. Nos acidentes de
trabalho, o objectivo desta avaliação é indemnizar a incapacidade de ganho (no direito penal, é
ver a outra pessoa condenada; no direito civil, é a reparação integral do dano).

Acidente de Cura
trabalho
Consolidação

ITA, ITP Dano Permanente (IPP, IPA, IPATH)

ITA: incapacidade temporária absoluta (Ex: parte a perna, é operado e tem de fazer repouso
total), pelo menos 50% da capacidade necessária

ITP: incapacidade temporária parcial (Ex: pode ir trabalhar de moletas). Incapacidade até à
recuperação que permita trabalhar.

A incapacidade temporária converte-se em definitiva passados 18 meses; pode ser prorrogado


até 30 meses pelo MP.

IPP: incapacidade permanente parcial

IPA: incapacidade permanente absoluta: para toda e qualquer profissão

IPATH: incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual – para o trabalho que fazia
(Ex: estafeta que ficou paraplégico, mas pode atender telefonemas)

Definição de consolidação: momento em que a lesão se fixa e torna permanente, não se


esperando a partir daí qualquer evolução. Não são necessários tratamentos para melhorar,
mas podem ser necessários para evitar o agravamento. É possível apreciar um determinado
prejuízo definitivo. (ex: fractura na articulação é pior que uma fractura no meio da perna.

Direito ao trabalho

✓ Direito à reparação → limitação dos danos reparáveis à incapacidade para o trabalho,


tal como ela era no dia do acidente (não há dano futuro)
✓ Pode concorrer com mais responsabilidades
o O mesmo dano só pode ser reparado uma vez, apesar de poder haver vários
processos
o Penal: compensação ética

63
Art. 23.º, 25.º e 47º da Lei 98/2009: a reparação pode ser em dinheiro ou em espécie (ex:
hospedagem, assistência)

✓ Em espécie: assistência médica; hospedagem; transporte; reabilitação; etc.


✓ Em dinheiro: é indemnizado tudo

As prestações de AT e DP são irrenunciáveis (obrigatoriedade de participação). Por outro lado,


as lesões verificadas a seguir ao acidente presumem-se dele (entidade patronal tem de provar
o contrário) → favorece a vítima. Se não for reconhecido após o acidente, o ónus recai sobre a
vítima.

Participação de AT:

✓ Fase conciliatória: se achar o nível de incapacidade justa (proposta da companhia de


seguros).
✓ Fase contenciosa: há uma segunda avaliação de incapacidade por parte do INML
(exames singulares); se a pessoa não aceitar, vai à junta médica → dá parecer sobre a
avaliação efectuada ao sinistrado, requerida pela parte que não concorda

Art. 25.º da Lei e 46.º do Regulamento: revisões, que têm lugar quando se modifique a
capacidade de ganho. Hoje já não é no prazo de 10 anos e são a título gratuito.

Perito médico-legal: necessidade de sólida preparação médica para saber o que resultou do
acidente; domínio das condições naturais de lesões.

Relatório médico-legal:

✓ (1) Preâmbulo
✓ (2) Informação
✓ (3) Dados documentais
✓ (4) Estado actual
✓ (5) Discussão
✓ (6) Lesões

(1) Informação
o História do evento: importante como factor que influencia o estabelecimento do nexo
de causalidade. Os médicos sabem que há mecanismos específicos que provocam
lesões específicas.
o Todos os exames que foi fazendo ao longo do tempo: importante para o
estabelecimento de incapacidade, especialmente quando há relatórios contrários.

(2) Estado actual


o Queixas: são todos registados para ver o que é verdade
o Exame objectivo: muito descritivo e detalhado. Visa corroborar queixas do examinado
ou suspeitas do perito.

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o Exames complementares: transcreve apenas os resultados relevantes para a avaliação
em causa.

(3) Discussão: em penal nem sempre há discussão, no civil e trabalho é essencial (mais
importante em civil que trabalho)
o Nexo de causalidade: se não for estabelecido, o relatório acaba por aí
o Data de consolidação: se ficou consolidada, o relatório fica por aí
o Incapacidade temporária
o Incapacidade permanente: estabelecidas com base na tabela nacional de
incapacidades (TNi)

(4) Conclusões: mais importante em trabalho que em civil


o tabela de incapacidades:
o Vantagens:
▪ Uniformização de critérios
▪ Controlo da subjectividade
▪ Facilitam acordos extrajudiciais
▪ Coeficientes têm valor meramente indicativo
o Desvantagens:
▪ Valorizam as sequelas de forma imprecisa (pouco rigor científico)
▪ Não têm em consideração a capacidade restante
▪ Muitos peritos sujeitam-se passiva e acriticamente

A TNi ajuda a avaliar o indivíduo como um todo físico e psíquico. Instruções gerais: (têm um
valor meramente indicativo e não vinculativo:

1) Fornece as bases de avaliação do prejuízo funcional


2) A cada prejuízo corresponde um coeficiente expresso em % (proporção da perda de
capacidade de trabalho).
3) A maior parte das lesões tem um intervalo de variação, e no caso específico é que o
médico vai dar um valor (fundamentado no exame objectivo e nas queixas do doente).

Princípio da capacidade restante:

Uma pessoa pode ficar com várias lesões e assim a incapacidade total é a soma dos
coeficientes de incapacidade.

✓ 1.ª lesão: corresponde a uma incapacidade de 10%, a sua capacidade era de 100%,
logo o coeficiente de incapacidade é 0,10.
✓ 2.ª lesão: incapacidade de 5%, mas a pessoa já tinha uma lesão, só tinha uma
capacidade restante de 90% e coeficiente 0,05 x 0,90 = 0,045.
✓ 3.ª lesão: incapacidade de 20%; capacidade restante de 85,5%; coeficiente de 0,171

Soma de todos os coeficientes.

65
4) A possibilidade de dar um bónus (1,5), em caso de ter 50 anos ou mais, ou se a pessoa
não for reconvertível ao posto de trabalho (não se podem acumular)/ou quando
houver alteração visível do aspecto físico.

Outras instruções gerais:

➔ A cada situação de prejuízo funcional corresponde um coeficiente (%) que traduz a


perda de capacidade de trabalho – tendo em conta intensidade e gravidade, bem
como idade e profissão habitual
➔ Sempre que as circunstâncias excepcionais o justifiquem, pode ainda o perito afastar-
se dos valores de coeficientes previstos – expondo claramente e fundamentando as
razoes que a tal o conduzem e indicando o sentido e medida do desvio em relação ao
coeficiente
➔ As incapacidades que derivem de disfunções ou sequelas não descritas são avaliadas
pelo coeficiente relativo a disfunção análoga
➔ Confere também direito à reparação a lesão/doença que se manteve durante o
tratamento e seja consequência desse tratamento
➔ A predisposição patológica não exclui o direito à reparação integral, salvo quando tiver
sido ocultada ou tiver sido causa única da lesão ou doença
➔ Quando a extensão e gravidade do défice funcional apontar para o valor mínimo de
intervalo de variação, o perito pode aumentar no sentido do valor máximo, tendo em
atenção
o Estado geral da vítima
o Natureza das funções exercidas
o Idade
➔ Quando a lesão/doença for agravada por lesão/doença anterior, a incapacidade avalia-
se como se tudo dele resultasse, salvo se já esteja a receber/tiver recebido (o estado
anterior deve constar dos capítulos “antecedentes” e “discussão”)
➔ No caso de IP anterior, a reparação corresponderá à diferença.

Parâmetros de danos:

1. Danos Temporários:
a. iTPA: período durante o qual a vítima esteve totalmente impedida de realizar a
sua actividade profissional habitual → avalia-se em dias.
b. iTPP: período em que a vítima passou a ter pelo menos 50% da capacidade
necessária → avalia-se em dias e taxas
i. Dificuldade de valoração retrospectiva → pode aceitar-se períodos e
taxas atribuídas pelos médicos.
ii. Existem habitualmente vários períodos de iTPP → a 1.ª taxa deve ser
fixada no dobro do coeficiente previsível numa futura situação de
incapacidade permanente, sendo reduzida gradualmente.

A incapacidade temporária transforma-se em permanente decorridos 18


meses (este praxo pode ser prorrogado até ao máximo de 30 meses pelo MP a
pedido de entidade patronal9.

66
2. Danos Permanentes:
a. Incapacidade permanente: perda de trabalho em resultado de uma ou mais
disfunções, como sequelas das lesões. Podem existir diversos níveis de
incapacidade permanente
i. iPP Determinadas tendo em conta globalidade das sequelas
ii. iPA (valoriza-se não só o dano no corpo, como a sua
iii. iPATH repercussão funcional e situacional, com preponderância
das actividades profissionais)

A quantificação do dano é concretizada através do TNi (tabela nacional de incapacidade por AT


ou DP)

b. Dependências

Acidente de trabalho  doença profissional:

✓ A doença profissional também confere direito à reparação, e passa pelo risco →


diagnóstico → doença. Esta também tem uma ligação com a actividade profissional
(isto não quer dizer que todas as doenças com esta ligação sejam doenças
profissionais), e caracterizam-se por:
o Causa
o Circunstância em que ocorre
✓ Distinguem-se do acidente de trabalho:
o O acidente ocorre subitamente
o A doença insidiosamente

Existem 3 sistemas de fixação de Doença Profissional:

1. Prova: o trabalhador prova que a sua doença é resultante do seu trabalho


2. Lista: há uma lista reconhecida e são consideradas as doenças da lista
3. Misto: aceitam-se as doenças da lista e ainda outras que sejam provadas → é o
sistema português

17) AVALIAÇÃO DO DANO CORPORAL EM DIREITO CIVIL

É a área mais abrangente e complexa dentro da avaliação do dano corporal. O papel do perito
é interpretar os indícios nos vestígios para chegar a uma imagem o mais próxima da realidade
possível. Consoante o ramo no âmbito do qual se faz a avaliação, haverá abordagens parciais
distintas, daí sendo possível haver conclusões distintas.

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Em direito civil, prevalece o princípio da reparação integral do dano (medicamente utópico): já
não em direito do trabalho, onde prevalece a capacidade de ganho. Isto desde que tenha
dignidade suficiente para merecer a tutela do direito.

É um princípio, do ponto de vista médico, utópico, pois não ficará na situação em


que estava antes de dano. Porém, fazemos tudo para ficar na posição o mais próximo possível,
inclusive por meios compensatórios.

A avaliação recai sobre:

✓ Danos patrimoniais (ex: compra de uma cadeira de rodas)


✓ Danos não patrimoniais (sofrimento)

Esta é uma actividade difícil, pois há uma subjectividade dupla na avaliação, tanto o doente
como o médico tiveram cada um de determinar graus de dor, que serão o máximo de que
conhecerão. Há muitas situações de dissimulação. A relação de confiança com um médico-
clínico é maior que com um médico-perito.

Lesões traumáticas: têm uma de duas evoluções:

✓ Cura: restituição anatómica, psíquica e psico-sensorial integral; a pessoa fica


exactamente igual ao que era antes das lesões ( da noção de cura clínica).
✓ Consolidação: é o que ocorre na maioria dos casos. A evolução pára num ponto onde o
sujeito não era igual ao que era antes, não recupera totalmente, tendo sequelas para o
resto da vida.

