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1ª Fase | 40° Exame da OAB

Direito Penal

DIREITO
PENAL

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

Olá! Boas-Vindas!
Cada material foi preparado com muito carinho para que você
possa absorver da melhor forma possível, conteúdos de qua-
lidade.

Lembre-se: o seu sonho também é o nosso.

Bons estudos! Estamos com você até a sua aprovação!

Com carinho,

Equipe Ceisc. ♥

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

1ª FASE OAB | 40° EXAME

Direito Penal
Prof. Nidal Ahmad
Prof. Arnaldo Quaresma

Sumário

1. Aplicação da Lei Penal............................................................................................................. 4


2. Do crime................................................................................................................................. 10
3. Da Imputabilidade Penal ........................................................................................................ 31
4. Concurso de Pessoas (arts. 29, 30 e 31 do CP) .................................................................... 32
5. Aplicação da Pena ................................................................................................................. 35
6. Da Suspensão Condicional da Pena...................................................................................... 50
7. Do Livramento Condicional .................................................................................................... 54
8. Efeitos da Condenação .......................................................................................................... 58
9. Extinção da Punibilidade ........................................................................................................ 62
10. Crimes contra a vida ............................................................................................................ 75
11. Lesão Corporal (art. 129 do CP) .......................................................................................... 83
12. Crimes contra a honra.......................................................................................................... 86
13. Crimes Contra o Patrimônio ................................................................................................. 89
14. Crimes contra a Dignidade Sexual ..................................................................................... 104
15. Crimes contra a Fé Pública ................................................................................................ 108
16. Crimes contra a Administração Pública ............................................................................. 111
17. Dos crimes contra a Administração da Justiça .................................................................. 121

Olá, aluno(a). Este material de apoio foi organizado com base nas aulas do curso preparatório para
a 1ª Fase OAB e deve ser utilizado como um roteiro para as respectivas aulas. Além disso, reco-
menda-se que o aluno assista as aulas acompanhado da legislação pertinente.

Bons estudos, Equipe Ceisc.


Atualizado em dezembro de 2023.

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Direito Penal

1. Aplicação da Lei Penal

Prof. Nidal Ahmad


@prof.nidal
1.1. Da lei penal no tempo (art. 2o do CP)
Pelo princípio tempus regit actum (“o tempo rege o ato”), a lei penal não alcança os fatos
ocorridos antes ou depois de sua vigência, de forma que, em regra, a lei aplicável a um crime é
aquela vigente ao tempo da execução deste crime.
A regra, pois, é que a atividade da lei penal se dê no período de sua vigência; a extra-
atividade, representada pela retroatividade da lei mais benéfica e pela ultratividade, configura
exceção a esta regra.
Ultratividade quer dizer que se a lei antiga for mais favorável, prevalecerá ao tempo da
vigência da lei nova, mesmo estando revogada.
A retroatividade da lei mais benéfica significa que a lei mais benigna prevalece sobre a
mais severa, prolongando-se além do instante de sua revogação ou retroagindo ao tempo em
que não tinha vigência.

1.1.1. Abolitio criminis (art. 2o, caput, do CP)


Ocorre a chamada abolitio criminis quando a lei nova deixa de considerar crime fato que
anteriormente era considerado ilícito penal. A nova lei, demonstrando não haver mais, por parte
do Estado, interesse na punição do autor de determinado fato, retroage para alcançá-lo.
A abolitio criminis, além de conduzir à extinção da punibilidade, apaga todos os efeitos
penais da sentença condenatória, permanecendo, no entanto, íntegros seus efeitos na esfera
extrapenal. É o que se extrai do art. 2o, caput, do CP.

1.1.2. Novatio legis in mellius (art. 2º, par. ún., do CP)


Além da abolitio criminis, a lei nova pode favorecer o agente de várias maneiras. A lei
posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que
decididos por sentença condenatória transitada em julgado (art. 2º, par. ún., do CP).
Assim, se uma lei posterior deixar de prever uma circunstância de aumento de pena em
relação a determinado crime, retroagirá para beneficiar o réu. O mesmo se pode dizer se a lei
posterior passar a prever uma causa de diminuição da pena, por exemplo. Essa lei retroagirá
para alcançar fatos praticados antes da sua vigência.

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1.1.3. Novatio legis incriminadora


A novatio legis incriminadora, ao contrário da abolitio criminis, considera crime fato ante-
riormente não incriminado, e somente gerará efeitos para fatos praticados após a sua vigência.
Por conferir tratamento severo, a novatio legis incriminadora, por evidente, não retroage
para alcançar fatos praticados antes da sua vigência, tendo eficácia, portanto, somente em
relação aos fatos praticados a partir da sua vigência.

1.1.4. Novatio legis in pejus


A quarta hipótese refere-se à nova lei mais severa que a anterior (exemplo: a nova lei de
drogas, Lei n. 11.343/2006, no art. 33, aumentou a pena do crime de tráfico de drogas). Incide,
no caso, o princípio da irretroatividade da lei penal: “a lei penal não retroagirá, salvo para bene-
ficiar o réu” (art. 5o, XL, da CF/1988).

1.1.5. Crime permanente e crime continuado e a lei penal mais benéfica


Aplica-se a lei nova durante a atividade executória do CRIME PERMANENTE, ainda que
seja prejudicial ao réu, já que a cada momento da atividade criminosa está presente a vontade
do agente.
Da mesma forma, sendo o crime continuado uma ficção, considerando que uma série
de crimes constitui um único delito para a finalidade de aplicação da pena, o agente responde
pelo que praticou em qualquer fase da execução do crime continuado. Portanto, se uma lei penal
nova tiver vigência durante a continuidade delitiva, deverá ser aplicada ao caso, prejudicando ou
beneficiando.

Súm. 711 do STF: A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime
permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da
permanência.

1.2. Lei temporária e lei excepcional (art. 3° do CP)


Leis excepcionais: são feitas para durar enquanto um estado anormal ocorrer. Cessa a
sua vigência ao mesmo tempo que a situação excepcional também terminar. Portanto, são aque-
las promulgadas em caso de calamidade pública, guerras, revoluções, cataclismos, epidemias
etc.
Leis temporárias: são as editadas com período determinado de duração, portanto, dota-
das de autorrevogação. É feita para vigorar em um período de tempo previamente fixado pelo

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legislador. Traz em seu bojo a data do início e da cessação de sua vigência. É uma lei que, desde
a sua entrada em vigor, está marcada para morrer.
Reúnem duas características:
Autorrevogabilidade: em regra, uma lei somente pode ser revogada por outra lei, poste-
rior, que a revogue expressamente, que seja com ela incompatível ou que regule integralmente
a matéria nela tratada. As leis de vigência temporária e excepcional constituem exceção a esse
princípio, visto que perdem sua vigência automaticamente, sem que outra lei as revogue.
Ultratividade: significa que uma lei revogada continua gerando efeitos. É o caso da lei
temporária e da lei excepcional, que continuarão gerando efeitos em relação aos fatos praticados
durante sua vigência, mesmo após revogadas.

1.3. Do tempo do crime (art. 4° do CP)


Em relação ao tempo do crime, o Código Penal adotou a teoria da atividade, segundo a
qual se reputa praticado o delito no momento da conduta, não importando o instante do resultado.
Assim, se um adolescente com 17 anos, 11 meses e 29 dias efetuar disparo de arma de fogo
contra a vítima, que vem a falecer cinco dias depois (quando já terá adquirido a maioridade),
responderá conforme as normas do ECA, diante da teoria da atividade que rege o tempo do
crime.

FATO DEIXA DE SER


CRIME
ABOLITIO CRIMINIS

CESSAM TODOS OS
EFEITOS PENAIS

CAUSA DE EXTINÇÃO
DA PUNIBILIDADE

PERMANECEM
EFEITOS CIVIS

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1.4. Territorialidade (art. 5° do CP)


Pelo princípio da territorialidade, aplicam-se as leis brasileiras aos delitos cometidos den-
tro do território nacional. Esta é uma regra geral, que advém do conceito de soberania, ou seja,
a cada Estado cabe decidir e aplicar as leis pertinentes aos acontecimentos dentro do seu terri-
tório.
Nos termos do art. 5°, § 1°, do CP, há duas situações de território brasileiro por equi-
paração:
a) embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo bra-
sileiro onde estiverem;
b) embarcações e aeronaves brasileiras, de propriedade privada, que estiverem
navegando em alto-mar ou sobrevoando águas internacionais.
Os navios estrangeiros em águas territoriais brasileiras, desde que públicos, não são con-
siderados parte do nosso território. Em face disso, os crimes neles cometidos devem ser julgados
de acordo com a lei da bandeira que ostentam. Se, entretanto, são de natureza privada, aplica-
se a lei brasileira (art. 5°, § 2°, do CP).

1.5. Do lugar do crime (art. 6° do CP)


O Código Penal adotou a teoria da ubiquidade ou mista, segundo a qual é lugar do
crime tanto onde houve a conduta quanto o local onde se deu o resultado.
Assim, na hipótese de o agente, que se encontra na cidade brasileira de Santana do Li-
vramento-RS, efetuar disparos contra a vítima que se encontra na cidade de Rivera, em solo
uruguaio, separada por uma rua do Município brasileiro, vindo este a falecer, aplica-se a lei penal
brasileira, já que os atos executórios do crime foram praticados em território brasileiro, embora o
resultado tenha sido produzido em país estrangeiro.

TEMPO DO CRIME TEORIA DA ATIVIDADE

1.6. Extraterritorialidade (art. 7° do CP)


Extraterritorialidade: é uma exceção. Mesmo que o crime seja cometido fora do Brasil, os
agentes sujeitam-se à lei brasileira, nas hipóteses mencionadas no art. 7° do CP, quais sejam:

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EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA (INCISO I)


a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da Repú- Nestes casos, o agente é punido segundo a lei brasi-
blica; leira, ainda que absolvido ou condenado no estran-
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Dis- geiro.
trito Federal, de Estado, de Território, de Município,
de empresa pública, sociedade de economia mista,
autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu
serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou do-
miciliado no Brasil;
EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA (INCISO II)
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a Nestes casos, a aplicação da lei brasileira depende do
reprimir; concurso das seguintes condições (§ 2o):
b) praticados por brasileiro; a) entrar o agente no território nacional;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasilei- b) ser o fato punível também no país em que foi prati-
ras, mercantes ou de propriedade privada, quando cado;
em território estrangeiro e aí não sejam julgados. c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei
brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou
não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por
outro motivo, não estar extinta a punibilidade, se-
gundo a lei mais favorável.
EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA (INCISO II)
Cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Bra- Se reunidas as condições (§ 2o):
sil. a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi prati-
cado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei
brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou
não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou,
por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, se-
gundo a lei mais favorável.
+
a) não foi pedida ou foi negada a extradição; (§ 3o)
b) houve requisição do Ministro da Justiça. (§ 3o)

1.7. Conflito aparente de normas


É o conflito que se estabelece entre duas ou mais normas aparentemente aplicáveis ao
mesmo fato. Há conflito porque mais de uma norma pretende regular o fato, mas é aparente,
porque apenas uma delas acaba sendo aplicada à hipótese.

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1.7.1. Princípio da especialidade


Trata-se da aplicação da regra de que a norma especial afasta a aplicação da lei geral,
representado pelo brocardo lex specialis derrogat generali.
A lei especial, ou específica, caracteriza-se por se revestir de sentido diferenciado, indi-
vidualizado, que a particulariza em relação às demais normas. Dito de outro modo, a norma penal
especial reúne todos os elementos típicos da lei geral, mas reveste-se de outros elementos que
a tornam especial, que a particularizam, chamados especializantes.
Tomemos como exemplo o caso de uma mãe matar, sob influência do estado puerperal,
o próprio filho, logo após o parto. Há um único fato sobre o qual, aparentemente, pode incidir o
crime de homicídio, previsto no art. 121 do CP, ou infanticídio, previsto no art. 123 do CP. O
crime de infanticídio possui núcleo idêntico ao do crime de homicídio, ou seja, reúne todos os
elementos descritos no art. 121 do CP, consistentes em “matar alguém”. Todavia, além dos ele-
mentos da norma geral, o art. 123 do CP, que tipifica o delito de infanticídio, possui elementos
que o especializam e diferenciam do crime de homicídio: autora ser a genitora da vítima, que
deve ser seu próprio filho, nascente ou neonato; prática do delito durante ou logo após o parto,
sob influência do estado puerperal. Note-se que se estabeleceu um conflito entre as normas do
art. 121 e do art. 123 do CP, mas que é aparente, pois será solucionado pelo princípio da espe-
cialidade, prevalecendo, no caso, a norma penal que define o crime de infanticídio, já que as
elementares contidas nesse crime a tornam especial em relação à norma geral que define o
homicídio.

1.7.2. Princípio da subsidiariedade


Há relação de subsidiariedade entre normas quando descrevem graus de violação do
mesmo bem jurídico, de forma que a infração definida pela subsidiária, de menor gravidade que
a da principal, é absorvida por esta. A subsidiariedade pode ser expressa ou tácita.
A subsidiariedade expressa ou explícita ocorre quando a própria lei indica ser a norma
subsidiária de outra. Quando a norma, em seu próprio texto, subordina a sua aplicação à não
aplicação de outra, de maior gravidade punitiva. O crime de importunação sexual, previsto no
art. 215-A do CP, incluído pela Lei no 13.718/2018, incidirá “se o ato não constitui crime mais
grave”, conforme expressamente prevê o referido dispositivo legal. Logo, o delito de importu-
nação sexual somente incidirá se a conduta do agente não caracterizar crime mais grave, por
exemplo, estupro (art. 213 do CP) ou estupro de vulnerável (art. 217-A do CP).
A subsidiariedade tácita ou implícita ocorre quando a norma penal não ressalva, de

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modo expresso, a sua incidência na hipótese de outra norma de maior gravidade punitiva não
ser aplicável ao caso concreto. A norma subsidiária poderá incidir ainda que o legislador não
tenha expressamente previsto essa possibilidade. O crime de constrangimento ilegal (art. 146 do
CP) é tacitamente subsidiário em relação ao crime de estupro (art. 213 do CP). Assim, se, no
caso concreto, o crime mais grave (art. 213 do CP) não restar caracterizado, ou seja, não ficar
demonstrado que o constrangimento não teve por finalidade violar a dignidade sexual da vítima,
pode-se aventar a incidência do crime de constrangimento ilegal (art. 146 do CP).

1.7.3. Princípio da consunção


Diversamente do princípio da subsidiariedade, em que a prática de um ato delituoso deve
ser enquadrada na norma mais grave, o princípio da consunção é aplicado para dirimir conflito
aparente de normas decorrente de uma sequência de fatos delituosos, que, isoladamente,
constituem crime, mas que, ao final, devem ser subsumidos a um único tipo penal. Em outras
palavras, os atos delituosos praticados para alcançar o resultado esperado serão absorvidos
pelo crime desejado, resultando, assim, na responsabilização do agente pela prática de um
crime.
Tomemos como exemplo o agente que pretende desde o início produzir a morte da vítima.
Para tanto, utiliza-se de uma faca, golpeando a vítima em várias partes do corpo, vindo, ao final,
a aplicar o golpe fatal, causando-lhe a morte. Há um único elemento subjetivo, sendo a conduta
composta por vários atos praticados de forma progressiva até atingir o resultado mais grave.
Surge, assim, o conflito aparente de normas: o agente responderá pelos delitos de lesão corporal
(art. 129 do CP) e homicídio (art. 121 do CP) ou apenas pelo crime de homicídio? Nesse caso,
aplicando-se o princípio da consunção, o agente responderá apenas pelo crime de homicídio
(art. 121 do CP), pois as várias lesões corporais produzidas pelos golpes de faca constituíram
meio necessário para a execução do delito pretendido, sendo, por isso, absorvidas pelo crime
de homicídio.

2. Do crime

Fato típico é o fato humano que se enquadra perfeitamente no modelo legal de conduta
proibida. Assim, o fato humano de desferir disparos de arma de fogo contra uma pessoa,
matando-a, será considerado fato típico, porque se amolda perfeitamente ao modelo legal da

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conduta proibida de “matar alguém”, adequando-se aos elementos constitutivos do tipo penal
que define o crime de homicídio, descritos no art. 121 do CP.
Fato atípico, por sua vez, é o fato humano que não se enquadra ou não se adéqua a um
tipo penal.
Para a integração do fato ao tipo penal deve haver um comportamento humano, con-
sistente na conduta. A ação ou omissão humana (conduta), porém, não é suficiente, sendo
necessário um resultado. Entre a conduta e o resultado se exige uma relação de causalidade.
Por último, para integralizar um fato típico, deve operar-se a subsunção ou adequação de todos
os elementos no modelo legal previsto no tipo penal, revestindo-se, assim, na própria tipicidade.
Portanto, os elementos do fato típico são:

CONDUTA
FATO TÍPICO

RESULTADO

RELAÇÃO DE
CAUSALIDADE

TIPICIDADE

2.1. Relação de causalidade ou nexo causal (art. 13 do CP)


Via de regra, a conduta do agente produz o resultado criminoso de forma direta. Trata-se
de relação de causa (conduta) e efeito (resultado): nexo de causalidade.
Todavia, pode ocorrer de, aliada à conduta do agente, outra causa contribuir para o re-
sultado. É a chamada concausa.
Esta “concausa” pode ser absolutamente independente ou relativamente independente,
dependendo se teve ou não origem na conduta do agente.

2.1.1. Causas absolutamente independentes


São aquelas que não têm origem na conduta do agente. A expressão “absolutamente”
serve para designar que a outra causa independente por si só produziu o resultado. São causas
que não se inserem na linha do desdobramento natural da conduta do agente, ou seja, causas
inusitadas, desvinculadas da ação do agente, surgindo de fonte distinta.

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Há, na verdade, uma quebra do nexo causal.


São três as espécies de causas absolutamente independentes:
a) Preexistentes
Trata-se de causa que existia antes da conduta do agente e produz o resultado inde-
pendentemente da sua atuação. Ou seja, com ou sem a ação do agente o resultado ocorreria do
mesmo modo.
Ex.: o agente desfere um disparo de arma de fogo contra a vítima, que, no entanto, vem
a falecer pouco depois, não em consequência dos ferimentos recebidos, mas porque antes
ingerira veneno com a intenção de se suicidar.
b) Concomitantes
São as causas que não têm nenhuma relação com a conduta e produzem o resultado
independentemente desta, no entanto, por coincidência, atuam exatamente no instante em que
a ação é realizada.
Ex.: “A” desfere golpe de faca contra “B” no exato momento em que este vem a falecer
exclusivamente por força da queda da marquise de um prédio em sua cabeça.
c) Supervenientes
São causas que atuam após a conduta. Ou seja, que surgem depois da conduta desen-
volvida pelo agente.
Ex.: “A” ministra veneno na alimentação de “B”. Antes de o veneno produzir efeitos, há um
desabamento ou incêndio na casa da vítima, que morre exclusivamente por conta dos escombros
que caíram sobre sua cabeça ou queimada pelo fogo.
*Consequência. Quando a causa é absolutamente independente da conduta do sujeito,
o problema é resolvido pelo caput do art. 13: há exclusão da causalidade decorrente da conduta.
Ou seja, o agente responde somente por aquilo que deu causa. Nos exemplos, a causa da morte
não tem ligação alguma com o comportamento do agente. Em face disso, ele não responde pelo
resultado morte, mas, sim, pelos atos praticados antes de sua produção. Isso porque ocorreu
quebra do nexo causal. Assim, se o dolo era de matar, o agente responderia por tentativa de
homicídio.
Cuidado!
Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo, o agente responderá por
aquilo que deu causa: lesão corporal (leve, grave ou gravíssima).

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2.1.2. Causas relativamente independentes


Como são causas independentes, produzem por si sós o resultado, não se situando
dentro da linha de desdobramento causal da conduta. Por serem, no entanto, apenas rela-
tivamente independentes, encontram sua origem na própria conduta praticada pelo agente.
Aqui não há, de regra, uma quebra do nexo causal, mas uma soma entre as causas, que,
ao final, conduzem ao resultado lesivo.
Também são três as espécies de causas relativamente independentes:
a) Preexistentes
A causa que efetivamente gerou o resultado já existia ao tempo da conduta do agente,
que concorreu para a sua produção.
Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do nexo causal, o agente re-
sponde pelo resultado pretendido. No caso, homicídio consumado, a menos que não tenha con-
corrido para ele com dolo ou culpa.
Isso porque, segundo doutrina majoritária, a imputação do resultado ao agente exige que
ele tenha conhecimento do estado de saúde do agente (que denota dolo) ou que, pelo menos,
lhe fosse previsível (indicativo de culpa).
Assim, se, por exemplo, o agente não sabia do estado de saúde da vítima ou não lhe era
previsível, não poderia lhe ser atribuído o resultado morte; responderia, pois, pelo delito de ten-
tativa de homicídio (se agiu com a intenção de matar). Da mesma forma, se pretendia ferir a
vítima, agredindo-a com um soco e esta, em razão da hemofilia, desconhecida pelo agente, vem
a falecer em razão da eclosão de uma hemorragia, o agente somente será responsabilizado pelo
delito de lesão corporal.
b) Concomitantes
A causa que efetivamente produziu o resultado surge no exato momento da conduta do
agente.
Ex.: considera-se o ataque à vítima, por meio de faca, que, no exato momento da
agressão, sofre ataque cardíaco, vindo a falecer, apurando-se que a soma desses fatores
(causas) produziu a morte, já que a agressão e o ataque cardíaco, considerados isoladamente,
não teriam o condão do produzir o resultado morte.
Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do nexo causal, o agente re-
sponde pelo resultado pretendido. No caso, homicídio consumado, a menos que não tenha con-
corrido para ele com dolo ou culpa.

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c) Supervenientes (art. 13, § 1°, do CP)


A causa que efetivamente produziu o resultado ocorre depois da conduta praticada pelo
agente.
Ex.: o agente desfere um golpe de faca contra a vítima, com a intenção de matá-la. Ferida,
a vítima é levada ao hospital e sofre acidente no trajeto, vindo, por este motivo, a falecer. A causa
é independente, porque a morte foi provocada pelo acidente e não pela facada, mas essa inde-
pendência é relativa, já que, se não fosse o ataque, a vítima não estaria na ambulância aciden-
tada e não morreria. Tendo atuado posteriormente à conduta, denomina-se causa superveniente.
Na hipótese das causas supervenientes, embora exista nexo físico-naturalístico, a lei, por
expressa disposição do art. 13, § 1°, do CP, que excepcionou a regra geral, exclui a imputação
do resultado ao agente, devendo, no entanto, responder pelos atos anteriores efetivamente prat-
icados. Assim, o agente não responde pelo resultado ocorrido, mas somente pelos atos anteri-
ores, que, no caso, foi tentativa de homicídio.
Cuidado!
Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo, o agente responderá pelos
atos anteriores praticados, no caso, lesão corporal (leve, grave ou gravíssima).

2.2. Relevância da omissão: crimes omissivos (art. 13, § 2°, do CP)


O crime omissivo configura-se quando o agente deixa de fazer aquilo que poderia e deve-
ria fazer, que estaria obrigado em virtude de lei.
Os crimes omissivos podem ser próprios ou impróprios (ou comissivos por omissão).

2.2.1. Crimes omissivos próprios


São aqueles em que há um tipo penal específico descrevendo a conduta omissiva. O
verbo nuclear do tipo descreve uma conduta omissiva. Nesse caso, o crime consiste em o sujeito
amoldar a sua conduta ao tipo legal que descreve uma conduta omissiva. Em síntese, o agente
será responsabilizado por não cumprir o dever de agir contido implicitamente na norma incrimi-
nadora.
Exemplo: crime de omissão de socorro:

Art. 135. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à cri-
ança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em
grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:
Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de

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natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

2.2.2. Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão (art. 13,


§ 2°, do CP)
Têm a finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento, desde que, evidente-
mente, seja possível agir.
Para que alguém responda por crime comissivo por omissão é preciso que tenha o dever
jurídico de impedir o resultado, previsto no art. 13, § 2°, do CP:
a) Ter por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância
Nesse caso, por expressa imposição da lei, o agente estará obrigado a agir para evitar o
resultado. Assim, se o agente se omitir, ou seja, deixar de agir, quando lhe era possível, respond-
erá pelo resultado gerado. Ex.: mãe que deixa de alimentar o filho, que, por conta da sua negli-
gência, acaba morrendo por inanição. Essa mãe deverá responder pelo resultado gerado, qual
seja, homicídio culposo. Se, de outro lado, a mãe desejou a morte do filho ou assumiu o risco de
produzi-la, responderá por homicídio doloso.
b) De outra forma, assumir a responsabilidade de impedir o resultado
Aqui a obrigação de agir para evitar o resultado não decorre de lei, mas do fato de o
agente ter assumido a responsabilidade de impedi-lo. Ex.: babá que, por negligência, deixa de
cumprir corretamente sua obrigação de cuidar da criança, que acaba caindo na piscina e, por
isso, morre afogada. Nesse caso, responderá pelo resultado gerado, qual seja, homicídio cul-
poso. Se, de outro lado, desejou a morte da criança ou assumiu o risco de produzi-la, responderá
por homicídio doloso.
c) Com o comportamento anterior, criar o risco da ocorrência do resultado
Nesta hipótese, o sujeito, com o comportamento anterior, cria situação de perigo para
bens jurídicos alheios penalmente tutelados, de sorte que, tendo criado o risco, fica obrigado a
evitar que ele se degenere ou desenvolva para o dano ou lesão. Ex.: aluno veterano, por ocasião
de um trote acadêmico, sabendo que a vítima não sabe nadar, joga o incauto calouro na piscina.
Nesse caso, contrai o dever jurídico de agir para evitar o resultado, sob pena de responder por
homicídio.

2.3. Iter criminis e tentativa (art. 14 do CP)


2.3.1. Iter criminis
Iter criminis significa literalmente “caminho do crime”. Trata-se do caminho percorrido pelo

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agente para a prática da infração penal, passando pela ideação até chegar à consumação. Em
síntese, iter criminis é o conjunto de fases pelas quais passa o delito.
O primeiro momento do iter criminis é a cogitação. O agente idealiza, internamente, a
atividade criminosa. Toda essa representação ainda se encontra no plano interno do agente, ou
seja, ainda não há exteriorização de nenhum ato. É exatamente por isso que a fase da cogitação
não é punível.
Nos atos preparatórios, o agente passa da cogitação para a exteriorização da sua ati-
vidade criminosa, buscando, previamente ao início da execução, os elementos necessários para
o desenvolvimento da conduta delituosa. É a partir dos atos preparatórios que o agente começa
a materializar, ou seja, exteriorizar sua busca pela consumação da infração penal. A aquisição
de uma arma, por exemplo, para a prática do homicídio constitui ato preparatório. Da mesma
forma, o estudo do local do crime, buscando identificar a melhor hora e forma de ingressar no
ambiente, constitui ato preparatório do crime de furto.
Os atos preparatórios, via de regra, não são puníveis, nem na forma tentada, uma vez
que, nos termos do art. 14, II, do CP, afigura-se necessário o início da execução do delito, com
a realização da conduta nuclear descrita no tipo penal.
Todavia, em casos excepcionais, o legislador descreve atos que na sua concepção seriam
preparatórios como delitos autônomos, por exemplo, os crimes de associação criminosa (art. 288
do CP) e petrechos para falsificação de moedas (art. 291 do CP).
Nos atos executórios, o agente passa a desenvolver conduta voltada a realizar o verbo
nuclear do tipo. A partir dos atos executórios, o fato passa a ser punível, ao menos na forma
tentada. Isso porque o próprio art. 14, II, do CP atrelou a tentativa ao início da execução do crime,
condicionando, pois, sua punibilidade ao início da prática de atos executórios.
A consumação é o momento de conclusão do delito, reunindo todos os elementos do tipo
penal.
O exaurimento não integra o iter criminis, que encerra com a consumação. O crime ex-
aurido, também chamado de esgotado, é aquele no qual, após ser alcançada a consumação,
continua produzindo efeitos decorrentes da conduta lesiva do agente.
A consumação do crime de corrupção passiva (art. 317 do CP) ocorre com a solicitação
da vantagem indevida. O efetivo proveito ulterior com o recebimento dessa vantagem não integra
o iter criminis, constituindo-se no exaurimento do crime.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

2.3.2. Tentativa (art. 14, II, do CP)


Nos termos do art. 14, II, do CP, para caracterizar ao menos crime tentado, deve o agente
passar pelos atos preparatórios e dar início à execução do delito, que, por razões alheias à
sua vontade, não alcance a consumação.

2.3.2.1. Algumas infrações que não admitem a tentativa


a) Crimes culposos
No crime culposo, o agente não deseja nem assume o risco na produção do resultado. O
resultado, pois, é involuntário. Na tentativa, o agente deseja ou assume o risco na produção do
resultado, que, no entanto, não ocorre por circunstâncias alheias à sua vontade. Logo, verifica-
se a absoluta incompatibilidade entre o crime culposo e a tentativa.
Há, no entanto, uma classe de crimes culposos que admitem a tentativa: culpa imprópria.
b) Crimes preterdolosos
Nos crimes preterdolosos, a conduta é desenvolvida de forma dolosa, mas o resultado
agravador é culposo. Assim, como no crime preterdoloso o resultado agravador não é desejado
pelo agente, não há falar em tentativa, que pressupõe a não consumação do delito por circun-
stâncias alheias à sua vontade.
c) Contravenções penais
Nos termos do art. 4° do Decreto-lei no 3.688/1941, “não é punível a tentativa de contra-
venção”.
d) Crimes omissivos próprios
Os crimes omissivos próprios não admitem tentativa, porque não se afigura possível fra-
cionar a conduta omissiva do agente. Isso porque ou o agente observa o seu dever de agir im-
plícito no tipo penal, e o crime se consuma; ou pratica a conduta, e não há crime.
Os crimes omissivos impróprios admitem tentativa.
e) Crimes unissubsistentes
Os crimes unissubsistentes ou de ato único não admitem tentativa, diante da impossi-
bilidade de fracionamento dos atos de execução. Ou seja, não é possível dar início à execução
do delito e não atingir a consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente.

2.4. Desistência voluntária e arrependimento eficaz (art. 15 do CP)


Na desistência voluntária e no arrependimento eficaz, o agente dá início à execução do

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delito, mas não consuma por vontade própria, ou porque desistiu de prosseguir nos atos executó-
rios, ou porque se arrependeu eficazmente.

