Você está na página 1de 27

2.1.

2 Procedimento

A cultura processual penal brasileira sempre se ateve ao mau uso das prisões
cautelares. Anteriormente à aplicação da audiência de custódia valorava-se mais a prisão em
flagrante, pois o preso em flagrante era recolhido ao cárcere enquanto aguardava a decisão do
juiz sobre a sua prisão e esta situação se perdurava por dias até que fosse realizada uma
primeira audiência em que o juiz decidia sobre a possibilidade ou não de o preso responder o
processo em liberdade e com a implementação da audiência de custódia essa privação pré-
cautelar da liberdade do preso foi superada.

A audiência de custódia traz consigo novos objetivos. Primeiro, têm-se que toda e
qualquer pessoa presa seja apresentada imediatamente à presença de um juiz competente.
Além disso, ao passo em que propicia a prevenção das prisões ilegais, arbitrárias e
desnecessárias, visa coibir práticas ilegais, tais como a tortura, maus tratos e qualquer outra
forma de tratamento degradante.

Neste novel procedimento, a pessoa presa deve ser encaminhada à Delegacia de


Polícia para lavratura do auto de prisão em flagrante pela autoridade policial, que
providenciará dentre outras questões, a apresentação da pessoa presa perante um juiz em até
24 horas, para que seja realizada audiência de custódia

Importante registrar que deve ser oportunizado prévia entrevista do custodiado com
seu defensor. Iniciada a audiência, o juiz é incumbido de informar os direitos pertinentes, bem
como de realizar entrevista pessoal com o preso, devendo abster-se de fazer perguntas
relacionadas ao mérito da prisão.

Em seguida, oportunizará manifestação ao Ministério Público e à Defesa, nesta ordem.


Portanto, e em obediência aos princípios constitucionais já estudados permite a participação
em breve contraditório, em paridade de armas, da acusação e da defesa.

Aqui perfilha-se ao sistema acusatório, haja vista que o juiz somente poderá decretar a
prisão, caso esta seja requerida pelo Ministério Público ou representada pelo Delegado de
Polícia.

Superado o breve contraditório entre acusação e defesa, o juiz deve decidir sobre a
necessidade ou não da prisão, com base nas alegações das partes. Ademais, o juiz que por
meio de entrevista com o custodiado verificar a ocorrência de indícios de praticas ilegais, tais
como maus tratos ou tortura, deve providenciar os devidos encaminhamentos aos órgãos
competentes para apuração das responsabilidades.Ainda, deve providenciar medidas sociais e
assistenciais, de acordo com o caso concreto.

Desta feita, a implementação desse mecanismo de controle das prisões processuais no


processo penal brasileiro é considerada de suma importância na concretização dos direitos
fundamentais e, portanto, na excepcionalidade da aplicação de prisão cautelar.

As prisões e suas peculiaridades

A Constituçao enumera 3 (três) espécies de prisão: a prisão extrapenal, prisão penal


e a prisão cautelar, a qual interessa a este trabalho. A prisão processual, cautelar ou provisória,
é uma medida cautelar de caráter pessoal, decretada antes do trânsito em julgado de sentença
penal condenatória objetivando garantir o êxito das investigações ou do processo criminal.

As medidas cautelares de caráter pessoal, conforme conceitua 1Lopes Jr. (2020, p.),
são atos que tem por objeto garantir o normal transcorrer do processo e, portanto, a eficaz
aplicação do jus puniendi.

À medida que a prisão pena objetiva dar punição ao autor de infração penal, a prisão
cautelar é considerada como instrumento do processo, visto que ela é utilizada de modo a
assegurar a eficácia das investigações e do processo criminal.

Para tanto o Doutrinador Renato Brasileir de Lima2 :

é necessário que a decretação da prisão cautelar seja lastreada de cautelaridade em sua


modalidade social ou processual. Dessa forma, não deve valer-se para aplicação antecipada de
pena ao imputado, tampouco à mera satisfação da opinião pública, pois nestes casos, constitui
séria afronta ao princípio da presunção de inocência

Em que pese o ordenamento jurídico brasileiro consagrar o princípio da presunção de


inocência (art. 5º, LVII, CRFB/88), entre a conduta delitiva e a sentença penal condenatória
transitada em julgado, existe o risco de questões que podem comprometer a concretização da
pretensão punitiva do Estado e até mesmo a eficácia do julgado. O que justifica o uso da
prisão provisória, afim de amenizar esse risco. Para que seja decretada a prisão processual, os
seus fundamentos – fumus commissi delicti e o periculum libertatis – devem ser devidamente
preenchidos. CAPEZ, F. Curso de Processo Penal.p.144 28ª ed. São Paulo: Editora Saraiva,
2021

1
Ob.cit. p. 369
2
Ob.cit. p. 905
O primeiro relaciona-se à probabilidade da ocorrência de um delito, que pode ser
verificado na prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria. O outro, tem a ver
com a situação de perigo decorrente da liberdade do acusado.

O uso da prisão processual, deve ser feito sob o juízo da periculosidade e jamais da
culpabilidade. Desta feita, a presunção de inocência deve recair sobre toda e qualquer pessoa,
até que seja declarada culpada por sentença condenatória com transito em julgado.

Ainda, a par desse princípio, a CRFB/88 institui outros incisos (art. 5º, LXV e LXVI)
que reforçam a ideia da excepcionalidade da prisão cautelar. Logo, a regra é que o imputado
aguarde o desenrolar processual em liberdade.

Do mesmo modo, art. 5º, LXI, prevê que: Ninguém será preso senão em flagrante
delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos
casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei

Em consonância com esta previsão constitucional, o ordenamento processual penal,


dispõe em seu art. 283, que: Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por
ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de
sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em
virtude de prisão temporária ou prisão preventiva

Conforme se extrai desses diplomas, conclui-se que a prisão poderá resultar de duas
maneiras: por flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente, com expedição de mandado de prisão, tal qual proveniente de sentença
condenatória transitada em julgado ou no transcorrer da investigação ou do processo, em
razão de decretação de prisão preventiva ou temporária

Ainda, em caráter excepcional, é prevista constitucionalmente a existência de duas


situações, que diante da quebra da ordem pública, admitem que a liberdade das pessoas seja,
de forma extraordinária, tolhida pelo Estado, consubstanciadas nas prisões durante os estados
de defesa (art. 136, §3º, I, CRFB/88) e de sítio (art. 139, II, CRFB/88).

A jurisdicionalidade, consagrada no art. 5º, LXI da CRFB/88 se relaciona com o


princípio do devido processo legal, previsto no art. 5º LIV, e consigna que para haver
privação de liberdade, deve necessariamente existir o processo – salvo nos casos de prisão em
flagrante. Além disso, sua decretação deve ser necessariamente oriunda de uma ordem
judicial, devidamente motivada, nos termos do art. 93, IX da CRFB/88 e art. 315 do CPP.
O professor Mougenot 3, considera espécies de prisão cautelar a prisão preventiva
(arts. 311 a 318 do CPP), a prisão temporária – modalidade de prisão prevista na Lei n.
7.960/1989 – e a prisão domiciliar (arts. 317 e 318 do CPP). E por fim, a prisão em flagrante
(arts. 301 a 310 do CPP), considerada como uma medida pré-cautelar, a ser analisada em
seguida.