O primeiro grande momento da perícia é a determinação da data de cura ou de consolidação,


muito importante para distinguir os danos temporários dos danos permanentes (os danos vão
sofrendo alterações contínuas, no sentido da consolidação ou cura). Enquanto há evolução,
estamos na fase dos danos temporários.

Uma lesão pode consolidar ainda que o sujeito permaneça com tratamentos desde que não
sirvam para promover melhorias, apenas para evitar um retrocesso.

Apontamos para uma data fixável, há um período em que se considera que as lesões já não são
susceptíveis de causar alterações.

(Ver esquema final)

Estabelecida a data, passamos para os parâmetros. Agora falamos antes do défice funcional
temporário, não de incapacidade temporária geral (tentativa de harmonização europeia). Fixa-
se em número de dias, não em pontos

É a implicação que as lesões têm no período de evolução, nos actos gerais do


dia-a-dia – isto 1.º na perspectiva de um cidadão comum; depois, passamos para
as especificidades do sujeito, com repercussão na actividade profissional
(temporária) → repercussão temporária na actividade profissional

68
Quantum doloris: é o quantum de dor sofrida, física/orgânica e psicológica. Temos:

✓ Dores físicas, orgânicas


✓ Dores psicogénicas, individuais, dependentes de factores próprios.

É muito subjectiva: não só é avaliada diferentemente, como pode ser sentida de modo distinto
consoante da lesão traumática, consoante a sua extensão física e psíquica. Porém, há também
muitos parâmetros objectivos, que só um médico sabe avaliar – características dos
tratamentos, modalidades dos tratamentos, evolução das lesões. São factores objectivos:

✓ Características das lesões traumáticas


✓ Modalidades de tratamento
✓ Evolução das lesões

Em casos excepcionais, pode ser valorado como dano permanente (não esteja incluído no
défice funcional ou outros parâmetros). Ex.: membro fantasma. Será muito raro.

Medição da dor: antes, usávamos uma escala de muito ligeiro a muito importante. A nível
europeu convencionou-se abandonar a escala qualitativa e substituir por uma escala
quantitativa (grau de 1 a 7).

A escala quantativa de 1 a 7 não é obrigatória, mas é a mais usada.

Na maioria dos casos, o quantum da dor para lá da consolidação está contida nos parâmetros
dos danos permanentes → princípio da proibição da dupla valoração do mesmo dano.

O perito deve explicar no capítulo “discussão”, as razoes que levaram à inclusão num dado
grau.

Défice funcional permanente (antiga incapacidade permanente geral): aqui, atribuem-se taxas
de incapacidade, algo muito importante. As taxas estão muito dependentes do que é 100%
para uma pessoa e de representação sócio-cultural. Agora, falamos de “pontos” para não ser
tão taxativo como uma percentagem, há pontos de apreciação, não de medida. Vale mais uma
coração ou um fígado? A função respiratória ou circulatória? Não é possível hierarquizar.

Em relação à TNi: é obrigatória a fundamentação deste dano quer através de uma descrição
correcta e pormenorizada das queixas e sequelas, quer através da implicação deste dano na
autonomia e independência da pessoa.

Foi um autor francês que conceptualizou as tabelas de incapacidade 100% de incapacidade


equivale à morte, mas ninguém duvida em dar 100% a um tetraplégico ou a alguém em coma.

Hoje defendemos que, além da taxa, o perito deve referir quais os reflexos das lesões nas
várias actividades da vida da pessoa, para melhor informar quem tem de decidir acerca das
indemnizações.

O nosso direito civil permite que o dano indemnizável seja o dano certo (aquele que já existe)
e o dano futuro. Passou a ser uma rotina acrescentar o dano futuro, como maneira de
satisfazer mais o sinistrado → agora deixa-se apenas uma nota sobre a possibilidade de dano

69
futuro ( dano potencial: não é valorado, pois não é inexorável) – se ocorrer, há reabertura do
processo.

Dano futuro → quando seja previsível, deve o perito fundamentar esta circunstância na
“discussão” e assinalá-la nas “conclusões” → dadas as dificuldades na fixação objectiva, não se
deve proceder à quantificação, apenas se assinala a verificação.

No seguimento de um pedido da Comissão Europeia, criou-se uma tabela de avaliação da


incapacidade europeia, que está a ser experimentalmente usada por funcionários da UE mas
não é ainda obrigatória.

Em 2007, entre nós publicou-se duas tabelas, para direito civil e direito do trabalho. É
actualizada de 6 em 6 meses a tabela europeia, a nossa não é actualizada há 4 anos. Em 1960
tivemos a 1.ª tabela de direito de trabalho, que tinha uma série de erros, tendo durado 37
anos/ correcção. Quanto à tabela, ver “recomendação”.

Em França, a perícia tem de ser feita por um médico com especial formação; entre nós,
qualquer médico pode elaborar perícias – mas apenas quem tem competência em avaliação
do dano corporal deveria ter tal poder.

Deve dizer-se que a incapacidade é “fixável” em 20, por exemplo → para transmitir que o valor
não é absolutamente taxativo.

Dano estético: suscita muitas questões. Uma cicatriz na cara não deve ser analisada de modo
igual em duas pessoas, interessa entrar na experiência psicológica que a vítima faz dos danos.
Cada sequela deve ser valorizada apenas uma vez, com excepção do dano estético. Assim:

✓ Deve ser uma avaliação personalizada


✓ Deverá ser feita pelo juiz? Não faz sentido, porque não tem preparação para avaliar o
impacto; a lesão pode ser em zonas íntimas, não é em audiência que se apercebe de
dissimulação, etc.
✓ Deve ser uma avaliação dinâmica e não estática (ex: mancar)

O dano estético tem virtualidades de dano patrimonial, quando tal tiver reflexos na actividade
profissional. Por outro lado, um dano estético temporário pode ser incluído no âmbito da
avaliação quantum doloris.

Também aqui usamos uma escala quantitativa de 1 a 7. Abandonamos a qualitativa, mais uma
vez, para não fragilizar quem ficou desfigurada.

Repercussão nas actividades lúdicas e desportivas: é um parâmetro de dano mais complexo. É


o reflexo do prejuízo funcional nas actividades que comprovadamente eram praticadas antes
do acidente e que representam uma ampla negação de realização pessoal.

Repercussão na vida sexual: apenas situações subjectivas de realização do acto sexual; lesões
traumáticas ou medulares cabem no 1.º parâmetro.

70
Categorias de danos: a valoração dos diversos parâmetros de dano é feita no capítulo
“Discussão” → a fundamentação é sempre obrigatória, não só na discussão, mas também
através de uma descrição pormenorizada nos respectivos capítulos.

1) Danos temporários:
a. Repercussão temporária na actividade profissional → dano patrimonial
b. Défice funcional temporário
Danos não patrimoniais
c. Quantum doloris

2) Danos permanentes
a. Repercussão permanente na actividade profissional
Danos patrimoniais
b. Dependências
c. Défice funcional permanente
d. Dano estético permanente Danos não patrimoniais
e. Repercussão na actividade sexual
f. Repercussão nas actividades desportivas e lazer

Relatório Pericial (perícias médico-legais em qualquer ramo)

➔ Dois momentos:
o Identificação e descrição dos danos -> =independentemente do ramo
o Interpretação e valoração dos elementos observados

Sempre independentemente do ramo

➔ Capítulo em que tem lugar a identificação/descrição dos danos:


o Informação:
▪ História do evento
▪ Dados documentais
o Antecedentes
▪ Fundamental no âmbito da ponderação de nexo de causalidade (pode
dar indicações quanto a eventual estado anterior)
o Estado actual → danos considerados a três níveis: corpo, funções e situações
de vida
▪ Queixas
▪ Exame objectivo
▪ Exames complementares

➔ Discussão: é a parte fundamental do relatório, fundamenta as conclusões, se há nexo


de causalidade e ainda os motivos para classificação do dano estético e quantum
doloris.

O capítulo da “discussão” varia consoante as especificidades do


enquadramento legal, mas envolverá sempre a análise do nexo de causalidade e de proposta
da data de cura/consolidação.

71
18) NEXO DE CAUSALIDADE

O nexo de causalidade (imputabilidade médica) corresponde ao estabelecimento de uma


relação entre a alteração na integridade psíco-físico de uma dada pessoa e um determinado
evento, mais frequentemente traumático.

Na ponderação deste nexo, o perito deve ter em consideração os critérios clássicos:

✓ Natureza adequada do acto ou evento em causa para produzir lesões


✓ Certeza diagnóstica, ou seja, natureza adequada das lesões ou sequelas à etiologia em
causa
✓ Exclusão da pré-existência do dano
✓ Adequação entre a região atingida e a sede da lesão ou sequela
✓ Adequação temporal
✓ Encadeamento anátomo-clínica
✓ Exclusão de uma causa estranha

Os primeiros 6 são apenas elementos de reflexão; o 1.º já é absoluto, ou seja, a exclusão de


uma causa estranha é condição do estabelecimento do nexo.

Pode ser:

o Certo/hipotético
o Directo/indirecto Se for certo, directo e total não temos dúvida
o Total/parcial

1. Nexo hipotético: a análise dos critérios não permite o estabelecimento com segurança
do nexo, mas o perito também não o pode afastar. Nestas situações, o perito deve
explicar ao julgador os argumentos científicos a favor e contra o nexo.
2. Nexo indirecto: ex. infecção por SIDA na sequência de uma transfusão sanguínea
necessária na sequência da lesão.
3. Nexo parcial: quando num estado patológico intervém mais do que um factor
etiológico, o nexo é parcial porque há várias causas que concorrem para o dano

Estado intercorrente: é toda a alteração de saúde, acidente ou outro, que surge durante ou
depois da acção traumática, que é uma das causas do estado actual. Ex: um acidente posterior
ao traumatismo que se está a analisar.

Predisposição: é uma variedade do estado anterior, que corresponde frequentemente a um


estado psicológico ou factores de risco.

Não há conhecimentos científicos suficientes que nos permitam dizer que a predisposição se
iria manifestar algum dia ou não se iria manifestar → alguns autores defendem que, em caso
de dúvidas, o dano deverá ser imputado na sua totalidade ao evento.

72
Estado anterior: corresponde ao estado que se verificava imediatamente antes, ou seja, no
momento da ocorrência do factor causador da lesão. O estado anterior para influenciar ou
alterar a evolução das lesões, ou seja, abrange um conjunto de antecedentes (como lesões
pré-existentes ou predisposições) susceptíveis de intervir no processo patológico consecutivo à
acção traumática → o perito apenas deve revelar os antecedentes que constituem um estado
anterior potencialmente relacionado com a situação em análise.