2.4.1. Desistência voluntária


A desistência voluntária caracteriza-se por um comportamento negativo do agente, que,
após dar início à execução do delito, adota uma postura de abstenção, ou seja, cessa o seu
comportamento delitivo, não leva adiante a atividade executória; mesmo podendo prosse-
guir, desiste da realização típica.
Tomemos como exemplo a conduta do agente que, com a intenção homicida, desfere um
disparo de arma de fogo contra a vítima, acertando-a em região não letal. Podendo prosseguir,
já que tinha mais cinco balas no revólver, o agente resolve, por vontade própria, não efetuar mais
disparos, deixando a vítima sobreviver.

2.4.2. Arrependimento eficaz


No arrependimento eficaz, o agente, após ter esgotado todos os meios à sua disposição
para a consumação do delito, arrepende-se e, adotando uma postura ativa, impede que o re-
sultado se produza.
Exemplo: agente que, com a intenção homicida, após efetuar disparos de arma de fogo
contra a vítima, utilizando todas as balas do revólver, arrepende-se e, adotando postura ativa,
leva a vítima até o hospital, que, submetida a intervenção cirúrgica exitosa, acaba sobrevivendo.

2.4.3. Consequência
Nos termos da parte final do art. 15 do CP, verificada hipótese de desistência voluntária
ou arrependimento eficaz, o agente jamais responderá pelo crime na modalidade tentada, já que,
como visto, trata-se de causa excludente da tipicidade da tentativa, mas pelos atos até então
praticados, se típicos.
Assim, o agente que ingressa numa residência e, por ato voluntário, desiste de consumar
a subtração, não responderá por tentativa de furto, mas pelos atos até então praticados, quais
sejam, violação de domicílio (art. 150 do CP).

2.5. Arrependimento posterior (art. 16 do CP)


Trata-se de causa obrigatória de diminuição da pena que incide quando o agente,

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responsável pelo crime praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa, repara o dano provo-
cado ou restitui a coisa, desde que de forma voluntária, até o recebimento da denúncia ou da
queixa.
Assim, se o agente subtraiu uma TV do seu local de trabalho e, ao chegar em casa com
a coisa subtraída, é convencido pela esposa a devolvê-la, o que efetivamente vem a fazer no dia
seguinte, mesmo quando o fato já havia sido registrado na delegacia, haverá arrependimento
posterior, com reflexo na dosimetria da pena.

2.6. Crime impossível (art. 17 do CP)


O crime impossível por ineficácia absoluta do meio guarda relação com o meio de
execução ou instrumento utilizado pelo agente, que, por sua natureza, será incapaz de produzir
qualquer resultado, ou seja, jamais alcançará a consumação do delito. É o caso do agente que,
pretendendo matar a vítima, usa como meio executório arma completamente defeituosa, que
jamais efetuaria qualquer disparo.
O crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto guarda relação com o ob-
jeto material, compreendendo a pessoa ou coisa sobre o qual recai a conduta do agente.
Tomemos como exemplo a conduta do agente que, pretendendo matar a vítima, desfere vários
disparos de arma de fogo contra o seu corpo, verificando-se, após, que, ao receber os disparos,
já se encontrava morta, em decorrência de ter sofrido, momentos antes, fulminante ataque
cardíaco. Evidente, neste caso, a impropriedade absoluta do objeto, diante da impossibilidade
de ceifar a vida de pessoa que já estava morta.

2.7. Crime doloso e culposo (art. 18 do CP)


2.7.1. Crime doloso
Com o sistema finalista, o dolo passou a integrar a conduta, elemento do fato típico. Trata-
se de um elemento psicológico introduzido no tipo penal, característico do crime doloso.
Dolo direto, também chamado dolo determinado, intencional, imediato ou incondicionado,
é aquele que se caracteriza pela vontade do agente estar dirigida especificamente à produção
do resultado típico, abrangendo os meios utilizados para tanto. No dolo direto, o agente quer o
resultado por ele anteriormente representado. Adota-se a teoria da vontade.
No dolo de primeiro grau, o agente desenvolve conduta com vontade e consciência de
atingir determinado resultado. O dolo do agente é voltado a atingir um único bem jurídico,

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produzindo, pois, único resultado. Em síntese, no dolo direto de primeiro grau, o resultado obtido
era o objetivo principal da conduta. Ex.: agente que sai ao encalço e mata a vítima pretendida.
No dolo de segundo grau ou de consequências necessárias, o agente desenvolve con-
duta com vontade e consciência dirigida a produzir determinado resultado. Todavia, os meios
empregados para alcançar o resultado desejado inexoravelmente produziram consequências
necessárias, de efeitos colaterais de verificação certa. Imaginemos que o agente toma conheci-
mento que seu desafeto realizará uma viagem de carro com mais três amigos. Com a intenção
de matar a vítima determinada, instala uma bomba no veículo, que, dada a potência da explosão,
provoca a morte de todos os ocupantes do veículo. No caso, ainda que o agente pretendesse
matar somente o seu desafeto, agiu consciente de que sua conduta provocaria necessariamente
a morte dos demais passageiros do veículo. Tem-se, em relação aos demais passageiros, o dolo
direto de segundo grau ou dolo de consequências necessárias.
Ocorre o dolo eventual quando o sujeito assume o risco de produzir o resultado, isto é,
admite e aceita o risco de produzi-lo. Em relação ao dolo eventual, adota-se a teoria do con-
sentimento ou assentimento, inserta na expressão “assumiu o risco de produzi-lo”, encartada
no art. 18, I, do CP. Tomemos como exemplo a conduta do agente que pretende atirar contra o
seu desafeto, que se encontra conversando com outra pessoa. O agente prevê que também
pode atingir a outra pessoa, mas segue em diante na sua conduta, assumindo o risco de errar o
disparo contra o seu desafeto e atingir a outra pessoa, sendo-lhe indiferente quanto ao resultado
que possa a vir a ser produzido em relação ao terceiro. Se efetuar disparos matando o seu de-
safeto e também a outra pessoa, o agente responderá por dois crimes de homicídio: o primeiro,
a título de dolo direto; o segundo, a título de dolo eventual.

2.7.2. Teoria do crime culposo


É a conduta humana voluntária desenvolvida sem observar o dever de cuidado objetivo,
que, por imprudência, negligência ou imperícia, produz um resultado involuntário, objetivamente
previsível, que poderia ter sido evitado.
A inobservância do dever objetivo de cuidado, que é a quebra do dever de cuidado im-
posto a todos, é manifestada por meio de três modalidades de culpa, todas previstas no art. 18,
II, do CP: imprudência, negligência e imperícia.
Imprudência: A conduta imprudente caracteriza-se por um agir positivo, sem a observân-
cia do dever de cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato perigoso, de forma intem-
pestiva e precipitada. Tomemos como exemplo condutor de veículo automotor que, imprimindo

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excessiva velocidade, atropela e mata um pedestre.


Negligência: Trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a inobservância do dever
de cuidado do agente é retratada pela ausência de cautela e precaução. É a culpa na forma de
deixar de adotar as cautelas. Tomemos como exemplo o condutor de veículo que, antes de sair
de viagem, deixa de reparar os pneus e verificar os freios.
Imperícia: A imperícia caracteriza-se pela falta de capacidade, preparo ou de conheci-
mentos técnicos suficientes de agente autorizado a desempenhar determinada arte, profissão ou
ofício. Assim, se um médico cirurgião, que não domina determinada técnica inerente à certa
intervenção cirúrgica, causar a morte do paciente, responderá por homicídio culposo (art. 121,
§ 3°, do CP), já que agiu com imperícia no exercício da sua profissão.
Na culpa consciente há a previsão do resultado, mas o agente realiza a conduta con-
siderando, sinceramente, que nenhum resultado se produzirá ou, ainda, que reúne habilidade
suficiente para evitá-lo. É a chamada culpa com previsão. Ex.: Leonardo conduz seu veículo por
uma avenida. No banco do carona está sua namorada, Célia. Durante o percurso, Leonardo
imprime velocidade excessiva no veículo, gerando protestos por parte de Célia, que lhe pedia
para reduzir a velocidade. Leonardo responde dizendo que nada aconteceria, até porque era um
excelente motorista. Todavia, ao fazer uma curva, Leonardo perde o controle do veículo e atro-
pela uma pessoa, causando-lhe a morte. Diante disso, Leonardo responderá pelo crime de hom-
icídio culposo na condução de veículo automotor (art. 302 da Lei no 9.503/1997). Note-se que,
no caso, havia por parte do motorista a previsibilidade do resultado, que não era aceito nem
esperado e, ainda, a leviana percepção de que sua habilidade como condutor impediria a
produção de qualquer evento lesivo.

Culpa Consciente
• Previsão do resultado;
• Acredita que o resultado não irá ocorrer;
• Considera ter habilidade para evitar o resultado.
Dolo Eventual
• Previsão do resultado;
• Assume o risco de produzir o resultado;
• Aceita o resultado.

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Direito Penal

2.8. Erro de tipo essencial e erro de proibição


2.8.1. Erro de tipo essencial
O erro de tipo essencial é aquele que repercute na própria tipificação da conduta do
agente, pois, se não tivesse a falsa percepção da realidade, o agente não teria praticado o fato
típico, ou, pelo menos, não nas circunstâncias que envolveram o contexto fático.
O erro de tipo essencial pode ser:
a) Invencível, inevitável, escusável
É aquele erro em que qualquer pessoa, nas mesmas circunstâncias, incorreria. É o erro
inevitável, desculpável ou escusável, que não poderia ser evitado, mesmo por uma pessoa cau-
telosa e prudente.
Tomemos como exemplo a conduta de uma estudante que deixa seu celular carregando
na tomada da sala de aula e sai para comprar café na cantina do local. Quando retorna, retira
um celular da tomada que, na verdade, não era o seu aparelho, mas de sua colega, que havia
colocado um celular idêntico para carregar em substituição ao da estudante. Nesse caso, há
evidente erro de tipo, pois a estudante, por conta da falsa percepção da realidade (supôs ser seu
o celular, já que idêntico), errou em relação ao elemento “alheio” do tipo que define o crime de
furto. E, trata-se de erro de tipo invencível, porque qualquer pessoa, nas circunstâncias, consid-
eraria que era o seu telefone celular que estava carregando na tomada em que havia deixado.
O erro de tipo invencível, inevitável ou escusável exclui o dolo e a culpa. Sendo a conduta
elemento do fato típico, a ausência de dolo ou culpa leva à atipicidade da conduta.
b) Vencível, evitável ou inescusável
É aquele erro em que uma pessoa mais cautelosa e prudente, nas mesmas circunstân-
cias, não incorreria. É o erro evitável, indesculpável ou inescusável, que uma pessoa cautelosa
e prudente teria evitado. Assim, se o fato for punido sob a forma culposa, o agente responderá
por crime culposo. Quando o tipo, entretanto, não admitir essa modalidade, a consequência será
inexoravelmente a exclusão do crime, já que configurará fato atípico.
No exemplo do caçador que praticava a caça em mata próxima à zona urbana, onde havia
circulação de pessoas, o agente responderá pelo crime de homicídio culposo, já que se trata de
erro de tipo vencível.

2.8.2. Do erro de proibição (art. 21 do CP)


O erro de proibição é o erro que incide sobre a ilicitude do fato. Encontra-se

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
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disciplinado no art. 21 do CP.


No erro de proibição, o agente tem consciência da conduta praticada, mas lhe falta poten-
cial consciência da ilicitude do fato.
O erro de proibição escusável, inevitável ou invencível ocorre quando o erro sobre a
ilicitude do fato é impossível de ser evitado, valendo-se o ser humano da sua diligência ordinária.
Ex.: um telejornal de alcance nacional informa, de forma equivocada, a aprovação da lei que
autoriza a eutanásia de doentes em estágio terminal. Não havendo nenhuma razão para duvidar
da veracidade da notícia, o agente dirige-se até o hospital e desliga os aparelhos que mantinham
vivo um ente querido, que se encontrava sofrendo com a doença que o acometia e em estágio
terminal, causando-lhe a morte. Praticou fato típico e ilícito, mas lhe faltou potencial consciência
da ilicitude, incidindo o erro de proibição inevitável, cuja consequência será a exclusão da culpa-
bilidade.
O erro de proibição inescusável ou evitável ocorre quando o erro sobre a ilicitude do
fato que não se justifica, pois, se tivesse havido um mínimo de empenho em se informar, o agente
poderia ter tido conhecimento da realidade. O critério de aferição do erro de proibição ines-
cusável, vencível ou evitável encontra-se no parágrafo único do art. 21 do CP, segundo o qual
“considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato,
quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência”. Tratando-se de erro
de proibição evitável, permanece hígida a culpabilidade do agente, sendo, no entanto, causa
de diminuição da pena de um sexto a um terço.

2.9. Erro de tipo acidental


2.9.1. Erro quanto à pessoa (art. 20, § 3°, do CP)
O erro sobre pessoa, previsto no art. 20, § 3°, do CP, incide quando o agente desenvolve
conduta voltada a atingir a pessoa pretendida, mas, confundindo-se em relação à sua identidade,
atinge pessoa diversa.
Consideremos, por exemplo, a hipótese do filho desalmado que, pretendendo matar seu
pai, realiza disparos de arma de fogo contra o homem que estava na varanda da residência do
genitor, causando a morte deste. O filho, então, deixa o local satisfeito, por acreditar ter concluído
seu intento delitivo, mas vem a descobrir que matara um amigo de seu pai, que contava com 65
anos de idade, que, de costas, era com ele parecido.
Nesse caso, nos termos do art. 20, § 3°, do CP, consideram-se as condições e qualidades
da vítima pretendida. Logo, o filho desalmado responderá pelo crime de homicídio, com a

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

incidência da agravante de ter praticado crime contra ascendente, prevista no art. 61, II, e, 1a
parte, do CP.

2.9.2. Erro na execução ou aberratio ictus (art. 73 do CP)


A aberratio ictus pode ocorrer quando, por acidente, o agente, em vez de atingir a pessoa
pretendida, atinge pessoa diversa. Suponhamos, nesse caso, que o agente pretende matar Wil-
son, deixando na sua mesa de trabalho uma xícara de café contendo veneno. Todavia, quem
toma o café é Pedro, que acaba falecendo.
Pode ocorrer também quando, por erro nos meios de execução, o agente, em vez de
atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Ex.: agente pretendendo matar Wilson, visu-
aliza a vítima, tendo-a como certa, faz a mira e efetua o disparo, mas, no entanto, erra o alvo
pretendido, atingindo pessoa diversa, que se encontrava próxima ao local.
A consequência jurídica da conduta do agente encontra-se retratada no art. 73, 1ª parte,
do CP, que faz expressa remissão ao art. 20, § 3°, do CP. Ou seja, na hipótese de erro na ex-
ecução, deve-se observar o disposto no art. 20, § 3°, segundo o qual, embora tenha atingido
pessoa diversa, o agente deve receber tratamento penal considerando-se as condições ou qual-
idades da pessoa pretendida (vítima virtual), desprezando-se as condições pessoais da vítima
efetivamente atingida.
Na aberratio ictus com resultado duplo, o agente, além de atingir a vítima pretendida,
atinge também pessoa diversa. Nesse caso, com uma única ação, o agente produz mais de um
resultado: atinge a pessoa pretendida e também pessoa diversa. Por essa razão, o art. 73, 2ª
parte, do CP faz expressa remissão ao art. 70 do CP, devendo ser aplicada a regra do concurso
formal de crimes.

2.9.3. Resultado diverso do pretendido ou aberratio criminis (art. 74 do


CP)
Na aberratio criminis, o agente pretende ofender determinado bem jurídico, mas, por aci-
dente ou erro na execução, acaba produzindo resultado diverso do pretendido. Na verdade, o
agente pretendia praticar um crime, mas acaba praticando crime diverso do pretendido.
Na aberratio criminis com unidade simples, o agente somente atinge o bem jurídico di-
verso do pretendido. Ou seja, o agente quer atingir uma coisa e atinge uma pessoa.
Nesse caso, o agente responde pelo resultado produzido a título de culpa, se o fato é

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

previsto como crime culposo.


Assim, se o agente, pretendendo atingir o veículo do desafeto, com o intuito de praticar o
crime dano, por erro na execução, não atingir o objeto, mas somente uma pessoa que se encon-
trava próxima ao local, responderá por lesão corporal culposa (art. 129, § 6°, do CP), se resultar
lesão corporal; ou por homicídio culposo (art. 121, § 3º, do CP), se resultar morte.
Na aberratio criminis com resultado duplo, o agente, além de praticar o crime pretendido,
também acaba produzindo um resultado diverso do pretendido. Ou seja, com uma ação ou omis-
são, acaba provocando dois resultados. Nesse caso, como expressamente prevê a parte final do
art. 74 do CP, aplica-se a regra do concurso formal de crimes (art. 70 do CP), considerando-se
a pena do crime mais grave aumentada de um sexto até metade, de acordo com o número de
resultados diversos produzidos.

2.10. Descriminante putativa


2.10.1. Conceito
É a causa excludente da ilicitude erroneamente imaginada pelo agente. Ela não existe na
realidade, mas o sujeito pensa que sim, porque está errado. Só existe, portanto, na mente, na
imaginação do agente. Por essa razão, é também conhecida como descriminante imaginária ou
erroneamente suposta.
Logo, é possível que o sujeito, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias do
caso concreto, suponha encontrar-se em estado de necessidade, legítima defesa, estrito cum-
primento do dever legal ou em exercício regular do direito. Quando isso ocorre, aplica-se o dis-
posto no art. 20, § 1º, 1ª parte.

2.10.2. Espécies
a) Descriminante putativa por erro de tipo
É um erro de tipo essencial incidente sobre elementares de um tipo permissivo. Os tipos
permissivos são aqueles que permitem a realização de condutas inicialmente proibidas. Com-
preendem os que descrevem as causas de exclusão da ilicitude.
Ocorrerá um erro de tipo permissivo quando o agente, erroneamente, imaginar uma situ-
ação de fato totalmente diversa da realidade, em que estão presentes os requisitos de uma causa
de justificação.
Assim, por exemplo, se o agente praticar uma conduta supondo estar diante de uma

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

agressão injusta, mas que, na verdade, não existe. Trata-se de legítima defesa putativa.
O agente pratica uma conduta supondo estar numa situação de perigo, que, na verdade,
não existe. Trata-se de estado de necessidade putativo.
Os efeitos são os mesmos do erro de tipo, já que a descriminante putativa por erro de tipo
não é outra coisa senão erro de tipo essencial incidente sobre tipo permissivo.
Assim, se o erro for vencível, o agente responde por crime culposo, já que o dolo será
excluído, da mesma forma como sucede com o erro de tipo propriamente dito; se o erro for
inevitável, excluir-se-ão o dolo e a culpa e não haverá crime.
Cuidando-se de erro invencível, há exclusão do dolo e culpa.
Tratando-se de erro vencível, responde o sujeito por crime culposo, se prevista a modali-
dade culposa. Provando-se que o sujeito não foi diligente ao se verificar as circunstâncias do
fato, responde por crime de homicídio culposo (art. 20, § 1°, do CP).
b) Descriminante putativa por erro de proibição
O agente tem perfeita noção de tudo o que está ocorrendo. Não há qualquer engano
acerca da realidade. Não há erro sobre a situação de fato. Ele supõe que está diante da causa
que exclui o crime, porque avalia equivocadamente a norma: pensa que esta permite, quando,
na verdade, ela proíbe; imagina que age certo, quando está errado; supõe que o injusto é justo.
O sujeito imagina estar em legítima defesa, estado de necessidade etc., porque supõe
estar autorizado e legitimado pela norma a agir em determinada situação.
Ex.: uma pessoa de idade avançada recebe um violento tapa em seu rosto, desferido por
um jovem atrevido. O idoso tem perfeita noção do que está acontecendo, sabe que seu agressor
está desarmado e que o ataque cessou. Não existe, portanto, qualquer equívoco sobre a reali-
dade concreta. Nessa situação, no entanto, imagina-se equivocadamente autorizado pelo or-
denamento jurídico a matar aquele que o humilhou, atuando, assim, em legítima defesa de sua
honra.
Ocorre aqui uma descriminante (a legítima defesa é causa de exclusão da ilicitude) puta-
tiva (imaginária, já que não existe no mundo real) por erro de proibição (pensou que a conduta
proibida fosse permitida). No exemplo dado, a descriminante, no caso a legítima defesa, foi pu-
tativa, pois só existe na mente do homicida, que imaginou que a lei lhe tivesse permitido matar.
Essa equivocada suposição foi provocada por erro de proibição, isto é, por erro sobre a ilicitude
da conduta praticada.
As consequências dessa descriminante putativa encontram-se no art. 21 do CP e são as
mesmas do erro de proibição direto ou propriamente dito.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

O dolo não pode ser excluído, porque o engano incide sobre a culpabilidade e não sobre
a conduta (por isso, erro de proibição). Se o erro for inevitável, o agente terá cometido um crime
doloso, mas não responderá por ele; se evitável, responderá pelo crime doloso, com pena
diminuída de um sexto a um terço.

2.10.3. Consequências
No contexto das descriminantes putativas, aplica-se a teoria limitada da culpabilidade.
Pela teoria limitada da culpabilidade, quando a descriminante putativa incidir sobre pres-
supostos de uma situação de fato (ex.: o agente imaginar que está diante de uma injusta
agressão, mas que era imaginária. Supor que o desafeto sacaria uma arma, quando, na verdade,
era um celular), o efeito em relação à conduta do agente é o mesmo do erro de tipo (art. 20 do
CP): se o erro foi invencível, exclui o dolo e a culpa; se vencível, exclui o dolo, mas o agente
responde pelo delito culposo, se previsto em lei.
Agora, se a descriminante putativa recair sobre pressupostos dos limites legais das ex-
cludentes, ou seja, apesar de conhecer a situação de fato, ignora a ilicitude do comportamento
(supõe ser comportamento lícito), o efeito será o mesmo do erro de proibição: se inevitável, o
agente será isento de pena; se evitável, o agente responde pelo delito, mas terá a pena reduzida
(art. 21 do CP). Ex.: um senhor de idade recebe um soco de um jovem rapaz e acredita estar
autorizado a revidar, lesionando-o gravemente por conta do desaforo. O senhor sabe exatamente
o que está fazendo, mas ignora que sua conduta será ilícita (que, no caso, não se trata de
hipótese de legítima defesa). É o caso das descriminantes putativas por erro de proibição.

2.11. Coação moral irresistível e obediência hierárquica (art. 22 do CP)


2.11.1. Coação moral irresistível
Na coação moral, o agente coator, para alcançar o resultado desejado, emprega grave
ameaça contra o coagido, que, por medo de suportar um mal grave contra si ou contra outrem,
acaba realizando a conduta criminosa exigida. A coação empregada pelo agente vicia a vontade
do coagido, retirando-lhe a exigência de se comportar de modo diferente. Nesse caso, em
relação ao coagido, incide a causa de exclusão da culpabilidade decorrente da inexigibilidade de
conduta diversa.
Ex.: se o sujeito é coagido a assinar um documento falso, responde pelo crime de fal-
sidade o autor da coação. O coato não responde pelo crime, uma vez que sobre o fato incide a

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

causa de exclusão da culpabilidade. Assim, quando o sujeito comete o fato típico e antijurídico
sob coação moral irresistível, não há culpabilidade em face da inexigibilidade de outra conduta
(não é reprovável o comportamento). A culpabilidade desloca-se da figura do coato para a do
coator.
Convém sinalar que, se o sujeito pratica o fato sob coação física irresistível, não praticará
crime por ausência de conduta. Trata-se de causa excludente da tipicidade.

2.11.2. Obediência hierárquica


Obediência hierárquica decorre da conduta do subordinado que, por força de ordem não
manifestamente ilegal emanada por superior hierárquico, pratica fato típico e ilícito.
A ordem não manifestamente ilegal é aquela que revela aparente legalidade, mas que, na
realidade, é contrária ao direito. O subordinado, por força da ordem emanada do superior hierár-
quico, realiza a conduta que lhe foi ordenada, considerando-a lícita, quando, na realidade, con-
stitui fato típico e ilícito.
Tomemos como exemplo a hipótese de um Delegado de Polícia que determina a um in-
spetor de polícia recém-empossado na instituição que conduza um desafeto até a Delegacia,
sem nenhuma razão plausível para isso. Desconhecendo os motivos do superior hierárquico, o
subordinado cumpre estritamente a ordem. Nesse caso, o subordinado não será responsabi-
lizado criminalmente, já que incide em seu favor a causa excludente de culpabilidade. O crime
de abuso de autoridade deve ser atribuído exclusivamente ao autor da ordem.
Se a ordem for manifestamente ilegal, tanto o superior hierárquico quanto o subordinado
responderão pelo delito praticado. Nesse caso, para o superior hierárquico incide a agravante
genérica descrita no art. 62, III, 1a parte, do CP. E em relação ao subordinado, aplica-se a atenu-
ante prevista no art. 65, III, c, do CP.

2.12. Excludentes de ilicitude (art. 23 do CP)


As causas legais de exclusão de ilicitude estão previstas no art. 23 do CP: estado de
necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito.

2.12.1. Estado de necessidade (art. 24 do CP)


Nos termos do art. 24 do CP, estado de necessidade é a causa de exclusão da ilicitude
da conduta de quem, não tendo o dever legal de enfrentar o perigo atual, o qual não provocou

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

por sua vontade, sacrifica um bem jurídico ameaçado por esse perigo para salvar outro, próprio
ou alheio, cuja perda não era razoável exigir.
Tem como fundamento um estado de perigo para certo interesse jurídico, que somente
pode ser resguardado mediante a lesão de outro.
Ex.: um pedestre joga-se na frente de um motorista, que, para preservar a vida humana,
opta por desviar e colidir com outro que se encontrava estacionado nas proximidades. Entre
sacrificar uma vida e um bem material, o agente fez a opção claramente mais razoável. Não
pratica crime de dano, pois o fato, apesar de típico, não é ilícito.

2.12.2. Legítima defesa (art. 25 do CP)


A legítima defesa, nos termos em que é proposta pelo nosso Código Penal, exige a
presença simultânea dos seguintes requisitos: a) agressão injusta; b) atual ou iminente; c) contra
direito próprio ou alheio; d) reação com os meios necessários; e) moderação no uso dos meios
necessários; f) elemento subjetivo: consciência de que está reagindo a injusta agressão.
A agressão injusta deve decorrer de ação ou omissão humana. Não há legítima defesa
contra ataque instintivo e espontâneo de um animal, porque ausente consciência e vontade iner-
ente à agressão. Nesse caso, como vimos, o agente estará diante de uma situação de perigo,
ensejando a incidência do estado de necessidade.
Convém registrar, no entanto, que, se o agente atiça um animal, cão feroz, por exemplo,
a atacar a vítima, estaremos diante de uma agressão injusta, não em decorrência do comporta-
mento do animal, mas pela conduta do agente instigador, que usou o cão como verdadeira arma
ou instrumento de ataque. Nesse caso, tratando-se de agressão injusta humana (agente que
atiçou o animal a atacar), a vítima poderá praticar um fato típico, que não será ilícito, porque
estará amparada pela legítima defesa.
A Lei no 13.964/2019 introduziu o parágrafo único ao art. 25 do CP, segundo o qual “Ob-
servados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa
o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém
durante a prática de crimes”. É o caso, por exemplo, de o agente de segurança efetuar disparos
contra o sujeito que, durante a prática de roubo a banco, mantém vítima refém.

2.12.3. Estrito cumprimento do dever legal


Estará ao abrigo do estrito cumprimento do dever legal o agente que praticar um fato típico
em face do cumprimento de um dever observando rigorosamente os limites impostos pela lei, de

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

natureza penal ou não. Ex.: policial que prende o agente em flagrante ou mediante cumprimento
de mandado de prisão, embora atinja o seu direito de liberdade, não comete crime algum, porque
amparado pelo estrito cumprimento do dever legal.

2.12.4. Exercício regular de direito


A Constituição Federal dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer al-
guma coisa senão em virtude de lei (art. 5°, II). Logo, se a lei autoriza o agente a praticar deter-
minada conduta, não poderá, à evidência, considerá-la ilícita.
Qualquer pessoa pode exercitar um direito subjetivo ou uma faculdade prevista em lei
(penal ou extrapenal). Exemplo clássico é do particular que realiza a prisão em flagrante, con-
forme prevê o art. 301 do CPP. A prática de determinadas atividades esportivas produz, invari-
avelmente, lesões corporais, tais como o futebol, o boxe e a luta livre.

2.12.5. Consentimento do ofendido


O consentimento do ofendido, como causa excludente de ilicitude, incide nos crimes em
que é o único titular do bem ou interesse penalmente tutelado, e que pode dele livremente dispor,
ou seja, somente em relação a bens disponíveis.
As infrações penais que geralmente admitem a possibilidade do consentimento do ofen-
dido, por tutelarem, em regra, bens disponíveis, envolvem: a) crimes contra o patrimônio, prat-
icados sem violência ou grave ameaça; b) crimes contra a integridade física; c) crimes contra a
honra; d) crimes contra a liberdade individual.
Assim, se o bem jurídico violado, ainda que seja de ação penal pública incondicionada,
atingir interesse prevalentemente individual, poderá ser enquadrado no bloco dos bens jurídicos
disponíveis. Imaginemos que o agente está praticando a subtração de um celular, momento em
que é avistado pela vítima, que consente com o desapossamento, por considerar que as funções
do aparelho já estão superadas. O fato é típico, pois se enquadra na descrição do modelo de
conduta proibida prevista no art. 155 do CP; não será, contudo, ilícito, por força do consentimento
da vítima, já que se trata de bem disponível.

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Direito Penal

3. Da Imputabilidade Penal

Segundo a teoria limitada da culpabilidade adotada pelo Código Penal, os elementos da


culpabilidade são: a) imputabilidade; b) potencial consciência da ilicitude; c) exigibilidade de con-
duta diversa.
De outro lado, as causas excludentes de culpabilidade consistem na inimputabilidade,
falta de potencial consciência de ilicitude e inexigibilidade de conduta diversa.
Nos termos do art. 28, I e II, do CP, não se exclui a imputabilidade se o agente praticou o
fato típico e ilícito movido pela emoção ou paixão, bem como decorrente de embriaguez volun-
tária ou culposa.

