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A ENGENHARIA CIVIL NA USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL


João Victor Carneiro Lacerda – joaovclacerda@gmail.com
Auditoria, Avaliações e Perícias de Engenharia
Instituto de Pós-Graduação - IPOG
Maceió, AL, 13 de abril de 2021

Resumo
Durante a graduação de engenharia nas faculdades e universidades não possuem
em sua grade a usucapião e muitos formandos não entendem como a engenharia
entra neste tipo de serviço. O presente trabalho tenta esclarecer sobre o que é a
usucapião, quais são as vias para se conseguir e quais os tipos e requisitos mínimos
e máximos para que seja atendido o requerimento. O estudo foi feito através de
pesquisas com leituras de artigos, leis e o código civil. Com o conhecimento
adquirido foi escolhido uma residência na cidade de Traipu/AL, localizada na região
do agreste alagoano com proximidade ao rio São Francisco. No processo foram
feitos todos os requerimentos da parte de advocacia e todos os documentos
necessários para as engenharias e/ou arquitetura, sendo eles projetos arquitetónicos
do imóvel, planta de localização, anotação de responsabilidade técnica (ART) e a
avaliação do imóvel feita através de amostras coletadas na cidade de Traipu e
região circunvizinhas. Tendo como objetivo mostrar um fluxograma explicando os
passos a se conseguir a escritura do imóvel e detalhando as etapas da engenharia.

Palavras-chave: Usucapião. Projeto. Avaliação. Imóvel.

1. Introdução
A usucapião é uma forma de se conseguir a posse de um bem que pode ser móvel
ou imóvel. Como o foco deste trabalho é apenas aos bens imóveis, é necessário
fazer uso deste bem por um determinado tempo, que varia de acordo com o tipo de
usucapião que se enquadra, e comportando-se como o proprietário sem que haja
nenhum tipo de oposição a sua presença no determinado bem. Gomes e Coelho
descrevem a usucapião da seguinte forma:

A usucapião é um instrumento de política urbana e também uma forma de


aquisição da propriedade imóvel. Pode ser requerida em casos que a
pessoa é residente no imóvel/parte do terreno, ou faz uso constante deste a
mais de 10 anos, sem reclamação do seu dono original. Assim, a pessoa
que pedir os direitos de posse da propriedade não pode ter obtido o mesmo
de forma violenta, clandestina ou ilegal, e sim o estar ocupando com o
consentimento do dono.
Em geral a usucapião pode ser requerida por uma pessoa que ocupa um
terreno e lhe confere uma função social (moradia da família, por exemplo).
Assim ela se torna responsável pelo local por determinado período,
assumindo também as responsabilidades tributárias, como gastos com
IPTU, iluminação, água, etc. Assim tal pessoa pode fazer o pedido judicial
para que o terreno passe a ser legalmente dela , para que possa ser
deixado como herança para seus filhos, para garantir indenização em casos
de desapropriação e , em suma, ter sua casa própria legalizada. Na maioria
dos casos esse processo é realizado diretamente com a justiça e
pacificamente.
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Existem alguns tipos de usucapião e serão explicados, mas todos eles têm três
requisitos comuns:
• Animus domini: Não basta estar apenas de posse do bem, é necessário que
haja como dono tendo cuidado, arqueando com os custos, prezando por
manutenção e se apresentar como proprietário;
• Inexistência de conflitos a posse: Não pode haver nenhuma contestação a
sua posse e deve ser pacífica;
• Posse do imóvel de maneira ininterrupta por um determinado tempo: Deve
estar de posse por um período sem que haja oposição, sendo este período
variável com os tipos de usucapião.
Antes de detalhar os tipos de usucapião, é válido ressaltar a diferença das vias de
se iniciar à usucapião, são elas: judicial e extrajudicial. A principal diferença é que na
usucapião judicial há uma disputa pelo imóvel, isso ocorre quando alguma parte não
concorda com a usucapião a favor do possuidor.
Para a usucapião extrajudicial ocorre o procedimento cartorário e o registro é feito
pelo Oficial de registro de imóveis, possui um custo de registro e é o método mais
rápido para a realização da posse ao solicitante. Esta última forma será a estudada
no presente artigo.
Agora depois de entender como são as vias que se iniciam a usucapião, devemos
saber que existem alguns tipos, são eles:
a) Usucapião ordinária de bem imóvel – Presente no artigo 1.242 do código civil
temos os requisitos de animus domini, inexistência de oposição à posse,
existência de justo título, boa-fé posse ininterrupta por no mínimo dez anos;
b) Usucapião extraordinária de bem imóvel –Presente no artigo 1.238 do código
civil temos os requisitos de animus domini, inexistência de oposição à posse e
posse ininterrupta por quinze anos;
c) Usucapião especial urbana – Presente no artigo 183 da constituição, artigo
1.240 do código civil e artigo 9º da lei 10.257/2001 temos os requisitos de
animus domini, inexistência de oposição à posse, posse ininterrupta por cinco
anos, utilização do imóvel para moradia, ter no máximo 250m², não possuir
nenhum outro imóvel, não ter tido reconhecida esta forma de usucapião
anteriormente;
d) Usucapião especial rural – Presente no artigo 1.239 do código civil e temos os
requisitos de animus domini, inexistência de oposição à posse, posse
ininterrupta por cinco anos, utilização do imóvel para moradia, imóvel de até
50 hectares e não ser proprietário de outro imóvel;
e) Usucapião coletiva – Presente no artigo 10 da lei 10.257/2001 e temos os
requisitos de animus domini, inexistência de oposição à posse, posse
ininterrupta por cinco anos, utilização do imóvel para moradia, imóvel de no
máximo 250 m², não ser proprietário de outro imóvel;
f) Usucapião especial indígena – Presente no artigo 33 da lei 6.001/1973 e
temos como requisitos animus domini, ser índio, inexistência de oposição à
posse, posse ininterrupta por dez anos e imóvel de no máximo 50 hectares;
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g) Usucapião especial familiar – Presente no artigo 1.240-A do código civil e