2.4 Da prisão em flagrante delito

Ao recorrer a etimologia do termo ‘flagrante’, constata-se sua origem do latim flagrare


(queimar) e flagrantis (que queima). Portanto, flagrante seria a infração penal que está
queimando, acontecendo, e a sua percepção se dá enquanto ela ocorre.

No entanto essa definição não abarca todos os casos, conforme ensina Lopes Jr.4

A prisão em flagrante, prevista no art. 301 e seguintes do Código de Processo Penal,


obriga os agentes públicos e faculta aos particulares, a atuarem na privação de liberdade de
quem quer que seja encontrado em situação de flagrância na prática de infração penal –
certeza visual do delito –, independentemente de prévia autorização judicial, ao contrário do
que ocorre nos casos de prisão preventiva e prisão temporária

A expressão “delito” constante no art. 301 do CPP, abrange não só a prática de crime,
como também a de contravenção penal. Todavia, caso ocorra a pratica de infração penal de
menor potencial ofensivo, se o agente comparecer imediatamente ao juizado, ou assumir o
compromisso de comparecer, não se exigirá fiança e nem será lavrado auto de prisão em
flagrante, mas sim termo circunstanciado de ocorrência, consoante com o art. 69, parágrafo
único da Lei nº 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais).

No entanto, de acordo com o art. 322 do CPP, caso o agente se recuse a comparecer
imediatamente ao juizado ou a assumir o compromisso de a ele comparecer, deverá ser
lavrado auto de prisão em flagrante, podendo a própria autoridade policial conceder liberdade
provisória mediante pagamento de fiança, caso tratar-se de infração penal punida com pena
máxima não superior a quatro anos.

Nas palavras de Lopes Jr.5 :

3
MOUGENOT, Edilson. Curso de processo penal / Edilson Mougenot. –. ed. – São Paulo: Saraiva, 2019.

4
(ob.cit. p. 933).
5
(ob.cit. p. 934)
A prisão em flagrante é considerada medida précautelar, porque os agentes autorizados
a exercê-la, agem sob a pretensão de evitar a continuação da infração penal, realizando a
detenção do individuo. Essa autorização é cedida, porque tão logo efetuada a prisão do
individuo deverá este ser conduzido à presença de uma autoridade judicial, para que seja
exercido o controle judicial daquela prisão, o que demonstra o caráter precário da prisão em
flagrante.

Portanto, defende Lopes Jr.6 :

que a prisão em flagrante, constitui uma medida pré-cautelar pessoal pela sua absoluta
precariedade, pois não tem o objetivo de garantir o resultado final do processo, mas visa
simplesmente a cessação da pratica delitiva e a apresentação do detido a uma autoridade
judicial, para que esta adote uma verdadeira medida cautelar.

A partir da realização da prisão em flagrante, a autoridade policial deverá lavrar o auto


de prisão em flagrante e providenciar a apresentação do preso à autoridade judicial, para que
analise sua legalidade e decida sobre a manutenção da prisão.

As hipóteses que autorizam a prisão em flagrante estão previstas, em rol taxativo, nos
incisos do art. 302 do CPP, assim expostas:

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:

I - está cometendo a infração penal;

II - acaba de cometê-la;

III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa,
em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam
presumir ser ele autor da infração

Ademais, quanto à situação em que se encontra o agente no momento de sua prisão,


Mougenot 7 classifica em três modalidades:

1) flagrante próprio, perfeito;

2) Flagrante impróprio, imperfeito;

6
(ob.cit. p 935)
7
Ob.cit p. 972
3) Flagrante presumido, ficto.

As hipóteses abarcadas pelos incisos I e II do art. 302, do CPP, são denominadas pela
doutrina nacional como flagrante próprio ou perfeito. A hipótese prevista no inciso I, ocorre
quando o agente é surpreendido na prática da infração penal.

No mesmo sentido, Lopes Jr.8 esclarece a ocorrência desta modalidade quando: “[...] o
agente é surpreendido durante o iter criminis, praticando a conduta descrita no tipo penal sem,
contudo, tê-lo percorrido integralmente [...]”. A hipótese desse inciso, se exemplifica no caso
do indivíduo que, de posse do animus necandi, está agredindo a vitima – praticando o tipo
penal do art. 121, do Código Penal. Ou seja, ocorrerá essa modalidade de flagrante, quando o
agente está na pratica do verbo nuclear do tipo penal.Já a hipótese prevista no inciso II ocorre
quando o agente é surpreendido quando acaba de cometer a infração penal.

2.5.2 Flagrante impróprio ou imperfeito

O flagrante impróprio ou imperfeito, assim denominado pela doutrina, abarcaas


situações de flagrância previstas nos incisos III e IV do art. 302 do CPP. A hipótese prevista
no inciso III, prevê a prisão em flagrante quando o agente é perseguido pela autoridade,
ofendido ou qualquer outra pessoa, logo após a pratica da infração penal, em situação que faça
presumir ser o autor da ação (CPP, art. 302, III).

Lopes Jr. 9leciona que, para a caracterização desta espécie de flagrante, é necessário a
presença de 3 (três) requisitos:

“ [...] 1) perseguição (requisito (2020, p. 939) de atividade); 2) logo após o


cometimento da infração penal (requisito temporal); 3) situação que faça presumir a autoria
(requisito circunstancial) [...]”.

Em relação ao primeiro requisito, o termo “perseguição” tem seu conceito extraído do


art. 290 do CPP, especialmente do paragrafo primeiro das alíneas “a” e “b”. Ao analisar tal
dispositivo, entende-se a ocorrência de perseguição – situação em que o executor vai em
perseguição do réu – quando: [...]

a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido
de vista;

8
Ob.cit. p.939
9
ob. cit. p. 939
b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco
tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço.

O segundo requisito, que trata do lapso temporal, exige que a perseguição inicie “logo
após”– a pratica da infração penal. Portanto, “logo após” é considerado um pequeno lapso
temporal entre a prática da infração penal e o início da perseguição.

Dessa forma, para Lopes JR.10 :

Para configurar a perseguição, exige-se que o executor – legitimado a executar a


prisão em flagrante – tenha o contato visual inicial, ou pelo menos, uma proximidade que
permita ir ao encalço do suspeito, ainda que perca posteriormente o contato visual, e que tal
perseguição se dê de forma ininterrupta e de forma continua, pois uma vez cessada a
perseguição, cessa a situação de flagrância.

Portanto, fácil compreender que se inicie a perseguição é necessário que o executor


tenha visualizado ou pelo menos tenha chegado próximo de visualizar o suspeito
imediatamente após o cometimento do delito.

Novamente recorremos ao professor Aury Lopes 11 :

Todavia, uma vez iniciada a perseguição, esta poderá perdurar por extenso lapso
temporal, desde que ininterrupta e continua. Melhor dizendo, na modalidade de flagrante do
inciso III, o início da perseguição se dá em poucos minutos após a pratica da infração penal,
no entanto, após iniciada, sua duração pode perdurar por várias horas, a se verificar no caso

Por ultimo, o requisito circunstancial consiste na exigência de que o individuo


perseguido seja preso em situação que faça presumir ser autor da infração.