3.1. Inimputabilidade por doença mental, desenvolvimento mental in-


completo ou desenvolvimento mental retardado (art. 26, caput, do CP)
A inimputabilidade pela enfermidade mental é aferida pelo critério biopsicológico. Além da
doença mental, é necessário que, em consequência desse estado biológico, o agente seja, no
momento da conduta, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-
se de acordo com esse entendimento.
Logo, se, embora portador de doença mental, o agente, ao tempo da conduta, apresentar
lucidez, isto é, capacidade de compreensão do caráter ilícito do fato e de determinação de acordo
com esse entendimento, será considerado imputável.
Nesse contexto, uma vez verificado que o agente praticou um fato típico e ilícito, sendo,
ao final, considerado inimputável por conta da sua enfermidade mental, o juiz deverá proferir
sentença absolutória imprópria, aplicando medida de segurança, consistente em internação
em hospital de custódia ou tratamento ambulatorial, nos termos do art. 386, par. ún., III, do CPP.
A semi-imputabilidade ou imputabilidade diminuída ou restrita encontra previsão no art.
26, par. ún., do CP. Trata-se, na verdade, de uma causa de diminuição da pena.
O art. 26, par. ún., do CP traz a expressão “perturbação mental”, que também se carac-
teriza como doença mental, mas de menor intensidade, já que não retira completamente a ca-
pacidade de compreensão do caráter ilícito do fato e de determinação de acordo com esse en-
tendimento.

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Direito Penal

3.2. Da inimputabilidade por embriaguez completa proveniente de caso


fortuito ou força maior (art. 28, § 1°, do CP)
Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou força maior, for completa,
ou seja, apta a deixar o agente, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de en-
tender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, há ex-
clusão da imputabilidade, nos termos do que dispõe o art. 28, § 1°, do CP.
Logo, não basta a embriaguez acidental, sendo, ainda, necessário que, em decorrência
da substância alcóolica ou de efeitos análogos, o agente tenha ficado, ao tempo da conduta,
inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito da sua conduta ou de determinar-se de acordo
com esse entendimento.
Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou força maior, é incompleta,
não há exclusão da imputabilidade. O sujeito responde pelo crime com a pena atenuada, desde
que haja redução de sua capacidade intelectiva ou volitiva. A sentença é condenatória. Aplica-
se o disposto no art. 28, § 2º, do CP.

4. Concurso de Pessoas (arts. 29, 30 e 31 do CP)

4.1. Conceito
Trata-se de contribuição entre dois ou mais agentes para o cometimento de uma infração
penal. Ocorre quando duas ou mais pessoas, em conjugação de esforços e comunhão de von-
tades, reúnem-se para a prática de um ou mais delitos.

4.2. Requisitos
4.2.1. Pluralidade de condutas
Trata-se de requisito elementar do concurso de pessoas: a concorrência de mais de uma
pessoa na execução de uma infração penal.
Assim, para que haja concurso de pessoas, exige-se que cada um dos agentes tenha
realizado ao menos uma conduta relevante. Pode ser em coautoria, em que há duas condutas
principais; ou autoria e participação, em que há uma conduta principal e outra acessória, prati-
cadas, respectivamente, por autor e partícipe.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

4.2.2. Relevância causal das condutas


Para justificar a punição de duas ou mais pessoas em concurso, afigura-se necessário
que a conduta do agente tenha efetivamente contribuído, ainda que minimamente, para a
produção do resultado.
Em outras palavras, se a conduta não tem relevância causal, isto é, se não contribuiu em
nada para a produção do resultado, não pode ser considerada integrante do concurso de pes-
soas.

4.2.3. Do liame subjetivo e normativo (vínculo subjetivo e normativo en-


tre os participantes)
Exige-se homogeneidade de elemento subjetivo-normativo. Significa que autor e partícipe
devem agir com o mesmo elemento subjetivo (dolo + dolo) ou normativo (culpa + culpa).
Os agentes devem atuar conscientes de que participam de crime comum, ainda que não
tenha havido acordo prévio de vontades. A ausência desse elemento psicológico inviabiliza o
concurso de pessoas, ensejando condutas isoladas e autônomas.
Ex.: uma empregada doméstica, percebendo a presença de um ladrão, para vingar-se do
patrão, deliberadamente deixa a porta aberta, facilitando a prática do furto. Há participação, e,
não obstante, o ladrão desconhecia a colaboração da empregada. Por consequência, a em-
pregada também responderá pelo crime de furto.
Vínculo normativo guarda relação com os crimes culposos.

4.2.4. Identidade de infração para todos os participantes


Nos termos do art. 29 do CP, todos que concorrem para o crime respondem pelo mesmo
delito.
Ex.: alguém planeja a realização da conduta típica, ao executá-la, enquanto um desvia a
atenção da vítima, outro lhe subtrai os pertences e ainda um terceiro encarrega-se de evadir-se
do local com o produto do furto. É uma exemplar divisão de trabalho constituída de várias ativid-
ades, convergentes, contudo, a um mesmo objetivo típico: subtração de coisa alheia móvel. Re-
spondem todos por um único tipo penal, qual seja, furto.

4.3. Punibilidade do concurso de pessoas


A ressalva “na medida de sua culpabilidade” feita aos limites da culpabilidade no art. 29

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

diz respeito somente à graduação da pena para os agentes que praticaram o mesmo crime.
Portanto, todos respondem pelo mesmo crime (teoria monista ou unitária). Todavia, a un-
idade criminosa não importa necessariamente a aplicação de pena idêntica a todos os que con-
tribuíram para a prática do crime, pois cada um deverá responder na medida da sua culpabi-
lidade.

4.3.1. Participação de menor importância (art. 29, § 1º, do CP)


A participação aqui referida diz respeito exclusivamente ao partícipe. Isso porque, ainda
que tenha sido pequena, a contribuição do coautor não pode ser considerada de menor importân-
cia, uma vez que atuou diretamente na execução do crime. O partícipe que houver tido “partici-
pação de menor importância” poderá ter sua pena reduzida de um sexto a um terço, nos termos
do art. 29, § 1º.

4.3.2. Da cooperação dolosamente distinta ou desvio subjetivo entre os


participantes (art. 29, § 2º, do CP)
O agente que desejava praticar um delito, sem a condição de prever a concretização de
crime mais grave, deve responder pelo que pretendeu fazer, não se podendo a ele imputar outra
conduta indesejada, sob pena de se estar tratando de responsabilidade objetiva.
Ex.: “A” determina a “B” que espanque “C”. “B” mata “C”. Segundo o art. 29, § 2º, “A”
responde por crime de lesão corporal, cuja pena deve ser aumentada até metade se a morte da
vítima lhe era previsível.

4.4. Comunicabilidade dos elementares e circunstâncias do crime (art.


30 do CP)
O art. 30 do CP determina que as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não
se comunicam, salvo quando elementares do crime.
Via de regra, as circunstâncias e condições pessoais relacionadas a um dos agentes não
se comunica aos outros que contribuíram para a prática delituosa.
Todavia, há determinadas circunstâncias ou condições pessoais que compõem, integram
o tipo penal, figurando, no caso, como verdadeira elementar no tipo penal. Nesse caso, quando
também constituem o tipo penal, ou seja, figuram como elementares do tipo penal, as circunstân-
cias ou condições pessoais relacionadas a um dos sujeitos se comunicam aos demais coautores

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

ou partícipes.
Ex.: “A”, funcionário público, comete um crime de peculato (art. 312), com a participação
de “B”, não funcionário público. A condição pessoal (funcionário público) é elementar do crime
de peculato, comunicando-se, portanto, ao agente que não é funcionário público. Logo, os dois
respondem por crime de peculato.
De outro lado, as circunstâncias objetivas alcançam o partícipe ou coautor se, sem haver
praticado o fato que as constitui, integraram o dolo ou culpa.
Ex.: “A” instiga “B” a praticar homicídio contra “C”. “B”, para a execução do crime, emprega
asfixia. O partícipe não responde por homicídio qualificado (art. 121, § 2º, III, 4a figura), a não
ser que o meio de execução empregado pelo autor principal tenha ingressado na esfera de seu
conhecimento.

5. Aplicação da Pena

5.1. Regime inicial de cumprimento de pena (art. 33 do CP)


O regime penitenciário é o meio pelo qual é executado ou efetivado o cumprimento da
pena privativa de liberdade.
O art. 33, § 1º, do CP prevê três regimes:
a) fechado: a pena privativa de liberdade é executada em estabelecimento de segurança
máxima ou média;
b) semiaberto: a pena privativa de liberdade é executada em colônia agrícola, industrial
ou estabelecimento similar;
c) aberto: a pena privativa de liberdade é executada em casa de albergado ou em es-
tabelecimento adequado.
Após estabelecer a quantidade da pena imposta da sentença, cumpre ao juiz fixar o re-
gime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade, levando em conta: a) a quantidade
da pena imposta; b) a reincidência; c) as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP.
Nos termos do art. 33, caput, do CP, nos crimes apenados com reclusão, o juiz poderá
fixar o regime inicial fechado, semiaberto ou aberto. Aos crimes apenados com detenção, o juiz
poderá fixar o regime inicial semiaberto ou aberto.
Logo, nos crimes apenados com detenção, não é possível ao juiz fixar o regime inicial
fechado, podendo, no entanto, haver regressão para o regime fechado, no caso, por exemplo,

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

de falta grave.
O início do cumprimento da pena para os crimes apenados com reclusão dar-se-á da
seguinte forma, nos termos do art. 33, § 2º, do CP:
a) o condenado a pena superior a oito anos deverá começar a cumprir a pena privativa de
liberdade no regime fechado;
b) o primário, cuja pena seja superior a quatro anos e não exceda a oito, poderá, desde o
princípio, cumpri-la em regime semiaberto;
c) o primário, cuja pena seja igual ou inferior a quatro anos, poderá, desde o início, cumpri-
la em regime aberto.

Súm. nº 269 do STJ: É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reinci-
dentes condenados à pena igual ou inferior a 4 anos se favoráveis as circunstâncias judi-
ciais.

Nos crimes apenados com detenção, os critérios para a definição do regime inicial são os
seguintes:
a) se a pena for superior a quatro anos, o juiz fixará o regime inicial semiaberto;
b) se a pena for igual ou inferior a quatro anos, o regime inicial será o aberto;
c) se o condenado for reincidente, o regime inicial será o semiaberto, independentemente
da quantidade da pena.
Além disso, a imposição de regime inicial fechado depende de fundamentação adequada,
não se revestindo a gravidade em abstrato do delito motivação idônea para a fixação do regime
de cumprimento de pena mais severo do que a pena aplicada exigir. É o que se extrai das Súm.
nos 718 e 719 do STF, e Súm. no 440 do STJ.

5.2. Penas restritivas de direitos (art. 44 do CP)


5.2.1. Conceito
São penas alternativas às privativas de liberdade, expressamente previstas em lei, com a
finalidade de evitar o encarceramento de determinados criminosos, autores de infrações penais
consideradas mais leves, provocando-lhes a recuperação por meio de restrições a certos
direitos.
Nos termos do art. 43 do CP, as penas restritivas de direitos são: a) prestação pecuniária;
b) perda de bens e valores; c) prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; d)
interdição temporária de direitos; e) limitação de fim de semana.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

As penas restritivas de direitos são substitutivas, uma vez que o juiz, depois de fixar a
pena privativa de liberdade, verificando a presença dos requisitos, efetua a substituição por uma
ou mais penas restritivas de direitos, conforme o caso. Isso porque não há, no preceito
secundário dos tipos penais incriminadores, previsão direta de pena restritiva de direitos, mas
tão somente pena privativa de liberdade.

5.2.2. Requisitos objetivos


a) Quantidade da pena aplicada
O legislador estabeleceu como parâmetro para a concessão da pena restritiva de direitos
a pena aplicada na sentença, independentemente da pena abstratamente cominada no preceito
secundário do tipo penal.
Nos crimes dolosos, praticados sem violência ou grave ameaça, apenados com reclusão
ou detenção, o limite estabelecido pelo legislador é de 4 (quatro) anos.
Tratando-se de concurso de crimes, deve-se levar em conta o total da pena imposta, por
conta da aplicação das regras do cúmulo material ou exasperação da pena. Dessa forma, se
aplicadas as regras do concurso material, concurso formal e crime continuado, e o total da pena
privativa de liberdade efetivamente imposta não exceder a 4 (quatro) anos, será possível a sub-
stituição por pena alternativa.
No caso de condenação por crime culposo, a substituição será possível, independente-
mente da quantidade da pena imposta, não existindo tal requisito, ainda que resulte violência
contra a pessoa, por exemplo, no homicídio culposo do Código Penal (art. 121, § 3º) e no hom-
icídio culposo na condução de veículo automotor (art. 302 do CTB).
b) Natureza do crime cometido
Em relação aos crimes dolosos, as penas restritivas de direitos são aplicáveis aos crimes
cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.

5.2.3. Requisitos subjetivos


Os requisitos subjetivos levam em conta as características pessoais do sentenciado.
a) Réu não reincidente em crime doloso
Nos termos do art. 44, II, do CP, para concessão do benefício, é necessário que o sujeito
não seja reincidente em crime doloso. O texto não trata de qualquer reincidente. Refere-se ao
não reincidente em crime “doloso”, de modo que não há impedimento à aplicação da pena alter-
nativa quando: a) os dois delitos são culposos; b) o anterior é culposo e o posterior é doloso; c)

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

o anterior é doloso e o posterior culposo.


Ainda que o réu seja reincidente em crime doloso, o Código Penal, no seu art. 44, § 3o,
prevê uma exceção. Se, em face de condenação anterior, a medida for socialmente
recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime,
será possível aplicar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
b) A culpabilidade, os antecedentes, a conduta ou a personalidade ou ainda os mo-
tivos e circunstâncias recomendarem a substituição
Conforme o art. 44, III, do CP, “a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a
personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa
substituição seja suficiente”.
Convém notar que esses requisitos praticamente reproduzem as circunstâncias judiciais
previstas no art. 59, caput, do CP, com exceção de duas: comportamento da vítima e conse-
quências do crime, coincidentemente as únicas de natureza objetiva. Logo, verifica-se que o art.
44, III, do CP somente levou em conta as circunstâncias subjetivas.

5.2.4. Penas restritivas de direitos e violência doméstica ou familiar con-


tra a mulher
Nos termos do art. 17 da Lei no 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, “É
vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de
cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique
o pagamento isolado de multa”.
Conforme a Súm. no 588 do STJ, a prática de crime ou contravenção penal contra a mul-
her com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição de pena
privativa de liberdade por restritiva de direitos.

5.3. Da pena de multa (arts. 49, 50, 51 e 60 do CP)


5.3.1. Conceito
Trata-se de uma sanção penal, de natureza patrimonial, consistente no pagamento de
determinada quantia em pecúnia, previamente fixada em lei, em favor do Fundo Penitenciário
Nacional.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

5.3.2. Critério de fixação da pena de multa


Diversamente da pena privativa de liberdade, cujo sistema é o trifásico, a aplicação da
pena de multa observa um sistema bifásico, comportando, pois, duas fases distintas e suces-
sivas.
Para o cálculo da pena de multa, o Código Penal adotou o sistema do dia-multa.
Na 1ª fase, o juiz deverá estabelecer o número de dias-multa, que varia de, no mínimo,
10 (dez) dias-multa a, no máximo, 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. É o que se extrai do
art. 49 do CP.
Para chegar ao número de dias-multa, o Magistrado considera as circunstâncias judiciais
do art. 59, caput, do CP, bem como eventuais atenuantes e agravantes, além de causas de
diminuição e aumento de pena.
Na 2ª fase, o juiz deverá fixar o valor do dia-multa, não podendo ser inferior a um trigésimo
do salário mínimo mensal de referência vigente ao tempo do fato, nem superior a cinco vezes
esse salário (art. 49, § 1º, do CP).
Para aferir o valor do dia-multa, o juiz deverá considerar a situação econômica do réu,
podendo chegar ao triplo, se considerada insuficiente e ineficaz diante da situação financeira do
réu, conforme dispõe o art. 60 do CP.

5.3.3. Execução da pena de multa


Conforme o ordenamento jurídico vigente, a inadimplência no pagamento da multa estatal
não conduz, em nenhuma hipótese, à aplicação da pena de prisão. Ninguém pode ser privado
da liberdade em razão do não pagamento de uma multa estatal.
Nos termos do art. 51 do CP, transitada em julgado a sentença condenatória, o valor da
multa deve ser inscrito como dívida ativa em favor da Fazenda Pública. A multa permanece com
sua natureza penal. A execução é que se procede em termos extrapenais. Em face disso, a
obrigação de seu pagamento não se transmite aos herdeiros do condenado.
A novidade introduzida pela Lei no 13.964/2019 diz respeito à execução da pena de multa.
Nos termos da atual redação do art. 51 do CP, a legitimidade para a execução da pena de multa
passa a ser do Ministério Público, sendo executada perante o juiz da execução penal.

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Direito Penal

5.4. Da aplicação da pena e reincidência


5.4.1. Da aplicação da pena (art. 68 do CP)
5.4.1.1. Introdução
Da leitura do art. 68 do CP verifica-se que, em relação à pena privativa de liberdade, a
legislação penal adotou o critério trifásico, segundo o qual se deve encontrar a pena-base
atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida, serão consideradas as circunstân-
cias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.
Em relação à pena de multa, convém repetir, o Código Penal adotou o sistema bifásico,
conforme se extrai do art. 49 do CP.

5.4.1.2. Primeira fase da fixação da pena: pena-base e circunstâncias


jurídicas
Não há nenhum dispositivo legal norteando o juiz na fixação da pena-base, encarregando-
se a doutrina e a jurisprudência de estabelecer critérios basilares para o montante da pena-base,
sempre ressaltando a discricionariedade do juiz.
Todavia, em que pese o grau de discricionariedade, o juiz, nessa fase, está restrito à
cominação legal da pena, devendo observar o mínimo e o máximo da pena legalmente prevista.
Em outras palavras, ainda que todas as circunstâncias judiciais sejam favoráveis ao réu, a pena-
base não poderá ficar abaixo do mínimo legal. De outro lado, se as circunstâncias judiciais forem
desfavoráveis ao réu, não será possível ao juiz fixar a pena-base além do máximo da pena
cominada ao delito. Assim, por exemplo, em relação ao crime de furto simples (art. 155, caput,
do CP), o juiz somente poderá fixar a pena-base dentro do limite de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
De todo modo, se todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP forem favoráveis ao
réu, a pena-base, como regra óbvia, deverá ser fixada no mínimo legal. Se alguma circunstância
judicial for desfavorável ao réu, o juiz está autorizado a fixar a pena-base acima do mínimo legal.

5.4.1.3. Segunda fase da fixação da pena: circunstâncias agravantes e


atenuantes
Após a fixação da pena-base, adotando como parâmetro as circunstâncias judiciais, cum-
pre ao juiz passar para a segunda fase, fixando a pena, ainda provisória, levando em conta as
circunstâncias agravantes e atenuantes.
No caput do art. 61, o Código Penal emprega o advérbio “sempre”, indicando que, via de

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Direito Penal

regra, as agravantes são de aplicação obrigatória. Em razão disso, o juiz não pode deixar de
agravar a pena, ficando o quantum da pena a seu critério.
Todavia, quando uma das circunstâncias agravantes funciona como elementar ou como
circunstância qualificadora, não se aplica a agravante, a fim de evitar o bis in idem.
Assim, se, por exemplo, o agente praticar homicídio por motivo fútil (art. 121, § 2º, II, do
CP), não incide a agravante do art. 61, II, a, 1ª figura (ter sido o crime cometido por motivo fútil),
pois a circunstância genérica funciona como “qualificadora” do homicídio.
A quantidade da pena a ser agravada ou atenuada fica a critério do juiz, uma vez que não
há nenhum dispositivo legal fixando os parâmetros.
As circunstâncias atenuantes são de aplicação em regra obrigatória, pois o caput do art.
65 reza que: “são circunstâncias que sempre atenuam a pena”.
Entretanto, quando a pena-base for fixada no mínimo legal, a incidência da circunstância
atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo da pena mínima cominada. É o que se
extrai da Súm. no 231 do STJ: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à
redução da pena abaixo do mínimo legal”.
É possível que a atenuante do art. 65 funcione na Parte Especial do Código Penal como
causa da diminuição da pena. Nesse caso, não se aplica a atenuante genérica. Ex.: a circun-
stância consistente em praticar crime por motivo de relevante valor moral ou social integra o
homicídio privilegiado (art. 121, § 1º, do CP); logo, não poderá ser considerada atenuante gen-
érica.
Ao contrário das circunstâncias agravantes, que somente podem ser aplicadas se expres-
samente previstas em lei, pode o Magistrado considerar, na segunda fase de fixação da pena,
atenuante não prevista em lei, levando em conta circunstância relevante, anterior ou posterior ao
crime. É o que se extrai do art. 66 do CP.
Assim, se, por exemplo, restar comprovado que o agente praticou o crime de furto em
razão de desemprego ou moléstia grave na família, poderá o Magistrado considerar essa circun-
stância para atenuar a pena, ainda que não expressamente prevista em lei.

5.4.1.4. Terceira fase da aplicação da pena: causas de aumento e de


diminuição da pena
Na terceira e última fase de aplicação da pena, o juiz deve considerar as causas de au-
mento e de diminuição da pena presentes no caso concreto. Essas causas de aumento e de
diminuição da pena podem estar previstas tanto na Parte Geral do Código Penal quanto na Parte

41
1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

Especial.
O cálculo decorrente da causa de aumento ou diminuição da pena deve incidir sobre a
pena provisória, encontrada na segunda fase, de forma cumulada.
É importante salientar que, com o reconhecimento de causa de aumento ou de diminuição
de pena, o juiz pode aplicar pena acima da máxima ou inferior à mínima cominada em abstrato.

5.4.2. Da reincidência (art. 63 do CP)


5.4.2.1. Conceito
A reincidência pressupõe uma sentença condenatória transitada em julgado por prática
de crime. Há reincidência somente quando o novo crime for cometido após a sentença con-
denatória de que não cabe mais recurso. É o que se extrai do art. 63 do CP.
Ex.: o agente pratica um crime, sendo processado e condenado. Não recorre, vindo a
sentença transitar em julgado. Meses depois, vem a praticar novo crime. É considerado reinci-
dente, uma vez que cometeu novo delito após o trânsito em julgado de sentença que o condenou
por prática de crime.
Se o agente praticar o novo crime exatamente no dia em que transitar em julgado a sen-
tença penal condenatória pelo crime anterior, não incide a agravante da reincidência, pois a lei é
expressa ao mencionar que o novo crime deve ser praticado “depois” do trânsito em julgado. No
dia do trânsito, portanto, não se encaixa na hipótese legal.
Além disso, complementando os pressupostos da reincidência, o art. 7º da Lei de Contra-
venções Penais (Decreto-lei no 3.688/1941) dispõe que: “verifica-se a reincidência quando o
agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha conde-
nado, no Brasil ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção”.
Assim, podem ocorrer várias hipóteses:
a) o agente, condenado irrecorrivelmente pela prática de um crime, vem a cometer outro
delito: é reincidente (art. 63 do CP);
b) o agente pratica um crime; condenado irrecorrivelmente, vem a cometer uma contra-
venção: é reincidente (art. 7º da LCP);
c) o sujeito pratica uma contravenção, vindo a ser condenado por sentença transitada em
julgado; comete outra contravenção: é considerado reincidente (art. 7º da LCP);
d) o sujeito comete uma contravenção; é condenado por sentença irrecorrível; pratica um
crime: não é reincidente (art. 63 do CP).

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

Informativo 636 STF: Condenações anteriores pelo delito do art. 28 da Lei nº 11.343/2006
não são aptas a gerar reincidência.

5.4.2.2. Eficácia temporal da condenação anterior para efeito da rein-


cidência
Nos termos do art. 64, I, do CP, não prevalece a condenação anterior se entre a data do
cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior
a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se
não ocorrer revogação.
Logo, o prazo de 5 (cinco) anos começa a correr a partir do cumprimento da pena ou a
sua extinção por outro modo, por exemplo, incidência de uma causa extintiva da punibilidade,
como a prescrição da pretensão executória, graça ou indulto.
O período de prova do livramento condicional e da suspensão condicional da pena será
computado para fins de cessar os efeitos da reincidência.
Assim, em tese, ao agente condenado a 6 (seis) anos de reclusão, cumprindo 1/3 (ou
seja, 2 anos), será concedido o livramento condicional (art. 83, I, do CP), restando outros 4
(quatro) anos para o término da pena, que será o período de prova.
Consideremos a hipótese de o agente ter iniciado o cumprimento da pena no dia 10-8-
2010. Após cumprir 1/3 da pena, dois anos, portanto, obteve o livramento condicional em 10-8-
2012, cumprindo integralmente a pena no dia 10-8-2016.
Em 10-9-2017, o agente pratica novo crime. Nesse caso, não será considerado reinci-
dente, pois passaram-se mais de 5 (cinco) anos entre a data do cumprimento da pena e a prática
do novo crime, computando-se o período de prova do livramento condicional.

5.4.2.3. Crimes que não induzem reincidência


O art. 64, II, do CP dispõe que, para efeito de reincidência, não se consideram os crimes
militares próprios ou políticos.
Convém ressaltar que, conquanto não gere reincidência, o trânsito em julgado de uma
sentença penal condenatória por crime militar próprio ou crime político gera maus antecedentes,
já que o art. 64, II, do CP limita-se a afastar a reincidência, nada dispondo sobre maus anteced-
entes.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

5.5. Concurso de crimes


5.5.1. Concurso material (art. 69 do CP)
Ocorre o concurso material, também chamado de real, quando o agente, mediante mais
de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não (art. 69, caput, do CP).
Há, pois, pluralidade de condutas e pluralidade de resultados.
Na hipótese de crimes conexos apurados na mesma ação penal, a soma das penas, pelo
concurso material, será realizada na própria sentença, após a adoção do critério trifásico para
cada um dos delitos. Ex.: o agente pratica o crime de estupro (art. 213 do CP) e, para assegurar
a sua impunidade, mata, na sequência, a vítima (art. 121, § 2º, V, do CP). Imaginemos que o juiz
fixe, em relação ao delito de estupro, a pena de 8 (oito) anos; e em relação ao crime de homicídio
qualificado, a pena de 20 (vinte) anos. Ao final, verificando-se tratar de concurso material de
crimes, o Magistrado aplicará o sistema do cúmulo material, somando as penas, alcançando a
pena definitiva de 28 anos.
De outro lado, na hipótese de não haver conexão entre os crimes, sendo, por isso, julga-
dos em processos distintos, a soma das penas será realizada perante o juízo da execução crim-
inal, por força do disposto no art. 66, III, a, da Lei de Execução Penal (Lei no 7.210/1984).
Nos termos do art. 69, caput, do CP, quando o agente realiza o concurso real de crimes,
“aplicam-se cumulativamente as penas em que haja incorrido”. Portanto, no concurso material,
as penas são cumuladas, somadas.
Aplica-se, pois, o sistema do cúmulo material de fixação da pena.

5.5.2. Concurso formal (art. 70 do CP)


5.5.2.1. Conceito
Ocorre o concurso formal (ou ideal) quando o agente, mediante uma só ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes (art. 70, caput, do CP). Há unidade de conduta e pluralidade de
crimes.
A unidade de conduta concretiza-se quando os atos são realizados no mesmo contexto
espacial e temporal, não exigindo, necessariamente, ato único. De fato, pode haver unidade de
conduta mesmo quando fracionada em vários atos, por exemplo, agente que subtrai objetos
pertencentes a pessoas distintas, no mesmo contexto fático.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, praticado o crime de roubo em um
mesmo contexto fático, mediante uma só ação, contra vítimas diferentes, tem-se configurado o

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

concurso formal de crimes.

5.5.2.2. Concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito


O concurso formal perfeito, ou próprio, está previsto na primeira parte do art. 70 do
CP. Ocorre quando o agente pratica duas ou mais infrações penais por meio de uma única con-
duta. Resulta de um único desígnio. O agente, de um só impulso volitivo, dá causa a dois ou
mais resultados, sem desígnios autônomos em relação a cada um dos resultados.
Desígnio autônomo caracteriza-se pelo fato de o agente pretender, mediante uma única
conduta, atingir dois ou mais resultados. Ou seja, o agente, mediante uma ação ou omissão, age
com consciência e vontade em relação a cada um deles, considerados isoladamente.
Assim, se, por exemplo, o agente, na condução de veículo automotor, atropela e causa a
morte de uma pessoa e lesão corporal em outra, pratica crime de homicídio culposo na condução
de veículo automotor (art. 302 do CTB), em concurso formal perfeito, já que não tinha desígnios
autônomos em relação a cada um dos resultados.
No concurso formal imperfeito, ou impróprio, o agente, mediante uma ação ou omissão,
pretende, de forma consciente e voluntária, o resultado em relação a cada um dos crimes.
Ex.: o agente provoca fogo em uma residência com a intenção de matar todos os mora-
dores. O agente tem desígnios autônomos (intenção de matar) em relação a cada um dos mora-
dores da residência.
A expressão “desígnios autônomos” abrange tanto o dolo direto quanto o dolo eventual.
Assim, haverá concurso formal imperfeito, por exemplo, entre o delito de homicídio doloso com
dolo direto e outro com dolo eventual.

5.5.2.3. Aplicação da pena no concurso formal


Em relação ao concurso formal perfeito, ou próprio, o Código Penal adotou o sistema
de exasperação da pena. Aplica-se a pena do crime mais grave ou, se iguais, somente uma
delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade.
O critério adotado pela jurisprudência para a fixação do aumento da pena em decorrência
do concurso formal perfeito de crimes tem relação com o número de crimes cometidos pelo
agente.

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Direito Penal

NÚMERO DE CRIMES AUMENTO DA PENA

2 crimes 1/6 de aumento

3 crimes 1/5 de aumento

4 crimes 1/4 de aumento

5 crimes 1/3 de aumento

5 ou mais crimes 1/2 de aumento

No concurso formal imperfeito, ou impróprio, por conta do maior grau de reprovabilidade


da conduta do agente, visando a não beneficiar agente que agiu com desígnios autônomos em
relação a cada resultado, as penas devem ser somadas, adotando-se o critério do cúmulo ma-
terial, nos termos do art. 70, caput, 2ª parte, do CP.

5.5.3. Concurso material benéfico (art. 70, par. ún., do CP)


Se da aplicação da regra da exasperação da pena, no concurso formal, a pena tornar-se
superior à que resultaria se somadas, deve-se adotar o critério do cúmulo material, porque, nesse
caso, será mais benéfico (art. 70, par. ún., do CP).
Ex.: suponha-se que o agente tenha praticado um homicídio simples (art. 121 do CP –
pena de 6 a 20 anos) e uma lesão corporal leve (art. 129, caput, do CP – pena de 3 meses a 1
ano), em concurso formal. Aplicado o critério da exasperação da pena, considerando-se a pena
do crime mais agrave, acrescido de 1/6, resultaria na pena de 7 (sete) anos.
Se aplicada a pena considerando-se o critério do cúmulo material, considerando-se a
pena aplicada para crime de homicídio simples (6 anos) e lesão corporal leve (3 meses), a pena
definitiva ficaria em 6 (seis) anos e 3 (três) meses. Essa seria a pena a ser aplicada, já que a
aplicação do critério do concurso material é mais benéfico.
Em face disso, a pena a ser aplicada não pode ser superior à que seria cominada se fosse
caso de concurso material, aplicando-se, nesse caso, o disposto no art. 70, par. ún., do CP.

