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Como proceder diante de

um engasgo de lactente
menor de 1 ano?

24.1 INTRODUÇÃO
Atualmente acidentes são a principal causa de morte de crianças
entre 1 a 14 anos de idade no Brasil. Anualmente, 3,6 mil crianças
dessa faixa etária vão a óbito, sendo as maiores causas os
atropelamentos e afogamentos. Cerca de 111 mil crianças são
hospitalizadas por essas causas no país, mais da metade por
quedas e queimaduras.
Quadro 24.1 - Principais acidentes por faixa etária
Segundo dados de 2018, os acidentes que mais causam de morte
de 0 a 14 anos são os de trânsito, seguido de afogamentos e
sufocação. Em bebês menores de 1 ano, as principais causas de
morte acidental são sufocamento, acidentes de trânsito e quedas.
24.2 TIPOS DE ACIDENTES
24.2.1 Traumas
As causas de traumas mais frequentes em menores de 15 anos,
no Brasil, são atropelamentos e quedas.
Os procedimentos realizados em situação de trauma são:
▶ Utilizar o suporte avançado de vida (CABD) de reanimação em
Pediatria, com imobilização da coluna cervical;
▶ Avaliar as vias aéreas e oferecer suporte;
▶ Identificar as causas de insuficiência respiratória e tratá-las;
▶ Identificar sinais de choque;
▶ Realizar uma avaliação neurológica rápida;
▶ Realizar exposição e controle do ambiente.
Algumas formas de prevenir trauma na faixa etária pediátrica são:
▶ Nunca deixar o bebê ou criança sobre superfície alta
desacompanhado, como trocador, cama ou sofá. Além disso,
sempre que o bebê estiver no carrinho, deve-se mantê-lo com o
cinto afivelado;
▶ Utilização de grades e redes em janelas e terraços, grades para
proteção de entrada em locais que oferecem perigo, como
cozinha;
▶ Impedir o uso de andadores, pelo risco de queda.
Deve-se atentar para sinais de alerta para traumatismo
cranioencefálico (TCE): nas crianças pequenas, ainda não
colaborativas ao exame, pode ser difícil a avaliação da Escala de
Coma de Glasgow. Há escalas adaptadas para a faixa etária
pediátrica.
São sinais de alerta, que definem necessidade de investigação
radiológica ou observacional em ambiente hospitalar frente a um
TCE:
▶ Agitação ou rebaixamento do nível de consciência;
▶ Alterações neurológicas focais;
▶ Crises convulsivas (crise convulsiva isolada imediatamente
após o trauma é discutível quanto a representar sinal de alarme);
▶ Evidência de fratura de crânio ao exame físico;
▶ Perda de consciência por mais de um minuto;
▶ Vômitos persistentes após o trauma;
▶ Presença de cefaleia/letargia.

#importante
O exame radiológico de escolha no TCE é
a tomografia de crânio. A radiografia de
crânio tem baixa sensibilidade e não
deve ser solicitada rotineiramente.

24.2.1.1 Transporte seguro

De acordo com documento da Sociedade Brasileira de Pediatria,


devem ser utilizados os seguintes dispositivos para que o
transporte seja seguro:
▶ Bebê-conforto: recomendado desde o nascimento até que a
criança atinja o limite máximo de peso ou altura permitido pelo
fabricante do assento. Deve ser utilizado até 2 anos de idade e, se
possível, até os 3 anos. A instalação deve ser feita de costas para
o painel do veículo, se possível no meio do banco de trás, preso
pelo cinto de segurança ou sistemas de ancoragem;
▶ Cadeirinha voltada para frente: a partir do momento que a
criança atinge o peso ou estatura acima do limite máximo
permitido para o assento do tipo bebê-conforto, deve passar a
usar a cadeirinha com cintos de segurança próprios, pelo maior
tempo possível, até atingir o limite máximo de peso ou altura
permitido pelo fabricante, geralmente engloba todo o período de
idade escolar;
▶ Assento elevador: a partir do momento que a criança atinge o
peso ou estatura acima do limite máximo para a cadeirinha de
segurança, deve passar a utilizar o assento de elevação (booster),
até que o cinto de segurança do veículo adapte-se com perfeição,
sem a necessidade do acessório, na porção subabdominal e
ombro, o que geralmente ocorre quando a criança atinge a
estatura de 1,45 m. O assento de elevação não deve ser utilizado
se o veículo tiver somente cintos subabdominais no banco
traseiro;
▶ Cinto de segurança: o cinto de segurança somente poderá ser
utilizado a partir do momento em que as costas da criança já
tocam o encosto do assento, com os joelhos dobrados
confortavelmente e os pés encostando firmemente no chão.
Independentemente da idade da criança, a estatura mínima para
usar o cinto de segurança do carro é de 1,35 m, segundo o padrão
europeu, e 1,45 m, segundo o padrão estadunidense.