temos como requisitos animus domini, inexistência de oposição à posse,
posse ininterrupta por dois anos, utilização do imóvel para moradia, imóvel de
até 250 m², não ser proprietário de outro imóvel e abandono do lar pelo outro
cônjuge.
Entendendo as vias e os tipos de usucapião nos aprofundaremos no objeto de
estudo, uma casa residencial que pertence ao município de Traipu no estado de
Alagoas, nela foi realizada a usucapião extrajudicial e ordinária.
Muitos não entendem a função dos engenheiros e arquitetos nesta área, pois
durante a graduação em diversas faculdades e universidades não constam na grade
nenhuma matéria que explique como funciona todo seu trâmite, não ofertando a
oportunidade de apresentar aos discentes uma grande porta de entrada no mercado
de trabalho, tendo em vista que no último senso do Instituto Brasileiro de Geografia
e estatística -IBGE foi identificado que de 60 milhões de imóveis, 50% se encontram
em situação de irregularidade sem suas escrituras devidamente registradas em
cartórios de imóveis.
Em Maceió na capital do estado de Alagoas, essa porcentagem aumenta ficando
cerca de 80% dos imóveis sem registros. Essa falta de registro gera prejuízo ao
estado, primeiramente acentua o crescimento desordenado e infraestrutura precária
nesta região, gera sonegação fiscal pois faz com que a União, estados e municípios
deixem de arrecadar bilhões em tributos, como imposto predial e territorial urbano
(IPTU) e no imposto de renda (IR), gera também prejuízo ao comercio, pois imóveis
irregulares não permitem que sejam usados para garantias de financiamentos,
gerando meios de vendas prejudiciais aos vendedores.

2. Desenvolvimento
Para fins de aprofundarmos sobre o tema, será necessário compreender sobre a
cidade onde o imóvel está localizado.

2.1. Cidade de Traipu


Segue a história de Traipu de acordo com o IBGE:
O significado do nome Traipu tem dus versões: segundo uns, quer dizer
“muito Peixe”, segundo outros, “olho d’água do monte”. Conta-se que Pedro
Gomes, mestre de campo, instituiu um morgado para seus descendentes
nos fins do século XVII, dando-lhe o nome de Porto da Folha. O local
começou a ter desenvolvimento e constituiu-se em um povoado com o
mesmo nome. Posteriormente passou a chamar-se Traipu, em razão de se
achar o povoado muito perto da barra do rio do mesmo nome.
Em 1835, foi criada a Vila com o nome de Porto da Folha e, em 1870,
recebeu oficialmente, a denominação de traipu. Por ocasião da
emancipação, Traipu desvinculou-se dos Distritos de Mata Grande, Santana
do Ipanema, Batalha, São Brás e Girau do Ponciano.