5.5.4. Crime continuado (art. 71 do CP)


5.5.4.1. Conceito
Ocorre o crime continuado quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão,
pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, devendo os subsequentes, pelas condições de
tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, ser havidos como continuação do

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

primeiro.

5.5.4.2. Requisitos
Para a incidência das regras do crime continuado é preciso verificar a presença de req-
uisitos dispostos no art. 71 do CP, consistentes: a) na pluralidade de condutas; b) na pluralidade
de crimes da mesma espécie; c) nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução
e outras semelhantes.
a) Pluralidade de condutas
Nos termos do art. 71 do CP, o crime continuado caracteriza-se pelo fato de o agente
praticar crimes mediante mais de uma ação ou omissão, exigindo, pois, pluralidade de condutas.
Distingue-se do concurso material, que também exige pluralidade de condutas, por força
da incidência dos demais requisitos, ou seja, a prática de crimes de mesma espécie, nas mesmas
condições de tempo, lugar e maneira de execução.
b) Crimes da mesma espécie
Crimes da mesma espécie são os que estiverem previstos no mesmo tipo penal, consider-
ando-se, inclusive, as figuras simples ou qualificadas, dolosas ou culposas, tentadas ou con-
sumadas.
De outro lado, a teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não há como
reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e de latrocínio, porquanto são delitos
de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos diferentes.1
c) Condições de tempo
Exige-se, para caracterizar crime continuado, conexão temporal entre as condutas prati-
cadas para que se configure a continuidade delitiva. Deve existir, em outros termos, certa perio-
dicidade que permita se observar certo ritmo, certa uniformidade, entre as ações sucessivas,
embora não se possam fixar, a respeito, indicações precisas.
A jurisprudência tem admitido crime continuado quando entre as infrações penais não
houver decorrido período superior a 30 (trinta) dias.
d) Condições de lugar
Deve existir entre os crimes da mesma espécie uma conexão espacial para caracterizar
o crime continuado.
A prática de crimes da mesma espécie em locais diversos não exclui a continuidade.

1 STJ – HC 384875/SP – rel. Min. Ribeiro Dantas – 5a Turma – j. 20-3-2018.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

Assim, crimes praticados em bairros diversos de uma mesma cidade, ou em cidades próximas,
podem ser entendidos como praticados em condições de lugar semelhantes.
e) Maneira de execução
A lei exige que a forma de execução das infrações continuadas seja semelhante, traduz-
indo-se no modo, forma e meios empregados para a prática dos delitos. Ex.: empregado de um
estabelecimento comercial que subtrai, diariamente, objetos da empresa.
Todavia, um crime de furto qualificado pela escalada e outro furto qualificado pela
destreza, conquanto crimes da mesma espécie, inviabilizam a incidência do crime continuado, já
que empregaram modos de execução distintos.

5.5.4.3. Crime continuado específico (art. 71, par. ún., do CP)


O crime continuado específico prevê a necessidade de três requisitos, que devem ocorrer
simultaneamente:
a) Contra vítimas diferentes
Admite-se nexo de causalidade entre crimes que lesam interesses jurídicos pessoais,
ainda que praticados contra vítimas diversas
De fato, a circunstância de os delitos componentes atingirem bens jurídicos pessoais não
impede a continuação. Entretanto, cumpre observar o disposto no parágrafo único do art. 71:
“Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pes-
soa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a person-
alidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos
crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo
único do art. 70 e do art. 75 deste Código”.
Assim, admite o Código Penal nexo de continuidade entre homicídios, lesões corporais
ou roubos contra vítimas diversas, podendo o juiz, de acordo com as circunstâncias judiciais do
art. 59, caput, do CP, aumentar a pena de um dos delitos até o triplo, desde que a pena não seja
superior à que seria imposta se o caso fosse de concurso material.
b) Com violência ou grave ameaça à pessoa
Mesmo que o crime seja contra vítimas diferentes, se não houver violência – real ou ficta
– contra a pessoa, não haverá a continuidade específica, mesmo que haja violência contra a
coisa.
c) Somente em crimes dolosos
Se a ação criminosa for praticada contra vítimas diferentes, com violência à pessoa, mas

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

não for produto de uma conduta dolosa, não estará caracterizada a exceção.

5.5.4.4. Aplicação da pena


Tratando-se de crime continuado comum, aplica-se a pena do crime mais grave, aumen-
tada de 1/6 até 2/3.
O parâmetro para o aumento da pena entre 1/6 e 2/3 deve ser proporcional ao número de
infrações praticadas.

NÚMERO DE CRIMES AUMENTO DE PENA

2 crimes 1/6 de aumento

3 crimes 1/5 de aumento

4 crimes 1/4 de aumento

5 crimes 1/3 de aumento

6 crimes 1/2 de aumento

7 ou mais crimes 2/3 de aumento

Com relação a crime continuado específico, previsto no art. 71, par. ún., do CP, aplica-se
a pena do crime mais grave aumentada até o triplo. Todavia, segundo o entendimento do Su-
premo Tribunal Federal, no crime continuado qualificado, a majoração da pena não está adstrita
ao número de infrações praticadas, haja vista que o art. 71, par. ún., do CP determina que poderá
o juiz, “considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se
idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo”. Logo, a fração de aumento de pena no crime
continuado qualificado lastreia-se nos vetores em questão, e não apenas no número de infrações
praticadas.2

2 STF – HC 131871/PR – rel. Min. Dias Toffoli – 2a Turma – j. 31-5-2016.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

6. Da Suspensão Condicional da Pena

6.1. Conceito
Trata-se de um instituto de política criminal, tendo por fim a suspensão da execução da
pena privativa de liberdade, evitando o recolhimento ao cárcere do condenado não reincidente
condenado à pena não superior a 2 (dois) anos (ou a 4 anos, na hipótese de sursis etário ou
humanitário), mediante o cumprimento de determinadas condições, fixadas pelo juiz, durante o
período de prova.
Os requisitos da suspensão condicional da execução da pena estão previstos no art. 77
do CP.

6.1.1. Requisitos objetivos


a) Pena privativa de liberdade
Quanto à qualidade da pena, somente a pena privativa de liberdade, seja reclusão, seja
detenção, admite a suspensão condicional da execução da pena.
Não cabe sursis em relação à pena restritiva de direitos e à pena de multa. É o que se
extrai do art. 80 do CP, segundo o qual “a suspensão não se estende às penas restritivas de
direitos nem à multa”.
Não se aplica o sursis às medidas de segurança, uma vez que o instituto é voltado a
suspender a execução da pena. E medida de segurança não tem natureza jurídica de pena. Além
disso, verificada a inimputabilidade pela enfermidade mental, a sentença será absolutória impró-
pria, não havendo, pois, execução da pena a suspender.
b) Quantidade da pena privativa de liberdade
Como regra, a quantidade da pena imposta na sentença não pode ser superior a 2 (dois)
anos, ainda que resulte, no concurso de crimes, de sanções inferiores a ela.
Tratando-se, entretanto, de condenado maior de 70 anos de idade, ao tempo da sentença
ou do acórdão (sursis etário) ou em razão de saúde (sursis humanitário ou profilático), a pena
aplicada pode ser igual ou inferior a 4 (quatro) anos (art. 77, § 2º, do CP).
Em relação a concurso de crimes, em qualquer das suas espécies, a pena aplicada, con-
siderando os critérios da exasperação da pena ou cúmulo material, não pode ser superior a 2
(dois) anos (ou 4 anos, na hipótese de sursis etário ou humanitário).
c) Impossibilidade de substituição por pena restritiva de direitos

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

Somente se aplica o sursis quando incabível ou não recomendável a substituição da pena


privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 77, III, do CP).

6.1.2. Requisitos subjetivos


a) Condenado não reincidente em crime doloso
Nem toda reincidência impede a concessão do sursis, mas somente a reincidência em
crime doloso. Isso quer dizer que a condenação anterior, mesmo definitiva, por crime culposo ou
por simples contravenção, por si só, não é causa impeditiva da suspensão condicional da pena.
Todavia, a reincidência, ainda que em crime doloso, em decorrência de anterior con-
denação a pena de multa, não impede a concessão do sursis (art. 77, § 1º, do CP).
b) Circunstâncias judiciais favoráveis ao agente
Não é indispensável que todas as circunstâncias sejam favoráveis, como ocorre com sur-
sis especial. Basta que, no geral, não sejam desfavoráveis de modo a criar dúvidas fundadas
sobre a possibilidade de o condenado voltar a delinquir.

6.2. Condições
Durante o período do sursis, o condenado deve cumprir determinadas condições, sob
pena de ser revogada a medida e ter de cumprir a sanção privativa de liberdade. Essas condições
são: a) legais: impostas pela lei (arts. 78, § 1º, e 81 do CP); b) judiciais: impostas pelo juiz na
sentença (art. 79 do CP).
No sursis simples, a condição legal e obrigatória consiste na prestação de serviços à co-
munidade ou limitação de fim de semana, no primeiro ano do período de suspensão (art. 78,
§ 1º, 1ª parte, do CP).
Tratando-se de sursis especial, satisfeitos os seus requisitos, as condições alternativas
da prestação de serviços à comunidade e a limitação de fim de semana são substituídas por:
proibição de frequentar determinados lugares; proibição de o condenado ausentar-se da
comarca onde reside, sem autorização judicial; e comparecimento pessoal e obrigatório a juízo,
mensalmente, para informar e justificar suas atividades (art. 78, § 2º, a e c, do CP).
As condições legais do sursis especial, previstas no art. 78, § 2º, a, b e c, do CP, devem
ser impostas cumulativamente.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

6.3. Período de prova


É o prazo em que a execução da pena privativa de liberdade imposta fica suspensa, me-
diante o cumprimento das condições estabelecidas.
Como regra, o período de prova varia entre 2 (dois) a 4 (quatro) anos (art. 77, caput, do
CP). Sendo o condenado maior de 70 anos de idade ou por razões de saúde, o prazo varia de 4
(quatro) a 6 (seis) anos (art. 77, § 2º, do CP). Tratando-se da contravenção, o período de prova
varia de 1 (um) a 3 (três) anos (art. 11 da LCP).
O período de prova deve ser fixado segundo a natureza do crime, personalidade do agente
e intensidade da pena, não podendo o juiz, senão em hipótese excepcional, estabelecê-lo no
prazo máximo.

6.3.1. Causas de revogação do sursis


Incidindo uma causa de revogação do sursis, deverá o condenado cumprir integralmente
a pena privativa de liberdade cuja execução se encontrava suspensa, desconsiderando o tempo
que permaneceu no período de prova, ainda que tenha cumprido as condições impostas.
Assim, se, por exemplo, no primeiro ano o agente cumpriu prestação de serviço à comun-
idade, sobrevindo causa de revogação do sursis, esse período não será descontando/detraído
da pena privativa de liberdade que deverá ser executada.
a) Revogação obrigatória
A revogação obrigatória decorre de lei, não ficando a critério do Magistrado decretá-la ou
não. A margem de discricionariedade do Magistrado é limitada pela lei, sendo seu dever revogar
o benefício.
Nos termos do art. 81 do CP, a suspensão condicional da execução da pena será
revogada, no curso do prazo, ao beneficiário que:
I – é condenado, sem sentença irrecorrível, por crime doloso
A lei não faz ressalva no sentido de que a condenação deva ser por crime praticado no
curso da suspensão condicional da pena. Logo, não se mostra relevante se o crime foi praticado
antes ou depois do início da suspensão condicional da pena. Basta que tenha havido sentença
condenatória transitada em julgado pela prática de crime doloso, independentemente de quando
foi praticado.
Todavia, se a nova condenação se referir somente à pena de multa, não haverá revogação
do benefício. Com efeito, se a condenação anterior à pena de multa, mesmo por crime doloso,
não impede a concessão do sursis (art. 77, § 1º, do CP), também não pode ser causa de

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Direito Penal

revogação do benefício.
II – frustra, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem mo-
tivo justificado, a reparação do dano
Trata-se da hipótese de o condenado solvente criar embaraços para frustrar a execução
da pena de multa que obstem a cobrança da multa, não efetuando o seu pagamento.
Também constitui causa obrigatória de revogação do sursis a ausência injustificada da
reparação do dano. Assim, se justificada a impossibilidade de reparação do dano, por exemplo,
a precária situação financeira do condenado, não incidirá a causa de revogação do benefício.
III – descumpre a condição do § 1º do art. 78 do CP
Como ocorre na hipótese da reparação do dano, somente o descumprimento injustificado
da prestação de serviços à comunidade ou da limitação de fim de semana ensejará a revogação
do benefício.
b) Revogação facultativa
Incidindo uma causa de revogação facultativa do sursis, ficará a critério do juiz revogar ou
não o benefício.
As hipóteses de revogação facultativa estão previstas no art. 81, § 1º, do CP. Nesse caso,
o juiz não está obrigado a revogar o benefício, podendo optar por advertir novamente o senten-
ciado, prorrogar o período de prova até o máximo ou exacerbar as condições impostas, conforme
dispõe o art. 81, § 3º, do CP.
São duas as hipóteses de revogação facultativa:
I – o condenado deixa de cumprir qualquer outra condição imposta
Na hipótese de revogação facultativa, a decisão fica sujeita à discricionariedade do juiz,
que, em vez de revogar a suspensão, poderá prorrogar o período de prova. Aqui, a lei refere-se
às condições legais previstas para o sursis especial (art. 78, § 2º, do CP) e às condições judiciais
que foram determinadas (art. 79 do CP).
II – condenação irrecorrível, por crime culposo ou contravenção, à pena privativa
de liberdade e restritiva de direitos
Essa hipótese afasta a condenação à pena de multa, já que se refere, especificamente,
às outras duas modalidades de penas.

6.4. Extinção da pena


Se o período de prova termina sem que haja ocorrido motivo para a revogação, não mais
se executa a pena privativa de liberdade (art. 82 do CP).

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Assim, expirado o prazo de suspensão ou de prorrogação sem que tenha havido motivo
para a revogação, o juiz deve declarar extinta a pena privativa de liberdade.
Trata-se de sentença declaratória. Em face disso, considera-se, para fins de extinção da
pena, a data do término do período de prova e não a data em que o juiz profere a decisão, ainda
que seja em período posterior.

7. Do Livramento Condicional

7.1. Conceito
Trata-se de um instituto de política criminal, destinado a antecipar o retorno do condenado
ao convívio social, mediante determinadas condições e de forma precária, desde que preenchi-
dos os requisitos legais.

7.2. Requisitos
Os requisitos do livramento condicional, de ordem objetiva e subjetiva, encontram-se no
art. 83 do CP.

7.2.1. Requisitos objetivos


Os requisitos objetivos estão previstos no art. 83, I, II, IV e V, do CP, vinculando-se à pena
e à reparação do dano.
a) Natureza e quantidade da pena
Assim como na suspensão condicional do processo, o livramento condicional somente
pode ser concedido em relação à pena privativa de liberdade. Não cabe, pois, à pena restritiva
de direitos e multa.
Além disso, o benefício somente poderá ser concedido à pena privativa de liberdade igual
ou superior a 2 (dois) anos (art. 83 do CP). A soma das penas é permitida para atingir esse limite
mínimo, mesmo que tenham sido aplicadas em processos distintos, nos termos do art. 84 do CP.
b) Cumprimento de parte da pena
Nos termos do art. 83, I, do CP, se o criminoso não for reincidente em crime doloso e
ostentar bons antecedentes, deverá cumprir mais de 1/3 da pena privativa de liberdade para
obter o benefício. É a hipótese de livramento condicional simples.

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Direito Penal

Se o condenado for reincidente em crime doloso, deverá cumprir mais da metade da pena
privativa de liberdade, conforme dispõe o art. 83, II, do CP. Trata-se do livramento condicional
qualificado. Nesse particular, há uma omissão do legislador na hipótese de o condenado não ser
reincidente em crime doloso, mas portador de maus antecedentes. Isso porque não se enquadra
na hipótese do inciso I (que exige bons antecedentes) nem na do inciso II (que trata da hipótese
de reincidente em crime doloso) do art. 83 do CP.
Nesse caso, prevalece o entendimento de que, por conta da ausência de expressa pre-
visão legal, deve-se conferir ao condenado o tratamento mais benéfico. Ou seja, o condenado
não reincidente em crime doloso, mas portador de maus antecedentes, deverá cumprir mais de
1/3 da pena para obtenção do livramento condicional. É a posição do Superior Tribunal de Jus-
tiça.3
Tratando-se de condenado por prática de tortura, crime hediondo, tráfico ilícito de entorpe-
centes e drogas afins, terrorismo e tráfico de pessoas (introduzido pela Lei no 13.344/2016),
desde que não seja reincidente específico em tais delitos, deve cumprir mais de 2/3 da pena (art.
83, V, do CP). Trata-se do livramento condicional específico.
Assim, sendo reincidente específico em crime hediondo ou equiparado, não é admissível
o livramento condicional. Há reincidência específica, para efeito desse dispositivo, quando o su-
jeito, já tendo sido condenado por qualquer dos delitos hediondos por sentença transitada em
julgado, vem novamente a cometer crime dessa mesma natureza. Ex.: após condenação defini-
tiva por crime de homicídio qualificado, o agente pratica e é condenado pelo crime de tráfico de
drogas. Nesse caso, não terá direito a livramento condicional, por ser reincidente específico por
crime de natureza hedionda e equiparado.
c) Reparação do dano, salvo efetiva impossibilidade
Nos termos do art. 91, I, do CP, a condenação torna certa a obrigação de indenizar o dano
resultante do crime. Assim, o condenado não pode obter o livramento condicional enquanto não
reparar o dano causado, salvo quando insolvente.
Na prática, esse requisito tem limitado alcance, uma vez que, via de regra, os condenados
são pessoas pobres, absolutamente insolventes, sem a menor possibilidade de reparar o dano
causado.

3 HC 102.278/RJ. Superior Tribunal de Justiça. Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora Convocada do TJ/MG), 6 a Turma, julgado
em 03/04/2008.

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7.2.2. Requisitos subjetivos


Os requisitos subjetivos referem-se à pessoa do condenado. São analisados para consta-
tar se o condenado reúne condições pessoais para retornar ao convívio social.
A Lei no 13.964/2019 acrescentou mais requisitos objetivos para a obtenção do livramento
condicional, prevendo o art. 83, III, do CP a necessidade da comprovação:
a) Bom comportamento durante a execução da pena
O bom comportamento carcerário, via de regra, é aferido com base no atestado emitido
pelo diretor do estabelecimento carcerário, considerando-se a conduta do condenado ao longo
da execução da pena. Em outras palavras, para a verificação do requisito subjetivo não se leva
em conta o crime praticado pelo condenado, mas seu comportamento durante o cumprimento da
pena.
Convém sinalar, por pertinente, que a prática de falta grave não interrompe o prazo para
a concessão do livramento condicional. É o que se extrai da Súm. no 441 do STJ, segundo a
qual “A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional”.
De acordo com a Súm. no 439/STJ, “admite-se o exame criminológico pelas peculi-
aridades do caso, desde que em decisão motivada”.
b) Não cometimento de falta grave nos últimos doze meses
A Lei no 13.964/2019 acrescentou mais um requisito para a obtenção do livramento con-
dicional, consistente no não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses de execução da
pena.
As hipóteses de falta grave durante a execução da pena estão previstas no art. 50 da Lei
no 7.210/1984.
Se o condenado praticou falta grave ao longo dos últimos 12 meses, não terá direito à
obtenção do livramento condicional, ainda que preenchidos os demais requisitos.
c) Bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído
Trata-se de uma exigência salutar para o retorno do condenado ao convívio social, mas,
infelizmente, de pouca efetividade prática, por conta da carência ou dificuldade de inserção do
apenado no mercado de trabalho.
Ao referir-se a “trabalho que lhe foi atribuído”, fica claro que não se trata apenas das ati-
vidades laborais desenvolvidas no interior do cárcere, mas também se refere ao trabalho efetu-
ado fora da prisão, por exemplo, o serviço externo, tanto na iniciativa privada como na pública.
d) Aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto
A lei não determina que o apenado deve ter emprego assegurado no momento da

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liberação. O que a lei exige é a aptidão, isto é, a disposição, a habilidade, a inclinação do con-
denado para viver às custas de seu próprio e honesto esforço.
e) Constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não vol-
tará a delinquir na hipótese de condenado por crime doloso, cometido com violência ou
grave ameaça
Tratando-se de condenado por crime doloso cometido com violência ou grave ameaça à
pessoa, a concessão do livramento fica subordinada, além dos requisitos do art. 83 do CP, à
constatação, mediante perícia, de condições pessoais que façam presumir que o liberado não
voltará a delinquir (art. 83, par. ún., do CP).

7.3. Livramento condicional vedado


A Lei no 13.964/2019, que altera o art. 112 da Lei no 7.210/1984 (LEP), passou a prever
vedação do livramento condicional a condenados pela prática de determinados crimes.
É vedado o livramento condicional:
• ao condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte
(art. 112, VI, a e c, da LEP);
• ao condenado expressamente em sentença, por integrar organização criminosa ou
por crime praticado por meio de organização criminosa, não será facultada a pro-
gressão de regime de cumprimento de pena ou a obtenção do livramento condi-
cional ou outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios que in-
diquem a manutenção do vínculo associativo (art. 2°, § 9º, da Lei no 12.850/2013);
• ao reincidente em crime hediondo ou equiparado (art. 83, V, do CP).

7.4. As causas de revogação do livramento condicional


O livramento condicional, pela própria natureza do benefício, é passível de revogação a
qualquer momento, desde que presente alguma hipótese que a justifique.
As causas de revogação obrigatórias estão previstas no art. 86 do CP, ao passo que as
causas de revogação facultativa estão previstas no art. 87.

7.4.1. Causas de revogação obrigatória


Quando ocorre uma causa obrigatória, não fica a critério do juiz revogar o livramento con-
dicional ou não, a revogação decorre da própria lei.

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A revogação obrigatória incide quando o liberado vem a ser condenado a pena privativa
de liberdade, em sentença irrecorrível, por crime praticado durante ou antes da concessão do
livramento condicional.
A condenação pela prática de contravenção penal ou por crime a pena que não seja priv-
ativa de liberdade constitui causa de revogação facultativa.

7.4.2. Causas de revogação facultativa


Nas hipóteses de revogação facultativa, cumpre ao juiz deliberar acerca da revogação ou
manutenção do livramento condicional. Trata-se, pois, de causas judiciais de revogação do li-
vramento condicional.
Se mantido o livramento condicional, na hipótese da revogação facultativa, o Juiz deverá
advertir o liberado ou agravar as condições (art. 140, par. ún., da LEP).
Nos termos do art. 87 do CP, duas são as hipóteses de revogação facultativa:
a) se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes na sentença;
b) se o liberado for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que
não seja privativa de liberdade.

8. Efeitos da Condenação

8.1. Nota introdutória


Após a prática de um fato típico, ilícito e sendo o agente culpável, em tese, instaura-se
uma ação penal, que pode ser pública ou privada. Observando as garantias constitucionais do
contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, objetiva-se chegar ao final e, se com-
provada a materialidade e a autoria, o Estado, por meio do Poder Judiciário, aplicar uma sen-
tença ou acórdão condenatório, com a fixação de uma pena.
Essa sentença condenatória, ao transitar em julgado, naturalmente gera efeitos que, direta
ou indiretamente, atingem o condenado. Os efeitos não são apenas na esfera penal, mas tam-
bém em outras áreas do direito, como cível, administrativa, eleitoral, por exemplo.
Os efeitos da condenação são divididos em principais e secundários:

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Direito Penal

8.2. Efeitos principais


Como corolário lógico da sentença penal condenatória, o efeito principal consiste na
aplicação de uma pena privativa de liberdade, restritiva de direitos e/ou multa, além de medida
de segurança, no caso de agente semi-imputável que revela periculosidade.

8.3. Efeitos secundários


Além dos efeitos principais, a sentença condenatória gera efeitos secundários, também
denominados efeitos mediatos, acessórios, reflexos ou indiretos, de natureza penal e extrapenal.

8.3.1. Efeitos secundários de natureza penal


São inúmeros os efeitos secundários da sentença penal condenatória transitada em jul-
gado, entre os quais podem ser destacados os seguintes:
a) gerar a reincidência (art. 63 do CP);
b) configuração de maus antecedentes, se não utilizada para fins de reincidência;
c) fixação do regime inicial fechado na hipótese de prática de novo crime, ressalvada a
hipótese da Súm. no 269 do STJ;
d) vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na
hipótese de prática de novo crime, ressalvada a hipótese do art. 44, § 3º, do CP;
e) vedação da concessão da suspensão condicional da pena em relação ao novo crime
(art. 77, I, do CP), e revogação do sursis (art. 81, I, e § 1º, do CP);
f) causa de revogação do livramento condicional (arts. 86 e 87 do CP);
g) aumento e interrupção do prazo da prescrição da pretensão executória, quando
reconhecida a reincidência pela prática de outro crime (arts. 110, caput, e 117, VI, do CP);
h) vedação da concessão da transação penal e da suspensão condicional do processo,
em relação ao novo crime (arts. 76, § 2º, I, e 89, caput, da Lei no 9.099/1995).

8.3.2. Efeitos secundários de natureza extrapenal


Além de gerar efeitos penais, a sentença penal condenatória transitada em julgado gera
efeitos extrapenais, ou seja, em outras áreas do direito, como na esfera cível, administrativa,
trabalhista, eleitoral etc. Esses efeitos se dividem em genéricos e específicos.
Os efeitos genéricos incidem sobre todos os crimes e estão previstos no art. 91 do CP,
consistentes em reparar o dano e confisco. Incidem de forma automática, não sendo necessário,

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Direito Penal

portanto, o juiz declarar na sentença. É o que se extrai, a contrario sensu, do disposto no art. 92,
par. ún., do CP.
Os efeitos específicos são aqueles previstos no art. 92 do CP. Nos termos do parágrafo
único do art. 92, esses efeitos não incidem de forma automática, devendo o juiz declará-los mo-
tivadamente na sentença.

8.3.3. Efeitos genéricos


a) Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime
Nos termos do art. 91, I, do CP, constitui efeito da sentença penal condenatória “tornar
certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime”. Trata-se de efeito automático decor-
rente da sentença penal condenatória, já que meramente declaratória no tocante à indenização
civil, não sendo necessário mandamento expresso no sentido de o réu reparar o dano resultante
do crime.
A sentença penal condenatória transitada em julgado permite à vítima promover a ação
de execução ex delicto, nos termos do art. 63 do CPP, já que constitui título executivo judicial,
conforme prevê o art. 515, I, do CPC.
Assim, transitada em julgado a sentença penal condenatória, a sua execução no juízo
cível visa tão somente estabelecer o quantum da reparação do dano, não sendo, portanto, objeto
de discussão o mérito da causa.
b) A perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-
fé, dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação,
uso, porte ou detenção constitua fato ilícito.
É a hipótese do confisco como efeito da condenação, previsto no art. 91, II, do CP. Trata-
se da perda em favor da União de bens de origem ilícita, decorrente do delito praticado.
Constitui efeito automático da sentença penal condenatória transitada em julgado, não
sendo, pois, necessário que o juiz declare expressamente na sentença.
c) Confisco alargado
A Lei no 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”) introduziu mais um efeito da sentença penal
condenatória.
Nos termos do art. 91-A do CP, na hipótese de condenação por infrações às quais a lei
comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como
produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio
do condenado e aquele que seja compatível com o seu rendimento lícito.

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Direito Penal

Para efeito da perda prevista no caput do referido artigo, entende-se por patrimônio do
condenado todos os bens:

Art. 91-A. (...)


I – de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o
benefício direto ou indireto, na data da infração penal ou recebidos posteri-
ormente; e
II – transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação
irrisória, a partir do início da atividade criminal.
§ 2° O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade
ou a procedência lícita do patrimônio.
§ 3° A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo
Ministério Público, por ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação
da diferença apurada.
§ 4° Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da diferença
apurada e especificar os bens cuja perda for decretada.
§ 5° Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações
criminosas e milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União
ou do Estado, dependendo da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que
não ponham em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pú-
blica, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o cometimento de
novos crimes.

8.3.4. Efeitos específicos


a) Perda de cargo, função pública ou mandato eletivo
O art. 92, I, do CP prevê duas hipóteses de perda de cargo, função ou mandato eletivo
como efeito da sentença penal condenatória:
a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 (um) ano,
nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pú-
blica;
b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos
nos demais casos.
A primeira hipótese, pode incidir quando o funcionário público praticar o delito no exercício
das suas funções ou em razão dela, e a pena privativa de liberdade seja aplicada por tempo igual
ou superior a 1 (um) ano.
Não se tratando de crime funcional, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo
poderá incidir quando a pena aplicada for igual ou superior a 4 (quatro) anos.
Esse efeito, no entanto, não é automático, ou seja, exige para sua incidência que o juiz
declare expressamente em decisão motivada (art. 92, par. ún., do CP).

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

b) Incapacidade para o exercício do pátrio poder (poder familiar), tutela ou curatela


Além do vínculo entre o autor do fato e a vítima, a incidência do efeito específico con-
sistente na incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela, depende de duas
condições: a) que o crime seja doloso; b) que seja cominada pena de reclusão.
Esse efeito não é automático, devendo ser declarado na sentença em decisão motivada,
conforme se extrai do art. 92, par. ún., do CP. Assim, cumpre ao Magistrado, no caso concreto,
avaliar a necessidade da imposição da incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou
curatela. Exemplo: pai condenado pela prática do crime estupro de vulnerável (art. 217-A do CP)
contra filha de tenra idade.
c) Inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime
doloso
A aplicação desse efeito específico depende de dois requisitos: a) que o crime seja doloso;
b) que o veículo tenha sido utilizado “como meio” para a sua prática. Logo, não incide esse efeito
no caso de crime culposo.

9. Extinção da Punibilidade

9.1. Conceito
Com a prática da infração penal, surge para o Estado o direito de punir o responsável,
incidindo a possibilidade jurídica de o Estado impor uma sanção penal ao responsável pela
prática do crime ou contravenção penal.