Assim, podemos ter:

✓ Exteriorização: é a passagem de um estado latente, conhecido ou desconhecido, ao


estado patente em que se manifesta clinicamente a sua condição patológica. O
evento traumático desencadeia o aparecimento do estado anterior → os autores
defendem que o dano deve ser integralmente reparado pelo responsável.
✓ Descompensação: o estado anterior já era conhecido, mas estava estabilizado. O
evento veio fazer evoluir esse estado.
✓ Aceleração: há uma precipitação do processo evolutivo, sendo a evolução a que se
previa para a doença pré-existente, mas com um intervalo evolutivo encurtado.
✓ Agravamento: passagem de um estado patológico conhecido para um de maior
gravidade.

Em relação ao estado anterior, temos de fazer 3 questões:

1. Qual seria a evolução decorrente do evento sem o estado anterior?


2. Qual seria a evolução do estado anterior sem o evento traumático?
3. Qual foi a evolução decorrente do complexo estado anterior/evento?

Como avaliar? Quando estamos a valorar o estado anterior, no âmbito da valoração do dano
corporal, a avaliação depende do ramo em que a perícia se processa. No âmbito do direito do
trabalho, estão legalmente definidas e publicadas regras que devem ser observadas quando se
verifique a existência de estado anterior.

Lei 98/2009. O artigo 11.º estabelece a regra de que, quando uma lesão ou doença que é
consequência do evento é agravada pelo estado anterior, lesão ou doença pré-existente, então
a incapacidade avaliar-se-á como se tudo tivesse resultado do evento (Salvo se o sinistrado já
tenha sido indemnizado por essa lesão anterior)

Num caso de incapacidade permanente anterior, a reparação é apenas o correspondente à


diferença entre a incapacidade anterior e a actual (que é calculada como se tudo tivesse
resultado do traumatismo). O coeficiente de incapacidade global não é calculado pela
capacidade integral, 100%, mas sim pela capacidade restante.

Em direito civil, demos assumir uma metodologia autónoma, o que caracteriza a avaliação do
dano de natureza civil. Há normas que não admitem que dois peritos possam avaliar um
indivíduo de forma .

Interessa-nos sobretudo os casos em que as lesões provocam um agravamento do estado


anterior ou em que este influencia negativamente a normal evolução daquelas. O estado

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anterior que altera a evolução das lesões no sentido positivo (melhora) não merece
valorização médico-legal.

Que situações do estado anterior devem ser consideradas concausas atendíveis? Não
podemos considerar as vulnerabilidades anátomo-fisiológicas normais. (ex: idoso, debilitado,
em que a consolidação é mais tardia)

As concausas existentes fisiológicas não deverão ser atendidas parcialmente.

Temos 3 situações distintas:

1) Evento traumático não agravou o estado anterior, nem este teve influência negativa
sobre as consequências daquele: deve-se apenas valorizar as lesões resultantes do
evento, desconsiderando o estado anterior. Os parâmetros de avaliação do dano em
direito civil (défice funcional temporário, permanente, quantum doloris, etc.) devem
ser valorizados atendendo apenas às lesões recorrentes do evento.
2) O estado anterior tem influência negativa sobre as consequências do evento
traumático: só não se valoriza o que for exclusivamente devido à influência do estado
anterior.
3) O evento agrava o estado anterior/exterioriza uma patologia latente. Aqui, temos
novamente 3 hipóteses:
a. O acidente anterior tinha já uma avaliação pericial de direito civil: a
indemnização é calculada com base na diferença de parâmetros
b. O acidente anterior tinha já uma avaliação pericial de direito do trabalho: não
podemos fazer aquela substração, uma vez que há tabelas diferentes. O perito
deve fazer a avaliação do estado anterior com os dados disponíveis, e depois
medir a diferença.
c. Não há qualquer avaliação pericial:
i. Se agravou o estado anterior: com os dados disponíveis, faz-se uma
avaliação do estado anterior
ii. Se exteriorizou: deve ser feita uma avaliação própria para cada situação.
Se não fosse provável que essa patologia se viesse a revelar, o evento
deverá ser totalmente responsabilizado; se existe dúvida, estes são
problemas muito complexos e devem ser discutidos caso a caso (não se
pode estabelecer regra geral).

19) PSIQUIATRIA FORENSE

Ao longo da história, a doença mental tem tido várias acepções.

✓ Cultura greco-romana: foi aqui que as doenças começaram a ser classificadas.


Hipócrates é o 1.º a falar de epilepsia (antes chamava-se ser possessão demoníaca).
No direito romano, surge a ideia de “persona”, e considerava o direito vedado aos
mentecaptos.
✓ Idade média: há um retrocesso no conceito da doença, tendo muitos doentes sido
mortos com fogo → retrocesso ao conceito mítico-religioso. Surgem os primeiros
hospitais.

74
✓ Racionalismo: a revolução francesa trouxe a 1.ª grande revolução da psiquiatria. Pirel
libertou os asilados de um manicómio, e introduz os conceitos de “liberdade” e
“moral”. Começou nesta altura a introduzir-se o conceito de que não há crime quando
o sujeito estivesse sob uma força mental irresistível, sendo impossibilitado de fazer
uma escolha.

Nascem os hospitais psiquiátricos, que visariam também a defesa da segurança pública – é


onde se recolhe o doente para não prejudicar a sociedade. Os médicos alienistas eram
chamados aos tribunais e no início quando o sujeito acusado tivesse doença mental – início de
psiquiatria forense.

Os exageros do racionalismo levaram ao aparecimento de modelos xxx – deterministas → o


delinquente é o resultado de um determinismo biológico, social e educacional. O ser criminoso
é um ser doente com necessidade de tratamento.

✓ Fins do século XIX: a psiquiatria é já uma especialidade médica, preocupada com


questões legais e administrativas. Surge a terapia de raiz psicanalítica (Freud e seus
discípulos). É estudada a “demência precoce” (hoje esquizofrenia); e as doenças
degenerativas do SNC (Alzheimer).
✓ Depois da 1.ª Guerra Mundial: surgem grandes autores como Bleuler, Paveav, etc. Em
1952, surgem os 1.º tratamentos para psicoses através de fármacos. Também as
primeiras classificações operativas: DSTI (não deve ser usado para fins jurídicos) e CID.

Já no fim do século XX, houve um grande desenvolvimento das neuro-ciências, sobretudo da


neuro imagem.

Noção de psiquiatria forense: Pode definir-se como o conjunto de conhecimentos médicos e


especialmente psiquiátricos, necessários para a resolução dos problemas que coloca o Direito
na sua aplicação dos doentes mentais. Não é um mero ramo da ML nem uma sub-
especialidade psiquiátricas; é uma especialidade clínica posta ao serviço da justiça; a perícia é
um acto médico, ainda que não termine com prescrição terapêutica.

Em Portugal, a evolução da psiquiatria dá-se em 6 períodos:

➔ Fundação em 1848 do Hospital de Rilhafoles e, em 1883, do Hospital Conde


Ferreira.
➔ Reforma assistencial e avanço na investigação.
➔ Criação do ensino universitário de psiquiatria (1911).
➔ Acção pedagógica nos anos 20 e 30, com a formação de psiquiatras (Sobral Cid).
➔ Auge de terapêutica ocupacional com o surgimento posterior das terapêuticas
farmacológicas.
➔ Início do ensino de psicologia médica e criação dos serviços de psiquiatria nos
hospitais gerais (1995).

Legislação regulamentar da psiquiatria forense:

➔ 1.º Código Penal: não faz referência ao doente mental (1852)


➔ Revisão do CP de 1886: já se faz referência à doença mental

75
➔ Lei da obrigatoriedade do exame médico-legal: ideia de hospital de alienados,
tratamentos
➔ DL 39/688 (1954): surge pela 1.ª vez o conceito de perigosidade; referida como
“tendência para a perpetração de actos de violência”.

Quer o conceito de doença mental, quer o de perigosidade, são conceitos jurídicos.

DL 326/86: exige que uma perícia seja solicitada às delegações da área do tribunal, que
a distribuirá pelos diversos serviços, aos quais cabe a realização de vários exames. O professor
entende que esta lei ainda está em relação à urgência das perícias. São prioritárias as perícias
que envolvem cidadãos internados em cumprimento de medidas de segurança ou outras
medidas privativas da liberdade.

Se necessidade de intervenção psiquiátrica:

✓ Pedido ao INML
o Realização da perícia ou no instituto ou
o Distribuição pelas instituições psiquiátricas (excepcional)
Por exemplo, um dos critérios de distribuição é a proximidade da localização: todos os
psiquiatras podem ser chamados a fazer pericias ainda que não tenham competência.

Mas temos ainda a Lei n.º 45/2004 (é a que está em vigor):

✓ Art.2.º: as perícias médico-legais são realizadas obrigatoriamente nas delegações


e gabinetes do INML.
✓ Art.24.º: os exames a perícias de psiquiatria e psicologia forense são solicitadas
pela entidade competente à delegação do INML da área territorial do tribunal que
os requer (n.1º)

Porém, sempre que a delegação não disponha de especialistas em


número suficiente nesta área, pode definir os exames a serviços
especializados do SNS (n.2º). Na prática, é isto que sucede.

Ou seja, é obrigatoriamente realizada nas delegações e gabinetes; excepcionalmente, por


entidades terceiras, públicas ou privadas (solicitadas à Delegação da área competente, que
pode definir os serviços especializados tendo em conta: possibilidade de resposta dos serviços;
área assistencial; residência habitual dos examinados).

O art. 159.º/7 do CPP estabelece quem pode requerer a perícia psiquiátrica – representante
legal do arguido/cônjuge (na falta deles, ascendentes, descendentes, etc.)

Valor da prova pericial (art. 163.º CPP):

✓ O juízo técnico-científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre


apreciação do julgador
✓ Sempre que a convicção do julgador divergir do juízo contido no parecer dos peritos,
deve aquele fundamentar a divergência.
Assim:

76
o O perito declara o sujeito inimputável → o juiz fica de “mãos atadas” para dizer o
contrário (“ditadura pericial”)
o Quando há divergência, o juiz deve fundamentá-la, podendo ser pedida uma nova
perícia
o Muitas vezes o perito tem grande dificuldade em se decidir por uma das hipóteses de
conclusão
o De qualquer forma, em última instância, não é o perito a declarar a
inimputabilidade/imputabilidade do sujeito, dado que este é um conceito jurídico → o
perito apenas deve apontar os dados médico-psiquiátricos para o juiz decidir.

Em relação à perigosidade:

Não é um diagnóstico nem tão pouco representa um prognóstico, tratando-se de uma previsão
que exige a consideração da pluralidade das diferentes causas criminogénicas:

✓ Patológicas
✓ Psicológicas
✓ Sociológicas

Não se limita a investigações exclusivamente psiquiátricas

Disgnóstico do estado perigoso do ponto de vista médico-legal:

✓ Indícios médico-psicológicos
✓ Indícios legais (antecedentes judiciários)
✓ Indícios sociais (factores do meio)

Não é um estado permanente e imutável!

Está previsto no art. 91.º do CP → quando é de esperar que venha a cometer outros crimes

Compete ao tribunal extrair uma conclusão sobre a perigosidade com base na:

✓ Anomalia mental
✓ Personalidade do agente
Não é o médico a avaliar
✓ Crime cometido
✓ Meio circundante

Tipos de exames:

Temos exames psiquiátricos nos vários âmbitos do Direito: penal, civil e trabalho
principalmente. O trabalho pericial deverá ser solicitado pelo juiz em situações que escapam
ao seu entendimento técnico-jurídico.