A cidade de Traipu pertence ao Estado de Alagoas, tendo seus habitantes nascidos


na cidade chamados de traipuenses, possui uma área de 698 km² e de acordo com
o último senso possui 27.715 habitantes. Fica localizado na região agreste do estado
fazendo margem no rio São Francisco como pode ser observado na figura 1.
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A média salarial da cidade gira em torno de 1,7 salário-mínimo e com este dado
alcança o oitavo lugar de média salarial na região do agreste e quadragésimo oitavo
lugar no estado. Este dado evidencia o poder de compra médio dos habitantes, e é
importante para ajudar na avaliação de imóveis já que se faz necessário obtenção
de amostras de cidades que possuem características similares.

Figura 1 – Localização da cidade de Taipu


Fonte: Dados adaptados pelo autor.

Para iniciar o processo de usucapião é necessário dar entrada em um tabelionato,


que na cidade de Traipu o nome é Tabelionato de Notas e Protesto, Ofício de
Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas, e fica localizado no
centro.

2.2. Procedimento necessário para o tabelionato


O primeiro passo é levar as documentações ao tabelionato onde o oficial de registro
imobiliário analisa e defere ou rejeita o reconhecimento de usucapião extrajudicial,
na presença de um advogado juntamente com a parte interessada. De acordo com
uma cartilha publicada pelo 26º tabelionato de notas de São Paulo – SP (2016) o
tabelião deverá começar o trabalho com a apresentação do memorial descritivo e
planta do imóvel usucapiendo. Isto permitirá atender a descrição do imóvel, os
limites da posse e conhecer os confrontantes que concordam com a planta
apresentada, podendo também colher as suas declarações e anuências na ata.
Lembrando que é facultativo a verificação in loco do imóvel por parte do tabelião já
que possui toda a documentação, mas caso tenha divergências se faz necessária
aferir a realidade fática.
De documentos podemos começar com a ata notarial lavrada pelo tabelião,
atestando o tempo de posse e cadeia possessória, de acordo com as modalidades
de usucapião mostradas na introdução. Para o reconhecimento do tempo de posse
podem ser utilizados contas de luz e energia no nome da pessoa requerente no
imóvel que deseja aplicar a usucapião, no caso estudado se trata de uma usucapião
extrajudicial ordinária, que tem um prazo mínimo de posse de 10 anos.
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Apresentação da planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente


habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica (ART) no respectivo
conselho de fiscalização profissional (no caso o Conselho Regional de Engenharia e
Agrimensura, CREA-AL), e pelos titulares de direitos reais registrados ou averbados
na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes.
Para ser cobrada a ata notarial é através do valor venal, é uma avaliação de quanto
vale determinada propriedade imobiliária feita pelo poder público, mas em casas
sem registros como no caso da estudada, foi necessária uma avaliação imobiliária
porque desde a sua construção não foi cobrado o IPTU.
Faz necessário certidão dos órgãos municipais e/ou federais que demonstre a
natureza urbana ou rural do imóvel usucapiendo, nos termos da Instrução Normativa
Incra n. 82/2015 e da Nota Técnica Incra/DF/DFC n. 2/2016, expedida até trinta dias
antes do requerimento (Artigo 4º, VIII do Provimento 65 do CNJ). Para que assim a
comarca saiba quais profissionais estejam aptos a fazer os serviços, quais tributos
pagar e quais dimensões máximas aceitáveis para determinado tipo de usucapião.
Certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do
domicílio do requerente e comprovação de justo título ou quaisquer outros
documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da
posse, tais como o pagamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre o
imóvel.
2.3. O imóvel
A residência escolhida para estudo foi construída em 1992, no centro da cidade de
Traipu com apenas o contrato de compra e venda como era de costume da época, a
não cobrança rígida de IPTU da cidade acaba deixando as pessoas mais a vontade
de não seguir o procedimento correto. Foi comprado o terreno e posteriormente
construído a residência com acompanhamento de engenheiro, foi realizado uma
planta baixa do imóvel, mas com a falta de cuidado do projeto ele perdeu qualidade
e a planta foi parcialmente comprometida como pode ser visto na figura 2, sendo
necessário que fosse levantado todas as dimensões para que desse entrada no
tabelionato. Ainda foi encontrado o Alvará de regularização do imóvel, mas os dados
encontrados não batem com o encontrado in loco, no documento consta como a
área do lote como 170m² sendo que foram constatados 218,28 m², a proprietária
afirmou ter realizado uma expansão posteriormente no terreno que não foi
documentado na prefeitura. Foi constatado que o terreno tem 8,32 metros de frente,
7,35 metros de fundo, na lateral direita temos 27,88 metros e na lateral esquerda
27,86 metros.
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Figura 2 – Planta original do imóvel.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.

