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NEUROPSICOLOGIA
CURITIBA
2009
POR QUE ME COMPORTO ASSIM?
TRANSFORMAÇÕES CEREBRAIS NA ADOLESCÊNCIA
Cristian V. Alencar1
RESUMO
Introdução
Diariamente aparecem na televisão e nos jornais casos de adolescentes
que passaram por algum acidente de carro devido a alta velocidade ou que
foram pegos com grande quantidade de drogas ou que participaram de algum
ato de violência. Da mesma forma questões como a escolha profissional, a
sexualidade, o relacionamento com os pais, os grupos também são temas
freqüentes.
1
Psicólogo formado pela UTP (Universidade Tuiuti do Paraná), especialista em Psicologia Corporal pelo
Centro Reichiano de Psicoterapias Corporais, aluno do curso de especialização em Neuropsicologia pelo
IBPEX.
A adolescência é considerada o período de transição entre a infância e a
vida adulta. Não há uma definição clara para o seu início e o seu fim. Abrange
conceitos culturais e sociais, mudanças físicas, biológicas e psicológicas. Mas
o que acontece com o ser humano nessa etapa de sua vida?
A Psicologia aponta as mudanças emocionais e sociais que acontecem
nessa fase. As crises de identidade, as primeiras experiências sexuais, a
identificação com grupos e muitas vezes a experiência com drogas e o
distanciamento dos pais. Por muito tempo foi defendida a idéia de que os
principais responsáveis pelas mudanças nesta fase da vida seriam os
hormônios. Idéia hoje bastante debatida, devido às descobertas da
neurociência sobre as transformações no cérebro dos adolescentes. Mas quem
é então o principal responsável pelo comportamento típico do adolescente?
Cérebro, hormônios ou meio social e cultural? Provavelmente todos eles.
Segundo Herculano-Houzel (2005) os Institutos Nacionais de Saúde dos
estados Unidos já reconheceram como este estudo é importante, e custeiam
atualmente um projeto de 16 milhões de dólares que visa a escanear
regularmente o cérebro de 500 crianças/adolescentes de 2 a 21 anos de idade
e testar suas funções cognitivas ao longo de sete anos. Ainda segundo a
autora a maioria dos trabalhos publicados sobre o assunto se deram a partir de
2004. Provavelmente muitos ainda estão por surgir.
Pesquisas como essas são necessárias para um melhor entendimento
dos adolescentes acerca dos seus comportamentos, para os pais de
adolescentes e educadores, e para própria ciência no que diz respeito a
discussão sobre quem é o principal responsável pelas alterações
comportamentais nesta fase: cérebro, hormônios, meio sociocultural. O avanço
das pesquisas em neurociência aponta que a adolescência é um estado do
cérebro e que o comportamento adolescente é resultado de um cérebro
adolescente.
O presente artigo investiga as transformações que acontecem no
cérebro no período da adolescência e os comportamentos resultantes dessas
transformações. Para isso parte do seguinte problema: quais as
transformações cerebrais que acontecem na adolescência? Quais as
influências dessas transformações no comportamento dos adolescentes?
Em todas as sociedades a adolescência constitui um período de muitas
transformações e transições. De acordo com Volpi, Volpi e Bernardelli (2004) o
adolescente passa muitas vezes por uma crise de identidade, quando está se
preparando para assumir maior liberdade e responsabilidades exigidas pela
vida adulta. Os hormônios estão à flor da pele provocando um aumento dos
impulsos sexuais. A ansiedade toma conta de seu corpo e psiquismo e o deixa
mais vulnerável ao uso de drogas e transtornos de ordem emocional, motivo de
brigas e discórdias com os pais. Mas e o cérebro?
O objetivo geral do presente artigo foi investigar as transformações
cerebrais no período da adolescência e suas influências no comportamento do
adolescente. Além disso, buscou-se verificar os principais estudos da
neurociência sobre o cérebro do adolescente, analisar a relação entre o
cérebro e os hormônios no período da adolescência, e, investigar as principais
contribuições da Psicologia sobre esse período.
Para o presente Artigo foi realizada uma pesquisa bibliográfica. “A
pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado
constituído principalmente de livros e artigos científicos” (GIL, 2002, p. 44). Em
quase todos os estudos é exigido algum tipo de trabalho dessa natureza, mas
há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas. É
importante ressaltar que existem muitos livros sobre a Psicologia na
adolescência que apontam as principais teorias psicológicas sobre
adolescência nos aspectos emocionais e sociais, além de ressaltarem as
mudanças físicas e a influência dos hormônios. Existem também muitos livros
sobre o desenvolvimento humano que exploram o desenvolvimento físico,
emocional e social na adolescência.
Com relação ao desenvolvimento do cérebro na adolescência a
pesquisa foi dificultada pelo pouco material encontrado. A obra “O cérebro em
transformação” de Suzana Herculano-Houzel é um livro muito completo sobre o
tema e foi bastante utilizado no artigo. Foram realizadas pesquisas em sites
científicos como scielo e pepsic, mas não foi encontrado nenhum material que
relacionasse as transformações cerebrais na adolescência. Além disso, é
importante relatar que a maioria das citações encontradas no livro “O cérebro
em transformação” são de pesquisas realizadas fora do Brasil e artigos
publicados em inglês.
O artigo inicia apontando a diferença entre puberdade e adolescência e
as principais mudanças físicas sofridas durante esse período. Na seqüência
explora os aspectos psicológicos, dando especial ênfase a psicanálise, e os
aspectos sociais, focando na visão sócio-histórica da adolescência. E
finalmente ressalta a neuropsicologia na adolescência. As principais
transformações sofridas pelo cérebro nesse período e as repercussões no
comportamento do adolescente.