Perícias no direito penal. Os artigos clássicos no CP são:

✓ Art. 20.º: imputabilidade

77
✓ Art. 144.º: vítima de uma agressão com consequências psíquicas (agravação da
moldura)
✓ Art. 165.º: abuso sexual de menor incapaz

No direito civil, é principalmente para avaliação das sequelas de um acidente; o mesmo no


direito do trabalho.

O exame psiquiátrico forense distingue-se do exame clínico. Apesar de a entrevista não ser
muito diferente, o objectivo é completamente distinto – a avaliação clínico-psiquiátrica visa o
estabelecimento de um diagnóstico psiquiátrico, a criação de um plano terapêutico e o
prognóstico do doente. Tem três fases:

✓ Triagem
✓ Fase intermédia Principal objectivo: elaborar plano tratamento (base social)
✓ Plano terapêutico

Já no exame forense, o motivo tem de ser determinado pelo tribunal, a base social
desaparece. É menos abrangente e termina com um relatório, um parecer.

A entrevista forense é mais antropológica, determina o conjunto de elementos que rodearam


o comportamento do indivíduo em dada situação. Reporta-se a uma actuação circunscrita, não
ao comportamento em geral → a imputabilidade não é aferida em abstracto, antes em relação
a um facto (perspectiva ideográfica).

Já as conclusões têm de esclarecer o tribunal sobre as questões que colocou. Seria muito
extenso se contivesse todas as informações que o perito deve recolher. Deve ser
pormenorizado, mas não extenso.

No caso das perícias, o segredo médico não se aplica – os dados relevantes para o caso/crime
devem ser admitidas. A pessoa deve é ser informada que aquelas informações não são
confidenciais.

A perícia sobre a imputabilidade é a clássica no direito penal. “Imputar” significa atribuir culpa
a alguém. A anomalia psíquica é um conceito misto – psicológico e normativo; mas há outros
sistemas que funcionam de forma diferente.

A imputabilidade mantém pelo menos duas funções psíquicas intactas: juízo de realidade e
volição; inteligência e vontade. O médico tem de responder a este conceito jurídico → noção
exclusivamente jurídico; a medicina apenas oferece à justiça os meios que facilitem a decisão
do juiz.

Havendo declaração de inimputabilidade, o perito tem de se pronunciar sobre a perigosidade.


Também é um conceito jurídico, não há critérios psicológicos para determinar se alguém vai ou
não voltar a cometer crimes. Há patologias mais inclinadas ao crime, mas estas tendem a ser
atribuídas a imputáveis. A perigosidade deve ser sujeita a tratamento adequado, com o qual
estará comprometida a sua actuação. É um conceito sempre dependente do tratamento. É um
juízo muito difícil de se fazer.

78
A perícia não devia ser só feita na audiência de julgamento – devia ser logo na fase de
inquérito.

Art. 20.º CP:

o N.º1: inimputabilidade
o N.º2: imputabilidade diminuída → ainda não se aplicou em Portugal
o N.º3: incapacidade para ser influenciado pelas penas → assenta aos anti-sociais e
psicopatas.

Art. 91.º CP: o n.º2 impõe uma duração mínima de internamento de 3 anos, o que não faz
sentido.

Art. 509.º CPP: é possível pedir a realização de uma segunda perícia, até porque há casos de
erros ou incongruência.

Art. 131.º CPP: capacidade para testemunhar. Há casos em que pessoas não podem prestar
declarações, por questões médicas.

Art. 104.º CP: imputáveis com anomalia psíquica. É possível declarar uma pessoa imputável,
mas ser portador de anomalia psíquica. Nesses casos, pode ser internado em vez de ir para a
prisão, se tal for perigoso para ele.

Inimputabilidade por anomalia psíquica: duplo pressuposto

✓ Pressuposto biológico: anomalia psíquica, designação ampla que engloba toda a gama
de patologia psiquiátrica, desde que produza o efeito psicológico referido.
✓ Pressuposto psicológico ou normativo: incapacidade do agente para avaliar a ilicitude
do facto de se determinar de acordo com ela. Reporta-se apenas ao acto.

Notas: não é por o perito encontrar uma patologia (esquizofrenia) que se atribui a
inimputabilidade → não depende directamente do diagnóstico do distúrbio, mas sim da análise
cuidadosa do caso. Reporta-se à acção.

Lei da Droga (1993): determina que, logo no interrogatório, se se aperceber que alguém é
toxicodependente, pode ser submetido a uma avaliação para determinar o seu estado de
toxicodependência.

É preciso saber…

✓ Pressupostos médico-legais
✓ Conceito de psiquiatria forense
✓ Imputabilidade
✓ Lei da droga
✓ Mecânica de distribuição das perícias e como são feitas
o Tem de se pedir à Delegação, não ao médico Região Centro e Ilhas vão para
Coimbra.

20) PSIQUIATRIA FORENSE EM DIREITO CIVIL E DO TRABALHO

79
Em direito civil, o que estão em causa são as capacidades civis do indivíduo – terá a pessoa
capacidade para dispor dos seus bens e da sua própria pessoa ?

Vontade (liberdade) + inteligência: a partir destes conceitos fala-se em imputabilidade em


direito penal, sendo os sujeitos imputáveis a partir dos 16 anos; e em capacidade no direito
civil, a partir dos 18 anos.

Em termos psiquiátricos, as perícias de direito civil são mais difíceis.

A incapacidade pode ser declarada em menores, surtindo os seus efeitos logo na data em que
atinja a maioridade (casos de deficiência grave).

Dois conceitos:

✓ Habitualidade
✓ Actualidade

Interdição, art. 138.º: aplica-se a casos de anomalia psíquica, surdez-mudez e cegueira. É


preciso avaliar o caso na sua especificidade, ver a adaptação do indivíduo ao meio em que se
insere e ao tipo de vida que tem. Um interdito é equiparado a um menor.

Inabilitação, art. 152.º: tem pressupostos semelhantes, cabendo aqui os casos menos graves.
São casos mais raros – ex: alcoolismo crónico (pelo art. 20.º/2 CP pode ser declarado
inimputável, tem de se demonstrar no caso um não controlo do juízo e de vontade).

Artigos CPC:

o Art. 896.º: realização do exame pericial e interrogatório


o Art. 897.º: interrogatório pelo juiz
o Art. 898.º: exame pericial, pelo perito. Deve precisar:
o Espécies de afecção que sofre o requerido
o Extensão da incapacidade
o Data provável de começo
o Meios de tratamento propostos

Quais as patologias mentais susceptíveis de levar à interdição ou inabilitação? Demências,


quadro psicóticos, Alzheimer. Quanto às psicoses, estas podem não afectar a inteligência e a
vontade, a conduta pelos padrões de sociedade, mas tudo depende do caso.

Quanto à extensão da incapacidade, este pode ser total ou parcial.

Quanto à data de início:

✓ No caso de atraso mental, que normalmente vem do período pré-natal, a data é a data
de nascimento
✓ Já nos casos dos doentes, determinar uma data é muito difícil.
✓ Se a anomalia psíquica provier, por exemplo, de um acidente, é fácil.

Finalmente, ao juiz também interessa saber se há possíveis medidas de acompanhamento.

80
Capacidade de testar: a questão aqui é a de saber se estava capaz no momento da feitura do
testamento. Mesmo que haja um registo do hospital, pode não conter toda a informação
relevante → é muito difícil de averiguar. Para além do caso da incapacidade acidental, são
incapazes de testar os menores não emancipados e os interditos por anomalia psíquica (art.
2189.º CC).

Reparação do dano: interessa aqui quanto a sequelas psíquicas, no caso de um evento


traumático tiver repercussões sobre a integridade psíquica e tal se mantiver no tempo.

Evento traumático:

✓ Stress pós-traumático
✓ Traumatismo craniano: pode levar a lesões neurológicas ou neuropsiquiátricas
(epilepsia) ou a lesões a nível psicológico.

Reparação em direito civil  direito do trabalho

Reparação integral Apenas releva a capacidade de


de todos os danos trabalho (=ganho), mais nada
subsequentes ao
evento traumático

Logo, utilizam-se 2 tabelas distintas e avaliações diferentes

Nexo de causalidade: na classificação americana, que nós não usamos, tem de ser o médico a
provar o nexo de causalidade, sendo que um dos critérios é a existência de uma experiência
pós-traumática. Entre nós, é a vítima que tem de demonstrar o nexo de causalidade. Esta
prova só o médico pode colocar em causa, fazendo-o com base em princípios técnicos.

Tipos de avaliações periciais – há 3 tipos:

✓ Transversais
o Anomalia psíquica posterior
o Interacção/inabilitação
✓ Retrospectivas
o Imputabilidade no momento da prática do facto
o Capacidade de testar
✓ Prospectivas
o Perigosidade
o Processo gracioso de liberdade condicional

Quando alguém está a ser avaliado para ver se tem uma anomalia psíquica, em virtude de um
acidente, implica determinar uma indemnização em dinheiro → leva a muitas simulações.

A simulação distingue-se do transtorno factício e dissociativo:

✓ Transtorno dissociativo: motivação inconsciente + produção de sintomas inconscientes

81
✓ Transtorno factício: motivação inconsciente + produção de sintomas consciente
✓ Simulação: motivação consciente + produção de sintomas consciente.

Tem vários tipos: dissimulação, sobressimulação, etc.

Stress pós-traumático: é uma das possíveis patologias decorrentes de um trauma. Pode ter
uma duração curta ou longa. 3 tipos de sintomas.

Síndrome pós-concessional: ocorre após um traumatismo crânio-encefálico, quando este


origina lesões neurológicas.

Como avaliar? O DL 352/2007 tem duas tabelas de avaliação:

✓ Para incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais


✓ Para avaliação de incapacidades permanentes em direito civil

Não há tabela em direito penal

Tabela de direito civil – temos vários pontos de avaliação:

o Ponto 9 – perturbações persistentes do humor


o Ponto 10 – stress pós-traumático
o Ponto 11 – síndrome pós- concussional
o Etc.

Tabela de direito do trabalho – avaliamos de 1-95%, sendo difícil para o perito usar esta escala
de valorização.

✓ Até 30% podemos incluir traumas sem lesões crânio-encefálicas


✓ A partir de 60% têm de ser lesões muito graves

21) EXAMES SEXUAIS – AVALIAÇÃO NO ÂMBITO DO DIREITO PENAL

Conceito de agressão sexual:

➔ Actividade sexual no qual uma vítima é forçada a participar por um determinado


agressor
➔ Centra a sua vontade, por manipulação afectiva, física, material ou abuso de
autoridade
➔ Seja o agressor conhecido ou não
➔ Haja ou não evidência de lesão ou traumatismo físico ou emocional
➔ Independentemente do sexo das pessoas evolvidas

Agressores sexuais: classes sociais mais baixas → mas também pode ser uma perspectiva
errónea, na medida em que as classes mais altas tem outros meios para silenciar as situações.
Com grande preponderância a agressão ocorre em locais conhecidos da vítima.

