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Aconselhamento Genético:
Análise e Contribuições
a partir do Modelo de
Aconselhamento Psicológico
Pontifícia Universidade
Católica de Goiás
http://dx.doi.org/10.1590/1982-3703001372013
Artigo
Portanto, orienta o consulente e/ou os fami- inicial, provocado pelo diagnóstico positivo
liares sobre a tomada de decisões conscientes para uma doença genética, for elaborado
e equilibradas a respeito da saúde deles. É (Evers-Kiebooms, & Berghe, 1979). A singula-
importante reafirmar que, quanto mais cedo ridade de cada família influenciará a vivência
for iniciado o AG, maior será a probabilidade e a capacidade de chegar ou não à fase de
de um melhor prognóstico futuro (Ramalho, reorganização do pensamento e das atitudes,
Magna, & Silva, 2002). embora existam fatores reconhecidos como
fundamentais na qualidade de elaboração
O AG, como procedimento de diagnóstico, do enfrentamento, tais como o momento do
implica que os conselheiros devem atuar diagnóstico e sua gravidade (Irvin, Kennel,
como facilitadores de um processo complexo & Klaus, 1993).
de entendimento do que está ocorrendo com
o consulente e sua família e que ajam para Adicionalmente, o prognóstico, o tipo de
que os consulentes façam um processo de cuidado necessário ao consulente, os recursos
ajuste perante a nova situação a ser vivenciada externos de apoio e as estruturas internas
(Pina-Neto, 2008). Segundo Borges-Osório psíquicas disponíveis afetam o modo pelo
e Robinson (2001), a informação de ordem qual cada indivíduo lida com a situação
genética tem implicações importantes. Além emergente (Goldberg, Morris, Simmons,
de conter dados médicos e científicos de Fowler, & Levison, 1990; Kroeff, Maia, &
difícil compreensão, abrange aspectos psi- Lima, 2000; Pelchat et al., 2001). Tendo em
cológicos desencadeados pela confirmação vista as implicações genéticas e sociais dos
do diagnóstico positivo. distúrbios genéticos e o impacto que causam
nas famílias, o aparecimento do distúrbio
As alterações genéticas possuem causas precipita sinais clássicos das crises vitais e
multideterminadas, portanto, não se deve é sob esta perspectiva que se deve aborda-lo
admitir uma intervenção que exclua a dimen- durante os processos de AG e da conduta
são emocional e nem tampouco o contexto clínica de atenção à saúde dos afetados e
socioambiental no qual se insere o consulente de seus familiares.
e seus familiares. As famílias que atravessam
uma problemática de ordem genética precisam No processo de AG, são vários os temas a
do olhar integrador do profissional de saúde serem considerados: a proposição e a análise
mental, de apoio social e de todos os profis- do teste genético, o contexto sociocultural,
sionais que estão comprometidos com o seu o processo de desenvolvimento humano, a
tratamento. Assim, escutar o consulente e sua relação interpessoal, o processo de luto, o
família de maneira ampla implica considerar desamparo, os processos de comunicação
os diferentes fatores que estão potencialmente verbal e não-verbal, os mecanismos de
inter-relacionados e que afetam o problema defesa psíquica, os tipos de personalidade,
diagnosticado ou que são afetados por ele. a autoimagem, os modos de enfrentamento,
Assim, quando a família se depara com o o conceito de saúde e doença etc.