9.2. Efeitos da extinção da punibilidade


Em regra, as causas extintivas da punibilidade só alcançam o direito de punir do Estado,
subsistindo o crime em todos os seus requisitos e a sentença condenatória irrecorrível.
Excepcionalmente, a causa extintiva de punibilidade apaga o fato praticado pelo agente e
rescinde a sentença condenatória irrecorrível. É o que ocorre com a abolitio criminis e a anistia.

9.3. Causas de extinção de punibilidade (art. 107 do CP)


9.3.1. Morte do agente
A morte do agente constitui causa de extinção da punibilidade, por conta do princípio da

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Direito Penal

personalidade da pena, segundo a qual a pena não pode passar da pessoa do condenado (art.
5o, XLV, 1a parte, da CF/1988).
Essa extinção da punibilidade incide sobre todas as espécies de penas, inclusive a pena
de multa. Assim, se, no curso da execução da pena de multa convertida em dívida ativa, o réu
vier a falecer, deve ser declarada extinta a punibilidade do agente pela sua morte, não sendo
possível, assim, direcionar a execução da pena de multa aos seus sucessores.

9.3.2. Da anistia, graça e indulto


A anistia, graça e indulto constituem espécies de indulgência, ensejando a renúncia do
Estado ao direito de punir.
São benefícios concedidos por órgãos diversos do Poder Judiciário, mas que somente
ensejam a extinção da punibilidade após decisão judicial.

9.3.2.1. Anistia
Trata-se de uma espécie de exclusão da incidência do Direito Penal sobre uma ou mais
infrações penais. Não exclui o crime, mas apenas a possibilidade de o Estado punir o agente que
o praticou, razão pela qual tem efeito retroativo.
A competência para a concessão de anistia é exclusiva da União e privativa do Congresso
Nacional (art. 48, VIII, da CF/1988), com a sanção do Presidente da República, só podendo ser
concedida por meio de lei federal.
Não se aplica aos delitos referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, ao terrorismo e aos definidos como crimes hediondos (art. 5o, XLIII, da CF/1988;
art. 2º, I, da Lei no 8.072/1990).

9.3.2.2. Graça
A graça, ao contrário do indulto, é um benefício concedido a pessoa determinada, conde-
nada definitivamente pela prática de crime comum, consistente na extinção ou comutação da
pena.
Nos termos do art. 5o, XLIII, da CF/1988, a graça não pode ser aplicada em relação a
delitos referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ao terror-
ismo e aos definidos como crimes hediondos.
A competência para conceder a graça é do Presidente da República, nos termos do art.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

84, XII, da CF/1988, podendo, nos termos do parágrafo único desse artigo, delegar a atribuição
“aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União”.

9.3.2.3. Indulto
O indulto coletivo constitui modalidade de clemência concedida a todo condenado que
preencher os requisitos previstos no Decreto presidencial publicado geralmente no final de cada
ano. Como se vê, o indulto, ao contrário da graça, tem caráter coletivo e é concedido espontane-
amente.
Assim como a graça, a competência para conceder o indulto é do Presidente da
República, nos termos do art. 84, XII, da CF/1988, podendo, nos termos do parágrafo único desse
artigo, delegar a atribuição “aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao
Advogado-Geral da União”.
Os requisitos para a concessão do indulto variam de acordo com cada decreto publicado,
considerando, invariavelmente, requisitos subjetivos (primariedade e bom comportamento car-
cerário, sem registro de falta grave ao longo do ano) e objetivos (tempo de cumprimento de
pena).
Nos termos do art. 2º, I, da Lei no 8.072/1990, o indulto não pode ser aplicado em relação
a delitos referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ao
terrorismo e aos definidos como crimes hediondos. O art. 44 da Lei no 11.343/2006 também veda
a concessão do indulto aos condenados pelo crime de tráfico de drogas.
O indulto também extingue somente a punibilidade, subsistindo o crime, a condenação
irrecorrível e seus efeitos secundários. Assim, se o agente beneficiado com o indulto praticar
novo crime, será considerado reincidente.

9.3.3. Lei posterior que deixa de considerar o fato criminoso (abolitio


criminis)
A lei penal retroage, atingindo fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor, sempre que
beneficiar o agente de qualquer modo (art. 5o, XL, da CF/1988).
Se a lei posterior deixar de considerar o fato como criminoso, excluir da seara penal a
conduta como sendo delituosa, retroagirá para alcançar os fatos praticados antes da sua vigên-
cia, com a consequente extinção da punibilidade dos responsáveis.
Nos termos do art. 2o do CP, a abolitio criminis gera o efeito de fazer cessar a execução

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Direito Penal

e os efeitos penais da sentença condenatória, por exemplo, a reincidência, maus antecedentes,


lançamento do nome do réu no rol dos culpados.
Todavia, não apaga os efeitos civis da prática delituosa, já que a lei fala em cessação dos
efeitos “penais” da sentença.

9.3.4. Prescrição, decadência e perempção


O art. 107, IV, do CP prevê como causas de extinção da punibilidade a prescrição, a
decadência e a perempção.
A prescrição será analisada em capítulo próprio, diante da abrangência do tema.

9.3.4.1. Decadência
A decadência é a perda do direito do ofendido e dos demais legitimados de oferecer rep-
resentação, no caso de ação penal pública condicionada à representação, e de ajuizar a queixa-
crime, na hipótese de ação penal privada, em face do decurso do tempo.
Os legitimados para apresentar representação ou queixa-crime têm o prazo de 6 (seis)
meses, a contar da inequívoca ciência da autoria do fato, para exercer esse direito. Escoado
esse prazo sem iniciativa do ofendido ou do seu representante legal, incide a decadência, e a
consequente extinção da punibilidade do agente ofensor.
Com efeito, nos termos do art. 103 do CP e do art. 38 do CPP, o ofendido ou seu repre-
sentante legal decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo
de 6 (seis) meses, contados a partir do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no
caso da ação penal privada subsidiária da pública, do dia em que se esgotou o prazo para o
oferecimento da denúncia.
Como se trata de prazo penal, a contagem segue as regras do art. 10 do CP, incluindo-se
o dia do começo, excluindo-se o último dia, considerando o calendário comum. Assim, se, por
exemplo, o ofendido tomou ciência da autoria do fato no dia 3-3-2018, terá até o dia 2-9-2018
para oferecer a representação ou ajuizar a queixa-crime. A partir do dia 3-9-2018 já incidirá a
decadência e a causa de extinção da punibilidade.

9.3.4.2. Perempção
A perempção é uma causa de extinção da punibilidade que incide por conta da inércia
processual do querelante.

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Direito Penal

A perempção só é possível na ação penal exclusivamente privada, não sendo aplicável à


ação penal privada subsidiária da pública, já que, diante da negligência do querelante, o Ministé-
rio Público retoma a ação penal (art. 29, parte final, do CPP).
As hipóteses de perempção estão elencadas no art. 60 do CPP. E, segundo se extrai
desse dispositivo, a perempção somente é possível após o ajuizamento da ação penal privada.

9.3.5. Da renúncia ao direito de queixa ou perdão aceito nos crimes de


ação penal privada
Renúncia ao direito de queixa
É a abdicação do ofendido ou de seu representante legal do direito de promover a ação
penal privada. Trata-se de ato unilateral pelo qual o ofendido delibera por não ajuizar a queixa-
crime contra o suposto ofensor.
Nos termos do art. 104, caput, do CP: “o direito de queixa não pode ser exercido quando
renunciado expressa ou tacitamente”.
A renúncia ao direito de queixa somente pode ser exercida na ação penal exclusivamente
privada, não sendo possível na ação penal privada subsidiária da pública, uma vez que, se o
ofendido não oferecer a queixa-crime, o Ministério Público poderá oferecer a denúncia enquanto
não incidir causa de extinção da punibilidade do agente, por exemplo, pela prescrição.
Perdão do ofendido
O perdão do ofendido ou do seu representante legal consiste na manifestação, expressa
ou tácita, de desistir do prosseguimento da ação penal privada. É a desistência manifestada após
o oferecimento da queixa, que obsta o prosseguimento da ação penal privada, conforme prevê
o art. 105 do CP.
O perdão aceito do ofendido é causa extintiva de punibilidade que incide somente na ação
penal exclusivamente privada.
Tratando-se de ação penal privada subsidiária da pública (art. 100, § 3º, do CP), a de-
sistência do ofendido de prosseguir com o processo não determina a extinção da punibilidade,
mesmo que o réu aceite o perdão, pois se trata de ação penal pública, devendo o Ministério
Público assumi-la como parte principal (art. 29 do CPP).
Depois de iniciada a ação penal privada, o perdão do ofendido pode ser manifestado até
o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (art. 106, § 2º, do CPP).

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Direito Penal

9.3.6. Da retratação do agente


A retratação significa desdizer-se, retirar o que foi dito, confessar que errou.
Em regra, a retratação do agente não tem relevância jurídica, funcionando somente como
circunstância judicial na aplicação da pena. Excepcionalmente, o estatuto penal empresta-lhe
força extintiva da punibilidade (art. 107, VI, do CP).
A retratação, como causa de extinção da punibilidade, somente incide nos casos expres-
samente previstos em lei, por exemplo, nos crimes contra a honra, conforme prevê o art. 143 do
CP.
Nos crimes contra a honra, a retratação só é cabível na calúnia e na difamação, sendo
inadmissível na injúria. Nos dois primeiros casos, importa à vítima que o ofensor se retrate ne-
gando que ela praticou o fato imputado. Na injúria, porém, não há imputação de fato, mas
atribuição ao ofendido de qualidade negativa, não importando a esta a retratação.
Também incide na hipótese prevista no art. 342, § 2o, do CP, que trata do crime de falso
testemunho ou falsa perícia, segundo o qual o fato deixa de ser punível, se, antes da sentença,
o agente se retrata ou declara a verdade. Essa retratação só é possível até a sentença final do
procedimento em que foi praticado o falso testemunho.

9.3.7. Perdão judicial


Perdão judicial é o instituto pelo qual o juiz, não obstante a incidência da infração penal
praticada por agente culpável, deixa de aplicar a pena nos casos expressamente previstos em
lei.
O perdão judicial constitui causa extintiva da punibilidade de aplicação restrita. Significa
que não é aplicável a todas as infrações penais, mas somente àquelas especialmente indicadas
pelo legislador.
A sentença que concede o perdão judicial é meramente declaratória da extinção da puni-
bilidade, não surtindo nenhum efeito penal ou extrapenal. É o que se extrai da Súm. no 18 do
STJ, segundo a qual “A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da
punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”.

9.4. Prescrição
9.4.1. Introdução
Quando um indivíduo pratica, em tese, um fato típico e ilícito, surge para o Estado o poder

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Direito Penal

e o dever de buscar a punição do responsável. E essa punição é concretizada com a sentença


penal condenatória transitada em julgado, com a imposição de uma pena, surgindo, a partir de
então, a pretensão do Estado de executar essa pena.
Todavia, a pretensão punitiva e executória do Estado é limitada, não perdurando, via de
regra, por tempo indeterminado. Com efeito, o direito de punir e de executar a pena imposta ao
apenado encontra limites temporais, que, se não observados, podem levar à extinção da puni-
bilidade do agente pela incidência de prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pre-
tensão executória.
A prescrição penal, pois, é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo
decurso do tempo sem o seu exercício.

9.4.2. Imprescritibilidade
Em regra, a prescrição alcança todas as infrações penais, inclusive os crimes hediondos
e equiparados.
Todavia, nos termos da Constituição Federal, alguns crimes são imprescritíveis, viabili-
zando, assim, o exercício da pretensão punitiva e executória a qualquer tempo.
São imprescritíveis os crimes de racismo (art. 5º, XLII, da CF/1988; Lei no 7.716/1989) e
os referentes à ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático (art. 5º, XLIV, da CF/1988). Os Tribunais Superiores passaram a considerar
imprescritível também o crime de injúria racial (art. 140, § 3º, do CP).

9.4.3. Prazos para o cálculo da prescrição (art. 109 do CP)


A prescrição é regulada pelos prazos previstos no art. 109 do CP. Ou seja, os prazos
previstos nesse artigo servem de parâmetro para o cálculo da prescrição da pretensão punitiva
e executória:
I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;
II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;
III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;
IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;
V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede
a dois;
VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

Convém destacar que as penas restritivas de direitos, que substituem a pena privativa de
liberdade, prescrevem no mesmo prazo das penas substituídas, nos termos do art. 109, par. ún.,
do CP.

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Direito Penal

Ex.: suponha-se que o agente tenha sido condenado a 1 (um) ano pela prática do crime
de furto, sendo a pena privativa de liberdade substituída por uma de prestação de serviços à
comunidade. Essa pena prescreverá em 4 (quatro) anos.

9.4.4. Redução dos prazos de prescrição em face da idade do sujeito


(art. 115 do CP)
O art. 115 determina que são reduzidos de metade os prazos da prescrição quando o
criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 anos ou maior de 70 anos na data da sen-
tença.

9.4.5. Prescrição da pretensão punitiva


9.4.5.1. Prescrição da pretensão punitiva em abstrato (art. 109, caput, do
CP)
a) Contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato
Na prescrição da pretensão punitiva, o decurso do tempo faz com que o Estado perca
o direito de punir no tocante à pretensão de o Poder Judiciário julgar a lide e aplicar a sanção
penal.
A prescrição da pretensão punitiva ocorre antes de a sentença final transitar em jul-
gado.
Para saber qual o prazo de prescrição da pretensão abstrata punitiva devemos verificar o
limite máximo da pena imposta em abstrato no preceito sancionador e enquadrá-lo em um dos
incisos do art. 109 do CP.
Ex.: suponha-se que um sujeito cometa um crime de lesão corporal leve (pena de 3 meses
a 1 ano), não se descobrindo a autoria. Se o Estado, dentro de 4 (quatro) anos, não exercer o
direito de punir, opera-se a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva.
Aplica-se o disposto no art. 109.
No concurso de crimes (concurso material, formal e continuado), a prescrição atinge a
pretensão punitiva em relação a cada infração considerada isoladamente (art. 119 do CP).
b) Termos iniciais da prescrição da pretensão punitiva (art. 111 do CP)
O primeiro termo inicial é a data da consumação do delito (I). Constitui exceção à teoria
da atividade, pois, na prescrição, adota-se a teoria do resultado.
No caso da tentativa (II), o termo a quo da prescrição da pretensão punitiva é o dia da

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cessação da atividade criminosa.


No crime permanente (III), a prescrição começa a correr do dia em que cessou a per-
manência (art. 111, III, 1a figura, do CP). Ex.: suponha-se que a vítima de sequestro permaneça
presa durante 30 dias. A prescrição começa a correr a partir do dia em que conseguiu a liberdade.
No crime continuado, a prescrição deve ser considerada em relação a cada crime, iso-
ladamente (art. 119).
Nos crimes de bigamia e de falsificação ou alteração de assentamento de registro civil
(arts. 235 e 299, par. ún.), a prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhe-
cido de qualquer autoridade pública (art. 111, IV).
Com o advento da Lei no 14.344, de 24-5-2022, o legislador alterou a redação do art. 111,
V, do CP. Agora, além de crimes contra a dignidade sexual contra crianças e adolescentes, o
termo inicial do prazo prescricional a partir do momento em que a vítima completar 18 anos
também contempla qualquer crime que envolva violência contra crianças e adolescentes. Eis a
nova redação do inciso V do art. 111 do CP: “V – nos crimes contra a dignidade sexual ou que
envolvam violência contra a criança e adolescente, previstos neste Código ou em legislação es-
pecial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver
sido proposta a ação penal”.
Nesse sentido, se uma criança de 10 anos for vítima de crime de estupro de vulnerável,
por exemplo, ou qualquer outro crime praticado com violência, e a ação ainda não tiver sido
instaurada, o prazo prescricional passará a correr a partir da data em que ela completar 18 anos.

9.4.5.2. Prescrição da pretensão punitiva retroativa (art. 110, § 1º, parte


final, do CP)
A prescrição retroativa tem por pressuposto o trânsito em julgado da sentença penal con-
denatória para a acusação. Com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para a
acusação, a base para calcular a prescrição se altera, passando a ser considerada a pena
aplicada na sentença. Nesse caso, deve-se considerar a pena aplicada na sentença e enquadrá-
la num dos incisos do art. 109 do CP para verificar o prazo prescricional.
Verificado o prazo prescricional com base na pena aplicada na sentença, a prescrição
retroativa deve ser considerada a partir da publicação da sentença ou acórdão condenatório para
trás. Por isso o nome retroativa, porque sua incidência é verificada entre os marcos interruptivos
existentes antes da sentença condenatória.
Nos crimes em geral, a prescrição da pretensão retroativa pode ocorrer entre a publicação

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da sentença ou acórdão condenatório e o recebimento da denúncia ou queixa.


No contexto dos crimes de competência do Tribunal do Júri, a prescrição retroativa pode
incidir: a) entre a data da publicação da sentença condenatória e decisão confirmatória da
pronúncia; b) entre a decisão confirmatória da pronúncia até a decisão de pronúncia; c) entre a
pronúncia e o recebimento da denúncia.

9.4.5.3. Prescrição da pretensão punitiva intercorrente ou superveniente


à sentença condenatória (art. 110, § 1º, do CP)
Sendo espécie de prescrição da pretensão punitiva, a prescrição da pretensão punitiva
intercorrente incide somente antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória
para todos.
Como visto, nos termos do que dispõe o art. 109, caput, do CP, a prescrição da pretensão
punitiva, salvo a exceção do § 1º do art. 110, é regulada pelo máximo da sanção privativa de
liberdade.
Há, porém, no art. 110, § 1º, uma primeira exceção: caso em que, não obstante se tratar
de prescrição da pretensão punitiva, transitando em julgado a sentença condenatória para
a acusação, ou sendo improvido o seu recurso, a partir da sua publicação começa a correr o
prazo prescricional regulado pela pena concreta.
Ex.: suponha-se que o réu venha a ser condenado a 2 (dois) anos de detenção, tendo
transitado em julgado a sentença para a acusação. Sendo a pena aplicada de 2 (dois) anos, o
prazo prescricional é de 4 (quatro) anos (art. 109, V, do CP). O réu interpôs recurso de apelação,
que, passados quatro anos, ainda não havia sido julgado pelo Tribunal. No caso, passados
quatro anos da data da publicação da sentença sem que o recurso interposto pela defesa tenha
sido apreciado, ocorrerá a prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente, pre-
vista no art. 110, § 1º, do CP.

9.4.6. Prescrição da pretensão executória (art. 110, caput, do CP)


9.4.6.1. Conceito
Na prescrição da pretensão executória, o decurso do tempo sem o seu exercício faz com
que o Estado perca o direito de executar a sanção imposta na sentença condenatória.
A prescrição da pretensão executória incide após o trânsito em julgado da sentença con-
denatória.

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Direito Penal

Nos termos do caput do art. 110, a prescrição, depois de transitar em julgado a sentença
condenatória, regula-se pela pena imposta na sentença e verifica-se nos prazos fixados no art.
109, os quais aumentam de 1/3 se o condenado é reincidente.
Ex.: suponha-se que o agente tenha sido condenado irrecorrivelmente a 4 (quatro) anos
de reclusão pela prática do delito de roubo simples (art. 157 do CP). O prazo prescricional, con-
siderando a pena aplicada, será de 8 (oito) anos (art. 109, IV, do CP). Nesse caso, se o Estado
não iniciar a execução da pena dentro de 8 (oito) anos, opera-se a extinção da punibilidade pela
prescrição da pretensão executória. Aplica-se o disposto no art. 110 do CP.
Ex.: réu condenado a 1 (um) ano de reclusão: prazo da prescrição executória: 4 (quatro)
anos (art. 109, V).
Tratando-se de reincidente, o prazo da prescrição da pretensão executória da pena priv-
ativa de liberdade é aumentado de 1/3 (art. 110, caput, in fine). Para tanto, é necessário que a
sentença condenatória tenha reconhecido a reincidência.
No concurso material e formal, cada delito tem seu prazo prescricional ISOLADO, ainda
que as penas tenham sido impostas na mesma sentença (art. 119 do CP).

9.4.6.2. Termos iniciais da prescrição da pretensão executória (art. 112


do CP)
a) do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou
a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional
Cumpre observar: a prescrição da pretensão executória depende de uma condição: o
trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação e defesa. Satisfeita a con-
dição, entretanto, na contagem do prazo, leva-se em conta a data em que transitou em jul-
gado para a acusação, nos termos do artigo 112, I, do CP. Convém sinalar, no entanto, que o
STF e o STJ consideram que o termo inicial seria a data do trânsito em julgado para todos.
b) do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção
deva computar-se na pena.
Interrompida a execução da pena pela fuga do condenado, inicia-se a contagem do
prazo prescricional da prescrição executória (art. 112, II, 1ª parte, do CP).
Nos casos dos arts. 41 e 42 do CP (superveniência de doença mental ou internação em
hospital), em que se aplica o princípio da detração penal, embora interrompida a efetiva execução
da pena, não corre a prescrição (art. 112, II, 2ª parte).

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

9.4.6.3. Prescrição no caso de evasão do condenado ou de revogação


do livramento condicional (art. 113 do CP)
Ex.: suponha-se que o detento fuja faltando 2 (dois) anos para o cumprimento da pena. A
partir da data da fuga começa a correr a prescrição da pretensão executória (art. 112, II, 1a
parte), ocorrendo em 4 (quatro) anos (art. 109, V, do CP). Ou seja, se nesse período de quatro
anos o apenado não for localizado para dar continuidade ao cumprimento da pena, ocorrerá a
prescrição da pretensão executória.

9.4.7. Causas suspensivas da prescrição


O Código Penal prevê causas impeditivas ou suspensivas da prescrição (art. 116), dis-
tintas das causas interruptivas (art. 117). Na suspensão da prescrição, o tempo decorrido antes
da causa é computado no prazo; na interrupção, o tempo decorrido antes da causa não é com-
putado no prazo, que recomeça a correr por inteiro.

9.4.7.1. Causas suspensivas da prescrição punitiva


a) Enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o
reconhecimento da existência do crime
Nos termos do art. 116, I, do CP, a prescrição não corre enquanto não resolvida, em outro
processo, questão de que depende o reconhecimento da existência do crime (questão prejudi-
cial, tratada nos arts. 92 a 94 do CPP).
b) Enquanto o agente cumpre pena no exterior
A segunda causa suspensiva é prevista no art. 116, II, do CP: antes de passar em julgado
a sentença final, a prescrição não corre enquanto o agente cumprir pena no estrangeiro. Não
impede o decurso do prazo prescricional, entretanto, estar o sujeito cumprindo pena, em razão
de outro processo, no Brasil.
c) Na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos Tribunais Superi-
ores, quando inadmissíveis
A Lei no 13.964/2019 introduziu mais uma causa suspensiva da prescrição, visando a
dificultar a incidência da prescrição da pretensão punitiva na pendência de recursos interpostos
perante os Tribunais Superiores.
Assim, enquanto tramitam os embargos de declaração ou recursos aos Tribunais Superi-
ores, o prazo prescricional ficará suspenso, aguardando julgamento inadmissível, sendo

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

considerado o período de suspensão do prazo prescricional, se inadmissíveis os recursos.


d) Enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não persecução penal
Trata-se de outra causa suspensiva da prescrição introduzida pela Lei no 13.964/2019.
Durante o período relativo ao acordo de não persecução penal, o prazo prescricional ficará
suspenso.

9.4.7.2. Causas suspensivas da prescrição da pretensão executória (art.


116, par. ún., do CP)
Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante
o tempo em que o condenado está preso por outro motivo.
Ex.: suponha-se que o sujeito seja condenado em duas comarcas, iniciando o cumpri-
mento da pena imposta na ação penal de uma delas. Enquanto está cumprindo a pena, não corre
a prescrição da pretensão executória em relação à outra condenação.

9.4.8. Causas interruptivas da prescrição (art. 117 do CP)


Ocorrendo uma causa interruptiva, o curso da prescrição interrompe-se, desaparecendo
o lapso temporal já decorrido, recomeçando sua contagem desde o início.
A incidência das causas do art. 117, salvo a do inciso V, faz com que seja extinto o prazo
decorrido antes da interrupção, recomeçando a correr a prescrição por inteiro (§ 2º).

9.4.8.1. Pelo recebimento da denúncia ou da queixa


O recebimento da denúncia interrompe o prazo prescricional, recomeçando a correr a
prescrição da pretensão punitiva por inteiro, não se levando em conta o tempo já decorrido antes
da interrupção.

9.4.8.2. Pela pronúncia


A pronúncia também interrompe a prescrição (art. 117, II). A decisão do juiz tem força de
interromper a prescrição, ainda que o réu venha a ser absolvido no Júri.

9.4.8.3. Pela decisão confirmatória da pronúncia


Se o réu recorre da pronúncia e o Tribunal confirma, o Acórdão também interrompe a
prescrição (art. 117, III, do CP), o mesmo ocorrendo quando é impronunciado (art. 409, caput,

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
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do CPP) ou absolvido sumariamente (art. 411 do CPP) e o tribunal o pronuncia.

9.4.8.4. Pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recor-


ríveis
O art. 117, IV, do CP determina que a prescrição se interrompe pela sentença condenató-
ria recorrível. A interrupção ocorre na data da publicação da sentença, i.e., no dia em que o
escrivão recebe a sentença do juiz e a junta aos autos, independentemente do registro e de
outras diligências.
O acórdão condenatório, ainda que não unânime, e por isso sujeito a embargos in-
fringentes, também interrompe o prazo prescricional da pretensão punitiva. Isso ocorre quando,
tendo sido absolvido em primeiro grau, o réu vem a ser condenado pelo acórdão do tribunal.
Trata-se de acórdão recorrível.

9.4.8.5. Pelo início ou continuação do cumprimento da pena


Iniciando-se o prazo da prescrição da pretensão executória com o trânsito em julgado da
sentença condenatória, interrompe-se pelo começo do cumprimento da pena. Fugindo o conde-
nado, a prescrição começa a correr da data da fuga (art. 112, II, 1ª parte), regulando-se pelo
tempo que resta da pena (art. 113). Recapturado, interrompe-se a prescrição.

9.4.8.6. Pela reincidência


A reincidência somente interrompe o prazo da prescrição da pretensão executória,
sendo inaplicável à prescrição da pretensão punitiva (art. 109). Nesse sentido, a Súm. no
220 do STJ: “A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva”.

10. Crimes contra a vida

Prof. Arnaldo Quaresma


@profarnaldoquaresma
10.1. Homicídio
O homicídio consiste na eliminação da vida humana extrauterina provocada por outra pes-
soa. A eliminação da vida intrauterina (feto) caracteriza o delito de aborto.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

10.1.1. Homicídio privilegiado (art. 121, § 1º, do CP)


O art. 121, § 1º, do CP descreve o homicídio privilegiado como o fato de o sujeito cometer
o delito impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta
emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. Neste caso, o juiz pode reduzir a pena
de 1/6 a 1/3.
Motivo de relevante valor social: ocorre quando a causa do delito diz respeito a um
interesse coletivo. A conduta, então, é ditada em face de um interesse que diz respeito a todos
os cidadãos de uma coletividade. Ex.: pai desesperado pelo vício que impregna seu filho e vários
outros alunos, mata um traficante que distribui drogas num colégio, sem qualquer ação eficaz da
polícia para contê-lo.
Motivo de relevante valor moral: diz respeito a um interesse particular, de ordem pes-
soal. Será motivo de relevante valor moral aquele que, em si mesmo, é aprovado pela ordem
moral, pela moral prática, por exemplo, a compaixão ou piedade diante do irremediável sofri-
mento da vítima.
Sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima:
o texto legal exige, ainda, que o impulso emocional e o ato dele resultante se sigam imedi-
atamente à provocação da vítima, ou seja, tem de haver a imediatidade entre a provocação in-
justa e a conduta do sujeito.

10.1.2. Homicídio qualificado (art. 121, § 2º, do CP)


O art. 121, § 2º, do CP prevê circunstâncias que qualificam o crime de homicídio, quando
é cometido: a) mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; b) motivo
fútil; c) com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel,
ou de que possa resultar perigo comum; d) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação
ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; e) para assegurar a
execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime; f) feminicídio; g) contra agente
de segurança pública; h) com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido.
Merece especial destaque a qualificadora do feminicídio. Não basta a vítima ser mulher
para incidir a qualificadora do feminicídio, é preciso que o crime tenha sido praticado no contexto
de violência doméstica e familiar ou por menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
Assim, se, por exemplo, o agente matar uma mulher apenas porque é torcedora do Sport Clube
Internacional, não incide a qualificadora do feminicídio, já que o crime não foi praticado em razão

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

de a vítima ser do sexo feminino, podendo incidir outra qualificadora, como a do motivo fútil.
Trata-se, nesse caso, de femicídio e não de feminicídio.
Também merece destaque a qualificadora do homicídio funcional (art. 121, § 2º, VII, do
CP). A qualificadora alcança integrantes dos órgãos de segurança pública, bem como seus
parentes consanguíneos até terceiro grau, desde que o homicídio tenha sido praticado no exer-
cício da função ou em decorrência dela. Ou seja, para incidir a qualificadora, o homicídio deve
estar necessariamente vinculado à função desempenhada pelo agente de segurança pública.
A Lei no 14.344/2022 introduziu mais uma qualificadora ao crime de homicídio, quando se
tratar de vítima menor de 14 anos de idade (art. 121, § 2º, IX). Com isso, encontra-se tacitamente
revogada a segunda parte do art. 121, § 4º, do CP, no que se refere à majorante em face de a
vítima ser menor de 14 anos de idade. Além disso, passou a prever novas causas de aumento
de pena. Nos termos do art. 121, § 2º-B, do CP, a pena do homicídio contra menor de 14 anos é
aumentada de: “I – 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é pessoa com deficiência ou com
doença que implique o aumento de sua vulnerabilidade; II – 2/3 (dois terços) se o autor é as-
cendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou
empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela”.