Factores de risco:
Características
individuais

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➔ Características submissas, de vulnerabilidade (pessoas portadoras de deficiência
mental, por exemplo) da vítima.
➔ Características dos agressores – sobretudo para as crianças, são “sedutores natos”
➔ Contexto familiar
➔ Contexto sócio-cultural

Artigo 164.º CP (crime de violação):

✓ N.º 1: por meio de violência ou ameaça grave → moldura penal de 3 a 10 anos


✓ N.º2: por meio não violento, mas abusando de autoridade → até 3 anos. Isto não faz
sentido, pois na maior parte dos casos os agressores são próximos das vítimas.

Artigo 171.º (crime de abuso sexual de crianças): aqui não há muito menos casos de
penetração, são mais carícias, manipulação genital dos órgãos sexuais, etc. → todos estes
devem ser “actos sexuais de relevo” para efeitos do artigo.

Artigo 172.º: abuso sexual de menores dependentes; artigo 173: actos sexuais com
adolescentes.

Fases da violência: quanto mais a situação de abuso se prolonga no tempo, mais lentas estas
fases se processam, demorando mais tempo até à revelação.

Primeiro contacto com a vítima:

➔ Compreender as suas dificuldades


➔ Tranquilizar e transmitir confiança à vítima
➔ Não emitir juízos de valor
➔ Colher informação sumária
➔ Estabelecer urgência da situação
➔ Dar informação sobre preservação de vestígios
➔ Contactar outros profissionais
➔ Definir xxx de intervenção inicial
➔ Orientar/proteger a vítima

Suspeita de agressão sexual:

✓ Colher “informação sumária” sobre o caso → só para averiguar a urgência do caso e


recolher informação, passado às entidades responsáveis. Depois deve haver um só
interrogatório forense, para não obrigar a vítima a reviver o trauma.
✓ Estabelecer a urgência da situação e a necessidade de chamar médico-legista
✓ Obter consentimento da vítima ou responsável para o exame

Urgência médico-legal:

➔ <72h: possibilidade de recolha de vestígios biológicos


➔ Hemorragia, dor e violência: maior contacto → + transferência de vestígios
➔ iST: podemos fazer profilaxia, medicação que evita o surgimento da infecção.

83
Colheita de Descrição de
vestígios lesões
Perícias médico-legais urgentes (art. 13.º L45/04)

As mucosas anais e genitais são de regeneração muito rápida

Papel do médico-legista → fases do exame:

✓ Entrevista
✓ Exame clínico (Colaboração de outro médico ou profissional de enfermagem)
✓ Recolha e preservação de vestígios
✓ Exames complementares

Pode ser:

✓ A pedido da vítima
✓ Requisição da polícia
✓ Requisição judicial

A recolha da informação (entrevista) é o ponto de partida do exame médico-legal. É a fase


mais importante que irá orientar todos os restantes:

➔ Deve ocorrer no mais curto espaço de tempo após o evento


➔ Sem interrupções
➔ Um clínico entrevistador: uma só pessoa pode diminuir as distracções no discurso e
tornar o ambiente menos formal
➔ Não insistir nas perguntas
➔ Em relação as crianças: não tem razão temporal apurada, pelo que fazer perguntas
muito específicas pode tornar o discurso inconsistente. Perguntar apenas quando foi a
última vez e se foi muitas ou poucas vezes.
➔ Open mind
➔ Considerar todas as alternativas possíveis

Exame de vestuário:

✓ Roupa vestida à data de agressão ou não


✓ Peças secas ao ar livre e acondicionadas em sacos de papel
✓ Manipular o menos possível

Estado actual:

✓ Queixas
✓ Exame objectivo
o Estado geral
o Lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento
o Lesões e/ou sequelas sem relação com o evento

84
Lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento:

✓ Superfície corporal em geral


✓ Nível de cavidade anal
✓ Nível da região genital e perigenital

Ver ainda parte do exame corporal (exame perixx e genital).

O exame pericial médico-legal tem como finalidade recolher todos os elementos relativos à
alegada agressão sexual e proceder à sua interpretação pericial, funcionando como
coadjuvante na investigação criminal.

Exame sexual:

✓ O perito pode concluir pela existência de desfloramento quando há lacerações e


hímen permeável + na situação de hímen perfurado.
✓ Entende-se por hímen complacente o hímen sem soluções de continuidade
traumáticas e permeável aos dedos médio e indicador justapostos.

22) AVALIAÇÃO DANO CORPORAL EM SITUAÇÕES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

A violência doméstica é um conceito muito abrangente, não é só entre o casal.

✓ Maior sensibilidade e intolerância social → denúncias mais precoces


✓ Os profissionais também estão mais preparados.

A violência doméstica é um crime público → há obrigatoriedade de denúncia,


independentemente da vontade da vítima. O artigo 152.º CP prevê o crime de violência
doméstica; e o artigo 152.º-A o crime de maus tratos.

Violência em crianças e jovens. Suspeitar em caso de:

o Inadequação ou ausência de explicações


o Atraso na procura de assistência
o Lesões em diferentes estádios de evolução
o Lesões em locais pouco comuns
o Lesões em diferentes localizações
o Lesões figuradas (Ex: pontas de cigarros)
o Lesões com determinadas características
o Reflexos de defesa

Tem consequências:

o Cognitivas
o Afectivas
o Comportamentos
o Psiquiátricos

Straken baby syndrome: bastam 5 segundos para causas lesões irreversíveis:

85
o Cabeça pesada e musculatura do pescoço pouco desenvolvida
o Base craniana mais lisa → o cérebro desliza mais
o Encéfalo mais líquido

abanar o bebé causa lesões meningo-encefálicas mais graves.

Violência no idoso. Consequências:

o Orgânicas → formam-se equimoses e facilmente pois têm elasticidade na pele


o Emocionais e psíquicas
o Sócio-económicas

Em caso de suspeita de maus tratos:

o Estabelecer a urgência de situação/necessidade de chamar médico legista


o Obter consentimento da vítima ou responsável para o exame
o Efectuar exame completo e sistematizado
o Avaliar nexo de causalidade
o Informar restantes profissionais
o Informar serviços judiciais e sociais se necessário

Papel do médico legisla. Quem pode solicitar a perícia?

o Vítima ou sem responsável


o Assistentes sociais ou profissionais de outras áreas
o Polícias em tribunais
o Outro médico (para 2.ª opinião)

Perícias médico-legais urgentes: iguais crimes sexuais

Perícia e relatório médico-legal:

o Descrição do agregado familiar


o Descrição do episódio
o Antecedentes de violência
o Outros elementos do agregado (hábitos, patologia)
o Observação clínico-sintomatologia e exame físico
o Discussão- nexo de causalidade, consequências dos maus tratos
o Conclusões – natureza de instrumento, tempo de doença, consequências,
necessidades em termos de apoio médico e psicossocial

Atenção: o facto de não se encontrarem sinais de violência não invalida a possibilidade de esta
se ter verificado → muitas vezes não resultam vestígios/estes desaparecem rapidamente.

86
ESQUEMAS

1) AUTÓPSIA MÉDICO-LEGAL

MÉDICO-LEGAL ANÁTOMO-CLÍNICAS
✓ No INML (delegações e gabinetes); ✓ Nos serviços de anatomia patológica
dos hospitais
✓ Obrigatória em morte violenta/causa ✓ Na sequência do seu estudo clínico
ignorada
✓ Dispensa pelo MP, salvo nos casos de ✓ Necessária autorização da família
acidente trabalho/viação
✓ Brevidade após certeza de morte
✓ DL 11/98
Sempre que haja interesse clínico e médico-legal em simultâneo, deve prevalecer este último
→ realiza-se autópsia médico-legal.

OBJECTIVOS GERAIS OBJECTIVOS


✓ Causa de morte ✓ Causa de morte

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✓ Interpretação e correlação dos factos ✓ Estudo da causa, natureza e
que envolveram a morte desenvolvimento da doença
✓ Identificação do cadáver ✓ Avaliação da eficácia de tratamento
✓ Colheita/preservação de evidências ✓ Controlo de qualidade dos cuidados
médicos
✓ Informação à família, sociedade e
médicos
✓ Educação e formação médicas

6 W’s:

✓ Who
✓ When
✓ Where
✓ Why
✓ How
✓ What

Fases da autópsia médico-legal:

1. Exame do local
2. Exame da documentação
3. Exame do vestuário
4. Exame externo do cadáver
5. Exame interno do cadáver
6. Exames complementares

As autópsias médico-legais são realizadas por um médico perito coadjuvado por um auxiliar,
salvo se houver suspeitas de crime doloso, em que são executados por dois médicos.

Técnica de autópsia

1. Autópsia completa → abertura das 3 cavidades (cabeça, tórax e abdómen)


2. Autópsia sistematizada
3. Registo fotográfico das lesões
4. Exame do hábito externo
a. Observação directa, objectiva, macroscópica
i. Estado de nutrição
ii. Aspecto e higiene
iii. Ferimentos cadavéricos
iv. Descrição das lesões
v. Atitudes terapêuticas
b. Descrição das lesões
i. Tipo
ii. Localização
iii. Características (cor e desenho)
iv. Dimensões (padrão)

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5. Exame do hábito interno:
a. Abertura 3 cavidades
b. Abertura do pescoço e ráquis (coluna) e/ou membros → apenas quando há
suspeita de lesão nestas áreas
c. Dissecação dos órgãos
d. Dissecação dos órgãos (sempre depois do exame)

Exames complementares: exames que se podem pedir para complementar dados directos,
objectivos e macroscópicos recolhidos na autópsia.

✓ De anatomia patológica
São os mais pedidos
✓ Químico-toxicológicos
✓ Bioquímicos
✓ Microbiológicos
✓ De genética e biologia forenses
✓ Radiológicos
✓ Antropologia/odontologia forenses

Necessidade de exames complementares:

✓ Confirmar suspeita diagnóstica


✓ Excluir suspeita diagnóstica
✓ Orientar diagnóstico antes de uma actuação complexa
✓ Interpretar dados
✓ Análises de rotina (alcoolémia)

O momento de decisão de realização pode ser:

✓ Ao efectuar a verificação do óbito


✓ Antes de iniciar a autópsia
✓ Durante a realização da autópsia
✓ No final da autópsia

Colheita de amostras para exames complementares:

✓ Sangue periférico –> colhido na veia femoral ou nas extremidades


✓ Sangue central --> colhido nas cavidades cardíacas

Estabilidade das amostras:

✓ Amostra estável que não requer nenhum tipo de conservação → unhas, pêlos, cabelos
✓ Amostra estável em determinado tipo de conservação → sangue com NaCE para
dosear álcool
✓ Amostra instável que requer a sua colheita o mais rapidamente possível → sangue
para análise microbiológica.