diagnóstico positivo de uma doença genética e
percebe que deverá se adaptar a uma realidade É primordial que os profissionais envolvidos
irreversível, envolvendo toda a dinâmica fami- no AG tenham amplo conhecimento de todo
liar, o casal acaba tendo que revisar antigos o processo por que passam os consulentes,
desejos, expectativas, planos e sonhos para para que possam compreendê-los e lhes
que novas prioridades sejam estabelecidas dar o tempo necessário para assimilarem as
(Colmago, & Biasoli-Alves, 2003). informações e, principalmente, tomarem as
decisões necessárias, com clareza e raciona-
Estudos têm demonstrado que os familiares lidade (Petean & Pina-Neto, 1998). Embora
somente serão capazes de efetivamente se possam visualizar as complexidades
assimilarem as orientações e de oferecerem envolvidas na tarefa do AG, principalmente
os atendimentos necessários ao desenvol- no que se refere à dimensão de ordem
vimento da criança, quando o choque psicológica, o AG tem se desenvolvido e
tem sido exercido, principalmente, dentro e preparado para dar privacidade ao processo
do campo e da perspectiva das ciências de AG. O Material utilizado se constituiu de
biológicas. Pensa-se que a integração do exemplar do roteiro de entrevista semiestru-
conhecimento psicológico ao modelo de turada, elaborado para a pesquisa, composto
AG poderia contribuir no atendimento à por quatro questões que abordavam os seguin-
complexidade de sua função. tes temas: Percepções das Reações Familiares,
Percepção da Profissional e Considerações
O objetivo este trabalho foi analisar um caso Relevantes para Melhoria do Serviço de AG;
de Aconselhamento Genético, com base no Roteiro de entrevista padrão do aconselha-
modelo do aconselhamento psicológico, mento genético estruturado pela equipe de
buscando caracterizar a dimensão psicoló- aconselhamento genético do NPR o qual
gica presente no processo de AG e analisar contém Dados Pessoais e Dados do RN. Os
o modelo atual de AG praticado no Núcleo dados do RN requisitado são: Antecedentes
de Pesquisa Replicon, do Departamento de Clínicos, Dados Fonoaudiológicos, Consan-
Biologia da PUC de Goiás. guinidade, Dados Familiares, Antecedentes
Gestacionais, Dados e Medidas do Paciente,
Hábitos e Heredograma.
Método
Procedimentos
Participantes
Foram realizados contatos com a gerência do
Trata-se de estudo de caso descritivo e NPR e apresentado o projeto de investigação.
exploratório. Participaram da pesquisa três Após o aceite, os participantes foram recruta-
profissionais biomédicos geneticistas, de dos durante a realização dos procedimentos
ambos os sexos, de idades entre 37-42, de AG. A eles foram esclarecidos os objetivos
ligados ao NPR; uma consulente de 36 da investigação, bem como as condições
anos, semianalfabeta (apenas sabe escrever o do TCLE. Os primeiros sujeitos abordados
próprio nome), mãe de uma criança de onze consentiram na participação assinando o
anos que apresenta diagnóstico do 47, XYY TCLE. A coleta de dados foi realizada no
(Síndrome Caracterizada do Duplo Y) e com segundo semestre de 2010. A pesquisadora
retardo mental, dificuldade de aprendizagem inseriu-se na sessão de devolução diagnós-
e dificuldade na fala. tica do AG realizando registro em áudio
das interlocuções dos participantes e por
Como critério de inclusão dos profissionais, meio de observação realizou registros de
foi considerada a experiência maior a um ano cada fase do processo. Imediatamente após
de aconselhamento genético e participação a sessão de devolução do AG, entrevistou-
voluntária mediante assinatura de um termo se o conselheiro responsável, registrando as
de consentimento livre e esclarecido (TCLE). respostas em áudio. A partir da entrevista com
Da família, foi considerado: ter uma criança o conselheiro e da entrevista de devolução
com o diagnóstico positivo da síndrome 47, diagnóstica do processo de AG, foi realizada
XYY e disposição voluntária para assinar o a transcrição literal do material e procedeu-
termo de consentimento livre e esclarecido. se uma síntese temática dos aspectos mais
Foi garantido aos participantes não só o relevantes da fala do conselheiro e da fala do
sigilo, como também a possibilidade de consulente, por meio da técnica de análise
desistência da pesquisa a qualquer momento de conteúdo de Bardin (2008). Tanto para os
do processo. profissionais quanto para a família, segundo
o que orienta a resolução MS no 196/96
Material (Brasil, 1996), no que se refere à condução
de possíveis adversidades desencadeadas
O ambiente do AG foi composto por uma pelo processo de coleta de dados, a equipe
sala de, aproximadamente, 12 m², com dois se responsabilizou pelo acolhimento de
sofás, uma mesa e quatro pufes para crianças eventuais ocorrências.
Compreende-se que o mérito desta investigação Considera-se, por fim, que, quando houver a
reside no fato de destacar a importância de integração da Psicologia ao processo de AG,
serem considerados os aspectos emocionais pre- novos elementos poderão, com certeza, enri-
sentes e eliciados no processo de AG. Contudo, quecer tanto a ciência da Psicologia quanto a
não se pode deixar de vislumbrar em trabalhos ciência do Aconselhamento Genético. Este é
futuros a necessidade de uma metodologia o campo de ação, potencialidades e desejos
que busque ampliar a amostra tanto no que que surge diante dos psicólogos.
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