O imóvel é composto por dois pavimentos, sendo eles térreo e inferior ambos
construído em alvenaria cerâmica para vedação interna e externa, estruturado com
fundação, pilares e lajes em concreto armado e uma estrutura de coberta em
madeira de lei e telhas cerâmicas do tipo colonial, não possui forro na casa, visão
direta para a laje. Portas e janelas em sua parte de madeira e outra de ferro, piso
cerâmico em toda a casa e em alguns cômodos como cozinha e banheiros possui
em suas paredes.
O pavimento térreo é composto por garagem coberta para um carro, as escadas
para o andar inferior, duas varandas sendo uma na frente da casa e outra virada ao
rio, entrando encontra com a sala de estar/jantar, três quartos, dois banheiros
sociais, cozinha e depósito. Já no pavimento inferior têm-se um hall, um salão, um
banheiro, varanda e quintal seguindo mesmo padrão construtivo do andar acima.
Foi realizado uma vistoria no imóvel de apenas um engenheiro credenciado ao
conselho e um auxiliar, levando trena, trena a laser, prancheta, papel e caneta, foi
realizado a reprodução da planta do imóvel. Usando um notebook com o software
AutoCAD foi possível passar todos os dados para a versão digital prezando pela
preservação do documento, evitando o deterioramento dele sendo possível agora a
impressão de uma nova para reposição. As plantas realizadas serão apresentadas
nas figuras a seguir sendo pavimento térreo e pavimento inferior respectivamente.
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Figura 3 – Planta arquitetônica pavimento térreo.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.
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Figura 4 – Planta arquitetônica pavimento inferior.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.

Para a planta de situação foi utilizado um software do Google Earth Pro para auxiliar
na visão superior do imóvel e transcrever para o AutoCAD, no Google Earth Pro nos
temos uma excelente captura de imagem e com qualidade, mas este serviço pode
ser realizado de outras formas, como por exemplo, a utilização de drones para
capturas de imagens. Abaixo uma imagem do imóvel vista de cima que
posteriormente foi adaptada para o AutoCAD e este anexado aos documentos
enviado ao tabelionato.
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Figura 5 – Imagem área da região de Traipu com seta indicando o imóvel.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.

Com a figura 5 é possível escalonar através do comando “alinhar” para que fique 1
metro para 1 metro e assim desenhar por cima destacando os imóveis
confrontantes, seus números e as ruas em volta para facilitar a chegada de qualquer
pessoa que tenha necessidade de ir ao local. A figura 6 mostra como fica a imagem
depois de concluída.