Análises:

✓ Anatomia patológica:

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o Escolher fragmentos de zona problema rodeado de zona normal
o Recortar fragmentos de modo a incluir aquilo que se procura
o Com cortes limpos
o Pouco espessos
o Introduzir rapidamente em formol a 10%
✓ Químico-toxicológicos:
o Suspeita de morte por intoxicação.
o Exclusão de morte por intoxicação
o Análise de rotina (morte súbita, morte violenta)
✓ Bioquímicas
o Suspeita de morte súbita de causa desconhecida
o Datação de lesões
✓ Microbiológicas
o Suspeita de morte de etiologia infecciosa
✓ Genética e biologia forense
o Identificação do cadáver
o Identificação do presumível agressor (cabelo, sangue, saliva, esperma)
o Identificação do instrumento/objecto utilizado na agressão

Retirar sempre material do cadáver para excluir a possibilidade de que os


resíduos suspeitos pertençam à vítima!

✓ Radiológicos
o Identificação do cadáver (idade, factores individualizantes)
o Visualização de corpos estranhos (projécteis, fragmentos mecânicos)
o Suspeita de maus tratos (calos ósseos, deformações)

O relatório pericial: Deve ser claro, conciso, sintético e com linguagem simples

1. Informação:
a. Autoridade que pede a autópsia
b. Nome das pessoas que assistem à autópsia
c. Dados circunstanciais sobre o caso
d. Origem de informação
e. Data e hora de morte/aparecimento do cadáver
f. Assistência médica

2. Identificação:
a. Confirmação dos elementos identificantes

3. Hábito externo:
a. Descrição sistematizada das lesões

90
4. Hábito interno:
a. Descrição sistematizada das lesões (por regiões)
b. Resumo das lesões mais relevantes

5. Exames complementares:
a. Tipos de exames pedidos
b. Descrição das amostras
c. Resultados das análises

6. Discussão:
a. É a parte mais importante
b. Relação entre as lesões e causa (nexo de causalidade)

7. Conclusão:
a. Causa de morte
b. Mecanismo de morte
c. Resultados mais relevantes dos exames complementares
d. Outros achados necrépsicos

Frases curtas e concisas

8. Observações
a. Condições para execução de autópsia
b. Dificuldades ou impedimentos para o desenvolvimento da investigação forense

2) FENÓMENOS CADAVÉRICOS

✓ Arrefecimento
✓ Desidratação
Imediatos ✓ Rigidez
✓ Livores
Fenómenos

Cadavéricos ✓ Autólise
Destrutivos
✓ Putrefacção
Tardios

✓ Mumificação
Conservadores
✓ Saponificação

91
1. Imediatos:
1.1. Arrefecimento:
▪ Fenómeno mais útil para determinar o intervalo post-mortem nas primeiras 24h após a
morte, resultando da cessação da produção de calor. Inicia-se pela cara, mãos e pés,
depois alastra para as extremidades, tórax e dorso; finalmente, abdómen, axilas e
pescoço.
▪ Há casos excepcionais de hipertermia post-mortem (o corpo aquece em vez de
arrefecer)
▪ Evolução
Temp. desce o Planalto inicial (mantém a temperatura da morte) → 30min-1h
até = temp. o 1.º período → 0,5ºC/h → 3h-4h
ambiente; lei o 2.º período → 1ºC/h → 6h-10h
de Newton o 3.º período → 3-4ºC/h → até igualar temperatura ambiente
não se aplica
▪ Tacto (detecção de arrefecimento pelo tacto):
o Regiões descobertas estão frias após 2h
o Regiões cobertas, 4-5h
o Arrefecimento completo, 8-17h (10-12h + frequentes)

▪ Termómetro: o monograma de Hessenge permite fazer uma estimativa do intervalo


post-mortem através da temperatura ambiente e peso.
▪ Factores de variação:
o Causa da morte (é mais rápida nas doenças crónicas, hemorragias e
grandes queimaduras; mais lento nas doenças agudas e sufocação)
o Factores individuais (peso, idade, vestuário)
o Factores ambientais (temperatura, humidade e ventilação)

1.2. Rigidez cadavérica

▪ Mecanismo: coagulação do plasma muscular associado à desidratação, aumento do


ácido láctico e desaparecimento da ATP
▪ Evolução:
o Flacidez inicial
o Rigidez
o Flacidez secundária
▪ Evolução da rigidez propriamente dita:
o Início → 2-4h
o Completa → 6-12h
o Intensidade máxima → 13-24h
o Desaparece → 36h

Nota: início precoce –> intensidade e duração baixas (crianças e velhos); início tardio -->
intensidade e duração elevadas (adultos)

▪ Inicia-se na musculatura lisa (aparece 1.º nos pequenos músculos da face), mais tardia
nos músculos esqueléticos (6-8h depois da morte) → lei de Nysten: a rigidez começa
na cara e depois espalha-se em direcção às mãos e aos pés.
▪ Factores que influenciam → depende do grau de desenvolvimento muscular
o Calor ou frio acentuadas produzem rigidez rapidamente, embora no calor
passe rapidamente, por acção da putrefacção

92
o Nas crianças e velhos é precoce, pouco acentuada e de curta duração; nos
adultos é tardia, intensa e prolongada; em caso de hemorragias crónicas ou
atrofias musculares é tardia, pouco acentuada e de curta duração.
▪ Espasmo cadavérico: contracção muscular sem que tenha havido flacidez primária.
Pode ser generalizado (raro) ou localizado; ocorre habitualmente em morte violenta
(ex: feridas por armas de fogo; asfixias mecânicas)

1.3. Desidratação cadavérica

▪ Traduz-se numa série de fenómenos observados no cadáver:


o Perda de peso (constante, mas só apreciável nos recém-nascidos e crianças de
pouca idade)
o Apergaminhamento cutâneo (pode tornar lesões traumáticas mais visíveis):
peles amareladas, secas e duras, e áreas de pele fina (escroto)
o Desidratação das mucosas (lábios dos recém-nascidos e vulvas das crianças)
o Fenómenos a nível ocular: opacificação da córnea; mancha esclerótica de
Sommer-Lancher; afundamento do globo ocular.

1.4. Livores
▪ Manchas de coloração vermelho-arroxeado nas zonas de declive não sujeitas a
pressão, resultantes da acumulação do sangue não circulante → fenómeno puramente
mecânico.
▪ Nem sempre são fáceis de ver –> ex: hemorragia interna ou externa (sangue não está
nos vasos); indivíduo de cor; queimaduras
▪ Cor: geralmente roxo-avermelhada ou vermelho-arroxeada; pode variar em função da
causa da morte (carminam se por intoxicação por CO; esverdeados se por ácido
cianídrico)
▪ Intensidade: depende da fluidez do sangue e causa de morte
▪ Localização: depende da posição do cadáver → formam-se nas zonas de declive (não
se formam nas zonas cutâneas sujeitas a compressão)
▪ Evolução
o Livores móveis → até 6h (surgem 1.º no lóbulo da orelha)
o Livores semi-móveis → entre as 6 e as 12h
o Livores fixos → após 12h

Sinal de digitação: se pressionarmos um livor e este ficar branco, é


móvel; se não se modificar, é fixo.

▪ Possível indicador da causa de morte, de eventual mudança de posição do cadáver e


intervalo post-mortem
▪ Livores paradoxais: surgem em regiões que não são de declive, acompanhadas
frequentemente de petéquias hemorrágicas; surgem nas mortes súbitas e asfixias →
não concordantes com a posição do cadáver, mas não devido à acção de terceiro.
▪ Hipostases viscerais: fenómeno dos livores nos órgãos.

➔ Estimativa do intervalo post-mortem através dos fenómenos imediatos:


o Tanto mais preciso, quanto menor o intervalo post-mortem → importante por
motivos civis e em casos de investigação criminal.
o Em cadáveres recentes
▪ diminuição temperatura
▪ Alterações nos músculos e tecidos

93
▪ Química do humor vítreo
▪ Alterações noutros fluídos
o Em cadáveres antigos
▪ Métodos químicos
▪ entomologia cadavérica
o Métodos
▪ Nomograma de Henssege (temperatura rectal, temperatura ambiente
e peso) – não permite determinar hora exacta. Não usar se corpo
sujeito a forte radiação; grandes alterações de temperatura ou clima;
suspeita de febre elevada ou hipotermia; local de levantamento
diferente do local da morte;
▪ Esquema de Knight: em condições ideais..
• Corpo quente e flácido: morte há menos de 3h
• Corpo quente e rígido: morte entre 3 e 8h
• Corpo frio e rígido: morte entre 8 e 36h
• Corpo frio e flácido: morte há mais de 36h

2. Tardios
2.1. Destrutivos:
2.1.1. Autólise: conjunto de fenómenos fermentativos que têm lugar no interior da
célula por acção das próprias enzimas; ao fim de algum tempo as enzimas
destroem-se a si próprias e este fenómeno é substituído pela putrefacção.
Verifica-se em todas as células do organismo; mas não evolui à mesma
velocidade em todas elas.
o Alterações nos fluídos (sangue e bílis)
o Alterações nos órgãos (mais resistentes → estômago e esófago; mais
sensíveis → cérebro e pâncreas)

2.1.2. Putrefacção: processo de fermentação pútrida de origem bacteriana,


consequência da actividade bacteriana e enzimática. Evolução: intensidade
geralmente proporcional à precocidade)
o Período cromático:
▪ Início 24h após a morte; duração → vários dias
▪ Mancha verde: primeira manifestação da putrefacção, produzida
pela acção do ácido sulfúrico, início na fossa ilíaca direita
(afogados → pescoço; fetos → face e tórax; em zonas cutâneas
perto de lesões internas ou em redor de lesões gangrenosas e
neoplásicas). Nos cadáveres congelados pode adquirir cor
avermelhada.
o Período enfisematoso:
▪ Duração de vários dias até duas semanas
▪ Desenvolvimento de grandes quantidades de gases que invadem o
tecido celular subcutâneo, inchando e desfigurando o cadáver.
▪ Incha a cabeça; exoftalmia; projecção exterior da língua; distensão
do tórax e abdómen; distensão dos genitais masculinos; prolapso
rectal e expulsão do feto em grávida; a rede venosa superficial
torna-se aparente.
o Período coliquativo:
▪ Duração de vários meses (geralmente 8 a 10)

94
▪ A epiderme separa-se da derme; formam-se bolhas cutâneas de
dimensões variáveis com líquido escuro; soltam-se as unhas e
pêlos; gases escapam, diminuindo o volume do corpo.
o Período esquelético:
▪ Duração de 2 a 3 anos, até um máximo de 5 anos
▪ As partes moles do cadáver desaparecem progressivamente
através da liquidificação; o conjunto de órgãos e vísceras vai-se
destruindo progressivamente, mas com variações em função da
resistência da estrutura.
o Factores que influenciam (quanto mais precoce, mais intenso)
▪ Individuais
• Constituição física (mais rápida nos obesos)
• Idade (mais rápida na criança e mais tardia nos idosos)
• Influências patológicas (causa de morte; processos
patológicos prévios à morte)
▪ Ambientais:
• Humidade, frio, calor, arejamento e fauna
• Secura → mumificação; arejamento → mumificação;
humidade → saponificação.
▪ Dificuldades das autópsias em caso de putrefacção:
• Dificulta identificação
• Pode mascarar ferimentos e lesões
• Simula equimoses
• Produz alcalóides cadavéricos → impossibilidade de
determinar taxa de alcoolemia.
• Hemorragia nasal, comida nas vias respiratórias, pode
produzir falso sulco (asfixia)

2.2. Conservadores: processos conservadores do cadáver


▪ Naturais
o Mumificação: magreza + boa ventilação + temperatura ambiental elevada
→ Dissecação rápida do cadáver, volume do cadáver diminuída por perda
de água
o Saponificação: obesidade + humidade + falta de ventilação → formação de
camada gordurosa, untosa e viscosa à superfície
o Congelação
▪ Artificiais: embalsamento e refrigeração.