Nesse caso, restará fundamentado tal requisito quando existentes elementos que
fomentam a presunção de autoria, como o reconhecimento da vítima, a posse de objetos do
crime, etc., a depender do caso concreto 12

2.5.3 Flagrante presumido ou ficto

A situação de flagrância prevista no art. 302, inciso IV, ocorre quando o suspeito: “[...]
IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam
presumir ser ele autor da infração. [...]”. Nesse caso, o agente não é perseguido, mas
10
(ob.cit. p. 940).
11
ob. cit. p. 941
12
Idem.p.941
encontrado, logo depois da prática da infração penal na posse de instrumentos, armas, objetos
ou papéis em situação que presume sua autoria.

Apesar de haver controvérsia em relação ao tempo da expressão “logo depois”, parte


da doutrina, acompanhada por Renato Lima 13 :

essa expressão não é diferente de logo após (CPP, art. 302, III), e que ambas
significam uma relação de imediatidade em cada caso. A única diferença, é que, no caso do
inciso III, há a perseguição, enquanto no inciso IV, o suspeito é encontrado na posse de
objetos que façam presumir a autoria da infração penal, do crime. No entanto, não aceita
prisões muitos dias após

O flagrante esperado, ocorre quando a autoridade policial é informada da possibilidade


de ocorrer uma infração penal, desloca-se até o local indicado e em campana aguarda sua
execução e após iniciado os atos executórios do crime age para realizar a prisão em flagrante.

Diferentemente do flagrante provocado, este não há indução ou instigação da


autoridade policial para que o agente inicie os atos executórios. Desta feita, constitui
modalidade de flagrante regular e legal.

2.5.5 Flagrante retardado ou diferido ou ação controlada

Nessa modalidade, embora o delito esteja em curso, há a possibilidade de


retardamento do momento da prisão em flagrante, para buscar maiores informações ou provas
contra pessoas envolvidas em organizações criminosas ou tráfico ilícitos de drogas.

Em regra, tão logo a autoridade policial se depare com a pratica da infração penal,
deve-se obrigatoriamente efetuar a prisão em flagrante (art. 301, 2º parte, CPP). Todavia, essa
modalidade, autoriza a autoridade policial e seus agentes, realizem a prisão em flagrante em
momento mais oportuno, sob o ponto de vista da investigação criminal ou da colheita de
prova

Essa modalidade está prevista nos art. 8º da Lei nº 12.850/2013 (Lei do Crime
Organizado) e no art. 53, II, da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) e no art. 4º-B da Lei nº
9.613/1998 (Lavagem de Capitais ou de ilícitos ativos).

Na Lei do Crime Organizado, não há exigência de prévia autorização judicial para o


retardamento da atuação policial, mas simplesmente a comunicação à autoridade judicial

13
ob.cit. p. 961
competente, que, caso necessário, fixará os limites da atuação e dará ciência ao Ministério
Público (Art. 8º, §1º, Lei 12.850/2013).

Na Lei de Drogas, diferentemente do primeiro caso, o retardamento da prisão em


flagrante depende de autorização judicial, que esta condicionada a informação de provável
itinerário e a identificação dos autores ou de colaboradores, bem como da manifestação do
Ministério Público (Art. 53, II, Lei 11.343/2006).

Na Lei de Lavagem de Capitais, há também a previsão da ação controlada quando a


execução imediata da prisão comprometer as investigações, mediante a suspensão pela
autoridade judicial, com prévia manifestação do Ministério Público.

2.5.6 Flagrante preparado ou provocado

Nesse caso, há a caracterização de crime impossível, já que a preparação do flagrante


torna impossível a consumação do crime, pois de forma simultânea a provocação, o agente
provocador do flagrante age para evitar a consumação.

Trata-se de prisão em flagrante ilegal. Ocorre, por que há indução para que o agente
pratique a infração penal exatamente para ser preso

Na lição de Mougenot14 :

Essa modalidade de flagrante ocorre quando uma pessoa, pública ou particular,


provoca, induz ou instiga alguém ao cometimento de uma infração penal de forma que esta é
praticada em razão da preparação (

Visando essas situações, dispõe o enunciado da Súmula 145 do Supremo Tribunal


Federal (STF) que: “Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna
impossível a sua consumação”.

Em regra, essa modalidade de flagrante é ilegal, no entanto, verifica-se situação de


legalidade quando o flagrante preparado relacionado a venda simulada de droga, na qual a
autoridade policial instiga o agente ao cometimento da infração penal na modalidade de
venda, do art. 33, da Lei 11.343/2006.

14
Ob.cit. p. 673).
Devido a existência de vários verbos nucleares desse tipo penal, apesar de recair a
ilegalidade na conduta “vender”, persiste a legalidade em relação as demais.

2.5.7 Flagrante forjado

trata-se de prisão em flagrante absolutamente ilegal, pois nesse caso, quem comete o
crime é a pessoa ou a autoridade que simula o crime, mediante a atribuição de provas.

Os ensinamento de Lima 15 são no seguinte sentido :

Essa modalidade de flagrante ocorre quando é forjada uma situação fática de


flagrância, para legitimar a prisão. Nesse caso, há a criação de provas para forjar a pratica de
uma infração penal inexistente, objetivando incriminar falsamente alguém Dessa maneira,
ciente da inexistência da infração penal, a autoridade policial poderá responder pelo crime de
abuso de autoridade (Lei nº 4.898/65, art. 3º, “a”) enquanto o particular poderá responder por
denunciação caluniosa (CP, art. 339).

2.6 Elaboração do auto de prisão em flagrante

O auto de prisão em flagrante, em regra, presidido pela autoridade policial, é o


documento que contém as formalidades que revestem a prisão em flagrante, tem o objetivo
precípuo de retratar os fatos que ensejaram a restrição de liberdade do individuo e reunir os
primeiros elementos de prova da infração penal que motivou a prisão (LOPES JR. 2020, p.
953).

As formalidades relativas à elaboração do auto de prisão em flagrante estão


estabelecidas nos art. 304 e seguintes do CPP bem como no texto constitucional.

Anteriormente à elaboração do auto, deve ser feita a comunicação imediata da prisão


ao juiz competente, ao Ministério Público, à família do preso ou à pessoa por ele indicada,
além de lhe ser cientificado do direito à assistência de um advogado, de acordo com o
disposto no art. 5º, LXII e LXIII, da CRFB/88 e art. 306, do CPP (MOUGENOT, 2019, p.
676).

Assim que a autoridade policial for cientificada da prisão em flagrante, esta

deverá proceder na elaboração do auto de prisão em flagrante, que deverá seguir


rigorosamente o procedimento previsto em lei, que, caso descumprido, tornará o auto
completamente nulo.
15
Ob.cit. p. 965
Após efetuada a prisão em flagrante delito, o preso deve ser apresentado a autoridade
policial, e de acordo com o estabelecido no art. 304 do CPP, a autoridade policial deverá
proceder à oitiva do condutor – aquele que realizou a prisão e conduziu o detido –, e colherá,
desde logo, sua assinatura, devendo lhe entregar a cópia do termo e o recibo de entrega de
preso.