Figura 6 – Planta de localização.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.
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Com estes dados em mãos, dar-se início a próxima etapa da documentação que é
de responsabilidade do engenheiro. A segunda documentação é o memorial
descritivo do imóvel, lembrando que estes documentos precisam ser elaborados e
assinados por engenheiros ou arquitetos registrado no conselho e com o pagamento
em dia de sua anuidade. Para detalhar o memorial descritivo do imóvel foi
apresentado os itens fundamentais para este documento com finalidade para
usucapião:
• Localização do imóvel de preferência com coordenadas geográficas para
auxiliar o encontro do imóvel;
• Detalhamento das plantas, explicando quantas e quais foram anexadas,
qual tamanho plotado caso não tenha no carimbo;
• Detalhes construtivos do imóvel, como foi construído, alvenaria, concreto
etc;
• Apresentar as dimensões (Perímetro e área) do imóvel tanto do terreno
quanto da área construída quando houver;
• A composição da área construída detalhando os cômodos e se possível
suas metragens quadradas;
• Todos os confrontantes do imóvel, fundo e laterais direita e esquerda.
Frente normalmente se dar pelo nome do logradouro quando situado em
perímetro urbano;
• Finaliza com a assinatura do responsável técnico pelo trabalho.
Quando é usucapião judicial, as etapas acabam por aqui e é só finalizar com
a ART, mas como o caso estudado é extrajudicial é imprescindível uma
avaliação do imóvel para que o tabelionato tenha um valor para gerar os
custos de emissão da escritura, o procedimento de avaliação será
exemplificado e mostrado no próximo item deste trabalho.
2.4. Avaliação do imóvel
Ao iniciar um procedimento de avaliação, precisa seguir uma rotina básica, onde o
avaliador deverá solicitar todas as documentações relativas ao imóvel avaliando.
Quando não há coerência ou há insuficiência dos documentos coletados, deve ser
expresso e explicado essa circunstância no laudo, bem como todos os pressupostos
admitidos.
Para uma boa avaliação é imprescindível a consulta das legislações municipais,
estaduais e federais que podem restringir ou incentivar a utilização do bem,
impactando de forma direta no valor do imóvel.
Tendo em posse todas as documentações e conhecimento prévio sobre a
legislação, inicia a fase da vistoria. A vistoria é imprescindível para a realização da
avaliação e somente em casos em que o imóvel é de impossível acesso, poderá não
ser realizada. Compartilhando da afirmação da Secretaria do Patrimônio da União
(SPU-DF) (2018) “A vistoria deve ser efetuada pelo profissional avaliador com o
objetivo de conhecer e caracterizar o bem avaliando e sua adequação ao seu
segmento de mercado...”.
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Conclui-se que a vistoria do bem avaliando, deve ser caracterizada todo o


imóvel, a respeito do terreno e da região, utilizando como base o imóvel
estudado:
• Caracterização da região: É situado em uma região ribeirinha, onde
alguns moradores vivem da pesca, cidade possui 27.715 habitantes,
estes com uma média salarial de 1,7 salário-mínimo. No centro da
cidade possui predominância em aclives, o imóvel é encontrado no
centro da cidade. A rua é pavimentada em paralelepípedos, não possui
saneamento, mas há entrega de água e luz, possui iluminação pública
funcional, rede telefônica fixa e móvel, coleta de lixo funciona
normalmente e próximo a pontos de transportes coletivos. No entorno
tem comercio forte, o centro da cidade é uma área residencial e
comercial, possui um banco próximo apenas, o Bradesco, possui
postos de saúdes, delegacias, escolas, praças e templos religiosos no
entorno.
• Caracterização do terreno: Está situado na rua Monsenhor Medeiros,
S/N, no centro da cidade, faz divisa com os imóveis 568 e 75, pela
esquerda e direita respectivamente, aos fundos divisa com a rua Frei
Caneca ao lado do rio São Francisco, como visto na figura 6.
Atualmente a casa encontra-se em estado de não utilização, mas sua
estrutura é para fim residencial, possuindo de frente 8,32 metros, 7,35
metros de fundo, na lateral direita temos 27,88 metros e na lateral
esquerda 27,86 metros. Possui um formato trapezoidal em declive
partindo da rua Monsenhor Medeiros à rua Frei Caneca, solo sem
análise detalhada, terreno não possui nenhuma restrição, no entanto o
entorno possui a restrição da margem do rio.
• Caracterização das edificações e benfeitorias: O imóvel esta
completamente murado, proteção apenas com caco de vidro colado na
argamassa, casa construída em alvenaria cerâmica para vedação,
estrutura em concreto armado, casa possuindo laje nos dois
pavimentos, inferior e térreo, estrutura de coberta em madeira de lei e
telhas cerâmicas, piso revestido em cerâmica, paredes internas em
tinta PVA e para área molhada em revestimento cerâmico, acabamento
em madeira para esquadrias e bancadas em inox. A casa possui duas
águas e sistema de drenagem de água pluvial, quadro de energia
elétrico apenas com disjuntor geral, parte elétrica em fios, tomadas no
modelo antigo sem fio terra. Encanamento em PVC e torneira em inox,
aquecimento de água se dá por chuveiro elétrico. Sistema de esgoto
em PVC, possui caixa de gordura e fossa séptica para drenagem dos
dejetos. A casa se encontra em estado de abandono visto que a
proprietária não tem mais condições de viajar devido a idade
avançada, o que agiliza no fator de deterioramento da residência, esta
possui infestação de alguns animais como cupim, maribondo e
aranhas. Infiltração vindo da parede com o vizinho da esquerda, parte
de pintura do pavimento inferior desprendeu da laje mas a residência
se encontra em bom estado de conservação precisando apenas de
pequenos reparos.
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• Caracterização das edificações e benfeitorias não documentadas:


Único documento presente era o alvará de construção, os demais não
existem.
A seguir algumas fotos do imovel mostrando o seu estado atual de conservação com
ênfase na qualidade da construção e nas manifestações patologicas.

Figura 8 – Frente do imóvel.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.

Figura 9 – Fachada bem conservado com avarias apenas no toldo.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.
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Figura 10 – Desprendimento da tinta, provavelmente decorrente de algum ponto de infiltração no


banheiro do andar superior.
Fonte: Dados produzidos pelo autor.

Figura 11 – Infiltração na parede proveniente do imóvel vizinho.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.
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Figura 12 – Caminho de cupim saindo da esquadria


Fonte: Dados produzidos pelo autor.

Agora se inicia a etapa de escolher qual a metodologia avaliatória deverá ser


utilizada.
Para a escolha correta da metodologia deve-se atentar que o valor de mercado de
um bem pode ser determinado através de três distintos enfoques básicos: renda,
comparação e custo.
A renda é onde o valor de mercado é identificado a partir da renda que ele pode
gerar na sua vida econômica, mais utilizado em imóveis de função comercial,
principalmente fazendas e sítios.
Comparação é onde o valor de mercado é pelos preços dos imóveis semelhantes
praticados no mercado. Método este escolhido para realização da avaliação do
imóvel estudado.
O custo é onde o valor de mercado tem como base de cálculo os gastos diretos e
indiretos necessários à produção do bem. Muito utilizado quando não há outros
similares sendo vendidos.
Agora falando sobre as metodologias que são possíveis utilizar a SPU-DF (2018) diz
que “A metodologia a ser aplicada é em função, basicamente, da natureza do bem
avaliando, da finalidade da avaliação e da disponibilidade, qualidade e quantidade
de informações colhidas no mercado.”. O modelo escolhido dever ser justificado de
acordo com a NBR 14653-1 “Avaliação de bens. Parte 1: Procedimentos gerais”.
As metodologias são: Método Comparativo Direto de Dados de Mercado (MCDDM),
método involutivo, método evolutivo e método de renda.
Para o bem avaliado foi escolhido o MCDDM, este é utilizado quando existem dados
amostrais semelhantes ao avaliando, identifica o valor destes e com base em um
tratamento técnico dos dados é possível a obtenção do valor do bem avaliado.
Já iniciando a pesquisa, é necessário o planejamento do que pretende ter na
composição da amostra representativa, sendo eles com características similares
tanto quanto possível. É recomendável que a qualidade da amostra esteja
assegurada quanto:
• A data de referência da avaliação;
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• Semelhança do imóvel avaliando;