3) TIPOS DE FERIMENTOS

Ferimentos provocados por agentes mecânicos → estes nem sempre provocam dano, apenas
quando a intensidade da força aplicada ultrapassa capacidade de resistência do tecido.

a) Lesões por instrumentos contundentes (lesões contusas): causadas por instrumentos


contundentes, que são objectos duros, de superfície plana ou romba.
a. Lesões traumáticas externas (mais importantes) → grande importância
médico-legal
i. Contusão superficial: acção exercida perpendicular ou obliquamente
sobre a superfície corporal; não há solução de continuidade.

95
Necessário fazer diagnóstico diferencial, por exemplo com equimoses
resultantes de procedimento patológico e livores.
1. Equimose: rotura de vasos com extravasamento de sangue,
que infiltra os tecidos
2. Hematoma: colecção de sangue em cavidade neoformada
3. A coloração vai variando: não é possível datar pela cor, mas
equimoses de cor diferente significa que ocorreram em dias
diferentes (maus tratos)
ii. Abrasão: mais frequentes em áreas descobertas e acessíveis. A acção
exercida de forma oblíqua; já há solução de continuidade. A acção
tangencial faz com que fiquem pontos levantadas na parte terminal, o
que permite determinar direcção do movimento.
1. Esfoliação: atinge só a epiderme
2. Escoriação: atinge também a derme

iii. Ferida contusa: acção exercida perpendicular ou obliquamente, com


intensidade, determinando solução de continuidade de todas as
camadas da pele, de bordos irregulares e pontas tecidulares a unir os
bordos.
Para além destas (principais), temos ainda:
1. Lesões modeladas: permitem identificação do instrumento
2. Estigmas ungueais: resultam da acção das unhas na pele
3. Mordeduras: podem deixar marcas na pele, de equimoses ou
escoriações

b. Lesões traumáticas internas:


i. Contusão profunda: causada por traumatismo de grande intensidade,
que dá origem a uma infiltração hemorrágica em profundidade; pode
associar-se ou não a escoriações/contusões na superfície (a existência
de lesões cutâneas obriga a investigar lesões profundas)
ii. Laceração/esfacelo de órgãos: na laceração, ainda se pode ver o
órgão; no esfacelo, está completamente destruído
iii. Fracturas ósseas: traumatismo violento que dá origem a uma solução
de continuidade do osso. Etiologia médico-legal diverso.

b) Lesões por instrumentos cortantes e perfurantes: lesões por armas brancas,


instrumentos lesivos que tem um gume, ponta ou ambos. (indica existência de
vontade prévia por parte do agressor)
a. Ferida por instrumento cortante ou ferida incisa: aspecto fusiforme linear,
limpa, com bandas regulares e sem contusão. Cauda inicial, de ataque; e final,
de saída (mais comprida) – cauda de rato. A cauda final é também menos
profunda (alívio da pressão) → determinação do sentido do movimento.
Morfologia variada – agressão dinâmica, pessoa tenta defender-se.
b. Ferida perfurante: lesão em túnel ou canal em profundidade (se for um
ferimento vital, há infiltração sanguínea); solução de continuidade da pele, de
contorno circular, ovalar ou similar à secção do instrumento. Se o instrumento
é fino não ultrapassa a capacidade elástica da pele e apenas causa ponto
avermelhado; se grosso o suficiente para ultrapassar, forma-se um orifício de
entrada com orla de contusão em forma de botão. Raramente há orifício
(quando existe, mais pequeno e irregular) de saída. Dimensão dominante:
profundidade.

96
c. Feridas corto-perfurantes: componente na pele de ferida incisa, e
componente perfurante, de bordos rectos e nítidas. Profundidade maior que
comprimento e largura. Orifício de entrada limpo, linear e fusiforme; orifício
de saída raro.
d. Feridas corto-contundente: componente na pele de ferida incisa; e
componente contundente:
i.  feridas cortantes: bordos mais irregulares, com orla de contusão,
atingem planos mais profundas e não tem cauda de rato
ii.  feridas contusas: não tem ponto tecidulares a unir os bordos e
atingem estruturas mais profundas.

c) Lesões por instrumentos perfuro-contundentes: componente na pele, de ferida


contusa; e componente perfurante – trajecto em canal de paredes irregulares, nos
tecidos e órgãos subjacentes. Profundidade maior que comprimento e largura. Tem
sempre orifício de entrada, podem não ter de saída. Ex: bala.

A dissecação plano-por-plano das feridas perfurantes é obrigatória, pois só assim se consegue


determinar o seu trajecto e profundidade.

Origem vital ou post-mortem da ferida:

✓ Origem vital:
o Infiltração sanguínea dos tecidos ➔ Caso permitam dúvidas:
o Refracção dos tecidos métodos histológicos e/ou
o Formação de crosta
bioquímicos
o Supuração

✓ Origem post-mortem → lesões cobertas por placas apergaminhadas, sem infiltração.

Etiologia médico-legal (necessário conjugar com outras informações → exame do local,


antecedente)

✓ Suicídio
o Atingem zonas de importância vital
o Compatíveis com gestos da vítima
o Feridas de ensaio → características de suicídio por arma branca.
o Vestuário poupado
✓ Homicídio:
o Múltiplos e graves ferimentos, em locais diversos onde a vítima não poderia
facilmente chegar e pouco compatíveis com gesto.
o Lesões de defesa
o Vestuário danificado
o Ex: feridas muito extensas e profundas no pescoço, contusões à volta da boca,
nariz e pescoço; estigmas ungueais.

Identificação da arma:

✓ Em regra, apenas podemos determinar a natureza do instrumento


✓ Havendo instrumento suspeito, podemos pronunciar sobre se poderia ou não ter
causado as lesões
✓ Só num pequeno número de casos é possível determinar instrumento específico →
lesões modeladas.

Ordem de produção: temos de partir de alguns pressupostos:

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✓ A ausência de sinais vitais numa ferida indica que foi produzida após outras feridas
com características vitais
✓ Quando todas as feridas forem produzidas pela mesma arma e estas sofrer mossas,
feridas ficarão mais irregulares.

Lesões auto-infligidas sem ser suicidas:

✓ Cortes superficiais
✓ Em áreas não sensíveis
✓ Incisões regulares, com igual profundidade
✓ Cortes múltiplos e paralelo

4) ASFIXIAS:

Classificação:

1. Compressão externa do pescoço


a. Enforcamento
b. Estrangulamento
c. Esganadura
2. Sufocação
a. Oclusão extrínseca
b. Oclusão intrínseca
c. Compressão toraco-abdominal
d. Confinamento
3. Afogamento

1) Compressão externa do pescoço


1.1) Enforcamento

Suspensão completa (corpo totalmente suspenso no ar) – lesões observadas são mais intensas;
ou incompleta (mais frequente) do corpo a partir de um ponto fixo, por meio de laço que
constringe o pescoço. Pode ser típico (nó do enforcado) ou atípico (nó à frente ou de lado).

✓ Mecanismos de morte
o Anoxia anoxia
o Anoxia encefálica
o Inibição reflexa
o Lesão medular

Notas: cabeça fica pendente para lado contrário do nó; quando se retira o cadáver, deve
manter-se o nó à volta do pescoço.

✓ Sinais externos:
o Sulco à volta do pescoço (único, apergaminhado, incompleto, altamente
situado, profundo e ascendente) → de características do sulco por si só não
chegam para fazer diagnóstico
o máscara equimótica (cara arroxeada)
o Livores “em luvas” e “meias” (membros superiores e inferiores)
o sutusão sanguíneas nas conjuntivas
o Profusão da língua entre as arcadas dentárias

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o Escoriações no dorso das mãos ou membros inferiores (causadas por
contracções musculares)
o Esperma no meato urinário
✓ Sinais internos:
o Linha argêntea (parte de dentro do sulco)
o Hemorragias (infiltração sanguínea das partes moles)
o Equimose netrofaríngea
o Fracturas do aparelho laríngeo
o Espuma na laringe e traqueia
o Raramente, fracturas e rupturas e ligamentos (maior violência)

1.2) Estrangulamento (o diagnóstico diferencial entre enforcamento e estrangulamento por


laço baseia-se nas características do sulco e nas lesões internas a este nível)
✓ Constrição violenta do pescoço por meio de laço, por acção independente do peso do
corpo. Implica geralmente interferência de terceiro; se suicídio, é preciso haver forma
de manter a pressão depois de perder a consciência.
o Sinais externos;
▪ Sulco horizontal, geralmente múltiplo, mole, completo, estreito ou
longo, ao nível ou por baixo de cartilagem tiróide, profundidade
uniforme.
▪ Congestão crânio-facial/palidez da face
▪ Situações hemorrágicas nas conjuntivas
▪ Máscara equimótica
o Sinais internos:
▪ Infiltração sanguínea do pescoço
▪ Fracturas do aparelho laríngeo
▪ Sinais gerais de asfixia
▪ Hemorragias
▪ Não pode haver lesões vertebrais

1.3) Esganadura
✓ Constrição do pescoço por uma das mãos (só pode ser homicídio)
✓ Sinais externos
o Ausência de sulco
o Estigmas ungueais no pescoço
o Equimoses e escoriações
o Máscara equimótica, congestão crânio facial ou palidez, sutusões nas
conjuntivas
o Exoftalmia (globo ocular para fora)
✓ Sinais internos
o Hemorragias das partes moles
o Equimose retrofaríngea
o Fracturas do aparelho laríngeo
o Sinais asfíxicos gerais
o Sutusões hemorrágicos plurais e xxx

2) Sufocação:

2.1) Oclusão extrínseca da boca e fossas nasais (mais frequentemente homicídio)

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Nota: problemas médico-legais quando: não há vestígio de lesões perinasais ou peribucais; não
foi efectuado o exame do local antes de mobilizar cadáver; foi retirado o objecto que ocluía as
vias respiratórias.

2.2) Obstrução das vias aéreas com corpos estranhos (mais frequentemente acidente)

2.3) Compressão toraco-abdominal (mais frequentemente acidente)

2.4) Confinamento em espaço reduzido, com oxigénio limitado (importância do exame do


local)

✓ Sinais externos:
o Podem apresentar petéquias
o Quadro mais exuberante no caso de compressão
o Lesões traumáticas diversas
✓ Sinais internos:
o Sinais gerais asfíxicos
o Presença de alimentos ou outros corpos estranhos nas vias aéreas
(oclusão intrínseca) ou sinais de soterramento

3) Afogamento ( → diagnóstico de exclusão!)