Em seguida, ouvirá as testemunhas que presenciaram os fatos e/ou a prisão, caso não
há testemunhas que presenciaram os fatos, determina o art. 304, §2º, que,nesse caso, deverão
assinar, pelo menos, duas testemunhas de apresentação denominadas testemunhas
instrumentárias pela doutrina nacional.

Ao final, a autoridade policial interrogará o preso, sendo-lhe garantido todos os seus


direitos constitucionais, quais sejam a presença de um defensor, sendo-lhe assegurado o
direito de conversar reservadamente com o preso e a cientificação de seu direito de silêncio,
conforme as peculiaridades do art. 185, e seguintes do CPP.

Caso o preso se recuse a assinar, não souber ou estiver em situação que o impossibilite
de fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será subscrito por duas testemunhas de leitura,
conforme estabelecido pelo art. 304, §3º, do CPP.

Por conseguinte, no prazo máximo de 24 horas, será entregue a nota de culpa ao preso,
mediante recibo, que constará o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas,
devidamente assinado, assim como dispõe o art. 306, §1, do CPP.

Em relação a importância da entrega da nota de culpa, segundo Lopes Jr.(2020, p.


957), o conhecimento sobre os motivos, causas e elementos de acusação, bem como a
identificação dos que sustentam a realização do auto de prisão em flagrante serve para
desterrar o antigo segredo com que se oprimia o indiciado .

Por fim, dentro do prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas a contar da realização da
prisão, tendo o auto de prisão em flagrante tornado formalizado e concluso, deverá este ser
imediatamente remetido à autoridade judicial competente e, caso o autuado não informe o
nome de seu advogado, remeterá também, cópia integral do auto à defensoria pública (CPP,
art. 306, §1º).

2.7 Decisões interlocutórias em audiência de custódia

Após a implementação da audiência de custódia no sistema processual penal, que só


ocorreu, inicialmente, com a Resolução 213/2015, do CNJ, tornou se obrigatória a sua
realização em até 24 horas após o recebimento do auto de prisão em flagrante delito pela
autoridade judicial. Nessa audiência, o preso é apresentado à presença do juiz competente,
que deverá ouvi-lo. Após a instituição da audiência de custódia, o preso deve ser apresentado
pessoalmente ao juiz, que deverá interroga-lo sobre as circunstancias de sua prisão, e só após
ouvir o defensor e ministério publico, decidirá, de acordo com o artigo 310 do CPP e art. 8º,
§1º da Res. 213/20155 do CNJ, sobre o relaxamento da prisão; concessão da liberdade
provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão, a decretação de prisão
preventiva; e a adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos do preso.

Ainda, vale ressaltar que a audiência de custódia não se limita aos casos de prisão em
flagrante, mas tem aplicação em toda e qualquer prisão (cautelar ou definitiva), de acordo
com o art. art. 7.5 da CADH, art. 287 do CPP e art. 13 da Res. 213/2015 do CNJ.

Consoante ao estabelecido no art. 310, §1º do CPP, ao analisar o auto de prisão em


flagrante, caso a autoridade judicial verifique que o agente praticou o fato sob qualquer uma
das causas excludentes de ilicitude (CP, art. 23, I, II, III) – estado de necessidade, legitima
defesa, estrito cumprimento do dever legal, exercício regular do direito –, poderá,
fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de
comparecimento obrigatório aos atos processuais, sob pena de revogação.

Não obstante, dispõe o §2º do art. 310 do CPP, que a autoridade judicial deverá
denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares, se for verificado que o agente
é reincidente, ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de
fogo de uso restrito. Esse parágrafo, introduzido no CPP pela Lei nº 13.964/19 (Pacote
Anticrime), foi alvo de crítica de parte da doutrina nacional.

Lopes Jr.16 considera que :

esse dispositivo inconstitucional e sustenta que, inicialmente, ressuscita o bis in idem


da reincidência já tão criticado pela doutrina penal. Por conseguinte, cria determinadas
condutas para proibir a concessão de liberdade, o que realça sua inconstitucionalidade, pois o
STF já firmou entendimento que é inconstitucional as regras que vedam a concessão de
liberdade provisória

Com a intenção de reafirmar a importância da realização da audiência de custódia no


prazo legal, o §3º do art. 310 estabelece que a autoridade judicial que contribuir, sem

16
(ob.cit. p. 963)
justificativa plausível, poderá ser responsabilizado nas esferas administrativa, civil e penal,
pela omissão.

Por fim, dispõe o §4º, do art. 310 que o decurso do prazo de 24 horas para realização
da audiência de custódia, sem justificativa idônea, resulta na ilegalidade da prisão em
flagrante, devendo esta ser relaxada pela autoridade judicial, se não for caso de decretação de
prisão preventiva. Todavia, apesar desse parágrafo reafirmar a importância da audiência de
custódia e, visando a sua integral concretização, o estabelecimento de prazo e sanção, foi
suspenso pelo STF, por meio da liminar proferida pelo Ministro FUX.

2.7.1 Relaxamento da prisão em flagrante ilegal

No primeiro momento, a autoridade judicial, com o auto de prisão em flagrante em


mãos, e na presença do preso durante a audiência de custódia, analisará a legalidade da
medida constritiva. Essa análise do auto de prisão em flagrante visa verificar a presença dos
requisitos formais e materiais.

Sobre o tema Lopes Junior17 :

O juiz deve fazer o exame do aspecto formal do auto de prisão em flagrante


verificando se todo o procedimento para elaboração do auto de prisão em flagrante está de
acordo com as formalidades estabelecidas pela CRFB/88 e pelo CPP. Nesse ponto, o juiz
verificará se houve a comunicação imediata da prisão às pessoas que a lei estabelece, a
entrega da nota de culpa ao preso dentro do prazo máximo de 24h, a remessa do auto ao juízo
no mesmo prazo, o uso correto de algemas, dentre outros

Ainda, deve-se analisar a legalidade do próprio flagrante, de acordo com os requisitos


do art. 302, do CPP. Aqui, é analisado se o capturado estava em uma das situações que
autoriza o flagrante, estabelecidas pelo art. 302, do CP. Assim, se verificado a ocorrência de
prisão em flagrante legal, esta será homologada. Porém, caso verifique a ilegalidade da prisão
em flagrante, seja pela ausência dos requisitos formais e materiais, o magistrado deve
determinar o seu relaxamento.

Ainda, conforme Lima18 :

17
ob.cit. p. 959).
18
Ob.cit. p. 978
caso o magistrado verifique ordem ou execução de prisão, sem as formalidades legais
ou com abuso de poder, deverá encaminhar ao Ministério Público os elementos de prova, para
que seja feita a responsabilização criminal do funcionário (Lei nº 4.898/65, art. 4º, “a”, e “c”).

A ocorrência de relaxamento da prisão em flagrante não obsta a imposição da prisão


preventiva, temporária, nem tampouco a imposição de medidas cautelares diversas da prisão,
desde que presente seus requisitos legais

2.7.2 Conversão da prisão em flagrante em preventiva ou temporária

Caso homologada a prisão em flagrante, o magistrado deve verificar,


sistematicamente, se há pressupostos para a decretação da prisão preventiva. Tais
pressupostos, estão previstos nos art. 312 e 313 do CPP, e devem ser considerados
cumulativamente. Além disso, deve verificar se as medidas cautelares diversas da prisão
demonstram-se inadequadas ou insuficientes a tutelar o risco de liberdade do individuo.