• Número de elementos efetivamente utilizados para atingir um grau de
fundamentação esperado;
• Diversificação das fontes com o intuito de aumentar a confiabilidade dos
dados de mercado.
A especificação da avaliação se tem quanto à fundamentação e precisão, onde
temos o Grau I como o menor e o Grau III como o maior. A precisão será
estabelecida quando for possível medir o grau de confiabilidade da avaliação e o
nível de erro seja tolerável. De acordo com a NBR 14.653-2 (2011) o grau de
fundamentação e precisão atingidos na avaliação estão condicionados à seleção da
metodologia adotada em razão da confiabilidade, a quantidade e a qualidade das
amostras selecionadas, do objetivo da avaliação bem como da natureza do bem
avaliado.
Iniciando a coleta de dados, foram escolhidas mais duas cidades que possuem
material para uma boa qualidade de amostras, já que a renda média das suas
populações se equipara com a de Traipu, são cidades ribeirinhas e na mesma região
do agreste alagoano, são elas Pão de Açúcar e Penedo. As amostras coletadas se
encontram na tabela 1.
nº TIPO PREÇO ÁREA TERRENO (m²) ÁREA CASA(m²) PADRÃO Traipu Pão d eáçucar Pendeo
1 CASA R$ 455.900,00 1296,00 340,00 5 1 0 0
2 CASA R$ 100.000,00 82,00 76,40 4 1 0 0
3 CASA R$ 250.000,00 170,00 150,00 4 1 0 0
4 CASA R$ 200.000,00 100,00 100,00 3 1 0 0
6 CASA R$ 60.000,00 50,00 50,00 2 1 0 0
7 CASA R$ 65.000,00 100,00 49,00 2 0 1 0
8 CASA R$ 190.500,00 83,00 83,00 4 0 1 0
9 CASA R$ 80.000,00 70,00 42,00 3 0 1 0
10 CASA R$ 170.000,00 200,00 200,00 3 0 1 0
11 CASA R$ 130.000,00 167,00 167,00 3 0 0 1
12 CASA R$ 240.000,00 200,00 145,00 5 0 0 1
13 CASA R$ 110.000,00 180,00 180,00 4 0 0 1
14 CASA R$ 160.000,00 210,00 130,00 3 0 0 1
15 CASA R$ 170.000,00 136,00 136,00 4 0 0 1
16 CASA R$ 190.000,00 100,00 100,00 4 0 0 1
17 CASA R$ 180.000,00 600,00 120,00 4 0 0 1
18 CASA R$ 160.000,00 400,00 164,50 3 0 0 1
19 CASA R$ 200.000,00 250,00 180,00 4 0 0 1
20 CASA R$ 95.000,00 82,00 82,00 3 0 0 1
21 CASA R$ 100.000,00 87,00 87,00 3 0 0 1
Tabela 1 – Amostras colhidas.
Fonte: Dados produzidos pelo autor.

Depois de coletado todos os dados amostrais, é determinado quais são as variáveis


dependentes e independentes. Em nosso modelo temos dependente o valor dos
imóveis e independentes o da área do terreno e área construída, o padrão
construtivo e a variável localização. Sendo as áreas variáveis quantitativas, padrão e
localização variáveis qualitativa. Sendo padrão no modelo de código alocado para o
padrão construtivo e localização em variáveis dicotômicas.
Seguindo os padrões da NBR 14653-2 temos que este trabalho atingiu um grau de
fundamentação Grau I pois não atendeu o requisito mínimo de acordo com a norma.
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grau
it descrição
I II III

Completa quanto
Completa quanto a Adoção de
Caracterização do às variáveis
1 todas as variáveis situação
imóvel avaliando utilizadas no
analisadas paradigma
modelo

Quantidade
6 (k+1), onde 4 (k+1), onde 3 (k+1), onde
mínima de dados
k é o número k é o número k é o número
2 de mercado,
de variáveis de variáveis de variáveis
efetivamente
independentes independentes independentes
utilizados

Apresentação
de informações
relativas a todos os presentação Apresentação
dados e variáveis de informações de informações
analisados na relativas aos relativas aos
Identificação dos
3 modelagem, dados e variáveis dados e variáveis
dados de mercado
com foto e efetivamente efetivamente
características utilizados na utilizados no
observadas no modelagem modelo
local pelo autor do
laudo

Admitida para Admitida, desde


apenas uma que:
variável, desde a) as medidas das
que: características
a) as medidas das do imóvel
características do avaliando não
imóvel avaliando sejam superiores
não sejam a 100% do limite
superiores a 100% amostral superior,
do limite amostral nem inferiores à
4 Extrapolação Não admitida superior, nem metade do limite
inferiores à metade amostral inferior
do limite amostral b) o valor estimado
inferior não ultrapasse
b) o valor estimado 20% do valor
não ultrapasse calculado no
15% do valor limite da fronteira
calculado no amostral, para as
limite da fronteira referidas variáveis,
amostral, para a de per si e
referida variável em simultaneamente,
17

módulo e em módulo

Nível de
significância α
(somatório do
valor das duas
5 caudas) máximo 10% 20% 30%
para a rejeição
da hipótese nula
de cada regressor
(teste bicaudal)

Nível de
significância
máximo admitido
para a rejeição
6 1% 2% 5%
da hipótese nula
do modelo através
do teste F de
Snedecor
Tabela 2 – Grau de fundamentação.
Fonte: Dados produzidos pelo autor.