#importante
Todas as crianças devem viajar no banco
traseiro até os 13 anos de idade.

24.2.2 Corpo estranho


Trata-se de qualquer elemento introduzido voluntária ou
involuntariamente em uma cavidade.
24.2.2.1 Nas vias aéreas superiores e no ouvido
▶ Tipos mais comuns: fragmentos de esponja de banho, papel
higiênico, componentes de brinquedos, contas de bijuterias,
baterias alcalinas, usadas em relógios e calculadoras;
▶ Diagnóstico: obter informações mais completas possíveis do
paciente ou do acompanhante; verificar sinais e sintomas;
▶ Remoção: conhecer a anatomia e ter equipamento adequado; o
otorrinolaringologista e o endoscopista são indicados no auxílio
ao diagnóstico e à remoção.
24.2.2.2 Engasgo

▶ Ocorrências: a maior parte dos engasgos em lactentes e


crianças ocorre quando estes estão comendo ou brincando;
▶ Diagnóstico: sinais de obstrução de vias aéreas incluem início
súbito, desconforto respiratório associado a tosse fraca ou
silenciosa, incapacidade de falar, estridor e aumento da
dificuldade respiratória;
▶ Tratamento:
▷▷ Lactente responsivo: combinações de cinco golpes nas costas
e cinco compressões torácicas rápidas, até que o objeto seja
expelido pela vítima e que esta se torne responsiva;
▷▷ Criança de 1 a 8 anos: manobra de Heimlich.
As principais formas de evitar o engasgo são não deixar objetos
pequenos ao alcance das crianças, adequar os brinquedos para
cada idade e não oferecer alimentos passíveis de engasgo a
menores de 3 anos, como tomate cereja, ovo de codorna, uva e
pipoca.
24.2.2.3 Ingestão
▶ Ocorrências: objetos colocados na cavidade oral podem tanto
levar ao engasgo como ser ingeridos, geralmente peças de
brinquedos ou objetos pequenos encontrados pelas crianças;
▶ Diagnóstico: pode haver sinais de obstrução de vias aéreas de
início súbito como descritas no engasgo e devem ser realizadas
as manobras descritas no item anterior ou também os pacientes
podem se apresentar de forma assintomática; somente a história
do acompanhante de que testemunhou o que ocorreu ou de que
determinado objeto com o qual a criança brincava sumiu;
▶ Tratamento: a conduta vai depender do tipo de objeto e de sua
localização, conforme apresentado nas Figuras a seguir.
Figura 24.1 - Abordagem do corpo estranho radiopaco
Fonte: Tratado de Pediatria, 2017.
Figura 24.2 - Abordagem do corpo estranho radiolucente

Fonte: Tratado de Pediatria, 2017.

As indicações de endoscopia de urgência são:


▶ Corpo estranho não pontiagudo ou afiado no esôfago;
▶ Alimento impactado em esôfago sem obstrução total;
▶ Objetos pontiagudos e afiados no estômago ou no duodeno;
▶ Objetos de 6 cm no duodeno proximal ou antes;
▶ Ímãs com alcance endoscópico.