10.1.3. Homicídio privilegiado-qualificado


Perfeitamente possível a coexistência do homicídio privilegiado e as qualificadoras de na-
tureza objetiva, já que relacionadas ao fato praticado, por exemplo, o meio e o modo de ex-
ecução.
As qualificadoras relacionadas ao motivo torpe (inciso I) ou fútil (inciso II), bem como à
conexão com outro crime (inciso V) ou ao fato de a vítima integrar órgão de segurança pública
(VII), são consideradas de natureza subjetiva. Isso porque não estão vinculadas diretamente ao
fato praticado, mas a condições ou características subjetivas ou pessoais, como a motivação, ou
em relação à pessoa da vítima. Até mesmo o crime de homicídio por conexão é de natureza
subjetiva, pois guarda relação com o motivo do crime, ou seja, o agente desenvolve a conduta
homicida para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime.
As qualificadoras relacionadas aos meios (inciso III) ou modos (IV) de execução, bem
como a do feminicídio (VII), são consideradas de natureza objetiva. As duas primeiras, porque
relacionadas diretamente ao fato praticado, não havendo qualquer vinculação com carac-
terísticas ou condições pessoais da vítima.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

10.1.4. Homicídio culposo (art. 121, § 3º, do CP)


É um tipo penal aberto, que depende, pois, da interpretação do juiz para poder ser
aplicado. A culpa, conforme o art. 18, II, do CP, é constituída de “imprudência, negligência ou
imperícia”. Portanto, matar alguém por imprudência, negligência ou imperícia concretiza o tipo
penal incriminador do homicídio culposo. Ex.: ao manejar arma carregada para limpá-la, o agente
aciona, imprudentemente, o gatilho e mata uma pessoa que está ao seu lado.

10.1.5. Perdão judicial (art. 121, § 5º, do CP)


É a clemência do Estado, que deixa de aplicar a pena prevista para determinados delitos,
em hipóteses expressamente previstas em lei.
Somente ao autor do homicídio culposo pode-se aplicar a clemência, desde que ele tenha
sofrido com o crime praticado uma consequência tão séria e grave que a sanção penal se torne
desnecessária.
Ex.: o pai que provoca a morte do próprio filho, num acidente fruto de sua imprudência, já
teve punição mais do que severa. A dor por ele experimentada é mais forte do que qualquer pena
que se lhe pudesse aplicar. Por isso, surge a hipótese do perdão. O crime existiu, mas a puni-
bilidade é afastada.

10.2. Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação


10.2.1. Conceito de suicídio e automutilação
O suicídio decorre da conduta voluntária e consciente da própria vítima, que, por ato pos-
itivo ou negativo, busca eliminar a sua vida. É o chamado autocídio ou autoquíria.
A automutilação decorre da conduta voluntária e consciente da própria vítima, que, por
ato positivo ou negativo, busca provocar lesão em si própria. Nesse caso, a vítima não tem a
intenção de eliminar a sua própria vida, mas de provocar autolesão, por exemplo, produzir cortes
na pele, amputar alguma parte do corpo, bater com a cabeça na parede, utilizar fogo para
queimar parte da pele.
Portanto, o crime consiste no fato de o agente induzir, instigar ou prestar auxílio a suicídio
ou automutilação. Em outras palavras, constitui crime a conduta voltada a fazer com que a vítima
pratique atos executórios para eliminar sua própria vida ou provocar lesões em si mesma. Trata-
se, em síntese, do crime de participação em suicídio ou automutilação.

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Direito Penal

10.2.2. Consumação
Com as alterações introduzidas pela Lei no 13.968/2019, o delito de participação em sui-
cídio ou automutilação passou a ser crime formal, não mais exigindo para a sua consumação a
produção do resultado naturalístico morte ou lesão corporal de natureza grave.
Agora, para a consumação do delito, basta a conduta de induzir, instigar ou prestar auxílio
ao suicídio ou à automutilação, ainda que resulte lesão corporal de natureza leve ou não resulte
qualquer lesão. Nesse caso, o agente responderá pelo crime de participação em suicídio ou
automutilação na sua modalidade simples, nos termos do art. 122, caput, do CP.
A participação em suicídio ou automutilação com resultado lesão grave ou gravíssima,
bem como com resultado morte configuram o crime na modalidade qualificada (art. 122, §§ 1° e
2º, do CP).

10.2.3. Figuras qualificadoras


A Lei no 13.968/2019 introduziu no ordenamento jurídico duas qualificadoras do crime de
participação em suicídio ou automutilação: a) se resultar lesão corporal de natureza grave ou
gravíssima; b) se resultar morte.
Nos termos do art. 122, § 1º, do CP, se da automutilação ou da tentativa de suicídio resulta
lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena será de 1 (um) a 3 (três) anos.
Se da indução, instigação ou auxílio ao suicídio ou automutilação resultar qualquer um
dos resultados previstos no art. 129, §§ 1º e 2º, do CP, incidirá a qualificadora do crime de par-
ticipação em suicídio ou automutilação (art. 122, § 1º, do CP); ausente qualquer circunstância
que qualifica a lesão corporal, o crime será de participação em suicídio ou automutilação, na sua
modalidade simples (art. 122, caput).
Nos termos do art. 122, § 2º, do CP, se o suicídio se consuma ou se da automutilação
resulta morte, a pena será de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
Se o agente, de forma dolosa, induzir, instigar ou auxiliar a vítima a eliminar a sua própria
vida, o que efetivamente vem a ocorrer, responderá pelo crime de participação em suicídio na
sua forma qualificada.
O crime de participação em automutilação com resultado morte necessariamente é
preterdoloso. Isso porque estará presente o dolo na conduta de induzir, instigar ou auxiliar a
automutilação, ao passo que o resultado morte decorre de culpa. Se o agente desejasse ou
assumisse o risco em relação ao resultado morte, o crime seria de participação em suicídio e
não em automutilação.

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Direito Penal

10.2.4. Causas de aumento de pena


O art. 122, §§§ 3º, 4º e 5º, do CP prevê circunstâncias que elevam a pena do crime de
participação em suicídio. A pena será duplicada se o crime é praticado por motivo egoístico,
torpe ou fútil, ou se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de
resistência (art. 122, § 3º, I e II). A pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por
meio da rede de computadores, de rede social ou transmitida em tempo real (art. 122, § 4º). Au-
menta-se a pena em metade se o agente é líder ou coordenador de grupo ou de rede virtual (art.
122, § 5º).

10.2.5. Vítima menor de 14 anos ou contra quem não tem discernimento


para a prática do ato
Nos termos do art. 122, § 6º, do CP: “Se o crime de que trata o § 1º deste artigo resulta
em lesão corporal de natureza gravíssima e é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou
contra quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a
prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o
agente pelo crime descrito no § 2º do art. 129 deste Código”.
Logo, se a vítima for menor de 14 anos de idade, e se resultar lesão corporal gravíssima,
o agente responderá pelo crime descrito no art. 129, § 2º, do CP (art. 122, § 6º, in fine, do CP).
Também responderá pelo crime de lesão corporal gravíssima se a vítima for acometida
de enfermidade ou deficiência mental, e, por essa razão, não tem o necessário discernimento
para a prática do ato. Não basta, pois, que a vítima seja portadora de enfermidade ou deficiência
mental, sendo necessário que, em razão disso, não tenha qualquer discernimento para o ato.
Se a enfermidade ou deficiência mental não tem a potencialidade de retirar a plena ca-
pacidade de discernimento da vítima, o agente responderá pelo crime de participação em auto-
mutilação, se resultar lesão grave ou gravíssima, nos termos do art. 122, § 1º, do CP.
O art. 122, § 6º, faz expressa remissão somente ao art. 129, § 2º, do CP. Nesse contexto,
se da tentativa de suicídio ou da automutilação resultar lesão corporal grave em vítima menor de
14 anos de idade, portadora de enfermidade ou deficiência mental sem o necessário discerni-
mento ou sem qualquer capacidade de resistência, forçoso concluir que o agente responderá
pelo crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio ou automutilação qualificado, com a
pena aumentada em dobro (art. 122, §§ 1º e 3º, II, do CP).
Conforme o art. 122, § 7º, do CP, se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta

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Direito Penal

morte, e o crime tiver sido praticado contra vítima menor de 14 anos ou contra quem não tem o
necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode
oferecer resistência, responde o agente pelo crime de homicídio, nos termos do art. 121 do CP.

10.3. Infanticídio (art. 123 do CP)


10.3.1. Conceito
Trata-se de homicídio cometido pela mãe contra seu filho, nascente ou recém-nascido,
sob a influência do estado puerperal.
Estado puerperal é o estado que envolve a mulher durante o parto. Há profundas al-
terações psíquicas e físicas, que chegam a transtornar a mãe, deixando-a sem plenas condições
de entender o que está fazendo.

10.3.2. Sujeitos do delito


A autora do infanticídio só pode ser a mãe. Cuida-se de crime próprio, uma vez que não
pode ser cometido por qualquer autor.
O tipo penal exige qualidade especial do sujeito ativo. Entretanto, isso não impede que
terceiro responda por infanticídio diante do concurso de agentes.
Sujeito passivo é o neonato ou nascente, de acordo com a ocasião da prática do fato:
durante o parto ou logo após.
Antes do parto, o sujeito passivo será o feto, caracterizando, portanto, o delito de aborto.
Segundo boa parte da doutrina, estando a mulher sob influência do estado puerperal,
responde ela por infanticídio, delito que também será atribuído aos eventuais concorrentes do
fato, uma vez que se trata de circunstância de caráter pessoal que constitui elementar do crime.
Logo, comunica-se aos coautores ou partícipes, nos termos do art. 30 do CP.

10.4. Aborto (arts. 124 a 128 do CP)


10.4.1. Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (art.
124)
Trata-se de crime de mão própria, pois somente a gestante pode realizá-lo; contudo, isso
não afasta a possibilidade de participação no crime em questão.
Na primeira figura, é a própria mulher quem executa a ação material do crime, ou seja, ela
própria emprega os meios ou manobras abortivas em si mesma. Se um terceiro executar ato de

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provocação do aborto, não será partícipe do crime do art. 124 do CP, mas, sim, autor do fato
descrito no art. 126 (provocação do aborto com consentimento da gestante).
Na segunda figura, a mulher apenas consente na prática abortiva, mas a execução mate-
rial do crime é realizada por terceira pessoa. Em tese, a gestante e o terceiro deveriam responder
pelo delito do art. 124. Contudo, o Código Penal prevê uma modalidade especial de crime para
aquele que provoca o aborto com o consentimento da gestante (art. 126).

10.4.2. Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante


(art. 125 do CP)
Trata-se de forma mais gravosa do delito de aborto.
Ao contrário da figura típica do art. 126, não há o consentimento da gestante no emprego
dos meios ou manobras abortivas por terceiro. Aliás, a ausência de consentimento constitui ele-
mentar do tipo penal.
As formas de dissentimento estão retratadas no parágrafo único do art. 126:
a) dissentimento presumido: é necessário que a gestante tenha capacidade para consen-
tir, não se tratando de capacidade civil. Para o Código Penal, quando a vítima não é maior de 14
anos ou é alienada mental, não possui consentimento válido, levando à consideração de que o
aborto se deu contra a sua vontade;
b) dissentimento real: quando o agente emprega violência, grave ameaça ou mesmo
fraude, é natural supor que extraiu o consentimento da vítima à força, de modo que o aborto
necessita se encaixar na figura do art. 125.

10.4.3. Aborto consensual (art. 126)


Para que se caracterize a figura do aborto consentido (art. 126), é necessário que o con-
sentimento da gestante seja válido, isto é, que ela tenha capacidade para consentir. Ausente
essa capacidade, o delito poderá ser outro (art. 125).
Trata-se de uma exceção à teoria monista. O legislador, para punir mais severamente o
terceiro que provoca o aborto, criou o art. 126, aplicando a teoria pluralista do concurso de pes-
soas.

10.4.4. Aborto legal (art. 128)


a) Aborto necessário ou terapêutico

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É a interrupção da gravidez realizada pelo médico quando a gestante estiver correndo


perigo de vida e inexistir outro meio para salvá-lo.
A excludente da ilicitude em estudo do crime de aborto somente abrange a conduta do
médico. Não obstante isso, a enfermeira, ou parteira, não responderá pelo delito em questão se
praticar o aborto por força do art. 24 do CP (estado de necessidade, no caso, de terceiro).
b) Aborto humanitário, sentimental ou piedoso
O aborto humanitário, também denominado ético ou sentimental, é autorizado quando a
gravidez é consequência do crime de estupro e a gestante consente na sua realização. A lei não
exige autorização judicial, processo judicial ou sentença condenatória contra o autor do crime de
estupro para a prática do aborto sentimental. Basta prova idônea do atentado sexual.

11. Lesão Corporal (art. 129 do CP)

11.1. Lesão corporal leve ou simples (art. 129, caput)


A definição de lesão corporal leve é formulada por exclusão, ou seja, configura-se quando
não ocorre nenhum dos resultados previstos nos §§ 1º, 2º e 3º do art. 129.

11.2. Lesão corporal grave (art. 129, § 1º)


A lesão corporal de natureza grave (ou mesmo a gravíssima) é uma ofensa à integridade
física ou à saúde da pessoa humana, considerada muito mais séria e importante do que a lesão
simples ou leve.
a) Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias
Deve-se compreender como tal toda e qualquer atividade regularmente desempenhada
pela vítima, e não apenas a sua ocupação laborativa, enquadrando-se, inclusive, as atividades
de lazer.
b) Perigo de vida
É a concreta possibilidade de a vítima morrer em face das lesões sofridas.
A doutrina e a jurisprudência majoritária consideram que, neste caso, somente pode haver
dolo na conduta antecedente (lesão corporal) e culpa no tocante ao resultado mais grave (perigo
de vida), pois, havendo dolo em ambas as fases, haverá tentativa de homicídio.
Portanto, o tipo só admite o preterdolo, uma vez que, se houver dolo quanto ao perigo de
vida, o agente responderá por tentativa de homicídio.

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c) Debilidade permanente de membro, sentido ou função


Não se exige que seja uma debilidade perpétua, bastando que tenha longa duração.
Ex.: perda de um dos dedos (membro); perda da visão de um dos olhos (sentido); perda
de um dos rins é debilidade permanente e não perda de função, pois se trata de órgão duplo.
d) Aceleração de parto
Significa antecipar o nascimento da criança antes do prazo normal previsto pela medicina.
Nesse caso, é indispensável o conhecimento da gravidez pelo agente.
Se, em virtude da lesão corporal praticada contra a mãe, a criança nascer morta, terá
havido lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2º, V, do CP).

11.3. Lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2º)


Todas as circunstâncias qualificadoras elencadas neste parágrafo são tanto dolosas
quanto preterdolosas, com exceção da circunstância contida no inciso V (aborto), que é neces-
sariamente preterdolosa.
a) Incapacidade permanente para o trabalho
Trata-se de inaptidão duradoura para exercer qualquer atividade laborativa lícita. A per-
manência não significa perpetuidade.
Nesse contexto, diferentemente da incapacidade para as ocupações habituais, exige-se
atividade remunerada, que implique sustento, portanto, acarrete prejuízo financeiro para o ofen-
dido.
b) Enfermidade incurável
É a doença irremediável, de acordo com os recursos da medicina na época do resultado,
causada na vítima.
c) Perda ou inutilização do membro, sentido ou função
Perda implica destruição ou privação de algum membro (ex.: corte de um braço), sentido
(ex.: aniquilamento dos olhos) ou função (ex.: ablação da bolsa escrotal, impedindo a função
reprodutora).
No tocante a órgãos duplos, ter-se-á a perda quando houver a supressão de ambos, por
exemplo, cegueira ou surdez total. Nessa hipótese, há a perda total da visão ou audição. Quando
se der a supressão de apenas um órgão, estaremos diante da hipótese de debilidade (art. 129,
§ 1º, III, do CP), pois a função não foi totalmente abolida, por exemplo, surdez em apenas um
dos ouvidos.
d) Deformidade permanente

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Deformidade é o dano estético de certa monta. Permanente é a deformidade indelével,


irreparável. Entende-se por irreparável a deformidade que não é passível de ser corrigida pelo
transcurso do tempo. Ex.: perda de orelhas, mutilação grave do nariz, entre outros.
e) Aborto
Nesta hipótese, o agente, ao lesionar a vítima, não quer nem mesmo assumir o risco do
advento do resultado agravador aborto.
Portanto, para que possa se caracterizar a qualificadora da lesão corporal gravíssima, não
pode ter sido objeto de dolo do agente, pois, nesse caso, terá de responder pelos dois crimes,
lesão corporal e aborto, em concurso formal impróprio, ou, ainda, por aborto qualificado, se a
lesão em si mesma for grave.

11.4. Lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3°)


O evento morte não deve ser desejado, nem ter o agente assumido o risco de causá-lo,
sob pena de responder pelo crime de homicídio. Em outras palavras, trata-se de típico crime
preterdoloso, em que o agente desenvolve conduta com dolo em relação a determinado re-
sultado, mas, por culpa, acaba produzindo resultado mais grave.
No caso, o agente age com dolo em relação à lesão corporal, mas acaba produzindo,
involuntariamente, a morte da vítima.
A tentativa é inadmissível, pois o crime preterdoloso envolve a forma culposa e esta é
totalmente incompatível com a figura da tentativa.

11.5. Violência doméstica (art. 129, § 9º)


Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro,
ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações
domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, a pena será de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
Diversamente do que possa parecer, a qualificadora prevista no art. 129, § 9º, do CP não
se limita a alcançar apenas vítima mulher, incidindo ainda que a vítima seja homem, por exemplo,
a agressão praticada pelo agente contra o irmão.
O art. 129, § 9º, do CP incide se a lesão corporal for de natureza leve. Se for grave,
gravíssima ou seguida de morte, incidirá, ainda, causa de aumento de pena em 1/3, nos termos
do art. 129, § 10.

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11.6. Lesão corporal contra a agente de segurança pública (art. 129,


§ 12, do CP)
Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da
CF/1988, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exer-
cício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente con-
sanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços.
Trata-se de crime hediondo, conforme se extrai do art. 1º, I-A, da Lei no 8.072/1990.

11.7. Lesão corporal no contexto de violência doméstica e familiar con-


tra a mulher (art. 129, §13, do CP)
Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos
termos do §2º-A do art. 121 do CP, a pena será de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

12. Crimes contra a honra

12.1. Calúnia (art. 138 do CP)


Calúnia é o fato de atribuir a outrem, falsamente, a prática de fato definido como crime. O
Código Penal tutela a honra objetiva (reputação).
A lei exige, expressamente, que o fato atribuído seja definido como crime. O fato criminoso
deve ser determinado, ou seja, um caso concreto. É fundamental, para a existência de calúnia,
que a imputação de fato definido como crime seja falsa. Se o fato for verdadeiro, não há que se
falar em crime de calúnia.
O momento consumativo da calúnia ocorre no instante em que a imputação chega ao
conhecimento de um terceiro que não a vítima.
A calúnia verbal não admite a figura da tentativa. Ou o sujeito diz a imputação, e o fato
está consumado, ou não diz, e não há conduta relevante para o Direito Penal.
Já a calúnia escrita admite a tentativa. Ex.: o sujeito remete uma carta caluniosa e ela se
extravia. O crime não atinge a consumação, por intermédio do conhecimento do destinatário, por
circunstâncias alheias à vontade do sujeito.

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Direito Penal

12.2. Difamação (art. 139 do CP)


Difamar significa desacreditar publicamente uma pessoa, ofendendo sua reputação.
O legislador protege a honra objetiva (reputação). A exemplo do crime de calúnia, o bem
jurídico protegido é a honra, isto é, a reputação do indivíduo, a sua boa fama, o conceito que a
sociedade lhe atribui.
Dizer que uma pessoa é caloteira configura uma injúria, ao passo que espalhar o fato de
que ela não pagou aos credores “A”, “B” e “C”, quando as dívidas X, Y e Z venceram, configura
a difamação.
Considerando que não se enquadra no tipo penal que define a calúnia, já que exige im-
putação falsa de fato definido como crime, se o agente imputar falsamente fato definido como
contravenção, responderá pelo crime de difamação.
A difamação atinge o momento consumativo quando um terceiro, que não o ofendido,
toma conhecimento da imputação ofensiva à reputação.
Quanto à tentativa, é inadmissível, quando se trata de fato cometido por intermédio da
palavra oral. Tratando-se, entretanto, de difamação praticada por meio escrito, é admissível.

12.3. Injúria (art. 140 do CP)


Injúria é a ofensa à dignidade ou ao decoro de outrem.
Ao contrário dos delitos de calúnia e difamação, que tutelam a honra objetiva, o bem
protegido por essa norma penal é a honra subjetiva, que é constituída pelo sentimento próprio
de cada pessoa acerca de seus atributos morais (chamados de honra-dignidade), intelectuais e
físicos (chamados de honra-decoro).
Trata-se de crime formal. O crime consuma-se quando o sujeito passivo toma ciência da
imputação ofensiva, independentemente de o ofendido sentir-se ou não atingido em sua honra
subjetiva, sendo suficiente, tão só, que o ato seja revestido de idoneidade ofensiva.
A injúria, quando cometida por escrito, admite a tentativa; quando por meio verbal, não.
Nos termos do artigo 140, parágrafo 2 do CP se a injúria consiste em violência ou vias de
fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes haverá a injúria
real com pena de detenção de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à
violência.
Por sua vez, nos termos do artigo 140, parágrafo 3º CP (já com a redação atualizada pela
lei 14532 de 2023) se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a religião ou à
condição de pessoa idosa ou com deficiência haverá a injúria qualificada com pena de reclusão,

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Direito Penal

de 1 a 3 anos e multa.
Quando o agente se dirige a uma pessoa de determinada raça, insultando-a com argu-
mentos ou palavras de conteúdo pejorativo, responderá por injúria racial, nos termos do artigo
2º A da lei 7716 de 1989, com pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa não podendo alegar que
houve uma injúria simples, tampouco uma mera exposição do pensamento (como dizer que todo
“judeu é corrupto” ou que “negros são desonestos”), uma vez que não há limite para tal liberdade.
Assim, quem simplesmente dirigir a terceiro palavras referentes à “raça”, “cor”, “etnia” ou
“procedência nacional”, com o intuito de ofender, responderá por injúria racial nos termos do
dispositivo legal citado. Ademais, vale destacar que, nos termos do parágrafo único do artigo 2ºA
da Lei 7716 de 1989 a pena será aumentada de metade se o crime for praticado mediante o
concurso de duas ou mais pessoas

12.4. Ação penal


Conforme se extrai do art. 145 do CP, nos crimes contra a honra, a regra é a de ação
penal privada da vítima ou do seu representante legal. Todavia, resultando lesão física na vítima
(injúria real com lesão corporal), apura-se o crime mediante ação penal pública incondicionada.
No entanto, com o advento da Lei no 9.099/1995, alguns autores entendem que se trata de ação
penal pública condicionada à representação, já que é a prevista para os crimes de lesão corporal
leve.
Será penal pública condicionada à representação no caso de o delito ser cometido contra
funcionário público, no exercício das funções (art. 141, II), e condicionada à requisição do Min-
istro da Justiça no caso do inciso I do art. 141 (contra o Presidente da República ou Chefe de
Governo Estrangeiro).
Convém ressaltar:

Súm. no 714 do STF: É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do


Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime
contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções.

Além das causas de aumento de pena já previstas no art. 141 do CP, o legislador acres-
centou, por meio da Lei no 14.344/2022, mais uma majorante, aumentando-se de um terço, se
qualquer dos crimes contra a honra forem praticados contra criança, adolescente, pessoa maior
de 60 anos ou pessoa com deficiência (inciso IV), exceto na hipótese prevista no § 3º do art. 140
deste Código.

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Direito Penal

Por último, vale destacar que a injúria qualificada do parágrafo 3º do artigo 140 será de
ação penal pública condicionada à representação enquanto a injúria racial (art. 2º A da lei 7716
de 1989) será de ação penal pública incondicionada.

13. Crimes Contra o Patrimônio

13.1. Furto (art. 155 do CP)


13.1.1. Conceito
O crime de furto consubstancia-se no verbo subtrair, que significa tirar, retirar de outrem
bem móvel, sem a sua permissão, com o fim de assenhoramento definitivo. A subtração implica
sempre a retirada do bem sem o consentimento do possuidor ou proprietário.
É indispensável que o agente tenha a intenção de possuir a coisa alheia móvel, sub-
metendo-a ao seu poder, isto é, de não devolver o bem, de forma alguma. Assim, se ele o subtrai
apenas para uso transitório e depois o devolve no mesmo estado, não haverá a configuração do
tipo penal. Cuida-se, na hipótese, de mero furto de uso, que não constitui crime, pela ausência
do ânimo de assenhoramento definitivo do bem.

13.1.2. Consumação e tentativa


O furto atinge a consumação no momento em que o objeto material é retirado da esfera
de posse e disponibilidade do sujeito passivo, ingressando na livre disponibilidade do autor, ainda
que este não obtenha a posse tranquila. A subtração opera-se no exato instante em que o possui-
dor perde o poder e o controle sobre a coisa, tendo de retomá-la porque já não está mais consigo.
Pode-se usar, por analogia, o teor da Súm. no 582 do STJ, relativa ao roubo: consuma-
se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave
ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuper-
ação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.
A tentativa é admissível. Ocorre sempre que o sujeito ativo não consegue, por circunstân-
cias alheias à sua vontade, retirar o objeto material da esfera de proteção e vigilância da vítima,
submetendo-a à sua própria disponibilidade.

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Direito Penal

13.1.3. Furto noturno (art. 155, § 1º, do CP)


A causa de aumento de pena do repouso noturno só é aplicável ao furto simples, previsto
no caput do art. 155, tendo em vista a sua posição sistemática na construção do tipo penal. Não
se aplica, portanto, ao furto qualificado do § 4º.

13.1.4. Furto privilegiado (art. 155, § 2º, do CP)


A corrente majoritária sustenta ser de pequeno valor a coisa que não ultrapassa quantia
equivalente a um salário mínimo vigente à época do fato.

13.1.5. Furto qualificado (art. 155, § 4º, do CP)


13.1.5.1. Com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da
coisa
É necessário que o sujeito pratique violência contra “obstáculo” à subtração do objeto
material. A violência contra a coisa subtraída não qualifica o furto.

13.1.5.2. Com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou


destreza
a) Abuso de confiança
É a confiança que decorre de certas relações (que pode ser a empregatícia, a decorrente
de amizade ou parentesco) estabelecidas entre o agente e o proprietário do objeto. O agente,
dessa forma, aproveita-se da confiança nele depositada para praticar o furto, pois há menor vig-
ilância do proprietário sobre os seus bens.
b) Mediante fraude
É o ardil, artifício, meio enganoso empregado pelo agente para diminuir, iludir a vigilância
da vítima e realizar a subtração. São exemplos de fraude: agente que se disfarça de empregado
de empresa telefônica e logra entrar em residência alheia para furtar, ou agente que, a pretexto
de realizar compras em uma loja, distrai a vendedora, de modo a lograr apoderar-se dos objetos.
c) Mediante escalada
Escalada, que em direito penal tem sentido próprio, é a penetração no local do furto por
meio anormal, artificial ou impróprio, que demanda esforço incomum. Escalada não implica, nec-
essariamente, subida, pois tanto é escalada galgar alturas quanto saltar fossos, rampas ou
mesmo subterrâneos, desde que o faça para vencer obstáculos.

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Direito Penal

d) Mediante destreza
Consiste na habilidade física ou manual do agente que lhe permite o apoderamento do
bem sem que a vítima perceba. É a chamada punga. Tal ocorre com a subtração de objetos que
se encontrem junto à vítima, por exemplo, carteira, dinheiro no bolso ou na bolsa, colar etc., que
são retirados sem que ela note.
Importa dizer que se a vítima perceber a subtração no momento em que ela se realiza,
considera-se o furto tentado na forma simples, pois não há que se falar no caso em destreza do
agente (ex.: a vítima sente a mão do agente em seu bolso).

13.1.5.3. Com emprego de chave falsa


Chave falsa é qualquer instrumento de que se sirva o agente para abrir fechaduras, tendo
ou não formato de chave. Ex.: grampo, alfinete, prego, fenda, gazua etc.

13.1.5.4. Mediante concurso de duas ou mais pessoas


Se for praticado em concurso de pessoas, seja na condição de coautoria ou participação
e autoria, o furto será qualificado pelo concurso de pessoas.

13.1.5.5. Furto de veículo automotor (art. 155, § 5º, do CP)


Esta qualificadora diz respeito, especificamente, à subtração de veículo automotor. Con-
sideram-se como tal os automóveis, ônibus, caminhões, motocicletas, aeronaves, lanchas, jet-
skis. Para caracterizar essa qualificadora, afigura-se necessário que o veículo seja efetivamente
transportado para outro Estado ou exterior. Se não ultrapassar a fronteira do Estado ou do País,
essa qualificadora não incide, sendo o crime de furto simples, salvo se presente outra qualifica-
dora.

13.1.5.6. Emprego de explosivo que cause perigo comum


A Lei no 13.654/2018 acrescentou o § 4º-A do art. 155 do CP prevendo outra qualifica-
dora para o crime de furto, quando praticado com emprego de explosivo ou de artefato análogo
que causa perigo comum.
A partir da edição do Pacote Anticrime (Lei no 13.964/2019), o crime de furto com emprego
de explosivo ou de artefato análogo que causa perigo comum passou a ser considerado hediondo
(art. 1º, IX, da Lei no 8.072/1990).

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

13.1.5.7. Utilização de substâncias explosivas


A Lei no 13.654/2018 acrescentou também o § 7o do art. 155 do CP prevendo outra qual-
ificadora para o crime de furto, segundo o qual a pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez)
anos e multa se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou
isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.

13.1.5.8. Alterações promovidas pela Lei no 14.155/2021


Cumpre ressaltar que a Lei no 14.155/2021, que entrou em vigor em 27-5-2021, acres-
centou os §§ 4º-B e 4º-C ao art. 155 do CP:

§ 4º-B. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se o furto mediante


fraude é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou informático, conectado ou não à
rede de computadores, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a utilização
de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo. (Incluído pela Lei
no 14.155/2021)
§ 4º-C. A pena prevista no § 4º-B deste artigo, considerada a relevância do resultado gra-
voso: (Incluído pela Lei no 14.155/2021)
I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a
utilização de servidor mantido fora do território nacional; (Incluído pela Lei no 14.155/2021)
II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é praticado contra idoso ou vul-
nerável. (Incluído pela Lei no 14.155/2021)

13.2. Roubo (art. 157 do CP)


13.2.1. Conduta típica
A ação nuclear do tipo consubstancia-se no verbo subtrair, que significa tirar, retirar, de
outrem, no caso bem móvel. Agora, contudo, estamos diante de um crime mais grave que o furto,
na medida em que a subtração é realizada mediante o emprego de grave ameaça ou violência
contra a pessoa, ou por qualquer outro meio que reduza a capacidade de resistência da vítima.
Esta última hipótese constitui violência imprópria, consistente em outro meio que não constitua
violência física ou grave ameaça, por exemplo, fazer a vítima ingerir bebida alcoólica, narcóticos,
soníferos ou hipnotizá-la.