Com base em uma amostra extraída do mercado, os parâmetros populacionais são


estimados por inferência estatística com o auxílio de software específico, no caso foi
utilizado a regressão do Excel para avaliar, e a representação gráfica do modelo de
regressão linear se dar por uma reta que tenta ao máximo passar próximo de todos
os pontos possíveis como visto na figura 13, e o SPU-DF (2018) explica:
Quaisquer que sejam os modelos utilizados para inferir o comportamento do
mercado e formação de valores devem ter seus pressupostos devidamente
explicitados e testados. Quando necessário, devem ser intentadas medidas
corretivas, com repercussão na classificação dos graus de fundamentação e
de precisão.
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Figura 13 – Reta de regressão linear.


Fonte: Dados produzidos pelo autor.

E com todas estas informações temos que o imóvel avaliado tem seu valor estimado
em R$240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais) caso estivesse em bom estado de
conservação, como não se tem amostras suficientes para a criação de mais uma
variável independente que se trataria disto, foi presumido em diminuir o padrão
construtivo, sendo assim o imóvel foi avaliado no valor de R$205.000,00 (duzentos e
cinco mil reais), assim concluído o processo de avaliação.

3. Conclusão
A engenharia tem um papel fundamental na usucapião, pois muitos não conhecem
todo este processo, e não sabe como atuar quando aparece um trabalho na área.
Para evitar mão de obra desqualificada é necessário a busca por profissionais da
área que possuam conhecimento técnico e capacidade para efetuar este serviço,
pois devido a grande quantidade de construções irregulares no Brasil, de maneira
geral tem provocado uma maior demanda nesta década, pois muitas famílias sentem
a necessidade de regularizar seus imóveis para que quando for levantado o
inventario, esteja regularizado para que seus legítimos herdeiros recebam a
propriedade. Existem cursos que ensinam estes trâmites e a avaliação, mas estes
cursos não são unificados. Portanto, o mais indicado é a contratação de profissional
que possua uma pós-graduação voltada para realização deste serviço juntamente
com uma equipe de advogados especializados na área para que toda a
documentação seja emitida e assim ter em mãos a escritura do imóvel.

Referências

ABNT, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14653-1:


Avaliação de bens. Pate 1: procedimentos gerais. Rio de Janeiro, 2001.

ABNT, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14653-1:


Avaliação de bens. Pate 2: Imóveis urbanos. Rio de Janeiro, 2011.
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BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário


Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139.

FRANÇA, Lucas. Cerca de 80% dos imoveis de Maceió estão irregulares. TRIBUNA
HOJE. Fevereiro de 2019. Disponivel em: Cerca de 80% dos imóveis de Maceió
estão irregulares | TribunaHoje.com. Acesso em: 17/06/2021.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo


brasileiro de 2019. Rio de Janeiro: IBGE, 2021.

Martins, Marcus. Usucapião extrajudicial no Novo CPC: entenda como funciona.


AURUM. Setembro de 2020. Disponivel em: Usucapião Extrajudicial no Novo CPC:
guia completo (aurum.com.br). Acesso em: 17/06/2021

RIBEIRO, Luiz. Metade dos imoveis no país são irregulares, segundo ministério.
CORREIO BRAZILIENSE. Setembro de 2019. Disponivel em: Metade dos imóveis
no país são irregulares, segundo ministério (correiobraziliense.com.br). Acesso em:
17/06/2021

TERRA, Mateus.O que é usucapião, seus diferentes tipos, requisitos e como


funciona. AURUM. Setembro de 2020. Disponivel em: Usucapião: O que é, tipos e
requisitos do procedimento (aurum.com.br). Acesso em: 17/06/2021

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