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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro


Vigésima Segunda Câmara Cível

Apelação Cível n° 0018659-32.2017.8.19.0204

RELATOR: DES. MARCELO LIMA BUHATEM


Apelante: CLAUDINEA DE OLIVEIRA BASTOS
Apelado: LIGHT – SERVIÇOS DE ELETRICIDADE S.A.

EMENTA

DIREITO DO CONSUMIDOR - APELAÇÃO CÍVEL –


AÇÃO INDENIZATÓRIA - FORNECIMENTO DE
ENERGIA ELÉTRICA –

RECUPERAÇÃO DE CONSUMO - LAVRATURA DE TOI-


SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL– REFORMA-

NULIDADE DO TOI - FALHA NA PRESTAÇÃO DO


SERVIÇO CONFIGURADA -

PERDA DO TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR –


NECESSIDADE DE RECORRER AO JUDICIÁRIO PARA
VER SEU DIREITO GARANTIDO – STJ: TEORIA DO
DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR –

DANO MORAL CONFIGURADO – VERBA


REPARATÓRIA QUE DEVE SER ARBITRADA,
LEVANDO EM CONSIDERAÇÃO O MÉTODO BIFÁSICO
DE FIXAÇÃO DE DANOS MORAIS –

DA-SE PROVIMENTO AO RECURSO.

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Assinado em 06/02/2020 13:23:28


MARCELO LIMA BUHATEM:31153 Local: GAB. DES MARCELO LIMA BUHATEM
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Apelação Cível n° 0018659-32.2017.8.19.0204

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos esta APELAÇÃO CÍVEL n.º


0018659-32.2017.8.19.0204, em que é Apelante: CLAUDINEA DE OLIVEIRA
BASTOS e Apelado: LIGHT SERVIÇO DE ELETRICIDADE S.A.

ACORDAM os Desembargadores que compõem a Vigésima


Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por
unanimidade de votos, em DAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto
do Relator.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível, na qual a parte autora,


CLAUDINEA DE OLIVEIRA BASTOS, busca a reforma da sentença no tocante à
improcedência do pleito de compensação por danos morais.

Aduz, em síntese, que a ré, Light Serviço de Eletricidade S.A.,


efetuou TOI unilateralmente, imputando parcelamento e cobrança de multa em
desfavor da autora a respeito de dívida inexistente.

A sentença (fl. 265 do index) julgou parcialmente


procedentes os pedidos, nos termos da parte dispositiva a seguir:

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Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE


PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS PELA
PARTE AUTORA, extinguindo-se o feito com resolução de
mérito, na forma do art. 487, I do CPC, para: a) Confirmar
a decisão de fls. 74/75 para torna-la definitiva; b) declarar
a nulidade do TOI e determinar que a parte ré se
abstenha de efetuar o corte no serviço de energia
elétrica em função de débitos relativos ao TOI em nome
do autor, cancelando o mesmo e todo e qualquer débito
a ele atrelado, no prazo de 05 dias a contar da presente,
sob pena de multa de R$500,00 por cada cobrança
indevidamente realizada; c) condenar a parte ré à
devolução de eventuais quantias COMPROVADAMENTE
PAGAS EM RELAÇÃO AO TOI em sede de liquidação de
sentença, com incidência de correção monetária a contar
do desembolso e juros de mora de 1% ao mês a partir da
citação. Diante da sucumbência mínima da parte autora,
custas e honorários sucumbenciais pela parte ré, estes
fixados em 10% sobre o valor da condenação, na forma do
art.85, § 2º e 86, parágrafo único, ambos do NCPC.
Transitado em julgado, arquive-se com baixa.

Em seu recurso (doc.280), a parte autora pleiteia a reforma do


julgado, para ver reconhecido o direito à devolução em dobro, na forma do
artigo 42 parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor. Requereu, ainda,
o reconhecimento do direito à compensação por danos morais, em razão dos
grandes transtornos sofridos pela conduta ilícita perpetrada pelo apelado,
consistente nada imputação de parcelamento e multa por dívida inexistente.
Requerer, ainda, a condenação do réu as penas pela litigância de má-fé.

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Contrarrazões (doc.342), pelo desprovimento do recurso e


manutenção do julgado.

Passo ao V O T O.

Conheço do recurso por tempestivo e por estarem presentes


os demais requisitos de admissibilidade.

Cinge-se a controvérsia recursal quanto à configuração de


dano moral, alegadamente causado por lavratura de Termo de Ocorrência de
Inspeção (TOI) e a eventual devolução em dobro.

De se registrar que não há discussão, por qualquer das partes,


quanto ao reconhecimento, no julgado, da ilegalidade da conduta perpetrada pelo
apelado.

No que tange ao pedido de indenização por dano moral, vale


ressaltar que a autora foi cobrada indevidamente, sendo compelida a pagar
parcelamento do importe referente à recuperação de consumo, sob o risco de ter
seu fornecimento de energia cortado e seu nome negativado.