Ultrapassadas essas fases, só então decretará a prisão preventiva e, para Aury Junior19 :

preliminarmente, ressalta-se a impossibilidade de haver conversão de ofício daprisão


em flagrante em preventiva e temporária. Portanto, é imprescindível a existência de
representação da autoridade policial ou o requerimento do Ministério Público, consoante com
o estabelecido no art. 311, do CPP

Dessa maneira, resta claro a absoluta impossibilidade de ser decretada a prisão


preventiva, sem o pedido do MP ou representação da autoridade policial, o que se coaduna
com o sistema acusatório, objetivado pelo sistema processual penal brasileiro.

No entanto, quando existente o pedido de decretação da prisão preventiva, o


magistrado deve analisar o fumus commissi delicti e o periculum libertatis que a
fundamentam, a serem considerados cumulativamente.

O requisito – fumus commissi delicti – já é demonstrado, naturalmente, na própria


prisão em flagrante. No entanto, a demonstração do fundamento – periculum libertatis –,
quais sejam o risco para a ordem publica, ordem econômica, conveniência da instrução
criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, deve ser analisado diligentemente.

19
Ob.cit.p. 960).
20
Dessa forma, como leciona Mougenot a prisão preventiva deve ser a última das
medidas aplicáveis, somente aplicada, quando as medidas cautelares diversas da prisão se
revelarem inadequadas ou insuficientes, conforme disposição do §6º, do art. 282, do CPP.

Assim, de acordo com o caso concreto, o juiz deve verificar se o risco do estado de
liberdade do agente, não pode ser tutelado por alguma das medidas cautelares diversas da
prisão previstas no art. 319, do CPP.

2.7.3 Concessão de liberdade provisória

Durante audiência de custódia, o juiz, ao analisar o auto de prisão em flagrante, caso


não seja hipótese de relaxamento de prisão, e inexistentes os pressupostos que fundamentam a
prisão preventiva ou temporária, deverá, de forma fundamentada, conceder liberdade
provisória, com ou sem fiança, conforme estabelece o inciso III do art. 310, do CPP.

21
Ainda, segundo o professor Renato Brasileiro (2019, p. 983), o art. 310 deve ser
interpretado em conjunto com o art. 321 do CPP o qual estabelece que ausentes os requisitos
que fundamentam a decretação da prisão preventiva, o magistrado deverá conceder liberdade
provisória, impondo se for o caso, isolada ou cumulativamente, além da fiança, as medidas
cautelares diversas da prisão arroladas no art. 319, e observados os critérios instituídos no art.
282, ambos do CPP.

No Estado Democrático de Direito é certo que a sociedade não suportaria a não


existência de uma reprimenda àquele que infringe a lei lesando bens essenciais de alguém ou
do próprio Estado, cuja preservação se visa a promover por meio da ameaça penal (REALE
JR, 2020).

Nesta vertente, o Estado é, portanto, responsável pela aplicação de sanções à prática de


delitos que afrontem os bens jurídicos da sociedade. Isso se dá, porém, a partir da prévia
instituição de leis controladoras do poder estatal Jus Positum.

Acerca do assunto, assevera o Mestre Guilherme Nucci 22:

Cometida a infração penal, nasce para o Estado o poder-dever de punir (pretensão


punitiva), consubstanciado na legislação material, com alicerce no seguinte direito

20
Ob.cit. p. 682
21
Ob.cit. p. 983
22
NUCCI, G.D.S. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Grupo GEN, 2021.
fundamental (princípio da legalidade): não há crime sem prévia lei que o defina, nem pena
sem prévia lei que a comine.

A intervenção mínima evidencia a natureza subsidiária do Direito Penal (ultima ratio),


pois somente quando os demais ramos do ordenamento jurídico não forem fortes o suficiente
na proteção de determinado bem é que se buscará a sua proteção através do Direito Penal.

Nas palavras de Nucci 23:

O termo prova origina-se do latim – probatio –, que significa ensaio, verificação,


inspeção, exame, argumento, razão, aprovação ou confirmação.

Dele deriva o verbo provar – probare –, significando ensaiar, verificar , examinar,


reconhecer por experiência, aprovar, estar satisfeito com algo, persuadir alguém a alguma
coisa ou demonstrar.

Portanto, a prova, como instituto garantidor da veracidade dos fatos, está sujeita a
diferentes ações por parte de quem a almeja, sendo necessário, para o operador do Direito,
entender seus conceitos, os caminhos percorridos por ela e a possibilidade de contaminação
da mesma.

Partindo da premissa de que a prova objetiva remontar a situação fática, ela, em


sentido amplo, é presumida de veracidade, para que assim tenha credibilidade em formar o
convencimento do juiz acerca do fato cometido.

Não obstante, ao se tratar da conceituação da prova, vemos que ela remete a uma
suposta verdade dos fatos. Porém, o conjunto probatório, como um todo, deve ser levado em
consideração ao se tratar de uma possível condenação do sujeito.

Ao lecionar sobre o assunto, Nucci24 (2021, p.439) nos traz o seguinte:

Quando se busca provar um fato juridicamente relevante, na investigação ou no


processo, deve-se ter a noção de que a busca findará em torno de algo supostamente
verdadeiro (que tenha ocorrido na realidade), levando à presunção de credibilidade em outro
fato, juridicamente importante para o feito. Ilustrando, mesmo quando o acusado confessa a
prática do crime, podendo-se apurar tanto a materialidade quanto autoria, trata-se apenas de
uma suposta verdade, leia-se, a suposição do que realmente ocorreu. É preciso muito mais
para uma condenação, de forma que o conjunto probatório é o panorama mais seguro para se
23
Ob cit. p. 439
24
NUCCI, G.D.S. Código de Processo Penal Comentado. São Paulo: Grupo GEN, 2021.
ter uma noção do que se passou no plano da realidade. Prova entrelaça-se, sutilmente,com
convencimento.

Se a prova é convincente, o fato deve ter acontecido daquela forma, como retratado
pela mencionada prova.A prova, portanto, consagra-se como um instituto de muito valor para
o processo penal, pois, sendo ela a responsável por trazer à tona a veracidade sobre o fato
cometido, pode tanto criar convicções para a absolvição quanto para uma possível
condenação.

Como cita Renato Ercolin :25

Em conseguinte, o ordenamento jurídico brasileiro consagrou, também, os meios pelos


quais as partes hão de obter provas. O chamado meio de prova é todo procedimento utilizado
para comprovar a veracidade do que for alegado no bojo processual

Adjeto, o Código de Processo Penal leciona em seu texto que:

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em
contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos
informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e
antecipadas.

Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições
estabelecidas na lei civil.

Pode-se ver então que temos como meios de prova todos os meios que se tem de modo
direto ou indireto para se alcançar não a verdade real, mas a dentro do processo. Podem ser
usados na validação do que for arguido na fase processual.