13.2.2. Roubo próprio e roubo impróprio


No roubo próprio, a violência ou a grave ameaça (ou a redução da impossibilidade de
defesa) são praticadas contra a pessoa para a subtração da coisa. Os meios violentos são em-
pregados antes ou durante a execução da subtração.

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Direito Penal

O roubo impróprio ocorre quando o sujeito, logo depois de subtraída a coisa, emprega
violência contra a pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a
detenção da coisa para ele ou para terceiro (art. 157, § 1º, do CP).
São exemplos típicos de roubo impróprio aquele em que o sujeito ativo, já se retirando do
portão com a res furtiva, alcançado pela vítima, abate-a (assegurando a detenção), ou, então, já
na rua, constata que deixou um documento no local, que o identificará, e, retornando para
apanhá-lo, agride o morador que o estava apanhando (garantindo a impunidade).

13.2.3. Consumação e tentativa


Nos termos da Súm. no 582 do STJ, “Consuma-se o crime de roubo com a inversão da
posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e
em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo pre-
scindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada”.

13.2.4. Causas especiais de aumento de pena: roubo majorado (circun-


stanciado) (art. 157, § 2º)
a) Se há o concurso de duas ou mais pessoas
Pode haver concurso material entre roubo majorado e quadrilha armada, pois os bens
jurídicos são diversos. Enquanto o tipo penal de roubo protege o patrimônio, o tipo da quadrilha
ou bando guarnece a paz pública.
b) Se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal cir-
cunstância
A pena é agravada se a vítima, por dever de ofício (caixeiro viajante, empresa de se-
gurança especialmente contratada para o transporte de valores), realiza serviço de transporte de
valores (dinheiro, joia etc.).
c) Se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro
estado ou para o exterior
Assim como no furto, esta majorante diz respeito, especificamente, à subtração de veículo
automotor. Consideram-se como tal os automóveis, ônibus, caminhões, motocicletas, aeronaves,
lanchas, jet-skis.
d) Se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade
Ocorre quando o agente restringe a liberdade da vítima por tempo superior ao necessário

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ou valendo-se de forma anormal para garantir a subtração planejada. Ex.: subjugando a vítima,
o agente, pretendendo levar-lhe o veículo, manda que entre no porta-malas, rodando algum
tempo pela cidade, até permitir que seja libertada ou o carro seja abandonado.
Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, a, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela
Lei no 13.964/2019).
e) Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca
Essa qualificadora foi introduzida pela Lei no 13.964/2019, e só terá incidência para fatos
praticados a partir da sua vigência, ou seja, fatos praticados a partir do dia 23-1-2020.
Arma branca é aquela em que o instrumento ou objeto é dotado de ponta ou gume, apto
a matar ou ferir uma pessoa, por exemplo, punhal e espada.
f) Se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou
isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego

13.2.5. Roubo com emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, do CP)
Importante alteração trazida pela Lei no 13.654/2018, na qual o roubo “com emprego de
arma” deixou de ser uma hipótese de roubo circunstanciado no art. 157, § 2º. Já o roubo com
emprego de arma de fogo continua sendo punido como roubo circunstanciado no art. 157, § 2º-
A, I, do CP.
Ou seja, o emprego de arma branca majora o crime de roubo de 1/3 até a metade, ao
passo que o emprego de arma de fogo majora o crime de roubo em 2/3.
A arma de brinquedo não serve para majorar a pena, uma vez que não causa à vítima
maior potencialidade lesiva. Pode, no entanto, gerar grave ameaça e, justamente por isso, servir
para configurar o tipo penal do roubo, na figura simples.
Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, b, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela
Lei no 13.964/2019).

13.2.6 Roubo com emprego de explosivo ou de artefato análogo que


cause perigo comum
Para caracterizar essa qualificadora, deve restar demonstrada a capacidade de o artefato
causar perigo comum, apto a causar risco a um número indeterminado de pessoas.
Curiosamente, o legislador considerou hediondo o crime de furto qualificado pelo emprego
de explosivo ou artefato análogo, mas não considera hediondo o crime de roubo com emprego

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Direito Penal

de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. Como, à evidência, não existe
analogia in malam partem no Direito Penal, essa omissão do legislador significa que não será
possível considerar esse tipo de roubo como hediondo.

13.2.7 Roubo qualificado pelo resultado (art. 157, § 3º, do CP)


Prevalece o entendimento doutrinário, que passou a admitir a possibilidade, indistinta-
mente, de o resultado agravador poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo, direto ou eventual.
a) Crime qualificado pelo resultado lesões graves
É uma das hipóteses de delito qualificado pelo resultado, que se configura pela presença
de dolo na conduta antecedente (roubo) e dolo ou culpa na conduta subsequente (lesões cor-
porais graves).
Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, c, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela
Lei no 13.964/2019).
b) Crime qualificado pelo resultado morte: LATROCÍNIO
O crime de latrocínio ocorre quando do emprego da violência física contra a pessoa com
o fim de subtrair o bem, ou para assegurar a sua posse ou a impunidade do crime, decorre a
morte da vítima. Tratando-se de crime qualificado pelo resultado, a morte da vítima ou de terceiro
tanto pode resultar de dolo (o assaltante atira na cabeça da vítima e a mata) quanto de culpa (o
agente desfere um golpe contra o rosto do ofendido para feri-lo, vindo, no entanto, a matá-lo).
Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, c, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela
Lei no 13.964/2019).

Súm. no 610 do STF: Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que
não realize o agente a subtração de bens da vítima.
Súm. no 603 do STF: A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz
singular e não do Tribunal do Júri.

13.3. Extorsão (art. 158 do CP)


13.3.1. Conduta típica
Extorsão é o fato de o sujeito constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça,
e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar
que se faça ou deixar de fazer alguma coisa.
A diferença em relação ao roubo concentra-se no fato de a extorsão exigir a participação
ativa da vítima fazendo alguma coisa, tolerando que se faça ou deixando de fazer algo em virtude

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da ameaça ou da violência sofrida.


A ação nuclear do tipo consubstancia-se no verbo constranger, que significa coagir, com-
pelir, forçar, obrigar alguém a fazer (ex.: quitar uma dívida não paga), tolerar que se faça (ex.:
permitir que rasgue um contrato) ou deixar de fazer alguma coisa (ex.: obrigar a vítima a não
propor ação judicial contra o agente).
O constrangimento pode ser exercido mediante o emprego de violência ou grave ameaça,
os quais podem atingir tanto o titular do patrimônio quanto pessoa ligada a ele (filhos, pai, mãe
etc.).

13.3.2. Consumação e tentativa


A extorsão atinge a consumação com a conduta típica imediatamente anterior à produção
do resultado visado pelo sujeito.
Para a consumação, portanto, o agente deve atingir o segundo estágio, isto é, a con-
sumação ocorre quando a vítima cede ao constrangimento imposto e faz ou deixa de fazer algo.
Esse é o entendimento que prevalece na doutrina. Nesse sentido, a Súm. no 96 do STJ: “O crime
de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida”.
A tentativa é admissível. Ocorre quando o sujeito passivo, não obstante constrangido pelo
autor por meio da violência física ou moral, não realiza a conduta positiva ou negativa pretendida,
por circunstâncias alheias à sua vontade.

13.3.3. Extorsão qualificada (art. 158, §§ 2º e 3º)


As duas hipóteses (lesão corporal grave ou morte) elencadas, como no roubo, caracteri-
zam condições de exasperação da punibilidade em razão da maior gravidade do resultado.
Inusitadamente, o legislador deixou de considerar hediondo o crime de extorsão qualifi-
cada pelo resultado morte, ao dar nova redação ao art. 1º, III, da Lei no 8.072/1990, que passou
a prever como crime hediondo somente a extorsão qualificada pela restrição da liberdade da
vítima, ocorrência de lesão corporal ou morte (art. 158, § 3º).

13.3.4. Extorsão qualificada pela privação da liberdade (art. 158, § 3º)


Trata-se da hipótese em que a privação da liberdade da vítima é condição indispensável
para obtenção da vantagem indevida. É o chamado sequestro-relâmpago.
Ex.: ladrão constrange a vítima a entregar-lhe o cartão magnético e a fornecer-lhe a senha,

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acompanhando-a até caixas eletrônicos de bancos para sacar dinheiro. Nesse caso, ocorre o
crime de extorsão qualificada, uma vez que é imprescindível a atuação do sujeito passivo do
ataque patrimonial para a obtenção da vantagem indevida por parte do autor. Difere do roubo
majorado pela restrição da liberdade da vítima, porque, neste caso, a restrição da liberdade é
irrelevante para obtenção da vantagem indevida. Imaginemos o agente subtrair objetos da vítima,
prendendo-a no banheiro. Trata-se de roubo majorado pela restrição da liberdade da vítima, pois
trancá-la no banheiro não é condição indispensável para a subtração.
A extorsão qualificada pela privação da liberdade da vítima com resultado lesão grave ou
morte passou a ser considerada crime hediondo (art. 1º, III, da Lei no 8.072/1990).

13.4. Extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP)


13.4.1. Conduta típica
O crime consubstancia-se no verbo sequestrar, que significa privar a vítima de sua
liberdade de locomoção, ainda que por breve espaço de tempo.
Exige a presença de um elemento subjetivo específico, consistente na finalidade de ob-
tenção, para si ou para outrem, de qualquer vantagem como condição ou preço de resgate.
É crime hediondo.

13.4.2. Consumação
A consumação ocorre com a privação de liberdade de locomoção da vítima, exigindo-se
tempo juridicamente relevante.
Trata-se de crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo. Assim, enquanto
a vítima estiver submetida à privação de sua liberdade de locomoção, o crime estará em fase de
consumação.
Tratando-se de crime formal, pune-se a mera atividade de sequestrar pessoa, tendo a
finalidade de obter vantagem. Assim, embora o agente não consiga a vantagem almejada, o
delito está consumado quando a liberdade da vítima é cerceada.

13.4.3. Formas qualificadas (art. 159, § 1º, do CP)


São formas qualificadas:
a) sequestro por mais de 24 horas;
b) sequestro de menor de 18 ou maior de 60 anos;

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Direito Penal

c) sequestro praticado por bando ou quadrilha.


É possível responsabilizar-se o agente pelo crime autônomo de associação criminosa (art.
288) em concurso material com a forma qualificada em estudo. Não há falar em bis in idem, uma
vez que os momentos consumativos e a objetividade jurídica entre tais crimes são totalmente
diversos, além do que a figura prevista no art. 288 do CP existe independentemente de algum
crime vir a ser praticado pela quadrilha ou bando.

13.4.4. Extorsão mediante sequestro qualificada pelo resultado: lesão


grave ou morte (art. 159, §§ 2º e 3º, do CP)
A regra, repetindo, é que, nesses crimes, o resultado agravador seja sempre produto de
culpa. Contudo, na hipótese em apreço, a extrema gravidade das sanções cominadas uniu o
entendimento doutrinário que passou a admitir a possibilidade, indistintamente, de o resultado
agravador poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo, direto ou eventual:
a) se resulta em lesão corporal grave;
b) se resulta em morte.

13.4.5. Delação premiada (art. 159, § 4º, do CP)


A Lei no 8.072/1990, que instituiu os crimes hediondos, houve por bem criar, no Brasil, a
delação premiada, que significa a possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar
o(s) comparsa(s) a qualquer autoridade capaz de levar o caso à solução almejada, causando a
liberação da vítima (delegado, juiz, promotor, entre outros).

13.5. Dano (art. 163 do CP)


13.5.1. Conduta típica
Destruir quer dizer arruinar, extinguir ou eliminar. Inutilizar significa tornar inútil ou im-
prestável alguma coisa aos fins para os quais se destina. Deteriorar é a conduta de quem estraga
ou corrompe alguma coisa parcialmente.
É o dolo. Não há a forma culposa.
Em que pese o art. 163 CP não exija expressamente um fim especial de agir, a juris-
prudência tem entendido pela necessidade do animus nocendi, que é a vontade específica de
causar um prejuízo patrimonial ao dono da coisa.
Neste sentido, vem se entendendo que a conduta do apenado que rompe a tornozeleira

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

eletrônica é atípica, justamente pela ausência de tal animus (RHC 151173-RS).

13.5.2. Dano qualificado (art. 163, par. ún., do CP)


I – Violência à pessoa ou grave ameaça a pessoa;
II – Com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui
crime mais grave;
III – Contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou
de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou em-
presa concessionária de serviços públicos;
IV – Motivo egoístico e prejuízo considerável.

13.5.3. Ação penal (art. 167 do CP)


De acordo com o art. 167, a ação penal privada é cabível no crime de dano simples (art.
163, caput, do CP) e qualificado somente na hipótese do inciso IV do parágrafo único.
A ação penal pública incondicionada é cabível nas demais hipóteses.
13.6. Apropriação indébita (art. 168 do CP)

Art. 163, caput


Regra: ação
penal privada
Art. 163, p.ú
inciso IV
Ação penal

Exceção: ação
Art. 163, p.ú
penal pública
incisos I, II, III
incondicionada

Finalidade
Deteriorar
econômica

Finalidade
Dano Destruir
econômica

Finalidade
Danificar
econômica

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

13.6.1. Conduta típica


O núcleo do tipo é o verbo “apropriar-se”, que significa fazer sua a coisa alheia. Tendo o
sujeito a posse ou a detenção do objeto material, em dado momento faz mudar o título da posse
ou da detenção, comportando-se como se dono fosse. O pressuposto do crime de apropriação
indébita é a anterior posse lícita da coisa alheia, da qual o agente se apropria indevidamente. A
posse, que deve preexistir ao crime, deve ser exercida pelo agente em nome alheio, isto é, em
nome de outrem.
A apropriação indébita propriamente dita ocorre quando o sujeito realiza ato demonstrativo
de que inverteu o título da posse, como a venda, doação, consumo, penhor, ocultação etc. Na
negativa de restituição, o sujeito afirma claramente ao ofendido que não devolverá o objeto ma-
terial.
O art. 168, § 1º, do CP prevê causas de aumento de pena, consistentes em ter recebido
a coisa: a) em depósito necessário; b) na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inven-
tariante, testamenteiro ou depositário judicial; c) em razão de ofício, emprego ou profissão.

13.7. Estelionato (art. 171 do CP)


13.7.1. Conduta típica
Consiste em induzir ou manter alguém em erro, mediante o emprego de artifício, ardil, ou
qualquer meio fraudulento, a fim de obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo
alheio.
A característica primordial do estelionato é a fraude: engodo empregado pelo sujeito para
induzir ou manter a vítima em erro, com o fim de obter um indevido proveito patrimonial.
O meio de execução deve ser apto a enganar a vítima. Tratando-se de meio grotesco, que
facilmente demonstra a intenção fraudulenta, não há nem tentativa, por atipicidade do fato.

13.7.2. Consumação e tentativa


Trata-se de crime material. Consuma-se com a obtenção da vantagem ilícita indevida, em
prejuízo alheio, ou seja, quando o agente aufere o proveito econômico, causando dano à vítima.
Via de regra, esses resultados ocorrem simultaneamente. Há, assim, ao mesmo tempo, a ob-
tenção de proveito pelo estelionatário e o prejuízo da vítima.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

13.7.3. Fraude no pagamento por meio de cheque (art. 171, § 2º, VI, do
CP)
Se o indivíduo emite um cheque na certeza de que tem fundos disponíveis para o devido
pagamento pelo banco, quando na realidade não há qualquer numerário depositado na agência
bancária, não se pode falar em ilícito criminal, diante da ausência de má-fé.
O que a lei penal pune é o pagamento fraudulento. Nesse sentido é o teor da Súm. no
246 do STF: “Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque
sem fundos”.
Emitir cheque significa pôr em circulação o título de crédito; frustrar o pagamento quer
dizer iludir ou enganar o credor, evitando a sua remuneração.
a) Emitir cheque sem provisão de fundos
O agente preenche, assina e coloca o cheque em circulação sem ter numerário suficiente
na instituição bancária (banco sacado) para cobrir o valor quando da apresentação do título pelo
tomador. No momento da emissão do cheque – que não significa simplesmente o seu
preenchimento, mas a entrega a terceiro –, é preciso que o estabelecimento bancário, en-
carregado da compensação, já não possua fundo suficiente para cobrir o pagamento.
b) Frustrar o pagamento de cheque
Neste caso, o agente possui fundos suficientes na instituição bancária quando da emissão
do cheque, contudo, antes de o beneficiário apresentar o título ao banco, aquele retira todo o
numerário depositado ou apresenta uma contraordem de pagamento.
c) Competência
Conforme o art. 70, § 4º, do CPP, incluído pela Lei no 14.155/2021, nos crimes previstos
no art. 171 do CP, quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem
suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante
transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em
caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.
d) Reparação do dano
Arrependendo-se o agente antes da apresentação do título pelo beneficiário no banco
sacado, e depositando o numerário necessário para cobrir a quantia constante do cheque, haverá
arrependimento eficaz, não respondendo ele por crime algum.
Se, por outro lado, o agente arrepender-se somente após a consumação do crime, ou
seja, após a recusa do pagamento pelo banco sacado, incidirá a Súm. no 554 do STF: “O pa-
gamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

ao prosseguimento da ação penal”.


Assim, o pagamento do cheque antes do recebimento da denúncia extingue a punibilidade
do agente.

13.7.4. Ação penal (art. 171, § 5º, do CP)


A Lei no 13.964/2019, ao incluir o § 5º ao art. 171 do CP, passou a considerar que o crime
de estelionato será, via de regra, de ação penal pública condicionada à representação. Logo, a
vítima terá o prazo de 6 (seis) meses a contar da ciência da autoria do fato para manifestar sua
vontade acerca da persecução penal, sob pena de, extrapolado esse prazo, ocorrer a extinção
da punibilidade, com base no art. 107, IV, do CP.
Excepcionalmente, será, no entanto, de ação penal pública incondicionada se o crime de
estelionato for praticado contra: a) a Administração Pública, direta ou indireta; b) criança ou ad-
olescente; c) pessoa com deficiência mental; d) maior de 70 anos de idade ou incapaz.

13.7.5. Alterações promovidas pela Lei no 14.155/2021


Cumpre ressaltar que a Lei no 14.155/2021, que entrou em vigor em 27-5-2021, acres-
centou os §§ 2º-A e 2º-B ao art. 171:

§ 2º-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida


com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por
meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou
por qualquer outro meio fraudulento análogo. (Incluído pela Lei no 14.155/2021)
§ 2º-B. A pena prevista no § 2º-A deste artigo, considerada a relevância do resultado gra-
voso, aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a
utilização de servidor mantido fora do território nacional. (Incluído pela Lei no 14.155/2021)

13.8. Receptação (art. 180 do CP)


13.8.1. Conduta típica
Nos termos do art. 180, caput, do CP, a receptação é o fato de adquirir, receber, trans-
portar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime,
ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.
É pressuposto do crime de receptação a existência de crime anterior. Trata-se de delito
acessório, em que o objeto material deve ser produto de crime antecedente, chamado de delito
pressuposto.
A receptação culposa constitui o fato de o sujeito adquirir ou receber coisa que, por sua
natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece,

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Direito Penal

deve presumir-se obtida por meio criminoso (art. 180, § 3º).

13.8.2. Receptação qualificada (art. 180, § 1º, do CP)


Forma qualificada: tem como elemento subjetivo o dolo, seja direto ou eventual.

13.8.3. Receptação punível autonomamente (art. 180, § 4º, do CP)


Para a concretização do crime de receptação não importa se houve a condenação do
autor do crime anterior. Porém, é necessário evidenciar-se a existência do crime anterior.

13.8.4. Perdão judicial (art. 180, § 5º, do CP)


Nos termos do art. 180, § 5º, 1ª parte, do CP, na hipótese da receptação culposa, se o
criminoso é primário, deve o juiz, tendo em consideração determinadas circunstâncias, deixar de
aplicar a pena. No caso, fixaram a doutrina e a jurisprudência que, além da primariedade, deve-
se exigir o seguinte: a) diminuto valor da coisa objeto da receptação; b) bons antecedentes; c)
ter o agente atuado com culpa levíssima.

13.8.5. Tipo qualificado (art. 180, § 6º, do CP)


Outra forma qualificada: quando o produto de crime pertencer à União, Estado, Município,
empresa de serviços públicos ou sociedade de economia mista. Exige-se que o agente tenha
conhecimento disso.

13.9. Escusas absolutórias (arts. 181 a 183 do CP)


13.9.1. Imunidade absoluta (art. 181)
Trata-se da chamada imunidade penal absoluta, também conhecida como escusa ab-
solutória, incidente sobre os crimes contra o patrimônio, nas seguintes hipóteses:

I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;


II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou
natural.

13.9.2. Imunidade relativa (art. 182, I, II e III, do CP)


Consubstancia-se em imunidade penal relativa ou processual, que não extingue a puni-
bilidade, mas tão somente impõe uma condição objetiva de procedibilidade.
Neste caso, ao contrário da imunidade absoluta, o autor do crime não é isento de pena,

103
1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

mas os crimes de ação penal pública incondicionada passam a ser condicionados à repre-
sentação do ofendido.

13.9.3. Exclusão de imunidade ou privilégio (art. 183 do CP)


Dá-se nas seguintes hipóteses:

I – se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave


ameaça ou violência à pessoa;
II – ao estranho que participa do crime;
III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta)
anos.

14. Crimes contra a Dignidade Sexual

14.1. Estupro (art. 213 do CP)


14.1.1. Conduta típica
Constranger significa tolher a liberdade, forçar ou coagir. Nesse caso, o cerceamento des-
tina-se a obter a conjunção carnal. Ato libidinoso é aquele destinado a satisfazer a lascívia, o
apetite sexual do agente. Considerando que a conjunção carnal é a cópula vagínica, todos os
demais atos que servem à satisfação do prazer sexual são considerados libidinosos, tais como
o sexo oral ou anal, o toque em partes íntimas, a masturbação, o beijo lascivo, a introdução dos
dedos na vagina.

14.1.2. Sujeito ativo e passivo


Antes da alteração introduzida no art. 213 do CP, o sujeito passivo do crime de estupro
era apenas a mulher. Atualmente, o estupro poderá ter como sujeito passivo homens ou mul-
heres, quando constrangidos à prática de atos libidinosos de qualquer natureza.
Atinente ao sujeito ativo, por sua vez, este pode ser homem ou mulher, indistintamente.

14.1.3. Consumação e tentativa


O delito consuma-se com a prática do ato de libidinagem (gênero que abrange conjunção
carnal e vasta enumeração de atos libidinosos ofensivos à dignidade sexual da vítima), sendo
perfeitamente possível a tentativa, quando, iniciada a execução, o ato sexual visado não se

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.


Antes da Lei nova, se ocorresse conjunção carnal e atos libidinosos substanciais contra a
mesma mulher, tínhamos estupro e atentado violento ao pudor. Discutia-se, apenas, se deveria
incidir a continuidade delitiva ou se se tratava de concurso material de crimes.
Agora, tendo o legislador unificado os tipos penais do estupro e do atentado violento ao
pudor, passando a existir apenas o estupro e o estupro contra vulnerável, haverá crime único, se
praticado no mesmo contexto fático.

14.1.4. Formas qualificadas (art. 213, §§ 1º e 2º, do CP)


Duas são as hipóteses: 1ª) ocorrência de lesões graves (que abrangem as lesões gravíssi-
mas) decorrentes da conduta do agente; 2ª) vítima maior de 14 anos e menor de 18 anos na data
do fato.
Quanto às lesões graves (ou gravíssimas), devem ocorrer da conduta. Com isso, deixou
claro o legislador que tais resultados devem decorrer da conduta, portanto, da violência ou grave
ameaça empregadas contra a vítima.
O § 2º do art. 213, por sua vez, prevê o resultado qualificador morte, também decorrente
da conduta. Neste particular, houve redução da pena máxima, que anteriormente era de 25 anos,
passando para 20 anos de reclusão.
Em ambos os casos, os resultados lesões graves (ou gravíssimas) e morte devem ocorrer
a título de culpa do agente.

14.2. Violação sexual mediante fraude (art. 215 do CP)


14.2.1. Conduta típica
O crime do art. 215 do CP abarca a prática de conjunção carnal ou a prática de ato libidi-
noso diverso contra homens ou mulheres, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte
a livre manifestação de vontade da vítima.
Exemplo que se tem visto é a prática de simulações por médico no sentido de sugestionar
estar examinando o(a) paciente para obter aludidos atos libidinosos, ou mesmo rituais de cura
fraudulentamente praticados com o mesmo fim.
Atentar para que não se configure a hipótese prevista no novel § 1º do art. 217-A, que
prevê o tipo penal de estupro contra vulnerável, isto é, quando a vítima, além das demais
hipóteses lá elencadas (vítima menor de 14 anos, pessoa que, por enfermidade ou deficiência

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

mental, não tiver o necessário discernimento para a prática do ato), por qualquer outra causa,
não possa oferecer resistência. Se a vítima, por exemplo, estiver absolutamente embriagada,
absolutamente narcotizada, dormindo, em estados de inconsciência, elevada senilidade,
deficiência física que a incapacite de resistir etc., teremos estupro contra vulnerável.
O sujeito ativo e passivo da aludida infração penal pode ser homem e mulher, indistinta-
mente. Trata-se, pois, de crime comum. No entanto, no caso de menor de 14 anos, o crime será
o do art. 217-A do CP (estupro de vulnerável).

14.2.2. Consumação e tentativa


Tal como ocorre no estupro, consuma-se o delito com a prática do ato de libidinagem,
sendo perfeitamente possível a tentativa quando, iniciada a execução, o ato sexual visado não
se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

14.3. Importunação sexual (art. 215-A do CP)


14.3.1. Conduta típica
A conduta do agente consiste em praticar ato libidinoso, com o propósito de satisfazer sua
lascívia ou a de terceiro. A partir da introdução do art. 215-A do CP, o art. 61 do Decreto-lei no
3.688/1941 está revogado. Deve o ato libidinoso ser praticado contra alguém, ou seja, contra
pessoa determinada. Assim, pratica o crime de importunação sexual o agente que se masturba
diante de uma pessoa para satisfazer a sua lascívia. Agora, se o agente se masturbar em praça
pública, sem visar a uma pessoa determinada, estará praticando o crime de ato obsceno (art.
233 do CP).
Trata-se de crime que contém subsidiariedade expressa, ou seja, aplicam-se as penas da
importunação sexual se a conduta não caracteriza crime mais grave. Assim, se, por exemplo, o
agente empregar violência na prática do ato libidinoso, incidirá o crime de estupro (art. 213 do
CP).
É tipificado também como crime comum, não se exigindo, portanto, qualidade especial da
vítima. Pode, assim, ser praticado por qualquer pessoa. Da mesma forma, qualquer pessoa pode
figurar como vítima.
O agente desenvolve conduta com a consciência de praticar o ato libidinoso contra al-
guém. Eis o dolo. Além disso, o tipo prevê um elemento subjetivo específico, consistente no
agente atuar com a finalidade de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro.

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Direito Penal

14.3.2. Consumação e tentativa


A consumação ocorre com a prática do ato libidinoso. Embora seja de difícil incidência, já
que, se o agente inicia o ato libidinoso, estará consumado o crime, é possível a tentativa.

14.4. Estupro de vulnerável (art. 217-A do CP)


14.4.1. Conduta típica
O crime de estupro de vulnerável consiste na conduta de ter conjunção carnal ou praticar
outro ato libidinoso com menor de 14 anos, bem como com pessoa portadora de enfermidade ou
deficiência mental ou incapaz de discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra
causa, não apresenta condições de oferecer resistência (§ 1º).
O crime é punido a título de dolo, devendo o agente ter ciência de que age em face de
pessoa vulnerável. Se o agente não sabia que a vítima era menor de 14 anos de idade, pode
incidir o erro de tipo (art. 20, caput, do CP).
Nos termos do art. 217-A, § 5º, do CP, incide o crime de estupro de vulnerável inde-
pendentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido relações sexuais ante-
riormente ao crime.

14.4.2. Consumação ou tentativa


Tratando-se de crime material, a consumação ocorrerá com o resultado naturalístico, ou
seja, com a conjunção carnal ou ato libidinoso diverso da conjunção carnal.

14.4.3. Formas qualificadas (Art. 217-A, §§ 3º e 4º, do CP)


Os §§ 3° e 4° qualificam o delito de estupro contra vulnerável se da conduta ocorrer o
resultado lesão grave (por consequência, gravíssima também) ou morte da vítima.

14.4.5. Ação penal (art. 225 do CP)


Em relação aos crimes contra a dignidade sexual, a ação penal será sempre pública in-
condicionada.

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Direito Penal

15. Crimes contra a Fé Pública

15.1. Moeda falsa (art. 289 do CP)


15.1.1. Conduta típica
O tipo básico (caput) pune aquele que falsificar, fabricando ou alterando, moeda metálica
ou papel-moeda de curso legal no País ou no estrangeiro.
Falsificar significa conferir aparência enganadora, recaindo a conduta sobre moeda me-
tálica ou papel-moeda (nacional ou estrangeira).
É essencial que a falsificação seja convincente, isto é, capaz de iludir os destinatários da
moeda.

15.1.2. Consumação e tentativa


O crime consuma-se no momento da fabricação ou da alteração da moeda, desde que
idônea a iludir. A tentativa é perfeitamente possível.

15.1.3. Formas equiparadas (art. 289, § 1º, do CP)


Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta,
adquire, vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa.

15.1.4. Privilégio (art. 289, § 2º, do CP)


Quem, tendo recebido de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, a restitui à
circulação, depois de conhecer a falsidade, é punido com detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois)
anos, e multa.

15.1.5. Falsificação funcional (art. 289, § 3º, do CP)


É punido com reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e multa, o funcionário público ou
diretor, gerente, ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou autoriza a fabricação ou
emissão:
I – de moeda com título ou peso inferior ao determinado em lei;
II – de papel-moeda em quantidade superior à autorizada.

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Direito Penal

15.2. Falsificação de documento público (art. 297 do CP)


15.2.1. Conduta típica
O art. 297 do CP trata da falsidade material, ou seja, aquela que diz respeito à forma do
documento.
As ações nucleares consubstanciam-se nos verbos falsificar, que significa formar, criar
um documento; e alterar, que significa modificar o documento. Na hipótese, o documento é
verdadeiro, e o agente substitui seu conteúdo, isto é, frases, palavras que alterem sua essência,
incidindo, portanto, sobre aspectos relevantes do documento.