A menina que tem os seios se desenvolvendo não os vê, sente e lhes atribui o
significado de possibilidade de amamentar seus filhos no futuro. Com certeza, em
algum tempo ou cultura isso já foi assim. Hoje, entre nós, os seios tornam as meninas
sedutoras e sensuais. Esse é o significado atribuído em nosso tempo. A força muscular
dos meninos já teve o significado de possibilidade de trabalhar, guerrear e caçar. Hoje
é beleza, sensualidade e masculinidade.
Cérebro e Adolescência
A neuropsicologia estuda a relação entre a mente e o cérebro. A ciência
que visa estudar a repercussão de disfunções cerebrais sobre o
comportamento e a cognição. Segundo Luria (1966) citado por Moretti e
Martins (1997) a neuropsicologia é a ciência que tem por objetivo o estudo das
relações entre as funções do sistema nervoso e o comportamento humano.
Considerações Finais
As transformações cerebrais que acontecem na adolescência nos
trazem um novo olhar para esse período do desenvolvimento humano. A
adolescência é vista por muitos teóricos como uma invenção cultural de pouco
mais de um século. No passado essa etapa não existia passando a criança,
após a puberdade, a etapa adulta. Já era iniciada no trabalho e
consequentemente com a puberdade já tinha capacidade de reproduzir.
A perspectiva sócio-histórica aponta que o comportamento do
adolescente, a adolescência em si, depende do meio sócio-cultural, da
interação do adolescente com esse meio e do momento histórico. Segundo
essa teoria, a família em que está ou esteve inserido, a escola que freqüenta e
o grupo de iguais terão uma grande influência nas atitudes do adolescente.
Além disso, a comunidade, o país, o momento histórico e a sociedade também
terão uma forte influência na etapa da adolescência.
A adolescência é vista pela psicanálise como uma etapa com
características próprias em que o indivíduo deve elaborar o luto pelo corpo de
criança, pelos pais da infância e pela identidade infantil. O adolescente não é
criança e não é adulto, está construindo uma identidade e nesse momento
pode passar por uma confusão de identidade ou uma confusão de papéis. Nas
palavras de Anna Freud e Maurício Knobel é normal certa dose de
anormalidade durante esse período.
Não se pode esquecer que para muito autores a adolescência inicia com
a puberdade, mas que é muito difícil definir quando ela termina. Com todas
essas mudanças físicas e hormonais fica difícil não imaginar que tipo de
conflitos esse indivíduo pode estar passando.
Aliado a tudo isso vem à proposta da neurociência quanto às
transformações cerebrais na adolescência. Foi possível verificar com essa
pesquisa que realmente o cérebro sofre transformações nessa etapa. O córtex
parietal sofre transformações acarretando um estranhamento quanto à imagem
corporal tão defendida também pela psicanálise. O corpo já não é mais o
mesmo e as partes do corpo crescem em momentos diferentes, podendo trazer
uma série de conflitos para o adolescente. Conflitos também causados pelos
familiares que apontam características desse corpo ao adolescente e pelo meio
social que estabelece certo padrão de beleza, muitas vezes impossível de ser
atingido pelo adolescente.
O sistema de recompensa está embotado e os muitos receptores para
dopamina foram perdidos gerando tédio, preguiça e uma busca por fortes
emoções, música alta e esportes radicais. Aqui também se pode perceber uma
possível busca por drogas devido a essa insatisfação. Nesse ponto fica clara a
diferença de uma criança e de um adolescente. Estimular uma criança é muito
mais fácil do que estimular um adolescente. O adolescente parece estar
insatisfeito, não tem empolgação em realizar determinadas atividades, tem
preguiça e um tédio constante.
O córtex frontal também sofre transformações refinando suas conexões.
Reduz substância cinzenta ao mesmo tempo em que expande substância
branca. Foi possível verificar que esta área apresenta funções de memória de
trabalho, controle de impulsos, raciocínio abstrato, além da capacidade de usar
as emoções para tomada de decisões. Essa é uma das últimas regiões do
cérebro a ficarem prontas na adolescência.
É possível afirmar que ocorrem transformações no cérebro adolescente
e que estas alterações influenciam no comportamento. O que não podemos
esquecer é que cada indivíduo possuí uma personalidade e está inserido num
contexto sócio-cultural e que isso pode fazer a diferença quando essas
transformações cerebrais começarem a acontecer. As transformações
cerebrais vão acontecer num adolescente que mora no Brasil como num
adolescente que mora no Japão, vão acontecer num sujeito de 17 anos dos
dias de hoje como aconteceram num sujeito de 17 anos que viveu há 200 anos
atrás, vai acontecer num indivíduo de classe alta como num indivíduo da classe
baixa. Elas acontecem. Mas o meio em que o indivíduo está inserido é muito
importante. E a sua estrutura de caráter também.
Vale ressaltar novamente a dificuldade em encontrar material sobre as
transformações cerebrais na adolescência, assim como é importante dizer que
essa é apenas uma pesquisa introdutória. Cada abordagem teórica defende as
suas idéias sobre esse período do desenvolvimento humano como, por
exemplo, a psicanálise e a sócio-histórica. E a neurociência traz mais uma idéia
sobre essa fase de nossas vidas. Qual é a mais correta? Impossível responder.
O que é valida é essa discussão, pois todas têm sua parcela de contribuição.
REFERÊNCIAS
ABERASTURY, A.; KNOBEL, M. Adolescência normal. Um enfoque
psicanalítico. Porto Alegre: Artmed, 1981.