O artigo 155, do Código de Processo Penal, entretanto, não traz um rol

exaustivo acerca da obtenção de provas. Talvez isto gere uma evidência de que seja

permitido, exceto o exposto no parágrafo único do dispositivo em comento, desde

que não viole normas e princípios legais e constitucionais, todos os demais meios de

comprovação da veracidade dos fatos (ERCOLIN, 2018).

25
ERCOLIN, R. Provas no Processo Penal [e-book]. Brasília: Instituto Fórmula, [s.d.].
Disponível em: https://www.institutoformula.com.br/wp-content/uploads/2018/08/Ebook-Processo-Penal-
Provas.pdf. Acesso em: 01 abr. 2021.
Adjeto, o artigo 157 do CPP, à luz do princípio constitucional da inadmissibilidade da
prova ilícita, traz uma proibição excepcional acerca da produção de provas, quais sejam as
provas que violem normas legais e/ou normas constitucionais, assim conhecidas como provas
ilícitas. Segundo esse dispostivo, estas provas, uma vez arguidas, necessitam serem
desentranhadas do bojo processual.

Os meios de prova podem ser lícitos – que são admitidos pelo ordenamento jurídico –
ou ilícitos – contrários ao ordenamento. Somente os primeiros devem ser levados em conta
pelo juiz. Em relação aos meios ilícitos, é preciso destacar que eles abrangem não somente os
que forem expressamente proibidos por lei, mas também os imorais, antiéticos, atentatórios à
dignidade e à liberdade da pessoa humana e aos bons costumes, bem como os contrários aos
princípios gerais de direito.

Nos termos de Capez (2020, p.394):

Visando regulamentar o preceito contido no artigo 5º, LVI, da Carta Magna, a Lei nº
11.690/2008, disciplinou, no art. 157 do Código de Processo Penal, a matéria relativa às
provas ilícitas. (...) Em primeiro lugar, a lei, respeitando o comando constitucional, deixou
bem clara a inadmissibilidade das provas ilícitas, não distinguindo as provas produzidas com
violação das disposições materiais daquelas realizadas em contrariedade às disposições
processuais.

Por outro lado, a doutrina apresenta a diferenciação entre prova ilícita e prova
ilegítima, que são espécies do gênero de provas proibidas. A primeira diz respeito àquelas
obtidas em violação às normas de direito material; já a segunda se obtém através da
contrariedade às normas de direito processual.

O doutrinador Capez (2020, p. 386) traz uma diferenciação sistematizada entre as duas
espécies, nos dizeres:

Quando a prova for vedada, em virtude de ter sido produzida com afronta a normas de
direito material, será chamada de ilícita. Desse modo, serão ilícitas todas as provas produzidas
mediante a prática de crime ou contravenção, as que violem normas de Direito Civil,
Comercial ou Administrativo, bem como aquelas que afrontem princípios constitucionais.

Tais provas não serão admitidas no processo penal.

Quando a norma afrontada tiver natureza processual, a prova vedada será chamada de
ilegítima. Assim, será considerada prova ilegítima: o documento exibido em plenário do Júri,
com desobediência ao disposto no art. 479, caput (CPP); o depoimento prestado com violação
à regra proibitiva do art. 207 (CPP) (sigilo profissional) (...).

Assim sendo, o sistema jurídico brasileiro ao legislar sobre tal matéria, se viu na
responsabilidade de criar mecanismos que oferecessem à prova mais segurança e amparo
legal, pois, sendo ela de suma importância para o veredicto, poderia facilmente ser alvo de
deturpação e contaminação.

A cadeia de custodia e a preservação e processamento dos vestígios Atualmente, o


processamento do vestígio é consagrado pela chamada Cadeia de Custódia, instituto do
processo penal que foi recentemente positivado no ordenamento jurídico brasileiro, através da
Lei nº 13.964 (2019), após décadas da promulgação dos livros que regem os direitos Penal e
Processual Penal.

Nas palavras de Vinícius Assumpção26 :

Chega tarde a um processo penal, que se pretende democrático, um conjunto de


normas que disciplinem as regras de reconhecimento, preservação, perícia, armazenamento e
descarte de vestígios de uma infração penal.

Nesse sentido, a proteção ao vestígio se vislumbrava como um procedimento avulso,


uma vez que a cadeia de custódia (assim chamada a proteção do vestígio) não era disciplinada
no ordenamento jurídico brasileiro. Com o advento da referida Lei, o Brasil subiu ao patamar
de países desenvolvidos por preocupar-se com a seguridade da prova. É o que aponta Nucci
sobre o assunto Nucci27 :

(...). Enfim, a lei procura um caminho didático por fazer definições de variados temas.
Vê-se o cuidado com a captação do objeto ou material, relacionado ao delito. Depois, pauta-se
em lei, de maneira expressa, ponto a ponto, até chegar ao final descarte da prova

Nesse sentido, o advogado e escritor jurídico Darlan Barroso 28 (2020, p.99) esclarece
que:

26
ASSUMPÇÃO, Vinicius Pacote Anticrime – comentários à Lei n. 13.964/2019.p.81 São
Paulo: Editora Saraiva, 2020.

27
(ob.cit.
p. 388)
28
BARROSO, D. Lei Anticrime Comentada (13.964/2019). São Paulo: Editora Saraiva, 2020.
[...] por meio de um procedimento formal e técnico, garante-se que aquela evidência
ou vestígio prossiga durante a investigação e instrução criminal sem qualquer interferência
externa capaz de macular sua integridade e colocar em risco a licitude da prova. Em outras
palavras, a cadeia de custódia visa assegurar a idoneidade da prova.

Esta norma não é fácil de ser cumprida, visto determinar que o agente público (como
regra, o policial), ao reconhecer um elemento de prova para a futura perícia, fica responsável
por sua preservação. Dá-se a entender que uma falha sua ao preservar a prova, no mínimo,
transforma-se em infração administrativa

Por fim, o derradeiro parágrafo, do artigo em epígrafe, alinha-se ao caput do mesmo,


trazendo um aspecto conceitual ao que se entende como objeto da cadeia de custódia, qual
seja o vestígio material.

Por fim, o último parágrafo do referido artigo coaduna-se com o teor daquele artigo,
trazendo aspectos conceituais ao objeto da cadeia de custódia, quais sejam, os vestígios
físicos. Os vestígios constituem os vestígios deixados por um crime, geralmente
estabelecidos no âmbito físico e visíveis aos interessados na formação de provas. A
definição proposta neste parágrafo está correta. No entanto, não se deve esquecer a
existência de vestígios imateriais, que se conservam na memória das testemunhas, por
exemplo, quando proferidas oralmente, a fim de provar a existência de um crime contra a
honra. Assim, a proteção que a cadeia de custódia confere à prova através dos
procedimentos previstos na lei parece visar a legitimação do vestígio, uma vez que pode ser
utilizada em juízo, processo penal, para se chegar a uma sentença em um caso concreto.

Do desenvolvimento temporal da cadeia de custodia e dos vestígios

Para o doutrinador Vinicius Assumpçao29 :

a Lei Anticrime estabeleceu os procedimentos a serem adotados para o rastreio do


vestígio, assim como especifica a norma contida no artigo 158-B, do Código de Processo
Penal. Assumpção (2020, p.88) destaca que o referido dispositivo é “eminentemente
explicativo, elencando quais etapas compõem a trajetória do vestígio a fim de se preservar a
cadeia de custódia”.
29
ASSUMPÇÃO, Vinicius . Pacote Anticrime – comentários à Lei n. 13.964/2019. São

Paulo: Editora Saraiva, 2020.