24.2.3 Intoxicações exógenas


Intoxicações exógenas agudas podem ser definidas como as
consequências clínicas e/ou bioquímicas da exposição aguda a
substâncias químicas encontradas no ambiente. A conduta
envolve:
▶ Avaliação clínica inicial;
▶ Estabilização (ABCDE);
▶ Reconhecimento da toxíndrome e identificação do agente
causal se possível.
A tentativa de diagnóstico etiológico não deve retardar o suporte
clínico e a conduta:
▶ Descontaminação:
▷▷ Contaminantes tópicos: lavagem copiosa com solução salina e
remoção de roupas;
▷▷ Ingestões: avaliar descontaminação do trato gastrointestinal:
▷▷▷ Carvão ativado: uso rotineiro não é recomendado; indicado
em até 1 hora após ingestão de dose tóxica ou letal de
substâncias de absorção lenta; sem indicação no assintomático;
contraindicado na ingestão de corrosivos, hidrocarbonetos,
álcool, obstrução ou perfuração intestinal e na diminuição do nível
de consciência;
▷▷▷ Lavagem gástrica: não há benefícios, podendo ser
considerada em até 1 hora após ingestão de ferro, lítio e
substâncias em quantidades potencialmente letais;
▷▷▷ Irrigação intestinal: impulsionar a substância tóxica com o
uso de solução de polietilenoglicol.
▶ Eliminação:
▷▷ Diurese forçada;
▷▷ Alcalinização da urina: intoxicações por fenobarbital, salicilatos
e antidepressivos tricíclicos;
▷▷ Métodos dialíticos.
O suporte clínico geral inclui:
▶ Realiazar monitorização cardíaca e manejo de possíveis
arritmias;
▶ Manter controle térmico;
▶ Corrigir distúrbios eletrolíticos e hipoglicemia — monitorização
neurológica (risco de crises convulsivas e rebaixamento do nível
de consciência);
▶ Não induzir vômitos.
Em todos os casos, deve-se entrar em contato com o centro de
intoxicação de referência, que orientará a conduta para cada caso,
pois, de acordo com a toxina, define-se o tratamento. Se há
antídoto conhecido disponível, deve ser administrado, por
exemplo:
▶ Benzodiazepínico: flumazenil;
▶ Opioide: naloxona;
▶ Paracetamol: acetilcisteína.

Como proceder diante de


um engasgo de lactente
menor de 1 ano?
Deve-se segurar a criança com a cabeça em nível
inferior ao resto do corpo e dar cinco batidas firmes nas
costas, seguido de cinco compressões torácicas.
Repetir o ciclo até que a criança desengasgue ou que
haja perda de consciência. Então deve-se proceder às
manobras de ressuscitação cardiopulmonar, conforme
o Suporte Avançado de Vida em Pediatria (PALS). Não
se deve fazer varredura às cegas na boca da criança,
mas se for visualizado o objeto, pode-se retirá-lo, em
movimento de pinça com os dedos.

Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo


No processo da FMUSP, haverá uma prova objetiva com 120
questões-teste, com quatro alternativas cada. A duração da prova
é de até 5 horas. O conteúdo das questões está relacionado à
especialidade do programa de pré-requisito. Para os aprovados,
haverá uma segunda etapa, com análise e arguição do currículo.
FMUSP | 2021
Paciente de 10 anos, vítima de acidente automobilístico com TCE
grave, encontra-se internado em UTI pediátrica há três dias,
intubado e em coma (Escala de Coma de Glasgow 4T). Verificado
aumento importante de diurese nas últimas duas horas, atingindo
10 mL/kg/h de urina clara. Colhidos exames que mostraram: Na =
160 mEq/L; K = 4,5 mEq/L; Cl = 100 mEq/L; pH 7,35; pCO2 35
mmHg; BIC 22 mEq/L. U = 20 mg/dL; Cr = 0,32 mg/dL. Quanto ao
diagnóstico mais provável, podemos afirmar que:
a) rata-se de quadro de diabetes insipidus central, secundário a
lesão e edema cerebral pós-TCE; a deficiência de hormônio
antidiurético leva a maior clearance de água livre, culminando
com hipernatremia
b) trata-se de hipernatremia aguda, causada possivelmente por
administração iatrogênica de NaCl para o paciente no contexto da
neuroproteção pós-TCE
c) trata-se de síndrome da secreção inapropriada de ADH,
secundária a ventilação mecânica administrada ao paciente
crítico; o rim responde com retenção de sódio e água
d) trata-se da síndrome cerebral perdedora de sal, sucedendo
quadro de TCE; esse quadro leva a aumento de diurese e
natriurese, culminando com hiponatremia e hipovolemia
Gabarito: a
Comentários:
a) O diabetes insipidus central pode ser secundário a um quadro
de lesão cerebral. No quadro há deficiência na síntese do ADH
causado pela neuro-hipófise levando a incapacidade de
concentração urinária (urina hipotônica e aumento de volume
urinário) e hipernatremia.
b) A solução salina hipertonia com NaCl 3% não causa aumento
significativo da diurese.
c) Na síndrome da secreção inapropriada de ADH observamos
hiponatremia, osmolaridade urinária elevada e aumento do sódio
urinário.
d) Na síndrome cerebral perdedora de sal ocorre perda renal de
sódio (natriurese aumentada), hiponatremia e diminuição do
volume extracelular (hipovolemia).

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