Intromissão de meio líquido, normalmente água (asfixia atípica), no interior das vias aéreas
(acidente).

✓ Sinais externos:
o Livores claros e sem localização definida
o Cogumelo de espuma → não é sinónimo de afogamento
o Pele de galinha e maceração da pele
✓ Sinais internos:
o Presença de corpos estranhos nas vias aéreas e digestivas
o Congestão generalizada dos órgãos
o Sangue fluido e escuro
o Pulmões insuflados
o Sutusões hemorrágicas plurais e epicordicos
o Água no estômago e duodeno → fenómeno vital

Sinais Gerais da Asfixia:

1. Petéquias “The obsolete quintet”: antes achava-se que


2. Cianose
perante este quadro estávamos sempre
3. Sangue fluido e escuro
4. Congestão dos órgãos perante uma asfixia; mas não é exclusivo desta
5. Engorgitamento do coração direito causa de morte.

Notas importantes:

✓ Guardar sempre laço (verificar se coincide com marcas da pele)


✓ No enforcamento há só um sulco (no estrangulamento, a corda tem de se sobrepor em
pelo menos uma parte)
✓ Homicídio: normalmente sulco duplo, pelo menos num local, e completo
(enforcamento raramente é homicídio)
✓ Pode haver deslocamento da corda originando vários sulcos

100
✓ Esganadura deixa marcas dispersas, que podem confundir o técnico pois podemos ter
enforcamento por laço complexo.

5) LESÕES POR ARMAS DE FOGO

1. Feridas por armas de cano curto:


a. Orifício de entrada
o Geralmente único (podem haver excepções)
o Geralmente arredondado ou oval (pode ser estrelado – cano
encostado; linear – longa distância; circular – vivo)
o Dimensões geralmente menores que o tamanho da bala, mas depende
da distância e força com que atinge a pele (maior nos disparos a curta
distância) → a pele é elástica e contrai após a entrada
o Tatuagem: não existe nos disparos a longa distância ou com cano
encostada ao corpo (nestes dois casos, apenas temos orifício de
entrada e orla de contusão) → numa tatuagem ovalar é possível
avaliar direcção do disparo
o Tatuagem verdadeira:
▪ Queimadura (disparo a 5cm)
▪ Incrustação de grãos de pólvora (disparo a 30cm)
o Tatuagem falsa:
▪ Negro de fumo (lavável, disparo a 15cm)
o Orla de contusão: elemento característico do orifício de entrada.
Existe sempre; é geralmente circular ou em meia lua; é estreito,
enegrecida e apergaminhada no cadáver.

Nota: é possível um disparo a média distância


Tatuagem aparentar ser a longa distância, o negro de fumo
Orifício de entrada pode ficar na roupa (exame do vestuário é
fundamental)
Orla de contusão

b. Trajecto (→ à medida que vai entrando, a bala produz lesões cada vez mais
graves)
i. Único ou múltiplo (bala fragmenta-se)
ii. Rectilíneo (segue a direcção do disparo) ou com desvios (por colisão
com os ossos)
c. Orifício de saída
i. Nem sempre existe e tem forma e tamanho muito variáveis, podendo
até ser múltiplo se a bala se fragmentar ou houver colisão com osso;
pode até ser maior que o de entrada
ii. Geralmente não tem orla de contusão (apenas terá se a bala bater em
qualquer coisa dura à saída)
iii. Bordos revertidos com exteriorização de tecido adiposo

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2. Feridas por armas de cano longo (caçadeira)
a. Orifício de entrada:
i. Se o tiro for dado a curta distância (<1m), os chumbos não dispersam e
actuam como projéctil único → orla de entrada de grandes dimensões
irregular, com destruição acentuada dos tecidos subjacentes
ii. Geralmente múltiplo (>1m)

3. Discussão da distância do disparo (nota: estas distinções são teóricas, podem variar)
a. Feridas de bala:
i. Contacto: os gases entram na pele e provocam o seu rebentamento
(forma estrelada). Tudo o que sai da arma vai para dentro do corpo,
logo não há tatuagem. Pode deixar marca da arma.
ii. Curta distância (=disparo do alcance dos elementos da tatuagem)
1. Disparo à queima-roupa: o corpo está ao alcance da chama
(5cm), há queimadura da pele.
2. Disparo a curta distância próxima: orifício arredondado ou
ovalar, com bordos invertidos; com negro de fumo.
3. Disparo a curta distância remota; presença de grãos de
pólvora (tatuagem verdadeira)
iii. Longa distância: só tem orla de contusão; não há tatuagens. Um tiro a
média distância pode aparentar a média, o negro de fumo pode ficar
no vestuário → importante analisar sempre a roupa.

Em suma:

✓ Cano encostado → OE (estrelado) + orla de contusão


✓ Queima-roupa → OE + orla de contusão + queimadura
✓ Curta distância próxima → OE (arredondado/ovalar, bordos invertidos) + orla de
contusão + negro de fumo
✓ Curta distância remota → OE + orla de contusão + grãos de pólvora
✓ Longa distância → OE + orla de contusão

As características e aspectos das OE dependem assim da:

✓ Natureza da arma
✓ Ângulo de incidência do disparo
✓ Distância do disparo
✓ Superfície vulturante do projéctil

São elementos que permitem fundamentar um diagnóstico de disparo a curta distância:

✓ Partículas pólvora
Disparo a curta distância igual ao alcance dos elementos
✓ Depósito de fumo
de tatuagem
✓ Zona de queimadura

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6) QUEIMADURAS

1. Distinção entre queimaduras por diversos agentes:


a. Agentes térmicos (tipo de agente físico, temos ainda o frio, electricidade e
radiações)
i. Chamas e materiais inflamados: queimaduras amplas, extensas, de superfície
irregular e mal delimitadas. Presença de diferentes graus de queimadura.
Pêlos e cabelos carbonizados. Direcção de baixo para cima. Poupam pele
protegida por vestuário.
ii. Gases a temperaturas elevadas: queimaduras extensas mas pouco profundas,
com limites pouco definidos. Pêlos e cabelos queimados e carbonizados.
Possibilidade de lesão das vias aéreas superiores.
iii. Vapor a elevadas temperaturas: queimaduras de grau não elevado, extensão
pode ser grande. Produção de flictenas. Afecta áreas cobertas (roupa absorve
o vapor quente).
iv. Líquidos quentes: queimaduras mais ou menos extensas de profundidade
variável, com sulcos ou goteiras de direcção descendente. Zonas cobertas
com vestuário com lesões mais profundas. Pêlos e cabelos conservados.
v. Sólidos ao rubro: queimaduras limitadas que traduzem a forma do agente.
Profundidade variável.
b. Agentes químicos: lesões uniformes em toda a sua extensão (grau uniforme) com
sulcos ou goteiras. Grau depende da concentração do produto. Forma irregular
pois, tratando-se de líquidos, são muitas vezes projectadas. Poem ser: (→ deve-se
lavar com água)
i. Ácidos: escaras brancas ou negras (aspecto varia com o ácido). Levam
à corrosão das proteínas, mas a estrutura celular mantém-se
ii. Bases: escaras moles, translúcidas e húmidas. Alteram a estrutura
celular.
iii. Sais: escaras brancas e moles.
➔ Droga química: macerar em água os tecidos, filtrar o líquido, comprovar a reacção com
papel de tornesol e usar reagentes específicos.
c. Agentes biológicos: raro na Europa

2. De que depende a gravidade das queimaduras?


➔ Extensão
➔ Profundidade (a zona central da queimadura é a mais profunda)
➔ Localização (mais grave na face, mãos e períneo)
➔ Estado de saúde anterior e idade da vítima (mais grave nas crianças e velhos)

Queimaduras geralmente mais graves nas áreas superiores do corpo

3. Graus das queimaduras:


o 1.º grau:
▪ Limitadas à camada superficial
▪ Causam eritema e edema (inflamação cutânea)
▪ Formação de bolhas (flictenas) por deslocamento da epiderme → rara

103
▪ Não são habitualmente visíveis no cadáver; muito dolorosas
o 2.º grau:
▪ Destruição da epiderme e parte da derme
▪ Formação de flictenas (rompem frequentemente antes da morte → pele
apergaminhada de coloração amarela e negra onde é visível a rede
vascular)
▪ Tendem a respeitar os anexos cutâneos
o 3.º grau:
▪ Destruição total (necrose) da pele com formação de escara (aspecto
branco acizentado e apergaminhado no cadáver)
▪ Ausência de flictenas
▪ No vivo não cicatriza por si pois todas as estruturas térmicas foram
afectadas (é necessário enxerto de pele)
▪ Ao contrário do que sucede no 2.º grau, o vivo não sente dor pela
afectação das terminações nervosas
o 4.º grau:
▪ Destruição dos sentidos profundos, incluindo gordura, músculo e osso.
▪ Só no cadáver

1.º grau

2.º grau Vivos (graus clínicos)

3.º grau

4.º grau → cadáver

4. Morte por carbonização: características do cadáver; objectivos da autópsia


✓ Hábito externo do cadáver
o Redução do volume do cadáver por condenação dos tecidos ( → problemas de
identificação)
o Posição de pugilista por contracção muscular devida ao calor
o Pele seca e de coloração negra
o Soluções de continuidade da superfície cadavérica sobretudo a nível das pregas
de flexão (retracção da pele)
o Carbonização ou desaparecimento dos pêlos e cabelos
✓ Hábito interno do cadáver
o Vísceras conservadas, mas com diminuição de peso
o Fracturas ósseas
o Hematoma epidural disseminado (artefacto por acção do calor)
o Depósitos de gordura nos vasos pulmonares por liquefacção da gordura
✓ Objectivos da autópsia
o Identificação do cadáver (cadáver não é reconhecível → usar DNA,
nomeadamente dos dentes resistentes)

104
o Diagnóstico do cadáver vital da queimadura (ocorrem antes ou depois da
morte)
o Etiologia (suicídio, homicídio ou acidente)
o Extensão da superfície queimada, grau/profundidade, agente etiológico
o Determinação da causa da morte

A primeira coisa que se deve fazer é um raio-x → suspeita de queimaduras


para ocultar crime

5. Diagnóstico deferencial
✓ Afirmação de que a pessoa estava viva antes da queimadura:
o Presença de produtos de combustão (negro de fumo ou cinzas) nas vias
respiratórias profundas e digestivas
o Queimaduras na base da língua, epiglote, faringe e brônquios
o Teor de carboxihemoglobina superior a 10% em sangue cardíaco e femoral
o Carbonização vascular a nível das escaras (sangue coagulado)

A causa de morte pode não ser a queimadura, mas sim uma intoxicação por
CO (também acção da temperatura, lesões traumáticas concomitantes)

A morte por queimadura pode ser rápida, tardia ou deferida.

Causas de morte num foco de incêndio:

✓ Acção de temperatura muito elevada


✓ Queimadura em si
✓ Lesões traumáticas concomitantes
✓ Intoxicação por CO
✓ Espasmo da glote por inalação de gases → asfixia
✓ Causas naturais

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