Neste sentido, conforme explica Nucci30 (2021, p.389), “rastrear significa seguir a
pista de algo e é exatamente isso que se reconhece neste dispositivo, passando por todas as
fases, desde o reconhecimento até o descarte do vestígio”. O autor destaca, ainda, como de
suma importância, a brilhante ideia do legislador em definir, de forma autêntica, cada uma das
fases da cadeia de custódia.

Nesta vertente, a inserção da cadeia de custódia para o rastreio do vestígio, no


ordenamento jurídico brasileiro, proporcionou uma maior manutenção da seguridade da prova
pericial, evidenciando assim, a importância que a comprovação probatória possui frente à
persecução penal.

É de suma importância salientar a respeito dos vícios que permeiam o rastreio do


vestígio – quebra da cadeia de custódia – e que nem sempre a aplicabilidade da mesma será
efetivada minuciosamente, tendo em vista as diferentes condições de operação do instituto nas
diversas localidades brasileiras. Sobre o assunto, assevera Nucci31

Embora mereça aplauso a inserção da cadeia de custódia em lei, é preciso ponderar


que o Brasil dispõe de regiões bem diferentes, em matéria de concentração populacional e de
renda. Há lugares em que a cadeia de custódia será desrespeitada por falta absoluta de
condições materiais.

Diante disso, não cabe adotar um formalismo radical nesse campo.

32
Em tal seara,Nucci douto autor adverte sobre a criação de um sistema probatório
absoluto e intocável, ao passo que, a prova pericial que não obedeça as formalidades legais
(art.158-B), não deverá ser considerada imprestável, mas, sim, invocada a nulidade relativa da
mesma. Em suas palavras:

(...) trata-se de nulidade relativa no tocante à referida cadeia de custódia. Pode-se dizer
que não há nulidades em investigação criminal, mas acontece um fato diferenciado no âmbito
da prova pericial: ela vale para a instrução e para o julgamento de mérito. Logo, uma vez que
avança para dentro da instrução, pode, sim, ser questionada quanto às formalidades legais
desde a sua captação e até o seu descarte. Não fosse assim, estarse-ia produzindo uma prova
de caráter absoluto e intocável, o que é incompatível com os princípios regentes da instrução
acusatória p

30
NUCCI, G.D.S. Código de Processo Penal Comentado. P.339São Paulo: Grupo GEN, 2021
31
Ob.cit. p.339
32
Ob.cit. p.146
Conseguinte, os tribunais têm solidificado cada vez mais o posicionamento favorável
acerca da nulidade relativa da prova, entendendo que a simples quebra da cadeia de custódia,
por mera inobservância das formalidades legais, quais sejam as do art. 158-B, não ensejam na
imprestabilidade da prova pericial.

Assim sendo, conforme explanado, nota-se que atualmente o entendimento adotado


sobre a quebra da cadeia de custódia, tanto doutrinária quanto jurisprudencial, demonstra a
fidelidade do ordenamento jurídico brasileiro a não valoração de regras absolutas para a
efetivação do Direito, no que diz respeito ao período probatório do processo penal.

Por fim, nota-se que a positivação do instituto da cadeia de custódia, com todos os
seus conceitos e procedimentos, reflete uma preocupação do legislador em manter o princípio
do devido processo legal, ao passo em que concede a este instituto a tutela de um dos mais
importantes atos do trâmite processual, a saber, a prova penal.

Inteirando, o cometimento de crimes sempre esteve presente na sociedade humana,


desde os primórdios até a contemporaneidade, ensejando a um Estado Democrático de Direito
a incansável tarefa de reprimir tais condutas, instituindo penas e sanções inovadoras como
resposta a quem o comete.

Não obstante, o organismo dos sistemas probatórios vigora como mecanismo a buscar
maior legitimidade ao trâmite processual, dando à prova a responsabilidade de remontar a
situação fática, aquela cometida por quem infringe a lei.

33
Para Luis prado Nas palavras de Prado a prova “trata-se, portanto, de todo e
qualquer meio de percepção empregado pelo homem com a finalidade de comprovar a
verdade de uma alegação”.

Sendo assim, com o advento da Carta Maior de 1988, a fase de produção probatória
foi concebida por uma regra inovadora, já que era ausente nas ordens constitucionais
anteriores. A referida inovação trata-se do princípio da Inadmissibilidade da Prova Ilícita,
concebido no artigo 5º, inciso LVI, da Constituição da República Federativa do Brasil:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(...)

33
PRADO, L. C. Provas ilícitas: teoria e interpretação dos tribunais superiores. 2.
ed., rev. e atual. Niterói: Editora Impetus, 2009. 139p.
LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.

Neste sentido, o comando constitucional em comento, que consagrou tal princípio ao


ordenamento jurídico brasileiro, não especifica o que são e quais seriam as provas obtidas por
meios ilícitos, dando um caráter genérico ao dispositivo.

Para tanto, na tentativa de sanar tal lacuna, a doutrina e a jurisprudência pátrias


consolidaram o entendimento de que o comando aí citado refere-se ao gênero de prova
proibida, do qual derivam duas espécies, a saber, prova ilegítima e prova ilícita. É o que
exemplifica o autor Capez34:

Prova vedada ou proibida é, portanto, a produzida por meios ilícitos, em contrariedade


a uma norma legal específica. A prova vedada comporta duas espécies:

Prova ilegítima. Quando a norma afrontada tiver natureza processual, a prova vedada
será chamada de ilegítima.

Prova ilícita. Quando a prova for vedada, em virtude de ter sido produzida com afronta
a normas de direito material, será chamada de ilícita.

Entretanto, desligando-se do entendimento doutrinário e jurisprudencial, a Lei nº


11.690/2008 trouxe nova regra ao instituto das provas proibidas, passando essas a serem
disciplinadas pela nova redação do artigo 157, instituído ao CPP, qual seja “são inadmissíveis,
devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em
violação a normas constitucionais ou legais”

Sobre tal mudança, destaca o professor Capez 35 (2021, p.144) que a reforma
processual penal “distanciou-se da doutrina e jurisprudência pátrias que distinguiam as provas
ilícitas das ilegítimas, concebendo como prova ilícita tanto aquela que viole disposições
materiais como processuais”.

Ainda em tempo, nota-se que além da inadmissibilidade da prova ilícita, que já era
vislumbrada na norma constitucional, a Lei 11.690/2008 trouxe também o comando de que tal
prova deve ser desentranhada do bojo processual, uma vez que arguida for.

Nas palavras de Capez36 (2021, p.146):

34
CAPEZ, F. Curso de Processo Penal.p.144 28ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021
35
Ob.cit. p. 146
36
Ob.cit. p.146 28ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021
Em primeiro lugar, a lei, respeitando o comando constitucional, deixou bem clara a
inadmissibilidade das provas ilícitas, não distinguindo as provas produzidas com violação das
disposições materiais daquelas realizadas em contrariedade às disposições processuais; (...)
Em segundo lugar, o preceito legal dispôs, também, acerca do seu desentranhamento do bojo
do processo.