Além disso, o corte e a negativação também restaram


obstados pela decisão que deferiu a tutela de urgência, razão pela qual não pode

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a concessionária ré arguir tais abstenções como meios para minimizar o dano


moral sofrido pela autora.

Desta forma, a situação vivenciada pela apelante caracteriza


dano moral a exigir reparação, principalmente quando se vê em risco de ter
seu nome inscrito nos cadastros de restrição ao crédito, bem como de sofrer a
suspensão no fornecimento de serviço essencial.

Com efeito, a dignidade da pessoa ocupa posição de destaque


no ordenamento jurídico atual, constituindo valor máximo e central
constitucionalmente assegurado.

Neste sentido as palavras de Gustavo Tepedino, em “Temas


de Direito Civil”, pág. 47, Ed. Renovar, 2.ª edição, 2001:

“em respeito ao texto constitucional, parece lícito


considerar a personalidade não como um novo reduto de
poder do indivíduo, no âmbito do qual seria exercida a sua
titularidade, mas como valor máximo do ordenamento,
modelador da autonomia privada, capaz de submeter toda
a atividade econômica a novos critérios de validade”.

O dano moral, no caso, decorre do próprio fato (in re ipsa),


gerado pela falta de segurança imposta ao consumidor em relação aos serviços
prestados pelo fornecedor.

Há que se considerar, também, que houve perda do tempo


útil da parte autora (dano temporal), retirando o consumidor de seus deveres

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e obrigações, e da parcela de seu tempo, que poderia ter direcionado ao lazer


ou para qualquer outro fim.

Nesse sentido, o precedente do STJ, publicado em 25 de abril


de 2018 que, em decisão monocrática do ministro Marco Aurélio Bellizze, relator
do AREsp 1.260.458/SP na 3ª Turma, reconheceu, no caso concreto, a
ocorrência de danos morais com base na Teoria do Desvio Produtivo do
Consumidor.

Para o eminente relator, ficaram caracterizados o ato ilícito e


o consequente dever de indenizar, que viu como absolutamente injustificável a
conduta da instituição financeira em insistir na cobrança de encargos
contestados pela consumidora. Afirmou o ministro: “Notório, portanto, o dano
moral por ela suportado, cuja demonstração evidencia-se pelo fato de ter sido
submetida, por longo período [por mais de três anos, desde o início da cobrança
e até a prolação da sentença], a verdadeiro calvário para obter o estorno
alvitrado”,.

Destarte, o dano moral está configurado e decorre da


cobrança de débitos inexistentes, o que transcende o mero aborrecimento e
fundamenta o pleito de compensação por danos morais.

Caracterizado o dano moral, passa-se a análise do valor a ser


fixado a título de compensação.

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Levando-se em conta o caráter pedagógico- punitivo, é de


se arbitrar o valor da compensação de forma prudente, sem olvidar da fixação
de quantia que cumpra a finalidade de ordem psíquica.

Nesse trilho, para a fixação do quantum debeatur da


compensação por danos morais, deve-se ter em mente o princípio de que o dano
não pode ser fonte de lucro, sob pena de causar enriquecimento sem causa,
com abusos e exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação.

No entanto, não se pode, sob pena de ratificar condutas


irregulares, olvidar o caráter punitivo pedagógico da verba em questão.

Assim, considerando as peculiaridades do caso concreto, a


verba em questão deve ser fixada em 8.000.00 (cinco mil reais), observando-se
os valores comumente fixados no âmbito desta Corte para casos análogos,
impondo-se o arbitramento neste patamar em função da ameaça de corte da
energia e necessidade de pagamento de parcelamento por débito inexistente.

Reconheço, ainda, o direito à devolução em dobro, na forma


da dicção do artigo 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor e
diante da ausência de configuração do engano justificável, na medida em que a
cobrança que se reputa indevida nestes autos é derivada de dívida inexistente,
justificando, portanto, a devolução dobrada.
Afasto o pleito de condenação do apelado nas penas de
litigância de má-fé, diante da ausência de enquadramento nas hipóteses legais

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(artigo 80 do CPC), não tendo havido qualquer demonstração efetiva para que
haja tal condenação.

Ex positis, VOTO no sentido de conhecer e DAR


PROVIMENTO ao recurso, para determinar a devolução em dobro dos valores
comprovadamente pagos pela recorrente, tudo a ser apurado em sede de
liquidação de sentença, nos moldes determinados no julgado.

Condeno, ainda, a parte ré, ora apelada, ao pagamento de


danos morais, arbitrados em oito mil reais, corrigidos da data deste julgado
(sumula 362 do STJ) e com juros de mora a partir da citação.

Inverto o ônus sucumbencial, para determinar ao réu o seu


pagamento integral das despesas processuais e honorários advocatícios, que
fixo em dez por cento do valor da condenação, na forma do artigo 85, §1º do
CPC.
No mais, mantenho todos os termos do julgado vergastado.

Rio de Janeiro, na data da assinatura digital.

Desembargador MARCELO LIMA BUHATEM - Relator

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