15.2.2. Consumação e tentativa


O crime consuma-se com a falsificação ou alteração do documento, sendo prescindível o
uso efetivo deste.
A tentativa é possível, pois há um iter criminis que pode ser fracionado. A tentativa ocor-
rerá se, por exemplo, o agente, estando no início do processo de formação da escritura pública
falsa, tendo preenchido apenas algumas linhas, é surpreendido por terceiro. Nessa hipótese, não
ocorreu ainda a contrafação total do documento, portanto, o crime reputa-se tentado.
Aplica-se a Súm. no 17 do STJ: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais po-
tencialidade lesiva, é por este absorvido”. Trata-se da aplicação da regra de que o crime-fim
absorve o crime-meio.

15.3. Falsificação de documento particular (art. 298 do CP)


15.3.1. Conduta típica
Também se trata de falsidade material, ou seja, aquela que diz respeito à forma do docu-
mento.
Falsificar: significa formar, criar um documento. Ex.: o agente aproveitou-se do espaço
em branco existente entre o conteúdo da carta e a assinatura do missivista para inserir aí uma
confissão de dívida, cortando a parte do conteúdo da carta, e criando, dessarte, parcialmente o
documento.
Alterar: significa modificar o documento. Na hipótese, o documento é verdadeiro, e o
agente substitui seu conteúdo, isto é, frases, palavras que alterem sua essência, incidindo,
portanto, sobre aspectos relevantes do documento.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

15.3.2. Consumação e tentativa


O crime consuma-se com a falsificação ou alteração do documento, sendo prescindível o
uso efetivo deste.
A tentativa é possível, pois há um iter criminis que pode ser fracionado. A tentativa ocor-
rerá quando, por exemplo, o agente, estando no início do processo de forjamento de um instru-
mento de cessão de direitos, em que ele figura como beneficiário, é interrompido por terceiros
antes de sua finalização.

15.4. Falsidade ideológica (art. 299 do CP)


15.4.1. Conduta típica
Na falsidade ideológica, o documento é formalmente perfeito, sendo, no entanto, falsa a
ideia nele contida.
O sujeito tem legitimidade para emitir o documento, mas acaba por lhe inserir um conteúdo
sem correspondência com a realidade dos fatos.
Ex.: assim, uma escritura lavrada pelo funcionário do Cartório de Registro de Imóveis é
formalmente perfeita, pois a ele incumbe formar o instrumento público. Entretanto, se essa es-
crita encerrar declarações falsas prestadas pelo particular, haverá o crime de falsidade ideo-
lógica.
Trata-se de crime de ação múltipla. Diversas são as ações nucleares típicas previstas:
Omitir – deixar de inserir ou não mencionar.
Inserir – colocar ou introduzir.
Fazer inserir – proporcionar que se introduza.

15.4.2. Consumação e tentativa


Consuma-se com a omissão ou a inserção da declaração falsa ou diversa da que deveria
constar.
Trata-se de crime formal; prescinde-se, portanto, da ocorrência efetiva do dano, bastando
a capacidade de lesar terceiro. Assim, o prejuízo a direito, a criação da obrigação ou a alteração
da verdade sobre fato juridicamente relevante não são necessários à consumação do crime.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

16. Crimes contra a Administração Pública

16.1. Dos crimes praticados por funcionário público contra a Admin-


istração em geral
16.1.1. Peculato (art. 312 do CP)
16.1.1.1. Conduta típica
O peculato próprio, na realidade, constitui uma apropriação indébita, só que praticada por
funcionário público com violação do dever funcional. Antes de ser uma ação lesiva aos interesses
patrimoniais da Administração Pública, é principalmente uma ação que fere a moralidade admin-
istrativa, em virtude de quebra do dever funcional.
O peculato próprio é formado pelo peculato-apropriação e peculato-desvio.
No peculato-apropriação, a ação nuclear típica consubstancia-se no verbo apropriar. As-
sim como no crime de apropriação indébita, o agente tem a posse (ou detenção) lícita do bem
móvel, público ou particular, e inverte esse título, pois passa a comportar-se como se dono fosse,
isto é, alienando, doando, consumindo com o bem.
O peculato-desvio está previsto na segunda parte do caput do art. 312: “ou desviá-lo, em
proveito próprio ou alheio”.
O agente tem a posse da coisa e lhe dá destinação diversa da exigida por lei, agindo em
proveito próprio ou de terceiro.
Por exemplo, o funcionário empresta o dinheiro público para perceber os juros.
O peculato-furto é o denominado peculato impróprio, e está previsto no art. 312, § 1º, do
CP. Trata-se de um crime de furto, só que praticado por funcionário público, o qual se vale dessa
qualidade para cometê-lo. Aqui o agente não tem a posse ou detenção do bem como no peculato-
apropriação ou desvio, mas se vale da facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário
público para realizar a subtração.

16.1.1.2. Sujeitos do delito


Trata-se de crime próprio. Somente o funcionário público (art. 327, caput) e as pessoas a
ele equiparadas legalmente (art. 327, §§ 1º e 2º) podem praticar o delito de peculato.
A condição especial funcionário público, como elementar do crime de peculato, comunica-
se ao particular que eventualmente concorra, na condição de coautor ou partícipe, para a prática

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

do crime, nos termos do art. 30 do CP. Portanto, é perfeitamente possível o concurso de pessoas,
dada a comunicabilidade da elementar do crime (art. 30).

16.1.1.3. Peculato culposo (art. 312, § 2º, do CP)


Pune-se aqui o funcionário público que, por negligência, imprudência ou imperícia, con-
corre para a prática de crime de outrem.
O funcionário, para ser punido, insere-se na figura do garante, prevista no art. 13, § 2º.
Assim, tem ele o dever de agir, impedindo o resultado de ação delituosa de outrem. Não o
fazendo, responde por peculato culposo.
Ex.: se um vigia de prédio público se desvia de sua função de guarda, por negligência,
permitindo, pois, que terceiros invadam o lugar e de lá subtraiam bens, responde por peculato
culposo.
Nos termos do art. 312, § 3º, do CP, a reparação do dano, para dar causa à extinção da
punibilidade, deve ser anterior ao trânsito em julgado da sentença criminal.
Deve ser completa e não exclui eventual sanção administrativa contra o funcionário. A
extinção da punibilidade somente aproveita o funcionário, autor do peculato culposo.
Consoante a segunda parte do § 3º, no crime culposo, se a reparação do dano é posterior
à sentença irrecorrível, isto é, transitada em julgado, haverá a redução de metade da pena im-
posta.

16.1.2. Concussão (art. 316 do CP)


16.1.2.1. Conduta típica
A ação nuclear consubstancia-se no verbo exigir, isto é, ordenar, reivindicar, impor como
obrigação.
A vítima cede às exigências formuladas pelo agente diante do temor de represálias rela-
cionadas ao exercício da função pública por ele exercida.
Assim, não é necessária a promessa da causação de um mal determinado; basta o temor
que a autoridade inspira.
Ex.: carcereiro que exige dinheiro dos presos sob sua custódia. Na hipótese, o simples
fato de os presos encontrarem-se sob a guarda daquele gera neles o temor de eventuais
represálias.
Contudo, não pratica esse delito, mas o de extorsão ou roubo, por exemplo, o policial

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

militar que exige vantagem indevida da vítima utilizando-se de violência, ou ameaçando-a grave-
mente de sequestrar seu filho.

16.1.2.2. Consumação e tentativa


Trata-se de crime formal. A consumação ocorre com a mera exigência da vantagem in-
devida, independentemente de sua efetiva obtenção. Se esta sobrevém, há mero exaurimento
do crime.
É possível a tentativa, na hipótese em que o crime é plurissubsistente.

16.1.3. Excesso de exação (art. 316, § 1º, do CP)


16.1.3.1. Conduta típica
Há duas formas de incidir o crime de excesso de exação: a primeira, quando se trata de
exigência de tributo ou contribuição social indevido; a segunda, o tributo ou contribuição social é
devido, mas o agente emprega meio gravoso ou vexatório para o devedor, o qual não é au-
torizado por lei.

16.1.3.2. Consumação e tentativa


a) Exigência indevida: aqui o delito se consuma no momento em que é feita a exigência
do tributo ou contribuição social.
Trata-se de crime formal, portanto, a consumação independe do efetivo pagamento do
tributo ou contribuição social pela vítima.
A tentativa é possível. Ex.: carta contendo a exigência de vantagem, a qual é interceptada
antes de chegar ao conhecimento da vítima.
b) Cobrança vexatória ou gravosa: consuma-se com o emprego do meio vexatório ou
gravoso na cobrança do tributo ou contribuição social, independentemente de seu efetivo rece-
bimento.
A tentativa é possível.
Ex.: com o devido aparato já se acha na casa ou estabelecimento do ofendido, mas é
obstado antes que inicie a cobrança.

16.1.3.3. Excesso de exação qualificado (art. 316, § 2º, do CP)


Nessa modalidade mais gravosa do crime de excesso de exação, pune-se o funcionário

113
1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

público que, em vez de recolher o tributo ou contribuição social, indevidamente exigido (§ 1o),
para os cofres públicos, desvia-o em proveito próprio ou alheio.

16.1.4. Corrupção passiva (art. 317 do CP)


16.1.4.1. Conduta típica
Trata-se de crime de ação múltipla. Três são as condutas típicas previstas:
a) solicitar: pedir, manifestar que deseja algo. Não há o emprego de qualquer ameaça
explícita ou implícita. O funcionário solicita vantagem, e a vítima cede por deliberada vontade.
b) receber: aceitar, entrar na posse. Significa obter, direta ou indiretamente, para si ou
para outrem, vantagem indevida.
Aqui a proposta parte de terceiros e a ela adere o funcionário, ou seja, o agente não só
aceita a proposta como recebe a vantagem indevida.
Ao contrário da primeira modalidade, é condição essencial para sua existência que haja a
anterior configuração do crime de corrupção ativa, isto é, o oferecimento de vantagem indevida
(art. 333). Sem essa oferta pelo particular, não há como falar em recebimento de vantagem.
c) aceitar a promessa de recebê-la: nessa modalidade típica, basta que o funcionário
concorde com o recebimento da vantagem. Não há o efetivo recebimento dela. Deve haver, nec-
essariamente, uma proposta formulada por terceiros, à qual adere o funcionário, mediante a
aceitação de receber a vantagem.
Na corrupção passiva, o funcionário, em troca de alguma vantagem, pratica ou deixa de
praticar ato de ofício para beneficiar alguém. O ato a ser praticado pode ser ilegítimo, ilícito ou
injusto. É a chamada corrupção própria.
Ex.: o funcionário do cartório criminal solicita indevida vantagem econômica para suprimir
documentos do processo judicial.
Também configura o crime a prática de ato legítimo, lícito, justo. É a chamada corrupção
passiva imprópria.
Ex.: oficial de justiça solicita vantagem econômica ao advogado, a fim de dar prioridade
ao cumprimento do mandado judicial expedido em processo em que aquele atua.

16.1.4.2. Consumação e tentativa


Trata-se de crime formal. Portanto, a consumação ocorre com o ato de solicitar, receber
ou aceitar a promessa de vantagem indevida.

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1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

A corrupção passiva consuma-se instantaneamente, isto é, com a simples solicitação da


vantagem indevida, o recebimento desta ou com a aceitação da mera promessa daquela.
O tipo penal não exige que o funcionário pratique ou se abstenha da prática do ato fun-
cional. Se isso suceder, haverá mero exaurimento do crime, o qual constitui condição de maior
punibilidade (causa de aumento de pena prevista no § 1º do art. 317).
A tentativa é de difícil ocorrência, mas não é impossível. Basta que haja um iter criminis a
ser cindido. Ex.: solicitação feita por carta, a qual é interceptada pelo chefe de repartição.

16.1.4.3. Causa de aumento de pena (art. 317, § 1º)


Eleva-se em 1/3 a pena do agente que, em razão da vantagem recebida ou prometida,
efetivamente retarda (atrasa ou procrastina) ou deixa de praticar (não leva a efeito) ato de ofício
que lhe competia desempenhar ou termina praticando o ato, mas desrespeitando o dever fun-
cional. É o que a doutrina classifica de corrupção exaurida.

16.1.4.4. Figura privilegiada (art. 317, § 2º)


Trata-se de conduta de menor gravidade, na medida em que o agente pratica, deixa de
praticar ou retarda o ato de ofício, não em virtude do recebimento de vantagem indevida, mas
cedendo a pedido ou influência de outrem, isto é, para satisfazer interesse de terceiros ou para
agradar ou bajular pessoas influentes.

16.1.5. Prevaricação (art. 319 do CP)


16.1.5.1. Conduta típica
O crime de prevaricação caracteriza-se pela conduta do funcionário público em retardar
ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de
lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.
a) Retardar: é atrasar, adiar, protelar, procrastinar, não praticar o ato de ofício dentro do
prazo estabelecido (crime omissivo).
Ex.: atendente de cartório judicial que, devendo expedir alvará de soltura, por não sim-
patizar com o advogado, deixa de fazê-lo com a brevidade que a medida exige.
b) Deixar de praticar: trata-se de mais uma modalidade omissiva do crime em estudo.
Aqui, no entanto, ao contrário da conduta precedente, há o ânimo definitivo de não praticar o ato
de ofício.

115
1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

c) Praticar (contra disposição expressa de lei): cuida-se aqui de conduta comissiva, em


que o agente efetivamente executa o ato, só que de forma contrária à lei.
O interesse pessoal é qualquer proveito, vantagem, podendo ser patrimonial ou moral.
Quanto ao interesse patrimonial, importa distinguir algumas situações:
a) se o ato praticado, retardado ou omitido tiver sido objeto de acordo anterior entre o
funcionário e o particular, visando aquele indevida vantagem, o crime passará a ser outro: cor-
rupção passiva;
b) se houver, anteriormente à prática ou omissão do ato, a exigência de vantagem in-
devida pelo funcionário público, haverá o crime de concussão.
Sentimento pessoal: reflete um estado afetivo ou emocional do próprio agente, que pode
manifestar-se em suas mais variadas formas, tais como amor, paixão, emoção, ódio.

16.2. Dos crimes praticados por particular contra a Administração em


geral
16.2.1. Resistência (art. 329 do CP)
16.2.1.1. Conduta típica
A conduta típica consiste em opor-se o particular à execução de ato legal mediante o
emprego de violência ou ameaça.
Para grande parte da doutrina, a violência e a ameaça devem ser dirigidas à pessoa do
funcionário, e não contra coisas, por exemplo, quebrar os vidros da viatura policial. Poderá o
agente, nesse caso, responder pelo crime de dano qualificado.
A oposição pode também se dar mediante o emprego de ameaça, a qual pode ser real,
por exemplo, apontar uma faca para o funcionário público ou uma arma de fogo, ainda que
desmuniciada; ou verbal, por exemplo, indivíduo que promete ao policial, que, se ele for preso,
mandará seus comparsas eliminá-lo.

16.2.1.2. Consumação e tentativa


Consuma-se com o emprego da violência ou ameaça contra o funcionário.
Tratando-se de crime formal, não se exige que o agente efetivamente impeça a execução
do ato legal.
É perfeitamente possível a tentativa. Por exemplo: agente é impedido por terceiros de
desferir uma paulada no funcionário público. Ressalve-se que, no caso de ameaça, somente

116
1ª Fase | 40° Exame da OAB
Direito Penal

haverá a tentativa se ela for realizada por escrito.

16.2.2. Desobediência (art. 330 do CP)


16.2.2.1. Conduta típica
O delito de desobediência em muito se parece com o de resistência, uma vez que em
ambos o sujeito ativo pretende subtrair-se à execução de ato legal; contudo, no crime de deso-
bediência, não ocorre o emprego de violência ou ameaça contra funcionário público.
O núcleo do tipo está consubstanciado no verbo desobedecer, desatender, não aceitar,
não se submeter, no caso, à ordem legal de funcionário público.
Para que exista o crime de desobediência é necessário que haja ordem legal emanada
de funcionário público competente. Não se cuida aqui de pedido ou solicitação, por exemplo, de
promotor de justiça que, mediante ofício, solicita documentos.

16.2.2.2. Consumação e tentativa


Trata-se de delito formal (aquele que não exige resultado naturalístico, consistente na
ocorrência de algum prejuízo efetivo para a administração por conta do não cumprimento da
ordem).
A tentativa somente é possível na forma comissiva do descumprimento da ordem legal.

16.2.3. Desacato (art. 331 do CP)


16.2.3.1. Conduta típica
O desacato consiste na prática de qualquer ato ou emprego de palavras que causem vex-
ame, humilhação, falta de respeito ao funcionário público.
Pode implicar qualquer tipo de palavra grosseira ou ato ofensivo contra a pessoa que
exerce função pública, incluindo ameaças e agressões físicas.
Ex.: cuspir no rosto do oficial de justiça, atirar papéis no promotor de justiça, rogar praga
contra o funcionário.
No exercício da função: diz com a ofensa praticada contra funcionário público que esteja
no desempenho de sua função, isto é, praticando atos de ofício.
Em razão do exercício da função: nessa hipótese, o funcionário está fora do exercício de
sua função, mas a ofensa contra ele irrogada diz respeito a ela.

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Direito Penal

16.2.3.2. Consumação e tentativa


Trata-se de crime formal (delito que não exige o resultado naturalístico, consistente no
efetivo desprestígio da função pública). Consuma-se, portanto, no momento em que os atos
ofensivos são praticados (vias de fato, lesão corporal, gestos, gritos etc.) ou as palavras ultra-
jantes irrogadas (calúnia, difamação, injúria) são proferidas contra o funcionário público.
Como se trata de crime formal, não se exige que o funcionário público se sinta ofendido
com os atos praticados.

16.2.4. Corrupção ativa (art. 333 do CP)


16.2.4.1. Conduta típica
As ações nucleares do tipo estão consubstanciadas nos verbos:
Oferecer vantagem indevida, ou seja, propor ou apresentar para que seja aceita.
Prometer vantagem indevida, isto é, comprometer-se, fazer promessa, garantir a entrega
de algo ao funcionário.
Por não se tratar de crime bilateral, prescinde-se da aceitação da vantagem pelo fun-
cionário público. Caso aceite, o funcionário deverá responder pelo delito de corrupção passiva.

16.2.4.2. Consumação e tentativa


Trata-se de crime formal, uma vez que a consumação se dá com a simples oferta ou
promessa de vantagem indevida por parte do agente ao funcionário público, isto é, independen-
temente de ele aceitá-la ou recusá-la. Também não é necessário que o funcionário pratique,
retarde ou omita o ato de ofício de sua competência.
A tentativa é possível. Ex.: suponha-se a hipótese de que a correspondência contendo a
oferta de dinheiro não chegue às mãos do funcionário destinatário por ter sido apreendida pela
polícia.

16.2.4.3. Causa de aumento de pena (art. 333, par. ún.)


Eleva-se a pena em 1/3 quando, em razão da promessa ou da vantagem, o funcionário
público efetivamente atrasa ou não faz o que deveria, ou mesmo pratica o ato, infringindo dever
funcional. Nessa hipótese, o crime é material, isto é, exige resultado naturalístico.

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Direito Penal

16.2.5. Descaminho (art. 334 do CP)


16.2.5.1. Conduta típica
Descaminho é a fraude voltada a frustrar, total ou parcialmente, o pagamento de direitos
de importação ou exportação ou do imposto de consumo sobre mercadorias.
Em síntese, no descaminho, o agente busca iludir, mediante o emprego de fraude, o pa-
gamento de direito ou imposto devido em face de entrada e saída de mercadoria não proibida.
Princípio da insignificância: O STF, baseado no art. 20 da Lei no 10.522/2002 e na
Portaria MF no 75/2012, estabeleceu que o valor que dispensa a cobrança fiscal em juízo é de
R$ 20.000,00, incidindo, em relação a esse valor, o princípio da insignificância.

16.2.5.2. Consumação e tentativa


O descaminho consuma-se com a liberação pela alfândega, sem o pagamento dos im-
postos inerentes. Consuma-se, ainda, com a entrada e saída da mercadoria do território nacional.
A tentativa é possível. No caso de exportação, o crime é tentado se a mercadoria não
chega a sair do País. No caso de importação, se o agente entrar com a mercadoria no País, mas
for preso na alfândega, o crime já estará consumado.

16.2.5.3. Figuras equiparadas (art. 334, § 1º)


Incorre na pena do caput do art. 334 (reclusão, de 1 a 4 anos) quem:

I – pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei;


II – pratica fato assimilado, em lei especial, a descaminho;
III – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito
próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de proce-
dência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente
ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação
fraudulenta por parte de outrem;
IV – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade
comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de do-
cumentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos.

16.2.5.4. Causa de aumento de pena (art. 334, § 3º)


A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo,
marítimo ou fluvial.

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16.2.6. Contrabando (art. 334-A do CP)


16.2.6.1. Conduta típica
Contrabando é a clandestina importação ou exportação de mercadorias cuja entrada no
País, ou saída dele, é absoluta ou relativamente proibida.

16.2.6.2. Consumação e tentativa


Na importação ou exportação de mercadorias proibidas com passagem pelos órgãos
alfandegários, o crime consuma-se quando transposta a barreira fiscal, mesmo que a mercadoria
não chegue ao seu destino.
A tentativa é possível. No caso de exportação, o crime é tentado se a mercadoria não
chega a sair do País. No caso de importação, se o agente entrar com a mercadoria no País, mas
for preso na alfândega, o crime já estará consumado.

16.2.6.3. Figuras equiparadas (art. 334-A, § 1º)


§1º Incorre na mesma pena quem:

I – pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando;


II – importa ou exporta clandestinamente mercadoria que dependa de registro, análise ou
autorização de órgão público competente;
III – reinsere no território nacional mercadoria brasileira destinada à exportação;
IV – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito
próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida
pela lei brasileira;
V – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade
comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira.

16.2.6.4. Causa de aumento de pena (art. 334-A, § 3º)


A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo,
marítimo ou fluvial.

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17. Dos crimes contra a Administração da Justiça

17.1. Denunciação caluniosa (art. 339 do CP)


17.1.1. Conduta típica
Trata-se da conduta do agente que dá causa à instauração de inquérito policial, de pro-
cedimento investigatório criminal, de processo judicial, de processo administrativo disciplinar, de
inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime,
infração ético-disciplinar ou ato ímprobo de que o sabe inocente.
O elemento do tipo “alguém” indica, nitidamente, tratar-se de pessoa certa, não se po-
dendo cometer o delito ao indicar para a autoridade policial apenas a materialidade do crime e
as várias possibilidades de suspeitos.

17.1.2. Elemento subjetivo


É o dolo, consistente na vontade livre e consciente de dar causa à instauração de inves-
tigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa contra alguém,
imputando-lhe crime.
É imprescindível que o denunciante saiba (dolo direto) que o denunciado é inocente, con-
forme expressa exigência legal contida na expressão “de que o sabe inocente”. Sem ele, não há
crime. A dúvida (dolo eventual) afasta a tipicidade do delito.

17.1.3. Consumação
Trata-se de crime formal, ou seja, delito que não exige, para sua consumação, resultado
naturalístico, consistente no efetivo prejuízo para a administração da justiça.
Consuma-se, portanto, com a instauração de investigação policial, de processo judicial,
de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra al-
guém.
Não se exige que a autoridade policial, formalmente, instaure o inquérito policial para que
se consume o crime. Basta que inicie investigação policial no sentido de coletar dados que apu-
rem a veracidade da denúncia.

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17.2. Comunicação falsa de crime ou de contravenção (art. 340 do CP)


17.2.1. Conduta típica
Consubstancia-se no verbo provocar, isto é, dar causa à ação da autoridade pública (del-
egado de polícia, juiz, promotor de justiça, bem como todas as autoridades administrativas que
tenham atribuição legal para iniciar investigações).
Na hipótese, o agente comunica à autoridade a prática de crime ou contravenção penal
que não se verificou.
Ao contrário do que ocorre no crime de denunciação caluniosa, não há no delito em estudo
a imputação a uma pessoa determinada da prática de crime. Se assim suceder, estará caracter-
izado o crime de denunciação caluniosa.

17.2.2. Consumação e tentativa


É crime formal, que não exige, para sua consumação, resultado naturalístico.
Consuma-se, portanto, o crime no momento em que a autoridade pratica alguma ação no
sentido de elucidar o fato criminoso. Semelhantemente ao crime de denunciação caluniosa, não
se exige a efetiva instauração de inquérito policial.
É possível a tentativa. Desse modo, se o agente fizer a comunicação falsa à autoridade,
e esta não iniciar as investigações por circunstâncias alheias à vontade dele, haverá tentativa.

17.3. Falso testemunho ou falsa perícia (art. 342 do CP)


17.3.1. Conduta típica
Trata-se de crime de ação múltipla, pois três são as ações típicas:
a) “Fazer afirmação falsa”. Segundo a doutrina, cuida-se aqui da falsidade positiva, pois o
agente declara a ocorrência de fato inverídico.
Ex.: testemunha que, para forjar um álibi em favor do acusado, afirma falsamente que, no
momento do crime, ele estava em sua companhia.
b) “negar a verdade”. Essa modalidade constitui a chamada falsidade negativa, pois o
agente tem ciência da verdade, mas nega o que sabe.
Ex.: testemunha de acusação que nega falsamente que a vítima de homicídio tenha an-
teriormente tentado estuprar a filha do acusado.
c) “calar a verdade”. É, segundo a doutrina, a chamada reticência. Aqui há o silêncio a
respeito do que se sabe ou se recusa em manifestar a ciência que se tem dos fatos. Há, assim,

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resistência por parte do agente em declarar a verdade. Não há, ao contrário das demais modal-
idades, qualquer afirmação falsa ou negativa.
Ex.: perito que omite dados relevantes ao elaborar o laudo pericial, de forma a criar prova
benéfica ao acusado.

17.3.2. Sujeitos do delito


Trata-se de crime de mão própria (de atuação pessoal ou de conduta infungível). Nesse
passo, somente pode ser cometido pelo sujeito em pessoa.
São sujeitos ativos desse delito a testemunha, o perito, o tradutor ou o intérprete. A Lei no
10.268/2001 acrescentou um novo sujeito ativo, não previsto na antiga redação do dispositivo,
qual seja, o contador que atue em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial ou em
juízo arbitral.
Se a testemunha não assina o compromisso de dizer a verdade, não pode praticar o delito
em tela. Portanto, é indispensável que seja reconhecida como testemunha, e não como simples
declarante ou informante, pessoas estas que não narram seu entendimento sobre algo sem o
compromisso de dizer a verdade.

17.3.3. Consumação e tentativa


É crime formal, não exigindo, portanto, para a sua consumação, resultado naturalístico.
Consuma-se o falso testemunho com o encerramento do depoimento. Em tese, o crime
consuma-se no momento em que é proferido o falso; contudo, como o depoente pode retificar o
que foi declarado até o encerramento do depoimento, entende-se consumado o crime nesse
exato instante.

17.3.4. Retratação (art. 342, § 2º)


No caso, o agente, antes da sentença no processo em que ocorreu o falso testemunho,
declara a verdade.
Na realidade, o crime já se consumou no momento em que o depoimento foi encerrado,
contudo, a lei faculta ao agente o direito de arrepender-se antes da prolação da sentença de
primeiro grau, possibilitando com isso o esclarecimento da verdade dos fatos e, conse-
quentemente, a extinção da punibilidade.
Trata-se, portanto, de condição resolutiva da punibilidade. Embora já consumado o crime,

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a punição depende, ainda, de o agente não se retratar ou declarar a verdade, oportunamente.

17.4. Favorecimento pessoal (art. 348 do CP)


17.4.1. Conduta típica
Comete este delito o agente que presta auxílio, de qualquer natureza, a quem acaba de
cometer um crime, com a finalidade de subtraí-lo à ação da autoridade, prejudicando a ação de
autoridade pública (policiais civis ou militares, membros do Judiciário).
O favorecimento pessoal é delito acessório, ficando sua tipificação na dependência da
existência de um crime antecedente, que pode ser de qualquer natureza (doloso, culposo, ten-
tado ou consumado etc.).
Não incidirá o crime de favorecimento pessoal quando em relação ao fato anterior: a)
houver causa excludente de ilicitude; b) já estiver extinta a punibilidade; c) houver escusa ab-
solutória.
Se o agente autor do crime antecedente vier a ser absolvido por qualquer motivo (salvo
na hipótese de absolvição imprópria, em que é aplicada medida de segurança), o sujeito que o
auxiliou não poderá ser condenado pelo crime de favorecimento pessoal.

17.4.2. Consumação e tentativa


O crime consuma-se no momento em que, prestado o efetivo auxílio, o agente favorecido
obtém êxito em sua ocultação, ainda que momentaneamente. Trata-se, pois, de crime material.
É possível a tentativa, por exemplo, quando o auxílio chega a ser prestado, mas o agente
beneficiário não se livra da autoridade.

17.4.3. Escusa absolutória (art. 348, § 2º)


Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica
isento de pena.

17.5. Favorecimento real (art. 349 do CP)


17.5.1. Conduta típica
O presente dispositivo visa a tutelar a administração da justiça, no sentido de punir o com-
portamento daquele que auxilia o criminoso a tornar seguro o proveito do crime.
Comete este delito o agente que prestar a criminoso, fora dos casos de coautoria ou de

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receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime.


Assim como o delito anterior, o favorecimento real também é delito acessório, ficando sua
tipificação na dependência da existência de um crime antecedente, que pode ser de qualquer
natureza (doloso, culposo, tentado ou consumado etc.).
Para a incidência deste delito, o auxílio deve ser destinado a tornar seguro o proveito do
crime, referindo-se a qualquer vantagem alcançada com a prática do delito principal, podendo
abranger:
a) o objeto material do crime, como o próprio bem subtraído;
b) o preço do crime, por exemplo, dinheiro que o homicida ganhou para matar alguém.
Não incide o delito se o agente desconhece a procedência criminosa do bem.
Se autor do crime antecedente for menor de idade ou já estiver extinta a sua punibilidade,
pela prescrição, por exemplo, continua sendo possível o favorecimento real, pois o objeto con-
tinua sendo produto de crime. A menoridade e a extinção da punibilidade apenas impedem a
aplicação de sanção penal ao autor do crime antecedente.
Somente haverá o crime de favorecimento real se o agente não estava previamente ajus-
tado com os autores do delito antecedente. Se houve prévio ajuste, o agente responderá pelo
mesmo delito, em concurso de pessoas.

17.5.2. Consumação e tentativa


O crime consuma-se no momento em que o agente presta auxílio, independentemente de
saber se o agente conseguiu ou não tornar seguro o proveito do crime anterior. Trata-se, pois,
de crime formal.
É possível a tentativa.

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