Neste sentido, a norma legal advinda da Lei 11.690/2008 enfatiza a vedação da


ilicitude probatória no processo penal ao proibir também provas que sejam derivadas de
ilícitas, ou seja, aquelas que, embora lícitas em si, tenha sua origem em fato ilegal.

O professor Capez37 leciona sobre o assunto ao ensinar que:

A doutrina e a jurisprudência, em regra, tendem também a repelir as chamadas provas


ilícitas por derivação, que são aquelas em si mesmas lícitas, mas produzidas a partir de outra
ilegalmente obtida. É o caso da confissão extorquida mediante tortura, que venha a fornecer
informações corretas a respeito do lugar onde se encontra o produto do crime, propiciando a
sua regular apreensão. Esta última prova, a despeito de ser regular, estaria contaminada pelo
vício na origem.

Adjeto, a norma em comento, que consagrou a proibição da prova ilícita por derivação
e que está disciplinada no §1º, do art. 157 CPP, é reflexo da chamada Teoria dos Frutos da
Árvore Envenenada, que foi desenvolvida nos Estados Unidos, em 1920, conforme demonstra
Capez 38 :

Essa categoria de provas ilícitas foi reconhecida pela Suprema Corte norteamericana,
com base na teoria dos “frutos da árvore envenenada” – fruits of the poisonous tree –,
segundo a qual o vício da planta se transmite a todos os seus frutos.

Seguindo nessa linha, não resta dúvida do iminente compromisso do legislador e do


constituinte em garantir a integridade e seriedade do processo penal brasileiro, quando estes
consagram tal matéria ao ordenamento jurídico pátrio. Entretanto surge uma discussão acerca
do tema: Deve tal proibição ter caráter absoluto e desprezar, de fato e realmente, toda e
qualquer prova tida como ilícita?

Segundo o professor Capez 39

37
CAPEZ, F. Curso de Processo Penal.p.133 28ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021
38
ob.cit p.144):
39
Ob.cit. p. 141
Não é razoável a postura inflexível de se desprezar, sempre, toda e qualquer prova
ilícita. Em alguns casos, o interesse que se quer defender é muito mais relevante do que a
intimidade que se deseja preservar. Assim, surgindo conflito entre princípios fundamentais da
Constituição, torna-se necessária a comparação entre eles para verificar qual deva prevalecer.

Dependendo da razoabilidade do caso concreto, ditada pelo senso comum, o juiz


poderá admitir uma prova ilícita ou sua derivação, para evitar um mal maior, como, por
exemplo, a condenação injusta ou a impunidade de perigosos marginais. Os interesses que se
colocam em posição antagônica precisam ser cotejados, para escolha de qual deva ser
sacrificado.

Partindo dessa ideia, chega-se ao cerne da discussão aqui desenvolvida por essa
pesquisa, que busca salientar sobre a possibilidade de utilização da prova ilícita “pro reo” à
luz do princípio da proporcionalidade, no Direito Processual Penal brasileiro.

Nesse aspecto, conforme ensina Capez40

Entra aqui o princípio da proporcionalidade, segundo o qual não existe propriamente


um conflito entre as garantias fundamentais. No caso de princípios constitucionais
contrastantes, o sistema faz atuar um mecanismo de harmonização que submete o princípio de
menor relevância ao de maior valor social.

Assim, ao passo em que a proibição da prova ilícita constitui a garantia que o


indivíduo possui frente ao direito de punir, consagrado pelo princípio da inadmissibilidade da
prova ilícita, por outro lado, consagra-se também o direito do acusado ao contraditório e à
ampla defesa, ancorado pelo princípio do devido processo legal pro reo.

Sobre essa vertente, estamos diante de garantias constitucionalmente iguais em sentido


de valoração, pois em se tratando de princípios dessa ordem, não existe um “melhor” que
outro, entretanto, é preciso destacar que “estes devem harmonizar-sese de modo que, em caso
de aparente contraste, o mais relevante juridicamente prevaleça” (CAPEZ, 2021, p.145).

Atualmente, como fruto da teoria da proporcionalidade pro reo, dentro do


ordenamento jurídico brasileiro, tem prevalecido o entendimento de que aprova, mesmo sendo
obtida em afronta à normas legais e constitucionais, deve ser aceita no bojo processual, se for
esta primordial para inocentar o acusado.

40
CAPEZ, F. Curso de Processo Penal. 28ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021
tem sido, de fato, o entendimento da doutrina e nas palavras de Capez 41: “a tendência
da doutrina pátria é a de acolher essa teoria, para favorecer o acusado (a chamada prova ilícita
pro reo), em face do princípio do favor rei.”

Sendo assim, o princípio em questão é apresentado com o intuito de “balancear” a


justiça dentro do Estado Democrático, ao passo em que, fazendo absoluta a proibição de toda
e qualquer prova proibida possa o julgador correr o risco de estar ensejando em decisões
injustas, tendo em vista a dignidade da pessoa humana.

Nos ensinamentos do jurista Fernando Capez42:

A aceitação do princípio da proporcionalidade pro reo não apresenta maiores


dificuldades, pois o princípio que veda as provas obtidas por meios ilícitos não pode ser usado
como um escudo destinado a perpetuar condenações injustas. Entre aceitar uma prova vedada,
apresentada como único meio de comprovar a inocência de um acusado, e permitir que
alguém, sem nenhuma responsabilidade pelo ato imputado, seja privado injustamente de sua
liberdade, a primeira opção é, sem dúvida, a mais consentânea com o Estado Democrático de
Direito e a proteção da dignidade humana.

Adjeto, conforme explanado, o Direito procura sempre inovar, ao passo em que não se
valha de regras e princípios absolutos, a exemplo da inadmissibilidade da prova ilícita.
Contudo, ainda nessa vertente, se faz necessário ponderar sobre a aceitação das provas tidas
como proibidas, para que estas não venham a ensejar também caráter absolutista ao
ordenamento jurídico.

A aceitação da prova ilícita pro reo deve ser analisada com cautela e coerência para
não se permitir o cometimento de um crime maior para provar a inocência da prática de um
menor, restando assim demonstrado que a aceitação da prova ilícita sob o princípio da
proporcionalidade pro reo não pode ser absoluta.

Em suma, nota-se que o ordenamento jurídico brasileiro tem se valido, cada vez mais,
de inovações que buscam o aprimoramento de questões conflitantes, como é o caso aqui
exposto, e assim chegue a um posicionamento mais unificado, tanto jurisprudencial quanto
doutrinariamente.

41
Ob.cit.p.146
42
CAPEZ, F. Curso de Processo Penal.p.133 28ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2021
Sob essa perspectiva, percebe-se que o Estado tem buscado garantir ao ordenamento
jurídico brasileiro um sistema probatório que seja justo e democrático, não se valendo de
normas de cunho absolutista para sua efetivação. Nesse sentido, é possível observar que
atualmente, diante do conflito entre princípios norteadores do Direito, os tribunais brasileiros
têm decidido por ser o mais acertado elucidar aquele que contenha maior valor juridicamente
expresso.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Você também pode gostar